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Curso: Transtorno de Ansiedade

Generalizada TAG
Módulo 1: Introdução
O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) é uma situação comum,
caracterizada por preocupação excessiva e crônica sobre diferentes
temas, associada a tensão aumentada. É o transtorno de ansiedade
mais comum na atenção primária, estando entre os dez motivos gerais
mais comuns de consulta. Uma pessoa com transtorno de ansiedade
generalizada normalmente se sente irritada e tem sintoma físicos, como
inquietação, fadiga fácil e tensão muscular. Pode ter problemas de
concentração e de sono. Para fazer um diagnóstico, os sintomas devem
estar presentes por pelo menos seis meses e causar desconforto
clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social,
ocupacional ou em outras áreas importantes.

Um aspecto essencial é a preocupação constante concomitante aos


sintomas somáticos e psíquicos. Os receios mais frequentes são: medo
de adoecer, de que algo negativo aconteça com seus familiares, de não
conseguir cumprir com compromissos profissionais ou financeiros. No
curso do transtorno, é comum a preocupação mudar de foco. É
especialmente comum entre donas de casa e, entre os homens, mais
comum entre os solteiros/separados e desempregados.

O reconhecimento de transtornos de ansiedade na atenção primaria é


pobre, e apenas uma minoria das pessoas com transtornos de
ansiedade recebem algum tratamento. Quando ansiedade coexiste com
depressão é comum que os sintomas depressivos sejam reconhecidos
sem a detecção do transtorno de ansiedade subjacente. Apesar de
considerável variabilidade entre os transtornos de ansiedade, eles
costumam estar associados a incapacidades prolongadas, podendo ter
um longo curso de remissões e recidivas. Podem ser muito
perturbadores para as pessoas afetadas, suas famílias, amigos e
cuidadores. Transtornos de ansiedade normalmente ocorrem
associados entre si, ou com outros problemas como depressão e abuso
de substâncias.

O tratamento deve ser oferecido logo que possível, na própria atenção


primária, e pode ser feito com farmacoterapia, psicoterapia ou
combinação de ambos.
Módulo 2: Ansiedade normal e patológica
Pode-se falar de uma ansiedade normal toda vez que é claramente
vantajoso responder com ela em certas situações ameaçadoras, o que
contrasta com uma ansiedade anormal ou patológica. A ansiedade pode
ser considerada normal para o bebê ameaçado com o afastamento dos
pais ou com a perda do amor, para as crianças no primeiro dia de
escola, para os adolescentes no primeiro namoro, para o jovem no seu
primeiro dia de trabalho, para os adultos que vislumbram a velhice e a
morte, e para pessoas em qualquer idade que enfrentam uma doença
grave. A ansiedade é um acompanhamento normal do crescimento, das
mudanças, de experiências novas e inéditas, do encontro da identidade
profissional e outras situações integradoras do desenvolvimento
humano. Em contrapartida, a ansiedade patológica é uma resposta
inadequada e disfuncional a determinado estímulo, considerando-se sua
intensidade e duração (KAPLAN; SADOCK; GREBB, 1997). Quando a
ansiedade é muito intensa, ela interfere no funcionamento social,
gerando prejuízos na vida profissional, acadêmica e social das pessoas.
Às vezes, as respostas de ansiedade podem ocorrer na ausência de
qualquer ameaça real ou podem estar fora de proporção em relação ao
perigo existente.

A sensação de ansiedade se caracteriza por um sentimento difuso,


desagradável e vago de apreensão, frequentemente, acompanhado por
sintomas autonômicos como: cefaleia, hiperidrose, taquicardia, diarreia,
palpitações, tremores, aperto no peito, formigamento nas extremidades,
dificuldade de ereção, leve desconforto abdominal, frequência alta e
urgência urinária. Um indivíduo ansioso também pode sentir
inquietação, expressa por incapacidade para permanecer sentado ou
imóvel por muito tempo. Todos esses sintomas constituem os efeitos
motores e viscerais da ansiedade. No entanto, a constelação particular
de sintomas presentes tende a variar entre as pessoas. Os efeitos da
ansiedade sobre o pensamento, a percepção e o aprendizado também
não podem ser ignorados. A ansiedade tende a produzir confusão e
distorções perceptivas, não apenas em termos de tempo e espaço, mas
com relação aos significados atribuídos às pessoas e aos eventos.
Essas distorções podem interferir no aprendizado, baixando a
concentração, reduzindo a memória e prejudicando a capacidade de
relacionar uma coisa com outra. Os indivíduos ansiosos são capazes de
selecionar certos objetos em seu ambiente e ignorar outros na tentativa
de provarem que estão certos ao considerarem a situação
amedrontadora e ao responderem de acordo com esta percepção
(KAPLAN; SADOCK; GREBB, 1997).
De acordo com os referidos autores, a psiquiatria tem buscado delimitar
os vários transtornos de ansiedade com base em critérios clínicos de
validade e confiabilidade reconhecidas. O Manual Diagnóstico e
Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-IV – APA, 1994) relaciona os
seguintes transtornos de ansiedade: transtorno de pânico com e sem
agorafobia; agorafobia sem história de transtorno de pânico; fobias
específicas; fobia social (ou transtorno de ansiedade social); transtorno
obsessivo-compulsivo; transtorno de estresse pós-traumático; transtorno
de estresse agudo; transtorno de ansiedade generalizada; transtorno de
ansiedade devido a uma condição médica geral; transtorno de
ansiedade induzido por substância; e transtorno de ansiedade sem
outra especificação, incluindo transtorno misto de ansiedade-depressão.

Dentre os vários transtornos de ansiedade, o interesse deste estudo


reside no Transtorno de Ansiedade Social (TAS) ou fobia social. O uso
da terminologia “transtorno de ansiedade social” é predominante na
literatura atual (GARCÍA et al., 1999), visto que pode incluir outras
características inseridas em traços de personalidade ou atributos
temperamentais, como a timidez (ALCALDE; LÓPEZ, 1999).

Módulo 3: Transtorno de Ansiedade Social


Conforme os critérios diagnósticos do DSM-IV (APA, 1994), os
indivíduos com TAS manifestam um medo excessivo, persistente e
irracional de serem vistos comportando-se de um modo humilhante ou
embaraçoso – pela demonstração de ansiedade ou de desempenho
inadequado – e de consequente desaprovação ou rejeição por parte dos
outros. Apontam que este transtorno pode estar associado a ataques de
pânico. A exposição ao estímulo fóbico ou sua antecipação resulta,
quase que invariavelmente, em um ataque de pânico em um indivíduo
propenso a eles.

Por esses critérios, fica subentendido que há dois subtipos de TAS: o


generalizado (medo da maioria das situações de interação social e de
desempenho) e o circunscrito, específico ou não-generalizado (medo de
uma situação pública de desempenho e de algumas situações de
interação social), cuja caracterização pode ser útil na predição do curso,
prognóstico e na resposta ao tratamento. No entanto, o subtipo
específico do TAS não está reconhecido como um subtipo no DSM-IV
(1994), mas tem sido frequentemente reconhecido na literatura tanto de
pesquisa quanto clínica (BEIDEL; TURNER, 1999; HEIMBERG et al.,
1993).

As situações de desempenho (ou circunstâncias de desempenho) mais


temidas são falar em público, comer, beber, escrever e tocar um
instrumento na frente dos outros, usar banheiro público e entrar em uma
sala onde já se encontram pessoas sentadas. Falar em público,
entretanto, é o medo social mais prevalente (FURMARK, 2000). As
situações interacionais abrangem conversar ao telefone, falar com
pessoas estranhas, participar de festas e reuniões sociais, interagir com
o sexo oposto, conversações face-a-face com estranhos e autoridades e
devolver mercadoria em uma loja (HAZEN; STEIN2, 1995 apud
FALCONE; FIGUEIRA, 2001; FURMARK, 2000).

De acordo com citações feitas por Falcone e Figueira (2001), os fóbicos


sociais, em contato com situações ansiogênicas, costumam apresentar
manifestações físicas como rubor, sudorese, palpitação, tremor das
mãos ou da fala e/ou urgência em evacuar, embora alguns relatem
apenas embaraço e medo.

Estes autores expõem que a evitação fóbica pode ser classificada como
sutil (por exemplo, desviar os olhos, evitar iniciar uma conversação, etc.)
ou extrema (evitar todos os contatos interpessoais fora do ambiente
familiar). Isto pode limitar as possibilidades de sucesso profissional pela
escolha de um trabalho menos qualificado, ou manter um
relacionamento infeliz para não enfrentar a ansiedade de encontrar
novas pessoas. Portanto, este padrão de comportamento evitativo de
situações sociais, característico do TAS, favorece limitações na vida
profissional, acadêmica, social ou sexual da pessoa portadora de tal
transtorno.

Segundo o DSM-IV, para firmar o diagnóstico de tal transtorno é


necessário ainda excluir que tais manifestações sejam resultado de
evitação social originada de complicações relativas a outra condição
médica geral ou de outro transtorno mental.

O TAS precisa ser diferenciado do medo apropriado e da timidez normal


e o DSM-IV auxilia nessa diferenciação, exigindo que os seus sintomas
comprometam a capacidade de funcionar apropriada ou funcionalmente.
Conforme First e Tasman (2006), fatores similares deveriam ser
considerados ao decidir em que ponto a timidez normal alcança uma
intensidade que justificaria um diagnóstico de TAS. Um indivíduo que é
bastante calado em grupos ou quando encontra pessoas
desconhecidas, mas não evita essas situações e não se sente,
particularmente, aflito por sua timidez, provavelmente, não receberia um
diagnóstico de TAS. Em contrapartida, um indivíduo que,
frequentemente, recusa convites para socializar-se por causa de
ansiedade, abandona um trabalho devido à ansiedade por ter que falar
com os clientes, ou sente-se aflito por conta de sua ansiedade social,
provavelmente, receberia um diagnóstico de TAS.

