Krishnamurti - A Revista Da Ordem Da Estrela

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Em 1928, foi a fundada a revista A ESTRELA, substituindo O ARAUTO DA ESTRELA, que veiculava palestras e poesias de J.

Krishnamurti (ento com 32 anos); nela tambm encontramos entrevistas com Krishnamurti, escritos de Annie Besant, Emily Lutyens, C. Jinarajadasa, D. Rajagopal e outros Teosofistas que acompanharam os anos do despertar de J. Krishnamurti. Eis alguns textos:

A ESTRELA Volume I No 1 A Unio Simples J. Krishnamurti O Menino e o Instrutor por Annie Besant Krishnaji por Jinarajadasa

A ESTRELA Volume I No 2 O Mendigo no Santurio Krishnamurti Para Ningum Olho, Ao Teu Lado (Poema) - Krishnamurti Busca a Tua Alma, Amigo (Poema) Krishnamurti Libertao, A Meta Final Krishnamurti Discurso de Krishnaji Na Sala Adyar, Paris

A ESTRELA Volume I No 3 O Portal da Libertao Krishnamurti

A ESTRELA Volume I No 4 Anda Luz do Meu Amor e No Ters Nenhuma Sombra (Poema) Krishnamurti Revolta Inteligente Krishnamurti

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A ESTRELA Volume I No 5 O Topo da Montanha Krishnamurti

A ESTRELA Volume I No 6 Meu Corao Pesa Com Seu Amor (Poema) - Krishnamurti A Harmonia Dos Veculos - Krishnamurti

A ESTRELA Volume I No 7 A Verdade Que Libertao E Felicidade - Krishnamurti

A ESTRELA Volume I No 8 O Oleiro (Poema) - Krishnamurti A Necessidade de Modificar - Krishnamurti Felicidade e Libertao - Krishnamurti

A ESTRELA Volume I No 9 Uma Parbola - Krishnamurti Krishnaji - Annie Besant Entrevista com Krishnamurti O Instrutor do Mundo e a Ordem da Estrela

A ESTRELA Volume I No 10 A Centelha e a Chama - Krishnamurti Os Desconhecidos (Poema) - Krishnamurti Verdade ou Lealdade - Krishnamurti

A ESTRELA Volume I No 11 A Busca do Bem Amado (Poema) - Krishnamurti O Tempo da Colheita da Vida - Krishnamurti O Bem Amado em Tudo (Poema) - Krishnamurti 2

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A ESTRELA Volume I No 12 Eu Sou Tudo (Poema) - Krishnamurti No Podes Limitar a Verdade (Poema) - Krishnamurti No Posso te Ensinar a Orar (Poema) - Krishnamurti Os Objetivos da Ordem da Estrela - Krishnamurti Pratica a Mensagem de Krishnamurti? (Discusso no Acampamento de Ommen)

Boletim Internacional A ESTRELA No 9 Perguntas e Respostas (I) Perguntas e Respostas (II)

A ESTRELA Ano II N 1 e 2 - Janeiro e Fevereiro de 1929 Um Sonho me Advm por entre Multido de Desejos (Poema) Krishnamurti Tempo (Poema) Krishnamurti H Uma Montanha... (Parbola) Krishnamurti Oh, Ama a Vida (Poema) Krishnamurti A Verdade no Bem nem Mal (Poema) - Krishnamurti A Aurora que Vem Krishnamurti

Boletim Internacional da ESTRELA Ano II No 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929 Discusso em Eerde O Fim no Comeo - C. Jinarajadasa A Chama Krishnamurti Construir sobre o Entendimento Krishnamurti O Ouvinte Ideal C. Jinarajadasa Propaganda Krishnamurti

A ESTRELA Ano II No 3 e 4 Maro e Abril de 1929 O Desejo Vida (Poema) - Krishnamurti

www.lojajinarajadasa.com Uma Viso da Vida (Poema) - Krishnamurti No Tenho Nome (Poema) - Krishnamurti O Perfume do Mundo (Poema) - Krishnamurti O Rio da Vida Krishnamurti

Boletim Internacional da ESTRELA Ano II No 5 e 6 (da anual em Ingls) Fevereiro e Maro de 1929 Em meu Jardim... (Parbola) Krishnamurti Expectativa e Consecuo Emily Lutyens Meditao Coletiva Krishnamurti O Valor da Individualidade Krishnamurti

A ESTRELA Ano II No 5 e 6 Maio e Junho de 1929 H uma Pequena Cidade... (Parbola) Krishnamurti As Portas do Eterno Krishnamurti Dois Poemas Krishnamurti A Consecuo da Verdade Krishnamurti

Boletim Internacional da ESTRELA Ano II No 7 e 8 (da anual em Ingls) Abril e Maio de 1929 A Verdadeira Base da Vida (Poema) - Krishnamurti Uma Entrevista com Krishnaji R. L. C. Krishnamurti e o msico Stokowski Uma Palestra A Vida em Liberdade (comentrios pela Dra. Besant do livro) - Annie Besant O Objetivo do Acampamento Indiano da Estrela (fragmentos da mensagem de Krishnaji) Discernimento Krishnamurti

A ESTRELA No 7 Julho de 1929 A Verdade na Limitao (Poema) Krishnamurti Uma Entrevista com Krishnaji sobre Problemas da poca Atual Havia certa vez um homem... (Parbola) Krishnamurti

www.lojajinarajadasa.com A ESTRELA e Boletim Ano II No 8 e 9 Agosto e Setembro de 1929 Poemas - Krishnamurti Renncia e Transigncia Krishnamurti A Dissoluo da Ordem da Estrela Krishnamurti Dissoluo da Ordem D. Rajagopal

Boletim Internacional da ESTRELA Ano II No 10 Excertos Krishnamurti Vislumbres do Acampamento de Ojai Antes do Acampamento de Ojai - Annimo

Que o Entendimento Seja a Lei - Krishnamurti

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A UNIO SIMPLES J. Krishnamurti

Escuta-me, Oh! Amigo Sejas Yogi, ou Sacerdote ou Monge, Um devoto amante de teu Deus, Um peregrino em busca da ventura, Banhando-te nos Santos Rios, Freqentando os Sacros altares, O ocasional cultuador de um dia, Um grande ledor de livros, Ou um construtor de muitos templos; Meu amor di-me por ti, Eu sei o caminho para o corao do Bem Amado.

Esta luta v, Este longo af, Esta tristeza intrmina, Este prazer cambiante, Esta dvida que queima, Este prezar da vida, Tudo isso cessar, oh! Amigo. Meu amor doi-me por ti. Eu sei o caminho para o corao do Bem Amado.

Peregrinei pela terra, Amei os reflexos, Cantei, entoando em xtase. Cobri a fronte de cinzas,

www.lojajinarajadasa.com Ouvi os sinos dos templos, Envelheci no estudo, Procurei. Perdi-me? Oh! sim, muito aprendi. Meu amor doi-me por ti, Eu sei o caminho para o corao do Bem Amado.

Amigo, Amars os reflexos Quando eu posso propiciar-te a realidade? Lana fora teus sinos, teu incenso, Teus temores e deuses, Pe de lado teus credos e filosofias. Vem, pe de lado tudo isso. Eu sei o caminho para o corao do Bem Amado.

Amigo, A simples unio a melhor. Este o caminho para o corao do Bem Amado. (A Estrela, Vol. I, N. 1 Janeiro de 1928)

O MENINO E O INSTRUTOR Annie Besant

Muitas tm sido as mudanas que vi, operadas em Krishnamurti, desde o dia 11 de Janeiro de 1910 em que eu e o meu venerando irmo, C. Leadbeater, estivemos de p, por detrs dele e dos seus dois padrinhos, nossos Irmos mais Velhos, na presena radiante do Senhor Maitreya, o futuro Buddha, sobre cuja cabea brilhava a Fulgente Estrela, ao passo que o Senhor Buddha, sentado bem alto, no espao, abenoava a criana que ia pr os seus frgeis ps no Caminho trilhado pelos Tatagathas, desde que o nosso globo recebeu os Filhos do Fogo.

www.lojajinarajadasa.com Aps as costumadas perguntas e respostas e depois de um breve pausa, o Hierofante olhando ternamente para aquele pequenino, perguntou se, em vista da to tenra idade do corpo do candidato, queriam alguns irmos vivendo no mundo fsico, toma-lo a seu cargo e velar por ele, at atingir a maioridade. Respondemos, meu irmo e eu, que gostosamente aceitvamos o encargo, porque o estimvamos muito. Tendo-se-lhe perguntado se ele nos aceitava como seus tutores durante a sua adolescncia, ele em uma frase cheia de amor, mostrou desejar acolher-se nossa proteo. Com algumas frases sublimes, foi-nos transmitido esse sagrado encargo, formando-se, entre ele e ns, um elo que jamais poder ser quebrado. Passaram-se os anos; o jovem tornou-se um adolescente e o adolescente um homem que atravessou vrios estados e muitas maneiras de pensar e de sentir. Houve perodos de franca alegria de criana; outros de languidez em relao ao seu destino, perodos de revolta mental e de uma forte e ntima aspirao pela liberdade de pensar e independncia de julgamento, cumulando o irmo de perguntas, com a sua mente brilhante. Mas ficou sempre, atravs de tudo, a mesma criatura, gentil, amvel, graciosa, cheia de compaixo para tudo quanto era fraco, para os animais, para as criancinhas, ligado, sempre, pelo mesmo puro amor aos seus dois irmos mais velhos, designados para seus tutores; um adolescente encantador e fascinante, conquistando os coraes de quantos o conheciam. Desde 1909, ano em que seu pai o trouxe com Nityananda, para Adyar, Quartel General da Sociedade Teosfica, ambos os irmos viveram num ambiente de Teosofia, haurindo os seus ideais, absorvendo os seus ensinamentos, acrescentando ao Hindusmo, em que nasceram, a liberdade de pensamento inseparvel da Teosofia. Assim, afirmou ele no castelo de Herde ao seu crculo de estudantes: a base dos meus conhecimentos a Teosofia". A grande dor da sua vida foi a desencarnao do seu irmo, pois sempre junto dele se conservara desde o seu nascimento; mas apenas os seus corpos fsicos se separaram, pois que a morte no podia romper a sua indissolvel unio. Ele recebeu a sua Segunda Iniciao em Taormina e a terceira no seu prprio lar, no Vale de Ojai. Em 1925 teve lugar a primeira manifestao pblica, mostrando que ele era o veculo escolhido pelo Grande Instrutor, quando este falou como os nossos leitores sabem, pelos seus lbios, no dia 28 de Dezembro na reunio do aniversrio da Estrela, que imediatamente se seguiu a Conveno do Jubileu da Sociedade Teosfica. Desde ento, as suas mudanas tm sido sucessivas e rpidas, como se pode ver nos poemas que tem escrito, chegando sua conscincia a imergir na parte da conscincia do Instrutor do Mundo, que se permite funcionar dentro das limitaes do corpo fsico humano. (Veja-se o captulo XI do Bhagavad Gita). As transformaes tm sido notveis. Ao falar em pblico na ltima primavera e no recente vero, mostrava-se ainda tmido, muito nervoso, por vezes hesitante, sempre com completa ausncia de segurana prpria. Agora, porm, tornou-se majestoso, sem a mais leve sombra de nervosismo, fluente e potico na dico rica de imagens tiradas sempre da Natureza. Afirmou-se, plena e definidamente, o Instrutor do Mundo, como a porta para a Libertao, como Uno com o Seu Bem-Amado. Eu, que o conheci desde criana, dou testemunho de que ele j no o Krishnaji que foi. Mesmo nas suas prprias qualidades de amor e ternura, se fez uma mudana. Tornaram-se mais profundas e mais fortes, porm, impessoais, j no depende mais de ningum. Est s, irradiando amor e felicidade para todos. Uma felicidade serena, alegre, irradia dele, brota espontnea da sua natureza ltima, no superficial. Os seus ensinamentos so Ideais e no meros detalhes; dele emana uma poderosa torrente de Vida, pouco lhe importando que ela v quebrar as velhas frmulas imperfeitas ou mesquinhas. A vida cria e regenera, e o Instrutor do Mundo irradia de Si a Vida, sem cuidar das formas. A dor temporria e s a sofrem aqueles que ficam agrilhoados forma. A alegria, porm, pertence queles que se encontram prontos a perder a vida inferior e esto certos de que encontraro a Vida Eterna. E, assim, embora Me e tutora do jovem, do adolescente, eu, alegremente, reverencio no Homem a presena do Senhor que adoro. 8

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Porque O reconheo como Ele no seu Corpo Glorioso, na Sua morada do Himalaia, onipotente e onipresente, eu O sado no santurio do seu corpo fsico, com as limitaes assim impostas, imanente no corpo terrestre, to verdadeiro como Ele se manifesta no seu Corpo Glorioso, naquelas longnquas cordilheiras. Sou a Sua serva, seja qual for a forma que Ele revista e tomo esse servio como o meu mais alto privilgio neste mundo inferior. Revista A Estrela Volume I N. 1 Janeiro 1928

KRISHNAJI C. Jinarajadasa A feio caracterstica de Krishnaji a sua individualidade. Como todos sabem, os seus "Pais espirituais" tm sido a Dra. Annie Besant e o Bispo C. W. Leadbeater; eu mesmo, posso incluir-me no nmero dos seus "irmos espirituais". Ns, que com ele temos vivido desde tenros anos, trabalhamos no campo Teosfico, e pensamos de um modo muito especial, quer dizer: Teosoficamente. Mas, Krishnaji, no pensa assim. Ele individual e original, e quando apresenta a sua mensagem, o faz sempre sob um ponto de vista nitidamente especial. Nem a sua fraseologia nem as suas dissertaes se aproximam das dos discursos que ele ouviu daqueles que o rodeiam e que foram tambm ouvidos por centenas de Tesofos. nisto que se encerra o encanto de Krishnaji e a frescura da sua mensagem. que, apesar de tudo, no h mais do que uma Sabedoria, quer ela seja enunciada por um Instrutor antigo ou moderno. Mas h diversas maneiras na sua apresentao, e, para mim, que busco no s a verdade, mas tambm a beleza, sinto um grande deleite com que Krishnaji nos d, no "vinho novo em garrafas velhas", mas "vinho novo em novas garrafas". Krishnaji tem nos dito muitas "verdades amargas". So amargas? Apenas para aqueles que at agora se tm contentado em seguir o "caminho mais fcil", como Shri Krishna lhe chama, para atingir a Divindade Manifestada. Mas para aqueles que tm ansiado veementemente, aproximar-se da Divindade No Manifestada, para quem a vida interior tem, no obstante, sido difcil, para esses, "as verdades amargas" de Krishnaji so como alimento para os famintos e gua para os que morrem a sede. Se qualquer de ns, que encontrou na Teosofia, a luz da Sabedoria Divina, acha os seus ensinamentos "duros", sem luz nem conforto, mas trevas e desconforto, queixe-se apenas de si, pois, isso significa que, no seu passado, receou encarar de frente a Luz da Verdade, com medo de perder a vista. O nico remdio, agora, ir acostumando, gradualmente, os olhos, a verem essa Luz, at que, a despeito da dor que sofra, possa crescer, graas a essa mesma luz, e regozijar-se, por fim, intensamente. Quem viu a face de Krishnaji, em criana, por ventura esqueceu a sua beleza? Quem teve esse privilgio no poder, nunca, olvidar a sua humanidade, o seu deleite em ser, no mundo, como os outros homens, como eles e no diferente deles; homem entre os homens, pesquisador entre os pesquisadores e, acima de tudo, a sua averso a ser posto sobre um pedestal. Agora j no um pesquisador, mas um Mestre que fala com retido. Porque achou o conhecimento, ele acrescentou, sua humanidade, atributos dessa Divindade oculta no homem, com que eu h tanto sonho. C. Jinarajadasa

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O MENDIGO NO SANTURIO J. Krishnamurti Como o pedinte, Roto e faminto Se senta escada do Templos Sacudindo a escudela vazia, Assim me sentava, clamando Que meu corao vazio fosse repleto.

Os cultuantes, Em caminho para o templo Adornados com hbitos de oferenda Com um sorriso, Partilhavam comigo suas ddivas.

Mas no dia vindouro Entre os pedintes, Retomava meu posto, Uma vez mais, Triste e vazio. (A Estrela, Vol. I, N. 2 Fevereiro de 1928)

PARA NINGUM OLHO AO TEU LADO J. Krishnamurti Para ningum olho ao Teu lado, Oh! meu Bem Amado. Em mim Tu nasceste 10

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E que a Eu busco meu refgio.

De Ti tenho lido em livros muitos. Eles me dizem Que muitos h que a Ti so semelhantes, Muitos templos a Ti foram erguidos, E muitos ritos h Para invocar-Te. Porm, com eles no tenho intimidade. Pois todos so as cascas De humanos pensamentos.

Amigo, Busca o meu Bem Amado Nos recessos ocultos de teu corao. Morto o tabernculo Se o corao cessar a sua dana.

