Régio e Autopsicografia - 31.10.24

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Notas sobre José Régio

- Autor de primeira tese académica sobre a poesia modernista portuguesa: As correntes e


as individualidades na moderna poesia portuguesa, 1925
- Receção permanente, nas páginas da revista Presença (1927-1940), de que foi fundador,
juntamente com João Gaspar Simões e Branquinho da Fonseca, das obras do primeiro
modernismo, em particular de Pessoa e Sá-Carneiro
- João Gaspar Simões acompanha Régio nesta receção inicial do primeiro modernismo,
publicando os volumes de ensaios Temas (1929) e O Mistério da Poesia (1931), a respeito
deste último livro trava-se uma polémica entre Simões e António Sérgio nas páginas da
revista presença, em que Sérgio acusa Simões de menosprezar a racionalidade na criação
poética; proximidade inicial e posterior afastamento de Miguel Torga; Adolfo Casais
Monteiro publica os seus ensaios mais tarde, a partir dos anos 40
- Trabalho ensaístico e de crítica literária muito relevante, sobre Camões, Camilo, Florbela,
Sá-Carneiro, Pessoa, Botto, Antero, Cesário Verde, entre outros (reunido principalmente
em Ensaios de Interpretação Crítica, INCM, 2009) Textos programáticos muito relevantes na
definição do programa da revista Presença: “Literatura Viva”, n.º 1, 1927 e “Literatura
Livresca e Literatura Viva”, n.º 9, 1928
- Outros poetas da Presença são inspirados por esta índole programática da revista:
Branquinho da Fonseca, Edmundo de Bettencourt, Miguel Torga, Francisco Bugalho, Adolfo
Casais Monteiro, entre outros (ver A Poesia da Presença, Estudo e Antologia, org. Adolfo
Casais Monteiro, Lisboa: Cotovia, 2003 (1.ª ed. 1959))
- Poeta, ensaísta, ficcionista e dramaturgo; primeiro romance, Jogo da Cabra-Cega, de
1934, trata a figura do duplo e a problemática identitária, na herança de Sá-Carneiro
Em arte, é vivo tudo o que é original. É original tudo o que provém da parte mais virgem,
mais verdadeira e mais íntima duma personalidade artística. A primeira condição duma
obra viva é pois ter uma personalidade e obedecer-lhe. (…) A excentricidade, a
extravagância e a bizarria podem ser poderosas – mas só quando naturais a um dado
temperamento artístico. Sobre estas qualidades, o produto desses temperamentos terá o
encanto do raro e do imprevisto. Afetadas, semelhantes qualidades não passarão dum
truque literário. (…) Pretendo aludir nestas linhas a dois vícios que inferiorizam grande
parte da nossa literatura contemporânea, roubando-lhes esse carácter de invenção, criação
e descoberta que faz grande a arte moderna. São eles: a falta de originalidade e a falta de
sinceridade. (…) Eis como tudo se reduz a pouco: Literatura viva é aquela em que o artista
insuflou a sua própria vida, e que por isso mesmo passa a viver de vida própria.
Sendo esse artista um homem superior pela sensibilidade, pela inteligência e pela
imaginação, a literatura viva que ele produza será superior; inacessível, portanto, às
condições do tempo e do espaço. E é apenas por isto que os autos de Gil Vicente são
espantosamente vivos, e as comédias de Sá de Miranda irremediavelmente mortas; que
todos os livros de Judith Teixeira não valem uma canção escolhida de António Botto; que os
sonetos de Camões são maravilhosos, e os de António Ferreira maçadores; que um
pequeno prefácio de Fernando Pessoa diz mais que um grande artigo de Fidelino de
Figueiredo; que há mais força íntima em catorze versos de Antero que num poemeto de
Junqueiro; e que é mais belo um adágio popular do que uma frase de literato.

José Régio, “Literatura Viva”, em Presença, n.º 1, 1927


Quanto a nós, sugeriríamos como mais adequada à realidade profunda de Presença e à
topogra­fia do nosso panorama cultural a designação de Contra-Revolu­ção do Modernismo.
(...) Bastava isto para cavar uma diferença que o culto da personalidade e da originalidade,
conscientemente professado, só podia acentuar até converter o falso filho num autêntico
rival. (…) Orpheu nasce da noite, caminha no labirinto, busca os deuses ou único Deus que
deve libertar da treva original. Sá-Carneiro e Pessoa buscam porque não são. Os
“presencistas” são e buscam.

Eduardo Lourenço, “Presença ou a Contra-Revolução do Modernismo Português?”, 1958


(publicado no volume Tempo e Poesia)
Autopsicografia

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que leem o que escreve,


Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda


Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa
Presença, nº 36, Nov. 1932

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