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“O passado é lição para se meditar, não para se reproduzir”
Mário de Andrade
Em 2022, a XVI Semana de Estudos Clássicos da Feusp inspira-se no centenário da Semana de Arte
Moderna de 1922, um evento marcante da história nacional, caracterizado pelo rompimento com padrões
estéticos e intelectuais exógenos. Nesse sentido, o tema Ruptura e Continuidade com o Mundo Antigo
propõe uma reflexão acerca das lições que a Antiguidade nos legou, tanto naquilo que, de algum modo,
optamos por preservar, quanto naqueles aspectos dos quais escolhemos nos afastar.
Realizada desde 2002 pelo Paideuma - Grupo de Estudos Clássicos da Feusp, a Semana de Estudos Clássicos
tem se constituído como um momento privilegiado para a discussão das relações entre o pensamento
antigo e a educação, buscando apresentar a importância da tradição clássica (concebida também como
uma tradição de releituras e apropriações) para o debate acerca dos fins da educação, seu caráter político,
suas exigências e implicações éticas. Esse caminho, por si só, já é prova da recusa de uma educação regida
somente pelo apelo a um futuro fetichizado ou pelas urgências de um presente administrado; a boa
filosofia ensina que é preciso distanciamento e certa lentidão – ou paciência – para compreendermos os
propósitos da educação, os vigentes e os buscados. Para isso, são os Estudos Clássicos – campo privilegiado
da interdisciplinaridade – um excelente recurso. Eles exigem a paciência, o pensamento cuidadoso, e
impõe a lentidão como disciplina de trabalho, ao mesmo tempo em que nos afastam do que nos é
imediato e costumeiro, para que, ao retornarmos, vejamos facilitadas nossas tentativas de compreensão.
A Comissão Organizadora
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Segunda-feira 06/06
17h-19h
MESA 1
meet.google.com/vjz-dwsm-yhf
Coordenação: Danilo Patutti
A recepção em Michel Foucault da noção socrático-platônica de “cuidado de si”.
Edson da Silva Afonso (Doutorando FEUSP)
No Primeiro Alcibíades, Sócrates diz que o “conhecimento de si” (gnôthi seauton) corresponde à sabedoria.
Esse conhecimento é entendido como condição essencial para o engajamento na vida pública e está ligado ao
discernimento do bem e do mal, podendo ser entendido como uma das condições para o “cuidado de si” (epiméleia
heautou). O gnôthi seauton, na filosofia platônica, diz respeito a um processo de formação. Platão entende que não
cabe aos mestres de virtude ou aos dirigentes políticos o papel formativo. A virtude não é aprendida da mesma
maneira que se dá a transmissão de um conteúdo pedagógico. Ela só pode ser alcançada de outro modo: a partir de
um exercício de si sobre si mesmo. Assim, a verdadeira função do mestre de virtude não é a transmissão de um saber,
e sim convencer cada um a cuidar da virtude. Para Platão, viver filosoficamente consiste tanto em dedicar-se à vida
intelectual quanto em debruçar-se sobre a vida espiritual. Filosofia e espiritualidade não estavam separadas na
Antiguidade. Michel Foucault, n’A Hermenêutica do Sujeito, afirma que houve uma longa época em que o acesso à
verdade não podia ser colocado em termos restritos ao conhecimento. É o que estaria sintetizado pelo preceito de
epiméleia heautou. Foucault considera que o “cuidado de si” constituiria a forma mais geral dessa espiritualidade,
praticamente deixada de lado pela filosofia ocidental atual. Pretendemos analisar a questão socrático-platônica do
“cuidado de si” a partir das reflexões do filósofo francês. Para tanto, analisaremos as duas primeiras aulas do curso A
Hermenêutica do Sujeito. Sublinharemos como, na análise foucaultiana, Platão vincula o “cuidado de si” ao
“conhecimento de si”, não com a finalidade de opor esses dois preceitos, mas para colocar frente a frente dois modos
de vida bem diferentes: o modo de vida do jovem Alcibíades, baseado no poder e na ambição, e o modo de vida
filosófico, o de Sócrates, alinhado com a realização da justiça e que requer o “cuidado de si”.
O modo de vida e discurso da filosofia em Pierre Hadot:
pode-se pensar uma educação universal?
Rafael Batista Lopes de Oliveira (Graduando Filosofia UFU)
Essa comunicação pretende expor a tensão da filosofia entre discurso e modo de vida a partir da crítica
hadoniana sobre a tentativa de sistematização rigorosa da história da filosofia antiga, ou seja, conceber a filosofia
antiga enquanto uma atividade puramente abstrata e teórica. Para isso, serão apresentados os seguintes pontos: a
incomensurabilidade e a inseparabilidade entre o discurso e o modo de vida filosóficos; a predominância da vida em
detrimento do discurso na filosofia antiga e a noção de exercícios espirituais; a dissociação histórica do discurso
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filosófico com a vida operada pelas transformações do cristianismo e pelo advento das universidades e a persistência,
embora subalterna, da filosofia enquanto maneira de viver na filosofia medieval, moderna e contemporânea. Com
isso, espera-se constatar a característica marcadamente formativa que os filósofos da Antiguidade possuem, bem
como a permanência posterior desse caráter. Por conseguinte, tendo constatado esse caráter formativo na filosofia,
a presente comunicação também pretende oferecer um esforço intelectivo a partir do qual se pensa o conceito
hadoniano de exercícios espirituais, que se dá a partir da dimensão da vida na atividade filosófica, para ensino de
filosofia no escopo de uma educação plural e democrática. Como pensar o currículo de filosofia? Como não tornar a
filosofia serva da religião ou da ciência? Como não oferecer uma filosofia dandista? Qual as consequências para o
ensino de filosofia ao ser perpassado por um ideal a ser produzido mediante sua intrínseca pluralidade?
Podemos aprender a prestar atenção?
Danilo Ulhano Patutti (Mestrando FEUSP)
Segundo Epicteto de Hierápolis, filósofo estoico do primeiro século da Era Comum, a capacidade de atenção
necessita ser educada, pois aprender a controlá-la e a desenvolvê-la é condição sine qua non para conhecer-se a si
mesmo. Joseph Jacotot, no século XIX, define a inteligência humana como um ato de atenção. Aprender os
movimentos da mão que faz uma estátua, perceber as relações sintáticas de uma frase, ou ainda, acompanhar o lavrar
da terra; a tudo isso se nomeia obra humana e em tudo isso está presente a mesma inteligência humana,
essencialmente, como esforço de atenção. Atualmente, os filósofos Christoph Türcke e ByungChul Han tecem críticas
ao modo de vida contemporâneo, pois ele contribui para a fragmentação da capacidade de prestar atenção. A cultura
do déficit de atenção significa o término dos rituais, a morte dos ritos habituais vividos individual e socialmente a fim
de darem sentido à existência. No entanto, a perda teleológica é preterida diante da ausência do cultivo de um esforço
de atenção. As crianças não cantam nem dançam cirandas, mas brincam com computadores e celulares. As pessoas,
passivamente, deixam a sua capacidade de atenção ser conduzida pelos estímulos sensoriais ininterruptos que as
bombardeiam diariamente. A atenção deixada “livre” é dirigida pelos objetos externos e não por si mesmo. A
sobrecarga de estímulos insensibiliza a percepção, implicando na ausência de si. A sensibilidade, ao contrário, só
poderia ser melhorada por meio do desenvolvimento da capacidade de atenção, pois ela faria presente sensações e
processos interiores antes passados despercebidos, aumentando a percepção às nuances.
Estoicismo coach: a instrumentalização da filosofia estoica
na formação do indivíduo neoliberal
José Roberto Nogueira de Sousa Carvalho (Mestrando Filosofia UnB)
A racionalidade neoliberal, entendida conforme o exposto por Pierre Dardot e Christian Laval em “A nova
razão do Mundo”, se mostra como uma nova forma de pensar e agir que corresponde a um novo sujeito de um recente
momento do capitalismo. Tal racionalidade é típica de um novo modo de se experienciar a realidade, a partir de um
ultraindividualismo pautado no fim da solidariedade e coesão social, tal como na concorrência como fundamento de
todas as coisas. Nesse sentido, os sujeitos são vistos como “homens-empresa”, uma espécie de “chefes de si mesmos”
que consideram todas ações em suas vidas como investimentos. É neste contexto de reprodução da racionalidade
neoliberal que as obras de autoajuda ganharam proeminência, muitas vezes figurando entre as mais vendidas,
demonstrando, portanto, a sua força discursiva. A filosofia, por sua vez, em especial a filosofia antiga, foi
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instrumentalizada tendo em vista objetivos políticos diversas vezes na história, de modo que, na era neoliberal um
caso marcante é o das obras estoicas. Observa-se, portanto, que diversos livros foram publicados, desde inúmeras
edições de textos do “estoicismo imperial” (as obras clássicas de Sêneca, Epicteto e Marco Aurélio) até coletâneas de
trechos e fragmentos que como um todo se pretendem como “manuais para a vida” (como os textos de Ward
Farnsworth; Jonas Salzgeber; Ryan Holiday e Stephen Hanselman; Frances e Henry Hazlitt). É observando tais obras
que se percebe que, elas incorrem no clichê que Keimpe Algra denuncia existir: a redução das preocupações do
estoicismo tardio à ética. É evidente, portanto, que o estoicismo usado na formação de indivíduos neoliberais é um
saber sanitizado de sua lógica e de sua física, atendendo, ainda que inconscientemente, à docilização dos indivíduos
por meio de uma espécie de seleções de texto que instrumentalizam um saber filosófico como autoajuda em favor da
racionalidade neoliberal.
