Endometriose e Adenomiose

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ENDOMETRIOSE

A endometriose é definida como a presença de glândula e/ou estroma endometrial fora do útero,
com predomínio, mas não exclusivo, na pelve feminina.

• Pico de prevalência: mulheres em idade reprodutiva (25-35 anos)


• Doença benigna, crônica, estrogênio-dependente e de natureza multifatorial
• Parece haver aumento do risco de câncer de ovário

O tecido endometrial ectópico causa inflamação local crônica

• A ação inflamatória crônica das lesões tem feito a endometriose ser considerada uma doença
sistêmica

Local mais frequentes em ordem decrescente de frequência: ovários, fundo de saco anterior e
posterior, ligamentos uterossacros, ligamentos largos posteriores, útero, trompas, cólon sigmóide,
apêndice e ligamentos redondos

• Outros locais: fora da pelve, no abdômen, tórax, cérebro e, até mesmo, na pele
• Ou seja, a endometriose pode aparecer em, praticamente, todo o corpo!
A endometriose é uma doença dependente do ESTROGÊNIO está relacionada à maior exposição ao
estrogênio.

• A quase totalidade do estrogênio das mulheres no menacme é produzida pelos ovários, mas
uma pequena parte pode ser produzida na gordura periférica, através da conversão dos
androgênios em estrona (estrogênio) pela enzima aromatase (aromatização).
• Os implantes de endometriose também produzem a aromatase, ou seja, têm a capacidade
de produzir estrógenos locais para sua própria “sobrevivência”.
• Por isso, os inibidores da aromatase são uma opção terapêutica para a endometriose.

Além disso, os implantes endometrióticos expressam uma enzima chamada 17-beta-hidroxi-


desidrogenase do tipo I.

• A aromatase converte androstenediona em estrona e a 17-betahidroxi-desidrogenase I


converte a estrona em estradiol.
• O estradiol é um estrógeno muito mais potente que a estrona. Ou seja, com essas duas
enzimas, os implantes de endometriose são, praticamente, "auto suficientes" e produzem
estrógenos para seu desenvolvimento.
• O endométrio normal não apresenta aromatase, mas sim níveis elevados de 17-beta-hidroxi-
desidrogenase do tipo II.
• A 17-beta-hidroxi-desidrogenase do tipo II faz o caminho inverso da enzima do tipo I,
convertendo o estradiol (mais potente) em estrona (menos potente).
• A produção de 17-beta-hidroxi-desidrogenase do tipo II, pelo endométrio normal, acontece
em resposta ao estímulo da progesterona.
• É dessa forma que a progesterona faz oposição à ação proliferativa do estrógeno sobre o
endométrio.
• Os implantes de endometriose apresentam uma diminuição dos receptores de
progesterona e desenvolvem uma resistência local.
• Com isso, os implantes de endometriose tornam-se, praticamente, “imunes” à ação
antiproliferativa da progesterona.

Classificação da profundidade

1. Endometriose superficial/peritoneal: presença de implantes superficiais no peritônio (<


5mm);
2. Endometriose ovariana: implantes superficiais ou cistos (endometriomas) no ovário; e
3. Endometriose profunda: lesão que penetra no espaço retroperitoneal ou na parede dos
órgãos pélvicos com profundidade ≥ 5 mm

Estadiamento

Leva em consideração os achados da cirurgia (aparência das lesões, dimensão e profundidade):

• Estádio I (doença mínima) – implantes isolados e sem aderências significativas.


• Estádio II (doença leve) – implantes superficiais, com menos de 5 cm, espalhados no
peritônio e nos ovários, sem aderências significativas.
• Estádio III (doença moderada) – múltiplos implantes, aderências tubárias e ovarianas
evidentes.
• Estádio IV (doença grave) – múltiplos implantes superficiais e profundos, incluindo
endometriomas e aderências densas e espessas

Não existe correlação entre o estádio da endometriose e os sintomas.

• A dor depende da profundidade do implante e de sua localização em áreas mais


inervadas.
Etiologia

A teoria mais aceita, ainda hoje, para o desenvolvimento da endometriose é a teoria de Sampson, ou
da menstruação retrógrada.

• Ela postula que a endometriose é causada pelo implante de células endometriais


provenientes do refluxo tubário para a cavidade pélvica, durante o período menstrual.

Fatores de risco

→ Quanto maior e mais frequente for o refluxo tubário menstrual, maior será o risco de
desenvolver endometriose.