Para Stopa e Clark (1993), pessoas que são tímidas podem entrar em
uma situação social com o mesmo tipo e frequência de cognições que
um fóbico social, mas notam que outras pessoas respondem
demonstrando interesse e decidem que nesta situação, pelo menos,
elas não estão sendo chatas e, então, termina a sequência de
pensamentos negativos. Fóbicos sociais, por outro lado, podem falhar
em fazer esta verificação e, então, mantêm a sequência de
pensamentos negativos. Assim, esses autores hipotetizam que uma das
principais diferenças entre fobia social e timidez poderia residir no fato
da pessoa monitorar a situação social a fim de verificar a validade de
suas afirmações auto avaliativas negativas.

O DSM-IV também reconhece a diferenciação a ser considerada entre o


TAS, transtorno do pânico, agorafobia e o transtorno da personalidade
evitativa. Um indivíduo agorafóbico, frequentemente, sente-se
confortado pela presença de outra pessoa na situação ansiogênica,
enquanto o indivíduo com TAS torna-se mais ansioso pela presença de
outras pessoas. A falta de ar, tonturas, sensação de sufocamento e
medo de morrer são comuns no transtorno do pânico e na agorafobia,
ao passo que os sintomas associados ao TAS, geralmente, envolvem
rubor facial, contrações musculares e ansiedade acerca do escrutínio
por outros (KAPLAN; SADOCK; GREBB, 1997).

Indivíduos com transtorno do pânico experimentam ataques de pânico


inesperados e ansiedade elevada fora da situação fóbica, enquanto que
aqueles com TAS, tipicamente, não. O transtorno do pânico com
agorafobia pode facilmente ser diagnosticado erroneamente como TAS.
Por exemplo, um indivíduo pode evitar um grande número de situações,
incluindo centros comerciais, supermercados, andar em ruas
movimentadas, e várias situações sociais, incluindo festas, encontros e
falar em público. Sem mais informações, este problema do indivíduo
pareceria satisfazer os critérios para o TAS, transtorno do pânico com
agorafobia, ou ambos os diagnósticos. Contudo, muitos indivíduos com
transtorno do pânico evitam uma variedade de situações sociais por
causa de ansiedade por ter outros observando seus sintomas. Além
disso, indivíduos com TAS podem evitar situações que são comumente
evitadas por indivíduos com agorafobia pelo medo de verem alguém
que eles conhecem ou de serem observados por pessoas
desconhecidas. Para fazer o diagnóstico neste caso, é necessário
avaliar as razões para a evitação. Quatro variáveis deveriam ser
consideradas para fazer o diagnóstico diferencial:

(1) tipo e número de ataques de pânico,

(2) foco de apreensão,

(3) número de situações evitadas, e

(4) nível de ansiedade intercorrente (FIRST; TASMAN, 2006).

A diferenciação entre o TAS e o transtorno da personalidade evitativa


pode ser difícil, exigindo avaliação extensa por meio de entrevistas e de
cuidadosa anamnese psiquiátrica (KAPLAN; SADOCK; GREBB, 1997).
Como apontado por Falcone (1998), as pessoas com transtorno da
personalidade evitativa manifestam menos desejo de interagir com os
outros do que os fóbicos sociais. Indivíduos com transtorno de
personalidade evitativa tendem a manifestar mais sensibilidade
interpessoal e apresentam habilidades sociais mais pobres do que
indivíduos com TAS sem transtorno de personalidade evitativa (FIRST;
TASMAN, 2006). Barlow (1988) pressupõe a existência de um
continuum de gravidade envolvendo o TAS circunscrito, generalizado e
o transtorno da personalidade evitativa.

Segundo Kaplan, Sadock e Grebb (1997), duas considerações


diagnósticas diferenciais e adicionais para o TAS são o transtorno
depressivo maior e transtorno da personalidade esquizoide. Em
indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide é a falta de
interesse por se socializar e não o medo de se socializar que leva ao
comportamento de esquiva social. Posto que a esquiva de situações
sociais pode, frequentemente, ser um sintoma da depressão, uma
avaliação clínica sistemática tende a fornecer uma ampla constelação
de sintomas depressivos para caracterizar essa diferenciação. Por outro
lado, de acordo com Falcone (1998), os indivíduos com TAS que se
encontram mais impedidos de obterem reforço social, devido aos seus
medos, podem também desenvolver um quadro depressivo como
comorbidade. Além disso, como apontam First e Tasman (2006),
indivíduos com depressão, transtorno da personalidade esquizoide ou
um transtorno invasivo do desenvolvimento podem evitar situações
sociais devido a uma falta de interesse em passar o tempo com os
outros. Para ser considerado TAS, um indivíduo deve evitar essas
situações, particularmente, devido à ansiedade por poder ser avaliado
negativamente.

Ademais, o TAS não deveria ser diagnosticado se o medo está


completamente relacionado a outro transtorno. Por exemplo, se um
indivíduo com transtorno obsessivo-compulsivo evita situações sociais
somente por causa do embaraço de ter outras pessoas observando seu
comportamento excessivo de lavar as mãos, um diagnóstico de TAS
não deveria ser dado (FIRST; TASMAN, 2006).

Com relação aos aspectos epidemiológicos, a prevalência do TAS, em


seis meses, é de cerca de 2 a 3 por 100 pessoas. Em estudos
epidemiológicos, as mulheres são afetadas com maior frequência do
que os homens, ocorrendo o inverso em amostras clínicas. A idade de
pico de início para o TAS situa-se na adolescência, embora o seu
aparecimento possa ser observado aos 5 ou até aos 35 anos (KAPLAN;
SADOCK; GREBB, 1997). Entretanto, observa-se disparidade entre as
estimativas de prevalência, variando entre 2,6% e 16%, o que pode
estar relacionado às mudanças nos critérios diagnósticos entre as
versões do DSM-III, DSM-III-R, DSM-IV e CID-10 (LECRUBIER et al.,
2000).

Em um estudo epidemiológico recente, Baptista (2007) encontrou uma


prevalência elevada do TAS (11,6%) em uma população composta por
2319 estudantes universitários brasileiros. Identificou-se que os sujeitos
do gênero feminino apresentaram significativamente maior prevalência
do transtorno (12,5%) em comparação aos sujeitos do gênero masculino
(7,4%). No que diz respeito aos tipos de medos, a maioria dos sujeitos
com TAS apresentou medo de falar em público (91,6%), seguido do
medo de comer em público (28,3%) e do medo de escrever em público
(16,5%). A idade média de início do TAS foi de 11,4 anos (DP = 0,27) e
o tempo médio de início do transtorno foi de 10,2 (DP = 0,30). Com
base nestes dados, o autor relata que o TAS é um transtorno sub
reconhecido, subdiagnosticado e associado às incapacidades sociais
importantes.

Conforme os dados de vários estudos, as pessoas com TAS têm


avaliado sua qualidade de vida como prejudicada, mostrando
insatisfação com a vida e também com sua saúde (SAFREN et al.,
1996/1997; STEIN; KEAN, 2000; WITTCHEN; BELOCH, 1996;
WITTCHEN et al., 2000). Esses dados apontam para a necessidade do
diagnóstico precoce de tal transtorno e de modalidades de tratamento
eficazes que atendem as necessidades sociais, pessoais e profissionais
destas pessoas.

A patogênese do TAS pode ser compreendida com base em um modelo


de interações entre fatores biológicos e genéticos, por um lado, e
eventos ambientais, por outro, podendo ser considerada como um
fenômeno clínico multideterminado.

Os parentes em primeiro grau dos indivíduos com TAS estão cerca de


três vezes mais propensos a serem afetados por TAS do que os
parentes em primeiro grau de indivíduos sem transtornos mentais.
Ademais, alguns dados preliminares indicam que os gêmeos
monozigóticos são mais frequentemente concordantes do que os
gêmeos dizigóticos (FALCONE; FIGUEIRAS, 2001; KAPLAN; SADOCK;
GREBB, 1997), embora para tais estudos seja particularmente
importante estudar os gêmeos criados separadamente para ajudar no
controle dos fatores ambientais.

Para Falcone (1998), parece haver uma vulnerabilidade constitucional


que predispõe um indivíduo a desenvolver o TAS, o que em contato
com variáveis relacionadas a padrões de educação, a fatores culturais e
a fatos da experiência pessoal podem favorecer o desenvolvimento
deste transtorno.

Tendo em vista que o TAS é caracterizado pela presença de sintomas


físicos, cognitivos e comportamentais, e visando contemplar os fatores
ambientais que incidem sobre este transtorno, este estudo adotará uma
abordagem cognitivo-comportamental, enquanto eixo teórico, que
enfatiza a interação dos indivíduos com seu ambiente histórico e
imediato para a compreensão de suas condutas, quer sejam públicas ou
encobertas.

Distinção qualitativa entre os subtipos do Transtorno de Ansiedade


Social

De forma geral, alguns aspectos da distinção qualitativa entre os


subtipos do TAS serão abordados, porém sem a pretensão de esgotar o
tema de forma exaustiva. Alguns pesquisadores (BARLOW, 1998;
HEIMBERG et al., 1995; MCNEIL, 2001) interpretam a distinção entre o
TAS generalizado e específico como quantitativa e sustentam que estes
subtipos não são categoricamente distintos, mas existem sobre um
continuum de gravidade, com o TAS generalizado e transtorno da
personalidade evitativa representando o polo mais severo; o TAS
generalizado sem transtorno da personalidade evitativa a forma menos
severa do transtorno; o TAS específico representando uma forma ainda
menos severa; e indivíduos sem ansiedade social representando o polo
oposto.

Em contrapartida, o suporte para uma distinção qualitativa seria


mostrado pelas diferenças significativas encontradas nos sintomas,
curso e causas entre os subtipos generalizado e específico do TAS.
Considerando estas diferenças parecerem difíceis de conciliar com uma
perspectiva estritamente quantitativa, Hook e Valentiner (2002)
propuseram uma distinção qualitativa. Com base nestes autores, as
peculiaridades dessas diferenças serão apresentadas a seguir.

Quanto às diferenças no curso, os subtipos generalizado e específico


do TAS parecem ter idades distintas de início. Mannuzza et al. (1995)
observaram que o início para o TAS generalizado é significativamente
mais precoce (média = 10,9 anos, DP = 5,8) do que para o TAS não-
generalizado (média = 16,9 anos, DP = 9,3), com metade do primeiro
grupo desenvolvendo o transtorno antes dos 10 anos de idade. Ainda, o
TAS específico é comumente descrito como tendo um início
relativamente mais repentino e o TAS generalizado com um início
insidioso ou por toda a vida (DSM-IV – APA, 1994).

