RECEPTORES CDV

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 98

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA


CAMPUS DE BOTUCATU

ATUALIZAÇÕES NA NEUROPATOGENIA DA CINOMOSE

LUANDA FERREIRA CIPRIANO

BOTUCATU, SP
2021
i

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA


FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA
CAMPUS DE BOTUCATU

ATUALIZAÇÕES NA NEUROPATOGENIA DA CINOMOSE

LUANDA FERREIRA CIPRIANO

Dissertação apresentada junto ao programa


de Pós-Graduação em Medicina Veterinária,
.
da Faculdade de Medicina Veterinária e
Zootecnia da Universidade Estadual Paulista
Campus de Botucatu, para obtenção de título
de Mestre.

Área: Enfermidades infecciosas dos animais

Orientador: Prof. Dr. Antônio Carlos Paes


ii
iii

Nome da Autora: Luanda Ferreira Cipriano


Título: Atualizações na neuropatogenia da cinomose

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof. Dr. Antônio Carlos Paes


Presidente e orientador
Higiene e saúde pública/
FMVZ – UNESP - Botucatu

Profª Drª Noeme Sousa Rocha


Membro
Departamento de Clínica Veterinária
FMVZ – UNESP - Botucatu

Profª Drª Leila Sabrina Ullmann


Membro
Instituto de Biotecnologia - IBTEC
UNESP – Botucatu

Prof. Dr. Rogério Martins Amorim


Membro Suplente
Departamento de Clínica Veterinária
FMVZ – UNESP - Botucatu

Profª Drª Tatianna Frate Schwardt De Nardo


Membro Suplente
Departamento de Clínica Veterinária
Faculdade Qualittas

Data da defesa: 05/07/2021


iii

Dedicatória
Aos meus pais Luiz e Iolanda, aos
meus irmãos Sandro Luiz e Flavia e
ao meu sobrinho Davi, pelo apoio,
paciência, amor e por não medirem
esforços para que eu alcance a minha
vocação.
A Nossa Senhora, por tudo que tenho,
tudo que sou, tudo que fiz e farei.
“Totus tuus ego sum Mariae et omnia
mea tua sunt. ”
iv

Agradecimentos Oficiais

Ao meu orientador, professor Dr. Antônio Carlos Paes, pela orientação, ajuda, apoio,
incentivo e paciência para que eu pudesse “salvar o meu mestrado”. Sinto-me honrada e
grata ao senhor pela oportunidade de ser sua orientanda na pós-graduação.
Aos professores da Pós-Graduação da Faculdade de Medicina Veterinária (FMVZ) da
Unesp, que foram mestres excepcionais na arte de ensinar e conduzir. Cresci muito
sendo aluna de vocês!
À banca de qualificação, professores Dr. Cassiano e Dr. Márcio pelas contribuições a
este trabalho.
À banca de defesa, professores Dra. Noeme, Dra. Leila, Dr. Rogério e Dra.Tatianna pela
disponibilidade em me avaliar e contribuir para o aprimoramento desta dissertação.
Ao Colegiado da Pós-Graduação em Medicina Veterinária da Unesp- Botucatu, em
especial à coordenadora professora Dra. Renée e aos representantes de discentes André
e Lohaine, pelo apoio e acolhimento durante o mestrado.
Ao Carlos Roberto da Seção Técnica de Pós-Graduação, pela atenção e trabalho de
excelência na orientação ao pós-graduando.
À professora Noeme, por ajudar na seleção e laudo das imagens de histopatologia.
Ao CNPQ, pela bolsa de mestrado que foi essencial para a minha permanência em
Botucatu.
À CAPES, pela assistência financeira. O presente trabalho foi realizado com apoio da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) -
Código de Financiamento 001”
v

Agradecimentos pessoais

A Deus, pelo amor incondicional, cuidado e por possibilitar que tudo seja possível na
minha vida.
Aos meus pais, pelo apoio, carinho, cuidado e dedicação para que este mestrado se
tornasse possível.
Aos meus irmãos, pela alegria de tê-los por perto, pela parceria, amizade e apoio de
sempre.
Ao meu sobrinho lindo, Davi, pela alegria e amor que ele me trouxe desde que nasceu.
Ao meu namorado, Demétrius, pela parceria, amizade e companheirismo que tornaram
mais agradável esse tempo em Botucatu.
Aos meus amigos da Pós-Graduação, Ísis, Rodrigo, Ana Paula da Biotecnologia, Ana
Paula da Medicina Veterinária, Arthur, Ana Carolina, Viviane, João Baqui e Raíssa que
me incentivaram, me ouviram, me apoiaram e fizeram deste período de mestrado um
tempo especial.
Aos meus amigos de sempre, Mariana, Érica, Roberta, Letícia, Ana Keila, Christiane e
tantos outros, pela companhia da caminhada e por tornarem a minha trajetória mais
bonita.
Aos residentes do setor de Moléstias Infecciosas (MI), Beatriz, Gabrielly, Marcelo,
Carolina, Carmem, Thaís, Thiago e Larissa, por encaminharem os casos de cães com
cinomose que vieram a óbito para a coleta de encéfalo, e por ajudarem nos
procedimentos ambulatoriais.
Ao laboratório Objetiva Vet, pela confecção das lâminas de histopatologia.
vi

“Nada te perturbe, Nada te espante,


Tudo passa, Deus não muda,
A paciência tudo alcança;
Quem a Deus tem, Nada lhe falta:
Só Deus basta” Santa Tereza D’ Avila

“Não importa a cor do céu, quem faz o dia bonito é você!”


Autor Desconhecido

“Aliás, sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a
Deus, daqueles que são os eleitos, segundo os seus desígnios.” Rm 8:28
vii

LISTA DE FIGURAS:

Figura 1: Representação da distribuição global aproximada de Morbillivirus ao longo


da história.
(a) Morbillivirus (azul) e Rinderpest morbillivirus (verde) são os mais antigos
Morbillivirus que se espalharam ao longo de antigas rotas comerciais (setas
vermelhas)...........................................................................................................09
(b) A Importação de Morbillivirus para o Novo Mundo e o vírus da cinomose canina
(vermelho) para o Velho Mundo durante a Era da Exploração..........................09
(c) Propagação de Rinderpest morbillivirus para a África e Ásia devido ao
movimento transfronteiriço de gado e estabelecimento do primeiro Morbillivirus
distribuído globalmente. Descoberta da peste de ruminantes (laranja claro), peste
bovina (laranja escuro) e Morbillivirus em cetáceos como as focas,
respectivamente. O desenvolvimento de vacinas atenuadas contra o
Morbillivirus em diferentes espécies trouxe um maior controle da doença em
diversas partes do mundo....................................................................................09
(d) A descoberta do Morbillivirus felino (roxo), um novo membro proposto do
gênero na Ásia e nos Estados Unidos. Determinação da sequência do
Morbillivirus de morcego (azul claro com linha tracejada) a partir de material
clínico obtido no Brasil. O Morbillivirus expande o seu alcance geográfico na
Ásia e África e é isolado na Turquia e na China. O ressurgimento de
Morbillivirus (azul com linha vermelha) em regiões do mundo onde eram
endêmicas. A detecção de Morbillivirus em cetáceos (amarelo) ocorreu em uma
faixa mais ampla de mamíferos marinhos amplamente distribuídos. Após ocorrer
a erradicação do Rinderpest morbillivirus, o uso da vacina em bovinos foi
suspenso. O Morbillivirus permanece globalmente distribuído (NAMBULLI et
al., 2016). ...........................................................................................................10

Figura 2 (a): A figura mostra a partícula viral, com o envelope de lipoproteína,


contendo o complexo de ribonucleoproteína, que consiste no nucleocapsídeo. No
envelope, existem as proteínas M, a proteína de fusão F e a hemaglutinina (H). O RNA
viii

polimerase viral, contém as proteínas L e


P.......................................................................................................................................11

(b): As duas glicoproteínas, a proteína hemaglutinina (H) (amarela) e a proteína de


fusão (F) (verde), juntamente com a grande proteína L (roxo), consituem o complexo
ribonucleoproteico (RNP) (Adaptado de SATO et al. 2012 e LOOTS et al.,
2017)................................................................................................................................12

Figura 3: A cepa 5804PeH do VCC do tipo selvagem infecta células que expressam
nectina-4 em humanos e em cães. Os membros dos grupos de VCC e vírus do sarampo
compartilham tropismo e doenças comuns. O estudo sugere que a abundância de
nectina-4 por ser um receptor de VCC, na superfície celular está relacionada à sua
susceptibilidade à infecção pelo VCC. As imagens de fluorescência foram capturadas
quatro dias após a infecção e sobrepostas com fases contrastantes; a nectina-4 na linha
celular correspondente sombreado com IgG; anticorpo nectina-4, nectina-4-vermelho
(NOYCE et al., 2013)......................................................................................................14

Figura 4: O CDV5804PeH de tipo selvagem infecta eficientemente células Vero que


expressam a nectina-4 do cão. As células Vero caninas expressam o SLAM. As
nectinas-4 das MDCK (células renais caninas) que expressam nectina-4 de cão e um
plasmídeo no grupo controle, foram infectadas com a cepa de CDV5804PeH. Fase de
contraste e fluorescência: As imagens foram capturadas e sobrepostas para visualizar a
extensão da replicação do vírus, ocorrendo um aumento significativo no CDV5804PeH.
(Adaptado de NOYCE et al., 2013)...............................................................................15

Figura 5: Os sistemas do prosencéfalo envolvidos no controle autônomo. O córtex


cingulado anterior, amígdala e hipotálamo são os principais centros de controle do
prosencéfalo (GIBBONS,
2019)...............................................................................................................................20
ix

Figura 6: Reconstrução da superfície do cérebro canino. A localização do giro


proreano, sulco coronal (vermelho) e sulco ansate (azul) é indicado na vista dorsal. (B)
Vistas lateral e medial do branco inflado, com sulcos e giros marcados. As estruturas
cinza escuro são os sulcos e as regiões cinza claro são os giros. Nas superfícies
rotuladas, os sulcos são coloridos em cores menos saturadas e os giros em cores
saturadas (DATTA et al., 2012)......................................................................................22

Figura 7: Esquema resumido do Sistema Nervoso Periférico, mostrando a integração de


seus componentes com o SNC (JORTNER, 2010).
........................................................................................................................................24

Figura 8: A ilustração representa o VCC se disseminando dentro do SNC. A seção


transversal do cerebelo indicada por setas azuis mostra a disseminação viral por meio de
células meníngeas infectadas. Os círculos pretos mostram a disseminação viral via
leucócitos infectados e células endoteliais. As setas amarelas apontam a disseminação
viral via células epiteliais do plexo coróide infectadas e as setas vermelhas se referem à
propagação viral via células ependimárias infectadas (BEINEKE et al.,
2009)...............................................................................................................................25

Figura 9: Representação da patogenia das lesões crônicas na leucoencefalite


desmielinizante, após a infecção pelo VCC. A ilustração mostra a diminuição ou
ausência da expressão viral e um aumento do influxo de células CD8 +, CD4 + e B na
região perivascular. Além disso, as células cerebrais periféricas mostram um aumento
de MHC de classe II e uma regulação positiva moderada a grave de IL-6, IL-8-, IL-12 e
TNF-a (BEINEKE et
al.,2009)...........................................................................................................................29

Figura 10: Alterações anatomopatológicas características dos diferentes subtipos de


leucoencefalite causadas pelo VCC. Coloração: azul-cresil rápido Luxol. Barras de
escala = 200 mm (ULRICH et al.,
2014)..............................................................................................................................42
x

a) O cerebelo dos cães não infectados, sem alterações


histológicas..................................................................................................42
b) O cerebelo de cães afetados por leucoencefalite aguda por VCC. A figura
apresenta alterações em astrócitos e microgliose focal (seta) e
ocasionalmente poucas bainhas de mielina vacuoladas (ULRICH et al.,
2014)..........................................................................................................42
c) O cerebelo de cães afetados por VCC na fase subaguda, apresentando
leucoencefalite com desmielinização, mas sem inflamação. A substância
branca está desmielinizada focalmente (asterisco) combinada com astro e
microgliose (seta) (ULRICH et al.,
2014).............................................................................................................42
d) O cerebelo de cães afetados por leucoencefalite crônica por VCC com
desmielinização e com inflamação apresentou substância branca
desmielinizada focalmente (asterisco), combinada com astro- e microgliose
(seta), bem como infiltrados inflamatórios perivasculares (ponta de seta)
(ULRICH et al., 2014)..................................................................................42

Figura 11: Fotomicrografias do cérebro de cães com cinomose. Coloração:


Hematoxilina e Eosina (DE NARDO et al.,
2020)...............................................................................................................................44
a) A área de desmielinização na substância branca adjacente ao quarto
ventrículo (*, bar = 200 μm) DE NARDO et al.,
2020).............................................................................................................44
b) Presença de numerosas inclusões acidofílicas pleomórficas no citoplasma
de astrócitos reativos (setas, barra = 20 μm) DE NARDO et al.,
2020).............................................................................................................44
c) Área de necrose liquefativa rica em células Gitter (células fagocíticas
derivadas de monócitos da circulação sanguínea, e em menor parte da micróglia
residente) (setas, barra = 20 μm) DE NARDO et al.,
2020)...............................................................................................................................44
xi

d) Manguitos perivasculares e hiperemia vascular em no neurópilo (setas, barra


= 50 μm) DE NARDO et al.,
2020)................................................................................................................................44

Figura 12: A figura mostra a apresentação histológica da substância branca cerebelar


de cães do grupo controle e com cães com cinomose. Coloração: hematoxilina e eosina
(HE) A – A ′ ′ ′) e violeta azul-cresil rápido de luxol
(LFB / KEV) (B – B ′ ′)..................................................................................................45
Grupo 1: O animal do grupo controle apresenta a substância branca
intacta..............................................................................................................................45
Grupo 2: Lesão aguda com hipercelularidade e vacuolização.
(A ′, B ′)...............................................................................................................45
Grupo3: Lesão desmielinizada subaguda com hipercelularidade, astrócitos
gemistocíticos (seta), células gitter (cabeça de seta) e a coloração LFB / KEV
intralesional
diminuída........................................................................................................................45
Grupo 4: Lesão subaguda a crônica com cufs perivasculares marcados,
astrócitos gemistocíticos (setas) e desmielinização da substância branca. Asterisco: vaso
sanguíneo (A – A ′ ′ ′) Barra de escala = 50 µm. (B – B ′ ′ ′), barra de escala = 200 µm.
(KLEMENS et al., 2019)................................................................................................45

Figura 13: O fragmento do lobo parietal direito de um cão, macho, SRD, adulto. A seta
azul aponta um
infiltrado de células inflamatórias mononucleares, sugestivas de linfócitos, na região
encefálica.........................................................................................................................45

Figura 14: Imagem de um cão, macho, SRD, adulto. O fragmento do lobo parietal
esquerdo mostra perda de substância branca, neurônios vermelhos por isquemia e
degeneração neuronal. (Paciente do setor MI, FMVZ-Unesp, Botucatu, 2021).............46

Figura 15: Imagem de um cão, macho, SRD, adulto. O fragmento do lobo parietal
esquerdo apresentando
xii

astrócitos em desmielinização intensa e infiltrado linfocitário no lobo parietal.


Coloração H.E. (Paciente do setor MI, FMVZ-Unesp, Botucatu, 2021). (Arquivo
pessoal, 2021)..............................................................................................................47

Figura 16: Imagem de um cão, macho, SRD, adulto. O fragmento do lobo parietal
esquerdo apresenta infiltrado linfocitário de células mononucleares dentro do vaso,
lesão neuronal por hipóxia (neurônio vermelho). Coloração H.E. (Paciente do setor MI,
FMVZ-Unesp, Botucatu, 2021)....................................................................................47

Figura 16: Imagem de um cão, macho, raça SRD, adulto. A figura mostra o Tálamo/
córtex temporal com vacúolos devido a perda de mielina na substancia branca e intenso
infiltrado linfocitário. Presença de vacúolos e infiltrado inflamatório. Coloração HE.
(Arquivo pessoal,
2021)................................................................................................................................47

Figura 17: Alterações patológicas no cérebro de um paciente com esclerose múltipla


(EM) secundária progressiva. As lesões desmielinizadas focais estão presentes na
substância branca (A). Há extensa desmielinização subapical cortical. (B). Em
contraste com o padrão normal de mielina no córtex cerebral, como mostrado em C, a
perda completa de mielina nas lesões subpiais (D) Placas desmielinizadas na substância
branca podem aparecer como lesões desmielinizantes com uma baixa densidade de
bainhas finas de mielina, visível por imunocitoquímica para proteínas de mielina ou
como placas de sombra remielinizadas (G e H) (LASSMANN,
2018)................................................................................................................................49
xiii

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: A epidemia generalizada de sarampo nas Américas precedeu as primeiras


epizootias de cinomose entre os séculos XVI a XVII................................................06
xiv

LISTA DE ABREVIATURAS

BHE - Barreira Hematoencefálica


BHM - Barreira Hemato-Meníngea
DRC- Doença Renal Crônica
EUA - Estados Unidos
TNF - Fator de Necrose Tumoral
EM- Esclerose Múltipla
F - Proteína de fusão
FAT- Teste de Anticorpo Fluorescente Direto
FMVZ- Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia
GFAP- Proteína Ácida Fibrilar Glial
GME- Meningoencefalite Granulomatosa
H - Proteína Hemaglutinina de Fixação
HE - Hematoxilina e Eosina
IFD -Imunofluorescência Direta
IL - Interleucina
LFB / KEV- Violeta Azul-Cresil e Rápido de Luxol
M - Proteína de Matriz
MI- Moléstias Infecciosas
MVFE - Morbillivirus felino
MDCK - Células Renais Caninas
MHC-II- Complexo Principal de Histocompatibilidade de Classe II
NAD- Dinucleótido de Nicotinamida e Adenina
NP- Núcleo Capsídeo
OIE - Organização Mundial da Saúde Animal
OMS - Organização Mundial de Saúde
RABV - Vírus da raiva
RIT- Teste imunohistoquímico
RNAms -RNA mensageiros
RPV – Rinderpest
SLAM - Molécula de Ativação de Linfócitos de Sinalização
xv

SARM1- Sterile Alpha and TIR Motif-containing 1


SNC - Sistema Nervoso Central
SNP - Sistema Nervoso Periférico
VCC - Vírus da Cinomose Canina
xvi

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 1

2 REVISÃO DE LITERATURA.......................................................................................................... 2

2.1 Epidemiologia..............................................................................................................2

2.2 Etiopatogenia.............................................................................................................10
2.3 SLAM: O receptor do Morbillivirus e os mecanismos de entrada do vírus na célula
do hospedeiro...................................................................................................................12
2.3 Anatomia do sistema nervoso do cão........................................................................18
2.4.1 Neurônios ..............................................................................................................18
2.4.2 Sistema Nervoso Autônomo..................................................................................19
2.4.3 Sistema Nervoso Central....................................................................................20
2.4.4 Sistema Nervoso Periférico.................................................................................. 23
3. Neuropatogenia da cinomose.....................................................................................24
3.1 Os mecanismos de neuroinvasão do VCC............................................................... 24
3.2 Estágio agudo da infecção neurológica da cinomose.............................................. 26
3.3 Estágio crônico da infecção neurológica da cinomose.............................................28
3.4 Os mecanismos de defesa imunológica no SNC na neuroinvasão pelo VCC......... 30
3.5 Encefalite causada pelo Morbillivirus na
cinomose..........................................................................................................................31
3.6 A função imunológica das células da microglia e dos oligodendrocitos, na encefalite
pelo VCC.........................................................................................................................35
3.7 Manifestações neurológicas causadas pela
cinomose.........................................................................................................................36
3.8 Síndromes neurológicas decorrentes do
VCC...............................................................................................................................37
3.9 Encefalite do cão
idoso................................................................................................................................37
3.10 Alterações histopatológicas do Sistema Nervoso Central de cães com encefalite por
cinomose......................................................................................................................... 40
3.11 Alterações histopatológicas do Sistema Nervoso Central de doenças com
mecanismos de desmielinização semelhantes à cinomose..............................................48
xvii

3.12 Diagnóstico..........................................................................................................50
3.13 Diagnóstico laboratorial..........................................................................................51
3.13 Diagnóstico diferencial...........................................................................................52
3.13 Diagnóstico diferencial entre raiva canina e cinomose............................................53
4 OBJETIVOS........................................................................................................... 56

5 MATERIAL E MÉTODOS.....................................................................................56
5.1 Revisão Sistemática...................................................................................................57
5.2 Critérios de inclusão..................................................................................................57
5.3 Critérios de exclusão.................................................................................................57
5.4 Análise histopatológica..............................................................................................58
6 CONCLUSÕES.........................................................................................................59
REFERÊNCIAS..............................................................................................................60
ANEXOS.........................................................................................................................66
Anexo 1- Atestado de aprovação do Conselho Nacional de Controle de Experimentação
Animal - CONCEA........................................................................................................ 73
xviii

Cipriano, L. F. Atualizações na neuropatogenia da cinomose. Botucatu, 2021. 84 p.


