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sábado, junho 29, 2019

THE HONEY POT (1967)

O PERFUME DO DINHEIRO
(CHARADA EM VENEZA)
Um Filme de JOSEPH L. MANKIEWICZ



Com Rex Harrison, Susan Hayward, Cliff Robertson, Capucine, Edie Adams, Maggie Smith, Adolfo Celi, etc.


EUA-ITÁLIA / 132 min / 
COR / 16X9 (1.85:1)



Estreia na GRÃ-BRETANHA (Londres) a 21/3/1967
Estreia nos EUA (Nova Iorque) a 22/5/1967
Estreia em MOÇAMBIQUE (LM, Teatro Manuel Rodrigues) a 23/12/1967



"The Honey Pot / O Perfume do Dinheiro" baseia-se, em princípio, no Volpone de Ben Johnson, dramaturgo contemporâneo de Shakespeare. Por Volpone começa aliás: num teatro de Veneza, Mr. Cecil Fox (Rex Harrison) assiste à representação privada da farsa de Johnson, durante a qual Volpone e o seu criado Mosca resolvem simular a morte do primeiro para assim enganar os herdeiros. Na peça, Volpone acaba por ser enganado pelo cúmplice, que, aproveitando-se do testamento, acaba por receber a herança e desalojar o proprietário. No filme, Mr. Fox não acaba sequer de assistir à representação, que interrompe a meio do terceiro acto. No seu palácio veneziano, irá também Mr. Fox simular a sua morte, convidando para assistir aos seus últimos minutos, três mulheres outrora ligadas à sua vida: uma princesa, Dominique (Capucine), uma actriz de Hollywood, Merle McGill (Edie Adams), que ele próprio fez subir na vida, e uma americana milionária, Mrs. Sheridan (Susan Hayward), que se vem a saber depois tratar-se da sua legítima mulher. Para o papel de Mosca (criado e confidente), Mr. Fox escolhe um actor desempregado de nome William McFly (Cliff Robertson). Distribuídos os papéis e planeado o argumento, corre o pano e inicia-se a acção: diz Mr. Fox que pretende, através desta comédia palaciana, saber até que ponto o dinheiro influi na vida das pessoas, até que ponto uma possível herança pode alterar um comportamento. Não iremos aqui revelar o evoluir dos acontecimentos (até para respeitar quem nunca assistiu ao filme); diremos simplesmente que poucas vezes se nos tem deparado um argumento (da autoria do próprio Mankiewicz, e baseado na novela de Thomas Sterling e na peça de Frederick Knott) tão bem construído, tão inteligentemente urdido, tão ardilosamente desenvolvido.


Até cerca do intervalo, o filme desenrola-se definindo as personagens e fazendo engrenar as diferentes peças do mecanismo posto a girar pela vontade de Mr. Fox. Depois, assistimos então a uma encarniçada luta pelo dinheiro. Cada uma das três pretendentes oferece a Mr. Fox um relógio. A princesa traz uma ampulheta que, em vez de areia, tem no seu interior ouro em pó; a actriz, um relógio múltiplo, marcando as horas simultâneamente em diversas cidades do mundo; a terceira, uma relíquia outrora comprada pelo próprio Mr. Fox. No quarto do hipotético moribundo faz-se ouvir portanto o tic-tac ritmado que assinala as horas de espera dos abutres, que anseiam por se lançar sobre a vítima. A presença do tempo, como realidade física, e a única coisa que tem realmente valor na vida de todos nós, é outra das virtudes desta obra, atravessada de ponta a ponta por um humor negro e muitas vezes cruel.


Costuma dizer-se que uma obra de arte é um todo indestrutível. Pelo menos para a verdadeira obra de arte torna-se capcioso tentar destrinçar aspectos de uma mesma realidade que o artista pensou e realizou em simultaneidade. E o filme de Mankiewicz volta a provar-nos a justeza dessa premissa. Pensado como obra, "The Honey Pot" impõe-se como obra, completa, perfeita, acabada. Tudo se conjuga para que assim seja. Os décors sumptuosos de palácios venezianos (da autoria de Boris Juraga e Paul S. Fox), o granulado admirável de uma fotografia colorida sem igual (último trabalho de um dos maiores fotógrafos de todos os tempos, Gianni di Venanzo, que faleceu precisamente enquanto rodava este filme), a elegância e a maleabilidade de uma mise-en-scène pensada em função dos personagens e ambientes definidos, tudo conjugado por Mankiewicz adquire uma tonalidade muito pessoal, um significado de verdadeira obra de auteur.


