CONTEÚDO DIGITAL DE FORMAS CONSENSUAIS[1]
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MÓDULO 1
Direito fundamental ao acesso ao Poder Judiciário
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Nesse cenário, estão inseridos os direitos fundamentais. Trata-se daqueles que são
oriundos da própria natureza da pessoa enquanto ser humano e se encontram
normatizados e positivados nos principais textos constitucionais modernos, razão pela
qual é inadmissível o seu desrespeito, sob qualquer justificativa (POLARINI, 2012).
Em linhas gerais, podemos afirmar que o acesso ao Poder Judiciário determina duas
finalidades básicas do nosso ordenamento jurídico: aquela em que as pessoas
podem reivindicar os seus direitos ou resolver os seus problemas sob a inferência
do Estado. Contudo, para que essas finalidades sejam atingidas, o sistema jurídico
deve garantir o acesso a todos, sendo imprescindível que os resultados produzidos
sejam individuais e socialmente justos. “Sem dúvidas, uma premissa básica será a
justiça social, tal como desejada por nossas sociedades modernas, que pressupõe o
acesso efetivo” (CAPPELLETTI; GARTH, 2002, p. 8)
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Acesso ao Poder Judiciário e acesso à justiça são dois fenômenos jurídicos distintos?
Historicamente, esse importante direito fundamental sempre fora tido como sinônimo
de acesso à própria justiça ou, então, de submeter um conflito de interesses à
apreciação de um órgão judiciário, de modo a se obter uma solução satisfatória para
as partes.
É por essa razão que o Poder Judiciário não pode tomar decisões que sejam
impositivas e superiores ao ordenamento, tendo em vista que o cidadão deve ser
considerado um participante do exercício da função do Estado, e não apenas um mero
destinatário (CAPPELLETTI; GARTH, 2002).
Segundo Nalini (2000, p. 100), “[...] assim como a normatividade não é monopólio do
Legislativo, a realização do justo não é monopólio do Judiciário”, porque “há outras
modalidades de solução dos conflitos”.
Logo, a tutela jurisdicional exercida pelo Estado deve estar voltada para a realização
da justiça como finalidade última, a virtude das virtudes ou a virtude suprema que
deve estar em harmonia, equilíbrio e proporção com as demais virtudes da pessoa
humana, segundo Platão (GUSMÃO, 2018). Nesse contexto, é possível concluir que o
acesso ao Poder Judiciário é um meio para a realização da justiça.
REFLITA
Aqui, cabe uma indagação: se o processo não se desenvolver e não contiver uma
decisão satisfatória aos litigantes, mesmo assim, terá havido acesso à justiça? Ou,
então, estaria garantido apenas o acesso ao Poder Judiciário? Nesse caso, terá
havido apenas o acesso ao Poder Judiciário, e a justiça não terá sido efetivamente
concretizada.
Você sabe qual é a diferença entre ambos os dispositivos? A diferença entre eles está
no fato de que o primeiro deve ser observado, em especial pelo legislador, e
busca oferecer uma garantia mais ampla, extrapolando os limites do Poder Judiciário,
a quem incumbe prestar a jurisdição, mas não como um monopólio. Já o segundo é
feito para ser observado pelo juiz e pelos tribunais, que são quem efetivamente
devem obedecer ao comando do seu art. 1º, do Código de Processo Civil, que
determina que esse é ordenado, disciplinado e interpretado, conforme os valores e as
normas fundamentais preconizadas na Constituição Federal (BUENO, 2021).
Esses dispositivos estão de acordo com os arts. 8º e 10, da Declaração Universal
dos Direitos do Homem, da ONU, proveniente de 1948. Tais artigos definiram,
expressa e respectivamente, que a pessoa humana tem direito a um recurso efetivo
perante as jurisdições nacionais competentes contra os que violam os direitos
fundamentais que lhe são reconhecidos pela constituição e pela lei, além da plena
igualdade a que a sua causa seja ouvida equitativa e publicamente por um tribunal
independente e imparcial, o qual decidirá sobre seus direitos e obrigações,
legitimidade de toda acusação em matéria penal dirigida contra ela.
Seja como for, esses normativos, em conjunto, garantem a todos o acesso ao Poder
Judiciário para postular e defender os seus interesses, por meio de uma tutela
específica, garantida pelo exercício do direito de ação processual, que permite ao
interessado deduzir suas pretensões em juízo, a fim de que seja emitido um
pronunciamento judicial (GONÇALVES, 2021).
Como essa questão é tratada no Brasil? Importa enfatizar: o Brasil adota um sistema
em que, ao Poder Judiciário, compete se manifestar em matéria de Direito. Assim,
apesar das inúmeras legislações que autorizam outras formas de solução dos conflitos
de interesses, o cidadão brasileiro ainda espera que os órgãos judiciários
desempenhem um papel de primazia na pacificação e na harmonização da sociedade.
O Estado, contudo, deve proporcionar condições necessárias que contemplem todos
os indivíduos, em observância ao princípio da igualdade (ZANINI, 2017).
ATENÇÃO
Por último, o acesso ao Poder Judiciário implica, também, uma questão geográfica.
Configura-se pela dificuldade de um sujeito de, individualmente, postular direitos
coletivos e pela dispersão das pessoas afetadas, impedindo a formulação de
estratégia jurídica comum, de modo a conferir e reconhecer a existência de um direito
juridicamente exigível (CAPPELLETTI; GARTH, 2002).
Não obstante toda a preocupação dos processualistas com a ideia da busca pela
justiça, a doutrina, há muito, debruça-se sobre a possibilidade de expandir os limites
desse acesso para além das fronteiras do Poder Judiciário (PINHO, 2021).