Dissertação (mestrado) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Campus de
Botucatu, Universidade Estadual Paulista (UNESP).

RESUMO: O objetivo deste estudo foi revisar a neuropatogenia causada pelo


Morbillivirus em cães, através de revisão de literatura sistemática com ênfase na
fisiopatogenia da cinomose. Foram analisadas amostras de encéfalos de cães com
diagnóstico de cinomose que vieram a óbito, com base em análise histopatológica das
lesões. A cinomose é uma doença multissistêmica grave, altamente contagiosa, com
altas taxas de morbidade e mortalidade. É necessário um estudo completo da
neuropatogenia da cinomose, abrangendo a etiopagenia e as complicações neurológicas
da doença para elucidar detalhadamente as consequências dessa infecção, como as
lesões desmielinizantes multifocais crônicas. Nessas patologias, os nucleocapsídeos
virais por não utilizarem envelopamento em partículas virais para a sua multiplicação,
são transmitidos para as células nervosas através de receptores, principalmente os
astrócitos. A fusão célula a célula depende da nectina-4, presente nas cepas
desmielinizantes do vírus da cinomose (VCC). Algumas pesquisas mostram que o vírus
da cinomose acomete o SNC, mesmo que a infecção não tenha gerado alterações
neurológicas. Os mecanismos de invasão e disseminação cerebral do Morbillivirus
ainda não são totalmente conhecidos. A análise das alterações neuropatológicas
causadas pela presença do VCC pode auxiliar estudos de novos tratamentos que visam à
recuperação de sinais neurológicos de cães acometidos pela cinomose, que resultam nas
principais causas de óbitos.

Palavras chaves: Desmielinização, Morbillivirus, Encefalite.


xix

Cipriano, L. F. Updates on the neuropathogenesis of canine distemper disease.


Botucatu, 2021. 84 p. Dissertation (Master) - School of Veterinary Medicine and
Animal Science, Botucatu Campus, Sao Paulo State University (UNESP).

ABSTRACT: The aim of this study was to review the neuropathogenesis caused by
Morbillivirus in dogs through systematic literature review with emphasis on the
pathophysiology of canine distemper. Encephalic samples from dogs diagnosed with
canine distemper that died were analyzed based on histopathological analysis of the
lesions. Canine distemper is a severe, highly contagious, multisystemic disease with
high morbidity and mortality rates. A complete study of the neuropathogenesis of
canine distemper, covering the etiopathogenesis and neurological complications of the
disease is necessary to elucidate in detail the consequences of this infection in the
Central Nervous System (CNS), such as chronic multifocal demyelinating lesions. In
these pathologies, the viral nucleocapsids by they do not use envelopment in viral
particles for their multiplication, they are transmitted to the nerve cells through
receptors, mainly the astrocytes. Cell-to-cell fusion depends on nectin-4, which is
present in demyelinating strains of cynomatosis virus (DCV). Some research shows that
the distemper virus affects the CNS, even if the infection has not generated neurological
changes. The mechanisms of brain invasion and dissemination of Morbillivirus are not
yet fully known. The analysis of neuropathological changes caused by the presence of
CCV to support studies of new treatments aimed at the recovery of neurological signs in
dogs affected by canine distemper, which results in the main causes of death.

Key words: Demyelination, Morbillivirus, Encephalitis.


xx

Preâmbulo

Esta dissertação de mestrado foi elaborada a partir da compreensão acerca da


necessidade de novas pesquisas sobre a neuropatogencia da cinomose.
Ao ocorrer à entrada do vírus no SNC, com comprometimento da substância
cinzenta e posteriormente da substância branca, as células da microglia alteram
mecanismos de nutrição, sustentação e defesa cerebral. O estudo da neuropatogenia da
cinomose pode auxiliar a desvendar as principais consequências da neuroinflamação e
os mecanismos imunológicos microgliais que participam do agravamento das lesões
encefálicas.
Atualmente os tratamentos para a encefalite causada pela cinomose estão em
estudos e até o momento, existem poucas opções viáveis que possam intervir nos
processos imunopatológicos neurais que acometem os cães. Em muitos casos o avanço
da fase neurológica, causa comprometimentos irreversíveis, levando o paciente ao óbito
ou a opção pela eutanásia.
Por isso, são necessários novos estudos acerca da neuropatogenia dessa doença,
de alta morbidade e mortalidade. A deficiência nos programas de profilaxia, ausência de
protocolos vacinais, protocolos vacinais incompletos, desconhecimentos sobre cuidados
com os cães, falhas nas medidas de posse responsável, inexistência de programas
governamentais de controle de cães errantes, são fatores que levam à permanência dessa
doença, tornando um cão contaminado, fonte de infecção para outros cães.
Foram realizadas coletas de cérebros de cães atendidos pelo serviço de Moléstias
Infecciosas (MI) do Hospital Veterinário da Unesp, com diagnóstico de cinomose, que
vieram a óbito, em decorrência de um mal prognóstico. O material foi processado em
laboratório de patologia e realizou-se a análise histopatológica das lesões com a
finalidade de ilustrar essa dissertação. Foram identificadas algumas lesões decorrentes
do quadro de encefalite associado à desmielinização, devido a progressão da doença.
Vários artigos científicos foram compilados para a elaboração dessa revisão de
literatura, com o objetivo de trazer informações atuais presentes na literatura, a fim de
fornecer um estudo atualizado em anatomopatogenia da cinomose.
xxi

Este estudo é significativamente importantes para o conhecimento da doença e


para ser utilizado em pesquisas sobre outras doenças do SNC que acometem seres
humanos, como Alzheimer, esclerose múltipla, esclerose amiotrófica lateral,
leucodistrofias, deficiência de enzimas lisossomais, epilepsia, malformações corticais
(lissencefalia e polimicrogiria), demência, lesões focais, doença de Parkinson, encefalite
autoimune, paralisia microglial, encefalomielite desmielinizante aguda, neuromielite
óptica, entre outras.
Na esclerose múltipla (EM) não existe um modelo que permita uma visão geral
da doença, por isso é necessário utilizar uma variedade de modelos. A cinomose é um
modelo “in vivo” que pode ser utilizada não somente para entender a neuropatogenia da
EM, mas também para instituir tratamentos que visam o reparo nas lesões,
remielinização e interrupção da neurodegeneração, evitando assim à progressão da
doença.
Alguns estudos mostraram que os surtos de doenças causadas pelo Morbillivirus
podem ocorrer em um mesmo período de tempo, tornando animais contaminados,
reservatórios da doença e agentes de transmissão intraespécies e interespécies.
O Morbillivirus possui RNA de fita simples, sentido negativo e não possui a
enzima transcriptase reversa, não sendo, portanto um retrovírus. A infecção sistêmica
pelo Morbillivirus pode ser encontrada em canídeos selvagens, procionídeos como
guaxinins, kinkajous, ursos, mustelídeos, hienas, grandes felinos, felinos domésticos,
cetáceos, primatas não humanos e humanos.
A grande capacidade do Morbillivirus de transpor barreiras entre as espécies se
deve a mutações na proteína H do envelope lipoprotéico, tornando-o um vírus
pantrópico. Surtos de doenças causadas pelo Morbillivirus foram registrados em
diferentes espécies em um mesmo período de tempo, pois além da alta virulência, os
animais contaminados são reservatórios da doença e agentes de transmissão
intraespécies e interespécies. Esta característica do Morbillivirus dificulta a erradicação
das infecções do VCC (vírus da cinomose), embora existam vacinas para algumas
espécies acometidas.
O estudo das interações do Morbillivirus com as diferentes espécies leva-nos a
discutir os conceitos de 'One World One Health', 'One Medicine' e 'One Health', ao se
correlacionar com os riscos para a saúde humana e animal que o Morbillivirus
xxii

representa. O trabalho de vigilância epidemiológica do VCC é significativamente


importante por se tratar de uma doença infecciosa emergente que representa uma
ameaça a saúde de seres humanos e animais. Alguns estudos apontam que o vírus do
sarampo é derivado do vírus da cinomose ou do vírus da peste bovina.
A promoção da saúde depende do empenho de órgãos nacionais e internacionais,
através de práticas político-econômicas, investimento em ciência e cuidado com o
ecossistema, evitando prejuízos na relação entre os hopedeiros, agentes patogênicos e o
ambiente. A disseminação e multiplicação desse vírus podem causar efeitos
catastróficos mundiais.
Esta dissertação é composta por lista de figuras que ilustram didaticamente a
estrutura viral, esquemas que ilustram os mecanismos patológicos utilizados pelo
Morbillivirus para infectar o hospedeiro, estruturas cerebrais, fotomicrografias com a
descrição das lesões. Além disso, a presente revisão de literatura aborda a
epidemiologia, etiopatogenia, neuropatogenia, mecanismos de neuroinvasão, alterações
histológicas, diagnóstico clínico, laboratorial, material e métodos, conclusão e
referências.
1

1 INTRODUÇÃO

A cinomose é causada por um patógeno multi-hospedeiro, Morbillivirus da


família Paramyxoviridae, responsável por causar imunossupressão grave e doença
neurológica associada à desmielinização (ANDERSON et al., 2012; LIU et al., 2016).
Em torno de 30% de cães infectados pelo Morbillivirus desenvolvem síndromes
neurológicas após uma a seis semanas do início dos sinais clínicos. Os filhotes de 3 a 6
meses podem desenvolver poliencefalopatias com disfunções no proencéfalo (GREEN
et al., 2020).
O VCC (vírus da cinomose) é um vírus de RNA de fita simples, não segmentado
e envelopado, da família Paramyxoviridae, gênero Morbillivirus, mesmo gênero do
sarampo humano (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005). Os Morbillivirus já
causaram epidemias em várias espécies, uma vez que essas doenças possuem
características semelhantes com sinais cuja gravidade varia de manifestações
subclínicas até degeneração cerebral crônica, podendo levar o animal a óbito (UHL et
al,. 2019).
Os Morbillivirus podem causar doenças neurológicas agudas e progressivas
acometendo a substância cinzenta e a substância branca. Esses sinais incluem
convulsões parciais ou generalizadas, mioclonia, paresia, paralisia, déficits
proprioceptivos, movimentos circulares, mudanças comportamentais, disfunção
vestibular, levando o paciente a óbito ou gerando sequelas neurológicas crônicas (VON
RÜDEN et al., 2021).
Os cães com cinomose possuem um padrão de alterações neurológicas que se
assemelham a doenças humanas como Alzheimer, esclerose múltipla, leucodistrofias,
deficiência de enzimas lisossomais, epilepsia, malformações corticais (lissencefalia,
polimicrogiria) demência, lesões focais, entre outras (DATTA et al., 2012).
O modelo da anatomopatologia da cinomose embasa estudos sobre a esclerose
múltipla por se assemelhar ao mecanismo de desmielinização. A desmielinização está
relacionada à ação do vírus em diferentes tipos de células. A homeostasia cerebral é
mantida por junções de astrócito-astrócito e astrócito-oligodendrócito. As alterações
nessas junções comunicantes podem desencadear convulsões em casos crônicos (VON
RÜDEN et al., 2017).
2

Considerando que modificações nas células da microglia alteram mecanismos de


nutrição, sustentação e defesa cerebral, o estudo da neuropatogenia da cinomose pode
auxiliar a desvendar as principais consequências da neuroinflamação e como as lesões
microgliais participam do agravamento das lesões encefálicas.

2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 Epidemiologia

A cinomose é uma doença viral altamente contagiosa que afeta carnívoros das
famílias Canidae, Mustelidae, Felidae e Procyonidae em diferentes países do mundo,
como os Estados Unidos, Finlândia, Alemanha, Polônia e os países do continente
africano. Os animais selvagens como raposas, furões e primatas não humanos também
podem ser acometidos pelo Morbillivirus (ATHANASIOU et al., 2017).
A soroprevalência da cinomose em populações de raposas varia de 4 a 17%,
porém esse valor pode estar subestimado devido às altas taxas de mortalidade nessa
espécie que atua como reservatório da doença (BILLINIS et al., 2013). A taxa de
letalidade da cinomose é de 5 a 30% em primatas, sendo que a principal causa da morte
é a pneumonia seguida de alterações neurológicas (VRIES et al., 2014). Em um estudo
realizado ao longo de sete anos, observou-se que a prevalência de cinomose em cães
selvagens na África foi de 16%, comparado a 48% de prevalência nos cães domésticos
(WOODROFFE et al., 2012).
Outros vírus estão relacionados ao vírus da cinomose, como o vírus do sarampo
humano e o vírus da peste bovina. Os Morbillivirus também acometem espécies como
os cetáceos, felinos, morcegos e roedores (UHL et al,. 2019; PFEFFERMANN et al.,
2018). Vários estudos relataram que o vírus da cinomose possui ancestral comum e que
se adaptou a uma variedade de hospedeiros ao longo do tempo (VRIES et al., 2014).
Surtos causados pelo VCC já ocorreram em diversas espécies, como cão
doméstico (Canis familiaris), cão selvagem africano (Lycaon pictus), furão de pé preto
3

(Mustela nigripes), foca-do-baikal (Pusa sibirica), leão africano (Panthera leo) e na


hiena-pintada (Crocuta crocuta) (NIKOLIN et al., 2012).
Nos anos de 1991 e 1992 ocorreram infecções pelo VCC em leopardos cativos
(Panthera pardus), tigres (Panthera tigris), leões (Panthera leo) e em uma onça-pintada
(Panthera onca) na América do Norte. Ocorreram 17 óbitos desses animais, e os
guaxinins foram considerados a fonte de infecção. Além desses felinos, dois leopardos
negros morreram no zoológico de Naibi, Coal Valley, Illinois, e 2 tigres vieram a óbito
na Reserva Shambala, Acton, Califórnia (APPEL et al., 1994). Em 1994
aproximadamente um terço da população de leões no Serengeti, norte da Tanzânia, veio
a óbito por infecções atribuídas ao VCC. Houve também surtos em felinos de vida livre
como lince, lince canadense, lince euro-asiático, o lince ibérico em perigo crítico e o
tigre de Amur (NIKOLIN et al., 2012).
Os sinais clínicos encontrados nessas espécies foram anorexia, doença
gastrointestinal, respiratória e convulsões. O VCC foi isolado através de testes de
anticorpos monoclonais que identificaram o VCC de 3 leopardos, 3 tigres e 3 leões que
vieram a óbito. Exames macroscópicos e histopatológicos revelaram lesões semelhantes
às que são encontradas em canídeos, porém havia menos lesões no cérebro e uma
proliferação celular no pulmão com corpos de inclusão, também foram identificados
antígenos do VCC em imuno-histologia. Anticorpos neutralizantes para o VCC foram
encontrados em altos títulos no soro da maioria dos animais, mas estava ausente ou
baixo em alguns grandes felinos que morreram após a infecção pelo VCC (APPEL et
al., 1994).
O Morbillivirus foi identificado em gatos domésticos na China em 2012, a nova
espécie denominada Morbilivirus felino (MVFE) causou nefrite túbulo-intersticial
(MARCACCI et al., 2016). O Morbillivirus foi detectado através de PCR de urina e
amostras de sangue em 12% de gatos de rua na Itália, foram observados efeitos
citopáticos, lise e formação de sincícios em células renais. No exame histológico de
tecidos obtidos na necropsia foram encontrados infiltrado inflamatório, degeneração e
necrose tubular (WOO et al., 2012). No Japão, um estudo em gatos domésticos
identificou em 40% a presença de MVFE em tecidos renais de 10 gatos com nefrite.
Embora os MVFE possuam diversidades genéticas, os isolados do Japão e China
mostraram uma seqüência de nucleotídeos idêntica, sugerindo que existem reservatórios
4

naturais. A análise gênica mostrou que a recombinação ocorreu dentro dos genes F e H
(SAKAGUCHI et al., 2015).
Na Itália, em um gato com doença renal crônica (DRC), o MVFE foi encontrado
através de exame RT-PCR de urina. Em 2013, foram registrados gatos com MVFE na
Alemanha, e recentemente na Túrquia e nos Estados Unidos (EUA). A infecção crônica
causada pelo Morbillivirus pode ser responsável pela recombinação e heterogeneidade
viral. Além disso, a diversidade viral está relacionada à existência de diferentes
ancestrais virais envolvidos na origem do MVFE. Na Europa, o MVFE foi detectado em
gatos com DRC. Estudos mostram que os gatos parecem hospedar uma população
heterogênica de novos paramixovírus que estão relacionados com a DRC nesses animais
(MARCACCI et al., 2016).
No VCC a proteína H é a mais variável no gênero do Morbillivirus, o que
explica um amplo espectro de hospedeiros. A infecção pode levar à formação de células
multinucleadas, os sincícios. A formação de sincícios é determinada pela proteína H do
VCC. O receptor celular para a proteína H em células linfáticas hospedeiras é a
molécula SLAM (molécula de ativação de linfócitos de sinalização) que se liga ao
Morbillivirus. O SLAM é expresso em humanos por células T de memória, células B e
induzida por uma gama de células imunes, após a ativação. A especificidade da proteína
H do VCC e a interação proteína-receptor SLAM representam um potencial
disseminador da gama de hospedeiros do Morbillivirus (NIKOLIN et al., 2012).
Em humanos, o vírus do sarampo é um tipo de Morbillivirus. O vírus do
sarampo e o VCC usam dois receptores celulares, o CD150 expresso em subconjuntos
de células dos sistemas imunes e a nectina-4 expressa em células epiteliais. O vírus do
sarampo infecta células imunes que expressam CD150, e estas células migram os
nódulos linfáticos de drenagem (SAKAGUCHI et al., 2015). O gênero inclui o vírus
Rinderpest (RPV) já erradicado pela vacinação, peste dos ruminantes e vírus da
cinomose em cães. Há evidências de Morbillivirus em animais marinhos, como os
cetáceos, sendo esse vírus, denominado de Phocid distemper vírus-1 (PDV-1) e em
felinos recentemente observou-se o Morbillivirus, em gatos domésticos, espécies de
morcegos e roedores (PFEFFERMANN et al., 2018). Os Morbillivirus também foram
encontrados em morcegos, nos exames de RT-PCR do soro sanguíneo, em taxa de
5