Para ningum olho ao Teu lado Oh! meu Bem Amado Em mim Tu nasceste, E eis que em Ti Encontro meu refgio. (A Estrela, Vol. I, N. 2 Fevereiro de 1928)

BUSCA A TUA ALMA, AMIGO J. Krishnamurti 11

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E podes tu dizer-me, pois, Amigo, De onde vem esta enorme segurana E o propsito dela? A origem, desta interminvel discrdia, Desse violento desejo de bens mltiplos Desse ansiar imenso pela vida, Dessa luta infindvel, por transitria dita?

Quo ligeiro Se esfolha a linda rosa. Quanto fcil, Amigo, A tristeza gerar-se.

Amigo, No achars tua dita perdurvel Em templo algum, Em nenhum livro, Nem no humano intelecto Nem nos Deuses de tua criao.

No vs aos santos stios, Nem adores em templos beira dos caminhos.

Quo de pronto A laguna tranqila se perturba E aos reflexos que encerra.

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www.lojajinarajadasa.com Amigo, pois, No busques tua dita Nas coisas passageiras.

Procura tua alma, Amigo, Pois s nela Habita o teu Amado. (A Estrela, Vol. I, N. 2 Fevereiro de 1928)

LIBERTAO - Meta Final J. Krishnamurti A no ser que a Verdade nos venha sob a forma de linguagem a qual nos achamos habituados, somos inclinados a rejeit-la e a deix-la passar desapercebida. Se uma Verdade nos aparecer atravs uma abertura que tenhamos conservado limpa talvez durante muitas vidas se nos vier por essa janela, sentimo-nos capazes de aceit-la; se nos vier por outra que tenhamos negligenciado, no a aceitaremos; pelo fato de no estarmos habituados a essa forma de expor a Verdade, nossa mente e emoes no se afinam por ela e rejeitamo-la inconsideradamente, sem lhe prestarmos a ateno e meditao que ela requereria. Quaisquer que sejam nossas modalidades mentais, h em ns a tendncia a s aceitarmos a Verdade se nos for apresentada no jargo, a forma a qual nos achamos habituados. Se pertencemos a um credo especial, preciso que a Verdade nos venha na linguagem dessa particular religio; ao Hindu, deve vir por intermdio dos Vedas e do snscrito, segundo as formas peculiares em que j tem sido ensinada. D-se o mesmo com relao ao Cristo e ao Budista. Suas respectivas mentes estreitaram-se, limitaram-se as suas emoes, e da o rejeitarem a Verdade, sejam quais forem as formas outras sob as quais ela lhes aparea. A Verdade freqentemente apresenta-se-nos sob formas que no aquelas as quais nos achamos habituados e a reside o que h de grande e de trgico em relao ao assunto; nele h grandeza, porque vem inopinadamente; e tragdia porque as pessoas que buscam a Verdade no o fazem na direo em que sempre deve ela ser vista. Aqueles dentre ns, que buscam a Verdade devem, primeiro que mais nada, limpar suas mentes e coraes de todo pensamento, linguagem e filosofia estreitos e sectrios. No devemos acomodar a Verdade ao nosso modo particular de pensar; se o fizermos ela ser torcida e desfigurada. Eis porque me to difcil expor meu pensamento sem observar seus efeitos sobre as mentes das outras pessoas, efeitos que se evidenciam em seus semblantes. Dse que certo pensamento recebido pelo seu valor intrnseco em virtude da mente da pessoa se encontrar limpa neste sentido, no que respeita a este assunto particular; e assim que seus coraes o recebem com entusiasmo. Aqueles, porm, que se acham habituados a s receberem a Verdade atravs de um canal particular, por intermdio de uma forma peculiar ou de um molde especial, a rejeitaro sob qualquer outra forma em que ela se lhes apresente e abanaro suas cabeas como se no houvessem compreendido. Isto significa que a Verdade, - quer seja a minha ou a de outrem - no pode ser recebida: no encontra caminho, entrada adequada para tal ou qual mente ou corao. De modo que, se eu pudesse, inventaria uma nova linguagem por meio da qual todos pudssemos escapar aos termos familiares e forma particular de filosofia 13

www.lojajinarajadasa.com por intermdio da qual havemos sido alimentados; de todos os smbolos, de toda a literatura, livros sagrados, quadros, devoes, afim de que renovados, pudssemos saturar-nos da Verdade, limpos e puros como estvamos no incio de todas as coisas ou como estaremos no fim de todas elas. Para que possais aspirar o perfume das flores, indispensvel que possais respirar livremente. Se pudesse, eu destruiria essa iluso que haveis criado, essas barreiras que a Verdade acha sempre difcil transpor; pois que a Verdade to ilusiva, to tnue, que somente o limpo e puro pode dela aproximar-se, receb-la livre e plenamente, goz-la sem a maltratar, sem a torcer, como temo que todo o mundo faa. Todos no mundo querem que a Verdade lhes aparea sob uma forma particular, revestida de uma fraseologia tambm particular. A Verdade, porm, semelhante a um ladro que vem pela noite, silenciosa e secretamente, e, se houverdes guardado todas as entradas da vossa mente e do vosso corao com a vossa fraseologia e as vossas idias, ela no poder penetrar. Como, infelizmente, no me possvel inventar uma nova linguagem, eu vos peo que tomeis o que vos digo tal qual se acha, destruindo vossas frases, vossa estreiteza, vossas formas particulares, afim de que a Verdade aparea, tal qual , nua e pura. Assim como o oceano recebe todos os rios do mundo, assim, tambm, a finalidade de todos os homens a libertao. Assim como o oceano recebe todos os minsculos rios que vagueiam por terras inspitas, por desertos e regies onde no h sombras, terras assoladas pela tristeza e pela pestilncia, e os rios que passam atravs de florestas e campinas verdejantes, vales belssimos e pases tranqilos; e os rios que descem, impetuosos, de montanha em montanha, em cataratas, cachoeiras, cheios de rumores e entrando para o oceano com um rugido; os rios que entram em contato com fbricas, cidades, com a vida alegre, o barulho, do trfego, com os escoadouros e as impurezas, - assim tambm, todas as pessoas, quer pertenam a um ou outro tipo, sejam deste ou daquele temperamento, entraro para o oceano da libertao. Assim, cada qual deve estabelecer por si prprio esta aspirao nica, este propsito nico na vida. O homem s tem um fim. Todas as coisas vivas ou no vivas, os animais, os brbaros, os civilizados, o artista, o poeta, o mstico, o ocultista, o homem que conhece as tristezas e os prazeres, o Super-homem, os Deuses e o povo, s tm um fim e um propsito, e este a libertao - a libertao est acima de todas as religies, pois que a finalidade de todas elas. a finalidade de todos os pensamentos, de todas as frases, de todos os sistemas, de todos os sentimentos, de todas as aes e de todas as experincias. E, uma vez que hajais estabelecido esta meta que, para todos ns, a realidade nica, pois que est para alm dos sonhos de todos os homens e de todos os Deuses, deveis moldar a vossa vida, os vossos pensamentos e sentimentos de modo a poderdes entrar nesse oceano da libertao. Para podermos verificar que este oceano existe, temos que passar atravs de muitas experincias, como faz o ignorante - temos que passar por seitas, por formas estreitas de religio, sociedades, culto aos Deuses, supersties - precisamos passar por isso, afim de adquirirmos experincia de tudo, afim de podermos conhecer por ns mesmos que o fim de cada um de ns a libertao. E, como resultado das minhas palestras que se vo seguir, desejaria que cada um de vs se retirasse tendo pelo menos verificado este fim, experimentado esta sensao de libertao por si prprio; pois que eu no vos posso proporcionar a libertao, tendes de a conquistar. A libertao vem do interior e no do exterior. Como mendigos que se sentam nos degraus do santurio, com sua paralisia, sua vacuidade e sua fome, dando-lhes cada cultuante que passa uns cobres ou uns gros de arroz para aliment-los, voltando eles no dia seguinte, de novo, vazios, famintos, tristes, fracos, assim o homem que depende dos outros, o homem que no viu o fim, e que depende para sua felicidade, para seu consolo, para sua libertao, do amparo de outrem. Pelo fato de haver eu atingido a libertao que vos posso alimentar, encher os vossos vasos; como, porem, sei que amanh eles estaro de novo vazios, quero dar-vos, antes, o poder, a fora, e a vitalidade para dardes os passos que conduzem ao Santo dos Santos, para que assim vs prprios vos torneis Deuses e possais alimentar a outros, para que possais dar fora e vitalidade aos que se encontrarem vazios, famintos e esqulidos. Desde antigos tempos foi propsito meu inconsciente, porm agora consciente, atingir a libertao e durante muitos meses, senti que havia despedaado todas as barreiras e sinto que agora estou liberto, mental e emocionalmente, para ir para onde quiser - talvez no fisicamente, porm esta deve ser a ltima das coisas a nos preocupar, sendo o fsico, como , de menor 14

www.lojajinarajadasa.com importncia. Foi esta uma libertao pela qual trabalhei durante muitas vidas, pela qual me esforcei toda esta existncia, especialmente nestes ltimos seis meses. Queria libertar-me dos meus prprios amigos, dos meus livros, dos meus sistemas de pensar, das minhas filosofias; e penso - no somente penso, mas sei - que estou livre e, desde que alcancei a liberdade, compete-me o dever de indicar o caminho que conduz a esta liberdade, a esta libertao. E cumpre-vos, quem quer que sejais, msticos, cerimonialistas, poetas, pintores, msicos, a todos vs compete caminhar em direo a essa finalidade, alcanar a experincia dos vossos temperamentos, tendncias, inclinaes, e assim chegardes a uma meta especial que existe para todos e que a finalidade de todas as coisas. Seria aconselhvel, se o pudsseis fazer desde o comeo, firmar em vossas mentes e em vossos coraes aquilo que cada um de vs deseja, pois que o entendimento nasce do desejo de atingir as coisas pelas quais ansiais. A compreenso vem tanto intelectual como emocionalmente, desde que o vosso desejo por um objeto seja forte bastante, e o vosso anseio bastante imperioso; portanto, a primeira coisa que vos compete fazer fundamentar esse desejo que atuar como uma agulha de compasso afim de guiar-vos por esse caminho que leva libertao. O que precisais em seguida, verificar se se trata de desejo vosso ou meu. A maioria das pessoas em virtude de sua devoo, tornam-se semelhantes aos pssaros engaiolados. So colhidos pela prpria devoo e ficam, assim, sempre dependentes da pessoa a quem sua devoo se dirige. Assim pois, a despeito da individualidade, sem atender vossa devoo por essa pessoa, deveis por vs prprios firmar este desejo o qual deve, naturalmente, nascer de vossa prpria experincia. O que vos estou dizendo agora, o que vos hei de dizer nas poucas semanas que se vo seguir, o resultado de minha experincia, que a experincia de todos. Pois sei que em passadas vidas fui casado, fui cerimonialista, fui vadio, perdi-me, fui taciturno, cada coisa por sua vez. Fiei na roda da vida e desse fio teci meu prprio desejo, meu anseio pela libertao o qual de minha prpria criao, inteiramente pessoal e, portanto, nada no mundo pode destrulo. O mesmo fato se d com aqueles que quiserem tornar-se discpulos, seguidores, amantes desta libertao; deveis estabelecer este desejo que deve ser vosso nico ponto de referncia. Este desejo no deve depender de mim, da minha autoridade, da minha individualidade, pois que, se amanh eu me retirar, perder-vos-eis. Deveis libertar-vos, no por amor de mim, porm, a despeito de mim. Talvez possa auxiliar alguns dentre vs a atingirem a libertao, posso dar-vos o meu amor, acompanhar-vos com meu ardente desejo, porm deve ser dentro de vs que deve haver este constante bater de asas no sentido de escapar para o ar livre. Deve ser o vosso prprio desejo, a vossa prpria experincia, a vossa prpria flor de sofrimento, tristeza e dor que vos deve guiar. E este sofrimento, esta dor, esta tristeza, so minhas tambm, como o so de toda a gente. O que eu digo, o que canto, a vossa prpria experincia falando atravs da minha boca e a nica Verdade que tem valor. O p da experincia que colhi, que me libertou, por meio do qual constru a montanha na qual vivo, a vossa mesma experincia. Tive os mesmos anseios, os mesmos ardores que vs tendes e somente existe um fim para tudo isso, pois que o meu fim o vosso, minha meta a vossa meta, minha conquista, minha felicidade, minha libertao so a vossa conquista, a vossa felicidade e a vossa libertao. Assim pois, antes de tudo tendes que estabelecer em vossas mentes e em vossos coraes esse desejo, essa resultante da vossa prpria experincia. A libertao a meta para todos, pois que todos sofrem, todos tm alegrias, todos tm prazeres, e dessas coisas passageiras, transitrias, impermanentes, nasce aquilo que permanente e eterno - o anseio pela libertao. Assim, quer para o pobre, quer para o rico, quer para o vencido pela tristeza, sem conforto e desprezado, quer para o glorificado da terra, s existe uma finalidade, que a libertao. Se entenderdes isso e o mantiverdes dentro da vossa mente e em vosso corao como o perfume est contido na flor, constantemente, ento alcanareis o entendimento o propsito real da vida. S existe uma lei para todos e esta a da conquista da libertao. Quer se trate dos que adoram - como na ndia - dolos em minsculos santurios e em velhos templos maravilhosos, quer dos que executam cerimnias como fazem por todo o mundo, envoltos em suntuosas roupagens, com incenso e repicar de sinos, quer se trate de msticos que desejam entrar em contato com o Eterno Esprito que interpenetra o orbe; ou quer se trate ainda de senhores de muitas posses - s existe uma lei para todos. Pois todos procuram escapar dessas coisas que ligam, sair dessas vielas estreitas em que se sentem escravizados, tolhidos, nas quais se luta como o pssaro que busca sair para o ar livre e atingir a meta. Se no possuirdes este desejo 15

www.lojajinarajadasa.com pela libertao, pela glria, pela beleza intrnseca que lhe inerente, sereis semelhantes ao navio perdido no mar, sem aparelhos que o guiem, sereis coibidos por todos os ventos, por toda a vaga que venha e levados para todos os pontos para onde no desejardes ir. A partir do momento, porm, que tenhais estabelecido este desejo, sentido este amor ardente pela libertao, ento tereis descoberto o porto no oceano da vida. E, a partir do momento em que tenhais descoberto esse porto, comeareis a perceber que tendes que renunciar a tudo, a todas as coisas que haveis como caras, aos prprios Deuses que vos auxiliaram, pois a libertao est acima dos Deuses, acima da perfeio da humanidade. Uma vez que tenhais entrado neste cu da libertao tornar-vos-eis devotos, amantes do mundo, pois que o mundo procura esta libertao e vs a haveis encontrado. Desejareis, ento guiar todos esses navios que se encontram perdidos pelo oceano, para esse porto de solido onde existe consolo, onde no h isolamento e onde, no futuro, vos tornareis verdadeiros discpulos dos que amam o mundo e para ele vo afim de ajudarem as pessoas a compreender o que a libertao e como atingirem-na. Por esta razo somente, afim de vos ajudar, para em vs despertar este desejo, aqui me encontro; por esta razo somente e por possuir esse amor que vos d inspirao de modo a nascer em vs esse desejo de atingir o porto da libertao que aqui estou; e, enquanto no houverdes atingido essa libertao sereis como animais colhidos em uma rede. Tudo que fizerdes, quaisquer que sejam as vossas aes, quaisquer que sejam os vossos pensamentos, as vossas cerimnias, sejam quais forem as vossas idias, elas atuaro como redes no sentido de vos prenderem mais e mais, para vos escravizarem; por essa razo que aqui me encontro, afim de cortar pela raiz essa ligadura que vos cerca, para que fiqueis livres, e, durante este ms, eu vos pediria que conservsseis diante de vs como que um espelho para que ele reflita vossos pensamentos e emoes afim de verificardes se eles coincidem, se se adaptam aos vossos sonhos, aos vossos ideais, aos vossos anseios; e aquilo que no coincidir, que for indesejvel, deve ser posto de lado, pois que o nosso anseio nico deve ser o da liberdade - liberdade de todas as coisas, dos prprios Mestres, dos prprios Deuses, de toda a vida e de toda a morte. A ESTRELA Volume I N. 2 Fevereiro de 1928

DISCURSO PROFERIDO POR KRISHNAMURTI (na Sala Adyar, Paris, Setembro de 1927) Para onde quer que fordes, qualquer que seja o clima que percorrerdes, verificareis que o povo busca a felicidade - felicidade que depende das circunstncias exteriores, felicidade que podem alcanar por um momento passageiro, felicidade que continuamente cambiante. Esta, a felicidade partilhada pela maioria das pessoas em todo o mundo. Felicidade que consideram to essencial, to vital para suas existncias e que, no entanto, flutuante, mutvel, varivel com os tempos. Contudo, existe na mente e no corao de cada indivduo uma idia definida, um distinto anseio de encontrar a felicidade real que existe por detrs deste vu das coisas transitrias. Esta tarde minha inteno demonstrar no ser esta felicidade objetiva, porm subjetiva. Entretanto, afim de compreenderdes o subjetivo, tendes que haver j realizado a experincia do que objetivo. Porque, se no houverdes contemplado o mundo, e se no houverdes experimentado o que o mundo, o mundo vos atrair a tal ponto, que no sereis capazes de vos recolher dentro de vs mesmos para encontrardes ai a fonte desta felicidade. Para mim s existe um propsito na vida e este a conquista do Reino da Felicidade, que dentro de cada um deve ser encontrado e que s pode ser achado pela renncia, pela rejeio da conquista do que fsico.

