Mia Joao Correia Dissertação

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Universidades Lusíada

Correia, João Miguel Aldeias, 1988-


Arquitetura art nouveau : Bruxelas e Victor
Horta
http://hdl.handle.net/11067/5828

Metadados
Data de Publicação 2020
Resumo O Art Nouveau é um movimento do final do séc. XIX, que rompeu com
os estilos académicos, classicistas e revivalistas da sua época, criando
uma linguagem própria, denotando-se pela sua variedade, riqueza artística
e arquitetónica É importante, no entanto, compreender a sua origem, a
rápida expansão que teve através de toda a Europa mas sobretudo na
cidade de Bruxelas, que contou com uma ampla variedade de expressões
dos diferentes arquitetos, e perceber a razão do seu declínio enquanto
movimento ...
Art Nouveau is a movement from the end of the 19th century, which
challenged the academic, classicist and revivalist styles of its time,
and thus created its own language and variety, both in artistic and
architectural terms. It is important, however, to understand its origin and
the fast expansion throughout Europe – especially in the city of Brussels
– and as such possessed a wide variety of expressions from different
architects. Finally, it is important to understand the reason for its declin...
Palavras Chave Arte Nova (Arquitectura) - Bélgica - Bruxelas, Hôtel van Eetvelde
(Bruxelas, Bélgica), Hôtel Tassel (Bruxelas, Bélgica), Horta, Victor,
Barão, 1861-1947 - Crítica e interpretação, Horta, Victor, Barão,
1861-1947 - Projectos e plantas, Musée Horta (Bruxelas, Bélgica),
Bruxelas (Bélgica) - Edifícios, estruturas, etc.
Tipo masterThesis
Revisão de Pares Não
Coleções [ULL-FAA] Dissertações

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http://repositorio.ulusiada.pt
UNIVERSIDADE LUSÍADA
FACULDADE DE ARQUITETURA E ARTES
Mestrado Integrado em Arquitetura

Arquitetura art nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Realizado por:
João Miguel Aldeias Correia

Orientado por:
Prof. Doutor Arqt. Rui Manuel Reis Alves

Constituição do Júri:

Presidente: Prof. Doutor Horácio Manuel Pereira Bonifácio


Orientador: Prof. Doutor Arqt. Rui Manuel Reis Alves
Arguente: Prof.ª Doutora Arqt.ª Helena Cristina Caeiro Botelho

Dissertação aprovada em: 1 de março de 2021

Lisboa

2020
U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A

F ACULDADE DE A RQUITETURA E A RTES

Mestrado Integrado em Arquitetura

Arquitetura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

João Miguel Aldeias Correia

Lisboa

setembro 2020
U N I V E R S I D A D E L U S Í A D A

F ACULDADE DE A RQUITETURA E A RTES

Mestrado Integrado em Arquitetura

Arquitetura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

João Miguel Aldeias Correia

Lisboa

setembro 2020
João Miguel Aldeias Correia

Arquitetura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitetura e


Artes da Universidade Lusíada para a obtenção do grau
de Mestre em Arquitetura.

Orientador: Prof. Doutor Arqt. Rui Manuel Reis Alves

Lisboa

setembro 2020
Ficha Técnica
Autor João Miguel Aldeias Correia
Orientador Prof. Doutor Arqt. Rui Manuel Reis Alves
Título Arquitetura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta
Local Lisboa
Ano 2020

Mediateca da Universidade Lusíada - Catalogação na Publicação

CORREIA, João Miguel Aldeias, 1988-

Arquitetura Art Nouveau : Bruxelas e Victor Horta / João Miguel Aldeias Correia; orientado por Rui
Manuel Reis Alves. - Lisboa : [s.n.], 2020. - Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Artes da Universidade Lusíada.

I - ALVES, Rui Manuel Reis, 1964-

LCSH
1. Arte Nova (Arquitetura) - Bélgica - Bruxelas
2. Hôtel van Eetvelde (Bruxelas, Bélgica)
3. Hôtel Tassel (Bruxelas, Bélgica)
4. Musée Horta (Bruxelas, Bélgica)
5. Horta, Victor, Barão, 1861-1947 - Crítica e interpretação
6. Horta, Victor, Barão, 1861-1947 - Projetos e plantas
7. Bruxelas (Bélgica) - Edifícios, estruturas, etc.
8. Universidade Lusíada. Faculdade de Arquitetura e Artes - Teses
9. Teses - Portugal - Lisboa

1. Art Nouveau (Architecture) - Belgium - Brussels


2. Hôtel van Eetvelde (Brussels, Belgium)
3. Hôtel Tassel (Brussels, Belgium)
4. Musée Horta (Brussels, Belgium)
5. Horta, Victor, Baron, 1861-1947 - Criticism and interpretation
6. Horta, Victor, Baron, 1861-1947 - Designs and plans
7. Brussels (Belgium) - Buildings, structures, etc.
8. Universidade Lusíada. Faculdade de Arquitetura e Artes - Dissertations
9. Dissertations, Academic - Portugal - Lisbon

LCC
1. NA1173.H67 C67 2020
“Acho que a arquitetura tem que criar
espanto, criar surpresa, é fazer uma obra de
arte. E a obra de arte se caracteriza quando
ela provoca emoção e surpresa.” (Oscar
Niemayer, 2007)
AGRADECIMENTOS

Eu endereço os meus agradecimentos a todos que me ajudaram na realização desta


dissertação.

Em primeiro lugar, tenho a agradecer ao Professor Doutor Arq. Rui Reis Alves,
orientador desta dissertação, pela sua ajuda, sua disponibilidade, encorajamentos,
assim como os seus preciosos e sábios conselhos durante a realização desta
dissertação.

Agradeço também Françoise Aubry, antiga diretora do Musée Horta, Barbara Van der
Wee, arquiteta e restauradora, Francis Metzger, arquiteto e professor, por terem
disponibilizado o seu tempo para responderem às minhas questões.

Agradeço particularmente ao senhor Pierre-Hugo Schorine, por me ter disponibilizado


gentilmente a sua enorme coleção privada de livros sobre o Art Nouveau, assim como
ao Musée Horta, por me ter aberto as portas da Maison Horta e do seu centro de
pesquisa e arquivos.

Para terminar, endereço os meus mais sinceros agradecimentos à minha família, em


particular à minha mãe, que me encorajou, apoiou e que nunca deixou de acreditar em
mim ao longo de toda a minha formação académica.

A todos que me ajudaram de um modo ou de outro a escrever esta dissertação, o meu


muito obrigado.
"Quand le goût, Ia volonté, l'énergie, Ia force
physique y sont, tout y est pour réussir, et
réussir par le travail personnel, c'est
s'entourer de joie en se donnant comme
obligation de toujours avoir à apprendre."
(Victor Horta apud Dulière, 1985, p. 8.)

(Quando o gosto, a vontade, a energia, a


força física estão presentes, temos tudo para
ter sucesso e ter sucesso através do próprio
trabalho, é se envolver de alegria, tendo
como obrigação de sempre ter a aprender.)
(tradução nossa)
APRESENTAÇÃO

Arquitetura Art Nouveau:


Bruxelas e Victor Horta

João Miguel Aldeias Correia

O Art Nouveau é um movimento do final do séc. XIX, que rompeu com os estilos
académicos, classicistas e revivalistas da sua época, criando uma linguagem própria,
denotando-se pela sua variedade, riqueza artística e arquitetónica É importante, no
entanto, compreender a sua origem, a rápida expansão que teve através de toda a
Europa mas sobretudo na cidade de Bruxelas, que contou com uma ampla variedade
de expressões dos diferentes arquitetos, e perceber a razão do seu declínio enquanto
movimento artístico.

Estudar a obra do arquiteto Victor Horta torna-se essencial para entender a sua
perceção do espaço, a maneira harmoniosa e sábia como aplica os diferentes materiais,
texturas e cores na arquitetura, assim como a concepção dos edifícios que respondem
a programas específicos dos seus proprietários. Os edifícios Art Nouveau são
cenográficos e caraterizam-se por uma sucessão e fluidez de espaços abertos em que
arquitetura, estrutura e decoração estão intrinsecamente ligados criando assim obras
de arte totais, Gesamtkunstwerk. Através do estudo de diferentes obras é possível
compreender até que ponto se pode inovar em arquitetura, tendo em conta o contexto
e a época em que foi concebida, mas sobretudo o facto de ser uma arquitetura capaz
de despertar emoções.

Contudo, foi um movimento historicamente curto, tendo tido início em 1893 como
movimento internacional, mas declinando rapidamente com a I Guerra Mundial e
desaparacendo depois desta, deixando, no entanto, várias joias de arquitetura de
grande valor patrimonial.

Palavras-chave: Art Nouveau, Victor Horta, origens da arquitetura modernista,


património arquitetónico.
PRESENTATION

Art Nouveau Architecture:


Brussels and Victor Horta

João Miguel Aldeias Correia

Art Nouveau is a movement from the end of the 19th century, which challenged the
academic, classicist and revivalist styles of its time, and thus created its own language
and variety, both in artistic and architectural terms. It is important, however, to
understand its origin and the fast expansion throughout Europe – especially in the city of
Brussels – and as such possessed a wide variety of expressions from different architects.
Finally, it is important to understand the reason for its decline as an artistic movement
as well.

Studying the work of the architect Victor Horta becomes essential to comprehend his
perception of space, the harmonious and wise way in which he applies different
materials, textures and colors in architecture, as well as the design of buildings that
respond to specific requests of their owners. Art Nouveau buildings are scenographic
and characterized by a succession and fluidity of open spaces in which architecture,
structure and decoration are intrinsically linked, thus creating total works of art so-called
Gesamtkunstwerk. Through the study of different works it is possible to realize the extent
to which one can innovate in architecture – taking into account the context and the time
in which it was conceived –, but above all the fact that it is an architecture capable of
arousing emotions.

It was, however, a historically short movement. It started in 1893 as an international


movement, but disappeared as result of the First World War, leaving, however, several
architectural gems of great patrimonial value.

Keywords: Art Nouveau, Victor Horta, origins of modernist architecture, architectural


heritage.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1 – Edifício da Secessão Vienense, arq. Joseph Maria Olbrich, Viena, 1897.
(Ilustração nossa, 2017). ............................................................................................ 33
Ilustração 2 - Platanen Palace, Der Schlaf - art. Bernhard Hoetger, Darmstadt.
([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 8) ............................................................... 35
Ilustração 3 – Torre do casamento, mosaico dos amantes, art. Friedrich Wilhelm
Kleukens, Darmstadt. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 11). .......................... 36
Ilustração 4 - Casa Majorelle, arq. Henri Sauvage, Nancy, 1902. (Ilustração nossa,
2016). ......................................................................................................................... 37
Ilustração 5 - Casa Vicens, arq. Antoni Gaudí, Barcelona, 1883. (Ilustração nossa,
2014). ......................................................................................................................... 37
Ilustração 6 – Nietzche-Archiv – arq. Henry Van de Velde, Weimar, 1911. ([Adaptado a
partir de:] Husson, 2011, p. 12). .................................................................................. 38
Ilustração 7 – Hotel Paul Mezzara – arq. Hector Guimard, Paris, 1911. (Ilustração
nossa, 2016). .............................................................................................................. 40
Ilustração 8 – Museu de Artes Decorativas, Budapeste, 1900-1906. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 41
Ilustração 9 - Dragão de Finca Güell, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1884-87. (Ilustração
nossa, 2014). .............................................................................................................. 42
Ilustração 10 - Salamandra do Parque Güell, arq. Antoní Gaudí, Barcelona. (Ilustração
nossa, 2014). .............................................................................................................. 42
Ilustração 11 – Casa Mackintosh, arq. Charles Rennie Mackintosh, Glasgow.
([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 114)............................................................ 43
Ilustração 12 – The Princess from the Land of Porcelain, pendurada sobre a lareira na
Peacock Room, art. James McNeil Whistler, 1876-1877. ([Adaptado a partir de:] Freer
Gallery of Art, 2019). ................................................................................................... 44
Ilustração 13 – Le Japon artistique. ([Adaptado a partir de :] Siegfried Bing, 1888). .. 45
Ilustração 14 – Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893 (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 46
Ilustração 15 – Maison Saint-Cyr, arq. Gustave Strauven, Bruxelas, 1900 (Ilustração
nossa, 2018). .............................................................................................................. 46
Ilustração 16 – Hôtel Hannon, arq. Jules Brunfaut, Bruxelas, 1903. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 47
Ilustração 17 – Mercado Municipal, arqts. Osvald Polívka e Antonin Balŝanek, arts
Ladislav Saloun e Karel Novák, Praga, 1912. (Ilustração nossa, 2019). ..................... 48
Ilustração 18 – Edifício da Secessão Vienense, arq. Joseph Maria Olbrich, Viena, 1897.
(Ilustração nossa, 2017). ............................................................................................ 49
Ilustração 19 – Hôtel Van Eetveld, arq Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir
de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 199). ........................................................................ 50
Ilustração 20 – Estufas Reais de Laeken, arq. Alphonse Balat, Bruxelas, 1873.
(Ilustração nossa, 2015). ............................................................................................ 52
Ilustração 21 – Villa Bloemenwerf, arq. Henry Van de Velde, Uccle, 1895. (Ilustração
nossa, 2018). .............................................................................................................. 53
Ilustração 22 - Hôtel Otlet, arq. Octave Van Rijsselberghe, art. Henry Van de Velde,
Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa, 2018). ................................................................... 54
Ilustração 23 - Fábrica Fagus, arq. Eduard Werner, fachadas desenhadas pelos arqts.
Walter Gropius e Adolf Meyer, 1911. (Ilustração nossa, 2019). .................................. 55
Ilustração 24 – Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................... 57
Ilustração 25 – Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa,
2019). ......................................................................................................................... 58
Ilustração 26 – Muséé des Beaux Arts, arq. Victor Horta, Tournai, 1911. (Ilustração
nossa, 2017). .............................................................................................................. 59
Ilustração 27 - Planta do projeto definitivo do Muséé des Beaux Arts, arq. Victor Horta,
Tournai, 1911. ([Adaptado a partir de:] Dulière, 1985, p. 186). .................................... 60
Ilustração 28 - Hôtel Aubecq, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1899. ([Adaptado a partir de:]
Goslar, 2012, p. 254). ................................................................................................. 61
Ilustração 29 - Maison Hankar, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 62
Ilustração 30 - Maison Cortvriendt, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1900. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 62
Ilustração 31 - Maison Niguett, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1896. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 63
Ilustração 32 - Hôtel Ciamberlani, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1897. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 63
Ilustração 33 - Maison Cauchie, arq. Paul Cauchie, Bruxelas, 1905 (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 64
Ilustração 34 - Detalhe da fachada da Maison Cauchie, arq. Paul Cauchie, Bruxelas,
1905. (Ilustração nossa, 2018). ................................................................................... 64
Ilustração 35 - Interior da Maison Cauchie arq. Paul Cauchie, Bruxelas,1905.
([Adaptado a partir de:] Aubry 2006, p. 201). .............................................................. 65
Ilustração 36 - Palais Stoclet, arq. Josef Hoffmann, Bruxelas, 1906. (Ilustração nossa,
2018). ......................................................................................................................... 65
Ilustração 37 - Detalhe da cobertura, Palais Stoclet, arq. Josef Hoffmann, Bruxelas,
1906. (Ilustração nossa, 2018). ................................................................................... 66
Ilustração 38 - Maison Saint-Cyr, arq. Gustave Strauven, Bruxelas, 1900. (Ilustração
nossa, 2018). .............................................................................................................. 67
Ilustração 39 - Maison Gustave Strauven, arq. Gustave Strauven, Bruxelas, 1902.
(Ilustração nossa, 2018). ............................................................................................ 67
Ilustração 40 - Maison 1904, Avenue Charles de Gaulle, arq. Ernest Blérot, 1904,
Bruxelas. (Ilustração nossa, 2018). ............................................................................. 68
Ilustração 41 - Maison Ernest Blérot, arq. Ernest Blérot, Bruxelas, 1902. (Ilustração
nossa, 2018). .............................................................................................................. 68
Ilustração 42 - Localização temporal das principais obras de Victor Horta em Bruxelas.
(Ilustração nossa, 2020). ............................................................................................ 69
Ilustração 43 - Localização espacial da expansão do Art Nouveau na Europa.
(Ilustração nossa, 2020). ............................................................................................ 70
Ilustração 44 - Detalhe do Castel Béranger, arq. Hector Guimard, Paris, 1894-98.
(Ilustração nossa, 2016). ............................................................................................ 71
Ilustração 45 - Detalhe do Castel Béranger, arq. Hector Guimard, Paris, 1894-98.
(Ilustração nossa, 2016). ............................................................................................ 71
Ilustração 46 - Entrada da Estação de Metro Abbesses, arq. Hector Guimard, Paris,
1912. (Ilustração nossa, 2016). ................................................................................... 72
Ilustração 47 - Detalhe da entrada da Estação de Metro Palais Royal / Musée du Louvre,
arq. Hector Guimard, Paris, 1900. (Ilustração nossa, 2016). ....................................... 72
Ilustração 48 - Hotel Mezzara, arq. Hector Guimard, Paris, 1910-11. (Ilustração nossa,
2016). ......................................................................................................................... 73
Ilustração 49 - Avenue Rapp, arq. Jules Lavirotte, Paris, 1901. (Ilustração nossa, 2016).
................................................................................................................................... 73
Ilustração 50 - Glasgow School of Art, arq. Charles Rennie Mackintosh, Glasgow.
([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 112)............................................................ 74
Ilustração 51 - Mackintosh House, arq. Charles Rennie Mackintosh, Glasgow.
([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 115)............................................................ 74
Ilustração 52 - Glasgow School of Art, arq. Charles Rennie Mackintosh, Glasgow.
([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 113)............................................................ 75
Ilustração 53 - Casa da Secessão Vienense, arq. Joseph Maria Olbrich, Viena, 1897.
(Ilustração nossa, 2017). ............................................................................................ 76
Ilustração 54 - Casa Majolika, arq. Otto Wagner, art. Koloman Moser, Viena, 1898.
(Ilustração nossa, 2017). ............................................................................................ 77
Ilustração 55 - Casa Majolika, arq. Otto Wagner, art. Koloman Moser, Veina, 1898.
(Ilustração nossa, 2017). ............................................................................................ 77
Ilustração 56 - Estacão de metro Karlsplatz, arq Otto Wagner, Viena, ilustração nossa,
1899. (Ilustração nossa, 2017). ................................................................................... 78
Ilustração 57 - Capela St. Leopold-am Steinhof, art.Koloman Moser, Viena, 1907.
(Ilustração nossa, 2017). ............................................................................................ 79
Ilustração 58 - Vitral da capela St. Leopold-am Steinhof, art. Koloman Moser, Viena,
1907. (Ilustração nossa, 2017). ................................................................................... 79
Ilustração 59 - Hoher Markt 10, art Franz von Matsch, Viena, 1911-17. (Ilustração
nossa, 2017). .............................................................................................................. 80
Ilustração 60 - Detalhe do portal da natividade na Sagrada Família, arq Antoni Gaudí,
Barcelona, 1883-inacabada até hoje. (Ilustração nossa, 2014). .................................. 81
Ilustração 61 - Claraboia central do palácio Güell, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1886.
(Ilustração nossa, 2014). ............................................................................................ 81
Ilustração 62 - Sagrada Família, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1883-inacabada até
hoje. (Ilustração nossa, 2014). .................................................................................... 82
Ilustração 63 - Interior da Sagrada Família, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1883-
inacabada até hoje. (Ilustração nossa, 2014). ............................................................. 82
Ilustração 64 - Casa Milá, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1905-07. (Ilustração nossa,
2014). ......................................................................................................................... 83
Ilustração 65 - Casa Batlló, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1877. (Ilustração nossa,
2014). ......................................................................................................................... 83
Ilustração 66 - Torre do Casamento e Edifício das de Exposições, arq. Joseph Maria
Olbrich, Instituto Mathildenhöhe, Darmstad, 1905-1908. ([Adaptado a partir de:]
Gracmon, 2007, p. 80). ............................................................................................... 85
Ilustração 67 - Relógio de Sol da Torre do Casamento (Hochzeitsturm), arq. Joseph
Maria Olbrich, Instituto Mathildenhöhe, Darmstad, 1905-1908. ([Adaptado a partir de:]
Gracmon, 2007, p. 80). ............................................................................................... 86
Ilustração 68 - Entrada da Casa de Ernst-Ludwig, arq. Joseph Maria Olbrich, Instituto
Mathildenhöhe, Darmstad, 1901. ([Adaptado a partir de:] Gracmon, 2007, p. 80). ...... 86
Ilustração 69 - Casa do arquiteto Peter Behrens, arq. Peter Behrens, Instituto
Mathildenhöhe, Darmstad, 1901. ([Adaptado a partir de:] Gracmon, 2007, p. 79) ....... 87
Ilustração 70 - Interior do Museu Künstlerkolonie, Instituto Mathildenhöhe, arq. Joseph
Maria Olbrich, Darmstad, 1905-1908. ([Adaptado a partir de:] Gracmon, 2007, p. 81).87
Ilustração 71 - Painél em alro relevo com Torre do Casamento em plano de fundo, arq.
Joseph Maria Olbrich, Instituto Mathildenhöhe, Darmstad, 1914. ([Adaptado a partir de:]
Gracmon, 2007, p. 81). ............................................................................................... 87
Ilustração 72 - Interior da estação de comboios, arq. Josef Fanta, Praga, 1909.
(Ilustração nossa, 2019). ............................................................................................ 88
Ilustração 73 - Câmara Municipal, art. Ladislav Saloun e Karel Novák, Praga, 1906-
1911. (Ilustração nossa, 2019). ................................................................................... 89
Ilustração 74 - Hotel Central, arq. Friedrich Ohmann, Praga, 1898-1900. (Ilustração
nossa, 2019). .............................................................................................................. 90
Ilustração 75 - Hlahol, arq. Josef Fanta, Praga, 1903-1906. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................... 91
Ilustração 76 - Retrato de Victor Horta. ([Adaptado a partir de:] Schuiten,1996, p. 6).93
Ilustração 77 - Pavilhão das Paixões Humanas, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1889-1905.
(Ilustração nossa, 2019). ............................................................................................ 95
Ilustração 78 - Robie House, arq. Frank Lloys Wright, Chicago, 1908. ([Adaptado a partir
de:] Tim Long, Frank Lloyd Wright Trust, 2019). ......................................................... 97
Ilustração 79 - Musée des Beaux Arts, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1919-1928.
(Ilustração nossa 2018). ............................................................................................. 98
Ilustração 80 - Projeto definitivo de 1936, Gare Central, arq. Victor Horta, Bruxelas,
1937-1952. ([Adaptado a partir de:] Dulière, 1985, p. 276).......................................... 98
Ilustração 81 - Entrada Gare Central, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1937-1952. (Ilustração
nossa, 2018). .............................................................................................................. 99
Ilustração 82 - Detalhe da fachada, Gare Central, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1937-
1952. (Ilustração nossa, 2018). ................................................................................... 99
Ilustração 83 - Maison du Peuple, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir
de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 169). ...................................................................... 101
Ilustração 84 - L’Innovation, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1901. ([Adaptado a partir de:]
Borsi e Portoghesi, 1990, p. 277). ............................................................................. 103
Ilustração 85 - Magasins Wolfers, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1909. ([Adaptado a partir
de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 306). ...................................................................... 104
Ilustração 86 - Magasins Wolfers, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1909. (Ilustração nossa,
2019). ....................................................................................................................... 105
Ilustração 87 - Maison Roger, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1901. ([Adaptado a partir de:]
Huib Hoste, 1921) ..................................................................................................... 106
Ilustração 88 - Maison Roger, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1901. (Ilustração nossa,
2019). ....................................................................................................................... 106
Ilustração 89 - Hôpital Brugmann, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1919-1923. (Ilustração
nossa, 2019). ............................................................................................................ 108
Ilustração 90 - Reconstituição no armazém da rue de Navez, em Bruxelas, da fachada
do Hôtel Aubecq apresentada ao público na ocasião do 150º de Victor Horta, arq. Victor
Horta, Bruxelas, 1899. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 265). ...................... 109
Ilustração 91 - Entrada Hôtel Aubecq, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1899. ([Adaptado a
partir de:] Goslar, 2012, p. 257). ............................................................................... 110
Ilustração 92 - Grande auditório, Maison du Peuple, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895.
([Adaptado a partir de:] Route européenne de l'Art nouveau, 2007, p. 16). ............... 111
Ilustração 93 - Detalhe da escada da entrada principal, Maison du Peuple, arq. Victor
Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 234-235). ............... 112
Ilustração 94 - Detalhe da porta a coches, Maison du Peuple, arq. Victor Horta,
Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 234-235)........................... 112
Ilustração 95 - Estrutura da sala de café da Maison du Peuple, integrada no Grand Café
Horta & Art Nouveau zaal, Antuérpia, 2000. (Ilustração nossa, 2019). ...................... 113
Ilustração 96 - Hôtel Solvay, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1894. (Ilustração nossa 2019).
................................................................................................................................. 114
Ilustração 97 - Os edifícios de Victor Horta em Bruxelas. (Ilustração nossa, 2020). 115
Ilustração 98 - Palais Stoclet, arq. Josef Hoffmann, Bruxelas, 1905. (Ilustração nossa,
2018). ....................................................................................................................... 118
Ilustração 99 - Detalhe da fachada, Hôtel Winssinger, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1894-
1897. (Ilustração nossa, 2019). ................................................................................. 124
Ilustração 100 - Detalhe da bow-window, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas,
1893. (Ilustração nossa 2019)................................................................................... 125
Ilustração 101 - Detalhe da fachada, Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893.
(Ilustração nossa 2018). ........................................................................................... 126
Ilustração 102 - Detalhe do coroamento, Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas,
1893. (Ilustração nossa 2018)................................................................................... 127
Ilustração 103 - Porta interior, Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898.
(Ilustração nossa 2019). ........................................................................................... 128
Ilustração 104 - Lareira e móvel louceiro, Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas,
1898. (Ilustração nossa 2019)................................................................................... 128
Ilustração 105 - Detalhe da escada do grande salão, Maison Horta, arq. Victor Horta,
Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019). .................................................................. 129
Ilustração 106 - Detalhe do corrimão, Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas,
1893. (Ilustração nossa 2019)................................................................................... 130
Ilustração 107 - Detalhe da cobertura do jardim de inverno, Hôtel Ciamberlani, arq. Paul
Hankar, Bruxelas,1897. (Ilustração nossa 2019)....................................................... 130
Ilustração 108 - Detalhe da fachada, Maison Saint-Cyr, arq. Gustave Stauven, Bruxelas,
1900. (Ilustração nossa 2018)................................................................................... 131
Ilustração 109 - Detalhe da cobertura de entrada, Jardins d’enfants, arq. Victor Horta,
Bruxelas, 1897. (Ilustração nossa 2018). .................................................................. 132
Ilustração 110 - Detalhe do interior, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893.
(Ilustração nossa 2019). ........................................................................................... 133
Ilustração 111 - Detalhe da bow-window, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas,
1893. (Ilustração nossa 2019)................................................................................... 134
Ilustração 112 - Detalhe da fachada, Hôtel Ciamberlani, arq. Paul Hankar,
Bruxelas,1897. (Ilustração nossa 2019). ................................................................... 136
Ilustração 113 - Detalhe da fachada, Maison Cortvriendt, arq. Paul Hankar,
Bruxelas,1900. (Ilustração nossa 2019). ................................................................... 137
Ilustração 114 - Detalhe da fachada, Maison Cauchie arq. Paul Cauchie, Bruxelas,1905.
(Ilustração nossa 2019). ........................................................................................... 138
Ilustração 115 - Maison 1900, rue Faider, arq. Albert Roosenboom, Bruxelas.
(Ilustração nossa 2019). ........................................................................................... 139
Ilustração 116 - Detalhe da cobertura, Instituut van de Ursulinen, art. Raphael Evrald,
Mechelen, 1900. (Ilustração nossa, 2018). ............................................................... 141
Ilustração 117 - Detalhe da cobertura do jardim de inverno, Hôtel Tassel, arq. Victor
Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019). ....................................................... 142
Ilustração 118 - Detalhe da cobertura das escadas, Maison Horta, arq. Victor Horta,
Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019). .................................................................. 142
Ilustração 119 - Detalhe de vitral porta, Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898.
(Ilustração nossa 2019). ........................................................................................... 144
Ilustração 120 - Detalhe de vitral porta, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893.
(Ilustração nossa 2019). ........................................................................................... 144
Ilustração 121 - Fachada Rue Paul-Émile Janson, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 148
Ilustração 122 - Detalhe da fachada com vitral da sala de fumo e a bow-window do
escritório. (Ilustração nossa, 2019). .......................................................................... 150
Ilustração 123 - Planta do piso térreo e alçado da fachada acompanhado do pedido de
autorização de construção introduzido a 9 de agosto de 1983 à cidade de Bruxelas.
([Adaptado a partir de:] Dulière, 1985, p. 36). ........................................................... 151
Ilustração 124 - Organização da planta através dos eixos. Da esquerda à direita: planta
do piso térreo; planta do piso intermédio; planta do 1º piso. ([Adaptado a partir de:]
Aubry, 2006, p.36). ................................................................................................... 152
Ilustração 125 - Corte longitudinal acompanhado do pedido de autorização de
construção introduzido a 9 de agosto de 1983 à cidade de Bruxelas ([Adaptado a partir
de:] Dulière, 1985, p. 37). ......................................................................................... 152
Ilustração 126 - Corte axonométrico através da planta do piso térreo e do jardim de
inverno indicado pelas linhas a pontilhado ([Adaptado a partir de:] Dernie e Carew-cox,
1995, p. 81). ............................................................................................................. 153
Ilustração 127 - Planta do piso térreo e corte longitudinal dos espaços nobres da
habitação ([Adaptado a partir de:] Dernie e Carew-cox, 1995, p. 89). ....................... 153
Ilustração 128 - Detalhe do pavimento do vestíbulo da entrada. (Ilustração nossa,
2019). ....................................................................................................................... 154
Ilustração 129 - Vista do vestíbulo para o piso nobre. (Ilustração nossa, 2019)....... 155
Ilustração 130 - Vista do vestíbulo para o jardim de inverno. (Ilustração 2019). ...... 156
Ilustração 131 - Visto do vestíbulo para a escada. (Ilustração nossa, 2019). ........... 157
Ilustração 132 - Vista do salão para o vestíbulo e a sala de fumar. ([Adaptado a partir
de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 81). ........................................................................ 158
Ilustração 133 - Desenho dos mosaicos do pavimento no rés do chão. ([Adaptado a
partir de:] Loyer e Delhaize, 1996, p. 106). ............................................................... 158
Ilustração 134 - Vista para a escada nobre. (Ilustração nossa, 2019). ..................... 159
Ilustração 135 - Vista para o vitral da sala de fumar. ([Adaptado a partir de:] Goslar,
2012, p. 96-97). ........................................................................................................ 160
Ilustração 136 - Vista da sala de fumar para o salão. ([Adaptado a partir de:] Borsi e
Portoghesi, 1990, p. 83). ........................................................................................... 160
Ilustração 137 - Vista do patim para o escritório. À esquerda, no nicho, o David de
Godefroid Devrees; à direita, o grande vitral decorado com uma paisagem de montanha.
([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 102). .......................................................... 161
Ilustração 138 - Fotografia antiga do salão, vestíbulo e jardim de inverno. ([Adaptado a
partir de:] Goslar, 2012, p. 104). ............................................................................... 162
Ilustração 139 - Vista geral do conjunto, Hôtel Van Eetevel e extensões, Bruxelas.
(Ilustração nossa, 2019). .......................................................................................... 163
Ilustração 140 - Fachada Avenue Palmerston, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019). . 164
Ilustração 141 - Corte e alçado da fachada. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi,
1990, p. 118). ........................................................................................................... 165
Ilustração 142 - Detalhe do mosaico e do metal da fachada. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 166
Ilustração 143 - Organização da planta através dos eixos. Planta piso térreo e 1º piso.
([Adaptado a partir de:] Aubry, 2006, p. 37). ............................................................. 167
Ilustração 144 - Corte longitudinal. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p.
75). ........................................................................................................................... 168
Ilustração 145 - Corte axonométrico do conjunto, Hôtel Van Eetevel e extensões.
([Adaptado a partir de:] Dernie e Carew-cox, 1995, p. 119). ..................................... 168
Ilustração 146 - Fotografia antiga do hall de entrada dando acesso às escadas com
vista para o hall, Hôtel Van Eetevel e extensões. ([Adaptado a partir de:] Borsi e
Portoghesi, 1990, p. 190). ......................................................................................... 169
Ilustração 147 - Fotografia antiga no primeiro lance de escadas do hall central para a
entrada. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p.242). ............................................. 170
Ilustração 148 - Vista do hall octogonal no 1º piso para a entrada no piso térreo e o
grande salão. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 244). .................................... 171
Ilustração 149 - Vista do salão para o hall octogonal e sala de jantar ao fundo.
([Adaptado a partir de:] Aubry, 2005, p. 20). ............................................................. 173
Ilustração 150 - Vista para as janelas do grande salão. ([Adaptado a partir de:] Borsi e
Portoghesi, 1990, p. 197). ......................................................................................... 174
Ilustração 151 - Fotografias antigas: (1) vista do jardim de inverno num dia de receção;
(2) sala de jantar; (3): vista do grande salão após extensão em 1900-1901. ([Adaptado
a partir de:] Aubry, 2005, p. 65). ............................................................................... 175
Ilustração 152 - Fachada Rue Américane, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019). ....... 177
Ilustração 153 - Detalhe da janela do primeiro piso, nº 23. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 179
Ilustração 154 - Detalhe da estrutura em ferro do piso térreo, nº 23. (Ilustração nossa,
2019). ....................................................................................................................... 179
Ilustração 155 - Detalhe da janela do primeiro piso, nº 23. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 179
Ilustração 156 - Detalhe da janela do segundo piso, nº 23. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 180
Ilustração 157 - Detalhe da estrutura em ferro do piso térreo, nº 25. (Ilustração nossa,
2019). ....................................................................................................................... 180
Ilustração 158 - Detalhe da varanda do primeiro piso, nº 25. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 181
Ilustração 159 - Detalhe da varanda do segundo piso, nº 25. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 181
Ilustração 160 - Corte e alçado da fachada da casa e atelier. ([Adaptado a partir de:]
Goslar, 2012, p. 270). ............................................................................................... 182
Ilustração 161 - Organização da planta através dos eixos. Planta piso térreo e 1º piso.
([Adaptado a partir de:] Aubry, 2006, p. 37). ............................................................. 183
Ilustração 162 - Corte longitudinal. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2005, p. 105). ... 184
Ilustração 163 - Vista do vestíbulo da entrada para escada no piso térreo. (Ilustração
nossa, 2019). ............................................................................................................ 185
Ilustração 164 - Vista da caixa de escada no piso térreo para a cobertura em vidro.
(Ilustração nossa, 2019). .......................................................................................... 186
Ilustração 165 - Vista da sala de jantar no primeiro piso. (Ilustração nossa, 2019). . 187
Ilustração 166 - Vista da segunda sala de jantar com vista para o jardim no primeiro
piso. (Ilustração nossa, 2019). .................................................................................. 188
Ilustração 167 - Detalhe do radiador entre a sala de jantar e o salão de música no
primeiro piso. (Ilustração nossa, 2019). .................................................................... 189
Ilustração 168 - Detalhe do candeeiro. (Ilustração nossa, 2019). ............................ 189
Ilustração 169 - Detalhe do corrimão. (Ilustração nossa, 2019). .............................. 189
Ilustração 170 - Vista do salão de música piso para a sala de jantar no primeiro e escada
de acesso ao segundo piso. (Ilustração nossa, 2019)............................................... 190
Ilustração 171 - Quarto de Horta no segundo piso. (Ilustração nossa, 2019). .......... 191
Ilustração 172 - Sala de estar e camarim no segundo piso. (Ilustração nossa, 2019).
................................................................................................................................. 192
Ilustração 173 - Vitral da claraboia no terceiro piso. (Ilustração nossa, 2019).......... 193
Ilustração 174 - Quarto da filha de Horta no terceiro piso. (Ilustração nossa, 2019).193
Ilustração 175 - Detalhe da abertura de luz nas escadas de serviço no segundo piso.
(Ilustração nossa, 2019). .......................................................................................... 194
Ilustração 176 - Vista geral da cozinha, Bruxelas (Ilustração nossa, 2019). ............ 195
Ilustração 177 - Musée Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898-1901. (Ilustração nossa,
2019). ....................................................................................................................... 196
Ilustração 178 - Hôtel Van Eeteveld, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895-1899. (Ilustração
nossa, 2019). ............................................................................................................ 199
Ilustração 179 - Maison Saint-Cyr, arq Gustave Strauven Bruxelas, 1900-1903.
(Ilustração nossa, 2019). .......................................................................................... 201
Ilustração 180 - Hôtel Max Hallet, arq Victor Horta, Bruxelas, 1901-1906. (Ilustração
nossa, 2019). ............................................................................................................ 203
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E ACRÓNIMOS

ARBA - Academie Royal Beaux-Arts


BANAD - Brussels Art Nouveau & Art Deco
CRMS - Comission Royale des Monuments et Sites
FIGAZ - Fédération de l'Industrie du Gaz
GRACMON - Grup de Recerca en Història de l'Art i del Disseny
Contemporanis
ICOM - International Council of Museums
MRAH - Musées Royaux d’Art et Histoire
PTB - Parti du Travail de Belgique
RANN - Réseau Art Nouveau Network
SBUAM - Société Belge des Urbanistes et Architectes Modernistes
SCA - Société Centrale d’Architecture
ULB - Université Libre de Bruxelles
SUMÁRIO

1. Introdução .............................................................................................................. 29
2. Utilidade do Art Nouveau........................................................................................ 33
2.1. O que é o Art Nouveau .................................................................................... 33
2.2. O Art Nouveau em Bruxelas ............................................................................ 51
2.3. O Art Nouveau na Europa ............................................................................... 69
2.3.1. França – Paris .......................................................................................... 70
2.3.2. Reino Unido – Glasgow ............................................................................ 74
2.3.3. Áustria – Viena ......................................................................................... 76
2.3.4. Espanha – Barcelona ............................................................................... 80
2.3.5. Alemanha – Munique e Darmastadt .......................................................... 84
2.3.6. República Checa – Praga ......................................................................... 88
3. Autenticidade do Art Nouveau ................................................................................ 93
3.1. Victor Horta (Ghent, 06/01/1861; Bruxelas, 08/09/1947) ................................. 93
3.2. Fortúnios e infortúnios da obra de Victor Horta.............................................. 100
3.3. A autenticidade de uma obra patrimonial, uma quimera? .............................. 116
3.4. A materialidade do Art Nouveau .................................................................... 122
3.4.1. Pedra natural .......................................................................................... 123
3.4.2. Madeira .................................................................................................. 127
3.4.3. Ferro ....................................................................................................... 131
3.4.4. Esgrafito ................................................................................................. 135
3.4.5. Vitral ....................................................................................................... 140
4. Atualidade do património Art Nouveau ................................................................. 145
4.1. Casos de estudo ........................................................................................... 145
4.1.1. Hôtel Tassel – Rue Paul-Émile Janson n º 6, Bruxelas – 1893-1896 ...... 147
4.1.2. Hôtel Van Eetvelde – Avenue Palmerston nº 4, Bruxelas – 1895-1899... 162
4.1.3. Maison Horta, hoje Musée Horta – Rue Américane nº 23-25, Bruxelas –
1898-1901 ......................................................................................................... 176
4.2. A problemática da reutilização ....................................................................... 195
4.2.1. Reutilização em museu? – caso do Musée Horta ................................... 195
4.2.2. Reutilização em escritório? – caso do Hôtel Van Eeteveld ..................... 198
4.2.3. Reutilização em hotel/bed and breakfast? – caso da Maison Saint-Cyr .. 201
4.2.4. Reutilização em habitação privada? – caso do Hôtel Max Hallet ............ 203
4.3. A atualidade do património ............................................................................ 206
5. Considerações finais ............................................................................................ 211
Referências .............................................................................................................. 215
Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

1. INTRODUÇÃO

Ao longo da formação académica, foram várias as hipóteses relativamente à área de


conhecimento a escolher para a dissertação, e sobre o tema a desenvolver. Essa
escolha veio a recair sobre o Art Nouveau e Victor Horta. O interesse pelo Art Nouveau
surgiu após conhecer a Bélgica, em 2013, e em particular a cidade de Bruxelas, berço
deste movimento. Foi visitando e vivenciando esta cidade repleta de história, que fomos
descobrindo as inúmeras realizações Art Nouveau, que resistiram até aos nossos dias
e que podem ser visitadas. A escolha deste tema deveu-se sobretudo a um edifício Art
Nouveau em particular, o Musée Horta em Bruxelas, que visitámos e que vivamente nos
impressionou pela diferença que marca em relação ao que é corrente em arquitetura
graças ao génio do seu arquiteto, Victor Horta, pela sua maneira de conceber os
projetos, sem descurar o mínimo detalhe.

Esta dissertação tem como objetivo principal compreender a origem do movimento Art
Nouveau, a sua expansão através da Europa, com enfoque particular na cidade de
Bruxelas e no seu célebre arquiteto, Victor Horta. É fundamental tentar compreender se
enquanto movimento, seguiu uma linha única de pensamento e conceção, ou se foi
interpretado de diferentes maneiras, e se proporcionou aos seus arquitetos uma
arquitetura livre e organicista, de criação e cunho pessoal? É, contudo, necessário
conhecer as obras dos diferentes arquitetos deste movimento em Bruxelas, sobretudo
as de Victor Horta, para compreender se o Art Nouveau enquanto movimento que surgiu
em plena época oitocentista, foi capaz de criar uma arquitetura vanguardista, e se se
pode considerar como um movimento que contribuiu para a formação do modernismo?
Igualmente importante é estudar e perceber o percurso do património Art Nouveau em
Bruxelas, desde a sua origem, expansão, as adversidades que atravessou durante o
seu percurso, até ao apogeu e posterior declínio, e questionarmo-nos, mais de cem
anos depois, sobre que herança deixaram estas joias arquitetónicas e sobretudo, como
é que irão conservar-se no futuro?

O trabalho organiza-se em quatro grandes capítulos. O capítulo 2. - Utilidade do Art


Nouveau, que está organizado em três subcapítulos: 2.1. - O que é o Art Nouveau,
dedicado aos fundamentos e à história do movimento em geral; 2.2. - O Art Nouveau
em Bruxelas, que explica a origem do movimento, em que contexto se desenvolveu, e
quais foram as duas gerações de arquitetos que marcaram esta cidade, como Henry
Van de Velde, Victor Horta, Paul Hankar, Paul Cauchie, Gustave Strauven e Ernest
Blérot, assim como as respetivas obras mais significativas de cada arquiteto; 2.3. - O
Art Nouveau na Europa, onde iremos estudar a arquitetura e as diferentes formas de

João Miguel Aldeias Correia 29


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

expressão nos países e cidades com maior relevância, tais como, Bruxelas (Bélgica),
Paris (França), Viena (Áustria), Barcelona (Espanha), Darmastadt / Munique
(Alemanha) e Praga (Républica Checa). O capítulo 3. - Autenticidade do Art Nouveau,
é composto por quatro subcapítulos: 3.1. - Victor Horta, que explica a vida, a evolução
da obra e a carreira do arquiteto; 3.2. - Fortúnios e Infortúnios da obra de Victor Horta,
explicando o destino dos edifícios que foram brutalmente destruídos, como o Hôtel
Aubecq em 1950 e a Maison du Peuple em 1965, ou transformados nas suas fachadas,
como os Magasins Wolfers, em 1975 ou a Maison Roger; 3.3. - A Autenticidade de uma
obra patrimonial, uma Quimera?, em que nos debruçamos sobre o restauro, a
autenticidade e a salvaguarda de obras patrimoniais; 3.4. - A Materialidade do Art
Nouveau, estudando os materiais utilizados nos edifícios, como a pedra natural, a
madeira, o ferro, o esgrafito e o vitral, assim como a sua grande diversidade e diferentes
aplicações. O capítulo 4. - Atualidade do Art Nouveau, que por sua vez está subdividido
em três subcapítulos: 4.1. - Casos de Estudo, ou seja, a análise e estudo presencial de
casos de bens patrimoniais reutilizados hoje, tais como o Hôtel Tassel de 1893, o Hôtel
Van Eeteveld de 1895 e o Musée Horta de 1898; 4.2. - A Problemática da Reutilização,
na qual estudamos as obras patrimoniais que foram sujeitas a diferentes tipos de
reutilizações como: em museu, caso do Musée Horta; em escritório, caso do Hôtel Van
Eeteveld; em hotel/bed & breakfast, caso da Maison Saint-Cyr de 1900; ou em habitação
privada, caso do Hôtel Max Hallet de 1901; 4.3. - A Atualidade do Património, com
enfoque em Bruxelas, em que falamos da sua salvaguarda e da herança que nos foi
transmitida, assim como a que queremos deixar às futuras gerações. Por fim o capítulo
5. - Considerações Finais.

Como metodologias recorremos sobretudo à pesquisa bibliográfica e na internet para o


estudo de obras sobre o tema; à consulta de documentos de suporte digital; assistimos
a conferências e realizámos entrevistas a peritos no domínio do Art Nouveau e do seu
património, como Françoise Aubry, antiga diretora do Musée Horta, e os arquitetos
Francis Metzger e Barbara Van der Wee que realizaram várias reabilitações em edifícios
Art Nouveau. Efetuámos ainda o estudo presencial de casos, a maioria do arquiteto
Victor Horta, que teve um papel estruturante para a compreensão das diferentes
expressões do Art Nouveau. Entre eles, constam: o Hôtel Tassel, obra que deu início ao
movimento em 1893, mandado construir pelo filantropo Émile Tassel; o Hôtel Van
Eeteveld construído em 1895 para Edmond Van Eetvelde, secretário geral do Estado
Independente do Congo na Bélgica; o Musée Horta, casa pessoal e atelier do arquiteto
Victor Horta construída em 1898; a Maison Saint-Cyr de 1900, do arquiteto Gustave
Strauven, aluno de Victor Horta; e o Hôtel Max Hallet, mandado construir em 1901 pelo

João Miguel Aldeias Correia 30


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

político e advogado do mesmo nome. É importante compreender que embora


concebidas pelo mesmo arquiteto, Victor Horta, estas obras arquitetónicas realizadas
para diferentes clientes e feitas ao seu gosto, revelam entre si semelhanças e diferenças
na sua conceção e realização, o que as torna únicas no seu género.

João Miguel Aldeias Correia 31


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

João Miguel Aldeias Correia 32


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

2. UTILIDADE DO ART NOUVEAU

“Tout l'intérêt de l'art se trouve dans le commencement. Après le commencement, c’est


déjà la fin.” 1 (Pablo Picasso apud L'Intransigeant, 15 de Junho 1932, p. 1)

2.1. O QUE É O ART NOUVEAU

Esta parte será dedicada aos fundamentos e à história do movimento Art Nouveau, uma
vez que o principal objetivo desta dissertação é perceber que enquanto movimento de
vanguarda, não segue muitas vezes uma linha única de pensamento e concepção,
podendo ser avaliada de forma distinta em cada local que se desenvolve, permitindo
aos seus arquitectos o conceito de uma arquitectura livre e organicista, de cunho e
interpretação pessoal. Conhecer Victor Horta e a sua obra é relevante para a
compreensão do Art Nouveau em Bruxelas enquanto arquitectura de vanguarda, que
acompanha os progressos do seu tempo e a industrialização da época, considerado
como um dos movimentos que deu origem à arte moderna.

Ilustração 1 – Edifício da Secessão Vienense, arq. Joseph Maria Olbrich, Viena, 1897. (Ilustração nossa, 2017).

O Art Nouveau é um movimento de duração relativamente curta, que se estende de


1893 (com a construção da Maison Autrique e ao mesmo tempo o Hôtel Tassel de Victor

1 Todo o interesse da arte está no início. Depois do início, já é o fim. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 33


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Horta, esta última que abre o mundo da arquitetura para o Art Nouveau) até cerca de
1910 e o início da I Guerra Mundial. Este estilo prolifera por toda a Europa, com algumas
variações e particularidades próprias de cada país, de maneira simultânea. É chamado
de Jugendstil na Alemanha, Secessão Vienense na Áustria (Josef Hoffman), Tiffany
Style nos Estados-Unidos, Modernismo em Espanha (Gaudí), Style Nouillena França ou
ainda Glasgow Style na Escócia (Charles Rennie Mackintosh) e nasce de uma só
aspiração, a modernidade. (D’Oreye, 2005, p. 32)

Uma nova burguesia, constituída por industriais, comerciantes, profissionais liberais,


ansiava por um estilo que lhe fosse próprio. Não pretendia mais imitar a arte da corte ou
da nobreza e os estilos do passado, mas sim viver confortavelmente num ambiente
harmonioso, mais artístico. Os seus protagonistas construíram mansões para a
burguesia e focaram-se na habitação acessível e de qualidade, onde olham com
nostalgia para o desaparecimento da sociedade rural, pensando na relação entre o
Homem e a Máquina, procurando uma forma apropriada para os produtos de novas
técnicas (dos aparelhos de iluminação elétrica às estações de metro), utilizando este
estilo como uma revindicação da independência face a um domínio cultural ou político,
como o caso da Finlândia ou da Checoslováquia. (Husson, 2011, p. 7)

Com o Art Nouveau, a construção estava, a partir de agora, ao serviço da expressão


ideológica: enquanto os católicos optavam pelo estilo renascentista gótico ou flamengo;
os pensadores livres, liberais e socialistas preferiam o Art Nouveau. (Culot, 1991, p. 11)

O movimento depressa se torna num fenómeno de moda, adaptando a sua linguagem


formal para decorar espaços de convívio, tais como cafés ou restaurantes, assim como
espaços de comércio, como bancos e lojas.

"la nature prête à l'artiste bien d'autres choses que les lombrics et ténias, les pseudo-
varechs et les vermicelles affolés dont on a pensé faire avec beaucoup de talent, à
l'occasion de 1900, un berceau où abriter le XXe siècle." 2 (Emile Gallé apud Gallé, Le
Mobilier contemporain orné d'après la nature, 1998, p. 251)

Neste texto publicado em 1900, uma data que se utilizou muitas vezes para datar o
estilo Art Nouveau, Emile Gallé denuncia o uso abusivo do arabesco cujas combinações
decorativas caracterizavam o Art Nouveau em Victor Horta, na Bélgica, ou Hector
Guimard, na França. Entre os criadores mais talentosos, esta linha exprime a vitalidade,
a força geradora da planta, anima as estruturas arquitetónicas, o mobiliário, os objetos.

2 A natureza dá ao artista bem mais do que as minhocas e vermes, as pseudo-algas e as aletrias loucas
que nós pensámos fazer com bastante talento, pelos anos de 1900, um berço onde abrigar o século XX.
(tradução nossa)

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Por vezes, não tão bem aceite pelas decorações excessivase à priori sem lógica
aparente.

Ilustração 2 - Platanen Palace, Der Schlaf - art. Bernhard Hoetger, Darmstadt. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 8)

Desde meados do século XIX, que numerosos teóricos se debruçaram sobre a relação
entre a decoração e a estrutura. A questão era premente, pois com a produção massiva
de objetos que a industrialização permitiu, era necessário dar às máquinas uma
produção constante e crecente de novos modelos estandardizados. Claro que foi fácil
recorrer à cópia dos estilos do passado, o reportório era inesgotável, do Antigo Egito,
ao Rococó. O estilo Neogótico era muito popular apesar da dificuldade que representava
a sua aplicação à arquitetura doméstica. (Husson, 2011, p. 7) É defendido por Eugène
Viollet-le-Duc3 que irá exercer uma influência sobre todos os protagonistas do Art
Nouveau através dos seus escritos, especialmente o Dictionnaire raisonné de
l'architecture française du XIe au XVIe siècle (1854-1868) e Entretiens sur l'architecture
(1863 e 1872). Defensor de uma Idade Média caraterizada por uma profunda harmonia
entre organização social e processo de produção, restaurador de monumentos antigos,
Viollet-le-Duc estabeleceu alguns princípios fundamentais: a honestidade no uso dos
materiais (utilizados no seu estado natural), a adoção de uma decoração subordinada a

3 Arquitecto e teórico ligado à preservação do património histórico (1814-1879).

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uma estrutura, o uso de materiais contemporâneos (o metal, o ferro forjado, o vidro) e a


cópia de formas da natureza. (Husson, 2011, p. 9)

O Art Nouveau, que segue, em parte, a linha de pensamento do movimento Arts and
Crafts, cuja defesa do artesanato perseguia um objetivo social e estético, opunha-se à
escravidão do Homem à Máquina que roubava toda a dignidade ao trabalho erigido
como modelo do sistema de produção de guildas medievais. (Husson, 2011, p. 11)

Estes defensores partilhavam também valores comuns como o facto de rejeitarem os


objetos industriais, ou ainda de incluir as artes (decorativas e aplicadas) à arquitetura
no sentido de uma obra de arte total (Gesamtkunstwerk).

Ilustração 3 – Torre do casamento, mosaico dos amantes, art. Friedrich Wilhelm Kleukens, Darmstadt. ([Adaptado a partir de:]
Husson, 2011, p. 11).

A arquitetura do Arts and Crafts prima pela simplicidade e harmonia, renuncia aos
antigos métodos de construção e técnicas (ferro forjado, carpintaria, gesso). Charles A.
Voysey será o mestre de um tipo de casa de campo que influenciará, por exemplo,
Henry Van de Velde, aquando da construção da sua própria casa, a Bloemenwerf
(1895), Henri Sauvage, na Maison Majorelle, à Nancy (1901-1902) ou Joseph-Maria
Olbrich pelas suas casas de artistas na colónia de Darmstadt (1901). (Husson, 2011, p.
13)

Moradias ou casas de campo dão muitas vezes à arquitetura vernacular algumas


características que os ancoram na tradição local: assimetria na repartição dos volumes
e das aberturas, silhueta movimentada das coberturas, cores vivas. Se a moradia

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suburbana, à beira mar ou no campo, mostrava cada vez mais uma simplicidade
requintada, ela podia ser também a ocasião para o arquiteto de se render a uma fantasia
que não autorizava os regulamentos na cidade: o Castel Henriette (1899) de Hector
Guimard em Sévres, França, ou as moradias El Capricho (1883-1885) em Comillas e
Vicens (1883-1888) em Barcelona, de Antoni Gaudí, exibem uma exuberância que
encantou a imaginação. (Husson, 2011, p. 15)

Ilustração 4 - Casa Majorelle, arq. Henri Sauvage, Nancy, 1902. (Ilustração nossa, 2016).

Ilustração 5 - Casa Vicens, arq. Antoni Gaudí, Barcelona, 1883. (Ilustração nossa, 2014).

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De facto, a arquitetura Art Nouveau, não se contenta unicamente pela construção, mas
preocupa-se igualmente pela decoração interior para que o conjunto da habitação seja
um todo harmonioso. (Culot, 1991, p. 13) Um todo, neste caso, pode ir até ao desenho
do lava-loiça, dos uniformes das domésticas, dos vestidos que as mulheres usavam
(especialmente Henri Van de Velde que desenhou os vestidos da sua esposa para a
sua casa de campo Bloemenwerf), às espécies de plantas que serão plantadas no
jardim, para finalmente chegar a um universo muito pessoal. Este movimento vai
suprimir a distinção clássica e a hierarquização que existiam entre as belas-artes e as
artes decorativas.

Ilustração 6 – Nietzche-Archiv – arq. Henry Van de Velde, Weimar, 1911. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 12).

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William Morris4 começou então a luta a favor da melhoria da qualidade de vida. O seu
motivo era não ter nada em casa que não fosse belo e útil. Morris vai abordar com igual
talento diferentes domínios das artes decorativas: os seus papéis de parede inspirados
na natureza, o Oriente e a Índia decorarão os interiores mais elegantes e não passarão
de moda; alguns foram utilizados mais de vinte anos depois da sua criação por Victor
Horta nas suas casas que estavam na vanguarda da modernidade. (Husson, 2011, p.
11)

"Faire prendre plaisir aux gens dans les choses qu'ils sont forcés d'employer, voilà le
grand devoir de la décoration ; faire prendre plaisir aux gens dans les choses qu'ils sont
forcés de fabriquer, voilà son utilité.”5 (William Morris, 1893, p. 242)

Mas, ao contrário do movimento Arts and Crafts, o Art Nouveau não rejeita totalmente a
modernidade; além disso, as teorias de Eugène Viollet-Le-Duc são seguidas à letra,
como a verdade estrutural e as possibilidades trazidas pelo aço. Além disso, a busca de
luz, de ar e de espaço, que estavam no centro das atenções ao longo de todo o século
XIX, são igualmente áreas de investigação. (Puttemans, 2012, p. 218-219)

"Sous l'impulsion des idées émancipatrices qui ont bouleversé tous les domaines de la
pensée, l'art de bâtir s'est dégagé des liens traditionnels et des imitations stériles.
D'audacieux réformateurs, au premier rang desquels M. Victor Horta, ont osé affirmer
que la beauté d'un édifice réside surtout dans le caractère rationnel de sa construction;
que l'harmonie des lignes est inséparable de la logique et de la vérité ; que toute bâtisse
doit repondre rigoureusement à sa destination; que la façade — au rebours des plus
vénérables traditions— est commandée, dans tous ses éléments, par la distribution
intérieure ; que le choix des matériaux est subordonné aux conditions climatiques du
pays, que la decoration n'est que le développement de la pensée créatrice de l'architecte
et ne peut être disjointe du gros œuvre ; que le mobilier lui-même s'accorde, de même
que la ferronnerie, le vitral, la boiserie, les tissus, etc. avec la conception d'ensemble
pour en assurer l'unité. Axiomes si judicieux et d'une vérité si flagrante qu'on s'explique
difficilement qu'il ait fallu tant d'années pour les voir proclamés. ” 6 (Octave Maus,1900, p.
85)

4 Designer, romancista, poeta e activista socialista inglês ligado ao movimento Arts & Crafts (1834-1896)
5 Fazer as pessoas felizes nas coisas que são forçadas a usar é o grande dever da decoração; fazer as
pessoas felizes nas coisas que são forçadas a fabricar, essa é a sua utilidade. (tradução nossa)
6. Sob o ímpeto de idéias emancipatórias que perturbaram todas as áreas do pensamento, a arte de

construir emergiu de vínculos tradicionais e imitações estéreis. Audaciosos reformistas, de primeira linha
como o Senhor Victor Horta, ousaram afirmar que a beleza de um edifício reside acima de tudo no caráter
racional de sua construção; que a harmonia das linhas é inseparável da lógica e da verdade; que todo
edifício deve responder rigorosamente ao seu destino; que a fachada - contrária às tradições mais
veneráveis - é comandada, em todos os seus elementos, pela distribuição interna; que a escolha dos
materiais está subordinada às condições climáticas do país, que a decoração é apenas o desenvolvimento
do pensamento criativo do arquiteto e não pode ser dissociada do trabalho estrutural; que o próprio
mobiliário estará em conformidade com as ferragens, o vitral, a madeira, os tecidos etc. com a concepção
de conjunto para assegurar a unidade. Axiomas tão judaciosos e de uma verdade tão flagrante que é difícil
explicar que foram necessários tantos anos para vê-los proclamados. (tradução nossa)

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Ilustração 7 – Hotel Paul Mezzara – arq. Hector Guimard, Paris, 1911. (Ilustração nossa, 2016).

Esta nova fonte de inspiração que é a natureza não surge do nada. Desde o final do
século XVIII, obras de grandes pensadores, como Darwin, vieram iluminar o campo das
ciências naturais sob uma nova luz. Estas numerosas publicações no campo da biologia
e da botânica contribuíram largamente para alimentar a imaginação dos artistas do
movimento. (D’Oreye, 2005, p. 25)

Para os criadores do Art Nouveau, o motivo vegetal não era mais que uma transcrição
fiel à maneira de um botânico. Era importante expressar um sentimento indescritível: a
grande comunhão com a natureza, como o afirma Eugène Grasset7:

"l'ornement est comme une manière de manifester notre plaisir de vivre." 8 (Eugène
Grasset apud Aubry, 2005, p. 14)

7 Decorador e arquiteto suiço, considerado como pioneiro no design Art Nouveau (1845-1917)
8 o ornamento é como uma maneira de mostrar o nosso prazer de viver. (tradução nossa)

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Ilustração 8 – Museu de Artes Decorativas, Budapeste, 1900-1906. (Ilustração nossa, 2018).

Segundo Émille Gallé, fundador e primeiro presidente da Escola de Nancy em 1901, a


simbologia surgirá espontaneamente dessas forças combinadas: o estudo da natureza,
do amor, da arte e da necessidade de exprimir o que há no coração. Na época do Art
Nouveau, belezas desconhecidas da natureza foram reveladas: a descoberta dos
fundos marinhos, a invenção ao microscópio e a descoberta de micro-organismos
forneceram novos motivos de inspiração. Gallé rejeitava um “mobiliário naturista” onde
o ornamento parece derretido ou derramado ao encontro de todo o princípio construtivo.
Gaudí quanto a ele, não hesitou em moldar seres vivos para ornamentar o portal da
Natividade na Sagrada Família em Barcelona, mas ele sacrifica também uma outra
vertente do Art Nouveau: a criação de seres fantásticos (o dragão da Finca Güel ou a
salamandra do Parque Güel). (Husson, 2011, p. 17)

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Ilustração 9 - Dragão de Finca Güell, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1884-87. (Ilustração nossa, 2014).

Ilustração 10 - Salamandra do Parque Güell, arq. Antoní Gaudí, Barcelona. (Ilustração nossa, 2014).

O Art Nouveau escocês deve a sua particularidade ao dom poético de Charles


Mackintosh9 transformando em puros elementos decorativos as belezas sonhadoras
dos pré-rafaelistas. Corpos humanos, pássaros, flores e árvores são estilizados ao

9Arquiteto e designer escocês, juntou à tradição escocesa a inspiração japonesa e Art Nouveau (1868-
1928).

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extremo e combinados com grelhas, quadrados e ovais. Cada toque de cor torna-se
uma joia rara num ambiente imaculado. Quando Mackintosh expõe em Viena, em 1900,
durante a VIII exposição da Secessão, o impacto sobre o Art Nouveau vienense é
notável. As combinações de linhas abstratas dinâmicas e de ornamentos naturalistas
dão lugar a formas puras desprovidas de toda a referência à natureza. O reinado do
ornamento termina temporariamente. Ele tinha assegurado a coesão da arquitetura, da
decoração e do mobiliário. A vitalidade dos laços criados pelo primeiro Art Nouveau, a
carga simbólica e poética dos sistemas decorativos torna-se desatualizada. (Husson,
2011, p. 19)

Ilustração 11 – Casa Mackintosh, arq. Charles Rennie Mackintosh, Glasgow. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 114).

Se tantos arquitetos e artistas do Art Nouveau se converteram ao culto da Natureza,


deveu-se também ao facto de eles terem descoberto a arte japonesa na segunda
metade do século XIX O Japão que esteve isolado durante muito tempo abriu as suas
fronteiras por volta de 1853, o que permitiu aos europeus descobrirem a cultura
japonesa e oferecerem novas possibilidades de representação aos artistas através de
estampas e outras.

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A influência do Japão não se limitava apenas à utilização de motivos exóticos, ela


despertava também um novo sentido de espaço que rompe com a perspetiva
geométrica, inventada no Renascimento; e incitava também a um novo olhar sobre a
natureza e os seus fenómenos, como fez James McNeil Whistler, pintor norte-americano
(1834-1903).

Ilustração 12 – The Princess from the Land of Porcelain, pendurada sobre a lareira na Peacock Room, art. James McNeil Whistler,
1876-1877. ([Adaptado a partir de:] Freer Gallery of Art, 2019).

Autor de móveis elegantes, ele próprio decorou a Peacock Room (1877) e pintou o
quadro The Princess from the Land of Porcelain (1864) num cenário japonês que faz
eco ao retrato feminino vestindo um kimono, e cuja decoração é um prelúdio para os
interiores artísticos do Art Nouveau. (Husson, 2011, p. 9) Esta influência da arte
japonesa é chamada "Japonismo". O termo "Japonismo", por sua vez, apareceu pela
primeira vez numa série de artigos publicados pelo colecionador e crítico de arte Philippe
Burty, na revista La renaissance littéraire et artistique em 1872. Este é o nome que ele
dá a essa influência das artes japonesas para o Ocidente. (D’Oreye, 2005, p. 28-29)

É impossível evocar a influência da cultura japonesa no Ocidente sem mencionar


Siegfried Bing (1838-1905). Este último desempenhou um papel predominante na
reaproximação entre o Art Nouveau e a arte japonesa. Este francês e negociante de

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arte japonesa possuía uma galeria de arte em Paris, inaugurada em 1875. Esta galeria
era um lugar importante para encontros entre artistas e críticos. Ele esteve também na
origem da revista ilustrada, Le Japon artistique, publicada de 1888 a 1891. Como o
nome sugere, esta revista foi dedicada à arte japonesa e fascinou enormemente os
europeus da época. No primeiro prefácio desta revista, ele explica que :

“Cet art (japonais) s'est à la longue mêlé au nôtre. C'est comme une goutte de sang qui
s'est mêlée à notre sang, et qu'aucune force au monde ne pourra éliminer.” 10 (Samuel
Bing apud Le Japon artistique, Vol.1, 1888, p. 75)

Ilustração 13 – Le Japon artistique. ([Adaptado a partir de :] Siegfried Bing, 1888).

O simbolismo e os pré-rafaelitas também tiveram uma influência considerável no


movimento, bem com o arabesco. Fio condutor do Art Nouveau, esta linha fluída e
elegante que emocionava tanto os amantes das estampas japonesas apareceu primeiro
na pintura e nas artes gráficas. O arabesco parece ser também o ornamento mais apto
a exprimir a ductilidade do metal que Victor Horta trouxe, desprovido de qualquer
disfarce, nas casas burguesas.

10Essa arte (japonesa) misturou-se ao longo do tempo com a nossa. É como uma gota de sangue que se
misturou com o nosso sangue, e que nenhuma força no mundo pode eliminar. (tradução nossa)

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Ilustração 14 – Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893 (Ilustração nossa, 2018).

Ilustração 15 – Maison Saint-Cyr, arq. Gustave Strauven, Bruxelas, 1900 (Ilustração nossa, 2018).

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A procura de linhas, tanto suaves, como nervosas incorporam-se num reportório de


motivos florais e vegetais, mas também de corpos femininos. A imagem da Mulher torna-
se um motivo condutor em todos os domínios das artes aplicadas: o cabelo espalhado,
adornado com flores ou joias elaboradas, as roupas ondulantes, a expressão misteriosa,
a sensualidade do corpo, tudo elaborado ao gosto refinado da elite europeia, como o
exemplo fulgurante do Hôtel Hannon, em Bruxelas. (Husson, 2011, p. 15)

Ilustração 16 – Hôtel Hannon, arq. Jules Brunfaut, Bruxelas, 1903. (Ilustração nossa, 2018).

Com o Art Nouveau, a construção estava agora ao serviço da expressão ideológica:


enquanto os católicos optaram pelo estilo renascentista gótico ou flamengo; pensadores
livres, liberais e socialistas preferiam o Art Nouveau. (Culot, 1991, p. 11)

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O Art Nouveau difundiu-se muito rapidamente no mundo graças às revistas de


fotografias e às exposições. O cartaz ilustrado é um forte meio de difusão, o seu
crescimento corresponde ao florescimento do Art Nouveau. As grandes exposições
universais como a de Paris em 1900, ajudaram a espalhar as modas: ao lado das
secções destinadas aos produtos da indústria ou da agricultura, à apresentação de
novas tecnologias, um lugar foi reservado às exposições de arte e artes aplicadas: a
“sala vienense” de Olbrich ou a da Escola de Artes Decorativas em Viena demonstram
a renovação das artes decorativas austríacas. Em contraste os pavilhões dos diferentes
países raramente eram inovadores, eles evocavam preferencialmente as formas de
arquitetura tradicional ou as imitações de monumentos famosos.

O Art Nouveau constituiu muitas vezes uma forma de expressão de revolta. Em Praga,
a Câmara Municipal de Antonin Balŝanek, decorada pelos maiores artistas checos da
época, testemunha a vontade checa de se apropriar de um estilo que simbolizasse a
modernidade e a emancipação.

Ilustração 17 – Mercado Municipal, arqts. Osvald Polívka e Antonin Balŝanek, arts Ladislav Saloun e Karel Novák, Praga,
1912. (Ilustração nossa, 2019).

Em Paris, o Pavilhão finlandês faz grande sucesso porque tinha a expressão autêntica
de uma nação que procurou libertar-se da força repressiva russa. A evocação de velhas
lendas finlandesas, o reportório de animais, as reproduções da antiga arquitetura

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Carélia, o mobiliário rústico de Axel Gallen provocaram uma nova sensação de frescura.
Depois do início dos anos 1890, era frequente que os salões artísticos acolhessem
objetos de arte: tornando-se possível adquirir e colectioná-los.

A exposição de Darmstadt em 1901 Ein Dokument deutcher Kuns abre porta às


exposições totalmente dedicadas às artes decorativas. Do mesmo modo, Darmstadt,
forte da experiência da colónia de Artistas, ilustrou o desejo de reforma dos criadores
alemães. (Husson, 2011, p. 19) Estes desejavam romper com o caráter artístico
procurado anteriormente no desenvolvimento das habitações e que levaram a um
individualismo desordenado. A arquitetura e as artes decorativas deviam responder a
critérios de clareza, de simplicidade, de natureza. A época em que os artistas exerciam
em todos os domínios da arte industrial terminou, o futuro é a profissionalização. Em
1914, Henri Van de Velde irá entrar em conflito com alguns membros do Werkbund,
adeptos da “estandardização” destinada a favorecer a produção industrial e a ascensão
das artes decorativas alemãs, restringindo toda a expressão individual e original. Henri
Van de Velde reivindica arduamente o direito à criação livre e espontânea. Os
protagonistas do Art Nouveau tinham tentado fazer renascer e proteger os modos de
produção artesanal. Em 1900, Olbrich sonhava que em Darmstadt convivessem artistas
e artesãos até que um e o outro se tornassem uma só pessoa. Os factos o demostraram
e a união artista/artesão será substituída pela união criador/máquina. (Husson, 2011, p.
21)

Ilustração 18 – Edifício da Secessão Vienense, arq. Joseph Maria Olbrich, Viena, 1897. (Ilustração nossa, 2017).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Podemos dizer que no final do século XIX, as velhas roupas das cidades europeias
estavam a rebentar pelas costuras. Devido à industrialização, as cidades atraiam uma
parte da população dos campos, o número de habitantes crescia em todo o lado. Os
caminhos-de-ferro aumentavam a mobilidade de pessoas e bens. As viagens eram
facilitadas e as grandes exposições como a de Paris em 1900 são visitadas por milhões
de pessoas. Os artistas expõem por toda a Europa e as suas criações são reproduzidas
em revistas ilustradas. Tornou-se mais fácil de estar a par das últimas tendências.

A nova burguesia que ansiava viver de uma forma moderna e confortável adopta o Art
Nouveau como sinal de reconhecimento. Com o incrível crescimento imobiliário das
cidades europeias no virar do século, a linguagem decorativa do Art Nouveau
internacionaliza-se para mais tarde cair em desuso, perdendo o seu carácter de
novidade desejada.

Ilustração 19 – Hôtel Van Eetveld, arq Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir de:] Borsi e
Portoghesi, 1990, p. 199).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Em vários países ele era acompanhado de formas decorativas locais, vindas do passado
e do folclore: estes vão levá-lo muitas vezes ao lado cosmopolita da linguagem do Art
Nouveau. O desafio do renascimento do artesanato e da aliança entre as Belas-Artes e
as artes aplicadas estava perdido: era necessário acomodar-se com o reinado da
máquina e de abandonar as bases de uma nova profissão, o de criador. E até mesmo a
necessidade da decoração se coloca.

Em 1908, Adolf Loos (1870-1933) publica Ornamento e Crime, afirmando que o


ornamento representa um atraso, um fenômeno de degeneração e é o produto de uma
força de trabalho desperdiçada. A ausência de decoração representa uma forma de
cultura mais avançada. Mas não se pode esquecer que os maiores arquitetos do Art
Nouveau usaram materiais nascidos com a industrialização, o aço, o ferro forjado, o
vidro, o betão, deram origem a uma nova arquitetura, adaptada às necessidades dos
seus contemporâneos. Edifícios como as estações, os centros comerciais, as casas do
povo, os hotéis, os bancos, as estações de metro responderam racionalmente às
exigências da vida moderna. A luz, o espaço, a facilidade de circulação e de
manutenção, o desenvolvimento do uso da eletricidade, os sanitários, o aquecimento,
não devem ser escondidos pela sedução da linguagem formal do Art Nouveau, este
praticamente já desaparecido em todo o lado assim que se dá início à I Guerra Mundial,
em 1914. (Husson, 2011, p. 23)

2.2. O ART NOUVEAU EM BRUXELAS

"Bruxelles, ma belle,..."11 (Dick Annegarn, 1974)

A arquitetura Art Nouveau em Bruxelas aparece no contexto do desenvolvimento da


cidade e das grandes obras urbanas realizadas por Leopoldo II e da sua ascensão ao
trono em 1865. Este desenvolvimento provocou o aparecimento de uma burguesia
atraída pela construção de mansões. É graças a essa burguesia progressista, composta
principalmente por engenheiros e industriais, que Victor Horta, iniciador desse
movimento em Bruxelas, poderá expressar o seu talento.

11 Bruxelas, minha bela,… (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 20 – Estufas Reais de Laeken, arq. Alphonse Balat, Bruxelas, 1873. (Ilustração nossa, 2015).

Ao contrário de Barcelona ou de Glasgow, onde o movimento arquitetónico é centrado


em um único arquiteto (Gaudí e Mackintosh), há em Bruxelas diversas personalidades
que deram ao movimento uma ampla variedade de expressões. O movimento Art
Nouveau, por mais breve que tenha sido, viu duas gerações de arquitetos na Bélgica. A
primeira, geração tem como representantes principais Henry Van de Velde, Victor Horta,
Paul Hankar e Paul Cauchie; a segunda, Gustave Strauven e Ernest Blérot. No entanto,
cada arquiteto tem a sua própria expressão e conceção deste movimento, sendo esta
uma das particularidades do Art Nouveau.