No Brasil, esse fenômeno teve início em meados dos anos de 1980, quando surgiram
os primeiros movimentos de democratização de acesso à justiça que pretendiam
verificar se as regras previstas no processo civil facilitam ou dificultam o acesso em
uma sociedade como a que vivemos, marcada por grandes desigualdades sociais que
levam a uma evidente exclusão de acesso ao Poder Judiciário por aqueles que não
têm condições financeiras para arcar com os custos e as despesas processuais, bem
como em decorrência da burocracia processual, que envolve advogados e demais
integrantes do Poder Judiciário. Diante disso, a solução encontrada foi viabilizar as
formas alternativas de solução dos conflitos de interesses, sem a intervenção do
Poder Judiciário (ZANINI, 2017).
Afinal, você consegue entender o que vem a ser o acesso à justiça? Na verdade,
podemos afirmar que se trata tanto de um princípio constitucional quanto processual;
está previsto em vários dispositivos legais e, historicamente, sempre fora tido como
um sinônimo de acesso ao próprio Poder Judiciário ou, então, como uma forma de
submeter uma disputa à apreciação de um órgão judiciário ou ao próprio controle
jurisdicional.
Para Boaventura de Souza Santos, citado por Ana Carolina Zanini, o tema do acesso
à justiça é aquele que mais diretamente equaciona as relações entre o processo civil e
a justiça social, entre a igualdade jurídico-formal e desigualdade socioeconômica
(ZANINI, 2017).
A partir dessas ideias, podemos afirmar que o acesso à justiça é como um direito
fundamental? Sim! Nos sistemas jurídicos modernos, como o do Brasil, em que se
predomina o princípio da igualdade, o acesso à justiça é considerado o mais básico
dos direitos humanos, de modo que visa a garantir o direito de todos, tornando-os
efetivos (CAPPELLETTI; GARTH, 2002).
FICA A DICA
“O Direito não é um fim, mas um meio. Na escala dos valores, não aparece o Direito.
Aparece, no entanto, a justiça, que é um fim em si, e a respeito da qual o Direito é tão
somente um meio para atingi-la. A luta deve ser, pois, a luta pela justiça” (COUTURE,
1999, p. 40).
Assim, a busca pela justiça está condicionada ao aparelho judiciário estatal? Não! É
muito além disso. Para que isso ocorra, pode ser considerado um direito fundamental
e social básico dos indivíduos, à medida que, em linhas gerais, todos, pessoas
naturais ou jurídicas, têm o direito de ir em busca de uma solução jurídica dos seus
conflitos por outros meios assegurados e regulados pelo nosso ordenamento jurídico
(CASADO FILHO, 2017).
Então, o acesso à justiça deve ser totalmente desvinculado do Poder Judiciário? Não!
Até porque, em maior ou menor nível, a dependência do Poder Judiciário existe e
sempre existirá, principalmente para se alcançar o cumprimento da decisão não
estatal, o que ocorre mediante o exercício dessa função por outros órgãos estatais ou
por agentes privados, devidamente capacitados.
ATENÇÃO
Como vimos, o acesso à justiça diz respeito a dar a cada um o que é seu de direito,
visando à efetivação de seus direitos, de modo satisfatório às partes,
independentemente do acesso ao Poder Judiciário. Daí decorre que o termo “justiça”
se refere a um valor, ou seja, a uma concepção ética e axiológica (CASADO FILHO,
2017).
Dessa forma, nas lições de Kazuo Watanabe, o acesso à justiça nada mais é do que
o acesso à ordem jurídica justa, ou seja, o acesso à juridicidade que compreende o
“direito a ter direitos”.
Acesso à justiça é acesso à ordem jurídica justa [...], ou seja, obtenção de justiça
substancial. Não obtém justiça substancial quem não consegue sequer o exame de
suas pretensões pelo Poder Judiciário e quem recebe soluções atrasadas ou mal
formuladas para suas pretensões ou soluções que não melhorem efetivamente a vida
em relação ao bem pretendido. Todas as garantias integrantes da tutela constitucional
do processo convergem a essa promessa-síntese, que é a garantia do acesso à
justiça assim compreendido.
Nesse panorama, o acesso à justiça pode ser alcançado de que forma? Por duas
maneiras básicas: pelo Poder Judiciário ou por outros métodos alternativos de
solução de conflitos, sendo eles, em sua maioria, regrados pelo nosso ordenamento
jurídico. Para ilustrar, nesse contexto, enquadram-se as
chamadas autocomposições, que dizem respeito à transação, à negociação, à
conciliação, à mediação, mas também à heterocomposição, ou seja, a arbitragem
com fundamento no art. 3º, §§ 1º a 3º, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015).
Daí decorre que estamos diante de outros órgãos com natureza jurisdicional, pois
permitem que se solucionem as controvérsias de modo mais rápido, menos custoso e
mais humanizado, em certas situações, promovendo a participação social e o acesso
à justiça de maneira mais eficiente. Por outro lado, às partes, é conferido o direito de
escolha, ou seja, diante de todas as soluções possíveis, permiti-lhes optar por aquela
que esteja mais de acordo com os interesses que se mostrem mais valiosos e que
sejam mais aptos a promover o acesso à ordem jurídica justa (PINHO, 2021).
Isso significa que aquele que teve o seu direito lesado pode escolher qual é o melhor
recurso para a solução dos conflitos que o atingem. Em última análise, o que se
pretende é a conjugação do binômio celeridade-eficiência, auxiliando-se na constante
busca pela verdade real. Se assim não fosse, haveria infringência ao art. 5º, inciso
XXXV, da Constituição Federal.
