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Filipa Daniela Domingues Silva

CONTRIBUTOS PARA A DEFINIÇÃO DE UM


PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA PARA
CANDIDATOS/AS À ADOÇÃO

Dissertação de Mestrado Integrado em Psicologia, área de especialização em


Psicologia Clínica e da Saúde, subárea de especialização em Psicologia Forense,
sob a orientação da Professora Doutora Manuela Vilar, apresentada à Faculdade
de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra

Fevereiro de 2020
Agradecimentos

Aos meus pais,


Pela liberdade que me deram para escolher o meu caminho. Pela prioridade que sempre
concederam aos meus projetos de vida, pelo esforço e sacrifício feitos para garantir a
minha formação. Agradeço-lhes por serem a minha base segura e por me apoiarem
incondicionalmente a superar todos os meus desafios.

À minha irmã,
Por estar do meu lado, sempre, nos bons e nos maus momentos!

Ao meu avô,
A estrelinha que me guia.

Em especial, à Professora Doutora Manuela Vilar,


Por ter acreditado neste projeto, pelos amplos e valiosos conhecimentos transmitidos.
Pela permanente dedicação e disponibilidade. Obrigada por todos os momentos de
partilha.

Aos meus amigos,


Que são a família que escolhi. Em especial, às minhas: Cristiana, Mariana e Silvana.
Resumo
Introdução: Dada a escassez de quadros teóricos empiricamente sustentados, a falta de
metodologias construídas especificamente para avaliar as dimensões diretamente implicadas
na determinação das capacidades parentais em casos adotivos e dada a heterogeneidade do
processo avaliativo, o presente estudo vem disponibilizar uma proposta de definição de
protocolo de avaliação psicológica (mais) abrangente e objetivo, a aplicar no processo de
avaliação de candidatos/as à adoção, em contexto português, de forma a contribuir para a
validação e estandardização do processo.
Método: Foi elaborada uma revisão bibliográfica sobre a adoção, contributos da
avaliação psicológica no contexto forense e instrumentos de avaliação psicológica
adaptados à população portuguesa, que pudessem ser adequados e responsivos ao estudo
das candidaturas à adoção. Atendendo à especificidade do estudo, teve, igualmente,
particular importância a pesquisa de guidelines de outros países. Também a integração e
experiência de estágio na equipa de adoção do Centro Distrital da Segurança Social de
Coimbra, ao permitir o contacto, o conhecimento do processo avaliativo, a nível nacional, e
a leitura do Manual dos Organismos da Segurança Social, enquanto documento orientador
do processo relativo à preparação, avaliação e seleção de candidatos/as à adoção, se
constituíram como informação/vetores relevantes para a presente reflexão/estudo.
Resultados: Considerando os delineamentos alusivos aos fatores de risco/protetores, as
diretrizes nacionais e internacionais do processo de avaliação de candidaturas à adoção e
enfatizando a importância da entrevista clínica em todo o processo, ressaltam cinco
domínios/dimensões de avaliação: Motivação para a Parentalidade, Estilos Educativos,
Vinculação, Personalidade e Desejabilidade Social. Nesta sequência, foram indicados
instrumentos psicométricos, validados para a população portuguesa, com vista a
operacionalizar cada domínio, respetivamente, Escala de Motivação para a Parentalidade,
EMBU Memórias de Infância, Escala de Vinculação do Adulto, Minnesota Multiphasic
Personality Inventory-2 e Escala de Desejabilidade Social – 20 itens. Adicionalmente, é
proposto um protocolo de avaliação complementar, atendendo a casos específicos de
identificação de perfis psicopatológicos, baixo auto-conceito, em situações de candidaturas
já com filhos ou em visíveis situações de comprometimento neurológico e/ou cognitivo.
Conclusão: O presente estudo constitui um contributo para a compreensão das
vulnerabilidades (e oportunidades) que o processo adotivo apresenta, bem como uma
diretriz para a definição de um protocolo de avaliação potencializador de adoções mais
bem-sucedidas.

Palavras-chave: adoção; superior interesse da criança; avaliação psicológica de


candidatos/as à adoção; processo de avaliação na adoção; perito forense.
Abstract

Introduction: Assuming the scarcity of the empirically supported theoretical


frameworks, the lack of methodologies built specifically to assess the dimensions directly
involved in determining parental abilities in adoption cases and being aware of the
heterogeneity of the evaluation process, this study provides a protocol definition proposal
(more) embracing and objective psychological assessment, to be applied in the evaluation
process of the adoption applications, in Portuguese context, in order to contribute to the
validation and standardization of the process.
Method: A bibliographic review was made in what concerns the adoption, the
contributions of psychological assessment in forensic context and psychological assessment
instruments applied to the Portuguese population, which could be appropriate and
responsive to the study of the adoption applications. In view of the specificity of the study,
it was also important to look for guidelines from another countries. Also the integration and
the internship experience in the adoption team of the District Social Security Center of
Coimbra, by permitting the contact, the knowledge of the evaluation process, at national
level, and the reading of the Social Security Organizations Manual as a guiding document
of the process related to the preparation, evaluation and selection of the adoption
candidates, constituted themselves as a relevant information/vectors for this
reflection/study.
Results: Considering the designs related to risk/protective factors, the national and
international guidelines of the evaluation process of the applications for adoption and
highlighting the importance of clinical interview in the whole process, stand out five
domains / dimensions of evaluation: Motivation for Parenting, Educational Styles, Bonding,
Personality and Social Desirability. In this sequence, psychometric instruments were
indicated, and validated for the Portuguese population, to operationalize each domain,
respectively, Parenting Motivation Scale, EMBU Childhood Memories, Adult Bonding
Scale, Minnesota Multiphasic Personality Inventory-2 and the Social Desirability Scale – 20
items. Additionally, a complementary evaluation protocol is proposed, taking into account
specific cases of identification of psychopathological profiles, low self-concept, in
situations of applications with children or in visible situations of neurological and/or
cognitive impairment.
Conclusion: The present study has contributed to the comprehension of the
vulnerabilities (and opportunities) which the adoption process presents, as well as a
guideline for the definition of an evaluation protocol that enhances more successful
adoptions.
Key- words: adoption; child’s best interest; psychological assessment of candidates for
adoption; adoption’s evaluation process; forensic expert.
Índice

Introdução ..................................................................................................................................... 1
I – Enquadramento Conceptual ................................................................................................. 3
1.1 – Definição e Conceptualização de Adoção .............................................................................. 3
1.1.1 – Indicadores de Risco e de Proteção na Adoção ................................................................... 5
1.2. – Enquadramento Histórico-Legal da Adoção em Portugal ...................................................... 9
1.2.1 – Enquadramento Institucional da Adoção .......................................................................... 11
1.2.2 - Constituição da Equipa de Adoção, Apadrinhamento Civil e Acolhimento Familiar da
Segurança Social ........................................................................................................................... 13
1.2.3 - Processo de Avaliação de Candidaturas à Adoção .............................................................. 14
1.3 – O Papel do Perito Forense no Processo de Adoção ............................................................. 18
1.3.1 – A Avaliação Psicológica no Processo de Adoção ............................................................... 19
1.3.2 – Contributos da Avaliação Psicológica para o Processo de Adoção ..................................... 22
II - Objetivos .............................................................................................................................. 26
III - Metodologia ....................................................................................................................... 26
IV - Resultados e Discussão ..................................................................................................... 27
V – Conclusão . .......................................................................................................................... 43
Referências Bibliográficas......................................................................................................... 45
Anexos ........................................................................................................................................ 52
Síntese de Apoio ao Protocolo de Avaliação proposto para Candidatos/as à adoção ........ 52
Introdução
Dentro da grande diversidade familiar, nem todas as famílias apresentam uma
configuração na qual há uma continuidade biológica. Existem famílias cujas relações
pais-filhos se baseiam, exclusivamente, nas relações afetivas estabelecidas entre os seus
membros. É o caso das famílias adotivas (Brito, 2013; Bydlowski, 2010; Machado,
Carneiro, & Magalhães, 2015; Silva, 2014).
Constituindo-se como um fenómeno que sempre existiu e que está presente em todas
as culturas (Palacios & Brodzinsky, 2010), a adoção, antes destinada a atender os
interesses dos adultos (Brodzinsky & Pinderhughes, 2002; Mascarenhas & Alarcão,
2003), é hoje vista como resposta a um direito da criança (Código Civil, 2018),
conceptualizado como a medida mais extrema de proteção à infância (Centro de Estudos
Judiciários, 2015; Machado et al., 2015; Palacios, 2009a).
Embora na filiação adotiva exista a possibilidade de reverter o processo, sempre que
adotantes ou adotados não consigam lidar com as adversidades/dificuldades (Ministério
da Segurança Social, 2015), à semelhança da filiação biológica, a adoção é
tendencialmente irreversível, não havendo diferenças entre ambas, no que confere aos
direitos e obrigações (Palacios, 2009a).
Todavia, no sentido de despistar vulnerabilidades/problemas e evitar qualquer fator
que venha a colocar a criança (novamente) em risco, a adoção pressupõe a avaliação
psicológica dos/as candidatos/as, que se desenvolve em várias etapas, até à
concretização judicial da adoção (Ministério da Segurança Social, 2017; Silva, 2014).
Deste modo, é fulcral a existência de uma equipa multidisciplinar, constituída por
psicólogos, técnicos de serviço social e juristas, que atuem no sentido de traçar o perfil
dos/as candidatos/as o mais completo possível, de forma a perceber as suas capacidades
e vulnerabilidades para acolher uma criança e dar resposta às suas necessidades
específicas, verificando as possibilidades de adaptação e as vantagens da adoção (Brito,
2013; Mascarenhas & Alarcão, 2003; Ministério da Segurança Social, 2017).
No entanto, embora a legislação portuguesa pressuponha a operacionalização de um
processo homogéneo e equiparado em todos os Centros Distritais da Segurança Social,
no respeitante à avaliação de candidatos/as à adoção, o mesmo não tem sido
implementado pelas equipas, por falta de orientações concretas e exemplificação de
técnicas/instrumentos a utilizar. O processo prima pela heterogeneidade, parecendo

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assentar essencialmente em elementos de natureza clínica e qualitativos para
fundamentar decisões.
É neste sentido, devido às fragilidades sentidas e à falta de uniformização de atuação
nestes processos de avaliação, que surge a elaboração da presente dissertação. Este é
estudo que vem ressaltar a necessidade de aperfeiçoar as práticas de avaliação
psicológica em todo o processo de adoção, disponibilizando uma proposta de Protocolo
de Avaliação Psicológica mais abrangente e objetivo, ancorando os referenciais de
análise em dados quantitativos e normativos para a população portuguesa. Vem ainda
contribuir para a estandardização do processo avaliativo de candidaturas à parentalidade
adotiva, de forma a sustentar as tomadas de decisão, minorar possíveis enviesamentos,
diferenças técnicas e metodológicas, potenciando adoções mais bem-sucedidas.
A presente dissertação encontra-se dividida em cinco secções principais, iniciando-
se com o Enquadramento Conceptual, onde se abordam linhas temáticas relativas à
Definição e Conceptualização de Adoção, Indicadores de Risco e Proteção associados à
Parentalidade Adotiva, Enquadramento Histórico-Legal e Institucional em Portugal, e
consequente Constituição da Equipa de Adoção, Apadrinhamento Civil e Acolhimento
Familiar da Segurança Social, bem como o Processo de Avaliação a Candidaturas à
Adoção. Neste ponto é ainda abordado o Papel do Perito Forense com ênfase no
Processo de Adoção, a Avaliação Psicológica no Processo de Adoção e os Contributos
da Avaliação Psicométrica para o Processo de Adoção. As secções seguintes reportam-
se a objetivos, metodologia implementada, resultados e respetiva discussão, e
conclusões do estudo.

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1. Enquadramento Conceptual

1.1 – Definição e Conceptualização de Adoção

A parentalidade continua a ser entendida como uma reorganização mental que os


pais vivenciam com a realização do desejo de ter um filho (Brito, 2013; Bydlowski,
2010; Machado et al., 2015).
Do ponto de vista de Lévy-Soussan (2006), o trabalho psíquico próprio da filiação
envolve fortemente a problemática do narcisismo parental, numa leitura psicodinâmica
do fenómeno. O filho deverá apropriar-se da história familiar de cada um dos
progenitores e, ao mesmo tempo, os pais deverão permitir que a criança possa construir
a sua própria identidade.
Contudo, a parentalidade biológica não é o único meio possível para ser-se pai ou
mãe (Machado et al., 2015; Tavares, 2012). Barbosa (2015) e Salvaterra e Veríssimo
(2008) consideram que quando a necessidade ou o desejo de ser-se pai e mãe encontra
obstáculos à sua realização, como a infertilidade, a morte anterior de um filho ou o
desejo de aumentar a família quando biologicamente já não é possível ou aconselhável,
as famílias procuram soluções alternativas para concretizarem o seu projeto.
Ao mesmo nível, Machado e colaboradores (2015) afirmam que as novas
organizações familiares, apresentadas na contemporaneidade, valorizam a vinculação de
parentesco por aliança afetiva, em contraponto à estabelecida por continuidade
biológica.
Inicialmente, os objetivos da adoção centravam-se, sobretudo, nos adultos,
procurando ir ao encontro de necessidades de ordem económica, política, religiosa ou de
garantia de sucessão da descendência e património familiar (Brodzinsky &
Pinderhughes, 2002; Mascarenhas & Alarcão, 2003). No entanto, na sociedade atual,
são os interesses das crianças que se encontram no centro da questão e a adoção é uma
forma de proporcionar uma família prestadora de cuidados adequados e satisfatórios às
mesmas cujos pais biológicos não tiveram possibilidade de o fazer (Barbosa-Ducharne,
Soares, Ferreira, & Barroso, 2014; Centro de Estudos Judiciários, 2015; Machado et al.,
2015; Palacios, 2009b; Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
Neste sentido, a adoção pode ser considerada a melhor resposta quando a separação
da criança da sua família biológica for realmente imprescindível (Campos, 2012; Centro
de Estudos Judiciários, 2015).

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Esta é definida, em sentido lato e segundo as normas legais em vigor, como a
inserção num ambiente familiar, de forma definitiva e com aquisição do vínculo jurídico
próprio da filiação, de uma criança cujos pais, por algum motivo, não puderam cumprir
com as suas responsabilidades parentais (Centro de Estudos Judiciários, 2015).
Em Portugal, ao contrário de alguns países ocidentais, a adoção é estruturalmente
fechada e confidencial (Centro de Estudos Judiciários, 2015), não havendo contactos
entre a família biológica e a adotiva. A situação, por defeito, é que a família adotiva
conhece a identidade da biológica, ao invés da família biológica que desconhece a
identidade da família adotiva (Campos, 2012; Ministério da Segurança Social, 2017).
Já no que diz respeito à criança que foi adotada, embora legalmente se tenham
cortado os laços que a ligavam à família biológica, não se extingue a ligação genética
que tem aos pais biológicos, nem são apagadas as experiências, frequentemente
negativas, que vivenciou com os mesmos (Barbosa-Ducharne et al., 2014). Todavia, o
processo de construção de identidade da criança e o seu ajustamento psicológico devem
ter em conta as suas origens e experiências, integrando-as na sua narrativa de vida
(Campos, 2012).
Apraz dizer que a parentalidade adotiva constitui uma transição essencial na vida da
criança, na medida em que lhe permite passar a ter experiências que poderão ser
reparadoras das vivências negativas anteriores à adoção (Barbosa-Ducharne et al.,
2014). Ou seja, podemos evidenciar a adoção como uma intervenção natural de sucesso
(van IJzendoorn & Juffer, 2006), pela capacidade que tem de fazer a criança passar de
uma situação caracterizada por experiências de adversidade, como maus tratos,
negligência e, mesmo, acolhimentos que não respondiam às suas necessidades
essenciais de carácter emocional e de estimulação social e cognitiva, para um ambiente
familiar que se pretende ser capaz de dar resposta a estas necessidades específicas e de
criar um laço forte e seguro que se mantém ao longo de toda a vida da criança,
possibilitando uma aproximação da trajetória desenvolvimental da criança à trajetória de
desenvolvimento normativo (Barbosa-Ducharne et al., 2014; Centro de Estudos
Judiciários, 2015; Silva, 2014).
Assim, na perspetiva das crianças, a adoção pode significar ter uma nova história,
que oferece esperança, demarca perdas e separações, principalmente no caso de crianças
mais velhas que passaram por acolhimento institucional (Ministério da Segurança
Social, 2015).