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www.lojajinarajadasa.com Para onde quer que vos dirijais, verificareis que as pessoas buscam a felicidade que permanente, durvel e eterna, mas so, porm, colhidas como peixes na rede m das coisas transitrias que os rodeiam, pelos aborrecimentos, pelas atraes, desprazeres, dios, despeitos, por todas essas mesquinhas coisas que ligam o homem. como se estivssemos em um jardim onde h muitas flores. Cada flor se esfora por expandir-se, por viver e proporcionar seu aroma, mostrar sua beleza, seus desejos, por evidenciar ao mundo seu pleno crescimento. Durante o processo de desabrochar, de conquistar, de expandir-se, perde-se o homem no que exterior. Surge dai a complicao e ele tem que distinguir desde o comeo o que essencial do que no . Tendo de momento estabelecido coma premissa que cada um de ns se encontra empenhado na busca da felicidade, olhemos em torno, afim de averiguar o que a felicidade. Todo indivduo, seja ele quem for, Hind, Budista ou Cristo, se acha limitado por sua prpria religio especial, pois que toda religio externa a idia de que, se se fizer o bem ir-se- para o Cu e se se fizer o mal, para a Inferno. No existe, porm, coisa que se assemelhe ao bem e ao mal. S existe ignorncia e conhecimento; e, portanto, a conquista do conhecimento, da perfeio, da verdade, est dentro de cada um e para realizar sua conquista necessrio a experincia. Ao acumular experincia precisamos nunca nos esquecer da meta que a finalidade para todos, pertenam a uma religio especificada ou a nenhuma: o propsito da vida a conquista da felicidade por meio de nos libertarmos a ns mesmos de todas os mesquinhos desejos, de tudo quanto nos liga, de todas as mesquinhas restries. Por toda a parte por onde fordes, verificareis que todos buscam esta felicidade permanente, durvel, eterna. So, porm, colhidos como peixes pela rede. Uma vez admitindo que a finalidade da vida esta libertao de todos os desejos que culminam em um desejo fundamental - a saber, o da felicidade eterna - verificareis que a busca da humana felicidade por intermdio das coisas transitrias , sob um aspecto, necessria. Sabemos que esta felicidade existe, ns a vimos na paz, na grande imagem de viso maravilhosa colocada diante de ns; experimentamo-la j em nosso interior, e jamais poderemos duvidar. Se admitirdes que a vida existe para a conquista da felicidade, devereis deixar de lado tudo mais que no tenha valor para essa conquista. Minha tarefa esta tarde, no estabelecer regulamentos, dogmas ou credos, porm expor qual a meta para toda a humanidade, tanto para o artista como para o cientista, para os que pertencem a uma religio como para os que no pertencem a nenhuma; a felicidade que produz a libertao constitui a meta para toda a humanidade. Agora, d-se o fato de que no podeis ir ao selvagem, ao brbaro, ao no evoludo e indicar-lhe que a meta da vida esta eterna felicidade; por no terem, no presente, adquirido experincia bastante, mediante a qual possam construir o arcabouo desse reino eterno. No vos possvel modific-los por milagre, e pelas vossas conquistas, pela vossa vida, pelo vosso desejo, for-los a entrarem nesse reino. Compete, porm, ao homem que entende o propsito da vida, mostrar o caminho aos outros e ser como um farol na borda de um oceano de trevas. Para buscarmos esta felicidade, para atingirmos esta libertao que cada um de ns deseja, devemos firmar em primeiro lugar, que este reino, esta manso, este jardim, existe dentro de cada um de ns. No h Deus algum externo que, como tal, nos propulsione a vivermos nobre ou inferiormente; somente existe a voz da nossa prpria intuio que, continuamente, pela experincia e pela prtica, nos ensina a viver nobremente. esta experincia que nos proporciona o conhecimento, que nos d o julgamento para sopesar na balana das coisas o que o bem e o que o mal. Se contemplardes um escultor em seu trabalho, haveis de apreciar como, com barro malevel, pouco a pouco, enchendo as cavidades, ele cria um semblante cheio de vitalidade. 17

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O mesmo acontece na vida humana: por este processo de acmulo de experincia vida aps vida, que aprendemos a ouvir a voz que est dentro de ns e que nos guiar. H, em cada um de ns, trs entidades distintas. A mente, que pode ser comparada a uma flor; as emoes que so semelhantes a gua que d fora, vida, vigor e aroma a flor; e o corpo, que o vaso que contm a flor. Se formardes a imagem de que, cada um de ns tem dentro de si estas trs entidades, cada qual esforando-se para criar por si mesma, para por si prpria se aperfeioar, podereis verificar que sempre existir desarmonia quando no houver completa unio entre as trs. Verificareis, assim, que ao estabelecerdes harmonia, compreenso, sntese, entendimento sinttico entre as trs, devereis ter um fim em relao ao qual as trs concordem. A primeira coisa que devemos dominar pois, o corpo, visto que este a base, pois deseja funcionar por si prprio e intervm na operao dos outros dois; devemos, portanto, gradualmente aprender a adestrar o corpo, a domin-lo e faz-lo obedecer mente e s emoes. Cada um de vs sabe bem que o corpo deve ser dominado e governado, porm nem todos sabem que o corpo constitui uma entidade separada, com seus desejos e anseios peculiares e que deve ser trazido para a linha com os outros dois corpos referidos. O mesmo se d com as emoes; se quisermos conquistar essa eterna felicidade que no muda, que no tem limites, necessrio que as emoes sejam impessoais. Para isto preciso haver afeto, amor impessoal. Pois se tiverdes afetos que prendam, ento vos estareis limitando a vs mesmos, vossas afeies, vossa vida, e o resultado disso sempre a criao de karma. Karma significa que toda a ao, seja ela qual for, todo o pensamento produz seu fruto e, enquanto houver karma, no podereis alcanar essa felicidade absoluta a qual me estou referindo. Depois, vem a mente que o guia, que contrabalana, que critica sempre, que investiga, experimenta, e capaz de distinguir e sopesar. Mente, emoes e corpo devem achar-se em harmonia absoluta, em absoluta unio; ento, em vs prprios estabelecereis essa voz que ser o vosso verdadeiro guia. A este guia chama-se intuio e em si mesmo ele a consecuo, a finalidade que Deus - se me dado usar esta palavra. Essa voz o resultado da experincia. Tendes de realizar experincias para cultivardes essa voz e para a tornardes poderosa. Esta a finalidade da experincia - e no o mero prazer que a experincia proporcione. Quando esta voz for suficientemente forte, quando esta voz - resultado da experincia acumulada - for obedecida e vs prprios vos tornardes essa voz, ento chegareis a ser Deus. Pois no existe Deus externo, existe apenas o Deus aperfeioado por meio de vossa prpria experincia. Por toda a parte por onde fordes, vereis que todos negam a autoridade, porque todos desejam evoluir, buscar, experimentar por si prprios e assim desenvolver suas faculdades e intuio. Decorre dai que, se vos sujeitardes a obedincia, criareis maiores perturbaes em vs prprios; no desejaria eu porm que se determinasse uma revoluo, pois que isto indicaria que no estareis obedecendo a lei de harmonia. Chegareis a verificar que o que tendes como experincia vossa e vosso conhecimento evidencia o vosso modo de viver. este o guia nico, no existe outro guia, outro Deus, outro regente. Direis porm: "Que ser do brbaro que no possui suficiente experincia para averiguar que a voz de sua intuio correta?" Existe muita desgraa no mundo devido ao fato do homem que pensa e compreende compelir os outros a compreenderem tambm. Assim, pois, o brbaro, 18

www.lojajinarajadasa.com o selvagem que no possui suficiente conhecimento, no dever ser forado, porm deve-se-lhe dar a oportunidade de chegar a compreender. Assim, o que h de mais importante na vida chegar a desvendar este Deus interno que existe em cada um de vs. este o propsito da vida: despertar o Deus que dorme; dar vida a centelha que existe em todos, afim de nos tornarmos chamas e nos unirmos chama eterna do mundo. Por muitos anos, por muitas existncias, talvez, tem sido objetivo de minha pesquisa constante, de minha continua demanda, encontrar a Verdade. Pois o fato que, o que quer que tenhais como forma objetiva, tangvel, ser destrudo; e assim nos perdemos a ns mesmos; perdemo-nos nessas coisas transitrias enquanto andamos busca daquilo que eterno. Para encontrarmos este reino, para despertarmos este Deus, para lhe darmos poder preciso abandonar tudo pela pesquisa da Verdade. E assim chegareis a verificar que a vida UNA em todos os indivduos, pois que, em cada um deles existe a centelha, dormente ou desperta. E, com o estabelecimento da paz individual, da individual conquista, vem a paz mundial e a conquista tambm mundial. O propsito, a maneira de conquistar esta felicidade, de alcanar esta libertao est em vossas prprias mos. No est nas mos de qualquer Deus desconhecido, ou nos templos, ou nas Igrejas, porm em vosso prprio eu. Pois os templos, as igrejas e as religies, ligam e vs deveis estar para alm de todos esses sonhos de Deus, afim de atingirdes a libertao. Para atingirdes, pois, este Reino da Felicidade que est em cada um de vs, tendes que dispor de fora, coragem, conhecimento, distinguir entre o que perdurvel e o que impermanente. Vedes, assim, que tendes que tornar a vida muito simples, sem tantas complicaes, tantas exigncias, tantos desejos. Deveria haver menos Deuses, menos templos. No que eles sejam bons ou maus; porm, porque em vs prprios reside o poder de Deus, em vs prprios est o Reino da Felicidade, para o qual vos haveis de retirar afim de construrdes a vossa prpria imagem da felicidade e eternidade. Por esse modo haveis de verificar que os Deuses que externamente cultuais fora de vs, no proporcionam fora bastante, bastante vitalidade ao homem que deseja estabelecer a verdade de um modo permanente. Eles, porm, em virtude da vossa adorao, do vosso amor, podem dar-vos momentaneamente satisfaes, porm jamais estabelecero essa verdade que procurais. Considerai como, ao ser arrebatado pela morte algum a quem amais, no h Deus algum que vos satisfaa nessa separao. Se, porm, fordes capazes de vos unir com aquele a quem houverdes perdido, no h mais necessidade de mediador. E, ao estabelecerdes esta unio, s a podereis consumar pela destruio da entidade separada, do ser separado a quem chamais "eu" ou "minha personalidade". Assim, desde o comeo verificareis que para estabelecer harmonia entre estes trs corpos que existem em todos ns indispensvel a destruio do sentimento da separatividade. Pois que, se essa conquista do eu no tiver lugar, o eu sempre criar karma em virtude de seus particulares desejos, de suas exigncias individualsticas, decorrendo dai a infelicidade e a constante mudana. Aqueles que desejarem esta felicidade perdurvel, este despertar do Deus que existe em cada um de ns, devem pr de lado todas as coisas, renunciar a tudo; sua religio, seu Deus, seus pais, tudo, na pesquisa da Verdade. Se desejardes essa gua que mitiga a vossa sede, e vos d liberdade em relao a todas as coisas, deveis deixar tudo de lado, exceto o Eterno. Deixando de lado o que impermanente e transitrio, o que flutuante e passageiro, atingireis o perdurvel, o permanente e eterno. Pois no permanente se encontra a felicidade nica e o eterno que a verdade. No que permanente se acha estabelecido e visto o Deus nico do mundo - o vosso prprio eu purificado. 19

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A ESTRELA Vol. I N. 2; Fevereiro de 1928

O PORTAL DA LIBERTAO J. Krishnamurti


Ms aps ms publicaremos em "A Estrela" as palestras realizadas por Krishnaji, para um grupo de estudantes reunidos no vero passado, no castelo de Eerde. No foram revistas por Krishnaji, pois isto importaria em uma demora de muitos meses em sua publicao. Leram-nas, no entanto, cuidadosamente, vrios que a elas assistiram e estes as consideram reproduo correta e exata do que ento disse Krishnaji. O tom quase pessoal - inevitvel, falando-se a um grupo de amigos - traduz com preciso a forma por que foram pronunciadas as palestras.

Na mente de alguns dentre vs que tendes estado a ouvir-me, parece haver a impresso de que, de algum modo misterioso, eu virei a moldar o vosso destino e dar-vos a libertao; de que, por algum mtodo desconhecido, eu vos darei a frmula exata que vos libertar de vossas tristezas e de vossos sofrimentos. H como que uma impresso de que, pelo fato de aqui haverdes estado a ouvir-me todas as manhs, eu vos imprimirei um cunho todo especial, como um selo em vossas frontes, de modo que todos vos possam reconhecer como vindo de Eerde. Se algum de vs alimentar alguma idia destas, estar incorrendo em um grande erro. Sei que h a tentao de pensar que, pelo fato de me haverdes ouvido, j alcanastes a libertao; mas no est em minhas mos dar-vos essa libertao. Eu sou apenas o portal atravs do qual podeis divisar a libertao que desejais. O poder de criar, o poder de sofrer, de alegrar-se, de ser feliz, est em vossas mos. No momento em que puderdes pr de lado todos os desejos de que resultam a tristeza, a dor e a alegria, comeareis a passar esse portal que leva libertao; compreendereis, ento, o que essa libertao significa; mas enquanto estiverdes envolvidos, enredados na teia de vossos desejos, de vossas paixes, de vossas aspiraes, estareis somente no exterior, estareis fora desse mundo que chamamos libertao. Estareis apenas na parte exterior do portal que leva libertao, enquanto houver essas dvidas, ansiedades e indagaes. No quer isto dizer que no devais ter dvidas, ansiedades ou fazer indagaes - deveis t-las, pois deveis examinar a todas as coisas apenas, antes de vencerdes o portal da libertao, deveis ter posto de lado todas essas coisas, pois a libertao a senda da paz; e se ainda estiverdes, como uma borboleta, a correr atrs de iluses, passando de uma a outra coisa, a procurar descobrir a felicidade e os meios de obter a libertao, estareis, todo esse tempo, a criar karma desnecessrio, atravessando tristezas, sofrimentos e lutas, que produzem karma. Assim, a primeira coisa essencial pr de lado todo desejo, pois antes de alcanardes essa senda da libertao, que a senda da paz, deveis estar libertos de vs mesmos, deveis estar prontos a renunciar a todas as coisas, a renunciar a vossos credos, a vossos deuses e a seus pregadores, e, assim, deveis passar atravs desse portal que , em verdade, a via que leva ao mundo da libertao. Mas, isto est em vossas mos e no nas minhas; como o disse, no sou seno o portal atravs do qual podeis passar e, embora vindo sentar-vos junto a mim todas as manhs, temo que vossas mentes e coraes estejam bem distantes, por vos dardes sempre a traduzir quanto vos digo de modo a se vos tornar mais grato mente e ao corao. Deveis fazer essa transposio, certo, mas de outro e novo modo; o que significa terdes limpa a mente e sereno o corao; isto, por sua vez, implica vos libertardes do desejo, das ansiedades, das lutas por qualquer coisa, pois o prprio desenvolver-se dessa luta vos prende e vos entrava.