Fatores que podem aumentar a probabilidade de exposição da cavidade pélvica ao refluxo menstrual
tubário contendo células endometriais são fatores de risco:

→ Aumento do número de menstruações na menacme >> menarca precoce e a menopausa


tardia
→ Aumento do fluxo menstrual
→ Nuliparidade
→ Gravidez tardia

Quanto menor a exposição ao estrogênio e menor o número das menstruações da mulher, menor o
risco de desenvolver endometriose. Fatores de proteção:

• multiparidade;
• intervalos prolongados de amamentação;
• menarca tardia (após os 14 anos);
• consumo de ácidos graxos ômega 3;
• uso de pílulas anticoncepcionais (proteção contra o endometrioma).
Quadro clínico

Os sintomas “clássicos” da endometriose são: dismenorreia, dispareunia, dor pélvica crônica e


infertilidade.

• Em geral, há um atraso de 7 anos no diagnóstico

Sintomas da Endometriose

➢ Dismenorreia (progressiva)
➢ Dispareunia profunda
➢ Dor pélvica crônica (acíclica)
➢ Infertilidade
➢ Alterações Urinárias
➢ Disfunção intestinal
➢ Dor lombar
➢ Fadiga crônica

Essas sintomatologias estão relacionadas a dor miofascial e compressão de nervos, assim como
infiltração diafragmática pela endometriose.

Sintomas clássicos

• Principal: dismenorreia progressiva (dismenorreia secundária).


Revisão sistemática: 2/3 das pacientes adolescentes com dismenorreia apresentam endometriose em suas laparoscopias

• Dispareunia de profundidade (focos em: ligamentos uterossacral e cardinal, bolsa de


Douglas, fórnice vaginal posterior e parede retal anterior). Mais raramente: dispareunia de
penetração (superficial)
• Dor pélvica crônica (pode sugerir endometrioma de ovário, devido à compressão de
estruturas adjacentes). Descrita como surda, latejante, aguda e/ou ardente
• Infertilidade (devido a distorção da arquitetura pélvica, aderências e disfunções imunológicas
na cavidade pélvica).
Outros:

• Alterações urinárias cíclicas: disúria, hematúria, polaciúria e urgência, sobretudo se esses


sintomas só aparecem ou pioram durante o período menstrual (sintomas cíclicos).
• Alterações intestinais cíclicas: mudanças no hábito intestinal, distensão do abdome,
presença de sangue nas fezes, disquezia, constipação, diarreia ou dor anal, sobretudo se esses
sintomas aparecerem ou piorarem durante o período menstrual.
• Dor para defecar e sangramento retal podem estar relacionados à presença de implantes
endometrióticos no septo retovaginal ou fundo de saco posterior.
• Outros: dor torácica, pneumotórax ou hemotórax, hemoptise, dor irradiada para as pernas
ou períneo, que se manifestam durante o período menstrual.

Devemos pensar em endometriose sempre que a houver algum sintoma (sobretudo dor)
relacionado à menstruação.

• Como dor irradiada para membros inferiores, vulvodínia, dor em região glútea, dor torácica,
hemoptise, dor epigástrica, entre outros, que podem refletir lesões em localizações menos
usuais.

Exames de imagem

Ultrassom pélvico ou transvaginal (sobretudo se com preparo intestinal), RNM e videolaparoscopia


(padrão ouro)

• A RNM é uma opção alternativa quando não há a disponibilidade de ultrassonografia com


preparo intestinal, apresentando sensibilidade e especificidade similares.
• A RNM tem melhor indicação nos casos de lesão parametrial, infiltração de nervos pélvicos
sacrais, retossigmoide alto, endometriose diafragmática e intestino delgado.
• Endometriose ovariana: USTV ou RM
USTV ou RNM qual escolher?

• Fica a critério da expertise de cada serviço, pois ambas têm vantagens e desvantagens

A videolaparoscopia é o método padrão-ouro para o diagnóstico de endometriose

• Contudo, é reservado para casos de: dúvida diagnóstica, falha do tratamento clínico ou
indicação de tratamento cirúrgico.
• Não é rotina indicar a videolaparoscopia "puramente" diagnóstica.

Exames laboratoriais

• Não há exame laboratorial definitivo para o diagnóstico da endometriose.


• O CA 125 pode estar elevado em mulheres com endometriose (> 35 U/mL), mas somente nos
casos avançados, bem como é pouco específico.
• CA 125 pode ser usado para acompanhamento da evolução da doença

Diagnóstico

O diagnóstico laparoscópico não é obrigatório, podendo ser realizado diagnóstico presuntivo


mediante exames de imagem (RNM ou USG, idealmente com preparo intestinal) e quadro clínico.

• O DIAGNÓSTICO CLÍNICO/PRESUNTIVO pode ser suficiente para iniciar o tratamento


empírico se quadro clínico compatível
• Laparoscopia >> restrita para o tratamento cirúrgico propriamente dito, ou seja, não
recomendamos mais a laparoscopia puramente diagnóstica, que outrora era padronizada.
• No entanto, a presença ou ausência de uma resposta ao tratamento empírico não pode
ser interpretada como confirmação ou exclusão definitiva do diagnóstico

Diagnóstico laparoscópico: inspeção direta da cavidade e visualização dos implantes, sem a


necessidade de biópsia para confirmação histopatológica*.