Com relação às diferenças na etiologia, a distinção quantitativa sugere


que ambos os subtipos têm histórias de desenvolvimento semelhantes e
que indivíduos com TAS específico poderiam eventualmente
desenvolver o subtipo generalizado. Em contrapartida, uma
interpretação qualitativa propõe que estes subtipos apresentam causas
diferentes em seu desenvolvimento e uma pessoa com TAS específico
pode não estar propenso a desenvolver o subtipo generalizado (HOOK;
VALENTINER, 2002).

Um fator contribuinte importante para o desenvolvimento do TAS parece


ser a hereditariedade. Mannuzza et al. (1995) relataram que os parentes
de indivíduos com TAS generalizado tinham maior probabilidade de ter
um diagnóstico de TAS do que os parentes de indivíduos com TAS não-
generalizado, e que os parentes daqueles com TAS não-generalizado
não tinham maior probabilidade de ter TAS do que controles normais.
De forma semelhante, Stein et al. (1998) observaram que parentes de
primeiro grau de pessoas com TAS generalizado tinham
aproximadamente 10 vezes maior probabilidade para ter TAS (26,4%, N
= 106) do que pessoas sem um diagnóstico de TAS (2,7%, N = 74).
Além disso, os parentes de primeiro grau de indivíduos com TAS
generalizado apresentaram maior probabilidade de ter TAS
generalizado do que o subtipo não-generalizado.

As práticas parentais de cuidado à criança têm sido também


examinadas como possíveis fatores contribuintes para o
desenvolvimento do TAS e ansiedade social. Os pais de indivíduos com
TAS têm sido tipicamente avaliados como excessivamente protetores,
menos calorosos (ARRINDELL et al., 1983) e mais isolados socialmente
(BRUCH, 1989) do que controles normais.

Embora pouca atenção tem sido dada às possíveis diferenças nos


estilos parentais entre os subtipos de TAS, evidências preliminares
sugerem que diferenças existem (HOOK; VALENTINER, 2002). Bruch e
Heimberg (1994) relataram que pacientes tanto com TAS generalizado
quanto não-generalizado descreveram seus pais como pessoas que
davam muita importância às opiniões dos outros e fazendo uso de
constrangimento como uma forma de disciplina mais frequentemente do
que os pais de controles. Indivíduos com TAS generalizado, entretanto,
percebiam seus pais como menos sociáveis e privando-os do contato
social com os outros em comparação às descrições daqueles com TAS
não-generalizado e controles normais. Quanto aos fatores ambientais,
com base em uma entrevista semiestruturada, Stemberger et al. (1995)
observaram que o grupo com TAS específico teve um percentual
significativamente maior de sujeitos (56%, N = 16) relatando
experiências sociais de condicionamento traumático comparado ao
grupo de controles normais (20%, N = 25); porém, não houve diferenças
significativas entre o grupo com TAS generalizado (40%, N =52) e os
demais grupos. Neste sentido, os indivíduos com TAS, frequentemente,
relatam acontecimentos em suas vidas que podem ser episódios de
condicionamento clássico como, por exemplo, o início de sintomas
depois de tornarem-se ansiosos ou envergonhados em uma situação de
avaliação social.

Em contrapartida, um percentual maior de indivíduos do grupo com TAS


generalizado (76%) relatou timidez na infância do que o grupo de
controles normais (52%). Não foram encontradas diferenças
significativas quando o grupo com TAS específico (56%) foi comparado
com os grupos com TAS generalizado e controles normais. De acordo
com Hofmann, Heinrichs e Moscovitch (2004), é possível que timidez e
inibição comportamental sejam fatores de risco para o TAS, e que mais
casos crônicos de TAS demonstrem uma história de inibição
comportamental e timidez na infância. Estes autores reforçam que a
inibição comportamental e timidez parecem estar intimamente
associadas ao subtipo generalizado de TAS, mas não ao subtipo não-
generalizado.

Com relação às características de personalidade, indivíduos com TAS


específico obtiveram escores significativamente mais baixos em
neuroticismo e mais altos em extroversão comparados aos indivíduos
com TAS generalizado, ou seja, mostraram-se significativamente menos
neuróticos e mais extrovertidos do que aqueles com TAS generalizado
(STEMBERGER et al., 1995). Resultados semelhantes foram relatados
em um estudo com formas subclínicas de TAS generalizado e
específico (NORTON et al., 1997). Os resultados mostraram que
extroversão esteve associada negativamente com ansiedade social;
neuroticismo foi o preditor mais forte de tendências para o TAS
generalizado; e sensibilidade à ansiedade (ou seja, o grau em que um
indivíduo está aflito por seus sintomas de ansiedade), o preditor mais
forte de tendências para o TAS não-generalizado. Portanto, as
diferenças entre os subtipos podem estar presentes mesmo em formas
subclínicas do TAS.

Hook e Valentiner (2002) tratam de quatro categorias referentes às


diferenças nos sintomas entre o TAS generalizado e específico,
incluindo: o tipo de situação temida, gravidade do prejuízo, comorbidade
e respostas às situações temidas.

No que diz respeito ao tipo de situação temida, estes autores também


definiram o TAS generalizado e específico em termos da difusão de
medos sociais, com o TAS específico associado a um número mais
limitado de medos. Consideram que o TAS generalizado esteja mais
associado às situações de interação e o TAS específico às situações de
desempenho. No entanto, argumentam que os critérios que focam o
número de situações para diagnosticar os subtipos podem obscurecer
uma questão muito importante: se os medos subjacentes estão
relacionados às características de desempenho ou de interação das
situações sociais, considerando que muitas situações de desempenho
envolvem algum tipo de interação. Assim, a distinção qualitativa sugere
que o número de situações temidas não seja a base para a
diferenciação dos subtipos.

Particularmente, o DSM-IV apenas instrui o clínico a especificar o TAS


como generalizado se os temores incluem a maioria das situações
sociais, mas não fornece informações sobre a especificação de um
subtipo para aqueles indivíduos que não temem a maioria das situações
sociais. Sob as suas diretrizes, a distinção entre os subtipos não está
clara e pode ser interpretada de maneiras diferentes. Segundo Turner,
Beidel e Townsley (1992), a maioria das situações para especificar o
TAS generalizado pode significar a maioria dos tipos de situações,
embora também não esteja claro que número corresponderia à maioria.
Por outro lado, alguns pesquisadores têm proposto uma distinção de
subtipos entre aqueles que temem as situações sociais mais comuns
(por exemplo, conversações, reuniões sociais ou festas) e aqueles que
apresentam dificuldade em situações menos comuns, orientadas ao
desempenho (por exemplo, discursos e encontros).

Quanto à gravidade do prejuízo, talvez uma das distinções mais


aparentes entre os subtipos de TAS é que o generalizado seja mais
incapacitante do que o específico (HOOK; VALENTINER, 2002). Mais
especificamente, indivíduos com TAS generalizado relatam maior
evitação social, medo de avaliação negativa (BROWN; HEIMBERG;
JUSTER, 1995; TRAN; CHAMBLES, 1995) e ansiedade social geral
(BROWN; HEIMBERG; JUSTER, 1995; TURNER; BEIDEL,
TOWNSLEY, 1992), além de apresentarem habilidades sociais mais
pobres (HERBERT; HOPE; BELLACK, 1992) do que indivíduos com
TAS específico.

Segundo Hook e Valentiner (2002), o TAS generalizado está também


associado a níveis maiores de prejuízos sociais. Comparados aos
indivíduos com TAS não-generalizado, indivíduos com TAS
generalizado são mais comumente solteiros (MANNUZZA et al., 1995),
têm menor nível educacional e menor probabilidade de estarem
empregados (FIRST; TASMAN, 2006; HEIMBERG et al., 1990). Tais
resultados são consistentes com uma distinção tanto qualitativa quanto
quantitativa entre os subtipos de TAS (HOOK; VALENTINER, 2002).

Em termos de comorbidade, as taxas são maiores para o TAS


generalizado do que para o não-generalizado, especialmente com
depressão atípica, alcoolismo (MANNUZZA et al., 1995), transtornos de
humor, outros transtornos de ansiedade (STEIN; CHAVIRA, 1998), e
transtorno de personalidade evitativa (BOONE et al., 1999), sendo que,
na maioria dos casos, o TAS precede o início de transtornos comórbidos
(SCHNEIER et al., 1992).

No que se refere às respostas em situações sociais, de acordo com


Hook e Valentiner (2002), a distinção quantitativa prediz que o subtipo
generalizado do TAS estaria associado a níveis mais altos de
perturbação do que o subtipo específico. A distinção qualitativa,
entretanto, prediz que o TAS generalizado e específico demonstrariam
perfis de respostas e sintomas diferentes, com o subtipo específico
demonstrando níveis mais altos do que o generalizado em pelo menos
alguns índices de perturbação, como demonstrado abaixo.

Em quatro estudos que mediram reatividade fisiológica para situações


temidas (BOONE et al., 1999; HEIMBERG et al., 1990; HOFMANN et
al., 1995; LEVIN et al., 1993), os indivíduos com TAS específico
apresentaram frequência cardíaca mais alta em uma tarefa de falar em
público, do que o subtipo generalizado. Boone et al. (1999) também
examinou as respostas do TAS generalizado e específico em um role-
play de interação social (conversar com um desconhecido do gênero
oposto). Este tipo de situação não produziu respostas fisiológicas
diferenciais, ao contrário da diferença encontrada para o role-play de
falar em público. Como defendem Hook e Valentiner (2002), estes
resultados são consistentes com a concepção de que o TAS específico
implica em ansiedade de desempenho e sugere que reações de
ansiedade aguda associadas ao TAS específico não ocorrem durante
desafios de interação social.