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www.lojajinarajadasa.com A primeira coisa requerida, portanto, para poderdes passar o portal que a libertao, que deixeis de lado tudo isso. Deveis pr de parte todos os sistemas e at o vosso prprio modo especial de pensar, - para vos firmardes apenas no pensamento universal que jaz por detrs desse portal. No ser em uma s vida que alcanareis a libertao, nem em um momento apenas que conquistareis a paz; as lutas incessantes, as constantes indagaes e aspiraes que cultivaro o jardim onde dever crescer a rvore da paz. Por muitos anos estive em revolta aberta com todas as coisas, - com as tradies, as leis, as filosofias - por no me satisfazerem, no me darem a tranqilidade, a certeza e a paz; mas agora que atingi a paz, que sou essa prpria paz, desejo poder dar-vos esse sentimento de certeza, trazer-vos a esse sentimento de tranqilidade e de paz, que eu j encontrei e obtive. Porque, se no possuirdes isso, no podereis convencer nem dar auxlio e conforto no mundo exterior. Por toda a parte, assim como em vs mesmos, h as alegrias passageiras, as tristezas e as dores, a mesquinhez e a ansiedade, e at as haverdes dominado todas, at alcanardes a certeza dessa libertao que est dentro em vs mesmos, desse portal que deveis vencer, at terdes inteira confiana em vossas prprias foras - estareis em agitao, sentir-vos-eis infelizes, estareis em constante revolta; e assim deve ser, pois, sem revoltas e tateamentos e sem indagaes, jamais encontrareis o portal que leva libertao. A libertao somente vem do interior e nunca do exterior; desejaria impregnar-vos desta idia, porque ainda h entre vs o desejo de converter a outros, de procurar modelar as idias alheias de acordo com a vossa vontade, de acordo com os vossos desejos. Desejaria poder reproduzir-me em cada um de vs porque ento alcanareis a libertao amanh, - ou at neste momento mesmo - mas infelizmente esse no o caminho, muito embora esteja eu cheio desse desejo, de afeio e de amor. Vs que deveis ter esse intenso desejo, de libertar-vos de tudo, at mesmo de mim, para que possais seguir avante e libertar todos os demais que se debatem na teia da tristeza. E, tendo isto em mente, desejaria perguntar-vos como vindes, de que modo vos aproximais, ao adiantar-vos para o portal da libertao. Pois deveis vir com as mos e o corao e a mente cheios e no vazios. Assim como, por exemplo, ao irdes ao templo, ao renderdes culto a uma imagem externa de algo que est dentro em vs mesmos, ao trazerdes as vossas flores e ao aspirardes o incenso, ficais em verdade cheios de coisas externas, assim ao chegardes a este portal da libertao, vosso corao e vossa mente devem estar cheios da experincia de vossas vidas passadas, de vossos passados desejos e aspiraes; deveis ter, de certo modo, realizado algo, em grande parte destrudo algo, e deveis ter deixado para trs tudo quanto vs mesmos haveis plantado. Naturalmente, no h quem no leve vidas para alcanar a isto e pelo que me diz respeito, agora posso ver quantas vidas levei para atingir esse portal da libertao, onde reina a paz, a certeza, e onde no h sombra de duvida. Aqueles dentre vs que desejarem alcanar essa libertao em uns poucos instantes, tero que sentir-se desapontados, pois a questo no de rapidez no tempo, nem do passar do tempo, porquanto este nem sequer, existe para vs, se tiverdes o verdadeiro desejo. Muitas maneiras h de atingir a essa libertao, de passar atravs desse portal, que vos levar senda da paz. No entanto, atentai que somente como um exemplo, uma ilustrao, que uso essa imagem ou smile do portal; nem um tal portal, existe, nem deveis cri-lo em vossas mentes, ao portal ou algo de parecido com ele, materialmente, assim como ao caminho que comea por detrs do portal. Vs prprios sois esse portal, eu sou esse portal e, no momento em que o houverdes transposto, no momento em que perceberdes o portal que jaz dentro de vs prprios e que por vs mesmos deve ser aberto, tereis dado o primeiro passo. Desejei essa libertao e a alcancei, porque sempre me encontrava insatisfeito e nada tinha o poder de me deixar contente. Tive as minhas tristezas, tive prazeres, tive grandes alegrias, mas nada soube satisfazer-me jamais e nunca me satisfiz, at verificar que essa minha paz, a paz que o mundo procura, a paz que tem de ser alcanada, est dentro de mim mesmo. At perceber isto e alcanar esse conhecimento no estava eu pronto para a libertao. Mas quando, afinal, consegui olhar atravs desse portal, que est dentro em meu corao, logo pude pr de lado todas as coisas e assim pude libertar-me e tornar-me a prpria senda da paz. Deveis, pois, vir a esse portal que est em vosso corao, que a um tempo vs e eu mesmo, - todos seguimos a mesma senda - deveis vir a esse portal e abri-lo, seja por um desejo ardente que sobrepuje a todos os demais, seja por uma imensa dor que no encontre consolo e nem possa ser calada ou apagada pela alegria superficial, seja finalmente por uma imensa felicidade que vos empolgue todo o ser e que desejeis partilhar com os outros; quando tiverdes assim o desejo, a aspirao de salvar aos outros, de dar-lhes essa felicidade eterna, 21

www.lojajinarajadasa.com ento tereis dentro em vs mesmos a capacidade necessria para entrar e abrir o portal, que leva libertao. Ou ainda se, por haverdes em vossas posses, posio ou autoridade no mundo alcanado um xito tal que tenhais atingido culminncia do bem estar material, vs vos disserdes: "Deve haver algo mais, para alm disto deve haver um portal, por onde possa passar destas coisas materiais todas para algo de mais maravilhoso e mais belo". Ou, finalmente, ainda, se tendo-vos satisfeito com todo o conhecimento do mundo, com os ensinamentos todos que os livros, a cincia, as filosofias ou as religies possam dar, ainda procurais o portal da libertao, ou se, sendo vs sbios e vendo ao vosso redor imensas tristezas e sofrimentos, desejais escapar a seu amplexo. Se tiverdes qualquer desses desejos de modo dominador e potente, pulsando em todo o vosso ser, ento o portal abrir-se-vos-. Mas se vierdes com as pernas fracas, de mos vazias, esperando ser dirigido, esperando que algum vos abra esse portal da libertao, que jaz dentro em vosso corao, ento que ainda pertenceis ao mundo exterior e ainda sobre vs reina o desejo. Desta maneira, portanto, que deveis vir perante mim, ante esse portal da libertao, verdadeiramente cheios de experincia e de sabedoria, que sejam os frutos de todas as experincias passadas e ento percebereis realmente que esse portal que pensveis estar fora, bem longe de vs, est dentro em vs mesmos. Ai ele est, como o ltus que contm todo o perfume, todo o mel, e toda a glria do mundo imenso. No deveis somente lanar os olhos por esse portal da libertao, que no seno eu mesmo, no deveis somente olhar atravs dele, deveis viv-lo, deveis tornar-vos parte dele. Em outras palavras, deveis trazer em vossos coraes constantemente essa libertao, afim de poderdes obt-la e viver com ela a vida inteira, como se fora um companheiro que jamais se altere ou mude. Assim, pergunto-vos, e a todos vs se aplica a pergunta - no a apliqueis a outras pessoas e sim somente a vs mesmos, individualmente - "De que modo vindes?". "Que flores trazeis a esse portal, que sejam a expresso externa dessa intensa aspirao interior pela libertao? Por haver tanta dor, tanto sofrimento, tanto penar no mundo, aqueles dentre ns que tm um pouco de conhecimento sobre esse portal, sobre essa porta entreaberta, devem sair para o mundo e dar aos outros esse conhecimento, dar-lhes essa libertao. Isso o que me mantm em vida, e o que me d prazer e que, finalmente, me leva de um dia ao outro. Agora que encontrei essa paz e essa libertao, ardo continuamente num desejo real de tornar os outros felizes, de dar aos outros a libertao, de levar quantos estejam em ansiedade, em tristeza e em sofrimento, at esse portal da libertao, onde h a tranqilidade e a paz, onde a prpria Senda se torna a paz e se torna o fim de todas as coisas. Pois no h a degraus de uma contnua ascenso e sim apenas fim de todas as coisas; a no h gradaes na espiritualidade, degraus no progresso; todas as coisas deixam de existir nesse ponto e a gente a si mesmo se perde e se funde nessa senda de paz. Todas as vezes que penso nisto, e tal amido acontece, desejo libertar aos outros, mostrar-lhes o portal, dar-lhes a libertao e, por haver conquistado e achado essa libertao e essa paz, naturalmente eu v-la daria e naturalmente abrir-vos-ia o portal de modo a poderdes divisar atravs dele a realidade ora velada. Deveis tornar-vos apaixonados e discpulos dessa Libertao, dessa Verdade, de forma a tudo deixardes de lado e tudo submeterdes a esse desejo nico. Vosso desejo deve ser to ardente, que tudo se lhe amolde, vossas penas como vossas tristezas, vossas ansiedades como vossos cimes, vossa mesquinhez como vossa clera. Considerai por um momento um pobre homem que deseje tornar-se milionrio. Tem esse desejo nico de acumular riqueza, de adquirir aquilo que julga a maior felicidade no mundo. Lana-se a esse objetivo e tem que ampliar a sua viso, as suas capacidades, os seus desejos afim de conseguir esses milhes que o libertaro e lhe daro a felicidade. Se, pois, tem esse grande desejo, dever ter uma viso ampla, impor-se grandes tarefas, possuir-se de grandes energias, de um grande impulso, para que dentro de um certo prazo possa alcanar a meta. Do mesmo modo vs deveis ter sempre presente diante de vs esse desejo de libertao, como o alvo mais alto, ao qual se devero submeter todas as coisas mais - a vossa lealdade, o vosso amor, as vossas afeies pessoais - at vos tornardes essa prpria libertao; ento ela nascer em vs. Quando enfim houverdes atingido essa libertao - como eu a atingi - tornar-vos-eis esse prprio alvo, essa finalidade, porque nada h para alm disto. De que precisa a gente no mundo, seno da Felicidade e da Libertao? Uma vez conseguida esta, tudo mais fica de lado, vs prprios sois a meta, o criador, o fim de toda a indagao, de todo o pensamento, de todas as coisas. Eis porque por haver alcanado isto, por ser a meta, a libertao e a felicidade - a 22

www.lojajinarajadasa.com desejo compartilhar convosco. Eu faria de vs discpulos verdadeiros dessa libertao, mas primeiro deveis ter o desejo de a alcanar. Para aqueles que se acham possudos de um tal desejo, no h escolas no mundo, nem h livros, pois tudo aprendem por si mesmos. Aqueles dentre vs que ainda se acham hesitantes, tateando ainda, colhidos no torvelinho da tristeza e do sofrimento, da ansiedade e da mesquinhez, podem ler os livros, cursar escolas onde dados sistemas de filosofias sejam ensinados, onde se pratiquem cerimnias, onde haja limitaes. Para aqueles que tm esse desejo nico da libertao, no h escolas. Pois, se entrasse em uma tal escola, perder-se-ia nela e perderia o seu desejo, e a revolucionaria, por no se poder submeter autoridade e s idias alheias. Deveis ter um desejo que tudo examine e destrua tudo quanto se interponha entre vs e a Libertao e a Felicidade. Enquanto aqui estais, podeis perceber - e penso que percebeis at certo ponto - o portal aberto, batentes de par em par abertos, que leva a essa senda que a paz; mas antes de poderdes compreender, de poderdes perceber essa senda claramente, sem limitaes - pois estas, vs as criais e no existem na senda da paz - tendes que rasgar o vu que vos cobre os olhos, tendes que destru-lo e manter-vos incansavelmente ativos, dentro de vs mesmos. Quando vierdes a esse portal, deveis vir prontos a revestir-vos do novo traje que vos dar a libertao e a paz, deveis vir despidos, tendo colocado de parte todas as coisas; em outras palavras, deveis renunciar a tudo, para alcanar a libertao; renunciar, para poderdes seguir a senda que leva paz. Como o pescador de prolas, que se lana s guas mais profundas, pronto a arriscar a vida por uma dessas prolas inteis, que o mundo considera de grande valor, assim deveis estar prontos a mergulhar bem fundo, despidos de tudo, a vos perder, vs mesmos, com a coragem necessria para perderdes at o prprio ser. Porque encontrei a Libertao e a Felicidade intensa, porque sou a Senda da Paz, desejo que outros entrem na Senda. Porque eu realmente amo, porque tenho a intensa aspirao de a todos redimir, de salv-los de seu penar, irei avante ensinando, vaguearei pela face toda da terra. Abri o portal de vosso corao afim de poderdes entrar na Libertao, afim de vos tornardes, por vs mesmos, verdadeiros redentores da humanidade, afim de poderdes sair a campo e mostrar aos que se debatem na tristeza e no sofrimento, que a sua salvao, a sua felicidade, a sua Libertao jazem dentro deles prprios. A ESTRELA Volume I N. 3 Maro de 1928

ANDA LUZ DO MEU AMOR E NO DARS NENHUMA SOMBRA J. Krishnamurti

Meu Bem-Amado e Eu, Amigo, te trazemos Em nosso corao. A ti falo Das profundezas do meu corao. Unido estou ao Bem-Amado, Sou como a ptala para a rosa; Sou como o aroma para o jasmim. 23

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Meu Bem-amado e Eu Somos inseparveis, indivisveis. Tal qual a lua a refletir a glria do sol, Assim reflito a glria do meu Bem-Amado.

Macio como a sombra De uma noite enluarada meu amor a ti Amigo. Assim como os redemoinhos que perpassam Pelas terras Assim meu amor Que espantar em derredor de ti a treva.

Como os crregos que descem Rumorosos da montanha Para o vale Assim penetre em ti o meu amor. Qual a rvore solitria Entre as altas montanhas Resiste aos uivantes ventos Assim apoiar-te- o meu amor Nas horas de vexame e aflio. Como o oceano ergue ondas possantes E suplanta tudo Assim o meu amor triunfa Dos labores da tua vida.

Sim,

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www.lojajinarajadasa.com amigo, Excessivamente grande o meu amor para ti, Bebe dele e no ters mais sede Come dele e no ters mais fome. Ata-o ao teu peito e no sentirs mais sabor de mgoa. Grava-o nas tbuas de teu esprito Sers o filho da sabedoria e entendimento. Caminha sob a luz do meu amor No projetars nenhuma sombra.

amigo, Vem para mim Mostrar-te-ei a senda para o amor. No voltes a cabea, No feches os ouvidos No canceles o teu corao. Antes vem atrs de mim. Conduzir-te-ei morada do amor. Oh! meu corao por ti padece Caso no ouas a voz do meu amor.

Porque no ds resposta ao meu apelo? Porque te afastas de mim? Porque escondes entre as sombras o teu rosto? Porque procuras tu o efmero? Quem em ti suscita mgoa? Porque te aprumas contra mim? Porque s tu cego ao meu amor?

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www.lojajinarajadasa.com Porque te nutres das ofertas da aflio? Ah! Responde-me Porque estou carregado de amor.

O amor que gera mgoa, O amor que aspa o sorriso na face aberta O amor que muda a todo o instante O amor que anda sozinho em sua solido O amor soberbo e opressivo O amor que mata o amor aos outros O amor que ata e limita O amor que se consome na fogueira do S ele Desses no sentirs o mau sabor Se comigo andares.

Amigo meu, A que aspiras tu? Qual o fim que te conduz? Que sombras te seduzem? Que queixumes te amargam? Para onde vais tu?

amigo, Os dissdios do povo, A opresso do pobre, As guerras das naes, A explorao do ignorante, O dio de classe contra classe, A luta pela riqueza e os conseqentes dissabores Os enredos dos governos, 26

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A repartio das terras, Tudo isso desaparecer Sob as vestes do amor.

No procura o homem dos campos, Aps a lida diria, O refgio do amor?

No se cansa o homem, Senhor de infindas coisas, Das suas prprias posses, E no procura a proteo do amor? No sente o guia de muitos povos A solitude das suas ambies E no procura o asilo do amor? No apela o homem do templo Arrebatado na exausto do culto Para o amparo do amor?

Sim, Todos indagam da morada Que lhes d a glria do amor.

Mas por que disputais amigo Um com o outro Em demanda do amor? Por que esse seqestro da alegria No rancor de uns para os outros? 27

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Porque essa rivalidade consumante Que levanta uns contra os outros E destri a ventura totalmente?

! meu corao sofre por ti amigo. Abre de par em par teu corao, E no consintas nele sombras negras, Porque, sem amor, Haver desolao e mgoa infinda. Mantm puro o corao Porque, sendo ele impuro, Haver nele aflio e queixa.

Digo-te Que onde quer que estejas E seja qual for a tua pena E seja qual for teu regozijo O caminho para o corao do Bem-amado o caminho do amor; Porque ele te conduz simplicidade E f conquistadora. O entendimento vem pelo caminho Do amor, E o conhecimento dele vem. Sim, Ama a tudo e deixa-te ficar nisso.

Meu Bem-amado e Eu,

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www.lojajinarajadasa.com Amigo, te trazemos Em nosso corao. Falo-te Das profundezas do meu amor. Sou como a ptala para a rosa Sou como o aroma para o jasmim. Acho-me unido com meu Bem-amado;

Vem para mim Sou o corao do amor. (A Estrela - Vol. I - N. 4 - Abril de 1928)

REVOLTA INTELIGENTE J. Krishnamurti


Todos os meses publicaremos em A Estrela as palestras feitas por Krishnaji para o grupo de estudantes que se reuniu no Castelo de Erde, no vero passado. Elas no foram revisadas por Krishnaji, pois se isto tivesse de ser feito por ele, resultaria em uma demora de muitos meses em sua publicao. Elas foram, no entanto, cuidadosamente lidas por muitos dos que se achavam presentes na ocasio, os quais crem que so um registro exato, palavra por palavra, do que Krishnaji disse. A nota um pouco pessoal, (inevitvel quando se fala a um grupo de amigos) representa com exatido a forma pela qual as palestras foram feitas.

Eu vos tenho referido que a liberao e o abrir das portas para o Reino da Felicidade para todos, e no para uns poucos escolhidos e preferidos, e a conquista e realizao da libertao s tem lugar quando cessa em absoluto toda criao de karma. Pois o karma fora todos a habitar a morada de carne de vida em vida, e o karma a roda qual o ser humano acha-se atado vida aps vida; a roda que se mantm girando com a energia de sua prpria volio e de seu prprio desejo. Assim, aquele que desejar chegar a liberao dever primeiramente examinar sua posio em relao ao invisvel girar dessa roda eterna - a que chamamos vida e morte. A fim de no abraarmos essa roda, de no beijarmos esses seus raios que so a agonia, a ansiedade e a tristeza, deveremos aprender que a criao de karma acha-se sob o nosso prprio poder, sob as nossas prprias mos, assim como tambm o fazer parar a roda. Enquanto essa roda invisvel girar no haver paz, no haver pausa, no haver lugar de repouso; ser uma constante corrida e ansiedade, uma contnua criao de karma e uma luta, vida aps vida. Em uma vida um homem poder ser um mendigo, porm pelas suas boas aes, pela sua vida nobre, pela sua fervorosa devoo, pelos seus grandes ideais, poder renascer em um palcio de reis, vivendo com conforto, vestido com perfeio e cercado de afetos. Mas aquele que sobe pode cair (a roda da vida e da morte no tem favoritos) e aquele que cai pode subir. lninterrupta essa roda da vida e da morte. Ela para somente para os que compreenderam o que a libertao e que abriram os portais que do acesso ao Reino da Felicidade.