"ll n'y a pas d'Art sans personnalité." Paul Hamese (sous Ie pseudonyme de Polam). 12

Os primeiros sinais do Art Nouveau aparecem na Bélgica em 1891 na capa do catálogo


do Salão dos XX desenhado pelo pintor neoimpressionista belga, Georges Lemmen
(1865-1916). As letras e linhas suaves revelam um gosto japonizado tingido com
influência inglesa. Lemmen colaborou ainda com Henry Van de Velde para a instalação
de uma sala de fumo na galeria de Art Nouveau de Bing, em 1895, ano durante o qual
Van de Velde constrói em autodidata a sua casa, a Bloemenwerf, em Uccle, Bruxelas.
Esta habitação de uma simplicidade refinada deve muito ao Arts and Crafts e
assemelha-se a uma cabana inglesa, oferece de acordo com o seu autor:

12 Não existe arte sem personalidade. (tradução nossa) Polam, Corporation d'architecture et d'art appliqué,
in La Gerbe, nº1,13 février 1898, p. 23.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

“rien de nouveau sinon l'idee maîtresse d'un plan qui réduirait la séparation entre les
différents locaux à un minimum afin de provoquer le sentiment que la communauté
d'action, de conviction et d'idéal de tous ceux qu'établirait à demeure notre foyer ou
provisoirement nos hôtes."13 (Henry Van de Velde apud Aubry, 2005, p. 12)

Van de Velde estima que, na sua simplicidade, a Bloemenwerf é fundamentalmente


subversiva, e que lutar contra a fealdade e o ornamento supérfluo despojado é para ele
uma tarefa diária. (Aubry, 2005, p. 12) Ele desenha todo o interior, o que o leva a criar
em 1898 as suas próprias oficinas de arte industrial e de decoração.

Ilustração 21 – Villa Bloemenwerf, arq. Henry Van de Velde, Uccle, 1895. (Ilustração nossa, 2018).

Nos seus primeiros escritos teóricos, Van de Velde assume as indignações de Ruskin e
Morris afirmando, por exemplo, nos Aperçus en vue d’une synthèse d’Art (1895), que a
divisão entre as artes é imoral. As artes de novo reunidas como na Idade Média terão o
título de artes da indústria, da construção e da decoração e contribuirão para a perfeição
de todas as esferas da vida. (Aubry, 2005, p. 12) Van de Velde preocupa-se também
com a confeção das roupas femininas que ele quer tirar da tirania da moda.

13nada de novo senão a ideia principal de uma planta que reduzisse a separação entre os vários espaços
a um mínimo, a fim de provocar o sentiment que a ação comunitária, a convicção e de ideal de todos aqueles
que usufruirão da nossa casa ou serão temporariamente nossos hóspedes. (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 22 - Hôtel Otlet, arq. Octave Van Rijsselberghe, art. Henry Van de Velde, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa, 2018).

O sucesso que consegue nas exposições de Dresden (1897) e na Secessão de Munique


(1899) levam-no a mudar-se para a Alemanha em 1900, onde constrói a escola de Artes
Decorativas (1905-1906) tornando-se diretor da escola de Belas-Artes (1904-1911). Em
1902 escreve na publicação para a revista die Zukunft :

"La ligne est une force dont les activités sont pareilles à celles de toutes les forces
élémentaires naturelles ; plusieurs lignes-forces mises en présence, exerçant leurs
activités en sens contraire, provoquent les mêmes résultats que les forces naturelles
opposées l’une à l’autre, dans les mêmes conditions! "14 (Henry Van de Velde apud Die
Zukunft, 1902, vol. XL, n° 49.)

Henry Van de Velde foi, entre outros, um dos protagonistas do movimento Deutscher
Werkbund, em 1907, considerado como um dos primeiros movimentos da arquitetura
moderna do séc. XX que irá posteriormente dar origem à Bauhaus. Arquitetos, artistas,
industriais e operários eram membros da associação cujo objetivo não era somente criar
edifícios e utensílios de alta qualidade, mas também dar uma nova forma à vida
quotidiana.

14 A linha é uma força cujas atividades são semelhantes às de todas as forças elementares naturais; várias
linhas de força postas em contacto, exercem as suas atividades em direções opostas, provocando os
mesmos resultados que as forças naturais contrárias umas às outras, nas mesmas condições! (tradução
nossa). Esta é uma reimpressão do trabalho original publicado em 1917. É neste mesmo livro que o próprio
Van de Velde cita este excerto como consta na edição de 1902 da revista Die Zukunft, mais precisamente:
Die Zukunft, 06/09/1902, vol XL, nº 49.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

A exposição de Colônia foi a primeira exposição conjunta, na qual arquitetos como


Walter Gropius, Peter Behrens, Hermann Muthesius e Henry van de Velde quiseram
expressar o enaltecer do modernismo. A visão do Werkbund era utilizar a "máquina
como auxílio para alcançar qualidade", como afirmou Henry Van de Velde. A ideia era
que a união entre arte e indústria reformaria todas as esferas da vida. A máquina não
deveria produzir apenas objetos baratos, mas também produtos de alta qualidade. A
crescente divergência entre o artesanato e a produção industrial alimentavam um
debate dentro da Werkbund, com alguns membros, como Hermann Muthesius, a
defender a estandardização, e outros, como Van de Velde, Gropius e Bruno Taut a
defender o individualismo. Este conflito, conhecido por Werkbundstreit, quase levou ao
fim da associação. Em 1914, o Werkbund promoveu a Exposição de Colónia, onde
foram apresentados edifícios “modelo” industriais, interiores modernos e objetos de
design. Contudo essa mesma exposição marcou também uma ruptura no movimento
devido à disputa entre os que eram a favor de um design completamente orientado para
o funcionalismo e aqueles que defendiam a individualidade artística. Após a I Guerra
Mundial, o Deutscher Werkbund dividido passou a dedicar-se mais à arquitetura.

Ilustração 23 - Fábrica Fagus, arq. Eduard Werner, fachadas desenhadas pelos arqts. Walter Gropius e Adolf Meyer, 1911.
(Ilustração nossa, 2019).

Já Victor Horta, além do enorme trabalho que enfatiza nas suas memórias descritivas,
deseja escapar das convenções da linguagem ensinada nas academias para criar uma
obra onde se denota a sua sensibilidade pessoal e a liberdade de criação. (Aubry, 2005,
p. 13) A sua arquitetura vai romper todas as convenções estéticas e sociais e trazer
nova vida à tradicional casa geminada de Bruxelas. Construído em 1893, o Hotel Tassel

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

é o elemento desencadeador do Art Nouveau em Bruxelas e anuncia o início


internacional do movimento.

Sensível às ideias de Eugene Viollet-le-Duc, Victor Horta concorda em ser verdadeiro


de acordo com os programas e os materiais. Como homem da sua época, adapta os
novos materiais da era industrial, destacando-os com respeito pelas suas propriedades,
de maneira simples, deixando as estruturas arquitetónicas aparentes, e até mesmo de
as afirmar integrando-as na decoração. É uma audácia tratando-se de materiais
industriais (ferro fundido, metal, vidro), aplicados a construções privadas. O ferro permite
a construção de fachadas com grandes janelas rasgadas de forma assimétrica; jardins
de inverno que trazem a luz ao centro das casas; varandas suspensas com pavimento
em vidro e espaços interiores fluidos e transparentes graças à supressão de paredes
internas substituídas por arcos ou lintéis metalálicos. Viollet-le-Duc refutou firmemente
a cópia dos estilos do passado. Uma nova arquitetura deve emergir do uso de materiais
produzidos pela indústria e decorada de maneira apropriada. (Aubry, 2005, p. 14)

Mas Horta também inovou ao introduzir um estilo amplamente inspirado nas curvas da
Natureza e onde diferentes materiais estão entreligados numa perfeita comunhão. Ele
é um apaixonado pelas linhas curvas, pelas ligações harmoniosas entre os diferentes
elementos, levando-o mesmo ao ponto de encurvar a base do edifício de maneira a
obter uma melhor transição deste com o passeio, demonstrando uma preocupação em
integrar elementos naturais a uma construção humana e artificial, como o são os motivos
vegetais da decoração interior. (Goslar, 2012, p. 93)

Quando Horta desenha o Hôtel Tassel (1983), inscreve-se na linha de arquitetos


clássicos, representada pelo seu mestre, Alphonse Balat, mas também na dos
arquitetos racionalistas, como Viollet-le-Duc. Porém vai para além dos ensinamentos
recebidos ao inventar uma linguagem decorativa baseada no arabesco em que se dizia:
“Horta, de uma planta retirava o caule, mas não a flor”, referência à sua linha chicote,
“coup de fouet”. Esta exprime maravilhosamente a flexibilidade do metal que Horta
introduz audaciosamente na arquitetura doméstica, seguindo a via de Viollet-le-Duc, no
seu Deuziéme Entretien sur l’Architecture, de 1872 (Aubry, 2005, p. 13), que diz:

“Ce que l’on n’a tenté nulle part avec intelligence, c’est l’emploi simultané du metal et de
la maçonnerie.”15 (Viollet-le-Duc, 1872, p. 61)

15 O que nós não tentámos em nenhum lugar com inteligência, é a aplicação simultânea do metal e da
alvenaria. (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 24 – Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa, 2019).

No entanto, ao conceber a fachada deste hôtel que, no início, se pronunciava num estilo
mais clássico, evoluiu e foi adaptada de maneira pessoal, onde Horta deixa, enfim, fluir
livremente a sua imaginação, cria ao mesmo tempo uma certa ambiguidade ao
desdenhar da sua formação clássica, para adquirir o seu próprio estilo, numa espécie
de desafio ao seu mestre, Alphonse Balat, e aos ensinamentos clássicos. Esta maneira
que Horta tem de considerar a construção como uma obra em evolução, suscetível de
ter melhorias, é outra característica do jovem arquiteto numa procura constante da
beleza e da perfeição, da harmonia e de um certo esplendor das formas. (Goslar, 2012,
p.95)

Horta deu também prova de criatividade e engenho, ao projetar a sua visão artística ao
interior dos edifícios, a fim de conceber um todo harmonioso, integrando em simbiose,
arquitetura, estrutura e decoração, prova de que o arquiteto adquiriu o papel de criador
de uma obra de arte total. Nos seus interiores, procurava uma harmonia colorida
derivada da estampa japonesa e das pinturas Nábis que obtinha através da própria cor
dos diversos materiais, pela decoração mural e pela aplicação do vitral que transforma
a luz natural. A habitação torna-se num lugar de emoções estéticas constantemente.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 25 – Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa, 2019).

Ao mesmo tempo, Horta realizou projetos únicos e individualizados, pensados e


executados até ao mínimo detalhe, que ia ao encontro dos desejos dos seus clientes,
reinventando a arquitetura do passado, dando especial atenção à função programática
e ao aspeto funcional da construção, numa procura constante de inovar, adaptando o
projeto da habitação à imagem e gosto do seu proprietário. E sobretudo, ao reinventar
o plano tradicional de três espaços consecutivos sombrios, com o corredor ao centro,
num espaço luminoso, contínuo e aberto, tanto na horizontal como na vertical, com o
poço de luz no centro da habitação. Esta transformação deve-se à conceção de Horta
sobre o que é uma habitação, que deve ser feita à imagem da vida do seu ocupante,
uma espécie de “casa-retrato” (Goslar, 2012, p.91), respondendo perfeitamente ao

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

programa específico imposto pelo seu proprietário, e a vontade em conferir à habitação


privada, uma monumentalidade, até então reservada às obras de arquitetura do Estado.

É, portanto, uma arquitetura feita para a vida social, para receber convidados, tornando
o Art Nouveau, numa arte muito dependente do estilo de vida da elite progressista da
época.

Essa mesma elite progressista, fará propaganda à obra de Horta, o que lhe valerá, em
1895, o projeto da Maison du Peuple para o Partido dos Trabalhadores Belga, ao mesmo
tempo que constrói duas das suas mais belas casas para particulares como o Hôtel
Solvay (1894) e o Hôtel Van Eetveld (1895). O seu estilo é rapidamente imitado em toda
a Europa e chega a um vasto público graças às grandes lojas, como L’Innovation,
inaugurada em 1900.

Hoje, em Bruxelas, há cerca de 2.500 edifícios do estilo Art Nouveau na capital. (RANN,
2000, p. 46) Embora nesta cidade o Art Nouveau seja um movimento afecto,
principalmente, à arquitetura comercial e privada, a imagem que temos de Bruxelas,
“capital” do Art Nouveau consiste mais em casas de paticulares. A cidade já não tem
grandes edifícios públicos deste movimento, uma vez que a Maison du Peuple foi
demolida em 1965. Tournai, pelo contrário, ainda tem o seu Musée des Beaux Arts, por
exemplo.

Ilustração 26 – Muséé des Beaux Arts, arq. Victor Horta, Tournai, 1911. (Ilustração nossa, 2017).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 27 - Planta do projeto definitivo do Muséé des Beaux Arts, arq. Victor Horta, Tournai, 1911. ([Adaptado a
partir de:] Dulière, 1985, p. 186).

Apesar disso, o património Art Nouveau é, atualmente, o melhor protegido pela região
de Bruxelas, nenhum outro movimento ou estilo pode gabar-se de tal política de
proteção, com um número que se aproxima de 150 edifícios protegidos, dados de 2000.
(RANN, 2000, p. 39) O primeiro edifício do movimento Art Nouveau que foi classificado
em Bruxelas, é o conjunto formado pela casa pessoal e o atelier de Victor Horta
(classificada desde 16 de outubro de 1963). É importante notar que quando se começa
a perceber o valor do Art Nouveau e a classificar certas propriedades, em paralelo houve
também muitas demolições de casas de particulares, algumas das quais eram grandes
obras de arte do movimento como o Hôtel Aubecq. Devemos, portanto, perceber que a
arquitetura Art Nouveau da cidade é apenas um "elo" do tecido urbano, que é composto
por algumas casas espalhadas pelas ruas ou bairros da capital. Ela está longe de
compor o horizonte da cidade de Bruxelas em termos de edifícios marcantes e
imponentes que se vêem em perspetiva.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 28 - Hôtel Aubecq, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1899. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 254).

O arquiteto mais importante do movimento em Bruxelas, tanto pelas suas numerosas


construções quanto pelo renome internacional, é e continuará a ser Victor Horta. Ele é,
de facto, o precursor deste movimento, mas é também o arquiteto deste estilo cuja obra
mais importante foi em grande parte salva, classificada, restaurada e frequentemente
reutilizada. Esta defesa do património de Victor Horta não é fruto do acaso, é o resultado
do trabalho árduo de um dos seus antigos alunos, Jean Delhaye, que lutou para proteger
os edifícios do seu mestre.

Por outro lado, Paul Hankar lança uma outra versão do Art Nouveau, aquando da
construção da sua casa pessoal, em 1893. Ele demonstra o gosto pela policromia, pelo
tratamento variado dos materiais, pelo trabalho sábio do ferro forjado.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 29 - Maison Hankar, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1893. Ilustração 30 - Maison Cortvriendt, arq. Paul Hankar,
(Ilustração nossa, 2018). Bruxelas, 1900. (Ilustração nossa, 2018).

Ao contrário de Horta, utiliza motivos facilmente reconhecíveis: a folha de castanheiro,


a tulipa, o flamingo ou a tromba de um elefante. Hankar não hesita em justapor
elementos flexíveis e composições geométricas ao mesmo tempo simples e com uma
grande riqueza de efeitos decorativos. (Aubry, 2005, p. 16) As janelas redondas que
desenha para diferentes casas serão bastante imitadas. A influência do Japão é sensível
nas suas composições: ele combina formas em arco com molduras geométricas. Hankar
é também o autor de inúmeras montras e decorações de lojas.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 31 - Maison Niguett, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1896. (Ilustração nossa, 2018).

Ilustração 32 - Hôtel Ciamberlani, arq. Paul Hankar, Bruxelas, 1897. (Ilustração nossa, 2018).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

A casa pessoal de Paul Cauchie, de 1905, é um raro exemplo da influência de Charles


Rennie Mackintosh em Bruxelas: especialista do esgrafito, ele transforma a sua fachada
num cartaz. Nela, figuras femininas parecem um pouco rígidas como estátuas antigas,
o movimento flexível do cabelo e as rosas estilizadas à escocesa ainda pertencem ao
Art Nouveau. A dureza também é percetível nas linhas da varanda muito semelhantes
a um desenho de Charles R. Mackintosh para a Willow Tea room, de 1904.

Ilustração 33 - Maison Cauchie, arq. Paul Cauchie, Ilustração 34 - Detalhe da fachada da Maison Cauchie, arq. Paul Cauchie,
Bruxelas, 1905 (Ilustração nossa, 2018). Bruxelas, 1905. (Ilustração nossa, 2018).

No esgrafito da sala de jantar e no corredor, a influência de Mackintosh ainda é


marcante, mas Cauchie permite-se, no interior, a uma doçura e sensualidade que
poderiam ter sido levadas para a fachada. A Maison Cauchie é um sucesso requintado
e frágil de um movimento cuja robustez vitalícia se esgotou em poucos anos, porém
anos suficientes para que Bruxelas seja a “capital” do Art Nouveau europeu. (Aubry,
2005, p. 17)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 35 - Interior da Maison Cauchie arq. Paul Cauchie, Bruxelas,1905. ([Adaptado a partir de:] Aubry 2006, p. 201).

Em 1905, o arquitecto austriaco, Josef Hoffmann e a Wiener Werkstätte receberam a


encomenda de uma casa privada para um rico banqueiro de Bruxelas, Adolphe Stoclet.
O edifício revela influências da Secessão Vienense e incorpora o ideal do
Gesamtkunstwerk (obra de arte total). O contraste que ofereceu com as obras
produzidas pelo Art Nouveau belga foi surpreendente: nem tratamento plástico das
fachadas nem estruturas expostas, mas superfícies planas de mármore estritamente
emolduradas de molduras de bronze douradas. O desaparecimento da linha belga
concretiza-se com a construção do Palais Stoclet de Josef Hoffman, em 1906.

Ilustração 36 - Palais Stoclet, arq. Josef Hoffmann, Bruxelas, 1906. (Ilustração nossa, 2018).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 37 - Detalhe da cobertura, Palais Stoclet, arq. Josef Hoffmann, Bruxelas, 1906. (Ilustração nossa, 2018).

A segunda geração de arquitetos como Gustave Strauven e Ernest Blérot fizeram-se


notar mais pelo tratamento decorativo e menos pela arquitetura das fachadas. Strauven,
jovem arquiteto e inventor, aluno de Victor Horta deu ao Art Nouveau um sentido quase
barroco. Nas suas casas, que poderiam vir de contos de fadas, Strauven mostra o seu
virtuosismo e a sua imaginação, entre as sumptuosas fachadas e as decorações florais.
(Meers, 1996, p. 123)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 38 - Maison Saint-Cyr, arq. Gustave Strauven, Bruxelas, Ilustração 39 - Maison Gustave Strauven, arq. Gustave
1900. (Ilustração nossa, 2018). Strauven, Bruxelas, 1902. (Ilustração nossa, 2018).

Ernest Blérot por sua vez não procurou como Victor Horta revolucionar a arquitetura. O
seu talento e a sua imaginação fértil são expressos a um nível decorativo. A maior parte
do seu trabalho é produzida especialmente entre os anos de 1898 e 1904, e é o próprio
arquiteto que desenha os vitrais, esgrafitos, ferragens, mosaicos, elementos de
marcenaria ou maçanetas. (Aubry, 2006, p. 77-78)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 40 - Maison 1904, Avenue Charles de Gaulle, arq. Ernest Blérot, Ilustração 41 - Maison Ernest Blérot, arq. Ernest
1904, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2018). Blérot, Bruxelas, 1902. (Ilustração nossa, 2018).

Fazendo a leitura do friso cronológico seguinte, onde se encontram as principais obras


do arquitecto Victor Horta, em Bruxelas, podemos constactar que o período onde se
concentram mais construções foi no final do séc. XIX, seguido das primeiras décadas
do séc XX, onde se demonstra um decréscimo de obras, que caracteriza a segunda
parte da carreira do Pós-Guerra de Victor Horta. É curioso que podemos fazer a mesma
leitura na evolução das obras de outros arquitectos como Henry Van de Velde ou Paul
Hankar, que realizaram as suas obras principalmente na última década do séc. XIX. Já
arquitectos como Paul Cauchie, Josef Hoffman, Gustave Strauven e Ernest Blérot
constatamos que realizaram as suas principais obras no início do séc. XX.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 42 - Localização temporal das principais obras de Victor Horta em Bruxelas. (Ilustração nossa, 2020).

2.3. O ART NOUVEAU NA EUROPA

O Art Nouveau teve uma grande expressão e expansão, um pouco por toda a Europa,
com uma maior concentração na Europa Central e do Norte, como demonstra o mapa
em baixo. Iremos ver como o Art Nouveau difere de país para país, tendo cidades mais
representativas que outras, durante o seu apogeu, como iremos analisar mais à frente.
Podemos agrupar esta expansão temporal em dois grupos: um com maior expressão
na última década do séc. XIX, em cidades como Bruxelas (Bélgica), que analisámos
anteriormente, mas também em Glasgow (Grã-Bretanha), Viena (Áustria) e Barcelona
(Espanha); e um outro na primeira década do séc. XX, em cidades como Paris (França),
Darmastadt (Alemanha), Praga (Républica Checa), Turim (Itália), La Chaux-de-Fonds
(Suiça), Liubliana (Eslovénia), Budapeste (Hungria), Riga (Letónia) e Helsínquia
(Finlândia).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 43 - Localização espacial da expansão do Art Nouveau na Europa. (Ilustração nossa, 2020).

2.3.1. FRANÇA – PARIS

Em 1895, o arquiteto francês Hector Guimard (1867-1942) descobriu os trabalhos de


Horta em Bruxelas. Nesta altura Guimard está ocupado a desenvolver o projeto para o
Castel Béranger (1894-98), cuja conceção é fortemente inspirada em Viollet-le-Duc, e
introduz uma nova forma de arquitetura em Paris, resolvendo assim de maneira inédita
o programa de habitação coletiva. Guimard organiza o espaço de maneira a
proporcionar uma iluminação natural dos interiores e desenha as fachadas combinando
formas e materiais inovadores.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 44 - Detalhe do Castel Béranger, arq. Hector Guimard, Paris, 1894-98.


(Ilustração nossa, 2016).

Ilustração 45 - Detalhe do Castel Béranger, arq. Hector Guimard, Paris, 1894-98.


(Ilustração nossa, 2016).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

O encontro com Horta provocou em Guimard um impulso criativo que o leva a explorar
todas as possibilidades do ornamento linear e nervoso, sem esquecer as máscaras e
os animais fabulosos. Quando Paris veiu à cena internacional com a Exposição
Universal de 1900, mesmo Guimard não participando na exposição, a sua obra espalha-
se por toda a cidade, graças às bocas de entrada do metro parisiense que deram a
conhecer aos visitantes a exposição. O ferro fundido favorece a produção dos elementos
com formas moldadas que permite variar de combinações, adaptando-se às
necessidades de cada estação. A sua linguagem abstrata, contudo, fortemente
inspirada na natureza, invade a cidade e ficando conhecida pelo nome de Style Métro.
(Gracmon, 2007, p. 177)

Ilustração 46 - Entrada da Estação de Metro Abbesses, arq. Hector Ilustração 47 - Detalhe da entrada da Estação de Metro
Guimard, Paris, 1912. (Ilustração nossa, 2016). Palais Royal / Musée du Louvre, arq. Hector Guimard, Paris,
1900. (Ilustração nossa, 2016).

Entre as encomendas de Guimard estão casas de particulares (Hotel Nozal, 1904, Hotel
Mezzara, 1910-1911), a casa pessoal de Guimard (1909-1913), uma sala de
espetáculos (Humbert de Romans, 1897-1901), casas de campo, prédios de
apartamentos e uma sinagoga.

Atualmente, no seio da arquitetura monumental de Paris, podemos seguir os traços do


movimento Art Nouveau, tanto através de obras de Guimard e Xavier Schoellkopf, que
animam as fachadas dos seus edifícios de ornamentos suaves; Jules Lavirotte pela sua
cerâmica e decoração extravagante; Charles Plumet pelo seu racionalismo e medida,
este último particularmente digno de nota. O Art Nouveau foi essencialmente empregue
para obras efêmeras: salas de espetáculo, grandes lojas (o Grand Bazar, Rue de
Rennes, Henri Gutton, La Samaritaine, rue de Rivoli, Frantz Jourdain), restaurantes,
cafés. (Husson, 2011, p. 49)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 48 - Hotel Mezzara, arq. Hector Guimard, Paris, 1910-11. (Ilustração nossa, 2016).

Ilustração 49 - Avenue Rapp, arq. Jules Lavirotte, Paris, 1901. (Ilustração nossa, 2016).

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2.3.2. REINO UNIDO – GLASGOW

No final do século XIX, Glasgow era a segunda maior cidade do Império Britânico. O
desenvolvimento da indústria e do comércio é tal, que se estima que no virar do século
a cidade tivesse cerca de três mil estudantes de Design. (Husson, 2011, p. 113) A
Glasgow School of Art, influenciada pelo movimento do Arts & Crafts, cujo grupo de
designers The Four, composto por Charles Rennie Mackintosh, Margaret e Frances
Macdonald, e Herbert McNair, formados nesta escola, e o grupo de pintores Glasgow
Boys e Glasgow Girls, tornar-se-ão o motor cultural da alta sociedade, desejosa de
investir em bens artísticos, no seio de uma cidade desprovida de uma sólida tradição
cultural e arquitetural. (O quarteto experimentará várias técnicas: o metal gravado, os
vitrais, os bordados, o gesso, o desenho) O edifício que simbolisa o Glasgow Style e
que faz parte da história da arquitetura europeia é a sede da Glasgow School of Art. O
projeto de Charles R. Mackintosh, cuja construção se fará em duas fazes, visa conferir
uma imagem mais artística que técnica à escola. Charles R Mackintosh privilegia as
salas de estudo aos ateliers, a decoração integral dos espaços e a utilização de novas
formas para o tratamento dos volumes.

Ilustração 50 - Glasgow School of Art, arq. Charles Rennie Ilustração 51 - Mackintosh House, arq. Charles Rennie
Mackintosh, Glasgow. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. Mackintosh, Glasgow. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p.
112). 115).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

O grupo The Four, dirigido pelas irmãs Macdonald e pelos artistas da Glasgow School
tais como Georges Walton, Ann Macbeth e Jessie King, introduz no resto da Europa, a
planimetria da arte japonesa, as figuras pré-rafaelitas inglesas e a paixão pelas artes
decorativas estilizadas, sóbrias e lineares. (Gracmon, 2007, p. 95) O trabalho de
Mackintosh agradou a Srta. Cranston, que o encarregou de decorar vários salões de
chá na cidade. Para o Argyle Street Tearoom (1897), ele desenha uma cadeira com um
encosto muito alto que estrutura o espaço, funcionando como uma tela. Em 1896 venceu
o concurso para a Escola de Artes, construído em duas fases (1896-1906 e 1907-1909).
Mackintosh participou da competição lançada pela revista Innendekoration e em 1901,
entregou o seu projeto House for an art lover, que despertou grande interesse na
Alemanha e na Áustria, a ponto de influenciar Josef Hoffmann durante o projeto do
palácio Stoclet, em Bruxelas. (Husson, 2011, p. 113)

Ilustração 52 - Glasgow School of Art, arq. Charles Rennie Mackintosh, Glasgow. ([Adaptado a partir de:] Husson, 2011, p. 113).

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2.3.3. ÁUSTRIA – VIENA

Em 1897, o Conselho Municipal de Viena cedeu um terreno à nova associação de


artistas, conhecida como a Secessão Vienense, presidida pelo pintor Gustav Klimt e
nascida da divisão da Kunstlerhaus. No pavilhão de exposições a ser construído, Joseph
Maria Olbrich queria transmitir uma sensação de pura dignidade que lembrava a Grécia
antiga. O frontão tem o lema do grupo: “A cada época, sua arte. A cada arte, sua
liberdade”. O edifício estava pronto para a segunda exposição da Secessão, que
continha projetos do mestre de Olbrich, Otto Wagner, bem como obras de Ashbee,
Morris, Crane e Hoffmann.

Ilustração 53 - Casa da Secessão Vienense, arq. Joseph Maria Olbrich, Viena, 1897. (Ilustração nossa, 2017).

Em 1903, nascem os Wiener Werkstätte sob a direção de Josef Hoffmann e Koloman


Moser, encorajados por Charles R. Mackintosh a produzir objetos autenticamente
modernos. A exuberância decorativa da Majolika Haus, de Otto Wagner em Viena, ou a
Sala vienense de Olbrich na exposição de Paris, em 1900, dão lugar à busca pela
simplicidade: as formas cúbicas são reforçadas com elementos decorativos, que
adquirem uma força extraordinária pela sua colocação em grandes superfícies planas.
A primeira grande encomenda dos Wiener Werkstätte é o Sanatório de Purkersdorf em
1904.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 54 - Casa Majolika, arq. Otto Wagner, art. Koloman Moser, Viena, 1898. (Ilustração nossa, 2017).

Ilustração 55 - Casa Majolika, arq. Otto Wagner, art. Koloman Moser, Veina, 1898. (Ilustração nossa, 2017).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Além dos Wiener Werkstätte, muitos outros artistas enriqueceram a obra do panorama
Art Nouveau: Michael Powolny, Carl Otto Czeschka, Richard Luksch e Frantz Metzner.
Gustav Klimt fez um friso para a sala de jantar mais elaborado do que o mosaico
bizantino que ele tanto admirava, combinando pedras finas, vidrado, repuxado de metal,
mármore, pintura - uma obra cuja riqueza poderia rivalizar com a beleza das coleções
de antiguidades de Adolphe Stoclet. Enquanto Hoffmann e os Wiener Werkstätte
trabalhavam para uma clientela rica, Otto Wagner deixou sua marca na cidade,
enquanto os seus estudantes disseminavam as suas teorias e a sua linguagem
arquitetural em todo o Império Austro-Húngaro. Otto Wagner trabalhou durante muito
tempo nos planos de desenvolvimento de Viena. Como assessor artístico do Comité dos
Transportes e da Comissão para a Regulamentação das Águas do Canal do Danúbio,
é autor de numerosas estações de comboios e de metro, pontes, comportas. As
estações de Schönbrunn (Hofpavillon) e Karlsplatz (1898-1899) combinam o
historicismo e o Art Nouveau.

Ilustração 56 - Estacão de metro Karlsplatz, arq Otto Wagner, Viena, ilustração nossa, 1899. (Ilustração nossa, 2017).

As duas casas que construiu para uso pessoal (em 1886-1888 e em 1912-1913)
mostram a evolução do historicismo pela procura de um volume compacto, ritmado por
aberturas da mesma proporção e sobriamente decorado com motivos geométricos.

João Miguel Aldeias Correia 78


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Estas últimas características já estavam presentes nos edifícios do Banco de Poupança


(1904-1906) e da igreja Am Steinhof (1905-1907), construída dentro de um hospital
psiquiátrico, cujas fachadas estão cobertas com um revestimento de placas de mármore
fixadas por pregos de metal. É um raro exemplo de Art Nouveau aplicado a um edifício
religioso. A sua beleza deveria exercer um efeito terapêutico. A influência de Wagner foi
também transmitida pelas suas publicações, nomeadamente Einige Skizzen, Projekte
und ausgeführte Bauwerke (1889, 1897, 1906, 1922) e Modern Architektur (1895, 1899,
1902). (Husson, 2011, p. 117)

Ilustração 57 - Capela St. Leopold-am Steinhof, art.Koloman Moser, Viena, 1907. (Ilustração nossa, 2017).

Ilustração 58 - Vitral da capela St. Leopold-am Steinhof, art. Koloman Moser, Viena, 1907. (Ilustração nossa, 2017).

João Miguel Aldeias Correia 79


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 59 - Hoher Markt 10, art Franz von Matsch, Viena, 1911-17. (Ilustração nossa, 2017).

2.3.4. ESPANHA – BARCELONA

Como na maioria das cidades com um importante património Art Nouveau, a explosão
demográfica de Barcelona leva à criação de um novo e gigantesco projeto de extensão
projetado em 1859 por Cerdà. Finalmente, em 1891, uma modificação do regulamento
municipal permitiu a adoção de um novo modelo de cidade que iria quebrar a
regularidade das fachadas no centro histórico. Além da permissão para construir
edifícios mais altos e profundos, foi também autorizado o projeto de fachadas muito
complexas. Era possível cobrir as varandas com tribunas, modificar as cornijas e linha
cércea dos edifícios, ou mesmo construir cúpulas e rotundas nos cantos. Esses fatores
determinam uma mudança radical no desenho da arquitetura dos edifícios, dando
liberdade à criatividade que caracteriza o modernismo. (Gracmon, 2007, p. 51)

Já em 1880, Gaudí testemunhou o seu carácter original, transformando à sua própria


maneira, formas herdadas dos estilos Neomudéjar e Gótico: as ferragens da Casa
Vicens (1883-1888) ou da Finca Güell (1884-1887) são de uma extraordinária riqueza
ornamental.

João Miguel Aldeias Correia 80


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 60 - Detalhe do portal da natividade na Sagrada Família, arq Antoni Gaudí, Barcelona, 1883-inacabada até hoje. (Ilustração
nossa, 2014).

A força do trabalho da indústria siderúrgica foi acentuada pela delicadeza no tratamento


dos tijolos, pelos revestimentos em esgrafito, os azulejos e mosaicos coloridos. Gaudí
pôde expressar de maneira única a interioridade através de simples corredores
pontuados por arcos parabólicos (colégio Teresiano de Barcelona, 1889-1894), a loggia
e a claraboia central do palácio Güell (1886), as abóbadas de tijolo da capela da Colonia
Güell (1898-1915).

Ilustração 61 - Claraboia central do palácio Güell, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1886. (Ilustração nossa, 2014).

João Miguel Aldeias Correia 81


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

A Sagrada Família, que ele realizou em 1883 é uma obra titânica, inacabada até hoje,
destinada a celebrar a fé e os seus mistérios, bem como admirar a natureza. Embora
Gaudí usasse frequentemente motivos naturalistas, ele podia também tornar-se mais
alusivo, como na Casa Milá, onde a massa de pedra criada pelo edifício evoca uma
montanha, e as chaminés os guerreiros a montar guarda, ou como na Casa Batlló, cuja
escada dá a impressão de entrar no interior de um organismo vivo.

Ilustração 62 - Sagrada Família, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, Ilustração 63 - Interior da Sagrada Família, arq. Antoní Gaudí,
1883-inacabada até hoje. (Ilustração nossa, 2014). Barcelona, 1883-inacabada até hoje. (Ilustração nossa, 2014).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 64 - Casa Milá, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1905-07. (Ilustração nossa, 2014).

Ilustração 65 - Casa Batlló, arq. Antoní Gaudí, Barcelona, 1877. (Ilustração nossa, 2014).

João Miguel Aldeias Correia 83


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

De 1905 a 1914, Josep Maria Jujol colaborou com Gaudí, trazendo a sua sensibilidade
pela cor e modelagem. Lluis Domenech i Montaner transformou as colunas do Palacio
de la Musica Catalana em árvores floridas. No interior, a excitação dos sentidos da
música é exaltada pela luz cintilante da cúpula invertida, pela cor dos vitrais e mosaicos
e pelo movimento das grandes esculturas da entrada que evocam a paixão da época
pelas óperas de Wagner. O temperamento de Domenech i Montaner apareceu um
pouco mais pacífico na Casa Navas de Reus (1901-1907) e no Hospital Sant Pau de
Barcelona (1902-1911). (Husson, 2011, p. 77)

2.3.5. ALEMANHA – MUNIQUE E DARMASTADT

Munique e Darmstadt são os dois principais centros de desenvolvimento do Jugendstil.


Na Baviera, um grupo de artistas produziu uma variante do Jugendstil inscrevendo-se
na linha do Arts and Crafts. Em 1900, na Exposição Mundial de Paris, Richard
Riermerschmid expôs, A Room for an Art Lover, no qual o ornamento orgânico ainda
está presente. Mais tarde ele abandona-o, retirando o efeito decorativo da beleza própria
da madeira e das proporções. Teve igualmente atividade como arquiteto e construiu em
1901 em Munique um teatro moderno, num estilo Jugendstil bem conseguido. Bernhard
Pankok ofereceu uma faceta mais excêntrica do estilo de Munique, como demonstram
as suas participações nas exposições de Paris em 1900, Turim em 1902 e Saint Louis
em 1904. Foi também pintor e ilustrador (Jugend, Innendekoration), como Otto
Eckmann, mas mais marcado pela arte japonesa e adepto de um estilo mais naturalista.
Todos os três estão relacionados com Herman Obrist, que fundou sua própria escola
em 1902.

João Miguel Aldeias Correia 84


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 66 - Torre do Casamento e Edifício das de Exposições, arq. Joseph Maria Olbrich, Instituto Mathildenhöhe, Darmstad, 1905-
1908. ([Adaptado a partir de:] Gracmon, 2007, p. 80).

Em 1899, o Grão-Duque de Hesse convidou sete artistas para se instalarem em


Darmstadt, na colina de Mathildenhöhe. O austríaco J. M. Olbrich, foi o único arquiteto
do grupo, ocupando um lugar preponderante. Ele foi responsável pela implantação
geral, da construção de oficinas (Ernst-Ludwig Haus) e várias casas, bem como os
edifícios temporários da exposição de 1901. Em 1905, Olbrich recebeu a encomenda
de uma torre, a Torre do Casamento em forma de mão, que ficava em frente de uma
sala de exposições: as duas construções são inauguradas no momento da terceira
exposição da Colonia, em 1908. Cada um desses eventos deixará os seus vestígios:
fontes, espelhos de água com nenúfares, bosques de plátanos decorados com as
esculturas de Bernard Hoetger. O Mathildenhöhe é um museu a céu aberto, mas no
início era um lugar onde arte e vida se fundiam idealmente na procura de clareza,
simplicidade e elevação espiritual.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 67 - Relógio de Sol da Torre do Casamento


(Hochzeitsturm), arq. Joseph Maria Olbrich, Instituto Mathildenhöhe,
Darmstad, 1905-1908. ([Adaptado a partir de:] Gracmon, 2007, p. 80).