Segunda 06/06
17h-19h
MESA 2
meet.google.com/hew-tkyc-pft
Coordenação: Armando Lima
Platão e sua tradição literária: breves apontamentos sobre
a interpretação da helenista Andrea Nightingale
Armando Silva Lima (Mestrando FEUSP)
A presente comunicação tem como objetivo realizar uma breve resenha crítica acerca de um trabalho de
autoria da helenista Andrea Nightingale intitulado “Genres in Dialogue: Plato and the Construct of Philosophy”
[“Gêneros em Diálogo: Platão e a Construção da Filosofia”], obra publicada em 1995 pela editora Cambridge University
Press. Nesse livro, em termos gerais, o leitor se defronta com um “método interpretativo” que nas últimas décadas
vem ganhando espaço nos estudos platônicos, cuja hipótese central fundamenta-se em interpretar o “conteúdo”
filosófico presente nos diálogos de Platão a partir de elementos poéticos e retóricos constituídos na “forma” como o
texto se manifesta redigido. Sob esse ângulo, Nightingale observa que os escritos platônicos gozam de uma
significativa carga de intertextualidades em relação a outros gêneros literários da paideia grega, tornando-se,
portanto, textos cujo caráter é “intergenérico”. Nesse sentido, dentre tantas conclusões suscitadas na obra da
helenista, uma em especial reside em atentar que o mestre da Academia – ainda que seja conhecido por ser um
hermeneuta ferrenho de diversas categorias literárias tradicionais – não deixa de adotar, em benefício de sua prosa
filosófica, os expedientes discursivos provenientes de poetas (épicos, trágicos, cômicos) e de prosadores (sofistas,
logógrafos). Assim, ao optar por essa linha intertextual, Nightingale demonstra que Platão se relacionava de modo
atento com sua tradição, uma vez que o filósofo se apropriava dos demais gêneros disponíveis na Atenas do século IV
a.C. não apenas visando à questão estilística de sua escritura (por puro e simples embelezamento), mas, também,
porque necessitava elevar a “filosofia” à condição de discurso de autoridade, o qual poderia ser apto – assim como
outros gêneros – a exercer uma função paidêutica na cidade.
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O problema da (a)temporalidade no caos pré-cósmico no Timeu de Platão:
as leituras antitéticas de Gregory Vlastos e Leonardo Tarán
Yasmin Tamara Jucksch (Doutoranda Filosofia USP)
Na cosmogonia do diálogo Timeu de Platão, o protagonista homônimo descreve um estado caótico
pretensamente anterior à formação do universo, no qual haveria uma condição primitiva da matéria em que o ser
(on), o devir (genesis) e o lugar (khóra) ainda não haviam sido combinados por uma causa inteligente (o Demiurgo
divino). Nesse estado, haveria já uma incipiente diferenciação entre elementos materiais e também certos
movimentos mecânicos elementares. Em seguida, na descrição da passagem do caos ao cosmos, Timeu afirma que o
universo e o tempo teriam sido gerados juntos. No entanto, apesar dessa afirmativa cabal, a referência a eventos que
ocorreram “antes” do tempo, isto é, no estado de caos pré-cósmico, mostra uma patente contradição na narrativa:
como seriam possíveis os movimentos desordenados da protomatéria sem uma correspondente passagem temporal,
indispensável a qualquer movimento? Gregory Vlastos (1939, 1964) ofereceu uma solução interpretativa que
permitiria conceber o caos literalmente e solucionar essa contradição. Vlastos busca mostrar que há um estado
temporal incipiente que preexiste ao tempo organizado, que seria próprio da genesis ilimitada ainda não organizada
pelo Demiurgo, uma “vaga sucessão temporal” sem movimento periódico para marcá-lo. De outro lado, Leonardo
Tarán (1966) critica a leitura literalista de Vlastos argumentando que, uma vez que Platão afirma categoricamente que
o universo e o tempo foram criados juntos – e que, portanto, não havia tempo antes de o universo existir – então nem
o universo nem o tempo foram criados, isto é, não têm início nem fim. Para Tarán, o fato de Platão não ter distinguido
o tempo cósmico de um tempo pré-cósmico mostra que para ele, assim como para Aristóteles, o cosmos não teve
início no tempo. Nossa comunicação objetiva apresentar essas duas posições distintas como emblemáticas da
polêmica entre literalistas e não literalistas na interpretação do Timeu, buscando mostrar o embate na perspectiva da
discussão sobre o problema do mal: enquanto que para literalistas como Vlastos, o mal no universo, para Platão, é o
movimento desordenado da matéria, para os defensores da interpretação contrária a desordem caótica só existe na
narrativa como uma experiência de pensamento e não como uma indicação literal de um fonte ontologicamente
positiva de males.
O ensino da virtude política no Protágoras de Platão
Marcos Tadeu Neira Miranda (Doutorando Filosofia USP)
O Protágoras de Platão apresenta Sócrates e Protágoras divergindo quanto à possibilidade do ensino da
virtude. Enquanto o sofista declara ensinar “a boa deliberação” (318e5) tanto no que se refere aos afazeres domésticos
quanto no que se refere aos assuntos da cidade, algo que Sócrates denominará – com o assentimento de Protágoras
– “técnica política” (319a4), o filósofo desconfia que esse “artifício” não é ensinável. São duas as razões que sustentam
tal opinião: (1) os Atenienses, considerados sábios, não pensam que os assuntos da polis (políticos) são passíveis de
serem tratados como são os assuntos para os quais há um conhecimento específico, isto é, os assuntos técnicos: a
política não seria, portanto, assunto técnico, restrito aos especialistas; (2) no âmbito particular, os mais sábios dos
atenienses não são capazes de transmitir a virtude que possuem, provando indiretamente que a virtude não é
ensinável. Como resposta, Protágoras elabora uma tese abrangente da educação política nas cidades. Em linhas gerais,
a tese protagoreana consiste na justificação da opinião política dos atenienses, mas reformulando-a para que se
abrigue a noção de uma técnica política sui generis: uma técnica que não é restrita a poucos, mas é dispensada a
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todos. Ademais, Protágoras sustenta o argumento da universalidade da partilha da técnica política por intermédio de
uma concepção político-educacional “imanente”; isto é, a cidade como um todo educa os cidadãos e transmite-lhes a
virtude política. Nessa comunicação, desenvolve-se o contexto argumentativo dessas passagens, com vistas a discernir
o núcleo da discordância entre Sócrates e Protágoras, que, argumenta-se, consistiria nas concepções de técnica
política e de virtude: enquanto Protágoras propõe uma noção de técnica política e de virtude consoante aos valores
estabelecidos, Sócrates, por outro lado, delineia os impasses decorrentes de tal concepção.
A paideia platônica em Dáfnis e Cloé de Longo
Beatriz Saar Leite (Mestranda PPGLM-UFRJ)
A ideia de que a literatura tem uma influência na obra platônica parece clara e um consenso entre os
estudiosos, visto as inúmeras referências que Platão realiza à poesia épica nas figuras de Homero e Hesíodo. Mas
pouco parece ter sido dito a respeito da influência que Platão poderia ter exercido na literatura posterior. Visando
lidar com esse obscurecimento, esta apresentação tem como objetivo, em primeiro lugar, identificar e analisar a
possível existência de elementos platônicos no romance Dáfnis e Cloé de Longo, ressaltando especialmente a
influência da paideia platônica nesta obra. Para depois, em segundo lugar, demonstrar de que modo Platão, ao exercer
uma clara influência na literatura posterior, deixou atrás de si não somente o já reconhecido legado filosófico, mas
contribuiu substancialmente para o desenvolvimento da atividade literária, efetuando uma síntese complexa entre
filosofia e literatura, ao mesmo tempo em que nos leva a questionar a suposta rigidez inflexível que as distinguem. O
método de leitura se justifica, pois a questão que une tanto Platão quanto Longo, é a ideia de uma educação (paideia)
através da mímesis. Ora, sabe-se que a sōphrosynē é o objetivo primário da educação e é adquirido na infância por
meio da mímesis de histórias bem contadas, histórias que são, elas mesmas, produto da mímesis do tipo de coisa certa
(República II-III). E este parece ser justamente o aprendizado das personagens Dáfnis e Cloé. Longo não é filósofo, e
Dáfnis e Cloé não é exatamente uma obra de ficção filosófica. Mas, de uma forma inusitada, Longo não é apenas um
grego culto do segundo século; ele também é um leitor de, entre muitas obras de ficção poética, as ficções em prosa
de Platão. Assim, o autor leu Platão como uma fonte para suas ideias educacionais, e ao menos uma camada do
romance parece comportar-se como uma adaptação habilidosa dessa leitura. Apresentar como tal recepção ocorre
será o foco desta exposição.
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Terça 07/06
17h-19h
MESA 3
meet.google.com/vjz-dwsm-yhf
Coordenação: Bruno Drumond
Do presente ao passado: o público e a construção de significado da Ilíada
Gabriela Canazart (Doutoranda DLCV-USP)
Desde o trabalho seminal de Milman Parry e Albert Lord, os poemas homéricos são entendidos como
composições orais, construídos na performance. Mesmo assim, o narrador da Odisseia nunca alude a seu receptor e
o da Ilíada apenas se refere a ele, de modo evidente, quando usa a expressão “mortais de hoje” (Il. 5. 303-4; 12. 38183, 447- 49 e 20. 286-87). Isso ocorre em uma cena típica na qual uma pedra é usada como arma e o herói que a utiliza
é o vencedor, e o atacado por ela, o perdedor. Nessas cenas, a força do herói vitorioso é comparada à força dos
membros da audiência. Mais do que um simples recurso narrativo e poético, a expressão demanda a interação do
receptor com aquilo que está sendo narrado. Sem a imaginação do público, requerida enfaticamente por meio do
desenvolvimento da cena, o mundo da história empobrece, já que a medida de força utilizada pelo aedo é a do
receptor. Esse tipo de troca entre aedo e audiência só é possível na performance, momento no qual o passado é
transformado em uma experiência no presente. Em minha apresentação, pretendo discutir como a interação do
público é essencial para a construção de sentido nas cenas em que a expressão “mortais de hoje” aparece e como o
aedo interage com o receptor por meio dessas cenas. Argumentarei que o performer, através de alguns recursos como
a mudança nas direções referenciais de algumas fórmulas e o uso do optativo na 2ª pessoa, alerta seus ouvintes para
a necessidade de prestar atenção redobrada à cena em questão antes de se referir diretamente a eles.
Respeto y virtud en el universo hesiódico. Las marcas de la enseñanza
Maria Cecilia Colombani (Universidad de Morón/Universidad Nacional de Mar del Plata)
El proyecto de la presente exposición consiste en abordar la noción de respeto como soporte de la legalidad
cósmica en Hesíodo. Nos proponemos relevar ciertos tópicos fundamentales cuyo respeto garantizan la
sustentabilidad del orden tanto social como cósmico. Entendemos por respeto el reconocimiento de un determinado
valor como legitimador del orden. Respetar significa, desde nuestro marco interpretativo, reconocer distintos
estatutos de ser y de obrar como modo de fundar un topos de convivialidad que no amenace la armonía cósmicosocial. La tarea de fundación de un plano social y político como el que diagrama Hesíodo a partir de su intención
didáctica y de las advertencias a su hermano como excusa de un mensaje dirigido a los mortales en su conjunto, implica
un mapa de respeto por ciertos valores que suponen, a su vez, un marco de subordinación voluntaria y sensata,
transido por la sophrosyne como valor dominante. Hesíodo juega, a nuestro entender, con un diagrama dual, de
fuerzas en tensión, entre lo que conviene al orden social y cósmico y lo que no. Se trata de un esquema binarizante
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que da cuenta de un juego de normatividad que permite la cohesión de la aldea a partir deldiagnóstico de la situación
que el poeta ha efectuado en el mito de las edades. La única posibilidad de salida del panorama aterrador que la quinta
raza devuelve, si es posible aún una recuperación, es, a nuestro criterio, el respeto, en tanto reconocimiento del status
que ostentan ciertos valores claves de la dinámica cósmica y social.