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No entanto, a literatura defende que a parentalidade e a filiação adotiva são possíveis
somente quando há uma descontinuidade, uma quebra no circuito geracional da
criança/adolescente, com a família de origem, independentemente dos motivos
(Barbosa-Ducharne et al., 2014; Machado et al., 2015).
A descontinuidade dos vínculos familiares de origem tem efeitos diferentes,
dependendo da idade da criança, das condições ambientais a que foi exposta e das
experiências emocionais vividas nas relações objetais primitivas (Machado et al., 2015).
A idade mais favorável para a adoção deve ser a mais precoce possível, pois a criança,
mesmo que maltratada, nutre sentimentos positivos pelos seus progenitores e terá tanto
maior ligação quanto mais idade tiver. Também a criança precisa de adotar os novos
pais e de fazer a separação dos pais biológicos em termos afectivos. (Centro de Estudos
Judiciários, 2015).
É neste âmbito que as instituições podem ter uma função única, a de selecionar
adequadamente os pais adotivos.

1.1.1 – Indicadores de Risco e de Proteção na Adoção

A família pode ser considerada o sistema mais importante na vida de qualquer


indivíduo (Patias, Siqueira, & Dias, 2013), assumindo-se como um dos principais
promotores de competências emocionais e sociais que exercem influência nas diferentes
trajetórias desenvolvimentais na vida do ser humano. Trata-se do primeiro ambiente de
aprendizagem e de um espaço que cria abertura para que a criança participe ativamente
em diversas situações e assuma diferentes papéis, de entre novas atividades e diversos
contextos (Mascarenhas & Alarcão, 2003; Ministério da Segurança Social, 2017).
Por sua vez, as figuras parentais exercem, desde cedo, através das interações
diádicas com os filhos, um forte papel na socialização infantil e no desenvolvimento de
sentimentos de segurança, identidade pessoal e auto-estima (Ministério da Segurança
Social, 2017). Contudo, cada cuidador age conforme as suas crenças e expectativas,
tanto face à criança como face a si próprio, e ao que a sociedade e a cultura em que se
insere determinam e exigem (Almeida, 2015).
A parentalidade tem sido considerada o produto da combinação de vários fatores
interligados entre si, desde as características individuais da criança e dos progenitores,
características parentais e do contexto social (Ministério da Segurança Social, 2017). No
entanto, nem sempre se verifica uma parentalidade adequada: em parte por falta de

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conhecimento e informação, restrito acesso a recursos e suporte, e/ou também pela
vivência de situações adversas, ligadas a modelos de cuidados desorganizados, violentos
e/ou negligentes (Almeida, 2015).
Ao não cumprir o seu papel de proteção, cuidando dos seus filhos, dando-lhes amor
e limites, uma parentalidade disruptiva pode constituir um fator de risco à trajetória
desenvolvimental das crianças e adolescentes (Patias et al., 2013).
De forma a compreender as vulnerabilidades associadas à parentalidade adotiva,
cabe conceptualizar indicadores de risco e de proteção (Almeida, 2015; Antoni, Barone,
& Koller, 2007; Filho & Guzzo, 2009).
O termo risco tem sido utilizado, no campo da saúde mental, com o significado de
stressor. Os fatores de risco são condições ou variáveis associadas à alta probabilidade
de ocorrência de resultados negativos ou indesejáveis, como o comprometimento da
saúde, do bem-estar ou do desempenho social do indivíduo (Maia & William, 2005;
Morais, 2009).
De entre estes constam características pessoais individuais e fatores ambientais.
Enquanto que o primeiro compõe uma classe de características genéticas, como o sexo,
habilidades sociais, intelectuais e características psicológicas, que interagem e
frequentemente dominam manifestações clinicas desfavoráveis; no segundo, contam-se
fatores como o baixo nível sócio-económico, eventos de vida stressantes, características
familiares, ausência de apoio social e influências sociais negativas, que abrangem uma
série de experiências humanas que afetam o normal desenvolvimento do individuo
(McInnis et al., 2018; Patias et. al., 2013)
Cowan, Cowan e Schulz (1996, como citado em Antoni et al., 2007) consideram que
qualquer variável pode agir como indicador de risco numa determinada situação,
dependendo das implicações e resultados específicos que terá nas relações e na vida do
sujeito. Ou seja, os efeitos de um fator de risco não são estáticos e/ou absolutos,
dependendo sempre de outros aspetos, como o contexto, as características do indivíduo
e a sua trajetória desenvolvimental de vida (Morais, 2009; Patias et al., 2013).
Em específico, o Ministério da Segurança Social (2017) indica que os fatores de
risco aumentam a probabilidade de os/as candidatos/as desenvolverem ou agravarem um
problema emocional ou comportamental da criança adotada, não permitindo prever a
concretização de um adequado exercício de parentalidade.
Com isto, são indicados como fatores de risco à parentalidade, a baixa auto-estima
dos/as candidatos/as, a inabilidade de expressar os sentimentos, a falta de coesão

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familiar, a instabilidade financeira, as relações desgastadas, a falta de pertença a um
grupo, e relações sociais e íntimas estreitas (Ministério da Segurança Social, 2017)
Também sinais de presença de sintomatologia específica do foro cognitivo e
emocional, a presença de perturbações da personalidade, incapacidade de insight e
autoanálise, baixa tolerância à frustração, sinais depressivos ao longo da sua história de
vida, comportamentos de fuga ou agressividade, motivação parental assimética e/ou
desajustada são apontados como fatores de risco para a parentalidade adotiva. São,
ainda, referidos incapacidade física grave, geradora de grande dependência ou
necessidade de cuidados permanentes e/ou contínuos, gravidez atual, família de origem
caracterizadas por limites difusos ou rígidos entre os subsistemas ou história de
alcoolismo, toxicodependência ou outras dependências, entre outros (Almeida, 2015;
Ministério da Segurança Social, 2017).
A motivação do casal acerca da adoção deve ter principal realce, pois uma
motivação desadequada pode, numa dimensão emocional, fomentar a falta de
autonomia, liberdade individual, conjugal e dos estilos de vida e profissionais (Guedes,
Carvalho, Pires, & Canavarro, 2011), tendo reflexos negativos no desenvolvimento
saudável da criança (Ministério da Segurança Social, 2017).
Por sua vez, também os fatores de proteção devem ser considerados no contexto e na
capacidade de mitigar o potencial risco de um evento stressor (Maia & William, 2005;
Patias et al., 2013) e, em específico, como fatores de realce no que se refere à decisão
do parecer final sobre avaliação dos/as candidatos/as à adoção (Almeida, 2015; Filho &
Guzzo, 2009).
A qualidade da parentalidade desempenha um papel importante no desenvolvimento
da criança (Almeida, 2015), assim como a organização e estruturação da parentalidade.
Também as exigências da sociedade devem ser ponderadas (Pereira & Alarcão, 2014).
Entendidos como as capacidades individuais para reagir ou ultrapassar o adverso,
evitar os efeitos negativos a longo prazo e garantir um bom autodesenvolvimento
(Herrenkohl, Herrenkohl, & Egolf, 1994), os fatores de proteção não são, apenas,
inerentes a um traço de personalidade inato que predispõe a sua aquisição, mas também
fruto do tempo e da influência familiar, dos suportes sociais e da educação (Almeida,
2015).
Apesar de a literatura apontar a genética como preditora na determinação das
diferenças individuais da parentalidade, no sentido de uma predisposição para os
processos de vinculação necessária ao desempenho parental, sabe-se que os fatores

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genéticos não são os únicos a ser considerados quando falamos em risco ou proteção.
Também as vulnerabilidades ambientais apresentam um papel fulcral no
desenvolvimento saudável da criança (Barroso & Machado, 2010).
Neste sentido, é importante reduzir as possíveis interferências ambientais negativas e
enaltecer a presença de fatores que favoreçam a resiliência nas crianças, nomeadamente
o temperamento e habilidades cognitivas. Também as características familiares como
coesão, acolhimento e proximidade entre os seus membros e a presença de suporte
externo para os membros da família são de igual importância (Friedman & Chase-
Lansdale, 2002).
Numa perspetiva sistémica, podemos pensar os fatores de proteção como
modificadores da resposta do indivíduo a algum risco ambiental, reduzindo o seu efeito
negativo (Maia & William, 2005; Ministério da Segurança Social, 2017).
Destacam-se como fatores de proteção: a auto-estima adequada, a competência para
lidar com as próprias emoções, a coesão familiar, a estabilidade financeira, a identidade
própria, o respeito, ser membro de um grupo que compartilhe os mesmos objetivos,
expectativas, valores e crenças. Ainda, o afeto, o suporte emocional, a existência de
limites claros, a flexibilidade, a comunicação aberta, a capacidade de integração da
história de vida da criança, a compreensão da necessidade de revelar à criança a sua
condição de adotada, a competência para a resolução de problemas e o sistema de
crenças favoráveis à adoção, bem como, a nível social, um quadro de estabilidade
económica e profissional, e uma rede social de suporte integradora e apoiante, por
exemplo (Ministério da Segurança Social, 2015, 2017).
Contudo, os fatores de risco e de proteção não podem ser compreendidos como
fenómenos universais que se impõem de maneira padronizada na vida dos indivíduos
(Ministério da Segurança Social, 2017). Ao trabalhar a ideia do contexto familiar como
um fator de risco e/ou proteção, não podemos reduzir a compreensão dos fenómenos
estudados a uma única variável - a família. Pretende-se ampliar a compreensão desses
fenómenos, incluindo-os na complexa rede de significados e de possibilidades, que
possibilitam a existência de uma maior ou menor vulnerabilidade das crianças a diversas
situações (Patias et al., 2013).
Em suma, os fatores de risco e proteção devem ser analisados tendo em conta o
contexto específico em que emergiram e reconhecendo, como parte deste contexto, a
capacidade do sujeito de dar sentido às suas vivências e descobertas e de modificar a
realidade social na qual está inserido (Filho & Guzzo, 2009).

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1.2. – Enquadramento Histórico-Legal da Adoção em Portugal

Em Portugal, a adoção foi regulamentada nas Ordenações Afonsinas e Manuelinas,


com o objetivo de conceder à criança adotada o estatuto de herdeiro. Contudo, a adoção
só foi introduzida no regime jurídico português com o Código Civil de 1966 e,
posteriormente, na reforma de 1977 (Brito, 2013).
Começou por ser um processo com muitos constrangimentos, exigências e/ou
limitações, em termos de critérios - por exemplo, a idade dos adotantes ser superior a 35
anos, os candidatos à adoção serem casados há pelo menos 10 anos, não poderem ter
descendentes legítimos e em que a criança adotável era, essencialmente, a criança
sujeita a abandono físico (Mascarenhas & Alarcão, 2003).
É já na década de 90, do século XX, que a prática da adoção ganha visibilidade em
Portugal, quando se tomou consciência do elevado número de crianças
institucionalizadas e sem projeto de vida (Salvaterra, 2007). Antes disso, nos anos 80 do
mesmo século, o regime jurídico acabou por dar largos passos ao estabelecer que antes
de a criança ser inserida num novo agregado, este deveria ser avaliado por organismos
da Segurança Social, no sentido de serem despistadas questões problemáticas nas
famílias adotivas, procurando prevenir novas ocorrências de situações de risco, às quais
estas crianças já haviam sido expostas na sua família biológica (Brito, 2013;
Mascarenhas & Alarcão, 2003).
Portanto, a tarefa dos técnicos consistia, desde início, em definir quais as famílias
com características favoráveis para adotar uma criança, tendo em conta o seu bem-estar
e sem deixar de respeitar os/as candidatos/as que, na sua maioria, se viram
biologicamente impedidos de ser pais (Brito, 2013; Mascarenhas & Alarcão, 2003).
Atualmente, a adoção é regida pela Lei n.º 143/2015 de 8 de Setembro, que veio
alterar o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 47/344 de 25 de Novembro de
1966, e o código do Registo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 131/95 de 6 de junho,
aprovando, ainda, o Regime Jurídico do Processo de Adoção. Ao mesmo nível, em
2016, é publicada a Lei n.º 2/2016 que elimina as discriminações no acesso à adoção,
permitindo a admissibilidade legal de adoção, em qualquer das suas modalidades, por
pessoas casadas com cônjuge do mesmo sexo ou singulares (cf. Código Civil, 2018;
Ministério da Segurança Social, 2017).
Definida pelo artigo 1974º, do Código Civil, como um ato jurídico que visa realizar
o superior interesse da criança e que será decretada quando apresente reais vantagens

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para o adotado, quando se funde em motivos legítimos, não envolva sacrifício injusto
para os outros filhos do adotante e seja razoável supor que entre o adotante e o adotado
se estabeleça um vínculo semelhante ao da filiação biológica; a adoção visa,
essencialmente, oferecer uma família a uma criança, que dela foi privada, estabelecendo
um vínculo jurídico de filiação (Centro de Estudos Judiciários, 2015; Código Civil,
2018; Ministério da Segurança Social, 2017).
A decisão deve ser ponderada, bem avaliada, pois conforme expressa o artigo 41º do
Estatuto da Criança e do Adolescente, a adoção atribui a condição de filho ao adotado,
com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer
vínculo com pais e parentes biológicos, salvo os impedimentos matrimoniais. Ao ser
uma medida excecional e irrevogável, só deve ser pensada em última hipótese, quando
não for possível manter ou a criança retornar à sua família biológica (Campos, 2012).
Tal complexidade deverá ser percecionada na sua dimensão psicossocial, uma vez
que a parentalidade adotiva pressupõe o desenvolvimento e a construção de uma relação
caracterizada por uma vinculação segura. E por vinculação segura entende-se uma
relação privilegiada de alguém com uma figura particular que lhe confere segurança e
proteção através da interação que promove na prestação de cuidados (Ministério da
Segurança Social, 2017).
A família adotiva, ao nível da sua função, não se distinguirá, no essencial, da família
biológica, uma vez que, por um lado, exercerá os mesmos direitos e deveres e, por
outro, assegurará as duas funções essenciais da família - a função interna, de
proporcionar e potenciar a proteção dos seus membros, e a criação e desenvolvimento
de uma identidade diferenciada e autónoma, no respeito pelos sentimentos de pertença
de cada elemento do todo familiar; e a função externa, de desenvolver, nos seus
elementos, as condições necessárias a uma boa integração social e cultural (Barbosa-
Ducharne et al., 2014).
Assim, não obstante às suas particularidades, é pertinente enquadrar a adoção como
uma resposta possível ao imperativo de que, para o seu desenvolvimento harmonioso, as
crianças necessitam de crescer num ambiente familiar saudável, representando a adoção
a passagem da criança de um meio familiar desfavorável para um outro, previamente
avaliado e definido como capaz de satisfazer as necessidades básicas, afetivas,
educativas e de saúde, inerentes ao seu adequado desenvolvimento em sociedade
(Centro de Estudos Judiciários, 2015; Ministério da Segurança Social, 2017).

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Devemos ter por assente que a decisão de encaminhar a situação familiar de uma
determinada criança para a adoção implica uma séria e necessária ponderação de fatores
de ordem psicológica, social e jurídica, já aqui delineados, e que a solução concreta
depende da compatibilização possível destes três tipos de abordagens (Barbosa-
Ducharne et al., 2014; Centro de Estudos Judiciários, 2015; Ministério da Segurança
Social, 2017).
Será necessário decidir como orientar um determinado caso social, dentro dos
recursos existentes e das normas legais em vigor, tendo em conta as vantagens e
inconvenientes previsíveis para o desenvolvimento global da criança e a possibilidade
de estabelecimento e consolidação de uma relação afetiva adequada com a família
adotante (Barbosa-Ducharne et al., 2014; Centro de Estudos Judiciários, 2015).
Posto isto, é de reforçar que, quer a evolução legislativa, quer a prática dos tribunais
estão a percorrer um caminho na procura da melhor solução para o regime da adoção
(Centro de Estudos Judiciários, 2015).

1.2.1 – Enquadramento Institucional da Adoção

O Instituto da Segurança Social é um organismo público e com estatuto especial nos


termos da lei, incorporado na administração indireta do Estado e provido de património
próprio e de autonomia financeira e administrativa, tal como descrito no artigo 1º do
Decreto de Lei 83/2012 (PGDL, 2012).
Enquanto serviço público, orienta-se para a prestação de apoio à população geral,
respondendo às suas necessidades e guiando-se pelos valores de respeito, honestidade,
rigor, não discriminação, diferenciação positiva, preservação ambiental, equidade social
e melhoria contínua. Mais, enquanto instituição nuclear do sistema de Segurança Social,
assume a gestão dos regimes de Segurança Social, o reconhecimento dos direitos e o
cumprimento das obrigações decorrentes dos regimes de Segurança Social, bem como
assegura a aplicação dos instrumentos internacionais de Segurança Social (Segurança
Social, n.d.).
Ao nível da parentalidade adotiva, é o Decreto de Lei n.º 185/93 de 22 de maio que
vem reconhecer a importância da intervenção profissional e a abordagem
pluridisciplinar no processo de adoção, através da aprovação do novo regime jurídico da
adoção e da alteração do Código Civil e da Organização Tutelar de Menores (Código
Civil, 2018; Ministério da Segurança Social, 2017).

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É importante realçar o aditamento do Decreto de Lei n.º 185/93 de 22 de maio,
artigo 11º C, que aborda as regras de funcionamento e de boas práticas, determinando a
obrigatoriedade de elaboração e aprovação, bem como de procedimentos a observar na
definição de projetos de vida, no encaminhamento de crianças e jovens para a adoção e
na seleção de candidatos/as a adotantes, aplicado uniformemente por todos os
organismos da Segurança Social (Ministério da Segurança Social, 2017).
Dando cumprimento a este preceito, foi editado pela Direção Geral da Segurança
Social, em setembro de 2004, o Manual de Procedimentos da Adoção, de aplicação a
nível nacional, que contém informação genérica sobre adoção e designa os
procedimentos e os circuitos inerentes às diversas fases do processo (Ministério da
Segurança Social, 2015).
De 2004 a 2010, o esforço desenvolvido pelos responsáveis da área da adoção, no
que respeita à qualificação dos serviços e qualificação de técnicos, denotou particular
importância à pluridisciplinaridade na composição das equipas de adoção, promovendo
a qualificação dos técnicos dos serviços de adoção (Ministério da Segurança Social,
2017).
É então, em 2009, com o duplo alcance de qualificação dos serviços de adoção e das
futuras figuras parentais, que vem a ser aprovado e iniciado o Plano de Formação para a
Adoção. O referido Plano de Formação tem como objetivo proporcionar uma adequada
preparação dos/as candidatos/as a adotantes para os desafios e problemáticas específicas
da parentalidade adotiva, facilitando uma maturação responsável do projeto adotivo e a
adequação das suas expectativas às realidades da adoção em Portugal (Ministério da
Segurança Social, 2015).
Foi, justamente, a novidade introduzida no sistema, pelo Plano de Formação para a
Adoção, que motivou o desenvolvimento do Manual de Procedimentos da Adoção,
assente no modelo das Necessidades das Crianças (Ministério da Segurança Social,
2017). Por sua vez, o modelo Necessidades das Crianças diz-nos que as capacidades dos
adultos devem adequar-se ao critério fundamental do superior interesse da criança,
como princípio orientador de todas as decisões que às crianças digam respeito (Palacios,
2014).
Finalmente, com o novo Regime Jurídico do Processo de Adoção (RJPA)
consignado na Lei n.º 143/2015 de 8 de setembro, surge como necessária a revisão do
Manual de Intervenção Profissional na Adoção de Crianças, de modo a proporcionar
um importante instrumento de trabalho para as equipas dos serviços de adoção,

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funcionando como um guia de boas práticas, com definições claras, com vista à
harmonização e padronização dos procedimentos relativos ao processo de adoção
(Ministério da Segurança Social, 2017).
Do novo RJPA constam e sobressaem aspetos como a avaliação das capacidades e a
preparação dos/as candidatos/as para a parentalidade adotiva, a ponderação associada ao
cruzamento das necessidades das crianças e das capacidades parentais dos adotantes,
bem como a avaliação da integração da criança na família adotiva (Ministério da
Segurança Social, 2017).
O RJPA vem, ainda, definir os organismos de Segurança Social competentes em
matéria de adoção e estabelecer a instalação do Conselho Nacional para Adoção (CNA),
com o intuito de garantir a uniformização dos procedimentos da adoção e a
colegialidade das decisões de encaminhamento da criança para a família adotante, assim
como a constituição de equipas técnicas pluridisciplinares qualificadas e
suficientemente dimensionadas, autónomas e distintas para a preparação, avaliação e
seleção de candidatos/as e para o estudo da situação das crianças e concretização dos
respetivos projetos adotivos (Ministério da Segurança Social, 2017).
De forma complementar, pretende-se, com o Manual, prosseguir na esteira da
qualificação da intervenção profissional na adoção, concretizando o imperativo de
uniformização de práticas, de metodologias e de critérios (Ministério da Segurança
Social, 2017).
No que respeita à sua organização de informação, a Parte I do Manual fala-nos dos
procedimentos de preparação, avaliação e seleção de candidatos/as, salientando-se o
principal objetivo de definir os critérios e as metodologias a utilizar no estudo de
pretensão de adotar, estando sistematizada a informação sobre os procedimentos a
implementar para a preparação, a avaliação e consequente seleção de candidatos/as. Já a
Parte II é dedicada à intervenção na integração da criança na família (Ministério da
Segurança Social, 2017).

1.2.2 - Constituição da Equipa de Adoção, Apadrinhamento Civil e


Acolhimento Familiar da Segurança Social

É a Equipa de Adoção, Apadrinhamento Civil e Acolhimento Familiar do Instituto


da Segurança Social que está responsável pela preparação, avaliação e seleção de
candidaturas à adoção. A equipa é subdivida em duas equipas distintas, nomeadamente

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Equipa de preparação, avaliação e seleção de candidatos/as e Equipa para o estudo e
concretização do projeto adotivo da criança (Ministério da Segurança Social, 2017).
Através do artigo 9º, n.º 1, do RJPA, podemos prever que as equipas devem ser
compostas por técnicos com formação específica nas áreas de Psicologia, Serviço Social
e Direito. Pretende-se que trabalhem em parceria, cada um com um papel diferenciado
e, ao mesmo tempo, complementar, com o dever de respeitar e de atuar de acordo com
os princípios de isenção e imparcialidade. Os técnicos devem zelar pela salvaguarda da
manutenção de uma posição objetiva, equidistante e neutra relativamente aos eventuais
interesses com que venham a ser confrontados na sua prática (Ministério da Segurança
Social, 2015, 2017).
Assim, é a natureza dinâmica e ancorada na constituição do seio familiar e a
necessidade de transpor essa natureza para a intervenção que aqui fica sublinhada.
Preparar, avaliar, integrar e apoiar as famílias surge, portanto, como as fases da
intervenção profissional que respeitam/concretizam as diferentes fases do projeto
familiar adotivo (Ministério da Segurança Social, 2017).

1.2.3 - Processo de Avaliação de Candidaturas à Adoção

De forma específica, o que se pretende com a preparação, avaliação e seleção de


candidatos/as à adoção é, essencialmente, aferir se determinados indivíduos reúnem
capacidades consideradas essenciais para o estabelecimento de uma relação parental de
sucesso com uma criança à qual não estão ligados por laços de consanguinidade
(Ministério da Segurança Social, 2015).
O estudo da pretensão de adoção deve incidir, nomeadamente, sobre a
personalidade, a saúde, a idoneidade para criar e educar a criança, a situação familiar e
económica dos/as candidatos/as a adotantes e as razões determinantes do pedido de
adoção, conforme está disciplinado no n.º 3 do artigo 44º do RJPA, aprovado em anexo
à Lei n.º 143/2015 de 8 de setembro (Ministério da Segurança Social, 2017).
Por sua vez, a intervenção profissional que se espera dos técnicos dos serviços de
adoção é, com base em elementos recolhidos ao longo do estudo efetuado, elaborar um
prognóstico sobre as capacidades dos/as candidatos/as para responderem de forma
adequada e sustentada aos desafios e exigências da parentalidade adotiva, assim como
identificar eventuais necessidades de apoio para levar a cabo o projeto adotivo
(Ministério da Segurança Social, 2017).

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O processo de preparação, avaliação e seleção de candidatos/as deve centrar-se no
princípio do superior interesse da criança, assentando na valência formativa e
associando-se às diversas fases do processo de adoção (Ministério da Segurança Social,
2015, 2017). O grande desafio é conseguir converter o atual modelo, centrado na
preparação, avaliação e seleção, num modelo de co-construção de um projeto adotivo,
em que os vários participantes se envolvam e colaborem ativamente (Barbosa-Ducharne
et al., 2014).
São vários os objetivos em que o processo de preparação, avaliação e seleção de
candidaturas se tem focado; nomeadamente, informar e esclarecer dúvidas sobre o
processo, conduzir à ponderação da decisão de adotar, ajustar as expectativas à
realidade das crianças em situação de adotabilidade, avaliar as capacidades dos/as
candidatos/as, contribuir para uma auto-avaliação das potencialidades dos mesmos e
adequar as suas capacidades identificadas ao projeto concreto de adoção. Bem como,
criar um espaço de confiança entre técnicos e candidatos/as, com a correspondente
aceitação da necessidade de intervenção profissional, a manter ao longo de todo o
processo de adoção (Ministério da Segurança Social, 2017).
Pormenorizando o processo, este inicia-se com a inscrição no Serviço de Adoção, do
Centro Distrital da Segurança Social da área de residência dos/as candidatos/as. Para
isso, estes devem, desde logo, preencher um conjunto de requisitos exigidos pelo artigo
1979º do Código Civil, nomeadamente estarem casados ou em união de facto há mais
de 4 anos e não separados judicialmente de pessoas e bens, ambos com idade superior a
25 anos. Pode ainda adotar, pessoa singular com mais de 30 anos ou, se o adotando for
filho do cônjuge do/a candidato/a, o adotante deve ter, pelo menos, 25 anos. Sendo que,
a partir dos 60 anos, a adoção só é permitida se a criança for filha do cônjuge ou se tiver
sido confiada ao adotante antes de este ter completado os 60 anos (Código Civil, 2018;
Ministério da Segurança Social, 2017).
Também a diferença de idades entre o adotante e o adotado não deve ser superior a
50 anos, exceto em situações especiais, como, por exemplo: quando o adotado é filho do
cônjuge ou quando, a título excecional, nomeadamente por se tratar de uma fratria, em
que relativamente apenas a algum ou a alguns dos irmãos se verifique uma diferença de
idades superior àquela e esteja garantido o superior interesse da criança junto
daqueles/as candidatos/as (Código Civil, 2018).
Após a inscrição no Serviço de Adoção, os/as candidatos/as serão convocados para
um Plano de Formação para a adoção, que surge com o objetivo primordial da

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construção de projetos de adoções realistas e capazes de dar resposta às necessidades
das crianças em situação de adotabilidade. Pretende-se proporcionar aos/às
candidatos/as, através da frequência de sessões formativas, uma preparação adequada
que lhes permita adquirir as competências necessárias para a parentalidade adotiva e
aprofundar os conhecimentos inerentes a todo o processo de adoção (Ministério da
Segurança Social, 2017).
A primeira formação, denominada de Fase A, e realizada a nível nacional, é uma
sessão prévia à formalização de candidatura, que vem dar a conhecer aos/às
candidatos/as todo o processo inerente à adoção e toda a documentação necessária para
a realização da candidatura (Ministério da Segurança Social, 2017).
Seguidamente à fase anterior, decorre um trabalho criterioso de avaliação
empreendido pela equipa, nomeadamente a avaliação psicossocial, via entrevista. Esta
avaliação (psicossocial) constitui o primeiro momento avaliativo do processo de
avaliação e seleção de candidatura e envolve uma análise das características individuais
e familiares dos/as candidatos/as à adoção (Ministério da Segurança Social, 2017).
O momento da entrevista é propício à observação do comportamento, verbal e não-
verbal e para um estudo das competências parentais, os técnicos devem ter em conta as
relações e dinâmicas familiares, as suas histórias e contextos, a rede de suporte social,
ambiente profissional e as expectativas relativamente à parentalidade adotiva, as suas
competências, funções e papéis, e os padrões comunicacionais. Do mesmo modo, são
avaliadas as características do projeto de adoção, a motivação, as condições sociais,
económicas e habitacionais (Ministério da Segurança Social, 2017).
De seguida, procede-se à avaliação psicológica. Esta fase incide sobre a exploração
e análise do comportamento dos/as candidatos/as com o objetivo de descrever e prever
a sua personalidade e as suas capacidades como figuras parentais. A vertente
psicológica da avaliação é realizada por um psicólogo (Ministério da Segurança Social,
2017).
A entrevista psicológica deve ser semiestruturada e constituída por questões abertas
que permitam a adaptação ao perfil dos/as candidatos/as, sob orientação de um conjunto
de tópicos a ser abordados e já pré-definidos no Manual dos Organismos da Segurança
Social, para que a recolha de informação possa ocorrer de forma sistematizada,
respeitando o ritmo e as características de cada candidato/a. A despistagem ou o
rastreio de problemas, a descrição ou identificação de atributos, a sua compreensão, a

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verificação de hipóteses e respetiva explicação são objetivos desta complexa tarefa
(Ministério da Segurança Social, 2017).
Segundo as diretrizes do mesmo Manual, devem ainda ser administrados um ou
mais testes psicológicos, consoante os domínios que o psicólogo da equipa de adoção
considere pertinentes avaliar. A nível nacional, considerando os vários Centros
Distritais da Segurança Social, este é um procedimento heterogéneo, não estando
definido um procedimento específico uniformemente aplicado (Ministério da
Segurança Social, 2017).
No contexto de estágio curricular em Psicologia Forense, realizado por mim no
Centro Distrital da Segurança Social de Coimbra, apenas a avaliação da personalidade
era efetuada com recurso a um instrumento de avaliação psicométrica: o NEO PI-R.
Este inventário permite avaliar e quantificar os cinco fatores/big five da personalidade
(neuroticismo, extroversão, abertura à experiência, amabilidade e conscienciosidade) e
respetivas facetas específicas, tendo disponíveis dados normativos para a população
portuguesa (Lima & Simões, 2000, 2003).
Neste sentido, as limitações da avaliação centram-se, sobretudo, na previsão e
descrição do perfil e do papel dos sujeitos enquanto pai ou mãe. É pertinente a
implementação de um protocolo de avaliação que despiste a existência de fatores de
risco da parentalidade adotiva e responda às necessidades técnicas de avaliação, para
que a mesma não assente substancialmente em elementos de natureza clínica e
qualitativa (Ministério da Segurança Social, 2017).
A avaliação psicológica decorre, assim, em duas fases: num primeiro momento é
realizada a identificação do funcionamento e estrutura do indivíduo, das suas relações e
dinâmicas familiares e, num segundo momento, é elaborada a formulação e
conceptualização do caso (Ministério da Segurança Social, 2017).
Segue-se uma segunda formação, denominada de Fase B, com objetivo de contribuir
para a definição do projeto de adoção com base no princípio da adequação das
capacidades dos/as candidatos/as às necessidades das crianças, refletir sobre diferentes
motivações e crenças da adoção, conhecer histórias de vida e necessidades da criança
em situação de adotabilidade e aprofundar o conhecimento e identificação das
capacidades dos adultos para responder às necessidades das crianças (Ministério da
Segurança Social, 2017).
A fase seguinte do processo prende-se com a visita domiciliária, realizada pelo
psicólogo e pelo assistente social da equipa de preparação, avaliação e seleção de

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candidaturas (Ministério da Segurança Social, 2015). A avaliação no domicílio tem
dupla valência psicossocial e incide, uma vez mais, sobre a observação dos/as
candidatos/as e dos seus modos de interagir, mas desta vez no seu espaço mais íntimo, a
casa, local onde poderão vir a receber a criança que pretendem adotar. Este momento de
observação, comum a ambos os técnicos, deve proporcionar uma visão de integrada
daquela família (Ministério da Segurança Social, 2017).
Concluída a avaliação e ajustada a informação pertinente relativa àquela
candidatura, a equipa está em condições de elaborar o relatório sobre a capacidade
dos/as candidatos/as de responder, de forma adequada e sustentada, aos desafios e
especificidades da parentalidade adotiva (Ministério da Segurança Social, 2015). Uma
cuidadosa ponderação dos indicadores de risco e proteção identificados permite traçar
dois quadros relativos aos critérios gerais e específicos para a seleção ou rejeição das
candidaturas (Ministério da Segurança Social, 2017).

1.3 – O Papel do Perito Forense no Processo de Adoção

Historicamente, é no campo da criminologia que se inicia a Psicologia Forense


(Costa, Penso, Legnani, & Sudbrack, 2009). Entendida como um campo interdisciplinar,
cuja especificidade é a interface entre a psicologia e o direito, as solicitações são cada
vez mais frequentes e abrangem atividades de investigação, realização de estudos,
consultoria, relatórios e testemunhos periciais, avaliação psicológica forense (e.g.,
vítimas, agressores) ou pareceres relativos a problemas surgidos em diversos momentos
do processo judicial (Associação Portuguesa de Ciências Forenses, n.d.; Ferreira,
Santos, Sales, Santana, & Santos, 2017).
Apesar da relação direta com o Tribunal, muito do trabalho levado a cabo pelos
psicólogos forenses dá-se em variados contextos, desde centros de tratamento ou de
reeducação para delinquentes, unidades de investigação do Ministério da Justiça,
serviços de apoio à criança e à vítima, universidades, institutos, estabelecimentos de
saúde mental, estabelecimentos prisionais, entre outros (Associação Portuguesa de
Ciências Forenses, n.d.).
Contudo, é de realçar o papel do psicólogo forense em casos que envolvam crianças
com trajetórias desenvolvimentais de vida desajustadas. Maus-tratos, negligência e
abuso sexual contra crianças e adolescentes, disputas de guarda e parentalidade adotiva
são algumas das principais problemáticas que envolvem crianças e jovens e que são,

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obrigatoriamente, objeto de intervenção de uma equipa composta por técnicos de
diversas áreas, incluindo, em específico, a Psicologia (Barbosa-Ducharne et al., 2014;
Peixoto & Ribeiro, 2007).
Em especial, no processo de adoção, ao envolver a definição de família funcional,
superior interesse da criança, avaliação da personalidade, expectativas e competência
parental, estratégias de melhor convivência e ao auxiliar, no pós-adoção, na adaptação à
nova estrutura familiar, preparando adotantes e o adotado; o papel do psicólogo e a
intervenção psicológica são preponderantes e denotam real importância tanto antes,
como durante e após o processo de adoção (Alvarenga & Bittencourt, 2013; Centro de
Estudos Judiciários, 2015; Ferreira et al., 2017; Ministério da Segurança Social, 2017).
Neste seguimento, Rodrigues, Couto e Hungria (2005, p. 74) afirmam que “ (ao)
enfocarmos a atuação da equipa multiprofissional nos casos de adoção, fazemos
referência a um extenso trabalho que inclui entrevistas com os/as candidatos/as a pais
adotivos, entrevistas de acompanhamento a crianças e/ou adolescentes com perspetivas
de serem colocados em lares substitutos (…), aproximação gradual dos/as candidatos/as
habilitados à adoção com crianças ou adolescentes, assessoria à recém-formada família
durante a preparação de convivência e acompanhamento das famílias adotivas com
dificuldades”.
Com isto, o papel do psicólogo incide, essencialmente, na promoção da proteção e
bem-estar da criança e da família, a partir de padrões estabelecidos, naturalizados pela
sociedade e normalizados pelo direito (Santos, 2013).

1.3.1 – A Avaliação Psicológica no Processo de Adoção

O processo de adoção apresenta-se como um procedimento que exige um certo


conhecimento da lei, compreensão do desenvolvimento emocional do ser humano a
partir do início da vida e experiência no estudo psicosocial do caso. Estas atribuições
mostram que a intervenção de um psicólogo no procedimento de adoção é complexa,
exigindo uma visão não só dos/as candidatos/as à adoção, mas especialmente das
crianças e adolescentes com projeto de vida adotivo (Ministério da Segurança Social,
2017).
Neste âmbito, a intervenção psicológica forense no que respeita à avaliação das
capacidades parentais levanta, desde logo, questões centrais, como: Quais as
características que deverão ser definidas, como adequadas, para o exercício da

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parentalidade? (Peixoto & Ribeiro, 2007; Pereira, 2013). Ou, segundo Budd (2008):
Como saber se determinado indivíduo é suficientemente bom, enquanto progenitor? Os
diagnósticos de saúde mental ou funcionamento cognitivo constituem uma prova de
adequação ou desadequação parental?
Assim, a definição de um padrão adequado para o exercício da parentalidade começa
por ser, desde logo, uma questão controversa no âmbito da psicologia (Peixoto &
Ribeiro, 2007; Pereira, 2013).
Ao longo das duas últimas décadas têm surgido diferentes modelos de avaliação de
parentalidade, que procuram operacionalizar conteúdos e procedimentos que possam
fundamentar as respetivas conclusões do processo avaliativo (Pereira, 2013).
Azar, Lauretti e Loding (1998, como citado em Pereira, 2013) defendem que a
avaliação dos progenitores deve ser feita numa perspetiva funcional e contextual, capaz
de relacionar as competências e vulnerabilidades dos mesmos com a sua capacidade de
serem pais de uma determinada criança, num contexto específico de vida.
Budd (2001), por sua vez, afirma que o perito deverá avaliar de que forma
determinadas características individuais constituem um fator de proteção ou de risco
relativamente ao desenvolvimento e à satisfação das necessidades básicas dos filhos.
Grisso (2003), no mesmo âmbito, considera que o plano funcional da parentalidade
diz respeito àquilo que o cuidador entende, acredita, sabe, faz e é capaz de fazer
relativamente à educação da criança. Também Donald e Jureidini (2004, como citado
em Pereira, 2013) consideram que a capacidade parental não é uma medida de como as
pessoas desempenham as tarefas parentais, mas sim as qualidades psicológicas que
trazem para essas tarefas.
Deste modo, podem definir-se enquanto objetivos primordiais da avaliação dos/as
candidatos/as: a idoneidade dos sujeitos, o contexto de vida onde se irá integrar e
desenvolver uma criança e, por outro lado, as capacidades dos/as candidatos/as para
responder adequadamente aos desafios inerentes ao exercício da parentalidade adotiva
(Ministério da Segurança Social, 2017).
No entanto, para que os objetivos sejam cumpridos criteriosamente e de forma a
obter informação diferenciada sobre os/as candidatos/as, devem ser utilizados múltiplos
métodos de avaliação, como abordagens quantitativas, normalizadas para a população
portuguesa, abordagens qualitativas e diversas fontes de informação - tais como o
próprio e outros membros do agregado familiar ou pessoas significativas. Na

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interpretação dos dados e na formulação de conclusões, devem ser integrados os
resultados dos vários métodos utilizados (Ministério da Segurança Social, 2017).
Pormenorizando, embora as diretrizes pressuponham a atuação do psicólogo na
entrevista psicossocial, na realidade o processo de avaliação psicológica na adoção
começa com as entrevistas psicológicas realizada aos potenciais futuros pais (Ministério
da Segurança Social, 2017). São momentos fundamentais do processo avaliativo,
constituindo a matriz do processo de avaliação psicológica (Nichting, 2016).
A entrevista cumpre, essencialmente, dois objetivos: permite uma avaliação clínica
do funcionamento psicológico dos/as candidatos/as, através da sua dimensão
anamnésica e observacional e, em segundo lugar, permite obter informação sobre a
dimensão funcional e relacional da parentalidade. A observação do comportamento,
quer seja de substrato motor, quer seja de matriz verbal, será fundamental para
caracterizar o estado dos/as candidatos/as no que respeita a dimensões como o humor e
a afetividade, a cognição e pensamento, a capacidade de insight e os mecanismos de
defesa (Peixoto & Ribeiro, 2007).
A entrevista deverá focar a análise das características individuais e familiares, como
a história de vida e o processo de desenvolvimento pessoal, estilos educativos,
enquadramento familiar e capacidades parentais, história de relacionamentos afetivos,
rede de suporte e qualidade das relações íntimas, competências de relacionamento
interpessoal, interesse e ocupação de tempos livres, traços e perfis de personalidade,
auto e hétero representação, situação de saúde física e mental (Barbosa-Ducharne et al.,
2014; Ministério da Segurança Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007).
Deve ainda reter aspetos como a sensibilidade para as necessidades
desenvolvimentais das crianças e a vivência dos/as candidatos/as relativamente a
situações traumáticas (como a infertilidade), reação familiar e da rede social sobre o
projeto adotivo, modificações e ajustamento do funcionamento/estrutura familiar,
estratégias sobre comunicação e busca de origens, aceitação e compreensão da história
da criança, mitos e receios face à adoção; bem como, atestar se a tomada de decisão e a
motivação para a adoção é mútua entre os elementos do casal (Barbosa-Ducharne et al.,
2014; Ministério da Segurança Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007).
Num outro nível, a avaliação deve ser capaz de prever se as expectativas acerca do
modelo parental, as experiências e as estratégias educativas são adequadas. Estes
parecem ser aspetos fulcrais da avaliação da parentalidade no processo de adoção, pois
transpõem para o processo o reconhecimento que cada candidato/a faz das

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idiossincrasias da criança e as múltiplas formas da sua expressão (Ministério da
Segurança Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007).
O passo seguinte do processo avaliativo será a administração de provas psicológicas,
no sentido de obter dados clínicos com os quais se deve articular analiticamente o
resultado da entrevista e da observação do comportamento (Ministério da Segurança
Social, 2017). O objetivo da utilização de uma bateria de testes psicológicos é a
clarificação e a confrontação dos dados e hipóteses clínicas obtidas a partir das outras
metodologias aplicadas (Nichting, 2016).
A seleção das provas psicológicas a utilizar deverá abranger o mais vasto leque de
dimensões psicológicas, quer no plano da avaliação da personalidade, quer da dimensão
de psicopatologia, da avaliação da parentalidade e de desejabilidade social. Em
determinados casos, poderá ser necessário alargar o leque de instrumentos
psicométricos a administrar, quando, por exemplo, se evidenciem situações de
comprometimento neurológico e/ou cognitivo ou em casos de candidatos/as já com
filhos (Ministério da Segurança Social, 2017; Nichting, 2016; Peixoto & Ribeiro, 2007;
Souza, Alexandre, & Guirardello, 2017).
A bateria de testes psicológicos deve ter por base a existência de estudos de
adaptação e normalização para a população portuguesa e as suas características
psicométricas devem ser adequadas (Ministério da Segurança Social, 2015, 2017;
Nichting, 2016; Souza et al., 2017).
Contudo, é importante reter que da avaliação do exercício da parentalidade emergem
questões éticas e culturais que devem ser valorizadas durante a intervenção do
Psicólogo Forense (Pereira, 2013).
Em específico, na avaliação de candidaturas à adoção, para além da certificação da
capacidade para adotar, a intervenção deve estar subordinada e orientada
equilibradamente, de forma a permitir, por um lado, salvaguardar o papel do avaliador
e, por outro, ser indutor de confiança e serenidade para possibilitar aos/às candidatos/as
a expressão das suas dúvidas, receios e a aceitação consciente das dificuldades que uma
adoção acarreta (Ferreira et al., 2017; Lind & Lindgren, 2017; Swedish National Board
of Health and Welfare, 2009).

1.3.2 – Contributos da Avaliação Psicológica para o Processo de Adoção


A avaliação sempre foi parte integrante do processo de adoção (Lind & Lindgren,
2017). Contudo, a natureza, o conteúdo e o processo de avaliação têm vindo a sofrer

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alterações consideráveis, ao longo dos anos, à luz dos diferentes tipos de situações e/ou
crianças à adoção e dos diferentes métodos de encontrar famílias adotivas (Adcock,
2010).
Evidências, que mostram uma melhor compreensão dos possíveis efeitos adversos da
adoção na criança, levaram os países a ser cada vez mais minuciosos na avaliação das
capacidades dos/as candidatos/as à adoção (Noordegraaf, Nijnatten, & Elbers, 2010).
Enquanto que, anteriormente, a prática da avaliação na adoção se centrava apenas na
avaliação dos/as candidatos/as, atualmente, ao ter um carácter mais informativo, prepara
os futuros pais para a avaliação através de sessões de formação e apoio aos/às
candidatos/as e criança na fase do pós-adoção (Adcock, 2010; Ministério da Segurança
Social, 2015, 2017).
É de prever que a avaliação de candidaturas à adoção seja efetuada mediante a
realização de um estudo psicossocial composto por entrevistas aos/às candidatos/as (em
alguns casos, também a pessoas que integrem o agregado familiar ou que possam vir a
assumir um papel de referência para a criança) e através da aplicação de instrumentos de
avaliação social e de avaliação psicológica (Ministério da Segurança Social, 2015).
Visando, portanto, analisar as qualidades e os recursos necessários dos/as candidatos/as,
para abraçar o projeto adotivo (Lind & Lindgren, 2017), provendo, com base na
franqueza e participação ativa dos/as candidatos/as, dados psicométricos que permitam
à equipa de adoção basear a sua decisão sobre a elegibilidade dos futuros pais, para o
projeto adotivo (Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
Em Portugal, a avaliação de candidaturas à adoção aparece regulamentada no art.º 9
do Regulamento Jurídico do Processo de Adoção, aprovado pela lei nº 143/2015, de 8
de setembro. Como objetivo primordial do RJPA surge a definição de critérios e
procedimentos padronizados e de aplicação uniforme por todos os organismos de
Segurança Social, no que respeita à preparação, avaliação e seleção de candidatos/as a
adotantes e às diligências para concretização do projeto adotivo (Ministério da
Segurança Social, 2017).
A nível europeu, a profundidade e o foco da avaliação caracterizam-se pela
variabilidade e os procedimentos tendem a ser diferentes, contudo cobrem questões
semelhantes (Adcock, 2010; Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
A título de exemplo, na Holanda as avaliações são baseadas na teoria da vinculação
e são conduzidas usando métodos para identificar diferentes fatores de proteção e risco
(Noordegraaf et al., 2010).

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Quando um casal holandês planeia adotar uma criança, deve primeiro inscrever-se
no Centro de adoções da sua área de residência e, de seguida, frequentar seis sessões de
formação, que fornecem aos futuros pais informações sobre a adoção. O procedimento
de avaliação inclui uma análise da saúde, se os/as candidatos/as têm ou não
antecedentes criminais e quatro entrevistas conduzidas por um assistente social.
Especificamente, a avaliação incide sob três critérios de adequação, nomeadamente
personalidade, relacionamento e capacidades parentais (Noordegraaf et al., 2010).
Por sua vez, na Suécia, após a Segunda Guerra Mundial, a teoria psicodinâmica
passou a desempenhar um papel decisivo nas conclusões obtidas nas avaliações de
candidaturas à adoção. A ênfase era colocada em fatores como a personalidade, relações
interpessoais e atitudes em relação ao mundo, em geral, e à criança, em particular
(Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
Mais tarde, o foco das avaliações passou a ser essencialmente o relacionamento
entre o casal e os seus motivos para adotar. Já na década de 1970, o escopo das
avaliações foi ampliado ao círculo familiar dos/as candidatos/as e à sua rede social.
Atualmente, neste país, as avaliações são baseadas na teoria da vinculação e realizadas
por assistentes sociais (Noordegraaf et al., 2010; Swedish National Board of Health and
Welfare, 2009).
Após a inscrição formal para a adoção, os/as candidatos/as deverão participar numa
sessão de formação inicial, onde é trabalhado o conhecimento e insight que os/as
candidatos/as já possuem sobre a parentalidade adotiva (Swedish National Board of
Health and Welfare, 2009). O processo avaliativo, mais específico, contempla uma
avaliação social em conjunto, no caso de candidaturas de casal, uma entrevista
singular/individual e uma entrevista domiciliária (Lind & Lindgren, 2017).
Os/as candidatos/as têm a possibilidade de escolher algumas características
específicas da criança adotada, como a faixa etária, raça e etnia, entre outras. Nesses
casos, as restrições propostas serão discutidas no relatório de avaliação e na decisão
formal da equipa (Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
Embora nenhuma das entrevistas pressuponha o uso de instrumentos específicos
para avaliar os/as candidatos/as (Noordegraaf et al., 2010), é solicitado um atestado
médico geral e, caso persistam dúvidas sobre a saúde física ou mental dos futuros pais, é
pedida uma avaliação complementar de um médico especialista ou de um psicólogo
(Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).

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No decorrer da avaliação são ainda usados genogramas, pois para além de clarificar
a imagem da família extensa, serve como ponto de partida para explorar a parentalidade
e a vinculação ao longo das gerações (Lind & Lindgren, 2017; Swedish National Board
of Health and Welfare, 2009).
Tal como em Portugal, é possível encontrar toda a informação compilada, diretrizes
e recomendações correspondentes à avaliação e procedimentos no manual de adoção,
elaborado pelo Conselho Nacional Sueco de Saúde e Bem-Estar. Quando foi publicado
pela primeira vez, veio responder à necessidade de estabelecer práticas de avaliação
homogéneas, a nível nacional, sugerindo áreas de análise, perguntas a serem efetuadas
pelo assistente social e despiste de fatores de risco. Contudo, o manual não prescreve
qualquer método único de avaliação ou recomenda instrumentos específicos de
avaliação (psicológica) (Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
Já no Reino Unido, no final dos anos 1960, quando os/as candidatos/as eram,
principalmente, casais brancos sem filhos, o principal foco da avaliação era a
estabilidade emocional e financeira. A partir de 1970, o enfoque passou a ser a
preparação dos/as candidatos/as, através de sessões formativas com os adotantes, onde
eram disponibilizadas informações sobre o desenvolvimento infantil e os tipos de
crianças que estão preparados para adotar (Kellmer Pringle, 1976, como citado em
Adcock, 2010).
Seguiam-se sessões abertas, discussões em grupo, entrevistas para esclarecer os
objetivos e os métodos das equipas de adoção e conhecer as características das crianças
para a adoção. Com isto, acreditava-se que os/as candidatos/as poderiam desenvolver
capacidades parentais durante o processo de avaliação e no período pós-adoção
(Adcock, 2010).
Ao longo dos anos, observou-se um desenvolvimento notável ao nível do conteúdo
das sessões, acrescidas das avaliações individuais, com a implementação do Foster
Parent Reports. Reconhecia-se que era necessário, devido às preocupações de proteção
à criança, assegurar o desenvolvimento saudável das famílias adotivas e perfis
adequados à adoção (Dibben, 2010, como citado em Adcock, 2010).
Em específico, a avaliação padronizava medidas como o Adult Attachment Interview
e a Attachment Style Interview (Adcock, 2010). A primeira, entrevista semiestruturada,
analisava, alternadamente, as descrições de relacionamentos, memórias específicas de
apoio e descrições de relacionamentos atuais com os pais. Os/as candidatos/as
forneciam memórias relacionadas à vinculação desde a infância e avaliavam essas

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memórias a partir da sua perspectiva atual (George, Kaplan, & Main, 1996; van
Ijzendoorn, 1995); a Attachment Style Interview, entrevista semiestruturada, igualmente,
preza por descrever a dinâmica das relações interpessoais de suporte e avaliar a
qualidade do relacionamento com o parceiro e a família de origem. Continua a ser uma
ferramenta de avaliação usada em candidaturas à adoção, no Reino Unido (Bifulco,
Jacobs, Bunn, Karen, & Irving, 2008).
Na Dinamarca, a formação inicial obrigatória inclui diferentes questões, aprofundar
desde os aspectos importantes sobre a adoção, às capacidades parentais e económicas
necessárias à parentalidade adotiva. E, na Áustria, as avaliações variam entre as
diferentes cidades, mas o relatório psicológico é obrigatório (cf. Swedish National
Board of Health and Welfare, 2009).
Desta forma, a prática de avaliação evoluiu em torno do reconhecimento de que
existe uma relação entre as equipas de adoção, o psicólogo, o assistente social, a criança
e os pais. Nesse relacionamento, adultos e crianças podem aprender, entender, mudar e
desenvolver-se positivamente, satisfazendo padrões de interação (Adcock, 2010).
Contudo, mesmo não existindo um método padrão estruturado, cientificamente
testado para avaliar potenciais adotantes, e sendo eles (métodos) distintos nos vários
países, a questão vital de todo o processo é pensar no superior interesse da criança e
mantê-lo, mesmo que as discussões sobre o processo de avaliação se centrem nos
sentimentos e desejos dos/as candidatos/as (Adcock, 2010; Nichting, 2016; Noordegraaf
et al., 2010; Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).

II - Objetivos

O objetivo central desta dissertação foi disponibilizar uma proposta de definição de


protocolo de avaliação psicológica para candidatos/as à adoção. O estudo visa contribuir
para a possibilidade de estandardizar estes processos, de forma a minorar possíveis
enviesamentos, diferenças de metodologias e técnicas, ao disponibilizar um protocolo
mais abrangente, objetivo e exequível, uniformizado e validado para a população
portuguesa, que venha a potenciar adoções mais bem-sucedidas.

III - Metodologia

Para a realização da presente dissertação teve lugar, num primeiro momento, a


reunião de artigos científicos e consequente leitura bibliográfica, pesquisada na base de

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dados B-On, MBSCO, ResearchGate e SciELO, sobre a adoção, contributos da
avaliação psicológica no contexto forense e sobre instrumentos de avaliação psicológica
adaptados à população portuguesa, que pudessem ser adequados e responsivos ao estudo
de candidaturas à adoção. Contudo, de forma a identificar os domínios/dimensões
psicossociais de relevo para a avaliação de candidaturas à adoção e sustentar/justificar a
seleção dos instrumentos para aplicação em contexto português, atendendo à
especificidade do estudo, teve particular importância a pesquisa de diretrizes
internacionais.
Também a integração e experiência de estágio na equipa de adoção do Centro
Distrital da Segurança Social de Coimbra, ao permitir o contacto com o processo
avaliativo e o conhecimento real sobre a não estandardização do processo, a nível
nacional, serviu de base e ponto de partida para a proposta aqui apresentada; bem como,
o Manual dos Organismos da Segurança Social, ao auxiliar a
contextualização/conceptualização e ao disponibilizar linhas orientadoras de todo o
processo envolvido na preparação, avaliação e seleção de candidatos/as à adoção.
De entre os termos de busca inicial utilizados foram considerados “adoção”,
“avaliação psicológica na adoção”, “perito forense”, “adoption”, “psychological
assessment in adoption”, “forensic psychologist” e “adoption and fostering”.
A partir da identificação dos domínios/dimensões relevantes a avaliar, foram
pesquisados posteriormente/adicionalmente estudos portugueses sobre instrumentos
referentes a esses constructos (tendo por referência manuais da especialidade/avaliação
psicológica/avaliação psicológica forense e publicações periódicas, nacionais e
internacionais).

IV - Resultados e Discussão

Embora sejam conhecidas linhas gerais e orientadoras de parâmetros avaliativos, é


notória a escassez de quadros teóricos e de metodologias criadas especificamente para
avaliar as dimensões, diretamente implicadas na determinação das capacidades
parentais, em casos adotivos (Ferreira et al., 2017; Ministério da Segurança Social,
2017; Peixoto & Ribeiro, 2007; Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).
É neste contexto que surge a fundamentação da avaliação de candidaturas à adoção e
das redes de apoio dos/as candidatos/as e a consequente justificação deste complexo e

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responsável ato técnico: o de selecionar candidatos/as capazes para uma adequada e
responsável parentalidade adotiva (Ministério da Segurança Social, 2017).

Domínios/dimensões gerais de avaliação psicológica em contexto de adoção


Da pesquisa e análise bibliográfica efetuadas, considerando os delineamentos
alusivos aos fatores de risco/protetores e as diretrizes nacionais e internacionais
referentes à adoção, com o objetivo único de potenciar adoções bem-sucedidas, é
salientada alguma concordância na definição de domínios/dimensões psicossociais,
ressaltando cinco imprescindíveis, em termos de avaliação a implementar/perfis a
caracterizar.
São eles, Motivação para a Adoção, Estilos Educativos, Vinculação, Personalidade
e Desejabilidade Social (cf. Adcock, 2010; Barbosa-Ducharne et al., 2014; Ferreira et
al., 2017; Lind & Lindgren, 2017; Machado et al., 2015; Ministério da Segurança
Social, 2017; Nichting et al., 2016; Noordegraaf et al., 2010; Peixoto & Ribeiro, 2007;
Swedish National Board of Health and Welfare, 2009).

Proposta de protocolo de avaliação psicológica de candidatos/as à adoção


Como já referido, muito embora as guidelines sejam relativamente uniformes quanto
à definição dos domínios avaliativos e à importância da aplicação de instrumentos
psicométricos, destaca-se a inexistência de testes com estudos que atestem a
adequabilidade para a população adotiva (Adcock, 2010; Ferreira et al., 2017;
Noordegraaf et al., 2010; Peixoto & Ribeiro, 2007; Swedish National Board of Health
and Welfare, 2009).
Nessa sequência, procurou-se operacionalizar tais domínios, considerando
procedimentos avaliativos disponíveis. A seleção dos instrumentos teve como base a
existência de estudos de validação para a população portuguesa, bem como a evidência
de boas características psicométricas, nesse âmbito (Ministério da Segurança Social,
2015, 2017; Nichting, 2016) (cf. Quadro 1).
Os instrumentos proporcionam informação quantitativa e qualitativa que viabiliza
uma avaliação empírica mais precisa acerca dos traços psicológicos e outras
características das pessoas (Lind & Lindgren, 2017; Ministério da Segurança Social,
2017; Souza et al., 2017).
No entanto, é necessário reconhecer a pertinência da entrevista clínica. Ao ser
semiestruturada e constituída por questões abertas, para além de permitir a sua

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adaptação ao perfil dos/as candidatos/as, auxilia na observação do comportamento
verbal, não-verbal e na interação entre o casal (caso se aplique), auxiliando na discussão
de decisões e sustentando respostas em cada processo. Nesse sentido, a entrevista deve
ser parte integrante e incontornável do processo de avaliação, no âmbito da adoção
(Ministério da Segurança Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007). Mas exige um
complemento de indicadores mais objectivos, nomeadamente, os que os testes, escalas,
questionários/inventários permitem obter (Nichting, 2016).

Quadro 1: Proposta de protocolo de avaliação psicológica de candidatos/as à adoção

Domínio Avaliativo Instrumento (s) Psicométrico (s)


Motivação para a Adoção Escala de Motivações para a Parentalidade
(EMP)
(Guedes, Pereira, Pires, Carvalho, & Canavarro,
2015)
Estilos Educativos EMBU Memórias de Infância (Canavarro,
1996, 1999)
Vinculação Escala de Vinculação do Adulto (EVA)
(Canavarro, 1997)

Personalidade Minnesota Multiphasic Personality


Inventory-2 (MMPI-2) (Silva, Novo, Prazeres,
& Pires, 2006)
Desejabilidade Social Escala de Desejabilidade Social – 20 Itens
(EDS-20) (Almiro et al., 2017)
.

Motivação para a Adoção


Face à complexidade e à dificuldade em avaliar a motivação para a parentalidade,
em específico para a parentalidade adotiva, poucos têm sido os estudos junto da
população. Grande parte deles têm envolvido amostras de conveniência e a
inconsistência dos seus resultados têm conduzido os teóricos a privilegiar grupos
clínicos que enfrentam experiências reprodutivas específicas, como casais inférteis,
sobreviventes de cancro ou indivíduos que decidem voluntariamente não ter filhos
(Guedes et al., 2011).

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Não obstante a sua heterogeneidade e as suas limitações, as investigações têm
apontado para uma vasta constelação de motivações positivas e negativas, globalmente
expressas em dimensões emocionais, sociais, económicas, biológicas e/ou físicas
(Guedes et al.,2011).
Como as mesmas nem sempre podem ser apreendidas de forma estandardizada
através de entrevista clínica, a Escala de Motivação para a Parentalidade surge como um
instrumento que permite avaliar as disposições empiricamente implicadas na motivação
para a parentalidade, de forma a percecionar o que parece ser favorável e desfavorável à
parentalidade (Guedes et al., 2015).
A Escala de Motivação para a Parentalidade é uma ferramenta útil para entender
melhor os padrões contemporâneos de motivação para a parentalidade e foi construída
com o intuito de avaliar as motivações positivas e negativas da gravidez. De forma a
fornecer evidências preliminares de confiabilidade (precisão) e estrutura factorial
(validade de constructo), a seleção dos itens foi baseada em critérios estatísticos e
concetuais (Guedes et al., 2015).
A versão final da EMP integra duas subescalas, com boa consistência, que avaliam
as motivações positivas (26 itens) e negativas para a parentalidade (21 itens) (cf. anexo
1) (Guedes et al., 2011).
A sua aplicabilidade ao processo de adoção prevê a identificação de motivações
incongruentes para a parentalidade adotiva nos membros do casal, que possam interferir
na qualidade do processo de tomada de decisão e na satisfação subsequente com as
perspetivas de pai e mãe (Guedes et al.,2015).
A identificação desses perfis motivacionais incongruentes pode orientar a equipa de
adoção na sua tomada de decisão ou na preparação de estratégias de aconselhamento
que possam mobilizar e/ou desenvolver capacidades eficazes de comunicação, resolução
de conflitos e negociação do casal (Ministério da Segurança Social, 2017).

Estilos Educativos
Outro dos métodos que permite abordar empiricamente a parentalidade é o estudo
dos estilos educativos parentais. Este é um conceito associado à forma utilizada pelos
pais para lidar com questões de poder, hierarquia e apoio emocional (Morgado, Dias, &
Paixão, 2013).
Entendidos como um conjunto de estratégias que são direcionadas e comunicadas à
criança, usadas para incentivar a ocorrência de comportamentos desejados e validados

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pelos progenitores, de forma a criar um clima emocional positivo (Fidalgo, 2009;
Morgado et al., 2013), várias pesquisas têm enfatizado a importância dos estilos
parentais e do estudo da interação parental, bem como práticas educativas utilizadas
pelos pais (Machado et al., 2015; Noordegraaf et al., 2010; Swedish National Board of
Health and Welfare, 2009).
Estudos defendem que relacionamentos familiares positivos facilitam o
desenvolvimento de uma identidade positiva, funcionando como um meio de suporte
emocional. Estes resultados fornecem suporte empírico para o modelo/conceptualização
de que as relações familiares formam a base para todas as relações de vinculação
subsequentes (Fidalgo, 2009; Morgado et al., 2013).
A este nível, são diversos os instrumentos que procuram contemplar a avaliação das
retrospetivas de cuidados parentais, nomeadamente o Adult Attachment (George,
Kaplan, & Main, 1985, como citado em Fidalgo, 2009), Inventory for Assessing
Memories of Parental Rearing Behaviour (Perris, von Knorring, & Perris, 1980, como
citado em Fidalgo, 2009), o Parental Bonding Instrument (Parker, Tupling, & Brown,
1979, como citado em Fidalgo, 2009), o Attachment History Questionnaire (Pottharst &
Kessler, 1990, como citado em Fidalgo, 2009). Contudo, na literatura, as avaliações têm
sido predominantemente realizadas por meio de dois instrumentos, o Parental Bonding
Instrument (Parker et al., 1979, como citado em Fidalgo, 2009) e o questionário Egna
Minnen Betrafande Uppfostran (EMBU), que designa o acrónimo sueco para
“memórias próprias referentes à infância” (Perris, Jacobson, Lindstrom, Von Knorring,
& Perris, 1980, como citado em Canavarro, 1999).
No âmbito do presente trabalho, é aqui proposta a aplicação da versão portuguesa do
instrumento EMBU Memórias de Infância. Validado por Canavarro (1999), consiste
num instrumento de auto-relato de avaliação da retrospetiva dos estilos parentais
educativos e avalia as recordações da frequência de determinadas práticas educativas,
durante a infância e a adolescência do indivíduo, em relação ao pai e à mãe,
separadamente (anexo 1).
De forma geral, o estudo português veio mostrar “bons índices de fiabilidade e
validade do instrumento” (Canavarro, 1999, p. 236), embora os seus valores de Alpha
de Cronbach se encontrassem ligeiramente abaixo dos valores encontrados por outros
investigadores, quer para o total dos itens, quer para os itens considerados
individualmente. Contudo, este indicador tende a subestimar a fiabilidade dos itens em
instrumentos multidimensionais, como é o caso (Fidalgo, 2009).

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Uma das críticas que tem sido feita ao EMBU, comum a outros instrumentos que
recorrem à avaliação retrospetiva de acontecimentos, consiste na natureza reconstrutiva
da memória e no facto destas recordações estarem sujeitas a variados enviesamentos
(Fidalgo, 2009).
Contudo, a experiência subjetiva do comportamento e desenvolvimento foi,
igualmente, salientada por diferentes autores, que defendem que as perceções que os
indivíduos têm dos seus pais podem ser ainda mais importantes do que o
comportamento real dos pais. Também a sua facilidade de aplicação e o facto de
permitir o acesso ao conhecimento de aspetos das interações e das relações entre pais e
filhos, que ocorrem pouco frequentemente, que são difíceis de observar ou de interpretar
sem a informação dos próprios, constituem as vantagens de aplicação do EMBU
(Canavarro, 1999).

Vinculação
Definida como um sistema comportamental que serve funções filogenéticas, com
uma disposição inata para o estabelecimento de um laço afetivo com o cuidador e com
vista à proteção e sobrevivência do indivíduo, a teoria de vinculação desenvolvida por
Bowlby (1980) preconiza que a criança estabelece vínculos afetivos significativos com
as figuras prestadoras de cuidados, variando a qualidade destes vínculos em função da
qualidade dos cuidados e, em especial, das características da relação com a figura de
vinculação (Ministério da Segurança Social 2017).
Ao comparar a utilização de entrevistas e questionários na avaliação da vinculação
do adulto, estudos referem três argumentos a favor da utilização de instrumentos de
auto-resposta para avaliar diferenças individuais da vinculação na idade adulta.
Nomeadamente, o facto de a vinculação ter um papel muito importante na vida
emocional dos indivíduos (Bowlby, 1980) e, desta forma, estes poderem fornecer
informação sobre as suas experiências emocionais; o facto de os adultos terem
suficiente experiência relacional para saberem descrever como se sentem e comportam
nessas relações; e, por último, o de os processos conscientes e inconscientes
concorrerem para o mesmo objetivo (Canavarro, Dias, & Lima, 2006).
Neste âmbito, diversas escalas com o objetivo de identificar as características do
relacionamento entre pais e filhos têm sido desenvolvidas, nomeadamente a Inventory of
Parent and Peer Attachment (Armsden & Greenberg, 1987, como citado em Canavarro
et al., 2006), Reciprocal Attachment Questionnaire for Adults (West & Sheldon-Keller,

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1994, como citado em Canavarro et al., 2006) e Adult Attachment Scale (Canavarro et
al., 2006). Em específico, a escala construída por Collins e Read (1990, como citado em
Canavarro et al., 2006), a Adult Attachment Scale, foi estudada pela primeira vez, em
Portugal, por Canavarro (1996) (cf. Anexo 1). Nessa altura, à versão portuguesa da
escala correspondeu a designação de Escala de Vinculação do Adulto (EVA)
(Canavarro et al., 2006).
Posteriormente, outros estudos realizados com a EVA, por diversos autores,
permitiram robustecer a amostra inicial, oferecendo importantes contributos para o
estudo das qualidades psicométricas da versão portuguesa da escala, na sua atual
apresentação (Canavarro et al., 2006).
Especificamente, a Escala de Vinculação do Adulto, condizente com a Teoria da
Vinculação do Adulto (Bowlby, 1970), avalia a vinculação no adulto em 18 itens e está
subdividida em três dimensões: ansiedade, contacto com a proximidade e confiança nos
outros.

