Pessoas Natural e Juri Dica

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PESSOAS - NATURAL E JURÍDICA

2a EDIÇÃO/2023

1. PESSOA NATURAL 2
1.1. PERSONALIDADE 2
1.1.1. INÍCIO DA PERSONALIDADE 2
1.2. CAPACIDADE 5
1.3. INCAPACIDADE 7
1.3.1. ALTERAÇÕES NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA 11
1.3.1.1. TOMADA DE DECISÃO APOIADA 12
1.3.2. REGULAÇÃO DA CAPACIDADE DOS INDÍGENAS 14
1.3.3. SUPRIMENTO DA INCAPACIDADE 16
1.3.4. CESSAÇÃO DA INCAPACIDADE 16
1.3.4.1. EMANCIPAÇÃO 16
1.4 EXTINÇÃO DA PESSOA NATURAL 20
1.4.1 COMORIÊNCIA 21
1.4.2 DA AUSÊNCIA 22

2. DIREITOS DE PERSONALIDADE 25
2.1. FUNDAMENTO DO DIREITO DA PERSONALIDADE 25
2.2. CRÍTICA À DIGNIDADE COMO FUNDAMENTO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 26
2.3. DIREITOS DA PERSONALIDADE E PESSOAS JURÍDICAS 27
2.4. CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 31
2.4.1. QUESTÕES POLÊMICAS ACERCA DA IRRENUNCIABILIDADE 34
2.5. PROTEÇÃO DO NOME, IMAGEM E PSEUDÔNIMO DA PESSOA (arts. 15 a 21 do CC/02) 36
2.5.1. NOTAS 40
2.5.2. JURISPRUDÊNCIA 43
2.6. DIREITOS DA PERSONALIDADE E PESSOAS MORTAS 44
2.7. OUTROS DIREITOS DE PERSONALIDADE 45

3. PESSOA JURÍDICA / MORAL / COLETIVA 46


3.1. TEORIA GERAL 46
3.1.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA 49
3.1.2 REQUISITOS PARA A CONSTITUIÇÃO DA PESSOA JURÍDICA 50
3.2. ESTRUTURAS DAS PESSOAS JURÍDICAS NO CÓDIGO CIVIL 51
3.2.1. ASSOCIAÇÕES (Art. 53 a 61) 53
3.2.2. FUNDAÇÃO 55
3.2.3. SOCIEDADE 57
3.2.4. EIRELI (ALTERAÇÃO DA LEI DO AMBIENTE DOS NEGÓCIOS – LEI 14.195/21) 57
3.2.5. ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS 58
3.2.6. PARTIDOS POLÍTICOS 58
3.3. JURISPRUDÊNCIA 59
3.4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA 60
3.4.1. HISTÓRICO NO BRASIL 60
3.4.2. CONCEITO 60
3.4.3. TEORIAS A RESPEITO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA 61

1
1. PESSOA NATURAL

A pessoa natural é o ser humano.


Segundo MIGUEL REALE, a pessoa humana é o VALOR-FONTE de todo o Direito.
A pessoa humana é o único ente dotado do atributo da dignidade humana.
TEXEIRA DE FREITAS chamava a pessoa natural de ente de existência visível.

1.1. PERSONALIDADE
A doutrina entende a personalidade como a aptidão para se titularizar direitos e contrair
obrigações na órbita jurídica, vale dizer, é o atributo do sujeito de direito. Dessa forma, as pessoas (natural e
jurídica) são dotadas de personalidade.
Personalidade é a soma de caracteres ou aptidões da pessoa, ou seja, representa quem ela é para si e
para a sociedade. Este conceito é do autor italiano Adriano de Cupis.

1.1.1. INÍCIO DA PERSONALIDADE

Art. 2 A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a
concepção, os direitos do nascituro.

TEORIAS SOBRE O INÍCIO DA PERSONALIDADE


a) TEORIA NATALISTA (Caio Mário, Sílvio Rodrigues, Sílvio Venosa)
Segundo Rubem Valente1, “a personalidade civil somente se inicia no nascimento com vida,
independentemente de viabilidade ou de forma humana, nos moldes da orientação do art. 2º do CC.
Consequentemente, o natimorto (aquele que nasce sem vida) não adquire personalidade. Portanto, o
nascituro tem mera expectativa de direito, sem reconhecer-lhe personalidade. Nesta Teoria, a personalidade do
nascituro não é condicional; apenas certos efeitos de determinados direitos dependem do nascimento com
vida, notadamente os direitos patrimoniais materiais, como a doação e a herança. Nesses casos, o nascimento
com vida é elemento do negócio jurídico que diz respeito à sua eficácia total, aperfeiçoando-a.”

b) TEORIA DA PERSONALIDADE CONDICIONAL (Arnoldo Wald, Clóvis Beviláqua, Washington de Barros)


Segundo Flávio Tartuce2, “é aquela pela qual a personalidade civil começa com o nascimento com
vida, mas os direitos do nascituro estão sujeitos a uma condição suspensiva, ou seja, são direitos
eventuais”..
Rubem Valente ressalta que tal teoria é criticada visto que “conduz ao entendimento de que o nascituro
não tem direitos efetivos, mas apenas direitos eventuais sob condição, isto é, mera expectativa de direitos; e
comete um desacerto ao falar em condição, pois, tecnicamente, só se pode considerar condição uma cláusula
voluntária (conditio facti), não existindo em nosso ordenamento a denominada condição legal (conditio iuris)
(CC, art. 121);”

1
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022.
2
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022.
2
c) TEORIA CONCEPCIONISTA (Pontes de Miranda; Teixeira de Freitas; Francisco Amaral)
O nascituro é dotado de personalidade jurídica, desde a concepção, inclusive para efeitos
patrimoniais. O nascimento apenas consolida direitos que já existem. É a teoria prevalente na jurisprudência
pátria.

“O ordenamento jurídico como um todo (e não apenas o CC/02) alinhou-se mais à teoria concepcionista -
para a qual a personalidade jurídica se inicia com a concepção, muito embora alguns direitos só possam ser
plenamente exercitáveis com o nascimento, haja vista que o nascituro é pessoa e, portanto, sujeito de direitos
- para a construção da situação jurídica do nascituro, conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária
doutrina contemporânea. Além disso, apesar de existir concepção mais restritiva sobre os direitos do
nascituro, amparada pelas teorias natalistas e da personalidade condicional, atualmente há de se reconhecer
a titularidade de direitos da personalidade ao nascituro, dos quais o direito à vida é o mais importante, uma
vez que garantir ao nascituro expectativas de direito, ou mesmo direitos condicionados ao nascimento, só faz
sentido se lhe for garantido também o direito de nascer, o direito à vida, que é direito pressuposto a todos os
demais.” (STJ, REsp 1.415.727/SC)

Importante pontuar que “o Brasil não impõe a forma humana para a aquisição da personalidade. A
viabilidade, no direito brasileiro, é a aptidão para a vida, não importando as anomalias e deformidades que
apresente. A exigência de forma humana fere o princípio da dignidade da pessoa humana, basilar e
norteador do nosso ordenamento jurídico, bem como tantos outros princípios constitucionais que regem a
proteção à personalidade do indivíduo3”.
Repisa-se que nos últimos anos a teoria concepcionista vem ganhando mais e mais espaço no Direito
Brasileiro, e grande destaque em decisões do Poder Judiciário, especialmente do Superior Tribunal de Justiça.
Nesta Corte Superior, já foi reconhecido o direito que o nascituro tem ao recebimento de indenização por
dano moral (REsp 399028/SP), bem como de que seus genitores teriam direito ao pagamento do seguro
DPVAT caso sobrevenha sua morte (REsp 1120676).
A Lei dos Alimentos Gravídicos (Lei 11804/08) reforça a adoção da teoria concepcionista. Nesse sentido:

“Os alimentos gravídicos, previstos na Lei n. 11.804/2008, visam a auxiliar a mulher gestante nas despesas
decorrentes da gravidez, da concepção ao parto, sendo, pois, a gestante a beneficiária direta dos alimentos
gravídicos, ficando, por via de consequência, resguardados os direitos do próprio nascituro” (STJ, REsp
1629423/SP, 3.ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 06.06.2017, DJe 22.06.2017).

A proteção ao nascituro alcança o embrião de laboratório?


Segundo Rubem Valente, “apesar da Lei de Biossegurança, Lei n. 11.105/2005, tutelar a integridade
física do embrião, permitiu (art. 5º) a utilização de células-tronco embrionárias com finalidade científica e
terapêutica, desde que tais embriões sejam considerados inviáveis. Em 2008, inclusive, o STF reconheceu a
constitucionalidade do dispositivo em foco (ADIn 3.510). A despeito da controvérsia, parece-nos mais acertada a
tese de que nascituro é aquele que foi concebido, mas ainda não nasceu, então, a proteção abrange o
embrião pré-implantatório, in vitro ou criopreservado – mesmo não estando em vias de nascer (o que
ocorre com a implantação uterina). Nesse sentido, a melhor doutrina destaca que, a despeito da
constitucionalidade do citado art. 5º da Lei de Biossegurança, a utilização de células-tronco, nesse caso, se dá de

3
https://jus.com.br/artigos/24650/do-inicio-da-personalidade-civil
3
forma excepcional, pois diz respeito a embriões inviáveis – situação comparável a uma espécie de presunção de
morte –, sendo que, numa ponderação de valores, o interesse coletivo, no caso, científico e terapêutico, deve
prevalecer. Dessa forma, tal dispositivo legal não choca com a essência da própria Lei de Biossegurança,
tampouco com a tese concepcionista”.

Se o embrião tiver sido concebido em laboratório (in vitro), mas não se encontrar fixado e em
desenvolvimento em um útero, sua situação jurídica e seus interesses aparentemente não são resguardados
pela ordem jurídica, podendo ser descartado, o que implica a sua destruição. (STF, ADI 3510)

📌 OBSERVAÇÃO
Em resumo, ensina os professores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona que “o nascituro, embora não
seja expressamente considerado pessoa, tem a proteção legal dos seus direitos desde a concepção”. inclusive,
elencam os direitos do nascituro da seguinte forma em sua obra conjunta:4
a) o nascituro é titular de direitos personalíssimos (como o direito à vida, o direito à proteção pré-natal etc.);
b) pode receber doação, sem prejuízo do recolhimento do imposto de transmissão inter vivos;
c) pode ser beneficiado por legado e herança;
d) o Código Penal tipifica o crime de aborto;
e) como decorrência da proteção conferida pelos direitos da personalidade, o nascituro tem direito à realização
do exame de DNA, para efeito de aferição de paternidade.

⚠️ ATENÇÃO
Maria Helena Diniz classifica a personalidade jurídica em5:

PERSONALIDADE JURÍDICA é aquela relacionada com os direitos da personalidade, o que o


FORMAL nascituro já tem desde a concepção.

PERSONALIDADE JURÍDICA mantém relação com os direitos patrimoniais, e o nascituro só a adquire


MATERIAL com o nascimento com vida, segundo a doutrinadora.

🚩 NÃO CONFUNDA
Não se deve confundir o nascituro com o concepturo e o natimorto.
O concepturo é também chamado de prole eventual e é aquele que nem concebido ainda foi.
O natimorto é o aquele nascido morto, que deverá ser registrado em livro próprio do cartório de
pessoas naturais, conforme o Enunciado nº 1 das Jornadas de Direito Civil (“A proteção que o Código defere ao
nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome, imagem e
sepultura.”).

Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
4

Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022.
5

4
1.2. CAPACIDADE
Como diferenciar capacidade de personalidade?
Segundo Tartuce, a capacidade é a medida da personalidade (quantum). Portanto, ela é apenas um
dos aspectos da personalidade.
“Adquirida a personalidade jurídica, toda pessoa passa a ser capaz de direitos e obrigações. Possui,
portanto, capacidade de direito ou de gozo. Todo ser humano tem, assim, capacidade de direito, pelo fato
de que a personalidade jurídica é atributo inerente à sua condição.”6
MARCOS BERNARDES DE MELLO prefere utilizar a expressão capacidade jurídica para caracterizar a
“aptidão que o ordenamento jurídico atribui às pessoas, em geral, e a certos entes, em particular, estes
formados por grupos de pessoas ou universalidades patrimo­niais, para serem titulares de uma situação
jurídica”7
Como será esclarecido adiante, não é toda pessoa que possui aptidão para exercer em seu próprio
nome os seus direitos, por meio de atos jurídicos, desta situação surgem institutos jurídicos para a
representação.

🚩 NÃO CONFUNDA 8

“é a capacidade de direito somada a capacidade de fato. Capacidade de direito é


a aptidão genérica para ser titular de direitos e deveres na esfera civil. Toda
CAPACIDADE CIVIL pessoa tem capacidade de direito. Capaz, de fato, é quem pode exercer,
PLENA pessoalmente, os atos da vida civil. Em outras palavras, tem capacidade de fato
quem não sofre qualquer tipo de incapacidade (consoante disciplina dos arts. 3º
e 4º do CC)”.

“é atributo da pessoa natural, vale dizer, toda pessoa é sujeito de direito e tem
personalidade. Ter personalidade significa ter capacidade de direito e, além
disso, significa ter proteção fundamental atinente aos direitos da personalidade.
Nesse aspecto, convém destacar que capacidade é um conceito patrimonial,
PERSONALIDADE
podendo ser exercido por entes despersonalizados, por exemplo, condomínio
edilício, massa falida, espólio, sociedade de fato etc. Por essa razão, a
personalidade não pode ser relacionada, exclusivamente, com a capacidade
civil”.

“capacidade especial para a prática de determinado ato ou negócio jurídico.


Exemplo: outorga conjugal para vender imóvel, sob pena de anulabilidade do
contrato (arts. 1.647, I, e 1.649 do CC/2002); venda de ascendente para
LEGITIMAÇÃO
descendente – há necessidade de autorização dos demais descendentes e do
cônjuge (art. 496 do CC).” Trata-se da pertinência subjetiva para a prática de
determinado ato.

6
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
7
MELLO, Marcos Bernardes de. Achegas para uma Teoria das Capacidades em Direito, Revista de Direito Privado, São Paulo, p. 17.
8
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022.
5
LEGITIMIDADE “é a capacidade processual (art. 17 do CPC/2015).”

Art. 1. TODA PESSOA É CAPAZ de direitos e deveres na ordem civil.

O art. 1° do CC enuncia a capacidade de direito ou de gozo ou capacidade de aquisição de


direitos, que “consiste na aptidão potencial de ser titular de direitos patrimoniais e obrigações. Seu termo
inicial, na concepção natalista, é o nascimento, perdurando até a morte. Estende-se à pessoa jurídica, aos
privados de discernimento e aos infantes em geral, independentemente de seu grau de desenvolvimento
mental, podendo, assim, herdar bens deixados por seus pais, receber doações etc. Só não há capacidade de
aquisição de direitos onde falta personalidade, como no caso do nascituro para a corrente natalista.” (VALENTE,
2022).
Já a capacidade de fato ou de exercício ou de agir, “aptidão para exercer pessoalmente os direitos.
Possuidora da capacidade de fato, a pessoa poderá agir juridicamente, por atos próprios ou mediante
representante voluntário, praticando, livremente, atos da vida civil. Ao contrário da capacidade de direito, nem
todas as pessoas a possuem. (...) A capacidade de fato é a medida de proteção ao incapaz, que, destituído da
plenitude de discernimento, necessita de auxílio para a prática dos atos da vida civil (representação ou
assistência).9”

🚩 NÃO CONFUNDA
CAPACIDADE DE DIREITO CAPACIDADE DE FATO

Capacidade conferida a todos, indistintamente. Capacidade de exercer de forma pessoal e direta os


atos da vida civil - arts. 3º, 4º e 5º do CC/2002.

É estática, todas as pessoas têm sem distinção. É dinâmica – algumas pessoas não têm (os
incapazes, arts. 3º e 4º do CC).

CAPACIDADE DE DIREITO + CAPACIDADE DE FATO = CAPACIDADE PLENA

O que é morte civil? Ainda existe no Brasil?


“Antigamente, existia o instituto da Morte Civil, que acontece quando uma pessoa continua
realmente viva, mas, para fins legais, é tratada como “coisa”, inapta a ter direitos e deveres (era privada
de sua personalidade), em razão de algum ato previsto e estipulado em lei. No ordenamento pátrio, não se
admite a Morte Civil. Embora para o direito Brasileiro somente seja aceita a morte real ou presumida, existem
alguns resquícios da ideia de Morte Civil. Por exemplo, os artigos 1.814 e seguintes do CC, que, ao tratar da
exclusão da herança da indignidade, considera o herdeiro indigno como morto no momento da abertura da
sucessão. Para todos os demais efeitos jurídicos, no entanto, ele permanece com os caracteres da
personalidade jurídica intactos10”.

9
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022.
10
https://trilhante.com.br/curso/pessoas-no-codigo-civil-1/aula/fim-da-personalidade-morte-presumida-sucessao-definitiva-1
6
🚨 JÁ CAIU
Na prova para Procurador do Estado de Roraima (CESPE - 2022), questionou-se: “O atributo da pessoal natural,
conferido pela legislação civil, que a qualifica a firmar negócios de grandes riscos, sem auxílio ou intervenção de
outra pessoa, e, consequentemente, a assumir eventuais perdas refere-se à “, tendo sido considerada CORRETA
a assertiva que disse: “capacidade.“

1.3. INCAPACIDADE
Segundo Rubem Valente11: “O incapaz reclama um tratamento diferenciado, tendo em vista que não
possui o mesmo quadro de compreensão da vida e dos atos cotidianos das pessoas plenamente capacitadas. É
a pura aplicação do princípio da isonomia, segundo o qual o ordenamento deve tratar os iguais igualmente e os
desiguais diferentemente, na medida em que se desigualam. Segundo Silvio Rodrigues, a incapacidade revela o
reconhecimento da inexistência, numa pessoa, daqueles requisitos que a lei acha indispensáveis para que ela
exerça os seus direitos.”

Redação anterior à Lei nº 13.146/2015

Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I- os menores de dezesseis anos;

II- os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática
desses atos;

III- os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Redação atual

Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 anos.

Como exposto na redação atual do art. 3º, do Código Civil, “os únicos absolutamente incapazes
previstos no Código Civil a partir da vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência são os menores de 16
anos, denominados menores impúberes. Leva-se em conta o critério etário, não havendo necessidade de
qualquer processo de interdição ou de nomeação de um curador (presunção absoluta de incapacidade)”12.

⚠️ ATENÇÃO
Não estão mais arrolados no art. 3º, do Código Civil, os que, por enfermidade ou deficiência mental,
não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos e os que, mesmo por causa transitória, não
puderem exprimir sua vontade.

Redação anterior à Lei nº 13.146/2015

Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:

I- os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II- os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento
reduzido;

11
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado . Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2022.
12
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único . Disponível em: Minha Biblioteca, (11ª edição). Grupo GEN, 2020.
7
III- os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV- os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.

Redação atual

Art. 4º: São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:

I - os maiores de 16 e menores de 18 anos;

II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;

III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

IV - os pródigos.

Parágrafo único: A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial

O art. 4º do Código Civil também sofreu algumas alterações, assim como o art. 3º. Tais alterações se
deram em virtude do novo tratamento que a legislação deu às pessoas portadoras de deficiência, um olhar
muito mais inclusivo.

a) Art. 4º, I: maiores de dezesseis e menores de dezoito anos


Há um critério etário de incapacidade relativa, sem ação de interdição. Os menores púberes podem
praticar atos civis mais complexos, sem assistência, por previsão legal. Exemplos: podem se casar (há
autorização especial), fazer testamento, reconhecer filho, ser testemunhas, aceitar mandato extrajudicial (“ad
negotia”). Em alguns casos, ocorrerá a emancipação do menor de idade (art. 5º, CC);

b) Art. 4º, II: Ébrios habituais (viciados em álcool) e viciados em tóxicos.


Nestes casos, há necessidade de interdição relativa com laudo médico, pois a capacidade não se
presume. A sentença deve apontar quais atos podem ou não podem ser praticados pelo indivíduo. A pessoa
deve ser objeto de procedimento de interdição.

c) Art. 4º, III: Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade
Após as mudanças ocorridas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, será plenamente capaz o
portador de síndrome de Down, em regra geral, sujeito ao instituto da tomada de decisão apoiada, para
as decisões relativas aos atos patrimoniais. Além disso, para os atos existenciais familiares, o portador de
síndrome de Down possuirá capacidade civil plena (art. 6º da Lei no 13.146/2015).
Diante disso, o artigo 4º, III, do Código, passou a elucidar a antiga hipótese que estava contida no art. 3º,
III, mencionando aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade. Ex:
idoso com Alzheimer e a pessoa em coma.
Intoxicação fortuita (como por exemplo, o “boa noite cinderela”), pois se for embriaguez dolosa - ACTIO
LIBERA IN CAUSA, aí sim não se aplica. Com isso queremos dizer que: AQUELE que se coloca voluntariamente
em estado de incapacidade não se isenta de responsabilidade civil.
A teoria da actio libera in causa é aplicada no direito civil também, de maneira que a pessoa que
voluntariamente se intoxica não está isenta de responsabilidade civil sob a alegação de incapacidade.

8
⚠️ ATENÇÃO
O cego, o surdo-mudo e o senil, em regra, são capazes. Se, entretanto, elas não conseguirem exprimir
suas vontades, poderão se enquadrar como relativamente incapazes.

d) Art. 4º, IV – Pródigos: são as pessoas que gastam de maneira destemperada o seu patrimônio, o que
pode reduzi-los à penúria.
Define os professores Pablo e Rodolfo: “Trata-se de um desvio comportamental que, refletindo-se no
patrimônio individual, culmina por prejudicar, ainda que por via oblíqua, a tessitura familiar e social. Note-se
que o indivíduo que descontroladamente dilapida o seu patrimônio poderá, ulteriormente, bater às portas de
um parente próximo ou do próprio Estado para buscar amparo.”
Neste sentido, que se justifica a interdição do pródigo a fim de lhe evitar alguns atos da vida civil, sem o
devido apoio, como por exemplo impedir a transmissão de bens senão por intermédio de uma decisão apoiada.
Sobre os pródigos, cuidado: segundo o Art. 1.782, CC, a interdição do pródigo somente diz respeito a
atos de disposição direta de bens.

Art. 1.782. A interdição do pródigo só o privará de, sem curador, emprestar, transigir, dar quitação,
alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que não sejam de mera
administração.