Na interpretação há a destacar um conjunto de actores inultrapassáveis de intenção e rigor. Rex Harrison não é só o actor que nós já conhecíamos, sobretudo de "My Fair Lady"; Cliff Robertson descobre-se numa figura notável de composição; Susan Hayward mostra-nos como o passar dos anos não tem qualquer importância quando se trata de talento puro; Edie Adams é a actriz histérica e nevrótica que Hollywood formaria certamente no seu seio; Capucine possui o charme de uma verdadeira princesa e o talento de uma grande actriz; e que dizer da magnífica Maggie Smith, aqui uma jovem actriz de 32 anos e ainda nos inícios da sua longa e brilhante carreira? Finalmente, Adolfo Celi é o rival italiano de Perry Mason, cuja presença se torna imprescindível para a completa compreensão da comédia. "The Honey Pot" é na verdade, e ainda hoje, uma película admirável, de tal modo rica, exuberante, explosiva, simultâneamente divertida e cruel, elegante e brutal, irredutível a esquemas e convenções que, por muito que tentemos tudo dizer, muito haveria sempre a dizer. Mas não será, afinal, esta uma forma de lhe rendermos homenagem? 


LOBBY CARDS:


sexta-feira, maio 27, 2016

THE PINK PANTHER (1963)

A PANTERA COR-DE-ROSA
Um filme de BLAKE EDWARDS


Com David Niven, Peter Sellers, Robert Wagner, Capucine, Claudia Cardinale, Fran Jeffries

EUA / 115 min / COR / 
16X9 (2.35:1)

Estreia na RFA a 19/12/1963
Estreia na GB a 7/1/1964
Estreia nos EUA a 18/3/1964
Estreia em PORTUGAL a 17/12/1964



Sempre que assisto a este filme é como saborear um delicioso pitéu. Nada de muito condimentado, apenas uma pequena iguaria que serve para me confortar o estômago e deixar saciado (e feliz) para o resto do dia. “The Pink Panther” vê-se com um sorriso permanente nos lábios, independentemente do número de vezes que já acompanhámos as inenarráveis peripécias do desastrado Clouseau. Foi a primeira vez que a hoje célebre personagem foi apresentada ao grande público e o sucesso não poderia ter sido mais inesperado.

Com efeito, quando o filme foi idealizado, a figura principal apontava para Sir Charles Lytton, requintado ladrão de jóias conhecido pelo “Fantasma” (David Niven), cujas aventuras teriam neste filme o seu início. Mas não houve qualquer sequela; e tudo por causa do extraordinário desempenho de Peter Sellers que, não contente em ter roubado as melhores cenas do filme, ainda por cima deu ao mundo do cinema uma das suas personagens mais queridas. O inspector Clouseau tinha vindo para ficar e Sellers vestiu-lhe a pele em mais quatro filmes, de valor cinéfilo variável mas todos eles recheados de cenas de antologia: “A Shot in the Dark” (1964), “The Return of the Pink Panther” (1975), “The Pink Panther Strikes Again” (1976) e “The Revenge of the Pink Panther” (1978).

Em 1982, dois anos após a morte do actor, seria estreado “The Trail of the Pink Panther” em que, numa indecorosa acção de marketing, foram usadas algumas sequências inéditas, rodadas para os anteriores filmes mas que não tinham sido usadas nas montagens finais. O actor Alan Arkin interpretaria também a personagem de Clouseau num filme de 1968 (“Inspector Clouseau”), do mesmo modo que Steve Martin, este já neste século: “The Pink Panther” (2006) e “The Pink Panther 2” (2009), ambos filmes perfeitamente escusados e que só vieram mostrar, uma vez mais, a política oportunista e gananciosa dos estúdios norte-americanos, evidenciada nas duas décadas anteriores com mais dois filmes onde a célebre personagem foi também alvo de uma abusiva apropriação: “The Curse of the Pink Panther” (1983) e “Son of the Pink Panther” (1993).