Ilustração 68 - Entrada da Casa de Ernst-Ludwig, arq. Joseph Maria Olbrich,


Instituto Mathildenhöhe, Darmstad, 1901. ([Adaptado a partir de:] Gracmon,
2007, p. 80).

Peter Behrens desenhou a sua casa pessoal em Darmstadt onde abordou todos os
domínios das artes aplicadas. Quanto a Hans Christiansen, adepto de uma linha floral
influenciada pelo Art Nouveau francês, era também um grande admirador da arte
popular e do que acreditava serem as qualidades fundadoras de uma arte futura:
simplicidade, natureza e poesia.

João Miguel Aldeias Correia 86


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 69 - Casa do arquiteto Peter Behrens, arq. Peter Ilustração 71 - Painél em alro relevo com Torre do Casamento em
Behrens, Instituto Mathildenhöhe, Darmstad, 1901. ([Adaptado plano de fundo, arq. Joseph Maria Olbrich, Instituto
a partir de:] Gracmon, 2007, p. 79) Mathildenhöhe, Darmstad, 1914. ([Adaptado a partir de:]
Gracmon, 2007, p. 81).

Ilustração 70 - Interior do Museu Künstlerkolonie, Instituto


Mathildenhöhe, arq. Joseph Maria Olbrich, Darmstad, 1905-
1908. ([Adaptado a partir de:] Gracmon, 2007, p. 81).

A Alemanha e os países escandinavos compartilham um estilo particular, o "estilo


dragão", que pode ser mesclado com o Art Nouveau. Este estilo foi inspirado nas sagas,
na mitologia nórdica e nas descobertas arqueológicas dos navios vikings. (Husson,
2011, p. 105)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

2.3.6. REPÚBLICA CHECA – PRAGA

A expansão do Art Nouveau em Praga vai de mãos dadas com o desenvolvimento de


novos bairros no final do século XIX. A Checoslováquia, que estava vivenciando um
forte crescimento industrial, queria adquirir mais autonomia dentro do Império Austro-
Húngaro. Praga estava obviamente sujeita à influência de Viena, onde os seus
arquitetos eram frequentemente formados, mas essa influência era contrabalançada por
aquelas que exerceram as tendências mais recentes da Inglaterra e de Paris. Nesta
última cidade, um dos seus cidadãos, o pintor e decorador Alfons Mucha conquistou
grande reputação graças aos seus cartazes. Sendo um fervoroso defensor da causa
eslava, ele decorou o Pavilhão da Bósnia e Herzegovina na exposição de Paris em
1900. Nesta ocasião, pela primeira vez, os checos puderam apresentar de forma
independente o "Escritório de um intelectual checo" um conjunto de Josef Fanta e Jan
Koula com influência do Arts and Crafts inglês e que é premiado com uma medalha de
ouro.

Ilustração 72 - Interior da estação de comboios, arq. Josef Fanta, Praga, 1909. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Em Praga, na segunda metade do século XIX, os estilos Neorrenascentista e


Neobarroco foram uma resposta aceitável à procura de um estilo nacional. Muito
naturalmente, o Neobarroco amalgamar-se-á com o Art Nouveau: o exemplo mais belo
é constituído pela Câmara Municipal (1906-1911) de Osvald Polívka e Antonin Balšének
chamada a ser um ex-libris da vida cultural de Praga. Esta incluía uma sala de concertos,
salas de exposições e restaurantes. Os maiores artistas checos colaboram na
decoração: entre eles estão os pintores Alfons Mucha, Jan Preisler e Karel Špillar e o
escultor Ladislav Saloun.

Ilustração 73 - Câmara Municipal, art. Ladislav Saloun e Karel Novák, Praga, 1906-1911. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

O Art Nouveau em Praga é caracterizado pela riqueza do trabalho de escultura: as


figuras de vulto são abundantes e as fachadas são erguidas com estuque exuberante e
mosaicos cujos temas são inspirados na natureza e no folclore. O Art Nouveau usado
em Praga em hotéis, lojas e prédios de apartamentos, bem como em edifícios públicos,
como a estação de comboios, projetada por Josef Fanta (1900-1909). O Art Nouveau é
especialmente visível na decoração. Raramente toca a estrutura do edifício, como é o
caso da Casa Peterka de Jan Kotěra (1899-1900), que trai a influência de Victor Horta.
Por volta de 1908, a exuberância do estilo acalmou para dar lugar a composições mais
geométricas. (Husson, 2011, p. 129)

Ilustração 74 - Hotel Central, arq. Friedrich Ohmann, Praga, 1898-1900. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 75 - Hlahol, arq. Josef Fanta, Praga, 1903-1906. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

3. AUTENTICIDADE DO ART NOUVEAU

“[…] comme il causait un jour avec le brillant architecte belge, celui-ci lui lança cette
boutage: «Ce n'est pas la fleur, moi, que j'aime à prendre comme élément de décor, c'est
la tige!»" 16 (Hector Guimard, citando Victor Horta, 1899 apud Evrard, 1996, p. 44)

3.1. VICTOR HORTA (GHENT, 06/01/1861; BRUXELAS, 08/09/1947)

Ilustração 76 - Retrato de Victor Horta. ([Adaptado a partir de:] Schuiten,1996, p. 6).

16[…] enquanto me cruzava um dia com o brilhante arquiteto belga, este disse-me:" Não é a flor que eu
gosto de ficar como elemento de decoração, é o caule. (tradução nossa)

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Nascido em 1861, o arquiteto Victor Horta é o líder indiscutível do Art Nouveau na


Bélgica, essencialmente na paisagem arquitetural de Bruxelas, já que é na capital que
se encontram a maioria das suas obras. Filho de um mestre sapateiro, que lhe transmitiu
o gosto por um trabalho bem feito e pela perseverança, Horta destaca-se desde muito
jovem pelo seu amor à música, principalmente o violino, tendo mesmo para o
Conservatório de Música, e a arquitetura. Após um estágio aos 12 anos, no estaleiro de
obras de um tio empreendedor, escolheu a arte de construir e integrou o departamento
de arquitetura da École des Beaux-Arts de Ghent.

Aos 17 anos, foi para Paris, onde trabalhou dois anos para um arquiteto de Montmartre
e se impregnou com entusiasmo na efervescência artística e técnica da cidade luz.

De volta a Bruxelas, matriculou-se na ARBA e trabalhou intermitentemente nos


escritórios de arquitetura de Alphonse Balat17 (1818-1895), a quem devemos as
majestosas Estufas de Laeken, em Bruxelas, que lhe incutiu o amor pelo clássico e a
quem Horta dedicará durante toda a vida um imenso reconhecimento. Horta inicia a
construção em 1890 de um pavilhão destinado a abrigar uma escultura monumental de
Jef Lambeaux, simbolizando as Paixões Humanas no parque do Cinquentenário, em
Bruxelas. Este foi o seu primeiro projeto oficial, constituindo para o arquiteto um
verdadeiro desafio, pois desejava impor-se na capital belga.

"On s'est imaginé que les lignes courbes que j'ai introduites dans mon architecture étaient
de la fantasie? J'étais à leur recherche depuis ma sortie d'école et encore quan j'étais
chez Balat et sous sa pleine influence. L'édicule du Cinquentenaire en est la preuve: il
n'y a pas une seule droite, toutes les verticales sont courbes. Cepandant, cette recherche
partait du même esprit, car elle partait du galbe des colonnes, galbes séculaire, mais
qu'on n'avait, en aucun temps, traduit ou transposé aux autres éléments de
l'architecture."18 (Victor Horta, 1985 apud Evrard, 1996, p. 10)

17 Alphonse Balat é um arquitecto belga, que propõe uma arquitectura clássica inspirada na Antiguidade do
renascimento italiano, Ele foi igualmente o mentor de Victor Horta.
18 Imaginamos que as linhas curvas que introduzi na minha arquitetura eram fantasias? Eu procurava-as

desde que saíra da escola e ainda estava em Balat e sob sua influência total. O santuário do Cinquentenário
é a prova disso: não existe uma única linha reta, todas as verticais são curvas. Contudo, esta busca partiu
do mesmo espírito, pois ela partia da curva das colunas, curva secular, mas que não havia, em nenhum
momento, traduzido ou transposto aos outros elementos da arquitetura. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 94


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 77 - Pavilhão das Paixões Humanas, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1889-1905. (Ilustração nossa, 2019).

É um personagem rebelde que está na raiz do espírito inventivo de Horta. Entre os seus
princípios: a recusa de estar na moda para poder criá-la.

Ele, que às vezes foi apelidado de “l’arquisec” pelas suas opiniões fortes e gracejos fez
tábua rasa de todos os estilos historicistas que o precederam. Ele desejava construir
para todos, edifícios plenos de luz, entusiasmo e energia em reação à industrialização
que escureceu essa época.

Ao princípio, Horta constrói muito pouco (três casas em Ghent), mas refina o seu
conhecimento técnico e, de acordo com a sua pesquisa artística, cria a sua própria
sensibilidade. (Aubry, 2005, p. 11) Após esse período de amadurecimento artístico,
aceitou os seus primeiros pedidos de residências, para a nova burguesia de Bruxelas
que também frequentava. Esses clientes deixam-lhe uma grande liberdade de criação
e essa confiança permitiu-lhe colocar em prática a nova arquitetura que procurava, com
um estilo amplamente inspirado nas curvas da natureza e onde diferentes materiais
estão entreligados. Mais do que uma imitação da natureza, Horta tende, por essas
curvas, a ampliar a impressão do espaço e a dar vida à matéria inanimada. (Borsi &
Portoghesi. 1990, p. 19) Livre de qualquer patrocinador, Horta atinge a meta que
estabeleceu para si mesmo: criar obras livres, com cunho pessoal nas quais afirma os
grandes princípios da sua arte: racionalidade e força, mas também beleza e
sociabilidade.

João Miguel Aldeias Correia 95


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

"Horta a-t-il lu Jules Verne? Nous ne le saurons jamais; portant, son architecture est
imprégnée d'un espoir d'aventure et de decouverte; elle a l'ambition de proposer des
images inédites où, a côté d'influences historiques évidentes, surgit de façon continuelle
la vision d'un avenir dans lequel le comportement humain se transforme en fonction de
nouvelles réalités techniques et de nouveaux idéaux de liberté."19 (Portoghesi, 1970 apud
Evrard, 1996, p. 32)

E para completar o seu trabalho, e muito importante a seus olhos, Horta também
estendeu a sua visão artística ao interior dos edifícios, a fim de conceber um todo
harmonioso, integrando em simbiose móveis, ferragens, tapeçarias e objetos de
decoração.

Os Hôtel Tassel (1893), Solvay (1894), Van Eetvelde (1895) e a sua casa pessoal e
atelier (1898), em Bruxelas, são hoje os vestígios mais ilustres, todos bens patrimoniais
classificados pela UNESCO. Este é o início de uma longa série de jóias que adornam
Bruxelas de edifícios com espaços inovadores, vidros luminosos, nos antípodas da
banalidade.

Paralelamente às encomendas residenciais, Horta volta-se para os projetos públicos e


os grandes edifícios como L’Innovation (1901, destruída num incêndio em 1961) ou a
Maison du Peuple (1895, demolida em 1965), uma das suas maiores obras que
simboliza a seus olhos os ideais do progresso associados ao Art Nouveau.

Horta consagra igualmente uma parte do seu tempo ao ensino, na ULB (1892-1911) e
na ARBA de Bruxelles onde propõe uma reforma no ensino (1913-1916). Em 1916 as
autoridades alemãs impedem-no de regressar a Bruxelas, depois da sua participação
num congresso em Londres, levando-o a exilar-se nos Estados Unidos. A sua estadia
permite-lhe descobrir lógicas de estandardização e de produção em série, às quais ele
se opunha ferozmente, dando-lhe uma visão mais flexível na maneira como os via.
(Borsi & Portoghesi,1990, p. 178)

Mas a tendência Art Nouveau, mesmo que se tenha estabelecido na Europa e mesmo
revolucionado a arquitetura e as artes visuais da época, ainda assim teve curta duração.
A geometria, já anunciando as formas Art Déco, recupera os seus direitos, mantendo
uma nova harmonia inventada pelos criativos do início do século. Aqui também Horta
mostra grande domínio: uma parte de sua obra menos conhecida do público em geral e
que ainda precisa ser descoberta. Após a prolongada estadia nos Estados Unidos

19Horta leu Jules Verne? Nunca o saberemos; portanto, a sua arquitetura está imbuída de uma esperança
de aventura e descoberta; ela tem a ambição de propor imagens inéditas onde, ao lado de influências
históricas óbvias, a visão de um futuro em que o comportamento humano se transforma em função das
novas realidades técnicas e dos novos ideais de liberdade. (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

durante a I Guerra Mundial, Victor Horta regressa a Bruxelas e tráz consigo uma nova
visão, mais simples, da arquitetura. Esta nova visão, poderá ser consequência da
influência de Frank Lloyd Wright que, assim como Horta na Europa, era uma figura
chave na arquitetura orgânica e um arquiteto de referência na arquitetura moderna dos
Estados Unidos, também conhecido como International Stlyle.

Ilustração 78 - Robie House, arq. Frank Lloys Wright, Chicago, 1908. ([Adaptado a partir de:] Tim Long, Frank Lloyd Wright Trust,
2019).

Wright foi o criador da Prairie School, movimento da arquitetura ao qual pertencem os


projetos da Robie House (projectada em 1908, exerceu uma profunda influência nos
jovens arquitetos europeus após a I Guerra Mundial). Estas casas de pradaria eram
marcadas por linhas horizontais com estruturas baixas, coberturas planas ou
ligeiramente inclinadas, saliências e terraços, de construção sólida, com paredes em
textura ou relevo, e economia no uso de ornamentos. Estas casas são as primeiras, nos
Estados Unidos, a apresentarem o sistema de planta aberta, à semelhança do que Horta
fez, em Bruxelas. Tal influência em Horta é caracterizada pour um retorno ao clássico,
às linhas retas e simples, em grandes projetos de cariz estatal, como o Palais des
Beaux-Arts (1919) ou da Gare Central (1937), em Bruxelas, que caracterizam a segunda
parte da sua carreira do Pós-Guerra. A partir daqui todos os clientes o chamam e
confiam-lhe outras grandes obras como o Musée des Beaux-Arts, em Tournai ou o
Hôpital Brugmann, em Bruxelas, entre outras.

João Miguel Aldeias Correia 97


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 79 - Musée des Beaux Arts, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1919-1928. (Ilustração nossa 2018).

Ilustração 80 - Projeto definitivo de 1936, Gare Central, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1937-1952. ([Adaptado a partir de:] Dulière, 1985,
p. 276).

João Miguel Aldeias Correia 98


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 81 - Entrada Gare Central, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1937-1952. Ilustração 82 - Detalhe da fachada, Gare Central,
(Ilustração nossa, 2018). arq. Victor Horta, Bruxelas, 1937-1952. (Ilustração
nossa, 2018).

"De là Monsieur Horta passa au culte de la ligne droite et calme, comme par exemple,
dans le pavillon de la Belgique aux Arts décoratifs de Paris en 1925, qui préluda au Palais
des Beaux-Arts de Bruxelles, donc l'unité et la régularité s'ornent de caprices
ornamentaux de l'invention la plus sûre...on ne peut qu'admirer la maîtrise de M.Horta à
qui nous devons un outil que le monde nous envie, un cadre prestigieux pour les
manifestations de la vie intellectuelle et artistique, un temple quasi souterrain, où
s'entretient, en un continuel festival, le feu sacré."20 (La Flandre Libérale, 1934 apud
Evrard, 1996, p. 116.)

Construiu também o Pavilhão de honra da Bélgica na Exposição Internacional de Artes


Decorativas e Industriais Modernas, realizada em Paris em 1925. Essas obras titânicas
fazem a glória nacional e valem-lhe a Legião de Honra e o título de Barão atribuído pelo
rei Albert I em 1932. Nos últimos anos da sua vida e apesar do reconhecimento unânime
da sua obra, Horta, o arquiteto moderno, é amargurado e melancólico, sabe que a
arquitetura que ele defendeu durante toda a sua vida tornou-se “fora de moda”, de estilo
pesado, demasiado pessoal e arrependeu-se de nunca ter publicado as suas obras, o
que o levará, paradoxalmente, a tomar a triste decisão de destruir a maioria dos seus
arquivos e desenhos. As suas memórias escritas em 1939 permitirão lembrar-nos das
grandes ideias e de traçar a vida deste génio arquiteto que morreu em 8 de setembro
de 1947. (Aubry, 2005, p. 19)

20A partir daí, o Sr. Horta passou para o culto da linha reta e calma, como por exemplo, no pavilhão da
Bélgica para as Artes Decorativas de Paris em 1925, que antecedia o Palácio das Belas Artes de Bruxelas,
cuja unidade e a regularidade é adornada com caprichos ornamentais da invenção mais acertiva...só
podemos admirar a mestria do Sr. Horta a quem devemos uma ferramenta que o mundo nos inveja, uma
estrutura de prestígio para as manifestações da vida intelectual e artística, um templo quase subterrâneo,
onde se desenrolam, num contínuo festival, o fogo sagrado. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 99


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

3.2. FORTÚNIOS E INFORTÚNIOS DA OBRA DE VICTOR HORTA

Analisaremos neste texto, o destino de alguns dos edifícios de Victor Horta durante o
século XX, edifícios que foram, às vezes, brutalmente destruídos, como o Hôtel Aubecq
em 1950 ou a Maison du Peuple em 1965, ou transformados nas suas fachadas. Os
destinos dos edifícios de Horta refletem a evolução da aparência do Art Nouveau e a
fragilidade de uma obra arquitetónica celebrada na sua época.

“Ma fidélité au programme donné, la préoccupation de l’emploi maximum du terrain


étaient autant d’obstacles se heurtant au thème d’extension, car il est impossible de
prévoir dans cette voie des ajouts sans savoir d’où ils viendraient et quelle serait leur
importance. De même en était-il de mon architectonique qui visant à être, non un style,
mais la simple expression de mes goûts et de mes capacités, dénuées de tout emprunt,
loin de s’inscrire dans l’oeuvre permanente tend vers l’oeuvre passagère."21 (Victor Horta
apud Dulière, 1985, p. 60)

“J’étais bien loin d’être le premier architecte de mon temps à avoir fait des meubles, mais
ma manière de les concevoir s’apparentait à mon architecture et bénéficiait de ses
succès, comme à présent, ils subissent la dépréciation qu’il y a sur mon architecture de
ce temps."22 (Victor Horta apud Dulière, 1985, p. 47-48)

Bruxelas, que hoje é descrita como "a capital” do Art Nouveau, viu desaparecer algumas
jóias da arquitetura desta época. Entre elas, a demolição da Maison du Peuple de Victor
Horta tornou-se o epítome do não reconhecimento do valor de um património
arquitetónico antigo de importância primordial, apesar dos protestos vindos do mundo
inteiro.

"[...] le palais de la Fédération bruxelloise du Partie Ouvrier est certes, et par ses
propositions et par son originalité frappante, une des ouvres architecturales les plus
marquantes de notre temps, qu'il évoquera éloquemmment dans l'avenir. Les différents
plans des façaes, où le fer, la pierre blue et la brique se mêlent, s'enchevetrent et se font
valoir l'un par l'autre s'etendent sur une longueur de plus de cent mètres."23 (Pierron apud
Evrard, 1996 p. 38).

21 A minha fidelidade ao programa em questão, a preocupação com a ocupação máxima da parcela eram
tantos, com os inúmeros obstáculos que se deparavam com ao sujeito da extensão, porque é impossível
prever neste sentido acréscimos sem saber de onde eles viriam e qual seria a sua importância. O mesmo
se aplica ao meu objetivo arquitetónico, que pretendia ser, não um estilo, mas a simples expressão dos
meus gostos e habilidades, desprovido de qualquer empréstimo, longe de fazer parte da obra permanente,
dirigindo-se para uma obra passageira. (tradução nossa)
22 Eu estava longe de ser o primeiro arquiteto do meu tempo a fabricar móveis, mas a minha maneira de

projetá-los era semelhante à minha arquitetura e beneficiava dos seus sucessos, pois como agora, eles
sofrem a depreciação que há sobre a minha arquitetura desse tempo. (tradução nossa)
23 [...] o palácio da Federação do Partido dos Trabalhadores de Bruxelas é certamente, pelas suas

proporções pela sua impressionante originalidade, uma das obras arquitetónicas mais marcantes do nosso
tempo, que evocará eloquentemente no futuro. Os diferentes planos das fachadas, onde o ferro, a pedra
azul e o tijolo se misturam, se entrelaçam e se destacam, um pelo outro, se estendem por mais de cem
metros. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 100


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 83 - Maison du Peuple, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 169).

Hoje, a destruição da Maison du Peuple está bem presente na memória do povo


bruxelense, que se refere frequentemente a ela quando testemunha atentados contra o
património. Paradoxalmente, foi na mesma época (1961) que o município de Saint-
Gilles, Bruxelas, compra a casa pessoal de Victor Horta para fazer um museu dedicado
ao arquiteto. A casa e o atelier são classificadas em 1963 e tornam-se os primeiros
edifícios Art Nouveau protegidos em Bruxelas.

João Miguel Aldeias Correia 101


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Escolhemos descrever, como parte deste texto, o destino de alguns dos edifícios de
Horta, que nos parecem casos emblemáticos do destino dos edifícios do Art Nouveau
durante o século XX. Horta, nas suas Memórias escritas em 1939, destacou que não
seria de surpreender que a Maison du Peuple:

“agrandie sans son concours, peinte et repeinte sans souci de ce qu’elle était à
l’inauguration" et “n’étant plus en rapport avec un parti dominant les autres."24 (Victor
Horta apud Dulière, 1985, p. 57)

Horta vê, acima de tudo, que na sua escrupulosa adaptação da arquitetura ao programa
(de acordo com os preceitos desenvolvidos por Viollet-le-Duc nos seus Ensaios sobre a
Arquitetura), havia um perigo, o de uma obra criada por encomenda em que não era
possível transformá-la para outros fins. Ele viu a Maison du Peuple modificada ao longo
do tempo, mas a arquitetura mais efêmera foi provavelmente a das lojas que
permanentemente precisavam estar atualizadas e responder às mudanças das
necessidades dos negócios que se instalavam sucessivamente. A 2 de julho de 1935, o
seu amigo, o crítico de arte Sander Pierron, escreveu-lhe:

“en traversant hier la Place de la Monnaie, j’ai constaté tout à coup qu’on avait jeté bas
la belle façade en pierre et fer que tu avais construite naguère pour le Grand Bazar. J’ai
eu un serrement de coeur… ce monument familier pour moi résumait ta première
manière, c’était une oeuvre pleine du reflet de ton souci de nouveauté rationnelle, dans
des formes nouvelles. Il portait la marque de ton génie en évolution.” 25 (Sander Pierron,
1935 apud Dulière, 1985, p. 294-295)

Horta, nas suas Memórias escritas, relata ficando surpreso:

“des transformations constantes qui s’opèrent dans le mobilier et le bâtiment d’un


magasin. Une fois entré, l’architecte travaille pour ainsi dire en permanence." 26 (Victor
Horta apud Dulière, 1985, p. 112)

Em 1910, Horta assinou um contrato para dirigir o atelier de arquitetura L’Innovation que
ele tinha construído em 1900 mas renunciará após a I Guerra Mundial. L’Innovation,
profundamente transformada, desaparece num incêndio em 1967. Note-se que nas
suas Memórias, Horta dedica várias linhas ao perigo de incêndio nas lojas do Grand
Bazar de Frankfurt-sur-le-Main desaparecidas no bombardeio da II Guerra Mundial.

24 ampliada sem a sua ajuda, pintada e repintada sem se preocupar em como ela estava na inauguração e
não estava mais em conformidade com um partido dominante. (tradução nossa)
25 ao atravessar ontem a Place de la Monnaie, repentinamente notei que tinham derrubado a bela fachada

de pedra e ferro que tu tinhas construído antes para o Grand Bazar. Eu tive um aperto no coração ... este
monumento familiar para mim resumia a tua maneira, era uma obra cheia de reflexão sobre a tua
preocupação racional, sob novas formas. Ele carregava o cunho do teu gênio em evolução. (tradução
nossa)
26 das constantes transformações que ocorrem no mobiliário e no edifício de uma loja. Uma vez no interior,

o arquiteto trabalha, por assim dizer, permanentemente. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 102


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

"Tout Bruxelles, cette fois, est d'accord pour admirer la derniere construction de Victor
Horta. Ce n'est point un palais, un hôtel, un édifice officiel, une maison bourgeoise. C'est
un magasin gracieux, hardi, transparent. A l'extérieur, d'immenses baies cintrées où des
verrières gigantesques s'enferment dans de légers cadres de granit ; à l'intérieur, des
galeries surperposés maintenues par le plus original et le plus logique des jeux de fer..." 27
(Hippolyte Fierens-Gaveart, 1903 apud Evrard, 1996, p. 78)

Ilustração 84 - L’Innovation, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1901. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 277).

27 Bruxelas inteira, desta vez, concorda em admirar a mais recente construção de Victor Horta. Não é um
palácio, um hotel, um prédio público, uma casa burguesa. É uma loja agradável, ousada, transparente. Do
lado de fora, imensas vidraças arqueadas, onde gigantescos vidros envolvem as ligeiras molduras de
granito; no interior, galerias sobrepostas mantidas pelos mais originais e lógicos jogos de ferro... (tradução
nossa)

João Miguel Aldeias Correia 103


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Os Magasins Wolfers, construídos entre 1909 e 1911, mostram outro exemplo: o edifício
ainda se encontra na Rue d'Arenberg, Bruxelas, mas muito alterado devido à sua
ocupação pelos escritórios de um banco. O edifício, incluía não apenas lojas
sumptuosamente mobiliadas para a venda de jóias e artigos de joalharia, mas também
oficinas e escritórios cuidadosamente projetados para as suas funções, sobretudo de
inúmeras máquinas necessárias para o fabrico de talheres. Em 1975, os Magasins
Wolfers foram vendidos aos joalheiros parisienses Chaumet, que faliram doze anos mais
tarde. O banco, que depois compra as instalações, desmantela as lojas e oferece aos
MRAH e ao Musée Horta, ambos em Bruxelas, uma grande parte dos móveis de mogno,
montras, mesas, cadeiras, entre outros. O edifício de arquitetura complexa tornou-se
numa carapaça sem significado.

Ilustração 85 - Magasins Wolfers, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1909. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 306).

"[...] les magasins Wolfers Frères ont donné lieu à un nombre de plans inusités en raison
de la complication de la structure métallique qui variait a chaque étage, et d'autre part en
raison des matériaux: pierre blanche et surtout granit nécessitant un maximum d'épures
en grandeur d'exécution"28 (Victor Horta apud Evrard, 1996, p. 112).

"Au rez-de-chaussée, le granit noir pour faire valoir les étalages; à l'entresol, les ateliers
de la bijouterie qui, malheureusement, par économie, n'ont pu être réalisés en granit gris

28[...] as lojas Wolfers Frères deram origem a uma série de planos incomuns devido à complicação da
estrutura metálica que variava em cada andar e, em segundo lugar, devido aos materiais: pedra branca e
especialmente granito que exigem um máximo de desenhos em tamanho de execução. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 104


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

bouchardé comme je l'aurais désiré; aux deux étages les appartements pour deux
admnistrations privées, à l'étage au-dessus, la galerie-promenoir indique l'appartement
privé et celui du directeur." 29 (Victor Horta apud Evrard, 1996, p. 114).

Ilustração 86 - Magasins Wolfers, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1909. (Ilustração nossa, 2019).

Quando Horta se lembra do destino da Maison Roger construída na Avenida Louise, em


1901, revela a sua amargura. Construída para um dos seus clientes, Octave Aubecq,
que passa para as mãos de um amador apaixonado pela obra de Horta, Paul Verstraete,
que foi em tempos um financiador da empresa Serrurier-Bovy. Após o desenvolvimento
urbanístico necessário à exposição de Bruxelas, em 1910, os serviços camarários
estimam que as proporções da casa não são aptadas face ao espaço criado para a
abertura da Avenue Emile De Mot que conduzia ao local da exposição. Em 1909, Horta
acrescenta um andar à casa que, depois da morte de Verstraete, nesse mesmo ano, é
comprada por um senador, o barão Edouard Descamps. Após a I Guerra Mundial, o
mesmo decide transformar uma parte da casa, com a justificação de que o Art Nouveau
era um estilo antiquado, mas talvez também por razões ideológicas.

29 No rés-do-chão, o granito preto para exibir as vitrines, no mezanino, oficinas de joalheria que,
infelizmente, por questões de custo, não podiam ser feitas em granito martelado cinza como eu gostaria.
nos dois andares superiores, os apartamentos para dois escritórios particulares; no ultimo andar, a galleria
ambulatório indica o apartamento privado e do seu director. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 105


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 87 - Maison Roger, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1901. Ilustração 88 - Maison Roger, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1901.
([Adaptado a partir de:] Huib Hoste, 1921) (Ilustração nossa, 2019).

Um senador católico não poderia habitar num edifício relacionado com um estilo
associado à Maison du Peuple construído para o PTB, no qual Horta revela numa carta
dirigida à revista La Cité, em julho de 1921:

"Des artistes du cercle Les Figuristes publient cette année-là un manifeste dénonçant les
travaux et avertissant les Bruxellois qu’ils pleureraient un jour des larmes de honte quand,
las des façades Louis XVI et autres Louis cosmopolites, ils se souviendraient qu’ici se
dressait, taillée en cette belle pierre bleue de chez nous, l’attestation d’un style sincère,
noble, neuf, Belge, c’était son crime !"30 (Victor Horta apud Dulière, 1985, p. 159-166)

Horta sentiu-se afetado, mas não fez nada para defender a sua obra. Ele deixa
subentender que um ataque ao senador poderia prejudicar os seus projetos atuais (ele
provavelmente refere-se ao Palais des Beaux-Arts, cujo financiamento público tinha sido
rejeitado pelo Senado em 1920, o que levou o projeto a um impasse). Foi necessário
esperar até 1922 e a criação da Société du Palais des Beaux-Arts, graças ao banqueiro
Henri Le Boeuf, para tornar possível a realização da obra.

30Artistas do círculo Os figuristas publicam naquele ano um manifesto denunciando a obra e alertando o
povo de Bruxelas que um dia chorarão lágrimas de vergonha quando, cansados das fachadas de Luís XVI
e de outros cosmopolitas de Luís, eles lembrar-se-iam "que ali estava, esculpido nesta bela pedra azul da
nossa terra, o atestado de um estilo sincero, nobre, novo, belga, esse era o seu crime! (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 106


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

O início dos anos 20 foi difícil para Horta: ele passou grande parte da I Guerra Mundial
nos Estados Unidos e regressou à Bélgica em 1919. Para continuar a sua carreira como
arquiteto, tinha que mostrar que havia virado a página gloriosa do Art Nouveau e que
estava em sintonia com os novos tempos do período pós-guerra. Numa entrevista
concedida em 1920 a Sander Pierron, Horta evoca o desaparecimento do trabalhador
de elite:

“il faut savoir prendre son parti. Avec lui disparaîtront le fatras des ornementations inutiles
au bénéfice d’un retour à la « belle ligne simple », dont l’impeccable grandeur nous
ramènera jusqu’à l’art de la Grèce.”31 (Victor Horta apud Le Home, nº1, octobre 1920, p.
4)

Assim, ele expressa de maneira clara a necessidade de virar a página do Art Nouveau
e o seu retorno ao clássico que caracteriza a segunda parte da sua carreira.

"[...] il y a là des piliers qui respirent la nostalgie des supports antiques et d'énormes
parements qui contraignent au silence le matériau de base."32 (Delevoy apud Evrard,
1996, p. 118).

Horta vende a sua casa e atelier na Rue Americane e instala-se na Avenue Louise,
Bruxelas, num edifício neoclássico que ele transforma. Nas suas Memórias escritivas,
relembra a relutância de Henri Le Boeuf a esse respeito, dizendo que Le Boeuf teria
desejado:

“une collaboration de plus d’importance et plus ferrée sur les acoustiques que celle d’un
humble Belge qui n’avait à son actif que des magasins de second rang, des maisons d’un
goût douteux et un hôpital qui avait coûté des millions !"33 (Victor Horta apud Dulière,
1985, p. 241)

31 é necessário saber tirar partido. Com ele desaparecerá o amontoado de ornamentos inúteis em benefício
de um retorno à "bela linha simples", cuja grandeza impecável levar-nos-á de volta à arte da Grécia.
(tradução nossa)
32 [...] existem pilares que respiram a nostalgia dos antigos suportes e enormes revestimentos que forçam

ao silêncio o material de base. (tradução nossa)


33 uma colaboração mais importante e mais séria em acústica do que a de um humilde belga que tinha em

sua posse apenas lojas de segunda posição, casas de um gosto duvidoso e um hospital que tinha custado
milhões! (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 107


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 89 - Hôpital Brugmann, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1919-1923. (Ilustração nossa, 2019).

"On peut donner à la structure la plus simple un style, une distinction particulière, si l'on
sait employer exactement les matériaux, en raison de leur destination. Une simple chaîne
de pierre, placée dans un mur, devient ainsi une expression de l'art" 34 (Viollet-le-Duc apud
Evrard, 1996, p. 110).

Pouco depois da morte de Horta, em 1947, o Hôtel Aubecq na Avenue Louise, Bruxelas,
foi ameaçado de demolição. O arquiteto Jean Delhaye e a viúva de Horta, Julia Carlson,
tentam defender o magnífico edifício que a CRMS recusa classificar (1949). A destruição
ocorreu em 1950 e teve uma fraca compensação do estado Belga que concordou em
financiar a desmontagem de parte da fachada cujas pedras sofreram várias tormentas
desde então.

"Ai-je dis qu'Aubecq était intelligent? En voici la preuve, en moins d'un quart d'heure, les
plans étaient approuvés et le contrat mis en pièces. La construction dura deux ans,
l'appareillage était d'une difficulté sans égale. Durant l'éxecution des travaux, non
seulement aucun mot déplacé ne fut prononcé entre nous, mais jamais architecte et client
ne furent plus reconnaissants l'un vers l'autre. Jamais non plus, famille ne fut plus
d'accord pour aimer la maison et y vivre."35 (Victor Horta apud Evrard, 1996, p. 74)

34 Podemos dar à mais simples estrutura um estilo, uma distinção particular, se soubermos exatamente
como usar os materiais, em razão do seu destino. Uma simples fileira de pedra, colocada numa parede,
torna-se assim uma expressão de arte. (tradução nossa)
35 Eu disse que Aubecq fora inteligente? Aqui está a prova, em menos de quinze minutos, os planos foram

aprovados e o contrato posto em pedaços. A construção durou dois anos, a montagem apresentava uma
dificuldade inigualável. Durante a execução dos trabalhos, não só não foram pronunciadas palavras
inapropriadas entre nós, mas jamais arquiteto e cliente tiveram mais reconhecimento um pelo outro.
Também nunca mais, uma família concordou mais em amar a casa e lá morar. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 108


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

"Quel fantaisiste que l'architecte! Il faut des courbes et des lignes contrariées: mais il en
est "maître" et on chante sa louange. Je tempête: mais malheureux, ne voyez-vous donc
pas que tout est réfléchi en architecture-constructeur, fidéle au programme jusqu'au
sacrifice?" 36 (Victor Horta apud Evrard, 1996, p. 76)

Ilustração 90 - Reconstituição no armazém da rue de Navez, em Bruxelas, da fachada do Hôtel Aubecq apresentada ao público na
ocasião do 150º de Victor Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1899. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 265).

36Que fantasista que é o arquiteto! Ele precisa de curvas e linhas frustadas: mas ele é "mestre" e nós
cantamos os seus louvores. Estou agitado: mas infeliz, não vêm que tudo é pensado no arquitecto-
construtor, fiel ao programa até ao sacrifício? (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 109


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Hoje, eles estão nas mãos da região de Bruxelas-Capital, que os guarda e inventaria
cientificamente (2010) antes de atribuir um destino que se espera que seja final.
Enquanto isso, os planos para reutilização das pedras não faltaram: em 1979, os
arquitetos Dominique Delbrouck e Michel Leloup propuseram incorporá-las num novo
edifício na rue Montagne de la Cour, em frente aos Magasins Old England. Para um
bom aproveitamento, o projeto incluia um jardim de inverno de Horta desmontado em
1969: la salle Cousin. Este deveria finalmente ser reconstruído dentro dos MRAH e fazer
parte de um circuito de quatro salas dedicadas às coleções Art Nouveau.

Ilustração 91 - Entrada Hôtel Aubecq, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1899. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 257).

Cerca de dez anos após a demolição do Hôtel Aubecq, a Maison du Peuple corre o
mesmo perigo. Construída entre 1895 e 1899 para o PTB, que acabara de ter seu
primeiro grande sucesso eleitoral, ela já não se adaptava às necessidades do Partido
Socialista: os escritórios, as salas de reunião e especialmente as lojas cooperativas
parecem totalmente obsoletas. O audacioso edifício de metal e vidro, construído na
periferia do bairro popular Marolles, Bruxelas, e que exibe orgulhosamente a presença

João Miguel Aldeias Correia 110


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

do partido no coração da cidade, parece não merecer proteção. Um dos mais


proeminentes membros do Partido Socialista, Camille Huysmans, não hesita em
descrever a construção como "lamentável" (Le Peuple, 16 octobre 1964). Desta vez, a
CRMS dá uma opinião favorável à classificação, mas não é seguida pelo governo belga.

Ilustração 92 - Grande auditório, Maison du Peuple, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir de:] Route européenne de
l'Art nouveau, 2007, p. 16).