Tales de Mileto: o pai da filosofia e as águas do λóγος
Omar Moisés Rossáinz Rodríguez (Graduado Letras Clássicas UNAM)
Quando e onde na antiguidade a poesia épica atravessou as águas do λόγος para se tornar filosofia? O leme
deste barco deve ir definitivamente na direcção da Grécia antiga. Nessa altura, a filosofia não estava claramente
separada da religião ou daquilo a que agora chamamos "ciência". Claro que a especulação mítica é mais antiga do que
a especulação filosófica; mas não é menos certo que os dois campos seguiram caminhos paralelos durante séculos e
que não houve de forma alguma uma substituição puramente radical de um pelo outro. Nos tempos gregos antigos,
os mitos não tinham as características negativas com que mais tarde foram marcados e que turvaram a compreensão
da filosofia incipiente. A divisão entre o mito e a razão é algo que começou a ser refutado na escola de Mileto. E nessa
terra vislumbrou aquele que poderia ser considerado o filósofo mais antigo: Tales de Mileto, onde a água era a causa
que dirigia o caminho do seu pensamento. A ciência grega foi o resultado de um humanismo rico e ofereceu pela
primeira vez na história a tentativa de dar uma interpretação puramente naturalista do mundo: uma explicação e
justificação racional da natureza como um todo, sem recorrer ao sobre-humano no homem. Tales, Anaximandro e
Anaximenes da cidade de Mileto na costa ocidental da Ásia Menor foram os primeiros filósofos cujas respostas
manifestaram uma abordagem verdadeiramente racional. Questionavam-se sobre a essência subjacente a todos os
fenómenos, sobre a natureza dos quais todas as manifestações da realidade eram feitas. Neste trabalho vamos discutir
o pioneiro do pensamento racional e como as suas ideias foram fundamentais para substituir gradualmente as
explicações mitológicas para dar lugar a uma forma mais racional de pensar, ele não foi apenas um replicador de ideias
do Oriente, mas um verdadeiro filósofo que soube unir o mitológico com o racional.
As instruções da deusa e o aprendizado do mortal no poema de Parmênides
Viviane Veloso Pereira Rodegheri (Doutoranda Filosofia UFRJ)
Quando a deusa frisara a necessidade de o mortal instruir-se sobre tudo (χρεὼ δέ σε πάντα πυθέσθαι), ela
não estava se referindo apenas àquilo que é, cujo caráter é inabalável e todo inviolado; ela também o enalteceu em
relação às opiniões dos mortais (βροτῶν δόξας), vinculadas a em um estatuto que estaria, a princípio, apartado da
verdade (DK 28 B 1, 28-32). No entanto, faz-se mister sublinhar ainda que a deidade ordenou ao mortal que este último
se capacitasse a discernir sua controversa tese [κρῖναι δὲ λόγωι πολύδηριν ἔλεγχον ἐξ ἐμέθεν ῥηθέντα (DK 28 B 7, 5)];
mais adiante, ela destacou outrossim que o seu próprio arrazoamento seria dotado de uma ordem enganadora
[κόσμον... ἀπατηλὸν (DK 28 B 8, 52)]. Quais são os escopos da deusa ao proferir seu discurso nestes termos? Tendo
em vista que se tratava de uma autoridade divina provavelmente a par do que é verdadeiro ou não, por que ela teria
optado por se exprimir através de vocábulos que geraram tanta controvérsia entre os doxógrafos especialistas? A
hipótese que será aventada no presente trabalho é a de que a deusa estava desempenhando um papel pedagógico no
interior do poema, instruindo o mortal não apenas sobre o que ele deveria aprender acerca da realidade mas,
sobretudo, instruindo-o sobre o próprio discurso que ela veiculava, motivo pelo qual sua linguagem não poderia ser
assaz patente. O apelo da deusa é tão radical no sentido de estimular o mortal à busca pela verdade que nem mesmo
as palavras que ela emitiu estariam isentas desta busca. E tal investigação, conforme pretende-se explicitar, demanda
um questionamento apurado do mortal, resultando em sua postura crítica perante os dilemas e as vicissitudes que
arrosta ao longo de sua jornada.
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Terça 07/06
17h-19h
MESA 4
meet.google.com/hew-tkyc-pft
Coordenação Samira Cerqueira
Paródia e efeito cômico na recepção de Homero
nos Diálogos dos Deuses, de Luciano de Samósata
Ítalo Durdson Xavier de Oliveira (Graduando Letras Clássicas UFPB)
Este trabalho objetiva analisar como se configuram os conceitos de paródia e efeito cômico no texto Diálogo
dos Deuses, de Luciano de Samósata, demonstrando, ao mesmo tempo, como a obra homérica é recebida por ele.
Para tanto, partiu-se de alguns textos teóricos para a definição tanto da paródia quanto do efeito cômico. A partir de
Genette (2010), a paródia é uma prática transtextual que transforma o registro épico, sério, em um registro mais
familiar ou até mesmo vulgar. Nesse sentido, atribui-se quase sempre a esse registro vulgar a ideia do cômico. De fato,
são elementos quase inseparáveis, mas deve-se observar que, enquanto o primeiro depende de um texto original do
qual deriva, o outro, o cômico, resulta de técnicas que produzem tal efeito. Assim, a partir do tratado anônimo acerca
da comédia (Tratactus Coislinianus), analisar-se-ão as técnicas empregadas por Luciano em sua paródia cômica dos
textos homéricos. Dessa forma, pretende-se, nesta comunicação, analisar não só como Luciano, no diálogo Hermes e
Apolo, na obra Diálogos dos Deuses, parodia o texto homérico, mais especificamente o episódio dos amores entre
Ares e Afrodite (Odisseia, VIII), mas também a forma como o autor produz o efeito cômico em seu texto, recorrendo
a algumas técnicas aventadas pelo tratado anônimo. Para isso, o aspecto do caráter das personagens, o fio narrativo
e o léxico empregado serão de grande relevância em nossa abordagem, para que tanto a paródia quanto o efeito
cômico possam ser observados no corpus selecionado que compõe esta comunicação.
O clássico parodiado nos Diálogos dos Deuses Marinhos,
de Luciano de Samósata
Américo Carlos da Rocha Jr. (Graduando Letras Clássicas UFPB)
Desde Homero, a comicidade é um expediente narrativo recorrente nos diversos gêneros da literatura grega
antiga. A presença, na poesia épica, tanto de elementos trágicos quanto de cômicos nos permite traçar paralelos com
obras posteriores que floresceram neste terreno fértil preparado por Homero já no séc. VIII a. C. A paródia é um desses
elementos que estabelece estes paralelos. Segundo Genette (2010, pp. 28-29), a paródia, ainda que tenha muitas
subclassificações, pode ser definida, de modo geral, como a transposição cômica de um gênero sério. Partindo dessa
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definição, é possível traçar as relações entre uma obra e sua versão parodiada. Nesse sentido, parte ou, pelo menos,
trechos da obra de Luciano podem ser considerados paródias de passagens “sérias” homéricas. Assim, o segundo
diálogo dos Diálogos dos Deuses Marinhos, de Luciano de Samósata, do séc. II d.C. pode ser considerado uma paródia
de um episódio da Odisseia, de Homero. O diálogo Ciclope e Posêidon narra as consequências imediatas após o
episódio na ilha dos Ciclopes (canto IX da Odisseia) na qual ocorre o famoso encontro entre Odisseu e Polifemo.
Luciano, ao contrário do que se vê na Odisseia, dá voz a Polifemo, que, cegado e ofendido pelo herói, narra os
acontecimentos à sua maneira. As mudanças de um texto para o outro aqui são sutis, mas os traços de um Polifemo
homérico reverberam na paródia de Luciano, permitindo a identificação, a partir dessas semelhanças e também
diferenças, da paródia e de seu efeito cômico. Com isso, tentar-se-á demonstrar os elementos da recepção paródica
e dos efeitos cômicos neste diálogo em confronto com a passagem homérica.
Uma odisseia contemporânea: A releitura da ilha de Polifemo em Percy Jackson
Marcella Teixeira da Costa Alcântara (Graduanda História UFRJ)
O que a jornada de um herói homérico tem em comum com a de um herói contemporâneo? E quais as suas
diferenças? A presente apresentação busca respostas para essa pergunta. A partir dos princípios teóricometodológicos da Estética da Recepção e da Análise de Discurso Francesa, propomos evidenciar a obra Mar de
Monstros, da série Percy Jackson e Os Olimpianos, escrita por Rick Riordan, como uma releitura da Odisseia de
Homero, mais especificamente do canto IX do poema, no qual se dá o encontro do protagonista com o ciclope
Polifemo. Por “recepção” entende-se a maneira pela qual os documentos greco-romanos foram transmitidos,
traduzidos, fragmentados, interpretados, reescritos, repensados e representados, buscando-se, através disso, renovar
os estudos clássicos, trazendo à tona aspectos que foram ignorados, marginalizados ou negligenciados. No que diz
respeito a Análise de Discurso, o conceito de interdiscurso é essencial para a presente análise, pois defendemos que
todo texto sempre se referencia a um texto do passado em algum grau, seja contribuindo de forma direta para a sua
origem ou através do processo de criação. A partir dessas perspectivas, constata-se como o autor Rick Riordan
incorpora Homero em toda sua série de 5 livros, mas ainda mantém um enredo original: a do menino Percy Jackson,
um pré-adolescente de 12 anos que, de repente, descobre-se semideus, filho de Poseidon. No livro Mar de Monstros,
que escolhemos ter por foco, pode ser vista uma reinterpretação da Odisseia, uma vez que Percy, junto com seus
amigos e seu meio-irmão ciclope, refazem os passos de Odisseu em sua volta para casa, temática da obra em que se
faz protagonista. Dessa forma, é possível perceber como uma releitura contemporânea atualizou um clássico,
possibilitando que a Odisseia alcance um público mais jovem e atual.