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www.lojajinarajadasa.com Enquanto o ser humano no matar, no aniquilar o eu separado, haver karma, (pois o eu a causa do karma), porm, se destruirdes esse eu, o eu que vos diz: eu sou, eu fui, ou eu serei, ento a roda da vida e da morte, cujos raios so a ansiedade, a tristeza, a dor, e as alegrias passageiras, parar e vos tornareis o Mestre, aquele que atingiu a libertao, que atingiu o Reino da Felicidade. Enquanto no tiverdes chegado a essa liberao, enquanto no houverdes destrudo o eu, sereis como o homem que semeia seu gro, quer seja ssamo, trigo, ou qualquer outro; ele o semeia e colhe na estao seguinte. Aquilo que semear colher. Assim a pessoa que cria karma; colhe aquilo que semeia - seus pensamentos ignorantes, seus sentimentos insensatos e suas aes loucas, criam mato entre a sementeira. Quaisquer que sejam seus pensamentos, quaisquer que sejam seus sentimentos, quaisquer que sejam suas aes, o resultado lhe corresponder. E assim aquele que desejar atingir a liberao precisa, no s destruir esse eu separado, porm tambm operar retamente, pois, a ao reta, o reto sentimento e o reto pensamento produziro a rvore que proteger, que dar abrigo a muitos outros no caminho, na senda que conduz paz. Quando esse eu for destrudo, ento haver liberao e as portas para o Reino da Felicidade estaro abertas. Pois, esse Reino Kailash, Nirvana, Felicidade, e aquele que diz haver vida nesse Reino erra, e aquele que diz no haver vida ali, erra tambm; pois, ele como uma chama da qual sobem chispas, e cada um de vs uma chispa, e no momento em que destrus esse eu separado entrais nesse Reino e perdeis vosso ser separado na chama. Este o alvo mais elevado a atingir, essa a Liberao, esse o Reino da Felicidade. Se compreenderdes isto, ento vereis que esse poder de atingir, de conquistar, de forar a abertura dessas portas, acha-se em vossas prprias mos. Pois eu no posso parar, no posso segurar por um momento essa roda que gira e gira, inevitvel e irresistivelmente. Porm, assim que reconhecerdes que existe essa imensa chama que se acha para alm deste mundo, para alm de qualquer mundo do ser, senciente e movente, ento a roda do karma comea a diminuir sua marcha e seu poder comea a decrescer, e a medida que a chama cresce com a adio de mais lenha, assim tambm maior nmero de chispas entram nessa chama e maior a sua glria e o seu calor. E aqueles que, como eu, atingiram a liberao so uma parte dessa chama; destruram o seu eu separado, entraram na chama, onde no h vida e onde, no entanto, ela existe, onde no h cessao, e onde, no entanto, h cessao, e a Verdade vista. esse o fim de toda a evoluo, de todos os pensamentos e sentimentos da humanidade. Assim, meus amigos, deveis compreender essa verdade que eterna, que imperecvel: que o matar do eu separado a destruio do muro que vos aparta desse jardim, a destruio do obstculo que vos conserva do lado de fora desse Reino da Felicidade - isto, a realizao da liberao. Porm, para contemplar a Verdade, ou ver o Bem Amado, ou atingir a liberao e abrir as portas da felicidade, necessrio aos que procuram, tornarem-se como o cristal, que puro, uniforme e sereno. Eles devero achar-se livres dos embaraos da roda dos nascimentos e das mortes, e, acima de tudo, devem ser puros como o regato da montanha, que o resultado da neve de todo o inverno, lmpidos como os cus de vero, sem uma nuvem, sem uma mancha, puros e calmos. A fim de que esse estado de bem estar mental, emocional e fsico possa ser atingido, procurarei de hoje em diante, explicar o modo e os meios de vos aproximardes do portal que conduz paz e liberao. Para mim no h outro alvo a no ser a liberao, e eu a atingi; para mim no existe outra verdade a no ser a verdade que a destruio do eu separado, que, de um modo natural, guia para a paz, e eu sustendo essa verdade; por o meu Bem Amado viver em mim, e eu me haver tornado o Bem Amado, que gostaria de vos fazer semelhantes a mim. A fim de vos transformar Sua imagem, a imagem do Bem Amado e a imagem da Verdade, eu quereria multiplicar vossa fora, a fora que tendes acumulado, nutrido e mantido durante vidas, a fora que haveis reunido atravs das vossas experincias. E quereria fortalecer vosso propsito que cresceu, no s em momentos de percepo dessa liberao, porm, tambm, durante o correr de muitos perodos de vidas, durante a construo desse edifcio a que chamamos experincia e vida; e desejaria guiar a vossa determinao de modo a vos fortificar com os vossos prprios desejos, de modo a vos fortalecer contra as vossas prprias fraquezas e aumentar o vosso amor que dever ser o aspecto principal, o lmpido lago que dever refletir os cus abertos. Eu tambm amaria enobrecer os vossos desejos de modo que o vosso edifcio fosse completo, slido e bem fortificado. Gostaria de purificar as vossas mentes e os vossos coraes, pois, sem cristalina pureza e grande limpidez, no podereis perceber esse grande alvo da liberao, essa verdade em toda a sua pura nudez e em toda a sua grandeza. Acima de tudo, quereria vos tornar simples como a folha que atravessou muitos invernos, 30

www.lojajinarajadasa.com muitas primaveras e muitas estaes, pois, a simplicidade o produto de considervel experincia, de enorme conhecimento, de elevados objetivos e de nobres desejos. E para isto que me acho aqui, essa a razo pela qual vos achais reunidos aqui. Olhai para o lago oculto na floresta calma. Vereis que h uma espuma verde sua superfcie, e, assim, nenhum animal vive em suas guas, porque viver nelas significaria a morte, e nenhum animal se aproximaria para beber dele, porque as suas guas so venenosas e no extinguem a sede. Nem tampouco o lago reflete as rvores, ainda que se ache oculto em uma magnfica floresta, nem os cus no alto; nem reflete a luz atravs das folhas, nem as estrelas da noite. Esse lago acha-se imvel e por isto estagnado, da a putrefao surgir nele, ento nele no haver, nem movimento, nem vida; h ali a estagnao e o sopro de vida no o anima, e o lago espera pelas chuvas da estao seguinte, pelos ventos e tempestades que destruiro sua capa verde, que destruiro sua estagnante tranqilidade, sua quieta putrefao. Quando vierem do cu as chuvas, tempestades e brisas, ento as guas danaro novamente cheias de vida e de alegria. Tal a evoluo do homem. Da estagnao vida e da vida estagnao, at que finalmente ele aprende que em si mesmo reside o poder de criar a tempestade que limpar da face das guas a capa que desfigura sua beleza, at que enfim ele aprende que somente nele reside o poder de alimentar os animais que se aproximam de suas margens, de extinguir-lhes a sede, que s nele reside a capacidade de refletir as rvores, as estrelas e tudo o mais que passar em sua vizinhana. E, como o lago que revolvido para a vida pelas borrascas, pelas brisas, assim a evoluo do homem. Pois a evoluo um processo de mudanas contnuas de um estado a outro, de uma opinio a outra, de um ponto de vista a outro, de uma satisfao a outra, de um desejo a outro. A evoluo um estado de constante revolta. Se bem que, tal como o lago, estejamos satisfeitos durante uma estao, ou talvez durante muitas estaes, e como os ventos e as tempestades vm limpar da face das guas a capa verde, do mesmo modo, pela revolta constante, pela constante mudana, pelo constante agitar, ns nos limpamos de todas as doenas, desejos, acumulaes, amores, e afeies sob a ao de constantes mudanas e alteraes. A evoluo uma revolta inteligente. A forma errnea de revolta leva ao caos estpido que mataria a evoluo. A revolta estpida quando no tem nenhum pensamento, nenhum motivo, nenhum alvo estabelecido; e a revolta estpida, se bem que resida em todos, se bem que seja parte de cada um, no entanto contrria s leis da Natureza. Pois ela no cria, no destri o obstculo que vos separa da Verdade; pelo contrrio, a revolta estpida cria mais obstculos, maiores fortalezas, maiores divises entre vs e a vossa verdade. A revolta estpida como a criana que cruel, sem raciocnio e sem propsito; e a revolta estpida intolerante por no ter propsito, por no ser dirigida por uma mente tranqila, por no ser inspirada pelo corao. Por outro lado existe a espcie de revolta justa - a revolta inteligente - que o verdadeiro significado da evoluo, e essa revolta inteligente o descontentamento divino do qual cada um dar nascimento cintilante estrela; assim, dessa revolta, dessa cuidadosa e inteligente revoluo, deveremos construir um novo edifcio, deveremos construir uma nova estrutura que nos libertar, e que nos aproximar mais da nossa meta. A espcie correta de revolta inteligente contra a satisfao e a estagnao; pois, enquanto no tiverdes alcanado a verdade absoluta, enquanto o Bem Amado no morar em vs, enquanto no tiverdes alcanado o estado de liberao, que o resultado da renncia de todas as coisas, no dever existir satisfao; pois, assim que h satisfao h estagnao, e da no podereis refletir os cus puros, no sereis como um espelho que reflete a Verdade, que vos mostra vossos enganos, vossos erros. A revolta inteligente dever ser contra essa estreiteza de esprito, que o esprito do burgus. A estreiteza d nascimento ao esprito de intolerncia, o esprito que deseja converter os outros, o esprito da interferncia, o esprito que destri a beleza, a amizade e a afeio. A verdadeira revolta de espcie inteligente dever ser contra os preconceitos; pois eles atam, limitam e sufocam. Quando contemplais a face da montanha e no h nuvens no cu, que bela que , como calma, como serena e, assim que uma nuvem aparece entre o sol e a montanha, sua face fica alterada, ela se torna escura, perde sua beleza, seu xtase de cintilao e sua fora. O preconceito como a nuvem. Uma revolta inteligente dever existir contra a opresso que entorta, que empena a mente, a alma e o corao; e dever ser contra o imprio de quem quer que seja, do sbio ou do nscio, pois o domnio d nascimento intolerncia, ao desejo de converter e alterar as almas de outras pessoas. Ainda, o esprito da revolta inteligente dever ser dirigido contra a averso, o dio e a satisfao prpria; pois todos estes obstculos 31

www.lojajinarajadasa.com trazem a tristeza e o sofrimento que so o resultado do apego roda de nascimento e morte. Acima de tudo, se tiverdes essa revolta inteligente dentro de vs, ela vos dar energia criadora, vos dar propsito, vos dar a determinao de realizar vossos prprios desejos, vossos prprios xtases, at que tenhais atingido liberao. Assim, a evoluo uma revolta inteligente, e a revolta inteligente, se for sabiamente empregada e utilizada, vos libertar da roda de nascimento e morte. Outro dia sai a passeio pelos campos, os cus estavam lmpidos e havia um sorriso na face da terra. Era um dia sem nuvens e, de repente, surgiu pelo cu uma enorme nuvem aoitada por um forte vento, e um pombo voou das rvores, lutando contra o vento, gritando, clamando por alegria, fugindo da nuvem. Essa nuvem como o homem no liberto que empurrado, aoitado e acossado pela roda da vida e da morte, por essa roda invisvel que gira e gira, criando tristeza e dor. Como a nuvem o no liberto - o insensato, o inexperiente, o ignorante e o fraco - porque no estabelece seu alvo, ele se acha incerto de seu desejo, no se encontrando firme em suas aspiraes e mesmo duvidando do prprio fim. Enquanto me achava sentado sob a rvore, senti-me como o pombo, liberto, livre e fora das garras do vento; e dessa liberdade eu estou certo; porque, quando uma vez tiverdes entrado no reino, aberto esses portais que do acesso a essa paz que a liberao, no haver mais nenhuma dvida sobre a meta, nenhuma dvida sobre vosso poder, sobre vossas energias criadoras, sobre a vossa prpria conquista. Desde que atingi (no vos digo isto para vos convencer, nem para vos induzir, nem para vos fazer mudar as vossas opinies, ou para alterar a vossa atitude); desde que penetrei nessa liberao, desde que bebi nessa fonte de prazer, naturalmente gostaria de vos fazer tambm desfrutar da frescura, da limpidez e da beleza dessa viso, como o pssaro livre da gaiola desfruta do cu aberto. Se eu pudesse destruiria vosso karma; pois vos achais presos no karma como um pssaro em um lao, que transportado e posto em uma gaiola. No meu desejo vos forar em uma particular direo; pois a liberao o fim de todos, seja o indivduo de que tipo ou temperamento for, de uma seita ou de outra, de uma classe ou de outra, superior ou inferior, nasa branco ou de cor. A liberao de todas as coisas (de todas as alegrias passageiras, de todos prazeres transitrios, de todos os pequenos sentimentos), a liberao que certa, que eterna. Desejaria vos dar essa felicidade e vos ajudar a fazer parar essa roda por vs mesmos; porm como j disse anteriormente, eu no posso fazer parar vossa roda de vida e morte; pois, em vs prprios somente, dever nascer a determinao de fazer parar esses raios que so como flechas ardentes criando a dor e o prazer. Devido a ter o pequeno eu que existiu em mim durante tantas vidas, por tantas geraes, devido a ter sido consumido esse pequeno eu separado pelo fogo do amor do meu Bem Amado, eu desejaria repartir convosco e vos dar esse amor de modo que ficasse estabelecido em cada um de vs, de modo que nenhum vento passageiro vos atirasse para uma direo onde no desejsseis ir. O mundo com a sua infelicidade, com suas escaldantes ansiedades, grandes agonias, seu amor e dio, acha-se preso roda, tal como cada um de vs. A menos que tenhais atingido liberao, no sereis diferentes dos outros, embora tenhais uma viso mais vasta. Vs, como o resto do mundo, vos achais presos na rede, e eu gostaria de destruir essa rede. meu propsito, no vos fazer beber da fonte de outrem, ou de vos fazer beber no jardim particular de minha criao, porm de vos assegurar o vosso prprio fim, o fim que meu e que tambm pertence a todos os outros. Assim como o meu Bem Amado me mantm (disto eu estou certo) assim, se quereis atingir liberao, devereis manter-me em vosso corao, deveis conservar essa liberao sempre luzente, sempre excitando-vos, sempre forte em vosso corao; pois no h outro Instrutor, nenhuma outra meta, nenhum outro fim. Aquele que atinge esse fim torna-se o Instrutor, como eu. E devido a essa certeza que sinto, devido a esse prazer que experimento, devido a esse amor que trago, eu vos quero dar, a vs que ainda vos achais hesitando, que no estais ainda certos ou que ainda estais tateando s escuras, essa certeza, essa luz que vos libertar. esse o alvo de todo o Instrutor, esse o alvo do Maior dos Instrutores. O meu propsito ento destruir a barreira que vos separa, que afasta a toda gente do seu alvo, do seu desejo, da sua incerteza, essa barreira que o resultado da ignorncia, da estreiteza e do preconceito. Para compreenderdes isto, para destruirdes essa barreira que existe entre vs e o vosso alvo, entre vs e a vossa felicidade, no necessitais mediadores, nenhum interprete entre vs e mim, no necessitais de deuses, nem necessitais de templos. Tudo isso so coisas externas, e quando uma vez tiver nascido dentro de vs o verdadeiro desejo, tal como o perfume nasce na flor, no haver ento dvida, nem questo, nem sombra para obscurecer vossa viso. E afim de despertar em vosso interior essa beleza, de inflamar esse fogo 32