O arquiteto Jean Delhaye, com o apoio da SCA e da SBUAM, lançou uma petição
internacional em 1964 contra a demolição. É assinado entre outros por Alvar Aalto, Gio
Ponti, Jean Prouvé, Nikolaus Pevsner, Siegfried Giedeon, Walter Gropius, Mies van der
Rohe. Observamos que no texto que acompanha a petição, as palavras "obra-prima" e
"Art Nouveau" não aparecem. A Maison du Peuple deve ser preservada, porque é um
marco na história da arquitetura moderna e prefigura a arquitetura contemporânea. A
importância do Art Nouveau como estilo arquitetónico ainda não é percebida. O texto da
petição refere-se a "uma ornamentação, provavelmente antiquada, mas cheia de
invenções" e esquece que em Horta, a estrutura e o ornamento nascem indissociáveis
num elo criativo.

"La barbarie d'attaquer les témoins les plus importants du passé est devenue une maladie
internationale. On reçoit de partout des nouvelles de la destruction de batiments célebres
du passé. La Belgique était dans la derniere décade du XIXe siecle le pays de l'avant
garde. Dans cette période, il n'y a pas d'exemple plus réussi en Belgique que la Maison
du Peuple de Victor Horta...Sa façade incurvée de verre et d'acier est une des plus
parfaites de cette époque."37 (Siegfried Giedion, 1964 apud Evrard, 1996, p. 40)

37A barbaridade de atacar os testemunhos mais importantes do passado tornou-se uma doença
internacional. Recebemos de todo o lado notícias da destruição de edifícios famosos do passado. A Bélgica

João Miguel Aldeias Correia 111


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 93 - Detalhe da escada da entrada principal, Maison Ilustração 94 - Detalhe da porta a coches, Maison du Peuple, arq.
du Peuple, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir Victor Horta, Bruxelas, 1895. ([Adaptado a partir de:] Goslar,
de:] Goslar, 2012, p. 234-235). 2012, p. 234-235).

Nenhuma mudança de situação ocorreu e a Maison du Peuple foi destruída em 1965-


1966. Jean Delhaye recebe mais uma vez um subsídio do Estado para desmontar
algumas partes: o grande salão de espetáculos, a sala Matteoti, a sala de café e parte
da escadaria monumental. Ele supervisiona a operação de desmontagem com os
arquitetos Pierre Puttemans e Louis H. De Koninck, em nome da SCA aos quais são
confiados os vestígios armazenados no local do Musée Tervueren, Bélgica. Diferentes
projetos de reconstrução, que seriam muitos para enumerar, surgem nos anos
seguintes. Nada acontece até 1981, quando os vestígios são transferidos para Jette,
Bruxelas, em terrenos desprotegidos e, em 1983, descobre-se que os elementos
metálicos foram pilhados por um negociante de sucata que os vendeu. Em 1985,
algumas ferragens são colocadas na estação de Metro Horta, em Saint-Gilles (Bruxelas)
e em 1988, o resto das peças é transferido para Ghent, com o intuito de uma integração
num futuro museu de arqueologia industrial. Alguns elementos foram postos em
evidência temporariamente em 1991 pelo arquiteto Walter Slock como parte da Flanders
Expo. Finalmente, os vestígios da Maison du Peuple foram incorporados num café em
Antuérpia, o Grand Café Horta & Art Nouveau zaal. Este é coroada pela estrutura

foi na última década do século XIX o país do avant-garde. Neste período, não há exemplo mais bem-
sucedido na Bélgica do que a Casa do Povo de Victor Horta... A sua fachada curva de vidro e aço é uma
das mais perfeitas desta época. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 112


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

metálica original do auditório reduzida e estreitada, que se tornou numa sala polivalente
para acolher casamentos, desfiles de moda, entre outros. A inauguração ocorreu em 21
de setembro de 2000.

Ilustração 95 - Estrutura da sala de café da Maison du Peuple, integrada no Grand Café Horta & Art Nouveau zaal, Antuérpia, 2000.
(Ilustração nossa, 2019).

Na operação, as próprias qualidades da arquitetura de Horta desapareceram. O


poderoso esqueleto engenhosamente adaptado ao terreno cujas estruturas de suporte
eram o reflexo exato das cargas tornou-se num ornamento desprovido de significado. O
elemento que a petição de 1964 considerou o menos importante na obra de Horta, o
ornamento, aparece. A arquitetura deixa de existir.

Como vimos, os ataques contra Horta foram severos e apenas o Hôtel Solvay preservou
ao longo do tempo um esplendor quase intacto. Em 1955, a CRMS recomendou ao
ministro dos Obras Públicas a compra do hotel à família Solvay "disposta a ser
extremamente moderada quanto ao preço de venda" (Carta de 4 de outubro de 1955,
enviada pelo Conde Carton de Wiart ao Ministro de Obras Públicas, Arquivos do Museu
da Horta). Esta venda não ocorreu e o edifício, não classificado, estave perto de ser

João Miguel Aldeias Correia 113


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

demolido. O Hôtel Solvay foi felizmente comprado no final de 1957 pelo Sr. e Sra.
Wittamer-Descamps, cujos descendentes são ainda os proprietários do edifício.

"J'ai toujours pris comme juge les matériaux que j'avais mis en oeuvre eux-mêmes! Il
n'est pas de meilleurs conseils. La pierre mal mise en oeuvre n'a pas besoin de parler ou
d'écrire pour se fiche du responsable, à moins que la vaniténe l'écrase, ce qui n'est pas
d'un artiste car l'artiste sait fort bien où se trouvent ses qualités et ses défauts meme s'ils
sont enveloppés dans un peu de soie."38 (Victor Horta apud Evrard, 1996, p. 26)

Ilustração 96 - Hôtel Solvay, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1894. (Ilustração nossa 2019).

38Eu sempre tomei como juiz os materiais que eu próprio havia aplicado! Não há melhores conselheiros. A
pedra mal aplicada não precisa falar ou escrever para desprezar o responsável, a menos que a vaidade a
esmague, o que não é de um artista, porque o artista sabe muito bem onde estão as suas qualidades e
defeitos, mesmo que envolvidos num pouco de seda. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 114


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Hoje, pode-se especular incessantemente as motivações que levaram Horta a queimar


os seus desenhos em 1939 e 1946. Deste modo ele destruiu um trabalho gráfico que
tornaria possível entender melhor os seus processos criativos, manter a memória de
obras que desapareceram, de inventariar o seu trabalho.

É difícil acreditar que uma obra arquitetónica celebrada na sua época, com pouco mais
de um século e construída com um “savoir-faire” magistral em materiais de qualidade,
tenha se mostrado tão frágil. A sua história poderia ser o tema de uma fábula moderna.
(Aubry, 2010, RANN).

E após todos estes fortúnios e infortúnios, uma impotante questão se coloca:

Qual é o futuro da herança do Art Nouveau?

Ilustração 97 - Os edifícios de Victor Horta em Bruxelas. (Ilustração nossa, 2020).

João Miguel Aldeias Correia 115


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

3.3. A AUTENTICIDADE DE UMA OBRA PATRIMONIAL, UMA QUIMERA?

“Croire à l'existence d'un fait imaginaire engendre des chimères. Entretenir des chimères
provoque des utopies.”39 (Jacques Lamarche, 1977, p. 47)

No que respeita ao restauro e à autenticidade, existiam duas doutrinas: uma


intervencionista que predomina em boa parte dos países europeus (Viollet-le-Duc);
outra, anti intervencionista, que é sobretudo característica de Inglaterra (Ruskin) 40.

Na vertente anti intervencionista, Ruskin defende um anti intervencionismo radical,


consequência da sua concepção de monumento histórico. As marcas do tempo dos
edifícios fazem parte da sua essência.

“O desenvolvimento dos estudos históricos permitiu a este século pensar o carácter único
e insubstituível de qualquer acontecimento, bem como o de toda a obra pertencente ao
passado.” (Choay, 2006, p. 130)

Para Ruskin não podemos tocar nos monumentos do passado, vistos quase como
relíquias. O restauro significa a destruição da obra, ou seja, restaurar é ferir a
autenticidade do monumento histórico, logo o seu destino é a ruína. A arquitetura é o
único meio que dispomos para preservar o laço com o passado e é a ele que devemos
a nossa identidade, individual e coletiva.

Na vertente intervencionista, Viollet-le-Duc encabeça a política do restauro. Para este,


o passado está morto; a nostalgia deve-se virar para o futuro, e não ao passado, e os
monumentos antigos devem simbolizar o espaço vazio, testemunhas dos sistemas
históricos obsoletos. Ele defende a restauração dos edifícios tal como o eram
originalmente, eliminando as intervenções posteriores. No entanto, existem certos
intervencionismos nos monumentos históricos que convém denunciar, como as
fachadas inventadas ou os elementos de escultura arquitetónica destruídos e
substituídos por elementos do século XIX. Tais intervencionalismos são a tentativa de
atribuir uma imagem aos monumentos históricos daquilo que eles não são. Viollet-le-
Duc apresenta interesse pela história das técnicas e dos materiais de construção e pela
importância dada à fotografia nos seus levantamentos. A brutalidade das suas
intervenções prende-se com o facto de ele ter tendência a deixar cair no esquecimento
a época em que o monumento histórico foi construído em relação à época da
intervenção realizada. Para que um edifício possa ser considerado como histórico, o

39 Acreditar na existência de um facto imaginário engendra quimeras. Manter quimeras provoca utopias.
(tradução nossa)
40 Crítico de arte ligado à preservação do património histórico (1819-1900).

João Miguel Aldeias Correia 116


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

mesmo deve ser entendido como parte integrante do presente e do passado. (Choay,
2006, p. 153-161)

Já no final do século XIX os princípios fundamentais de Viollet-le-Duc começam a ser


questionados face ao emprego de métodos mais eficazes que surgiram em virtude dos
progressos da história da arte e da arqueologia. Essa mesma orientação foi definida por
Camillo Boito41, que estabeleceu diversos critérios relativos ao restauro e conservação
dos monumentos históricos, criando um diálogo para levar a debate as diretrizes
antagónicas. Deve a Ruskin a noção de conservação fundada sobre a ideia de
autenticidade assim como defende que a legitimidade do restauro só deve ser praticada
em situações extremas, como um complemento da conservação. Coloca em questão a
dificuldade em avaliar de forma justa, a necessidade de intervenção. (Choay, 2006, p.
167-171)

Focalizando-nos em particular no património Art Nouveau, que apesar dos seus


fortúnios e infortúnios resistiu até aos nossos dias, uma vez que o panorama de Bruxelas
é pontilhado de fachadas deste movimento. Para além do tempo estes edifícios tiveram
que resistir aos efeitos da moda, mas igualmente aos desejos por vezes caprichosos
dos promotores imobiliários.

A salvaguarda deste património certamente não se fez sozinha, foi necessária a


intervenção de diversos profissionais: historiadores de arte, arquitetos, artesãos,
engenheiros, entre outros.

Mas uma salvaguarda a que preço?

Françoise Aubry (antiga diretora do Museu Horta) fala em “autenticidade quimérica”.


(Aubry, 2002, p. 5) De facto, estes restauros, reparações, como desenvolvimentos
maiores, fazem com que hoje em dia, estes edifícios não contenham grande coisa de
original. Falamos de original, no sentido de autêntico, que não foi refeito ou modificado.

Se não perderam a sua “autenticidade” com os restauros, é através das adaptações


próprias ao nosso modo de vida atual, tais como: as tomadas elétricas; os vidros duplos
das janelas; a instalação de radiadores de aquecimento; o reforço da caixa de escadas,
sem contar com as normas de segurança impostas, relativamente aos edifícios com
uma função pública, como no Musée Horta, que se juntam à lista: sistema de segurança;
detetores de fumos; saídas de emergência; escadas de socorro, entre outros.

41 Arquiteto e historiador italiano, critico de arte e da teoria do restauro (1836-1914).

João Miguel Aldeias Correia 117


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Mas se nos querem fazer acreditar nesta “autenticidade”, o melhor é rendermo-nos à


evidência de que ela é praticamente impossível.

Os elementos das fachadas, assim como os elementos interiores não são como os de
origem, e não os encontramos mais: as pinturas, as substituições dos chumbos nos
vitrais ou o recobrimento. O que chamamos de patine, quando envelhece e acaba por
se “sujar” ao longo do tempo, contraria igualmente a veracidade da obra. O problema
desta patine, é que a deixando, acabamos por pensar que temos à frente dos nossos
olhos, exatamente aquilo que parecia originalmente.

Um exemplo interessante para ilustrar a ação da patine ao longo do tempo e sobre o


olhar que as pessoas têm sobre ela, é o quadro De Nachtwacht (A ronda noturna) de
Rembrandt. O verniz que foi fixado nesta obra enegreceu muito ao longo da sua
evolução no tempo. Inicialmente, este quadro representava uma cena em pleno dia. Mas
devido à presença desta patine, as pessoas pensavam erradamente que a sua
representação acontecia em plena noite, o que lhe valeu o sobrenome de “a ronda
noturna”. Esta patine instalou-se sem que se desse atenção o que levou a erros na
análise do quadro. Limpar e preencher as lacunas leva igualmente à perda de
autenticidade da obra, uma vez que estas intervenções tiveram lugar bem depois da
criação da obra.

Pode acontecer, o que é raro, que certos edifícios como o Palais Stoclet em Bruxelas,
que nunca foi modificado, esteja no seu perfeito estado de integridade, praticamente
intacto. Mas são edifícios que estiveram fechados e voltados para si mesmos.

Ilustração 98 - Palais Stoclet, arq. Josef Hoffmann, Bruxelas, 1905. (Ilustração nossa, 2018).

João Miguel Aldeias Correia 118


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Será este, o destino que desejamos para todos os edifícios Art Nouveau?

Existe uma contradição entre o facto de perpetuar no tempo estes edifícios, que são
obras patrimoniais, para manter a memória coletiva em torno de grandes arquitetos, de
génios, ou ainda de uma parte da história. E para além dessa memória, preservar a sua
veracidade ao ponto de as deixar fechadas sobre elas próprias, espécie de conchas
vivas cujo valor patrimonial se tornou mais importante que a sua função inicial: habitar
e servir a sociedade.

Mas um edifício que não tem sustentabilidade social na cidade tem ainda razão de o
ser?

Para o saber, é necessário, primeiro, interrogarmo-nos que ligação queremos que a


sociedade mantenha com o património, uma relação antropológica ou antes
contemplativa?

Se a única função que desejamos para um edifício é a contemplação não tenderemos


a cair no mito de uma cenarização da cidade?

Na conferência de Francis Metzer, “Reconquête de l’identité de l’ouvre architecturale:


approche philosophique et méthodologique de la restauration.” (Metzger, 2016), explica
que a partir do fim dos trabalhos, no momento em que os proprietários tomam posse
dos bens, a perda de identidade da obra começa. É legítimo que eles vão instalar-se e
fazer alterações ao longo do tempo. E como tal a obra vai, pouco a pouco, perdendo a
sua autenticidade e identidade. O trabalho do restaurador, no domínio do património,
consiste, portanto, na conquista da sua identidade. O perigo, ao encontrá-la, seria deixar
o edifício intocável, fazer tábua rasa da sua imagem que impediria a boa evolução do
trabalho arquitetónico.

É aqui que a arquitetura se diferencia das outras artes. Os edifícios, não sendo
transformados irão manter a sua identidade de origem. A restauração em arquitetura e
em arte é, igualmente, diferente. Em arte, restauramos mantendo-nos fiéis e respeitando
ao máximo o valor da obra, enquanto em arquitetura, os restauradores tentam
aproximar-se e preservá-la o mais possível da versão original, adaptando-a às normas
de segurança atuais, assim como às novas tecnologias que fazem parte do nosso
quotidiano. Podemos comparar a arquitetura a uma arte “viva” e não imóvel.

Hoje em dia, existe também um património que foi reconstruído no seu estado de
origem, para acolher o público e proteger do memso modo o original. Podemos citar por

João Miguel Aldeias Correia 119


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

exemplo, um dos mais conhecidos que são as Grutas de Lascaux, em França. De facto,
uma réplica foi reconstruída ao lado do conjunto original. Trata-se, portanto, de
desmaterializar o objeto em causa e de criar um “duplo” à escala real e idêntico até ao
ínfimo detalhe (até à temperatura que foi mantida a 13°C).

Os atuais visitantes, cada vez mais adeptos do virtual, ainda sentirão, no futuro, a
necessidade de vivenciar a realidade e assim ter acesso a essa autenticidade?

Mas então uma outra questão se coloca, poderemos nós permitir fazer réplicas ao
idêntico a todo o património, e por consequência, todos os edifícios que julgamos
oportunos de conservar?

Que faremos nós então de original, deixá-los fechados sobre eles mesmos?

Estas são algumas questões que dizem respeito ao nosso património histórico na era
da indústria cultural. A difusão da “cultura” precipita uma mudança semântica: esta
perde o seu caráter de realização pessoal e se torna em indústria. Os monumentos e o
património histórico adquirem dupla função: obras que propiciam saber e prazer, à
disposição de todos, mas também produtos culturais, prontos para serem consumidos.
Metamorfose do valor de uso em valor económico. (Choay, 2006, p. 211) É então que a
valorização do património histórico, expressão-chave, é ambígua, pois contém a noção
de mais-valia, de interesse, de encanto, de beleza, de capacidade de atrair, tudo com
conotações económicas. Apresenta múltiplas formas: conservação e restauro;
espetáculos de som e luz; animação cultural; modernização; benefício financeiro (lojas);
acesso automóvel (estacionamento). Ao mesmo tempo em que o valorizam podem
desfigurá-lo ou prejudicar sua apreensão pelo público. Para a sua integração, a
reutilização é a forma mais difícil de valorização do património: o monumento é poupado
aos riscos do desuso para ser exposto ao desgaste e às usurpações do uso; deve-se
levar em conta o estado material do edifício, o que requer uma avaliação do fluxo de
potenciais usuários.

Como efeitos perversos: o “invólucro” que se dá ao património histórico urbano tendo


em vista seu consumo cultural, assim como o facto de ser alvo de investimentos do
mercado imobiliário, tende a excluir dele as populações locais ou não privilegiadas; a
banalização, semelhança entre muitas cidades; efeitos das crescentes visitas.

Mas não existem efeitos sobre a relação do grande público com a herança
arquitetónica?

João Miguel Aldeias Correia 120


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

E onde fica o acesso aos valores intelectuais e estéticos que existem no património
histórico? (Choay, 2006, p. 228)

A frustração do grande público interessado nos valores da arte e da história dos


monumentos e conjuntos históricos é um dos efeitos perversos da industrialização do
património. A prevenção dos efeitos perversos deve ser entendida tanto do ponto de
vista da proteção dos monumentos quanto do seu público. Aí entra a conservação em
segundo grau ou estratégica, que requer medidas de controlo (fluxo de visitantes
controlados), medidas pedagógicas (museu imaginário, com desenhos, reprodução dos
edifícios em três dimensões e tamanho natural), políticas urbanas (adequação das áreas
a suas dimensões e morfologias).

“Qual é o fundamento em que repousa a conservação do património histórico


arquitetónico num mundo que se muniu de recursos científicos e técnicas para guardar
na memória e interrogar seu passado sem a mediação de monumentos ou de
monumentos históricos reais?” (Choay, 2006, p. 237)

Dispomos de algumas armas estratégicas contra os excessos de um consumo


patrimonial que tende a se converter em destruição. Contudo, nenhuma das motivações
institucionalmente reconhecidas ou reivindicadas permite interpretar o culto ao
património, cada vez mais crescente, pelo mundoq. Questionar o sentido da inflação do
património histórico e colocá-lo numa perspetiva social. Françoise Choay42 no seu livro
Alegoria do Património diz:

“O património histórico parece fazer hoje o papel de um vasto espelho no qual nós,
membros das sociedades humanas do fim do século XX, contemplaríamos a nossa
própria imagem.” (Choay, 2006, p. 240)

O património teria assim perdido sua função construtiva, substituída por uma função
defensiva, que garantiria a recuperação de uma identidade ameaçada. Traços
narcisistas, forma de lidar, talvez, com transformações que não são dominadas na sua
profundidade nem no seu ritmo, e que parecem questionar a sua própria identidade,
confortando a angústia e as incertezas do presente com a adição de novos elementos.

O desenvolvimento da inflação patrimonial nos anos 50, época de perturbação cultural


nas sociedades industriais, com o advento da Era eletrónica e suas memórias artificiais
e sistemas eficientes de comunicação, libertou-nos das limitações do espaço
(mobilidade) e tempo (instantâneo). Vive-se uma revolução “protética” (inspiração em
Freud), na qual se salienta a multiplicação das mediações e das percepções entre o

42 Historiadora francesa das teorias, formas urbanas e arquitectónicas, assim como professora de
urbanismo, arte e arquitectura.

João Miguel Aldeias Correia 121


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Homem e o Mundo, e entre o próprio Homem. (Choay, 2006, p. 241) Não é só o


património arquitetónico que compõe a imagem narcisista patrimonial. Há a
“museificação” de todos os campos e tipos de atividade; onde o museu, que era visto
como uma instituição, tornou-se uma mentalidade. (Choay, 2006, p. 247) Ainda a
propósito do património, Françoise Choay afirma:

“Embora a figura que contemplamos no espelho do património seja o reflexo de objetos


reais, nem por isso é menos ilusória. A forma indiscriminada com que foram reunidos
eliminou todas as diferenças, heterogeneidades e fraturas. Ela nos tranquiliza e exerce
sua função protetora graças, precisamente, à redução e à supressão fictícia dos conflitos
e das questões que não ousamos enfrentar: instrumentos de defesa eficaz numa
situação de crise e de angústia, mas instrumento transitório.” (Choay, 2006, p. 248)

Seria um tempo para assumir um destino, uma reflexão, para depois continuar a
construção da identidade. Passado esse prazo, o espelho do património estaria nos
precipitando na falsa consciência, na recusa do real e na repetição. O acontecimento
traumático que a cultura do património nos ajuda a conjurar e a ocultar é a eliminação
da competência de edificar (capacidade de articular entre si e o seu contexto, com a
mediação do corpo humano). Essa competência é a relação direta do construtor com o
ambiente, sem intermediário, o que envolve também a memória ancestral. Isso traria a
superação da crise da arquitetura e das cidades, reconduzindo os objetivos de
conservação do património à conservação da capacidade de lhe dar continuidade e
substituí-lo. Uma nova abordagem do património deve levar em conta o reencontro com
essa competência. (Choay, 2006, p. 251) Para rematar estas reflexões deixamos uma
frase que achamos pertinente:

“Quando deixar de ser objeto de um culto irracional e de uma valorização incondicional,


não sendo, portanto, nem relíquia nem gadget, o reduto patrimonial poderá se tornar o
terreno inestimável de uma lembrança de nós mesmos no futuro.” (Choay, 2006, p. 257)

3.4. A MATERIALIDADE DO ART NOUVEAU

"Les matériaux peuvent être les mêmes, mais il y a la manière de les mettre en oeuvre,
de les assembler...Cela semble peu chose, mais c'est ce qu'il y a de plus difficile à copier,
pour la masion essentielle qu'en ceci il y a l'âme de toute la collectivité qui a travaillé aux
édifices, et il y a la contribuition du temps. Les matériaux, c'est la gamme des notes en
musique; celles-ci également sont toujours les mêmes."43 (Sander Pierron, Le Home
1920 apud Evrard, 1996, p. 72).

43 Os materiais podem ser os mesmos, mas existe uma maneira de os aplicar, de os montar... Tal parece
pouco, mas é o mais difícil de fazer, pela simples razão que em tal haja a alma de toda a comunidade que
trabalhou nos edifícios e a contribuição do tempo. Os materiais, são a gama de notas em música, essas
também são sempre as mesmas. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 122


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Os materiais utilizados nas construções do movimento Art Nouveau, surpreendem pela


sua grande diversidade, a sua aplicação meticulosa, muitas vezes pela sua subtileza
que evoca um incontestável conhecimento do “savoir-faire”.

Todos estes diferentes elementos, que serão aqui separados de modo a melhor se
compreenderem, dialogam entre eles nas fachadas e nos interiores dos edifícios para
formarem um todo.

A vontade de criar uma unidade edificada coerente irá levar, muitas vezes, os arquitetos
a tomarem a seu cargo o desenho de elementos que não eram, até então, produzidos
em série como por exemplo as campainhas, as caixas dos correios ou as maçanetas de
porta…

Em geral, os temas que são representados nestas diferentes categorias são a natureza
e a mulher. A mulher é um símbolo retirado da mitologia antiga, que, associado a uma
natureza idealizada apela ao devaneio. (Arets & Blérot, 2013, p. 44)

O intuito neste texto não é juntar e detalhar todas as causas de degradação assim como
todas as técnicas que existem a fim de restaurar estes materiais, mas antes fazer um
resumo não exaustivo do que se faz aos materiais no domínio do património no intuito
de ter uma visão global.

3.4.1. PEDRA NATURAL

“Le petit granit est, on peut le dire, la véritable pierre nationale de la Belgique, et l’une
des meilleures pierres à bâtir connues. A la grande résistance à l’écrasement qu’elle
présent, se joignent : une taille facile, permettant l’exécution de fines moulures et des
sculptures les plus compliquées, une élasticité suffisante et une inaltérabilité complète à
la gelée et presque indéfinie aux intempéries." 44 (Paul Combaz, 1895 apud Evrard, 1996,
p. 46).

Na época, a pedra era pouco utilizada pela classe burguesa, esta preferia a alvenaria
de tijolo e o gesso que eram mais abordáveis financeiramente. A presença da pedra nas
fachadas, estava confinada às bases dos edifícios, ou a elementos como varandas,
lintéis ou colunas.

44 O pequeno granito é, podemos dizê-lo, a verdadeira pedra nacional da Bélgica e uma das melhoras
pedras conhecidas para a construção. À grande resistência à compressão que apresenta, junte-se: um
tamanho fácil, permitindo a execução de molduras finas e as esculturas mais complicadas, uma elasticidade
suficiente e uma completa inalterabilidade à geada e quase indefinida às condições meteorológicas.
(tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 123


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 99 - Detalhe da fachada, Hôtel Winssinger, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1894-1897. (Ilustração nossa, 2019).

Por outro lado, na arquitetura Art Nouveau, a utilização da pedra, na totalidade, ou numa
parte da fachada, é primordial. De facto, é um dos materiais mais adequados à execução
de formas “vivas”, como encontramos na natureza. A possibilidade de modelar formas
vegetais e de redefinir novas alternativas nos modos de execução é sem dúvida o que
vai dar um novo impulso à utilização deste material. A resistência à erosão e a dureza
da pedra garantem a durabilidade do trabalho de escultura da pedra.

Certos arquitetos detalham a tal ponto o trabalho da pedra, que são levados a produzir
cortes e desenhos de execução das pedras em escala real para facilitar a tarefa aos
pedreiros como os modelos em gesso de Victor Horta.

O trabalho de montagem de Victor Horta e dos seus assistentes era fenomenal. À


produção de esquissos realizados pelo arquiteto seguia-se a sua passagem a rigor.
Cada bloco de pedra da fachada era representado sob quatro planos (vista, planta, corte
direito e esquerdo). Aqueles que eram mais complexos como os caixilhos das janelas
ou das portas, eram representados em forma de maqueta: um pedaço de madeira
coberto de gesso sobre o qual os escultores reproduziam com barro o modelo seguinte.

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Essas partes, uma vez esculpidas, eram moldadas, e esse novo molde oco servia para
colar o modelo final em gesso que era depois entregue ao artesão. (Evrard, 1996, p. 8)

As pedras utilizadas durante o período Art Nouveau são maioritariamente pedras


calcárias, tais como a pedra de Gobertange, o mármore, a pedra d’Euville, ou ainda a
pedra azul. (Axmacher, 2007, p. 47)

Ilustração 100 - Detalhe da bow-window, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019).

Existem diversos fatores e patologias que vão degradar a pedra, tais como a chuva, e
as secreções que dela provêm pela escorrência e que podem “sujar” as pedras da
fachada.

A presença de musgos, fungos e outros organismos biológicos, para além do lado


menos estético, podem criar pequenas fissuras. As raízes das plantas podem
igualmente fissurar, partir ou até mesmo provocar a derrocada das pedras.

Existem diferentes tipos de limpeza de pedras em função do estado de sujidade destas:


a limpeza a água (com ou sem pressão, a alta ou baixa pressão), a limpeza a laser ou
a limpeza química. (Axmacher, 2007, p. 56)

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Ilustração 101 - Detalhe da fachada, Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2018).

Podemos reparar e consolidar as pedras que foram atacadas por elementos que
alteraram o aglutinante de grãos minerais das quais as pedras são compostas para lhes
dar uma boa coesão. Para tal, primeiro dessalinizamos a pedra para limpá-la. A etapa
de consolidação ela mesmo, faz-se pela aplicação de uma matéria à base de silicato de
etilo, que impregnando a pedra, vai voltar a unir as ligações entre os grãos que
constituem a pedra e, assim, conservar a sua porosidade. No caso em que pedaços de
uma peça de pedra desapareceram, uma intervenção de reparação é necessária. Se as
fissuras presentes não forem de grande importância, podemos colmatá-las com uma
argamassa mineral a base de pó de pedra e de cimento.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Se os estragos sobre a pedra são maiores, e a substituição de uma parte, ou mesmo da


totalidade da pedra é necessária, uma réplica desse pedaço é feita e inserida na
alvenaria. Graças a hastes metálicas, fixamos as duas partes e terminamos com a
argamassa de modo a bem consolidar o conjunto.

No caso em que a pedra desapareceu totalmente, ou se simplesmente não é


recuperável, ela é substituída por uma idêntica, colocada no lugar com um banho de
argamassa, e as junções em volta recriadas.

3.4.2. MADEIRA

“Usa un pedazo de madera y ya no será más un pedazo de madera.“45 (provérbio espanhol)

A madeira é um material que não está muito presente ao nível dos elementos
construtivos da habitação propriamente dita, exceto para as estruturas em madeira, não
apresentando nenhuma especificidade particular. Contudo, ela é um elemento essencial
da arquitetura Art Nouveau, principalmente nos trabalhos de carpintaria. Está presente
especialmente ao nível dos caixilhos das portas, janelas ou coroamentos das fachadas.

Ilustração 102 - Detalhe do coroamento, Maison Autrique, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2018).

45 Use um pedaço de madeira e ele não será mais um pedaço de madeira. (tradução nossa)

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De linhas ondulantes, típicas do Art Nouveau, começa a aparecer e a ganhar vida nos
caixilhos de janelas e portas. Esta nova linguagem de inspiração vegetal tornou-se
possível graças à facilidade com a qual se trabalha a madeira, tornando-se um
verdadeiro trabalho de escultura.

Ilustração 103 - Porta interior, Maison Horta, arq. Victor Horta, Ilustração 104 - Lareira e móvel louceiro, Maison Horta, arq.
Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019). Victor Horta, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019).

Este trabalho individualizado e muito preciso, próprio para cada elemento, necessita de
uma colaboração estreita entre o arquiteto e o artesão, para que estas carpintarias se
tornem verdadeiras obras de arte, originais e personalizadas, contribuindo para uma
obra de arte total, característica primordial do Art Nouveau. Se bem que elas constituem,
igualmente, uma obra de arte por elas próprias.

Os elementos em madeira são geralmente envernizados e não pintados, a fim de fazer


transparecer a beleza natural da madeira e dos seus veios aparentes, e no intuito de
tornar visível a verdadeira natureza do material. Este constitui sobretudo peças de
grande qualidade. A espécie mais usada, pelo menos para portas e molduras, era o
carvalho. (Hennaut, 1997, p. 63) Esta madeira de construção pesada resiste às
deformações e variações de humidade, para além de ser uma madeira dura e nobre.

As junções de madeira constituem a parte mais importante da montagem, mas é


também a etapa mais delicada. Primeiro escolhem-se os moldes e as junções de acordo

João Miguel Aldeias Correia 128


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

com as especificidades técnicas das peças, assim como a posição destes e a sua
exposição à água e ao ar. (Axmacher, 2007, p. 66)

Ilustração 105 - Detalhe da escada do grande salão, Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019).

A carpintaria tradicional permite diferentes maneiras de junções, não necessitando nem


de pregos, nem verniz, nem cola. O que permite, se necessário, desmontar mais
facilmente, e confere melhor resistência ao trabalho da madeira, sem, por isso, perder
a rigidez e a estabilidade.

Existem diversos tipos de degradação possíveis. Podem ser de causas naturais,


induzidas pelos elementos naturais, tais como a exposição à chuva, ao sol, ao vento, às
variações térmicas ou ainda à poluição. Pode se também causada pela proliferação de
agentes exteriores, como fungos e insectos, que dependendo de certas características,
tais como o nível de humidade, a temperatura e a presença de oxigénio, causam a
degradação da madeira. Além dos tratamentos fungicidas e dos inseticidas, podemos
também ter de fazer reparações sobre as carpintarias.

Para os elementos sujeitos a ataques de fungos, a madeira é retirada na envolvente da


zona danificada e queimada a ferro de soldar para evitar que haja uma propagação.
Com uma solução de pentaclorofenato de sódio, deve-se lavar igualmente os elementos
afectados com fongicidas. (Axmacher, 2007, p. 69)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Para os ataques de insetos, uma decapagem e escovagem com escova de ferro das
partes afetadas é necessária. Se certas partes são afetadas em mais de um terço da
sua secção, é necessário ter em conta a sua substituição ou o seu reforço. Uma limpeza
do local, devido ao ataque de fungos, deve ser feita.

No que diz respeito às intervenções dos elementos de madeira, variam de acordo com
as partes afetadas. Armações de madeira, soalhos, portas ou caixilhos não podem ser
tratados da mesma maneira. Estas reparações são efetuadas pela substituição das
peças danificadas. No caso das armações, pode acontecer que para certas peças
danificadas, nos vejamos na obrigação de injetar resinas époxi ou de cimento époxi nas
partes boas da madeira para as consolidar e reforçar. Este método, que é relativamente
discreto, adequa-se relativamente bem às peças não sujeitas à flexão.

Ilustração 106 - Detalhe do corrimão, Maison Autrique, arq. Ilustração 107 - Detalhe da cobertura do jardim de inverno, Hôtel
Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019). Ciamberlani, arq. Paul Hankar, Bruxelas,1897. (Ilustração nossa
2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

3.4.3. FERRO

“C’est en forgeant qu’on devient forgeron.”46 (proverbio francês)

Na Bélgica, a idade de ouro da indústria siderúrgica em ferro forjado foi por volta de
1900. Esta arte decorativa vai ser reinventada graças à contribuição do Art Nouveau nas
suas manifestações de originalidade e diversidade.

Ilustração 108 - Detalhe da fachada, Maison Saint-Cyr, arq. Gustave Stauven, Bruxelas, 1900. (Ilustração nossa 2018).

46 A prática leva à perfeição. (tradução nossa)

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A técnica de produção artesanal do ferro produzido pela laminação é muitas vezes


privilegiada pelos arquitetos do movimento. Se bem que mais dispendiosa, ela permite
realizar elementos inéditos e personalizados, integrando-se na obra de arte total.

Basicamente, o papel das ferragens é o da proteção, no entanto ele tem também um


papel decorativo. É colocada em pontos estratégicos ao nível da via pública ou das
partes inferiores da fachada, assim como dos vãos envidraçados. Pode aparecer sob a
forma de proteção ou na varanda dos pisos superiores. (Arets & Blérot, 2013, p. 35-36)
As ferragens conferiam uma ornamentação rica às fachadas.

O ferro forjado pode ser curvado, dobrado, torcido, entrançado ou moldado de modo a
dar-lhe formas originais e realistas, tais como aquelas produzidas na natureza. É
também unido por diferentes tipos de encaixes. Estes podem-se fazer a quente, com
diferentes tipos de soldaduras, ou a frio, neste caso, é um encaixe do tipo mecânico
feito com elementos de ligação.

O ferro fundido é usado sobretudo em tudo o que diz respeito aos elementos estruturais
da construção. A sua importante resistência à compressão permite utilizá-lo como
elemento portante, sob a forma de coluna, por exemplo, o que vai permitir a liberdade
espacial e de rasgar as fachadas levando também mais luz ao interior dos edifícios. Os
balaústres são frequentemente esculpidos e decorados como elementos decorativos.

Ilustração 109 - Detalhe da cobertura de entrada, Jardins d’enfants, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1897. (Ilustração nossa 2018).

João Miguel Aldeias Correia 132


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 110 - Detalhe do interior, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019).

O ferro fundido, de cor bastante escura, quase negra, é fabricado por vários artesões
qualificados à sua produção: o modelador que esculpe o modelo e que fabrica o molde;
o fundidor que prepara e verte o metal em fusão; e, por fim, o ferreiro que se ocupa do
trabalho final.

Certos elementos decorativos, tais como as balaustradas ou as varandas, são feitos de


preferência em ferro fundido do que em ferro forjado graças ao seu baixo custo,
consequência da sua produção em série. Esta produção em série é contrária aos ideais
do Art Nouveau, mas certos arquitetos, não obstante, recorreram a ela para ter custos
de produção menos elevados.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Nas fachadas, é comum ver, ao nível da decoração, os elementos em ferro forjado nos
andares inferiores, à vista do transeunte, enquanto os elementos em ferro fundido
estandardizado completam os andares superiores menos visíveis.

Ilustração 111 - Detalhe da bow-window, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019).

O ferro forjado e o ferro fundido são metais ferrosos que não resistem à humidade do ar
se não forem tratados convenientemente.

Antes da generalização da utilização da máquina a vapor, optava-se unicamente por


técnicas tradicionais de modelagem do ferro tais como a moldagem e a martelagem. Os
mecanismos eram ainda acionados pela água ou pelo Homem, até que a máquina a
vapor os substituiu, aperfeiçoando assim os laminadores. A laminagem é um método
que consiste no alongamento e achatamento do metal a fim de lhe conferir uma forma
regular para uma produção estandardizada mais importante e rápida.