A Arquitetura do Templo de Hera em Agrigento segundo Hans Riemann
Claudio Walter Gomez Duarte (Unimes)
Esta comunicação tem por objetivo propor uma pesquisa, e se utiliza da análise do templo de Hera para
exemplificar a proposta. A pesquisa pretende trazer a público uma tese originalmente escrita em alemão e defendida
em 1934 pelo arqueólogo Hans Riemann. O assunto é a arquitetura dos templos gregos, mais precisamente: “Sobre o
templo períptero grego – a sua concepção de planta e seu desenvolvimento até o final do século V”. Por se tratar de
uma obra de referência, pretendemos levar esta proposta a entidades de fomento à pesquisa, bem como, a órgãos de
cultura que possam vir se interessar pelo tema. Em poucas palavras a pesquisa pretende: coletar dados biográficos
sobre o autor, traduzir o texto para o português, comentar todas as análises apresentadas por Hans Riemann em seu
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texto e ilustrar a obra com desenhos de arquitetura, pois vale observar que o texto não traz nenhuma ilustração.
Algumas palavras sobre o Templo de Hera-Lacínia, Agrigento, ca. 455 a.C. Agrigento está situada na costa centro sul
da Sicília, Itália. Foi fundada por Gela e Rhodes em 580 a.C. e destruída mais tarde pelos Cartagineses em 405 a.C.
Embora chamado de templo de Hera-Lacínia, a divindade à qual foi dedicado é ainda desconhecida e por isso é
arbitrariamente denominado como Templo D. Não há vestígios da base de uma imagem de culto para este templo, e
nem as fontes históricas e nem os achados arqueológicos forneceram pistas sobre a sua divindade cultuada. Trata-se
de um templo dórico de 6x13 colunas, com a planta organizada em pronaos, cela sem colunata interna e opistódomo.
Sua crepidoma possuí 4 degraus em vez de 3, e sua planta foi concebida pelo ajuste simétrico da cela dentro da
colunata.
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Quarta 08/06
17h-19h
MESA 5
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Coordenação: Armando Lima
Por uma História da Recepção: releituras de Tucídides nas Relações Internacionais
Bruna Moraes da Silva (Doutora UFRGS)
A presente comunicação tem por proposta evidenciar a importância dos estudos da recepção para as análises
históricas sobre a antiguidade. Para isso, delineia-se como objeto de investigação as releituras feitas da obra de
Tucídides, A História da Guerra do Peloponeso, pelas Relações Internacionais. Dando-se destaque às interações
linguísticas, textuais e ideológicas neste processo de interpretação do antigo, une-se as prerrogativas da Estética da
Recepção aos postulados da Análise de Discurso – através do uso, especialmente, das noções de interdiscurso e
arquitexto – a fim de se verificar como e por que o texto tucidideano foi interpretado e repensado em nossa
contemporaneidade. Por meio de um conceito específico, o de Thucydides Trap (“Armadilha de Tucídides”) – cunhado
por um cientista político e amplamente utilizado nas Relações Internacionais – notabiliza-se a força da intervenção
política de um texto clássico nos dias atuais, sobretudo em contextos de crise e conflito, realizando-se, até mesmo,
uma apropriação desse clássico a fim de sancionar-se ideias e/ou práticas. Diante disso, busca-se ir de encontro a ideia
de que a História Antiga estaria conectada a um esgotamento de fontes e de suas análises, pondo-se em pauta a
necessidade de um esforço coletivo por parte dos antiquistas para se salientar como toda história, mesmo a mais
remota que seja, está sujeita a uma multiplicidade de interpretações, demonstrando-se a dinamicidade da
documentação, e a possibilidade de propormos histórias alternativas as já estabelecidas.
A guerra civil (stasis) na Grécia Clássica: entre a atimia e a anistia
José Eduardo Pimentel Filho (Instituto Federal do Paraná)
A Guerra Civil (stasis) não é um fenômeno desprezível para aqueles que pesquisam a vida e o pensamento dos
gregos clássicos. Ela aparece em inúmeras passagens de filósofos, artistas e historiadores dos séculos V à III a.C. O
próprio Platão dedicou muitas páginas da República e das Leis pensando em como construir uma utopia que fosse
imune a ela, onde a paz e o consenso seriam fortes o suficiente para evitar as violências que o filósofo, provavelmente,
testemunhara nas ruas de Atenas durante a Tirania dos Trinta e sua respectiva resistência. Porém, bem mais realista
do que Platão, Sólon (o legislador) compreendeu que se na vida democrática a stasis não podia ser evitada, seria então
necessário e racional legislar sobre ela. E parte desta legislação é encontrada na Constituição de Atenas (Capítulo 8, 45), na qual Aristóteles nos informa: “vendo que a cidade era constantemente atravessada por conflitos internos, mas
que alguns cidadãos por negligência preferiam deixar o acaso decidir quem sairia vitorioso, então ele [Sólon] instituiu
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uma lei especifica quanto a isso: aquele que em um conflito deflagrado na cidade não tomar armas por algum dos
partidos, será condenado à atimia (infâmia) e não fará parte da cidade”. Sendo a atimia entendida como um
“ostracismo” que não expulsa da pólis ou uma prisão domiciliar, podemos compreendê-la como uma verdadeira
oikonomia da punição. E se a atimia foi pensada para punir os que não tomavam partido na stasis, no sentido oposto
estão os que dela participaram; para esses a lei ateniense também propôs um instrumento: a anistia. O perdão que
os combatentes receberiam posteriormente pelos malefícios, pelos excessos e pelos traumas causados aos seus
concidadãos durante a guerra civil. O filósofo italiano Agamben (in Stasis, 2018) aponta que a anistia só serviria de
fato como um instrumento de superação se fosse encarado como um esquecimento, não dos fatos, mas do rancor e
do ressentimento (mnesíkakos) forjados durante a stasis. A proposta desta comunicação vai no sentido de entender
como a stasis pôde, no mundo grego, ser balizada por “dois interditos, perfeitamente coerentes entre si: por um lado,
não tomar parte dela é politicamente recriminável, e por outro, esquecê-la quando terminada é um dever político”
(AGAMBEN, idem).
Identidades Culturais, conexões e práticas produtivas na África romana:
os garamantes na História Natural de Plínio, o velho.
Willams Clark Gonçalves de Araújo (Graduação História UFRPE)
No quadro geral da historiografia sobre a Antiguidade, as representações da África romana tendem a gerar
interpretações essencializadas e homogêneas. Nesse sentido, o presente trabalho analisa tanto as representações das
comunidades locais da África romana produzidas pela tradição literária latina – reproduzidas pela historiografia sobre
essa região na antiguidade –, cuja tendência apresenta essas comunidades de forma reificada, cristalizando
identidades e ignorando sua historicidade, como também a documentação arqueológica que oferece um quadro
distinto da atividade dessas comunidades no interior do Norte da África, em particular, dos Garamantes. Tendo como
principal fonte o quinto volume da História Natural de Plínio, o Velho (I d.C.), dedicado à descrição da África, e
apoiando-se nos relatórios arqueológicos das escavações realizadas na África subsaariana, especificamente na região
do Fezã – antigo território Garamante –, bem como nas contribuições de estudos acerca das identidades, das
etnografias romanas e das conexões no Mediterrâneo antigo, o trabalho propõe uma análise comparativa entre as
representações produzidas pelas obras literárias latinas e os dados provenientes das escavações; contrapondo, desta
forma, o uso sócio específico do discurso em seu contexto de produção a uma reconstrução do quadro geral da
sociedade Garamante, suas práticas produtivas e atividades comerciais. Considerando os esforços para aumentar a
presença da História da África como um conteúdo importante do Ensino de História no Ensino Básico, problematizar
como esta aparece no contexto do ensino da História Romana e desenvolver instrumentos conceituais para criticar
visões essencializadas e baseadas em paradigmas civilizatórios dessa região pode contribuir não só para a
compreensão da diversidade étnica, mas também para uma ampliação do enquadramento dessa África antiga no
ensino escolar, problematizando a ideia de ausência de conexões antigas entre Mediterrâneo a África subsaariana.
Tragédia grega: paideía e relações de gênero
Matheus Barros da Silva (Doutorando História UFRGS)
A tragédia grega se configura como uma instituição da pólis ateniense entre o final do século. Desenvolvendose ao longo do século V, e encontrando seu ocaso no final dessa mesma centúria. A tragédia e o teatro clássicos
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mobilizam ideias, valores, visões sociais de mundo, ideários etc, que constituem o contexto intelectual no qual o
próprio espetáculo trágico está inserido. Trabalha-se com a visão de que à tragédia, dentre suas funções, está aquela
de educar os cidadãos. A tragédia problematiza a própria pólis, suas estruturas culturais, sociais e políticas. No
pensamento grego e na praxis social se verifica um corte entre o masculino e o feminino. De Hesíodo aos trágicos (não
só), homens e mulheres, ou melhor, aquilo que se compreende por uma ontologia masculina e feminina, aparecem
de forma cindida, ainda que complementares. A comunicação pretende analisar a tragedia Medéia de Eurípides (431),
a partir de um olhar focalizado na paideía dos cidadãos e sua ligação com as relações de gênero no contexto políade.
A tragédia Medéia apresenta o drama de uma mulher, que fora desposada por Jasão, mas já no começo das obras se
encontra rejeitada, pois Jasão contraiu novas núpcias. Medéia, juntamente com o Coro de mulheres coríntias,
lamentam a condição feminina, de dominação diante do masculino. O drama em questão avança com Medeia
buscando vingança, que se concretiza no assassinato dos filhos que teve com Jasão, da nova esposa, de seu ex-esposo
e também de Creon, atual sogro de Jasão. Medéia mata, mas antes lamenta ter sido ultrajada naquilo que é mais caro
à mulher, sua família, seu leito, sua condição de esposa. Alijada disso e ferida no orgulho, nada faz sentido. Assim,
proponho pensar que ao apresentar a condição feminina na pólis, Eurípides permite refletir sobre as formas que se
constituem as relações entre homem e mulher no contexto políade, uma vez que tanto a condição feminina como a
masculina se implicam e se constituem por afirmações e negações recíprocas.
Quarta 08/06
17h-19h
MESA 6
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Coordenação: Samira Cerqueira
"Sem método, sem livros, sem gramática, sem regras, sem chicote e sem lágrimas".