Personalidade
O estudo da personalidade tem revelado uma utilidade e eficiência reconhecidas na
área clínica e da saúde e, como tal, tem sido descrita sob múltiplas perspetivas e em
diferentes domínios. Atualmente, as definições contemplam os conceitos de integridade
e organização, referindo-se à regularidade dos comportamentos e das formas de
experiência, como os pensamentos e os sentimentos (Gonçalves, 2011; Mesquita, 2012).
McCrae e Costa (2006) defendem que a personalidade é um factor preditor do
comportamento humano e, como tal, deve ser considerada no estudo de determinados
quadros clínicos e contextos sociais.
Um dos instrumentos robustos utilizados para a avaliação da patologia e da
personalidade, em específico na adoção, é o Minnesota Multiphasic Personality
Inventory-2 (MMPI-2) (Gonçalves, 2011; Mesquita, 2012; Nichting, 2016).
O Inventário Multifásico de Personalidade de Minnesota-2 (MMPI-2) é um
inventário de auto-relato que permite caracterizar a personalidade e a psicopatologia do
indivíduo a nível global, permitindo uma diferenciação entre a “normalidade” e a
patologia (cf. anexo 1) (Gonçalves, 2011; Nichting, 2016; Silva et al., 2006).
Este instrumento seguiu processos rigorosos de construção e de validação revelando
boas características psicométricas, o mesmo sendo reportado para a versão portuguesa,
(cf. Gonçalves, 2011) que se encontra em validação (Silva et al., 2006).

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Devido às suas características particulares, o MMPI-2 constitui-se como um
inventário utilizado pelos psicólogos para a deteção de psicopatologia, designadamente
de perturbações clínicas e de personalidade, e é internacionalmente reconhecido como
útil nos contextos clínico, organizacional, forense e no da saúde (Gonçalves, 2011;
Mesquita, 2012; Nichting, 2016). Um estudo realizado por Nichting (2016), no âmbito
das avaliações de adoção nos Estados Unidos, veio mostrar que 84.6% dos psicólogos
inquiridos utilizam o MMPI-2 nas avaliações de personalidade, no âmbito dos processos
de certificação de candidatos/as à adoção em que estão envolvidos enquanto peritos.
Contudo, são ainda poucos os estudos que procuram explorar as relações existentes
entre as preocupações e as dimensões de personalidade no contexto da adoção. As
perspetivas futuras devem remeter para uma compreensão mais alargada das relações
existentes entre preocupações e perturbações clínicas e da personalidade, nesse
contexto.
No que diz respeito à minha experiência em contexto de estágio curricular e à
aplicação do NEO PI-R (Lima & Simões, 2000, 2003), nesse âmbito, ainda que este
instrumento permita obter características da personalidade, nomeadamente os traços
mais característicos, e podendo a interpretação dos resultados assumir características de
vulnerabilidade quando se obtêm perfis extremos, não permite apreender em rigor a
especificidade de elementos de psicopatologia/perfil de funcionamento psicopatológico.
No entanto, este é um aspeto/domínio que poderá ter um interesse mais evidente no
contexto das candidaturas à adoção, daí também a proposta do MMPI-2.

Desejabilidade Social
O processo de responder conforme o que é socialmente desejado constitui um tópico
de interesse nos estudos da atualidade (Almiro et al., 2017). Em especifico, a
desejabilidade social refere-se à tendência das pessoas para atribuírem a si próprias
atitudes e/ou comportamentos com valores socialmente desejáveis, de forma a
satisfazerem a sua necessidade de aprovação social e mostrarem que os seus
comportamentos estão em conformidade com tais valores (cf. Almiro et al., 2017; Lind
& Lindgren, 2017).
Nos diversos contextos de avaliação psicológica, e em especial no âmbito da
avaliação de candidaturas à adoção, é de notar a tendência para a ocorrência de
respostas distorcidas aos itens dos questionários, isto é, um estilo de resposta
congruente com o que é socialmente aceitável, o que pode retirar validade ao perfil

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obtido e ao próprio processo avaliativo (Lind & Lindgren, 2017; Ministério da
Segurança Social, 2017).
A este propósito, a EDS-20 é um instrumento de autorrelato que avalia o constructo
de desejabilidade social e é uma escala unidimensional de resposta dicotómica
(sim/não) (cf. anexo 1). Apesar de carecer de estudos de precisão teste-reteste, que
permitam analisar a estabilidade temporal dos resultados obtidos, a EDS-20 é uma
escala muito útil na apreciação do nível de sinceridade das respostas dadas pelos
sujeitos na avaliação do seu comportamento, do seu perfil de personalidade e das suas
atitudes pessoais, nomeadamente, em contexto forense (Almiro et al., 2017).
Trata-se de um instrumento de rápida e fácil aplicação, que possui várias
potencialidades na medição da desejabilidade social e que pode ser integrado nos
protocolos de avaliação psicológica, funcionando como uma escala de validade para
detetar o efeito (da desejabilidade) no enviesamento das respostas (Almiro et al., 2017).

Dimensões de Avaliação Complementar


Contudo, atendendo a casos específicos de evidentes perfis psicopatológicos, baixo
auto-conceito, em situações de candidaturas já com filhos ou em visíveis situações de
comprometimento neurológico e/ou cognitivo, são propostos testes de avaliação
complementar.

Quadro 2: Dimensões de avaliação complementar

Domínio Avaliativo Instrumento (s) Psicométrico (s)

Perfil Psicopatológico Inventário de Sintomas Psicopatológicos 18 – BSI


18 (Canavarro, Nazaré, & Pereira, 2017).

Auto-conceito Inventário Clínico de Auto-conceito - ICAC (Vaz


Serra, 1986)
Capacidades Parentais EMBU-Pais (Canavarro & Pereira, 2007)

MoCA (Freitas, Simões, Alves, & Santana, 2011)


Rastreio Cognitivo/ Capacidade WAIS III – Subteste de Vocabulário (Wechsler,
Intelectual 2008)

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Note-se que, e tendo em conta a especificidade individual, o protocolo a aplicar pode
ser diferenciado, quer para os elementos do casal, quer no que concerne as várias
candidaturas (cf. Quadro 2).

Perfil de psicopatologia
No âmbito da avaliação de candidatos/as, seria igualmente interessante perceber,
quando não existam evidentes características estruturais de psicopatologia, se
situacionalmente/num espectro temporal circunscrito, há alguma vulnerabilidade
psicopatológica, que possa, eventualmente, constituir-se como entrave para atingir
objetivos ligados à promoção do superior interesse da criança (Ministério da Segurança
Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007; Souza et al., 2017).
De entre os instrumentos validados para a população portuguesa que avaliam perfis
de psicopatologia, é proposta a aplicação do Brief Symptom Inventory 18 (BSI-18),
instrumento de rastreio do mal-estar psicológico. O somatório dos 18 itens, organizados
em três subescalas (somatização, depressão e ansiedade, cada uma constituída por seis
itens) corresponde/visa apreender o nível geral de mal-estar psicológico dos indivíduos,
isto é, considerando os últimos sete dias, se experienciaram (ou não) 18 manifestações
de sintomatologia psicopatológica. Pode ser aplicado através da modalidade de
autorrelato ou em modo de entrevista, em grupo ou individualmente (cf. anexo 1)
(Canavarro et al., 2017).
É uma medida mais breve e recente de uma série de instrumentos desenvolvidos por
Derogatis para avaliar a sintomatologia psicopatológica, que inclui itens retirados dos
dois inventários mais longos, desenvolvidos pelo autor: o Brief Symptom Inventory
(BSI, 53 itens) e a Symptom Checklist-90-Revised (SCL-90-R, 90 itens) (cf. Canavarro
et al., 2017).
Estudos verificaram correlações elevadas entre as pontuações obtidas no BSI-18 e na
SCL-90-R, numa amostra da população geral, bem como entre o BSI-18 e o BSI,
atestando a validade do BSI-18, quando comparado com BSI e SCL-90-R, na avaliação
da sintomatologia psicopatológica (Canavarro et al., 2017).
A versatilidade do BSI-18 está ainda patente no facto de o instrumento ter
demonstrado ser fiável em amostras bastante diversificadas ao nível do estado de saúde
física e mental, como sejam doentes oncológicos, sobreviventes de doenças
oncológicas, doentes com patologia cardíaca e/ou disfunção renal, doentes psiquiátricos,
entre outros (Canavarro et al., 2017).

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Assim, as características psicométricas do BSI-18 oferecem segurança na sua
utilização, atestando-o como um bom questionário de avaliação de sintomas do foro
psicopatológico sendo um bom instrumento de rastreio da saúde mental, permitindo
distinguir os indivíduos que apresentam perturbações emocionais dos que não as
apresentam.
Contudo, o maior inconveniente da utilização do BSI-18 prende-se com eventuais
interpretações abusivas dos seus resultados. Um avaliador menos esclarecido poderá
sentir-se tentado a considerar os resultados não como indicadores de sintomatologia,
mas como fundamentos únicos para um diagnóstico. Neste sentido, é fundamental o
recurso a meios de avaliação complementares (e.g., Entrevista Clínica, ou no caso de
avaliação de candaidatos/as à avaliação - MMPI-2). (Canavarro et al., 2017).
De igual forma, torna-se relevante proceder, futuramente, ao estudo de algumas
características psicométricas do BSI-18 não avaliadas pela equipa de validação,
incluindo a sensibilidade à mudança, o valor preditivo positivo e o valor preditivo
negativo. Salientando-se, também, a importância de constituir uma amostra
representativa da população, para que se possam calcular os valores estandardizados,
estabelecer normas do BSI-18 para a população portuguesa (Canavarro et al., 2017) e
posteriormente a validação da mesma escala na população adotiva.

Auto-conceito
O auto-conceito pode ser definido como a perceção que o indivíduo tem de si
próprio e o conceito que, devido a isso, forma de si. O seu papel é crucial no
desenvolvimento cognitivo, social e profissional (Vaz Serra, 1988). Ajuda a
compreender aspetos importantes do comportamento humano, como a uniformidade, a
consciência e a coerência dos comportamentos observáveis, a noção de identidade e a
manutenção de certos estereótipos de ação na continuidade do tempo (Vaz Serra, 1988).
De entre os constituintes intrínsecos do autoconceito realça-se a auto-estima. Esta
deriva dos processos de avaliação que o indivíduo faz das suas qualidades,
desempenhos ou virtudes, ocupando um lugar proeminente na compreensão e na
explicação dos transtornos emocionais (Vaz Serra, 1988).
Estudos revelam ainda que uma influência específica das relações com os pais e um
bom auto-conceito está dependente de uma boa atmosfera familiar, em geral, e de uma
relação positiva com o pai e com a mãe, especificamente. Além disso, uma relação de
tolerância, de compreensão, de ajuda e de incentivo para vencer as dificuldades, por

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parte de ambos os progenitores, relacionam-se, igualmente, com um bom auto-conceito
(Ministério da Segurança Social, 2017; Vaz Serra, 1988).
Ao desempenhar um papel significativo nos diversos contextos de avaliação
psicológica, encontra-se intimamente relacionado com numerosos fenómenos de
natureza psicopatológica, nomeadamente distúrbios da personalidade, transtornos
neuróticos e/ou psicóticos (Vaz Serra, 1988).
Estes factos revelam a importância da avaliação do auto-conceito, através do
Inventário Clínico de Auto-conceito – ICAC (Vaz Serra, 1988). É uma escala de
avaliação de aspetos emocionais e sociais do auto-conceito, designada, em especial,
para a aplicação clínica. É constituído por 4 fatores principais (nomeadamente,
aceitação/rejeição social, autoeficácia, maturidade psicológica e
impulsividade/atividade) e 20 questões, cotadas de 1 a 5, em que uma pontuação alta
traduz um auto-conceito mais favorável (cf. anexo 1) (Vaz Serra, 1986).
Este instrumento, originalmente português, prende-se por ser um teste de aplicação
breve que facilita a colaboração e o bom preenchimento de todas as respostas, assim
como se relaciona com a autoestima (Vaz Serra, 1986).
Na metodologia da sua construção verificou-se que tem uma boa validade de
constructo, e ainda boa consistência interna e estabilidade temporal. Estudos mostram
que o instrumento apresenta correlações negativas e altamente significativas com a
ansiedade social, com sentimentos depressivos na população em geral ou com
perturbações emocionais em doentes psiquiátricos e com ansiedade, fobia, depressão e
somatização. Por outro lado, apresenta correlações positivas e significativas com uma
boa atmosfera familiar, em específico com uma relação positiva com o pai e com a mãe.
Estes factos revelam a importância dos fatores de educação na sua génese (Vaz Serra
1988).
Neste contexto poderá ainda complementar a interpretação dos resultados obtidos
nas escalas MMPI-2 e BSI 18, fornecendo um perfil abrangente de características
personalísticas e de psicopatologia.

Capacidades Parentais
Sendo a adoção um modelo de parentalidade devidamente avaliado e consagrado sob
laços afetivos, e havendo processos com candidatos/as já pais/mães (quer
biologicamente, quer pela via adotiva), faz todo o sentido a avaliação da relação que é

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mantida pelo/a candidato/a com o/a seu/sua filho/a (Ministério da Segurança Social,
2017).
Ao mesmo nível, durante várias décadas, ao estudar a relação entre pais e filhos, os
instrumentos de avaliação refletiram a existência de duas principais dimensões do
comportamento parental: uma relacionada com o comportamento parental de suporte,
aceitação e afeto, e outra relativa ao controlo (permissividade-restrividade) (Canavarro
& Pereira, 2007).
A avaliação dos estilos parentais educativos era realizada com recurso a diferentes
metodologias, desde a observação naturalista ou em laboratório, de interações entre
filhos e pais, até à avaliação da perceção do comportamento parental por parte de pais e
de crianças (Canavarro & Pereira, 2007).
Em específico, o EMBU-Pais tem como objetivo a avaliação da perceção dos
progenitores relativamente à frequência de ocorrência de determinadas práticas
educativas parentais na educação dos seus filhos, em três dimensões, nomeadamente
suporte, rejeição e sobreproteção (cf. anexo 1) (Canavarro & Pereira, 2007).
A utilização deste instrumento em processos de adoção poderá constituir uma fonte
adicional de informação que, utilizada conjuntamente com a perceção das crianças, por
exemplo, através de entrevista, poderá contribuir para uma visão mais rica das relações
entre pais e filhos e do comportamento parental (Canavarro & Pereira, 2007). Ao
centrarmo-nos no ponto de vista da criança, podemos ainda ter uma ideia mais clara da
real influência exercida pelos estilos educativos dos seus pais (Swedish National Board
of Health and Welfare, 2009).

Rastreio Cognitivo/Capacidade Intelectual


Atendendo à especificidade do processo adotivo, que permite a adoção a indivíduos
até aos 60 anos, torna-se imperativo o rastreio das suas capacidades neurocognitivas,
quando sejam detetadas ou haja suspeita de alterações cognitivas significativas/processo
de deterioração.
Neste âmbito, os testes neuropsicológicos de rastreio cognitivo breve continuam a
ser os métodos com maior potencial para a precocidade da deteção das condições
clínicas de declínio cognitivo. Um exemplo de instrumento de rastreio cognitivo é o
Montreal Cognitive Assessment (MoCA) (Freitas et al., 2011; Freitas, Alves, Simões, &
Santana, 2013).

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O MoCA é um instrumento de rastreio cognitivo sensível aos estádios mais ligeiros
de declínio e o mais adequado ao rastreio cognitivo da população com escolaridade
mais elevada. Quando comparado a outros instrumentos breves de avaliação das funções
cognitivas (ex., MMSE/Mini Mental State Examination), parece ser mais adequado, por
avaliar mais funções cognitivas e por apresentar itens com maior nível de
complexidade, salvaguardando a brevidade/rápida aplicação (Freitas, Simões, Martins,
Vilar & Santana, 2010) (cf. anexo 1).
Em Portugal, a necessidade de instrumentos objectivos para a avaliação
neuropsicológica do défice cognitivo é significativa e a versão final portuguesa do
MoCA resulta de um longo processo de adaptação transcultural, que procurou ser o
mais rigoroso possível, de forma a maximizar a sua adequação à realidade portuguesa
(Freitas et al., 2010, 2011).
Deste complexo processo resulta um método rápido e eficaz na distinção entre
desempenhos de adultos com envelhecimento cognitivo normal e adultos com défice
cognitivo (Freitas et al., 2010). É, assim, um teste adaptado para o rastreio cognitivo da
população portuguesa, com boas qualidades psicométricas, incluindo indicadores de
validade e utilidade diagnóstica (Freitas et al., 2011, 2013).
Por outro lado, pode ser relevante, em alguns casos, aceder ao perfil de capacidade
intelectual geral dos/as candidatos/as. Assim, a Escala de Inteligência de Wechsler para
adultos (WAIS-III) constitui-se como um instrumento de referência, ao permitir
indicadores de quociente intelectual geral verbal e realização, bem como indicadores
específicos de compreensão verbal, organização percetiva, velocidade de processamento
e memória de trabalho. As características da WAIS-III conferem-lhe excelentes
qualidades enquanto instrumento de avaliação do funcionamento intelectual, podendo
ser utilizada nos diagnósticos de deficiência mental e sobredotação, assim como no
diagnóstico diferencial de perturbações neurológicas e psiquiátricas, que afetem o
funcionamento mental (Wechsler, 2008).
É uma das escalas com mais estudos a nível mundial, que têm evidenciado as suas
boas características psicométricas, o mesmo ocorrendo nos estudos levados a cabo para
o contexto português (Wechsler, 2008).
Permite, também, informação particular no que concerne os subtestes, com utilidade
para a definição de funções/áreas preservadas e/ou afetadas de funcionamento
cognitivo. Neste âmbito, ganha particular relevância o subteste de Vocabulário, ao
constituir-se como uma boa medida de inteligência geral verbal e uma boa medida de

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funcionamento pré-mórbido. Pode, portanto, ser utilizado como parâmetro único quando
se pretende uma medida mais geral e rápida de perfil de funcionamento (Wechsler,
2008).