• A visualização dos focos tem sensibilidade e especificidade suficientes para tornarem a


videolaparoscopia o suficiente para o diagnóstico, sem necessidade de exame
histopatológico das lesões.
• Diagnóstico definitivo: avaliação histológica

MANEJO

A endometriose é uma doença crônica que requer um plano de tratamento com o objetivo de
aumentar o uso de tratamento clínico e reduzir procedimentos cirúrgicos repetidos

• As decisões de tratamento são individualizadas e levam em consideração a apresentação


clínica (como dor, infertilidade, presença de tumoração), a gravidade dos sintomas, a
extensão e localização da doença, os desejos reprodutivos, a idade da paciente, os efeitos
colaterais da medicação, as taxas de complicações cirúrgicas e os custos.

O tratamento clínico de endometriose, salvo exceções, é a primeira linha de tratamento.

• Tratamento cirúrgico: tratamento clínico ineficaz ou contraindicado por alguma razão.


O tratamento será dividido em tratamento da paciente com sintomas (dor) e tratamento da paciente
com infertilidade.

• Em casos assintomáticos, nenhum tratamento é necessário.

IIU = Inseminação Intra Uterina, COC = contraceptivos orais combinados

TRATAMENTO CLÍNICO

• Tratamento de escolha na ausência de indicação cirúrgica.


• Principal objetivo: alívio da dor.
• Fundamento: eliminar o estímulo estrogênico, que é o responsável pela manutenção e pelo
crescimento dos focos de endometriose
• Não promove diminuição das lesões ou cura da doença, mas, sim, o controle do quadro
clínico.
*Outras referências colocam endometrioma ovariano > 5mm
Tratamento não hormonal:

• AINES
• Não apresenta uso terapêutico específico, apenas para alívio temporário da dor nas pacientes
com endometriose

Tratamento hormonal:

• A dor da paciente piora durante a menstruação porque os implantes endometrióticos


“sangram” nesse período.
• Assim, se “bloquearmos ou diminuirmos” a menstruação da paciente, poderemos melhorar
seus sintomas e aliviar sua dor.
• Por isso, a supressão da função ovariana (bloqueio hormonal) reduz a dor associada à
endometriose. O objetivo é bloquear a menstruação!
• Opções: ACOs, os progestágenos e os agonistas do GnRH
• Todos eles são, igualmente, eficazes em reduzir a dor.
• Se refratário uma combinação de ACO, pode-se tentar outro ACO

Mecanismo:

→ Eliminam a produção do estrogênio (análogo GnRH e inibidor da aromatase);


→ Eliminam o efeito estrogênico por meio da pseudodecidualização (progestogênio puro ou
combinado ao estrogênio).

Progestágenos

• Mecanismo: bloqueio ovulatório e inibição do crescimento endometrial, com consequente


atrofia das lesões
• Alta eficácia, bem tolerados, baratos e devem ser a primeira opção de tratamento (UpToDate
colococa como primeira apenas os que não podem usar ACO)
• 10% dos pacientes não respondem (escolher outros métodos)
• Os progestágenos têm um efeito de “oposição” em relação ao estrógeno e que a endometriose
é uma doença dependente do estrogênio.
• Podem ser por todas as vias (IM, SC, VO, implante)
• Exemplo VO: acetato de noretisterona 10 mg e dienogeste 2 mg e desogestrel 75 mcg
• Acetato de medroxiprogesterona 150 mg, IM, a cada 3 meses
• SIU-LNG e Implante

Anticoncepcionais combinados

• O mecanismo de ação é similar ao dos progestágenos e agem induzindo a decidualização


(descamação) e atrofia do tecido endometrial ectópico
• Primeira linha (UpToDate)
• Todos os anticoncepcionais combinados (seja VO, IM, SC, anel vaginal) têm a mesma eficácia
no tratamento da dor provocada pela endometriose.
• O USO CONTÍNUO é mais eficaz que cíclicos para a diminuição da dor.