Aqui o juiz colhe a prova pericial e determina curador com a interdição (matéria de justiça estadual,
mesmo repercutindo na área previdenciária). Depois de estar interditado, na forma da lei, qualquer ato que o
incapaz, mesmo em momentos de lucidez, venha a praticar, sem o seu curador, é ANULÁVEL, conforme art.
171, inc. I, CC.

📌 OBSERVAÇÕES
■ A sentença no procedimento de interdição é declaratória.
■ A partir da sentença de interdição, publicada e registrada, qualquer ato praticado sem a presença do
curador é inválido mesmo que em momento de lucidez.
■ Ele pode se casar livremente.
■ Em regra, o regime de casamento do pródigo é o da comunhão parcial de bens, e não o da separação
obrigatória, pois ele não consta nos casos do art. 1.641, CC;

Art. 1.641. É OBRIGATÓRIO O REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS no casamento:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de 70 anos;

III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

⚠️ ATENÇÃO
Para fazer pacto antenupcial, há necessidade de assistência? Há duas correntes sobre o tema:
1ª CORRENTE: Não. José Fernando Simão defende que não há previsão do pacto no art. 1.782, CC.

9
Art. 1.782. A interdição do pródigo só o privará de, sem curador, emprestar, transigir, dar quitação,
alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que não sejam de mera
administração.

2ª CORRENTE: Sim. Esta é a corrente majoritária, encabeçada pelo professor Carlos Roberto
Gonçalves, o qual defende que a celebração do pacto é tida como ato de “alienar” (especialmente se a
comunhão de bens é universal);

■ No caso de testamento, predomina o entendimento de que o pródigo pode testar, pois é ato
“post mortem” e o art. 1.782, CC, trata de atos entre vivos.

O pródigo para casar precisa da manifestação do seu curador?


Sim, quanto ao regime de bens adotado porque o casamento gera um vínculo patrimonial. Quanto ao
aspecto afetivo, o curador não precisa se manifestar.
A interdição do pródigo só interfere em atos de disposição e oneração do seu patrimônio. Pode
inclusive administrá-lo, mas ficará privado de praticar atos que possam desfalcá-lo, como “emprestar, transigir,
dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado” (CC, art. 1.782). Tais atos dependem da
assistência do curador. Sem essa assistência, serão anuláveis (art. 171, I).

Exemplos de prodigalidade:
▸ Por cibomania: impulsos por jogos de azar;
▸ Por oniomania: impulso por compras;
▸ Por imoralidade: sujeito que se desfaz de seu patrimônio na busca da sua satisfação sexual.

📌 OBSERVAÇÕES
■ O CC não traz mais a expressão “LOUCO DE TODO GÊNERO”. As pessoas que padecem de
enfermidade mental ou deficiência que as torne completamente incapazes de praticar atos jurídicos devem ser
interditadas (matéria de processo).

■ Os absolutamente incapazes devem ser representados, sob pena de nulidade absoluta do ato
praticado (art. 166, I, CC);

Art. 166. É NULO o negócio jurídico quando:

I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

■ Para os relativamente incapazes, há o instituto da assistência, sob pena de nulidade relativa do ato
praticado (art. 171, I, CC);

10
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

I - por incapacidade relativa do agente;

■ Art. 3º, “caput”: Há um critério etário de incapacidade absoluta, o que independe de ação
específica - Não há interdição de menor de idade.

Art. 3 São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de
16 anos. .

■ Os menores impúberes podem praticar atos de menor complexidade, desde que demonstrem
discernimento bastante para tanto (Enunciado 138, III Jornada de Direito Civil 16 – Atos-fatos jurídicos).
Exemplo: comprar lanche na cantina da escola;
Enunciado 138, III JDC, “A vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese do inc. I do art. 3º é
juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que
demonstrem discernimento bastante para tanto.”

A vontade do absolutamente incapaz é relevante nas situações existenciais que lhes são pertinentes.
Esse enunciado está dizendo que mesmo sendo menor de 16 anos nada impede que o juiz possa ouvi-lo, pode
ser importante que sua vontade seja sopesada. Inclusive, o Estatuto da Criança e do Adolescente consagra o
direito do adolescente (maior de 12 anos) ser ouvido nos processos de colocação em família substituta, sendo
sua vontade levada em consideração pelo magistrado que atua no feito. No mesmo sentido, sempre que
possível, as crianças também devem ser ouvidas, a fim de expressar seu desejo de pertencer (ou não) àquela
nova realidade (vide art. 28, §§1º e 2º da Lei nº 8.069/1990).

1.3.1. ALTERAÇÕES NO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA


O Estatuto da Pessoa com Deficiência tem como base a convenção internacional sobre os direitos das
pessoas com deficiência. Esta convenção (de NY) foi o primeiro tratado internacional a ingressar no
ordenamento brasileiro com o status de emenda constitucional pelo rito do Art. 5º, §3º, da Constituição
Federal, fazendo parte do denominado “bloco de constitucionalidade”.
São premissas fundamentais do Estatuto da Pessoa com Deficiência:
✔ Igualdade.
✔ Inclusão com autonomia.
✔ Vedação da discriminação
Antes, para as pessoas com deficiência, existia a premissa da dignidade-vulnerabilidade. Tal
premissa foi substituída pela dignidade-igualdade. A pessoa com deficiência, a partir da entrada em vigor do
Estatuto das Pessoas com Deficiência, passou a ser, em regra, plenamente capaz. Para os atos existenciais
familiares, sempre haverá capacidade civil plena (art. 6º, Lei 13.146/2015). Ex: contrair casamento, união estável,
praticar atos reprodutivos, adotar e exercer o planejamento familiar. Neste sentido, o art. 6º do EPD dispõe
expressamente que:

11
Art. 6º A deficiência NÃO AFETA a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

I - casar-se e constituir união estável;

II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre
reprodução e planejamento familiar;

IV - conservar sua fertilidade, sendo VEDADA A ESTERILIZAÇÃO COMPULSÓRIA;

V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em


igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

📌 OBSERVAÇÕES
■ O Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD) revogou ainda a proibição para o casamento, pois o art.
1.548, inciso I, do CC/2002, estabelecia ser NULO o casamento celebrado pelo enfermo mental sem o necessário
discernimento para os atos da vida civil.
■ Nos artigos 84 a 87, o EPD estabeleceu a possibilidade de curatela da pessoa com deficiência.
Porém, o Art. 85, caput, diz expressamente que a curatela afetará tão somente os atos relacionados aos
direitos de natureza patrimonial e negocial.
Esse dispositivo sofre duras críticas, pois, pela sua literalidade, uma pessoa com deficiência submetida
à curatela poderia ser impedida, por exemplo, a por si só comprar um Iphone, mas poderia casar ou adotar
uma criança. Vejamos:

Art. 85. A curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e
negocial.

§ 1º A definição da curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à


privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto.

1.3.1.1. TOMADA DE DECISÃO APOIADA


A Lei incluiu o Art. 1.783-A no Código Civil que disciplina o instituto chamado de TOMADA DE
DECISÃO APOIADA, que nada mais é do que o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo
menos 2 pessoas idôneas com as quais mantenha vínculo e que gozem de confiança para prestar-lhe
apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações
necessários para que possa exercer sua capacidade.

Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo
menos 2 pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para
prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e
informações necessários para que possa exercer sua capacidade.

§ 1o Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com deficiência e os apoiadores devem
apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores,
inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que
devem apoiar.

§ 2o O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa a ser apoiada, com indicação

12
expressa das pessoas aptas a prestarem o apoio previsto no caput deste artigo.

§ 3o Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão apoiada, o juiz, assistido por equipe
multidisciplinar, após oitiva do Ministério Público, ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe
prestarão apoio.

§ 4o A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre terceiros, sem restrições, desde
que esteja inserida nos limites do apoio acordado.

§ 5o Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode solicitar que os apoiadores
contra-assinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado.

§ 6o Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante, havendo divergência de
opiniões entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir
sobre a questão.

§ 7o Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não adimplir as obrigações assumidas,
poderá a pessoa apoiada ou qualquer pessoa apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz.

§ 8o Se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará, ouvida a pessoa apoiada e se for de
seu interesse, outra pessoa para prestação de apoio.

§ 9o A pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término de acordo firmado em processo de
tomada de decisão apoiada.

§ 10. O apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do processo de tomada de decisão
apoiada, sendo seu desligamento condicionado à manifestação do juiz sobre a matéria.

§ 11. Aplicam-se à tomada de decisão apoiada, no que couber, as disposições referentes à prestação de
contas na curatela.

Segundo o professor Rubem Valente, “ ao contrário da curatela, a pessoa conserva a capacidade de


fato, obtendo maior autonomia para a prática de atos da vida civil. Contudo, somente ficará privada de realizar
determinados atos – descritos no termo, homologados pelo Magistrado e registrados em cartório –,
desacompanhada dos apoiadores13”.
O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa a ser apoiada e, antes de decidir,
o juiz ouvirá o MP.

12- Conforme se extrai da interpretação sistemática dos parágrafos § 1º, § 2º e § 3º do Art. 1.783-A, a tomada
de decisão apoiada exige requerimento da pessoa com deficiência, que detém a legitimidade exclusiva para
pleitear a implementação da medida, não sendo possível a sua instituição de ofício pelo juiz. (STJ, REsp n.
1.795.395/MT, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 4/5/2021, DJe de 6/5/2021.)

Por fim, atente-se para julgado importantíssimo do STJ proferido em 2021:

Não se admite a declaração de incapacidade absoluta às pessoas com enfermidade ou deficiência


mental - Depois do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que alterou os arts. 3º e 4º do
Código Civil, não é mais possível declarar como absolutamente incapaz o maior de 16 anos que, em razão de
enfermidade permanente, encontra-se inapto para gerir sua pessoa e administrar seus bens de modo
voluntário e consciente.

A Lei nº 13.146/2015 teve por objetivo assegurar e promover a inclusão social das pessoas com deficiência
física ou psíquica e garantir o exercício de sua capacidade em igualdade de condições com as demais pessoas.

13
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 86.
13
A partir da entrada em vigor da referida lei, só podem ser considerados absolutamente incapazes os menores
de 16 anos, ou seja,o critério passou a ser apenas etário, tendo sido eliminadas as hipóteses de deficiência
mental ou intelectual anteriormente previstas no Código Civil.

O instituto da curatela pode ser excepcionalmente aplicado às pessoas com deficiência, ainda que agora
sejam consideradas relativamente capazes, devendo, contudo, ser proporcional às necessidades e às
circunstâncias de cada caso concreto (art. 84, § 3º, da Lei nº 13.146/2015).

STJ. 3ª Turma. REsp 1927423/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/04/2021 (Info 694).

Enunciado 640 da VIII Jornada de Direito Civil – “A tomada de decisão apoiada não é cabível, se a
condição da pessoa exigir aplicação da curatela.”
Feitas as considerações, prosseguimos com o regular estudo do Código Civil.

Art. 4 São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:

I - os maiores de 16 e menores de 18 anos;

II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;

III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

IV - os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Defensor Público do Estado do Paraná (Instituto AOCP - 2022), foi apresentado o seguinte texto:
“Josefa procura a Defensoria Pública afirmando que seu companheiro, José, foi diagnosticado com mal de
Alzheimer. Narra também que José tem um filho, João, criança que está sob a guarda de fato da mãe, Maria.”
Diante do texto, considerando as disposições legais e jurisprudência sobre o tema, foram apresentadas as
afirmativas abaixo:
I. José é absolutamente incapaz.
II. José poderá se casar, exercer direitos sexuais e reprodutivos e exercerá o direito à adoção, como adotante ou
adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
III. Em caso de ação de regulamentação de convivência familiar intentada por Maria nos interesses de João, o
juiz deverá suspender a convivência com José pela segurança da criança.
IV. É possível a José valer-se do processo da tomada de decisão apoiada, pelo qual a pessoa com deficiência
elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança,
para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e
informações necessários para que possa exercer sua capacidade.
Tendo sido assinaladas como CORRETAS as assertivas “II e IV”.

1.3.2. REGULAÇÃO DA CAPACIDADE DOS INDÍGENAS


Segundo o professor Flávio Tartuce:

“Em relação aos índios ou silvícolas, o Código Civil de 2002 não os considera mais como incapazes, como

14
constava do art. 6.º, III, do CC/1916. A sua situação deve ser regida por lei especial, pelo que enuncia o art. 4.º,
parágrafo único, do CC/2002. Essa lei especial é a Lei 6.001/1973, conhecida como Estatuto do Índio, que
coloca o indígena e sua comunidade, enquanto não integrados à comunhão nacional, sob o regime tutelar,
devendo a assistência ser exercida pela FUNAI (Fundação Nacional do Índio). Enuncia o art. 7.º da referida
norma que a esse regime tutelar aplicam-se, no que couber, os princípios e normas da tutela de direito
comum. São nulos os atos praticados entre o não integrado e qualquer pessoa estranha à comunidade
indígena quando não tenha havido assistência do órgão tutelar competente (art. 8.º do Estatuto do Índio). Não
se aplica tal regra no caso em que o índio revele consciência e conhecimento do ato praticado, desde que não
lhe seja prejudicial, e da extensão dos seus efeitos (art. 8.º, parágrafo único). Qualquer índio poderá requerer
ao Juiz competente a sua liberação do regime tutelar previsto nesta Lei, investindo-se na plenitude da
capacidade civil, desde que preencha os requisitos seguintes: índio a) idade mínima de 21 anos; b)
conhecimento da língua portuguesa; c) habilitação para o exercício de atividade útil, na comunhão nacional; d)
razoável compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional. O Juiz decidirá após instrução sumária,
ouvidos o órgão de assistência ao índio e o Ministério Público, transcrita a sentença concessiva no registro civil
(art. 9.º da Lei 6.001/1973). Aqui não houve qualquer alteração engendrada pelo Estatuto da Pessoa com
Deficiência14”.

Complementa o tema os professores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona em obra conjunta:

Assim, acreditamos que a melhor disciplina sobre a matéria é considerar o indígena, se inserido na sociedade,
como plenamente capaz, podendo ser invocada, porém, como norma tuitiva indigenista, não como presunção
absoluta, mas sim como situação verificável judicialmente, inclusive com dilação probatória específica de tal
condição, para a declaração de nulidade do eventual negócio jurídico firmado.

⚠️ ATENÇÃO
ESTATUTO DO ÍNDIO versus CONVENÇÃO OIT 16915
A crítica que deve ser feita quanto a esse regime tutelar previsto no Estatuto do Índio é que ele está em
total dissonância com a Convenção OIT 169, da qual o Brasil é signatário. Nos termos do referido diploma (que
possui status supralegal), foi superada a noção de integração dos povos indígenas à comunidade nacional, que
era prevista no Estatuto do Índio, passando-se a adotar a noção de proteção e perpetuação de sua cultura,
e respeito à sua diversidade.
Assim, não há mais que se defender a noção de integração dos povos indígenas, muito menos fazer
distinção entre silvícolas integrados e não integrados.
Ademais, mais precisamente no seu art. 3º, dispõe que os povos indígenas e tribais deverão gozar
plenamente dos direitos humanos e liberdades fundamentais, sem obstáculos nem discriminação.
Portanto, deve-se entender que os índios possuem plena capacidade para os atos da vida civil,
alcançada a maioridade. Devem ser entendidos como relativamente incapazes apenas os que se enquadrarem
em algum dos incisos do art. 4º do novel diploma civilista.
Por fim, antes de avançarmos ao próximo ponto, apenas importante destacar o Enunciado nº 3, da I
Jornada de Direito Civil:

3. Art. 5º: a redução do limite etário para a definição da capacidade civil aos 18 anos não altera o disposto no

14
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 104.
15
Fonte: material do curso para Magistratura Federal coordenado pelo professor Patrick Nilo, em 2020.
15
art. 16, I, da Lei nº 8.213/91, que regula específica situação de dependência econômica para fins
previdenciários e outras situações similares de proteção, previstas em legislação especial.

1.3.3. SUPRIMENTO DA INCAPACIDADE


A incapacidade absoluta é suprida através da representação, esta representação pode ser exercida
pelos pais, tutores ou curadores. Cada um destes exerce a atividade de representação em contextos distintos.
Sobre o assunto nos alertam os professores Pablo e Rodolfo:

Não se pode confundir, por outro lado, a representação legal, ora tratada, com a representação voluntária ou
convencional, a exemplo do que ocorre no contrato de mandato. Neste caso, uma parte (mandante) cuida de
outorgar, por ato de vontade, mediante procuração (instrumento do mandato), poderes gerais ou específicos
para que a outra (mandatário) pratique atos jurídicos em seu nome e no seu interesse. Por isso mesmo, o art.
120 preceituou que os “requisitos e os efeitos da representação legal são os estabelecidos nas normas
respectivas; os da representação voluntária são os da Parte Especial deste Código”16

1.3.4. CESSAÇÃO DA INCAPACIDADE


“A incapacidade, via de regra, cessa com o fim da causa que lhe determinou ou com a aquisição
da maioridade civil aos 18 anos, operando a aquisição da plena capacidade jurídica. Cessa, portanto, a
situação de incapacidade e o indivíduo é autorizado a praticar, pessoal e diretamente, todo e qualquer ato
jurídico. Ocorre de forma automática, ou seja, independentemente de qualquer ato judicial”17.
Rubem Valente ensina ainda que, “além das hipóteses elencadas, existe a possibilidade de
antecipação dos efeitos da maioridade civil, por meio do instituto da emancipação, previsto no art. 5º do Código
Civil”.

1.3.4.1. EMANCIPAÇÃO
Instituto presente no art. 5º do Código Civil:

Art. 5, CC. A menoridade cessa aos 18 anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os
atos da vida civil.

Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade (EMANCIPAÇÃO):

I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público,
INDEPENDENTEMENTE DE HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor
tiver dezesseis anos completos – serão registrados em registro público;

II - pelo casamento;

III - pelo exercício de emprego público efetivo;

IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;

V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função
deles, o menor com 16 anos completos tenha economia própria.

16
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
2022.
17
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado . Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2022.
16
Segundo Flávio Tartuce, “pode ser conceituada como o ato jurídico que antecipa os efeitos da aquisição
da maioridade e da consequente capacidade civil plena, para data anterior àquela em que o menor atinge a
idade de 18 anos, para fins civis. Com a emancipação, o menor deixa de ser incapaz e passa a ser capaz.
Todavia, ele não deixa de ser menor18”.
Temos 3 espécies de emancipação: Voluntária, Judicial e Legal, os professores Pablo e Rodolfo
apresentam o seguinte quadro de resumo:19

Passamos agora à análise de cada uma das classificações de emancipação:


a) VOLUNTÁRIA: “por ato unilateral dos pais, ou de um deles na falta do outro, sempre em benefício do
menor. É um ato irrevogável e feito por meio de escritura pública, registrada no Cartório do Registro
Civil do lugar onde está assentado o registro da pessoa emancipada. Nessa hipótese de emancipação,
os pais continuam respondendo pelos atos ilícitos dos filhos20”;
A forma desta modalidade de emancipação é de INSTRUMENTO PÚBLICO que, posteriormente, deve
ser levada a registro no Cartório de Registro Civil, conforme dispõe o art. 9º, inciso II, do CC/02, para que assim
tenha validade perante terceiros, independe de homologação do juízo.

Art. 9º, CC. Serão registrados em registro público:

II - a emancipação por outorga dos pais ou por sentença do juiz;

18
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 104.
19
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
2022.
20
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 88.
17
📌 OBSERVAÇÕES
■ A emancipação não constitui direito do menor que não pode exigi-la em juízo.
■ O filho emancipado faz cessar a responsabilidade civil dos pais? Segundo o professor Rubem
Valente “Não há previsão expressa na codificação privada a respeito do tema. Se a emancipação é voluntária,
por ato próprio, ou judicial, a responsabilidade civil dos pais, segundo a doutrina majoritária, é solidária. Já a
emancipação legal gera a exoneração da responsabilidade dos pais. Nessa linha de raciocínio, o Enunciado 41
da I Jornada de Direito Civil do CJF aduz: “A única hipótese em que poderá haver responsabilidade solidária do
menor de 18 anos com seus pais é ter sido emancipado nos termos do art. 5º, parágrafo único, inc. I, do novo
Código Civil”. No que concerne à perspectiva da jurisprudência superior, entende-se, de igual forma, que “a
emancipação voluntária, diversamente da operada por força de lei, não exclui a responsabilidade civil dos pais
pelos atos praticados por seus filhos menores” (STJ, AgRg no Ag 1.239.557/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Maria Isabel
Gallotti, j. 09.10.2012). Por razões evidentes, busca-se evitar que os pais se utilizem da emancipação como meio
de afastar a responsabilidade civil que lhes é legalmente imposta pelos atos do filho, uma vez que a
emancipação é DEFINITIVA, IRRETRATÁVEL E IRREVOGÁVEL, embora caiba anulação por vício (erro ou dolo, por
exemplo)21”.
■ A emancipação é irrevogável (exceção: hipótese de invalidade do casamento). Todavia, a
irrevogabilidade não se confunde com invalidade. Uma vez que a emancipação dever ser concedida em função
do interesse do menor, poderá ela ser ANULADA se praticada apenas para exonerar os pais do dever de
alimentar.

Enunciado nº 397, da V JDC: a emancipação por concessão dos pais ou por sentença do juiz está sujeita à
desconstituição por vício de vontade.

Enunciado nº 530, da VI JDC: a emancipação, por si só, não elide a incidência do estatuto da criança e do
adolescente.

b) JUDICIAL: “concedida pelo juiz, ouvido o tutor, desde que o menor tenha pelo menos 16 anos
completos. Nem sempre satisfeito com o encargo que lhe foi imposto, com o fito de evitar
emancipações destinadas a livrar o tutor do ônus que lhe foi atribuído, a norma determina que tal
espécie deve ser submetida ao crivo do magistrado, evitando prejuízos ao menor. O tutor, desse modo,
não pode emancipar diretamente o tutelado22”;
Observe-se que a previsão legal, por mencionar tutor, pressupõe a falta de ambos os pais, motivo pelo
qual a emancipação somente se dará pela via judicial, ao contrário da modalidade anterior — emancipação
voluntária — que se realiza extrajudicialmente.23

📌 OBSERVAÇÕES
■ As emancipações voluntária e judicial devem ser registradas em livro próprio do 1º ofício de registro
civil da comarca do domicílio do menor. Antes do registro não produzirão efeitos (Art. 91, §único, LRP).
Inclusive deverá o Juiz comunicar de ofício o Oficial Registrador, caso em 8 dias da decisão não tenha sido
comprovado tal comunicação, de acordo com o art. 91 da Lei de Registros Públicos (lei 6.015/73.

21
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 88.
22
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 88.
23
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
2022.
18
Art. 91. Quando o juiz conceder emancipação, deverá comunicá-la, de ofício, ao oficial de registro, se não
constar dos autos haver sido efetuado este dentro de 8 dias.

Parágrafo único. Antes do registro, a emancipação, em qualquer caso, não produzirá efeito.

■ Registre-se que não se enquadra no conceito de emancipação judicial a realizada no caso de


impossibilidade de um dos pais (motivo de saúde, por exemplo), em que o juiz é chamado a intervir, pois, neste
caso, atua no exercício da sua própria função jurisdicional.24

c) LEGAL: “quando o menor vem a praticar determinado ato reputado incompatível com a sua condição
de incapaz, como: 1) casamento (a separação, a viuvez ou mesmo a anulação do casamento, para o
cônjuge de boa-fé, não geram retorno à menoridade), inclusive daquele que não tem, ainda, 16 anos
(para evitar imputação de crime ou em caso de gravidez); 2) exercício de cargo ou emprego público
efetivo; 3) colação de grau em curso de ensino superior; 4) estabelecimento civil, comercial ou
existência de relação de emprego (para maiores de 16 anos) que gerem economia própria25”.

📌 OBSERVAÇÕES
■ O casamento válido emancipa o menor e também o putativo (não lembra o que é? Reveja seu
caderno de família, espécies de casamento). O NULO não produz nenhum efeito.
Interessante posicionamento traz os professores Pablo e Rodolfo: “ Em caso de nulidade ou anulação
(do casamento), entendemos que a emancipação persiste apenas se o matrimônio fora contraído de boa-fé
(casamento putativo). Em caso contrário, retorna-se à situação de incapacidade, como consectário lógico de um
retorno ao status quo ante.”26
■ Segundo a doutrina, ainda que os nubentes venham a se separar em momento futuro, a
emancipação decorrente do casamento permanece,
■ A união estável NÃO CAUSA emancipação. Além de o rol do Art. 5º ser taxativo, tal modus vivendi
não exige autorização.
■ No que diz respeito ao inciso III, que trata da emancipação pelo exercício do emprego público efetivo
é interessante lembrarmos do conceito de servidor público: ““o indivíduo que mantém, com o Estado ou
entidades de sua Administração direta ou indireta, relação de trabalho de natureza profissional e caráter não
eventual, sob vínculo de dependência. O servidor, entretanto, é um gênero, do qual se extraem duas espécies: o
empregado público (conhecido pelo neologismo ‘celetista’), que mantém relação de trabalho subordinado,
regida, portanto, pela legislação trabalhista comum (no caso brasileiro, a CLT, de onde se origina o epíteto
mencionado); e o serventuário ou funcionário público, que é o trabalhador que exerce cargo ou função pública,
mediante aprovação em concurso público, eleição ou nomeação em comissão, com disciplina por Estatuto (daí
também o neologismo de servidor ‘estatutário’), que é instituto jurídico regido pelo Direito Administrativo”27
■ Ainda sobre o mesmo inciso III a doutrina entende que tal expressão deve ser ampliada à noção de

24
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
2022.
25
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 88.
26
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
2022.
27
PINTO, José Augusto Rodrigues; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Repertório de Conceitos Trabalhistas, São Paulo: LTr, 2000, p. 474-5.
19
função pública. Todavia, excluem-se os cargos de confiança, já que não efetivos, bem como os serviços
temporários. Aqui não se exige economia própria.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco (FCC - 2022), foram consideradas corretas as
afirmativas a seguir:
II. A emancipação feita por ambos os pais, ao filho com idade de 18 anos incompletos, exige instrumento
público.
III. A emancipação feita por tutor em relação ao tutelado depende de decisão judicial.”

1.4 EXTINÇÃO DA PESSOA NATURAL


Conforme dispõe o professor Rubem Valente28, “A extinção da pessoa natural, nos termos do art. 6º do
Código, ocorre com a morte, evento que faz cessar toda e qualquer atividade vital do indivíduo. Para fins de
transplante de órgãos, considera-se suficiente a morte encefálica. Com a morte, fica completo o ciclo vital da
pessoa humana, extinguindo-se, automaticamente, a sua personalidade jurídica juntamente com seus direitos.”

Art. 6 A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos AUSENTES, nos
casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.

Com a morte, extingue-se a personalidade jurídica da pessoa humana, e seus direitos. No entanto,
conforme leciona o professor Rubem Valente, “mesmo após a extinção da pessoa, subsistirá a sua vontade, por
exemplo, para os fins do que, eventualmente, tiver o falecido disposto em testamento ou codicilo, bem como no
que concerne ao destino do corpo, se, em vida, ocorreu expressa manifestação de vontade própria29”.

Como é o reconhecimento da morte real? Em regra, é necessário uma declaração médica da ocorrência
da morte encefálica para que seja, então, lavrada a necessária certidão de óbito.

📌 OBSERVAÇÃO
A morte deverá ser atestada por profissional da Medicina, ressalvada a possibilidade de duas
testemunhas o fazerem se faltar o especialista, sendo o fato levado a registro, nos termos dos arts. 77 a 88 da
Lei de Registros Públicos.30

No entanto,existe a possibilidade de ocorrência da morte em situações excepcionais, atípicas, nas


quais não seja possível localizar o corpo do indivíduo. É a chamada morte presumida, que pode ser:

28
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado . Disponível em: Minha Biblioteca, (2ª edição). Grupo GEN, 2022.
29
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 89.
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
30

2022.
20
COM DECLARAÇÃO DE “Nas ocasiões em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva (art.
AUSÊNCIA 6º do CC)31”;

“Em situações que for extremamente provável a morte para quem estava
em perigo de vida e, se alguém, desaparecido em campanha ou feito
prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra (art.
SEM DECLARAÇÃO DE
7º do CC). Procede-se, nesse caso, como anunciado anteriormente,
AUSÊNCIA
mediante Justificação, consoante procedimento estabelecido na Lei de
Registros Públicos, com a finalidade de promover o assento de óbito por
meio de provas indiretas32”.

Art. 7 Pode ser declarada a morte presumida, SEM DECRETAÇÃO DE AUSÊNCIA:


I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;
II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até 2 anos após o
término da guerra.
Parágrafo único. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de
esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.

1.4.1 COMORIÊNCIA
O instituto da comoriência é aplicado nas situações em que “não se pode definir com precisão a
ordem cronológica das mortes de pessoas que faleceram em uma mesma situação (comorientes). Presume-se
haverem falecido no mesmo instante33”.

Art. 8 (COMORIÊNCIA) Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se
algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos.

Para realmente ilustrar a situação nos renderemos ao exemplo a seguir: “João e Maria, casados entre
si, sem descendentes ou ascendentes vivos. Falecem por ocasião do mesmo acidente. Pedro, primo de João, e
Marcos, primo de Maria, concorrem à herança dos falecidos. Se a perícia atestar que João faleceu dez minutos
antes de Maria, a herança daquele, à luz do princípio da saisine e pela ordem de vocação legal, seria transferida
para a sua esposa e, posteriormente, após se agregar ao patrimônio dela, arrecadada por Marcos. A solução
inversa ocorreria se Maria falecesse antes de João. Ora, em caso de falecimento sem possibilidade de fixação do
instante das mortes, firma a lei a presunção de óbito simultâneo, o que determinará a abertura de cadeias
sucessórias distintas. Assim, nessa hipótese, não sendo os comorientes considerados sucessores entre si, não
haverá transferência de bens entre eles, de maneira que Pedro e Marcos arrecadarão a meação pertencente a
cada sucedido.”34
Qual é a consequência da comoriência? A ocorrência da comoriência tem efeitos no âmbito dos
direitos das sucessões, pois ela impede a transmissão de qualquer direito entre as pessoas comorientes.

31
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 90.
32
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 90.
33
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 90.
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva,
34

2022.
21
Conforme leciona o professor Rubem Valente “em caso de serem parentes, não sucedem um ao outro,
abrindo-se cadeias sucessórias distintas. Somente haverá comoriência entre pessoas sucessíveis entre si, pois
não há nenhum interesse para o direito civil na determinação da ordem de óbitos em relação a pessoas que
não travam qualquer relação jurídica de transmissão de direitos.35”

1.4.2 DA AUSÊNCIA
A ausência já possuiu outros entendimentos em códigos passados, atualmente a ausência “consiste
no desaparecimento de uma pessoa de seu domicílio, sem dar notícias do lugar onde se encontra, nem
deixar procurador para administrar seus bens, acarretando, por essa razão, dúvida a respeito de sua
sobrevivência. Não basta o desaparecimento de uma pessoa para a sua configuração. A ausência reclama
uma declaração judicial, em procedimento especial de jurisdição voluntária (onde não há partes, não há lide e
nem pretensão resistida de interesses36”
Existem três etapas para que seja realizada a declaração de ausência:

▸ Inicia-se mediante provocação, por meio de petição inicial de qualquer


interessado.
○ Parentes sucessíveis, sócios, credores, pessoas que têm pretensão contra
o ausente) ou do MP.

▸ Competência: será proposta no último domicílio do ausente (art. 49 do


CPC/2015).

▸ Após a propositura, o juiz deverá arrecadar os bens abandonados e


nomear curador (art. 744 do CPC/2015), mesmo que o ausente tenha deixado
procurador, acaso este não possa ou não queira mais exercer o mandato.
1. CURATELA DOS BENS
DO AUSENTE
▸ Desde que não separado judicialmente ou de fato, por mais dois anos, o
(arts. 22 a 25)37
cônjuge do ausente terá prioridade para ser o curador.
○ Subsidiariamente, poderão ser nomeados os ascendentes e, em seguida,
os descendentes.
○ Inexistindo qualquer desses, o juiz escolherá um curador.

▸ Após nomeado, receberá do juiz poderes e obrigações especiais, ficando


responsável pela administração e conservação do patrimônio do ausente,
pelo que receberá uma gratificação e terá ressarcido do que gastou no
exercício da curadoria.
○ É proibido ao curador adquirir bens do ausente, em função do conflito de
interesses.

35
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 90.
36
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 91.
37
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 92.
22
▸ Com o fim da arrecadação, o juiz mandará publicar editais na rede mundial
de computadores, no sítio do tribunal a que estiver vinculado e na plataforma
de editais do Conselho Nacional de Justiça, onde permanecerá por um ano, ou,
não havendo sítio, no órgão oficial e na imprensa da comarca, durante um ano,
reproduzida de dois em dois meses, anunciando a arrecadação e chamando o
ausente a entrar na posse de seus bens (art. 745 do CPC/2015).

▸ Cessa a curadoria caso o ausente reapareça, compareça seu procurador ou,


ainda, haja notícia inequívoca de seu óbito;

▸ Com o fim do prazo previsto no edital, poderão os interessados requerer a


abertura da sucessão provisória (art. 745, § 1º, do CPC/2015).

▸ Fase que se instaura após o decurso de um ano da arrecadação ou, caso o


ausente tenha deixado procurador, passados três anos.

▸ É uma administração dos bens do ausente (não mero depósito), com o


objetivo de preservá-los, de modo que não sejam alterados mais do que o
necessário, já que o desaparecido pode estar vivo.

▸ Depende de pedido dos interessados.


○ Não havendo qualquer dos interessados mencionados, o MP pode
requerer a sucessão provisória.
2. SUCESSÃO PROVISÓRIA
(art.s 26 a 36)38 ▸ Os efeitos da sentença que a determina só ocorrem após 180 dias de sua
publicação. Entretanto, imediatamente após transitada em julgado, ocorre a
abertura do testamento e do inventário, como se o ausente fosse falecido.

▸ Não comparecendo herdeiro ou interessado para requerer a abertura do


inventário, após 30 dias do trânsito em julgado, a massa de bens do ausente
será considerada como herança jacente.

▸ Os herdeiros que se imitirem na posse dos bens devem prestar garantia


pignoratícia ou hipotecária, com exceção do cônjuge, dos ascendentes e dos
descendentes.
○ Os que não prestarem a devida garantia, ficarão impedidos de ter a posse
dos bens, mas receberão a metade dos rendimentos da sua cota.
○ Cônjuges, ascendentes e descendentes receberão a integralidade dos

38
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 92.
23
frutos produzidos pelos bens que administram.
○ Os outros herdeiros, a metade.
○ Nessa fase, não se poderá alienar os imóveis do ausente.

▸ Reaparecendo o ausente e provado que a ausência foi injustificada e


voluntária, perderá os frutos;

▸ Etapa que ocorre após dez anos do trânsito em julgado da sentença que
concedeu a abertura da sucessão provisória.

⚠️ ATENÇÃO
Caso o ausente tenha 80 anos e esteja sumido há, pelo menos, cinco
anos, poderá acontecer a sucessão definitiva, sem que seja necessário cumprir
o prazo de dez anos.

3. SUCESSÃO DEFINITIVA
▸Nessa fase, levantam-se as garantias prestadas.
(arts. 37 a 39)39

▸ Após o trânsito em julgado da sentença que concede a sucessão definitiva


dos bens, declara-se a morte presumida.

▸ Se o ausente retornar, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, nos


10 anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, receberá os bens no
estado em que se encontrarem, os que foram sub-rogados em seu lugar ou o
preço que os herdeiros houverem recebido.

⚠️ ATENÇÃO
A ausência pode gerar efeitos familiares:
● Após a declaração da morte presumida, o casamento resta dissolvido;
● Se houver filhos menores órfãos e ambos os pais estiverem ausentes, os menores devem ser
postos em tutela.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco (FCC - 2022), questionou-se: “São efeitos da morte
da Pessoa Natural, tendo sido assinalado como CORRETA a assertiva que disse: “extinção do poder familiar e a
dissolução da sociedade conjugal.“

2. DIREITOS DE PERSONALIDADE

39
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 92.
24
A doutrina tem muita dificuldade em definir quais são ou o que são os direitos da personalidade, pois a
expressão é muito vaga. No Brasil, o pioneiro no estudo dos direitos da personalidade foi o professor RUBENS
LIMONGI FRANÇA. Segundo ele, os direitos da personalidade consistem nos direitos próprios da pessoa
humana em suas emanações e prolongamentos. Isto significa que para que alguém seja titular de direitos da
personalidade basta que seja um ser humano independentemente de qualquer outra condição.
Para o professor Flávio Tartuce, "os direitos da personalidade têm por objeto os modos de ser, físicos
ou morais do indivíduo. O que se busca proteger com tais direitos são os atributos específicos da
personalidade, sendo esta a qualidade do ente considerado pessoa. Em síntese, pode-se afirmar que os direitos
da personalidade são aqueles inerentes à pessoa e à sua dignidade (art. 1.º, inc. III, da CF/1988)40”.
Para os professores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona: “os direitos da personalidade como aqueles que
têm por objeto os atributos físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais. A ideia a
nortear a disciplina dos direitos da personalidade é a de uma esfera extrapatrimonial do indivíduo, em que o
sujeito tem reconhecidamente tutelada pela ordem jurídica uma série indeterminada de valores não redutíveis
pecuniariamente, como a vida, a integridade física, a intimidade, a honra, entre outros.”41
A doutrina diverge quanto à origem dos direitos de personalidade. Podemos apontar 3 teorias acerca
da origem:
a) DIREITO NATURAL: Os direitos de personalidade são naturais, ou seja, existem independentemente de
qualquer lei que os reconheça. São assim, inatos. (GOFFREDO SILVA TELLES)
b) DIREITO POSITIVO: Não existem direitos que não sejam positivados. Os direitos da personalidade são
atribuídos pela lei. Tanto é verdade que em alguns períodos históricos certas pessoas foram privadas
dos direitos da personalidade. (PONTES DE MIRANDA)
c) HISTORICISMO AXIOLÓGICO (MIGUEL REALE): REALE explica os direitos da personalidade por meio do
historicismo axiológico, ou seja, os direitos da personalidade seriam conquistas civilizacionais
transmitidas de uma geração à outra e que, portanto, dão a sensação de sempre terem existido.

2.1. FUNDAMENTO DO DIREITO DA PERSONALIDADE


A doutrina de maneira praticamente unânime ensina que os direitos da personalidade têm fundamento
na dignidade da pessoa humana, de modo que a violação aos direitos de personalidade implica violação à
dignidade humana. (CORRENTE QUE DEVE SER ADOTADA).
Didaticamente, é interessante associar os direitos da personalidade com cinco grandes ícones,
colocados em prol da pessoa no atual Código Civil e visualizados a seguir42:
a) Vida e integridade físico-psíquica, estando o segundo conceito inserido no primeiro, por uma questão
lógica.
b) Nome da pessoa natural ou jurídica, com proteção específica constante entre os arts. 16 a 19 do CC,
bem como na Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/1973).
c) Imagem, classificada em imagem-retrato – reprodução corpórea da imagem, representada pela
fisionomia de alguém; e imagem-atributo – soma de qualificações de alguém ou repercussão social da

40
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 107.
41
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
42
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 108.
25
imagem.
d) Honra, com repercussões físico-psíquicas, subclassificada em honra subjetiva (autoestima) e honra
objetiva (repercussão social da honra). Tal divisão segue a doutrina, entre outros, de Adriano De Cupis,
para quem “a honra significa tanto o valor moral íntimo do homem, como a estima dos outros, ou a
consideração social, o bom nome ou a boa fama, como, enfim, o sentimento, ou consciência, da própria
dignidade pessoal”.
e) Intimidade, sendo certo que a vida privada da pessoa natural é inviolável, conforme previsão expressa
do art. 5.º, inc. X, da CF/1988: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Essa lista foi inspirada na doutrina de Rubens Limongi França, que divide os direitos da personalidade
em três grandes grupos:
● O primeiro deles está relacionado ao direito à integridade física, englobando o direito à vida e ao
corpo, vivo ou morto.
● O segundo grupo é afeito ao direito à integridade intelectual, abrangendo a liberdade de
pensamento e os direitos do autor.
● No terceiro grupo há o direito à integridade moral, relativo à liberdade política e civil, à honra, ao
recato, ao segredo, à imagem e à identidade pessoal, familiar e social.

Tais ícones devem ser relacionados com três princípios básicos constitucionais:
a) Princípio de proteção da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de
Direito da República Federativa do Brasil (art. 1.º, inc. III, da CF/1988).
b) Princípio da solidariedade social, também um dos objetivos da República Federativa do Brasil
(construção de uma “sociedade livre, justa e solidária” – art. 3.º, inc. I, da CF/1988), visando também à
erradicação da pobreza (art. 3.º, inc. III, da CF/1988).
c) Princípio da igualdade lato sensu ou isonomia, eis que “todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza” (art. 5.º, caput, da CF/1988).

2.2. CRÍTICA À DIGNIDADE COMO FUNDAMENTO DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE


O professor Maurício Bunazar nos lembra que o conceito atual de dignidade humana foi desenvolvido
pelo filósofo KANT em sua obra "Fundamentação metafísica dos costumes”. Ele diferencia pessoas e coisas nos
seguintes termos: coisas têm preço, pessoas têm dignidade. Ninguém pode utilizar o ser humano como um
simples meio. Para Kant, portanto, pode-se dizer que a violação da dignidade humana se caracteriza quando
ocorre a COISIFICAÇÃO do ser humano, quando uma pessoa é tratada como se coisa fosse.
A ideia de dignidade humana passou a fazer parte do contexto jurídico com a Lei fundamental alemã
do pós guerra e sua proclamação teve por objeto evitar que os horrores do nazismo se repetissem.
Pode-se estabelecer a relação entre dignidade humana e direitos da personalidade a partir da ideia de
continente e conteúdo de modo que toda violação à dignidade humana implica violação aos direitos da
personalidade, mas nem toda violação a direitos de personalidade implica violação à dignidade humana.
Veja o gráfico:

26
Exemplo: A tortura implica violação à dignidade humana e também viola direitos da personalidade
consistente no direito à integridade física ou psicológica. Por sua vez, a divulgação não autorizada da imagem
alheia para fins de propaganda comercial viola direito de imagem (direito de personalidade), mas não implica
violação à dignidade humana.
O autor Rubens Limongi França diz que os direitos da personalidade dizem-se as faculdades
jurídicas cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim da sua projeção
essencial no mundo exterior.
O autor Cristiano Chaves considera os direitos da personalidade aqueles direitos subjetivos
reconhecidos à pessoa, tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais. Enfim, são direitos
essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana e em que se convertem as projeções físicas, psíquicas e
intelectuais do seu titular, individualizando-o de modo a lhe emprestar segura e avançada tutela jurídica.

2.3. DIREITOS DA PERSONALIDADE E PESSOAS JURÍDICAS


Como visto, prevalece a ideia de que os direitos de personalidade têm por fundamento a dignidade e,
portanto, as pessoas jurídicas não seriam titulares dos direitos de personalidade, afinal de contas não têm
dignidade humana. Neste sentido, GUSTAVO TEPEDINO e PABLO MALHEIROS.
Todavia, essa tese final não prevalece no Brasil. O Código Civil no art. 52 dispõe que “se aplica às
pessoas jurídicas, no que couber, a proteção aos direitos da personalidade”.

Súmula 227, STJ: A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

O professor TEPEDINO critica a súmula, pois segundo ele o dano moral é consequência da violação à
dignidade humana. Com relação às pessoas jurídicas sem fins lucrativos o professor ensina que elas sofrem o
que ele chama de DANO INSTITUCIONAL.

📌 OBSERVAÇÃO
A pessoa jurídica só sofre dano moral quanto à honra objetiva e não quanto à honra subjetiva. A
pessoa jurídica tem direito ao nome, à honra objetiva, à imagem (retrato e atributo) e ao segredo. Sobre o
assunto destacamos o seguinte julgado recente:

27
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE
RESILIÇÃO DE CONTRATO E RECONVENÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/73. NÃO OCORRÊNCIA. DANO
MATERIAL (SÚMULA 7 DO STJ). DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. HONRA OBJETIVA. RUPTURA DO CONTRATO
DE DISTRIBUIÇÃO E DE TRANSPORTE PELAS FABRICANTES. INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO. DISTRIBUIÇÃO DOS
ÔNUS SUCUMBENCIAIS. INVIABILIDADE. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Não há violação do art. 535 do CPC/73 quando o eg. Tribunal estadual aprecia a controvérsia em sua
inteireza e de forma fundamentada.