Segundo Veronese (2013), o mais elevado objetivo alcançado pelo positivismo jurídico
foi a formação de um campo teórico de análise formal das normas e dos sistemas
jurídicos. Essa concepção foi fortemente vinculada a um conceito de Direito que o
restringe ao produto dos Estados nacionais.
Assim, as normas jurídicas estabelecem a maneira pela qual cada indivíduo deve agir
em sociedade para alcançar certos objetivos, a partir de leis escritas e abstratas que
integram o ordenamento jurídico, subordinando-se, exclusivamente, à vontade do
Estado (MELLO, 2021).
É nesse contexto que aparece o modelo piramidal do Direito, que se refere a uma
estrutura estatal em que o foco está voltado e definido para a produção de normas
jurídicas – de um modo geral, tais normas se encontram dispostas em forma de
pirâmide. Dessa maneira, Hans Kelsen se utilizou desse símbolo para estabelecer a
unidade do ordenamento jurídico relativamente às estruturas do sistema.
Você consegue entender por que a pirâmide foi utilizada como símbolo por Hans
Kelsen? Para Losano (2005), a pirâmide representa a hierarquia do poder, sendo
esse o modelo que o Direito tende a se ajustar. Por outro lado, expressa
uma desigualdade ordenada, que delimita, sem lacunas, tudo o que está
compreendido entre a base e o seu ápice.
Assim, o modelo piramidal funciona como uma forma de hierarquização das normas,
de modo a evitar conflitos entre as legislações que regem todo o nosso ordenamento
jurídico. Vejamos a seguir, de forma ilustrativa, o modelo que ficou conhecido como
Pirâmide de Kelsen.
Isso porque, de acordo com o positivismo jurídico, a lei é a mais importante fonte do
direito e o principal instrumento para a solução dos conflitos de interesses que surgem
na sociedade, uma vez que se estabelecem as diretrizes fundamentais do
ordenamento jurídico nacional (SIQUEIRA JÚNIOR, 2019).
Diante dessas premissas, você consegue identificar a relação existente entre o modelo
piramidal e as formas consensuais de solução de conflito? Nessa seara, constatamos
o monopólio do Estado para realizar essa função, por meio do acesso ao Poder
Judiciário, com fundamento no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal.
Segundo Montesquieu, ainda no século XVIII, o juiz é a boca da lei e deve ser um
autômato, isto é, um robô comandado e guiado pela lei, simplesmente reproduzindo a
vontade do legislador (FERRAZ JÚNIOR, 2019). Você acredita que essa concepção
ainda possa ser utilizada para analisar as leis na atual sociedade em que vivemos?
Não. Essa concepção já está ultrapassada! O juiz não pode ser um mero reprodutor
do texto legal. Ele deve levar em consideração uma gama de fatores que envolvem a
análise do concreto, de modo a conferir a efetivação da justiça enquanto valor
supremo.
A princípio, o modelo piramidal parece ser o ideal para a solução de controvérsias
judiciais ou extrajudiciais. Essa constatação seria verdadeira? Não! Esse sistema não
é perfeito e, muitas vezes, encontra dificuldades para resolver, de modo consensual,
as disputas entre os litigantes. Por essa razão, em meados da segunda metade do
século XX, surge o modelo reticular do Direito.
O que vem a ser esse modelo reticular do Direito? Igualmente denominado modelo
em rede, utilizando-se novamente de uma linguagem simbólica, esse sistema
estabelece novos paradigmas normativos que guardam relação com os fatos sociais e
com a complexidade dos novos problemas que surgem na sociedade moderna e que
fazem com que o Estado assuma novas funções ou descentralize outras para
enfrentar essa realidade social (LOSANO, 2005).
Daí decorre que não é mais possível considerar que as normas do Estado integram
um ordenamento jurídico hierárquico, mas, sim, uma rede normativa baseada em
processos sociais e no reconhecimento da multiplicidade de fontes normativas
(VERONESE, 2015).
Na verdade, esse sistema é uma consequência da crise do Direito que, dentre outros
reflexos, enfraquece a tendência do monopólio do Poder Judiciário na resolução
consensual dos conflitos de interesses, à medida que visa a reformar os seus poderes
internos e certos agentes privados para que possam praticar essa atividade. Até
mesmo porque o Estado, há muito, já se conscientizou dos problemas gerados pela
nossa cultura do litígio. Com isso, pretende-se descentralizar e desjudicializar a
sua atuação, visando à pacificação social.
SAIBA MAIS
ACESSAR
Nessa linha de ideias, o Código de Processo Civil, em seu art. 3º, § 3º, preconiza que
a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos
deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do
Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial, como formas de acesso
efetivo à justiça. De outra maneira, essas ferramentas não excluirão da apreciação
jurisdicional, pelo Poder Judiciário, a ameaça ou a lesão a direitos.
Daí decorre a seguinte indagação: o litigante que decidir recorrer ao Poder Judiciário
para a solução do conflito que lhe aflige deve fazer prova em juízo de que previamente
tentou resolvê-lo pelos métodos consensuais e alternativos de modo que tenha
interesse processual para ajuizar a demanda? Essa é uma questão ainda bastante
discutida pelos nossos legisladores, em especial pelos processualistas (LONGO;
SOUSA, 2021).
