Tese2020_FILIPASILVA
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Fevereiro de 2020
Agradecimentos
À minha irmã,
Por estar do meu lado, sempre, nos bons e nos maus momentos!
Ao meu avô,
A estrelinha que me guia.
Introdução ..................................................................................................................................... 1
I – Enquadramento Conceptual ................................................................................................. 3
1.1 – Definição e Conceptualização de Adoção .............................................................................. 3
1.1.1 – Indicadores de Risco e de Proteção na Adoção ................................................................... 5
1.2. – Enquadramento Histórico-Legal da Adoção em Portugal ...................................................... 9
1.2.1 – Enquadramento Institucional da Adoção .......................................................................... 11
1.2.2 - Constituição da Equipa de Adoção, Apadrinhamento Civil e Acolhimento Familiar da
Segurança Social ........................................................................................................................... 13
1.2.3 - Processo de Avaliação de Candidaturas à Adoção .............................................................. 14
1.3 – O Papel do Perito Forense no Processo de Adoção ............................................................. 18
1.3.1 – A Avaliação Psicológica no Processo de Adoção ............................................................... 19
1.3.2 – Contributos da Avaliação Psicológica para o Processo de Adoção ..................................... 22
II - Objetivos .............................................................................................................................. 26
III - Metodologia ....................................................................................................................... 26
IV - Resultados e Discussão ..................................................................................................... 27
V – Conclusão . .......................................................................................................................... 43
Referências Bibliográficas......................................................................................................... 45
Anexos ........................................................................................................................................ 52
Síntese de Apoio ao Protocolo de Avaliação proposto para Candidatos/as à adoção ........ 52
Introdução
Dentro da grande diversidade familiar, nem todas as famílias apresentam uma
configuração na qual há uma continuidade biológica. Existem famílias cujas relações
pais-filhos se baseiam, exclusivamente, nas relações afetivas estabelecidas entre os seus
membros. É o caso das famílias adotivas (Brito, 2013; Bydlowski, 2010; Machado,
Carneiro, & Magalhães, 2015; Silva, 2014).
Constituindo-se como um fenómeno que sempre existiu e que está presente em todas
as culturas (Palacios & Brodzinsky, 2010), a adoção, antes destinada a atender os
interesses dos adultos (Brodzinsky & Pinderhughes, 2002; Mascarenhas & Alarcão,
2003), é hoje vista como resposta a um direito da criança (Código Civil, 2018),
conceptualizado como a medida mais extrema de proteção à infância (Centro de Estudos
Judiciários, 2015; Machado et al., 2015; Palacios, 2009a).
Embora na filiação adotiva exista a possibilidade de reverter o processo, sempre que
adotantes ou adotados não consigam lidar com as adversidades/dificuldades (Ministério
da Segurança Social, 2015), à semelhança da filiação biológica, a adoção é
tendencialmente irreversível, não havendo diferenças entre ambas, no que confere aos
direitos e obrigações (Palacios, 2009a).
Todavia, no sentido de despistar vulnerabilidades/problemas e evitar qualquer fator
que venha a colocar a criança (novamente) em risco, a adoção pressupõe a avaliação
psicológica dos/as candidatos/as, que se desenvolve em várias etapas, até à
concretização judicial da adoção (Ministério da Segurança Social, 2017; Silva, 2014).
Deste modo, é fulcral a existência de uma equipa multidisciplinar, constituída por
psicólogos, técnicos de serviço social e juristas, que atuem no sentido de traçar o perfil
dos/as candidatos/as o mais completo possível, de forma a perceber as suas capacidades
e vulnerabilidades para acolher uma criança e dar resposta às suas necessidades
específicas, verificando as possibilidades de adaptação e as vantagens da adoção (Brito,
2013; Mascarenhas & Alarcão, 2003; Ministério da Segurança Social, 2017).
No entanto, embora a legislação portuguesa pressuponha a operacionalização de um
processo homogéneo e equiparado em todos os Centros Distritais da Segurança Social,
no respeitante à avaliação de candidatos/as à adoção, o mesmo não tem sido
implementado pelas equipas, por falta de orientações concretas e exemplificação de
técnicas/instrumentos a utilizar. O processo prima pela heterogeneidade, parecendo
II - Objetivos
III - Metodologia
IV - Resultados e Discussão
Estilos Educativos
Outro dos métodos que permite abordar empiricamente a parentalidade é o estudo
dos estilos educativos parentais. Este é um conceito associado à forma utilizada pelos
pais para lidar com questões de poder, hierarquia e apoio emocional (Morgado, Dias, &
Paixão, 2013).
Entendidos como um conjunto de estratégias que são direcionadas e comunicadas à
criança, usadas para incentivar a ocorrência de comportamentos desejados e validados
Vinculação
Definida como um sistema comportamental que serve funções filogenéticas, com
uma disposição inata para o estabelecimento de um laço afetivo com o cuidador e com
vista à proteção e sobrevivência do indivíduo, a teoria de vinculação desenvolvida por
Bowlby (1980) preconiza que a criança estabelece vínculos afetivos significativos com
as figuras prestadoras de cuidados, variando a qualidade destes vínculos em função da
qualidade dos cuidados e, em especial, das características da relação com a figura de
vinculação (Ministério da Segurança Social 2017).
