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Pinóquio de Del Toro: marionetes, filosofia e fascismo

2024, Insólita

Pinóquio por Guillermo del Toro é a nova maneira que o diretor mexicano encontrou de contar a história que se tornou clássica pela animação da Disney (Pinocchio, Hamilton Luske & Ben Sharpsteen. EUA, 1940).

ANO 3 VOL. 3 NÚMERO 2 JANEIRO – JUNHO 2023 Pinóquio de Del Toro: marionetes, filosofia e fascismo Murilo Bronzeri1 Cartaz do filme Pinocchio (2022) Pinóquio por Guillermo del Toro é a nova maneira que o diretor mexicano encontrou de contar a história que se tornou clássica pela animação da Disney (Pinochio, Hamilton Luske & Ben Sharpsteen. EUA, 1940). Dessa vez, o filme é feito em animação stop motion e distribuído pela Netflix. Além disso, é codirigido por Mark Gustafson. Sem aprofundar as comparações com as outras adaptações da história, uma diferença que se observa de imediato é que o filme de Del 1 Murilo Bronzeri é Mestre em Comunicação pelo PPGCOM da Universidade Anhembi Morumbi, e também é graduado em Rádio, TV e Internet pela mesma universidade. E-mail: [email protected] ANO 3 | VOLUME 3 | NÚMERO 2 | JANEIRO – JUNHO 2023 Toro/Gustafson possui uma abordagem menos infantil: vê-se, já de início, uma trágica história de como o carpinteiro Geppetto perde seu filho, Carlo, e se afunda na depressão e no alcoolismo, até que um dia ele cria, a partir da árvore nascida da pinha perfeita que Carlo morreu tentando salvar, o boneco de madeira a quem dá o nome de Pinóquio. O filme ainda traz outras singularidades, como as duas criaturas místicas, interpretadas por Tilda Swinton, que tomam o lugar da antiga fada madrinha. Porém, outra diferença perceptível, e que também revela uma abordagem mais adulta, é a ambientação do filme no contexto da Itália fascista. É até possível, agora, falarmos de uma trilogia antifascista de Guillermo Del Toro, já que, além desse filme, o diretor já abordou o tema em O Labirinto do Fauno (2007) e A Espinha do Diabo ( ), que se passam na Espanha de Franco. Além do próprio Geppetto reprovar a guerra, outro ponto da crítica ao fascismo presente na animação é a apresentação musical de Pinóquio a Benito Mussolini (um dos personagens da história), em uma passagem que ridiculariza a patacoada fascista. Mas Pinóquio por Del Toro também traz reflexões existenciais, por meio das quais medita sobre a vida e a morte, já que o boneco-menino, nessa versão, pode morrer e também renascer quantas vezes quiser, desde que espere um tempo que aumenta pouco a pouco a cada experiência de morte. No entanto, como nos lembra muito bem a personagem mística de Tilda Swinton, viver para sempre significaria que Pinóquio veria a todos que ama morrerem – e é exatamente a perspectiva da morte que traz o sentido para a vida humana na Terra. Os pontos positivos do filme não param por aí. O visual também é belamente construído, em uma mistura de CGI e stop motion, sem deixar de trazer o que Del Toro sempre fez com maestria: explorar elementos de horror, o bizarro, o feio, o estranho. E sempre com incrível sensibilidade. O elenco também merece um comentário à parte. Além de Tilda Swinton, a obra conta ainda com os talentos de Gregory Mann, Ewan McGregor, David Bradley, Christoph Waltz, Ron Perlman, Finn Wolfhard, Cate Blanchett, Burn Gorman, John Turturro, Tim Blake Nelson e Tom Kenny. Em suma, Pinóquio por Del Toro é uma obra-prima. O filme reinventa uma história clássica, imprimindo elementos autorais do diretor, com o esmero característico de sua filmografia. Triste para a Disney, que lançou sua versão em live action de Pinóquio no mesmo ano (Pinocchio, Robert Zemeckis, EUA, 2022). Isso porque o filme de Robert Zemeckis, não obstante o talento do diretor, não chega aos pés da criação de Del Toro. Ficha técnica Título: Pinóquio por Guillermo del Toro Ano: 2022 Duração: 117 minutos Direção: Guillermo del Toro; Mark Gustafson Roteiro: Guillermo del Toro; Patrick McHale; Carlo Collodi 86