incidência entre 3,3 e 3,1% em um total de 86 espécies de morcegos, com 4.954


indivíduos do Brasil, países de África e da Europa (DREXLER et al., 2012).
Os Morbillivirus são responsáveis por epidemias que dizimaram muitas
populações, ao longo de séculos, essas doenças possuem características semelhantes
entre as espécies, com sinais cuja gravidade varia de manifestações subclínicas até
febre, sinais respiratórios, gastrointestinais, dermatite e imunossupresão, facilitando
infecções bacterianas imunomediadas, danos cerebrais, a medula espinhal e
degeneração cerebral crônica, podendo levar o paciente a óbito (UHL et al,. 2019).
Estima-se que os cães por serem reservatórios, podem representar uma fonte de
infecção do vírus da cinomose para os animais não domesticados. Essa transmissão
pode representar ameaça para populações de espécies selvagens (COSTA et al., 2019).
Os estudos epidemiológicos do vírus da cinomose, aliado a vigilância
epidemiológica constante, medidas de profilaxia como a vacinação, se mostram
necessárias para conter a disseminação da doença de cães para outras espécies. Após a
raiva, a cinomose é considerada a doença mais relevante, devido a sua gravidade
(COSTA et al., 2019).
Os Morbillivirus causam doenças com morbidade e mortalidade muito altas em
populações humanas e animais. Surtos de sarampo e peste bovina ocorreram em um
mesmo período na Europa, Ásia e África entre os séculos XVII a XIX, durante esses
séculos, o sarampo foi endêmico na Europa. O primeiro registro de cinomose ocorreu
no Equador e no Peru em 1735. Podendo-se perceber que a ocorrência de doenças
provocadas pelo Morbillivirus em diferentes espécies como humanos, bovinos e caninos
ocorreram concomitantemente em diversos continentes, mostrando que o vírus da
cinomose é tem caráter pandêmico (UHL et al., 2019).
A tabela 1 mostra que uma grave epidemia de sarampo ocorreu em um momento
em que a cinomose se estabeleceu na América do Sul e na Europa, assim como a peste
bovina que se tornou endêmica em vários continentes. Os registros históricos de surtos
de cães com cinomose em um cenário endêmico de sarampo e peste bovina apontam
para uma compreensão ampla a respeito de patógenos multihospedeiros, que ameaçam
continuamente às populações humanas e animais (UHL et al., 2019).
A figura 1 descreve os momentos históricos em que ocorreram surtos e endemias
de doenças causadas pelo Morbillivirus, sugerindo que este patógeno se originou de um
6

ancestral comum e foi transmitido a várias espécies. Possivelmente houve uma


adapatação do Morbillivirus aos humanos após o primeiro surto em animais. O
desenvolvimento de resistência em pessoas diminuiu as taxas de morbidade e
mortalidade. Ao se registrar a ocorrência de cães com cinomose, em 1809 percebeu-se
semelhanças com a transmissão do sarampo e a susceptibilidade maior em filhotes.
(NAMBULLI et al., 2016).

Tabela 1: A epidemia generalizada de sarampo nas Américas precedeu as


primeiras epizootias de cinomose entre os séculos XVI a XVII

Séc. Séc. Séc. Séc.


Doença Local Países
XVI XVII XVIII XIX

Quito,
Cinomo Améric 1748,
Equador NRF NRF NFR
se a 1759
, Sul

Inglaterr
Europa NRF NRF
a

1761-64,
NRF NRF 1782-84, 1808
França
1799

Aleman
NRF NRF NRF 1834
ha

NRF NRF 1761-64 NRF


Irlanda

NRF NRF 1799 NRF


Itália
7

NRF NRF 1771 1820


Rússia

NRF NRF 1761 NRF


Espanha
1517,
Caribe,
Saramp Améric 1519-
Guatem NRF NRF NRF
o as 1523,152
ala
9
1628,163
Argenti
4- NRF NRF NRF
na
35,1645
1558,
1611,1612, Endemia
1585-
Equador 1618,1628,16 a partir Endêmica
1591,159
34-35,1645 de 1785
7
1531-34,
América 1604, 1613- Endêmic
1559-63 Endêmica
Central 17 a
1576-80
1611-
1531-33,
1614,1618, Endêmic
Peru 1557-62, Endêmica
1628, 1634- a
1585-91
35,1645
1713- 1802,1820,
1715, 1837,1848,
1727, 1861-65,
1533- 1729,173 1878-1879,
Estados 1635, 1657,
1533, 9-40, 1883-1884
Unidos 1687
1592-96 1747,
1759,
1772,
1788
1819, 1844,
1846, 1865
Europa Canadá NRF 1635, 1687 NRF
8

Endemia
1700-
Endemia,
Endemia em 1800,
União 1808, 1811-
Endêmic 1629-1700, 1740,
Européi 1812,
a 1665,1675 1762,
a 1839,1846,18
1751,
49, 1882,
1781,178
3,

Peste Améric Toda a


NRF NRF NRF NRF
bovina a região

Toda a
África NRF NRF 1726-65 1887-97
região

1609, 1616, 1709-


1800-1816,
União 1514, 1618, 22,1726-
1825-37,
Europa Européi 1559, 1625,1665, 65,
1844-1863-
a 1598 1673-74, 1769-
67, 1877
1682-83 1800

Fonte: Modificado de UHL et al., 2019.


9

Figura 1: Representação da distribuição global aproximada de Morbillivirus ao longo da história. (a)


Morbillivirus (azul) e Rinderpest morbillivirus (verde) são os mais antigos Morbillivirus que se
espalharam ao longo de antigas rotas comerciais (setas vermelhas).
(b) A Importação de Morbillivirus para o Novo Mundo e o vírus da cinomose canina (vermelho) para o
Velho Mundo durante a Era da Exploração.
(c) Propagação de Rinderpest morbillivirus para a África e Ásia devido ao movimento transfronteiriço de
gado e estabelecimento do primeiro Morbillivirus distribuído globalmente. Descoberta da peste de
ruminantes (laranja claro), peste bovina (laranja escuro) e Morbillivirus em cetáceos como as focas,
respectivamente. O desenvolvimento de vacinas atenuadas contra o Morbillivirus em diferentes espécies
trouxe um maior controle da doença em diversas partes do mundo.
10

(d) A descoberta do Morbillivirus felino (roxo), um novo membro proposto do gênero na Ásia e nos
Estados Unidos.
Determinação da sequência do Morbillivirus de morcego (azul claro com linha tracejada) a partir de
material clínico obtido no Brasil. O Morbillivirus expande o seu alcance geográfico na Ásia e África e é
isolado na Turquia e na China. O ressurgimento de Morbillivirus (azul com linha vermelha) em regiões
do mundo onde eram endêmicas.
A detecção de Morbillivirus em cetáceos (amarelo) ocorreu em uma faixa mais ampla de mamíferos
marinhos amplamente distribuídos. Após ocorrer a erradicação do Rinderpest morbillivirus, o uso da
vacina em bovinos foi suspenso. O Morbillivirus permanece globalmente distribuído (NAMBULLI et al.,
2016).

2.2 Etiopatogenia

O Morbilivírus canino da família Paramyxoviridae, causa doença sistêmica


grave e altamente contagiosa, que atinge carnívoros domésticos e selvagens (SATO et
al., 2012, LOOTS et al., 2017). As doenças infecciosas em geral são o resultado
evolutivo de complexa interação entre agentes infecciosos e seus hospedeiros, como
adaptação dos agentes às células hospedeiras, tropismo específico, neuroinvasividade,
resposta imune ao vírus, tropismo específico, entre outros fatores (VANDEVELDE &
ZURBRIGGEN, 2005).
O genoma do VCC tem 15.690 nucleotídeos de comprimento e contém seis
genes. Destes, dois são não estruturais e seis proteínas estruturais, que são codificadas
por RNAs mensageiros (PLATTET et al., 2007). Os Morbillivirus estão envoltos em
envelope lipoprotéico que possuem genoma de RNA em sentido negativo não
segmentado que codifica uma única proteína de matriz associada ao envelope.
O envelope consiste na nucleoproteína N e proteína M que está localizada na
superfície interna do envelope, exibindo duas glicoproteínas de superfície: a proteína de
fixação (H) e a proteína de fusão (F). O receptor celular para a proteína H “in vivo” não
foi determinado. Os Morbillivirus possuem, ainda, duas proteínas associadas ao RNA
polimérico (complexo polimerase), que são as fosfoproteína P e proteína grande L, e
uma proteína do nucleocapsídeo (N) que encapsula o RNA viral (VANDEVELDE &
ZURBRIGGEN, 2005; SATO et al., 2012; LOOTS et al., 2017).
11

A proteína de fusão (F) é uma glicoproteína clássica do tipo I, composta por 662
aminoácidos essenciais para a penetração e disseminação viral no hospedeiro. A
tradução da proteína F começa no primeiro códon de início, o AUG1, ou no segundo
códon, AUG61, gerando os pré-F0 AUG1 e pré-F0 AUG61, que são translocados para o
retículo endoplasmático e clivados entre os aminoácidos 135 e 136 por uma peptidase
de sinal celular, produzindo assim um peptídeo de 75 ou 135 aminoácidos, dependendo
do códon da tradução (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005; SATO et al., 2012;
LOOTS et al., 2017).
Para ocorrer a fusão de membrana, a proteína F sofre uma cascata de alterações,
a proteína F representa para a membrana plasmática uma estrutura potencialmente ativa
de fusão dependente do receptor e da hemaglutinina (H), a proteína F passa por
alterações conformacionais, que finalmente levam à fusão da membrana (PLATTET et
al., 2017).
a)
12

b)

Figura 2
A) A figura mostra a partícula viral com o envelope de lipoproteína, contendo o complexo
de ribonucleoproteína que consiste no nucleocapsídeo. No envelope, existem as
proteínas M, a proteína de fusão F e a hemaglutinina (H). O RNA polimerase viral
contém as proteínas L e P (Adaptado de SATO et al. 2012 e LOOTS et al., 2017).

B) As duas glicoproteínas, a proteína hemaglutinina (H) (amarela) e a proteína de fusão (F)


(verde) juntamente com a grande proteína L (roxo) constituem o complexo ribonucleoproteico (RNP)
(Adaptado de SATO et al. 2012 e LOOTS et al., 2017).

2.3 SLAM: O receptor do Morbillivirus e os mecanismos de entrada do vírus na


célula do hospedeiro

O SLAM (Molécula de ativação de linfócitos de membrana) atua como receptor


celular para o Morbillivirus (FUKUHARA et al., 2019). O SLAM é um membro do
subconjunto da superfamília das imunoglobulinas e possui dois domínios extracelulares
(loop V e loop C2) juntamente com uma região transmembranar e uma cauda
citoplasmática. A interação entre a proteína H do Morbillivirus e o domínio V da
molécula do SLAM nas células-alvo é responsável pela infecção por Morbillivirus
(YADAV et al., 2019).
Os Morbillivirus usam principalmente três tipos de receptores, que
desempenham uma função na especificidade do hospedeiro e no tropismo dos vírus nos
tecidos. A molécula de ativação de linfócitos de sinalização, o SLAM, é o principal
receptor celular para vírus em humanos, bovinos e cães, identificado pela primeira vez
em humanos como receptor de ativação de células T, B e células B induzidas após a
ativação (YADAV et al., 2019).
O SLAM humano é expresso seletivamente em tecidos linfóides, por isso o
SLAM humano apresenta tropismo tecidual. Os cães e os bovinos possuem uma
13

molécula de SLAM homóloga ao SLAM humano que atua como receptor celular para o
VCC e RPV, respectivamente (TATSUO & YANAGI, 2002).
Os mecanismos de entrada do Morbillivirus nas células hospedeiras são
importantes para determinar a sua característica de multi-hospedeiro e o tropismo de
tecido. Os Morbillivirus têm duas glicoporteínas, a hemaglutinina (H) e a proteína de
fusão (F) na superfície viral. Durante a invasão do vírus, a proteína H se liga ao receptor
de entrada do hospedeiro, o SLAM, que também é conhecido como CD150. O SLAM é
uma proteína específica de células imunes, expressa na superfície de timócitos,
linfócitos ativados, células dendríticas maduras e macrófagos (FUKUHARA et al.,
2019).
O receptor SLAM é considerado um determinante de imunossupressão e induz
mudanças conformacionais na proteína F, ocorrendo a fusão do vírus à membrana
plasmática das células imunes do hospedeiro. Durante a fusão, alguns aminoácidos da
proteína H são importantes para favorecer a ligação a nectina-4 que é expressa na
superfície celular, sendo responsável pela suscetibilidade da infecção pelo Morbillivirus
(MESSLING et al., 2005; FUKUHARA et al., 2019).
14

Figura 3: A cepa 5804PeH do VCC do tipo selvagem infecta células que expressam nectina-4 em
humanos e em cães. Os membros dos grupos de VCC e vírus do sarampo compartilham tropismo e
doenças comuns. O estudo sugere que a abundância de nectina-4 por ser um receptor de VCC, na
superfície celular está relacionada à sua susceptibilidade à infecção pelo VCC. As imagens de
fluorescência foram capturadas quatro dias após a infecção e sobrepostas com fases contrastantes; a
nectina-4 na linha celular correspondente sombreado com IgG; anticorpo nectina-4, nectina-4-vermelho
(NOYCE et al., 2013).
15

Figura 4: O CDV5804PeH de tipo selvagem infecta eficientemente células Vero que expressam a
nectina-4 do cão. As células Vero caninas expressam o SLAM. As nectinas-4 das MDCK (células renais
caninas) que expressam nectina-4 de cão e um plasmídeo no grupo controle, foram infectadas com a cepa
de CDV5804PeH. Fase de contraste e fluorescência: As imagens foram capturadas e sobrepostas para
visualizar a extensão da replicação do vírus, ocorrendo um aumento significativo no CDV5804PeH.
(Adaptado de NOYCE et al., 2013).

Durante muitos anos acreditou-se que o VCC se reproduzia no epitélio


respiratório antes de se disseminar, mas recentemente concluiu-se que o VCC infecta
macrófagos e células dendríticas das vias aéreas usando o SLAM como um receptor
celular. As células infectadas cruzam o epitélio respiratório e transportam a infecção
para os órgãos linfóides, ocorrendo a replicação viral. A nectina-4 é uma
imunoglobulina, conhecida como receptor de saída do hospedeiro, interage com alta
afinidade com a proteína de fixação viral através do seu domínio distal de membrana,
possibilitando a disseminação viral nas vias aéreas. (MÜHLEBACH et al., 2011).
Os Morbillivirus infectam as células que expressam CD46 e SLAM, mas
também infectam outras células através do receptor celular, nectina-4. As células que
expressam a nectina-4 são as células epiteliais, células da traquéia, brônquios, pulmões,
cavidade oral, faringe, esôfago, intestinos, fígado e bexiga urinária. A nectina é uma
16

família de moléculas de adesão, porém apenas a nectina-4 é um receptor epitelial para o


Morbillivirus (YADAV et al., 2019).
A nectina-4 apresenta glicoproteína transmembrana em sua estrutura com três
ectodomínios semelhantes, uma região transmembrana e uma cauda citoplasmática. É
expresso basolateralmente nas células epiteliais nas proximidades de linfócitos
infectados e células dendríticas e atua como receptor viral através de um mecanismo
semelhante à interação entre domínio V do SLAM com a proteína H do Morbillivirus
(YADAV et al., 2019).
O SLAM é um receptor eficiente para o VCC selvagem em culturas de tecidos
caninos. Em análises imunocitoquímicas, o SLAM se expressa de forma limitada no
SNC em comparação com tecidos linfóides, mostrando que provavelmente existem
outros receptores virais (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005). A transmissão do
Morbillivirus se dá através de aerossóis para o trato respiratório, e a primeira replicação
ocorre nos tecidos linfóides, causando grave imunossupressão de longa duração
(VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005; COSTA et al., 2019). O receptor SLAM no
sistema imunológico se correlaciona com a imunossupressão associada à infecção
citolítica mediada pelo Morbillivirus no tecido linfóide. Outros receptores são
responsáveis pela entrada do VCC na nectina-4, pois o receptor da célula epitelial
contribui para o multitropismo do Morbillivirus. O receptor SLAM se liga a proteína H
do vírus da cinomose em regiões específicas, que compreendem 500 a 550 aminoácidos
(COSTA et al., 2019).
Após seis dias de infecção, todos os tecidos linfáticos são acometidos e a
viremia é desenvolvida (KIM et al., 2001). O período de incubação é de
aproximadamente 1 a 4 semanas, dependendo do estado imunológico dos cães afetados
(AWAD, 2019). Os cães sem anticorpos contra o vírus da cinomose morrem em
aproximadamente três semanas após a infecção (KIM et al., 2001).
No início da infecção, o vírus da cinomose invade os macrófagos, trato
respiratório e posteriormente, acomete outros órgãos como o trato gastro-intestinal,
órgãos linfóides, bexiga urinária e o sistema nervoso central. As manifestações podem
ser subclínicas a letais, sendo que os principais sinais clínicos são febre, alterações
respiratórias, gastrointestinais e dermatológicas (ATHANASIOU et al., 2017).
17

O esgotamento de linfócitos, principalmente as células TCD4, em decorrência


do apoptose de células linfoides, na fase inicial, causa imunossupressão persistente,
podendo ocorrer infecções bacterianas secundárias. (BEINEKE et al 2009).
Durante a fase aguda da infecção, as células T são mais afetadas do que as
células B, enquanto as células CD8 + são menos afetadas e se recuperam mais rápido
em comparação com os linfócitos CD4. Após 10 dias da infecção, o VCC se replica por
tecidos epiteliais, causando comprometimento multisistêmico no trato respiratório, trato
gastro-intestinal e alterações dermatológicas (BEINEKE et al 2009; VANDEVELDE &
ZURBRIGGEN, 2005).
Ao se dirigir para o SNC, o VCC invade o encéfalo através de células
mononucleares infectadas, circulando pelo líquido cefalorraquidiano (LCR) e fundindo-
se com o revestimento ependimal dos ventrículos, causando lesões periventriculares e
subpiais. Ao afetar o SNC, determina a síndrome neurológica com lesões
desmielinizantes, que podem ocorrer em até 3 semanas do início da infecção. Os sinais
neurológicos podem ocorrer na ausência de sinais sistêmicos (VANDEVELDE &
ZURBRIGGEN, 2005).
O vírus pode causar danos ao cérebro, como a leucoencefalomielite
desmielinizante, e à medula espinhal, que induzem à manifestações neurológicas
crônicas imunomediadas, havendo níveis crescentes de moléculas de MHC classe II em
decorrência da permanência do vírus no tecido nervoso (BEINEKE et al 2009;
KLEMENS et al., 2019; RENDON-MARIN et al. 2019). A desmielinização ocorre
principalmente em astrócitos, ocorrendo a hipertrofia destas células, gliose isomórfica,
astrócitos reativos (gemistócitos) e, ocasionalmente, a formação de astrocítico sincicial
(KLEMENS et al., 2018).
18