Análogos agonistas do GnRH

• Agem no hipotálamo, ocupando os receptores do GnRH e provocando a inibição da liberação


de FSH e LH pela hipófise.
• Consequentemente, ocorre um estado de hipoestrogenismo e anovulação, semelhante ao
observado no climatério.
• Fazendo o nível estrogênico chegar ao nível da pós-menopausa, e reduz o estímulo aos focos
da doença, levando à atrofia destes
• Demoram 14 dias para começar a fazer efeito, porque, de início, ocorre o estímulo dos
receptores até que estes sejam saturados (efeito flare up).
• O hipoestrogenismo (“menopausa medicamentosa”), causado pelos agonistas do GnRH,
pode acarretar sintomas climatéricos como fogachos, secura vaginal, redução de libido e
perda de massa óssea.
• O uso de reposição hormonal de estrógeno e progesterona em baixas doses (add-back
therapy) pode reduzir esses efeitos.
• Embora exista a recomendação da terapia add-back conjuntamente ao análogo, o que
significa associar um contraceptivo oral combinado ou progestagênio isolado para minimizar
os efeitos indesejados, essa medicação tem ficado como segunda linha de tratamento
• Evitar uso prolongado (> 6 meses).

Drogas:

• Gosserrelina 3,6 mg mensal ou 10,8 mg trimestral, SC.


• Leuprolida 11,25 mg IM a cada 3 meses por 6 meses ou 3,75 mg IM dose única mensal

Análogos antagonistas do GnRH

• Inibem a produção das gonadotrofinas (LH e FSH) e criam um estado hipoestrogênico


(menopausa medicamentosa).
• Ao contrário dos agonistas do GnRH, esses agentes são eficazes imediatamente, porque não
apresentam o efeito flare up.
• Os antagonistas do GnRH são mais fáceis de administrar do que os agonistas do GnRH, posto
que têm a opção de serem administrados por via oral.
• Um exemplo de antagonista do GnRH é o elagolix.
• A terapia add-back também pode ser usada nos casos em tratamento com antagonistas do
GnRH e sintomas importantes de hipoestrogenismo

Inibidores da aromatase

• O tecido endometrial é capaz de produzir, localmente, a enzima aromatase, que é responsável


pela conversão da androstenediona em estradiol. Ou seja, o tecido endometriótico tem a
capacidade de produzir o estrogênio localmente.
• Além disso, ocorre a conversão de andrógenos em estrona, na gordura periférica.
• Tem indicação restrita devido aos efeitos colaterais, especialmente pela indução de
formação de cistos ovarianos volumosos
• Exemplo: letrozol 2,5 mg/dia e o anastrozol 1mg/dia
• Sempre o uso dos inibidores da aromatase deve ser combinado a um contraceptivo hormonal
ou mesmo ao análogo do GnRH, o que torna essa associação muito potente

Podem ser utilizadas em duas condições:

• Pós-menopausa (pela conversão periférica e formação estrogênica)


• Menacme, quando há falta de resposta a outros medicamentos;
Tratamento do endometrioma de ovário

• Cisto resultante do tecido endometrial ectópico dentro do ovário


• Parece aumentar risco de câncer de ovário (sobretudo se > 9 cm e mulheres idosas)
• Objetivos: aliviar a dor, prevenir complicações, como ruptura ou torção, excluir doenças
malignas, tratar a infertilidade e preservar a função ovariana.

Opções terapêuticas:

1. Vigilância ativa com imagens seriadas


2. Terapia hormonal para melhora dos sintomas e redução do tamanho do cisto, ou
3. Tratamento cirúrgico com ϲiѕtеctomia ou ooforectomia.

Endometrioma assintomático

• Se assintomáticos, pequenos (< 5cm) e baixo risco de câncer de ovário: acompanhamento


através de exame de imagem (USG a cada 6 meses, por 1-2 anos e depois anual)

Endometrioma sintomático

• Se dor leve: terapia hormonal +/- AINE


• Sintomas moderados a graves: tratamento clínico ou cirúrgico (cistectomia ou
ooferectomia)
• A exérese do endometrioma pode tratar a dor, mas pode afetar a fertilidade (reduzir reserva
ovariana). Por isso, so opera se SINTOMÁTICOS e GRANDES (> 5-6 cm).
• Risco da falta de um diagnóstico histológico: maliginidade não diagnósticada
• Gestão pós-operatória: bloqueio hormonal para diminuir recorrência
• Ooforectomia: se recorrência do endometrioma ou suspeita de malignidade
• Se recorrência dos endometriomas após sua ressecção: pensar em MALIGNIDADE

Tratamento da infertilidade

• Primeiro, investigue a infertilidade (não assuma que a endometriose é a causa isolada da


infertilidade)
• Em seguida, avaliamos a necessidade de realizar uma cirurgia primária de endometriose

Não há indicação de cirurgia de rotina antes do tratamento por reprodução assistida para aumentar
as taxas de gravidez em mulheres com endometriose mínima e leve, uma vez que os potenciais
benefícios não são claros.

• A cirurgia prévia à RA, incluindo a abordagem de endometriomas, não aumenta as taxas de


gravidez no tratamento. Pelo contrário, pode causar mais dano do que a endometriose
propriamente dita, comprometendo a reserva ovariana.
• A RA não piora os sintomas da endometriose e não apresenta impacto negativo sobre os
endometriomas e a endometriose profunda e infiltrativa.
• Antes de considerar a cirurgia, verifique se há uma real possibilidade de gravidez
espontânea – com sêmen normal e tubas viáveis e pérvias – e se o tempo disponível (idade da
paciente) e a RESERVA OVARIANA permitem dedicar 12 a 18 meses a tentativas de concepção
natural.

Abordagem UpToDate:

➢ Se sintomas significativos sugestivos de endometriose que não passaram por tratamento


cirúrgico primário: laparoscopia operatória com ablação ou excisão de implantes de endometriose
como o primeiro passo no tratamento após a avaliação de infertilidade ser concluída;
➢ Se tratamento cirúrgico primário de endometriose: não repetir a remoção cirúrgica da
endometriose para o tratamento de infertilidade, a menos que haja dor significativa. A repetição da
cirurgia não melhora a fertilidade, embora possa reduzir a dor
➢ Se infertilidade e endometrioma presumido assintomático: geralmente procedemos com FIV e
observação do endometrioma em vez da remoção cirúrgica.
➢ Se endometriose e infertilidade sem outros sintomas: o tratamento cirúrgico para melhorar a
fertilidade não é indicado, mesmo que a endometriose não tenha sido removida anteriormente. Como
o impacto da endometriose assintomática na fertilidade não é conhecido, os riscos associados à
ressecção cirúrgica não são garantidos

A terapia hormonal para supressão ovariana em pacientes com infertilidade e endometriose não
deve ser prescrito, pois não há evidência!

• Única droga eficaz: análogo do GnRH, administrado por até 3 meses, porém
especificamente antes da FIV.
FIV: fertilização in vitro; VAS: escore analógico visual.

TRATAMENTO CIRÚRGICO

• Objetivo: remoção ou destruição completa de todos os focos de endometriose para


restaurar a anatomia original e a função reprodutiva.
Indicações

• Refratariedade da dor com o tratamento clínico;


• Contraindicação a terapia medicamentosa ou recusa ao tratamento clínico;
• Necessidade de diagnóstico histológico de endometriose;
• Exclusão de malignidade de uma massa anexial;
• Obstrução do trato urinário ou intestinal;
• Endometrioma de ovário > 5-6 cm (provoca perda de parênquimica ovariano pela inflamação
crônica);
• Endometriose do apêndice;
• Tratamento da infertilidade*;

Deve-se evitar a cirurgia nos seguintes casos:

• Mulheres com dor pélvica avaliada de forma incompleta.


• Mulheres com dor pélvica persistente após cirurgias repetidas.
• Mulheres próximas da menopausa, a menos que haja suspeita de malignidade

* Os sintomas da endоmetriоse geralmente desaparecem com a menopausa. Mulheres que estão próximas
da menopausa podem preferir tolerar sintomas subótimos controlados para evitar a cirurgia

Técnica

• Opções: laparoscopia ou laparotomia;


• A via laparoscopia é a escolha porque permite melhor ângulo de visão e acesso à pelve (fundo
de saco), além de a recuperação da paciente ser mais rápida
• Desvantagens do tratamento cirúrgico videolaparoscópico: risco de lesão (vascular, intestinal
ou vesical), possível redução da reserva ovariana (após a exérese do endometrioma) e
formação de aderências.

A indicação de tratamento cirúrgico na endometriose é diferente para os casos de endometriose


superficial e profunda
Cirurgia Conservadora Versus Cirurgia Definitiva

A cirurgia conservadora é a exérese, ou cauterização dos implantes endometrióticos, com o objetivo


de preservar o útero e o máximo de tecido ovariano possível.

• A cirurgia conservadora (de preferência pela via laparoscópica) é a primeira escolha para a
maioria das mulheres que planejam o tratamento cirúrgico da endometriose, pois preserva a
fertilidade e a produção de hormônios, é menos invasiva e tem recuperação mais rápida.
• Desvantagem: maior taxa de recorrência dos sintomas (sobretudo se jovem) e necessidade
de nova cirurgia;
Cirurgia definitiva: histerectomia, com ou sem ooforectomia.

• Indicação de cirurgia definitiva: sintomas refratários aos outros tipos de tratamento, com
prole constituída (a endometriose é uma doença dependente do estrogênio).
• A ooforectomia reduz risco de recorrência, contudo evoluem com sintomas da menopausa
(fogachos e secura vaginal).
• A cirurgia não é o tratamento curativo da endometriose em 100% dos casos.

Cuidados pós-operatórios

→ Terapia hormonal supressora a longo prazo (pelo menos 6 a 24 meses) >> pode reduzir
a recorrência da endometriose e, assim, evitar a necessidade de múltiplas cirurgias >> As
opções para terapia médica pós-operatória são as mesmas da terapia médica inicial.

A terapia hormonal pode ser necessária para tratar sintomas relacionados à menopausa cirúrgica,
após a ooforectomia bilateral.

• Os riscos e benefícios relativos à terapia estrogênica dependem do tamanho dos implantes


endometrióticos.
• Mulheres com doença peritoneal > 3 cm no momento da ressecção cirúrgica não devem
receber TH (apresentaram um risco aumentado de recorrência dos sintomas quando tratadas com
terapia de estrogênio em comparação com mulheres cuja doença era < 3 cm)
• Se endometriose residual significativa, com sintomas moderados ou graves ou < 45
anos apresentam benefícios e podem receber a TH.
• A terapia hormonal para sintomas vasomotores pode ser iniciada imediatamente após a
cirurgia
• Se histerectomia >> usar apenas estrogênio (não há vantagem em adicionar progesterona)

Endometriose peritoneal

• A indicação da laparoscopia no sentido de tratar a endometriose peritoneal deve ser motivada


pela piora do quadro clínico, progressão da doença, infertilidade e situações especiais,
como o comprometimento do diafragma, bexiga e intestino
• Manejo: excisão dos focos (eletrocirurgia)

Tratamento da endometriose do trato urinário

• Locais mais acometidos: bexiga, ureter, rim e ureter.


• Clínica: disúria, hematúria (principalmente durante a menstruação) e polaciúria.
• Diagnóstico pelo ultrassom: nódulos na bexiga e hidronefrose, nos casos de obstrução
ureteral.
• Diagnóstico da endometriose vesical é feito pela cistoscopia, que pode visualizar a lesão
dentro da bexiga e possibilita, também, a realização de biópsia.
• Lesão identificada no ultrassom não for visível na cistoscopia: trata-se de lesão intramural, que
deve ser avaliada pela RNM quanto à sua extensão e localização, para um melhor planejamento
cirúrgico.
• O tratamento da endometriose vesical, em geral, é feito com o bloqueio hormonal.
• Tratamento cirúrgico: reservado para os casos refratários ao tratamento clínico ou para os
casos em que a lesão endometriótica está muito perto do óstio ureteral, ameaçando uma
obstrução.
• O tratamento da endometriose ureteral é, principalmente, cirúrgico, para desobstruir ou
evitar a obstrução e a consequente perda da função renal.
• Após o tratamento cirúrgico, procedemos com o bloqueio hormonal a fim de evitar a recidiva e
continuar o tratamento da endometriose pélvica.

Tratamento da endometriose extrapélvica

Parede abdominal

• Clínica: nódulo, que pode ser doloroso, geralmente próximo a uma cicatriz cirúrgica prévia (por
exemplo, de cesárea).
• Pode variar de tamanho, ficar roxo e sangrar durante o período menstrual.
• Exame: USG e RNM
• Manejo: exérese da lesão.

Umbilical

• Clínica: nódulo na cicatriz umbilical, que pode variar de tamanho, ficar roxo e sangrar durante
o período menstrual.
• Exame: USG e RNM
• Manejo: exérese da lesão.
Canal inguinal

• Clínica: nódulo na virilha que pode causar dor durante a menstruação e até variar de tamanho
nesse período
• Exame: USG e RNM
• Manejo: exérese da lesão.

Diafragma

• Clínica: dor no ombro direito durante a menstruação, dor para respirar e desconforto na
posição reclinada.
• Em geral, o tratamento é clínico. Contudo, se lesões profundas: ressecção completa.

Grandes vasos ou nervos

• Como a ressecção é inviável, o tratamento de escolha é o bloqueio hormonal.

Tratamento da endometriose torácica

• Clínica: hemotórax, pneumotórax e hemoptise durante o período menstrual.


• Outros: dor e nódulo pulmonar.
• Investigação diagnóstica: raio-X de tórax, TC, RNM, toracoscopia, broncoscopia e biópsia a céu
aberto.
• Diagnóstico: presumido através da clínica e dos exames de imagem e, embora a confirmação
histopatológica seja importante para afastar a malignidade, não é obrigatória.

O tratamento da endometriose torácica depende da manifestação clínica:

→ Pneumotórax: drenagem de tórax, seguida pela prevenção da recorrência (pleurodese) e


bloqueio hormonal por 6-12 meses
→ Hemotórax: drenagem do tórax, seguido pela prevenção da recorrência (toracoscopia) e
bloqueio hormonal por 6-12 meses
→ Hemoptise: além da endometriose, nenhuma outra causa de hemoptise está relacionada
à menstruação. Sempre devemos afastar a malignidade, através da biópsia e estudo
histológico. O bloqueio hormonal é indicado para evitar a recorrência.
→ Nódulo(s) pulmonar(es): exérese da lesão. Se nódulo único, a exérese é curativa. Se
nódulos múltiplos, pode ser necessária uma lobectomia. Se nódulos múltiplos sintomáticos
e esparsos, o tratamento deve ser feito com o bloqueio hormonal, já que a ressecção não é
possível.