Como Montaigne disse ter aprendido o latim.
Elaine Cristine Sartorelli (DLCV-FFLCH)
Esta comunicação partirá do Ensaio 26 do livro I, Da educação das crianças, para comentar a alegação feita
por Montaigne de que aprendeu o latim como primeira língua, de forma que, aos seis anos de idade, desconhecia
completamente o francês e o dialeto local, sendo, porém, absolutamente fluente em latim. Tentando compreender o
que essa confissão pode ter de verídica, ou, por outro lado, de exagero ou mistificação deliberada e significativa,
depreenderemos, de suas afirmações, a pedagogia proposta autor francês. E demonstraremos que a sua didática sem
castigos físicos e sem os rigores dos tecnicismos gramaticais é, ao mesmo tempo, sua declaração de adesão a uma
corrente literária. Naquele momento em que a chamada controvérsia ciceroniana, a mais importante polêmica
literária do século XVI, dividia o mundo letrado em duas grandes vertentes, tendo por eixo a língua latina, Montaigne
parece estar sugerindo sua filiação ao lado dos anticiceronianos, ou, mais claramente, ao lado de Erasmo, cujo nome
já não se podia mencionar em segurança. Demonstraremos que é, portanto, a pedagogia pelo prazer de Erasmo, com
suas citações, alusões, paráfrases e aproximações intertextuais, o pano de fundo da educação que Montaigne
apresenta. Quer a didática montaigneana tenha sido de fato aplicada a ele por seu pai excêntrico, quer Montaigne a
tenha concebido como réplica aos detratores de Erasmo, ela sem dúvida representa (e reapresenta, de forma talvez
nostálgica, talvez irônica) um pouco do ideal do humanismo quando este já havia cedido espaço para as guerras
religiosas e a Contra-Reforma, e quando os livros de Erasmo haviam deixado de ser os mais lidos da história do livro
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impresso para constarem no Index da Inquisição.
Res e verba: a dimensão didática do De Copia, de Erasmo de Rotterdam.
José Elias de Sena (Mestrando Letras Clássicas USP)
A partir do século XV, o estudo das figuras de linguagem, prática que teve como um de seus resultados a
nomeação de todo tipo de frase e sentença, difunde-se intensamente no ocidente, refletindo uma ênfase no estilo
discursivo que então se filiava a um renovado interesse pela antiguidade clássica. De fato, no contexto europeu e
cristão, parte do que se conhece hoje por período renascentista e período humanista, esteve ligada a um projeto que
tomava como um de seus fundamentos a estreita observância da forma com que autores clássicos, gregos e latinos,
escreviam. Ao morrer em 1536, Erasmo de Rotterdam deixava como legado uma extensa obra escrita em latim, na
qual notadamente se destaca essa franca disposição em agregar elementos considerados basilares da cultura clássica
ao já milenar pensamento cristão, fato que explica porque o próprio Erasmo de um lado foi nada menos que o editor
renascentista das obras completas de autores caros à Igreja Católica, como Agostinho de Hipona e, de outro, um
público admirador de Homero, Virgílio, Quintiliano e especialmente de Cícero. E é dentro desse vasto corpus latino
erasmiano que encontramos um manual de retórica voltado especificamente para aspectos estilísticos no uso da
língua latina, o qual a princípio havia sido intitulado De duplici copia uerborum ac rerum, em seguida De utraque
uerborum ac rerum copia, para a partir daí ser chamado genérica e popularmente De Copia. O De Copia, portanto,
nasce com o objetivo colimado de ensinar tanto a concisão, quanto a afluência discursiva por meio de mecanismos de
variação, ou seja, disponibilizar ao aluno modos práticos para, entre outros procedimentos, expressar uma mesma
ideia em estilos diferentes, tanto pela via da brevidade, quanto pela via da abundância do discurso. Nesta
apresentação, o De Copia, como nosso trabalho de tradução, será apresentado em seus aspectos gerais e, sobretudo,
no que concerne à sua dimensão didática, como manual de retórica voltado para o ensino escolar.
Vox Clamantis, Livro I: Uma écfrase medieval
Lia Oliveira Lima Serapião (Mestranda DLCV-USP)
Caracterizamos o Livro I do poema Vox Clamantis, composto em dísticos elegíacos por John Gower, poeta
medieval, como texto receptor e reprodutor dos formatos clássicos; não só Gower escreve em latim, mas também as
referências à mitologia, a métrica e a emulação de Ovídio sugerem que o uso da écfrase foi deliberado. A écfrase, para
Jaś Elsner (2002), consiste do uso das palavras para descrever imagens e dar vivacidade ao texto. Para Claire Barbetti
(2011), estuda-se a écfrase de forma sistemática nas literaturas clássica e Renascentista, mas não na medieval,
tornando o tema fértil para pesquisas como esta. A partir da análise do poema, este artigo discute a écfrase e suas
possíveis aplicações, e a demonstração de que as visões oníricas como gênero literário podem ser vistas como imagens
e interpretadas pela ótica da écfrase. São também objetivos definir o conceito de écfrase partindo do diálogo entre
Barbetti (2011), Elsner (2002) e Paulo Martins (2014; 2016); e compreender o seu uso fora da descrição de objetos de
arte. O medievalista Jean-Claude Schmitt (2007) nos leva ao conceito de imagem-objeto ao invés da ideia da arte
medieval como mera representação. Os autores foram escolhidos pelas suas contribuições nas áreas de análise
propostas. Martins dedica-se ao estudo da écfrase, bem como ao conceito da arte na poesia clássica. De maneira
semelhante, Elsner estuda o conceito da écfrase na literatura e suas aplicações na história da arte. O diálogo segue
com o historiador Schmitt, cujos métodos para interpretar a história medieval a partir da cultura imagética contribui
também na história da arte. A medievalista Barbetti, escritora sobre o gênero das visões oníricas, foi basilar para o
desenvolvimento da relação entre o gênero e o estudo da écfrase neste artigo. O resultado é o aprofundamento na
obra de John Gower, inédito no Brasil, e a ampliação do entendimento da écfrase a partir da sua classificação como
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fenômeno presente na literatura medieval.
"Magnânimo eácida, magno César": Estácio e o elogio a Domiciano na Aquileida (séc. I)
Irlan de Sousa Cotrim (Doutorando História UFES)
A Aquileida, poema épico escrito por Estácio entre 95 e 96, tem como tema as façanhas do mítico herói grego
Aquiles desde seu nascimento. Ao analisar a épica estaciana como uma narrativa episódica, Ganiban (2015) apontou
que logo no proêmio da epopeia Estácio atribui a Aquiles o epíteto de magnanimus. De acordo com o Oxford Latin
Dictionary o adjetivo magnanimus referia-se a nobreza de espírito, à coragem, à ousadia e a generosidade daquele
que o portava. Ainda de acordo com o verbete, magnanimus era um epíteto convencionalmente atribuído a monarcas
e heróis. A palavra deriva da junção dos vocábulos magnus e animus que significam, respectivamente, grande, alto ou
ótimo e alma, espírito, princípio distinto do corpo (Cic. Tusc. 1.80; Fin. 5.38; Or. 3.67; 9; 138; GLARE, 1968). O adjetivo
latino magnanimus possui relação com o termo grego megathumos que na Ilíada de Homero foi constantemente
empregado para qualificar os heróis (Il. 20.179-181; 1.135; 6.145; KOZIAK, 2000). Na visão de Ganiban (2015), o termo
magnanimus destacava o estilo elevado condizente com o gênero épico que rememorava o precedente meônio, ou
seja, aos poemas homéricos. De fato, ao voltarmos para os textos latinos em versos podemos observar o uso do epíteto
magnanimus em Catulo para retratar o lendário rei Minos (64.85) “magnanimum ad Minoa venit sedesque superbas”,
Vergílio para caracterizar o herói Enéias (Aen. 1.260) “magnanimum Aenean”, o deus Júpiter (Aen. 12.144)
“magnanimi Iovis” e para adjetivar heróis ao longo da Eneida (6.307; 649) “magnanimum heroum” e “magnanimi
heroes” e Ovídio que nas Metamorfoses utilizou do termo para representar Aquiles (Ov. Met. 13.298) “nec se
magnanimo maledicere sentit Achilli?”. Estácio, porém, utilizou desse epíteto em suas três obras poéticas
sobreviventes para qualificar não somente os seus heróis. Há a presença desse epíteto nas Silvas, na Tebaida e na
própria Aquileida, sendo que o termo nas duas primeiras obras foi o mote dos estudos de Barchiesi (1996). Buscamos
analisar, a partir da prerrogativa que esse autor defendeu em seu estudo, como o termo magnanimus aparece na
Aquileida muito mais do que uma forma de caracterizar um herói, mas também como forma de homenagear
Domiciano, o imperador cuja obra de Estácio foi contemporânea.
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Quinta 09/06
17h-19h
MESA 7
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Coordenação: Daiane Lordeiro
O encontro entre Medeia e Joana: a tragédia euripidiana
revisitada por Chico Buarque e Paulo Pontes
Anne Caroline Santos Nunes (Doutoranda História UFRJ)
A tragédia, feito creditado aos antigos gregos, provocou fascínio e inquietação ao longo da História. As origens
das produções trágicas remontam aos rituais dedicados em honra ao deus Dioniso. De acordo com Aristóteles (Poética,
1449a), a tragédia teria nascido de improvisos, sua origem é proveniente do ditirambo, canto coral em honra a Dioniso.
Embora apresentem origens religiosas, as tragédias assumiram uma função política. Os autores de tragédias
encaminhavam-se a um público de cidadãos, o que nos leva a conjecturar a respeito da associação entre o nascimento
da tragédia e a existência de uma autoridade política que se dirigia ao povo. No contexto aludido, o tragediógrafo
Eurípides produziu, em 431 a.C., Medeia, que se tornara uma das tragédias mais revisitadas do poeta. O que nos chama
atenção é a construção de uma personagem feminina forte, de inteligência ardilosa e habilidosa, obstinada a buscar
justiça através de vingança. Medeia age com coragem e sapiência e a sua força tem por princípio a persuasão, o uso
da palavra e a métis. A métis euripidiana em Medéia constrói-se na capacidade feminina em criar subterfúgios. Isto
posto, Gota d’água, escrita por Chico Buarque e Paulo Fontes em 1975, é um drama que revisita a tragédia Medeia de
Eurípides. A Grécia é transposta para o subúrbio carioca do período ditatorial, e o povo é inserido como principal
protagonista da tragédia moderna em tela. A história tem como cerne o cotidiano e as dificuldades dos moradores da
Vila do Meio Dia que dialogam com o conflito conjugal entre Joana e Jasão. Desse modo, vislumbramos, através da
presente proposta de comunicação, refletir a respeito da releitura, tal como as aproximações entre a tragédia Medéia
e a obra Gota d’Água. As produções trágicas nos permitem pensar sobre a condição feminina e as relações de gênero,
dado que as protagonistas das obras analisadas vivenciam situações em comum: a perda do leito nupcial, o abandono
parental e a humilhação moral.