2.2 Anatomia do sistema nervoso do cão

2.2.1 Neurônios

Os neurônios são as unidades de construção do sistema nervoso. Nos animais, os


órgãos receptores e efetores são separados e conectados por neurônios, que são células
altamente especializadas, cujas funções citoplasmáticas de excitabilidade e
condutividade são altamente desenvolvidas (DYCE et al., 2010).
Os neurônios possuem partes distintas, uma é a região central com o núcleo da
célula e numerosos tubos finos que irradiam da região central; o corpo celular; a soma e
o pericárdio que fazem parte da região central; os axônios e os dendritos que irradiam
da soma, que são os neuritos. O corpo celular origina um único axônio. Os dendritos
não ultrapassam 2 mm e se estendem do corpo celular terminando em filamentos finos
(BEAR et al., 2017).
O funcionamento do neurônio está relacionado a sua estrutura, o tamanho do
neurônio varia de poucos micrômetros a mais de 100 mm de diâmetro. O seu citoplasma
contém o retículo endoplasmático rugoso, sendo responsável pela síntese de proteínas, o
complexo de Golgi armazena as moléculas de transporte, libera as proteínas e faz a
síntese de neurotransmissores. Os neurônios demandam grande quantidade de energia e
por isso, possuem um alto número de mitrocôndrias (CATALA & KUBIS, 2013).
O neurônio receptor tem a função de receber o estímulo e transmitir a mensagem
codificada, sendo que o impulso é transmitido por todo o neurônio e ao final da cadeia o
neurônio motor transmitirá o estímulo a um músculo efetor ou uma célula glandular. O
dendrito é uma estrutura múltipla, e transmite os impulsos em direção ao pericário. O
axônio tem uma única origem, e transmite os impulsos para fora da célula. A célula
nervosa é, portanto, polarizada (DYCE et al., 2010).
Os dendritos formam a maior parte dos neurônios, eles são curtos, ramificados e
fazem parte da extensão do corpo celular, enquanto o axônio é uma longa extensão, cuja
origem está no corpo celular (CATALA & KUBIS, 2013).
Os neurônios se dividem conforme a localização do seu corpo celular, dendritos,
projeção axonal, características fisiológicas, padrão de expressão de genes e função. Os
RNA mensageiros (RNAms) expressos por células individuais podem ser quantificados
19

na escala de todos os RNAms expressos. Os axônios de alguns tipos de neurônios de


projeção que conectam uma região do cérebro a outra, podem percorrer longas
distâncias com padrões complexos de ramificação, permitindo a inervação de estruturas
distantes (DATTA et al., 2012).
A soma é a parte central e esférica do neurônio, contendo o núcleo que armazena
os cromossomos que contém o material genético. O produto final da expressão genética
são as proteínas. A síntese protéica ocorre no citoplasma (BEAR et al., 2017).
As semelhanças entre o cérebro de humanos e cães em relação ao
desenvolvimento, envelhecimento e algumas doenças neurológicas, tornam o cérebro
canino um modelo de estudo. As influências comportamentais e cognitivas da
morfologia do cérebro dos cães são resultados de vários fatores, como a domesticação.
O formato do crânio e do corpo são diferentes entre as raças, mostrando o grau de
girificação do córtex cerebral determinado pelo tamanho do cérebro. A forma da cabeça
está ligada ao tamanho do cérebro, a organização, posição, a parte sensorial e
comportamental (DATTA et al., 2012; CZEIBERT et al., 2020).
As células ganglionares diferem entre as raças com base no comprimento do
focinho, que está relacionado a visão binocular. A morfologia biomecânica de raças
braquicefálicas está relacionada a função de guarda, enquanto as raças dolicocéfalas são
bons corredores (DATTA et al., 2012).

2.2.2 Sistema Nervoso Autônomo

A distribuição anatômica do sistema nervoso autônomo é complexa, constituída


em sistema nervoso central (SNC), subdividido em encéfalo, medula espinhal,
neuroeixo e periférico (SNP) que abrange os troncos nervosos cranianos, espinhais e
autônomo com seus gânglios associados (DYCE et al., 2010).
O sistema periférico se desenvolve com característica de neurotransmissores,
sendo controlado por neurônios centrais. A atividade eferente autonômica tem a função
de responder as necessidades do organismo. O prosencéfalo e o tronco cerebral
coordenam informações eferentes autônomas com funções mentais superiores
(GIBBONS, 2019).
20

O sistema nervoso autônomo central abrange o prosencéfalo, tronco cerebral e


medula espinhal, que por sua vez coordena os segmentos simpático e parassimpático. O
tronco cerebral inferior é responsável pelas funções de circulação, respiração, função
gastro-intestinal e micção. O sistema do tronco cerebral superior (pontomesencefálico)
está relacionado as funções de dor e estresse (GIBBONS, 2019).
O sistema prosencéfalo inclui o hipotálamo para controle da homeostase e
adaptação às mudanças de temperatura corporal, além de osmolaridade, hipoglicemia,
ritmos circadianos, sono, excitação ou outras alterações ambientais. O prosencéfalo tem
a função de integrar as sensações de temperatura e dor (GIBBONS, 2019).

Córtex Córtex anterior

Hipotálamo Amígdala

Figura 5: Os sistemas do prosencéfalo envolvidos no controle autônomo. O córtex cingulado anterior,


amígdala e hipotálamo são os principais centros de controle do prosencéfalo (GIBBONS, 2019).

2.2.3 Sistema Nervoso Central

O sistema nervoso central (SNC) tem um sistema de barreira complexo com


mecanismos especializados para regular as reações imunológicas. As respostas do SNC
estão relacionadas com a localização anatômica (MASTORAKOS & MCGAVERN,
2019).
O parênquima do SNC não possui sistema de drenagem linfática. A barreira
hematoencefálica (BHE) e a barreira hemato-meníngea (BHM) controlam a entrada de
células, regulam a resposta imune e são mobilizadas em tecidos linfóides periféricos
(MASTORAKOS & MCGAVERN, 2019).
O encéfalo está alojado na cavidade craniana e é um órgão irregular, dividido
pelos hemisférios cerebrais semi-ovóide, separados por profunda fissura longitudinal e
21

do cerebelo por fissura transversa. Os hemisférios possuem giros (elevações) e sulcos


(depressões). O encéfalo não possui separação demarcada com a medula, havendo
continuidade entre eles. A porção caudal forma a medula oblonga, que termina em
proeminência transversa chamada de ponte que se une ao cerebelo (DYCE et al., 2010).
O mesencéfalo, na região dorsal, se mostra como duas colunas divergentes e os
pedúnculos cerebrais que continuam na localização dorsal são separados pelo sulco
interpeduncular. O prosencéfalo segue na frente com o hipotálamo, a hipófise está
ligada por um pedúnculo, o quiasma, que contém o nervo óptico. O prosencéfalo é
formado pelos hemisférios cerebrais com características ventrais em proeminência, os
lobos piriformes arredondados, de onde se origina os nervos cranianos, exceto o IV, par
troclear (DYCE et al., 2010).
22

Legendas:
A Giro pro reano N Sulco ectomarginal
B Sulco Pro reano O Giro Supra Sylvius
C Fissura de Sylvius P Sulco Supra Sylvius
D Sulco lateral rinal Q Giro Ecto Sylvius
E Pedúnculo olfatório R Sulco Ecto Sylvius
F Giro pré-cruzado S Giro Sylvius
G Giro pós-cruzado T Sulco pseudoSylvius

A Giro frontal I Giro marginal


B Giro em linha J Sulco supra-
reta esplenial
C Giro orbitário K Giro esplenial
D Sulco orbitário L Sulco esplenial
E Sulco cruzado M Giro
parahipocampal
F Giro subcaloso N Sulco Hipocampal
G Sulco subcaloso O Giro dentado
H Corpo caloso P Lobo piriforme

Figura 6: Reconstrução da superfície do cérebro canino. A localização do giro proreano, sulco coronal
(vermelho) e sulco ansate (azul) é indicado na vista dorsal. (B) Vistas lateral e medial do branco inflado,
com sulcos e giros marcados. As estruturas cinza escuro são os sulcos e as regiões cinza claro são os
23

giros. Nas superfícies rotuladas, os sulcos são coloridos em cores menos saturadas e os giros em cores
saturadas (DATTA et al., 2012)

2.2.4 Sistema Nervoso Periférico

O sistema nervoso periférico (SNP) é formado por fibras sensoriais aferentes e


eferentes, que inervam o músculo estriado esquelético, através da junção
neuromuscular. Os interneurônios da medula espinhal, tronco cerebral ou cérebro,
modulam a informação através da fibra eferente, respondendo o estímulo aferente
(CATALA & KUBIS, 2013).
Os corpos celulares dos nervos espinhais estão localizados nos gânglios da raiz
dorsal. Os nervos espinhais motores, formados pelo motor do axônio, possuem os seus
corpos celulares localizados no corno anterior, constituindo um sistema sob controle
voluntário. Os nervos cranianos, III a XII e III, VII, IX e X possuem fibras do sistema
somático e autônomo. Os nervos espinhais entram na medula pela raiz dorsal e saem
pela raiz ventral (CATALA & KUBIS, 2013).
O sistema nervoso periférico é constituído por neurônios motores, sensoriais
primários e autônomos que possuem terminações, fora do SNC. Estão associados a
células ganglionares satélite (células de Schwann).
24

Figura 7: Esquema resumido do Sistema Nervoso Periférico, mostrando a integração de seus


componentes com o SNC (JORTNER, 2010).

3. Neuropatogenia da cinomose

3.1 Os mecanismos de neuroinvasão do VCC

O VCC geralmente é transmitido por aerossol para o trato respiratório superior,


se replica em tecidos linfóides e afeta células de defesa imunológica. Alguns cães se
recuperam da infecção, outros animais podem desenvolver comprometimentos mais
graves, havendo disseminação para os tecidos epiteliais e para o SNC (GRIOT et al.,
2003).
A entrada do VCC no SNC ocorre predominantemente por meio da via
hematogênica, havendo a infecção das células ependimárias e subependimárias, através
25

do líquido cefalorraquidiano. A disseminação via nervo olfatório foi descrita em furões


infectados experimentalmente. O VCC atinge as células da meninge e pode ser
detectado nos capilares do SNC e endotélio venoso em 5 a 6 dias pós infecção cerebral.
O VCC infecta o plexo coróide e se dissemina para a substância branca em 10 dias após
a infecção. Alguns estudos relatam que o vírus atinge primeiro a substância cinzenta e
posteriormente a substância branca. As lesões dependem da cepa do vírus (BEINEKE et
al., 2009).

Figura 8: A ilustração representa o VCC se disseminando dentro do SNC. A seção transversal do


cerebelo indicada por setas azuis mostra a disseminação viral por meio de células meníngeas infectadas.
Os círculos pretos mostram a disseminação viral via leucócitos infectados e células endoteliais. As setas
amarelas apontam a disseminação viral via células epiteliais do plexo coróide infectadas e as setas
vermelhas se referem à propagação viral via células ependimárias infectadas (BEINEKE et al., 2009).
26

3.2 Estágio agudo da infecção neurológica da cinomose

Entre 16 a 24 dias de infecção pelo VCC, podem ser observadas as lesões


agudas, havendo por vacuolização focal da substância branca e infecção glial com
poucos astrócitos e macrófagos ativados. Os vacúolos crescem em número e tamanho
para formar uma placa com astrogliose e formação de células gigantes multinucleadas,
porém com poucos infiltrados mononucleares (BEINEKE et al., 2009).
Os cães afetados com cinomose no estágio inicial da doença devido a
imunossupressão podem apresentar uma resposta imunológica humoral e celular que
teria pouca interferência no desenvolvimento da lesão inicial e a maior parte do
comprometimento neurológico é causado pela atividade viral, porém mesmo na
ausência de resposta imunológica na fase aguda, os anticorpos IgM ocorrem nas
primeiras 2 semanas de infecção (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005).
Uma grande quantidade de células CD8 + estão presentes em lesões
desmielinizantes agudas no parênquima cerebral, causadas pela atividade do
Morbillivirus. A ativação de células da microglia pode desencadear a invasão de células
T no SNC (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005).
Na fase aguda da infecção do VCC a resposta imune não é eficaz durante as duas
primeiras semanas, porém as células CD8 estão presentes nas lesões desmielinizantes
no parênquima cerebral e no LCR. A ativação de células da microglia pode induzir a
proliferação de células T, no SNC. A atividade viral causa lesões na substância branca e
na cinzenta podendo ocorrer necrose, resultando em polioencefalomalacia
(CARVALHO et al., 2012).
As lesões na substância branca geram a desmielinização, na substância cinzenta
ocorre a infecção neuronal e necrose do tecido nervoso. A reatividade astrocítica ocorre
junto com a presença de inclusões citoplasmáticas e nucleares (CARVALHO et al.,
2012; DE NARDO et al., 2020).
A diminuição da síntese de mielina, ativação de células da microglia e disfunção
metabólica em oligodendrócitos infectados pelo VCC, contribuem nas lesões agudas no
SNC (GALÁN et al., 2014). Estudos de imuno-histoquímica mostraram a presença de
células imunes já em fase aguda, subaguda e em lesões não inflamatórias (BEINEKE et
27

al., 2009). As lesões subagudas com desmielinização ocorrem entre 24 a 32 dias após o
início da infecção (KLEMENS et al., 2019).
As lesões iniciais causadas pelo VCC no estágio agudo da doença, durante o
período de imunossupressão grave, são a desmielinização induzida pelo Morbillivirus.
A desmielinização ocorre durante o processo de replicação do VCC nas células gliais da
substância branca. A maioria das células infectadas são astrócitos, porém ocorre
também à infecção de oligodendrócitos, as células produtoras de mielina (GRIOT et al.,
2003).
A infecção aguda da substândia branca por VCC interfere em alterações
metabólicas em oligodendrócitos, favorecendo a desmielinização. Outros danos na
mielina são causados por fatores tóxicos, liberados por células da microglia.
(VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005).
As lesões agudas são caracterizadas por vacuolização, havendo edema nas
bainhas de mielina e hipercelularidade da substância branca em astrócitos e células da
microglia. Podem ser observados nesta fase, os corpos de inclusão eosinofílicos
intranucleares e / ou intracitoplasmáticos. Além de uma leve diminuição da densidade
da bainha de mielina por causa da vacuolização do neurópilo (GRIOT et al., 2003).
As lesões subagudas apresentam desmielinização, astrogliose com gemistócitos,
macrófagos / microglia ativados, células de gitter e linfócitos únicos no
neuroparênquima, mas sem inflamação perivascular (GRIOT et al., 2003).
Na fase aguda da cinomose, as lesões na substância branca, ativação de células
microgliais, progressão da reação imune e a desmielinização somadas a uma modulação
associada à doença da neurogênese hipocampal resultam em convulsões sintomáticas e /
ou epilepsia crônica nos cães acometidos, além disso, os cães podem desenvolver
encefalite aguda (GALÁN et al., 2014; VON RÜDEN et al., 2017).
28

3.3 Estágio crônico da infecção neurológica da cinomose

As lesões crônicas ocorrem entre 29 a 63 dias do início da infecção pelo VCC e


apresentam desmielinização e inflamações linfo-histiocíticas nos espaços
perivasculares, além de perda progressiva de reatividade em processos
oligodendrogliais em lesões por VCC e perda significativa da bainha de mielina. Os
mecanismos imunomediados, anticorpos anti-mielina, formação de imunocomplexos e
persistência da infecção pelo VCC contribuem para a desmielinização crônica (GALÁN
et al., 2014).
Nas células gitter ocorre a desmielinização e mielinofagia. A proteína S100
expressa em células da linhagem astrocítica e oligodendroglial, diminui nas lesões pelo
VCC. A leucoencefalite induzida se desenvolve progressivamente. Nas lesões
subagudas crônica a quantidade de células infectadas pelo VCC é reduzida em infecções
experimentais (GALÁN et al., 2014; KLEMENS et al., 2019).
As infecções crônicas apresentam malácia, redução de gemistócitos e de
astrócitos, gliose, inflamação severa, infiltrado e manguitos perivasculares compostos
de linfócitos e células plasmáticas, além de desmielinização focal, geralmente os cães
mais idosos apresentam maiores chances de desenvolver a encefalite crônica (GALÁN
et al., 2014; KLEMENS et al., 2019).
Ao ocorrer a infiltração do vírus, uma hipersensibilidade tardia mediada por
CD4 + e células T CD8 + citotóxicas, favorece a perda de mielina na fase crônica. A
leucoencefalomielite desmielinizante acontece quando há uma alteração entre o
equilíbrio das metaloproteínas da matriz e os seus inibidores (BEINEKE et al 2009).
As áreas de necrose liquefativa estão presentes em áreas de desmielinização com
forte presença de astrócitos gemistocíticos e perivasculares, indicando que a infecção se
tornou crônica. Estas células expressaram MIF, MMP-9, GFAP e MHC-II (WYSS-
FLUEHMANN et al., 2010)
As lesões crônicas apresentam uma desmielinização severa, podendo haver
preservação dos axônios ou lesões com necrose da bainha de mielina. Observa-se nessas
lesões um infiltrado perivascular de células mononucleares com proeminência de
29

macrófagos e mudanças astrogliais. Os corpúsculos de inclusão viral são observados


nessas lesões (VANDEVELDE et al., 1981).
A persistência viral no SNC induz mecanismos imunomediados na fase crônica
com leucoencefalomielite marcante. Os fatores que favorecem a persistência incluem
infecção não citolítica e pouca disseminação do VCC pela limitação de expor o antígeno
viral ao sistema imunológico local (BEINEKE et al., 2009).

Figura 9: Representação da patogenia das lesões crônicas na leucoencefalite


desmielinizante, após a infecção pelo VCC. A ilustração mostra a diminuição ou
ausência da expressão viral e um aumento do influxo de células CD8 +, CD4 + e B na
região perivascular.
Além disso, as células cerebrais periféricas mostram um aumento de MHC de classe II e
uma regulação positiva moderada a grave de IL-6, IL-8-, IL-12 e TNF-a (BEINEKE et
al., 2009).
30

3.4 Os mecanismos de defesa imunológica no SNC na neuroinvasão pelo VCC

Os astrócitos são as células presentes em maior quantidade no SNC e fornecem


suporte trófico para os neurônios (LIDDELOW et al., 2017; KLEMENS et al., 2019).
Os astrócitos e as suas terminações envolvem as células endoteliais
microvasculares da barreira hematoencefálica (BHE), mantendo essa barreira livre de
toxinas e substâncias estranhas ao cérebro. Nas infecções virais no SNC, os vírus ao
atravessarem a barreira hematoencefálica, lesam neurônios, ocorrendo a ativação glial e
a produção de citocinas como interferons do tipo I (IFNs), expressadas por astrócitos,
havendo o estímulo de células pró-inflamátorias (LIDDELOW et al., 2017; KLEMENS
et al., 2018).
A neuroinvasão viral leva a deleção de astrócitos e morte celular neuronal
imunopatológica (KLEIN et al., 2019). Durante a ocorrência de lesões neurais, os
astrócitos se modificam e formam uma cicatriz glial, sendo esse processo denominado
de astrocitose reativa (LIDDELOW et al., 2017; KLEMENS et al., 2018).
Os astrócitos expressam baixos níveis de MHC classe I, na infecção viral essa
produção aumenta, havendo o reconhecimento de células T. A micróglia ativada em
função semelhante aos astrócitos, altera a sua morfologia e regula a expressão de
receptores que serão responsáveis pela produção de quimiocinas de defesa de lesões no
SNC. A micróglia regula a cascata de complemento clássica, gerando um processo
patológico em nível cerebral (KLEIN et al, 2019).
A ativação do sistema imunológico é coordenada por células gliais como a
micróglia e os astrócitos, mostrando uma correlação entre a inflamação e a
neurodegeneração (HEPPNER et al., 2015). A atuação conjunta da micróglia com o
astrócito promove a defesa imunológica em invasões virais, pois os astrócitos fazem a
neuroproteção, regulação sináptica, reparo neuronal a fim de manter a integridade da
barreira hematoencefálica. As células da glia produzem fatores neurotróficos e citocinas
antiinflamatórias (KLEIN et al, 2019).
Fatores intrínsecos do SNC e doenças sistêmicas se correlacionam com a
neuroinflamação. As células como a microglia, células mieloides perivasculares e
outros elementos reativos como astrócitos, participam da reação inflamatória no SNC. A
31

ativação imunológica em doenças neuroinflamatórias pode promover a degeneração do


tecido nervoso. Desse modo, a terapia para doenças neurodegenerativas deverá ser
direcionada para a contribuição do sistema imunológico, que é ativo na doença primária
(encefalites) ou secundária a doenças sistêmicas e as alterações astrocíticas (HEPPNER
et al., 2015).
A isquemia e a neuroinflamação estimulam os astrócitos que regulam genes da
cascata do complemento, que se mostram destrutivos para as sinapses ao perderem
algumas funções astrocíticas habituais e passam a apresentar uma função neurotóxica,
destruindo neurônios durante uma doença neurodegenerativa (HEPPNER et al., 2015).
As sequelas neurológicas são um produto da persistência de RNA viral, prejuízo em
sinapses hipocampais, sinalização de resposta imunológica pelas células gliais,
liberação de citocinas antineurogênicas como IL-1β e pelos astrócitos, resultando em
alterações neurocognitivas no paciente (HEPPNER et al., 2015; SOUNG & KLEIN,
2018).
A desmielinização ocorre como uma sequela da ação do vírus e infiltração de
células T citotóxicas CD8, havendo uma regulação de citocinas pró-inflamatórias como
interleucina (IL) -6, IL-8, fator de necrose tumoral (TNF) -α e IL-12 (BEINEKE et al
2009).