Ao contrário do padrão de maior reatividade fisiológica para o subtipo


específico do que para o generalizado, o padrão geral dos resultados de
quatro estudos sugere que o TAS generalizado está associado a mais
autorrelatos de ansiedade do que o TAS específico. Um estudo (TRAN;
CHAMBLESS, 1995) observou que o grupo com TAS específico relatou
maior ansiedade comparado ao grupo com TAS generalizado sem
transtorno de personalidade evitativa somente durante o discurso, e três
(HOFMANN et al., 1995; LEVIN et al., 1993; TURNER et al., 1992)
encontraram que os grupos com TAS generalizado relataram maior
ansiedade. No estudo de Boone et al. (1999), apenas o grupo com TAS
generalizado e transtorno de personalidade evitativa relatou
significativamente maior ansiedade-estado do que o grupo com TAS
circunscrito durante o discurso. Com relação à tarefa de conversação,
ambos os grupos de TAS generalizado (com e sem transtorno de
personalidade evitativa) relataram significativamente maior ansiedade-
estado do que o grupo com TAS circunscrito.

Na análise de Hook e Valentiner (2002), como estas investigações


mediram ansiedade usando sistemas de avaliação diferentes, a
variabilidade dos resultados pode refletir diferenças metodológicas.

Todos os estudos acima tiveram em comum o procedimento dos


sujeitos receberem a tarefa de fazer um discurso frente a uma audiência
de 2 a 6 de pessoas. Em geral, além desta tarefa, quatro dos cinco
estudos tiveram as seguintes variações em seus procedimentos: (a) no
estudo de Tran e Chambless (1995), os sujeitos participavam de duas
tarefas de role-plays, nas quais tinham que iniciar e manter
conversação, uma com um assistente de pesquisa do mesmo gênero e
a outra com um assistente do gênero oposto; (b) no de Hoffmann et al.
(1995), o sujeito conversava com o experimentador sobre o que fez no
dia anterior ao experimento, durante três minutos, antes de preparar o
discurso; (c) em Turner et al. (1992), os sujeitos participavam de duas
interações interpessoais não-estruturadas, uma com um assistente de
pesquisa do mesmo gênero (como se este fosse um vizinho ou
companheiro de quarto) e a outra com um assistente do gênero oposto
(como se estivesse em um primeiro encontro romântico com ele); e (d)
em Boone et al. (1999), os sujeitos tinham que participar de uma
conversação com um desconhecido do gênero oposto, como se
estivessem se conhecendo.

No tocante às cognições, evidências preliminares sugerem


características únicas associadas ao TAS generalizado e específico
(HOOK; VALENTINER, 2002). McNeil et al. (1995) examinaram as
respostas de indivíduos com TAS generalizado e circunscrito usando
uma versão modificada do Stroop Teste. No General Social Stimuli
Stroop Test, o grupo com TAS generalizado apresentou um tempo de
resposta significativamente mais longo para palavras sociais (por
exemplo, festa), ou seja, maior interferência cognitiva, comparado ao
grupo com TAS circunscrito. Este teste, em particular, foi designado
para avaliar interferência devido à ansiedade associada a uma
variedade de situações sociais. De acordo com Hook e Valentiner
(2002), o tempo mais longo para processar certos estímulos sociais tem
sido interpretado como uma tendência dos indivíduos com o subtipo
generalizado de TAS para desviarem a atenção de estímulos sociais e
dirigi-la mais para informações de autorreferência.

Em termos comportamentais, Hofmann et al. (1997) compararam os


comportamentos de fóbicos sociais generalizados e não-generalizados
durante os dois primeiros minutos na situação de falar em público. O
comportamento de fixar o olhar (manter contato visual) não diferiu
significativamente entre os grupos. No entanto, os fóbicos sociais
generalizados relataram mais ansiedade e gastaram mais tempo
pausando dos que os fóbicos sociais não-generalizados, ou seja,
aproximadamente 15% a mais. Estes autores observaram que a
produção de um discurso envolve um número de processos cognitivos
altamente complexos que requer certa quantidade de atenção. O
discurso pode ser perturbado se o sujeito realoca a atenção para outros
processos cognitivos. Como os fóbicos sociais generalizados relataram
mais ansiedade, sua atenção pode ter sido realocada para outros
processos cognitivos adicionais, como por exemplo, prestar mais
atenção à própria presença, atributos e sentimentos durante o discurso,
resultando em mais pausas.

O mais central deste corpo de evidências é a diferença em tipos de


situações sociais temidas (isto é, desempenho versus interação),
distribuições distintas da idade de início, os perfis distintos de respostas
fisiológicas em situações sociais, diferenças claras em fatores causais
(isto é, genéticos versus ambientais), e os prejuízos sociais e
ocupacionais. Conforme Hook e Valentiner (2002), o quadro que
emerge do TAS específico é bastante consistente com aquele de fobias
específicas. As respostas de indivíduos com TAS específico durante
confrontação com a situação social temida são semelhantes àquelas
esperadas para fóbicos específicos quando confrontam seus objetos
temidos. O quadro que emerge do TAS generalizado não é consistente
com aquele das fobias específicas. Embora algumas das características
fenotípicas, tais como comportamento evitativo, sejam comparáveis
àquelas de outros transtornos de ansiedade, outras características não
são. O mais notável a este respeito é a falta de reações fisiológicas
pronunciadas em confrontação com a situação temida.
Módulo 4: Aspectos cognitivos e comportamentais
Em um trabalho de revisão da literatura, Furmark (2000) faz uma
distinção entre os aspectos cognitivos e comportamentais associados à
fobia social. A seguir, estes aspectos serão explorados segundo a
revisão empreendida por este autor, com algumas contribuições de
outros autores:

ASPECTOS COGNITIVOS

Geralmente, os modelos cognitivos de fobia social enfatizam que os


fóbicos sociais são excessivamente preocupados com a maneira pela
qual eles estão sendo percebidos e avaliados pelos outros. Na
perspectiva cognitiva, a ansiedade social pode emergir de um excesso
de pensamentos negativos, defeitos pessoais percebidos, padrões
excessivamente elevados para seus próprios desempenhos e/ou
crenças irreais acerca dos padrões que as pessoas comumente usam
para avaliar os outros. Conforme argumentam Stopa e Clark (1993), os
pensamentos de fóbicos sociais não são informações guiadas pelas
situações sociais, mas uma função bastante semelhante a um programa
automático que é ativado nas situações sociais. Para Falcone e Figueira
(2001), o aspecto central da fobia social é um forte desejo de causar
impressão favorável nos outros e uma insegurança marcante sobre a
própria habilidade em alcançar esse objetivo. Ao entrarem em uma
situação social, os fóbicos sociais acreditam que se comportarão de um
modo inepto ou inadequado e, como consequência, serão rebaixados,
rejeitados e desacreditados.

Antes de entrarem em uma situação social problemática, os fóbicos


sociais frequentemente reveem em detalhe o que eles pensam que
poderia acontecer e como eles poderiam lidar com as várias
dificuldades que podem surgir. Estas ruminações podem sensibilizar os
indivíduos de modo que eles entrem na situação com um modo de
processamento autofocado pré-ativado. Assim, ao pensarem que estão
correndo o risco de uma avaliação negativa, os indivíduos dirigem sua
atenção para uma autoobservação detalhada, o que aumenta a
ansiedade e interfere no processamento da situação e dos
comportamentos da outra pessoa. Frente a situações estressantes,
indivíduos socialmente ansiosos comumente relatam mais pensamentos
negativos e menos positivos que sujeitos não ansiosos ou não incluídos
em grupos clínicos. A autopercepção gera uma impressão negativa de
si mesmo que, para eles, reflete o que os outros realmente notam e
pensam sobre eles.
Os pensamentos negativos nem sempre param imediatamente após o
indivíduo deixar a situação social. Ao contrário, as ruminações negativas
tendem a continuar na medida em que os indivíduos fóbicos,
posteriormente, reveem mentalmente em detalhes o que aconteceu.
Wells e Clark (1997 apud FURMARK, 2000) usam o termo“
processamento post-mortem” para descrever o pensamento
retrospectivo sobreas situações fóbicas.

O processamento postcmortem pode ser relacionado a uma


necessidade fortemente sentida de reparar a autoestima e planejar
estratégias mais efetivas para lidar com a situação no futuro.

Nos transtornos de ansiedade, esforços consideráveis de pesquisa têm


sido dedicados para a questão dos vieses no processamento de
informações com relação a indícios de ameaças relevantes, por
exemplo, relacionados à atenção, a interpretação e a memória. Tais
vieses têm sido relatados por indivíduos com fobia social. Por exemplo,
estudos empíricos usando a avaliação por meio do Stroop Teste e
tarefas de decisão léxica, geralmente apontam que os fóbicos sociais
demonstram maior vigilância para informação relacionada a ameaça
social comparada a informação relacionada a ameaça física ou neutra.
Wells e Clark (1997 apud FURMARK, 2000) relatam que a hiper
vigilância para os indícios interoceptivos de ameaça levam os fóbicos
sociais a se esquivarem ou afastarem a atenção de informações
ameaçadoras externas nos seus ambientes sociais, argumentando que
os indivíduos socialmente ansiosos são caracterizados cognitivamente
pela atenção autofocada e codificação pobre em dicas ambientais.

Destacam-se também elementos que demonstram viés de interpretação


por parte dos fóbicos sociais. Por exemplo, indivíduos socialmente
ansiosos têm uma tendência para avaliar seu próprio desempenho
muito pior do que juízes independentes. Além disso, tem-se
demonstrado que os fóbicos sociais tendem a interpretar eventos
ambíguos como negativos e supervalorizar a probabilidade de
resultados sociais negativos. Indivíduos socialmente ansiosos também
exageram a extensão na qual os observadores podem notar que eles se
sentem desconfortáveis. Wells e Clark (1997 apud FURMARK, 2000)
argumentam que o indivíduo socialmente fóbico tipicamente constrói
uma imagem negativa de si mesmo a partir da perspectiva de um
observador, como se a pessoa estivesse se vendo fora do seu corpo,
olhando para si mesma.
Estudos cognitivos têm demonstrado que os fóbicos sociais mostram
recuperação de “memória aumentada” relativa a informações relevantes
de ameaças para eles, desconsiderando os aspectos positivos ou
neutros da situação como um todo. Alguns estudos sugerem que
indivíduos socialmente ansiosos tendem a lembrar mais dados
negativos sobre eles próprios, como consequência de atenção
autofocada, do que pessoas menos vigilantes socialmente (BRECK;
SMITH, 1983; O’BANION; ARKOWITZ, 1977 apud FURMARK, 2000).