Mas regressemos a este primeiro e refrescante filme da série. Para além do brilhantismo de Sellers e do bom desempenho de todos os restantes actores (belissima Claudia Cardinale, sensual e desconcertante Capucine e o sempre fleumático David Niven interpretando-se a si próprio) “The Pink Panther” está impregnado de um humor delicioso, com sequências inesquecíveis, que tornaram o filme numa clássica comédia de Hollywood (apesar de rodada inteiramente em Itália) e dos anos 60 em particular. Recordemos apenas duas delas: a passada no quarto de Clouseau e da sua idolatrada Simone, onde diversas peripécias se sucedem a um ritmo de puro vaudeville, a lembrar os antigos filmes dos Irmãos Marx; e a louca perseguição em quatro viaturas (de todos atrás de todos, incluindo gorilas siameses  e uma tresloucada zebra) após o baile de máscaras, que culmina num espalhafatoso choque frontal presenciado por um seráfico habitante da praceta local – um momento indescritível de puro nonsense e burlesco.

Foi neste filme que, de um momento para o outro, nasceu a conhecida alquimia entre Sellers e Blake Edwards (um "amor à primeira conversa", entre dois homens que até então nunca se tinham visto, mas que rapidamente descobriram uma infinidade de gostos e paixões comuns), a qual viria a dar frutos no futuro: para lá das sequelas da Pantera cabe aqui referir o hilariante “The Party” (1968), que pessoalmente considero o apogeu da dupla. Neste “The Pink Panther” a revelação Sellers estilhaçou por completo o argumento original, dando azo a um vendaval de improvisações para gáudio de todos os intervenientes nas filmagens, quer fossem actores ou elementos da equipa técnica. Ao mesmo tempo que finalizava o filme, Edwards já se encontrava a reescrever todo o guião de “A Shot in the Dark”, de modo a conferir à personagem de Clouseau o foco principal. É por isso que muita gente considera esse segundo filme como o “verdadeiro” arranque da personagem.

Seja como for, “The Pink Panther” permanece, quase 50 anos depois, uma comédia brilhante e espirituosa em todas as suas variantes (veja-se por exemplo o "número musical" onde Fran Jeffries interpreta em italiano a canção "Meglio Stasera" - ver videoclip abaixo - ou a sensual sequência de Niven e Cardinale, com esta completamente embriagada e deitada no tigre de tapeçaria), que teve a sorte de incluir a comicidade fulgurante de Peter Sellers, evidenciada sobretudo na interacção de Clouseau com os adereços do plateau. É na mímica, na gestão do espaço à sua volta, no sentido de ritmo e sobretudo nos silêncios que o génio do actor melhor se manifesta. Já para não falar na incrível pronúncia, que viria a ser ainda melhor trabalhada nos filmes seguintes (recorda-se que uma das especialidades do actor, desde os tempos da rádio e do Goon Show, programa televisivo transmitido entre 1951 e 1960, era a imitação de vozes de personalidades conhecidas) ou naquela absurda mas indefectível postura, impregnada da maior das dignidades.

De referir ainda a belissima fotografia, que confere a “The Pink Panther” um visual magnífico, sobretudo em toda aquela primeira parte rodada na estância de desportos de inverno da Cortina D’Ampezzo, em Itália - a paisagem coberta de neve confere um atractivo suplementar ao filme, adicionando-lhe um esplenderoso glamour. Bem como a partitura musical, assinada por Henry Mancini, e cujo tema principal se tornou instantaneamente num verdadeiro clássico. Não só como identificativo de toda a série mas sobretudo do desenho animado da pantera cor-de-rosa, que faz a sua estreia absoluta no fabuloso genérico. Tal como Clouseau, que iniciou aqui a sua história, o cartoon criado por Friz Freleng e David H. DePatie ganharia vida própria dando origem a centenas de desenhos animados.

CURIOSIDADES:

- Peter Ustinov foi o actor inicialmente escolhido para interpretar o inspector Clouseau. A sua injustificada ausência nos primeiros dias de filmagens em Roma (que levou os produtores a processá-lo) foi a razão pela qual Peter Sellers conseguiu o papel. Capucine também não foi uma primeira escolha: Ava Gardner e Janet Leigh recusaram entrar no filme – a primeira por desacordo quanto ao salário e a segunda por se ter casado recentemente (pela quarta vez) e não querer interromper a lua-de-mel.

- Claudia Cardinale não sabia falar inglês, pelo que foi dobrada em todas as cenas por Gale Garnett.

- Na cena da banheira com Capucine e Robert Wagner, o forte ingrediente usado para a abundante espuma provocou queimaduras nos dois actores. Wagner, que chega a estar completamente imerso durante longos segundos, acabou por ter problemas de visão, ficando praticamente cego durante cerca de três semanas.




Para os interessados disponibiliza-se aqui a banda-sonora original: