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As Tecnologias Digitais Móveis na EJA:
territórios em movimento e a multiterritorialidade
Flávia Andréa dos SANTOSi
Sérgio Paulino ABRANCHESii
Resumo
O presente artigo versa sobre o encontro do território das Tecnologias Digitais Móveis com o território
da Educação de Jovens e Adultos, dos significados que margeiam esse encontro e como os sentidos de
desterritorialização, reterritorialização e multiterritorialidade se inserem nesse diálogo. As reflexões
apresentadas, decorrem dos dados obtidos através de uma entrevista semiestruturada aplicada com treze
professores que lecionam nessa modalidade de ensino, nos Módulos I, II ou III. Como resultado,
observou-se que a multiterritorialidade articula-se com o sentido de pertencimento construído bem como
com as implicações atribuídas pelos professores ao uso dessas tecnologias na Educação de Jovens e
Adultos, que envolve, por exemplo, a possibilidade de contribuir para o processo de alfabetização,
minimizar as diferenças etárias-geracionais e preparar o aluno para o mundo de trabalho.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos; tecnologias digitais móveis na EJA; territórios;
multiterritorialidade.
Mobile Digital Technologies in EJA: territories in motion and the multiterritoriality
Abstract
This article deals with the encounter of the territory of Mobile Digital Technologies with the territory
of Youth and Adult Education, the meanings that border this encounter and how the meanings of
deterritorialization, reterritorialization and multiterritoriality are inserted in this dialogue. The
reflections presented derive from data obtained through a semi-structured interview applied with
thirteen teachers who teach in this teaching modality, in Modules I, II or III. As a result, it was observed
that multiterritoriality articulates with the constructed sense of belonging as well as with the
implications attributed by teachers to the use of these technologies in Youth and Adult Education, which
involves, for example, the possibility of contributing to the process literacy programs, minimize agegenerational differences and prepare students for the world of work.
Keywords: Youth and Adult Education; mobile digital technology in EJA; territories; multiterritoriality.
i
Doutora em Educação Matemática e Tecnológica pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professora
multiplicadora e da Educação de Jovens e Adultos (EJA). E-mail
[email protected] - ORCID iD:
https://orcid.org/0000-0002-9471-5431.
ii
Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Professor da UFPE. E-mail:
[email protected] - ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-0612-068X.
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Tecnologías Digitales Móviles en EJA: territorios en movimiento y multiterritorialidad
Resumen
Este artículo aborda el encuentro entre el territorio de las Tecnologías Digitales Móviles y el territorio
de la Educación de Jóvenes y Adultos, los significados que bordean este encuentro y cómo los
significados de desterritorialización, reterritorialización y multiterritorialidad se insertan en este
diálogo. Las reflexiones presentadas derivan de datos obtenidos a través de una entrevista
semiestructurada aplicada a trece docentes que imparten docencia en esta modalidad de enseñanza, en
los Módulos I, II o III. Como resultado, se observó que la multiterritorialidad se articula con el sentido
de pertenencia construido así como con las implicaciones atribuidas por los docentes al uso de estas
tecnologías en la Educación de Jóvenes y Adultos, lo que implica, por ejemplo, la posibilidad de
contribuir al proceso programas de alfabetización, minimizar las diferencias generacionales y de edad
y preparar a los estudiantes para el mundo laboral.
Palabras clave: Educación de
multiterritorialidad.
Adultos;
tecnología
digital
móvil
en EJA;
territorios;
1 AS TECNOLOGIAS DIGITAIS MÓVEIS E A EJA: ENCONTROS TERRITORIAIS
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) corresponde a uma modalidade da Educação
Básica, desenvolvida em correspondência do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Direcionase aos jovens a partir dos 15 anos – que não foram alfabetizados, ou encontram-se em distorção
idade/ano – e aos adultos e idosos que nunca frequentaram a escola ou não concluíram a
Educação Básica. Enquanto modalidade, a EJA encontra-se vinculada às leis e diretrizes
instituídas pelo Ministério da Educação (MEC) e aos currículos estabelecidos; todavia, a sua
concretização pode ocorrer dentro e fora do espaço da escola. Ou seja, a modalidade pode ser
realizada no lócus da sala de aula escolar, mas, também, nos espaços das associações de
moradores, das igrejas, das unidades prisionais e das fábricas.
A EJA representa um território. Não um território no sentido de pertencimento de um
espaço físico, mas um território que se compõe sob múltiplas dimensões: política, geográfica,
econômica, cultural e educacional; um território que tem sua territorialidade consolidada na
ação dos seus sujeitos.
De acordo com Milton Santos,
O território não é apenas o resultado da superposição de um conjunto de
sistemas naturais e um conjunto de sistema de coisas criadas pelo homem. O
território é o chão e mais a população, isto é, uma identidade, o fato e o
sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é a base do
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trabalho, da residência, das trocas materiais e espirituais e da vida, sobre os
quais ele influi (Santos, 2001, p. 96).
Haesbaert (2009, p. 79) reflete que o território pode ser compreendido “a partir da
imbricação de múltiplas relações de poder, do poder mais material das relações econômicopolíticas ao poder mais simbólico das relações de ordem cultural”. Para o autor, o significado
de território não se traduz como sinônimo de unidade, de hegemonia, de harmonia. Pelo
contrário, abriga relações entre sujeitos e contextos que se colocam entre contínuos processos
de concordâncias e desavenças, perpassando por processos permanentes de desterritorialização
e reterritorialização ou compondo-se na multiterritorialidade.
Em diálogo com cada território posto, a EJA necessita construir sua territorialidade, uma
ação conduzida em dinâmicas multifuncionais, multigestionárias, multigeracionais e multiidentitárias. Multicomposição que faz da EJA um território-rede. Para Haesbaert (2004), o
território-rede versa sobre a mobilidade, os fluxos (redes) e as conexões; consiste em um
território que passa da dimensão do território-zona, configurado na perspectiva física, para
assumir a dimensão do território simbólico. No território-rede, o “movimento ou a mobilidade
passa a ser um elemento fundamental na construção do território” (Haesbaert, 2004, p. 05).