Até o presente momento, impera a corrente que entende que ambos os sistemas
convivem em perfeita harmonia no nosso ordenamento jurídico, sendo que compete
aos litigantes optarem por aquele que melhor condiz com a resolução do caso
concreto e que tenha condições de lhes entregar uma decisão mais satisfatória, de
acordo com os interesses envolvidos na lide (LOSANO, 2005).
MÓDULO 2
Negociação e transação
Em outro sentido, não existe, até o momento, uma lei especial que a discipline
(SCAVONE JÚNIOR, 2020). Se é assim, qual é, então, a base legal da negociação?
Podemos dizer que o Art. 3º, § 3º, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015a, on-
line), ao se referir, em sua redação, a “outros métodos de solução consensual de
conflitos”, está a incluindo em seu rol de possibilidades. Desse modo, é permitido que
os negociadores, entre si, sem a interferência ou a intervenção de terceiros, utilizem-
se, diretamente, desse método para que obtenham uma decisão conjunta, definitiva e
satisfatória acerca da controvérsia que os envolve (GUERRERO, 2015).
Ao contrário do que se pode imaginar, para que a transação ocorra, não necessita
haver a perda de uma parte para que a outra obtenha êxito. Em decorrência disso, a
Escola de Negociação de Harvard desenvolveu técnicas com base em princípios de
negociação e de afeto entre os negociadores para que todos obtenham vantagens
equivalentes, já que, nesse caso, não podem ser considerados oponentes. Em regra
geral, essas técnicas estão orientadas por quatro diretrizes básicas, que,
resumidamente, são as seguintes (TARTUCE, 2021):
Para a ponderação das opções criadas e permitir que os negociadores tenham mais
clareza ao escolher qual a melhor, para a solução do conflito.
SAIBA MAIS
ACESSAR
A negociação deve seguir certas fases para que possa alcançar o seu principal
objetivo, que é solucionar um conflito de interesses. Quais são essas fases? De
acordo com as lições de Luís Fernando Guerrero, em primeiro lugar, há a necessidade
da análise das circunstâncias que envolvem o conflito, para que se possa, em um
segundo momento, reconhecer e delimitar as questões que devem ser levadas em
consideração para alcançar a finalidade que se pretende. Por último, há
a indagação propriamente dita de que as análises e os objetivos estabelecidos pelos
negociadores serão contrapostos (TARTUCE, 2021).
Por outro lado, todos os sujeitos envolvidos devem se conduzir de boa-fé para que
ocorra a pacificação do conflito, de modo satisfatório, para ambos, afastando qualquer
possibilidade de fraudes ou de enriquecimento imotivado. Assim, na negociação, não
há espaços para jogo de barganhas (GUILHERME, 2016). Pinho (2021) enumera
algumas atitudes que os negociadores devem ter para se chegar a um bom termo:
ACESSAR
A principal base legal material desse instituto está nos Arts. 840 a 850, do Código Civil
(BRASIL, 2002), e no Art. 784, inciso IV, do Código de Processo Civil (BRASIL,
2015a), sendo que esse último dispositivo considera o instrumento da transação
um título executivo extrajudicial. Nesse caso, deverá ser referendado pelo Ministério
Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados das partes,
por conciliador ou por mediador credenciado por tribunal.
Uma vez celebrada, a transação poderá vir a ser anulada? Sim, desde que haja dolo,
coação ou erro essencial, quanto à pessoa dos transatores ou quanto à coisa
controversa (Art. 849, do Código Civil) (BRASIL, 2002). Para tanto, basta que, apenas,
uma de suas cláusulas seja assim considerada (Art. 848, do Código Civil) (BRASIL,
2002). Nesse caso, aplica-se, igualmente, os regimes das anulabilidades, mas, ao
contrário da regra geral, não se admitirá ignorância ou erro de direito a respeito da
matéria objeto do fundo de transação (VENOSA, 2022). Quando a transação ocorrer
por termo nos autos, ela poderá ser anulada quando houver sentença transitada em
julgado e uma das partes não tenha conhecimento ou se, em tal sentença, for
reconhecido que uma das partes não era titular do direito alegado (Art. 850, do Código
Civil) (BRASIL, 2015a).
Mediação e conciliação
Assim, o mediador pode optar por seguir uma direção mais facilitadora ou
mais avaliadora, de acordo com o caso concreto. O facilitador, por sua vez,
estabelece regras básicas, promove a troca de informações, estabelece uma agenda
de negociações, movimenta as propostas por vários meios e estrutura o fechamento
das discussões. Como um avaliador, atua como um administrador da negociação,
aprecia as propostas e os argumentos das partes como um especialista e, ao final,
apenas, recomenda (não impõe ou decide) os termos do acordo (SOUZA et al., 2016).
Desse modo, quem pode ser um mediador? Em regra, o mediador é uma pessoa
natural ou um grupo delas, de confiança das partes e
com conhecimento específico acerca da questão controvertida, mas não se envolve,
pessoal ou emocionalmente, com o objeto do litígio. Contudo, apesar de não ter poder
de decidir, como mencionado anteriormente, em certas circunstâncias, poderá
influenciar na solução do conflito (PINHO; MAZZOLA, 2021).
ACESSAR
Diante de tudo que estudamos até aqui, você consegue identificar as diferenças entre
as decisões proferidas por mediação e aquelas emanadas por sentença judicial, pelo
Poder Judiciário? Nesse ponto, podemos citar que a principal delas é quanto à forma
como os conflitos são resolvidos. Naquela, as próprias chegam a um consenso,
diferentemente da sentença judicial, cuja solução é imposta pelo Poder Judiciário.
Ocorre que essa, muitas vezes, distancia-se do real motivo que levou as partes a
pleiteá-la, não alcançando a sua finalidade sociológica, fato esse que, na maioria das
vezes, não acontece na mediação.