Módulo 5: Aspectos comportamentais


De acordo com os princípios do condicionamento operante, acredita-se
que as fobias sejam mantidas pelos comportamentos de fuga e esquiva.
Por exemplo, quando um aracnofóbico foge de um porão depois de ver
uma aranha andando na parede, o comportamento de fuga é reforçado
negativamente porque ele acaba com a exposição aversiva. A esquiva
futura de entrar no porão similarmente evita exposição aversiva
potencial. Contudo, enquanto essas estratégias reduzem ansiedade em
uma perspectiva mais limitada, o indivíduo fóbico nunca tem uma
chance de aprender maneiras mais adequadas e menos
desconfortáveis para lidar com o objeto fóbico. É por isso que a
exposição a eventos temidos é uma marca essencial nos tratamentos
comportamentais das fobias. A fuga e esquiva também são importantes
na fobia social, embora seja talvez mais difícil de se evitar
completamente as situações sociais ou fugir delas do que outras
situações fobogênicas, especificamente nas fobias específicas e
agorafobia. Sair correndo da sala de aula quando precisar falar na aula,
voltar de uma festa cedo para casa ou desligar o telefone antes que a
outra pessoa seja capaz de atender são alguns exemplos de
comportamento de fuga na fobia social. A esquiva pode ser manifestada
de formas incontáveis, como, por exemplo, quando um aluno talentoso
se recusa a entrar na universidade pelo medo de falar na aula ou
quando um empregado habilidoso rejeita uma promoção porque a nova
posição põe maior ênfase nos contatos sociais.

Wells e Clark (1997 apud FURMARK, 2000) argumentam que a fobia


social é mantida por manobras sutis de esquiva ou “comportamentos de
segurança”, praticados por indivíduos socialmente ansiosos quando
resistem a situações fóbicas. Evitar contato visual nas conversas, usar
roupas frescas para evitar suor, manter os braços rígidos para evitar
tremor, ensaiar um discurso várias vezes e falar rapidamente para evitar
pausas longas e dar impressão de insegurança, segurar um copo com
força para não aparentar tremor são alguns exemplos de tais
comportamentos de segurança. Estes comportamentos se destinam a
reduzir o risco de fracasso social, contudo eles impedem os indivíduos
de testarem a validade de suas crenças negativas e preservam a sua
atenção autofocada, sendo possível faltar-lhes habilidades de
enfrentamento mais efetivas para lidarem com as situações
interpessoais.

Por conseguinte, a questão de habilidades sociais deve ser mencionada


como um dos aspectos fundamentais da fobia social. Poder-se-ia
suspeitar que os fóbicos sociais careçam de habilidades adequadas
(verbais ou não-verbais) necessárias para lidar com as situações sociais
de interação ou de desempenho. Contudo, conforme revisão
empreendida por Furmark (2000), a pesquisa nesse tópico tem sido
inconsistente, considerando que embora os fóbicos sociais pareçam ter
desempenhos inadequados em alguns estudos, isso poderia refletir
inibição ao contrário de falta real de habilidades. É possível que tais
habilidades sociais estejam apenas inibidas durante estados de alta
ansiedade em situações fóbicas, sendo desejável desenvolver ou
estimular habilidades de enfrentamento no repertório destes indivíduos.

Módulo 6: Habilidades Sociais


Del Prette e Del Prette (2001) definem habilidades sociais como
diferentes classes de comportamentos sociais existentes no repertório
de um indivíduo para lidar de maneia adequada com as demandas das
situações interpessoais. Este conceito abrange mais o aspecto
descritivo dos comportamentos verbais e não-verbais apresentados pelo
indivíduo diante das diferentes demandas das situações interpessoais.
Demanda seria uma ocasião ou oportunidade diante da qual se espera
um determinado desempenho social em relação a uma ou mais
pessoas.

Poder-se-ia afirmar que as demandas seriam produtos da vida em


sociedade, regulada pela cultura de subgrupos. E, sendo assim, quando
algumas pessoas não conseguem adequar-se a elas, principalmente às
mais importantes, são consideradas desadaptadas, provocando reações
de vários tipos nas demais. O exemplo mais extremo, segundo os
autores, seria o do fóbico social “que não consegue responder às
demandas interpessoais de vários contextos, isolando-se no grupo
familiar e, mesmo neste, mantendo um contato social bastante
empobrecido” (p. 47). Tanto as habilidades cognitivas de percepção
social e processamento de informação que definem, organizam e guiam
o desempenho social, quanto as habilidades comportamentais verbais e
não-verbais que implementam a direção definida pelos processos
cognitivos estão agrupadas no conceito de habilidades sociais (DEL
PRETTE; DEL PRETTE, 2001).

Os referidos autores apresentam uma distinção clara entre os conceitos


de habilidades sociais, desempenho social e competência social. O
desempenho social refere-se à emissão de um comportamento ou
sequência de comportamentos em uma situação social qualquer,
incluindo tanto as condutas que favorecem como as que interferem na
qualidade dos relacionamentos; e a competência social é um termo
amplamente utilizado para qualificar o nível de proficiência com que as
classes de comportamentos verbais e não-verbais de um indivíduo são
articuladas em um desempenho bem sucedido. Neste sentido, a
competência social tem um sentido avaliativo que remete aos efeitos do
desempenho social apresentado por um indivíduo para garantir a
consecução dos seus objetivos (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 1999;
2001), o que depende muito das características da audiência com a qual
interage. O grau de efetividade do desempenho de uma pessoa também
dependerá do que ela deseja conseguir na situação particular em que
se encontra. Não obstante, muitas vezes a disponibilidade de um
variado repertório de habilidades sociais também não implica,
necessariamente, em um desempenho socialmente competente,
embora seja uma das condições para isso.

Em acréscimo, Caballo (1999) define o comportamento socialmente


habilidoso como o conjunto de condutas emitidas por um indivíduo, em
um contexto interpessoal, que expressa seus sentimentos, atitudes,
desejos, opiniões ou direitos, de um modo adequado à situação,
respeitando essas condutas nos demais e que, geralmente, resolve os
problemas imediatos da situação enquanto minimiza a probabilidade de
problemas futuros. Em sua definição, este autor aproxima os conceitos
de habilidades sociais e comportamento assertivo, que visa a
autoafirmação do indivíduo perante os outros, a garantia dos seus
direitos e a expressão apropriada, direta e honesta dos seus
pensamentos, sentimentos e crenças, não violando o direito dos demais
(ANGÉLICO, 2004).

As habilidades sociais devem ser consideradas dentro de um contexto


situacional e cultural que estabelecem e configuram as contingências
em que são aprendidas e emitidas. O contexto situacional inclui o
ambiente físico onde as pessoas se comportam (sala de aula, cinema,
lanchonete e assim por diante), o evento antecedente e consequente
para determinados desempenhos sociais, e as regras explícitas e
implícitas que sinalizam os comportamentos valorizados, aceitos ou
proibidos em cada situação específica. O contexto cultural abrange as
normas e valores que definem os padrões de comportamento
valorizados ou reprovados para os diferentes tipos de situações,
contextos ou interlocutores. (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2005). Os
dois contextos se interpenetram e estão sempre presentes nas
interações sociais.

Com relação às diferenças culturais, embora a falta de contato visual


possa ser interpretada como indicativo de timidez ou falta de
assertividade pelos americanos brancos, a evitação de contato visual é,
frequentemente, vista como um sinal de respeito entre os japoneses e
americanos de origem mexicana. Ao contrário dos americanos brancos,
os japoneses apresentam maior probabilidade de interpretar o sorriso
como um sinal de embaraço ou desconforto. Enquanto os americanos
brancos, muitas vezes, ficam incomodados com o silêncio em uma
conversação, os indivíduos árabes e britânicos podem usar o silêncio
para privacidade e outras culturas o usam para indicar concordância
entre as partes ou como um sinal de respeito (FIRST; TASMAN, 2006).

Além disso, as habilidades sociais são sempre avaliadas em seu nível


molecular e/ou molar. Em geral, o nível molar refere-se a habilidades
globais, como expressão de sentimentos, solicitar emprego, falar em
público, liderar um grupo e lidar com críticas, enquanto o nível molecular
refere-se a habilidades componentes, como fazer perguntas, volume da
voz, contato visual, velocidade da fala, entre outros (DEL PRETTE; DEL
PRETTE, 1999).

Sem dúvida alguma, as habilidades sociais são aprendidas e as


demandas para a sua aquisição e desempenho variam em função do
estágio de desenvolvimento do indivíduo (ANGÉLICO, 2004). Por
exemplo, uma criança de escola maternal não apresentará as mesmas
habilidades sociais que uma do ensino fundamental, e as habilidades
sociais que um adolescente demonstrará não serão as mesmas
esperadas de um adulto ou pessoa idosa.

No entanto, considera-se que os déficits de habilidades sociais


dificultam o funcionamento social e a capacidade adaptativa do
indivíduo, com implicações e prejuízos diversos, especialmente para o
desempenho e interações sociais. Os diferentes tipos de déficits de
habilidades sociais que um indivíduo pode apresentar são:

(a) déficit de aquisição, caracterizado pela não ocorrência na habilidade


social diante das demandas do ambiente ou, em outras palavras, o
indivíduo por razões diversas simplesmente não aprendeu uma
determinada habilidade em sua história de reforçamento;

(b) déficit de desempenho, caracterizado pela ocorrência de uma


habilidade específica com frequência inferior à esperada diante das
demandas do ambiente; e

(c) déficit de fluência, demonstrado pela ocorrência da habilidade com


proficiência inferior à esperada diante das demandas sociais
(ANGÉLICO; CRIPPA; LOUREIRO, 2006; GRESHAM, 2002).