No presente artigo, refletimos o território da EJA a partir do território da escola, lócus
que lhe atribui o sentido da “EJA Escolarizada”. Um contexto de exercício formal dessa
modalidade de ensino, regimentado pelas leis e diretrizes que orientam a educação nacional,
pelo currículo prescrito e pelas normativas do ambiente escolar. Uma modalidade desenvolvida,
majoritariamente, no horário noturno. Nesse contexto se estabelece o nosso objeto de análise
que consiste em refletir, a partir do território da escola, o encontro da EJA com as Tecnologias
Digitais Móveis (TDM), territórios de múltiplas configurações.
O território da EJA, ao adentrar o território da escola, também necessita fazer-se
reconhecido, posto que, muitas vezes, mesmo ocupando o território da escola, a EJA não usufrui
de todas as possibilidades que a escola pode oferecer, a exemplo do acesso a todas as
dependências da escola ou aos recursos tecnológicos. A EJA corresponde a um território
permeado por direitos instituídos, mas que, de forma recorrente, não são reconhecidos ou são
simplesmente negados e/ou praticados de forma negligenciada. Constitui-se um território de
luta, que envolve permanentes enfrentamentos, tensões e conquistas. Um território desenhado
sob a dinâmica material e a simbólica.
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Ao considerarmos o encontro entre o território da EJA e o território das TDM, três
aspectos se colocam à reflexão. O primeiro decorre da compreensão de que os territórios
possuem composição e características próprias, como é o caso das TDM e da EJA. O segundo
incide no entendimento de que um encontro territorial pode resultar em aproximações e
estranhamentos. E, o terceiro consiste na compreensão de que este encontro pode ocorrer
envolvendo as dimensões do território material e do território simbólico.
Faz-se necessário considerar que as TDM, por natureza, não foram criadas para a
educação, para o exercício pedagógico. Elas têm a sua origem vinculada ao exercício da
comunicação e da construção da informação em contextos sociais diversos. Por sua vez, a EJA
distancia-se de uma configuração uniforme/hegemônica, caracterizando-se por uma eclética
composição etária-geracional, social, geográfica e diversidade e pelas especificidades dos
contextos e dos sujeitos que a compõem. A exemplo de uma dessas especificidades, observase a diferença etária-geracional dos grupos classes da EJA; nesses, observa-se a presença do
jovem de 15 anos, do adulto de 40 anos ou do idoso de 80 anos, uma composição que traz, em
si, diferentes objetivos de aprendizagem e perspectivas pedagógicas.
2 METODOLOGIA E PERCURSO REALIZADO
As análises e reflexões que compõem este artigo inserem-se em uma investigação de
doutorado, que apresentou como objetivo discutir o uso das TDM na EJA. De natureza
qualitativa, a pesquisa dialogou com os significados atribuídos pelos professores ao uso das
TDM no contexto escolar da EJA. Na composição deste artigo, trazemos os dados relacionados
ao sentido de território e territorialidade que perpassou as considerações dos professores quando
refletido o uso das TDM na ação pedagógica da EJA.
Em âmbito global, a pesquisa foi realizada com professores que lecionavam na EJA e
se desenvolveu em três etapas. A primeira etapa consistiu na aplicação de um questionário com
professores da EJA, independentemente do módulo de atuação deles. A aplicação irrestrita
buscava localizar as possibilidades e os desafios globais que margeavam o uso das TDM nessa
modalidade de ensino. No campo de pesquisa, onde foi realizada a investigação, realizavam-se
os Módulos I, II, III, IV e V. O questionário foi composto por 31 questões – entre objetivas e
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abertas – e foi enviado para os professores por meio do Google Forms, via rede social
WhatsApp. Responderam ao questionário 52 professores.
A segunda etapa consistiu na realização de Encontros Formativos. Por meio das
respostas ao questionário buscou-se localizar professores da EJA que lecionavam
especificamente na Fase I dessa modalidade de ensino, ou seja, nos módulos I, II e III. Por livre
adesão, 15 professores contatados participaram dos Encontros Formativos, realizados ao longo
de 11 meses. Os encontros se deram por meio da plataforma Google Meet.
Com os Encontros Formativos, surgiu a necessidade de realizar entrevistas para o
aprofundamento de questões que envolviam a pesquisa. Então, como terceira etapa, foram
realizadas entrevistas com 13 dos professores participantes dos Encontros Formativos e,
consequentemente, respondentes do questionário. Dois dos participantes dos encontros
estiveram impossibilitados, por questões de saúde, de participar da entrevista.
As entrevistas, de composição semiestruturada, apresentavam 08 perguntas relacionadas
à inserção e ao uso das TDM na EJA. Na realização das entrevistas, foi utilizado o recurso da
foto-elicitação, com o objetivo de ampliar a reflexão dos professores acerca do tema discutido.
A elicitação das imagens se vincula à possibilidade de desencadear e provocar reflexões e
narrativas, se colocando de uma maneira a capturar o tangível e intangível (Clark-Ibañez, 2007).
Para Harper (2002, p. 23), a foto-elicitação “adentra memórias mais profundas, em uma parte
diferente da consciência humana, do que entrevistas realizadas apenas com palavras”.
Das oito questões que delinearam a entrevista, quatro indagavam diretamente aos
entrevistados sobre a sua compreensão acerca das fotografias apresentadas (uma das imagens
trazia ícones característicos da TDM e, as demais, apresentavam exemplos dos alunos fazendo
uso dessas tecnologias). As entrevistas foram efetivadas por meio do Google Meet, sendo as
fotografias apresentadas no decorrer das perguntas através do compartilhamento de tela. Para a
composição deste artigo serão considerados os dados relativos às entrevistas. Por meio desses,
busca-se refletir os significados que margeiam o encontro das TDM com a EJA e como os
sentidos de desterritorialização, reterritorialização e multiterritorialidade se inserem nesse
diálogo.
Ressaltamos que, tanto o questionário, veiculado através das rede social WhatsApp,
como a entrevista, realizada através da plataforma Google Meet, traziam como parte integrante
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de sua composição o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) a serem assinalados
pelos participantes.
Excetuando as quatro perguntas relativas à compreensão do que era visto nas imagens,
as questões colocadas aos professores foram: i) você utiliza Tecnologias Digitais Móveis na
EJA? Em caso afirmativo, com qual objetivo e como utiliza; ii) quais as contribuições do uso
das Tecnologias Digitais Móveis à prática pedagógica da EJA; iii) o uso das TDM na EJA
favorece o envolvimento dos alunos na prática pedagógica; e, iv) quais os desafios para o uso
das TDM na EJA.