2. O eg. Tribunal estadual, com arrimo nas peculiaridades do caso concreto, concluiu pela existência de danos
materiais a serem reparados pelos recorrentes. A pretensão recursal, no sentido de modificar esse
entendimento, demandaria o revolvimento fático e probatório, providência incompatível com o apelo nobre, a
teor da Súmula 7/STJ.

3. A teoria acerca da possibilidade de pessoa jurídica experimentar dano moral está calcada na violação
da honra objetiva, consubstanciada em atributos externalizados, susceptíveis de padecerem de mácula
à imagem, à admiração conquistada, ao respeito e à credibilidade no tráfego comercial. Assim, a
violação à honra objetiva está intimamente relacionada à publicidade de informações potencialmente
lesivas à reputação da pessoa jurídica (REsp 1.005.752/PE, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
Quarta Turma, j.

em 26/6/2012, DJe de 2/8/2012).

4. As condutas elencadas no acórdão recorrido, tais como a invasão da fabricante na área de distribuição das
recorridas; a rescisão contratual independentemente do aviso prévio; a ausência de pagamento dos
empregados; a falta de carregamento dos veículos com os produtos para a distribuição; a constituição
exclusiva das sociedades de distribuição; a ausência de cumprimento da margem de lucro prometida; a
restrição de rota e de entrega à transportadora, entre outros, configuram ocorrências inerentes à própria
atividade de distribuição e revenda exclusiva dos produtos comercializados, ou a eventualidades decorrentes
de tal atividade, de modo que não possuem o condão de influir na honra objetiva das sociedades
empresárias recorridas, não estando demonstrada nenhuma mácula à imagem, à admiração, ao respeito e à
credibilidade das recorridas.

5. No que tange à sucumbência recíproca, com a consequente distribuição equânime dos ônus, impende
consignar que a decisão recorrida não padeceu de vício, máxime porque bem realizou a efetiva fixação,
partindo-se da sucumbência mínima das ora recorridas.

6. Agravo interno parcialmente provido, com o fim de excluir da condenação a compensação por danos
morais. (AgInt no AREsp n. 532.727/RN, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/9/2022, DJe
de 20/9/2022.)

Os direitos da personalidade previstos no Código Civil de 2002 estão em rol taxativo (“numerus
clausus”) ou exemplificativo (“numerus apertus”)? Estão em rol exemplificativo, conforme Enunciado n. 274 –
IV Jornada de Direito Civil.

Enunciado 274, IV JDC: “Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil,
são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, inc. III, da Constituição
(princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os
demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação.”

Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da

28
ponderação. A técnica da ponderação foi incluída expressamente no Código de Processo Civil de 2015 em seu
artigo 489, § 2º do CPC. Trata-se da chamada “ponderação à brasileira” (colisão de normas). A técnica da
ponderação foi desenvolvida na Alemanha por Robert Alexy para os casos de colisão entre direitos
fundamentais (Caso Lebach).

CPC, Art. 489. São elementos da sentença:

§2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação
efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que
fundamentam a conclusão.

No Brasil, o principal exemplo de ponderação envolve a liberdade de expressão e de pensamento


versus o direito à imagem e à intimidade. Enunciado 279, IV JDC: “A proteção à imagem deve ser ponderada com
outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e
da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos
abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa,
biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações.”

Enunciado n. 613 da VIII Jornada de Direito Civil: a liberdade de expressão não goza de posição
preferencial em relação aos direitos da personalidade (imagem e intimidade) (técnica da ponderação).

Em suma, o Enunciado 279 prevê o uso da técnica de ponderação e o Enunciado 613 dispõe que a
liberdade de expressão não prevalece sempre, ou seja, não goza de posição preferencial.

Inexistência do direito à indenização em razão da divulgação, no jornal, de imagem do cadáver morto


em via pública - Jornal divulgou a foto do cadáver de um indivíduo morto em tiroteio ocorrido em via
pública.

Os familiares do morto ajuizaram ação de indenização por danos morais contra o jornal alegando que houve
violação aos direitos de imagem. O STF julgou a ação improcedente argumentando que condenar o
jornal seria uma forma de censura, o que afronta a liberdade de informação jornalística. STF. 2ª Turma.
ARE 892127 AgR/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/10/2018 (Info 921).

Inexistência do direito à indenização em razão da divulgação, no jornal, de imagem do cadáver


morto em via pública
Existem direitos da personalidade que sequer estão escritos. Exemplo: direito ao esquecimento -
Nesse sentido, Enunciado n. 531– VI Jornada de Direito Civil: “A tutela da dignidade da pessoa humana na
sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento.”

⚠️ ATENÇÃO
No início de 2021 o STF, ao julgar o RE 1010606/RJ, sob a sistemática da Repercussão Geral
(Tema 786), entendeu que o direito brasileiro não foi contemplou o direito ao esquecimento:

É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de

29
obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e
publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no
exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos
parâmetros constitucionais – especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e
da personalidade em geral – e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível. STF.
Plenário. RE 1010606/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 11/2/2021 (Repercussão Geral – Tema 786) (Info
1005).

No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça:

O direito ao esquecimento não justifica a exclusão de matéria jornalística - O direito ao esquecimento é


considerado incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro. Logo, não é capaz de justificar a atribuição
da obrigação de excluir a publicação relativa a fatos verídicos. STJ. 3ª Turma. REsp 1961581-MS, Rel. Min.
Nancy Andrighi, julgado em 07/12/2021 (Info 723).

Existindo evidente interesse social no cultivo à memória histórica e coletiva de delito notório, incabível o
acolhimento da tese do direito ao esquecimento para proibir qualquer veiculação futura de matérias
jornalísticas relacionadas ao fato criminoso cuja pena já se encontra cumprida. O chamado direito ao
esquecimento, apesar de ser reconhecido pela jurisprudência, não possui caráter absoluto. Em caso de
evidente interesse social no cultivo à memória histórica e coletiva de delito notório, não se pode proibir a
veiculação de matérias jornalísticas relacionados com o fato criminoso, sob pena de configuração de censura
prévia, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. Em tal situação, não se aplica o direito ao esquecimento.
STJ. 3ª Turma. REsp 1736803-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 28/04/2020 (Info 670). Obs: É
importante ter conhecimento desse julgado, mas não deixe de observar que ele foi proferido antes do
julgamento de repercussão geral do STF. Atualmente, não reconhecemos o direito ao esquecimento em
nosso ordenamento jurídico.

Excepcionalmente, é possível que o Judiciário determine o rompimento do vínculo estabelecido por sites de
busca entre o nome da pessoa, utilizado como critério exclusivo de busca, e a notícia desabonadora
apontada nos resultados - STJ. 3ª Turma. REsp 1660168-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Marco
Aurélio Bellizze, julgado em 08/05/2018 (Info 628).

Exemplo de direito de personalidade que não está escrito no rol do Código Civil, mas é reconhecido
pela jurisprudência da Corte Superior, é o direito à orientação sexual. Neste sentido, o STJ já condenou veículo
jornalístico ao pagamento de indenização a indivíduo referido como “bicha” em um noticiário impresso:

Direito civil. Indenização por danos morais. Publicação em jornal. Reprodução de cognome relatado em
boletim de ocorrências. Liberdade de imprensa. Violação do direito ao segredo da vida privada. Abuso de
direito. A simples reprodução, por empresa jornalística, de informações constantes na denúncia feita pelo
Ministério Público ou no boletim policial de ocorrência consiste em exercício do direito de informar. Na
espécie, contudo, a empresa jornalística, ao reproduzir na manchete do jornal o cognome ? "apelido" ? do
autor, com manifesto proveito econômico, feriu o direito dele ao segredo da vida privada, e atuou com abuso
de direito, motivo pelo qual deve reparar os conseqüentes danos morais. Recurso especial provido. (REsp
613.374/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/05/2005, DJ 12/09/2005, p.
321)

2.4. CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

30
O CC/02 disciplina os direitos da personalidade nos Arts. 11 a 21; em seu art. 11 aponta as
características:

Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são INTRANSMISSÍVEIS e
IRRENUNCIÁVEIS, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

Os direitos de personalidade, em razão de seu caráter personalíssimo, são IMPENHORÁVEIS pelo fato
de não terem conteúdo econômico. O que pode ser penhorado são os reflexos patrimoniais dos direitos da
personalidade.
Ensina os professores Pablo e Rodolfo sobre a impenhorabilidade: “decorrente da
extrapatrimonialidade e indisponibilidade, direitos morais jamais poderão ser penhorados, não havendo,
porém, qualquer impedimento legal na penhora do crédito dos direitos patrimoniais correspondentes”43
O Código Civil (art. 11) em sua literalidade estabelece que as limitações aos direitos da personalidade
sempre devem estar autorizadas em lei. Porém, a doutrina afasta essa ideia, permitindo que haja limitações
sem qualquer previsão legal desde que não sejam permanentes e nem gerais. Neste sentido é o enunciado
nº 4 do CJF.
Ao lado dessas características legais, a doutrina aponta ainda que os direitos da personalidade são
ABSOLUTOS. Isso significa que os direitos da personalidade existem independentemente de qualquer
relação jurídica. Isto não significa que são ilimitados, apenas que eles não estão inseridos numa relação
jurídica. Trata-se de “oponibilidade erga omnes, irradiando efeitos em todos os campos e impondo à
coletividade o dever de respeitá-los”.44
Prevê o Enunciado n. 4 do CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil, que “o exercício dos direitos
da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral”. Ademais, o
Enunciado, de número 139, da III Jornada de Direito Civil, ressalta que “os direitos da personalidade podem
sofrer limitações, ainda que não especificamente previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso de direito de
seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes”.
Pelo teor desses dois enunciados doutrinários, a limitação voluntária constante do art. 11 do CC seria
somente aquela não permanente e que não constituísse abuso de direito.
Em relação ao art. 12, caput, do Código Civil, trata-se do comando legal que possibilita a tutela geral
da personalidade (“pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e
danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”). Dois são os princípios que podem ser retirados da
norma, com a possibilidade de medidas judiciais e extrajudiciais. Primeiro, há o princípio da prevenção.
Segundo, consagra-se o princípio da reparação integral de danos.
No que concerne à prevenção, dispõe o Enunciado n. 140 do CJF/STJ, aprovado na III Jornada de
Direito Civil (dez. 2004) que “a primeira parte do art. 12 do Código Civil refere-se a técnicas de tutela específica,
aplicáveis de ofício, enunciadas no art. 461 do Código de Processo Civil, devendo ser interpretada como resultado
extensivo”. Desse modo, cabe multa diária, ou astreintes, em ação cujo objeto é uma obrigação de fazer ou não
fazer, em prol dos direitos da personalidade. Essa medida será concedida de ofício pelo juiz (ex officio),
justamente porque a proteção da pessoa envolve ordem pública.

43
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
44
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
31
Quanto à reparação integral dos danos, continua merecendo aplicação a Súmula 37 do STJ, com a
cumulação em uma mesma ação de pedido de reparação por danos materiais e morais, decorrentes do mesmo
fato. Mais do que os danos morais, são ainda cumuláveis os danos estéticos, conforme reconhece a Súmula
387 do STJ.

Súmula 37 do STJ: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato.

Súmula 387 do STJ: É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.

Por sua vez, a Súmula 403 do STJ possui a seguinte redação: “independe de prova do prejuízo a
indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais”. Trata-se de
súmula muito importante, pois muito cobrada nas provas de concurso. Portanto, ATENÇÃO!
O dano à imagem restará configurado quando presente a utilização indevida desse bem jurídico,
independentemente da concomitante lesão a outro direito da personalidade, sendo dispensável a prova do
prejuízo do lesado ou do lucro do ofensor para a caracterização do dano, por se tratar de modalidade in re ipsa
(Enunciado n. 587).
O parágrafo único do mesmo art. 12 do CC reconhece direitos da personalidade ao morto, cabendo
legitimidade para ingressar com a ação correspondente aos lesados indiretos: cônjuge, ascendentes,
descendentes e colaterais até 4° grau. Conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil, tais
legitimados agem por direito próprio (Enunciado n. 400).
Injustificadamente, o art. 12, parágrafo único, do CC não faz referência ao companheiro ou
convivente, que ali deve ser incluído por aplicação analógica do art. 226, § 3º, da CF/1988. Justamente por isso, o
Enunciado n. 275 do CJF/STJ, da IV Jornada de Direito Civil, aduz que “o rol dos legitimados de que tratam os arts.
12, parágrafo único, e 20, parágrafo único, do Código Civil, também compreende o companheiro”.

Outras características dos direitos de personalidade apontadas pela doutrina:


a) Caráter absoluto: “consequência de sua oponibilidade erga omnes (contra todos). Com isso, não quer
dizer que são ilimitáveis, a pretensão é que será dirigida a certa(s) pessoa(s). Nesse ponto, são relativos,
incidindo a razoabilidade, em caso de colisão de interesses45”.
b) Extrapatrimoniais: como anteriormente dito, os direitos de personalidade em si não possuem
conotação econômica, mas a sua violação implica em reparação pecuniária. “Ainda que sua lesão gere
efeitos econômicos (dano moral), caracterizam-se pela ausência de conteúdo patrimonial direto.”46;
c) Inatos: derivam da natureza do homem;
d) Vitalícios: apesar de os direitos de personalidade serem vitalícios, o direito de pleitear indenização se
transmite com a morte. Assim, se o titular, em vida, sofrer lesão à sua honra/imagem, seus herdeiros
poderão promover a ação caso ele faleça.
e) Imprescritíveis: não há prescrição para pleitear a proteção aos direitos de personalidade. Contudo, há
prazo prescricional (de 03 anos), para requerer indenização decorrente de lesão a direito de
personalidade. Logo, a regra é que o titular do direito maculado deve pleitear indenização no prazo de
03 anos quanto ao dano sofrido. No entanto, há uma exceção reconhecida pelo STJ: a Corte Superior

45
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 106.
46
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 106.
32
decidiu que o dano moral decorrente de tortura é imprescritível:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS.


REGIME MILITAR. PERSEGUIÇÃO, PRISÃO E TORTURA POR MOTIVOS POLÍTICOS. IMPRESCRITIBILIDADE.
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.º DO DECRETO N.º 20.910/32. 1. A violação
aos direitos humanos ou direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a proteção da sua
dignidade lesada pela tortura e prisão por delito de opinião durante o Regime Militar de exceção enseja
ação de reparação ex delicto imprescritível, e ostenta amparo constitucional no art. 8.º, § 3.º, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias. 2. A tortura e morte são os mais expressivos atentados à
dignidade da pessoa humana, valor erigido como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Sob
esse ângulo, dispõe a Constituição Federal: (...) 5. Consectariamente, não há falar em prescrição da
pretensão de se implementar um dos pilares da República, máxime porque a Constituição não
estipulou lapso prescricional ao direito de agir, correspondente ao direito inalienável à dignidade. (...) 9.
A exigibillidade a qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de
que o reconhecimento da dignidade humana é fundamento da liberdade, da justiça e da paz, razão por que a
Declaração Universal inaugura seu regramento superior estabelecendo no art. 1.º que "todos os homens
nascem livres e iguais em dignidade e direitos". 10. Deflui da Constituição Federal que a dignidade da pessoa
humana é premissa inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de
normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da
jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual. (...) (REsp
816.209/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/04/2007, DJ 03/09/2007, p. 124)
(Grifou-se)

f) Generalidade: “outorgados a todas as pessoas. Por meio dos direitos da personalidade, todos os seus
titulares estão protegidos. Caráter necessário dos direitos da personalidade47”.
g) Indisponibilidade: “por ser essencial, a pessoa dele não pode dispor. Abrange tanto a
intransmissibilidade (não se admite a cessão do direito de um sujeito para outro) quanto a
irrenunciabilidade (ninguém pode dispor de sua vida, sua intimidade, sua imagem). O ordenamento
relativiza a indisponibilidade, na medida em que o art. 11 do CC admite restrição voluntária, desde que
atendidos os seguintes requisitos:
● não pode ser permanente;
● não pode ser genérico;
● não pode violar a dignidade do titular.
Nesse sentido, os enunciados da Jornada de Direito Civil prelecionam que os direitos da personalidade
podem sofrer limitações voluntárias, desde que não sejam permanentes nem gerais, ainda que não
especificamente previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso de direito de seu titular,
contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes.
O Superior Tribunal de Justiça entende que o direito de ação por dano moral possui natureza
patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores da vítima (REsp 978.651/SP). Ademais, explana Sérgio
Cavalieri Filho que o art. 11 é expresso quanto à intransmissibilidade dos direitos da personalidade, bem como
o parágrafo único do art. 20, que confere legitimidade ao cônjuge, aos ascendentes e aos descendentes para
resguardarem a imagem do de cujus, a boa fama e a respeitabilidade, abrange as ofensas causadas após o
falecimento, caso em que os herdeiros vão a juízo por direito próprio. Não se confunde, assim, com a situação

47
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 106.
33
em que a postulação é realizada em decorrência daquele sentimento próprio da vítima já morta, pois se trata
da incorporação ao patrimônio dos herdeiros do direito que nasceu e foi reconhecido pela própria vítima, a
qual não teve chance de ingressar com a ação. Os Enunciados 4, da I Jornada de Direito Civil, e 139, da III
Jornada de Direito Civil do CJF, respectivamente, a respeito do tema, por fim, disciplinam que:

Enunciado 4: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja
permanente nem geral”.

Enunciado 139: “Os direitos da personalidade podem sofrer limitações, ainda que não especificamente
previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé
objetiva e aos bons costumes”48.

h) Vitaliciedade: “com a morte, ocorre a extinção dos direitos da personalidade. No entanto, mesmo após
a morte, alguns desses direitos são resguardados, como o respeito ao morto, à sua honra ou memória
e ao seu direito moral de autor. O art. 12, parágrafo único, do CC prevê que os parentes podem sofrer o
chamado dano reflexo, em caso de lesão aos direitos que seriam da personalidade da pessoa morta.
Cuida-se, em verdade, da proteção aos direitos da personalidade dos parentes, que são lesados
indiretamente, não se tratando de sucessão, em exceção ao princípio da indisponibilidade. Os
legitimados para requerer o dano são, subsidiariamente, os cônjuges, qualquer parente em linha reta,
ou colateral até o quarto grau”49..

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Magistratura do Estado do Maranhão (CESPE - 2022) questionado sobre direitos da
personalidade foram apresentados as seguintes opções: “I intransmissíveis; II irrenunciáveis. III
extrapatrimoniais. IV absolutos. V absolutamente indisponíveis.” Diante das opções, foi assinalado como
CORRETA a alternativa que trouxe: “Apenas os itens I, II, III e IV estão certos.”

2.4.1. QUESTÕES POLÊMICAS ACERCA DA IRRENUNCIABILIDADE


a) O ART. 13 IMPEDE A CIRURGIA NO CASO DE TRANSEXUAL?
O art. 13 afirma que somente se houver exigência médica será possível praticar ato que importe
diminuição da integridade física ou contrarie os bons costumes. A transgenitalização importa diminuição
permanente, porém está pautada em exigência médica.
Relembrando o art. 13:

Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar
diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.
Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida
em lei especial.

Conforme enunciados 276 do CJF:

48
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 106.
49
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 106.
34
O art. 13 do Código Civil, ao permitir a disposição do próprio corpo por exigência médica, autoriza as cirurgias
de transgenitalização, em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de
Medicina, e a consequente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil.

b) OS CASOS DE MODIFICAÇÃO CORPORAL


Modificação corporal radical é a hipótese em que a pessoa se submete a tatuagens, microcirurgias a fim
de alterar o formato do próprio corpo. Há casos famosos como a mulher vaca e o homem lagarto, sendo muitas
dessas alterações irreversíveis.
O que se coloca é saber se no caso de arrependimento, a pessoa teria ação contra o modificador.
Tem-se que, por ser uma expressão artística, prevalece que o consentimento do modificado é eficaz
desde que ele seja plenamente capaz.
➽ Tutela jurídica do corpo vivo: A regra geral é a proibição de ato de disposição da integridade física
quando importar diminuição permanente, exceto se houver exigência médica. O titular pode dispor livremente
do seu corpo, desde que não gere diminuição permanente da sua integridade física e que não contrarie os bons
costumes. Se ocorrer a diminuição permanente da integridade física, a disposição só pode ocorrer com a
intervenção médica.
Vários municípios trazem leis vedando tatuagens e piercing para os menores de 18 anos. Uma
amputação de órgão por necessidade médica é perfeitamente possível.
➽ Wanna be: Trazem consigo uma repulsa psicológica a determinado órgão do corpo humano ou
parte do seu corpo. Exemplo: “A” não gosta dos ouvidos. Na forma do artigo 13 do CC eles não podem diminuir a
integridade física; a sua conduta é proibida pelo ordenamento jurídico.
➽ Tutela jurídica do corpo morto: A proteção do cadáver é extensão da personalidade, tanto que a
deliberação quanto ao destino do cadáver é direito do titular (art. 14).
Esse artigo afirma que no Brasil não é admitido o chamado “testamento vital” ou “living will”
(disposição do titular em não permanecer vivo em estado vegetativo ou em determinadas condições). Por esse
motivo, no Brasil a eutanásia é ilícita.
Ademais, quanto à disposição do próprio corpo para depois da morte, vejamos interessante julgado
do STJ:

Não se exige que o indivíduo tenha deixado um documento escrito dizendo que desejava ser submetido
à criogenia, podendo essa vontade ser provada por outros meios, como a declaração do familiar mais
próximo - Não há exigência de formalidade específica acerca da manifestação de última vontade do
indivíduo sobre a destinação de seu corpo após a morte, sendo possível a submissão do cadáver ao
procedimento de criogenia em atenção à vontade manifestada em vida. A criogenia (ou criopreservação)
é a técnica de congelamento do corpo humano após a morte, em baixíssima temperatura, a fim de
conservá-lo, com o intuito de reanimação futura da pessoa caso sobrevenha alguma importante descoberta
científica que possibilite o seu retorno à vida. Em outras palavras, a criogenia consiste no congelamento de
cadáveres a baixas temperaturas, com a finalidade de que, com os possíveis avanços da ciência, sejam, um dia,
ressuscitados. STJ. 3ª Turma. REsp 1693718-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 26/03/2019 (Info
645). (Grifou-se)

35
c) ART. 15 E O TRATAMENTO MÉDICO OU INTERVENÇÃO CIRÚRGICA
O art. 15 estabelece que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a
tratamento médico ou intervenção cirúrgica.
As testemunhas de Jeová podem se recusar a receberem transfusão ainda que este seja fundamental
para salvar sua vida? A doutrina tradicional e ainda MAJORITÁRIA entende que não, isto é, o médico tem
obrigação de realizar a transfusão ainda que contra a vontade, isto pelo fato de que o direito à vida prevalece
sobre outros direitos, como a liberdade de religião e crença.
🔔 CRÍTICA: Parte da doutrina afirma que não há nada no sistema jurídico brasileiro que autorize dizer
que o direito à vida deva prevalecer sempre que se encontre em conflito com outro direito fundamental. Aliás,
há casos tipificados em que a vida cede diante de outro direito, a exemplo do aborto resultante de estupro
ainda que o embrião seja perfeitamente saudável e viável.
O Enunciado 403 do CJF traz critérios para que a pessoa possa invocar a liberdade de consciência e
crença a fim de recusar tratamento médico. É fundamental que a pessoa seja maior e capaz, sendo vedado
recusar por meio de representante. O consentimento deve ser prévio, livre e informado. Esta corrente é
MINORITÁRIA.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Delegado de Polícia do Estado do Rio de Janeiro (CESPE - 2022), sobre direitos fundamentais, foi
assinalado como CORRETA a assertiva que disse: “Ao tratar da proteção à integridade física e do direito ao
próprio corpo, o Código Civil Brasileiro traz a possibilidade de recusa em submeter-se a tratamento ou
intervenção médica em situações em que o procedimento demonstre risco à vida da pessoa.”

2.5. PROTEÇÃO DO NOME, IMAGEM E PSEUDÔNIMO DA PESSOA (arts. 15 a 21 do


CC/02)
A imagem de uma pessoa pode ser dividida em:
a) IMAGEM RETRATO: imagem em sentido estrito, ou seja, aquele conjunto de caracteres físicos que
identificam a pessoa.
b) IMAGEM ATRIBUTO: Características da personalidade imaterial da pessoa, como a fama, reputação,
nome, voz etc.
A proteção dos direitos da personalidade abrange todos esses atributos.
Os arts. 16 a 19 do CC/2002 tutelam o direito ao nome, sinal ou pseudônimo que representa uma
pessoa natural perante a sociedade, contra atentado de terceiros, principalmente aqueles que expõem o sujeito
ao desprezo público, ao ridículo, acarretando dano moral ou patrimonial. Sendo o nome reconhecido como um
direito da personalidade, as normas que o protegem também são de ordem pública.
Todos os elementos que fazem parte do nome estão protegidos: o prenome, o sobrenome e, desde que
utilizado para fins lícitos, o pseudônimo. Partículas do nome:
■ Prenome: indica a pessoa, podendo ser simples ou composto;
■ Sobrenome (patronímico): é indicativo da origem ancestral, devendo indicar a origem familiar;
■ Agnome: visa distinguir pessoas da mesma família que possuem o mesmo nome, com a finalidade

36
de perpetuar um nome anterior já existente (exemplo: Júnior, Filho etc).
O art. 17 do Código Civil refere que “o nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em
publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda que não haja intenção difamatória”.
Ainda, o nome também não pode ser utilizado, sem autorização, para fins de publicidade ou propaganda
comercial (art. 18 do CC). Nos dois casos, tratados pelos arts. 17 e 18 da codificação, havendo lesão, caberá
reparação civil, fundamentada nos arts. 186 e 927 da codificação privada.
Sendo possível, cabem também medidas de prevenção do prejuízo. Nesse sentido, preconiza o
Enunciado n. 278, também da IV Jornada de Direito Civil, que “a publicidade que venha a divulgar, sem
autorização, qualidades inerentes a determinada pessoa, ainda que sem mencionar seu nome, mas sendo capaz de
identificá-la, constitui violação a direito da personalidade”.
O art. 19 do CC consagra expressamente a proteção do pseudônimo, nome atrás do qual se esconde
um autor de obra artística, literária ou científica. Deve-se concluir que a proteção constante no art. 19 do Código
Civil atinge também o cognome ou alcunha, nome artístico utilizado por alguém, mesmo não constando esse no
registro da pessoa.

Não é cabível, sem motivação idônea, a alteração do nome de menor para exclusão do agnome “filho” e
inclusão do sobrenome materno - Aquele que recebe o nome de seu genitor acrescido do agnome “filho” ou
“filha” não tem nenhuma mitigação do vínculo com as famílias de seus genitores, tampouco sofre
constrangimento por não ter os mesmos sobrenomes de eventual irmão, pois não é função do nome de
família estreitar ligação afetiva. Além disso, os nomes da mãe e dos avós maternos constam na certidão de
nascimento. STJ. 4ª Turma. REsp 1731091-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/12/2021 (Info 723).

A discrepância entre a assinatura artística e o nome registral não consubstancia situação excepcional e
motivo justificado à alteração da grafia do apelido de família - Como o sobrenome é também uma
característica exterior de qualificação familiar, não é possível a sua livre disposição. Assim, o indivíduo não
pode alterar o patronímico (apelido de família) para satisfazer interesse exclusivamente estético e pessoal. A
modificação pretendida alteraria a própria grafia do apelido de família e, assim, representaria violação à regra
registral que exige a preservação do sobrenome, com o objetivo de indicar a estirpe familiar, o que tem
relação com o próprio interesse público. A discrepância entre a assinatura artística e o nome registral não se
consubstancia em situação excepcional e motivo justificado para a alteração pretendida. O nome do autor da
obra de arte, lançado por ele nos trabalhos que executa, pode ser escrito da forma como ele bem desejar, sem
que tal prática importe em consequência alguma ao autor ou a terceiros, pois se trata de uma opção de cunho
absolutamente subjetivo, sem impedimento de qualquer ordem. Todavia, a utilização de nome de família, de
modo geral, que extrapole o objeto criado pelo artista, com acréscimo de letras que não constam do registro
original, não para sanar equívoco, mas para atender a desejo pessoal, não está elencado pela lei como um
motivo que autorize a modificação do assento de nascimento. STJ. 4ª Turma. REsp 1729402-SP, Rel. Min. Marco
Buzzi, julgado em 14/12/2021 (Info 723).

É admissível a exclusão de prenome da criança na hipótese em que o pai informou, perante o cartório
de registro civil, nome diferente daquele que havia sido consensualmente escolhido pelos genitores -
Trata-se de ato que violou o dever de lealdade familiar e o dever de boa-fé objetiva e que, por isso mesmo, não
deve merecer guarida pelo ordenamento jurídico, na medida em que a conduta do pai configurou exercício
abusivo do direito de nomear a criança. Vale ressaltar que é irrelevante apurar se houve, ou não, má-fé ou
intuito de vingança do genitor A conduta do pai de descumprir o que foi combinado é considerada um ato
ilícito independentemente da sua intenção. Houve, neste caso, exercício abusivo do direito de nomear o filho,

37
o que autoriza a modificação posterior do nome da criança, na forma do art. 57, caput, da Lei nº 6.015/73.
Nomear o filho é típico ato de exercício do poder familiar, que pressupõe bilateralidade e consensualidade,
ressalvada a possibilidade de o juiz solucionar eventual desacordo entre eles, inadmitindo-se, na hipótese, a
autotutela. STJ. 3ª Turma. REsp 1905614-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04/05/2021 (Info 695).

É admissível o retorno ao nome de solteiro do cônjuge ainda na constância do vínculo conjugal - O


pedido deve ser acolhido a fim de ser preservada a intimidade, a autonomia da vontade, a vida privada, os
valores e as crenças das pessoas, bem como a manutenção e perpetuação da herança familiar. STJ. 3ª Turma.
REsp 1873918-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/03/2021 (Info 687).

É possível a retificação do registro civil para acréscimo do segundo patronímico do marido ao nome da
mulher durante a convivência matrimonial. STJ. 3ª Turma. REsp 1648858-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, julgado em 20/08/2019 (Info 655).

É admissível o restabelecimento do nome de solteiro na hipótese de dissolução do vínculo conjugal pelo


falecimento do cônjuge. STJ. 3ª Turma. REsp 1724718-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/05/2018
(Info 627).

O brasileiro que adquiriu dupla cidadania pode ter seu nome retificado no registro civil do Brasil, desde que
isso não cause prejuízo a terceiros, quando vier a sofrer transtornos no exercício da cidadania por força da
apresentação de documentos estrangeiros com sobrenome imposto por lei estrangeira e diferente do que
consta em seus documentos brasileiros. STJ. 3ª Turma. REsp 1310088-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha,
Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/5/2016 (Info 588).

A Lei 14382/22, alterando a Lei de Registros Públicos, passou a prever as seguintes hipóteses de
alteração posterior de sobrenomes, quais sejam:

Art. 57. A alteração posterior de sobrenomes poderá ser requerida pessoalmente perante o oficial de
registro civil, com a apresentação de certidões e de documentos necessários, e será averbada nos assentos
de nascimento e casamento, independentemente de autorização judicial, a fim de: (LEI 14382/22)

I - inclusão de sobrenomes familiares; (LEI 14382/22)

II - inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge, na constância do casamento; (LEI 14382/22)

III - exclusão de sobrenome do ex-cônjuge, após a dissolução da sociedade conjugal, por qualquer de suas
causas; (LEI 14382/22)

IV - inclusão e exclusão de sobrenomes em razão de alteração das relações de filiação, inclusive para os
descendentes, cônjuge ou companheiro da pessoa que teve seu estado alterado. (LEI 14382/22)

§ 1º Poderá, também, ser averbado, nos mesmos termos, o nome abreviado, usado como firma comercial
registrada ou em qualquer atividade profissional.

§ 2º Os conviventes em união estável devidamente registrada no registro civil de pessoas naturais poderão
requerer a inclusão de sobrenome de seu companheiro, a qualquer tempo, bem como alterar seus
sobrenomes nas mesmas hipóteses previstas para as pessoas casadas. (LEI 14382/22)

§ 3º-A O retorno ao nome de solteiro ou de solteira do companheiro ou da companheira será realizado por
meio da averbação da extinção de união estável em seu registro. (LEI 14382/22)

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Ademais, passou a prever a possibilidade de alteração de prenome, após atingir a maioridade,
independentemente de decisão judicial:

Art. 56. A pessoa registrada poderá, após ter atingido a maioridade civil, requerer pessoalmente e
imotivadamente a alteração de seu prenome, independentemente de decisão judicial, e a alteração será
averbada e publicada em meio eletrônico. (LEI 14382/22)

§ 1º A alteração imotivada de prenome poderá ser feita na via extrajudicial apenas 1 vez, e sua
desconstituição dependerá de sentença judicial. (LEI 14382/22)

Prosseguindo, o artigo 20 deixa claro que a regra é a possibilidade se pode utilizar a imagem alheia
sem autorização, salvo 2 exceções:
a) Será necessária autorização se a utilização da imagem for para fins econômicos ou comerciais
(propaganda comercial)
b) Não se poderá utilizar sem autorização se isso for capaz de lhe afetas a honra, boa fama ou
respeitabilidade, ainda que não haja intenção difamatória.

📌 OBSERVAÇÃO
Em certas hipóteses, ainda que a utilização seja capaz de expor a pessoa ao desprezo, será
autorizada quando necessárias à administração da justiça ou manutenção da ordem pública.

Na exposição pornográfica não consentida, o fato de o rosto da vítima não estar evidenciado de maneira
flagrante é irrelevante para a configuração dos danos morais - Caso concreto: Paulo e Letícia eram namorados.
Paulo tirou fotografias de Letícia em que ela aparece de biquini, em poses sensuais, mas sem aparecer seu
rosto. Após o fim do relacionamento, Paulo, como forma de vingança, publicou tais imagens em um perfil
criado no Facebook. Letícia denunciou as publicações por meio dos canais disponibilizados pelo Facebook, no
entanto, a plataforma não aceitou retirar as fotografias alegando que não são fotografias pornográficas
(considerando que não há nudez), além do fato de não estar sendo exposto de forma evidente.

O STJ não concordou com os argumentos do Facebook e o condenou a pagar indenização por danos morais
em favor da autora.

A “exposição pornográfica não consentida”, da qual a “pornografia de vingança” é uma espécie, constituiu uma
grave lesão aos direitos de personalidade da pessoa exposta indevidamente, além de configurar uma grave
forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma contundente pelos meios jurídicos disponíveis.

Não há como descaracterizar um material pornográfico apenas pela ausência de nudez total. Neste caso
concreto, a autora encontra-se sumariamente vestida, em posições com forte apelo sexual.

O fato de o rosto da vítima não estar evidenciado nas fotos de maneira flagrante é irrelevante para a
configuração dos danos morais na hipótese, uma vez que a mulher vítima da pornografia de vingança sabe
que sua intimidade foi indevidamente desrespeitada e, igualmente, sua exposição não autorizada lhe é
humilhante e viola flagrantemente seus direitos de personalidade. STJ. 3ª Turma. REsp 1735712-SP, Rel. Min.
Nancy Andrighi, julgado em 19/05/2020 (Info 672).

🚨 JÁ CAIU
39
Na prova para Defensor Público do Estado da Paraíba (FCC - 2022), foi questionado como segue: “Luiza, maior e
capaz, é travesti e gostaria de alterar seu nome e sexo no registro civil de nascimento. De acordo com a decisão
do Supremo Tribunal Federal na ADI 4275, a alteração é possível sem a necessidade de cirurgia de
transgenitalização“. Tendo sido considerada CORRETA a alternativa que disse: “extrajudicialmente,
independentemente de tratamento hormonal ou perícia psicossocial.“
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de São Paulo (Banca Própria - 2022), questionou-se “Hoje a pessoa
transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração no registro civil“, tendo sido assinalado como
CORRETA a assertiva que disse: “se na via judicial, o juízo mandará expedir os competentes mandados.“
Na prova para Magistratura do Estado do Amapá (FGV - 2022), questionou-se “Justina, casada há 25 anos,
substituiu, por ocasião do casamento civil com Eduardo, um dos seus patronímicos pelo do marido. Ocorre que
o sobrenome adotado passou a ser o protagonista de seu nome civil, em prejuízo do patronímico de solteira, o
que passou a lhe causar intenso sofrimento, uma vez que sempre fora conhecida pelo sobrenome de seu pai.
Tal fato lhe trouxe danos psicológicos, especialmente agora que os últimos familiares que ainda usam o seu
sobrenome familiar encontram-se gravemente doentes. Por essas razões, Justina requereu a modificação do
seu patronímico, ainda durante a constância da sociedade conjugal, de forma a voltar a utilizar o sobrenome da
sua família.“ Assim, a respeito do pedido realizado, foi assinalada como CORRETA a assertiva que disse: “ deve
ser julgado procedente, pela interpretação histórico-evolutiva da inalterabilidade, da preservação da herança
familiar, da autonomia privada e da ausência de prejuízo a terceiros.“

2.5.1. NOTAS

SÚMULA 403-STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de
imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

O STJ entende que neste caso se está diante de dano IN RE IPSA, também chamado presumido. Na
verdade, o que ocorre também é um nítido enriquecimento sem causa, pois não está havendo remuneração
pelo uso da imagem.

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem


pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização
da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que
couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o
cônjuge, os ascendentes ou os descendentes (CAD).

O Art. 20 estabelece que a pessoa tem o poder de proibir a utilização caso a submeta ao
desprezo público.
Jurisprudência em relação à imagem:

O uso da imagem de torcedor inserido no contexto de uma torcida não induz a reparação por danos

40
morais quando não configurada a projeção, a identificação e a individualização da pessoa nela
representada - Em regra, a autorização para uso da imagem deve ser expressa; no entanto, a depender das
circunstâncias, especialmente quando se trata de imagem de multidão, de pessoa famosa ou ocupante de
cargo público, há julgados do STJ em que se admite o consentimento presumível, o qual deve ser analisado
com extrema cautela e interpretado de forma restrita e excepcional.

De um lado, o uso da imagem da torcida - em que aparecem vários dos seus integrantes - associada à partida
de futebol, é ato plenamente esperado pelos torcedores, porque costumeiro nesse tipo de evento; de outro
lado, quem comparece a um jogo esportivo não tem a expectativa de que sua imagem seja explorada
comercialmente, associada à propaganda de um produto ou serviço, porque, nesse caso, o uso não decorre
diretamente da existência do espetáculo.

A imagem é a emanação de uma pessoa, a forma com a qual ela se projeta, se identifica e se individualiza no
meio social. Não há violação ao direito à imagem se a divulgação ocorrida não configura projeção, identificação
e individualização da pessoa nela representada.

No caso concreto, o autor não autorizou ainda que tacitamente a divulgação de sua imagem em campanha
publicitária de automóvel. Ocorre que, pelas circunstâncias, não há que se falar em utilização abusiva da
imagem, tampouco em dano moral porque o vídeo divulgado não destaca a sua imagem, mostrando o autor
durante poucos segundos inserido na torcida, juntamente com vários outros torcedores.

STJ. 3ª Turma. REsp 1772593-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/06/2020 (Info 674).

Configura dano moral indenizável a divulgação não autorizada da imagem de alguém em material
impresso de propaganda político-eleitoral, independentemente da comprovação de prejuízo.

STJ. 3ª Turma. REsp 1217422-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 23/9/2014 (Info 549).

O uso, por sociedade empresária, de imagem de pessoa física fotografada isoladamente em local
público, em meio a cenário destacado, configura dano moral mesmo que não tenha havido nenhuma
conotação ofensiva ou vexaminosa na divulgação. O dano moral é decorrente tão somente do fato de
ter sido usada a imagem da pessoa sem a sua autorização.

Assim, é cabível compensação por dano moral decorrente da simples utilização de imagem de pessoa física,
em campanha publicitária, sem autorização do fotografado.

Aplica-se aqui o raciocínio da Súmula 403 do STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela
publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

STJ. 4ª Turma. REsp 1307366-RJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 3/6/2014 (Info 546).

Ente público tem direito à indenização por uso indevido da imagem?

A pessoa jurídica de direito público não tem direito à indenização por danos
morais relacionados à violação da honra ou da imagem.
Não é possível pessoa jurídica de direito público pleitear, contra particular,
REGRA: NÃO
indenização por dano moral relacionado à violação da honra ou da imagem.
STJ. 4ª Turma. REsp 1258389-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
17/12/2013 (Info 534).

Pessoa jurídica de direito público tem direito à indenização por danos morais
EXCEÇÃO: DANO À
relacionados à violação da honra ou da imagem, quando a credibilidade
CREDIBILIDADE
institucional for fortemente agredida e o dano reflexo sobre os demais

41
INSTITUCIONAL jurisdicionados em geral for evidente. STJ. 2ª Turma. REsp 1.722.423-RJ, Rel.
Min. Herman Benjamin, julgado em 24/11/2020 (Info 684).

O STF, por ocasião do julgamento da ADI 4815, foi chamado a decidir sobre as biografias. Até então
entendia-se que as biografias não autorizadas que expusessem a intimidade da pessoa biografada poderiam
ser proibidas a seu requerimento ou, caso já falecida, de seus familiares.
O STF deu ao art. 20 interpretação conforme a Constituição sem redução de texto tornando INEXIGÍVEL
a obrigação de obtenção do consentimento, ou seja, para biografias escritas ou audiovisuais não é necessário o
consentimento do biografado ou dos herdeiros. Para o STF, a necessidade de autorização configuraria censura
prévia, o que, portanto, seria inadmitido pela CF. Há crítica contra esta decisão.

Biografias: autorização prévia e liberdade de expressão - Para que seja publicada uma biografia NÃO é
necessária a autorização prévia do indivíduo biografado, das demais pessoas retratadas, nem de seus
familiares. Essa autorização prévia seria uma forma de censura, não sendo compatível com a liberdade de
expressão consagrada pela CF/88. As exatas palavras do STF foram as seguintes:

“É inexigível o consentimento de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou


audiovisuais, sendo por igual desnecessária a autorização de pessoas retratadas como coadjuvantes ou de
familiares, em caso de pessoas falecidas ou ausentes”.

Caso o biografado ou qualquer outra pessoa retratada na biografia entenda que seus direitos foram
violados pela publicação, terá direito à reparação, que poderá ser feita não apenas por meio de
indenização pecuniária, como também por outras formas, tais como a publicação de ressalva, de nova
edição com correção, de direito de resposta etc. STF. Plenário. ADI 4815/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado
em 10/6/2015 (Info 789). (Grifou-se)

Quanto a esse tema, o que é o chamado lucro de intervenção?


Segundo o professor Márcio Cavalcante, lucro de intervenção “é uma vantagem patrimonial obtida
indevidamente com base na exploração ou aproveitamento, de forma não autorizada, de um direito alheio.
Dever de restituição do lucro da intervenção é o dever que o indivíduo possui de pagar aquilo que foi auferido
mediante indevida interferência nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa. A obrigação de restituir o lucro
da intervenção é baseada na vedação do enriquecimento sem causa (art. 884 do CC).”
⚠️ ATENÇÃO ao julgado abaixo:
Determinada “farmácia de manipulação” utilizou o nome e a imagem da atriz Giovanna Antonelli, sem a sua
autorização, em propagandas de um remédio para emagrecer.

O STJ afirmou que, além da indenização por danos morais e materiais, a atriz também tinha direito à
restituição de todos os benefícios econômicos que a ré obteve na venda de seus produtos (restituição do
“lucro da intervenção”).

Lucro da intervenção é uma vantagem patrimonial obtida indevidamente com base na exploração ou
aproveitamento, de forma não autorizada, de um direito alheio.

Dever de restituição do lucro da intervenção é o dever que o indivíduo possui de pagar aquilo que foi auferido
mediante indevida interferência nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa.

A obrigação de restituir o lucro da intervenção é baseada na vedação do enriquecimento sem causa (art. 884

42
do CC).

A ação de enriquecimento sem causa é subsidiária. Apesar disso, nada impede que a pessoa prejudicada
ingresse com ação cumulando os pedidos de reparação dos danos (responsabilidade civil) e de restituição do
indevidamente auferido (lucro da intervenção).