Ao comparar a utilização de entrevistas e questionários na avaliação da vinculação
do adulto, estudos referem três argumentos a favor da utilização de instrumentos de
auto-resposta para avaliar diferenças individuais da vinculação na idade adulta.
Nomeadamente, o facto de a vinculação ter um papel muito importante na vida
emocional dos indivíduos (Bowlby, 1980) e, desta forma, estes poderem fornecer
informação sobre as suas experiências emocionais; o facto de os adultos terem
suficiente experiência relacional para saberem descrever como se sentem e comportam
nessas relações; e, por último, o de os processos conscientes e inconscientes
concorrerem para o mesmo objetivo (Canavarro, Dias, & Lima, 2006).
Neste âmbito, diversas escalas com o objetivo de identificar as características do
relacionamento entre pais e filhos têm sido desenvolvidas, nomeadamente a Inventory of
Parent and Peer Attachment (Armsden & Greenberg, 1987, como citado em Canavarro
et al., 2006), Reciprocal Attachment Questionnaire for Adults (West & Sheldon-Keller,
Personalidade
O estudo da personalidade tem revelado uma utilidade e eficiência reconhecidas na
área clínica e da saúde e, como tal, tem sido descrita sob múltiplas perspetivas e em
diferentes domínios. Atualmente, as definições contemplam os conceitos de integridade
e organização, referindo-se à regularidade dos comportamentos e das formas de
experiência, como os pensamentos e os sentimentos (Gonçalves, 2011; Mesquita, 2012).
McCrae e Costa (2006) defendem que a personalidade é um factor preditor do
comportamento humano e, como tal, deve ser considerada no estudo de determinados
quadros clínicos e contextos sociais.
Um dos instrumentos robustos utilizados para a avaliação da patologia e da
personalidade, em específico na adoção, é o Minnesota Multiphasic Personality
Inventory-2 (MMPI-2) (Gonçalves, 2011; Mesquita, 2012; Nichting, 2016).
O Inventário Multifásico de Personalidade de Minnesota-2 (MMPI-2) é um
inventário de auto-relato que permite caracterizar a personalidade e a psicopatologia do
indivíduo a nível global, permitindo uma diferenciação entre a “normalidade” e a
patologia (cf. anexo 1) (Gonçalves, 2011; Nichting, 2016; Silva et al., 2006).
Este instrumento seguiu processos rigorosos de construção e de validação revelando
boas características psicométricas, o mesmo sendo reportado para a versão portuguesa,
(cf. Gonçalves, 2011) que se encontra em validação (Silva et al., 2006).
Desejabilidade Social
O processo de responder conforme o que é socialmente desejado constitui um tópico
de interesse nos estudos da atualidade (Almiro et al., 2017). Em especifico, a
desejabilidade social refere-se à tendência das pessoas para atribuírem a si próprias
atitudes e/ou comportamentos com valores socialmente desejáveis, de forma a
satisfazerem a sua necessidade de aprovação social e mostrarem que os seus
comportamentos estão em conformidade com tais valores (cf. Almiro et al., 2017; Lind
& Lindgren, 2017).
Nos diversos contextos de avaliação psicológica, e em especial no âmbito da
avaliação de candidaturas à adoção, é de notar a tendência para a ocorrência de
respostas distorcidas aos itens dos questionários, isto é, um estilo de resposta
congruente com o que é socialmente aceitável, o que pode retirar validade ao perfil
Perfil de psicopatologia
No âmbito da avaliação de candidatos/as, seria igualmente interessante perceber,
quando não existam evidentes características estruturais de psicopatologia, se
situacionalmente/num espectro temporal circunscrito, há alguma vulnerabilidade
psicopatológica, que possa, eventualmente, constituir-se como entrave para atingir
objetivos ligados à promoção do superior interesse da criança (Ministério da Segurança
Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007; Souza et al., 2017).
De entre os instrumentos validados para a população portuguesa que avaliam perfis
de psicopatologia, é proposta a aplicação do Brief Symptom Inventory 18 (BSI-18),
instrumento de rastreio do mal-estar psicológico. O somatório dos 18 itens, organizados
em três subescalas (somatização, depressão e ansiedade, cada uma constituída por seis
itens) corresponde/visa apreender o nível geral de mal-estar psicológico dos indivíduos,
isto é, considerando os últimos sete dias, se experienciaram (ou não) 18 manifestações
de sintomatologia psicopatológica. Pode ser aplicado através da modalidade de
autorrelato ou em modo de entrevista, em grupo ou individualmente (cf. anexo 1)
(Canavarro et al., 2017).
É uma medida mais breve e recente de uma série de instrumentos desenvolvidos por
Derogatis para avaliar a sintomatologia psicopatológica, que inclui itens retirados dos
dois inventários mais longos, desenvolvidos pelo autor: o Brief Symptom Inventory
(BSI, 53 itens) e a Symptom Checklist-90-Revised (SCL-90-R, 90 itens) (cf. Canavarro
et al., 2017).
Estudos verificaram correlações elevadas entre as pontuações obtidas no BSI-18 e na
SCL-90-R, numa amostra da população geral, bem como entre o BSI-18 e o BSI,
atestando a validade do BSI-18, quando comparado com BSI e SCL-90-R, na avaliação
da sintomatologia psicopatológica (Canavarro et al., 2017).
A versatilidade do BSI-18 está ainda patente no facto de o instrumento ter
demonstrado ser fiável em amostras bastante diversificadas ao nível do estado de saúde
física e mental, como sejam doentes oncológicos, sobreviventes de doenças
oncológicas, doentes com patologia cardíaca e/ou disfunção renal, doentes psiquiátricos,
entre outros (Canavarro et al., 2017).
Auto-conceito
O auto-conceito pode ser definido como a perceção que o indivíduo tem de si
próprio e o conceito que, devido a isso, forma de si. O seu papel é crucial no
desenvolvimento cognitivo, social e profissional (Vaz Serra, 1988). Ajuda a
compreender aspetos importantes do comportamento humano, como a uniformidade, a
consciência e a coerência dos comportamentos observáveis, a noção de identidade e a
manutenção de certos estereótipos de ação na continuidade do tempo (Vaz Serra, 1988).
De entre os constituintes intrínsecos do autoconceito realça-se a auto-estima. Esta
deriva dos processos de avaliação que o indivíduo faz das suas qualidades,
desempenhos ou virtudes, ocupando um lugar proeminente na compreensão e na
explicação dos transtornos emocionais (Vaz Serra, 1988).
Estudos revelam ainda que uma influência específica das relações com os pais e um
bom auto-conceito está dependente de uma boa atmosfera familiar, em geral, e de uma
relação positiva com o pai e com a mãe, especificamente. Além disso, uma relação de
tolerância, de compreensão, de ajuda e de incentivo para vencer as dificuldades, por
Capacidades Parentais
Sendo a adoção um modelo de parentalidade devidamente avaliado e consagrado sob
laços afetivos, e havendo processos com candidatos/as já pais/mães (quer
biologicamente, quer pela via adotiva), faz todo o sentido a avaliação da relação que é
Vinculação
Definida como uma relação interativa emocional profunda e duradoura, e
desenvolvida em complementaridade entre dois elementos, um que solicita cuidados e
conforto e outro capaz de compreender e responder adequadamente às solicitações
recebidas através da prestação de cuidados físicos e sobretudo psicológicos, a figura de
vinculação deverá ter continuidade e consistência na vida da criança (Bowlby, 1970).
Isto possibilitará desenvolver um sentimento de confiança na disponibilidade da figura
de vinculação - base de uma vinculação segura, fundamental ao seu desenvolvimento
harmonioso e facilitador do funcionamento e competência do indivíduo com a
sociedade (Lavado, 2015; Ministério da Segurança Social 2017).
Estudos sugerem que pais carinhosos, disponíveis, atentos e capazes de responder às
necessidades dos filhos, contribuem para a formação de dimensões associadas a
vinculação segura na idade adulta (Canavarro, 1999).
A qualidade da vinculação é o resultado das interações entre as características da
criança (e.g., temperamento e desenvolvimento cognitivo), as características da figura
materna (e.g., representação da vinculação do adulto e psicopatologia) e da qualidade
dos cuidados (e.g., disponibilidade emocional e sensibilidade); e de fatores do meio, de
influência mais indireta (e.g., o apoio social recebido pela figura de vinculação, a
qualidade da relação de casal e o nível socioeconómico) (Lavado, 2015).
Personalidade
A atenção que é dada ao estudo da personalidade no âmbito da avaliação psicológica
tem sido cada vez maior. Vista como algo específico e único de cada indivíduo, que
permite diferenciá-lo dos outros, dá um sentido de identidade e continuidade às
significações e atitudes das pessoas (Mesquita, 2012). Assim, a avaliação da
personalidade permite identificar as capacidades e limitações de um indivíduo, as suas
preocupações e necessidades e ainda os seus estilos de coping e atitudes perante ele
próprio e os outros (Gonçalves, 2011; Lima & Simões, 2000, 2003).
Do ponto de vista científico, a avaliação da personalidade, ao consistir num método
que permite encontrar padrões sociais no comportamento de um indivíduo através da
distinção entre comportamentos situacionais e comportamentos duradouros, constitui
uma base segura para apoiar e fundamentar tomas de decisão em diversas situações e
contextos. No contexto forense, os objetivos passam por avaliar capacidades para
assumir determinados direitos e deveres, avaliar competências, determinar
responsabilidade criminal e ainda avaliar o grau de perigosidade do indivíduo
(Mesquita, 2012).
Perfil de psicopatologia
O rastreio do mal-estar psicológico denota um papel importante na melhoria da
qualidade de vida e dos cuidados de saúde aos indivíduos (Derogatis, 2001 como citado
em Canavarro et al., 2017). Neste âmbito, e apontado como fator de risco à
parentalidade adotiva, torna-se relevante a avaliação de eventuais vulnerabilidades