Os professores participantes das entrevistas foram todos do sexo feminino.
Apresentavam idades variantes entre 31 e 60 anos e tempo de docência na EJA entre 5 e 25
anos. No que se refere à formação, 04 das professoras possuíam graduação; 07 possuíam
especialização (uma realizada em EJA); 01 possuía mestrado; e 01 possuía doutorado. A
graduação em pedagogia fez parte da formação de 06 das respondentes.
As entrevistas, realizadas através do Google Meet, foram gravadas (com a autorização
dos participantes) e transcritas com o apoio da plataforma Reshape. As transcrições foram
formatadas em um documento word, foram atribuídos códigos de identificação (utilizamos a
letra P seguida da numeração 01 a 13, conforme a ordem de realização da entrevista) e, em
continuidade, enviadas ao software ATLAS.ti. O software foi utilizado para a categorização
dos temas, marcação dos trechos de fala relevantes e criação de redes temáticas.
Os dados das entrevistas foram analisados através da Análise Temática Reflexiva (AT
Reflexiva), proposta por Braun e Clarke (2006), Braun, Clarke e Gray (2019), Clarke (2017) e
Clarke e Braun (2018). Para a realização da análise, as autoras estabelecem seis fases de
desenvolvimento, sendo elas: i) familiarização com os dados; ii) gerando códigos iniciais; iii)
busca dos temas; iv) revisão dos temas; v) definição e nomeação dos temas; e, vi) produção do
relatório.
A escolha pela AT Reflexiva se deu em função da possibilidade de realizarmos a
transversalidade dos temas, por esta dialogar com a possibilidade de identificar, analisar,
interpretar e relatar padrões (temas) dentro de dados, trabalhando conceitos subjacentes e
significados compartilhados.
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3 LOCALIZANDO AS TECNOLOGIAS DIGITAIS MÓVEIS
Consideramos necessário explicitar ao que nos referimos quando mencionamos TDM.
Em primeiro lugar, não estamos nos remetendo, exclusivamente, aos dispositivos móveis
celular/smartphone, laptop, ipad, chromebook e tablet. Estes são equipamentos que também
estão incluídos no conceito das TDM. Quando nos referimos às TDM, estamos considerando
os dispositivos móveis em si, mas também os aplicativos, os recursos e as mídias que eles
comportam, uma compreensão respaldada na configuração multifacetada que as TDM assumem
no campo da discussão das tecnologias na educação.
O uso do WhatsApp, Facebook, Twitter, Instagram se refere às TDM. O uso dos
aplicativos Google Meet, Google Drive e Zoom, instalados no celular/smartphone, configura
TDM. O uso do buscador Google, via celular, para a realização de pesquisas na rede internet,
conforma TDM. O uso dos aplicativos Uber, Waze, Google Maps e Leitores de códigos QR
caracteriza TDM. O uso do aplicativo Duolingo, para o estudo de uma língua estrangeira,
significa TDM. O uso de aplicativos de rádio e TV, via celular/smartphone, significa TDM. O
uso de aplicativos bancários, via celular/smartphone, também é TDM, bem como os conceitos
de mobile learning e de aprendizagem ubíqua também se relacionam às TDM.
Na definição da Unesco (2014, p. 8), as TDM correspondem às Tecnologias Digitais
“facilmente portáteis, de propriedade e controle de um indivíduo e não de uma instituição, com
capacidade de acesso à rede internet e aspectos multimídia, e que podem facilitar um grande
número de tarefas, particularmente aquelas relacionadas à comunicação”. Compreendemos, no
entanto, que as TDM não se restringem às tecnologias de pertencimento do aluno, como é o
caso do celular/smartphone. Mas, também, que podem corresponder a uma tecnologia de
pertencimento de uma instituição, como é o caso do smartphone, do tablet, do chromebook
e do classmatePC, que são tecnologias de pertencimento da escola.
A inserção e o uso das TDM no contexto pedagógico da EJA localizam-se, de forma
representativa, como componente subjacente às tecnologias denominadas TIC, TICs, TDIC,
Novas Tecnologias, Recursos Tecnológicos e Mídias Digitais.
As TDM podem ser refletidas sob perspectivas globais, a exemplo dos significados
antropológicos, filosóficos, pedagógicos que as margeiam, e/ou sob perspectivas específicas,
essas caracterizadas através dos componentes que delas fazem parte, tais como os aplicativos
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das redes sociais, de jogos e de serviços, ou seja, refletidas no viés dos sentidos e significados
do seu uso na educação ou analisadas a partir da experiência prática estabelecida.
As TDM chegam ao território da escola, e consequentemente da EJA escolar, sob
percursos diferenciados. Surgem vinculadas às políticas públicas, como é o caso da presença
dos tablet, chromebook e classmatePC, equipamentos disponibilizados via redes educacionais
de ensino às escolas. Adentram pelas mãos dos professores, vinculadas às propostas
metodológicas, às estratégias didáticas, à ação do ensino e à perspectiva de contribuição para a
construção da aprendizagem. Inserem-se pelas mãos dos funcionários da escola, através de suas
práticas sociais ou laborais. E, de forma significativa, apresentam-se como tecnologias de
pertencimento do aluno.
A inserção e o uso das TDM na prática pedagógica da EJA também têm presença
registrada nos documentos que regulam e norteiam esta modalidade de ensino. Encontram-se
referidas nos documentos de forma direta ou indireta; a primeira, sendo mencionada como
dispositivos móveis e/ou representadas através da denominação dos recursos e ações que as
caracterizam, como é o caso do uso das redes sociais para comunicação e o uso da rede internet;
e a segunda, sendo relacionada de forma indireta, configuradas dentro do amplo significado das
Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) à educação, dentro de uma perspectiva de
sugestão à prática pedagógica.
4 A DESTERRITORIALIZAÇÃO E RETERRITORIALIZAÇÃO EM QUESTÃO
Ao considerarmos o encontro entre o território das TDM e o território da EJA, nos
deparamos com a prerrogativa da construção de um processo de desterritorialização. Para
Lemos (2007, p. 283), “não existe desterritorialização sem reterritorialização e não há formação
de território que não deixe aberto processos desterritorializantes”.