3.5 Encefalite causada pelo Morbillivirus na cinomose

As lesões neurológicas causadas pelo vírus da cinomose estão relacionadas à


evolução das lesões no SNC quando a doença progride (VANDEVELDE &
ZURBRIGGEN, 1995). Os sinais clínicos da cinomose e o nível de comprometimento
da doença dependem da cepa do vírus, idade e estado imunológico do cão, sendo que as
lesões iniciais na mielina se desenvolvem durante um período de imunossupressão
(VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 1995; LEMPP et al., 2014).
A localização neuroanatômica da infecção viral irá interferir no quadro clínico e
nas alterações neurológicas (LEMPP et al., 2014). As proteínas do virion do VCC
possuem três proteínas do nucleocapsídeo, sendo a proteína do nucleocapsídeo (NP) de
ligação ao RNA uma fosfoproteína (P), uma proteína polimerase (L) e três proteínas,
32

uma proteína de matriz (M), uma proteína de fusão (F) e uma proteína hemaglutinina de
fixação (H) (PARDO et al., 2005).
A proteína H viral é responsável pela transmissão celular do VCC no SNC. A
transmissão do Morbillivirus pode ocorrer rapidamente através de junções comunicantes
e se espalhar pelos astrócitos (CARVALHO et al., 2012). A proteína H liga o vírus a um
receptor celular, gerando poros, independente da proteína F. A atividade do VCC ocorre
entre um complexo de fusão e um receptor viral, se espalhando por células da glia
(WYSS-FLUEHMANN et al., 2010).
Ao ativar a proteína F por polimerases específicas de tecidos, é gerado o
processo infeccioso. Existem 10% de variações nas seqüências de aminoácidos da
proteína H com reações biológicas nas células hospedeiras (PARDO et al., 2005). A
infecção da cinomose causa a leucoencefalite desmielinizante, sendo a principal
manifestação observada na cinomose seguida pela disseminação do vírus na substância
branca (SEEHUSEN et al., 2017).
Na leucoencefalite ocorre uma infiltração de células T citotóxicas CD8-positivas
e citocinas pró-inflamatórias, como as interleucina IL 6 e IL-8, fator de necrose tumoral
(TNF) -α e IL-12. A desmielinização ocorre em estágios avançados da doença, e
constitue uma diminuição da expressão da proteína viral e uma regulação positiva de
MHC de classe II, interferon-γ e IL-1, resposta imune dominada por linfócitos CD4 e
CD8 positivos, células plasmáticas e macrófagos (SEEHUSEN et al., 2017).
Os antígenos virais são demonstrados nas lesões iniciais. No início do curso da
doença, ocorre infecção de macrófagos do epitélio do plexo coróide que se desprendem
dos ventrículos e são depositados nas superfícies ependimárias, resultando em infecção
ependimal e desmielinização periventricular subsequente (SUMMERS & APPEL,
1994).
Durante a infecção no SNC pelo vírus da cinomose, ocorrem à maturação e a
plasticidade dos astrócitos, axonopatia primária e uma potencial regeneração mediada
por células de Schwann. A proliferação de citocinas, metaloproteinases de matriz e seus
inibidores, podem influenciar no grau da inflamação e distribuição do vírus pelo SNC.
Algumas cepas do CVD como a Snyder Hill podem causar polioencefalite aguda,
enquanto A75 / 17 e R252 causam predominantemente leucoencefalite desmielinizante
(SUMMERS & APPEL, 1994; PLATTET et al., 2007; LEMPP et al., 2014). A
33

desmielinização causada pelas cepas A75 / 17 e R252 produz uma doença


desmielinizante crônica semelhante à esclerose múltipla em humanos (PLATTET et al.,
2007).
O modelo da anatomopatologia da cinomose embasa estudos sobre a esclerose
múltipla, por se assemelhar no mecanismo de desmielinização. O acoplamento de
astrócito-astrócito e astrócito-oligodendrócito por junções gap é responsável pela
manutenção da homeostasia e sobrevivência do astrócito. A ablação genética de
conexina-30 e conexina-43, duas proteínas de conexina, que são as responsáveis pelo
par de junções gap oligodendrócito-astrócito, leva a astrogliose acentuada, vacuolização
da mielina e convulsões tônico-clônicas. As alterações observadas nas junções
comunicantes em astrócito-oligodendrócito contribuem para a gênese das convulsões
em casos crônicos (VON RÜDEN et al., 2017).
A neuroinvasão pode ocorrer por infecção de células epiteliais e endoteliais. A
cepa A75 / 17-VCC é considerada uma das mais virulentas e desmielinizantes,
infectando principalmente os astrócitos da substância branca (SUMMERS & APPEL,
1994; PLATTET et al., 2007; LEMPP et al., 2014).
O vírus se propaga pelo contato entre as células lateralmente de maneira seletiva,
acometendo principalmente os astrócitos. A cepa A75 / 17 VCC recombinante expressa
uma unidade de transcrição entre os genes M e F. A velocidade de transmissão entre as
células é variável. O VCC recombinante que expressa a proteína RFP infecta as células
por mecanismos não citolíticos (WYSS-FLUEHMANN et al., 2010).
Além disso, há também evidências de infecção primária de células endoteliais do
SNC contribuindo para a neuroinvasão, podendo ocorrer o comprometimento de células
da pia-máter à substância cinzenta subpial. Dentro do SNC, o vírus pode infectar células
do revestimento ependimal dos ventrículos, células gliais e neurônios. A invasão do
vírus pode ocorrer através de filamentos do nervo olfatório para os gânglios olfatórios e
subseqüentemente para estruturas mais profundas do SNC (LEMPP et al., 2014).
O processo de desmielinização está relacionado a vários fatores como as
alterações metabólicas em oligodendrócitos, impedindo-os de realizar as suas funções.
Nas áreas de desmielinização, os astrócitos se tornam ativados (WYSS-FLUEHMANN
et al., 2010).
34

As inclusões intranucleares não são comumente observadas em


oligodendrócitos. Na fase aguda da neuroinflamação, causada pelo Morbillivirus, ocorre
a morte de neurônios, ativação da microglia, gliose reativa e liberação de citocinas pró-
inflamatórias em áreas afetadas, ocorrendo um aumento de astrócitos e células da
microglia em áreas infectadas, desencadeando uma forte resposta imunológica local
(DE NARDO et al., 2020).
A deposição de imunocomplexos durante a ativação do sistema imunológico,
pode contribuir para a disseminação viral no endotélio do SNC, e a penetração viral
ocorre pelo LCR. O Morbillivirus pode invadir células endoteliais vasculares nas
meninges, células do plexo coróide do quarto ventrículo e células ependimárias do
sistema ventricular linear, uma vez que o vírus pode ser encontrado em grande parte no
plexo coróide. Os astrócitos são as células alvo para o VCC no SNC. As lesões
desmielinizantes são características da encefalite aguda e crônica (CARVALHO et al.,
2012).
Nos casos de infecção pelo Morbillivirus existe o comprometimento do SNC na
grande maioria dos casos, mesmo que o dano seja mínimo, sem que o paciente
apresente alterações neurológicas como mioclonia e ataxia, por exemplo, (SUMMERS
& APPEL, 1994).
A encefalomielite viral de curso agudo ou crônico é indicada pela presença de
interferon no LCR. Uma análise histopatológica mostra a gliose focal sugerindo que na
encefalite desmielinizante ocorra o predomínio de células gliais. Alguns estudos
mostram que nem todos os Morbillivirus são neuropatogênicos, essa é uma
característica predominante nas infecções da cinomose em cães, animais marinhos e no
sarampo em humanos (SUMMERS & APPEL, 1994).
Os sinais neurológicos dependem da distribuição do vírus pelo SNC. Esta
disseminação viral depende da resposta celular e humoral do paciente. Uma resposta
imunológica eficiente é capaz de eliminar os vírus dos tecidos parenquimatosos. Os cães
podem apresentar sinais clínicos de rigidez cervical, convulsões, sinais cerebelares e
vestibulares, bem como paraparesia ou tetraparesia com ataxia sensorial. Em nível
histológico, percebe-se polioencefalite e leucoencefalomielite desmielinizante.
(BEINEKE et al., 2015).
35

Alguns animais podem se recuperar de forma lenta e desenvolver uma doença


crônica ou recidivante com progressão das lesões desmielinizantes causadas por reações
imunopatológicas (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 1995).

3.6 A função imunológica das células da microglia e dos oligodendrócitos, na


encefalite pelo VCC

As células da microglia representam entre 5 a 20% da população de células glias


do SNC. Durante um evento patológico, as células da microglia progridem do estado de
repouso para a ativação, ocorrendo a proliferação, migração e expressão de moléculas
de superfície, sendo responsáveis pela defesa do SNC contra agentes invasores e células
neoplasias, além de participar na recuperação do sistema nervoso central frente a uma
doença (STEIN et al., 2006).
A entrada de células imunes é limitada pela barreira hematoencefálica (BHE) e
por células endotelias, microglia e astrócitos. A microglia e os astrócitos são altamente
reativos frente a estímulos inflamatórios e infecciosos. As células da microglia
desempenham um papel importante na imunovigilância do SNC por ser ativada nos
estágios iniciais de respostas às lesões, precedendo as reações de outras células
nervosas. As ações sinérgicas da microglia e dos astrócitos promovem o reparo tecidual
após as lesões e envolvem o controle da BHE, a entrada de células sanguíneas, a
remoção de citocinas pró-inflamatórias e a sua regulação (LEMOS et al., 2008).
As células da microglia têm função semelhante à dos macrófagos como a
fagocitose, modulação de células T, produção de citocinas, quimiocinas, oxigênio
reativo e espécies de nitrogênio. As células da microglia também apresentam antígenos
de MHC, classe I e II e são ativadas durante a infecção pelo VCC, expressando
imunofenótipos e participando ativamente na infecção pelo Morbillivirus
(VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005).
Os oligodendrócitos apresentam uma discreta participação na infecção por
VCC, em contraste com os astrócitos. Não há evidências de que os oligodendrócitos
sofram apoptose na infecção por VCC. A transcrição viral que ocorre nessas células
36

pode ter alguma interferência na manutenção de membranas de mielina


(VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005).
A ativação de células microgliais com liberação de fatores tóxicos pode induzir
danos à bainha mielina. As células microgliais expressam MHC, moléculas de adesão,
atividade fagocítica e produção de radicais de oxigênio em distúrbios desmielinizantes.
Esta intensa atividade das células da microglia pode ocorrer em infecções pelo VCC. Os
danos em células de oligodendrócitos podem estar relacionados à ativação de células da
micróglia (VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005).

3.7 Manifestações neurológicas causadas pela cinomose

Alguns estudos mostram que em torno de 30% dos cães infectados pelo VCC
desenvolvem alterações neurológicas que podem ser observadas de 1 a 6 semanas após
o início dos sinais clínicos. Após a replicação do vírus nos tecidos linfóides, se a
resposta imunológica não for satisfatória, ocorre uma viremia secundária resultando na
disseminação do vírus às células epiteliais de vários órgãos, causando doenças
multissistêmicas incluindo o SNC, ocorrendo assim polioencefalopatias que causam
disfunção do prosencéfalo (GREEN et al., 2020).
O VCC invade os astrócitos, microglia, oligodendrócitos, neurônios, células
ependimárias, células do plexo coróide e oligodendrócitos, levando à desmielinização.
Os astrócitos são os mais afetados pelo Morbillivirus, e as alterações neurológicas da
cinomose ocorrem como resultado da desmielinização aguda ou crônica com manguito
perivascular de linfócitos, células plasmáticas e monócitos (GALÁN et al., 2014). Os
sinais vestibulares podem ser observados com lesões nos pedúnculos cerebelares
(AMUDE et al., 2007).
A forma neurológica da cinomose apresenta algumas manifestações clínicas que
podem ocorrer isoladamente ou combinadas, tais como a mioclonia, ataxia, convulsão,
paraplegia, retenção urinária, rigidez muscular, atrofia muscular, pressão da cabeça
contra objetos, disfagia e incontinência urinária. A mioclonia do temporal e de
músculos dos membros anteriores seguida de convulsão, opistótono, tremores,
37

movimentos de goma de mascar da boca e movimentos de pedalagem (SILVA et al.,


2007; GALÁN et al., 2014; GREEN et al., 2020).
As manifestações posturais e motoras nos quadros de cinomose são a paraplegia,
tetraplegia progressiva parcial ou completa, sinais vestibulares, demência, inclinação
lateral da cabeça, alterações na função do neurônio motor inferior e hiperestesia,
ausência de propriocepção consciente e ausência de reflexo de retirada após estímulo
doloroso (SILVA et al., 2007; GALÁN et al., 2014; GREEN et al., 2020).

3.8 Síndromes neurológicas decorrentes do VCC

As síndromes neurológicas decorrentes do VCC incluem a encefalomielite por


cinomose em cães imaturos, encefalomielite por cinomose multifocal em animais
maduros, encefalite de cães idosos (ODE), encefalomielite recorrente crônica e
encefalite pós-vacinal da cinomose. A etiologia dessas síndromes envolve o VCC, a
idade dos cães e a localização neuroanatômica das lesões neurológicas (HEADLEY et
al., 2009).

3.9 Encefalite do cão idoso

A ODE é uma síndrome de ocorrência rara e grande parte das manifestações


neuropatológicas foi reproduzida experimentalmente. A patogênese da ODE não está
totalmente elucidada, e o diagnóstico da ODE é confirmado por achados
histopatológicos no encéfalo, histórico, alterações no exame neurológico e isolamento
viral através do exame de RT-PCR (HEADLEY et al., 2009).
A primeira descrição de ODE encefalite foi publicada em 1942, no qual foi
relatado que 6 cães com idades entre 2 a 6 anos apresentaram extensa proliferação de
pequenos vasos nas camadas de células piramidais do córtex, necrose perivascular,
focos de hemorragia perivascular, corpúsculos de inclusão em 3 desses cães que
estavam com uma encefalite mais grave. Observou-se incoordenação motora, andar em
círculos, dismetria, rigidez ao andar, dificuldades na marcha e distúrbios visuais
(ADAM et al., 1975).
38

As alterações clínico-patológicas de sinais neurológicos corticais progressivos,


infiltrado perivascular grave multifocal e encefalite linfoplasmática parenquimatosa
envolvendo principalmente o cérebro e o tronco encefálico, são lesões características de
ODE. Os cães acometidos podem não apresentar evidências de infecção aguda
subclínica pelo VCC, contudo a infecção pelo VCC é persistente no cérebro e os
anticorpos neutralizantes do vírus podem ser encontrados no soro sanguíneo e no
líquido cefalorraquidiano (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).
As mudanças comportamentais comuns são incoordenação motora, andar
compulsivo e em círculo, podendo ocorrer convulsões. O exame neurológico pode
mostrar déficits de reações posturais, circulação compulsiva, cabeça sendo pressionada
contra objetos, estrabismo e dificuldade para andar (ADAM et al., 1975; HEADLEY et
al., 2009).
A ODE pode representar os efeitos cumulativos da encefalite pelo VCC crônica
ou subclínica em estágio terminal, havendo um distúrbio neurológico progressivo e
predominantemente cortical em cães adultos, ou ainda, pode ter características típicas da
infecção no SNC por vírus do tipo selvagem (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).
A ODE pode afetar cães adultos com históricos de vacinação completa ou
ocorrer a reinfecção de cães imunes por VCC do tipo selvagem com subsequente
imunomediação rápida a supressão da produção de vírus extracelular dentro do SNC,
podendo desenvolver a ODE. Algumas cepas do Morbillivirus podem ser
indistinguíveis do vírus virulento de tipo selvagem por métodos diagnósticos de rotina,
podem causar infecção persistente do SNC e ODE em virtude de determinantes de
virulência únicos e não identificados (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).
Em avaliação macroscópica do encéfalo, podem ser observadas lesões no córtex
frontal, núcleo basal, lobo piriforme, rostral, tálamo, substância branca subcortical,
corpo caloso, corona radiata e cápsula interna (HEADLEY et al., 2009).
Na histopatologia, observa-se principalmente a perda de demarcação distinta
entre a substância cinzenta e branca, havendo rarefação severa da substância branca e
cinzenta do parênquima associada a infiltrado inflamatório perivascular
linfoplasmocitário, proliferação de componentes gliais, corpúsculo de inclusões
intranucleares e intracitoplasmáticas em astrócitos, necrose de neurônios no córtex
cerebral, astrocitose e desmielinização da substância branca (HEADLEY et al., 2009).
39

Pode acometer cães a partir de 6 anos, porém a ODE não é ocasionada


naturalmente como resultado de encefalite aguda multifocal, pois existem lesões
cicatriciais inativas no cérebro de cães maduros com encefalite multifocal crônica, e o
cerebelo de cães com ODE não apresentou lesões, segundo os relatos da literatura sobre
o assunto (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).
As áreas crônicas de desmielinização estão presentes na ODS com distribuição
angiocêntrica proeminente da inflamação, se diferindo da cinomose desmielinizante
multifocal. Já foi estudado 1 cão com ODS em que a desmielinização do SNC não foi
associada a astrócitos infectados por vírus ou macrófagos, como é o caso das lesões
desmielinizantes agudas. Esses astrócitos foram associados à infiltração de linfócitos,
células plasmáticas e monócitos negativos para vírus, porém esse caso é o único relato
na literatura em que as lesões desmielinizantes eram negativas para o vírus (AXTHELM
& KRAKOWKA, 1998).
Além da encefalite, as lesões sistêmicas incluem lesões pulmonares, edema,
congestão, hemorragia e enfisema. Em decorrência do comprometimento sistêmico
gerado pelo VCC, a traquéia e pulmões podem ser afetados, sendo observadas
alterações “pós-mortem” como edema traqueal, pulmões com focos hemorrágicos e
bronquite, principalmente (HEADLEY et al., 2009).
Em cães com ODS, a inflamação angiocêntrica e a desmielinização possuem um
padrão morfológico mais semelhante à encefalite alérgica experimental em cães do que
a encefalite causada pelo VCC. Alguns estudos sugerem que o dano ao tecido do SNC e
a desmielinização podem ser resultado dos efeitos de células T e B específicas de vírus
infiltradas e citocinas inflamatórias (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).
A encefalite viral nas células parenquimatosas de cães com ODE pode ser uma
característica da ODE, porém existem relatos de manifestações virais de infecção com
corpos de inclusão, infecção em células astrogliais, células inflamatórias e
oligodendrócitos (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).
As alterações patológicas da ODE podem ser utilizadas para estudar doenças em
humanos como esclerose múltipla, panencefalite esclerosante subaguda e neuromielite
óptica pela semelhança de achados histopatológicos como a presença de infiltrado
perivascular com linfócitos, células plasmáticas e desmielinização. Os cães com ODE
apresentam uma encefalite crônica (ADAM et al., 1975).
40

Apesar de existirem algumas hipóteses para a etiopatogenia da ODE, faltam


provas sufucientes para confirmação dessas teorias, pois não é possível reproduzir
experimentalmente a ODS satisfatoriamente devido à incapacidade de excluir fontes
múltiplas de infecção por VCC ou mesmo a influência de outros agentes na patogênese
da ODE (AXTHELM & KRAKOWKA, 1998).