ACESSAR
A conciliação, no entanto, também poderá ser realizada por câmaras privadas, que,
assim como os conciliadores, serão inscritos em cadastro nacional e em cadastro de
tribunal de justiça ou de tribunal regional federal, que manterão registros de
profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional (Art. 167, do Código
de Processo Civil) (BRASIL, 2015a), sendo que as partes poderão, livremente,
escolhê-los (Art. 168, do Código de Processo Civil) (BRASIL, 2015a). Nesse ponto,
convém reafirmar que não há uma lei específica para regular o procedimento ou
requisito para sua atuação da conciliação extrajudicial. Assim, deve-se observar, no
que couber, as regras da modalidade judicial (LIMA JÚNIOR, s.d.). No mais, aplica-se
à conciliação as mesmas regras atinentes à mediação, conforme estudamos
anteriormente, pois ambas as formas de solução consensual de conflitos possuem
procedimentos similares, sendo tratadas de modo junto nos principais dispositivos de
lei.
ATENÇÃO
A conciliação judicial, assim como a mediação, pode ser realizada de forma eletrônica,
por meio de plataformas online, o que se tornou uma preferência nos tribunais, mesmo
depois da fase de isolamento social da pandemia da Covid-19. Essa prática foi
regulamentada pelo Art. 3º, § 7º, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015a),
pela Resolução nº 358/2020 (BRASIL, 2020a), do Conselho Nacional de Justiça, e
pela Lei nº 13.994/2020 (BRASIL, 2020b), que possibilita a adoção dessa medida no
âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, por meio das CEJUSCS virtuais. No mesmo
sentido, são o Enunciado nº 48, do Fórum Nacional de Conciliação e Mediação, e
o Enunciado nº 25, do Conselho da Justiça Federal.
REFLITA
Logo, para que a arbitragem seja possível, é preciso haver litígios cujo objeto verse
sobre direitos patrimoniais disponíveis, nos termos do Art. 1º, caput, da Lei nº
9.307/96 (BRASIL, 1996). Em outro sentido, as questões criminais, relacionadas a
direito pessoal de família, as questões relativas ao Poder Público e outras que não
tenham caráter patrimonial não podem ser objeto de arbitragem (SCAVONE JÚNIOR,
2020).
No exercício de sua função, como o árbitro deve se conduzir? O árbitro atua como se
fosse um juiz togado, e a sua decisão tem força e eficácia de sentença judicial com
natureza jurídica vinculativa, até mesmo porque atua na autonomia de vontade das
partes. Isso faz com que tenha, aparentemente, grande semelhança com o processo
judicial, onde o juiz faz papel equivalente e emite a sua decisão (LIMA JÚNIOR, s.d.).
Nesse contexto, nos termos do Art. 18, da Lei nº 9.307/96, “o árbitro é juiz de fato e de
direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo
Poder Judiciário” (BRASIL, 1996, on-line).
Quem pode ser árbitro em uma disputa? Em regra geral, o árbitro pode ser uma ou
mais pessoas naturais que tenha a confiança das partes e por elas, detidamente,
escolhidas, em razão das suas qualidades técnicas e éticas (Art. 13, da Lei nº
9.307/96) (BRASIL, 1996). Mas também pode ser uma Câmara Arbitral ou Centro de
Arbitragem que profere decisões colegiadas sem que as partes tenham que arcar
com os custos de um processo judicial. Aqui, convém lembrar que ser árbitro não é
uma profissão, mas um múnus de decidir um conflito de interesses recebida por
delegação das partes e que se encerra com a conclusão do seu trabalho, que ocorre
com a emissão da sentença arbitral (LIMA JÚNIOR, s.d.).
Cláusula compromissória
Compromisso arbitral
Um bom exemplo de dispute boards, para verificarmos de que forma é utilizada, foi a
criação da comissão para indenizar as famílias das 199 vítimas do acidente aéreo do
voo TAM 3054, em 2007, que ficou conhecida por CI 3054. Da mesma forma, foram o
Programa de Indenização 447 (PI 447), originado com o acidente do voo Air France,
em 2009, e as indenizações coletivas negociadas pela Defensoria Pública no acidente
do metrô em São Paulo, em 2007.
ATENÇÃO
Diante desse contexto, será que essa ferramenta consensual de solução de conflitos
é, de fato, eficaz? De acordo com uma pesquisa realizada, no ano de 2018, pela The
Dispute Resolution Board Foundation, organização sem fins lucrativos, constituída em
Wisconsin, Estados Unidos, em 1996, o índice de sucesso nos procedimentos
adotados para a resolução das disputas é de 94%. Assim, podemos concluir que esse
método é eficaz, até mesmo porque permite e encoraja o diálogo entre as partes, para
que as controvérsias sejam solucionadas da forma mais satisfatória para todos,
diferentemente do que aconteceria se a demanda fosse questionada perante o Poder
Judiciário (POLIDORO, 2021).
SAIBA MAIS
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FICA A DICA
MÓDULO 3
Necessidade de alteração da mentalidade dos litigantes
Segundo Kazuo Watanabe (2019), a cultura da sentença teria se instalado entre nós,
estabelecendo um modelo contencioso de solução dos conflitos de interesses e que
deve ser substituído, paulatinamente, pela cultura da pacificação. Diante desse
cenário, o que é preciso para que isso aconteça? Na atual sociedade em que vivemos,
presenciamos a necessidade de empreender mecanismos que promovam
uma mudança na mentalidade dos litigantes e da sociedade.