Endometriose retrocervical

• Manejo: excisão completa dos focos com liberação do reto quando aderido na região
retrocervical

Tratamento da endometriose intestinal

• Sítios: reto (79%), sigmoide (24%), apêndice cecal (5%), íleo terminal (2%), e ceco (1%)
• Sempre são lesões de endometriose profunda.
• Clínica: dor (geralmente cíclica), tenesmo e, em alguns casos, enterorragia durante o
período menstrual.
• Manejo clínico: AINES, pílulas anticoncepcionais combinadas ou de progesterona ou
análogos do GnRH

O tratamento cirúrgico com ressecção da área acometida é a forma terapêutica mais efetiva.
Indicações:

• Paciente disposto a aceitar os ricos e prefere evitar terapia médica crônica


• Tratamento não cirúrgico falho
• Contraindicação ao manjo não cirúrgico
• O tratamento cirúrgico é obrigatório se houver sinal de obstrução, mesmo que parcial.

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ADENOMIOSE

Doença em que o tecido endometrial (glândulas e estroma) está entremeado no miométrio,


resultando em hipertrofia do miométrio circundante.

• Manifesta-se como um espectro de lesões que pode variar de uma zona funcional
levemente espessada a adenomiose uterina com espessura total do miométrio
• Histologicamente se caracteriza pela invasão benigna do endométrio no miométrio, além de
2,5 mm de profundidade
• A invaginação do endométrio para a musculatura uterina leva a aumento volumétrico uterino
e por vezes, sangramento, dor pélvica e infertilidade.

Associação com outras patologias:

• Endometriose (11% - 21%)


• Miomatose (20%)
• Pólipo endometrial (7%)

Fisiopatologia

A afecção ocorre quando o limite normal entre a camada basal do endométrio e o miométrio é
interrompido, o que resulta em uma invaginação do endométrio para o íntimo da camada muscular
uterina.

• Assim, a adenomiose caracteriza-se pela presença das glândulas e do estroma endometriais


entre os feixes do miométrio, em localização superior a dois campos de pequeno aumento (2,5
mm) da borda inferior do endométrio, acompanhada de hipertrofia vascular e miometrial
compensatória.
• Esta propagação tecidual é facilitada por uma atividade não cíclica e não apoptótica da
camada basal, associada ao estado de hiperestrogenismo.
• A adenomiose é uma doença estrogênio-dependente.

Quatro teorias sugerem que a adenomiose ocorre de:

→ Invaginação endomiometrial do endométrio.


→ De novo a partir de remanescentes müllerianos.
→ Microtrauma da interface endometrial/miometrial (zona de junção).
→ Estabelecimento de lesões de menstruação retrógrada de células endometriais.
Existem duas formas de adenomiose:

• Difusa (focos podem estar distribuídos por todo o miométrio)


• Focal (focos formam um conjunto nodular circunscrito)

Classificação
Fatores de risco

• Idade de 40 a 50 anos
• Menarca precoce (antes dos 10 anos de idade)
• Ciclos menstruais curtos (menos de 24 dias de intervalo)
• Multiparidade (≥2 gestações)
• História de abortamento
• Cirurgias uterinas prévias (curetagem / cesárea)
• Uso prévio de contraceptivos hormonais e tamoxifeno
• IMC elevado

Quanto maior o número de ciclos menstruais, maior o estímulo estrogênico (cumulativo), logo, maior
o risco para desenvolvimento de adenomiose.

• A adenomiose está relacionada com o estímulo estrogênico, logo o uso prévio de


anticoncepcionais hormonais (estrógeno) e do tamoxifeno (agonista parcial do estrogênio) são
fatores de risco

Quadro clínico

• 1/3 são assintomáticos (UpToDate diz que é apenas 4,5%)


• Principais sintomas: aumento do fluxo menstrual ou sangramento intermenstrual
(sangramento uterino anormal) e dismenorreia secundária
• Outros: dor pélvica crônica, aumento uterino, dispaurenia e infertilidade* (que podem estar
presentes não somente pela adenomiose, mas devido a um quadro de endometriose
associado)

*Adenomiose como causa de infertilidade é controverso

Exame físico:

• útero aumentado difusamente, secundário a proliferação do tecido endometrial ectópico,


amolecido e muitas vezes doloroso ao toque.