3.10 Alterações histopatológicas do Sistema Nervoso Central de cães com


encefalite por cinomose

A encefalite induzida pelo VCC pode se manifestar de forma aguda, subaguda


ou crônica, e raramente como uma polioencefalite. As lesões encefálicas causadas pelo
VCC ocorrem principalmente no cerebelo, trato óptico, medula oblonga, pedúnculo
cerebral, medula espinhal e, com menos frequência, na substância branca subcortical,
fórnice, cápsula interna e corpo caloso. A classificação das lesões encefálicas e a
progressão da doença dependem da cepa do vírus, estado imunológico e idade do
hospedeiro (ULRICH et al., 2014).
Nos primeiros 10 dias da infecção pelo VCC, o vírus presente no líquido
cefalorraquidiano se dissemina para a substância branca. Estudos mostram que a
disseminação do VCC no SNC perfaz uma fase breve da doença na substância cinzenta
antes do desenvolvimento da leucoencefalomielite desmielinizante, referindo que a
sequência de entrada do VCC no SNC se inicia causando comprometimento da
substância cinzenta e posteriormente lesões na substância branca. Porém, essas
alterações dependem da cepa do vírus envolvido (BEINEKE et al., 2009).
Nas lesões agudas, que ocorrem entre 16 a 24 dias após a infecção, predominam-
se acúmulos focais de células gliais antígeno-positivo do VCC acompanhados por
vacuolização da substância branca, aumento do número de astrócitos, gliose reativa e
liberação de citocinas pró-inflamatório, gerando uma alta resposta imunológica e morte
de neurônios (ULRICH et al., 2014; DE NARDO et al., 2020).
As lesões subagudas com desmielinização, mas sem inflamação, podem ocorrer
entre 24 a 32 dias após a infecção. As lesões subagudas às crônicas com
desmielinização e inflamação ocorrem após 29-3 dias da infecção e são caracterizadas
por números reduzidos do VCC. Na fase crônica ocorre o predomínio de polioencefalite
41

desmielinizante e leucoencefalomielite (BEINEKE et al., 2015; DE NARDO et al.,


2020).
A desmielinização, disseminação de células mononucleares perivasculares,
hiperplasia de astrócitos e proliferação de microglia na substância branca na fase
crônica são resultados da expressão do complexo principal de histocompatibilidade de
classe II (MHC-II) e da infiltração maciça de células B, CD8 +, CD4 que ocorre
principalmente na microglia. Os astrócitos também contribuem para a formação do
MHC-II que leva a um aumento da expressão da Proteína Ácida Fibrilar Glial (GFAP)
no neurópilo junto às áreas desmielinizadas do cerebelo e tronco cerebral (STEIN et al.,
2006; ORLANDO et al., 2008; DE NARDO et al., 2020).
As células antígeno-positivas e manguitos linfo-histioplasmacíticos
perivasculares distintos de várias camadas de espessura e a desmielinização primária na
leucoencefalite induzida pelo VCC inclui danos aos oligodendrócitos, desmielinização
primária com a liberação de mielinotóxicos pelos macrófagos, espécies reativas de
oxigênio e enzimas proteolíticas, como a matriz metaloproteinases e astrócitos ativados
(ULRICH et al., 2014).
42

Figura 10: Alterações anatomopatológicas características dos diferentes subtipos de


leucoencefalite causadas pelo VCC. Coloração: azul-cresil rápido Luxol. Barras de escala = 200 mm
(ULRICH et al., 2014).
a) O cerebelo dos cães não infectados, sem alterações histológicas.
b) O cerebelo de cães afetados por leucoencefalite aguda por VCC. A figura apresenta
alterações em astrócitos e microgliose focal (seta) e ocasionalmente poucas bainhas de
mielina vacuoladas (ULRICH et al., 2014).
c) O cerebelo de cães afetados por VCC na fase subaguda, apresentando leucoencefalite
com desmielinização, mas sem inflamação. A substância branca está desmielinizada
focalmente (asterisco) combinada com astro e microgliose (seta) (ULRICH et al.,
2014).
d) O cerebelo de cães afetados por leucoencefalite crônica por VCC com desmielinização
e com inflamação apresentou substância branca desmielinizada focalmente (asterisco),
combinada com astro- e microgliose (seta), bem como infiltrados inflamatórios
perivasculares (ponta de seta) (ULRICH et al., 2014).

A cepa Snyder Hill geralmente afeta os neurônios, induzindo a polioencefalite e


a cepa R252 e a cepa A75-17 causam lesões nas células da glia e leucoencefalomielite
desmielinizante (BEINEKE et al., 2009). Estudos “In vitro” mostraram que as cepas
43

mais virulentas do VCC, como a A75-17, o Snyder Hill, o Rockborn e a Cepa


Onderstepoort, podem infectar astrócitos, microglia, fibroblastos e macrófagos, sendo
que os macrófagos são as primeiras células a serem infectadas (ORLANDO et al.,
2008). O VCC afeta 95% dos astrócitos e pode causar desmielinização na substância
branca, infecção neuronal e necrose do tecido nervoso na substãncia cinzenta
(VANDEVELDE E ZURBRIGGEN, 2005; DE NARDO et al., 2020). A reatividade dos
astrócitos pode gerar inclusões citoplasmáticas e nucleares (VANDEVELDE E
ZURBRIGGEN, 2005; BEINEKE et al., 2015).
44

Figura 11: Fotomicrografias do cérebro de cães com cinomose. Coloração: Hematoxilina e


Eosina (DE NARDO et al., 2020).
A) A área de desmielinização na substância branca adjacente ao quarto ventrículo (*, bar = 200
μm) DE NARDO et al., 2020).
B) Presença de numerosas inclusões acidofílicas pleomórficas no citoplasma de astrócitos
reativos (setas, barra = 20 μm) DE NARDO et al., 2020).
C) Área de necrose liquefativa rica em células Gitter (células fagocíticas derivadas de monócitos
da circulação sanguínea, e em menor parte da micróglia residente) (setas, barra = 20 μm) DE NARDO et
al., 2020).
D) Manguitos perivasculares e hiperemia vascular em no neurópilo (setas, barra = 50 μm) DE
NARDO et al., 2020).
45

Figura 12: A figura mostra a apresentação histológica da substância branca cerebelar de cães do
grupo controle e com cães com cinomose. Coloração: hematoxilina e eosina (HE) A – A ′ ′ ′) e violeta
azul-cresil rápido de luxol (LFB / KEV) (B – B ′ ′ ′).
Grupo 1: O animal do grupo controle apresenta a substância branca intacta.
Grupo 2: Lesão aguda com hipercelularidade e vacuolização. (A ′, B ′)
Grupo3: Lesão desmielinizada subaguda com hipercelularidade, astrócitos gemistocíticos (seta),
células gitter (cabeça de seta) e a coloração LFB / KEV intralesional diminuída.
Grupo 4: Lesão subaguda a crônica com cufs perivasculares marcados, astrócitos gemistocíticos
(setas) e desmielinização da substância branca. Asterisco: vaso sanguíneo (A – A ′ ′ ′) Barra de escala =
50 µm. (B – B ′ ′ ′), barra de escala = 200 µm. (KLEMENS et al., 2019).

Figura 13: O fragmento do lobo parietal direito de um cão, macho, SRD, adulto. A seta azul aponta um
infiltrado de células inflamatórias mononucleares, sugestivas de linfócitos, na região encefálica.
46

Coloração H.E., aumento no microscópio de 400 x. (Paciente do setor de Moléstias Infecciosas (MI),
Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) -Unesp, Botucatu, 2021).

Figura 14: Imagem de um cão, macho, SRD, adulto. O fragmento do lobo parietal esquerdo mostra perda
de substância branca, neurônios vermelhos por isquemia e degeneração neuronal. (Paciente do setor MI,
FMVZ-Unesp, Botucatu, 2021).
47

Figura 15: Imagem de um cão, macho, SRD, adulto. O fragmento do lobo parietal esquerdo apresentando
astrócitos em desmielinização intensa e infiltrado linfocitário no lobo parietal. Coloração H.E. (Paciente
do setor MI, FMVZ-Unesp, Botucatu, 2021).

Figura 16: Imagem de um cão, macho, SRD, adulto. O fragmento do lobo parietal esquerdo apresenta
infiltrado linfocitário de células mononucleares dentro do vaso, lesão neuronal por hipóxia (neurônio
vermelho). Coloração H.E. (Paciente do setor MI, FMVZ-Unesp, Botucatu, 2021).
48

3.11 Alterações histopatológicas do Sistema Nervoso Central de doenças


com mecanismos de desmielinização semelhantes à cinomose

A encefalite associada à desmielinização causada pelo Morbillivirus na


cinomose, com danos em macrófagos, microglia, oligodendrócitos e astrócitos é
utilizada como modelo experimental para pesquisas de doenças como
Alzheimer, esclerose múltipla, esclerose amiotrófica lateral, leucodistrofias,
deficiência de enzimas lisossomais, epilepsia, malformações corticais
(lissencefalia e polimicrogiria), demência, lesões focais, doença de Parkinson,
encefalite autoimune, paralisia microglial, encefalomielite desmielinizante
aguda, neuromielite óptica, entre outras (FREDERICK & CAMERON, 2016,
GUERRERO & SICOTTE, 2020, DATTA et al., 2021).
Uma melhor compreensão das atividades das células da microglias e a
sua ativação em processos inflamatórios complexos, alidos a fagocitose de
mielina, apresentação de antígeno às células T, ação de macrófagos periféricos,
linfócitos T e liberação de citocinas pró-inflamatórias em lesões ativas podem
auxiliar em estudos de doenças neurodegenerativas (GUERRERO & SICOTTE,
2020).
A esclerose múltipla (EM), por exemplo, é uma doença desmielinizante
inflamatória crônica do SNC com lesões na substância cinzenta e branca,
havendo neurodegeneração em todo tecido cerebral, com remielinização
incompleta e neurodegeneração. O tratamento visa o controle dos mecanismos
imunológicos nos estágios iniciais da doença (LASSMANN, 2018, TORRE-
FUENTES et al., 2020).
Na EM, assim como na cinomose, o processo inflamatório produz lesões
teciduais com presença de infiltrados inflamatórios focais nas meninges e nos
espaços perivasculares, que induzem a desmielinização ou neurodegeneração
direta ou indiretamente por meio da ativação da microglia. As lesões oxidativas
e o dano mitocondrial levam a hipóxia (LASSMANN, 2018).
As reações imunopatológica de células da astroglia produzem a
desmielinização e a neurodegeneração no cérebro com EM, formando uma
cicatriz glial. Na substância branca formam-se placas desmielinizantes focais,
49

havendo perda axonal e na substância cinzenta, no córtex, gânglios da base e


tronco encefálico, ocorrem neurodegeneração difusa (LASSMANN, 2018).

Figura 17: Alterações patológicas no cérebro de um paciente com esclerose múltipla (EM)
secundária progressiva. As lesões desmielinizadas focais estão presentes na substância branca
(A). Há extensa desmielinização subapical cortical. (B). Em contraste com o padrão normal de
mielina no córtex cerebral, como mostrado em C, a perda completa de mielina nas lesões
subpiais (D). Placas desmielinizadas na substância branca podem aparecer como lesões
desmielinizantes com uma baixa densidade de bainhas finas de mielina, visível por
imunocitoquímica para proteínas de mielina ou como placas de sombra remielinizadas (G e H)
(LASSMANN, 2018).
50

3.12 Diagnóstico:

O diagnóstico da cinomose depende do histórico do paciente, sinais clínicos e


exames complementares. O VCC possui alta morbidade e a transmissão se dá através do
contato direito com cães doentes, fluidos orais, respiratórios e oculares, além de
exsudatos contendo o patógeno. Na fase aguda da infecção, as excreções como fezes e
urina podem conter o vírus que é eliminado por até 90 dias em cães doentes. Os caninos
não vacinados ou com histórico de vacinação incorreto podem transmitir a doença,
inclusive ocorrendo a transmissão interespécies (LOOTS et al., 2017).
Os sinais clínicos dependem da gravidade, cepa viral, idade do hospedeiro e
estado imunológico. Uma resposta imune deficiente resulta em sinais inespecíficos
como perda de apetite e febre. O VCC pode persistir por longos períodos nos neurônios,
podendo causar lesões na úvea, urotélio e pele, como hiperceratose (ATHANASIOU et
al., 2017). Se a infecção ocorrer no início do desenvolvimento, antes da erupção da
dentição, pode ocorrer hipoplasia do esmalte dentário como resultado da infecção nos
botões dentários e ameloblastos ((VANDEVELDE & ZURBRIGGEN, 2005; LOOTS et
al., 2017).
Os cães acometidos podem apresentar quadro agudo sistêmico e
comprometimento nervoso, além da forma crônica. No quadro agudo que ocorre entre 2
a 3 semanas da infecção, o vírus se replica pelo organismo causando sinais clínicos
graves como febre, secreção oculonasal mucopurulenta, manifestações respiratórias
como rinite mucopurulenta, pneumonia intersticial e necrosante, bronquiolite,
broncopneumonia supurativa devido a infecções secundárias, tosse, dispnéia, depressão,
anorexia, vômito e diarréia. Os sinais neurológicos podem ocorrer junto com os sinais
sistêmicos (SILVA et al., 2007; BEINEKE et al., 2009; MAHAJAN et al., 2018).
Em relação ao comportamento dos cães afetados, percebe-se ambulação em
círculos, sonolência, vocalização, agressividade, inquietação, incapacidade de
reconhecer os seus tutores e automutilação. Pode ocorrer ainda, sialorréia, retenção
urinária, rigidez muscular, atrofia muscular, pressão da cabeça contra objetos, disfagia e
incontinência urinária (SILVA et al., 2007).
Outros sinais clínicos de mielopatia com alterações na função do neurônio motor
inferior e hiperestesia na infecção aguda por VCC são raros, mas podem ocorrer sendo
51

observados a claudicação, a hiperestesia, a ausência de propriocepção consciente e a


ausência de reflexo de retirada após estímulo doloroso (GREEN et al., 2020).
A cinomose pode evoluir para uma doença grave em cães. (ATHANASIOU et
al., 2017). O diagnóstico clínico de encefalomielite por cinomose pode ser mais
complexo na ausência de sinais extraneurais. O comprometimento do sistema nervoso
inclui manifestações em cães idosos e em cães jovens (BEINEKE et al., 2009;
MAHAJAN et al., 2018; VON RÜDEN et al., 2021).
As manifestações neurológicas mais comuns são mioclonia, nistagmo, ataxia
postural, opistótono, tremores, movimentos de pedalagem, déficits de reação,
convulsões focais como os "ataques de goma de mascar" e/ou convulsões generalizadas,
paresia, tetraparesia, plegia, paralisia, déficits proprioceptivos, movimentos circulares,
mudanças comportamentais e disfunção vestibular, levando o paciente a óbito ou
gerando sequelas neurológicas crônicas, como uma mioclonia persistente e/ou
convulsões focais ou generalizadas. (BEINEKE et al., 2009; MAHAJAN et al., 2018;
VON RÜDEN et al., 2021).

3.13 Diagnóstico laboratorial

Para haver uma melhor avaliação prognóstica, o diagnóstico precoce é essencial


para diferenciar de outras doenças infecciosas, principalmente quando o paciente
apresenta sinais neurológicos. Os materiais biológicos a serem coletados no estágio
inicial da doença como as secreções nasais e oculares, podem fornecer um material
biológico para a triagem dos animais infectados (MAHAJAN et al., 2018).
Os sinais clínicos que caracterizam febre, prostração e inapetência podem
sugerir a coleta de sangue e urina. Os esfregaços conjuntivais, vaginais, lavados
traqueais e sedimento de urina são úteis no diagnóstico final através de métodos como a
imunofluorescência direta, porém esse método não é o mais confiável, pois pode dar
resultados falso-negativos (MAHAJAN et al., 2018). A urina é um meio biológico em
que pode ser pesquisado o RNA viral pelo método do PCR. (ATHANASIOU et al.,
2017).
52

Os métodos que podem ser utilizados são a Imunocromatografia direta (IC) para
a detecção de antígeno da cinomose canina, Quantitative Real Time-PCR (RT-PCR) e
PCR nested, histopatologia do SNC, isolamento viral, Elisa, imunoflourescência,
Análise do fluido cérebro-espinhal e hematologia. As taxas de positividade mais altas
são relatadas nos exames de Elisa, IC e RT-PCR (COSTA et al., 2019).
No Elisa, as taxas de sensibilidade e especificidade variam de 93 a 100% e de 83
a 100%, respectivamente. A soroneutralização possui uma taxa de positividade de 38%.
O nested PCR, considerado como o padrão ouro no diagnóstico de RNA do vírus da
cinomose, tem alta sensibilidade, porém a sensibilidade depende do tipo de amostra
coletada (COSTA et al., 2019).
Análises de detecção de anticorpos não são consideradas bons testes de
diagnóstico, por causa da cinética do anticorpo de protocolos vacinais (ATHANASIOU
et al., 2017).

3.14 Diagnóstico diferencial

As doenças neurológicas e infecciosas que acometem o SNC geralmente causam


graves comprometimentos, deficiências que podem levar o animal a óbito, algumas
dessas doenças são zoonoses (TIPOLD, 1995).
Entre essas doenças destaca-se a encefalite causada pelo VCC, Ehrlichia canis,
raiva, encefalite por herpesvírus canino, encefalite causada pelo vírus da parainfluenza
canina, encefalite pós-vacinal após a vacina contra cinomose ou vacinação anti-rábica,
encefalomielite protozoária, meningoencefalite bacteriana, meningite causada pelos
protozoários Toxoplasma gondii (T gondii) e Neospora caninum (N caninum) e hepatite
infecciosa canina (adenovírus canino-1) (AROCH et al., 2018).
Algumas meningoencefalomielite são de etiologia desconhecida ou possuem
suspeita de etiologia viral como a encefalite periventricular, meningoencefalomielite
granulomatosa (GME), meningite-arterite responsiva a esteroides e meningoencefalite
necrosante do Pug (TIPOLD, 1995, HORNSEY et al., 2019).
Exames de diagnóstico podem auxiliar na diferenciação das doenças
neurológicas. Os achados hematológicos, exames do líquido cefalorraquidiano, índice
53

de imunoglobulina, citologia, imagens de tomografia e ressonância magnética


contribuem para elucidar algumas doenças neurológicas. Um diagnóstico específico
depende do histórico do paciente, aliado ao exame físico, exame neurológico, exames
laboratoriais e de imagens (TIPOLD, 1995, CARDY & CORNELIS, 2018).
O diagnóstico pós morte inclui a nécropsia e a histopatologia a ser realizada nos
principais órgãos, incluindo o encéfalo (cérebro, tálamo, cerebelo, ponte, medula) em
busca das alterações que caracterizam a doença (HORNSEY et al., 2019).