Para Cordeiro e Bonilla (2015), as TDM promovem a reterritorialização dos cotidianos
escolares quando, em função dessas tecnologias, os praticantes passam a criar outras
territorialidades, nas quais o digital passa a ser orientador das práticas de produção de conteúdo,
de construção do conhecimento, de construção de significados e de reorganização do espaço
escolar, vivenciando uma mobilidade digital que oportuniza aos indivíduos o acesso instantâneo
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à comunicação, assim como a possibilidade de responder, opinar, interagir com as mensagens
e informações recebidas ou acessadas, de forma imediata sem limitação de tempo e espaço.
Refletida sob a perspectiva da reterritorialização, as TDM na escola favorecem a
produção de novas dinâmicas nos cotidianos escolares, incidem sobre as práticas, a
configuração estética e o modo de acessar e produzir conhecimentos, tendo em vista que o
digital traz como característica “a plasticidade, o movimento, a bricolagem e, agregado ao
potencial das redes, favorece relações mais horizontalizadas, de produção, troca de saberes e de
construção de conhecimentos” (Cordeiro; Bonilla, 2015, p. 272).
O caminhar das TDM no espaço pedagógico vai estabelecendo outros territórios de
comunicação, convidando à realização de práticas que concebam outros sentidos do processo
de construção da aprendizagem, reterritorializando e relacionando outros sentidos e
significados à escola.
Haesbaert compreende que não ocorre desterritorialização sem reterritorialização; o que
ocorre é uma complexa territorialização que envolve a convivência simultânea de múltiplos
territórios. Muito mais do que perder ou destruir nossos territórios, este movimento
multiterritorial coloca-se, frequentemente, “vivenciando a intensificação e complexificação de
um processo de (re)territorialização muito mais múltiplo” (Haesbaert, 2010, p. 1).
A convergência de linguagens e mídias “articulada com a conectividade em tempo
integral possibilita a alunos e professores criar, inovar, inventar, entre si e com outros, em
espaços e tempos diversos, mantendo-se, ao mesmo tempo, ancorados no local e articulados
com o global” (Bonilla; Pretto, 2015, p. 502). Nesse contexto das possibilidades de
aprendizagens trazidas pelas tecnologias, a escola é chamada para refletir seus processos
pedagógicos, a pensar como o desenvolvimento do ensino e da aprendizagem dialoga com as
necessidades de aprendizagem dos alunos e como as aprendizagens construídas os ajudam a se
comunicar com as demandas da sociedade, questões que margeiam a construção da
multiterritorialidade.
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5 A MULTITERRITORIALIDADE
A existência de uma multiterritorialidade, resultante do encontro entre as TDM e a EJA,
corresponde a uma compreensão identificada através de entrevistas realizadas com professores
que lecionam na EJA.
Os professores participantes das entrevistas apontaram que as TDM chegam ao território
da EJA buscando apresentar suas possibilidades no campo da comunicação e da informação,
mas, de forma expressiva, na comunicação. Por meio da rede WhatsApp, os professores e os
alunos fazem uso das TDM para troca de mensagens de textos e áudios, utilizando-as com o
objetivo de informar sobre a ocorrência/não ocorrência das aulas, justificar atrasos e ausência
nas aulas e de estabelecer vínculos de modo a atuar sobre a evasão na EJA.
De acordo com os professores, o encontro territorial entre as TDM e a EJA também
ocorre via uso de tablets, classmatePC e chromebook. Esses equipamentos situam-se no interior
das escolas, das quais os professores fazem parte, e são utilizados na sala de aula da EJA em
algumas de suas práticas, sendo manuseados de modo online e offline.
De forma expressiva, as TDM se colocam no território da EJA através do uso da rede
YouTube via tablet e celular/smartphone, um uso, inclusive, que atribui ao notebook a condição
de TDM. Por meio do notebook, e com o suporte do datashow e da rede internet, são projetados
filmes, documentários e vídeos explicativos sobre determinados conteúdos, que auxiliam no
desenvolvimento da aula.
O uso da rede internet se projeta como componente significativo à reflexão das TDM
na EJA. A internet é utilizada por professores e alunos através das TDM presentes na escola,
bem como através de tecnologias de uso pessoal como é o caso do celular/smartphone. Os
jovens, adultos e idosos que compõem essa modalidade de ensino também levam seus
celulares/smartphones para a escola e os utilizam para a comunicação, serviços e busca de
informações, sejam elas ações frequentes ou circunstanciais.
A escola, enquanto um território, tem todo um modo de ser, de fazer e de dizer. Logo,
as TDM, ao adentrar este território, também constroem um território; um território que não é
específico da escola, mas da prática social. Trata-se de uma nova territorialização oriunda do
uso de uma tecnologia, de um recurso que não pertence à escola e passa a ser de uso pedagógico,
um uso didático. Nessa nova configuração, as TDM assumem uma relação com os sujeitos que
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é muito diferente das práticas sociais, passam a cumprir outra função, passam a dialogar com
as práticas pedagógicas.
Os professores destacam que mais que um encontro territorial que promova a
desterritorialização da sala de aula e do espaço pedagógico da EJA, o que se sobressai deste
encontro é a construção de uma multiterritorialidade. Para eles, não consiste em uma
desterritorialização, mas uma reterritorialização que dialoga com dois diferentes territórios, em
múltiplos formatos e sentidos. Consiste na construção de uma multiterritorialidade que perpassa
o reconhecimento dos benefícios resultantes do encontro destes territórios, das implicações que
este encontro produz.
O termo implicações é compreendido como ação, efeito, consequências, inferências,
pressuposições, suposições, subentendidos, envolvimentos, ligações, relação de dependência e
encadeamento. Para os professores, é através desta perspectiva de desdobramentos (das
implicações) que a multiterritorialidade se desenha. As implicações dialogam com os objetivos
de aprendizagens que alunos e professores atribuem à EJA, com expectativas acerca desta
modalidade de ensino.
Vejamos, no Quadro 1, as implicações pontuadas pelos professores ao uso das TDM
para a construção da multiterritorialidade.