Para tanto, em primeiro lugar, devem ser levados aos cidadãos as informações e o
conhecimento acerca das formas consensuais de solução de conflitos, dos
procedimentos, dos seus benefícios e, principalmente, de como ter acesso a eles.
Assim, observaremos mais um direito fundamental da pessoa humana, que é o direito
à informação e o direito ao acesso à informação, nos termos do art. 5º, inciso
XXXIII, da Constituição Federal, aplicado, inclusive, no âmbito das relações privadas.
Outra forma de mudar a mentalidade dos litigantes é por meio da divulgação dos
casos de sucesso existentes em nossa sociedade por meio das decisões tomadas
pelos citados Centros, Núcleos e, também, pelas diversas Câmaras e Tribunais
Arbitrais (TARTUCE, 2021). Nesse contexto, também pode ser citada a Semana da
Conciliação, estimulada pelo Conselho Nacional de Justiça e realizada anualmente em
todos os tribunais brasileiros. Os resultados são publicados no site do órgão, inclusive,
com as estatísticas dos acordos realizados (CNJ, 2022).
Assim, o que é necessário para que essas iniciativas tenham eficácia? Para que essas
medidas de incentivo tenham eficácia, é importante contar com o
efetivo envolvimento dos litigantes nesse processo. Se o interesse for simplesmente
em obter uma decisão para o conflito, de modo a pôr fim às suas angústias,
contentando-se apenas com a mera homologação judicial do acordo, não haverá a
pretendida mudança de mentalidade e uma efetiva alteração positiva de
comportamento dos litigantes, e se corre o risco de repetir o mesmo procedimento
(TAKAHASHI et al., 2019).
Com isso, os litigantes terão a consciência necessária para romper com a nossa
cultura jurídica do monopólio do Poder Judiciário para a solução das demandas, com o
seu sistema burocrático, moroso, custoso, prolongado e que, na grande maioria das
vezes, não promove o acesso à justiça. Neste, é comum os litigantes finalizarem o
processo insatisfeitos com a decisão imperativa e imposta pelo Estado, em qualquer
de suas instâncias.
Diante disso, você consegue perceber os reflexos advindos desses atos? As formas
consensuais de solução de controvérsias, em especial, as extrajudiciais, têm por
característica justamente a desjudicialização. Ela acarreta, como consequência,
celeridade na busca do resultado definitivo, já que as negociações correm em um
ambiente coloquial e com a ausência de formalidade que, muitas vezes, atrapalham a
celebração de um acordo.
Esses pressupostos são imprescindíveis para que possamos verificar se, de fato, os
litigantes têm maturidade suficiente, mesmo diante das informações recebidas, para se
adequar a essa mudança de paradigma ou de mentalidade. Nesse caso, renuncia-se a
uma suposta segurança jurídica das sentenças judiciais, que são passíveis de recurso
para as diversas instâncias superiores, por uma maior eficiência das decisões
tomadas por consenso e com o auxílio de especialistas devidamente escolhidos ou
aceitos pelas partes, porém definitivas, submetendo-se incondicionalmente a elas
(LIMA JÚNIOR, [2022]).
Dessa maneira, será que as formas consensuais de solução de conflitos têm a função,
entre outras, de evitar os conflitos? Ao contrário do que a cultura jurídica clássica
prega, a mediação, a conciliação e a arbitragem, para citar os principais métodos, não
se prestam a eliminar os conflitos, mas a transformá-los. Até mesmo porque eles são
inevitáveis e fazem parte da vida da pessoa humana. Portanto, devemos mudar o
modo como lidamos com eles para que sejam resolvidos de modo satisfatório.
Segundo Roger Fisher, William Ury e Bruce Patton (2014), os conflitos estão na
essência do próprio processo democrático, em que as melhores decisões resultam da
exploração de diversos pontos de vista.
Nesse ponto, vale lembrar que essa mudança de paradigma se torna ainda mais
necessária se voltarmos o foco para os efeitos decorrentes da pandemia de
Coronavírus, que tornar urgente a solução de vários conflitos, como débitos com
concessionárias de serviços públicos e empresas públicas, guarda, visitas, alimentos
para os filhos decorrentes dos inúmeros divórcios que ocorrem nesse período,
encerramento de empresas, ocupação de imóveis e renegociação de locação
(LAGRASTA, 2022).
Em linhas gerais, a cultura da paz diz respeito ao abandono das ações violentas e ao
respeito às diferenças no modo de pensar e de agir. Assim, é integrada por valores,
atitudes e comportamentos que refletem e inspiram a interação social, tendo por
principal objetivo a pacificação social. E, com ela, o respeito às leis e ao cidadão,
combatendo os conflitos sociais existentes e promovendo os meios alternativos de
resolução de conflitos (TARTUCE, 2021).
Nesse ponto, é importante citar Paulo Freire (1980), para quem a pessoa humana
como um ser eminentemente social (re)constrói a sua condição humana a partir de
uma relação dialógica com o outro. É a alteridade dialógica que permite o existir do
outro. Nessa relação, permite-se criar uma nova realidade relacional para as partes
envolvidas em situação de conflito (FREIRE, 1980).
Com efeito, a comunicação entre os litigantes é fácil? Nem sempre, pois, muitas
vezes, é influenciada por emoções, sentimento de culpa e atribuições de
responsabilidade recíprocas pela existência do conflito. Contudo, sem uma
comunicação dialogada e não violenta, não é possível a celebração de um acordo.