3.15 Diagnóstico diferencial entre raiva canina e cinomose

As infecções virais neurotrópicas representam uma grave ameaça à saúde dos


seres humanos e do animal. As respostas do hospedeiro ao combater os agentes
invasores, podem resultar em danos irreversíveis ao SNC (SUNDARAMOORTHY et
al., 2020). A raiva é causada pelo vírus de RNA neurotrópico da família Rhabdoviridae,
gênero Lyssavirus, sendo considerada a doença zoonótica com maior mortalidade no
mundo (SABETA & NGOEPE, 2018).
A raiva se subdivide em forma furiosa em 80% de cães acometidos e na forma
paralítica em 20% dos casos, os cães domésticos são os principais reservatórios da
espécie. É difícil estimar a carga humana de raiva, porém ao se usar dados sobre a
incidência de mordidas de animais suspeitos, os dados mostram que a raiva é
subnotificada e que os casos reais podem ser até 100 vezes maiores do que os relatórios
oficiais (SABETA & NGOEPE, 2018).
O RABV e outros Lyssavírus entram no sistema nervoso pelas sinapses dos
neurônios periféricos e se disseminam por transporte axonal retrógrado. Após a
endocitose mediada por receptor, os vírions invadem as vesículas endossômicas para
alcançar o neurônio soma, fazendo a sua replicação. Os vírus replicados são
transportados para membranas pós-sinápticas (POTRATZ et al., 2020).
Ocorrem degenerações de axônios e dendritos em resposta a infecção pelo
Lyssavirus. A degeneração axonal é mediada pela perda de NAD (Dinucleótido de
nicotinamida e adenina) e a digestão mediada por calpaína de proteínas estruturais
essenciais. Estudos mostram que o gene SARM1 (Sterile Alpha and TIR Motif-
54

containing 1) na infecção por raiva, executa a autodestruição axonal e a deleção de


SARM1, impedindo a propagação do vírus entre os neurônios interconectados. No
entanto, este mecanismo de defesa resulta na perda patológica de axônios e dendritos
(SUNDARAMOORTHY et al., 2020).
Os cães com raiva furiosa apresentam maior quantidade de antígenos nos
neurônios. Na forma paralítica da doença, a propagação viral é mais lenta. A
sintomatologia límbica domina o quadro clínico da forma furiosa, havendo sinais de
hiperexcitabilidade a estímulos externos, agressividade, paralisia progressiva dos
membros inferiores em direção à cabeça. (SHUANGSHOT et al., 2016). A replicação
prolongada causa à leva a encefalite progressiva, levando o cão ao óbito (POTRATZ et
al., 2020).
Na forma paralítica ocorre a disfunção dos nervos periféricos, axônio ou
mielinopatia. Estudos apontam que há comprometimento funcional seletivo. Nos
cérebros de cães raivosos, especialmente no tronco cerebral e no hipocampo, ocorrem
alterações nos receptores muscarínicos de acetilcolina. A inflamação do tronco cerebral
é uma resposta do hospedeiro para impedir a propagação viral para os hemisférios
cerebrais (SHUANGSHOTI et al., 2016). A invasão viral do nucleocapsídeo viral da
raiva se dá principalmente na linha média do SNC, tálamo, gânglios da base e tronco
cerebral (SHUANGSHOTI et al., 2016).
Os principais métodos de diagnóstico da raiva são a IFD (Imunofluorescência
direta), prova biológica que consiste na inoculação intracerebral em camundongos, além
de testes baseados em ácido nucléico, microarray de DNA e exame histopatológico para
confirmação de dignóstico pela observação de corpúsculos de inclusão
intracitoplasmáticos (corpúsculo de Negri). A IFD é o método de diagnóstico padrão-
ouro segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a OIE (Organização Mundial
da Saúde Animal) (SINGH, 2017).
A confirmação histopatológica dos corpúsculos de inclusão como o de Negri é
confirmatória da presença da raiva. Os corpúsculos de inclusão são formados durante o
ciclo de replicação do vírus, são compartimentos intracelulares concentrados de
proteínas virais, ácidos nucléicos e fatores celulares específicos, situados na célula
hospedeira. Estes corpúsculos abrigam etapas essenciais do ciclo viral e constituem uma
55

plataforma de replicação viral, além de proteger o genoma viral dos mecanismos de


defesa celular do hospedeiro (NEVERS et al., 2020).
Na cinomose observa-se a formação de corpúsculos de inclusão conhecidos
como corpúsculos de Lentz em diferentes células. Estas inclusões podem ser observadas
em astrócitos, neurônios, oligodendrócitos e células do epêndima. As alterações
neurológicas da cinomose são desmielinização, encefalite não supurativa, corpúsculos
de inclusão, esferóides axonais, gemistócitos, gliose, malácia da substância branca,
meningite mononuclear, necrose laminar cortical, neurônio vermelho, neuronofagia,
infiltrado perivascular linfoplasmocitário e tumefação endotelial (SILVA et al., 2007,
SONNE et al., 2009).
Os cães com cinomose na fase neurológica apresentam alterações
comportamentais como ambulação em círculos, sonolência, vocalização, agressividade,
inquietação, incapacidade de reconhecer os proprietários e automutilação (SILVA et al.,
2007). A sintomatologia comportamental de cães com raiva depende da localização das
lesões no SNC e da apresentação da raiva em formas paralítica e furiosa (BATISTA et
al., 2007).
Os sinais clínicos da raiva são inapetência, apatia, depressão, inquietude e
incoordenação motora. Após a fase prodrômica, os cães acometidos podem manifestar a
fase furiosa com agressividade marcante, depressão, excitabilidade, mudanças de
comportamento, insônia e febre. O animal não consegue deglutir a saliva, além disso, os
cães manifestam alucinações, convulsões e paralisias a partir dos membros inferiores
(BATISTA et al., 2007).
A forma paralítica da doença se difere por não haver agressividade pronunciada,
a paralisia ocorre no maxilar inferior e ocorre também a paralisia dos membros
posteriores. Os cães com raiva podem vir a óbito por morte súbita ou por paralisia dos
músculos respiratórios (BATISTA et al., 2007).
As manifestações neurológicas aliadas a um histórico completo, análise do
líquido cefalorraquidiano, testes de diagnóstico laboratorial e exames de imagem como
tomografia e ressonância magnética, podem identificar aproximadamente dois terços
dos cães com doenças inflamatórias do SNC. As doenças neurológicas como cinomose
e raiva compartilham de alterações comuns como infiltrado de leucócitos no cérebro
(encefalite), medula espinhal (mielite) ou meninges (meningite) (THOMAS 1998).
56

A paralisia e as convulsões não são comuns na cinomose, sendo mais presentes


na raiva. A distinção clínica da cinomose e da raiva associada a testes de diagnóstico
podem auxiliar na elucidação da maioria dos casos de encefalites de origem infecciosa
(THOMAS 1998, SILVA et al., 2007, VON RÜDEN et al., 2017, GREEN et al., 2020).

4 OBJETIVOS:

Tendo em vista que a cinomose é a doença viral mais importante em cães, com
alta morbimortalidade, podendo causar complicações no Sistema Nervoso Central,
foram revisados os mecanismos da neuropatogenia da infecção pelo VCC para melhor
compreensão desse processo mórbido.

5 MATERIAL E MÉTODOS

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais


(CEUA/FMVZ), da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP-Campus
de Botucatu-SP, sob o protocolo nº 0070/2021.
Neste trabalho realizou-se um estudo de revisão de literatura através de uma
busca eletrônica em diversas bases de dados, selecionando artigos relevantes para o
tema dessa revisão.
Os animais utilizados para este estudo foram os pacientes diagnosticados com
cinomose pelos médicos veterinários do setor de Moléstias Infecciosas da FMVZ,
Unesp, Botucatu, que vieram a óbito ou foram eutanasiados devido ao mal prognóstico.
Esses cães foram submetidos à coleta cerebral, e os cérebros desses pacientes foram
armazenados em formalina 10%, sendo transferido após 48h para um recipiente com
álcool 70%. O material foi encaminhado para o Laboratório Objetiva Vet, sendo
submetido às técnicas de histologia e corados pela hematoxilina.
57

5.1 Revisão Sistemática

A revisão de literatura sistemática foi realizada nas bases de dados Google


Scholar, Medline e Pubmed, a fim de obter uma visão aprofundada dos estudos
relevantes disponíveis na literatura.
Para a realização dessa revisão sistemática utilizou-se as seguintes palavras-
chave: Desmielinização, cinomose, neuropatogenia, Morbillivirus e anatomopatogenia.
Os artigos considerados nessa revisão foram publicados nos últimos 40 anos,
priorizando-se os trabalhos mais recentes dos últimos 10 anos. As pesquisas mais
antigas também foram utilizadas por trazerem as primeiras definições das características
da doença em estudo.
As bases de pesquisa indicaram 254 artigos, dos quais foram selecionadas 88
publicações, nos idiomas inglês, espanhol e português que traziam informações
detalhadas a respeito da neuropatogenia da cinomose. Após leitura dos estudos, outras
bibliografias foram incluídas, como livros de anatomia veterinária.

5.2 Critérios de inclusão

Os estudos publicados que atenderam aos seguintes critérios foram as revisões


sistemáticas, meta-análise e artigos científicos, por serem trabalhos que fornecem
evidências científicas e mostram as diferenças entre os estudos.
Os cães que foram a óbito com sintomatologia clínica compatível com a
cinomose, aliado a exames clínicos com alterações características da cinomose foram
incluídos nesse estudo para a realização de coleta de encéfalo e análise histopatológica.

5.3 Critérios de exclusão

Os artigos publicados que não descreveram ou não abordaram em detalhes


informações relevantes sobre a neuropatogenia da cinomose não foram incluídos neste
estudo.
58

Os animais que foram a óbito e não apresentaram sintomatologia consistente


com o quadro clínico da cinomose não foram incluídos.

5.4 Análise histopatológica

Após a fixação do material encefálico em formol 10%, o material foi processado


com a utilização de técnicas de rotina laboratorial para a confecção de lâminas,
passando por um processo de coloração com Hematoxilina e Eosina (HE).
Os tecidos encefálicos foram processados removendo a água e o fixador do
tecido, substituindo-os pelo reagente desidratante. Utilizou-se o xilol para remover o
agente desidratante (Diafanização) e promoveu-se a impregnação com parafina líquida,
após aquecer a mesma em temperatura de 58 a 60 graus celsius. Os solventes foram
removidos e substituídos pelo solvente seguinte, a partir de um aparelho processador
automático de tecidos, após sucessivos banhos com graduação crescente da
porcentagem de etanol.
Alguns banhos foram múltiplos com álcool 99%, xilol e parafina. Na inclusão
em parafina, os tecidos são envolvidos na parafina para obterem o suporte, colocando-se
o fragmento de tecido na parte central do molde. Depois de orientados os fragmentos,
os moldes foram transferidos para a placa fria a fim de solidificar a parafina,
pressionando-se ligeiramente os fragmentos para estes ficarem no mesmo plano. Na
sequência, colocou-se o cassete correspondente a cada amostra, a fim de identificá-la.
Os moldes foram transferidos para a placa fria com o objetivo de solidificarem e
serem desenformados, em seguida foram realizados os cortes finos dos tecidos e
colocados em lâmina de vidro. Prosseguiu-se com a coloração de rotina em histologia
com Hematoxilina-Eosina (HE) para uma preparação definitiva das lâminas, colocando
uma gota de meio de montagem sobre o corte, cobrindo com uma lamela.
As lâminas foram observadas em microscópio de luz para que as melhores
imagens de lesões compatíveis com a encefalite causada pela cinomose fossem
selecionadas para ilustrar este trabalho.
59

6. CONCLUSÕES

A cinomose é uma infecção sistêmica com envolvimento do SNC. Na encefalite


causada pela cinomose, o VCC se dissemina pelo SNC. Durante o início da fase aguda
da infecção, a resposta imunológica não é eficaz. A atividade viral, aliada aos
mecanismos da neuroinflamação, resulta em lesões na substância branca, gerando a
desmielinização e na substância cinzenta, causa infecção neuronal e necrose do tecido
nervoso.
A maioria das células infectadas pela invasão viral são astrócitos, porém ocorre
também a infecção de oligodendrócitos, as células produtoras de mielina. A isquemia e
a neuroinflamação estimulam a ativação imunológica, pelos astrócitos, através de genes
da cascata do complemento, que se mostram destrutivos para as sinapses ao perderem
algumas funções astrocíticas habituais e passam a apresentar uma função neurotóxica,
destruindo neurônios.
Na cinomose, a infecção restrita de oligodendrócitos e a ativação de células
microgliais, são importantes nos mecanismos da desmielinização.
Na fase crônica, ocorre desmielinização severa, podendo haver preservação dos
axônios ou lesões com necrose da bainha de mielina. As sequelas neurológicas são
resultantes da desmielinização, prejuízo nos mecanismos de resposta imunológica pelas
células gliais, liberação de citocinas antineurogênicas como IL-1β e pelos astrócitos. A
localização neuroanatômica da infecção viral irá interferir no quadro clínico e nas
alterações neurológicas.
O modelo da anatomopatologia da cinomose embasa estudos sobre a esclerose
múltipla, por se assemelhar no mecanismo de desmielinização.
60

REFERÊNCIAS

ADAMS JM, BROWN WJ, SNOW HD, LINCOLN SD, SEARS AW JR,
BARENFUS M, HOLLIDAY TA, CREMER NE, LENNETTE EH: Old dog
encephalitis and demyelinating diseases in man. Vet Pathol 12:220—226, 1975.

AMUDE AM, ALFIERI AA, ALFIERI AF. Antemortem diagnosis of VCC


infection by RT-PCR in distemper dogs with neurological deficits without the
typical clinical presentation. Vet Res Commun. Aug;30(6):679-87, 2007.

ANDERSON D.E., CASTAN A., BISAILLON M., VON MESSLING V. Elements


in the canine distemper virus M 3' UTR contribute to control of replication
efficiency and virulence. PLoS One, v. 7(2), e. 31561, 2012.

ANDREA BOARI, ALESSIO LORUSSO. Genome characterization of feline


morbillivirus from Italy, Journal of Virological Methods. v. 234, p. 160-163, 2016.

APPEL MJ, YATES RA, FOLEY GL, BERNSTEIN JJ, SANTINELLI S,


SPIELMAN LH, MILLER LD, ARP LH, ANDERSON M, BARR M, PEARCE-
KELLING S, SUMMERS BA. Canine distemper virus epizootic in lions, tigers, and
leopards in North America. J. Vet. Diagn. Invest. 6:277–288, 1994.

AROCH I, BANETH G, SALANT H, NACHUM-BIALA Y, BERKOWITZ A,


SHAMIR M, CHAI O. Neospora caninum and Ehrlichia canis co-infection in a dog
with meningoencephalitis. Vet Clin Pathol. Jun;47(2):289-293, 2018.

ATHANASIOU L.,V, KANTERE M.C., KYRIAKIS C.S., PARDALI D.,


ADAMAMA M. K., POLIZOPOULOU Z.S. Evaluation of a Direct
Immunofluorescent Assay and/or Conjunctival Cytology for Detection of Canine
Distemper Virus Antigen. Viral Immunol, v. 31, e. 3, p. 272-275, 2018.
61

AWAD, R. Rapid Approaches for Diagnosis of Canine Distemper Virus in Live and
Dead Dogs in Egypt. Egyptian Journal of Veterinary Sciences, v. 50, n.1, p.47-56,
2019.

AXTHELM MK, KRAKOWKA S. Experimental Old Dog Encephalitis (ODE) in a


Gnotobiotic Dog. Veterinary Pathology, 35(6):527-534, 1998.

BATISTA H.B.C.R., FRANCO A.C. & ROEHE P.M. Raiva: uma breve revisão.
Acta Scient. Vet. 35(2):125-144, 2007.

BEAR M. F., CONNORS, B. W., PARADISO M. A. Neurociências: Desvendando


o Sistema Nervoso. Porto Alegre: Artmed, e.4, p. 26-38. 2017.

BEINEKE A., PUFF C., SEEHUSEN F., BAUMGÄRTNER W. Pathogenesis and


immunopathology of systemic and nervous canine distemper. Vet Immunol
Immunopathol, v.127, n.1-2, p.1-18, 2009.

BEINEKE A, BAUMGÄRTNER W, WOHLSEIN P. Cross-species transmission of


canine distemper virus-an update. One Health. Sep 13;1:49-59. 2015.

BILLINIS C, ATHANASIOU LV, VALIAKOS G, MAMURIS Z, BIRTSAS P,


SPYROU V. Phylogenetic analysis of canine distemper viruses from red foxes,
Greece. Vet Rec. Aug 31;173(8):194. 2013

BRASIL, Ministério da Saúde. Manual de diagnóstico laboratorial da raiva.


Brasília - DF., 2008 Disponível
em<ttp://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_diagnostico_laboratorial_raiv
a.pd
f> Acesso em 07 junho. 2021
62

CARDY TJA, CORNELIS I. Clinical presentation and magnetic resonance imaging


findings in 11 dogs with eosinophilic meningoencephalitis of unknown aetiology. J
Small Anim Pract. Jul;59(7):422-431, 2018.

CARVALHO OV, BOTELHO CV, FERREIRA CG, SCHERER PO, SOARES-


MARTINS JA, ALMEIDA MR, SILVA JÚNIOR A. Immunopathogenic and
neurological mechanisms of canine distemper virus. Adv Virol., 2012:163860, 2012.

CATALA M, KUBIS N. Gross anatomy and development of the peripheral nervous


system. Handb Clin Neurol.;115:29-41, 2013.

COSTA V.G.D., SAIVISH M.V., RODRIGUES R.L., LIMA S.R.F., MORELI


M.L., KRÜGER R.H. Molecular and serological surveys of canine distemper virus:
A meta-analysis of cross-sectional studies. PLoS One., v.14 n.5, e. 0217594, 2019.

CZEIBERT, K., SOMMESE, A., PETNEHÁZY, Ö., CSÖRGŐ, T., & KUBINYI,
E. Digital Endocasting in Comparative Canine Brain Morphology ,2020. Frontiers
in veterinary science, 7, 565315. Disponível em <
https://doi.org/10.3389/fvets.2020.565315> . Acesso em: 20 de fev. de 2021.

DATTA R, LEE J, DUDA J, AVANTS BB, VITE CH, TSENG B, GEE JC,
AGUIRRE GD, AGUIRRE GK. A digital atlas of the dog brain. PLoS One.
2012;7(12):e52140, 2012.

DE NARDO TFS, BERTOLO PHL, BERNARDES PA, MUNARI DP,


MACHADO GF, JARDIM LS, MOREIRA PRR, ROSOLEM MC,
VASCONCELOS RO. Contribution of astrocytes and macrophage migration
inhibitory factor to immune-mediated canine encephalitis caused by the distemper
virus. Vet Immunol Immunopathol. 221:110010, 2020.