Para a configuração do enriquecimento sem causa por intervenção, não se faz imprescindível a existência de
deslocamento patrimonial, com o empobrecimento do titular do direito violado, bastando a demonstração de
que houve enriquecimento do interventor.

O critério mais adequado para se fazer a quantificação do lucro da intervenção é o do enriquecimento


patrimonial (lucro patrimonial).

A quantificação do lucro da intervenção deverá ser feita por meio de perícia realizada na fase de liquidação de
sentença, devendo o perito observar os seguintes critérios:

a) apuração do quantum debeatur com base no denominado lucro patrimonial;

b) delimitação do cálculo ao período no qual se verificou a indevida intervenção no direito de imagem da


autora;

c) aferição do grau de contribuição de cada uma das partes e

d) distribuição do lucro obtido com a intervenção proporcionalmente à contribuição de cada partícipe da


relação jurídica.

STJ. 3ª Turma. REsp 1698701-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 02/10/2018 (Info 634).
(Grifou-se)

2.5.2. JURISPRUDÊNCIA

A Súmula 403 do STJ é inaplicável para representação da imagem de pessoa como coadjuvante em
documentário que tem por objeto a história profissional de terceiro - Ação de indenização proposta por
ex-goleiro do Santos em virtude da veiculação indireta de sua imagem (por ator profissional contratado), sem
prévia autorização, em cenas do documentário “Pelé Eterno”.O autor alegou que a simples utilização não
autorizada de sua imagem, ainda que de forma indireta, geraria direito a indenização por danos morais,
independentemente de efetivo prejuízo. O STJ não concordou. A representação cênica de episódio histórico
em obra audiovisual biográfica não depende da concessão de prévia autorização de terceiros ali
representados como coadjuvantes. O STF, no julgamento da ADI 4.815/DF, afirmou que é inexigível a
autorização de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais, bem como
desnecessária a autorização de pessoas nelas retratadas como coadjuvantes. A Súmula 403/STJ é inaplicável às
hipóteses de representação da imagem de pessoa como coadjuvante em obra biográfica audiovisual que tem
por objeto a história profissional de terceiro. STJ. 3ª Turma.REsp 1454016-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel.
Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/12/2017 (Info 621).

A Súmula 403 do STJ não se aplica para divulgação de imagem vinculada a fato histórico de repercussão social -
A Súmula 403 do STJ é inaplicável às hipóteses de divulgação de imagem vinculada a fato histórico de
repercussão social. Súmula 403-STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não
autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais. Caso concreto: a TV Record exibiu
reportagem sobre o assassinato da atriz Daniela Perez, tendo realizado, inclusive, uma entrevista com
Guilherme de Pádua, condenado pelo homicídio. Foram exibidas, sem prévia autorização da família, fotos da
vítima Daniela. O STJ entendeu que, como havia relevância nacional na reportagem, não se aplica a Súmula
403 do STJ, não havendo direito à indenização. STJ. 3ª Turma.REsp 1631329-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/10/2017 (Info 614).

43
2.6. DIREITOS DA PERSONALIDADE E PESSOAS MORTAS
O CC/02 nos parágrafos únicos dos Arts. 12 e 20 permite a proteção dos direitos da personalidade
relativos a pessoas mortas. A questão que se coloca é a de saber se o direito defendido é da própria pessoa
morta ou dos legitimados.
A doutrina tradicional e que deve ser observada nos concursos é a de que com a morte cessa a
personalidade e, portanto, cessam os direitos da personalidade sendo certo que os direitos são exercidos
pelos legitimados como direito próprio.
Neste sentido, o Enunciado 400 do CJF:

Os parágrafos únicos dos Arts. 12 e 20 asseguram legitimidade, por direito próprio, aos parentes, cônjuge ou
companheiro para a tutela contra lesão perpetrada post mortem.

Alguns autores, no entanto, como a professoras SILMARA CHINELLATO, afirmam que o direito violado
é do próprio morto e que haveria uma pós-eficácia dos direitos da personalidade. Na Europa é esse o
posicionamento que prevalece.

LESÃO EM VIDA E AÇÃO 50 Sucessão processual (art. 110 do CPC/2015).


AJUIZADA ANTES DA MORTE Indenização conforme pedido formulado na inicial ajuizada.

O direito de requerer a indenização é transferido com a herança.

LESÃO EM VIDA E AÇÃO NÃO Art. 943 do CC/02: O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la
AJUIZADA EM VIDA transmitem-se com a herança.

Uma só indenização.

Legitimidade, por direito próprio, aos parentes, cônjuge ou companheiro


para a tutela contra lesão perpetrada post mortem.
Não há lesão a direito de morto enquanto estava vivo.
Há dano em ricochete (indireto).
LESÃO CONTRA DIREITOS DE
PESSOA JÁ FALECIDA
Art. 12, parágrafo único e art. 20, parágrafo único (imagem do morto), ambos
do CC/02.

O número de indenizações é igual ao número de lesados.

50
Fonte: material do curso para Magistratura Federal coordenado pelo professor Patrick Nilo, em 2020.
44
2.7. OUTROS DIREITOS DE PERSONALIDADE
a) DIREITO À PRIVACIDADE: Proteção aos aspectos mais personalíssimos das pessoas. Este direito diz
respeito às informações que tocam ao titular e a mais ninguém. Privacidade ou vida privada são
informações, fatos que interessam ao titular com exclusão do interesse alheio. Artigo 21 do CC.
Esse artigo se conecta diretamente com o art. 5º, X, da CF, estabelecendo a autonomia do direito à
privacidade. A vida privada é autônoma, ou seja, a privacidade está protegida independentemente da honra e
da imagem.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Procurador do Estado de Roraima (CESPE - 2022), sobre a classificação do alcance da eficácia do
direito à privacidade, foi assinalado como CORRETA a assertiva que disse ser "absoluto''.

b) TEORIA DOS CÍRCULOS CONCÊNTRICOS: A vida privada é composta por dois aspectos, tais quais:
■ Intimidade: somente o titular delibera com quem pretende compartilhar.
■ Segredo: são informações privadas que eventualmente precisam ser compartilhadas com terceiros
em nome do interesse público.
■ Privacidade: também chamada de privatus, são aquelas informações que pertencem ao titular com
exclusão do interesse do Estado e de terceiros.
As pessoas públicas gozam sim da proteção da privacidade, podendo ser relativizado, ou seja, sofre
mitigação da proteção acerca da privacidade tendo em vista a sua profissão e ofício.
Toda vez que você descobre a biografia não autorizada e revela fatos pessoais, logicamente, está
afrontando a privacidade.

As biografias não autorizadas eram permitidas no Brasil? Não.


ADI 4815: Em 2012, a Associação Nacional dos Editores de Livros (ANEL) ajuizou uma ação direta de
inconstitucionalidade no STF com o objetivo de declarar a inconstitucionalidade parcial dos arts. 20 e 21 do
Código Civil.
O pedido principal da autora foi para que o STF atribuísse interpretação conforme a Constituição e
declarasse que não é necessário consentimento da pessoa biografada para a publicação ou veiculação de obras
biográficas, literárias ou audiovisuais.

O STF concordou com o pedido? As biografias não autorizadas podem ser publicadas mesmo sem
prévia autorização do biografado (ou de sua família)? Sim. Por unanimidade, o STF julgou procedente a ADI e
declarou que não é necessária autorização prévia para a publicação de biografias.
É possível violar a privacidade sem violar a honra. REsp. 521697.
A proteção da privacidade independe da veracidade da informação, até porque permitir discutir a
veracidade da informação, implicará em nova violação à privacidade.
O direito à imagem não admite excepetio veritatis, pois permitir isso é violar a privacidade novamente.

45
🚨 JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Sergipe (CESPE - 2022), foi apresentado as afirmativas a seguir:
“De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, a publicação de obra biográfica sem prévia
autorização do biografado fere I a honra da pessoa biografada. II o direito de privacidade da pessoa biografada.
III o direito à inviolabilidade da intimidade da pessoa biografada. IV o direito de preservação da imagem da
pessoa biografada.” Diante do narrado, foi assinalado como CORRETA a alternativa que disse: “Nenhum item
está certo.”
Na prova para Delegado de Polícia do Estado do Espírito Santo (CESPE - 2022), foi apresentado o caso a seguir:
“Gilvan e Mariana mantinham relacionamento amoroso havia seis anos, quando Mariana engravidou. O casal
contou aos familiares e amigos que a criança que estava a caminho era um menino e se chamaria Cauã. No
entanto, às vésperas do nascimento do filho, Gilvan rompeu o relacionamento após ter descoberto que, havia
três meses, Mariana mantinha outro relacionamento amoroso. Nascida a criança, Gilvan registrou-a com o
nome de Enzo Cauã, em homenagem ao seu avô, sem consultar Mariana.” Diante do caso narrado,
considerando o entendimento do STJ, questionou-se sobre as atitudes que Mariana poderia tomar e foi
assinalado como CORRETA a assertiva que disse: “poderá requerer, perante o cartório de registro civil, a
exclusão do prenome Enzo, sob o argumento de que Gilvan violou o dever de lealdade familiar e a boa-fé
objetiva. “
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de São Paulo (Banca Própria - 2022), questionou-se Em
decorrência dos direitos da personalidade, alguns sustentam haver possibilidade de se obstar, em razão da
passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados. Em relação a
tal situação, o STF firmou o entendimento de que “, tendo sido assinalado como CORRETA a assertiva que disse:
“referido direito não se sobrepõe ao regular exercício da liberdade de expressão e de informação.“
Na prova para Delegado de Polícia do Estado da Paraíba (CESPE - 2022), questionou-se, de acordo com a
jurisprudência do STJ, sobre os direitos da personalidade, tendo sido assinalado como CORRETA a assertiva que
disse: “podem ser objeto de disponibilidade, como no caso de disposição, para fins científicos, do próprio corpo
para depois da morte”.

3. PESSOA JURÍDICA / MORAL / COLETIVA

Sobre o tema, definem os professores Rodolfo Pamplona e Pablo Stolze: “podemos conceituar a
pessoa jurídica como o grupo humano, criado na forma da lei, e dotado de personalidade jurídica própria, para
a realização de fins comuns. Enquanto sujeito de direito, poderá a pessoa jurídica, por seus órgãos e
representantes legais, atuar no comércio e sociedade, praticando atos e negócios jurídicos em geral.”51

3.1. TEORIA GERAL


Segundo o professor Rubem Valente, as teorias da personalidade jurídica podem ser reunidas em
duas correntes:

51
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
46
“consideravam uma massa de bens objeto de propriedade comum,
inadmitindo a existência da personalidade da pessoa jurídica. Negavam a
TEORIAS NEGATIVAS existência concreta das pessoas jurídicas, pois vislumbravam, tão somente,
um patrimônio sem sujeito. O direito positivo se afasta dessa corrente,
predominando, nos ordenamentos civis modernos, a tese afirmativista”52;

“Enxergam a existência real de grupos sociais com interesses próprios, aos


quais o ordenamento jurídico não poderia negar a qualidade de sujeito nas
relações jurídicas. Podem ser divididas em:
I.TEORIAS DA FICÇÃO: decorrem da ficção legal e da ficção doutrinária. Para
a primeira, desenvolvida por Savigny, a pessoa jurídica constitui uma criação
artificial da lei e só o homem poderia ser capaz de titularizar relações
jurídicas. Para a segunda, criada pelos juristas, as críticas às teorias da ficção
apontam que as pessoas jurídicas não são criadas pelo Estado, mas
confirmadas por ele;

II.TEORIAS DA REALIDADE: dividem-se em:


a) Teoria da realidade objetiva ou orgânica (Zitelman): do ponto de vista
objetivo, a pessoa jurídica é tão pessoa quanto as pessoas naturais. É uma
realidade sociológica, um ser com vida própria, que nasce por imposição das
forças sociais. Logo a pessoa jurídica não é abstrata, mas formada de corpus
(conjunto de bens) e animus (vontade do instituidor). A teoria é criticada, pois
TEORIAS AFIRMATIVAS,
os grupos sociais não têm vida própria, personalidade (no sentido de valor),
REALISTAS OU
que é característica do ser humano;
ORGANICISTAS

b) Teoria da realidade técnica (Ihering): é a teoria mais aceita hoje em dia,


inclusive pelo ordenamento jurídico brasileiro. A personificação dos grupos
sociais é expediente de ordem técnica, a forma encontrada pelo direito para
reconhecer a existência de grupos de indivíduos, que se unem na busca de
fins determinados. Não obstante sua personalidade seja conferida pelo
Direito, a pessoa jurídica possui existência real. O art. 18 do CC/16 e art. 45 do
CC/2002 estabelecem expressamente que a existência da pessoa jurídica se
inicia com a inscrição de seus atos constitutivos no respectivo registro, prova
cabal de que, para o direito pátrio, a personificação da pessoa jurídica é
construção da técnica jurídica (tanto que seus efeitos podem ser suspensos
em casos determinados, por meio da desconsideração);

c) Teoria da realidade das instituições jurídicas (Hauriou): assim como a


personalidade humana derivava do direito, poderia ser atribuída a certos
entes (agrupamentos de pessoas ou destinações de patrimônios),

52
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 126.
47
organizados para a realização de uma ideia socialmente útil, a partir do
desejo, da vontade das pessoas naturais, que lhe deram vida. Considera as
pessoas jurídicas como organizações sociais destinadas a um serviço ou ofício
e, por isso, personificadas”.53

📌 OBSERVAÇÃO
É pacífico na doutrina que o Código Civil adotou a Realidade Técnica, pois em seu art. 45 estabelece
que “a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado começa com a inscrição dos seus atos
constitutivos nos respectivos registros”.
O professor Flávio Tartuce54 explica que “essa teoria constitui uma somatória entre as outras duas
teorias justificatórias e afirmativas da existência da pessoa jurídica: a teoria da ficção – de Savigny – e a teoria da
realidade orgânica ou objetiva – de Gierke e Zitelman. Para a primeira teoria, as pessoas jurídicas são criadas
por uma ficção legal, o que realmente procede. Entretanto, mesmo diante dessa criação legal, não se pode
esquecer que a pessoa jurídica tem identidade organizacional própria, identidade essa que deve ser preservada
(teoria da realidade orgânica). Assim sendo, cabe o esquema a seguir:
Teoria da Ficção + Teoria da Realidade Orgânica = Teoria da realidade técnica”.

Há uma classificação das pessoas jurídicas que já foi cobrada em prova oral do TRF1, a respeito de
sua estrutura:
■ Universitas personarum: pessoas jurídicas que se formam pela reunião de pessoas que possuem
identidade de fins – sociedades, associações;
■ Universitas bonorum: pessoas jurídicas que se formam em torno de um patrimônio, que possui
um fim específico – fundações.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais (FUNDEP - 2022), foi questionado sobre a
regulamentação das Pessoas Jurídicas, tendo sido assinalado como CORRETA a assertiva que disse: “A
autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos,
estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo,
renda e inovação em benefício de todos.“

3.1.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

53
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 126.
54
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 165.
48
O professor Flávio Tartuce55 realiza as seguintes classificações em relação à pessoa jurídica:

QUANTO À NACIONALIDADE

“É a organizada conforme a lei brasileira e que tem no Brasil a sua sede


PESSOA JURÍDICA NACIONAL
principal e os seus órgãos de administração”56.

“É aquela formada em outro país, e que não poderá funcionar no Brasil


PESSOA JURÍDICA ESTRANGEIRA sem autorização do Poder Executivo, interessando também ao Direito
Internacional”57.

QUANTO À ESTRUTURA INTERNA

“É o conjunto de pessoas que atua com fins e objetivos próprios. São


CORPORAÇÃO corporações as sociedades, as associações, os partidos políticos e as
entidades religiosas”58.

FUNDAÇÃO “´É o conjunto de bens arrecadados com finalidade e interesse social”59.

QUANTO ÀS FUNÇÕES DE DIREITO PÚBLICO

“É o conjunto de pessoas ou bens que visa atender a interesses públicos,


sejam internos ou externos. De acordo com o art. 41 do CC/2002 são
pessoas jurídicas de direito público interno a União, os Estados, o
Distrito Federal, os Territórios, os Municípios, as autarquias, as
associações públicas e as demais entidades de caráter público em geral.
Seu estudo é objetivo mais do Direito Administrativo do que do Direito
PESSOA JURÍDICA DE DIREITO Civil. Em complemento, de acordo com o parágrafo único, do art. 41 do
PÚBLICO CC, as pessoas jurídicas de direito público e que tenham estrutura de
Direito Privado, caso das empresas públicas e das sociedades de
economia mista, são regulamentadas, no que couber e quanto ao seu
funcionamento, pelo Código Civil. As pessoas jurídicas de direito público
externo são os Estados estrangeiros e todas as pessoas regidas pelo
direito internacional público (art. 42 do CC). As demais são pessoas
jurídicas de direito público interno60”.

PESSOA JURÍDICA DE DIREITO “É a pessoa jurídica instituída pela vontade de particulares, visando a
PRIVADO atender os seus interesses. Pelo que consta do art. 44 do CC, inclusive

55
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
56
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
57
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
58
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
59
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
60
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
49
pela nova redação dada pelas Leis 10.825/2003 e 12.441/2011,
dividem-se em: fundações, associações, sociedades (simples ou
empresárias), partidos políticos, entidades religiosas e empresas
individuais de responsabilidade limitada. O estudo da pessoa jurídica de
Direito Privado merecerá aprofundamento no presente capítulo, a partir
de agora, pois de interesse direito ao Direito Civil”61.

3.1.2 REQUISITOS PARA A CONSTITUIÇÃO DA PESSOA JURÍDICA


Os requisitos para a constituição de pessoa jurídica de direito privado são vontade humana
criadora, observância das condições legais e licitude dos seus objetivos.
a) VONTADE HUMANA CRIADORA: “Depende da intenção de criar uma entidade distinta da de seus
membros, não podendo surgir de determinação estatal. A vontade humana convergente, ligada por
uma intenção comum (affectio societatis), constituída por duas ou mais pessoas, materializa-se no ato de
constituição, que deve ser escrito.62”

b) OBSERVÂNCIA DAS CONDIÇÕES LEGAIS: o ato constitutivo é requisito formal exigido pela lei e pode
ser:
■ Estatuto (em se tratando de associações – pessoa jurídicas sem fins lucrativos);
■ Contrato social (para sociedades simples ou empresárias, anteriormente denominadas civis e
comerciais); e
■ Escritura pública ou testamento (quando forem fundações, art. 62 do CC).

“Após o registro do ato constitutivo, inicia-se a existência legal da pessoa jurídica de direito privado (art. 45 do
CC). Até então, o grupamento de pessoas não passava de mera “sociedade de fato” ou “sociedade não
personificada”, equiparada por alguns ao nascituro, que já foi concebido, mas que só adquirirá personalidade
se nascer com vida. O registro pode depender, em casos específicos, de autorização ou aprovação do Poder
Executivo, como as seguradoras, as instituições financeiras, as administradoras de consórcio etc. No caso dos
partidos políticos, além do registro civil, que lhe confere personalidade, devem registrar-se no TSE. Os
sindicatos, por sua vez, além do registro civil, devem registrar-se no Ministério do Trabalho para adquirirem
personalidade (Súmula n. 677 do STF: “Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao Ministério do
Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade”)63”;

⚠️ ATENÇÃO: A constituição se divide em duas fases distintas:


■ Formação do ato constitutivo: atos concretos praticados pelos sócios (ex. formação de estatuto;
■ Registro público: efetiva inscrição do ato constitutivo em órgão competente.

c) LICITUDE DOS SEUS OBJETIVOS: “é indispensável para a formação da pessoa jurídica, devendo, ainda,
ser determinado e possível. Objetivos ilícitos ou nocivos constituem causa de extinção da pessoa
jurídica (art. 69). A importância da limitação da vontade se dá pela garantia de obediência dos negócios

61
Tartuce, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. Disponível em: Minha Biblioteca, (12th edição). Grupo GEN, 2022. p. 167.
62
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 128.
63
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 128.
50
ao ordenamento jurídico. Nas sociedades em geral, civis ou comerciais, o objetivo principal é o lucro
pelo exercício da atividade. Nas fundações, os fins podem ser religiosos, morais, culturais ou de
assistência (art. 62, parágrafo único), sendo-lhes possível se prestar a outras finalidades, desde que
afastado o caráter lucrativo. O propósito lucrativo é característica das sociedades (art. 981 do CC),
consistindo, portanto, em traço distintivo marcante entre essa espécie de pessoa jurídica e as
associações64”.

Enunciado 534 da VI Jornada de Direito Civil do CJF: “As associações podem desenvolver atividade econômica,
desde que não haja finalidade lucrativa”. Nas associações (art. 53 do CC), os objetivos colimados podem ser de
natureza cultural, educacional, esportiva, religiosa, filantrópica, recreativa, moral etc.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco (FCC - 2022), foram consideradas corretas as
alternativas que seguem:
I. A existência legal e a personalidade da pessoa jurídica se iniciam com a inscrição do ato constitutivo no
respectivo registro.
II. O registro do ato constitutivo deverá, dentre outros elementos, indicar a forma da administração e quem a
representa, judicial ou extrajudicialmente.

3.2. ESTRUTURAS DAS PESSOAS JURÍDICAS NO CÓDIGO CIVIL


O Código Civil, em seu art. 44, estabeleceu que são pessoas jurídicas de direito privado:
I. Associações:
II. Sociedades;
III. Fundações;
IV. Organizações religiosas;
V. Partidos políticos.

📌 OBSERVAÇÃO
■ Os incisos IV e V foram incluídos posteriormente pela Lei 10.825/03. As organizações religiosas e os
partidos políticos não estavam arrolados entre as pessoas jurídicas de direito privado na redação original do
Diploma Legal.
O Código Civil, em sua redação original, fez uma clara distinção entre pessoas jurídicas voltadas ao
lucro e pessoas jurídicas sem fins lucrativos. As pessoas jurídicas sem fins lucrativos são apenas:
▸ Associações;
▸ Fundações.
As associações e fundações, no entanto, têm estrutura totalmente diferente, pois a associação é uma
reunião de pessoas enquanto que a fundação é um patrimônio personalizado.

64
Valente, Rubem. Direito Civil Facilitado. Disponível em: Minha Biblioteca, (2nd edição). Grupo GEN, 2022. p. 128.
51
🚩 NÃO CONFUNDA
ASSOCIAÇÕES Trata-se de uma reunião de pessoas.