Assim, os mediadores e os conciliadores, no exercício de suas funções e fazendo uso
de técnicas específicas, abrem a oportunidade para o diálogo com o fim de chegarem
a um denominador comum sobre o fim definitivo do conflito, ainda que não tenham o
poder de decisão (FISHER; URY; PATTON, 2014).
ACESSAR
Em outro sentido, a ética é o veículo ou o instrumento utilizado pela moral para sair do
mundo interior da pessoa humana e vir para o mundo exterior, ou seja, para a
sociedade, como também reflete a moralidade de uma certa coletividade em uma
época determinada. Com isso, ampara uma função normativa, pois, com fundamento
nela, encontramos as orientações sobre o que pode ou deve ser permitido, obrigado
ou proibido nos comportamentos humanos (BITTAR, 2021).
ATENÇÃO
Como a ética é o meio pelo qual a moral se exterioriza, toda conduta ética deve estar
de acordo com a moral individual, isto é, aquela relativa às pessoas envolvidas na
lide, como também com a moral coletiva, que é aquela atinente à sociedade na qual
as partes e os litígios estão inseridos. Assim, é importante que os mediadores, os
conciliadores e os árbitros, ou seja, os especialistas envolvidos na decisão dos
conflitos estejam conscientes da moral que caracteriza os tempos atuais para melhor
orientar as partes na busca da solução do conflito.
Diante desses conceitos, de que forma a ética se relaciona com a solução consensual
dos conflitos de interesses? Nesse caso, a ética diz respeito à conduta dos
especialistas, no exercício de suas funções, para compor as partes litigantes, mas,
também, atinge o comportamento dos próprios litigantes entre si, que deve estar
pautado, sobretudo, na moral e na boa-fé. E, como não poderia deixar de ser, esses
pressupostos devem estar presentes, também, na execução dos procedimentos
atinentes ao método escolhido pelas partes para pôr fim à demanda que lhes aflige
(VASCONCELOS, 2020).
Nesse ponto, esses princípios éticos que sustentam a solução consensual dos
conflitos também estão fundamentados na Constituição Federal? Sim, esses princípios
encontram lastro na Constituição Federal, em especial, no preâmbulo, em que se
refere à sociedade brasileira como fraterna, fundada na harmonia social e
comprometida com a ordem interna e internacional na solução pacífica das
controvérsias. Redação semelhante encontramos no art. 3º, inciso I, e no art. 4º,
inciso VII, do mesmo diploma (TAKAHASHI et al., 2019).
(Art. 1º, § 1º, do Anexo III da Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça;
art. 166, do Código de Processo Civil; e art. 2,º da Lei de Mediação) quanto aos fatos
que envolvem o conflito e tudo o mais que for revelado pelos litigantes e especialistas
durante o procedimento. Assim, não podem ser expostos e utilizados em outro
ambiente, judicial ou extrajudicial, sem a prévia concordância dos interessados
(TAKAHASHI et al., 2019).
SAIBA MAIS
(Art. 13, § 6º, da Lei de Arbitragem; art. 1º, § 2º, do Anexo III da Resolução nº
125/2010 do Conselho Nacional de Justiça), ou seja, as qualificações e as habilidades
específicas que os especialistas devem ter para o desempenho de suas funções no
âmbito da mediação, da conciliação e da arbitragem. Assim, é conveniente, mas não
obrigatório, que tenham conhecimento técnico quanto ao objeto da lide para melhor
orientar as partes na busca da solução do conflito.
Imparcialidade
Art. 13, § 6º, da Lei de Arbitragem; art. 1º, § 3º, do Anexo III da Resolução nº 125/2010
do Conselho Nacional de Justiça; art. 166 do Código de Processo Civil; e art. 2º da Lei
de Mediação) dos especialistas na orientação aos litigantes quanto ao objeto da
demanda e na sugestão dos termos do acordo ou, então, na tomada de decisão
definitiva, no caso da arbitragem. De outro modo, as partes devem permanecer
imparciais durante todo o procedimento de modo a conferir tratamento igualitário e
segurança à relação. E, ainda, devem fazer prevalecer os valores e princípios
pessoais, compreendendo a realidade dos litigantes e jamais aceitar quaisquer
espécies de vantagens extras por conta de sua atuação.
Neutralidade
(Art. 1º, § 5º, do Anexo III da Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça;
art. 166 do Código de Processo Civil; e art. 2º da Lei de Mediação), em que as partes
devem optar, entre as várias permitidas pelo nosso ordenamento jurídico, qual é a
mais adequada para pôr fim à lide. Da mesma forma, esse princípio guarda relação
com a escolha do especialista para intermediar a tomada de decisão dos litigantes, no
caso da mediação e da conciliação, ou que decidirá a demanda, no caso do árbitro.
Por último, também deve ser aplicado quanto à análise do mérito da lide
(VASCONCELOS, 2020).
Respeito à ordem pública e às leis vigentes
(Art. 166 do Código de Processo Civil; e art. 2º da Lei de Mediação) princípio esse
característico das formas consensuais de solução de conflitos, estando diretamente
relacionado com o princípio da informalidade, em que privilegia a simplicidade dos
atos, dispensando contratos escritos, já que feitos diretamente entre os litigantes
(TAKAHASHI et al., 2019).
Busca do consenso
Diante desse cenário, o que você conclui quanto à ética na solução consensual dos
conflitos de interesses? A ética visa à busca pelo bem comum, sendo certo que é
fundamental para que as partes envolvidas no litígio sintam confiança, não só no
procedimento em si, mas também no especialista que auxilia e, igualmente, que, ao
final, terão uma decisão terminativa do conflito. Mais do que isso, que terão uma
solução satisfatória às suas pretensões, dentro do contexto de uma cultura da paz,
nos termos estudados no tópico anterior.