Quadro 1 - Construção da Multiterritorialidade
IMPLICAÇÕES DO USO DAS TDM PARA A CONSTRUÇÃO DA
MULTITERRITORIALIDADE
Colabora com o professor para a produção das atividades
Propicia o desenvolvimento de projetos em rede
Colabora para diminuir as diferenças etárias/geracionais
Possibilita inserir a produção dos alunos nas atividades
Permite personalizar as atividades
Favorece a adaptação e desinfantilização das atividades
Promove a convergência de mídias
Contribui para desenvolver a consciência crítica
Contribui com o processo de alfabetização
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Contribui para desenvolver a autoestima do aluno
Favorece a comunicação com diferentes contextos sociais
Colabora para preparar o aluno para o mundo do trabalho
Promove o envolvimento dos alunos
Favorece a inclusão dos alunos com deficiência
Fonte: Os autores (2023).
Nessa formatação da multiterritorialidade, os professores compreendem que o uso das
TDM contribui para desenvolver a consciência crítica, competência tão significativa à EJA,
e que se encontra diretamente vinculada às perspectivas de transformação do sujeito e ao amplo
exercício da cidadania. Por exemplo, a importância do desenvolvimento da consciência crítica
pode ser refletida em relação à propagação das Fake News.
Por meio das redes sociais, são divulgados textos, áudios e vídeos contendo inverdades.
O material veiculado demanda uma leitura crítica e a competência de sermos capazes de refletir
e buscar informações complementares, que confirmem as notícias divulgadas. A possibilidade
de ter acesso às informações oficiais (divulgadas por fontes fidedignas) por meio da rede
internet, em vários formatos de mídia, e poder utilizá-las na sala de aula para subsidiar um
debate, consiste em uma contribuição significativa ao desenvolvimento da consciência crítica.
O acesso à informação configura a base para a construção da consciência crítica. Além disso, a
leitura de imagens e a visualização de vídeos e documentários, veiculados através das TDM,
contribuem para o desenvolvimento da capacidade reflexiva.
Uma das especificidades da EJA consiste no fato dos alunos serem trabalhadores. Logo,
a compreensão de que o uso das TDM na EJA colabora para preparar o aluno para o mundo
de trabalho se coloca entre as implicações consideradas pelos professores. A contribuição
dessas tecnologias à ação laboral está na base dos motivos que orientam tanto a inserção quanto
o uso das TDM na EJA, ou seja, no campo das perspectivas e das possibilidades. Vejamos o
que a Professora P07 nos diz:
Eu tinha um aluno que era mestre de obras e haviam muitas pessoas novas no
trabalho dele, ele sabia fazer mais do que aqueles que já tinham estudado
muito, mas ele se sentia mal porque ele tinha que apresentar o trabalho e ele
não conseguia porque ele não era alfabetizado. Então, ele queria fazer um
cálculo mais rápido, mas ele ficava chateado porque aquela outra pessoa tinha
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um recurso no celular, sabia fazer muito mais rápido e ele ainda ia fazer os
cálculos. E prejudicava o trabalho dele. Então, se ele soubesse mexer em
várias tecnologias, se ele pudesse utilizá-las, ele conseguiria realizar o
trabalho da forma que ele se sentisse bem. E ele não podia fazer desse jeito
(Entrevista, Professora P07, 2020).
Essa colaboração é referenciada pelos professores a partir da compreensão de que os
alunos da EJA buscam na escola a possibilidade de qualificação para a (re)inserção no mundo
de trabalho; uma qualificação que perpassa, por vezes, pela possibilidade de fazer uso com
competência das TDM através da leitura e da escrita.
Os professores relatam o desejo dos alunos de serem alfabetizados e poderem utilizar as
tecnologias presentes no seu espaço de trabalho. Um desejo dos alunos que traz à escola da EJA
o desejo de realizar a inclusão digital. Neste sentido, coloca-se a possibilidade de alfabetizar o
aluno com o apoio das TDM. Situa-se a compreensão de que o uso das TDM contribui para o
processo de alfabetização.
A compreensão das contribuições do uso das TDM à alfabetização do aluno da EJA
atravessa o desafio do professor entender que o uso dessas tecnologias pelos alunos não
alfabetizados da EJA é possível e se consolida a partir da experimentação dessas tecnologias
no processo de alfabetização dos alunos da EJA. É o aluno não alfabetizado adentrando o
território da leitura e da escrita.
As contribuições do uso das TDM ao processo de alfabetização são pontuadas pelos
professores, nas entrevistas, a partir de duas perspectivas: como recurso didático utilizado no
desenvolvimento da alfabetização e como componente motivacional que promove o efetivo
envolvimento no processo de alfabetização.
Enquanto recurso didático, os professores fazem uso dos jogos de alfabetização
presentes no tablet; enviam mensagens via grupo no WhatsApp para que os alunos tentem
decodificar; estimulam os alunos a escreverem palavras e frases no grupo do WhatsApp para
desenvolver a escrita; utilizam imagens e vídeos no apoio à escrita de textos coletivos; e
pesquisam atividades de alfabetização diversificadas para trabalhar em sala. O componente
motivacional vem do uso, pelo aluno, de recursos diversificados em seu processo de
alfabetização. Tal diversidade permite dialogar com ritmos e estilos de aprendizagem
diferenciados.
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O uso das TDM favorece a inclusão dos alunos com deficiência na escola. Nas salas
de aula da EJA, encontram-se inseridos muitos alunos com deficiência, alguns com laudos
oficiais e tendo acompanhamento especializado e outros sem diagnósticos comprovados. Os
professores destacam o encantamento desses alunos pelas TDM e o quanto eles se envolvem
nas atividades realizadas com o apoio dessas tecnologias. Vejamos a reflexão da Professora
P02, no extrato de fala a seguir:
Os alunos deixam de ser sujeitos passivos, para serem sujeitos ativos, sujeitos
construtores, escritores da história. Então, isso favorece bastante.
Principalmente lá na minha turma que eu tenho os especiais. Eles adoram estas
coisas. Tenho 4 alunos, eles se encantam com estas coisas das tecnologias, da
máquina. Até porque eles têm os tablets e para eles quando chegam na escola
é uma festa, quando chega isso na sala de aula. Eles deixam de ser sujeitos
que dizem que não aprendem, para mostrarem que sabem. Que entendem. Que
sabem ligar, que sabem gravar. Então isso é bom para eles. Então eles se
tornam sujeitos realmente ativos no processo, e participativos (Entrevista,
Professora P02, 2021).