Processo geral de avaliação de candidatos/as à adoção


Para além da proposta dos protocolos específicos e alargado de avaliação
psicológica, no contexto de candidaturas à adoção, realça-se, ainda, a importância de
assegurar de forma sistemática a presença do psicólogo forense nas formações
denominadas como Fase A, Fase B e Fase C, o que não acontece nem está previsto,
atualmente, segundo as guidelines (Ministério da Segurança Social, 2017).
Esta possibilidade permitiria uma perspetiva mais abrangente do processo avaliativo,
de carácter multidisciplinar (integrando o psicólogo forense) e facilitadora da tomada de
decisão no âmbito dos processos de adoção. Esta é uma metodologia seguida por
exemplo em contexto Holandês (Noordegraaf et al., 2010).
Ainda neste âmbito, seria importante assegurar, também a presença sistemática do
psicólogo forense na realização da entrevista psicossocial. Este é um procedimento
previsto no Manual dos Organismos da Segurança Social (2017), mas que nem sempre
é aplicado. A sua presença/atuação permitiria a observação do comportamento verbal e
não-verbal e a eficácia do processo, ao ser possível o despiste de fatores avaliativos
cruciais inerentes e/ou de previsão de situações inadaptativas, bem como o
enquadramento da aplicação dos instrumentos psicométricos para a avaliação dos cinco
domínios apresentados previamente, e/ou dos instrumentos complementares sempre que
exigido ou necessário.
Obviamente, para além da importância da sistematização e uniformização do
processo avaliativo, este deve ser também perspetivado como singular (cada caso é um
caso) e interativo, através do estabelecimento de uma relação dinâmica, entre
candidatos/as e equipa, à base da compreensão, sem prejuízo do rigor e objetividade que
este tipo de avaliação exige. Nesse sentido, o delineamento de um plano pensado entre
as partes traria mais flexibilidade e confiança ao processo/resultados. Ou seja, antes de
iniciar o processo de avaliação, seria importante definir um plano de avaliação pensado
não só pela equipa, mas com o auxílio dos/as candidatos/as, sobre as suas expectativas
para a avaliação e o que esperam alcançar com a mesma, salvaguardando no entanto os
domínios base a avaliar (Nichting, 2016; Swedish National Board of Health and
Welfare, 2009).

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Não podemos esquecer que ainda que seja um processo que vise garantir o perfil
adequado da parentalidade adotiva, tem como fim último assegurar o superior interesse
da criança num quadro mais amplo de desenvolvimento desta, de desenvolvimento das
competências parentais e, em última análise, para aquilo que será a vivências dos novos
papéis em contexto real da vida destas pessoas (Swedish National Board of Health and
Welfare, 2009).
É imperativo a devida formação dos técnicos envolvidos no processo. Técnicos
conscientes, sensíveis a questões primordiais do comportamento humano e cooperativos
no trabalho em equipa, aumentam a probabilidade de alcançar uma tomada de decisão
mais consistente, precisa e fundamentada.
Com o intuito de potenciar adoções mais bem-sucedidas, através de uma avaliação
completa e bem fundamentada (Ministério da Segurança Social, 2017), evitando
igualmente eventuais contestações e/ou devoluções, será também necessário
rever/considerar os recursos económicos e os timings disponíveis pelas equipas, mas
sem prejuízo do processo de avaliação integrativo.

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Conclusão
Com este estudo, através da leitura bibliográfica e da análise de diretrizes nacionais
e internacionais, foi percetível que, embora não haja uniformidade na forma de alcançar
uma decisão, está pensado o superior interesse da criança como princípio primordial
destes processos/avaliações.
É notória uma escassez de quadros teóricos empiricamente sustentados, falta de
metodologias construídas especificamente para avaliar as dimensões diretamente
implicadas na determinação das capacidades parentais em casos adotivos e a
heterogeneidade dos processos avaliativos, bem como a inexistência de um protocolo de
avaliação validado e pré-definido.
Apesar destas fragilidades, foi possível identificar domínios/dimensões
imprescindíveis à avaliação psicológica de candidatos/as à adoção, nomeadamente a
motivação para a parentalidade, estilos educativos, vinculação, personalidade e
desejabilidade social. No entanto, a sua operacionalização em instrumentos
psicométricos de avaliação é por norma variável e/ou não considerada (cf. Adcock,
2010; Barbosa-Ducharne et al., 2014; Ferreira et al., 2017; Lind & Lindgren, 2017;
Machado et al., 2015; Ministério da Segurança Social, 2017; Nichting et al., 2016;
Noordegraaf et al., 2010; Peixoto & Ribeiro, 2007; Swedish National Board of Health
and Welfare, 2009).
O Manual dos Organismos da Segurança Social veio contribuir para a melhoria do
processo ao conter informação genérica sobre a adoção e ao designar os procedimentos
e os circuitos inerentes às diversas fases do processo. Todavia, prima pela falta de
delineamento de um protocolo de avaliação, propondo apenas a aplicação de um só
instrumento de avaliação, “a equipa deve administrar um ou mais testes psicológicos,
consoante os domínios a avaliar - personalidade, vinculação, capacidade parental,
sintomatologia/psicopatologia” (Ministério da Segurança Social, 2017, p. 38).
Tendo presente o objetivo do nosso estudo, visámos definir uma proposta de
protocolo de avaliação psicológica para candidatos/as à adoção de forma a assegurar a
estandardização deste processo em contexto português. O protocolo proposto inclui os
seguintes instrumentos: Escala de Motivação para a Parentalidade, EMBU Memórias de
Infância, Escala de Vinculação do Adulto, MMPI-2 e EDS-20.
Sempre que sejam despistadas situações/contextos de eventuais perfis
psicopatológicos, baixo auto-conceito, candidaturas já com filhos ou em visíveis
situações de comprometimento neurológico e/ou cognitivo, sugere-se a aplicação

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adicional dos instrumentos BSI-18, ICAC, EMBU Pais, MoCA e WAIS-III e/ou
Subteste de Vocabulário.
Trata-se de uma proposta ambiciosa, considerando que, apesar das evidências da
validade destes instrumentos para os contextos clínicos, nomeadamente forense, e de os
mesmos permitirem traçar um perfil de funcionamento nos cinco domínios ou
dimensões identificados como importantes, exige-se ainda a elaboração de estudos
específicos para a população de candidatos/as à adoção.
Mas, mais que passar uma bateria de testes, previamente validados para a população
e mesmo que com boas qualidades psicométricas, também a entrevista clínica tem
particular importância. No respeitante a esta técnica, consideramos haver informação já
bem desenvolvida e fundamentada, conferindo valor aos processos que a integram
(Ministério da Segurança Social, 2017; Souza et al., 2017). No entanto, um processo
estandardizado sustentará de forma fundamentada as tomadas de decisão e evitará
eventuais contestações e/ou devoluções (Nichting et al., 2016)
Também o papel do psicólogo forense na equipa denota real importância. Para além
da definição dos domínios/dimensões e da aplicação de um protocolo robusto, seria
igualmente importante pensar um processo mais flexível, onde candidatos/as e equipa
interagissem entre si, por forma a tornar possível um reajustamento avaliativo.
Ressaltando, igualmente, a necessidade de investimento de formação profissional pelos
técnicos da área da psicologia.
Contudo, apesar das suas fragilidades, Portugal constitui um bom exemplo. Pois, ao
contrário da maioria dos países aqui estudados, que aposta em avaliações com ênfase
em formações de particularidade psicossocial e com equipas constituídas apenas por
assistentes sociais, a nossa realidade destaca-se pela obrigatoriedade de equipas
multidisciplinares com técnicos da área da psicologia, dando alguma relevância, ainda
que pouca, à avaliação psicológica e aplicação de instrumentos.
Por fim, para além do objetivo aqui apresentado, havia sido pensado um
questionário de reflexão para candidatos/as em avaliação e pais adotivos (isto é, que
obtiveram parecer positivo no processo) sobre o processo adotivo, bem como
explorar/estudar a perceção dos profissionais envolvidos, nomeadamente, os técnicos de
psicologia. O referido questionário foi elaborado, contudo, por contingências várias,
externas ao nosso controlo, não foi possível a sua aplicação. Com isto, a presente
dissertação vem abrir portas a novos estudos sobre a viabilidade da aplicação do
protocolo aqui proposto, sua validação sistemática em contexto de adopção, bem como
a possibilidade de implementar o questionário elaborado, alargando a compreensão
desta temática em futuras investigações.

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Filipa Daniela Domingues Silva ([email protected]) 2020
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Anexos
Anexo 1.

Síntese de apoio ao Protocolo de Avaliação proposto para Candidatos/as à adoção

No âmbito da definição dos cinco domínios/dimensões apresentadas nesta dissertação,


bem como da proposta de protocolo elaborada, segue-se uma síntese de
apoio/complemento ao Protocolo de Avaliação proposto para Candidatos/as à adoção.

Motivação para a adoção


Mais do que ter recursos materiais e financeiros adequados ao desenvolvimento de
uma criança, a motivação para a adoção deve estar ancorada no desejo único de tornar-
se pai ou mãe (Ministério da Segurança Social, 2017). A criança adotada não deve ser
vista como a resolução de conflitos familiares, para resolver o luto de uma infertilidade,
servir para fazer companhia na velhice ou ser adotada por altruísmo (Almeida, 2015;
Guedes et al., 2011).

Escala de Motivações para a Parentalidade (EMP) (Guedes et al., 2015)


A Escala de Motivação para a Parentalidade é constituída por 47 itens, avaliados
numa escala tipo Likert de 5 pontos (1 - nada a 5 - completamente) e divididos em duas
subescalas, nomeadamente motivações positivas para a parentalidade (26 itens) e
motivações negativas para a parentalidade (21 itens) (Guedes et al., 2015).
Na subescala motivações positivas para a parentalidade, os participantes devem
indicar em que medida valorizam cada uma das razões favoráveis à parentalidade e na
subescala motivações negativas para a parentalidade, devem indicar em que medida
valorizam cada uma das razões desfavoráveis a tornar-se pai ou mãe. A primeira é
constituída por 4 fatores, nomeadamente aspetos socioeconómicos, realização pessoal,
continuidade e relação conjugal; e, a segunda, por 5 fatores, nomeadamente exigência
da parentalidade e imaturidade, preocupação social e ecológica, stress conjugal,
problemas financeiros e restrições económicas, e sofrimento físico e preocupação com a
imagem corporal (Guedes et al., 2011, 2015).

Contributos para a definição de um protocolo de avaliação psicológica para candidatos/as à adoção


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Estilos educativos
Um dos métodos que permite abordar empiricamente a parentalidade é o estudo dos
estilos educativos parentais (Barbosa-Ducharne et al., 2014; Brito, 2013; Bydlowski,
2010; Machado et al., 2015). Os estilos educativos são um conceito associado a
estratégias direcionadas e comunicadas à criança, usadas para incentivar a ocorrência de
comportamentos desejados e validados pelos pais, de forma a criar um clima emocional
positivo. Consideram questões de poder, hierarquia e apoio emocional (Morgado et al.,
2013).

EMBU – Memórias de Infância (Canavarro, 1996, 1999)


O EMBU – Memórias de Infância avalia as memórias que os adultos possuem sobre
as práticas educativas ocorridas durante a sua infância e adolescência, em relação ao pai
e à mãe. Validado para a população portuguesa por Canavarro (1996), é um instrumento
de auto-relato, composto por 23 itens e avaliado numa escala de resposta tipo Likert de
4 pontos, que varia entre “Não, nunca” e “Sim, a maior parte do tempo” (Canavarro,
1996, 1999).
Os 23 itens agrupam-se em três dimensões, nomeadamente suporte emocional,
rejeição e sobreproteção. A primeira dimensão, suporte emocional, representa o
suporte, a atenção, o ajudar sem ser intrusivo e o respeito pela identidade. Dois
exemplos de itens desta dimensão são: “Os meus pais elogiavam-me.” ou “Os meus pais
mostravam com gestos e palavras que gostavam de mim”. A medida deste factor é
obtida pelo somatório dos 7 itens que o compõem, separadamente para o pai e para a
mãe.
A rejeição refere-se aos castigos físicos, rejeição do sujeito com uma identidade
única, falta de respeito, ridicularização e criticismo frente a outras pessoas. Dois
exemplos de itens que compõem esta escala são: “Os meus pais eram severos ou
zangavam-se comigo sem me explicarem porquê.” ou “Os meus pais deram-me mais
castigos físicos do que eu merecia.” A medida desta dimensão para a relação com a mãe
obtém-se através do somatório de 9 itens, mais um que os considerados na relação com
o pai (8 itens); isto porque o item 21 (“Assegurar a descendência da minha família.”)
não apresenta níveis de consistência interna considerados mínimos e não contribui para
nenhum factor com um peso significativo, no que concerne ao pai (Canavarro, 1996).
Por último, a medida de sobreproteção é obtida através do somatório de 7 itens, quer
para a mãe, quer para o pai. Este factor reflete “o comportamento parental caracterizado

Contributos para a definição de um protocolo de avaliação psicológica para candidatos/as à adoção


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por proteção (excessiva) de experiências indutoras de stress e adversidades, um elevado
grau de intrusão e tentativa de conhecer todas as actividades dos filhos; elevados
padrões de realização em determinadas áreas (...) e imposição de regras rígidas às quais
é exigida estrita obediência” (Canavarro, 1999, p. 237). Como exemplo de itens que
compõem esta escala temos: “Quando chegava a casa tinha de contar tudo o que tinha
feito.” ou “ Desejava que os meus pais se preocupassem menos com o que eu fazia”.
Ao nível da estrutura fatorial da versão portuguesa, obtida através de análise de
componentes principais, a EMP mostrou níveis satisfatórios de variância intercultural e
veio replicar a estrutura da versão original composta por três fatores (Canavarro, 1999).
Também os níveis de consistência interna são semelhantes aos obtidos na versão
original e aceitáveis para fins de investigação. As três dimensões do instrumento
apresentam uma estabilidade temporal adequada (Fidalgo, 2009).

Vinculação
Definida como uma relação interativa emocional profunda e duradoura, e
desenvolvida em complementaridade entre dois elementos, um que solicita cuidados e
conforto e outro capaz de compreender e responder adequadamente às solicitações
recebidas através da prestação de cuidados físicos e sobretudo psicológicos, a figura de
vinculação deverá ter continuidade e consistência na vida da criança (Bowlby, 1970).
Isto possibilitará desenvolver um sentimento de confiança na disponibilidade da figura
de vinculação - base de uma vinculação segura, fundamental ao seu desenvolvimento
harmonioso e facilitador do funcionamento e competência do indivíduo com a
sociedade (Lavado, 2015; Ministério da Segurança Social 2017).
Estudos sugerem que pais carinhosos, disponíveis, atentos e capazes de responder às
necessidades dos filhos, contribuem para a formação de dimensões associadas a
vinculação segura na idade adulta (Canavarro, 1999).
A qualidade da vinculação é o resultado das interações entre as características da
criança (e.g., temperamento e desenvolvimento cognitivo), as características da figura
materna (e.g., representação da vinculação do adulto e psicopatologia) e da qualidade
dos cuidados (e.g., disponibilidade emocional e sensibilidade); e de fatores do meio, de
influência mais indireta (e.g., o apoio social recebido pela figura de vinculação, a
qualidade da relação de casal e o nível socioeconómico) (Lavado, 2015).

