Brasília: Sinfonia da Alvorada
Brasília: Sinfonia da Alvorada é um poema sinfônico composto por Antônio Carlos Jobim com letra de Vinícius de Moraes em 1959 celebrando a inauguração da nova capital do Brasil em 1960, Brasília. A obra é dividida em 5 movimentos, nos quais são discorridos diferentes temas como a paisagem do planalto central anterior à construção, a chegada do homem a fim de fundar a cidade, a chegada dos trabalhadores, o processo de construção da cidade e por fim, um canto de exaltação à nova cidade.
Composição
[editar | editar código-fonte]No contexto nacional, ambos os cenários político e artístico estavam em profundas mudanças, ocasionadas pela política de Juscelino Kubitschek de "50 anos em 5", a qual trouxe rápida industrialização ao Brasil. A criação da Bossa nova, e a nova capital, eram alguns dos símbolos do período de modernização pelo qual o Brasil passava.
A ideia da composição surgiu em 1958, idealizada pelo arquiteto de Brasília, Oscar Niemeyer. A obra seria apresentada num espetáculo com sons e luzes, ao modo europeu, sendo inclusive contratados técnicos da francesas da empresa Clemançon, referência na época. Tom Jobim iniciou a composição, porém desistiu após insinuações de que seria uma encomenda do então presidente Juscelino Kubitschek.[1]
Em setembro de 1959, Vinicius e Tom foram convidados por JK para conhecerem a futura capital, e ambos ficaram dez dias hospedados no Catetinho, então residência oficial do presidente. Lá, puderam entrar em contato com a fauna, a flora e a paisagem da região. Além do poema sinfônico, a canção "Água de beber" foi composta durante a estadia dos artistas na residência, que também era conhecida como "Palácio de Tábuas".[2] O poema sinfônico foi completado por Tom Jobim em sua casa, que preferiu ir a Brasília a fim de conhecer o clima e a paisagem apenas, alegando ali ser o lugar mais antigo da Terra.
Vinicius tomou tanta feição pelo Catetinho, que pediu que Oscar Niemeyer desenhasse uma casa no mesmo estilo para ele no Rio de Janeiro.
Apresentação e gravação
[editar | editar código-fonte]Oscar Niemeyer planejava a estreia mundial da obra no dia 21 de abril de 1960, data da inauguração de Brasília, o que não ocorreu. Ficou decidido que a peça teria sua primeira apresentação nas comemorações de 7 de setembro em Brasília, fato que também não veio a se concretizar devido aos altos gastos que seriam necessários e possíveis escândalos de corrupção envolvendo a construção da cidade, incluindo o espetáculo da empresa francesa.
A obra teve sua primeira gravação em novembro de 1960, com o próprio Vinicius recitando o texto. O disco foi lançado em fevereiro de 1961. A primeira apresentação do poema sinfônico ocorreu apenas em 1966 na TV Excelsior. A peça só veio a estrear em Brasília no ano de 1986, seis anos após a morte de Vinicius, na Praça dos Três Poderes. A orquestra foi regida por Alceu Bocchino, com Susana Moraes, filha de Vinicius, fazendo a leitura. Contou também com a presença do maestro e compositor Radamés Gnattali, que havia também participado da gravação em 1960.[3]
Movimentos
[editar | editar código-fonte]1. O Planalto Deserto
[editar | editar código-fonte]Na primeira página da partitura deste movimento, o compositor escreve “O Ermo”, “O Lugar mais velho do mundo”, “O Fundão”, “O Agreste”, “O Desolado”, buscando conferir sentido de um local primitivo, inóspito e desabitado. A fim de retratar a natureza, o movimento também contém sons de pássaros, não só por meio de representações nos instrumentos como também valendo-se do uso de apitos específicos que emitem sons similares aos de perdizes e jaós. O texto lido, faz referências às bandeiras, citando bandeirantes como Borba Gato, Anhanguera e Fernão Dias, citando a violência com as quais lidavam com os indígenas e a marcha para o oeste, projeto idealizado por Getúlio Vargas a fim de povoar a região central do país. Cita três rios importantes na história do país, Amazonas, São Francisco e Prata. Por fim, faz referência ao Cruzeiro do Sul.
“ | No príncipio era o ermo/Eram antigas solidões sem mágoa.O altiplano, o infinito descampado/No princípio era o agreste:O céu azul, a terra vermelho-pungente/E o verde triste do cerrado.Eram antigas solidões banhadas/De mansos rios inocentes/Por entre as matas recortadas./Não havia ninguém. A solidão/Mais parecia um povo inexistente/Dizendo coisas sobre nada. | ” |
2. O homem
[editar | editar código-fonte]Neste movimento, os ostinatos exercem a função de retratar a marcha dos homens ao planalto central. O movimento retrata o contato do homem com a hostil paisagem já descrita. Vinicius, valendo-se das palavras de Lúcio Costa, cita "nascida do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos que se cruzam em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal da cruz", referindo-se ao Plano Piloto de Brasília, no qual dois eixos se juntam, assemelhando-se a uma cruz. Tom Jobim utilizou também de melodias e ostinatos de canções anteriores como "Caminho de pedra", "Senhora Dona Bibiana" e "Cai a tarde"
3.A chegada dos Candangos
[editar | editar código-fonte]Nesse movimento, a ideia de uma marcha continua a ser exposta, mesclada a elementos de ritmos como o baião, em referência as regiões norte e nordeste, locais de onde vieram a maior parte dos trabalhadores, denominados "Candangos". Tal fato também é reforçado pela frase "sobretudo do norte", repetida algumas vezes. Então, no texto é lido uma sequência de cidades, demonstrando a diversidade de locais dos quais os candangos eram provenientes.
4.O trabalho e a Construção
[editar | editar código-fonte]Nesse movimento, o texto, faz uma contemplação à arquitetura, bem como ao trabalho. Retrata a tristeza e solidão dos candangos, que deixaram suas família a fim de trabalharem na construção da cidade, com condições precárias. O texto, traz dados sobre a construção, citando a quantidade de brita, madeira, cimento que foram necessárias para a construção. É também exposto o "tema do Palácio do Planalto", no qual o compositor utiliza a família dos metais com o intuito de dar um uma sensação épica e um tema militar, aludindo ao fato de tal palácio ser a residência oficial do presidente da república.
5. Coral
[editar | editar código-fonte]O último movimento é um canto de exaltação a cidade e uma comemoração ao trabalho completo e uma nova era que se iniciava no Brasil. Palavras de Juscelino Kubitschek estão presentes no texto lido por Vinicius. Há novamente um ritmo de baião. Há uma referência a "Aquarela do Brasil" de Ary Barroso, incitando um "Brasil brasileiro", descrito por Jobim como “herdeiro de todas as culturas e de todas as raças, guarda um sabor todo próprio." [4]
Referências
- ↑ Braziliense, Correio; Braziliense, Correio (21 de abril de 2013). «Jogo mostra verdades e mentiras sobre a composição da Sinfonia da Alvorada». Correio Braziliense. Consultado em 2 de agosto de 2020
- ↑ «EBC». memoria.ebc.com.br. Consultado em 2 de agosto de 2020
- ↑ «Concerto recupera "Sinfonia de Brasília" - Cultura». Estadão. Consultado em 2 de agosto de 2020
- ↑ ROSADO, Clairton. Brasília - Sinfonia da Alvorada: Estudo dos Procedimentos Composicionais da Obra Sinfônica de Tom Jobim. São Paulo, 2008. 141 f. Dissertação (Mestrado em Música) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo.