download

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 7

ARTIGOS ORIGINAIS

Separação inevitável do binômio mãe-bebê no pós-parto imediato na


perspectiva materna

Bruna Figueiredo Manzo 1


Anna Caroline Leite Costa 2
Miriã Diniz Silva 3
Danúbia Mariane Barbosa Jardim 4

Laiana Otto da Costa 5

1-3 Departamento de Enfermagem Materno Infantil e Saúde Pública. Escola de Enfermagem. Universidade Federal de Minas Gerais. Av. Prof. Alfredo Balena, 190. Santa
Efigênia. Belo Horizonte, MG, Brasil. CEP: 30.130-100. E-mail:[email protected]
4,5 Hospital Sofia Feldman. Belo Horizonte, MG, Brasil.

Resumo

Objetivos: compreender o processo de separação inevitável da mãe e o bebê no pós-parto


imediato na perspectiva materna.
Métodos: trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, desenvolvido por meio de
entrevista com 15 mães que foram separadas de seus filhos no pós-parto, em uma mater-
nidade pública em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Foi usada a análise de conteúdo
para interpretação dos dados.
Resultados: evidenciou-se por meio das categorias “Sentimentos e percepções maternas
frente à separação do filho no pós parto” e “Percepção das mulheres sobre a atuação dos
profissionais de saúde no momento da separação e a presença de seus acompanhantes” as
contradições de sentimentos e desafios vivenciados pelas mães diante da separação, como a
alegria pelo nascimento do filho seguido da angústia por ter que se separar desse e o medo
de perde-lo. O trabalho da equipe de saúde assume um papel relevante para o enfrentamento
das dificuldades e superação desses desafios.
Conclusão: percebe-se a necessidade de avançar na dimensão cuidadora das ações em
saúde, a fim de oferecer um atendimento direcionado às reais necessidades dessas mães e
minorar impactos negativos dessa separação.
Palavras-chave Enfermagem obstétrica, Relações materno-fetais, Parto humanizado,
Complicações do trabalho de parto

Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative http://dx.doi.org/10.1590/1806-93042018000300004
Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer

meio, sem restrições, desde que o trabalho original seja corretamente citado. Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018 509
Manzo BF et al.

Introdução intra e extrauterino.4,7


Nesse sentindo, o Ministério da Saúde (MS), ao
A gestação e o nascimento de um filho são eventos constituir diretrizes para a organização da atenção
sociais que permeiam a vivência reprodutiva da integral e humanizada ao recém-nascido (RN) no
mulher, e que resulta em um momento marcante na Sistema Único de Saúde (SUS), preconizou que o
vida dos que participam desse contexto. Essa expe- contato pele-a-pele imediato e contínuo deve ser
riência é composta por alterações físicas, psíquicas, assegurado em todos os casos de RN saudável. 5
econômicas e sociais que não se restringem apenas Porém, é preciso enfatizar que ainda assim, algumas
ao momento do parto, mas que também envolvem crianças que nascem saudáveis têm sofrido a sepa-
legados inter e transgeracionais, o parceiro, a família ração das suas mães, imposta sem justificativas, por
e a comunidade.1,2 profissionais que as assistem, contrariando a lógica
Sob o ponto de vista da mãe que dá à luz, o da atenção integral e humanizada.
período de pós-parto imediato é considerado Em situações especiais de complicações
precursor do apego. Assim, é a primeira oportu- maternas e neonatais, oriundas de uma gestação de
nidade da mãe ser sensibilizada pelo seu bebê e alto risco ou não, pode ser constatada uma vitalidade
iniciar o exercício social da maternidade, ocorrendo prejudicada do bebê. Esse fato pode, por sua vez,
uma espécie de encerramento do processo gesta- impedir a realização do contato pele-a-pele e inter-
cional.3 ferir no protagonismo da mulher como parturiente.8
No puerpério, a mulher vivencia as adaptações Nessa situação, habitualmente o recém-nascido é
psico-orgânicas. Em alguns casos, as experiê ncias separado da mãe para ser avaliado e, se necessário,
negativas e instabilidades emocionais vivenciadas ser submetido à intervenções por parte da equipe de
por ela, podem contribuir para o desenvolvimento de saúde. Este tipo de separação é o foco deste estudo.
situaço\es patolo]gicas como, por exemplo, depressão Nos casos em que não é possível oferecer o
puerperal, não aceitação do filho e distúrbios de contato pele-a-pele logo após o parto, é importante
auto-imagem. 4 Assim, a consolidação dos laços que esse seja retomado à medida que mãe e filho
afetivos entre ma\ e e filho e dos familiares estiverem em condições físicas e emocionais reesta-
contribuem para a prevença\o de agravos e doenças belecidas, devendo ser prolongado para suprir às
dessa origem.4 necessidades de ambas as partes. Portanto, se faz
Com o intuito de melhorar a qualidade da necessário, o esforço de todos os envolvidos no
atenção às mulheres nesse período de instabilidade, cenário para auxiliar na manutenção desse vínculo
o Ministério da Saúde (MS) do Brasil instituiu, no iniciado na gestação.6
ano 2000, o Programa de Humanização no Pré-Natal Profissionais de saúde atuantes no processo de
e Nascimento (PHPN), que tem como principal obje- parturição são agentes importantes para favorecer o
tivo reduzir as taxas de morbimortalidade materna e estímulo ao contato precoce entre mãe e filho, ofere-
perinatal, ampliar o acesso ao pré-natal e garantir cendo um cuidado integral que inclua os cuidados
qualidade e humanização da assistência ao parto e ao prestados para o estabelecimento da homeostase
puerpério.5 fisiológica, mas que também atenda às demandas
Assim, estudiosos da área ressaltam a necessi- relacionadas à subjetividade feminina e à signifi-
dade de promover uma assistência de qualidade cação da maternidade.2,3
durante o processo gravídico-puerperal, buscando a A relevância desse estudo se deve à recorrência
humanização do parto e nascimento.5 Dentro dessa de partos prematuros ou de situações de instabilidade
perspectiva surge a preocupação de o recém-nascido clínica de recém-nascidos, que em muitos casos
ser recebido com respeito e carinho, além do resultam na separação inevitável do binômio. Desse
cuidado com as demandas maternas nesse modo, compreender essa experiência é de funda-
momento.6 mental importância para favorecer uma assistência
Uma das estratégias que vai ao encontro à esses humanizada e acolhedora de acordo com as necessi-
pressupostos é o contato pele-a-pele do recém- dades apresentadas por essas mulheres.
nascido com a mãe logo após o nascimento. Esse A produção de conhecimento nesse âmbito
contato favorece o laço afetivo entre mãe e filho e torna-se necessária para o fortalecimento das
determina desfechos relevantes para os processos Políticas Públicas de Saúde que priorizem a
fisiológicos maternos, como a dequitação da assistência à mulher, ao recém-nascido e à família
placenta, a diminuição da loquiação, a estimulação nesse momento cercado pelo improvável e pelo
da produção de leite e amamentação, além de imprevisível. Este estudo tem como objetivo
amenizar o impacto do recém-nascido entre o mundo compreender o processo de separação inevitável da

510 Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018
Perspectiva materna da separação mãe-bebê no pós-parto imediato