USG
Considerando-se a maior disponibilidade e o menor custo, US é considerada o exame de primeira
linha

• Achados ultrassonográficos de tecido endometrial no interior do miométrio e/ou hiperplasia


miometrial são suficientes, sem necessidade de outros exames complementares
• Os cistos miometriais são considerados um dos sinais mais específicos de adenomiose

Critérios diagnósticos ultrassonográficos de adenomiose:

A. Espessamento assimétrico.
B. Cistos miometrais.
C. Ilhas hiperecogênicas.
D. Sombra em forma de leque.
E. Linhas e brotos subendometriais ecogênicos.
F. Vascularização translesional.
G. Zona juncional irregular.
H. Zona juncional interrompida.

A presença de ≥2 achados é bastante sugestiva de adenomiose.


RNM

• Acurácia um pouco maior que a ultrassonografia


• Pode diferenciar a adenomiose difusa e focal da leiomiomatose uterina.
• Pode ser usada também para o planejamento do tratamento cirúrgico conservador
• Espessamento da zona juncional com irregularidade e espessura > 12 mm é diagnóstica da
adenomiose.
• Zona juncional < 8 mm praticamente exclui a adenomiose.
DIAGNÓSTICO

➢ Diagnóstico presuntivo (radiológico): clínica + exames (USG ou RNM)


➢ Diagnóstico definitivo: estudo anatomopatológico de útero após histerectomia.

MANEJO

TRATAMENTO CLÍNICO

Para as mulheres sem prole constituída, o tratamento hormonal pode ser eficaz no tratamento do
sangramento uterino anormal e dismenorreia.

• Mas, esses medicamentos impedem a gravidez, podendo ser utilizados somente até o
momento em que a paciente deseja engravidar

Opções de tratamento clínico da adenomiose

→ SIU – levonorgestrel (primeira escolha)


→ Progestágenos
→ Anticoncepcional combinado
→ Análogos do GnRH (agonistas e antagonistas)
→ Inibidores da aromatase (pouca evidência)
→ AINES (terapia não hormonal preferida)

SIU-LNG*

➢ Tratamento clínico preferido, pois age no local da doença e apresenta baixa absorção sistêmica
da progesterona
➢ progesterona age provocando a atrofia endometrial e reduzindo a espessura da zona juncional,
melhorando o sangramento uterino anormal e a dismenorreia.
TRATAMENTO CIRÚRGICO

HISTERECTOMIA: tratamento definitivo da adenomiose

Sem desejo de gestação e terapia de primeira linha foram ineficazes ou contraindicadas, a


histerectomia é a opção de tratamento definitiva

→ Indicação: mulheres com prole concluída, com sintomas intensos de sangramento uterino
anormal e dismenorreia, que não responderam à terapêutica medicamentosa, seja
hormonal, sejam intervenções menos invasivas
→ Nota: DOR PODE CONTINUAR após a histerectomia, pois as vias neurais da dor ainda
podem estar ativas.

MANEJO CONSERVADOR

O tratamento cirúrgico conservador está indicado para as pacientes sem prole constituída que não
responderam ao tratamento clínico

• Objetivo: exérese do tecido doente


• Pode ser considerada em casos de doença focal
• Após o tratamento cirúrgico conservador, administramos o tratamento hormonal, como o SIU
de levonorgestrel ou os progestágenos, para prevenir a recorrência da doença.
• Melhora 50% do sangramento uterino anormal e 80% da dismenorreia.

Ablação endometrial

• Destruição de todo o endométrio que recobre a cavidade uterina por meio do calor ou do frio.
• Essa “cauterização” do endométrio pode ser realizada mediante corrente elétrica monopolar
ou bipolar, balão térmico, crioterapia, laser, microondas ou até mesmo soluções aquecidas
• Melhora SUA, mas não parece melhorar disminorreia

Embolização das artérias uterinas

• Consiste em “entupir” a irrigação sanguínea do útero com micropartículas (microesferas,


esponjas ou álcool polivinílico) para provocar a necrose e redução do útero
• Pode aliviar os sintomas e diminuir em cerca de 25% o volume uterino.
• Não é recomendada se desejo de gestação (risco de resultados adversos na gravidez)

Indicações para embolização das artérias uterinas

→ Falha do tratamento hormonal


→ Pacientes com prole constituída
→ Paciente sem condições para tratamento cirúrgico (histerectomia)
→ Escolha da paciente
PACIENTES QUE DESEJAM TER FILHOS NO FUTURO

Ressecção poupadora do útero

→ A ressecção poupadora do útero (pouco conhecida e em investigação) de adenomiose


focal pode ser realizada em pacientes que desejam ter filhos no futuro e nas quais as
terapias de primeira linha foram ineficazes ou contraindicadas

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