Errâncias de Medeia na contemporaneidade
Sabrina da Paixão Brésio (Doutoranda FEUSP)
Esta comunicação dedica-se a tecer uma teia das errâncias mitopoéticas de Medeia, princesa da Cólquida, e
como esta persona navega do Mar Negro, mistura-se nos afrolatinos mares mediterrânicos, segue em águas atlânticas,
e vem desembocar em nossa produção dramatúrgica contemporânea, espraiando-se no Rio de Janeiro, em Minas
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Gerais e outros territórios de transição, em que mulheres igualmente errantes e desterradas encarnam em seu corpo
e voz a polifonia do feminino que Medeia ainda representa a nós. Contextualizando brevemente suas origens grecolatinas, nas produções de Píndaro, Eurípedes, Ênio, Ovídio, Sêneca e outros (Gouvêa Junior, 2014), bem como algumas
produções fílmicas do século XX que a elegem como protagonista (Pasolini, 1969; Lars von Trier, 1988), chegaremos à
produção brasileira atual para compreender as camadas mitohermenêuticas que são evocadas por Chico Buarque e
Paulo Pontes (Gota D’ água, 1975), Rudinei Borges (Medea Mina Jeje, 2017); Grace Passô (Mata teu pai, 2017) e Márcia
Limma (Medeia Negra, 2018). Quantas mulheres cabem num nome, em uma postura, numa trajetória? Quantas
errâncias incorporadas nesta figura que é princesa, sacerdotisa, esposa, mãe, exilada, estrangeira, apátrida e, ainda
assim, firme em seus propósitos de re-existir? Dos clássicos ao contemporâneo, o mito-Medeia ressurge carregado
por discursos, intenções e validações acerca das proposições socioculturais de seu tempo-espaço, e das dinâmicas
entre masculino e feminino nas esferas privadas e públicas, mesclando amor, poder, convenção e moral.
"As musas me escolheram por intérprete":
o estar fora de si na poesia de Geraldo Carneiro
Fernanda Castro de Souza Abreu (Mestranda UFMA)
A expressão “estar fora de si”, ou ekstase, tem como significação a perda dos movimentos interiores e, por
consequência, o despojamento para o exterior (COLLOT, 2013, p.222). Presente em textos da tradição antiga, a
fórmula explica o processo de inspiração do aedo o qual, para que ele fosse tomado pelo sopro divino da Musa, era
necessário que antes abdicasse de sua racionalidade, se projetando para o exterior para deixar que a divindade o
tomasse como porta-voz. Tendo por base o texto “O sujeito lírico fora de si”, de Michel Collot, vê-se que o teórico
francês afirma que o movimento de “sair-se de si” também se faz presente na modernidade, não como uma simples
exceção, mas como regra. Evidentemente não são mais consideradas para esse novo momento as condições
transcendentes da expressão, como assim se entendia na Grécia Antiga, para a modernidade a condição de “fora de
si” estabelece relação com o outro, o tempo, o mundo, a linguagem (2013, p. 223). A partir disso, esta pesquisa, de
cunho exploratório quanto aos objetivos e bibliográfica quanto aos procedimentos, se propõe a pensar o que seria o
ekstase, termo tão caro ao mito da inspiração, para a poesia contemporânea de Geraldo Carneiro. Para isso serão
analisados poemas do autor brasileiro presentes na obra Poemas Reunidos (2010) que trazem a figura das Musas,
agora não mais como força numinosa, mas como sinônimo de poesia e do trabalho de composição realizado com a
interseção do Outro, que pode ser entendido como as inspirações em poemas, romances, canções, mitos, formas e
temas de outros autores, de sua temporalidade ou de qualquer outra, nutrindo seu texto de significações externas
que deixam falar, por meio de uma reflexão anacrônica de contato entre os textos, o próprio contemporâneo. Para a
composição principal do aporte teórico serão utilizados, além do já referido ensaio de Michel Collot, os diálogos Íon e
Fedro de Platão e o As artes do entusiasmo, coletânea de textos sobre o Entusiasmo e a Inspiração Criadora, organizada
por Fernando Muniz.
O mito de Sísifo na mitologia e na obra de Albert Camus e seus aspectos formativos
Daiane de Almeida Lordeiro (Graduanda FEUSP)
Em O Mito de Sísifo, Albert Camus empreende uma leitura trágica do mito em questão, herdado do mundo
antigo. Para o autor, o destino do personagem só é tomado por um caráter trágico a partir do momento em que ele
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toma consciência de sua condição extenuante. A partir desse instante de lucidez, mesmo que breve, será difícil
retornar aos seus grilhões da mesma maneira, afinal, começar a pensar é começar a ser atormentado. Sísifo é,
portanto, o trabalhador inútil dos infernos. Seu dever consiste em rolar incessantemente montanha acima um enorme
penedo para, logo após, vê-lo despencar montanha abaixo, indicando o eterno retorno à essa tarefa ciclicamente
renovada. Não é incomum ouvir alegorias entre o trabalho de Sísifo e a tarefa docente, afinal, a educação também é
um processo ciclicamente renovado, pois o objeto sobre o qual ela atua se renova constantemente. Por essa razão,
essa tarefa pode se revestir de um caráter também absurdo, uma vez que os resultados desse trabalho são da ordem
do imprevisível, justamente por estar circunscrita ao campo do campo humano que, como tal, é o campo da
plasticidade por excelência.
Quinta 09/06
17h-19h
MESA 8
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Coordenação: Vicente Zatti
Uma teoria sobre a educação a partir da Ética Nicomaqueia de Aristóteles
Juliana Santana (UFT)
Propomos apreciar uma possível teoria sobre a educação pautada na Ética Nicomaqueia. Conforme tal teoria,
educar é levar o homem a alcançar o que ele pode realizar de melhor em sua vida, a felicidade. Esta requer o melhor
desempenho possível das capacidades (dynámeis) da alma humana, especialmente da capacidade racional que ordena
as demais. Portanto, defenderemos a existência de uma teoria educacional na Ética Nicomaqueia, que se mostraria
como uma espécie de desenvolvimento gradual do homem em etapas que concorreriam para a felicidade. Para validar
esta interpretação, partiremos da afirmação que para se tornar virtuoso e feliz é preciso tanto hábito quanto tempo e
ensino. Assim, haveria uma etapa educacional inicial relativa à virtude ética (aretḕ ethikḗ) e outra relativa à virtude
dianoética (aretḕ dianoēthikḗ). Assim, a educação proposta pelo tratado vai da natureza ao hábito e do hábito à razão.
Para provar isso, começaremos a exposição indicando como a educação é importante para a consecução da vida feliz.
Na sequência, indicaremos as etapas que permitirão ao homem seu pleno desenvolvimento para essa vida.
Dedicaremos atenção às questões relativas à habituação e sua necessidade para o desenvolvimento da virtude ética,
até que o homem seja capaz de, com o auxílio de uma razão bem formada, agir por si mesmo, desejar e sentir de modo
adequado e de forma independente. Para tanto, apontaremos como indispensável a etapa da educação ética que
privilegia o intelecto; e, de modo especial, o intelecto prático: a esta Aristóteles chamou ensino, distinguindo-a da
habituação. Por fim, será necessário indicar a importância da lei para a manutenção ou a correção do tipo de educação
proposto. Assim, acreditamos contemplar os aspectos mais importantes da educação descrita, ainda que nas
entrelinhas, da Ética Nicomaqueia.
Distinções metodológicas na Ética Nicomaqueia de Aristóteles
Ian Silveira Pompeu (Mestrando Filosofia UFPA)
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A presente comunicação busca apresentar a importância de ater-se às distinções metodológicas subjacentes
à Ética Nicomaqueia (E.N.) de Aristóteles para elucidar o problema atual entre ética descritiva (teórica) e prescritiva
(prática). O objetivo da E.N. é a investigação do Bem, tomado com razão de fim, de modo a guiar a ação humana –
racional – em vistas ao florescimento do agente (1094a1-15). Para tal desenvolvimento, em 1139a5-15, Aristóteles
apresenta uma dupla divisão de faculdades da alma racional humana: uma por meio da qual contempla-se as coisas e
outra pela qual calcula-se/delibera-se em vistas de algo. Do ponto de vista prático, está, na primeira faculdade, a
capacidade de operar em vistas ao conhecimento dos princípios que regem a ação humana (Filosofia Prática
propriamente), enquanto na segunda localiza-se a deliberação acerca dos melhores meios para se alcançar um fim
sobre o qual não se delibera, ou seja, a Phrónesis tomada como operação. A aplicação disso se dá na consideração da
ação humana como um silogismo. A premissa maior é uma proposição enquanto norma geral que traz em seus termos
um bem capaz de contribuir à realização do homem, e a menor sendo o resultado de uma deliberação acerca dos
meios capazes de levar ao referido bem. Assim, a conclusão é uma norma específica sobre o que é para ser feito. Do
exposto, derivam-se dois modos distintos, dentro das próprias investigações éticas, para se considerar o caminho
explicativo a ser percorrido, a exatidão alcançada nas conclusões, as considerações psicológicas e a natureza –
entendida como as notas específicas.
Isócrates e Wittgenstein: uma possível aproximação
Samira Cerqueira da Silva (Mestre FEUSP)
Apesar de estarem diametralmente distantes no tempo e no espaço, podemos dizer que Isócrates, um dos
principais educadores atenienses do século IV a.C. e Ludwig Wittgenstein, filósofo alemão do século XX, têm algo em
comum, a questão do conhecimento humano ancorado na importância da linguagem, pois, para os autores, nada
existe fora dela. É preciso, no entanto, cuidado de observar possíveis anacronismos quando relacionamos esses
filósofos e suas concepções filosóficas, afinal, dois milênios os separam. Ambos se puseram a discutir o que é Filosofia,
embasaram suas concepções nos estudos da linguagem bem como recusaram concepções metafísicas da realidade.