mãe e o bebê no pós-parto imediato na perspectiva exploração do material e tratamento dos resul-
materna. tados. 12 A pré-análise é desenvolvida para sistem-
atizar as ideias iniciais e estabelecer indicadores para
Métodos a interpretação das informações coletadas.
Concluída a primeira fase, inicia-se a exploração do
Trata-se de um estudo descritivo com abordagem material, que constitui a segunda fase na qual ocorre
qualitativa que permite desvelar processos sociais, a construção das operações de codificação,
construir novas abordagens, revisar e criar conceitos considerando-se os recortes dos textos em unidades
e categorias durante a investigação. Trabalha com de registro e agregação das informações em catego-
significados, valores e atitudes, o que corresponde a rias simbólicas ou temáticas. A terceira fase
um espaço mais profundo das relações, dos compreende o tratamento dos resultados e interpre-
processos e dos fenômenos que não podem ser tação, constituindo em captar os conteúdos mani-
reduzidos à operacionalização de variáveis.9 festos verificados nas entrevistas.12
A pesquisa foi desenvolvida em uma mater- Visando o anonimato, as entrevistadas foram
nidade filantrópica em Belo Horizonte, com atendi- codificadas pela letra A, seguida de um número para
mento integral ao Sistema Único de Saúde (SUS). representar a ordem de participação variando de 1 a
Segundo os indicadores da instituição, no ano de 15, por exemplo: A1 (Entrevistado1). Este estudo
2015 foram realizados 11.473 partos, 78% dos partos respeita os princípios éticos e possui aprovação no
normais realizados por enfermeiras obstétricas e Comitê de Ética e Pesquisa da instituição, sob o
22% assistidos pelo médico-obstetra. A taxa de parecer CAAE de nº: 33611314.5.0000.5132.
cesárea foi de 24%.10 Ressalta-se que, nesse cenário,
é protocolo que os neonatos saudáveis fiquem com Resultados
as mães imediatamente após o nascimento e que não
se separarem. O perfil das entrevistadas foi 15 mulheres (100%),
As participantes deste estudo foram 15 mães sendo que dessas, sete estavam vivenciando a exper-
separadas de seus bebês logo após o parto, devido ao iência da maternidade pela primeira vez – com
desequilíbrio na vitalidade do bebê. Foram incluídas exceção de uma, que havia tido um aborto anterior –
mães que vivenciaram a separação do filho no pós- enquanto oito tinham dois ou mais filhos. A idade da
parto imediato. Não houve recusas maternas em amostra variou de 20 a 26 anos, e todas relataram ter
participar do estudo. Para definir o número de cursado ensino médio completo. Todas as partici-
sujeitos entrevistados, foi usada a saturação de dados pantes declararam que a gestação foi planejada,
a fim de cessar a inclusão de novos participantes, no fizeram pré-natal e viviam com seus companheiros.
momento em que os dados coletados apresentarem Entre as 15 participantes, 10 tiveram partos normais
redundância, segundo o pesquisador, e em que já e 5 tiveram indicação com justificativa para cesa-
havia a compreensão do fenômeno investigado.11 riana.
A coleta de dados foi feita no período de Deve-se ressaltar que essas mães foram sepa-
dezembro de 2014 a janeiro de 2015, norteada por radas de seus bebês logo após o parto por condições
meio de entrevistas com roteiro semiestruturado, de instabilidade hemodinâmica e/ou respiratória das
além de consulta aos prontuários para colher as crianças. As causas foram diversas, sendo as mais
causas das separações e a história clínica das prevalentes a prematuridade e o estado fetal não
mulheres. As entrevistas foram gravadas, posterior- tranquilizador do bebê o que é considerado quando
mente transcritas e analisadas, de acordo com o há a interrupção da transferência de oxigênio do
referencial metodológico da análise qualitativa de ambiente para o feto.13
conteúdo. Este tipo de análise apresenta vasta apli- A partir da análise das entrevistas, foi possível
cabilidade, permitindo a utilização de técnicas apreender as seguintes categorias: 1) Sentimentos e
integradas, incluindo abordagens interpretativas e percepções maternas frente à separação do filho no
intuitivas. 12 É definido como um método de pós parto e 2) Percepção das mulheres frente a
pesquisa, utilizado para a análise e interpretação atuação dos profissionais de saúde e a presença de
subjetiva de um fenômeno ainda não suficientemente seus acompanhantes.
estudado, mantendo o rigor científico.
Em sua modalidade convencional, as categorias Sentimentos e percepções maternas frente à
derivam dos dados obtidos pelas entrevistas, separação do filho no pós parto
trazendo informações diretas dos sujeitos de
conteúdo. Apresenta três fases distintas: pré-análise, As entrevistadas expressaram o desejo e o sonho de

Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018 511
Manzo BF et al.

vivenciar a maternidade, seguido da quebra da A primeira coisa eu perguntei, como está o meu filho?
expectativa por se separar do filho após o nasci- Gente fala comigo pelo amor de Deus, fala comigo!! (A4)
mento, como pode ser observado no depoimento a
seguir: (...) dá uma sensação estranha, nossa o que vai acontecer
com eles agora, até eu chegar lá em cima para saber como
Foi difícil (...) era o meu sonho, ter meu bebê nos meus é que foi (...) eu fiquei bem assustada, só na expectativa
braços, poder dar a primeira amamentação para ele (...) de saber o que eles iam fazer com os meninos (A5).
(A2).
Eu estava preocupada dela morrer, nossa senhora. Nooh,
A gente fica ali sonhando porque a gente levou dez anos meu Deus do céu, minha primeira filha (A14).
para ter filho ai quando engravida que vem, você tem que
ficar separada. (A13). Percepção das mulheres sobre a atuação dos
profissionais de saúde no momento da
Por sua vez, quando o sonho não foi realizado e separação e a presença de seus acompanhantes
o desfecho não foi o esperado, surgiram sentimentos
como a frustração, tristeza e angústia devido à Notou-se que, a maneira pela qual a mãe e bebê são
quebra das expectativas criadas. Esse sentimento assistidos pelos profissionais de saúde, repercute em
ficou explícito no depoimento a seguir: uma separação menos traumática para ambas as
partes, como podemos notar em:
(...) eu esperei tantos meses para ficar com ela e quando
eu achei que ia pegar ela, eles levaram, porque ela estava Eu queria só que ele tivesse ficado perto, né? Mas ele foi
com dificuldade para respirar (...) (A6). atendido bem, graças a Deus, levado pra UTI, foi tudo
rápido pra ele, graças a Deus tá bem [...](A6).
(...) achei que nascia e a gente já podia ficar com ela (...)
fiquei até agora ainda com aquele vazio (...) nossa, eu nem (...) a gente vê todo mundo com os bebês no colo, eu
escutei o primeiro choro, porque ela não chegou a chorar também queria tá com a minha, só que como ela está bem
lá na sala de parto (A11). melhor lá (UTI) então, espero daqui a pouco ela (..)]esteja
comigo também (A8).
As mães expressaram o sentimento de angústia
de não poder viver o momento esperado de sentir seu Nas falas, percebeu-se que, até mesmo a trans-
filho em seu colo pela necessidade da equipe em ferência da criança para unidade de terapia intensiva,
realizar intervenções: que é tida como local destinado a pacientes com
risco de morte, pode ter reflexos amenizados quando
(...) eu via ela chorando e já levaram ela para um lugarz- o atendimento transcorre de forma respeitosa.
inho e começaram a limpar ela, depois eles colocaram ela Porém, em alguns relatos, percebeu-se a insegu-
do meu lado rapidinho, mas como não podia levantar a rança e dúvidas maternas relativas aos procedi-
cabeça, né, vi assim ela, nem vi ela direito e foi muito mentos invasivos realizados ao bebê, como foi
rápido, então assim, foi muito ruim. Eu tinha uma expec- retratado a seguir:
tativa maior de ficar com ela, de poder abraçar (A6).
(...) quando eu vi colocando ela no capacete lá (...) tipo
Nesse sentido, as mães ressaltaram que, além da assim, eu fiquei com medo (...) fiquei pensando, uai gente
quebra da expectativa de permanecer com seu bebê será que ela engoliu o líquido? (A7)
após o parto, surgiu também o sentimento de
angústia relacionado ao medo de perder seus filhos, Assim, durante as entrevistas observou-se
como relatado abaixo: divergências sobre a percepção das mulheres frente
aos profissionais que as assistiram no processo de
(...) Imaginei, eu estou perdendo meu filho (...) não quero parto e nascimento. A puérpera do relato abaixo
perder (...) fiquei com muito medo, só imaginando, identifica os profissionais como alguém que pode
chorando, pedindo a Deus para salvar meu filho (A4). contribuir para amenizar a angústia desse processo
que é permeado por sentimentos diversos.
Adicionado ao medo da perda, evidenciou-se
também uma intensa preocupação e incertezas frente Eles conversaram comigo o tempo todo (...) conversou
ao desconhecido, como pode-se perceber nos depoi- bastante, eles mostraram tranquilidade o tempo todo. Aí
mentos: acaba passando tranquilidade para gente também (A5).