Os professores salientam que, muitas vezes, os alunos com deficiência passaram anos
frequentando as salas de aula sem serem alfabetizados e, ao completarem 15 anos, são enviados
à EJA com o parecer de que não aprendem. Migrar o aluno do campo do não aprendo para o
campo do estou aprendendo demanda do professor, entre outros aspectos, oferta de
experiências pedagógicas diferenciadas e recursos pedagógicos diversificados, entre os quais
podem estar inseridas as TDM.
O entendimento de que o uso das TDM contribui para desenvolver a autoestima do
aluno apresenta-se tão importante para os professores da EJA quanto “ensinar as letras”, visto
que os alunos desta modalidade de ensino são marcados por experiências escolares não exitosas,
por experiências de exclusão social decorrentes da não alfabetização ou baixa escolaridade e
pelo estigma de que não são capazes de aprender. De acordo com os professores, o uso das
TDM pode contribuir para o desenvolvimento da autoestima ao possibilitar o uso de estratégias
pedagógicas que permitam ao aluno experimentar outro modo de aprender, assim como
possibilita inserir a produção dos alunos nas atividades tornando-as significativas e fazendo
com que eles também se percebam como produtores do conhecimento.
A codificação dos dados indicou que o uso das TDM na EJA promove a convergência
de mídias, uma possibilidade significativa à estratégia didática dos professores. Essa
possibilidade compreende que as TDM permitiriam o uso de diferentes mídias em simultâneo
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(por exemplo, o uso da rede social, do YouTube, da plataforma Google e e-books) para uma
melhor compreensão/desenvolvimento de um tema, uma ação tão significativa à EJA, e que
muito impacta o seu processo de ensino e aprendizagem.
O entendimento de que o uso das TDM colabora com o professor para a produção
das atividades encontra-se entre os resultados mais representativos das entrevistas. Produzir
atividades relevantes, que dialoguem com as diferentes necessidades de aprendizagem,
presentes nas ecléticas turmas da EJA, configura um desafio ao professor desta modalidade de
ensino, principalmente se consideramos as turmas moduladas, que trazem em sua composição
a presença conjunta de alunos matriculados nos módulos I, II e III, com objetivos de
aprendizagens diferenciados.
As implicações do uso das TDM na produção de atividades estão também relacionadas
a duas significativas possibilidades. A primeira incide no fato do uso dessas tecnologias permitir
personalizar as atividades, uma contribuição importante quando considerados os diferentes
níveis de aprendizagem apresentados pelos alunos, as diferenças etárias geracionais e as
necessidades dos alunos com deficiência. A segunda contribuição resulta desse uso: favorece
a adaptação e desinfantilização das atividades.
Ao refletirem sobre o processo de ensino e aprendizagem na EJA, os professores
traziam, de forma recorrente, narrativas relacionadas à produção das atividades. Eles
enfatizavam o quanto o contexto pedagógico da EJA, particularmente nos módulos I, II e III,
requeria a realização de atividades diferenciadas. Em função disso, muitas vezes, utilizavam
atividades compartilhadas na escola por seus pares, faziam cópia de atividades presentes nas
coletâneas produzidas/vendidas para os professores e/ou pesquisavam atividades na rede
internet.
A esse modo de produção de atividades, para o desenvolvimento pedagógico na EJA,
são apresentados dois aspectos negativos. O primeiro diz respeito ao fato de muitas destas
atividades serem produzidas para o desenvolvimento pedagógico da criança, compostas por
textos e ilustrações do universo infantil. Estas, ao chegarem ao contexto da EJA, não
estabelecem diálogo com a vivência dos alunos e/ou reforçam o entendimento que a
alfabetização é uma competência da infância. O segundo, por terem foco no conteúdo, essas
atividades não respondem à necessidade do aluno da EJA, não contribuem para o uso dos
conteúdos aprendidos em suas demandas cotidianas.
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Ao inserirem as TDM no contexto da construção das atividades, os professores trazem
como significativa a possibilidade de realizarem edição das atividades compartilhadas na rede
e da possibilidade de poder compor suas próprias atividades utilizando as imagens, vídeos e
links também disponibilizados na rede. Essa última prática traz forte contribuição à adaptação
das atividades à linguagem e à realidade dos alunos da EJA e, por consequência, à
desinfantilização das atividades.
No entendimento dos professores entrevistados, observamos que o uso das TDM na EJA
colabora para diminuir as diferenças etárias-geracionais. Os professores mencionam que a
composição das turmas da EJA – formadas, em simultâneo, por jovens, adultos e idosos – requer
o desenvolvimento de um processo pedagógico que dialogue com diferentes expectativas e
ritmos de aprendizagem. E, para eles, mediante essa eclética composição das turmas da EJA,
desponta o desafio do professor “encontrar” interesses comuns aos alunos; identificar e
trabalhar temas que sejam relevantes ao grupo, fazendo-se necessário desenvolver estratégias
pedagógicas que minimizem as diferenças etárias-geracionais, que transformem as diferenças
em competências compartilhadas, visando à construção da aprendizagem.
Vejamos as considerações da Professora P05:
Quando vamos trabalhar com a cultura e coisas assim, as idades dos alunos
são diferenciadas, então cada um tem a sua parte, o seu conhecimento. Então,
podemos trabalhar, podemos ver alguns vídeos, que falem daquilo que o outro
vivenciou e que o mais novo pode não ter vivenciado. Por exemplo, no dia do
Halloween, fizemos um trabalho com as lendas urbanas de nossa cidade.
Então, muitos alunos já conheciam algumas lendas do cemitério, aí contaram
as lendas. Sabemos que Halloween é uma festa de fora, mas veio para cá e nós
comemoramos. Nós temos também essas lendas e muitos não conheciam.
Colocamos algumas lendas (como surgiram) colocamos os filmes e eles “ah,
eu conheço essa”. Então, quem não tinha o conhecimento acabou conhecendo
pelos colegas e pelos vídeos (Entrevista, Professora P05, 2021).
Os motivos que levam os jovens, os adultos e os idosos à escola da EJA, o que eles
buscam na escola, podem ser completamente diferentes em função da idade e da experiência de
vida. Do mesmo modo, os links que eles estabelecem entre os conteúdos são diferenciados
conforme a sua vivência.