Consiste em um conjunto patrimonial personalizado,


FUNDAÇÕES destinado a uma finalidade específica, prevista em
seu ato de criação e aprimorada pelo seu Estatuto

Com relação às pessoas jurídicas que visam ao lucro, sua estrutura própria é a de Sociedade. A
sociedade consiste, portanto, em uma reunião de pessoas que perseguem a OBTENÇÃO DE LUCROS.

■ Quando da entrada do CC/02 houve muita crítica no sentido de não ser possível tratar as
organizações religiosas e os partidos políticos como simples associações.
Em razão desta pressão, foram incluídos os incisos IV e V, arrolando entre as pessoas jurídicas de
direito privado, as organizações religiosas e os partidos políticos.
Além disso, dispõe o art. 44, §1º:

§ 1o São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas,
sendo VEDADO ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e
necessários ao seu funcionamento.

A doutrina, porém, entende que as organizações religiosas e os partidos políticos têm estrutura
associativa. Conforme enunciado 142 do CJF:

JDC142 Os partidos políticos, os sindicatos e as associações religiosas possuem natureza associativa,


aplicando-se-lhes o Código Civil.

■ Prevalece na doutrina que a existência de uma pessoa jurídica (de um novo tipo de pessoa jurídica)
exige lei, ou seja, no Brasil prevalece que as pessoas jurídicas são em numerus clausus. De todo modo, o rol do
art. 44 não é taxativo, vale dizer, é perfeitamente possível que outras leis estabeleçam novas modalidades de
pessoa jurídica. Nesse sentido, o enunciado 144 do CJF:

JDC144 A relação das pessoas jurídicas de direito privado constante do art. 44, incs. I a V, do Código Civil
não é exaustiva.

Parte da doutrina, ainda minoritária, entende que pode existir pessoa jurídica ainda que sem previsão
legal. Neste sentido, alguns autores, como Lamartine Correia, afirmam que o CONDOMÍNIO EDILÍCIO seria uma
pessoa jurídica, embora não esteja arrolado entre as modalidades de pessoas jurídicas. Esta visão se aproxima
da teoria da Realidade Orgânica.
⚠️ ATENÇÃO
Entes despersonificados não são, tecnicamente, “pessoas jurídicas”, mas têm capacidade processual,

52
como a massa falida, a herança jacente, o espólio, a sociedade irregular (art. 75, do CC). Podem ser
demandados juridicamente. Maria Helena Diniz afirma que são “entes de personificação anômala”.
Conforme a Nova Lei do Ambiente dos Negócios (Lei 14.195/21), todas as pessoas jurídicas de
direito privado podem fazer assembleias eletrônicas. Nesses termos, o novo dispositivo acrescentado ao CC/02:

Art. 48-A. As pessoas jurídicas de direito privado, sem prejuízo do previsto em legislação especial e em seus
atos constitutivos, poderão realizar suas assembleias gerais por meios eletrônicos, inclusive para os fins
do disposto no art. 59 deste Código, respeitados os direitos previstos de participação e de manifestação; (LEI
14382/22)

Pertinente ao tema é o julgado do STJ abaixo colacionado:

A impossibilidade jurídica do objeto da deliberação assemblear acarreta a sua nulidade e não anulabilidade - A
impossibilidade jurídica do objeto da deliberação assemblear acarreta a sua nulidade e não anulabilidade. O
vício de nulidade pode ser conhecido de ofício e suscitado a qualquer tempo, não se sujeitando a prazos
prescricionais ou decadenciais. STJ. 3ª Turma. REsp 1.776.467-PR, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em
25/11/2021.

Vejamos a seguir alguns pontos sobre cada pessoa jurídica em espécie.

3.2.1. ASSOCIAÇÕES (Art. 53 a 61)


Como visto, as associações se formam pela união de pessoas que buscam fins lícitos sem finalidade
de lucro. “As associações são entidades de direito privado, formadas pela união de indivíduos com o propósito
de realizar fins não econômicos.”65
Isto não significa que a associação não possa ter lucros. Ao contrário, sua sobrevivência econômica
exige que ela tenha receita maior que suas despesas. O que não é possível é a associação repartir lucros
entre associados.
Os associados não têm direitos e obrigações ENTRE SI. O direito e o dever do associado são com a
associação. Não pode um associado demandar o outro para obrigá-lo a pagar eventual mensalidade. Via de
regra, os associados terão iguais direitos; porém, o estatuto pode instituir categorias com vantagens especiais.
Exemplo: clube recreativo. • Associado contribuinte. • Associado proprietário.

⚠️ ATENÇÃO
Por ser fundamentalmente uma união de pessoas, a qualidade de associado é intransmissível, salvo se
o estatuto estabelecer algo diverso.

O “TÍTULO” DE ASSOCIADO NÃO SE TRANSMITE COM A HERANÇA!

O que ocorre se o associado for titular de uma cota ou fração ideal do patrimônio da associação?

65
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
53
Neste caso, é possível a cessão da cota, porém isso não implicará a aquisição da qualidade de associado.
O art. 57 dispõe que a exclusão do associado só é admissível se houver justa causa reconhecida em
procedimento que assegure direito de defesa e recurso nos termos do Estatuto.
Esta previsão foi incluída pela Lei 11. 127/05. Antes dela, o STF já havia decidido que a expulsão de
associado exigia contraditório e ampla defesa. Este foi o primeiro caso em que se usou a expressão “eficácia
horizontal dos direitos fundamentais”.
JUSTA CAUSA é um conceito aberto ou indeterminado, que deve ser preenchido de acordo com as
características do caso concreto, à luz do que o professor Miguel Reale chama de princípio da operabilidade. É
melhor que a norma preveja de maneira aberta do que elencar uma série de situações, já que seria pouco
eficaz tentar cobrir todas as hipóteses.

Não confundir com a expulsão do condômino:

Art. 1.337, Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial,
gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser
constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas
condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.

A assembleia pode deliberar a expulsão quando o condômino já foi notificado e multado várias vezes,
e nada disso surtiu efeito. A expulsão, no entanto, não decorre diretamente da deliberação assemblear.
Essa assembleia delibera a propositura de uma ação judicial para a expulsão da pessoa antissocial. Em
situações graves, excepcionais e justificadas (e quando a multa não surte efeito), há respeitável posicionamento,
em doutrina, que sustenta a possibilidade de exclusão do condômino antissocial, à luz do princípio da função
social da propriedade.

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Procurador do Estado de Mato Grosso do Sul (CESPE - 2021), foi apresentado o texto que segue: “
O Clube de Piscinas é uma associação caracterizada pela união de pessoas que se organizaram para fins não
econômicos. Certo dia, em um dos eventos sociais promovidos pelo Clube de Piscinas, João e Pedro, associados,
envolveram-se em uma briga, o que resultou em lesões leves a ambos. O fato gerou repercussão negativa junto
à comunidade local, o que provocou discussão a respeito da possibilidade de exclusão de João e Pedro da
associação.” Diante do texto, foi considerada CORRETA a alternativa que trouxe que o Magistrado deve
considerar que: “João e Pedro somente poderão ser excluídos se o fato ocorrido for considerado justa causa,
assim reconhecida em procedimento que assegure direito de defesa e recurso, nos termos previstos no
estatuto.”

3.2.2. FUNDAÇÃO
A fundação pode ser conceituada como um patrimônio personalizado. Não existe fundação sem
patrimônio. Define a doutrina: “resultam não da união de indivíduos, mas da afetação de um patrimônio, por
54
testamento ou escritura pública, que faz o seu instituidor, especificando o fim para o qual se destina”66. O art.
62 estabelece que a fundação exige a dotação especial de bens livres.
A constituição da fundação somente pode se dar por ESCRITURA PÚBLICA OU TESTAMENTO cabendo
ao instituidor especificar os fins a que ela se destina.
O CC limitou as finalidades que podem ser perseguidas pela fundação. Até 2015 a fundação poderia
se destinar às finalidades morais, culturais, religiosas e assistenciais. A lei 13.151/15 ampliou este rol:

Art. 62, Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins de:

I – assistência social;

II – cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;

III – educação;

IV – saúde;

V – segurança alimentar e nutricional;

VI – defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável;

VII – pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de


gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos;

VIII – promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos;

IX – atividades religiosas;

Quanto à insuficiência de patrimônio, o art. 63 estabelece que os bens terão o destino previsto no ato
da instituição. Se o ato de instituição for silente, os bens serão atribuídos a uma fundação que tenha finalidade
igual ou semelhante.
A fundação pode ser instituída de forma direta, hipótese em que o próprio instituidor faz de forma
pessoal, inclusive colaborando na elaboração de estatutos e outras questões; ou de forma fiduciária, quando
determina que terceiro organize a entidade.

⚠️ ATENÇÃO
Cabe ao MP velar pelas fundações privadas. O órgão do MP tem participação ativa no dia a dia da
fundação. Inclusive, devendo aprovar eventual alteração dos estatutos. Caso o promotor negue a alteração, o
juiz poderá supri-la.

Art. 65. Parágrafo único. Se o estatuto não for elaborado no prazo assinado pelo instituidor, ou, não
havendo prazo, em 180 dias, a incumbência caberá ao Ministério Público.

Se uma fundação privada receber verbas federais e houver suspeita de desvio de dinheiro, embora o
MPF não tenha a função fiscalizatória primária (que é dos MPs estaduais), o MPF, eventualmente, poderá
realizar a fiscalização. Veja o Enunciado 147: III – Jornada de Direito Civil

Enunciado 147: A expressão “por mais de um Estado”, contida no § 2º do art. 66, não exclui o Distrito Federal e
os Territórios. A atribuição de velar pelas fundações, prevista no art. 66 e seus parágrafos, ao MP local – isto é,

66
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
55
dos Estados, DF e Territórios onde situadas – não exclui a necessidade de fiscalização de tais pessoas jurídicas
pelo MPF, quando se tratar de fundações instituídas ou mantidas pela União, autarquia ou empresa pública
federal, ou que destas recebam verbas, nos termos da Constituição, da LC n. 75/93 e da Lei de Improbidade.

📌 OBSERVAÇÃO
Fundações e Cláusula de Reversão: Segundo Daniel Novais Dias, “é lícito ao instituidor estipular
cláusula de reversão dos bens transmitidos para a fundação, isto é, prever, para o caso de extinção da
fundação, a incorporação a si, ou a quem ele designar, dos bens estritamente por ele dotados à fundação”
(Negócio Fundacional, Ed. Forense).
Ademais, o art. 69 do Código Civil prevê, de modo semelhante, que:

Art. 69. Tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou vencido o prazo de sua
existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção, incorporando-se
o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação,
designada pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante.

⚠️ ATENÇÃO
A fundação pública, instituída pela União, Estado ou Município, na forma da lei, rege-se por preceitos
próprios de Direito Administrativo, escapando, portanto, da perspectiva desta obra.67

🚨 JÁ CAIU
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco (FCC - 2022), foram consideradas corretas as
alternativas que seguem:
I. A fundação adquire personalidade jurídica com o registro de seu estatuto.
II. Nas situações estabelecidas em lei para criação de uma fundação, há previsão legal de que o Ministério
Público poderá redigir o estatuto, em certos casos.
Na prova para Defensor Público do Estado de Mato Grosso do Sul (FGV - 2022), foi apresentado o caso que
segue: “Juliano viveu uma vida de excessos e se preocupa em dar um fim útil ao considerável conjunto de bens
que amealhou durante a sua vida. Por isso, deseja que, após a sua morte, 20% dos seus bens sejam destinados
à instituição de uma fundação para fins de defesa, conservação e promoção do meio ambiente dos povos
ribeirinhos.” Diante do texto foi considerada CORRETA a alternativa “se o estatuto não for elaborado no prazo
assinado pelo instituidor, ou, não havendo prazo, em 180 dias, a incumbência caberá ao Ministério Público.”

3.2.3. SOCIEDADE
A sociedade vem prevista nos arts. 981 e seguintes do CC/02.
A sociedade no Brasil é consequência de um contrato pelo qual 2 ou mais pessoas se obrigam,

67
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
56
reciprocamente, a contribuir com bens ou serviços para o exercício de atividade econômica e partilha do
resultado.
Com o contrato de sociedade, surge a sociedade. Os bens e dívidas da sociedade formam um
patrimônio especial. A sociedade se caracteriza pela finalidade de lucro.
Temos as seguintes espécies:
a) SOCIEDADE EMPRESÁRIA: É a sociedade que, nos termos do art. 966, exerce a empresa.

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para
a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

b) SOCIEDADE SIMPLES: Toda sociedade que não for empresária, é considerada sociedade simples (art.
966, parágrafo único).

Parágrafo único. NÃO SE CONSIDERA EMPRESÁRIO quem exerce profissão intelectual, de natureza
científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o
exercício da profissão constituir elemento de empresa.

📌 OBSERVAÇÕES
■ Independentemente do objeto que explore, a cooperativa será simples e a S/A será empresária.
■ A sociedade não se confunde com a pessoa jurídica. Tanto é que ela pode ser uma sociedade não
personificada (sociedade em comum e em conta de participação).

A sociedade adquirirá personalidade jurídica e então se tornará pessoa jurídica quando os atos
constitutivos da sociedade forem registrados no órgão próprio.
Por fim, importante destacar que a sociedade limitada ganhou nova modalidade. Agora, temos a
sociedade limitada UNIPESSOAL, conforme a Lei 13.874/19 (Art. 1.052, §§1 e 2º):

Art. 1.052. § 1º A sociedade limitada pode ser constituída por 1 ou mais pessoas.(LEI 13874/19)

§ 2º Se for unipessoal, aplicar-se-ão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as


disposições sobre o contrato social (LEI 13874/19)

3.2.4. EIRELI (ALTERAÇÃO DA LEI DO AMBIENTE DOS NEGÓCIOS – LEI 14.195/21)


Foi uma pessoa jurídica peculiar porque, enquanto a sociedade (regra geral) pressupõe sócios, uma
EIRELI era uma pessoa jurídica constituída por uma pessoa só, ou seja, uma pessoa jurídica unipessoal. Todavia,
o Legislador, quando da alteração do CC/02 para inclusão dessa nova pessoa jurídica, acabou empregando a
nomenclatura errada (chamando-a de “empresa”) e, conforme a doutrina empresarialista, perdeu a
oportunidade de criar a sociedade limitada unipessoal, o que só veio a ocorrer em 2019 com a Lei da Liberdade
Econômica, como foi dito.
No dia 27/08/2021, foi publicada e Lei do Ambiente dos Negócios (Lei 14.195/21), que extinguiu a
EIRELI, transformando automaticamente as existentes em Sociedade limitada unipessoal,

57
independentemente de alteração do instrumento constitutivo.
Nesse sentido, dispõe a nova lei:

Art. 41. As empresas individuais de responsabilidade limitada existentes na data da entrada em vigor desta Lei
serão transformadas em sociedades limitadas unipessoais independentemente de qualquer alteração em seu
ato constitutivo.

Parágrafo único. Ato do Drei disciplinará a transformação referida neste artigo.

3.2.5. ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS


Juridicamente, podem ser consideradas organizações religiosas todas as entidades de direito privado,
formadas pela união de indivíduos com o propósito de culto a determinada força ou forças sobrenaturais, por
meio de doutrina e ritual próprios, envolvendo, em geral, preceitos éticos. Nesse conceito enquadram-se,
portanto, desde igrejas e seitas até comunidades leigas, como confrarias ou irmandades.68
Interessante arcabouço legal circunda o tema, isso porque o ordenamento jurídico brasileiro traz a
chamada liberdade de organização religiosa, sendo um dos desenvolvimentos da liberdade religiosa, vejamos
algumas previsões relevantes:

Art. 44, § 1º, CC. São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das
organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos
constitutivos e necessários ao seu funcionamento. (Incluído pela Lei nº 10.825, de 22.12.2003)

Art. 19, CF. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com


eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de
interesse público;

Obviamente, a liberdade de organização e funcionamento das entidades religiosas não as exime da


apreciação judicial de seus atos, uma vez que não seria constitucional abrir uma exceção ao princípio da
indeclinabilidade do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF de 1988).69
Por fim, sobre o tema há o enunciado nº 143 da III Jornada de Direito Civil, vejam:

liberdade de funcionamento das organizações religiosas não afasta o controle de legalidade e legitimidade
constitucional de seu registro, nem a possibilidade de reexame pelo Judiciário da compatibilidade de seus atos
com a lei e com seus estatutos

3.2.6. PARTIDOS POLÍTICOS


Ensina Maria Helena Diniz, os partidos políticos são “entidades integradas por pessoas com ideias
comuns, tendo por finalidade conquistar o poder para a consecução de um programa. São associações civis,
que visam assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e
defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal. Adquirem personalidade jurídica com o

68
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
69
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
58
registro de seus estatutos mediante requerimento ao cartório competente do Registro Civil das pessoas
jurídicas da capital federal e ao Tribunal Superior Eleitoral. Os partidos políticos poderão ser livremente criados,
tendo autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento, devendo seus estatutos
estabelecer normas de fidelidade e disciplina partidária. Ser-lhes-á proibido receber recursos financeiros de
entidade ou governo estrangeiro, devendo prestar contas de seus atos à Justiça Eleitoral”70

Art. 44, § 3º, CC. Os partidos políticos serão organizados e funcionarão conforme o disposto em lei específica.

Na falta de norma posterior, esta lei específica continua sendo a Lei n. 9.096/95 que, dispondo sobre
os partidos políticos, regulamentou os arts. 17 e 14, § 3º, V, da Constituição Federal de 1988.71

3.3. JURISPRUDÊNCIA

A Cooperativa de Trabalho Médico pode limitar, justificada e objetivamente, o ingresso de médicos em seus
quadros - Diante do híbrido regime jurídico ao qual as Cooperativas de Trabalho Médico estão sujeitas (Lei nº
5.764/71 e Lei nº 9.656/98), é juridicamente legítima a limitação, de forma impessoal e objetiva, do número de
médicos cooperados, tendo em vista o mercado para a especialidade e o necessário equilíbrio financeiro da
cooperativa.

A interpretação harmônica das duas leis de regência consolida o interesse público que permeia a atuação das
cooperativas médicas e viabiliza a continuidade das suas atividades, mormente ao se considerar a
responsabilidade solidária existente entre médicos cooperados e cooperativa e o possível desamparo dos
beneficiários que necessitam do plano de saúde.

Assim, é admissível a recusa de novos associados se for atingida a capacidade máxima de prestação de
serviços pela cooperativa, o que deve ser aferido por critérios objetivos e verossímeis. Neste caso, a recusa é
legítima porque a entrada de novos sócios pode comprometer o equilíbrio econômico-financeiro da
cooperativa, impedindo-a de cumprir sua finalidade.

O princípio da porta aberta (livre adesão) não é absoluto, devendo a cooperativa de trabalho médico, que
também é uma operadora de plano de saúde, velar por sua qualidade de atendimento e situação financeira
estrutural, até porque pode ser condenada solidariamente por atos danosos de cooperados a usuários do
sistema (a exemplo de erros médicos), o que impossibilitaria a sua viabilidade de prestação de serviços. STJ. 3ª
Turma. REsp 1901911/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/8/2021. STJ. 4ª Turma. REsp
1396255-SE, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 07/12/2021 (Info 723).

O princípio da porta aberta deve ser interpretado no sentido de ser possível a exigência de processo
seletivo para admissão de novo cooperado, desde que haja previsão estatutária e a condição não tenha
a finalidade de restringir o acesso de forma abusiva - É lícita a previsão, em estatuto social de cooperativa
de trabalho médico, de processo seletivo público como requisito de admissão de profissionais médicos para
compor os quadros da entidade, devendo o princípio da porta aberta ser compatibilizado com a possibilidade
técnica de prestação de serviços e a viabilidade estrutural econômico-financeira da sociedade cooperativa. STJ.
3ª Turma. REsp 1901911-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/08/2021 (Info 706). STJ. 2ª
Seção. AgInt nos EREsp 1561337/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 18/08/2021.

70
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 37. ed., São Paulo: Saraiva, 2020, v. 1, p. 307.
71
Gagliano, Pablo, S. e Rodolfo Pamplona Filho. Manual de Direito Civil: volume único. Disponível em: Minha Biblioteca, (6th edição). Editora Saraiva, 2022.
59
Ficam suspensas as ações judiciais propostas contra cooperativa que esteja em liquidação
extrajudicial; esta suspensão, contudo, não pode ser superior a 1 ano, prorrogável por mais 1 ano -
Quando a assembleia-geral aprova a liquidação extrajudicial da cooperativa, isso acarreta a sustação
de qualquer ação judicial contra a entidade, pelo prazo de 1 ano (art. 76 da Lei nº 5.764/71). Esse prazo
pode ser prorrogado por mais 1 ano.

Não é possível ampliar essa suspensão para além do limite legal de 2 anos, não sendo possível aplicar, por
analogia, a regra de prorrogação do stay period da recuperação judicial (art. 6º, § 4º, da Lei nº 11.101/2005).

O art. 76 da Lei nº 5.764/71 possui caráter excepcional porque atribui atribuir a uma deliberação privada o
condão de suspender a prestação da atividade jurisdicional.

Em suma: não é cabível a suspensão do cumprimento de sentença contra cooperativa em regime de


liquidação extrajudicial para além do prazo de 1 ano, prorrogável por mais 1 ano.

STJ. 3ª Turma. REsp 1833613-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/11/2020 (Info 683).

Alteração no CNPJ por transformação de sociedade cooperativa - As cooperativas possuem natureza


jurídica de "sociedades simples", conforme determina o art. 982, parágrafo único do CC. Se uma cooperativa
quiser se transformar em uma sociedade empresária ela não precisará primeiro ser dissolvida e liquidada para
depois ser constituída uma nova pessoa jurídica (sociedade empresária). Isso pode ser feito direto, ou seja, ao
mesmo tempo que a cooperativa deixa de existir, ela passa a ser uma sociedade empresária, permitindo-se
que ela mantenha o mesmo número do CNPJ. Enfim, a alteração no CNPJ da razão social de sociedade
cooperativa que modificou sua forma jurídica não exige o prévio cancelamento de sua autorização para
funcionar e de seu registro.

STJ. 2ª Turma. REsp 1528304-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/8/2015 (Info 568).