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Escala de Vinculação do Adulto (EVA) (Canavarro, 1997; Canavarro et al., 2006).
A Escala de Vinculação do Adulto avalia a vinculação no adulto, em 18 itens.
Condizente com a Teoria da Vinculação do Adulto (Bowlby, 1970), está subdividida em
três dimensões: ansiedade, contacto com a proximidade e confiança nos outros. A
primeira dimensão, ansiedade, define o grau de ansiedade que o indivíduo sente em
relação a questões interpessoais como o medo do abandono ou de não ser bem querido;
o contacto com a proximidade refere-se ao grau em que o indivíduo se sente confortável
com a proximidade e intimidade; e por último, a confiança nos outros avalia o grau de
confiança nos outros e na sua disponibilidade, quando necessária (Canavarro, 1997;
Canavarro et al., 2006).
A Escala foi validada para a população portuguesa por Canavarro (1997). Os
primeiros estudos psicométricos realizados, foram compostos por uma amostra de 192
indivíduos (150 mulheres e 42 homens), maioritariamente casados ou a viver
maritalmente, e com um grau de instrução correspondente a um curso médio ou à
frequência universitária (Canavarro et al., 2006).
Posteriormente, à amostra utilizada juntaram-se estudos com população geral e
clínica. Os mesmos mostraram boas qualidades psicométricas (Canavarro et al., 2006).

Personalidade
A atenção que é dada ao estudo da personalidade no âmbito da avaliação psicológica
tem sido cada vez maior. Vista como algo específico e único de cada indivíduo, que
permite diferenciá-lo dos outros, dá um sentido de identidade e continuidade às
significações e atitudes das pessoas (Mesquita, 2012). Assim, a avaliação da
personalidade permite identificar as capacidades e limitações de um indivíduo, as suas
preocupações e necessidades e ainda os seus estilos de coping e atitudes perante ele
próprio e os outros (Gonçalves, 2011; Lima & Simões, 2000, 2003).
Do ponto de vista científico, a avaliação da personalidade, ao consistir num método
que permite encontrar padrões sociais no comportamento de um indivíduo através da
distinção entre comportamentos situacionais e comportamentos duradouros, constitui
uma base segura para apoiar e fundamentar tomas de decisão em diversas situações e
contextos. No contexto forense, os objetivos passam por avaliar capacidades para
assumir determinados direitos e deveres, avaliar competências, determinar
responsabilidade criminal e ainda avaliar o grau de perigosidade do indivíduo
(Mesquita, 2012).

Contributos para a definição de um protocolo de avaliação psicológica para candidatos/as à adoção


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Minnesota Multiphasic Personality Inventory-2 (MMPI2) (Silva et al., 2006)
O MMPI-2 é um dos instrumentos psicológicos com mais estudos e dos mais
utilizados na avaliação, tendo sido adaptado para diversas culturas e traduzido em
diversas línguas. Em Portugal o instrumento encontra-se ainda em validação
(Gonçalves, 2011; Silva et al., 2006).
A sua pertinência prende-se com o facto de permitir analisar pensamentos,
comportamentos, crenças e problemas do indivíduo, bem como as suas atitudes de
resposta face ao teste, dando-nos assim a conhecer aspetos da personalidade do
indivíduo, do seu funcionamento interpessoal, níveis de ajustamento e ainda sintomas
específicos que podem constituir indicadores de psicopatologia (Gonçalves, 2011;
Mesquita, 2012; Silva et al., 2006).
Construído com base nos critérios do DSM-V, ao avaliar a personalidade e a
psicopatologia em 567 itens, de resposta Verdadeiro ou Falso, permite distinguir um
determinado grupo critério, do grupo normativo. A sua construção confere-lhe uma
importante validade de critério (Gonçalves, 2011; Mesquita, 2012; Nichting, 2016;
Silva et al., 2006). Apesar disso, existem outras características que fazem do MMPI-2
uma opção importante no âmbito da avaliação: a facilidade de administração e cotação,
as suas qualidades psicométricas e a relação custo-benefício, na predição de
comportamentos e problemas (Butcher & Beutler, 2003 como citado em Mesquita,
2012).
Atualmente a sua utilidade vai muito além do âmbito clínico, estendendo-se também
ao contexto organizacional e forense. É utilizado, por exemplo, em seleção profissional,
julgamentos em tribunais, determinação de responsabilidade criminal, avaliação de
riscos, atribuição de poder paternal, entre outros (Mesquita, 2012).
Contudo, ao ser um instrumento de autorrelato, a informação recolhida é sempre
dada em função da forma como o indivíduo se perceciona e da imagem que quer
transmitir de si, podendo a informação obtida não refletir uma imagem real do
indivíduo. No entanto, atendendo a esta possibilidade, foram construídas escalas de
validade que permitem determinar quando é que o indivíduo está a tentar dar uma
melhor ou pior imagem de si mesmo (Mesquita, 2012; Silva et al., 2006).
A interpretação dos resultados deve, de um modo geral, atender às pontuações
obtidas por escala (nível dimensional), às elevações relativas das diferentes escalas
(nível configuracional) e às relações entre as elevações e as características
sociodemográficas e clínicas dos respondentes (nível contextual).

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Desejabilidade social
A desejabilidade social refere-se à tendência das pessoas para atribuírem a si
próprias atitudes e/ou comportamentos com valores socialmente desejáveis e rejeitarem
em si mesmas presença de atitudes e/ou comportamentos com valores socialmente
indesejáveis (Almiro et al., 2017; Lind & Lindgren, 2017), quando respondem,
especialmente, a questionários de personalidade e escalas de atitudes (Almiro et al.,
2017).
Nos diversos contextos de avaliação psicológica, e em especial no âmbito da
avaliação de candidaturas à adoção, é notável alguma tendência para respostas
distorcidas, aos itens dos questionários/instrumentos (Ministério da Segurança Social,
2017). As respostas tendem a ir ao encontro do que os candidatos/as consideram ser o
mais desejável, de forma a satisfazerem a sua necessidade de aprovação e mostrarem
que os seus comportamentos estão em conformidade com uma boa parentalidade
(Almiro et al., 2017).

Escala de Desejabilidade Social de 20 Itens (EDS-20) (Almiro et al., 2017)


A EDS-20 é um instrumento de autorrelato que avalia o constructo de desejabilidade
social e é uma escala unidimensional de resposta dicotómica (sim/não), constituída por
20 itens. Pode ser aplicada a sujeitos com mais de 16 anos, para fins de investigação e
avaliação psicológica em contextos clínicos e forenses (Almiro et al., 2017).
Apesar de carecer de estudos de precisão teste-reteste, que permitam analisar a
estabilidade temporal dos resultados obtidos na EDS-20, esta é uma escala muito útil na
apreciação do nível de sinceridade das respostas dadas pelos sujeitos na avaliação do
seu comportamento, do seu perfil de personalidade e das suas atitudes pessoais. Trata-se
de um instrumento de rápida e fácil aplicação, que possui muitas potencialidades na
medição da desejabilidade social e que pode ser integrado nos protocolos de avaliação
psicológica, funcionando como uma escala de validade para detetar o seu efeito no
enviesamento das respostas (Almiro et al., 2017).

Perfil de psicopatologia
O rastreio do mal-estar psicológico denota um papel importante na melhoria da
qualidade de vida e dos cuidados de saúde aos indivíduos (Derogatis, 2001 como citado
em Canavarro et al., 2017). Neste âmbito, e apontado como fator de risco à
parentalidade adotiva, torna-se relevante a avaliação de eventuais vulnerabilidades

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psicopatológicas, que possa, eventualmente, constituir-se como entrave para atingir
objetivos ligados à promoção do superior interesse da criança e a um adoção de sucesso
(Ministério da Segurança Social, 2017; Peixoto & Ribeiro, 2007; Souza et al., 2017).

Brief Symptom Inventory 18 (BSI – 18) (Canavarro et al., 2017)


O Brief Symptom Inventory 18 (BSI-18) é um instrumento de rastreio do mal-estar
psicológico, composto por 18 itens, avaliados numa escala tipo Likert de 4 pontos (0-
Nada a 4 – Extremamente). O somatório dos 18 itens permite obter o Índice de
Gravidade Global (IGG), que corresponde ao nível geral de mal-estar psicológico do
indivíduo (Canavarro et al., 2017).
O BSI-18 tem a vantagem de ser uma medida de rastreio fácil de preencher e cotar,
avaliando os três sintomas psicopatológicos mais frequentes (Wiesner et al., 2010 como
citado em Canavarro et al., 2017). Nomeadamente, a somatização, depressão e
ansiedade – cada uma constituída por 6 itens. A Somatização avalia o mal-estar
associado a manifestações dos sistemas regulados automaticamente (e.g.,
cardiovascular, gastrointestinal), a Depressão foca os sintomas nucleares das
perturbações depressivas (e.g., humor disfórico, anedonia, desesperança, ideação
suicida) e a Ansiedade inclui sintomas indicativos de estados de pânico (e.g.,
nervosismo, tensão, agitação motora, apreensão) (Canavarro et al., 2017).
Com efeito, na seleção das subescalas a incluir no BSI-18, Derogatis (2001 como
citado em Canavarro et al., 2017) teve em conta que a maioria das perturbações
psiquiátricas na população geral e clínica é de natureza ansiosa e/ou depressiva e que as
perturbações psiquiátricas menos prevalentes (e.g., esquizofrenia) se associam com
frequência a sintomas de natureza depressiva, ansiosa e somatoforme.
Assim, o BSI -18 constitui um questionário passível de ser utilizado em contextos
clínicos e de investigação, sempre que se pretenda que a avaliação seja rápida e quando
o foco dos profissionais incide nas manifestações mais prevalentes das perturbações
psicológicas. Nota-se, no entanto, que a utilização exclusiva do inventário não permite a
formulação de um diagnóstico (Canavarro et al., 2017).
A estrutura fatorial do BSI-18 tem sido testada em diversos estudos, por via
exploratória e confirmatória. Em Portugal, estudos realizados por Canavarro e
colaboradores (2017), mostraram bons índices psicométricos.

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Auto-conceito
O auto-conceito pode ser definido como a perceção que o indivíduo tem de si
próprio e o conceito que, devido a isso, forma de si. O seu papel é crucial no
desenvolvimento cognitivo, social e profissional. Ajuda a compreender aspetos
importantes do comportamento humano, como a uniformidade, a consciência e a
coerência dos comportamentos observáveis, a noção de identidade e a manutenção de
certos estereótipos de ação na continuidade do tempo (Vaz Serra, 1988).
De entre os constituintes intrínsecos do autoconceito realça-se a auto-estima. Esta
deriva dos processos de avaliação que o indivíduo faz das suas qualidades,
desempenhos ou virtudes, ocupando um lugar proeminente na compreensão e na
explicação dos transtornos emocionais (Vaz Serra, 1988).
Estudos revelam ainda que uma influência específica das relações com os pais e um
bom auto-conceito, está dependente de uma boa atmosfera familiar, em geral, e de uma
relação positiva com o pai e com a mãe. Além disso, uma relação de tolerância, de
compreensão, de ajuda e de incentivo para vencer as dificuldades, por parte de ambos os
progenitores relacionam-se, igualmente, com um bom auto-conceito. Estes factos
revelam a importância dos fatores de educação na sua génese (Vaz Serra, 1988).
Ao desempenhar um papel significativo nos diversos contextos de avaliação
psicológica, encontra-se intimamente relacionado com numerosos fenómenos de
natureza psicopatológica, nomeadamente distúrbios da personalidade, transtornos
neuróticos ou psicóticos (Vaz Serra, 1988).

Inventário Clínico de Auto-conceito (ICAC) (Vaz Serra, 1986)


O ICAC é uma escala de avaliação de aspetos emocionais e sociais do auto-conceito,
designada, em especial, para a aplicação clínica. É constituído por 4 fatores principais
(nomeadamente, aceitação/rejeição social, autoeficácia, maturidade psicológica e
impulsividade/atividade) e 20 questões, que podem ser cotadas de 1 a 5 - uma
pontuação alta traduz um auto-conceito mais favorável (Vaz Serra, 1986).
Foi elaborada de forma a aplicar a sujeitos com idade superior a 15 anos e é
particularmente indicada para indivíduos com transtornos emocionais. Este instrumento,
originalmente português, prende-se por ser um teste de aplicação breve que facilita a
colaboração e o bom preenchimento de todas as respostas (Vaz Serra, 1986).
Na metodologia da sua construção verificou-se que tem uma boa validade de
constructo, uma boa consistência interna e estabilidade temporal (Vaz Serra, 1986).

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Candidaturas já com filhos
Durante várias décadas, ao estudar a relação entre pais e filhos, os instrumentos de
avaliação refletiram a existência de duas principais dimensões do comportamento
parental: uma relacionada com o comportamento parental de suporte (aceitação e
afeto), e outra relativa ao controlo (permissividade-restrividade) (Canavarro & Pereira,
2007). A avaliação dos estilos parentais educativos era realizada com recurso a
diferentes metodologias, desde a observação naturalista ou em laboratório de interações
entre filhos e pais, até à avaliação da perceção do comportamento parental por parte de
pais e de crianças (Canavarro & Pereira, 2007).

EMBU-Pais (Canavarro, 2007)


O EMBU é um dos instrumentos de auto-relato mais utilizados na avaliação dos
estilos parentais educativos, validado para a população portuguesa por Canavarro (1996,
1999). A escala conta no total com 42 itens, avaliados numa escala de tipo Likert, de 4
pontos, que vai desde “Não, nunca” a “Sim, sempre”. Os itens são aplicados por escrito,
de forma individual ou coletivamente, e avaliam três dimensões: suporte emocional (14
itens), rejeição (17 itens) e tentativa de controlo (11 itens) (Canavarro & Pereira, 2007).
A primeira dimensão, que designam por suporte, é constituída por itens que
traduzem a expressão verbal e física de suporte afetivo por parte dos pais; a dimensão
rejeição é descrita como os comportamentos dos pais que visam modificar a vontade
dos filhos e que são sentidos por estes como uma rejeição de si próprio enquanto
individuo e a dimensão sobreproteção é constituída por itens que descrevem tentativas
dos pais em controlar o comportamento das crianças, manifestações de exigência em
relação aos filhos, e de uma grande preocupação acerca do bem-estar da criança
(Canavarro & Pereira, 2007).
A utilização deste instrumento em avaliação de candidatos/as à adoção já com filhos,
poderá constituir uma fonte adicional de informação que, utilizada conjuntamente com a
perceção das crianças, por exemplo através de entrevista, poderá contribuir para uma
visão mais rica das relações entre pais e filhos e do comportamento parental (Canavarro
& Pereira, 2007). Ao nos centrarmos no ponto de vista da criança, poderemos ter uma
ideia mais clara da real influência exercida pelos estilos educativos dos seus pais (Social
Municipal Swedish National, 2009).

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Rastreio Cognitivo/ Capacidade Intelectual

MoCA (Freitas et al., 2011)


O MoCA foi concebido como um instrumento de rastreio breve da disfunção
cognitiva ligeira. Este instrumento, que avalia vários domínios cognitivos,
nomeadamente função executiva, capacidade visuo-espacial, memória, atenção,
concentração e memória de trabalho, linguagem e orientação tempo e espacial, tem uma
pontuação máxima de 30 pontos, tendo a sua aplicabilidade uma duração entre 10 a 15
minutos (Freitas et al., 2010).
A Versão Final Portuguesa do MoCA resulta de um longo processo de adaptação
transcultural, que procurou ser o mais rigoroso possível, de forma a maximizar a sua
adequação à realidade portuguesa. Os estudos com a população portuguesa demonstram
que o MoCA possui boas qualidades psicométricas, incluindo indicadores de validade e
utilidade diagnóstica, discriminando os desempenhos de indivíduos cognitivamente
saudáveis ou com envelhecimento normativo dos quadros clínicos de disfunção
cognitiva ligeira e moderada (Freitas et al., 2010).

WAIS – III e/ou Subteste de Vocabulário da WAIS III (Wechsler, 2008)


Elaborada para a avaliação das capacidades cognitivas, a Escala de Inteligência de
Wechsler para Adultos III é um teste de inteligência geral, com muitos estudos a nível
mundial. As revisões das Escalas Wechsler, realizadas ao longo de décadas, tiveram
como propósito aprimorá-las tanto do ponto de vista teórico quanto prático. As revisões
proporcionaram não só a atualização de normas, bem como a inclusão de novos
subtestes, substituição de itens obsoletos, alterações nas regras de pontuação e obtenção
de novos resultados (Wechsler, 2008).
Atualmente, a escala é composta de 14 subtestes, avalia três escalas e quatro índices,
nomeadamente, QI Verbal, QI de Realização, QI Total, Índice de Compreensão Verbal,
Índice de Organização Percetiva, Índice de Memória de Trabalho e de Velocidade de
Processamento (Wechsler, 2008).
O tempo de aplicação permanece em torno de 90 minutos (Wechsler, 2008).
Ao nível do estudo de candidaturas à adoção, com evidentes situações de
capacidades intelectuais deficientes, parece pertinente, sobretudo, a aplicação do
subteste de vocabulário, enquanto medida de inteligência geral verbal e medida de
funcionamento pré-mórbido (Wechsler, 2008).

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