512 Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018
Perspectiva materna da separação mãe-bebê no pós-parto imediato

Diante disso, nota-se que esse momento da sepa- Assim, percebeu-se a ambivalência de senti-
ração exige que o profissional de saúde inclua essa mentos vividos por essas mulheres durante o
mãe e seu acompanhante nos cuidados realizados a processo de parto e nascimento de seus filhos. Tanto
esse RN, explicando cada procedimento realizado, a expectativa de ter o filho quanto o medo de perdê-
minimizando assim a angústia e o medo, como pode lo são elementos expressivos que surgem juntamente
ser vislumbrado em: com o temor de possíveis consequências ao bebê em
razão do nascimento prematuro ou outras comor-
(...) aí a moça foi me explicando, que não, que ela nasceu bidades.17
com um pouquinho de falta de ar, por causa do parto (...) Nesse sentido, os sentimentos negativos podem
(A7) ser suavizados a partir do momento em que a família
conhece melhor os procedimentos que estão sendo
Neste estudo, também ficou evidenciado que não realizados com o seu bebê e posteriormente começa
foram todas as mães que tiveram a percepção posi- a desmistificar a Unidade de Tratamento Intensivo
tiva em relação ao profissional durante a assistência. Neonatal (UTIN), compreendendo seus símbolos e
Houve relatos, inclusive, de insatisfação ao processo significados e passam a enxergar o setor como um
de trabalho de parto, apresentando queixas em lugar seguro para eles. 14 Nesse cenário, os profis-
relação à demora do seu processo de indução e da sionais de saúde, principalmente a equipe de enfer-
assistência prestada por profissionais específicos. magem, precisam acompanhar o processo de
inserção da família no ambiente da UTIN, capaci-
(...) uma enfermeira, a noite, a moreninha, eu esqueci o tando-a para a coparticipação no cuidado da criança,
nome dela, ela era muito gente boa, eu pedi ela ajuda, ela respeitando os seus momentos de estresse, ansiedade
me ajudou (...) correu atrás, agora a outra loira falou que e angústia, proporcionando o fortalecimento do
ia me ajudar (...) com exercício, com isso e com aquilo, vínculo do binômio e a prestação de cuidado huma-
com um monte de coisas, não me ajudou (...) (A7). nizado, seguro e integral.18
Portanto, nos casos em que o vínculo entre o
No que diz respeito à presença do acompanhante binômio foi interrompido logo após o parto, devido
durante todo o momento, as mulheres relataram ao desequilíbrio na vitalidade do bebê, tão logo esta-
maior confiança e sentiram-se apoiadas com a bilizadas as suas condições, o contato deve ser
presença deles. Como desvela a puérpera a seguir: estimulado por meio do incentivo do profissional aos
cuidados maternos diários ao bebê, como no
E o meu acompanhante era meu marido, ele a todo momento do seu banho e da alimentação. Assim, a
momento ficou conversando comigo, perguntando se eu mãe deixa de ser mera expectadora e passa a parti-
estava bem, se eu estava sentindo alguma coisa (...) (A6) cipar dos cuidados realizados com seu bebê.19,20
Desse modo, a assistência proporcionada pelos
Discussão profissionais no momento da separação podem
atenuar medos, angústias e inseguranças, além de
Os resultados apresentados vão ao encontro aos contribuírem para que o laço mãe-filho sejam restab-
achados evidenciados por outros estudos, enfati- elecidos pelo toque e contato pele a pele assim que
zando que, quando ocorre o desfecho inesperado, a possível, amenizando os transtornos da separação
maioria das mães manifestam medo, ansiedade e abrupta do binômio logo após o nascimento.16
insegurança frente ao bebê em situação de fragili- Apoiando esses achados tem sido reiterado que a
dade, diante a perda do bebê idealizado até o atitude do profissional é fundamental para minimizar
momento do parto.14,15 a insegurança materna diante da separação de seu
Assim, os pesquisadores afirmam que apenas as filho, visto que o cuidado individual e integral ao
famílias que vivenciam o processo de risco de vida binômio deve ser oferecido, junto a uma abordagem
de um filho conhecem a dimensão de se viver essa empática com o intuito de proporcionar o bem estar
experiência angustiante. Esse sentimento se torna da parturiente e do seu recém-nascido, envolvendo a
forte desde o momento do parto, principalmente família nesse processo.8
quando há algum diagnóstico desfavorável prévio ou Assim, o processo do parto e nascimento exige
quando se trata de um filho prematuro. 15 Demais atenção do profissional, acolhimento à cliente,
pesquisadores concordam com essa ideia e formação de vínculo e habilidade de comunicação,
descrevem que toda mãe sente o medo da perda, características que poderão resultar em um parto
pois, sabem que não se pode prever o desfecho que menos traumático e doloroso, independentemente da
poderá ser positivo ou negativo.16 via, e assim favorecer o vínculo entre a mãe e o

Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018 513
Manzo BF et al.

recém-nascido mesmo nas situações diversas.8 vivenciaram dentre tantos sentimentos, a alegria da
No entanto, conforme o cotidiano de assistência chegada do filho e o medo da perda; o desejo de
aos bebês internados logo após o parto, observou-se abraçá-los e permanecer ao lado e compreensão
que mesmo a equipe multiprofissional realizando acerca da necessidade do afastamento.
orientações às mães e suas famílias sobre as Portanto, cabe aos profissionais procurarem
condições do bebê, as reações maternas podem ser minimizar os efeitos e traumas da separação precoce
diferentes diante desse processo vivido.16 entre mãe e filho, agindo como facilitadores do
No que se refere à presença do acompanhante de contato pele-a-pele e do apego entre mãe e bebê. A
livre escolha da mulher, o trabalho de vários autores inclusão do acompanhante nesse processo pode
corroboram os relatos apresentados pelas puérperas, impactar nos sentimentos vividos por essas
e afirmam que esse apoio durante o processo do mulheres, uma vez que o suporte dos profissionais
nascimento contribui para o bem-estar físico e atrelado à dos familiares pode aumentar os senti-
emocional da mulher. O acompanhante fornece mentos de segurança e trazer maior tranquilidade
suporte emocional, conforto e encorajamento, mini- num momento permeado por angústias, medos e tris-
mizando os sentimentos de solidão, medo, ansiedade tezas.
e estresse causados pela vulnerabilidade da parturi- É necessário que os sentimentos e experiências
ente.21,22 relatadas pelas mulheres diante da situação de sepa-
Assim, viver esse momento juntamente com o ração, sejam considerados pelos profissionais de
parceiro ou alguém com quem a mulher tenha um saúde no momento da assistência, para que esses
laço afetivo, trará fortalecimento de suas relações.23- possam suprir as demandas delas e assim minorar os
25 traumas gerados pela separação do binômio mãe-
Para que esses benefícios sejam garantidos, em filho.
2005 foi sancionada a lei nº 11108, que estabelece Espera-se que os resultados encontrados neste
que os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde estudo possam contribuir para o aumento da quali-
– SUS ou da rede privada, ficam obrigados a dade na assistência às mulheres na situação de sepa-
permitir a presença, de um acompanhante de escolha ração pós-parto do seu filho, norteando os profis-
da mulher durante o período de trabalho de parto, sionais para melhor assistirem à mulher e ao recém-
parto e pós-parto imediato.26 nascido, quanto às suas reais necessidades.
Por outro lado novos estudos que abordem essa
Considerações finais temática são necessários a fim de sustentar e ampliar
a discussão podendo provocar mudanças na prática.
Por meio dos relatos maternos foi possível perceber Sugere-se que o tema seja discutido rotineiramente
as contradições e os desafios vivenciados pelas mães pelos profissionais da área, e que faça parte da
diante da separação do binômio mãe-filho, que formação acadêmica dos mesmos.

