4.3 - IV - Filosofia Do Direito Na Idade Moderna

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A FILOSOFIA DO DIREITO

NA IDADE MODERNA
O RENASCIMENTO

• O vigoroso movimento intelectual atingiu não somente o setor das artes em geral, mas alcançou ainda o domínio das
ideias políticas, filosóficas e jurídicas, especialmente com Nicolau Maquiavel, Bodin e Hugo Grócio.
• Durante a Idade Média o Direito foi concebido como ordem fundada em uma lei natural vinculada a Deus, enquanto o
Estado, por sua dependência ao Direito, também se apoiava naquele princípio transcendental. Com os novos tempos
inverteu-se a ordem de subordinação.
• Maquiavel o secretário da República de Florença, Niccolò Machiavelli (1469-1527), com sua obra máxima, Il Príncipe, foi
personagem destacada e polêmica no período da Renascença. o filósofo e político se apresenta na história como homem
de ação e preocupado com o momento histórico de sua pátria. Guiado por seu afã de ver restaurada a unidade do
Estado italiano, indicou ao governante, em seu livro fundamental, as fórmulas para se perpetuar no trono,
independentemente da observância das regras éticas. Expôs a sua teoria dentro da filosofia de que os fins justificam os
meios.
• Todas as manobras seriam válidas, honestas ou não, lícitas ou ilícitas, desde que objetivassem a permanência no poder.
Daí advir o termo maquiavelismo, que indica astúcia, conduta pérfida.
• O facto é que Maquiavel professou uma teoria utilitária e absolutamente alheia aos valores morais, distanciando-se dos padrões
medievais, que subordinavam as construções políticas ao primado da Ética e ao reconhecimento de uma ideia universal de
Direito.
• Ao afastar a arte da administração pública da Moral, a doutrina de Maquiavel não comportava a ideia do Direito Natural, que é
sede de valores morais e das sementes do justo. O engajamento de Maquiavel ao espírito renascentista se deu mais por uma
ruptura com a tradicional cultura medieval do que por vinculação às ideias greco-romanas do passado, pois é sabido que não se
inspirou naquelas fontes.
BODIN.
• Ao desenvolver as suas concepções sobre o Estado, Jean Bodin (1530-1596) esteve com a sua atenção voltada para a atualidade
da França, sua pátria, que passava por uma crise de poder, decorrente de divisões religiosas.
• Diferentemente de Maquiavel, que preconizou o fortalecimento do poder pela ação política de um déspota, Bodin ou Bodino, que
estudara leis em Tolouse, baseou-se no Direito.
• Em sua obra De la République, escrita em seis volumes, destacam-se as reflexões sobre a soberania, concebida esta como “la
puissance absolue et perpétuelle d’une République”.
• Bodin atribuiu um poder indivisível à soberania, rebelando-se contra o fracionamento feudal.
• Em suas considerações sobre o Direito chamou a atenção para a necessidade de se adaptarem as leis às condições naturais do meio
ambiente, com ênfase à influência do clima sobre as instituições jurídicas, ponto em que se antecipou a Montesquieu que, mais tarde, em
De l’Esprit des Lois (1748), desenvolveu amplamente sobre a matéria.

• Hugo Grócio.
• O humanista e jurisconsulto holandês, Hugo Grócio (1583-1645), autor de De Jure Belli et Pacis (1625), alcançou projeção por seu
pensamento jusnaturalista e estudos sobre o Direito das Gentes. Durante largo período histórico foi cognominado o pai do Direito Natural
e do Direito Internacional.
• Enquanto na Idade Média o Direito ficou subordinado à Teologia, com Hugo Grócio o fenômeno jurídico obteve outra visão. Apoiado em
princípios racionais, o Direito não seria uma revelação divina, mas “conjunto de normas ditadas pela razão e sugeridas pelo appetitus
societatis”.
• De modo veemente declarou que o Direito Natural independente da vontade divina: “O Direito Natural existiria mesmo que Deus não
existisse, ou ainda que Deus não cuidasse das coisas humanas.” O Direito Natural seria acessível ao conhecimento mediante dois caminhos:
com o método a priori, ao verificar-se que a máxima se encontra de acordo com a natureza racional ou social; pelo a posteriori, com a
constatação de que os povos civilizados adotam idêntico critério ou solução de justiça.
• A natureza humana, por sua dimensão social, seria o fundamento do Direito Natural. Foi a partir desta visão
racionalista que se originou a chamada Escola Clássica do Direito Natural, da qual Hugo Grócio foi o seu primeiro
corifeu e que se estendeu até o século XVIII, quando atingiu o apogeu com a filosofia de Rousseau.
• Considerando que o Direito visa a garantir as condições de sociabilidade, Hugo Grócio esposou a ideia de que o
Estado se origina do contrato social.
• Defendeu o princípio da inviolabilidade dos contratos – pacta sunt servanda –, sem o qual a sociedade não
subsistiria, pois só cumprindo os acordos se poderia determinar a ordem jurídica e elaborar o conjunto dos direitos
civis.
A ESCOLA CLÁSSICA DO DIREITO NATURAL
• A Escola Clássica promoveu a laicização do Direito Natural, ao indicar a natureza humana como a sua fonte e a
pontar a razão como via cognoscitiva. Cometeu, porém, alguns excessos, notadamente ao pretender a criação de
verdadeiros códigos de Direito Natural, onde se alcançavam pormenores de regulamentação da vida social, em
vez de limitar-se à análise dos princípios norteadores desse Direito.
• Para a Escola Clássica, o Direito Natural seria eterno, imutável e universal, não somente por seus princípios, mas
ainda em sua aplicação. Além de Hugo Grócio, destacaram-se, na Escola, os filósofos Hobbes, Spinoza, Locke,
Pufendorf, Tomásio, Rousseau.
• Thomas Hobbes: (1588-1679) negava ao homem a condição de animal social. Em sua doutrina política e
• antropológica, fundamentalmente exposta em Leviatã (1651), o filósofo inglês partiu da crença no chamado
status naturae, durante o qual os homens teriam vivido em constante medo diante das ameaças de guerra.
• Hobbes retratou o homem como ser naturalmente egoísta e agressivo, devotado apenas aos seus interesses e
insensível à sorte de seus semelhantes. A criação do Estado teria reprimido a sua tendência de ser o lobo do
próprio homem (homo homini lupus) e evitado a guerra total (bellum omnium contra omnes).
• A fim de superar as adversidades do estado de natureza, os homens teriam celebrado o contrato social e, em
consequência, constituído a sociedade, o Estado e o Direito. Teriam renunciado ao seu primitivo “jus omnium in
• omnia”, para alcançarem a paz, a liberdade e o verdadeiro Direito. Para que esses alvos fossem atingidos, pensava
• Hobbes que o Estado – Leviatã ou Deus Mortal – deveria ser suficientemente forte.
• O Filósofo inglês distinguiu a lei civil da lei de natureza. A primeira, emanada do Estado, não pode ser
• contrária à razão, entendida esta como a luz que levou o soberano a elaborar a lei.
• As leis da natureza “consistem na equidade, na justiça, na gratidão e outras virtudes morais destas dependentes,
na condição de simples natureza, não são propriamente leis, mas qualidades que predispõem os homens para a
paz e a obediência”.
• Locke. A filosofia do inglês John Locke (1632-1704) foi inspirada, em parte, nos fatos históricos de sua época,