www.lojajinarajadasa.com que jamais dever ser extinto por um interprete passageiro, por um passageiro mediador, por nuvens que passam atravs da face do cu, eu estabeleceria, eu despertaria esse desejo, essa verdade, em cada um de vs de modo que vs por vosso turno pudsseis vos tornar o liberador, vos tornar o instrutor afim de que o mundo fosse feliz. esse o propsito de ser-se liberto, esse o propsito de conquistar. Eu me encontro aqui para construir a ponte que vos trar ao alvo de modo que com o vosso prprio poder, com a vossa prpria determinao, com o vosso prprio anseio, com a vossa prpria experincia e com a vossa prpria ansiedade por atingir liberao, vs por vosso turno possais trabalhar para construir. Deveis ter esse desejo de atingir liberao e perfeio, de escapar da roda da vida e da morte; porm dever ser o vosso prprio desejo, o vosso prprio anseio e no o de outro; pois, se ele for o de outro vs sereis como o insensato, o inexperiente, o estpido, vs sereis desviados pelas angstias e alegrias de outrem. Assim, para aniquilar as estreitezas e limitaes, e as barreiras que existem entre vs e a verdade da liberao deveis procurar as causas, deveis encontrar, no somente as meras razes da superfcie, no somente as meras dvidas e questes superficiais, porm, deveis ir prpria fonte, prpria raiz da tristeza, que o eu separado. o eu que conserva todos afastados da liberao e que age como uma barreira, que o ata e o limita e esconde a glria da liberao. A menos que esse eu pequeno seja destrudo, a menos que ele seja completamente aniquilado permanecer como causa de karma. A destruio do karma e a destruio do eu separado vos libertar da roda de nascimento e morte, da tristeza e da dor, de alegrias e de prazeres passageiros, da mudana contnua e do desassossego eterno. o eu separado que vos conserva errando sobre a face da terra, vida aps vida, como um mendigo de casa em casa, chorando, ansiando por essa liberao que vos tornar livres. Como expliquei anteriormente, a revolta quando propriamente utilizada, quando inteligentemente levada a efeito auxilia a destruir a estreiteza, as limitaes, as restries e o desenvolvimento unilateral. A revolta inteligente necessria afim de destruir o karma. H em cada ser humano uma revolta contra alguma coisa, porm, na maioria dos casos mal guiada, no dominada, e ento se torna estereotipada. Se fordes a qualquer escola onde haja jovens reunidos, h sempre revolta contra a ordem das coisas, porm, sua revolta cega e sem propsito. O rio que desce da montanha, saltando de pedra em pedra, a no ser que seja dominado, a no ser que seja guiado, no auxiliar o homem a ser feliz; porm, assim que for dominado, assim que for guiado, assim que se construrem barragens para o bem estar do homem, ento o rio se tornar til. O mesmo sucede com a revolta, inteligente ou estpida. A revolta inteligente o resultado da experincia que tendes adquirido vida aps vida, o resultado de vossas tristezas e de dores passadas, lutas pela alegria e o resduo de toda experincia. Assim, quando combinardes a inteligncia com a revolta comeareis a agitar e a destruir esses pequenos lugares onde o eu separado se esconde, tal como o lago que agitado constantemente atira superfcie as suas impurezas que so ento queimadas pelo sol e levadas pelo vento. Por meio da revolta excitareis vosso eu pequeno, expondo-o inteligncia e assim comeareis a destru-lo. Alguns tm de obter experincias vida aps vida, outros, porm, percebem o fim e so consumidos pela meta; mas onde quer que vos acheis, no atingireis liberao sem passardes pela experincia. No podereis penetrar na chama e serdes por ela consumidos, essa chama que a essncia da inteligncia, que a essncia da liberao, sem que estejais ricos em experincia. Como penetrei nessa chama, como me tornei parte dela pela destruio do eu separado, do mesmo modo todo aquele que desejar atingir liberao dever ter esse imenso desejo de destruir o eu separado, e isto s poder ser feito pelo exame constante, pela constante exposio ao sol e ao vento. ao perceber o fim que, o vosso desejo se torna to forte, que vs vos tornais o prprio fim, que vs vos tornais parte da chama; e ento podereis acender a luz em outros e assim destruir os seus pequenos eus. *** Vinde todos, vs que estais aflitos, e entrai comigo no Templo do Conhecimento e no osis da imortalidade. Contemplemos a luz eterna, a luz que espalha a paz, a luz que purifica. A radiosa verdade brilha, resplandecente, e ns no podemos permanecer cegos por mais tempo, nem continuar a andar tateando, nas regies tenebrosas. A nossa sede ser ento saciada para sempre porque beberemos na Fonte da Sabedoria. Eu sou forte, no hesito mais, pois a centelha divina brotou em mim. Num sonho lcido, contemplei o Mestre e eu irradio da sua eterna alegria. Mergulho o meu olhar no Oceano sem fundo do Conhecimento e a contemplo todos os reflexos. Sou uma pedra do templo Sagrado; uma humilde erva ceifada e pisada aos ps. Sou a 33

www.lojajinarajadasa.com rvore gigante e reta que namora os cus. Sou o animal perseguido com ardor e o criminoso por todos amaldioado. Sou o nobre que todos honram e sou a tristeza, o desespero, o prazer dum momento, as paixes, os gozos, o rancor amargo e a compaixo infinita e ao mesmo tempo o pecado e o pecador. Sou o amante e o verdadeiro amor. Sou o prprio amor. Sou o santo, o adorador e o crente. Eu sou Deus. (A Estrela - Vol. I - N. 4 - Abril de 1928)

O TOPO DA MONTANHA J. Krishnamurti


Ms aps ms, publicaremos na A Estrela as palestras dadas por Krishnaji ao grupo de estudantes reunidos no Castelo de Erde no vero passado. No foram revistas por Krishnaji em pessoa pois que, a ter de faz-lo, importaria em uma demora de muitos meses na sua publicao. Foram lidas cuidadosamente, entretanto, por vrios daqueles que se acharam presentes por ocasio de serem tais palestras proferidas e que acreditam estarem elas corretas e serem o registro verbal do que Krishnaji disse. A nota de certo modo pessoal - inevitvel, quando se fala a um grupo de amigos - representa exatamente a forma na qual as palestras foram feitas.

Como o perfume da flor reside dentre dela mesma, assim a vossa busca e luta pela libertao est dentro de vs mesmos, deve ser parte de vs como o perfume parte da flor. meu propsito e meu anseio estabelecer firmemente em cada um de vs o desejo de trabalhar retamente para obteno da libertao. Deve tornar-se ela parte de vs, to naturalmente como o perfume o da flor, deve tornar-se parte de vs como o o desejo da abelha por coletar mel, de modo que, mesmo que eu me retire e cesse de falar, de vos impelir, de vos animar, de despertar vossa resoluo, vossa fora, vossa determinao, vejais, no entanto, por vs mesmos essa libertao e, como discpulos dessa liberao, saiais para o mundo e convenais aqueles que ainda se acham lutando, que ainda no encontraram a luz, e lhes proporcioneis o conforto do vosso conhecimento, da vossa fora, de vossa determinao, da vossa conquista. Como o perfume da flor reside dentro dela prpria, assim tambm a luz da verdade, o desejo da conquista, e o poder de abrir os portais da felicidade reside dentro de vs prprios. Meu propsito somente despertar essa verdade que dorme dentro de vs e no propelir-vos de qualquer maneira a vos acomodardes ou a vos transformardes de acordo com o meu particular ponto de vista sobre a vida. Quando houverdes atingido a libertao, quando vs prprios vos houverdes tornado a meta, verificareis que todos os caminhos, todas as modalidades de pensamento, todos os temperamentos, todas as seitas e credos, todas as filosofias, todas as religies finalizam nessa libertao, assim como nela tm o seu ser. E assim como no boto s existe o desejo de desabrochar e dar seu aroma ao mundo, assim tambm a vossa determinao de atingir a libertao deve nascer dentro de vs. No por minha causa ou por causa de outro indivduo deveis alcanar esta verdade, ou lutar para ating-la, mas pelo fato de em vosso poder estar o desejo de a atingir, de a conquistar, e passar alm do raios da roda do nascimento e da morte. Considerai a planta que, afim de atingir a sua libertao, de desempenhar a sua finalidade na existncia, como flor perfeita, passou atravs do outono e do inverno, atravs do processo de decadncia e da morte, antes do renascimento; assim so as pessoas que se libertam. No so um produto de um nico dia, mais do que o pintor, e o ourves, ou o violinista perfeito o so tambm. Eles so a culminncia, a apoteose de vidas de luta, de anseios e desejos, posto que paream realizar em um momento nico a glria do seu ser. Assim como a corrente, desde o prprio incio do seu nascimento busca assiduamente o caminho mais curto para o oceano, assim tambm, desde o momento em que tenhais aprendido, que houverdes percebido a meta, por muito distante que ela esteja, deveis assiduamente e propositadamente buscar o vosso caminho atravs desse turbilho, dessa irrealidade, dessa maya que vos atrai em todas as direes, at entrardes no oceano da

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www.lojajinarajadasa.com libertao, at haverdes aberto esses portais que conduzem morada da paz. Muitas pessoas alimentam a idia de que podem atingir a libertao, a glria da perfeio e entrar no Reino dentro de uns poucos dias; a perfeio, porm, vem somente aps vidas de luta; por meio do constante discernimento, de escolha constante, do constante sacrifcio, de vitrias constantes, de um constante deixar de lado aquelas coisas que criam tristeza e um constante apego quelas que do permanncia e fora. Minha vida o produto e a culminncia de muitas vidas e, agora, abri os portais e entrei nesse Reino da Libertao e da Felicidade. Atingi aquilo que resultante de muitas tristezas, de muitos prazeres, de muitos anseios, a resultante da determinao, tomada desde o prprio comeo. Assim tambm deve nascer em cada um de vs essa determinao de conquistar, de chegar ao fim de todas as coisas, desde o momento em que tenhais contemplado a meta. Sei que hei lutado como a semente luta sob o solo, para ver a luz do sol, porm, desse mesmo processo, nasceu a libertao desse mesmo processo de aquisio e rejeio, de discernimento e de colheita de fora, atingi a libertao. a que est a verdade. Na constante luta diria, na escolha de todos os dias entre o que bom e o que mau luz da libertao, e no em qualquer outra coisa, reside a sua conquista. Nesse processo de luta, mantive sempre meu rosto voltado para a montanha, e, portanto, com as costas para o vale. Nunca tive em considerao o que estava por detrs de mim, pois o topo da montanha, com a sua luz eterna, me chamava ansiosamente e, portanto, eu caminhava em uma direo nica, em direo ao cimo da montanha, com as costas para o vale, que o passado, posto que encerre suas lies. Porm, agora, que atingi o cimo da montanha, encaro o mundo como um guia, com o anseio de auxiliar, como quem conhece onde se encontram as armadilhas perigosas, os santurios que embaraam, ao lado da estrada. E com esse amor que em mim arde, eu vos convido a deixardes esses estreitos caminhos do vale, esses escuros atalhos ocultos e venhais caminhar comigo na luz que a libertao. Desde o topo da montanha podeis ouvir a voz clamando, bradando e advertindo em relao aos perigos do passo falso que, inevitavelmente, vos levar para o precipcio; porm, posto que a advertncia seja clara, deve existir, correspondentemente forte dentro de vs, o esforo da luta para sair do vale, para sair para fora da sombra - posto que ela seja convidativa, - para a luz clara do sol, onde sombras no existem nem falsos passos. Afim de que tenhais a fora, a energia, o xtase de propsito que vos dar determinao, deveis beber dessa fonte que libertao, da qual bebem os prprios deuses. Freqentemente dizeis: Desejo seguir-vos at ao portal da paz que a libertao, porm tenho que conduzir comigo meus amigos, meus desejos; tenho que sobrecarregar-me com isto e aquilo; tenho que ter por detrs de mim este pensamento, aquele sentimento; sem eles, no vos posso acompanhar; eles so meu sustentculo, o fruto de minhas aes, dos meus anseios. Amigo, se fizerdes isto, no poders subir s grandes alturas, onde deves chegar absolutamente n, liberto de todos os entraves, de todos os embaraos, afim de que possas vestir-te de novo com as roupagens da libertao. Como o capito de um navio que se afunda sabe que, para que o navio permanea flutuando, deve libertar-se do lastro, da carga pesada, assim tambm deveis renunciar a todas as coisas, por tudo de lado, libertar-vos de todos os fardos, ficar livre e desembaraado de todo o pensamento, de todo egosmo, de todos os anseios pela ao e pelo fruto da ao. Quando chegardes ao topo da montanha verificareis que justamente no processo de renncia vos haveis coberto com a veste da libertao. Como a chama que morre se no for mantida acesa, assim tambm a verdade da libertao morre dentro de vs se no for adequadamente alimentada, se no existir animao, desejo, determinao de manter esse fogo ardente eternamente. A centelha da divindade que est dentro de todos - seja do selvagem, seja do santo, do civilizado ou do brbaro, do branco, do pardo ou do preto - essa centelha deve ser conservada acesa e soprada at tornar-se a grande chama, parte da chama eterna da libertao. Esta centelha deveis estimul-la pelas experincias at se tornar to gigantesca, forte e poderosa, que se torne parte dessa chama que existe no reino da libertao, no reino da felicidade. No podeis escapar ao processo evolucionrio de aquisio de experincia, porm se fordes sbios, escolhereis, rejeitareis, discernireis o que auxilia do que embaraa. O verdadeiro processo de passar pelas experincias vos conduzir aos portais da libertao, porm a continuao de uma espcie de experincia, a necessidade, ser um empecilho. H um outro tipo, o do homem de revolta apaixonada que contemplou os cus abertos desde o assoalho do edifcio. No h nele o desejo de deter-se e olhar atravs de cada uma das janelas em particular, pois que possui imaginao e utiliza essa imaginao para os propsitos 35

www.lojajinarajadasa.com da evoluo. Arrastado pelo anseio de conhecimento, deixando para traz falsos deuses, pregadores, livros, falsas doutrinas e credos, passa rapidamente de um estgio para o outro, atendo-se apenas um curto espao de tempo em cada janela, colhendo experincia em cada pavimento, at que, finalmente, se eleva at ao ltimo andar onde existe a libertao. A finalidade da experincia ensinar-vos a renncia do falso, a destruio do que no verdadeiro, afim de que possais ascender verdade como um nufrago sobe a uma prancha - a nica verdade eterna que a libertao. Quando uma vez a houverdes percebido, no vos detereis em qualquer dos santurios que se acham ao lado do caminho, junto de qualquer dos pregadores, por eloqente que seja, pois que eles pregam aquilo por que os prprios deuses anseiam, que a libertao. Quando uma vez houverdes percebido a meta, o passar atravs de experincias torna-se em si mesmo, a libertao. Esforcei-me por estabelecer dentro de vs o desejo de atingir a meta, afim de que, por iniciativa prpria, luteis para atingir o pice dessa montanha da libertao, onde existe liberdade e felicidade. Este desejo e este conhecimento - o conhecimento que nasce da experincia, a sabedoria que a resultante da tristeza e do discernimento est, espero, bem estabelecido em vs, afim de que no sejais abalado em vosso propsito, afim de que a vossa resoluo no se enfraquea, para que a vossa fora se duplique. Pois, como vos disse, a libertao e a felicidade so o nico altar, a meta nica, a verdade digna de por ela se lutar e digna de ser atingida. a nica verdade qual as pessoas acorrero, da qual todos os tipos e temperamentos e seitas se acercaro. Se uma vez a houverdes visto e percebido, no mais duvidareis, no mais vos sentireis desviados, no mais criareis barreiras entre vs e a meta ou exigireis intrpretes para ela. No vos detereis nos altares beira dos caminhos para adorar a deuses que passam - pois todos os deuses so irreais e morrem. Somente a Verdade que libertao e felicidade permanece, e meias verdades, semi-realidades e desejos dbeis de conquista sero mortos, aniquilados dentro de vs e vs tomareis de um propsito nico, tereis a vossa direo bem determinada, vosso propsito bem fortificado para consecuo deste desejo. Agora, a percepo da meta e sua conquista so coisas perfeitamente diferentes. A maioria dentre vs supem que pela simples percepo da libertao, j a haveis atingido! verdade que, em qualquer estgio da evoluo, podeis ver por vs prprios o fim de todas as coisas, que a libertao, porm, a viso e a realidade, a percepo e a conquista so totalmente diferentes. Pelo fato de haverdes visto, no imagineis, de momento, que a haveis conquistado. Por exemplo, do vale, podeis sempre contemplar o cimo da montanha; da plancie podeis ver erguer-se, claramente, em toda a sua perfeio, em toda a sua serenidade o cimo da montanha; porm, entre vs, na plancie e no vale, e a conquista do topo da montanha, existe uma grande distncia a ser trilhada, muitas barreiras a vencer, florestas a romper, rios a vadear. S o homem de coragem, de experincia, de intenso anseio, cujo desejo de atingir o pice, arde em seu interior, ousar, lutar, onde quer que esteja, para atingir o topo da montanha. Assim, foi meu propsito estabelecer dentro de vossos prprios coraes e mentes o desejo de alcanar a meta, de atingir a libertao e a felicidade, S tendes que abrir os olhos para contemplardes a glria da libertao e da felicidade; ela est l, como o topo da montanha que contemplada do vale e da plancie; est sempre ali, tanto nos dias ensolarados como nos de muitas nvoas, s vezes oculto e misterioso e distante, outras vezes claro, lmpido, magnfico e muito prximo, ao nosso alcance. Este cimo da montanha da libertao est sempre ali, quer as populaes da plancie e do vale durmam ou estejam despertas, quer se divirtam ou chorem, clamem de alegria, lutem ou estejam em paz. Ele sempre ali est, sempre incitando-nos, sempre chamando-nos, sempre acenando s pessoas que se acham perdidas na escurido do vale, ou que se acham distantes, na plancie; est sempre convidando o povo que se acha embaixo, a subir ao cimo e conquist-lo. Assim, se utilizardes a vossa imaginao, compreendereis que o reino da felicidade e da libertao est dentro de vs, como o topo da montanha est sempre presente, perpetuamente, acima da tormenta, dos aguaceiros e das nuvens que passam; porm, para conquist-lo, ating-lo e viver nele eternamente, deveis ter sofrido na plancie ardente, onde no existem sombras, conforto, abrigo ou frescas correntes. A libertao como o cimo da montanha que se encontra muito distante e, apesar disso, est ao alcance daqueles que tem o desejo de vencer as plancies e entrar no vale abrigado onde existem lugares reclusos, proteo do sol e do frio. E vs, similarmente queles que fizeram a experincia, tanto da plancie como do vale e que no tendes outro desejo exceto atingir o topo da montanha, tendes que passar atravs de todos esses estgios - a plancie onde 36