Desse modo, a busca pelo bem comum, a partir do comportamento ético, está
justamente relacionada com a mudança de mentalidade dos litigantes, sendo certo
que os métodos consensuais de solução, por resolverem o conflito em sua essência,
atingem os verdadeiros interesses e necessidades das partes, levando à pacificação
social por meio do acesso à uma ordem jurídica justa (LAGRASTA, 2022).
REFLITA
O que se espera do comportamento ético dos litigantes? A resposta para essa questão
é muito individual. No entanto, podemos dizer que se espera que todos tenham
uma postura cooperativa para uma decisão satisfatória para ambos os litigantes, que
devem estar bem orientados e comprometidos para a solução do conflito a partir do
diálogo e da colaboração mútua.
SAIBA MAIS
Para uma análise mais específica sobre a constelação sistêmica e a sua aplicação no
Direito, veja: FIGUEIREDO, V. L.; PAIVA, M. F. J. C. B. E. de. As Constelações
Familiares como Método Alternativo de Resolução de Conflitos no Direito de
Família. IBDFAM, 20 abr. 2021.
ACESSAR
Por fim, para encerrar o nosso estudo sobre as formas consensuais de solucionar
conflitos, analisaremos os aspectos gerais da justiça restaurativa.
Esse método é uma novidade no Direito? Não, os seus primeiros registros podem ser
encontrados no Código de Hammurabi, um dos mais importantes documentos jurídicos
da Antiguidade, datado de cerca de 2.000 a.C. (ANDRADE, 2012) e que, ainda hoje, é
considerado a base legal do Direito da sociedade pós-moderna.
Sob essa perspectiva, como podemos entender a justiça restaurativa? De acordo com
esse método, o crime não se restringe a uma mera conduta típica e antijurídica, como
aprendemos no curso de Direito Penal. Na verdade, aqui, o seu conceito é bem mais
amplo, sendo, antes de tudo, um atentado às relações entre a vítima, o infrator e a
sociedade, causando-lhes vários danos (VASCONCELOS, 2020).
Por esse motivo, surge a necessidade de reparação tanto do delito em si quanto das
relações existentes entre os seus sujeitos — seja ela material, seja simbólica —, a
partir de práticas de mediação, com a atuação ativa de uma terceira pessoa
independente, imparcial e capacitada, que tem a função de facilitar o diálogo entre
os envolvidos no crime. Logo, não há atribuições de culpa quanto ao ato delituoso.
Esse método de solução de conflitos está baseado na autorresponsabilização,
na reflexão e na cooperação entre todos os sujeitos e a comunidade (OLIVEIRA,
2019).
Quais são os princípios que regem a justiça restaurativa no Brasil? De acordo com
o art. 2º daquele normativo, os princípios, que são autoexplicativos e podem ser
extraídos das disposições do art. 1º, anteriormente citado, são: a corresponsabilidade,
a reparação dos danos, o atendimento às necessidades de todos os envolvidos, a
informalidade, a voluntariedade, a imparcialidade, a participação, o empoderamento, a
consensualidade, a confidencialidade, a celeridade e a urbanidade.
Quais são os principais procedimentos que estão relacionados à justiça restaurativa?
Em linhas gerais, entre as suas práticas que são aplicadas para a solução de conflitos
por meio da justiça restaurativa, destacamos: a mediação restaurativa entre a vítima
e o ofensor, conforme já citado, e os círculos de diálogo ou os círculos
restaurativos, que podem ou não ter poder decisório e que ocorrem mediante
encontros entre os principais envolvidos no fato delituoso e os membros da
comunidade. Ou, então, entre aqueles — vítima e ofensor —, a autoridade judicial e o
representante do Ministério Público, cabendo ao juiz prolatar uma sentença de acordo
com aquilo que ficou acordado (VASCONCELOS, 2020).
Nesse ponto, convém afirmar que, na justiça restaurativa, o procedimento pode não
resultar, obrigatoriamente, na prisão do ofensor, mesmo que venha a confessar o
delito. Assim, é recomendável que as partes envolvidas celebrem um acordo
(ACHUTTI, 2016).
Desse modo, então, para quais casos a justiça restaurativa é indicada? A justiça
restaurativa e seus procedimentos só podem ser aplicados quando houver prova
suficiente de autoria do crime pelo ofensor mediante o consentimento deste e da
vítima, que pode ser revogado a qualquer momento durante o processo. Assim, os
acordos serão firmados voluntariamente. Quando isso não for possível, o caso será
encaminhado ao Poder Judiciário, de modo que seja investigada e declarada a sua
culpabilidade frente à vítima e à comunidade (AMANCIO, 2011).
ACESSAR
ATENÇÃO
Além da constelação familiar sistêmica e da justiça restaurativa, atualmente, existem
outros métodos alternativos e consensuais de solução de conflitos que ainda são
pouco utilizados em nossa sociedade, mas que vêm ganhando força nos últimos anos.
Citaremos alguns, a título de conhecimento: rent-a-judge, baseball arbitration, high-low
arbitration, mini-trial, early neutral evaluation, neutral fact-finding, consensus building, e
ombudsman. Para saber mais sobre eles, sugerimos: MAIA NETO, F. Diferentes
Formas de se Lidar com uma Controvérsia. In: ENAM – ESCOLA NACIONAL DE
MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO. Manual de Mediação de Conflitos: escrito por
advogados. Brasília: Ministério da Justiça, 2014. p. 17–35.