pois viveu em pleno século XVII, quando se registrou a Revolução Inglesa (1688).
• Como adepto da Escola Clássica do Direito Natural, sustentou as teses do estado de natureza e do contrato
social.
• Tomásio.
• Considerado por muitos como o fundador da moderna ciência do Direito, Cristiano Tomásio (1665-1728) teve o mérito de distinguir os
campos do Direito, Moral e Decoro, estudados, respectivamente, pela Jurisprudência, Ética e Política.
• Cada qual indicaria critério de agir próprio, mas que convergiam no objetivo de atender à vida social.
• Enquanto o Direito se fundaria no princípio do justum, a Moral, no honestum e a Política, no decorum. A máxima do honestum seria
“Quod vis ut alii sibi fariant, tute tibi facies” (Faça a ti o que quiseres que os demais façam a si mesmos); o princípio fundamental do
decorum seria “Quod vis ut alii tibi fariant, tu ipsis facies” (Faça aos demais o que quiseres que eles façam a ti); o grande preceito do
justum seria “Quod tibi non vis fieri, alteri ne feceris” (Não faça aos demais aquilo que não queres que eles façam a ti).
• Distinção de grande alcance, talvez a maior contribuição à Filosofia do Direito, foi a que estabeleceu no plano teórico entre o Direito e a
Moral, em Fundamenta Iuris et Gentium (1705).
• O forum externum, campo das condutas objetivas e sociais do homem, seria a sede do Direito. Assim, para que o comportamento humano
fosse atingido pela regra jurídica, indispensável que houvesse manifestação exterior da pessoa ou que sua omissão afetasse algum interesse
relevante de outrem.
• O mundo da Moral seria o do forum internum, plano da consciência, não alcançável pelas leis. Consequentemente, ninguém poderia ser
julgado ou punido por adotar alguma ideologia ou professar uma religião. A área do pensamento seria reservada exclusivamente à Moral.
• Rousseau. As principais teses do jusnaturalismo foram desenvolvidas, notavelmente, pelo genebrino Jean Jacques Rousseau (1712-1778)
e alcançaram ampla divulgação e prestígio em sua época, indo influenciar os estatutos ideológicos da Revolução Francesa,
especialmente por sua dimensão política.
• Em seu livro expõe acerca do estado de natureza, época primitiva em que os homens seriam felizes, desfrutando de liberdade e de
igualdade. Diferentemente de Hobbes, para quem o homem é mau por natureza, admitiu o contrário, pois tudo que provém da
natureza é bom.
• Sem comando político, os seres humanos viviam no livre exercício de seus direitos naturais, em uma Idade de Ouro, onde não havia
propriedade privada, nem corrupção. A desarmonia teria surgido quando alguns homens, prevalecendo de sua força, impuseram o
domínio. A sociedade civil teria sido fundada pelo indivíduo que, cercando um terreno, declarou: “Isto me pertence!” Se naquele
momento alguém houvesse gritado: “Guardai-vos de escutar este impostor!”, teria poupado, à humanidade, crimes, guerras,
assassinatos.
• Em O Contrato Social (1762), obra complementar ao Discours, o filósofo analisa a formação do Estado.
• Visando a recuperar o seu bem-estar primitivo, os homens teriam transferido seus direitos naturais ao Estado em troca de direitos
civis. Estes seriam os próprios direitos naturais, já então sob a tutela do Estado.
O DIREITO RACIONAL DE KANT
• O jusnaturalismo alcançou o seu apogeu no século XVIII, ao influenciar nas declarações de direitos dos
Estados Unidos e França, além de se projetar nas codificações dos direitos austríaco, prussiano e francês.
• No âmbito do Direito, Kant situou a liberdade como o valor máximo a ser alcançado: “O Direito é o
conjunto de condições segundo as quais o arbítrio de cada um pode coexistir com o arbítrio dos demais, de
harmonia com uma lei universal de liberdade.”
• Sob a influência de Cristiano Tomásio, distinguiu a Moral do Direito, entendendo que a primeira se ocuparia
com o motivo da ação, que deveria identificar-se com o amor ao bem, enquanto para o segundo o
relevante seria o plano exterior das ações.

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