www.lojajinarajadasa.com no existe abrigo, onde o sol forte, e o vale onde h a recluso, onde existe a paz e, s vezes estagnao, onde existe abrigo e muitos espaos abertos, bem como noites escuras. Alguns haver cujo desejo seja to forte, to intenso, to ardente, que lutaro para atingir o topo da montanha da libertao sem se deterem no vale, no estgio do conforto e do abrigo. Porm aqueles que se acham no vale do abrigo devem dar conforto e proteo aos da plancie, pois que se acham mais prximos do cimo da montanha e podem ver com mais clareza do que os das plancies. Se entenderdes corretamente este smile, verificareis que a maioria das pessoas, afim de atingirem o topo da montanha, tem que passar atravs a plancie e do vale, adquirindo fora e experincia durante esses estgios. Existe, porm, tambm o homem de outro tipo que tem dentro de si o desejo ardente de alcanar; esse pode passar rapidamente atravs dos dois estgios, o da plancie e o do vale afim de chegar mais rapidamente ao cimo da montanha. Com a minha vinda, fortificarei esse desejo de atingir o topo da montanha, tanto nos do vale como nos da plancie pois que j cheguei. O tempo desaparecer para aqueles que no houverem ainda chegado, porm que realmente compreenderem o ensinamento e mantiverem em seu corao a corporificao da libertao e da felicidade. Aqueles que ainda no houverem percebido esta felicidade e esta libertao, perceb-la-o; aqueles que a houverem visto, fortificaro o seu desejo e sua fora para atingirem-na. minha inteno semear a Semente no Campo que est inculto; as rvores estreis daro fruto; crescero at tornarem-se as rvores magnficas, cuja folhagem dar proteo e abrigo aos fatigados. Uma vez mais vos digo, no imagineis que, pelo fato de haverdes visto a meta a haveis capturado, a haveis atingido e vos tomado parte dela. A meta semelhante ao quadro acabado do artista; simples e misterioso. As pessoas que olham para um quadro pensam que podem pinta-lo. por ser to simples e arrebatar os seus coraes; porm, o mistrio de criao que produziu esse quadro grande. Contemplai o artista enquanto ele est pintando, como ele produz, com cores, pouco a pouco, vagarosa e gradualmente, um semblante; primeiro, a cor da pele e pouco a pouco, os olhos, e a expresso e, gradualmente, nele coloca a alma; porm, quando o quadro estiver acabado, existe nele a simplicidade da finalidade. Assim, pelo fato de eu haver atingido e ter alcanado essa Libertao e ela vos ter sido mostrada to simples, no penseis que a podeis atingir imediatamente. Primeiro, tendes que ter a mente simples e tambm assim o corao, antes que possais realmente compreender; e para possuir essa mente e corao simples tendes que haver passado atravs do vale e da plancie, deveis ter colhido experincia e ajuntado conhecimento. Dado o fato de existir esta semente dentro de cada um de vs, regai-a com cuidado, protegei-a enquanto a planta for jovem, encaminhai-a em direo ao crescimento reto, em direo aos cus abertos, em direo ao firmamento claro acima das nuvens tormentosas. Para a fazerdes crescer maravilhosamente tendes que possuir sabedoria e inteligncia que so a resultante da experincia. Se no fordes um jardineiro, se no fordes experientes com as plantas, vs as destruireis por admirvel que seja a semente no comeo. Em vs reside o poder de fazerdes a semente crescer brilhantemente, faze-la crescer em linha reta para o cu aberto, porm no podeis usar este poder corretamente, sem experincia, sabedoria e inteligncia. Com o desejo apenas, no podeis levar todas as coisas adiante de vs e atingir a meta; por muito poderoso que seja, por forte e intenso que seja o vosso desejo necessitais sabedoria, direo e domnio. Quando um homem forte trepa ao topo da montanha toma o caminho reto, pois preparou, cultivou e adestrou os seus msculos, armazenou a sua fora, preservou o seu poder por muitos dias para a luta e assim, para ele, o trilhar um caminho estreito e perigoso fcil. Porm, um homem fraco, talvez tenha que descer um pouco o caminho da montanha e tomar um caminho mais fcil e mais longo; chegar, porm, tambm ao cimo. Assim pois, a experincia, se adequadamente utilizada, vos dar conhecimento e sabedoria para pordes em ao esse conhecimento. Pelo fato de haver eu reunido a meta e a origem, vos direi que a libertao no atingida pela mera renncia, porm pela perfeio da vida, vida que nos rodeia, que nos cerca, que reside em cada um de ns. Se aparece um homem liberto, seu desejo no somente o estabelecer nas pessoas que o rodeiam o anseio por essa libertao, porm tambm expor-lhes os meios de ating-la e o processo de adquirir tal felicidade. Assim tem sido o meu propsito, desde que comecei a estabelecer dentro de vs este objetivo, de cultivar em vosso interior esses campos que tm permanecido incultos e plantar a semente que crescer at tornar-se essa rvore admirvel. Como um jardineiro, semearei a semente, porm vs sois o solo no qual a rvore crescer e assim, deveis preparar o terreno, deveis fertiliz-lo e guard-lo, afim de que a vossa rvore, a vossa planta cresa para a perfeio e ento, protegereis, dareis conforto aos fatigados. 37

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A verdade, que a essncia da libertao e da felicidade no se encontra em nenhum reino distante, no nos espera em nenhum oculto e longnquo recanto, porm eternamente mora nos coraes daqueles que tm o desejo de atingir, de pesquisar a verdade. Aqueles que tm o desejo de seguir essa verdade, essa libertao e essa felicidade, deveriam limpar-se a si mesmos de toda a estreiteza, de todos os seus preconceitos, e mergulharem fundo em seus prprios coraes e a, por si prprios, estabelecerem a verdade; e a, por si mesmos, encontrarem a libertao e a felicidade; pois onde quer que exista a eterna felicidade, a se encontra a libertao, pois sem felicidade - a felicidade que nunca pode mudar, nem pode ser alterada - jamais encontrareis a libertao. S chegareis a essa felicidade quando houverdes posto de lado todos os vossos liames, qualidades limitadoras, quando houverdes posto de lado o manto de treva que a herana de todos os seres humanos que se acham ainda ligados roda da vida e da morte. Quando a todos houverdes posto de lado, e houverdes seguido a verdade em vosso prprio corao e a a houverdes estabelecido firmemente, ento, ela se tornar parte de vs prprios, parte da vossa viso eterna, de vosso eterno anseio e ento nascer a revolta inteligente. Lanado a um lado essas coisas que ligam, que criam a tristeza, a ansiedade, e a dor lancinante do desejo, encontrareis essa revolta inteligente que nunca sossega, que atua sempre como um meio de destruir as coisas que so impuras, essas coisas que no se acham em alinhamento com a libertao e a felicidade. Assim, a primeira coisa para aqueles que desejam seguir a verdade, e seguirem-me dentro de seus prprios coraes, entrarem dentro de si mesmos, em seu prprio ser e a estabelecer a verdade e a encontrar sua prpria felicidade, sua libertao e tero, assim encontrado a minha felicidade e a minha libertao, a qual a herana de todos, o produto comum de toda a humanidade. No tem valia seguir-se a outrem cegamente, ou construir um templo para algum deus passageiro, pois que essas coisas objetivas desaparecem, morrem, e vos deixam to ns e desvalidos, to deprimidos e infelizes como estveis antes de encontrardes esse deus que passa alm para a escurido da noite. Quando houverdes encontrado a libertao e a felicidade em vosso prprio corao, a devereis construir um templo para adorar, deixando de lado todos os outros deuses, todos os outros desejos, todos os outros anseios, exceto o de vos unirdes com essa felicidade e essa libertao. Ento vos tornareis guias verdadeiros, de vs prprios, vs prprios encontrareis o caminho da paz. Se confiardes em outrem, por muito bela que seja a sua viso, por grande que seja o amor que tenhais a outrem, eles passam, fenecem e uma vez mais sois deixados ns e sozinhos em vossa solido. Pelo fato de haver subido ao cimo da montanha em meu prprio corao e ter encontrado a Libertao e a Felicidade, no quer dizer que deveis dedicar vosso amor e devoo minha forma externa. Deveis dedicar vosso amor e devoo verdade que libertao e felicidade, pois que esta forma exterior passa, como todas as coisas passam, exceto a verdade. A esta verdade deveis apegar-vos como um nufrago a uma prancha; se vos aferrardes verdade ela nunca vos abandonar, ao contrrio, vos fortificar e acrescentar vosso desejo de vos apegardes verdade eternamente. Aqueles que desejam seguir-me, devem seguir a Verdade, pois que somente se a verdade da felicidade e libertao, estiver bem estabelecida dentro de vs verdadeiramente me seguireis e assim, estaremos para sempre juntos, ento no haver separao nem solido. Porm, desde o momento que estabeleais vossa verdade em uma forma externa, em uma imagem, um altar, no incenso, em sinos, nos suntuosos vesturios de algum sacerdote, ento tereis perdido de vista a verdade, pois com essas formas, com esse incenso, com esses sinos, vossa verdade, se esvai. Assim, meu propsito estabelecer esta verdade dentro de vs, afim de que possais encontrar por vs prprios essa felicidade e essa libertao. Pelo fato de haver eu reunido o comeo e o fim, a origem e a meta, posso ver quo incitante, quo perigoso confiar nos outros. Pelo fato de haver eu atingido a libertao, por ter estabelecido em mim a felicidade, eu vos quero proporcionar esta libertao e esta felicidade, eu vos quero libertar dessas coisas que ligam, que limitam; porm se o desejo de encontrardes esta verdade, esta libertao e esta felicidade no se achar estabelecido dentro de vs, desde o momento em que eu cesse de ser, desde o momento que a minha forma fsica deixe de existir, a verdade da libertao e felicidade desaparecer. Desde o prprio comeo da pesquisa pela verdade, deve existir estabelecida esta devoo para com a verdade, posto que se encontre corporificada em uma pessoa, estabelecida em um indivduo; este indivduo, porm, somente a forma exterior, a expresso externa da felicidade 38

www.lojajinarajadasa.com interior e da interna libertao. Se houverdes percebido a verdade por vs prprios, quando houverdes contemplado a viso do cimo da montanha e houverdes vivido nesse jardim da eternidade, ento no mais confiareis em ningum, no sereis mais desviados pelos ventos passageiros da dvida, da argumentao, da ansiedade, pois toda a busca cessar quando houverdes contemplado a meta. De modo que, buscando esta verdade que est em vs prprios e no em outrem - posto que outro possa ter tido a fortuna de despertar este desejo dentro de vs, posto que algum tenha para vs corporificado a meta - deveis alcanar fora para os tufes passageiros, tirando-a de toda a experincia, de modo a estabelecerdes firmemente, por vs prprios, essas coisas que houverdes realizado, afim de que vos torneis os verdadeiros discpulos, os verdadeiros apstolos dessa verdade, dessa eterna felicidade e libertao. Meu nico desejo que deis o vosso amor e a vossa devoo a essa verdade que est dentro de mim e no a mim mesmo como forma externa, afim de que possais construir ao redor da verdade um templo que perdure para sempre, um altar ao qual os adoradores do mundo ho de vir; pois o que eles adoram na imagem por meio do incenso e todas as alfaias externas da religio passageiro, porm o que eterno, o que permanente, o que duradouro, est dentro deles. e no desdobrar, no abrir, no estabelecer esta verdade dentro deles prprios, reside a verdadeira obteno da libertao e da felicidade. A ESTRELA - Vol. I - N. 5 - Maio 1928

MEU CORAO PESA COM SEU AMOR J. Krishnamurti

A lua rubra, rubra surgiu Dos lados do Oriente, sobre o mar sonhador. A sombria palmeira balana Com o tombar da noite calma. Ouve-se o grito distante de uma ave Em vo para o ninho. H o suave encrespar das guas frias Batendo as praias clidas.

Um corao carregado De alegria pungente, quase dor. Um corao de entendimento me mister.

Um canto melodioso

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www.lojajinarajadasa.com Suave qual lamento Vem das profundezas da sombra. O ar tranqilo da noite fica opresso.

Como a luz distante que tremula Na torre escura do templo, Por cima dos fiis E de suas preces sussurrantes, Muito acima dos deuses silenciosos Entre as suas moradias nevoentas, Assim eu me tornei Livre da mo que me empolgava, Conquistador de tempos dolorosos E de suas tristes vias.

Amigo, Deixa de lado as complicaes das crenas Destri as monumentais supersties Do credo que te escraviza. Porm, cresce na singeleza de teu corao, Nas sombras do teu sofrimento.

Bem Amado, Meu corao pesa com teu amor. A ESTRELA - VOL. I N. 6 Junho de 1928

A Harmonia dos Veculos J. Krishnamurti

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Fortemente se arraigou na mente de muitos a impresso de ser necessrio para alcanarmos a libertao e felicidade, de anularmos o mundo que nos rodeia e fazermos tbua rasa de todas as conquistas da cincia, da arte e da religio. A consecuo desta forma de libertao negativa e por isso deve ser evitada. As coisas negativas no so criadoras e no presente estgio evolutivo temos que criar, temos que fazer brotar dentro em ns a energia criadora, essa fora que nos dar o poder, o conhecimento suficiente para libertar a outros e para faz-los sentir a sua prpria grandeza, a sua prpria divindade. , assim, destruidora essa concepo negativa da libertao; torna refratrio lei e conduziria eventualmente a um mundo sem lei, a um mundo catico e falto de qualquer sentimento de civilizao verdadeira. A libertao no retirada do mundo, e sim desapego as coisas do mundo. Tendo que viver no mundo - como todos viveis - deveis usar roupas, utilizar-vos de automveis, e de todas as outras coisas do mundo, embora sempre sentindo desapego a todas essas coisas; esse o verdadeiro retiro necessrio libertao. Esta no atingida pela recluso em monastrios ou em lugares ermos e afastados do tumulto do mundo; muito ao contrrio, felicidade e libertao podem ser alcanados onde quer que vos encontreis. Tambm, a consecuo da libertao no mera renncia. Esta - se nada tiverdes a que renunciar - no vos levar libertao ou felicidade. Se tiverdes experincia, conhecimento e destes resultar a renncia, ento, sim, atingireis libertao. Quem nada tem a dar e nada soube criar dentro de si, no tem a que renunciar; mas aquele cheio de sabedoria, cheio de conhecimento e de experincia, esse sim, com a renncia, faz um sacrifcio real, quebrando os laos que o prendem ao mundo. A idia negativa da libertao, portanto, que significa anularmos as coisas que nos rodeiam, no constitui o verdadeiro conceito, no representa o verdadeiro objetivo da libertao. Libertao e felicidade residem no aspecto positivo da vida, na energia construtora, refinadora, civilizadora, dentro em ns, na energia que do caos cria a ordem; alm disto a libertao , sobretudo, auto-realizao, desenvolvimento de si mesmo. Se a considerardes sob esse ponto de vista, vereis que antes de poderdes atingir o cimo da montanha, a perfeio, deveis ter os vossos veculos - o mental, o emocional e o fsico - em condio excelente e perfeita, completamente desenvolvidos. No aperfeioamento dos trs veculos que est a juno da origem e do fim. Considerai um rio, a cortar pelos campos, antes de alcanar o mar; acumula experincia e colhe, a um tempo que abranda as gentes e as rvores, delicia o sedento; mas, antes de deixar a fonte, j sabe que para atingir ao fim, alcanar o mar, tem que passar por todo um processo de aperfeioamento, de colheita e acmulo de experincia. Da mesma forma, antes de alcanarmos e sentirmos essa libertao e felicidade, necessrio estabelecermos a harmonia de nossos trs veculos. Podemos ter um corpo fsico perfeito, e corpos mental e emocional no plenamente desenvolvidos e a j haver desarmonia. Podemos ter um corpo emocional perfeitamente desenvolvido e corpos fsico e mental que no o sejam plenamente e assim por diante; quando todos os trs no se encontram em perfeita ordem, sobrevm a doena e a falta de bem estar. Os trs veculos devem tornar-se sincrnicos e trabalhar conjunta e harmoniosamente, - nisto consistindo, alis, a dificuldade para a maior parte das pessoas. Como o pescador de prolas, com seu corpo fsico bem controlado, suas emoes bem dominadas, e sua mente bem sossegada, para que possa achar as prolas em guas profundas e perigosas, - assim deve ser quem deseje atingir libertao e felicidade. Sua mente deve ser bem equilibrada, suas emoes bem dominadas, e assim tambm o seu corpo fsico, para que possa mergulhar fundo dentro de si mesmo. E quem deseje a libertao deve tambm tornar-se to simples quanto o pescador de prolas ou to simples quanto o montanhs, que sabe escalar grandes alturas. O objetivo da evoluo - embora seja esta complicada e envolva grandes tristezas e penas, alegrias e sofrimentos - tornar o homem um ser simples e no complicado, torn-lo a um tempo, simples como uma criana e cheio de sabedoria como um sbio. O homem verdadeiramente nobre, que j atingiu a libertao ou se acha a caminho de consegu-la, tambm verdadeiramente simples; ao contrrio, o brbaro, o no evoludo, o homem sem descortino ou viso, que ainda nem percebeu essa libertao e felicidade, sobre esse pesa uma infinidade de coisas. Com o tempo, atravs de muitas vidas, vai adquirindo desejos, paixes, tristezas e alegrias e segue por essa forma at nada mais ter que adquirir. Porque, na evoluo a grande questo abandonarmos quanto fomos adquirindo no correr do tempo, e temos que ir realizando esse abandono at nos tornarmos de novo absolutamente simples. O brbaro, o no 41