Contudo, Isócrates “perdeu” a disputa por uma concepção específica de Filosofia, afinal, a platônica “venceu”,
enquanto Wittgenstein, após 2.000 anos, é considerado um filósofo inovador. Dessa forma, analisaremos os pontos
convergentes entre o educador ateniense e o filósofo alemão, bem como até onde podemos dizer que a visão de
Isócrates foi como uma “primeiro grande transformação” na filosofia.
Educação como processo de formação humana – uma revisão
em filosofia da educação ante a premência da utilidade
Vicente Zatti (Instituto Federal do Rio Grande do Sul/Pós-doutor FEUSP)
Apresentamos nessa comunicação o livro “Educação como processo de formação humana: uma revisão em
filosofia da educação ante a premência da utilidade” publicado em 2022 no Portal de Livros Abertos da USP, resultado
de estágio pósdoutoral realizado na FEUSP sob supervisão de Marcos Sidnei Pagotto-Euzebio. Abordamos nele a
questão do utilitarismo que avança sobre a educação contemporânea, a partir de uma revisão teórica da tradição
filosófico-pedagógica que entende a educação como processo de formação que se apoia em saberes que valem por
si, não reduzindo-os à saberes de imediata utilidade econômica. Nessa revisão, elegemos seis tópicos de análise, os
quais correspondem aos capítulos: 1. Paideia grega; 2. Humanitas latina; 3. Bildung moderna; 4. Formação omnilateral
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em Karl Marx; 5. Habermas e a reconstrução comunicativa do ideal de formação humana; 6. Skholé e formação
humana. De tal modo, tecemos um elogio à historicidade da formação considerando sua transformação ao longo do
tempo, mas sem perder o horizonte de que se trata sempre de uma recepção da antiguidade clássica, em especial da
experiência educativa dos gregos antigos. A paideia grega funda a ideia de educação como algo não identificado com
a profissionalização, capacitação ou treinamento, mas como processo de formação humana que se constitui a partir
de uma cultura geral com caráter desinteressado. A paideia grega e sua recepção na humanitas latina e na Bildung
moderna é o fundamento de toda proposta educativa entendida como formação integral, não restrita aos saberes
com relevância utilitária. Além desses aspectos, revisamos a crítica de Marx à ideia clássica de formação, bem como,
a reconstrução pós-metafísica da formação no pensamento de Habermas.
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Sexta 10/06
17h-19h
MESA 9
meet.google.com/vjz-dwsm-yhf
Coordenação: Carlos Castanha
Pathes secundum homini et secundum Deum: análise dos capítulos um ao quatorze do
livro XIV da Cidade de Deus de Agostinho de Hipona
Wallace Tavares Alves Sá (Mestrando Filosofia UFABC)
O presente texto visa apresentar uma análise mais aprofundada dos capítulos “primeiro ao nono”, do livro XIV
da Cidade de Deus, de Agostinho de Hipona, onde se pode perceber um ponto de ruptura com o mundo antigo no que
diz respeito à algumas pathes (paixões). De um modo geral, pode-se dizer que Agostinho, nesses primeiros nove
capítulos do livro XIV, se preocupa em tentar demonstrar que todo ser humano descende de Adão e que, justamente
por isso, herdaria a ferida (morte física e espiritual) do pecado original na alma. Entretanto, afirmar que o homem
herda a ferida significaria o mesmo que dizer que herda a própria natureza humana, ou seja, o homem não herdaria
apenas a ferida, mas também todas as potencialidades naturais para uma vida moral advindas de sua natureza que
seria, enquanto essencialmente criação divina, boa; pois Deus não haveria de fazer uma natureza (humana) má. A
partir das opiniões de Cícero, Agostinho, então, faz uma análise crítica do entendimento greco-romano sobre as
paixões básicas e fundamentais como a alegria, tristeza, desejo e medo que, para Cícero, seriam, na verdade,
tormentas da vida humana – advindas do corpo físico e mortal; e os sábios em nada se relacionariam com elas. O
problema, segundo Agostinho, é que essas paixões não poderiam ser evitadas, pois que resultariam, em essência, da
natureza humana. Ou seja, sendo os sábios “homens”, viveriam, também, essas paixões. Nesse sentido, aproveitandose dessa crítica, Agostinho inverterá a lógica interpretativa greco-romana e proporá a possiblidade de benignidade
dessas paixões desde que orientadas secundum deum. Isso não seria algo impossível, pois os cidadãos da cidade de
Deus já demonstrariam essa possiblidade: temem a morte, alegram-se com a justiça, entristecem-se com o pecado e
desejam o paraíso. Cabe a esta comunicação precisar o itinerário argumentativo agostiniano destacando os pontos
chave de cisão entre mundo antigo (grego) e o medievo primevo.
Ciência e Filosofia Natural em Marsilio Ficino
Everton de Souza Teixeira (Mestrando Filosofia Unifesp)
Este trabalho de pós-graduação apresenta em sua temática o estudo da representação de ciência (scientia) na
teologia e filosofia natural de Marsilio Ficino (1433-1499) na qual o humanista não apenas buscou compreender Deus,
o cosmos e a imortalidade da alma, mas também o que é conhecimento e como o homem se apropria desta sabedoria
através da natureza, elementos que no autor em estudo não podem ser divorciados. Desta maneira, questiona-se o
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ideal de ciência desenvolvido por Ficino, tal como a posição ocupada pelo homem em seu universo e o processo no
qual se obtém conhecimento. Portanto, objetiva-se compreender o uso que Ficino atribui à palavra scientia, seu
significado e como metafisicamente o homem pode adquirir conhecimento sobre Deus e princípios necessários. Sobre
as hipóteses levantadas, compreendemos que a posição central que a alma humana ocupa no cosmos segundo Ficino,
concedeu ao homem a condição onde através da contemplação filosófica sobre o mundo sensível, podemos ascender
a verdades necessárias além da materialidade. Assim, transcende-se o conhecimento natural para alcançar a sabedoria
divina. No que diz respeito a resultados parciais, verifica-se que Ficino foi capaz de concatenar diferentes filósofos
gregos como Platão, Aristóteles e Plotino, da mesma forma que Tomás Aquino entre os escolástico-medievais para a
construção de sua filosofia natural e consequentemente seu conceito de scientia naturalium (ciência ou conhecimento
natural). A centralização do homem é elemento fundamental para entender como, segundo Ficino, este ser intelectual
pode superar a ciência da natureza para conhecer a divinorum sapientia, para passar da Physica à Metaphysica
(Teologia), a ciência divina (scientia divina) cujo escopo consiste em obter o máximo saber, o conhecimento sobre o
Summum Bonum, Deus.
As reminiscências dos aspectos misóginos da tradição clássica na literatura
tardo-medieval: uma comparação entre Il Corbaccio, de Giovanni Boccaccio,
e Sátiras, de Juvenal
Giovanna de Campos Mauro (Graduanda Università degli studi di Padova)
Giovanni Boccaccio é conhecido como o autor de O Decameron (1349-50), coleção de 100 novelle escritas em
prosa e que narram as aventuras de 10 jovens que decidem escapar da Peste Negra. A peculiar atenção de Boccaccio
ao mundo feminino pode ser encontrada em muitas de suas obras, tanto em italiano quanto em latim. Boccaccio
assume uma atitude filógina em boa parte de suas produções até O Decameron. Il Corbaccio (1365) é uma obra tardomedieval escrita em prosa. O surpreendente aspecto misógino do romance é debatido por estudiosos que baseiam a
interpretação do texto na conexão de aspectos do texto a eventos da vida do autor e aceitam a referência do próprio
autor à obra como um tratado filosófico, influenciado pela tradição clássica de acusação contra as mulheres. Na obra,
o protagonista, desesperado depois de não ter o seu amor à uma viúva correspondido, adormece e sonha. Em seu
sonho, ele é visitado pelo falecido marido da viúva, que o adverte contra as mulheres que, com a imoralidade,
prejudicam os homens. O falecido começa, então, a narrar suas experiências com a viúva, detalhando características
negativas da mulher. Depois de ouvir a história, o protagonista é persuadido a usar as suas habilidades de escritor para
"desmascarar" a natureza verdadeira das mulheres. Boccaccio conclui Il Corbaccio alertando os leitores contra a vil
natureza feminina. Em suas Sátiras (I a.C.), Juvenal dedica mais de setecentos hexâmetros para realizar uma invectiva
contra as mulheres. De fato, na Sátira VI, o alvo de sua crítica é, sobretudo, a mulher casada da alta sociedade romana,
personificação da corrupção moral que via presente em Roma. O autor questiona as causas que provocaram essa
degeneração moral, lembrando os tempos em que as matronas ainda eram virtuosas. Diante do exposto, o presente
trabalho pretende analisar as reminiscências da tradição clássica de acusação contra as mulheres dentro da literatura
medieval, mais especificamente na produção tardia de Boccaccio.
Vico e a educação dos antigos: contra as unilateralidades da razão moderna
Fran de Oliveira Alavina (UFVJM)
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Com base nas Orazioni inaugurali (Orações Inaugurais) e no De Nostri temporis studiorum ratione (Sobre o
método dos estudos do nosso tempo) se propõe apresentar as críticas do pensador Giambattista Vico (1668-1744) ao
modo como a Modernidade desconsidera o lugar dos antigos em seu programa formativo. Não obstante, Vico almejar
elaborar uma nova ciência, alvo tipicamente moderno, seu projeto de saber não rejeita os clássicos. Desde antes da
sua Ciência Nova, ele busca não perder de vista o caráter prático/civil de todo saber humano. Desse modo, o
conhecimento dos antigos não é inútil, devendo acompanhar a formação dos indivíduos, respeitando a gênese das
faculdades. Ora, os indivíduos não iniciam a vida com intricados pensamentos racionais, mas com as invenções da
fantasia. É preciso, então, respeitar a articulação entre ontogênese e filogênese. Trata-se de apontar certa função
pedagógica dos antigos, não apenas enquanto mero elemento de diletantismo erudito, mas – na exemplaridade dos
antigos - considerar o papel de faculdades como a memória, a imaginação e a fantasia. Âmbitos que, segundo os
filósofos modernos, conduzem sempre ao erro. Ocorre, contudo, que o homem não é apenas razão, como querem os
modernos. Donde, Vico considerar unilateral o modelo formativo de tipo cartesiano, pois incapaz de apesentar liames
para a integralidade dos saberes e das faculdades do ânimo. Em outras palavras, trata-se de resgatar o ideal formativo
dos studia humanitatis tendo por base o modelo apontado pela antiguidade clássica.