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Existem diferentes tipos de patologias que podem degradar e danificar estes elementos.

Uma patologia de tipo mecânico consiste em ultrapassar o limite elástico do metal.


Quando ele é utilizado sobre um elemento metálico de construção, diferentes
solicitações tais como a tração, a flexão, o encurvamento ou a dilatação podem ocorrer.
Todas estas solicitações podem “desgastar” o elemento construtivo. Tal pode acontecer
quando o limite elástico do metal é ultrapassado. Não há forçosamente uma rutura, mas
esta leva a deformações que são permanentes.

Um outro fator de degradação possível sobre os elementos metálicos é o de origem


química, mais precisamente a corrosão atmosférica. É uma reação química entre o
metal e o oxigénio presente no ar (oxidação) ou entre o metal e a água (corrosão). Esta
reação acontece quando a humidade relativa do ar ultrapassa os 75%. A poluição do ar
ou a água são fatores agravantes. (Axmacher, 2007, p. 18)

No que diz respeito ao restauro, maioritariamente as peças em ferro fundido, cujas


partes estão danificadas, são substituídas por elementos remodelados e reconstituídos
meticulosamente em atelier.

O ferro forjado, pelo contrário, pode ser facilmente reparado. Estas reparações efetuam-
se no próprio local ou em atelier, dependendo da complexidade do restauro. Mas certas
partes que estão demasiado danificadas podem ser inteiramente substituídas. O ferro
forjado solda-se muito bem, e é muito fácil de montar as peças posteriormente.
(Axmacher, 2007, p. 22)

3.4.4. ESGRAFITO

“[…] De la conversation raffinée des hôtels de maîtres de Victor Horta au bavardage fleuri
des maisons d’employés, c’est un brouhaha incessant qui s’élève dans les rues des
nouveaux quartiers. Les styles, les genres, les écoles s’interpellent et se basculent. La
rue est une fête, un carnaval, avec ses élégantes, ses précieuses, ses masques, ses
contorsionnistes et ses bancroches […]”47 (Guy Dessicy apud Culot & Borsi, 2005, p. 6)

47[…] Desde a conversa refinada sobre as casas de Victor Horta até a tagarelice sobre as casas dos
operários, é um burburinho que se eleva nas ruas dos bairros novos. Os estilos, os gêneros, as escolas
desafiam-se e lutam entre si. A rua é uma celebração, um carnaval, com os seus elegantes, os seus
preciosos, as suas máscaras, os seus contorcionistas e pessoas estranhas. (tradução nossa)

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Ilustração 112 - Detalhe da fachada, Hôtel Ciamberlani, arq. Paul Hankar, Bruxelas,1897. (Ilustração nossa 2019).

O esgrafito é uma técnica de pintura próxima do fresco. É uma decoração mural obtida
pela aplicação de camadas sobrepostas: a primeira é um revestimento escuro, que é
pobre em ligaduras e, portanto, frágil. O segundo é uma argamassa mais clara, que é
mais resistente pois contém muito mais cal. De seguida o desenho é feito por incisões,
arranhões (o termo vem do italiano “sgraffito”, que significa arranhar) da camada
superior, revelando assim a argamassa negra do fundo. As diferentes partes do desenho
delimitadas são então coloridas. A dificuldade da operação reside no facto de tudo se
passar imperativamente enquanto a argamassa é ainda fresca e húmida, não se
podendo prolongar este trabalho por vários dias.

O esgrafito não é uma técnica inventada no período Art Nouveau. O primeiro esgrafito
data do século XVIII, mas é apenas a partir da Renascença que esta técnica ganha
amplitude e torna-se mais popular. (Culot & Borsi, 2005, p. 97) Posteriormente, cairá no
esquecimento, e será valorizado nas fachadas (entre outras) dos edifícios Art Nouveau
nos séculos XIX e XX, uma vez que esta técnica traduz bem o desejo deste movimento,
que é o de reabilitar as artes e os ofícios. Este novo “boom” do esgrafito deve-se também
ao seu baixo custo e às suas múltiplas possibilidades representativas. A produção do

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esgrafito diminui com a chegada da primeira guerra mundial, desaparecendo


completamente desde que a Art Déco, sucessora do Art Nouveau, preferiu o rigor
arquitetural e as formas mais geométricas. (Culot & Borsi, 2005, p. 53)

Ilustração 113 - Detalhe da fachada, Maison Cortvriendt, arq. Paul Hankar, Bruxelas,1900. (Ilustração nossa 2019).

No que diz respeito ao esgrafito na Bélgica, ele tem como origem um projeto de
decoração, que tinha por objetivo valorizar o primeiro Palais des Beaux-Arts de Bruxelles
(atualmente Musée d’Art Ancien). Este projeto, empreendido por Alphonse Balat, em
1880, foi, infelizmente, abandonado. Ele tinha como objetivo realizar, na grande entrada
do rés-do-chão, um esplêndido friso tendo por tema “a marcha progressista da arte”. O
pintor progressista belga Xavier Mellery (mestre de Fernand Khnopff, pintor simbolista
belga), tinha sido escolhido para o realizar, e foi também encarregue ao mesmo tempo
pelo governo belga de estudar a técnica do esgrafito e a sua viabilidade ao viajar pela
Europa. (Culot & Borsi, 2005, p. 38)

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Da harmonia entre o Art Nouveau e o esgrafito, decorre o “binómio” de arquitetos-


decoradores, que se associam e trabalham em conjunto, como por exemplo Paul Hankar
e Adolphe Crespin. (Culot & Borsi, 2005, p. 97) Os esgrafitos eram raramente assinados,
mas a identificação dos seus autores continua a ser possível graças à presença de
certos motivos ou detalhes próprios a cada um dos decoradores. (Culot & Borsi, 2005,
p. 58) Falamos por exemplo de Paul Cauchie que utiliza com regularidade dois motivos:
a rosa e a flecha.

Ilustração 114 - Detalhe da fachada, Maison Cauchie arq. Paul Cauchie, Bruxelas,1905. (Ilustração nossa 2019).

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A argamassa mais escura, é por natureza pobre em ligamentos, muito sensível aos
choques, aos movimentos estruturais do edifício, à humidade e ao gelo. Chega então o
momento inevitável em que é necessário restaurar. (Culot & Borsi, 2005, p. 38) Existem
diferentes fatores de degradação possíveis para os esgrafitos. Convém distinguir dois
tipos: os danos naturais e os danos causados pelo Homem. (Culot & Borsi, 2005, p. 41)

Um destes fatores é a cristalização dos sais: estes sais vêm instalar-se e cristalizar-se
na superfície, aparecendo uma eflorescência, mas se tal acontecer em profundidade,
esses cristais vão diminuir a coesão do revestimento e provocar a sua decomposição.
Os agentes poluentes que existem no ar estão igualmente na origem da sua
degradação. De facto, estes agentes podem provocar secreções ácidas que tem como
consequência decomporem os materiais calcários e, por sua vez, o revestimento. A
humidade tem também um papel importante uma vez que favorece a formação de
musgos ou de bactérias, não contribuindo para a conservação dos esgrafitos.

Evidentemente o gelo é um dos fatores que vai separar as camadas entre elas. Se a
água se infiltra no revestimento e este acaba por congelar, aumentando ao mesmo
tempo de volume e faz fissurar as sobreposições do revestimento. Do mesmo modo, os
grandes trabalhos de fachada, tais como a limpeza a jato de água, podem ser
responsáveis por muitos danos, se não se proteger convenientemente os esgrafitos.
Esses danos são muitas vezes irreversíveis.

Ilustração 115 - Maison 1900, rue Faider, arq. Albert Roosenboom, Bruxelas. (Ilustração nossa 2019).

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As operações de conservação ou de restauro são efetuadas no local, e dividem-se em


várias etapas. (D’Oreye, 2005, p. 224-225) Primeiramente a limpeza. Esta etapa faz-se
de maneira manual ou mecânica com o objetivo de fazer desaparecer da superfície toda
a sujidade e os sais eventualmente presentes. De seguida vem a fase de consolidação,
que consiste em endurecer as argamassas que foram fragmentadas colocando um
consolidante (silicato de etilo), e voltando a fixar as argamassas por infiltração de uma
mistura de caseinato de cal ou pó hidráulico de tijolo. As fissuras derivadas dos
movimentos estruturais são inevitáveis e devem ser preenchidas de novo por injeções
(pó de tijolo e cal hidráulica) e finalizadas de seguida por uma argamassa calcária.

Uma vez que o esgrafito tenha sido tratado em profundidade, é necessário ocupar-se
do tratamento das lacunas. Trata-se, neste caso, de as preencher e nivelar de modo a
apresentar uma superfície lisa e ininterrupta para evitar a infiltração de água e a
acumulação de pós no seu interior. Evidentemente a argamassa utilizada deve ser
compatível com o material de origem e é necessário que ele seja colorido tal como o
esgrafito é em superfície. Se a argamassa colorida se integrar no conjunto do esgrafito,
não é especialmente necessário de voltar a fazê-lo. É uma etapa que nem sempre é
obrigatória, mas que evitará uma intervenção e irá preservar a integridade da obra. O
retoque, se for necessário, serve sobretudo para restaurar a estética do conjunto da
obra. O restaurador irá aplicar uma camada de cor de uma tinta ligeiramente mais fria
que a original.

3.4.5. VITRAL

“People are like stained-glass windows. They sparkle and shine when the sun is out, but
when the darkness sets in, their true beauty is revealed only if there is a light form
within.”48 (Elisabeth Kübler-Ross apud Clemen, 2003, p. 84)

Se a arte do vidro é largamente dominada, na Idade Média, pelos artesãos, é com a Art
Nouveau que se vai espalhar o uso do vitral de grandes dimensões na arquitetura
privada, para fazer penetrar a luz nas sombrias e estreitas casas tradicionais de
Bruxelas. O vitral é uma montagem decorativa de diferentes vidros coloridos unidos em
conjunto por meio de chumbo. O vitral confere aos interiores uma atmosfera suave e
ajuda a esconder algum elemento não tão atraente, uma claraboia ou um pátio.

48As pessoas são como os vitrais. Eles brilham quando há sol, mas, quando a escuridão se instala, a sua
verdadeira beleza só é revelada se houver luz no seu interior. (tradução nossa)

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Ilustração 116 - Detalhe da cobertura, Instituut van de Ursulinen, art. Raphael Evrald, Mechelen, 1900. (Ilustração nossa, 2018).

São os vidreiros americanos Louis C. Tiffany e John La Farge quem inventou este vidro
opaco (vitral americano) nos anos de 1880 antes que ele comece a ser fabricado na
Europa nos anos de 1890. (Aubry, 2005, p. 8) É um vidro que é colado e colorido numa
massa com a ajuda de óxidos metálicos. Pode ser em relevo, ondulado ou listrado;
opaco ou iridescente; e tem um efeito dicróico, o que significa que a sua cor varia em
função da quantidade de luz e da sua direção. (Arets & Blérot, 2013, p. 32)

O desenvolvimento de vitrais na arquitetura coincide com a época do Art Nouveau.


(Hennaut & Demante, 1997, p. 94) Este interesse pelas composições em vidro na
arquitetura (janela de sacada, janela da porta, arco da porta de entrada ou de janela,
vidro de teto, etc) vai de encontro às teorias higienistas, que convidam à entrada de
mais ar, luz e espaço nos edifícios. A procura de luz torna-se uma missão para os
arquitetos do movimento.

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Ilustração 117 - Detalhe da cobertura do jardim de inverno, Hôtel Tassel, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019).

Ilustração 118 - Detalhe da cobertura das escadas, Maison Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019).

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O fabrico do vitral divide-se em nove grandes etapas. (Axmacher, 2007, p. 67)


Primeiramente, o projeto é transcrito sob a forma de desenho que é a base da criação
de um vitral. O projeto constrói-se seguindo a composição do vitral no edifício e a
quantidade de luz que será suscetível de receber. Em geral, o anteprojeto é realizado
em papel grosso, a uma escala de 1/10, e pintado a aguarela ou a guache conforme a
preferência.

De seguida, vem a etapa do cartão. É realizado com base numa maquete e num
desenho, mas desta vez à escala real. É redesenhado sobre um papel forte, e em
seguida cortado em diferentes calibres que correspondem aos vários elementos do
vidro.

A terceira etapa é a dos modelos. Transpomos os calibres do passo anterior numa


camada, sem esquecer de deixar entre eles um espaço para os chumbos. Chamamos
padrão de corte a este decalque que servirá de criação a um novo modelo rígido em
cartão e de guia para o corte de cada elemento em vidro.

Etapa seguinte, a escolha dos vidros a utilizar em função das cores da maquete, e dos
efeitos de opacidade ou de transparência desejados. Esta escolha tem em conta
igualmente a estrutura geral do painel, a espessura do vidro, ou ainda a orientação do
vitral.

O corte dos modelos é a quinta etapa, em que estes são dispostos sobre uma mesa,
plana, para formar o desenho final do painel, e fixados com a ajuda de pregos.

A cravação, também chamada de montagem, consiste em inserir os vidros nas hastes


metálicas. Estas são dispostas de maneira a não interferir com a vista no conjunto da
composição vitral.

A antepenúltima etapa é a do enchimento. É uma fase importante uma vez que garantir
a impermeabilidade do vitral e a boa manutenção das diferentes peças. Os
componentes da massa são uma mistura bastante líquida de giz branco, óleo de linho,
de preto fumado que age como um corante e de um agente de secagem (que acelera a
secagem da pintura). No caso em que o vidro é pintado em vez de ser manchado na
massa, a massa só é colocada no lado não pintado. Finalmente, resta apenas colocar
os vitrais no seu lugar.

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Ilustração 119 - Detalhe de vitral porta, Maison Horta, arq. Ilustração 120 - Detalhe de vitral porta, Hôtel Tassel, arq. Victor
Victor Horta, Bruxelas, 1898. (Ilustração nossa 2019). Horta, Bruxelas, 1893. (Ilustração nossa 2019).

A degradação dos vitrais pode ser causada por diversos fatores. A água e o ar podem
ser responsáveis pela deterioração do vidro. Por exemplo na ausência de circulação do
ar em zonas húmidas. A condensação pode alterar a superfície do vidro e fazê-lo perder
a sua translucidez. As pressões exercidas sobre o painel e a flexibilidade do chumbo e
da massa vidreira pode levar a uma deformação maior.

Ao nível do restauro há diferentes opções possíveis. Se é apenas um modelo que é


partido ou que está em falta, recuperamos esse modelo e voltamos a colá-lo ou substitui-
lo por um novo. Nos casos mais graves, um estudo preliminar aprofundado sobre o vitral
é necessário, pois o resultado que vemos hoje em dia é talvez longe daquele do que o
vitral parecia na sua origem.

Para o restauro dos vidros dois métodos de restauro podem ser realizados segundo o
estado do vidro assim como o valor e a qualidade do trabalho feito nele. O mais simples
assenta sobre a substituição dos modelos em falta ou danificados por novos o mais
próximo possível do aspeto e da composição dos originais. Se os vidros têm um valor
importante, adotamos a técnica da colagem graças a colas transparentes em resinas
sintéticas. Durante a colocação do vitral restaurado, colocamos muitas vezes um
elemento de proteção contra os elementos exteriores.

A reparação assim como o restauro de um vitral são sempre delicadas. Apenas um


mestre vidreiro restaurador é capaz. (Hennaut & Demante, 1997, p. 99)

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4. ATUALIDADE DO PATRIMÓNIO ART NOUVEAU

4.1. CASOS DE ESTUDO

“Aucune expérience humaine n'est dénuée de sens ou indigne d'analyse.” 49 (Primo Levi
apud Levi, 1988, p. 108)

Análise de três casos de bens patrimoniais Art Nouveau reutilizados hoje.

O património hoje deve assentar sobre dois pontos que podem, à primeira vista, anular-
se e mesmo opor-se, quando, no seu âmago, devia ser é exatamente o contrário.

Primeiramente, o bem patrimonial, qualquer que seja ele, é por si um património, por
definição, que procuramos transmitir às gerações futuras e como tal, procuramos
protegê-lo dos efeitos do tempo. Tentamos "colocá-lo no pedestal" fora do alcance do
tempo com o objetivo de não trair a sua essência. Mas, por outro lado, a sustentabilidade
da obra, assim como a sua transmissão, para voltar ao primeiro ponto, depende
essencialmente da sua integração na sociedade atual.

Que melhor maneira para o integrar que ocupá-lo, atribuir-lhe uma nova função, habitá-
-lo?

Em resumo, atribuir-lhe um novo papel na nossa sociedade atual?

Para o fazer, é importante clarificar o termo “habitar”. Este tem origem na palavra latina
“Habitare”, que significa habitar, ocupar, frequentar (Gaffiot, 1934, p. 732). Habitar um
lugar é, portanto, diferente de percorrer um lugar. É uma ação que está relacionada com
o tempo e o espaço. Ela supõe um tempo longo, de vários anos ou diferentes gerações.
Habitar significa também apropriar-se do espaço pela apropriação de um lugar de
maneira sustentável, instalar-se por um longo período.

Este conceito é um pouco mais delicado no que respeita a um bem patrimonial.

Como poderemos nós apropriar-nos de algo que pertence, de um certo modo, ao


coletivo?

“Il y a deux choses dans un édifice : son usage et sa beauté. Son usage appartient au
propriétaire, sa beauté a tout le monde, à vous, à moi, à nous tous. Donc, le détruire c’est
dépasser son droit.”50 (Hugo, 1832, p. 621)

49Nenhuma experiência humana é sem sentido ou indigna de análise. (tradução nossa)


50Existem dois valores num edifício: o seu uso e a sua beleza. O seu uso pertence ao proprietário, a sua
beleza a todos. Portanto, destruí-lo é exceder o seu direito (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Hoje em dia, poucos bens patrimoniais têm a possibilidade de acolher a mesma função
para a qual foram concebidos de origem. E no caso em que tal acontece, é necessário
saber que, certamente, tal não será possível nas condições originais de ocupação.

O problema suplementar que se coloca, particularmente com as obras do Art Nouveau,


é que dado que são obras de arte totais (Gesamtkunstwerk), a proteção do edifício ou
da fachada, estende-se também ao interior, muitas vezes mesmo até ao mobiliário,
quando os monumentos puderam conservar os interiores de origem. Não é questão
aqui, o “fachadismo”, que significa conservar unicamente a fachada e recriar por trás
desta algo diferente. Tal facto, será contrário aos ideais do movimento Art Nouveau no
qual a fachada era o reflexo do interior. Aqui interior e exterior estão estritamente
ligados.

Neste caso, o termo “habitar” é utilizado no sentido mais vasto de ocupar. A


problemática é então compreender como, atualmente, são utilizados e ocupados os
edifícios Art Nouveau na cidade de Bruxelas.

Como integrá-los da melhor maneira no nosso modo de vida?

Além disso, hoje, o Art Nouveau, associado a outras referências e atracões da Bélgica,
(como o chocolate, a cerveja ou a banda desenhada) tornou-se um elemento constitutivo
da identidade cultural da Bélgica, e mais particularmente de Bruxelas. Fazer um
percurso Art Nouveau ou visitar o Musée Horta, ou mesmo outros edifícios do
movimento, tornou-se também incontornável para os turistas, como de levar consigo
outros “souvenirs”, durante a sua passagem na capital Belga.

De facto, já não contamos mais os livros e documentários consagrados a este sujeito,


assim como as numerosas visitas e percursos organizados. Existe igualmente um
festival (BANAD) dedicado ao Art Nouveau e à Art Déco, que decorre todos os anos, no
mês de março, em Bruxelas.

Esta identidade cultural belga emerge de um passado comum. Este passado comum,
tomamo-lo como uma herança coletiva, dos antepassados, mas também como uma
vontade política de integração em que o desejo da sociedade será de os projetar no
futuro. O património arquitetónico demarca-se, sendo, sem dúvida o elemento mais
visível de todos os componentes próprios desta identidade cultural, e que é percebido
de maneira clara e imediata no nosso ambiente. Ele é igualmente uma chamada de
atenção que construímos todos os dias para o património de amanhã.

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Não é o desejo do arquiteto, criar uma arquitetura capaz de se adaptar às futuras


gerações?

Através de três experiências pessoais, vamos neste capítulo, tentar analisar onde se
situa o património Art Nouveau em Bruxelas e no que se tornou, para posteriormente
compreender e explicar como é reutilizado e atualmente “habitado”.

Não se trata, em nenhum dos casos, de uma descrição detalhada destas três obras,
mas um ressentir, de experiências vivenciadas no momento da redação desta
dissertação assim como o entendimento de cada projeto. A nossa escolha orientou-se,
espontaneamente, sobre estes três bens patrimoniais por simples razões. Na ocasião
da visita ao Hôtel Tassel e ao Hôtel Van Eetvelde, que são raramente abertos ao público,
como muitos outros edifícios deste movimento, não deixámos passar a oportunidade,
sobretudo pelo facto de o Hôtel Tassel, se tratar do principal edifício Art Nouveau em
Bruxelas, de Victor Horta, e que deu origem ao movimento. Na terceira escolha,
optámos pela Maison Horta, hoje Musée Horta, por ser a sua própria casa e o
“monumento” Art Nouveau em Bruxelas, uma vez que é o ponto de partida obrigatório
para os amantes e admiradores deste movimento arquitetónico.

4.1.1. HÔTEL TASSEL – RUE PAUL-ÉMILE JANSON N º 6, BRUXELAS – 1893-


1896

“[…] Cette maison est une date, une grande date dans l’histoire de l’architecture : la
première manifestation d’un mouvement aujourd’hui victorieux, la première œuvre
moderniste dans l’œuvre chronologique. Tout l’art de Victor Horta est dans ce logis, dans
son plan aussi bien que dans sa façade et dans le choix et le mariage des matériaux dont
elle est composée. Il faudrait veiller sur cette construction comme sur une relique ; un
jour, on ira vers elle, comme un pèlerinage : on ira la consulter pour comprendre tout ce
qui est sorti d’elle, pour découvrir en elle, tout ce qu’elle annonçait de puissant, de
magnifique, de pratique […].”51 (Sander Pierron, 1924 apud Loyer e Delhaye, 1996,
contracapa)

51[…] Esta casa é um marco, um grande marco na história da arquitetura: a primeira manifestação de um
movimento que hoje é vitorioso, a primeira obra modernista da obra cronológica. Toda arte de Victor Horta
está nesta habitação, no seu plano, bem como na sua fachada e na escolha e na junção dos materiais de
que é composta. Será necessário vigiar esta construção como uma relíquia, iremos a ela, como uma
peregrinação: vamos consultá-la para entender tudo o que saiu dela, descobrir nela tudo o que ela anunciou
de poderoso, magnífico, prático […]. (tradução nossa)

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Ilustração 121 - Fachada Rue Paul-Émile Janson, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019).

Foi, aquando da nossa participação no festival BANAD, que tivemos a rara ocasião de
visitar o Hôtel Tassel, considerada a primeira obra que abre as portas ao mundo do Art
Nouveau, em 1893. Classificado como monumento pelo decreto real de 18 de novembro

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de 1976, foi no mesmo ano adquirido pelo arquiteto Jean Delhaye, que em 1982 o
restaurou no intuito de lhe restituir o seu esplendor inicial. Só mais tarde, no ano 2000,
foi inscrito na lista do Património Mundial da UNESCO.

Mandado construir por Émile Tassel,52 é implantado num terreno de 7,79m de largura e
29m de profundidade, dos quais 20.8m ocupados pela casa, cujo programa consiste
numa habitação para um solteiro e a sua mãe, com o gosto de acolher os amigos e
realizar em casa os seus trabalhos científicos. Os pisos sociais/nobres são no piso
térreo e primeiro piso, a cozinha e áreas técnicas são na cave, pela qual se tem acesso
exclusivo ao jardim, tipicamente inspirado nos jardins japoneses.

Chegamos enfim à Rue Paul-Émile Janson, e deparamo-nos com uma fachada que se
destaca, por diferentes características, de uma série de edifícios em banda, de linhas
retas e com bow-widows paralelepipédicos.

Constatamos também que o que existe de original nesta fachada é, em primeiro lugar,
a porta de entrada situada ao centro, contrariamente às casas típicas de Bruxelas, que
colocam a porta à esquerda ou à direita, no prolongamento da caixa de escadas
encostada a uma das paredes comuns à habitação vizinha. Uma referência clara à
planta aberta que Horta criou ao reinventar o plano tradicional de três espaços
consecutivos com o corredor ao centro, uma vez que esse espaço é privado de luz. 53

Ainda nem entrámos nesta habitação e estamos maravilhados com esta fachada única
e todos os seus detalhes. Nela podemos verificar a aversão de Horta às linhas retas, ao
observar as fachadas vizinhas com as suas bow-windows de formas retas e
pontiagudas. A novidade mais marcante desta fachada é, sem dúvida, o uso do vidro e
do ferro, e da sua relação com a pedra. 54

52 Foi professor de geometria descritiva da Université Libre de Bruxelles e, como Horta, membro do grupo
maçónico Les Amis Philanthropes.
53 Notamos, no entanto, que Paul Hankar, que na mesma altura constrói a sua própria casa, não só mantêm

a porta de entrada à esquerda, mas também o plano tradicional habitual de Bruxelas, trazendo sobretudo
algo novo, pelo tratamento decorativo da fachada e do interior da habitação.
54 A pedra d’Euville e de Savonniers, bastante apreciada no Art Nouveau, pelas suas diferentes cores, era

utilizada em alternância para ritmar o conjunto de listras horizontais, demostrando um certo gosto de luxo
pelo arquiteto, constituindo uma novidade em relação ao tradicional tijolo de alvenaria.

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Ilustração 122 - Detalhe da fachada com vitral da sala de fumo e a bow-window do escritório. (Ilustração nossa, 2019).

Contudo, apesar dos aspetos revolucionários, podemos ainda observar alguns aspetos
tradicionais nesta fachada, como as três janelas com duas paredes/suportes entre elas
e bow-window,55 o aspeto egípcio da porta de entrada, a divisão tripartida e a
sobreposição clássica do subsolo/pisos nobres superiores/sótão, ou o uso de materiais
tradicionais de caráter artesanal ao lado de outros, novos. (Goslar, 2012, p. 93)

55 Na época, para parecerem importantes, as casas “deveriam” ter três janelas na fachada.

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Ilustração 123 - Planta do piso térreo e alçado da fachada acompanhado do pedido de autorização de construção introduzido a 9 de
agosto de 1983 à cidade de Bruxelas. ([Adaptado a partir de:] Dulière, 1985, p. 36).

Mas foi, sem dúvida, na conceção do interior que Horta foi mais ousado. A planta
organiza-se de forma rígida e rigorosa em torno de um só eixo simétrico, que também é
evidente na fachada, tal como através do corte longitudinal dividido em dois corpos. É
ao longo deste eixo de simetria que se desenrola o percurso interior. A entrada na
habitação é central, e o habitante percorre este eixo central até ao salão; já no centro
da habitação, um eixo transversal indica uma mudança de direção. É através da escada
principal posicionada a meio piso, no centro da habitação, que os dois corpos
comunicam entre si. O corte longitudinal revela a sucessão dos dois corpos principais
unidos por claraboias, que resolvem simultaneamente o problema da iluminação e da
ventilação. Os dois edifícios são claramente distintos: o corpo construído na frente de
rua é o espaço de trabalho e de receção de amigos e convidados, organizando-se em
torno de um eixo central onde dominam as curvas, enquanto que o corpo posterior é
reservado à intimidade e às funções domésticas, que permanecem numa linha mais
tradicional.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 124 - Organização da planta através dos eixos. Da esquerda à direita: planta do piso térreo; planta do piso intermédio; planta
do 1º piso. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2006, p.36).

Ilustração 125 - Corte longitudinal acompanhado do pedido de autorização de construção introduzido a 9 de agosto de 1983 à cidade de
Bruxelas ([Adaptado a partir de:] Dulière, 1985, p. 37).

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Ilustração 126 - Corte axonométrico através da planta do piso térreo e do jardim de inverno indicado pelas linhas a pontilhado ([Adaptado
a partir de:] Dernie e Carew-cox, 1995, p. 81).

Ilustração 127 - Planta do piso térreo e corte longitudinal dos espaços nobres da habitação ([Adaptado a partir de:] Dernie e Carew-cox,
1995, p. 89).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

É ao passar a porta de entrada que uma grande surpresa nos espera, quando entramos
num pequeno hall com o teto relativamente baixo e com as paredes revestidas, de uma
imitação de mármore verde, com uma dupla porta em vitral americano martelado e
colorido de tons verde e roxo, dando acesso a um vestíbulo octogonal. Este hall, tem
uma função específica, de dar acesso ao vestíbulo situado à esquerda, e à pequena
sala de receção, à direita. Ao passar esta dupla porta (composta por vitrais em vidro
americano, em vez do vidro pintado, apresentando a vantagem de deixar passar a luz,
preocupação permanente de Horta) temos, de imediato, uma visão ampla e ordenada
do espaço. À esquerda uma pequena casa de banho, à direita, de novo, uma porta para
a sala de receção com acesso direto à escada que nos conduz à cave, acesso esse
também possível pelo vestíbulo octogonal.

Ilustração 128 - Detalhe do pavimento do vestíbulo da entrada. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

O nosso olhar chama-nos a atenção para os mosaicos de mármore no pavimento em


forma espiral de polvo, com uma placa de cobre ao centro, cuja função era aquecer a
casa, mas que, atualmente, está fora de uso. Este aquecimento era feito por uma
entrada de ar no jardim, por baixo do solo, passando o ar por um radiador aquecido,
saindo no hall octogonal da entrada, evitando assim os grandes radiadores em ferro
dando um conforto desde que se entrava na casa e proporcionando uma atmosfera
acolhedora. Este é mais um exemplo do engenho de Horta, ao experimentar este
sistema de aquecimento e ventilação, uma proeza técnica para a época.

Saímos do vestíbulo octogonal e subimos um lance de escadas em mármore branco


chegando ao “coração” da habitação, onde o pé direito é maior, o espaço
completamente aberto e cuja estrutura metálica é bem visível, dando uma fluidez
espacial e visual incrível, entre os diferentes espaços.

Ilustração 129 - Vista do vestíbulo para o piso nobre. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Por todo o lado um banho de luz, pois temos uma visão ampla dos diferentes espaços
devido às divisões em vidro que os separavam do vestíbulo, uma vez que finas e
elegantes colunas de ferro fundido, assim como as vigas de ferro aumentam a sensação
de espaço invadido pela luz zenital trazida pela claraboia do jardim de inverno, à nossa
esquerda.

Ilustração 130 - Vista do vestíbulo para o jardim de inverno. (Ilustração 2019).

À nossa frente, o salão que se estende por toda a largura do terreno, seguido da grande
sala de jantar ao fundo que dá para o jardim exterior.

Ao olharmos à nossa volta, constatamos que a decoração se funde com a estrutura (no
Art Nouveau espaço e decoração estão intrinsecamente ligados). Os capitéis das
colunas em ferro prolongam-se em hastes metálicas em forma de chicote, “coup de
fouet”, que as unem ao resto da decoração, assim como tentáculos vegetais se
contorcem para suportar as vigas de ferro rebitadas que percorrem os tetos encurvados.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 131 - Visto do vestíbulo para a escada. (Ilustração nossa, 2019).

A todas estas magnificas ondulações, juntam-se as do pavimento, realizadas em


mosaicos de mármore, de tons brancos e alaranjados, desenhando fagulhas e
enlaçados orgânicos; as pinturas murais que se prolongam pelos tetos e pelas vigas de
ferro; as portas e certas janelas decoradas de vitrais cujos desenhos evocam os fundos
marinhos ou bolbos de flores.

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Ilustração 132 - Vista do salão para o vestíbulo e a sala de fumar. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 81).

Ilustração 133 - Desenho dos mosaicos do pavimento no rés do chão. ([Adaptado a partir de:] Loyer e Delhaize, 1996, p. 106).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Por fim, à nossa direita a imponente escada que nos convida a percorre-la e nos conduz
ao piso intermédio, cuja parede é revestida por uma grande pintura mural, num dégradé
de verdes, ocres e laranjas, composto de arabescos e motivos vegetais estilizados,
realização de Henri Baes. 56

Ilustração 134 - Vista para a escada nobre. (Ilustração nossa, 2019).

A imponente escada leva-nos ao piso intermédio, encimado por um nicho com uma
escultura de David ou Perseu de Godefroid Devreese,57 decorado com arabescos verde
oliva que prolongam a base em folhas de acanto, e que nos leva diretamente à sala de
fumar que corresponde ao primeiro piso da bow-window. Deparamo-nos com um vitral
de estilo japonês de seis painéis em vidro americano, representando em tons roxos e

56 Pintor, decorador, artista de frescos, arquiteto e desenhador belga, nasceu em 1850 e faleceu em 1920.
Foi professor da Académie Royale des Beaux Arts de Bruxelas e membro da Comissão dos Monumentos
Históricos.
57 Escultor e medalhista belga, nasceu em 1861 e faleceu em 1941.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

amarelados, de remoinhos de fumo de cigarro acima de uma decoração vegetal


abstrata.

Ilustração 135 - Vista para o vitral da sala de fumar. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 96-97).

Por baixo do vitral reparamos nas saídas de ar do radiador por trás do divã embutido na
base do reforço interior da bow-window, dando um certo conforto a este pequeno
espaço. Daqui a vista que temos é magnífica, sobre o salão e a sala de jantar, assim
como dos delicados desenhos do teto e ferragens do vestíbulo.

Ilustração 136 - Vista da sala de fumar para o salão. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 83).

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Continuamos a nossa visita em direção ao primeiro piso, onde somos invadidos pela
harmonia das cores: do branco ao verde oliva, passando pelo marfim, o castanho, o
verde escuro e o dourado dos candeeiros que se erguem da escadaria como
deslumbrantes arranjos florais. Chegamos ao patim intermédio, e observamos a
magnífica integração das lâmpadas, perfeitamente incorporadas ao longo da escada e
dissimuladas em torno das colunas em ferro (outra característica engenhosa de Horta,
ao tirar partido das recentes descobertas do final do séc. XIX, no intuito de atribuir o
máximo de conforto aos espaços). Ainda no mesmo patim, Horta, ostenta em todo o
comprimento, um magnífico vitral bastante iluminado pelo poço de luz do jardim de
inverno, em tons azuis muito claros e amarelo pálido, evocando de maneira mais realista
que o da sala de fumar, uma paisagem de montanhas e céu claro, com perfis de flores
estilizadas.

Ilustração 137 - Vista do patim para o escritório. À esquerda, no nicho, o David de Godefroid Devrees; à direita, o grande vitral decorado
com uma paisagem de montanha. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 102).

Subimos mais alguns degraus e chegamos ao escritório, com uma luz extraordinária
vinda das grandes janelas da bow-window.

O resto da habitação não tem muito mais de surpreendente, pois toda a atenção do
arquiteto foi concentrada na fachada e nos espaços de receção, nomeadamente no piso
térreo e no piso intermédio, assim como no grande escritório situado no primeiro piso.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Atualmente, a utilização do edifício como escritórios de advogados, permitiu-lhe voltar


ao seu estado original, o que, por si só, é suficiente, mesmo se se pode verificar uma
discordância evidente entre o mobiliário atual e a decoração da época.

Ilustração 138 - Fotografia antiga do salão, vestíbulo e jardim de inverno. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 104).

4.1.2. HÔTEL VAN EETVELDE – AVENUE PALMERSTON Nº 4, BRUXELAS –


1895-1899

“J’espère avoir clairement établi que les diverses parties de la construction doivent
mériter notre attention par la délicatesse du dessin, la perfection de leur couleur, la valeur
précieuse des matériaux employés et leur intérêt légendaire."58 (John Ruskin, Les Pierres
de Venise, 1851-1853 apud Evrard, 1996, p. 36)

58Espero ter estabelecido de maneira clara que as diversas partes da construção merecem a nossa atenção
pela delicadeza do desenho, pela perfeição da sua cor, pelo precioso valor dos materiais utilizados e pelo
seu interesse lendário. (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 139 - Vista geral do conjunto, Hôtel Van Eetevel e extensões, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019).

Foi por ocasião de uma visita organizada pelo ARAU, que finalmente chegamos ao Hôtel
Van Eetvelde. Estes dois edifícios (nº 2 e nº 4) foram mandados construir por Edmond
Van Eetvelde, homem de negócios, diplomata e assessor pessoal do Rei Leopoldo II,
exercendo a função de secretário geral do Estado Independente do Congo, pelo qual
lhe foi atribuído o título de Barão em 1897.

O nº4, que pertenceu à Maison du Gaz, foi mandado construir em 1985. Horta, realiza
diferentes alterações aos interiores nos anos que se seguem. Em 1899, o arquiteto
realizou uma ampliação do Hôtel (nº2) na direção da esquina com a Square Marie-
Louise, para um edifício de arrendamento. Em 1901, Horta junta uma segunda
ampliação, desta vez do lado da Avenue Palmerston, numa parcela adquirida por Van
Eetvelde. Apesar destas inúmeras modificações, a coerência do conjunto arquitetónico
permanece, tendo Horta permanecido como arquiteto de cada uma delas. Em 1950, o
nº4, é adquirido pela FIGAZ, até hoje a proprietária do edifício, que tal como a extensão
de 1901, são classificados pelo decreto real do 18 de novembro de 1976 e inscritas
desde o ano 2000 na lista do Património Mundial da UNESCO.