3.4. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA


3.4.1. HISTÓRICO NO BRASIL
✔ CC/1916: não previa a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica;
✔ Na década de 60, Rubens Requião foi um dos primeiros doutrinadores brasileiros a defender a aplicação da
teoria no Brasil, mesmo sem previsão legal;
✔ CDC em 1990: primeira lei a prever a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no
Brasil (art. 28);
✔ Lei nº 8.884/94 (antiga Lei Antitruste): previu a desconsideração;
✔ Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais): também disciplinou a desconsideração;
✔ Código Civil de 2002: trouxe previsão expressa no art. 50;
✔ Lei nº 12.529/2011: disciplinou a desconsideração em casos de infrações da ordem econômica (art. 34).

3.4.2. CONCEITO
A desconsideração da personalidade jurídica consiste em uma ineficácia parcial e temporária da
personalidade jurídica, ou seja, a pessoa jurídica não desaparece, simplesmente sua personalidade é
momentaneamente desconsiderada.
O sistema jurídico brasileiro, no âmbito do direito civil, disciplina a desconsideração no art. 50 do CC.
Todavia, temos outras disposições sobre o instituto na legislação esparsa (inclusive anteriores ao art. 50), a

60
exemplo da desconsideração no direito do consumidor, direito ambiental e no direito do trabalho. A
disciplinada no CC é a chamada desconsideração pela Teoria Maior. Isto pelo fato de exigir requisitos rigorosos
para que possa ocorrer a desconsideração.
Quanto aos aspectos processuais, o CPC, de maneira inovadora, disciplina o incidente nos arts. 133 a
137.

3.4.3. TEORIAS A RESPEITO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA72

O Direito Civil brasileiro adotou a chamada teoria maior da


desconsideração. Isso porque o art. 50 exige que se prove o desvio de
finalidade (teoria maior subjetiva) ou a confusão patrimonial (teoria maior

TEORIA MAIOR objetiva).

Para gravar: “maior” porque Deve-se provar:

traz um maior número de 1) Abuso de personalidade (desvio de finalidade ou confusão patrimonial);


requisitos a serem 2) Que os administradores ou sócios da pessoa jurídica foram beneficiados
observados! direta ou indiretamente pelo abuso (novo requisito trazido pela Lei nº
13.874/2019).
Deve-se provar o abuso da personalidade, caracterizado pelo desvio de
finalidade ou pela confusão patrimonial.

No Direito do Consumidor e no Direito Ambiental adotou-se a teoria menor


da desconsideração. Isso porque, para que haja a desconsideração da
personalidade jurídica nas relações jurídicas envolvendo consumo ou
responsabilidade civil ambiental, basta provar a insolvência da pessoa
jurídica.
De acordo com a Teoria Menor, a incidência da desconsideração se
justifica:
a) pela comprovação da insolvência da pessoa jurídica para o pagamento
TEORIA MENOR de suas obrigações, somada à má administração da empresa (art. 28,
caput, do CDC); ou
b) pelo mero fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao
ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores, nos termos do §5º
do art. 28 do CDC. (STJ, 3ª Turma, REsp 1.735.004/SP, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 26/06/2018).
Deve-se provar apenas a insolvência.
Art. 4º da Lei nº 9.605/98 (Lei Ambiental).
Art. 28, §5º do CDC.

O STJ decidiu que:

Fonte: Buscador Dizer o Direito.


72

61
A teoria menor da desconsideração, acolhida em nosso ordenamento jurídico excepcionalmente no
Direito do Consumidor e no Direito Ambiental, incide com a mera prova de insolvência da pessoa
jurídica para o pagamento de suas obrigações, independentemente da existência de desvio de
finalidade ou de confusão patrimonial. Para a teoria menor, o risco empresarial normal às atividades
econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou
administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não
exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios e/ou
administradores da pessoa jurídica. A aplicação da teoria menor da desconsideração às relações de consumo
está calcada na exegese autônoma do § 5º do art. 28 do CDC, porquanto a incidência desse dispositivo não se
subordina à demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado, mas apenas à prova de
causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos
consumidores (STJ, REsp 279.273/SP, 3ª Turma, Rel. p/ acórdão Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2003; no mesmo
sentido, mais recentemente: STJ, EREsp 1.658.568/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 16.10.2018).

Sobre isso, importante lembrar que a Lei de liberdade econômica veio confirmar a excepcionalidade
da desconsideração. Conforme o art. 49-A:

Art. 49-A. A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores
(LEI 13874/19)

Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e
segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração
de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos. (LEI 13874/19)

Como afirma Pablo Stolze, esse artigo, propositalmente colocado antes do artigo que disciplina a
desconsideração, firma uma premissa, firma a regra geral de que as pessoas jurídicas têm autonomia
patrimonial em face das pessoas físicas que a compõem.
Ademais, o art. 49-A salientou a autonomia patrimonial da pessoa jurídica em face da pessoa física
que a compõem: regra geral, quem responde pelo débito da pessoa jurídica é própria pessoa jurídica, não é o
sócio, não é o administrador, não é o instituidor, não é a pessoa física porque, regra geral, a pessoa jurídica tem
autonomia patrimonial. Em outras palavras, a desconsideração é uma medida excepcional. O patrimônio dos
sócios não pode ser penhorado porque se o débito é da pessoa jurídica, regra geral, quem responde é a pessoa
jurídica.
Neste sentido, o STJ:

Membros do conselho fiscal de uma cooperativa não podem ser atingidos pela desconsideração da
personalidade jurídica se não praticaram nenhum ato de administração - A desconsideração da
personalidade jurídica, ainda que com fundamento na Teoria Menor, não pode atingir o patrimônio
pessoal de membros do Conselho Fiscal sem que haja a mínima presença de indícios de que estes
contribuíram, ao menos culposamente e com desvio de função, para a prática de atos de
administração. Caso concreto: consumidor comprou um imóvel de um cooperativa habitacional, mas este
nunca foi entregue; o consumidor ajuizou ação de cobrança contra a cooperativa, tendo o pedido sido julgado
procedente para devolver os valores pagos; durante o cumprimento de sentença, o juiz, com base na teoria
menor, fez a desconsideração da personalidade jurídica para atingir o patrimônio pessoal dos membros do
Conselho Fiscal da cooperativa; o STJ afirmou que eles não poderiam ter sido atingidos. A despeito de não se
exigir prova de abuso ou fraude para fins de aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade

62
jurídica, tampouco de confusão patrimonial, o § 5º do art. 28 do CDC não dá margem para admitir a
responsabilização pessoal de quem jamais atuou como gestor da empresa. STJ. 3ª Turma. REsp 1766093-SP,
Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/11/2019 (Info 661). (Grifou-se)

A desconsideração exige o preenchimento de certos pressupostos.


Em linhas gerais, a doutrina da desconsideração pretende o afastamento temporário da
personalidade da pessoa jurídica para permitir a satisfação do direito violado diretamente no patrimônio
pessoal do sócio que praticou o ato abusivo.
A desconsideração pode ser aplicada à pessoa jurídica de direito privado, em geral, e mesmo também
a pessoas jurídicas sem fins lucrativos.
A Teoria Maior (adotada) exige, além da insuficiência patrimonial, pressuposto lógico, a
demonstração do abuso caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial. Como
demonstrado na tabela acima, contrapõe-se, pois, à denominada teoria menor da desconsideração, de
aplicação mais facilitada, que exige, apenas, a insuficiência patrimonial, consagrada no Direito Ambiental e no
Direito do Consumidor, bem como na Justiça do Trabalho.
O desvio de finalidade se caracteriza quando a pessoa jurídica passa a exercer atividade estranha ao
objeto social. Já a confusão patrimonial se caracteriza quando os sócios passam a tratar o patrimônio social
como patrimônio próprio.

Art. 50. TEORIA MAIOR DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. Em caso de abuso da


personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz,
a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo,
desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos
aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou
indiretamente pelo abuso. (LEI 13874/19)

De acordo com a letra da lei, não há, aparentemente, espaço para que o juiz decrete de ofício a
desconsideração. Há doutrinas, como a de Flávio Tartuce, que entende que, em certos casos, por razão de
ordem pública, poderia caber desconsideração de ofício, por exemplo, em casos de danos ambientais.
Corroborando o entendimento pela impossibilidade de decretação da desconsideração da
personalidade jurídica de ofício, está o art. 133 caput, do CPC, que aduz ser tal intervenção de terceiros
suscitada pela parte interessada ou pelo Ministério Público, nos feitos em que atuar:

Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do
Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

Citando Edmar Andrade, entende-se que a desconsideração, regra geral, é uma matéria sob reserva
de jurisdição: quem decreta a desconsideração de uma pessoa jurídica é o juiz, o Poder Judiciário.

📌 OBSERVAÇÃO
Pablo Stolze observa que em geral é matéria sob reserva de jurisdição, mas cita como exemplo o
professor Gustavo Tepedino, que afirma que, em casos excepcionais, muito graves, admite-se a

63
desconsideração de uma personalidade de pessoa jurídica por meio de ato da Administração Pública, a
desconsideração administrativa.
Sobre isso, importante decisão no STJ (RMS 15.166/BA):

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. SANÇÃO DE


INIDONEIDADE PARA LICITAR. EXTENSÃO DE EFEITOS À SOCIEDADE COM O MESMO OBJETO SOCIAL, MESMOS
SÓCIOS E MESMO ENDEREÇO. FRAUDE À LEI E ABUSO DE FORMA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE
JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E DA
INDISPONIBILIDADE DOS INTERESSES PÚBLICOS. - A constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto
social, com os mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para
licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de burlar à aplicação da sanção administrativa,
constitui abuso de forma e fraude à Lei de Licitações Lei n.º 8.666/93, de modo a possibilitar a aplicação da
teoria da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da sanção administrativa à
nova sociedade constituída. - A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade
administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, desconsiderar a personalidade
jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado
o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular. - Recurso a que se nega provimento.

📌 OBSERVAÇÃO
A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica não vai alcançar qualquer sócio da pessoa
jurídica, vai alcançar o sócio/administrador que praticou o ato abusivo, que se beneficiou do ato abusivo, direta
ou indiretamente.
Breves comentários sobre os requisitos exigidos para a desconsideração:
a) Desvio de finalidade: Temos aqui um conceito aberto.
Como já dito, o desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores,
desviando-se do elemento teleológico finalístico do contrato social (art. 50, §1º).

Mas, para obter êxito em juízo, demonstrando esse desvio de finalidade, é necessário provar que
aquele sócio que se pretende atingir atuou com dolo específico de prejudicar alguém? É necessário provar a
má-fé? Bem lembra o professor Pablo Stolze que a doutrina mais desenvolvida, como a de Fábio Konder
Comparato, firmou entendimento no sentido da desnecessidade do credor ter que demonstrar que aquele
sócio que se quer atingir atuou de má-fé ou com dolo específico. A aferição do desvio de finalidade é uma
aferição objetiva, não é necessário provar que aquele sócio teve a intenção, a premeditação de causal mal.
Ainda, atenção, a ampliação do objeto social explorado pela pessoa jurídica não constitui, por si só,
desvio de finalidade para fins de desconsideração (art. 50, §5º).

b) Confusão patrimonial
Conforme o art. 50, §2º:

§ 2º Entende-se por CONFUSÃO PATRIMONIAL a ausência de separação de fato entre os patrimônios,


caracterizada por:

I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;(LEI

64
13874/19)

II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor


proporcionalmente insignificante; e(LEI 13874/19)

III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.(LEI 13874/19)

Trata-se da ausência de separação de fato entre os patrimônios, que se dá quando se confunde o


patrimônio da sociedade com o do sócio ou com o de outra sociedade (controladora e controlada). Este tipo de
desconsideração em que se afasta a personalidade jurídica de uma entidade para se atingir o sócio(s) da pessoa
jurídica que atua por trás (controlada - controladora), denomina-se desconsideração INDIRETA (afasta-se a
personalidade jurídica de uma pessoa jurídica para se atingir outra pessoa jurídica).

c) Desconsideração inversa ou invertida


Nos termos do art. 50, §3º:

§ 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de
sócios ou de administradores à pessoa jurídica.(LEI 13874/19)

Acolheu-se, aqui, a desconsideração inversa ou invertida, o que significa ir ao patrimônio da pessoa


jurídica quando a pessoa física que a compõe esvazia fraudulentamente o seu patrimônio pessoal.
Na desconsideração tradicional, a dinâmica é: a personalidade da pessoa jurídica é afastada, é
desconsiderada a pessoa jurídica que não tem patrimônio suficiente para alcançar a pessoa física que está por
trás, o sócio/administrador que se beneficiou do ato abusivo.
Na desconsideração inversa, porém, ocorre o contrário: desconsidera-se a pessoa física para alcançar
a pessoa jurídica.
Já decidiu o STJ:

(...) DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. OCULTAÇÃO DO PATRIMÔNIO DO SÓCIO.


INDÍCIOS DO ABUSO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. EXISTÊNCIA. INCIDENTE PROCESSUAL. PROCESSAMENTO,
PROVIMENTO. (...) 4. Com a desconsideração inversa da personalidade jurídica, busca-se impedir a prática de
transferência de bens pelo sócio para a pessoa jurídica sobre a qual detém controle, afastando-se
momentaneamente o manto fictício que separa o sócio da sociedade para buscar o patrimônio que, embora
conste no nome da sociedade, na realidade, pertence ao sócio fraudador. (...) 6. Na hipótese em exame, a
recorrente conseguiu demonstrar indícios de que o recorrido seria sócio e de que teria transferido seu
patrimônio para a sociedade de modo a ocultar seus bens ao alcance de seus credores, o que possibilita o
recebimento do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica, que, pelo princípio do tempus
regit actum, deve seguir o rito estabelecido no CPC/15. 7. Recurso especial conhecido e provido. (STJ, REsp
1647362/SP, Rel.Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 10/08/2017).

⚠️ ATENÇÃO
Conforme o §4º, a mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata
o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.

65
Bem lembra Pablo Stolze que se, por um lado, a mera existência de grupo econômico sem a presença
dos requisitos legais não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, por outro, nada
impede que, uma vez observados tais pressupostos, o juiz decida, dentro de um mesmo grupo, pelo
afastamento de um ente controlado, para alcançar o patrimônio da pessoa jurídica controladora que por meio
da primeira cometeu um ato abusivo.
Todavia, demonstrados os requisitos, pode-se desconsiderar a pessoa jurídica controlada e atingir a
controladora: isso é chamado de desconsideração indireta, quando se afasta uma pessoa jurídica e se alcança
a outra que está por trás.
Por fim, como afirma Pablo Stolze, no âmbito do Direito Civil, não é por ter ocorrido o encerramento
irregular da empresa demandada, ré, que ela deve ser desconsiderada. À luz da teoria maior, isso não é
possível porque deve ser demonstrado, além da insuficiência patrimonial, a comprovação do abuso
caracterizado ou pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
Sobre isso, elencamos 2 julgados recentes:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.


ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL.REQUISITOS. AUSÊNCIA. REEXAME. FUNDAMENTOS. SÚMULA N. 7/STJ. 1. Recurso
especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados
Administrativos n. 2 e 3/STJ). 2. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a
desconsideração da personalidade jurídica a partir da Teoria Maior (art. 50 do Código Civil) exige a
comprovação de abuso, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pelo que
a mera inexistência de bens penhoráveis ou eventual encerramento irregular das atividades da
empresa não justifica o deferimento de tal medida excepcional. 3. Na hipótese, inviável rever as
conclusões das instâncias ordinárias quanto ao preenchimento dos requisitos para a desconsideração da
personalidade jurídica da empresa sem a análise dos fatos e das provas da causa, o que atrai a incidência da
Súmula n. 7/STJ. 4. Agravo interno não provido. (Agin do AResp 1679434/SP, Rel.Ministro RICARDO VILLAS
BOAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, Julgado em 21/09/2020, DJe 28/09/2020).

AGRAVO INTERNO, RECURSO ESPECIAL. CIVIL, COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. DESCONSIDERAÇÃO DA


PERSONALIDADE JURÍDICA. REQUISITOS. INSOLVÊNCIA. ENCERRAMENTO IRREGULAR DA EMPRESA, NÃO
CONFIGURA ABUSO DE DIREITO OU DESVIO DE FINALIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A
desconsideração da personalidade jurídica é medida de caráter excepcional que somente pode ser decretada
após a análise, no caso concreto, da existência de vícios que configurem abuso de direito, caracterizado por
desvio de finalidade ou confusão patrimonial, requisitos que não se presumem em casos de dissolução
irregular ou se insolvência. Precedentes. 2. A inexistência ou não localização de bens da pessoa jurídica não é
condição para a instauração do procedimento que objetiva a desconsideração, por não ser sequer requisito
para aquela declaração, já que imprescindível a demonstração específica da prática objetiva de desvio de
finalidade ou de confusão patrimonial. 3. Agravo interno não provido. (Agint no REsp 1812292/RO, Rel.Ministro
LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/05/2020, DJe 21/05/2020).

Para memorizar melhor, segue a tabela abaixo acerca das modalidades citadas de desconsideração da
personalidade jurídica existentes:

DESCONSIDERAÇÃO DIRETA Confusão patrimonial + insolvência = atinge sócios.

66
DESCONSIDERAÇÃO INVERSA Sócios ocultam bens pessoais na própria PJ.

Atinge bens da empresa controladora que estão em nome da


DESCONSIDERAÇÃO INDIRETA
controlada/coligada.

DESCONSIDERAÇÃO EXPANSIVA Atinge bens do sócio oculto que estão em nome de terceiro.

DESPERSONALIZAÇÃO Dissolução da pessoa jurídica.

Ainda sobre o tema, importante o julgado abaixo:

A instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica não exige prova de


inexistência de bens do devedor - Nas causas em que a relação jurídica for cível-empresarial, a
desconsideração da personalidade da pessoa jurídica será regulada pelo art. 50 do Código Civil. A inexistência
ou não localização de bens da pessoa jurídica não é condição para a desconsideração da personalidade
jurídica. O que se exige é a demonstração da prática de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial (art.
50 do CC). Assim, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode ser instaurado mesmo nos
casos em que não for comprovada a inexistência de bens do devedor. STJ. 4ª Turma. REsp 1729554/SP, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 08/05/2018

Desconsideração da personalidade jurídica no Caso Salomon versus Salomon73


A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica foi amplamente desenvolvida na Common
Law, principalmente nos EUA. Entretanto, a maioria dos estudiosos acredita que sua origem foi na Inglaterra, no
célebre caso Salomon vs. Salomon & Co., julgado pela House of Lords – última instância - em 1897.
Os autores, então, apontam como leading case da Disregard Doctrine o referido julgamento na
Inglaterra, que, resumidamente é o seguinte:
O empresário Aaron Salomon havia constituído uma company, em conjunto com outros componentes
de sua família, e cedido seu fundo de comércio à sociedade que fundara, recebendo em conseqüência vinte mil
ações representativas de sua contribuição, enquanto para cada um dos outros membros coube, apenas, uma
ação para integrar o valor da incorporação do fundo de comércio da nova sociedade. Salomon recebeu
obrigações garantidas no valor de dez mil libras esterlinas. Logo em seguida, a sociedade revelou-se insolvável,
sendo seu ativo insuficiente para satisfazer as obrigações garantidas, nada sobrando sobrando aos credores
quirografários.
O liquidante sustentou que a atividade da company era pessoal, de Salomon, para limitar sua própria
responsabilidade, arrecadando, assim, seus bens particulares. Tal pretensão foi acolhida em 1º grau. A Corte de
Apelação confirmou a sentença proferida, mas a Casa dos Lordes reformou os entendimentos anteriores, sob a
alegação de que a empresa havia sido validamente constituída e que não havia qualquer intuito fraudulento.
Assim, inaugurou-se a Doutrina da Disregard, que não foi aplicada no caso, em virtude de a House of Lords ter
reformado a decisão que desconsiderava a personalidade jurídica da sociedade criada por Salomon.

73
Fonte: https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista08/Revista08_54.pdf
67
🚨 JÁ CAIU
Na prova para Defensor Público do Estado de Sergipe (CESPE - 2022), sobre desconsideração da personalidade
jurídica, foi assinalado como CORRETA a assertiva que disse: “A confusão patrimonial caracteriza-se pela
ausência de separação de fato entre o patrimônio do sócio e o da pessoa jurídica. “
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Sergipe (CESPE - 2022), questionou-se “de acordo com o
Superior Tribunal de Justiça, a desconsideração da personalidade jurídica, no âmbito do Código Civil, tendo sido
marcada CORRETA a assertiva que trouxe: “exige a comprovação de abuso.”
Na prova para Defensor Público do Estado de Sergipe (FCC - 2022), foi apresentado o texto a seguir: “Irene
conviveu em união estável com Hugo, empresário, que durante o relacionamento transferiu para a sua empresa
todos os bens que adquiriu, inclusive o único imóvel residencial que adquirira onerosamente durante o
relacionamento e que serviu para a moradia do casal até a data do óbito de Hugo. Irene não possuía nenhuma
participação societária na empresa do falecido.” Diante do exposto, foi considerada CORRETA a assertiva que
disse que Irene: “tem legitimidade para requerer a desconsideração inversa da personalidade jurídica para que
a partilha dos bens possa recair sobre os bens adquiridos onerosamente durante a união estável e que foram
desviados para a pessoa jurídica, inclusive para viabilizar o direito real de habitação da companheira
sobrevivente.”
Na prova para Defensor Público do Estado de Mato Grosso do Sul (FGV - 2022), foi apresentado o texto que
segue: “A empresa XYWZ, com sede no Estado do Amapá, há alguns anos enfrentava dificuldades financeiras e
passou a não realizar o pagamento de dívidas que já acumulavam um passivo maior do que o seu ativo. Com a
pandemia, a situação se agravou ainda mais e a empresa encerrou suas atividades às pressas, sem comunicar
aos órgãos competentes. Diante da inadimplência da empresa, seus credores, incluindo o fisco, entraram em
juízo e solicitaram a desconsideração da personalidade jurídica.” Diante do texto, considerando a jurisprudência
do STJ, foi considerada CORRETA a alternativa que trouxe que o Magistrado deve considerar que: “presume-se
dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos
órgãos competentes.”
Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Santa Catarina (CESPE - 2021), foi questionado em prova de
certo/errado: “A caracterização de desvio de finalidade ou de confusão patrimonial em uma associação enseja a
desconsideração da sua personalidade jurídica.” Essa afirmativa foi tida como CORRETA.

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