As contribuições do uso das TDM para a diminuição das diferenças etárias-geracionais
podem ser consideradas a partir de dois exemplos. O primeiro, consiste em inserir as TDM, via
realização de podcast/videocast, no desenvolvimento de projetos sobre as experiências de vida
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visando o compartilhamento e a socialização das diferentes experiências vivenciadas pelo
eclético grupo etário-geracional de alunos. Por meio destas, os alunos poderem observar as suas
histórias se cruzarem e se distanciarem, estabelecendo um diálogo entre gerações. O segundo,
consiste em realizar o uso compartilhado dos tablets, chromebook e classmatePC e mobilizar o
trabalho coletivo entre os alunos; auxiliando-se na realização das pesquisas e síntese dos
resultados encontrados; apoiando-se na resolução das atividades e execução dos jogos; e
apoiando-se no uso técnico dos equipamentos.
Para além do diálogo etário-geracional, os exemplos destacados pelos professores
recaem sobre a visão de que o uso das TDM promove o envolvimento dos alunos, uma
implicação representativa entre os dados da pesquisa.
Os professores destacam que o uso das TDM na EJA tem como eixo central o desejo de
envolver os alunos no processo pedagógico. Envolvê-los de modo que gostem da escola e não
desistam, se sintam estimulados a aprender; instigados a superar os desafios referentes à
construção da alfabetização e capazes de aprender a ler e escrever. Promover o envolvimento
do aluno da EJA na escola é ressaltado pelas professoras como um desafio presente nas aulas
presenciais ou realizadas de forma remota.
A criação de grupo na rede social WhatsApp é relatada pelos professores como uma das
primeiras ações de uso das TDM na EJA, ação também realizada como propulsora do
envolvimento do aluno na escola e da manutenção do vínculo.
Os professores mencionaram que um dos motivos para o não envolvimento dos alunos
da EJA na escola são as ausências nas aulas em decorrência do trabalho, de não ter com quem
deixar os filhos, dos adoecimentos. Ausências que fazem com que os alunos percam a
continuidade na construção de sua aprendizagem, não estabeleçam vínculo entre o que
estudaram na aula em que compareceram e o que é discutido na aula presente.
O uso da rede social como estímulo ao envolvimento do aluno é compreendido a partir
da possibilidade do professor poder enviar atividades prévias, por exemplo, através do Google
Forms, para serem realizadas pelos alunos dentro de seus horários disponíveis, atividades que
possam subsidiar e promover maior participação dos alunos nas aulas, considerando ser muito
difícil os alunos terem horário para fazer a tarefa de casa.
Os professores apontam que muitos dos projetos realizados, seja no espaço da escola
(entre as turmas que a compõem), ou seja entre escolas, são estabelecidos a partir da orientação
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da equipe pedagógica da rede de ensino, sendo vivenciados em coletivo. Nesse sentido, o uso
das TDM propicia o desenvolvimento de projetos em rede, principalmente no que tange à
socialização de materiais que auxiliem no desenvolvimento desses projetos. Por meio destas
tecnologias, as escolas, os grupos-classes, os professores e os alunos poderiam compartilhar
recursos, produções realizadas e aprendizagens construídas e, assim, trocarem experiências
significativas ao processo de ensino e aprendizagem na EJA.
Para os professores, o uso das TDM na EJA favorece a comunicação com os diferentes
contextos sociais, uma possibilidade que se amplia quando se pensa o compartilhamento entre
classes/grupos/redes. Na visão dos professores, os alunos da EJA consideram que serem
capazes de fazer uso de tecnologias que lhes permitam ter acesso à informação, fazer uso de
serviços, comunicar-se, aceder benefícios e construir conhecimento representa ampliar o
exercício da cidadania e interagir com contexto sociais, nos quais a linguagem das tecnologias
se faz prevalente, uma significativa implicação à construção da multiterritorialidade.
6 O SENTIDO DE PERTENCIMENTO
O pertencimento tecnológico vem do sentimento de pertença, da ação de pertencer, de
compreender que um espaço/lugar/objeto nos pertence e que podemos pertencer a esse
espaço/lugar/objeto. O sentimento de pertencimento das TDM aos sujeitos que compõem a EJA
e ao contexto pedagógico da EJA resulta de uma construção que dialoga com o sentimento de
não pertencimento, de exclusão. O que faz algo ou alguma coisa não pertencer pode estar nos
desafios que se colocam a esse pertencimento ou nos condicionantes atribuídos.
O pertencimento tecnológico chega ao contexto da EJA indagando se há este sentimento
de pertencimento das TDM em relação à EJA, ao professor da EJA e ao aluno da EJA. Em
relação ao sentimento de pertença à EJA, os professores afirmam que esse sentimento de
pertencimento tecnológico à EJA não configura uma realidade consolidada. Por exemplo,
ressaltam que as tecnologias pertencem à escola do dia, que a noite “tudo é trancado” e que o
acesso aos recursos tecnológicos demanda agendamento e negociação, um entendimento que
vem em conjunto com a compreensão de que as tecnologias na EJA são para uso em eventos,
nas culminâncias e nas comemorações, colocando-se distanciadas do uso cotidiano e da
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construção da prática pedagógica desta modalidade de ensino. Inclusive, o acesso às
tecnologias configura um dos desafios pertinentes ao uso das TDM na EJA.
Algumas vezes a resistência é por causa da idade, porque as pessoas não
conhecem, né? Mas nem sempre é só idade, às vezes, é essa questão mesmo
de achar que não pode. Que não tem condições. Porque eles vêm de um
histórico de dificuldade de aprendizagem. Então, muitos ouviram muito na
vida que eram burros, que não tinham condição, que nunca iam aprender.
Então tem essa relação também, de achar que não tem condições de fazer
aquilo, que aquilo é coisa “pra gente inteligente” (Entrevista, Professora P12,
2021).
Em relação ao sentimento de pertencimento das tecnologias ao professor,
identificamos que esta construção se dá no campo pessoal e no campo profissional/pedagógico.
Três dos professores entrevistados salientaram não terem muitas habilidades tecnológicas e
pouco utilizarem as redes sociais. Observamos que o sentimento de pertencimento tecnológico
do professor perpassa por, além do uso pessoal que ele faz das tecnologias, ele sentir-se
competente para realizar a transposição didática fazendo uso das tecnologias.