Nos anos seguintes vários foram os proprietários do nº2 e inúmeros os projetos


imobiliários para o edifício que previam, entre outras hipóteses, a sua demolição e a
construção de um edifício de apartamentos de vários pisos. Em 1958, o arquiteto Jean

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Delhaye, decide instalar-se aqui e o edifício, classificado pelo decreto real de 21 de


junho de 1971, é posteriormente adquirido por um serviço da embaixada da Hungria.

Em 2020, no Hôtel Van Eetevel, estão em curso importantes trabalhos de reabilitação,


quer do exterior, quer dos interiores, a cargo do atelier Barbara Van der Wee que, já
anteriormente tinha realizado o restauro da fachada e da cobertura, nomeadamente das
suas imensas claraboias.

É de precisar que o nosso principal enfoque e análise é sobre o Hôtel principal (nº4), e
não sobre as suas extensões (nº2). É com expectativa que esperamos ser capazes de
descobrir o seu interior, pois as poucas imagens que podem ser vistas em livros ou na
internet estão longe de refletir a beleza e a genialidade da criação dos edifícios Art
Nouveau.

Ilustração 140 - Fachada Avenue Palmerston, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Estamos em frente a esta fachada e constatamos que, desde já, a porta de entrada não
está localizada ao centro, como no Hôtel Tassel, mas do lado direito da fachada, uma
referência direta à organização da planta que Horta projetou. Observando ainda esta
magnífica fachada que, por si só, deveria revelar as escolhas mais revolucionárias do
líder incontestável do Art Nouveau, na Bélgica, notamos o refinado trabalho em ferro,
que Horta jamais teria ousado e iria ousar. Metal esse, na época, associado, até então,
às construções industriais e, ainda visto com desconfiança, quando aplicado a uma
construção privada, sobretudo numa fachada de tamanha envergadura. Impregnamo-
nos dos detalhes notando desde logo que a decoração desta fachada não é pintada,
como imaginávamos, mas composta de pequenos mosaicos com sublimes desenhos
em arabescos que se acentuam em cada piso que sobe.

Ilustração 141 - Corte e alçado da fachada. ([Adaptado a partir de:] Borsi e


Portoghesi, 1990, p. 118).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ilustração 142 - Detalhe do mosaico e do metal da fachada. (Ilustração nossa, 2019).

O edifício parece ter sido projetado para, em primeiro lugar, nos chamar a atenção, e,
em seguida nos deslumbrar, uma vez que passamos a porta de entrada, pois o que não
esperávamos era tal sucessão de surpresas. A nossa excitação está no auge e a
experiência é promissora, uma vez que o próprio Horta faz uma referência audaciosa
ao falar do projeto desta habitação:

"Van Eetvelde étaient de ces hommes qu'on voit venir avec indifférence, mais qu'on quitte
à regret après un court contact. J'estimais qu'avec lui, mon imagination pouvait courir en
liberté : je lui présentai le plan Ie plus audacieux que j'avais fait jusque-là." 59 (Victor Horta
apud Duliere, 1985, p. 78)

Na conceção do interior Horta também deu prova de ousadia. Ao analisarmos a planta


do Hôtel Van Eeteveld, constatamos que a disposição dos eixos é uma total novidade
em relação ao Hôtel Tassel. Dois sistemas de eixos sobrepõem-se organizando a
planta. Existe, de um lado, um esquema bastante tradicional dos eixos de simetria que
organizam o conjunto. Por outro lado, o percurso imposto ao visitante para ir da entrada
ao salão do primeiro piso é tão rigoroso (não podemos seguir um outro a não ser aquele
que Horta estipulou) que as direções indicadas são entendidas como verdadeiras

59Van Eetvelde foi um daqueles homens que vemos chegar com indiferença, mas nos arrependemos depois
de um curto contacto, e pensei que com ele a minha imaginação pudesse correr livremente: eu apresentei-
lhe o plano mais ousado que eu tinha feito até então. (tradução nossa)

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instruções para percorrer o espaço. A partir do pequeno hall de entrada, já somos


dirigidos diagonalmente através da habitação, o que não é habitual na planta da casa
burguesa. Horta rompe completamente com a planta convencional da casa típica de
Bruxelas. Percorrer na diagonal, e não em linha reta, através de um espaço, aumenta a
distância a ser percorrida.

Ilustração 143 - Organização da planta através dos eixos. Planta piso térreo e 1º piso. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2006, p. 37).

O corte longitudinal revela a sucessão dos dois corpos principais, unidos pela escada
central, encimada pela cúpula, que resolve simultaneamente o problema da iluminação
e da ventilação. Observamos ainda que os dois corpos do edifício estão implantados ao
mesmo nível, e que comunicam entre si através da escada central, colocada a meio piso
em relação a estes.

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Ilustração 144 - Corte longitudinal. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 75).

Ilustração 145 - Corte axonométrico do conjunto, Hôtel Van Eetevel e extensões. ([Adaptado a partir de:] Dernie e Carew-cox, 1995, p.
119).

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Esta direção obliqua é conscientemente introduzida na planta. É de referir que este Hôtel
servia os propósitos do seu proprietário, Van Eeteveld, com necessidade de grandes
espaços de receção e de um interior concebido para seduzir e deslumbrar futuros
clientes dos seus negócios. “Receber”, neste caso, significa criar espaço e superfície: o
que se conseguiu prolongando de maneira consciente a distância a percorrer através
da habitação.

Quando finalmente entramos não sabemos mais para onde olhar já que a entrada do
edifício nos surpreende. No pequeno hall de entrada, com um teto baixo e pouco
iluminado, encontramo-nos num piso composto de mosaicos de mármores vermelhos e
amarelos. A partir deste pequeno hall pentagonal, há ainda uma porta à esquerda de
acesso à casa de banho, uma porta de frente que leva às áreas de serviço, incluindo a
lavandaria e a cozinha, e duas grandes portas de madeira à direita que servem como
pequeno espaço de arrumação muito reduzido.

Ilustração 146 - Fotografia antiga do hall de entrada dando acesso às escadas com vista para o hall, Hôtel Van Eetevel e extensões.
([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 190).

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Na verdade, essas portas serviam apenas para dar uma impressão de grandeza à
habitação que, originalmente, servia para receber bastantes convidados nas receções
do Barão Van Eetvelde (é por isso que, uma grande parte do orçamento da obra feita
por Horta foi dedicado ao primeiro andar e à sala de receção, ao contrário, por exemplo,
do Hôtel Solvay onde Horta teve carta-branca para toda a construção). Achamos
fascinante ver o quanto o génio dos arquitetos deste movimento possibilitou a criação
do “trompe-l'oeil” nas portas para aumentar a imponência do edifício.

Continuamos a nossa visita, passando através de uma porta dupla de vidro, na direção
desta “rua diagonal”, um espaço bastante mais iluminado o que o pequeno hall de
entrada. Somos conduzidos por uma elegante escada, composta de pequenos
mosaicos verdes nos quais se entrelaçam outros mais alaranjados em todo o hall, em
direção ao piso intermédio, de forma octogonal, onde se encontra o jardim de inverno,
e que se estende em toda a largura da habitação e cujas paredes sustentam a famosa
cúpula da habitação.

Ilustração 147 - Fotografia antiga no primeiro lance de escadas do hall central para a entrada. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012,
p.242).

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Esta faz parte daquilo que nós preferimos na arquitetura de Horta: os poços de luz
criados no centro da habitação, em torno dos quais a vida é organizada nos diferentes
espaços. Feita de maneira sublime, esta cúpula de vitral erguida sobre um alto pé direito,
que confere uma sensação de imensidão ao espaço, repousa sobre trinta e duas
nervuras e oito pilares de metal. Uma luz esplêndida é filtrada através das suas grades
em ferro.

Ilustração 148 - Vista do hall octogonal no 1º piso para a entrada no piso térreo e o grande salão. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012,
p. 244).

Este hall é contornado por um segundo lance de escadas que conduz ao primeiro piso,
e achamos interessante comparar essa circulação posta em prática pelo arquiteto com
o termo "deambulatório". O termo é usado para a galeria que se articula em torno da
nave e da abside de uma igreja. Foi usado especialmente para a passagem de
peregrinos em volta da nave que abrigava os corpos sagrados ou as relíquias. Um

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espaço muito importante numa igreja, em que também podemos ver o reflexo da luz dos
muitos vitrais que circundam esta galeria. Estas duas passagens pareciam-nos muito
semelhantes em termos de conceção e jogo de luz dos vários vitrais, e é por isso que
pensamos que o termo é apropriado para definir este espaço que coloca a cúpula em
vidro no centro das atenções.

Nesse momento, descobrimos que, inicialmente, as paredes do jardim de inverno foram


projetadas em vitrais, para desse modo trazer luz às áreas de serviço do piso térreo.
Mas logo após a construção, foi o próprio Victor Horta quem as substituiu por painéis de
mármore verde a pedido da esposa de Van de Velde. Ao mesmo tempo, ele também
removeu os blocos de vidro no chão, do centro, octogonal (o Art Nouveau é uma
arquitetura progressista feita para as classes mais abastadas, e é necessário adaptar-
se às exigências desses clientes). As paredes deste espaço são revestidas por painéis
de mármore em tons bastante pálidos de branco, cinza, dourado e azul. Os tons de
verde presentes ao nível das escadas, as tonalidades mais claras ao nível das paredes,
assim como as ferragens de linhas vegetais, fazem-nos pensar que estamos num
verdadeiro jardim, numa atmosfera propícia à reflexão e à introspeção.

"Horta conçoit un parcours en spirale au cœur de la maison, qui semble l'image même
du dèsir d'introspection qu’amène l'homme á une plus claire conscience de lui-même."60
(Françoise Aubry apud Aubry, 1997, p. 22)

Infelizmente este magnífico edifício perdeu a sua função original, e deve-se, sem dúvida,
à sua reutilização em escritórios. Na verdade, este espaço no “coração” da habitação,
que foi concebido como um espaço de repouso, é hoje, uma área de passagem que as
pessoas utilizam apenas para aceder aos diferentes espaços convertidos em salas de
reunião ou escritórios.

Quando nos deixamos levar de maneira fluida pelo movimento em espiral do segundo
lance de escadas em torno da cúpula, também coberto por um teto de vidro, chegamos
por fim ao grande salão do primeiro piso, de frente para a rua. Deste modo a superfície
da habitação é aproveitada ao máximo e temos a impressão de ter percorrido uma longa
distância na habitação, desde a porta de entrada até ao salão. Originalmente, era o
grande salão, mas hoje tornou-se uma das duas maiores salas de reuniões com a antiga
sala de jantar do outro lado do jardim de inverno, ao nível do jardim exterior.

60 Horta cria um percurso em espiral no coração da casa, que parece refletir o desejo de introspeção que
leva o homem a uma consciência mais clara de si mesmo. (tradução nossa)

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Ilustração 149 - Vista do salão para o hall octogonal e sala de jantar ao fundo. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2005, p. 20).

Através deste espaço temos uma visão total que atravessa todo o edifício, e a luz que
banha este antigo salão através das suas grandes janelas, juntamente com aquela que
atravessa os chassis metálicos do centro da habitação é deslumbrante. Este espaço é
modulável e pode-se abrir graças a uma grande janela metálica vidrada que dá para o
espaço central da habitação. Esta permite, do mesmo modo, aumentar o espaço que
servia às receções para transformá-lo num só, abrindo também a porta de duplo batente
da sala de jantar situada do lado oposto.

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Ilustração 150 - Vista para as janelas do grande salão. ([Adaptado a partir de:] Borsi e Portoghesi, 1990, p. 197).

Por outro lado, no que respeita à função “salão” desta sala, é necessário imaginar-se o
que o espaço seria na época, uma vez que, atualmente, ela tem uma função diferente.
Mas conseguimos facilmente ter uma ideia graças à visita do Musée Horta.

A visita prossegue pela antiga sala de jantar, situada ao fundo do edifício, pela qual
acedemos através de uma porta de duplo batente. As portas são decoradas com vitrais
em vidro americano recriando uma paisagem de árvores estilizadas, que são
ligeiramente diferentes, mas semelhantes, a olho nu.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Quando as portas se abrem, descobrimos uma decoração estilo africano com


tapeçarias, uma cabeça de antílope, bem como duas cabeças de elefante, sem dúvida
referência ao Congo. Lembremo-nos que Edmond Van Eetvelde foi o Secretário-Geral
do Estado Independente do Congo.

Em ambos os lados dos aparadores existem ainda duas portas decorativas de madeira
escura, “pastiches”, para, mais uma vez, pela sua presença conferirem uma sensação
de grandeza às salas utilizadas para acolher as receções. As paredes são decoradas,
de ambos os lados, por dois aparadores diferentes, mas refletindo o mesmo espírito,
criados por Horta, bem integrados no conjunto, tanto que parece que são uma parte
integrante da parede e não uma peça de mobiliário à parte. Mas o conjunto, que se pode
pensar que é escuro por causa dos tons, é na verdade bastante agradável e harmoniza-
se bem com o espaço. Isto deve-se certamente ao facto de que o espaço é bastante
iluminado pela luz proveniente do centro da habitação a partir dos vitrais, bem como da
grande janela de sacada com vista para o jardim exterior.

Este conjunto de três divisões, incluindo o salão, a sala de jantar e o jardim de inverno
no primeiro piso, são as áreas de receção da habitação.

Ilustração 151 - Fotografias antigas: (1) vista do jardim de inverno num dia de receção; (2) sala de jantar; (3): vista do grande salão após
extensão em 1900-1901. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2005, p. 65).

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No segundo e no terceiro pisos estão os apartamentos privados da família, incluindo a


sala de jantar, a sala de estar, as casas de banho, os quartos e um vestiário, todos eles
sem nada de surpreendente, pois toda a atenção do arquiteto foi, à semelhança do Hôtel
Tassel, concentrada na fachada e nos espaços nobres de receção.

Do corredor, separando o jardim de inverno da sala de jantar, há duas escadas que


levam ao piso superior, cada uma iluminada por um vitral na parede com vista para o
espaço central, ainda na ideia de trazer um pouco mais de luz. A escada, à esquerda,
leva aos apartamentos privados e está aberta para as outras divisões. A outra caixa de
escada faz parte da área de serviço, começando assim no piso térreo, e é fechada sobre
as outras divisões.

A visita, infelizmente, termina aqui, uma vez que o acesso aos restantes espaços do
edifício nos é restrito. O que retiramos é que este edifício é usado para fins de
representação pela empresa, pelo menos a parte do piso principal, onde uma boa parte
do orçamento parece ter sido investido. Os outros níveis, no fim de contas, só estão lá
para servir a sua função de escritório e não a de monumento, isto é, com o intuito de
relembrar a memória de um importante movimento, embora breve, da arquitetura em
Bruxelas. No entanto, é uma experiência de que não nos arrependemos, já que este
edifício está à altura da sua reputação, magnífico!

4.1.3. MAISON HORTA, HOJE MUSÉE HORTA – RUE AMÉRICANE Nº 23-25,


BRUXELAS – 1898-1901

“Uni, en quelque sorte, dans une même flame haute et dansante, les sévérités du plan
rénové, les audaces constructives les plus neuves et cette sorte de délire végétal qui
creusait la pierre et tordait le fer pour exprimer un rêve poétique original, mais peu
orthodoxe, n’a pas fini de nous étonner.”61 (Pierre-Louis Flouquet, 1957 apud Evrard,
1996, p.62)

61De certa forma, unidos na mesma chama alta e dançante, as severidades da planta renovada, as
audácias construtivas mais recentes e este tipo de delírio vegetal que escavava a pedra e torcia o ferro para
expressar um sonho poético original, mas pouco ortodoxo, nunca nos deixa de surpreender. (tradução
nossa)

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Ilustração 152 - Fachada Rue Américane, Bruxelas. (Ilustração nossa, 2019).

Para Horta, a casa representa o retrato do habitante, pelo que é muito instrutivo de
visitar o que foi a sua casa e atelier em Bruxelas.

“[…] Je proclamais que la maison était non seulement à l'image de la vie du occupant,
mais qu'elle devait en être le portrait.” 62 (Victor Horta apud Duliere, 1985, p. 47)

Hoje o museu é inteiramente dedicado ao trabalho de Horta. Mas o edifício não é apenas
um museu: é, ao mesmo tempo, um local de visita, exposições, documentação e

62[…] Eu proclamei que a casa não era apenas à imagem da vida do ocupante, mas que ela deviria ser o
seu retrato. (tradução nossa)

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

pesquisa, para tudo o que se relaciona, de longe ou de perto, com o movimento Art
Nouveau.

Nesta obra arquitetónica, todas as novidades e audácias experimentadas por Horta nas
suas realizações precedentes, encontram-se reunidas: a utilização de estruturas
aparentes, vigamentos em ferro para aligeirar os planos de parede e garantir o máximo
de iluminação zenital, balaustradas em ferro pintado, simbiose da pedra e do metal,
pedra esculpida em revestimento aparente, tanto na fachada como nos espaços
interiores. O edifício foi projetado no período mais produtivo e criativo de Horta. O facto
de ser a sua casa pessoal deu-lhe a audácia e a oportunidade de a conceber, perfeita
e integralmente, ao seu gosto, o que não poderia dar-se ao luxo de fazer para uma
construção de um cliente.

"Ma maison de la rue Américaine, [...] et, pour celle-là, j'avais non pas les mains Iibres,
car je les avais toujours exigées ainsi, mais Ia bourse Iibrement ouverte, n'ayant de
reproches à faire qu'à moi-même quand je dépassais mes prévisions et souvent mes
raisonnables moyens.” 63 (Victor Horta apud Duliere, 1985, p. 71)

Ao observarmos esta fachada observamos que as duas construções são bem distintas:
à esquerda, a sua casa pessoal, cuja porta de entrada se situa à direita da fachada,
fachada esta que é mais trabalhada e mais decorada do que a do atelier, à direita, que
Horta queria mais sóbria pela sua função, e cuja porta de entrada se encontra do lado
esquerdo. Apesar desta diferença, tudo é coerente e há uma grande unidade
arquitetónica.

Sem surpresas, a escolha dos materiais recaiu sobre a pedra: a de Euville e a de


Savonnière, a pedra azul belga para a base do edifício e para o passeio; e a utilização
de estruturas metálicas. A parte de habitação, junta o conforto e a estética, enquanto
que a parte do atelier, a eficácia ao recurso de estruturas metálicas para assegurar o
máximo de iluminação, sem ignorar, todavia, a estética. É dada uma grande atenção ao
modo como a pedra é utilizada, prova disso é a escultura que sustenta a pequena coluna
do primeiro andar do lado do atelier, nº 23.

63A minha casa da rue Américane, [...] e, para esta, eu não tinha as minhas mãos livres, porque eu assim
sempre o tinha exigido, mas a bolsa aberta, não tinha nenhuma censura a fazer que a mim mesmo apenas
quando excedia as minhas previsões e muitas vezes os meus modestos meios. (tradução nossa)

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Ilustração 153 - Detalhe da janela do primeiro piso, nº 23. (Ilustração nossa, 2019).

Este elemento desempenha, na sua plenitude, todas as suas funções: a sustentação,


evacuação de águas pluviais do limiar das janelas, proteção e pronunciação das saídas
de ventilação, e também um elemento de animação nesta fachada retilínea.

No piso térreo a grande janela onde, outrora, foi o atelier dos inúmeros desenhadores
do arquiteto, no primeiro piso, o seu escritório, e salão de receção, postos em evidência
pelas três janelas onde encontramos a escultura em pedra talhada, referida
anteriormente, e à direita uma balaustrada da janela que serve de decoração e que trepa
até meio da janela.

Ilustração 154 - Detalhe da estrutura em ferro do piso térreo, nº 23. (Ilustração nossa, Ilustração 155 - Detalhe da janela do
2019). primeiro piso, nº 23. (Ilustração nossa,
2019).

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No segundo piso situavam-se o atelier de desenho que é marcado por um grande vão
envidraçado para garantir o máximo de iluminação, e por fim, o sótão, a terminar o
edifício.

Ilustração 156 - Detalhe da janela do segundo piso, nº 23. (Ilustração nossa, 2019).

Já a análise da fachada do lado da habitação, nº25, é uma demonstração da arte de


Horta, cheia de notáveis inovações. Uma fachada que nos fascina, pois temos a
impressão de ver uma paisagem encenada. A estrutura de ferro do piso térreo faz alusão
às plantas. No primeiro piso, a flor de íris e finalmente, no segundo piso, as asas de
libélula, que servem de balaustradas.

Ilustração 157 - Detalhe da estrutura em ferro do piso térreo, nº 25. (Ilustração nossa, 2019).

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Ilustração 158 - Detalhe da varanda do primeiro piso, nº 25. (Ilustração nossa, 2019).

Ilustração 159 - Detalhe da varanda do segundo piso, nº 25. (Ilustração nossa, 2019).

A varanda, cujo pavimento é em painéis de vidro, serve de cobertura à porta de entrada,


mas faz também de bow-window e de segunda varanda, no segundo piso. É, em nossa
opinião, um sucesso, a nível estético e técnico. Estético pela elegância e importância
das balaustradas, sobretudo as do segundo piso, com a particularidade de estarem
cercadas de pedras esculpidas; técnico pela utilização de consolas que sustêm a bow-
window com uma estrutura metálica onde são fixados os tirantes que suspendem a
varanda inferior. O desenho desta estrutura é excecional pela sua leveza e flexibilidade
que contraria a rigidez do metal e forma uma alusão a plantas que trepam pelos tirantes.

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Outra chamada de atenção para a bow-window, são as suas janelas laterais de forma
particular que saltam à vista, o seu balanço sobre a rua e fachadas dos edifícios vizinhos
e também pelos seus perfis metálicos trabalhados de modo sublime e linhas
excecionais.

De referir ainda a quantidade de vãos da fachada do lado da habitação é igualmente


importante, se comparado com os da fachada do atelier, demonstrando que Horta
procurava aqui, igualmente, o máximo de luminosidade.

Ilustração 160 - Corte e alçado da fachada da casa e atelier. ([Adaptado a partir de:] Goslar, 2012, p. 270).

O museu sofreu algumas mudanças desde a nossa primeira visita, em 2014, e estamos
curiosos para descobrir essas novidades. Primeira grande mudança que notamos: a

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entrada não é feita pela casa pessoal e atelier do arquiteto (nº25-º23), mas sim pelo nº
27, edifício ao lado da casa-museu, construído em 1900 pelo arquiteto Jules Brunfaut.64
Até setembro de 2016, a receção e a bilheteira estavam localizadas no piso térreo, no
atelier do artista. Hoje tudo o que é administrativo, a bilheteira, a loja, a biblioteca, assim
como salas de exposições, locais de arquivo e centro de pesquisa, ficam no nº 27, no
intuito de deixar a casa-museu visitável.

Na sua casa pessoal, Horta concebe um sistema de eixos ainda mais complicado que
nos seus projetos precedentes. Os eixos ditos tradicionais ou académicos deixam de
existir, exceto para indicar a simetria de alguns espaços tais como a sala de jantar e o
grande salão. O percurso feito desde a entrada até ao cimo da escada (que forma nesta
habitação um pivô à volta do qual se articulam todos os espaços) desenha-se como uma
linha suavemente ondulada: assim, os primeiros passos que percorremos acompanham
o desenho da planta, com um desfasamento progressivo e paralelo dos eixos, como se
fossemos conduzidos delicadamente no interior do edifício, e onde nenhum movimento
brusco ou retorno é necessário para percorrê-lo, toda a circulação é fluída.

Ilustração 161 - Organização da planta através dos eixos. Planta piso térreo e 1º piso. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2006, p. 37).

64 Engenheiro e arquiteto Art Nouveau belga, nasceu em 1852 e faleceu em 1942.

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Através do corte longitudinal, observamos que os dois corpos principais, implantados a


diferentes níveis, são unidos pela escada no centro da habitação, encimada pela
claraboia (à semelhança do Hôtel Tassel).

Ilustração 162 - Corte longitudinal. ([Adaptado a partir de:] Aubry, 2005, p. 105).

Começámos a visita passando pela casa-museu e chegamos agora à entrada da casa.


Um dos aspetos que mais nos fascina nas obras de Horta é a mudança de cenário que
se sente quando se passa pela porta de entrada. A descoberta de cada um dos seus
edifícios é feita de imprevistos e surpresas.

O pavimento do vestíbulo da entrada é feito de mosaicos em tons bege e laranja. À


esquerda, um pequeno vestíbulo, com um pavimento idêntico ao da entrada, bem como
uma casa de banho. À direita, o atelier de Horta, acessível a partir da casa através desta
porta, bem como outra no primeiro piso. Continuamos em direção à escada, escondida

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atrás de uma bela porta dupla de madeira com vitrais de tons amarelos e verdes, e uma
abertura vidrada que encima a porta, mas desta vez em tons de vermelho e rosa. O
puxador faz lembrar um inseto voador com asas abertas que vieram pousar nesta
paisagem de vitral idílica.

Ilustração 163 - Vista do vestíbulo da entrada para escada no piso térreo. (Ilustração nossa, 2019).

Esta escada não tem absolutamente nada a ver com uma típica caixa de escadas. Horta
fez a escada subir no centro da habitação com uma cobertura de vidro imponente que
distribui luz adicional em torno das outras divisões (Horta distanciou-se totalmente do
plano tradicional das casas feitas em Bruxelas na época).

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Seguimos pela escada de planta quadrada, cujos degraus são em mármore de Carrara,
o que cria uma transição entre o fundo e o topo. No centro deste plano quadrado está
um radiador com alhetas, que se enquadra perfeitamente na decoração e se torna, por
si só, uma obra de arte.

Ilustração 164 - Vista da caixa de escada no piso térreo para a cobertura em vidro. (Ilustração nossa, 2019).

Chegamos ao piso principal, onde a escada agora está verdadeiramente aberta a todos
os espaços até ao último piso, executada em madeira. No piso intermédio, temos, à
nossa direita, a sala de jantar, na qual entramos. É uma explosão de luz e beleza!

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Ilustração 165 - Vista da sala de jantar no primeiro piso. (Ilustração nossa, 2019).

O piso é em mosaico muito claro, com um pequeno friso, sempre em mosaico, de cores
ferrugem e acastanhadas. No centro, o pavimento é uma composição de madeira
delimitado por uma faixa de metal que funciona como junta de dilatação. A madeira é
bastante presente neste espaço por pequenos toques e transmite uma sensação de
calor. Encontramos também dois móveis aparadores de madeira embutidos, que são os
originais. As paredes e o teto são em tijolos esmaltados de branco que originalmente
eram para ser usados na fachada posterior. Estes tijolos esmaltados refletem, na
perfeição, a luz natural e em constante mudança que vem do jardim exterior.

“Encore était-il heureux que je ne I'eusse pas entreprise pour un client, car j'y eus un
mécompte qui m'entraîna loin dans les dépenses, encore que j'avais cru faire une
avantageuse affaire en achetant des briques émaillées blanches, destinées à la façade

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postérieure, que j'eus I‘idée d'employer à la construction et à la décoration de ma salle à


manger.” 65 (Victor Horta apud Duliere, 1985, p. 72)

Os arcos do teto dividem este grande espaço em três, delimitando três pequenas
abóbadas. O topo das paredes, ao nível dos óculos, é decorado com baixos-relevos de
gesso que são obras do artista Pierre Braecke.66 Entre duas dessas arcadas, há um
tirante em metal horizontal de latão em torno do qual estão envoltas leves hastes, como
as de uma hera, que terminam em candeeiros. Tal dá-nos realmente a impressão de
uma planta que se enrola e termina em pequenas lâmpadas de flores.

No fundo da sala de jantar, há uma pequena sala de estar diretamente com vista para
o jardim exterior, que pode ser acedido através de alguns degraus de vidro que
permitem a entrada de luz à cozinha, na cave (este último, acrescentado em 1906 pelo
arquiteto, está localizado logo abaixo, ao nível do subsolo).

Ilustração 166 - Vista da segunda sala de jantar com vista para o jardim no primeiro piso. (Ilustração nossa, 2019).

Saímos da sala de jantar e damos alguns passos para subir meio piso, encontramo-nos
no salão de música, na frente de rua. Estes são os últimos degraus em mármore, antes
de serem feitos em madeira. Mas pouco antes deste lance de escadas, notamos,
camuflado, sob a poltrona, um radiador. Só nos apercebemos dele pelas duas saídas

65 Ainda assim, ele estava feliz por eu não o ter feito para um cliente, porque eu cometi um erro que me
levou longe nas despesas, embora eu achasse que tivesse feito um bom negócio em ter comprado tijolos
brancos esmaltados, destinado à fachada posterior, que eu tive a ideia de utilizar na construção e decoração
da minha sala de jantar. (tradução nossa)
66 Escultor e medalhista belga, nasceu em 1858 e faleceu em 1938.

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de calor, localizadas logo acima de um painel de mármore verde, que fazem parte de
um todo formado pelas costas da poltrona. Aqui tudo está no jogo da subtileza.

Ilustração 167 - Detalhe do radiador entre a sala de jantar e o salão de música no primeiro piso. (Ilustração nossa, 2019).

Um candeeiro composto por três lâmpadas enrola-se como uma liana em redor da
coluna, ao lado da escada. O corrimão desta extremidade da escada é enrolado e
torcido para se tornar o braço de apoio da poltrona.

Ilustração 168 - Detalhe do candeeiro. (Ilustração nossa, 2019). Ilustração 169 - Detalhe do corrimão. (Ilustração nossa, 2019).

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Uma vez chegado ao cimo das escadas, recuamos um pouco e viramo-nos para ter uma
visão global do salão. O teto é um jogo de sucessivos e diferentes arcos de estilo gótico.
Esta articulação parece tão simples e natural, mas deve na realidade ser de uma grande
complexidade estrutural.

De seguida voltamos à escada, desta vez em madeira. Ele leva-nos para uma porta que
comunica com o atelier do arquiteto e que desemboca nos quartos. Entre esses dois
espaços, no nível do patim, há uma porta com um painel de vidro colorido que ilumina
a escada de serviço. Cada quarto no primeiro piso tem a sua própria entrada. Tal permite
isolá-los uns dos outros.

Ilustração 170 - Vista do salão de música piso para a sala de jantar no primeiro e escada de acesso ao segundo piso. (Ilustração nossa,
2019).

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Entramos no quarto de Horta cujas paredes estão cobertas com um papel de parede
com motivos vegetais de tom verde. A cama vem do quarto da Villa Carpentier, e a
cabeceira é esculpida e encabeçada por cinco botões de flores. De cada lado da cama,
existem duas portas idênticas à porta que leva ao quarto. A do lado direito abre para um
armário, antigamente com um bidê. A porta da esquerda levava à sala de banho onde
foi, posteriormente, instalado um urinol.

Ilustração 171 - Quarto de Horta no segundo piso. (Ilustração nossa, 2019).

Uma porta permite acesso ao guarda roupa ao lado do quarto. É um grande espaço,
bastante iluminado, graças às portas de vidro, e onde os armários estão embutidos nas
paredes, o que dá a impressão de se tratar de um grande quarto. De lá, acedemos por
duas portas, de um lado, à casa de banho, do outro lado, à sala de banho com banheira
e aquecedor de água ainda da época.

Subimos meio piso, novamente, e encontramo-nos na sala de estar da família e no


camarim. As paredes são revestidas de tapeçaria verde com reflexos iridescentes e no
topo das paredes há dois frisos de madeira escura para os dinamizar. O camarim
contém ainda um biombo de madeira escura revestido de tecido com flores e pássaros,
muito ao estilo japonês.

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Ilustração 172 - Sala de estar e camarim no segundo piso. (Ilustração nossa, 2019).

Continuamos subindo as escadas, e chegamos aos aposentos da filha de Victor Horta,


Simone. Quanto mais subimos, mais temos a impressão de chegar a algo mais belo, a
este nível a escada é resplandecente. É dominada pelo vitral que emana uma luz
amarela pálida. As paredes são de cor ocre com árvores bege estilizadas que sobem
ao teto de vidro em busca da luz. O corrimão, feito de madeira e cobre, parece ser feito
de altas árvores que ondulam com o vento. Temos a sensação de estar no meio da
floresta, como as descritas nos contos. Sensação essa que é acentuada por um espelho
que dá realmente a sensação de profundidade à floresta.

“[...] L'élément Ie plus en vue était Ie plafond courbé vitré qui, en tout temps, jetait une
lumière dorée sur le haut de I'escalier dont les murs étaient jaunes avec ornementation
or et blanc.” 67 (Victor Horta apud Duliere, 1985, p. 73)

67 [...] O elemento mais visível era a cobertura envidraçada curva, que em todos os momentos, emanava
uma luz dourada do alto da escada cujas paredes eram amarelas com ornamentos dourados e brancos.
(tradução nossa)

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Ilustração 173 - Vitral da claraboia no terceiro piso. (Ilustração nossa, 2019).

Todo o andar superior é dedicado à filha do arquiteto e, assim, mantém uma unidade
nas cores. O quarto é muito simples e fica do lado do jardim com um pequeno camarim
adjacente, que se estende para uma estufa.

Ilustração 174 - Quarto da filha de Horta no terceiro piso. (Ilustração nossa, 2019).

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Por fim, a última divisão a visitar neste andar, é a sala de jogos do lado oposto ao quarto,
na frente de rua.

Descemos a escada de serviço, escondida por detrás da escadaria principal e que não
era acessível antes da nova extensão, e vemos tudo nos bastidores, muito parecido com
os bastidores de um teatro. As duas circulações (escada principal e de serviço) são
feitas em paralelo, mas em momento algum suspeitamos da existência uma da outra,
se evidentemente não conhecermos a planta. As escadas e os patins são de madeira
muito simples, sem mobiliário, e luz é trazida ao nível dos pés por uma pequena
abertura, nos vários níveis, que atrai a luz da escada principal.

Ilustração 175 - Detalhe da abertura de luz nas escadas de serviço no segundo piso. (Ilustração nossa, 2019).

Os espaços, que são apenas áreas de serviço para o pessoal, são muito mais
pequenos, com um menor pé direito. Sentimos que estamos em espaços que,
claramente, têm uma função diferente dos destinados à família.

Continuamos descendo e chegamos à cave, a uma cozinha muito espaçosa e luminosa.


(este espaço é novamente acessível aos visitantes desde setembro de 2016). O espaço
é iluminado pelas escadas envidraçadas que levam à sala de jantar logo acima, e há
tantos utensílios e loiças presentes que nos sentimos realmente numa verdadeira
cozinha, não uma peça de "reprodução" de um museu.

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Ilustração 176 - Vista geral da cozinha, Bruxelas (Ilustração nossa, 2019).

Terminamos a visita deslumbrados com a autenticidade desta casa-retrato, feita à


imagem e ao gosto do seu proprietário, Victor Horta. Achamos que esta casa é uma das
suas melhores realizações, uma verdadeira obra de arte total! Além disso, o próprio
Horta, nas suas memórias, acha que chegou ao ponto culminante da sua carreira:

"Pourquoi, en cours d'achêvement, avais-je eu l'impression que j'atteignais au sommet


de mon bonheur et que la pente descendante s'ouvrait devant moi ?" 68 (Victor Horta apud
Duliere, 1985, p. 73)

4.2. A PROBLEMÁTICA DA REUTILIZAÇÃO

4.2.1. REUTILIZAÇÃO EM MUSEU? – CASO DO MUSÉE HORTA

"Un Lieu où il s'agit moins de stocker des œuvres finies que de les mettre au contact les
unes des autres et, à ce contact, de les faire vivre à I‘infini. Un lieu où [...] on fait du temps
avec de l'espace. L'œil écoute. Les murs parlent." 69 (Bernard-Henri Lévy apud Le Point,
2009)

68 Por que razão, no decorrer da conclusão deste projeto, tive a impressão que tinha chegado ao auge da
minha felicidade e que o caminho se abria à minha frente? (tradução nossa)
69 Um lugar onde se trata menos de armazenar obras concluídas do que colocá-las em contato umas com

as outras e, com este contato, fazê-las viver ao infinito. Um lugar onde […], fazemos do tempo com o
espaço. O olho escuta, as paredes falam. (tradução nossa)

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Ilustração 177 - Musée Horta, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1898-1901. (Ilustração nossa, 2019).

Ao colocá-lo no turismo, o património está a tornar-se um objeto que é “museificado”.

Françoise Aubry, antiga diretora do Musée Horta, refere-se a este museu como uma
“casa de mártires” (RANN, 2000, p. 43). Sacrificar um edifício para fins pedagógicos, é
colocar um edifício que é usado como “alimento” para o turismo cultural de massa, com
a esperança de também preservar outros edifícios do movimento de uma muito rápida
e grande degradação. As casas-museu são vítimas do seu próprio sucesso: as
escadarias não resistem ao peso dos muitos visitantes; ao crescente número de turistas;

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as malas danificam não só as pinturas murais, mas também os papéis de parede, à sua
passagem; os anéis e outros acessórios de adorno riscam os corrimões das escadas.

Nesse sentido, não poderíamos abrir todas as casas Art Nouveau ao público, seria um
verdadeiro desastre.

Além disso, embora Bruxelas seja a “capital” do movimento, não oferece um museu
dedicado a ele, o Musée Horta, é o único "ponto de chegada" para os amantes do Art
Nouveau. E, obviamente, instala-se um círculo vicioso. Quanto maior for a taxa de
frequência do museu, mais dinheiro este tem para restaurar e melhorar a qualidade da
visita. No entanto, quanto mais visitas, mais danos.

Mas o que é um museu e sobretudo, que futuro lhe é reservado?