De acordo com Elliott e Gresham (1993), os déficits de habilidades


sociais podem ser atribuídos a várias causas, incluindo:

• Falta de conhecimento. Neste caso, o indivíduo desconhece como


comportar-se de maneira socialmente apropriada. Os déficits de
conhecimento estão relacionados a três áreas de deficiência:

(1) Deficiência em reconhecer as metas apropriadas para as interações


sociais. Por exemplo, um indivíduo pode ver o objetivo de um jogo
apenas como oportunidade de vencer ao invés de diversão com os
colegas. As metas sociais representam um aspecto importante do
desempenho das habilidades sociais e, frequentemente, quando as
metas de um indivíduo não são congruentes com as metas sociais do
grupo, ele é excluído ou rejeitado;

(2) Falta de conhecimento de estratégias comportamentais para


alcançar metas socialmente apropriadas. Este tipo de deficiência pode,
muitas vezes, resultar de uma falta de prática de habilidades
componentes que permitiriam o alcance de uma meta social. Por
exemplo, alguém pode desejar ter um novo amigo, mas pode carecer de
habilidades de iniciar e manter conversação que lhe permitiriam criar
uma amizade;

(3) Falta de conhecimento dos contextos nos quais certas estratégias


comportamentais seriam apropriadas ou, em outras palavras, o
indivíduo não sabe combinar as estratégias comportamentais com os
contextos situacionais apropriados. O indivíduo pode perceber
erroneamente ou ignorar dicas ou pistas no ambiente que sugeririam
estratégias comportamentais apropriadas. Por exemplo, uma garota
pode estar dominando uma conversa com um grupo de amigos e não
perceber as reações sutis do grupo que sugeririam que ela permita que
os outros falem. O problema dessa garota não é que ela careça de
metas sociais apropriadas ou de habilidades de conversação, mas sim
que ela carece de habilidades para perceber dicas sociais no ambiente
que sugeririam que ela mude seu comportamento.

• Falta de prática ou feedback. Muitas pessoas exibem desempenhos


deficientes em habilidades sociais porque elas não tiveram a prática
suficiente em desempenhar uma habilidade social adquirida
recentemente. Os déficits de habilidades sociais resultantes de prática
insuficiente estão relacionados a desempenhos comportamentais
inadequados de uma habilidade social. Um componente importante da
prática comportamental é fornecer feedback para os desempenhos
apropriados de modo que a pessoa mude ou melhore o seu
comportamento social.

• Ausência de modelos ou oportunidades. Alguns indivíduos são


deficientes em certas habilidades sociais porque as oportunidades ou
modelos sociais que estimulariam a aprendizagem ou desempenho de
comportamentos socialmente apropriados estiveram ausentes. Por
exemplo, um indivíduo pode ter aprendido participar em atividades
sociais somente com pessoas conhecidas. Quando esse indivíduo entra
em contato com uma situação social envolvendo pessoas
desconhecidas, ele não participa. Neste caso, a causa funcional de sua
falta de participação foi a ausência de modelos sociais próximos
(colegas conhecidos) que ocasionariam a sua participação social entre
pessoas pouco conhecidas.

• Falhas de reforçamento. Muitos indivíduos exibem frequências


baixas de habilidades sociais apropriadas porque seu comportamento
produz pouco ou nenhum reforçamento do ambiente. Se certos
comportamentos produzem pouco reforçamento, eles serão
apresentados infrequentemente. Para muitas crianças com habilidades
sociais deficientes, as interações com pares produzem pouco ou
nenhum reforçamento de seus ambientes sociais e, em alguns casos,
estas interações podem produzir consequências aversivas (por
exemplo, provocação, xingamentos, ser ignorado, entre outras). Por
exemplo, um indivíduo socialmente isolado pode interagir raras vezes
com os amigos porque a interação com pares foi associada a pouco
reforçamento no passado. Numerosos exemplos na literatura de
pesquisa operante confirmam o poder do reforçamento dado de maneira
contingente para aumentar os comportamentos socialmente
apropriados.

• Comportamentos-problema. Alguns indivíduos podem falhar em


adquirir ou desempenhar certas habilidades sociais por causa da
presença de comportamentos-problema. Há, potencialmente, um grande
número de comportamentos-problema que podem ser classificados em:
(a) externalizantes (birras, discussões com os outros e brigas); (b)
internalizantes (ansiedade, depressão e baixa autoestima); e (c)
hiperatividade (distração, impulsividade e inquietação).

• Excesso de ansiedade interpessoal. As reações de ansiedade muito


intensas podem comprometer o desempenho socialmente competente
ou podem mesmo inibi-lo, embora os indivíduos saibam como devem se
comportar e possuam, em seu repertório, as habilidades necessárias
para responder às demandas do ambiente. O excesso de ansiedade
interpessoal foi incluído como uma das possíveis causas dos déficits de
habilidades sociais por Del Prette e Del Prette (2005).

É importante ter em mente que a deficiência em uma dada habilidade


social para um indivíduo em particular pode ser devido ou a uma causa
isolada ou a uma combinação de causas. Além disso, algumas dessas
causas encontram-se associadas aos três tipos de déficits e outras a
apenas um ou dois deles. Del Prette e Del Prette (2005) associam todas
as causas, acima listadas, ao déficit de fluência; a falta de
conhecimento, ausência de modelos e oportunidades, e
comportamentos-problema ao déficit de aquisição. E a falta de
feedback, ausência de modelos ou oportunidades, falhas de
reforçamento, comportamentos-problema e ansiedade interpessoal
excessiva estariam associadas ao déficit de desempenho.

Módulo 7: Transtorno de Ansiedade Social e


Habilidades Sociais
O repertório de habilidades sociais vem constituindo, cada vez mais,
uma medida de avaliação clínica da fobia social. Segundo Falcone
(1998), o déficit em habilidades sociais parece comum entre os fóbicos
sociais, principalmente na forma generalizada. Por outro lado, poderia
ser argumentado que os fóbicos sociais possuem habilidades sociais
em seu repertório, mas que sua exibição fica inibida durante a
manifestação de ansiedade (FURMARK, 2000; HEIMBERG; DODGE;
BECKER, 1987).

Formas sutis de evitação (interromper uma situação, desviar o contato


ocular, entre outras) podem ser identificadas por meio de observação do
comportamento do indivíduo em jogos de papéis (BUTLER, 1989).
De acordo com Falcone e Figueira (2001), a preocupação com a
monitoração da própria ansiedade e do desempenho, aliada aos
comportamentos de segurança (por exemplo, evitação do contato visual,
evitação de autorrevelação, entre outros) podem dar uma impressão
pouco amigável ou calorosa. Do mesmo modo, os fóbicos sociais
tornam-se preocupados com seus pensamentos negativos, e esta
preocupação interfere com a habilidade para processar dicas sociais,
levando a uma deterioração objetiva no seu desempenho (STOPA;
CLARK, 1993). Nessas circunstâncias, o fóbico social presta pouca ou
nenhuma atenção ao interlocutor e essas deficiências na interação
comprometem a relação, fazendo com que a outra pessoa distancie-se,
produzindo um padrão negativo de interação, o que contribui
posteriormente para a manutenção da fobia social.

Considerando, por um lado, o fato dos estudantes universitários


constituírem uma classe profissional emergente que tem, pelo menos
em algumas áreas, a interação social como base de sua ação
profissional, quando não também o objeto e objetivo dessa atuação
(DEL PRETTE; DEL PRETTE; CASTELO BRANCO, 1992a; DEL
PRETTE; DEL PRETTE; CASTELO BRANCO, 1992b), e, por outro, o
elevado comprometimento social e funcional evidenciado na qualidade
de vida de indivíduos com TAS, a necessidade de avaliação do
desempenho social desse grupo assume inquestionável relevância tanto
social quanto educacional. Um repertório de habilidades interpessoais
(aproximar-se de outras pessoas, iniciar contato e conversação,
estabelecer contato visual, defender os próprios direitos, criticar, fazer
pedidos, recusar pedidos abusivos, pedir mudança de comportamento,
entre outras) e de desempenho de falar em público (construção da fala,
pronúncia, concentração no conteúdo da fala, criar consciência do outro
na interação e autoconsciência pública) pode ser considerado
imprescindível para um melhor desempenho acadêmico e social de
indivíduos universitários.

Embora diversos instrumentos de medida já tenham sido construídos na


área de estudo das habilidades sociais, poucos foram elaborados ou
validados para o contexto cultural brasileiro. Ainda que existam
aspectos do repertório de habilidades sociais comuns a diversas
culturas, certas especificidades aconselham a adaptação de
instrumentos elaborados em outros contextos ou, mesmo, a construção
de novos instrumentos a partir de características próprias da subcultura
para a qual se destinam (DEL PRETTE; DEL PRETTE; BARRETO,
1998).
Uma escala para a avaliação da competência social de pacientes
psiquiátricos, por meio do desempenho de papéis, foi elabora por
Bandeira e Tremblay (1998), com propriedades psicométricas
satisfatórias (BANDEIRA, 2002). A Escala Brasileira para a Medida de
Assertividade (AYRES, 1994) e a Escala de Assertividade de Rathus,
adaptada e validada para o contexto brasileiro (PASQUALI; GOUVEIA,
1990), visam avaliar especificamente a assertividade e não as
habilidades sociais consideradas como um conceito mais abrangente.

Para suprir a falta de uma medida que avaliasse as habilidades sociais


em geral dos indivíduos, Del Prette e Del Prette (2001) elaboraram e
validaram o Inventário de Habilidades Sociais (IHS-Del-Prette) para
avaliar o repertório interpessoal de estudantes universitários, que além
de ser um instrumento de fácil aplicação, cobre um grande número de
situações e comportamentos interpessoais. No entanto, nenhum estudo
anterior aferiu as propriedades psicométricas deste instrumento em
amostras clínicas representativas de quaisquer transtornos
psiquiátricos.

Ainda que o déficit em habilidades sociais não esteja presente em


muitos fóbicos sociais, é recomendável que a sua avaliação seja
realizada, independentemente de manifestarem estes déficits, para
efeitos tanto de caracterização do repertório desses indivíduos quanto
de instrumentar programas de tratamento efetivos que atendam as suas
demandas interpessoais e acadêmicas de modo mais direto e objetivo.
E nesta direção, considera-se também que o desempenho de falar em
público pode se constituir em uma importante medida ou estratégia de
avaliação clínica do TAS, enquanto uma habilidade componente do
repertório interpessoal global dos indivíduos.