Referências

1. Santos KD, Motta IF. O significado da maternidade na Único de Saúde(SUS). Diário Oficial da União, Brasília,
trajetória de três jovens mães: um estudo psicanalítico. DF, 08 maio 2014: Seção 1. [acesso em 1 fev 2018].
Estud Psicol. (Campinas). 2014; 31 (4): 517-25. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/
sas/2014/prt0371_07_05_2014.html
2. Strapasson MR, Nedel MNB. Puerpério imediato: desven-
dando o significado da maternidade. Rev Gaúch Enferm. 6. Matos TA, Souza MS, Santos EKA, Velho MB, Seibert
2010; 31 (3): 521-8. ERC, Martins NM. Contato precoce pele a pele entre mãe e
filho: significado para mães e contribuições para a enfer-
3. Rosa R, Liceski BG, Marisa MM, Martins FE, Siebert ERC,
magem. Rev Bras Enferm. 2010; 63 (6): 998-1004.
Martins NM. Mãe e filho: os primeiros laços de aproxi-
mação. Mãe e filho: os primeiros laços de aproximação. Esc 7. Andrade RD, Santos JS, Maia MAC, Mello DF. Fatores
Anna Nery. 2010; 14 (1): 105-12. relacionados à saúde da mulher no puerpério e repercussões
na saúde da criança. Esc Anna Nery. 2015; 19 (1): 181-6.
4. Moore ER, AndersonGC, Bergman N. Contato piel-apiel
temprano para las madres y sus recien nascidos sanos 8. Souza CM, Ferreira CB, Barbosa NR, Marques JF. Equipe
(Revisison Cochrane traducida). La Biblioteca Cochrane de enfermagem e os dispositivos de cuidado no trabalho de
Plus. 2007; n. 1: 1-60. parto: enfoque na humanização. Rev Pesq Cuid Fundam.
2013; 5 (4): 743-54.
5. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 371, de 7 de Maio
de 2014. Institui diretrizes para a organização da atenção 9. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa quali-
integral e humanizada ao recém-nascido (RN) no Sistema tativa em saúde. 10 ed. São Paulo: Hucitec; 2010.

514 Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018
Perspectiva materna da separação mãe-bebê no pós-parto imediato

10. Hospital Sofia Feldman. O hospital [internet]. Belo 20. World Health Organization (WHO); United Nations
Horizonte: HSF, 2015 [acesso em 1 fev 2018]. Disponível Children's Fund (UNICEF). Baby-friendly hospital initia-
em: http://www.sofiafeldman.org.br/o-hospital/ tive: revised, updated and expanded for integrated care.
11. Fontanella BJB, Luchesi BM, Saidel MGB, Ricas J, Turato Section 1. Background and Implementation. Geneva; 2009.
ER, Melo DG. Amostragem em pesquisas qualitativas: [acesso em 1 fev 2018]. Disponível em:
proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43593/1/97892415
Cad Saúde Pública. 2011; 27 (2): 389-94. 94967_eng.pdf