A definição encontrada no site do ICOM diz que:

“A museum is a non-profit, permanent institution in the service of society and its


development, open to the public, which acquires, conserves, researches, communicates
and exhibits the tangible and intangible heritage of humanity and its environment for the
purposes of education, study and enjoyment.” 70

Na maioria dos países europeus, a taxa de frequência dos museus (com exceção
daqueles internacionalmente reconhecidos) está a aumentar lentamente, a estagnar ou
até mesmo a diminuir. Pelo contrário, o Musée Horta, por seu lado, continua a aumentar
a sua taxa de frequência. Após a celebração dos 150 anos de Victor Horta, em 2011, e
o festival BANAD, ultrapassa atualmente as 90 000 visitas, atraindo não só os
bruxelenses como os visitantes vindos do estrangeiro.

A questão colocada por Duncan Cameron: “Are the gallery and museum obsolete?”
(Peter Martin Associates, 1969) mostra que atualmente uma determinada divisão entre
os museus e o seu público se mantem. Além disso, os museus são cada vez mais, vistos
como instituições de elites.

A diferença entre lazer e educação está a aumentar e os museus não sabem mais
encontrar o seu lugar entre os dois. Eles são cada vez menos vivenciados como locais
de lazer, aos quais se refere a definição referida acima, mas sim como ambientes
próprios à educação. Lentamente, a sua função resume-se ao armazenamento e à

70Um museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, aberta ao público, que serve a sociedade
e o seu desenvolvimento, que adquire, preserva, estuda, exibe e transmite o património material e imaterial
da humanidade e do seu meio ambiente para fins de estudo, educação e lazer. (tradução nossa)

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conservação de coleções de arte, uma nova definição longe das teorias preconizadas
pelo ICOM.

Hoje em dia, a revolução digital que está em curso, acelera e torna a imagem real em
virtual e, assim, cria uma rutura na interação entre os museus e os visitantes, levando-
nos apensar que o museu na sua forma atual se tornou “antiquado”. Os museus
tradicionais de hoje deviam ser repensados, se quiserem ter uma nova vida, e a
integração da tecnologia também pode alcançar um novo público de potenciais
visitantes. Paralelamente a isso, a casa-museu, apesar de ter um valor patrimonial muito
alto, provavelmente não deve seguir a mesma evolução que os outros museus “padrão”
nos quais tudo é possível.

Será que esse património Art Nouveau vai perdurar, num momento em que a tecnologia
está em constante evolução, a grande velocidade?

Assim sendo, é este tipo de reutilização apropriada para o património Art Nouveau?

No que respeita à função de museu associado a uma habitação privada, esta não é, na
nossa opinião, uma hipótese de reutilização a longo prazo para validar essa herança,
em geral, e especialmente no que diz respeito ao Art Nouveau, em qualquer caso, nas
atuais condições. Por um lado, integrar painéis digitais e táteis para obter informações
complementares, ou outras tecnologias desse tipo, para além de deixar marcas, fará
perder ao bem patrimonial, a sua identidade arquitetónica e histórica. Este tipo de
adaptação, não tem, na nossa opinião, razão de ser em tal edifício. Nesta perspetiva,
as casas-museus também têm um futuro bastante incerto. Elas tornar-se-ão obsoletas
e sem sentido. Além disso, não haveria interesse em que, cada habitação privada Art
Nouveau, se tornasse um museu, a função perderia rapidamente o interesse e seria
redundante. De facto, um museu tem a particularidade de ser único no seu género. A
maneira de tornar um museu útil e agradável, tanto para a contemplação quanto para o
seu estudo, é que ele seja único.

4.2.2. REUTILIZAÇÃO EM ESCRITÓRIO? – CASO DO HÔTEL VAN EETEVELD

“Je ne suis jamais entré dans un bureau sans me demander comment m'en échapper.” 71
(Jacques Sternberq apud Sternberq, 1977, p.13)

71 Eu nunca entrei num escritório sem me perguntar como escapar dele. (tradução nossa)

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Ilustração 178 - Hôtel Van Eeteveld, arq. Victor Horta, Bruxelas, 1895-1899. (Ilustração nossa, 2019).

Existem, em Bruxelas, vários edifícios Art Nouveau transformados em escritórios, como


o Hôtel Van Eetvelde, que é ocupado por um escritório de advocacia, ou até mesmo o
Hôtel Tassel, para citar alguns.

Esta reutilização oferece como vantagem às empresas que adquirem esses imóveis, ter
um espaço de representação bastante impressionante para acolher os potenciais
clientes, como o caso do Hôtel Van Eetvelde.

A especificidade do Art Nouveau é encontrada tanto no exterior, como no interior de


cada um dos seus bens patrimoniais. Portanto, não podemos apenas manter a fachada
ou uma parte do interior. Infelizmente, acontece muitas vezes que, neste caso, apenas
o andar principal seja preservado e restaurado no seu estado original. O resto da casa
muitas vezes é considerado menos importante e pouco interessante para a empresa,
acolhendo, como tal, os escritórios.

A reutilização em escritórios às vezes também requer adaptações indispensáveis para


as suas atividades, e essas diferentes alterações nem sempre são simples e fáceis de

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conciliar com um bem patrimonial, ou com uma reutilização do espaço conforme o


original.

Na ocasião duma entrevista com Barbara Van der Wee72, soubemos que os proprietários
do Hôtel Van Eetvelde solicitaram um sistema de ventilação mecânica para todo o
edifício. Só que para evitar esta instalação, ela e a sua equipa realizaram pesquisas
para encontrar os métodos de ventilação natural existentes na origem do edifício. Eles
descobriram as diferentes entradas de ar feitas nas fachadas e ao nível das caves. Esta
descoberta permitiu, inicialmente, evitar essa instalação mecânica, já que tudo estava
implantado, bastava colocá-lo em funcionamento. E em segundo lugar, o edifício pôde
conservar um aspeto mais autêntico e realista, já que a instalação da ventilação
mecânica era tudo menos estética para o edifício.

Certamente, também a maioria dos funcionários não está ciente do valor patrimonial do
edifício em que trabalham. Portanto, dificilmente se apercebem do meio físico
envolvente do seu local de trabalho, que não é, por vezes, prático e fácil de usar. Além
disso, geralmente são lugares fechados ao público, exceto durante as jornadas do
património ou do festival BANAD. Há, portanto, apenas uma minoria da população que
tem acesso, e nem sempre os visitantes estão conscientes dessa oportunidade.

Alguns perguntarão se não será contradizer a vontade do arquiteto reutilizar um edifício


que foi concebido para uma função bem precisa?

E na mesma lógica, se não se perderá a autenticidade do edifício atribuindo-lhe uma


nova função, totalmente diferente da sua origem?

Do mesmo modo, a função de escritório associado a uma habitação privada, pode ser
vista como uma forma de mecenato por parte das empresas (caso do Hôtel Van Eetevel
e do Hôtel Tassel). Os particulares raramente se podem dar ao luxo de comprar e manter
este tipo de imóveis, e as empresas têm muito mais apoio financeiro a consagrar a esses
bens. Em troca deste, elas têm um cenário de qualidade excecional para receber os
seus clientes. Podemos ver isso como uma relação simbiótica em que todos beneficiam.
Mas a questão de saber se esta reutilização do património é ou não apropriada, depende
da perspetiva: se favorecermos a acessibilidade pública como uma característica
primordial à conservação do património ao longo do tempo, então esta opção de
reutilização provavelmente não é a melhor. No entanto, se se optar por privilegiar a
autonomia financeira do edifício, que seria neste caso gerido pelas empresas, o poder

72 Entrevista efetuada a 1 de julho de 2019.

João Miguel Aldeias Correia 200


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

público já não poderia assegurar financeiramente todo o património Art Nouveau, então
seria, a opção de reutilização aceitável. Sabendo que, se pelo menos, a totalidade do
edifício não seria classificada, existiria um risco de haver adaptações nos interiores,
sobretudo nos níveis superiores, menos representativos, como vimos anteriormente.

4.2.3. REUTILIZAÇÃO EM HOTEL/BED AND BREAKFAST? – CASO DA MAISON


SAINT-CYR

"Le voyageur voit ce qu'il voit; le touriste voit ce qu'il est venu voir."73 (Gilbert Keith
Chesterton apud Chesterton, 2002, p.23)

Ilustração 179 - Maison Saint-Cyr, arq Gustave Strauven Bruxelas, 1900-1903. (Ilustração nossa, 2019).

73 O viajante vê o que ele vê, o turista vê o que ele veio ver. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 201


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

A cidade de Bruxelas conta com muitos hotéis e outros alojamentos, para turistas e
visitantes ocasionais, descobrirem os muitos tesouros desta cidade. A procura por este
tipo de serviço é cada vez maior, e para conquistar clientes, é necessário oferecer
serviços originais que sejam atrativos e diferenciados do que é proposto pela
concorrência, para assim se destacar.

Então, por que não, propor passar uma noite, num hotel de charme do estilo Art
Nouveau? A experiência é tão tentadora quanto promissora.

Um exemplo desse tipo de reutilização é a Maison Saint-Cyr, uma obra do arquiteto


Gustave Strauven, aluno de Victor Horta, localizada perto da Square Ambiorix.
Recentemente foi transformada num hotel de prestígio pelo seu proprietário, cujo projeto
de restauro esteve a cargo do arquiteto Francis Metzger, através do qual tivemos a
oportunidade de visitar o edifício.

Por um lado, em termos de acessibilidade ao público em geral, o problema permanece


o mesmo. Por se tratar de uma propriedade privada, apenas uma elite se pode dar ao
luxo de usufruir dos poucos quartos disponíveis no hotel.

Por outro lado, surge também um problema em relação à nova função programática,
concretamente no que respeita à implementação de quartos. Estes, na sua função
original, eram espaços de vida, como o salão, a sala de jantar e outros, que
inevitavelmente foram convertidos em quartos de luxo de hotel. Para além disso, foi
necessário integrar casas de banho independentes para cada um dos quartos
projetados, dado o estatuto de prestígio exigido pelo gabarito do edifício. Contudo estas
modificações não devem ter sido fáceis, pois foi necessário, através de estudos sobre
arquivos, vestígios, estratos e materiais residuais, redescobrir a essência do projeto
imaginado pelo seu arquiteto e dar nova vida e brilho à multiplicidade de estilos das
decorações iniciais que fazem desta casa, uma obra-prima tão original.

Mas terão sido estas alterações, a melhor das hipóteses de modo a manter e a não
distorcer a essência da obra já existente?

E, além disso, ainda seremos capazes de imaginar e vislumbrar os diferentes espaços


da vida original que existiam na época?

Igualmente, no que respeita à função de hotel/bed and breakfast, associado a uma


habitação privada, a resposta sobre se esta reutilização do património Art Nouveau, será
uma opção possível, permanece incerta e depende do que se escolhe favorecer como

João Miguel Aldeias Correia 202


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

critérios mais importantes. Mas no caso específico da Maison Saint-Cyr, escolher tal
reutilização é estar consciente de poder perder o carácter único que existia entre os
diferentes espaços (salas), já que a maior parte foi transformado em quartos de hotel.

4.2.4. REUTILIZAÇÃO EM HABITAÇÃO PRIVADA? – CASO DO HÔTEL MAX


HALLET

“Il y a des maisons qui donnent des ordres. Elles sont plus impérieuses que le destin: au
premier reqard on est vaincu. On devra habiter là.” 74 (Amélie Nothomb apud Nothomb,
1995, p. 7)

Ilustração 180 - Hôtel Max Hallet, arq Victor Horta, Bruxelas, 1901-1906. (Ilustração nossa, 2019).

O modo de vida atual, afasta-se, em muito, daquele que era nos finais do séc. XIX,
assim como do propósito para o qual estas casas senhoriais, Hôtel de Maître, foram
concebidas.

O que significa, portanto, viver num prédio com mais de 100 anos e considerado uma
joia da arquitetura e da arte?

Na opinião de Barbara Van der Wee, num debate após uma conferência:

74 Existem casas que dão ordens. Elas são mais autoritárias do que o destino: ao primeiro olhar somos
arrebatados. Teremos que lá viver. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 203


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

“por vezes é mais difícil manter a função original de um edifício do que fazer algo
diferente e mudar a função. Sobretudo para os edifícios que eram, na sua origem, do
habita privado. Na verdade, às vezes é muito difícil adaptar ao nosso modo de vida atual,
esse património.” (Barbara Van der Wee apud Van der Wee, 2017, RANN)

Por outro lado, o custo de um património que tem uma função habitacional pode revelar-
se por vezes, muito superior ao de um edifício contemporâneo com o mesmo uso. Mas
ele será sem dúvida escolhido pelas suas qualidades de prestígio, às quais o edifício
contemporâneo poderá mais dificilmente rivalizar.

Um bom exemplo deste sucesso, que tivemos a oportunidade de visitar, na ocasião das
Jornadas do Património, foi o Hôtel Max Hallet, de Victor Horta, localizado na Avenue
Louise, mandado construir pelo político e advogado Max Hallet. Este edifício, habitado
por uma família, passou por uma restauração exemplar e os móveis trazidos pelos
proprietários integram-se perfeitamente nos diferentes espaços. Eles não têm uma
presença nem caráter muito fortes, o que permite destacar o espaço arquitetónico em
si mesmo, e não o mobiliário. Estes não vêm perturbar a perceção, nem a beleza do
espaço.

Este é obviamente apenas um exemplo entre muitos outros. A reutilização em habitação


é a mais comum para os bens patrimoniais deste movimento. Esta reutilização tem o
inconveniente de que o edifício só pode ser visitado apenas por um grupo muito restrito
de pessoas, no entanto, estas casas são acessíveis durante as Jornadas do Património
ou no festival BANAD.

Como solução para esta problemática, Jean Delhaye adquiriu, durante a sua vida,
alguns imóveis do seu mestre, Victor Horta, que alugou a arrendatários, sujeitas à
aceitação de certas condições. Os arrendatários tiveram de se comprometer e permitir
que, os eventuais estudantes de arquitetura e de arte visitassem a casa e, a abrissem
pelo menos uma vez por ano em dias de Jornadas do património.

Finalmente, essa reutilização, que consiste em manter a função original do edifício, é


uma solução bastante defendida. A única desvantagem é que, se tem de encontrar os
investidores, que além de terem os meios financeiros para adquirir tal bem, concordam
em executar tal projeto. Como mencionou Francis Metzger75:

“podemos comparar esses compradores aos amantes de arte, que compram esses bens
como se comprassem um quadro ou outra peça de arte.”

75 Entrevista efetuada a 12 de Fevereiro de 2019.

João Miguel Aldeias Correia 204


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

De facto, lançar-se na aquisição de um bem patrimonial, com todos os passos e


imperativos que tal acarreta e que, muitas vezes, são bastante vagos para um
proprietário comum, relacionados com a classificação do referido bem, não é tão simples
quanto se pode acreditar.

Em segundo lugar, um ponto importante a mencionar, e que foi referido no início, é a


evolução do modo de vida desde o final do século XIX, até aos nossos dias, os quais
mudaram drasticamente. Hoje, poucos proprietários se satisfazem com uma cozinha
que outrora estava na cave, onde os empregados trabalhavam. Todos os espaços,
assim como a circulação, anteriormente eram reservados às domésticas, podem hoje
ser reinventados de maneira diferente, já que essa função foi extinta.

O mesmo problema também se coloca com as antigas casas de banho, que, naquela
época, estavam no mesmo andar que os quartos. Enquanto que nos padrões
contemporâneos, e igualmente por questões de comodidade, tendemos a construí-las
adjacentes às áreas de vida de uma habitação.

Ao mesmo tempo, podemos também observar que houve uma evolução no que diz
respeito ao isolamento térmico. O que era feito naquela época, não é atualmente aceite.
Em certos casos, para uma função que não a de habitação, tal pode ser suficiente,
embora seja sempre preferível melhorá-lo. Trata-se, portanto, de isolar tanto quanto
possível a cobertura e as paredes, transformar caixilhos simples de vidro, classificadas,
em vidros duplos, entre outras adaptações.

Quem estará pronto a deixar para segundo plano o conforto moderno, para viver num
bem patrimonial Art Nouveau?

E ao mesmo tempo, não é o desejo do arquiteto, criar uma arquitetura capaz de se


adaptar às futuras gerações?

Após a análise anterior dos três casos de estudo e das diferentes reutilizações dos
edifícios, outras grandes questões se colocam:

Será que convertê-lo em museu, escritório ou hotel, oferece uma solução para uma
melhor conservação ao longo do tempo?

Existirá uma melhor reutilização que outra para prolongar a sua vida?

É melhor ter em consideração o valor do uso ou o valor simbólico do bem patrimonial


para considerar uma melhor reutilização?

João Miguel Aldeias Correia 205


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Ou existe uma reutilização que se quer mediadora desses dois valores importantes?

Efetivamente, são questões importantes e legítimas a colocar, mas a mais importante a


reter, é saber qual o valor, entre o de uso e o simbólico é o mais fundamental.

4.3. A ATUALIDADE DO PATRIMÓNIO

“Les actualités d'aujourd'hui, c'est l'histoire de demain.”76 (Raymond Queneau apud


Queneau, 1965, p. 62)

Hoje, não só em Bruxelas, mas de um modo global, vamos cada vez mais numa
tendência crescente para a reutilização da arquitetura, em geral. De facto, a
conservação de um edifício que é reutilizado contribuirá para a economia dos meios e
contra o desperdício, que são preocupações atuais da sociedade. Mas tal reutilização e
consequente conservação ao adquirir um bem patrimonial, nomeadamente o que tem
uma função habitacional (caso comum dos edifícios Art Nouveau), é difícil, por duas
razões. A primeira é que, de certo modo, pertence tanto ao proprietário como ao coletivo.
É o próprio princípio do património e dos monumentos. Por exemplo, a fachada, é tanto
para os transeuntes e visitantes como para o proprietário, e este último é “obrigado” a
fazer esse restauro, sem ter em conta a sua vontade, de modo a corresponder à versão
original e conservar a essência do edifício. Em segundo lugar, nem sempre é fácil de
aceitar um interior marcado por um forte carácter e notabilidade, para onde o mobiliário
foi especificamente criado e concebido. Apenas os amantes de arquitetura e de arte
compreendem na sua plenitude este valor inerente de obra de arte total, premissa do
Art Nouveau.

O facto de "habitar", em sentido amplo, envolve uma troca entre o ocupante e o lugar.
No entanto, existem em tais relações ações que marcam um lugar, mas, inversamente,
o lugar também marca aquele que o ocupa. O bem patrimonial muda em contato com o
"habitante", assim como modifica o modo de viver daquele que nele habita. Mas não
esqueçamos que o património é também saber entrar no seu arquétipo, podemos fazer
mudanças para o adaptar ao nosso estilo de vida contemporâneo, mas também o
devemos saber respeitar, uma espécie de simbiose natural que ocorre entre o ocupante
e o edifício, cada um dando ao outro um pouco de si mesmo.

76 As notícias de hoje são a história de amanhã. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 206


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Algo a evitar absolutamente, na nossa opinião, é condenar o património a uma imagem


fixa, correndo o risco de produzir do “falso velho”.

No que respeita ao futuro da herança do Art Nouveau, duas opções nos parecem
possíveis: ou escolhemos transmitir esta herança como ela é, no estado em que está,
com o risco, inevitavelmente, que desapareça eventualmente ao longo do tempo,
dependendo de um valor de uso; ou escolhemos transformá-la, adaptá-la, reutilizá-la
para transmiti-la às gerações futuras. Pensamos que a primeira opção não será a melhor
escolha. Estes são lugares que foram pensados para serem espaços de vida. Não
podemos ser “egoístas” ao ponto de escolher deixá-los fechados em si mesmos, como
vulgares edifícios vazios que acabarão por morrer num certo anonimato e pouco
reveladores da riqueza que eles representam. Mas, se optarmos pela segunda
possibilidade, nos questionamos até que ponto o respeito pela obra pode ir sem
comprometer o bem patrimonial, num projeto de reutilização.

No entanto, se quisermos manter a herança do Art Nouveau, em Bruxelas, o maior


tempo possível, achamos que, nesse caso, devemos enveredar pela reutilização, como
acima mencionado, uma vez que este património Art Nouveau é constituído
principalmente por habitações privadas, a sua reutilização não pode ser mantida para
todos os edifícios. Na verdade, estes são dispendiosos, não só para os adquirir, mas
também para os manter e, portanto, não importa quem, terá a sensibilidade e, podemos
dizer, a ousadia, de se tornar o seu proprietário. É necessário estar disposto a fazer
algumas cedências para os preservar e proteger.

O património é uma área bastante complexa, na qual não existe uma solução miraculosa
que poderá resolver o problema da sua preservação e da sua sobrevivência ao longo
do tempo. A reutilização é, portanto, uma hipótese de transformação do património que
existe e que funciona até à data, relativamente bem.

“La seule manière de protéger sa culture, c’est d’accepter de la mettre en danger" 77 (Paul
Andreu apud Andreu, 2007, p.68)

Como Paul Andreu78 o salienta, e bem, mais vale, por vezes agir, mesmo que isso
signifique cometer um erro, do que não fazer nada e deixar o nosso património ir na
direção de um futuro incerto, ou mesmo, desaparecer. Muitas vezes, as apostas mais
arriscadas são as mais lucrativas.

77 A única maneira de proteger a sua cultura, é aceitar de a pôr em perigo. (tradução nossa)
78 Arquiteto francês de renome conhecido pelos seus inúmeros projetos no mundo inteiro.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Não devemos esquecer também que, a importância do património se deve menos a


objetos e lugares, do que aos significados e usos que as pessoas lhe atribuem, e aos
valores históricos que representam. A presença do património numa cidade, permite
manter uma continuidade histórica e ela no nosso meio, é essencial para permitir ao
Homem a possibilidade de encontrar a sua identidade. A morfologia urbana, é o reflexo
direto da sua história, e, portanto, dos seus habitantes.

Contudo, não existe uma reutilização que seja a solução ideal para preservar o
património Art Nouveau numa continuidade histórica e urbana, nem é, evidentemente,
uma noção unitária. É muito mais subtil e complexa. De facto, a reutilização mais
adequada e conveniente é igualmente própria a cada edifício, cada um tem as suas
especificidades e capacidades para se adaptar, de maneira mais ou menos fácil, às
reutilizações. Além disso, a reutilização não é um fim em si mesmo, e é importante
insistir em tal, mas é um meio para se chegar lá. É apenas um modo de transmitir um
precioso património, que traz com ele valores históricos, arquitetónicos e culturais, às
gerações que nos irão suceder, esperando que, quando chegar a sua altura, irão
ocupar-se dele. A reutilização tem e terá cada vez mais um papel importante, como
menciona Françoise Aubry durante a nossa entrevista79:

“O melhor destino para uma casa Art Nouveau é que ela seja considerada um objeto de
arte, um objeto de coleção e que a pessoa que a adquire a respeite no que ela é, e se
adapte ao seu modo de vida, e não inverso.”

Tal será provavelmente uma das melhores soluções possíveis, mas não poderemos
afirmar com convicção se será exequível.

Em paralelo, acreditar que o nosso património é autêntico, e que, como tal, é necessário
preservá-lo a todo o custo no estado no qual ele se encontra, é claramente uma utopia.
Do mesmo modo, fazer réplicas ao idêntico do património, ou a partes daquele que
julgamos oportuno de conservar, financeiramente não será certamente viável para a
nossa sociedade. Mas tal não é em si um problema, é apenas necessário ser-se
consciente e admitir que ele não é tão perfeito quanto o original, que ele envelhece,
como o ser humano, e que ganhou, hoje, algumas rugas. É conveniente ver os seus
restauros e as suas diferentes adaptações contemporâneas como um “pergaminho”.
Eles acrescentam, pouco a pouco, uma nova pele ao edifício para lhe dar um
rejuvenescimento. De maneira analógica, podemos ver o património Art Nouveau como
um phoenix que renascerá das suas cinzas.

79 Entrevista efetuada a 27 de maio de 2019.

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Esta noção de obra de arte total, estimada pelos protagonistas do Art Nouveau,
prolonga-se ainda nos nossos dias de um certo modo. A tradição perpetua-se, quando,
no momento de um restauro, os profissionais dos diferentes domínios e artesãos se
reúnem para voltar a dar ao edifício o brilho e esplendor de outrora, juntando-lhe
igualmente um toque de frescura pelas adaptações necessárias à nossa época.

Podemos ver igualmente que, em relação ao estado atual do património, as coisas


mudaram um pouco. Após se ter classificado de maneira intensiva (quando se tomou
consciência do valor do património) atualmente, assistimos menos a processos de
classificação, reavaliam-se pouco a pouco os bens patrimoniais.

A título comparativo, seria interessante observar, o que se faz em matéria de gestão e


de reutilização do património Art Nouveau, noutros países europeus sob a sua influência
e de um modo abrangente, como os países a nível mundial, gerem esse património na
sua integralidade, com diferentes estilos e reutilizações juntas. Essa relação com o
património e a nossa história, tem certamente diferenças e subtilezas específicas a cada
civilização.

“Nous pouvons vivre sans (l'architecture), adorer notre Dieu sans elle, mais sans elle
nous ne pouvons-nous souvenir." 80 (Ruskin , 2008, p. 241)

O Homem realizou grandes obras através do tempo, e ainda hoje vemos vestígios
dessas realizações, como o testemunho da inteligência de civilizações que nos
antecederam. Pensamos em particular nas pirâmides de Gizé, no Egito, ao local
arqueológico de Petra, na Jordânia, na Basílica de Santa Sofia, em Constantinopla, que
são de um certo modo, ícones da história da arquitetura conhecidos mundialmente.

Gostaríamos de terminar com as palavras de Gandhi, que faz uma observação


perspicaz, afirmando que:

“il faut être fier d'avoir hérité de tout ce que le passé avait de meilleur et de plus noble. ll
ne faut pas souiller son patrimoine en multipliant les erreurs passées.” 81 (Gandhi, 1924,
p.253)

Efetivamente, o património não está unicamente ligado ao passado, ele deve-se inserir
no presente e no futuro. Ele não deve, portanto, ser petrificado, mas pelo contrário, estar
“vivo”. Preservemos a nossa herança patrimonial, qualquer que ela seja, e evitemos a

80 Podemos viver sem (a arquitetura), adorar o nosso Deus sem ela, mas sem ela não podemos recordar.
(tradução nossa)
81 Deve-se ter orgulho em ter herdado tudo o que o passado teve de melhor e mais nobre. Não se deve

profanar a herança multiplicando os erros do passado. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 209


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

todo o custo as demolições abusivas que fizeram e fazem desaparecer joias


inestimáveis da arquitetura de outrora.

A atualidade nos mostra que o futuro do nosso património está longe de ser
salvaguardado, e que ele será certamente pontuado por inúmeros acontecimentos que
o podem pôr em perigo. E mais particularmente a herança do Art Nouveau, que ainda
não é totalmente reconhecida, e permanece incompreendida por alguns. Cabe a nós
tomar as decisões certas e de fazer as melhores escolhas para garantir um lugar de
destaque para esta arquitetura, atendendo à sua qualidade e valor artísticos
inestimáveis, bem como o reconhecimento do génio desses arquitetos.

Ao pensar no hoje, estamos a pensar no amanhã…

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Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Le monde de l'art n'est pas celui de l'immortalité, c'est celui de la métamorphose.”82
(André Malraux apud Malraux, Paris, 1967, p.68)

O Art Nouveau, na Bélgica, desenvolveu-se graças a uma burguesia progressista,


impulsionada pelo desenvolvimento industrial do final do séc. XIX, que permitiu a um
dos maiores arquitetos desde movimento, Victor Horta, expressar o seu talento. Foi um
movimento que surgiu em plena época oitocentista, ainda ligado ao clássico,
demonstrando, contudo, uma vontade de inovar e de se afastar dos seus cânones. Foi
uma corrente artística que surgiu para fazer algo diferenciado, um movimento
multidisciplinar, reunindo arquitetos, artistas e artesãos com o desejo de fazer das
realizações deste movimento, obras de arte totais (Gesamtkunstwerk).

É importante referir que, a Bélgica, berço do Art Nouveau, não conta apenas com a
influência do arquiteto Victor Horta (com a vontade de criar uma arte demarcada pela
sensibilidade pessoal e pela liberdade de criação), mas também com outros
protagonistas como Henry Van de Velde (Deutscher Werkbund), Paul Cauchie (Escola
de Glasgow) e Joseph Hoffman (Secessão Vienense).

Assim, o Deutscher Werkbund, fundado em 1907, na Alemanha, e considerado como


um dos primeiros movimentos da arquitetura moderna do séc. XX (que irá
posteriormente dar origem à Bauhaus), teve como princípio proporcionar a união dos
artistas e artesãos à indústria para enaltecer o modernismo. Um dos seus principais
fundadores, o belga Henry Van de Velde, reivindica o direito ao individualismo e à
criação livre e espontânea, opondo-se, contudo, aos processos de estandardização
industriais, facto que levou a divergências entre os diferentes membros do movimento.
Contudo não deixa de ser curioso que o mesmo, construiu em 1895 a Bloemenwerf, em
Bruxelas, com clara referência ao Arts & Crafs.

Já a Escola de Glasgow, manifestou a sua influência, em Bruxelas, através do arquiteto


Paul Cauchie, na Maison Cauchie, construída em 1905. A sua original fachada “cartaz”,
com figuras femininas rígidas e estilizadas ao estilo escocês, assim como a rigidez
geométrica percetível nas linhas da varanda (muito semelhantes à da Willow Tea room,
em 1904), revelam a influência marcante de Mackintosh.

Por sua vez, a Secessão Vienense, deixou a sua marca em Bruxelas, através de Josef
Hoffmann e a Wiener Werkstätte, que projetaram o Palais Stoclet, em 1906. O edifício

82 O mundo da arte não é o da imortalidade, é o da metamorfose. (tradução nossa)

João Miguel Aldeias Correia 211


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

revela influências da Secessão Vienense e incorpora o ideal do Gesamtkunstwerk (obra


de arte total). O contraste inequívoco com o Art Nouveau belga foi espantoso: nem
tratamento plástico das fachadas, nem estruturas expostas, ao invés, uma
ornamentação estilizada e geométrica.

Cada uma destas variantes contribuiu para o pluralismo e a multiplicidade de estilo do


Art Nouveau belga, numa harmonia entre diferentes formas de expressão que
convergiam para o mesmo propósito, o de criar obras de arte totais.

Mas a grande mudança na arquitetura do final do séc. XIX, foi, sem dúvida, a perceção
e a organização do espaço, e neste campo, Horta, foi, efetivamente, um gênio inventivo
e um pioneiro. Os edifícios Art Nouveau são espaços cenográficos e harmoniosos, pois
arquitetura, estrutura e decoração estão intrinsecamente ligados, levando o habitante
ou o visitante a percorrer uma “caminhada arquitetural” repleta de subtilizas e criada
com efeitos de surpresa e deslumbramento.

A perceção positiva do espaço pelo habitante ou o visitante é, para Horta, uma das
condições essenciais à criação do projeto em arquitetura e decoração. A subdivisão do
programa de uma habitação num edifício como lugar de receção, apartamento privado
ou locais de serviço, era uma constante nas casas burguesas. Os espaços de receção
são amplos, sumptuosos e tratados com originalidade; os apartamentos privados, onde
se desenrolava a vida quotidiana, formam uma entidade separada; quanto à parte
puramente funcional (os locais de serviço), oferece, dentro de uma estrutura bastante
prática, as comodidades de serviço necessárias para as receções como para a vida
privada. A organização de uma habitação pela repartição das funções, elaborada de um
novo modo, e a integração meticulosa das suas funções eram primordiais. A
organização dos espaços indissociáveis, apesar da divisão rigorosa tendo em conta as
suas funções, era um princípio arquitetónico e espacial importante, não esquecendo as
necessidades e as exigências específicas de clientes determinados. Assim, Horta, para
cada um deles, propõe um projeto diferente, tendo em conta o seu modo de vida
específico. Estas são variações sobre os diferentes modos de habitar próprios de cada
um, que demonstram o quanto um projeto pode ser compreendido de diferentes
maneiras, e do modo pessoal como o arquiteto pode ajustar um edifício aos seus
habitantes, sem, contudo, se afastar da função principal, o de criador (uma conceção
radicalmente oposta à falta de originalidade dos tradicionais edifícios burgueses). O
arquiteto, assim como o habitante, encontram a sua personalidade nestas “habitações
por encomenda”.

João Miguel Aldeias Correia 212


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

Analisando os diferentes projetos de Horta, podemos, muito claramente, entender as


suas intenções em inovar. Um sistema particular de organização é utilizado para
estabelecer a planta dos edifícios. De um certo modo, esta organização evoca o projeto
com base nos eixos tradicionais de arquitetura, mas, Horta, utiliza esses eixos de
maneira diferente. As plantas tradicionais no séc. XIX, tinham por base os eixos de
simetria, como constantes. A planta era concebida principalmente em torno das linhas
de eixo que serviam apenas à organização do edifício. Nas habitações burguesas
típicas, encontramos igualmente estes eixos como linhas diretrizes da planta e da
organização arquitetónica. Horta utiliza os eixos para dirigir o “passeio arquitetónico” na
habitação. Estes estão assim ao serviço da circulação dos habitantes pelo edifício. Este
princípio está presente, pela primeira vez, no Hôtel Tassel, evoluindo pouco a pouco
antes de chegar ao seu apogeu no Hôtel Van Eeteveld e a uma síntese, na Maison
Horta.

Horta renovou a casa burguesa, adequando cada uma às necessidades dos seus
clientes através da criação, a cada novo projeto, de uma planta nova e original. Contudo,
uma importante premissa se encontra em toda a sua obra: a necessidade de trazer o
máximo de luz natural possível. Os interiores mal ventilados do séc. XIX, onde o centro
da habitação estava submergido numa atmosfera sombria, devido à sucessão de três
espaços consecutivos, são inexistentes na arquitetura de Victor Horta. O centro da casa
é um espaço invadido pela luz natural. A iluminação zenital, desce ao “coração” da casa
através das claraboias ou das cúpulas, como se, em cada uma, Horta concebesse um
pátio interior em cobertura de vidro, para criar um verdadeiro jardim de inverno. De
referir que no final do séc. XIX, a luz zenital era utilizada sobretudo nos grandes projetos
de construção: museus, palácios, estações, salões, pavilhões de exposição, igrejas, e,
por vezes, mas excecionalmente, numa mansão burguesa.

Horta aplica-o a grande escala nas casas geminadas. Ele divide a mansão burguesa
em duas, tirando partido da profundidade, para introduzir um poço de luz que resulta da
divisão em uma casa na frente de rua, e uma outra, posterior. Os poços de luz, graças
a janelas interiores, permitem iluminar e ventilar cada piso. A gama de cores, claras e
soalheiras, aplicada na decoração interior, contribui à criação de uma atmosfera
particularmente agradável. Os espaços, isolados uns dos outros nas tradicionais casas
burguesas, comunicam aqui amplamente. Todo o espaço se articula em torno deste
núcleo central que é o poço de luz, mesmo os espaços de receção, abertos uns sobre
os outros, que se situam em diferentes níveis. Este principio foi aplicado pela primeira

João Miguel Aldeias Correia 213


Arquitectura Art Nouveau: Bruxelas e Victor Horta

vez no Hôtel Tassel, enquanto que na Maison Autrique, construída quase em


simultâneo, apresenta um tipo de planta mais tradicional.

Victor Horta via, acima de tudo, que na sua escrupulosa adaptação da arquitetura ao
programa (de acordo com os preceitos desenvolvidos por Viollet-le-Duc nos seus
Ensaios sobre a Arquitetura), havia um perigo, o de uma obra criada por encomenda
não ser possível transformar para outros fins. E, de certo modo, não deixa de ter razão,
exemplo disso são, entre outros, os casos de estudo e as suas diferentes reutilizações,
que estudámos nesta dissertação. O propósito de Victor Horta em mostrar modernidade,
tal como acontece com o uso do ferro, até então utilizado na construção industrial, revela
a determinação do arquiteto em mostrar as suas técnicas de construção, algo que nunca
tinha sido visto até então, na construção de habitações privadas e que aparece como
uma reivindicação de modernidade.

E nesse sentido, o Art Nouveau foi, um manifesto de modernidade, com um carácter


plural reunindo tanto as vertentes decorativas, como as expressivas. Decorativas, por
ter cativado para as artes aplicadas e decorativas, artistas e artesãos, a expressarem o
seu talento e “savoir-faire”. Expressivas, por demonstrar o poder de uma sociedade
elitista e progressista do final do séc. XIX e início do séc. XX, e o seu afastamento face
aos valores e mentalidades da época. A sua arquitetura foi, sem dúvida, de vanguarda
e de transição, experimentando novos caminhos, um movimento que deu origem à arte
moderna do séc. XX. É uma arte que tem uma irrefutável qualidade e valor artísticos,
despertando emoções impossíveis de descrever que apenas as podemos sentir
verdadeiramente, vivendo-a.

Infelizmente foi um movimento de curta duração, culpa talvez de acontecimentos


trágicos como a I Guerra Mundial que vieram perturbar o equilíbrio da sociedade a todos
os níveis, incluindo o artístico, mas também, devido ao facto de ser um movimento cuja
arquitetura tinha um cunho muito pessoal, feita de acordo com a visão do arquiteto que
a projetava e o gosto pessoal do seu proprietário, obedecendo a programas específicos,
programas esses que, atualmente, condicionam de certo modo a maneira como
habitamos os edifícios Art Nouveau. Apesar do reconhecimento unânime do esplendor
da obra de Victor Horta, o arquiteto moderno, a sua arquitetura rapidamente se irá tornar
“fora de moda”, pesada e demasiado pessoal. No entanto, e apesar destes factos, não
podemos deixar de enaltecer o génio criativo e inovador deste arquiteto, que marcou e
revolucionou a arquitetura do final do séc. XIX e início do séc. XX, deixando como
herança joias de arquitetura que podem, hoje, ser apreciadas.

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