Módulo 8: Classificação na CID 10


F41.1 ANSIEDADE GENERALIZADA

Ansiedade generalizada e persistente que não ocorre exclusivamente


nem mesmo de modo preferencial numa situação determinada (a
ansiedade é “flutuante”). Os sintomas essenciais são variáveis, mas
compreendem nervosismo persistente, tremores, tensão muscular,
transpiração, sensação de vazio na cabeça, palpitações, tonturas e
desconforto epigástrico. Medos de que o paciente ou um de seus
próximos irá brevemente ficar doente ou sofrer um acidente são
frequentemente expressos. Sua sinonímia inclui estado ansioso,
neurose ansiosa e reação de angústia. Deve ser diferenciado da
neurastenia, codificada em outra seção.

DIAGNÓSTICO

A ansiedade e o medo, por si, não são doenças e nem transtornos.


Além de serem experiências normais do cotidiano, são condições
essenciais e naturais à vida humana, responsáveis por preparar o
indivíduo para situações de ameaça e perigo. (...) Em alguns casos, no
entanto, um indivíduo pode apresentar ansiedade ou medo elevados de
forma desproporcional à situação que os elicia ou em situações nas
quais eles não são adaptativos, muitas vezes se mantendo de modo
persistente e levando a prejuízos no seu funcionamento, caracterizando
os transtornos de ansiedade. (...) Os TA interferem significativamente na
vida do indivíduo diagnosticado e daqueles com quem ele convive,
comprometendo suas atividades cotidianas, seus relacionamentos
sociais e outras esferas da vida. Além disso, transtornos de ansiedade
apresentam baixos índices de remissão espontânea e tendem a se
cronificar ou mesmo se desdobrar em outros transtornos psiquiátricos
quando não tratados.

O diagnóstico deve avaliar, portanto, se há desproporcionalidade,


interferência muito incômoda, diminuição de capacidades, prejuízos
atuais e cronificação. Deve-se fazer o diagnóstico diferencial de uma
angústia normal, advinda de situações causadoras de sofrimento, das
condições neuróticas, vinculadas a predisposições e a características
particulares da personalidade, montadas na infância.

Um cuidado que os médicos generalistas, na atenção primária precisam


ter é o de não se apressar para fazer o diagnóstico. Na ansiedade,
como na depressão, há riscos de fazer identificações equivocadas
(falsos positivos). Na suspeita de síndromes depressivas, por exemplo,
no Reino Unido são mais frequentes os falsos positivos do que os casos
não diagnosticados (falsos negativos).

Todo paciente com suspeita de transtorno de ansiedade deve receber


avaliação adequada para definir se há ou não um transtorno específico,
qual a severidade dos sintomas e qual a severidade do prejuízo
funcional associado.

Em caso de efetivo diagnóstico de transtorno de ansiedade


generalizada deve haver diálogo com o paciente sobre o tema, em
linguagem pouco medicalizadora e não biologicista, tão logo possível,
para ajudar as pessoas a entender o problema, a se responsabilizar por
ele, a repensar suas pautas de relacionamento com pessoas e
situações. Espera-se que a pessoa inicie um tratamento sem esperar
milagres, dispondo-se a um trabalho psíquico, interior, e esforçando-se
para separar as ansiedades realísticas das ansiedades neuróticas. Sob
uma ótica psicanalítica, são situações prototípicas geradoras de
ansiedade: a perda de um objeto desejado, a perda de amor, a perda de
identidade e a perda de autoestima.

O uso de uma linguagem excessivamente biológica e medicalizante dá


a entender, ao paciente, que ele se torna vítima de uma doença que o
invade, com a qual nada tem a ver, e da qual pode se
desresponsabilizar. A medicalização excessiva provoca consumo
abusivo e contraproducente de serviços de saúde, fazendo declinar a
capacidade de enfrentamento autônomo do cidadão. Nesta situação, ele
corre o risco de deixar ao médico a obrigação, fantasiosa, de conseguir
um remédio que extinga, magicamente, a causa dos sintomas. É
comum que tais pacientes, sem se preocupar em buscar um sentido
para seu sofrimento, visitem vários médicos, exigindo remédios que
trocam seguidamente, por dificuldade de entenderem os fatores
pessoais, psíquicos e relacionais envolvidos.

Deve-se considerar este diagnóstico em pessoas se apresentando com


ansiedade ou preocupação exageradas, permanentes e significativas, e
em pessoas que (1) buscam serviços de saúde frequentemente e que
possuem um problema de saúde física crônico; (2) não tem um
problema de saúde física mas estão constantemente buscando
explicação sobre sintomas somáticos, particularmente idosos ou
populações vulneráveis; (3) estão repetidamente preocupadas sobre
uma ampla faixa de diferentes temas.

O paciente pode apresentar-se inicialmente com sintomas físicos


relacionados à tensão (cefaleia, taquicardia) ou com insônia. A
investigação adicional revelará ansiedade proeminente. Deve-se
suspeitar deste diagnóstico quando houver sintomas múltiplos de
ansiedade ou tensão nas seguintes áreas: tensão mental (preocupação,
sentir-se tenso ou nervoso, dificuldade de concentração); tensão física
(inquietação, cefaleia, tremores, incapacidade de relaxar); hiperatividade
autonômica (tontura, sudorese, taquicardia, desconforto epigástrico). Os
sintomas podem durar meses e reaparecer frequentemente. São
frequentemente desencadeados por eventos estressantes em pessoas
com uma tendência crônica à preocupação.
Deve ser feito o diagnóstico diferencial com as condições psiquiátricas
comórbidas mais frequentes. Se o humor deprimido for proeminente,
considerar depressão. Se houver ataques súbitos de ansiedade não
provocados, considerar transtorno do pânico. Se houver medo e
evitação de situações específicas, considerar transtornos fóbicos. Se
houver uso pesado de álcool e drogas, considerar transtornos por uso
de substâncias psicoativas. Para tanto, veja-se os protocolos
específicos para tais situações.

Pelo menos três de seis sintomas precisam estar presentes para um


diagnóstico: inquietação ou nervosismo, fadiga, perda de concentração,
irritabilidade, tensão muscular e sono perturbado. É em parte um
diagnóstico de exclusão, já que condições médicas gerais,
medicamentos, substâncias e outros transtornos mentais devem ser
excluídos como causa primária. O exame físico e as provas laboratoriais
são geralmente normais se não há problemas médicos ou abuso de
substâncias presentes.

Do ponto de vista conceitual, o transtorno, segundo a Organização


Mundial da Saúde define-se por uma:

Ansiedade generalizada e persistente que não ocorre exclusivamente


nem mesmo de modo preferencial numa situação determinada (a
ansiedade é “flutuante”). Os sintomas essenciais são variáveis, mas
compreendem nervosismo persistente, tremores, tensão muscular,
transpiração, sensação de vazio na cabeça, palpitações, tonturas e
desconforto epigástrico. Medos de que o paciente ou um de seus
próximos irá brevemente ficar doente ou sofrer um acidente são
frequentemente expressos.

As crianças com transtorno de ansiedade generalizada geralmente


demonstram medos excessivos, preocupações ou sentimentos
exagerados e irracionais a respeito de situações triviais, são tensas,
inseguras e excessivamente sensíveis a quaisquer situações
provocadoras de ansiedade. São crianças, como mostram publicações
clássicas e revisões sistemáticas mais novas sobre o tema, muito
preocupadas com o julgamento de terceiros em relação a seu
desempenho em diferentes áreas e necessitam exageradamente que
lhes renovem a confiança, que as tranquilizem. Apresentam dificuldade
para relaxar, queixas somáticas sem causa aparente e sinais de
hiperatividade autonômica (ex. palidez, sudorese, taquipneia, tensão
muscular e vigilância aumentada). Tendem a ser crianças autoritárias
quando se trata de fazer com que os demais atuem em função de
tranquilizá-la. (...)Tornam-se crianças difíceis, pois mantêm o ambiente
a seu redor tenso, provocam irritação nas pessoas de seu convívio pelo
absurdo da situação, sendo difícil acalmá-las e ter atividades rotineiras
ou de lazer com elas.

O início destas condutas ansiosas é insidioso. Muitas vezes os pais têm


dificuldade para precisar quando começaram, mas sentem seu
agravamento gradual, à intelerabilidade, quando, então, buscam
atendimento.

CRITÉRIOS DE INCLUSÃO

Adultos e crianças com 7 anos e mais.

CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO

a) Hipersensibilidade aos fármacos;

b) Abuso atual de álcool ou de fármacos psicoativos;

c) Ausência de aderência ao tratamento ou falta de acompanhamento


médico adequada.

CASOS ESPECIAIS

Compreendem situações a respeito do tratamento ou da doença em que


a relação risco-benefício deve ser cuidadosamente avaliada pelo
médico prescritor e nas quais um comitê de especialistas nomeados
pelo Gestor Municipal ou Estadual poderá ou não ser consultado para a
decisão final.

POSSÍVEIS LOCAIS DE TRATAMENTO

O tratamento deve ser oferecido logo que possível, e pode ser feito com
abordagem orientadora, farmacoterapia, psicoterapia ou combinação de
ambos. Há benefícios no tratamento baseado em serviços de atenção
primária, como menores taxas de absenteísmo e maior satisfação das
pessoas, e estes serviços devem ser o local preferencial de tratamento
sempre que possível, mesmo que necessária a interconsulta com
profissional de saúde mental. Por tratar-se de transtorno com tendência
a cronicidade e a períodos de remissão e recorrências, o seguimento
por um mesmo profissional ou equipe de saúde pode ser importante
fator de adesão, além de possibilitar a identificação precoce de
situações desencadeantes e sinais de piora. Além do acompanhamento
com médico geral ou médico de família, o acompanhamento
complementar por enfermeiro pode colaborar com reforço da adesão e
orientação e monitoramento de medidas adjuvantes não
medicamentosas, como exercícios físicos, técnicas de relaxamento,
higiene do sono.

Casos refratários à terapêutica inicial ou quando houver dúvida quanto


ao diagnóstico podem se beneficiar de interconsulta ou seguimento
complementar com profissional de saúde mental de apoio, por exemplo,
psiquiatra de Núcleo de Apoio à Saúde da Família. Suspeita de
transtorno de humor severo como transtorno bipolar ou presença de
sintomas psicóticos indicam a necessidade de avaliação especializada e
possivelmente seguimento em serviço de saúde mental.