Sexta 10/06
17h-19h
MESA 10
meet.google.com/hew-tkyc-pft
Coordenação: Bárbara Freitas
O pomar de Plutarco e a floresta de Rousseau
Bruno Drumond Mello Silva (Doutorando FEUSP)
O objetivo desta comunicação consiste em analisar as diferenças na concepção de natureza humana, no Da
educação das crianças, de Plutarco, e no Livro I do Emílio, de Rousseau, valendo-nos sobretudo da analogia entre a
educação e a agricultura, central na composição de ambas as obras. Desde o princípio, Plutarco é uma referência muito
presente no Emílio. A própria composição da obra iluminista segue de perto a estrutura do Da educação das crianças,
embora este pequeno tratado, em particular, não seja jamais citado diretamente pelo filósofo de Genebra;
introduzidas algumas considerações gerais que marcam a perspectiva depreciativa com que avalia a educação
europeia de então, que mutila a natureza humana tal como o jardineiro poda as árvores do jardim, Rousseau apresenta
algo como uma fenomenologia da educação que, ao menos no que se refere às crianças, deveria pautar-se pelo curso
da natureza, definida, por sua vez, como o conjunto das disposições espontâneas do indivíduo, anteriores a toda
alteração provocada pelo convívio social e pela educação. Enquanto Rousseau, alimentado pelo imaginário naturalista
do século XVIII, idealiza uma natureza humana que, na medida do possível, deve representar uma espécie de
paradigma para a educação das crianças, como uma floresta a ser preservada, Plutarco toma a ideia de natureza como
o solo no qual um lavrador planta suas sementes: sendo bom, facilmente as plantas se desenvolvem e dão bons frutos;
sendo ruim, exige muito trabalho e os frutos são incertos. O lavrador, que faz a vez do professor na analogia, é aquele
que semeia os saberes e os costumes, corrigindo a criança como quem conduz os ramos da jovem árvore, tendo em
vista aquilo que é o melhor para ela. Para Plutarco – profundo platônico –, a educação das crianças consiste
precisamente naquilo que conforma a natureza delas a um conjunto de caracteres predeterminados, tais como o
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empenho no aprendizado, a adesão aos exercícios e o respeito pela disciplina.
A paideia grega em Plutarco, uma leitura de Da educação das crianças
Maria Aparecida de Oliveira Silva (Labham/UFPI)
Em seu tratado Da educação das crianças, Plutarco afirma que a educação de uma criança é um processo, um
ato contínuo que requer dedicação do aprendiz. A boa origem, que está relacionada à natureza, é apenas um indicativo
de que a educação encontrará um terreno fértil em que o semeador terá as condições ideais para o seu cultivo. No
entanto, como na agricultura, é preciso que o semeador esteja atento aos afazeres necessários para que essa semente
se desenvolva e passe a dar bons frutos. Desse modo, Plutarco orienta o leitor a escolher um bom mestre para que
seus filhos aprendam corretamente a arte retórica, a filosofia e a prática de exercícios físicos, entre outros, nos moldes
da paideia grega. Notamos que, embora tenha nascido no século I d.C., em plena época da dominação romana sobre
a Grécia, Plutarco se mantém fiel à tradição literária de seus antepassados, pois seu modelo pedagógico contempla
preceitos já encontrados em Homero, Hesíodo, Aristóteles e outros. No entanto, será em Platão que nosso autor irá
buscar grande parte de sua inspiração para elaborar sua concepção de educação. Plutarco escreve de forma prescritiva
e didática, tal postura se explica por sua intenção de instruir os pais sobre como gerar e educar seus filhos. Nesse
sentido, boa origem e bons professores não garantem ainda a boa formação das crianças; para alcançar a virtude é
necessária a convergência de três elementos: natureza, razão e costume. Portanto, nesta comunicação, pretende-se
demonstrar a visão plutarquiana da educação ideal para a formação do caráter de uma criança.
Seria o educador um psykhagogo?
Bárbara de Abreu Freitas (Graduada Filosofia UFSJ)
Termos correlatos a psykhagogen e psykhagogoi foram muito utilizados em inúmeros textos ao longo da
tradição do pensamento clássico Ocidental. Muitos significados foram atribuídos a eles. Em suas primeiras aparições,
estes termos foram associados ao ato de dar passagem ou o de guiar as almas do mundo dos vivos para o mundo dos
mortos. Na Odisseia (XXIV, 1-14), por exemplo, no seu último canto, embora não seja muito clara a aparição do termo,
Hermes é apresentado como aquele que conjura as almas mortas e as leva em direção ao Hades. Já numa perspectiva
trágica, por exemplo em Os persas de Esquilo (687vv.), a força da ação prática do termo parece se inverter, ou seja, o
psykhagogo aparece como aquele que invocava as almas dos mortos para trazê-las de volta ao nosso mundo. Nos
versos o psykhagogon traz ao mundo dos vivos a alma do defunto Rei Dário. Mas parece ser em Platão que a atmosfera
que gira entorno destes termos sofre uma mudança realmente significativa. Em Fedro (271c), o filósofo entende
psykhagogia como a condução das almas dos vivos para uma melhora efetiva aqui nesse mesmo mundo. Aqueles que
fazem bons discursos devem saber conduzir bem a alma dos ouvintes. Dito isso, seria possível aproximar esse
instrumental teórico antigo ao nosso contemporâneo ambiente pedagógico? Essa comunicação pretende propor essa
correlação. O professor/educador, poderia ser entendido como aquele que conduz a alma dos seus estudantes à uma
condição de melhoramento? Buscaremos aplicar a ressignificação do conceito feita por Platão e entender até que
ponto essa noção, tão complexa e ampla, pode ser entendida na relação de aprendizagem, entre educador e educando
em nossos dias.
A questão do trágico e da mímesis na literatura infantil
Fábio da Silva Santos (Mestrando UFLA)
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O filósofo grego Aristóteles na obra Poética expressa os efeitos pedagógicos da arte, propriamente o aspecto
"catártico da mímeses”. Na concepção do filósofo, as ciências poéticas: a tragédia e a poesia épica são imitações
relevantes das ações humanas para viver bem. Na obra “A República”, livro X, Platão, concebe as produções artísticas
como imitações captadas pelos sentidos, estando três graus de distância da verdade. Assim, repudia as artes miméticas
por colocarem em risco o conhecimento das essências eternas, da ideia de bem, como a justiça, coragem, lealdade. A
tragédia e a poesia não devem fazer parte da educação do cidadão ideal, justamente pelos efeitos miméticos,
sedutores e retóricos, sobre a alma racional. Aristóteles, por sua vez, defende a permanência de poetas e
tragediógrafos na cidade, justamente por retratar aspectos éticos da condição humana. O mito como objeto da
tragédia aborda diferentes experiências que podem vim acontecer aos espectadores através dos personagens que
estão sujeitos às forças dos fenômenos psicológicos, humanos, naturais e a vontade dos deuses. Os sentimentos de
temor e compaixão suscitados pelas desventuras do herói provoca no espectador a "catarse”, ou seja, purificação das
emoções e paixões sentidas, embora não vividas na prática. Esse caráter pedagógico da tragédia encontra-se na poesia
épica. O poeta na arte mimética em forma de versos ou não, produz imitações e criações das ações humanas, de
maneira enriquecedora. A consciência trágica conduz o espectador a manter distância, identificar, refletir e avaliar a
própria condição na via cotidiana. O propósito da pesquisa encerra em analisar na literatura infantil: contos, poesias,
canções, obras teatrais, fílmicas, a presença do trágico e da mímesis. Essa transposição conceitual pode abrir
possibilidades para ressignificar a prática docente na formação crítica, emocional e moral dos alunos. O trágico faz
parte da infância, a criança em estágio de desenvolvimento mental, observa, pensa, sente e age, numa sociedade
moldada por vícios e virtudes. A missão filosófica docente pauta em ajudá-la compreender os acontecimentos que lhe
pode suceder, fatos da vida, com leveza e seriedade.
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COMISSÃO ORGANIZADORA
APOIO
Marcos Sidnei Pagotto-Euzebio - FEUSP
FEUSP - Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Carlota Boto - FEUSP
Seção de Apoio Acadêmico da FEUSP
Juliana Oliva - FEUSP
Lab_Art FEUSP
Bruno Drumond Mello Silva - (doutorando) FEUSP
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación (FHCE) de la
Universidad de la República (UDELAR) - Uruguay
Edson da Silva Afonso - (doutorando) FEUSP
Cláudia Kurokawa - (graduada) FEUSP
Núcleo de Pesquisas em Filosofia e Educação (NUPEFE) da Universidade
de Passo Fundo - UPF
Samira Cerqueira da Silva - (mestre) FEUSP
Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos - SBEC
Victor Oliveira Santos - (graduado) FEUSP
Sociedade Brasileira de Retórica - SBR
Letícia Manso - monitora (graduanda) FEUSP
Sociedade Brasileira de Filosofia da Educação - SOFIE
José Carlos André da Silva - monitor (graduando) - Filosofia/FFLCH
Nelbert Araújo - monitor (graduando) FEUSP
REALIZAÇÃO
Paideuma - Grupo de Estudos Clássicos
COMITÊ CIENTÍFICO
da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Ana Maria Guedes - Universidade do Porto - Portugal
Andrea Díaz Genis - Universidad de la República - Uruguay
Belmiro Fernandes Pereira - Universidade do Porto - Portugal
Breno Sebastiani - Universidade de São Paulo
Bruno Bontempi - Universidade de São Paulo
Claudio Almir Dalbosco - Universidade de Passo Fundo
Cosimo Costa - Universidade de Roma
Elaine Sartorelli - Universidade de São Paulo
Fábio de Barros Silva - Universidade Federal de São João del Rei
Gabriele Cornelli - Universidade de Brasília
Gilda Naécia Maciel de Barros - Universidade de São Paulo
Henrique Manso - Universidade da Beira Interior - Portugal
Jaime Cordeiro - Universidade de São Paulo
Marta Várzeas - Universidade do Porto - Portugal
Maria Cecília Coelho - Universidade Federal de Minas Gerais
Silvio Marino - Universidade de Brasília
Roberto Bolzani – Universidade de São Paulo
Rogério De Almeida – Universidade de São Paulo
Roni Cleber Dias Menezes – Universidade de São Paulo
www.paideuma.org