12. Bardin L. Análise de conteúdo. 70 ed. Lisboa (PT): LDA; 21. Dodou HD , Rodrigues DP , Guerreiro EM , Guedes
2009. MVC, Lago PN , Mesquita NS. A contribuição do acom-
panhante para a humanização do parto e nascimento:
13. Brasil. Ministério da Saúde. Diretriz Nacional de
percepções de puérperas. Esc. Anna Nery. 2014; (18) 2:
Assistência ao Parto Normal. Relatório de Recomendação:
262-9.
Conitec – Comissão Nacional de Incorporação de
Tecnologias do SUS. Brasília, DF, 2016. [acesso em 1 fev 22. Jardim DMB. Pai-acompanhante e a sua compreensão sobre
2018]. Disponível em: http://conitec.gov.br/images/ o processo de nascimento do filho [dissertação]. Belo
Consultas/2016/Relatorio_Diretriz-PartoNormal_CP.pdf Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2009.

14. Cruz ARM, Oliveira MMC, Cardoso MVLML, Lúcio IML. 23. Missonnier S, Solis-Ponton L. Parentalidad y embarazo:
Sentimentos e expectativas da mãe com filho prematuro em convertirse en madre, convertirse en padre: las interaciones
ventilação mecânica. Rev Eletrônica Enferm. 2010; 12: entre los padres y su hijo antes del nacimiento. In: Solis-
133-9. Ponton L, organizador. La parentalidad: desafíos para el
tercer milênio. México: Manual Moderno; 2004. p. 75-92.
15. Melo RCJ, Souza IEO, Paula CC. O sentido do ser-mãe-
que-tem-a-possibilidade-de-tocar-o-filho-prematuro na 24. Hodnett ED, Simon G, Justus HG, Carol S. Continuous
unidade intensiva: contribuições para a enfermagem support for women during childbirth. Cochrane Database of
neonatal. Esc Anna Nery. 2012; 16 (2): 219-26. Systematic Reviews. 2012; p. 1-173.

16. Botêlho SM, Boery RNSO, Vilela ABA, Santos WS, Pinto 25. M, Hollywood E. The lived experiences of fathers of a
LS, Ribeiro VM, Machado JC. O cuidar materno diante do premature baby on a neonatal intensive care unit. J
filho prematuro: um estudo das representações sociais. Rev Neonatal Nurs. 2011; 17 (1): 32-40.
Esc Enferm. USP. 2012; 46 (4): 929-34. 26. Brasil. Lei nº 11.108 de 7 de abril de 2005. Altera a Lei nº
17. Araújo BBM, Rodrigues BMRD. Alojamento de mães de 8.080, de 19 de setembro de 1990, para garantir às parturi-
recém-nascido prematuro. Esc Anna Nery Rev Enferm. entes o direito à presença de acompanhante durante o
2010; 14 (2): 284-92. trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do
Sistema Único de Saúde – SUS. Diário Oficial da União
18. Sousa FCP, Montenegro LC, Goveia VR, Corrêa AR, Rocha
[periódico na internet], Brasília (DF). 7 abr 2005.
PK, Manzo BF. A participação da família na segurança do
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
paciente em unidades neonatais na perspectiva do enfer-
_Ato2004-2006/2005/Lei/L11108.htm.
meiro. Texto Contexto Enferm. 2017; 26 (3): e01180016.
19. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.
Departamento de Ações Programáticas Estratégicas.
Atenção à saúde do recém-nascido: guia para os profis-
sionais de saúde – 2. ed. – Brasília, DF, 2012. [acesso em 1
fev 2018]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/
publicacoes/atencao_saude_recem_nascido_v1.pdf

______________
Recebido em 16 de Fevereiro de 2018
Versão final apresentada em 6 de Junho de 2018
Aprovado em 18 de Julho de 2018

Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, 18 (3): 509-515 jul-set., 2018 515

Você também pode gostar