DREXLER JF, CORMAN VM, MÜLLER MA, MAGANGA GD, VALLO P,


BINGER T, GLOZA-RAUSCH F, COTTONTAIL VM, RASCHE A,
63

YORDANOV S, SEEBENS A, KNÖRNSCHILD M, OPPONG S, ADU


SARKODIE Y, PONGOMBO C, LUKASHEV AN, SCHMIDT-CHANASIT J,
STÖCKER A, CARNEIRO AJ, ERBAR S, MAISNER A, FRONHOFFS F,
BUETTNER R, KALKO EK, KRUPPA T, FRANKE CR, KALLIES R,
YANDOKO ER, HERRLER G, REUSKEN C, HASSANIN A, KRÜGER DH,
MATTHEE S, ULRICH RG, LEROY EM, DROSTEN C. Bats host major
mammalian paramyxoviruses. Nat Commun. Apr 24;3:796, 2012.

DYCE, R.M., SACK, W.O, & WENSING, C.J.G. Tratado de Anatomia Veterinária,
e.4, p. 534 a 800. Rio de Janeiro: Elsevier Editora. (2010).

FREDERICK MC, CAMERON MH. Tumefactive Demyelinating Lesions in


Multiple Sclerosis and Associated Disorders. Curr Neurol Neurosci Rep.
Mar;16(3):26, 2016.

FUKUHARA H, ITO Y, SAKO M, KAJIKAWA M, YOSHIDA K, SEKI F,


MWABA MH, HASHIGUCHI T, HIGASHIBATA MA, OSE T, KUROKI K,
TAKEDA M, MAENAKA K. Specificity of Morbillivirus Hemagglutinins to
Recognize SLAM of Different Species. Viruses. Aug 19;11(8):761, 2019.

GALÁN A, GAMITO A, CARLETTI BE, GUISADO A, DE LAS MULAS JM,


PÉREZ J, MARTÍN EM. Uncommon acute neurologic presentation of canine
distemper in 4 adult dogs. Can Vet J. Apr;55(4):373-8, 2014.

GIBBONS CH. Basics of autonomic nervous system function. Handb Clin


Neurol.;160:407-418, 2019.

GRIOT C, VANDEVELDE M, SCHOBESBERGER M, ZURBRIGGEN A. Canine


distemper, a re-emerging morbillivirus with complex neuropathogenic mechanisms.
Anim Health Res Rev. Jun;4(1):1-10, 2003.
64

GREEN L., LAURIE D.V.M., COOK, D.V.M., MARTINEZ M. DVM, GREEN E.,
DVM, DACVR Distemper Encephalomyelitis Presenting with Lower Motor Neuron
Signs in a Young Dog. J Am Anim Hosp Assoc, v. 56, e. 2, p. 127–132, 2020.

GUERRERO BL, SICOTTE NL. MICROGLIA IN MULTIPLE SCLEROSIS:


Friend or Foe? Front Immunol. 2020 Mar 20;11:374, 2020.

HEADLEY SA, AMUDE AM, ALFIERI AF, BRACARENSE APFRL, ALFIERI


AA, SUMMERS BA. Detecção molecular do vírus da cinomose canina e a
caracterização imuno-histoquímica das lesões neurológicas na encefalite canina
idosa de ocorrência natural. Journal of Veterinary Diagnostic Investigation, 21 (5):
588-597, 2009.

HEPPNER F.L., RANSOHOFF R.M., BECHER B. Immune attack: the role of


inflammation in Alzheimer disease. Nat Rev Neurosc, v. 6, p.358-72, 2015.

HORNSEY SJ, PHILIBERT H, GODSON DL, SNEAD ECR. Canine adenovirus


type 1 causing neurological signs in a 5-week-old puppy. BMC Vet Res, 2019.

JORTNER BS. Preparation and analysis of the peripheral nervous system. Toxicol
Pathol. Jan;39(1):66-72, 2011.

KIM Y.H., CHO K.W., YOUN H.Y., YOO H.S., HAN H.R. Detection of canine
distemper virus (VCC) through one step RT-PCR combined with nested PCR. J Vet
Sci., v.1, p. 59-63, 2001.

KLEIN, R. S., GARBER, C., FUNK, K. E., SALIMI, H., SOUNG, A.,
KANMOGNE, M., MANIVASAGAM, S., AGNER, S., & CAIN, M.
Neuroinflammation During RNA Viral Infections. Annual review of
immunology, v.37, p.73–95, 2019.
65

KLEMENS, J., CIURKIEWICZ, M., CHLUDZINSKI, E., ISERINGHAUSEN, M.,


KLOTZ, D., PFANKUCHE, V. M., ULRICH, R., HERDER, V., PUFF, C.,
BAUMGÄRTNER, W., & BEINEKE, A. Neurotoxic potential of reactive
astrocytes in canine distemper demyelinating leukoencephalitis. Scientific
reports, v.9, n.1, e.11689, 2019.

LASSMANN H. Multiple Sclerosis Pathology. Cold Spring Harb Perspect Med.


Mar 1;8(3):a028936, 2018.

LEMOS, Karen Regina et al . Astrocytic and microglial response and


histopathological changes in the brain of horses with experimental chronic
Trypanosoma evansi infection. Rev. Inst. Med. trop. S. Paulo, São Paulo , v. 50, n.
4, p. 243-249, Aug. 2008 . Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0036-
46652008000400011&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 08 Apr. 2021.

LEMPP, C., SPITZBARTH, I., PUFF, C., CANA, A., KEGLER, K.,
TECHANGAMSUWAN, S., BAUMGÄRTNER, W., & SEEHUSEN, F. New
aspects of the pathogenesis of canine distemper leukoencephalitis. Viruses, 6(7),
2571–2601, 2014.

LIDDELOW S.A., GUTTENPLAN K.A., CLARKE L.E., BENNETT F.C.,


BOHLEN C.J., SCHIRMER L., BENNETT M.L., MÜNCH A.E., CHUNG W.S.,
PETERSON T.C., WILTON D.K., FROUIN A., NAPIER B.A., PANICKER N.,
KUMAR M., BUCKWALTER M.S., ROWITCH D.H., DAWSON V.L.,
DAWSON T.M., STEVENS B., BARRES B.A. Neurotoxic reactive astrocytes are
induced by activated microglia. Nature, v. 541, e. 7638, p.481-487, 2017.

LIU P.C., CHEN C.A., CHEN C.M., YEN C.H., LEE M.H., CHUANG C.K., TU
C.F., SU B.L. Application of xenogeneic anti-canine distemper virus antibodies in
treatment of canine distemper puppies. J Small Anim Pract, v.57(11):626-630, 2016.
66

LOOTS A.K., MITCHELL E, DALTON D.L., KOTZÉ A., VENTER E.H.


Advances in canine distemper virus pathogenesis research: a wildlife perspective. J
Gen Virol, v. 98, e. 3, p. 311-321, 2017.

LUO L, CALLAWAY EM, SVOBODA K. GENETIC DISSECTION OF NEURAL


CIRCUITS: A Decade of Progress. Neuron. Apr 18;98(2):256-281, 2018.

MANGIA, S.H.; MORAES, L.F.; TAKAHIRA, R.K. et al. Efeitos colaterais do uso
da ribavirina, prednisona e DMSO em cães naturalmente infectados pelo vírus da
cinomose. Pesq Vet Bras, v.34, n.5, p.449-454, 2014.

MARCACCI M, DE LUCA E, ZACCARIA G, DI TOMMASO M, MANGONE I,


ASTE G, SAVINI G, BOARI A, LORUSSO A. Genome characterization of feline
morbillivirus from Italy. J Virol Methods, Aug;234:160-3, 2016.

MARTINS, B.C. et al . Características epizootiológicas da infecção natural pelo


vírus da cinomose canina em Belo Horizonte. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.
72, n. 3, p. 778-786, 2020.

MASTORAKOS P, MCGAVERN D. The anatomy and immunology of vasculature


in the central nervous system. Sci Immunol. Jul 12;4(37):eaav0492, 2019.

MAURILIA MARCACCI, ELIANA DE LUCA, GUENDALINA ZACCARIA,


MORENA DI TOMMASO, IOLANDA MANGONE, GIOVANNI ASTE,
GIOVANNI SAVINI,

MÜHLEBACH MD, MATEO M, SINN PL, PRÜFER S, UHLIG KM, LEONARD


VH, NAVARATNARAJAH CK, FRENZKE M, WONG XX, SAWATSKY B,
RAMACHANDRAN S, MCCRAY PB JR, CICHUTEK K, VON MESSLING V,
LOPEZ M, CATTANEO R. Adherens junction protein nectin-4 is the epithelial
receptor for measles virus. Nature. Nov 2;480(7378):530-3, 2011.
67

NEVERS Q, ALBERTINI AA, LAGAUDRIÈRE-GESBERT C, GAUDIN Y. Negri


bodies and other virus membrane-less replication compartments. Biochim Biophys
Acta Mol Cell Res. Dec;1867(12):118831, 2020.

NIKOLIN VM, OSTERRIEDER K, VON MESSLING V, HOFER H, ANDERSON


D, DUBOVI E, BRUNNER E, EAST ML. Antagonistic pleiotropy and fitness
trade-offs reveal specialist and generalist traits in strains of canine distemper virus.
PLoS One.;7(12):e50955, 2012.

NOYCE RS, DELPEUT S, RICHARDSON CD. Dog nectin-4 is an epithelial cell


receptor for canine distemper virus that facilitates virus entry and syncytia
formation. Virology. Feb 5;436(1):210-20, 2013.

ORLANDO EA, IMBSCHWEILER I, GERHAUSER I, BAUMGÄRTNER W,


WEWETZER K. In vitro characterization and preferential infection by canine
distemper virus of glial precursors with Schwann cell characteristics from adult
canine brain. Neuropathol Appl Neurobiol. Dec;34(6):621-37, 2008.

PARDO ID, JOHNSON GC, KLEIBOEKER SB. Phylogenetic characterization of


canine distemper viruses detected in naturally infected dogs in North America. J
Clin Microbiol. Oct;43(10):5009-17, 2005.

PFEFFERMANN K, DÖRR M, ZIRKEL F, VON MESSLING V. Morbillivirus


Pathogenesis and Virus-Host Interactions. Adv Virus Res., v. 100: p. 75-98, 2018.

PLATTET P, CHERPILLOD P, WIENER D, ZIPPERLE L, VANDEVELDE M,


WITTEK R, ZURBRIGGEN A. Signal peptide and helical bundle domains of
virulent canine distemper virus fusion protein restrict fusogenicity. J Virol.
Oct;81(20):11413-25, 2007.
68

POTRATZ M, ZAECK LM, WEIGEL C, KLEIN A, FREULING CM, MÜLLER T,


FINKE S. Neuroglia infection by rabies virus after anterograde virus spread in
peripheral neurons. Acta Neuropathol Commun. Nov 23;8(1):199, 2020.

RENDON-MARIN S., FONTOURA B. R., CANAL C.W., RUIZ-SAENZ J.


Tropism and molecular pathogenesis of canine distemper virus. Virol J. v.16(1):30,
2019.

ROHOWSKY-KOCHAN C, DAVIDOW A, DOWLING P, COOK SD. Increased


frequency of canine distemper virus-specific antibodies in multiple sclerosis. Brain
Behav. Jan;11(1):e01920, 2020.

SABETA C, NGOEPE EC. Controlling dog rabies in Africa: successes, failures and
prospects for the future. Rev Sci Tech. Aug;37(2):439-449, 2018.

SAKAGUCHI S, KOIDE R, MIYAZAWA T. In vitro host range of feline


morbillivirus. J Vet Med Sci.;77(11):1485-1487, 2015.

SATO, H., YONEDA, M., HONDA, T., & KAI, C. Morbillivirus receptors and
tropism: multiple pathways for infection. Frontiers in microbiology, v. 3, p.75,
2012.

SEEHUSEN F, AL-AZREG SA, RADDATZ BB, HAIST V, PUFF C,


SPITZBARTH I, ULRICH R, BAUMGÄRTNER W. Accumulation of Extracellular
Matrix in Advanced Lesions of Canine Distemper Demyelinating Encephalitis.
PLoS One. Jul 21;11(7):e0159752, 2016.

SHAM NAMBULLI, CLAIRE R SHARP, ANDREW S ACCIARDO, J FELIX


DREXLER, W PAUL DUPREX. Mapping the evolutionary trajectories of
morbilliviruses: what, where and whither. Current Opinion in Virology, v. 16, p. 95-
105, 2016,
69

SHUANGSHOTI S, THORNER PS, TEERAPAKPINYO C, THEPA N,


PHUKPATTARANONT P, INTARUT N, et al. Intracellular Spread of Rabies Virus
Is Reduced in the Paralytic Form of Canine Rabies Compared to the Furious Form.
PLoS Negl Trop Dis 10(6): e0004748, 2016.

SILVA M.C., FIGHERA R.A., BRUM J.S., GRAÇA D.L., KOMMERS G.D.,
IRIGOYEN L.F. & BARROS C.S.L. Aspectos clinicopatológicos de 620 casos
neurológicos de cinomose em cães. Pesq. Vet. Bras. 27:215-220, 2007.

SILVA, MARCIA C. ET AL . Aspectos clinicopatológicos de 620 casos


neurológicos de cinomose em cães: Clinicopathological features in 620 neurological
cases of canine distemper. Pesq. Vet. Bras., Rio de Janeiro , v. 27, n. 5, p. 215-220,
May 2007 . Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-
736X2007000500006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 01 Apr. 2021.

SINGH R, SINGH KP, CHERIAN S, SAMINATHAN M, KAPOOR S, REDDY


GBM, PANDA S, DHAMA K. Rabies – epidemiology, pathogenesis, public health
concerns and advances in diagnosis and control: a comprehensive review. Vet Q.
37(1): 212-251, 2017.

SONNE, LUCIANA et al. Achados patológicos e imuno-histoquímicos em cães


infectados naturalmente pelo vírus da cinomose canina. Pesquisa Veterinária
Brasileira, v. 29, n. 2, 2009. Acesso em 7 Junho 2021. Disponível em:
<https://doi.org/10.1590/S0100-736X2009000200010

SOUNG A., KLEIN R.S. Viral Encephalitis and Neurologic Diseases: Focus on
Astrocytes. Trends Mol Med. 2018 v.11, p.950-962, 2018.

STEIN V. M., BAUMGÄRTNER W., KREIENBROCK, L. ZURBRIGGEN, A.,


VANDEVELDE, M., TIPOLD, A. Canine microglial cells: Stereotypy in
immunophenotype and specificity in function? Veterinary Immunology and
70

Immunopathology,v. 113, e. 3–4, p. 277-287, 2006. Disponível em


<https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0165242706001590>. Acesso
em 01 Apr. 2021.

SUNDARAMOORTHY V, GREEN D, LOCKE K, O’BRIEN CM, DEARNLEY


M, BINGHAM. Novel role of SARM1 mediated axonal degeneration in the
pathogenesis of rabies. PLoS Pathog 16(2): e1008343, 2020.

SUMMERS, B. A., & APPEL, M. J. Aspects of canine distemper virus and measles
virus encephalomyelitis. Neuropathology and applied neurobiology, 20(6), 525–
534, 1994. Disponível em < https://doi.org/10.1111/j.1365-2990.1994.tb01006.x>.
Acesso em 01 Apr. 2021.

TATSUO H, YANAGI Y. The morbillivirus receptor SLAM (CD150). Microbiol


Immunol.;46(3):135-42, 2002.

TIPOLD A. Diagnosis of inflammatory and infectious diseases of the central


nervous system in dogs: a retrospective study. J Vet Intern Med. Sep-Oct;9(5):304-
14, 1995.

TORRE-FUENTES L, MORENO-JIMÉNEZ L, PYTEL V, MATÍAS-GUIU JA,


GÓMEZ-PINEDO U, MATÍAS-GUIU J. Experimental models of demyelination
and remyelination. Neurologia (Engl Ed). Jan-Feb;35(1):32-39, 2020.

UHL E.W., KELDERHOUSE C., BUIKSTRA J., BLICK J.P., BOLON B.,
HOGAN R.J. New world origin of canine distemper: Interdisciplinary insights. Int J
Paleopathol, v.24, p.266-278, 2019.

ULRICH R, PUFF C, WEWETZER K, KALKUHL A, DESCHL U,


BAUMGÄRTNER W. Transcriptional changes in canine distemper virus-induced
demyelinating leukoencephalitis favor a biphasic mode of demyelination. PLoS
One. Apr 22;9(4):e95917, 2014.
71

VANDEVELDE M, FANKHAUSER R, KRISTENSEN F, KRISTENSEN B.


Immunoglobulins in demyelinating lesions in canine distemper encephalitis. An
immunohistological study. Acta Neuropathol.;54(1):31-41,1981.

VANDEVELDE, M E A ZURBRIGGEN. “A neurobiologia da infecção pelo vírus


da cinomose canina.” Veterinary microbiology vol. 44,2-4 271-80, 1995.

VANDEVELDE M, ZURBRIGGEN A. Demyelination in canine distemper virus


infection: a review. Acta Neuropathol. Jan;109(1):56-68, 2005.

VON MESSLING V, OEZGUEN N, ZHENG Q, VONGPUNSAWAD S, BRAUN


W, CATTANEO R. Nearby clusters of hemagglutinin residues sustain SLAM-
dependent canine distemper virus entry in peripheral blood mononuclear cells. J
Virol.;79(9):5857-5862, 2005.

VON RÜDEN EL, AVEMARY J, ZELLINGER C, ALGERMISSEN D, BOCK P,


BEINEKE A, BAUMGÄRTNER W, STEIN VM, TIPOLD A, POTSCHKA H.
Distemper virus encephalitis exerts detrimental effects on hippocampal
neurogenesis. Neuropathol Appl Neurobiol. Aug;38(5):426-42, 2012.

VRIES RD, LUDLOW M, VERBURGH RJ, VAN AMERONGEN G, YÜKSEL S,


NGUYEN DT, MCQUAID S, OSTERHAUS AD, DUPREX WP, DE SWART RL.
Measles vaccination of nonhuman primates provides partial protection against
infection with canine distemper virus. J Virol. Apr;88(8):4423-33. 2014.

YADAV AK, RAJAK KK, BHATT M, KUMAR A, CHAKRAVARTI S,


SANKAR M, MUTHUCHELVAN D, KUMAR R, KHULAPE S, SINGH RP,
SINGH RK. Comparative sequence analysis of morbillivirus receptors and its
implication in host range expansion. Can J Microbiol. Nov;65(11):783-794, 2019.
72

WOO PC, LAU SK, WONG BH, FAN RY, WONG AY, ZHANG AJ, WU Y,
CHOI GK, LI KS, HUI J, WANG M, ZHENG BJ, CHAN KH, YUEN KY. Feline
morbillivirus, a previously undescribed paramyxovirus associated with
tubulointerstitial nephritis in domestic cats. Proc Natl Acad Sci U S A. Apr
3;109(14):5435-40, 2012.

WOODROFFE R, PRAGER KC, MUNSON L, CONRAD PA, DUBOVI EJ,


MAZET JA. Contact with domestic dogs increases pathogen exposure in
endangered African wild dogs (Lycaon pictus). PLoS One. Jan ;7(1):e30099, 2012.

WYSS-FLUEHMANN G, ZURBRIGGEN A, VANDEVELDE M, PLATTET P.


Canine distemper virus persistence in demyelinating encephalitis by swift
intracellular cell-to-cell spread in astrocytes is controlled by the viral attachment
protein. Acta Neuropathol. e. 119, v.5, p. 617-30, 2010.
73

ANEXOS
Anexo 1: Atestado de aprovação do Conselho Nacional de Controle de
Experimentação Animal - CONCEA
74

Você também pode gostar