O sentimento de pertencimento tecnológico do aluno da EJA se constrói pelo acesso
às tecnologias, pela permissão de uso das tecnologias, pelo entendimento de que ele é capaz de
fazer uso das tecnologias e pelo uso realizado.
As TDM também trazem consigo o uso da rede internet como um direito e, mesmo que
teoricamente, a possibilidade da realização de uma ação pedagógica baseada no pressuposto da
mobilidade, da conectividade e ubiquidade, sentidos que colocam o território da escola em
movimento.
A construção da Multiterritorialidade dialoga diretamente com o sentido de
pertencimento, o perpassar por entre múltiplos território, o territorializar-se. O reconhecer-se
como todo e como parte traz enraizado o sentido de pertencimento, seja ele no território
concreto ou no território simbólico.
As tecnologias são chamadas ao território da EJA, principalmente vinculadas à
possibilidade de favorecer aos sujeitos a ampliação do exercício da cidadania, a inclusão social,
a Aprendizagem ao Longo da Vida e o desenvolvimento de habilidades que promovam maior
interação com a sociedade da informação e do conhecimento. Mas, é importante ressaltar que
a possibilidade do encontro entre o território da EJA e o território das TDM não configura
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unanimidade por seus sujeitos, podendo ser considerado um encontro necessário ou um
encontro permeado por muitos desafios e impossibilidades.
Refletir as TDM no espaço pedagógico perpassa os significados atribuídos à inserção
e ao uso dessas tecnologias nas práticas pedagógicas. A inserção e o uso são conceitos que
podem ser compreendidos de forma relacionada, mas não são sinônimos. Inserir uma tecnologia
pode ser compreendido como colocar à disposição. Usar uma tecnologia configura exercer
uma ação sobre. A inserção conversa com o campo das perspectivas. O uso com o campo da
prática. A inserção encontra-se relacionada à motivação. O uso tem relação direta com a ação
sistematizada. A inserção é a chegada ao território, o uso é o tornar-se território.
A inserção e o uso das TDM na sala de aula da EJA demandam conhecimento técnico e
capacidade de adequação aos objetivos pedagógicos. Em outras palavras, não é algo
espontâneo. O uso pessoal e social que os professores fazem dessas tecnologias pode contribuir
para refletir sobre a sua inserção no contexto pedagógico, mas não habilita para a realização
deste uso pedagógico.
O uso das TDM se coloca como transversal à prática pedagógica da EJA, podendo
dialogar com todos os módulos que englobam esta modalidade de ensino, contribuindo
particularmente com as turmas denominadas moduladas/multisseriadas/multietapas que estão
presentes na realidade da EJA e têm como característica a composição de grupo-classes
formados por mais de um módulo. O uso das TDM pode colaborar com o ensino e a
aprendizagem, por oportunizar o acesso à informação, favorecer a comunicação e possibilitar a
realização de pesquisa e construção de projetos didáticos.
A multiterritorialidade se configura pela multiplicidade de sentidos presentes no
encontro do território da EJA com o território das TDM. Abrange o entendimento de que um
território não anula o outro, pelo contrário, eles conversam e convivem em simultâneo. De certo
não significa dizer que a multiterritorialidade pressupõe a falta de tensão ou a plena harmonia
de convivência entre os territórios. Pelo contrário, a multiterritorialidade implica a dinâmica
entre forças com movimentos distintos, por vezes, lócus de conflito de territórios simbólicos
instituídos.
Perpassa, inclusive, pelo uso significativo das tecnologias no processo pedagógico e de
uma visão crítica acerca deste uso, como bem ressalta Freire:
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A compreensão crítica da tecnologia, da qual a educação de que precisamos
deve estar infundida, e a que vê nela uma intervenção crescentemente
sofisticada no mundo a ser necessariamente submetida a crivo político e ético.
Quanto maior vem sendo a importância da tecnologia hoje tanto mais se
afirma a necessidade de rigorosa vigilância ética sobre ela. De uma ética a
serviço das gentes, de sua vocação ontológica, a do ser mais e não de uma
ética estreita e malvada, como a do lucro, a do mercado (Freire, 2014, p. 117118).
Compreendemos que mais do que um encontro entre territórios, o diálogo entre as TDM
e a EJA se dá em um encontro de territórios em movimento. Em um processo de
desterritorialização e reterritorialização que envolve a construção de territórios múltiplos no
sentido da construção da multiterritorialidade, perpassando a construção de territórios
conectados em espaços/tempos diversos, de território-rede.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos o presente artigo ressaltando que o encontro das TDM com a EJA não se
concretiza na desterritorialização de um dos seus territórios. Consiste em um encontro
permeado de identidades/individualidade que se mantêm, que caminha no sentido da construção
de uma multiterritorialidade, podendo, inclusive, abranger uma territorialização via
ciberespaço, permeada pelos sentidos de fluxos e redes.
Como mencionado, nossa reflexão parte do encontro territorial das TDM com a EJA a
partir do território da EJA escolarizada, do território da escola. Compreendemos que a escola
representa apenas um dos múltiplos lócus que compõem esta modalidade de ensino, assim como
compreendemos que a EJA não escolarizada, não pertencente à escola, possui itinerários
diversos, ocupa diferenciados espaços geográficos, comunica-se com os mais diferenciados
saberes e necessidades de aprendizagem. Mas, consideramos que os elementos representativos
da multiterritorialidade, resultante do encontro das TDM com a EJA escolarizada, também se
estendem aos demais lócus que acolhem a EJA.
As implicações do uso das TDM na EJA, refletidas como indicativos à construção da
multiterritorialidade, são componentes pertinentes à EJA independente do seu lócus de atuação,
visto que ampliar a participação dos sujeitos na sociedade, desenvolver a autoestima, realizar
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aprendizagens que tenham significados reais são objetivos que se colocam efetivamente a esta
modalidade de ensino.
Para os professores participantes das entrevistas, a multiterritorialidade traz, em si, o
desejo de que o encontro, entre múltiplos territórios, resulte no compartilhamento de saberes e
ações que favoreçam a construção de um multipertencimento territorial, seja ele físico ou
simbólico.
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Recebido em: 09/04/2023
Aprovado em: 29/08/2023
Publicado em: 30/09/2023
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional
que permite o uso irrestrito, distribuição e reprodução em qualquer meio, desde que a obra original seja
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