Os CAPS devem ser reservados para casos complexos, principalmente


quando houver comorbidade com transtornos psicóticos e/ou abuso de
substâncias. Como existe alta prevalência de sintomas físicos no TAG,
é importante que os profissionais das UPA e emergências hospitalares
sejam treinados para identificar casos suspeitos de transtornos de
ansiedade – por exemplo, ao fazer o diagnóstico diferencial da dor
torácica atípica -, possibilitando prevenção de medicalização excessiva
e orientação ao paciente para buscar diagnóstico preciso e cuidado
adequado na atenção primária.

Pacientes com depressão severa comórbida ou ideação suicida podem


necessitar de hospitalização enquanto terapia efetiva é instituída.

TRATAMENTO

Recomendações gerais

As seguintes recomendações gerais devem ser feitas a todos os


pacientes e familiares, independente da prescrição de tratamento
farmacológico:

a) O paciente deve ser encorajado a praticar métodos de relaxamento


diários para reduzir os sintomas físicos de tensão;

b) O paciente deve ser encorajado a envolver-se em atividades


prazerosas e exercícios físicos e a retomar atividades que foram úteis
no passado;

c) Identificar e desafiar preocupações exageradas ou pensamentos


pessimistas podem reduzir os sintomas de ansiedade;
d) Identificar eventos que desencadeiam preocupação excessiva pode
ajudar a formular estratégias para reduzir a ansiedade;

e) Discutir o que o paciente está fazendo para manejar as situações


desagradáveis, identificando e reforçando atitudes que estão
funcionando;

f) Identificar algumas medidas específicas que o paciente pode tomar


nas próximas semanas.

Atualmente, existem alguns fármacos, tratamentos psicoterápicos e


técnicas comportamentais com evidências científicas de efetividade nos
diversos transtornos de ansiedade. Não existe evidência de
superioridade de um sobre o outro. O tratamento disponível no local
deve ser oferecido no momento do diagnóstico e monitorado em
consultas subsequentes para avaliar resposta e eventual necessidade
de mudança.

Caso médico assistente conclua haver necessidade de tratamento


medicamentoso, deve ser selecionado um inibidor seletivo de
recaptação de serotonina (ISRS). Benzodiazepínicos não devem ser
oferecidos para tratamento de TAG na atenção primária ou secundária,
a não ser como medida de curto prazo durante crises. Antipsicóticos
não devem ser oferecidos como tratamento para TAG na atenção
primária, e só devem ser prescritos para esta condição em qualquer
cenário quando especificamente indicados.

É muito importante que o médico, ao prescrever um fármaco, explique


ao paciente que o remédio, diferentemente de um antibiótico numa
infecção comum, não tem o poder de cura, mas tão somente alivia os
sintomas.

Café, tabaco, bebidas alcoólicas, maus hábitos de sono e drogas ilícitas


são fatores que podem piorar os sintomas. O paciente deve ser
orientado para os riscos da mistura de tratamentos ditos naturais, como
chás tidos como calmantes porque baixam a pressão arterial. Também
quanto ao uso da erva de São João (Hypericum perforatum), que pode
interagir com remédios psicoanalépticos potencializando efeitos
colaterais. Sobre o Hypericum há discretos indícios de que, se for bem
aplicado, em monoterapia, na dose de 900 mg por dia, sob observação
médica, possa ter melhores efeitos do que placebos.
A utilidade da passiflora, bastante conhecida e procurada pela
população, não foi confirmada. Não há estudos que possam garantir a
existência de seus efeitos benéficos comparados a placebo.

Módulo 9: Fármacos
Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS)

São o tratamento de primeira linha para a ansiedade generalizada em


adultos. O fármaco ISRS disponível na Relação Nacional de
Medicamentos Essenciais (RENAME, 2013) é o cloridrato de fluoxetina,
na forma de cápsulas ou comprimidos de 20 mg. Fora do SUS os
psiquiatras usam, também, em determinadas situações, a sertralina, a
paroxetina e o citalopram.

Antes de se iniciar o tratamento com fluoxetina, deve-se explicar os


prováveis benefícios do tratamento; os efeitos colaterais esperados,
síndrome de retirada e interações medicamentos; o risco de ativação,
com sintomas como aumento da ansiedade, agitação e sono
perturbado; o gradual desenvolvimento do efeito ansiolítico durante as
primeiras semanas de tratamento; a importância de se tomar o
medicamento como prescrito e a necessidade de continuar o tratamento
após remissão dos sintomas para evitar recidiva. Isto vale também para
crianças. Orientar que a administração seja preferencialmente pela
manhã.

Deve se levar em conta o risco aumentado de sangramento associado


ao seu uso, principalmente para idosos e pessoas usando outras drogas
que aumentam este risco, como os anti-inflamatórios não esteroidais
(AINE). Deve-se alertar o paciente a evitar o uso de bebidas alcoólicas
durante o tratamento e orientar que pode afetar a capacidade de realizar
atividades que exijam atenção e coordenação motora, como dirigir
máquinas ou veículos. O médico orienta sobre o risco de mudança na
frequência cardíaca e levantar-se mais lentamente devido ao risco de
hipotensão postural.

Pessoas abaixo de 30 anos devem ser orientadas sobre o fato de estas


drogas associarem-se a um risco aumentado de pensamento suicida e
autolesão em uma minoria de pessoas. Os pacientes devem ser vistos
novamente em uma semana e monitoradas para pensamento suicida e
autolesão durante o primeiro mês de tratamento.
Este fármaco apresenta um número elevado de interações
medicamentosas, e deve-se fazer uma pesquisa sobre este aspecto ao
introduzir ou descontinuar este ou outros medicamentos do esquema
terapêutico do paciente.

Tricíclicos

Utilizadas historicamente em transtornos neuróticos, relacionados ao


estresse e somatoformes, a clomipramina, a amitriptilina, a nortriptilina e
a imipramina são drogas clássicas.

Apesar de também não estar indicada especificamente para o


transtorno de ansiedade generalizada, entre as drogas disponíveis no
Formulário Terapêutico Nacional, o cloridrato de clomipramina pode ser
uma alternativa. Tem grande eficácia na vigência de sintomas de
tendência fóbica, obsessivo-compulsiva, pânico, ou angústia refratária
elevada. A clomipramida deve ser evitada em idosos, por seus efeitos
adversos anticolinérgicos e cardiovasculares. Recomenda-se orientar o
paciente a realizar bochecho frequente com água, consume de balas de
goma sem açúcar ou cubo de gelo para amenizar o efeito de boca seca
e melhorar a adesão, principalmente no início do tratamento. A
nortriptilina é incisiva em depressões apáticas e não é tão sedativa
quanto a amitriptilina.

Nas ansiedades agitadas, com sintomas depressivos e com insônia a


amitriptilina pode ter um papel importante. O perfil menos favorável de
efeitos colaterais, dos tricíclicos, constitui-se em motivo de cuidados
redobrados, do ponto de vista clínico e farmacológico. Os tricíclicos
podem ser uma opção terapêutica principalmente quando houver
depressão comórbida e esta for o foco inicial do tratamento. Quando
usados para depressão isolada ou comórbida com transtornos de
ansiedade, em geral seus efeitos terapêuticos são tão bons quanto os
dos inibidores seletivos de recaptação da serotonina, mas a taxa de
abandono do remédio é maior, pelos efeitos colaterais frequentes. As
doses de tricíclicos variam de 75 a um máximo de 250 mg por dia,
iniciando-se com 25 mg/dia, em aumentos graduais, na primeira
semana. A dose usual é 75 mg/dia. As mesmas doses podem ser
seguidas para a amitriptilina e a imipramina.

A imipramina apresenta boa segurança na lactação. Deve ser evitada


em idosos devido aos efeitos adversos anticolinérgicos e
cardiovasculares. Caso seja usada, recomenda-se ao paciente
aumentar ingestão de água e de fibras, para evitar retenção urinária e
constipação intestinal, assim como limitar o uso de cafeína e bebidas
alcoólicas.

Em gestantes, todos os antidepressivos citados são classe C, e deve-se


preferir terapias não medicamentosas como relaxamento, meditação,
exercícios físicos, higiene do sono, ou psicoterapias estruturadas,
quando estas estiverem disponíveis. Se for imprescindível a
farmacoterapia da ansiedade nesta população, deve-se preferir o
inibidor seletivo de receptação da serotonina (fluoxetina),
preferencialmente a partir do segundo semestre. Se uma mulher ficar
grávida durante o tratamento medicamentoso do transtorno de
ansiedade generalizada, o médico deve pesar sobre os riscos e
benefícios de manter o tratamento, já que hoje há evidências de que
continuar ISRS, por exemplo, durante a gestação pode prevenir riscos
associados com sintomas ansiosos e depressão comórbida, inclusive
trabalho de parto pré-termo.

Tempo de tratamento e critérios de interrupção

O tratamento deve ser mantido por um ano após remissão dos


sintomas, devido ao curso normalmente crônico e com recidivas deste
transtorno. A interrupção deve ser feita após avaliação conjunta entre
médico e paciente do quadro atual (com remissão dos sintomas),
contexto e risco de recidivas, e compreensão do paciente sobre os
riscos e benefícios. Deve ser oferecida durante todo o tratamento e
reforçada no momento da interrupção psicoeducação a respeito de
fatores desencadeantes e estressores de quadros de ansiedade,
sintomas de recidiva e como buscar novo tratamento.

Benefícios esperados
Todo paciente recebendo tratamento deve ser monitorado e ter sua
resposta ao tratamento avaliada a cada consulta. Um erro comum que
deve ser evitado é iniciar tratamento e não propor um seguimento
estruturado do transtorno, deixando o problema se disfarçar entre outras
queixas nas consultas seguintes, ou mesmo deixando os retornos a
critério do paciente. Os objetivos centrais do tratamento do TAG são a
melhora dos sintomas de ansiedade e a redução ou eliminação da
incapacidade.

ALGORITMO – DIAGNÓSTICOS DOS TRANSTORNOS ANSIOSOS

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