www.lojajinarajadasa.com evoludo, aquele que no percebeu, que ainda no despertou dentro em si o desejo de libertarse, esse depende das coisas externas at para seu Deus, seu culto, seu altar; para sua felicidade, depende de outrem, para seu bem estar, tanto mental quanto emocional ou fsico, ainda depende de outrem; - como a folha que o vento leva onde bem lhe apraz, que atirada para onde a quer levar o vento pois tal pessoa vtima dos seus prprios desejos, e no tem ainda esse controle sobre os desejos, as paixes, as aspiraes, que o h de tornar simples e tambm puro e forte. A simplicidade essencial libertao. No podeis ser complicados, no vos podeis sobrecarregar com muitas coisas em vossa jornada de ascenso para o cimo da montanha. essencial libertao que haja grande cultura, refinamento, obtidos nesse processo de eliminao por que tm que passar os seres humanos para se tornarem simples. A criana (ou selvagem ou o brbaro) muito simples a princpio; ainda no est desenvolvida, est no estgio em que tem incio a colheita do conhecimento, a aquisio da fora necessria, e ainda no aprendeu o processo do desapego, da discriminao, que lhe permitir alcanar o cimo da montanha da libertao. No correr do primeiro processo que se torna homem. Encontra-se ento merc de suas paixes, desejos, alegrias e pesares, um ser complicado, colhido na rede dos desejos e, atravs de vidas de pesares e sofrimentos, de penas e tristeza sem conta, que comea a desapegar-se, a tornar-se simples, iniciando assim a ascenso da montanha, cujo cimo a libertao. Assim, quantos aspirem libertao e felicidade e a esse desenvolvimento ou florescimento do Eu que importa na destruio do eu, tm que unir o comeo e o fim, com o se tomarem simples. Deveis, portanto, treinar-vos, pois, embora tenhais a viso da libertao e felicidade, no a alcanareis seno quando imitardes um montanhs que partisse da plancie todo carregado de coisas, de desejos e de coisas desnecessrias do mundo, e medida que fosse subindo, se fosse tambm desfazendo dessas coisas, pondo de lado as que no fossem essenciais e somente conservando as que o fossem e que lhe devessem dar foras em sua jornada ascendente. Para atingirdes libertao, deveis ter grande simplicidade, oriunda de um nobre refinamento e grande cultura. Sem cultura e refinamento, estareis ainda somente no estgio da aquisio; ambos s vos vem, quando comeais a desapegar-vos, a deixar de lado as coisas todas que vos prendem. Para treinardes a mente, as emoes e o fsico, o que importa sobretudo distinguir bem a meta; com esta em vista, que deveis treinar os vossos trs corpos. Tendes que ter como um espelho diante de vossa mente, para nele se refletirem todos os vossos pensamentos, sejam teis ou inteis, e o vosso desejo de ascender vos habilitar a distinguir, e por de lado tudo que no seja til ao vosso objetivo. Da mesma forma, deveis ter como um espelho diante de vossas emoes, para as poderdes examinar imparcialmente e com lgica e, tendo-as assim examinado, poderdes levar vossas concluses a seu fim lgico, ganhando fora e multiplicando as vossas emoes, com o torn-las simples. E tambm deveis ter como um espelho diante de vosso corpo fsico, para que este veculo possa refletir a beleza de vossa mente e a fora de vossas emoes. Se no os tiverdes perfeitos, a esses trs veculos, absolutamente perfeitos, dominados e enobrecidos, podereis divisar a libertao e felicidade, mas no a podereis alcanar. O navio que singra as grandes guas do mar, to poderoso e, a um tempo, to simples, fruto das lutas, das incessantes experincias e fracassos de vrios sculos. E, simples, como o navio que resultou de uma constante eliminao de causas inteis, assim devem ser quantos aspirem senda da paz, que libertao, e queiram vencer o portal que leva ao Reino da Felicidade. Devem eliminar quanto de suprfluo e desnecessrio tenham em si; tudo o que foi acumulado por muitos sculos de lutas e fracassos. E como o Instrutor ora aqui se encontra, quantos lutam nos vrios estgios da aquisio ou no processo de eliminao - n'Ele tero auxlio maior do que talvez imaginem. Estando Ele convosco, suspende-se o correr do tempo, o tempo em si desaparece, pois Ele torna simples todas as coisas para os que seguem lutando, embora enredados em seus fracassos e tristezas; pois n'Ele todas as coisas existem e Ele a flor de muitos sculos e a eliminao de todas as coisas desnecessrias. O lnstrutor vem para todos; felizes aqueles que O compreendem e O encontram e O trazem em seu corao. Ele vem para todos, estejam presentes no momento ou muito distantes pelo mundo afora. Quem O traz em seu corao, tem uma oportunidade especial, pois Ele d um dom especial que ser aceito por quem for sbio, - o dom de enobrecer, de simplificar e purificar a vida, de torn-la mais compreensvel e harmoniosa. Mas, para compreenderdes o valor desse dom, necessrio estabelecerdes dentro em vs a harmonia e a 42

www.lojajinarajadasa.com paz; para ouvirdes a voz do Instrutor, que a voz da intuio, deveis ter uma paz absoluta e uma grande tranqilidade. Afim de compreenderdes o lnstrutor, que no seno vs mesmos, no qual tudo existe e em que culminam todas as experincias, deveis ter dentro em vs essa harmonia e para consegu-la deveis guiar vossos passos com sabedoria e cuidado. Assim como no territrio do Estado, cujas fronteiras abrangem povos de temperamentos diversos, de idias e opinies diferentes - pois nesse territrio deve haver leis sbias e justas, para ser possvel a harmonia - assim tambm dentro de vs, que procurais ouvir a Sua voz, que a voz de vossa prpria intuio, deveis firmar, a um tempo, a harmonia e a paz. Pois, em cada um de ns h trs seres distintos, bem diversos e separados. Todos os possumos, a esses trs mente, emoes e corpo fsico - e se no se acham em harmonia, surge a discrdia, o tumulto e logo foge o bem estar. Como trs cavalos a puxar em direes diferentes um carro, querendo cada qual levar a cabo algo diferente do pretendido pelos outros dois, - assim dentro em ns os trs corpos constantemente se encontram em luta, procurando cada qual criar algo que lhe seja prprio, sem ter em conta os demais. Disto resulta desordem e desarmonia, mas quando os souberdes fazer cooperar, trabalhar em conjunto para um s objetivo, ento alcanareis a libertao e ouvireis a voz do Bem Amado, que a prpria voz da intuio. Considerai, por um instante, um gramofone. Nele h um motor, um disco e uma agulha; se um dos trs no funcionar de modo apropriado, no trabalhar com perfeita preciso, unidos para produzir a harmonia - haver sons discordes, e no msica. Da mesma forma, se vosso corpo mental, ou o emocional ou o fsico, no se acha nas condies adequadas, cheio de sade e de vida, tereis a doena e a desarmonia. Quando uma pessoa consagra todo o seu tempo, todas as suas energias, toda a sua sabedoria, qualquer que seja a que possua, ao mero desenvolvimento de um desses trs veculos, negligenciando os dois outros, - com o prprio fato de negligenci-los, est produzindo karma. No podeis desenvolver a um deles, em prejuzo dos outros. A grande maioria das pessoas no sabe distinguir entre os trs veculos e tm o corpo fsico em conta de nico poder e autoridade; por isso o desenvolvem at o mximo, esquecendo-se porm, de que tm emoes e mente, que devem ser refinadas, - cultivadas e equilibradas. Ao tornarem belo o fsico, como o fazem muitos homens e mulheres, esquecem-se de desenvolver igualmente os dois outros corpos; provir da a desarmonia e na vida imediata, ou em muitas vidas futuras, tais pessoas possuiro mente e corpo emocional contorcidos, negligenciados e tolhidos. Deve, assim, haver um certo desenvolvimento, naqueles que desejem ouvir a voz da intuio, a Sua voz, a voz do Instrutor. Devem compreender que o corpo fsico um mero veculo, mera mquina que deve trabalhar feliz e alegremente, com perfeio e paz, sem ter em conta onde, porventura, a mente ou as emoes se achem focalizadas. Deve ser como a mquina, o dnamo que, posto em ao, funciona o dia inteiro, sem pedir mais ateno. Mas para isto se dar, necessrio estabelecer hbitos bons e verificar com cuidado quais os desejos do corpo, independentemente dos da mente e emoes. O corpo fsico tem seus desejos e por isso quer agir por conta prpria, sem atender aos outros dois corpos; quando age separadamente, sobrevm a perturbao, a agonia, a luta, mas quando coopera com os demais, h ento paz e ordem e da resulta bem estar para o prprio corpo fsico. A ESTRELA - Vol. I - N. 5 - Junho de 1929

A VERDADE QUE LIBERTAO E FELICIDADE J. Krishnamurti

Ms aps ms publicaremos em "A Estrela" as palestras realizadas por Krishnaji, para um grupo de estudantes reunidos, no vero passado, no castelo de Eerde. No foram revistas por Krishnaji, pois isto importaria em uma demora de muitos meses em sua publicao. Leram-nas, no entanto, cuidadosamente, vrias daqueles que a elas assistiram e estes as consideram reproduo correta e exata do que ento disse

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Krishnaji. O tom quase pessoal - inevitvel, falando-se a um grupo de amigos - traduz com preciso a forma por que foram pronunciadas as palestras.

Como a rvore que se cobre de muitas folhas, assim o homem se enche de ansiedades de pressas, de perturbaes, de prazeres e de alegrias. Como as folhas que murcham e caem no outono, assim do homem que atingiu Libertao e Felicidade se desprendem todas as tristezas, dores e prazeres. Ele se encontra para sempre unificado com a grande felicidade, duradoura e perptua. Pois o que souberdes firmar dentro de vs, no mais para vs ser objeto de dvida, nem poder haver dentro de vs reao contra aquilo que para vs mesmos houverdes construdo. A Libertao e Felicidade e a sua consecuo esto em vossas prprias mos, est em vosso poder alcan-las, pois para todos so a meta. Quando se acham firmemente estabelecidas no corao e na mente do pesquisador, embora este por muitos dias ainda venha a estar sobrecarregado, como a rvore com a folhagem - com ansiedades, tristezas ou prazeres, ele poder sempre fazer com que tudo isto dele se desprenda, assim como as folhas caem no outono. Como no existe para mim dvida quanto consecuo desta Felicidade, tenho-me sempre esforado, em minhas palestras aqui, por firmar em vossas mentes essa viso da Libertao, para que no haja mais dvida para vs, para que por vs mesmos possais divisar a realidade e perceber a verdade dessa viso, para que quando de novo estiverdes no mundo, longe daqui, no haja para vs questes, dvidas, ansiedades, nem nenhum pesquisar sempre de novo ou novo tatear nas trevas. Quando houverdes estabelecido firmemente esta realidade dentro em vs, sempre podereis retirar-vos para esse lugar isolado de vossa mente e corao, para ali buscardes conhecimento, entusiasmo, aspiraes. Para aqueles que buscam, s h uma fonte de entusiasmo, de deleite e de felicidade e esta est dentro deles mesmos; e aqueles que dependem de outros para serem encorajados ou para se sentirem felizes, esses falharo em sua busca. E os que tiveram a boa fortuna de passar aqui estes dias, espero tenham to firmemente estabelecido a verdade dentro em si, que no mais estaro a tatear em sua busca. Pois, erigistes dentro de vs mesmo, em vossas mentes e em vossos coraes, o edifcio, o altar, o templo em que podeis render culto liberto de todas as coisas externas, - sendo vosso deus vs mesmos e a conquista da Libertao e da Felicidade. No atingir essa Libertao e essa Felicidade, deveis ter grande capacidade de amor, de devoo, e grandes energias, afim de construirdes esse edifcio de magnificncia, afim de que quanto edificardes, seja de vossa prpria construo, feito com material vosso, com os vossos sofrimentos e prazeres. Pois, o que quer que edificardes com as vossas prprias mos, perdurar para sempre, enquanto o que por alheias mos for construdo no ter a durao de um dia. Se isto bem firmado ficar dentro de vs mesmos, ter chegado ao fim o vosso tatear em busca da verdade. Assim como quando vm as chuvas, tantos os pequenos crregos como os grandes rios tm suas guas a transbordar e sempre mais se aproximam, correndo em direo ao mar, assim quando vm o Bem Amado, quando o Bem Amado est convosco, atingis com mais rapidez; os caudais de vosso corao e vossa mente estaro pesados de muitas guas, que vos faro correr para essa meta que para todos Libertao. De modo que, se tiverdes essa mente e esse corao, o tempo em si, para vs, no mais existe. No precisareis esperar que a evoluo vos leve para a frente, vos faa acelerar o passo; tendo percebido o Bem Amado, porque o Bem Amado est convosco, vosso corao e vossa mente ampliar-se-o - mesmo que isto ainda vos leve muito tempo - e assim entrareis nesse oceano da Libertao e felicidade. O fraco se tornar forte e o forte crescer ainda em fora. Aqueles que esto cheios de amor, tero o seu amor ampliado e enaltecido e os que estiverem cheios de tristezas buscaro conforto e o obtero, pois somente dentro deles prprios jaz o conforto que buscam. pelo fato do Bem Amado se achar convosco que todas essas coisas so possveis. Se tiverdes alcanado isto e tiverdes grande capacidade de devoo, de energia e de amor, conservareis o Bem Amado em vosso corao e em vossa mente em pocas de grandes sofrimento e ansiedades. Pelo fato de terdes o Bem Amado dentro de vs mesmos, assim como eu o possuo eternamente dentro de mim, pelo fato de por um momento O haverdes percebido, deveis amar a Verdade, pois esta o prprio Bem Amado. A Verdade a coisa nica que cada qual deve buscar, por que cada qual deve lutar, tudo pondo de lado em busca da luz que lhe iluminar a senda para a paz. Durante nossas palestras aqui, eu vos abri meu corao de modo a poderdes perceber a minha felicidade, pois esta Felicidade a felicidade do Bem Amado, e aos outros eu quero dar aquilo que possuo. Porque o Bem Amado encheu-me do Seu amor, no h para mim lutas, dificuldades, buscar ou tatear, nem satisfao que resulte do transitrio e do passageiro. Assim, 44

www.lojajinarajadasa.com dar-vos-ia por minha vez este amor e o daria portanto ao mundo todo em geral. Pelo fato de haver sofrimento ao derredor, pelo fato de haver tristezas e prazeres transitrios, aqueles que provaram desse amor que jaz dentro deles prprios e que o amor do Bem Amado, - esses daro aos sofredores, aos tristes, ao fraco como ao forte, e lhes sabero encher o corao. E para isto foi que aqui estivestes tantas semanas, - para ganhardes uma nova compreenso, um novo propsito, que bem se firme dentro de vs, de modo que quando partirdes, possais tornar-vos fonte de vida para vs mesmos, e possais, com o correr do tempo, libertar-vos e entrar no Reino da Felicidade. Desejaria deter-me uma vez mais em considerar a importncia de nossa atitude, de nossa conduta, pois em ambos reside a retido e por causa disto lembrar-vos-ia a vossa responsabilidade para com aqueles que vo chegar dentro de alguns dias. No sei quanto tereis compreendido daquilo a cujo respeito vos vim falando nas ltimas semanas, mas pelas perguntas que me so feitas - se tenho certeza de minha mensagem, qualquer que seja o significado desta, se tenho certeza de minha obra no mundo - muitos parece haver aqui que no compreenderam inteiramente, embora isso no tenha grande importncia; o que, porm importa muito que os que no compreenderam, no assumam a responsabilidade de interpretar para outrem aquilo que eles prprios no compreenderam. Porque, pelo fato de aqui haverdes estado, considerar-vos-o como tendo compreendido, como tendo sido, por algum modo misterioso, transformado segundo o molde do Bem Amado; e assim de fato, bem o sabeis vs prprios, alguns de vs, embora no compreendendo de modo absoluto, perceberam, sentiram e desabrocharam internamente como a flor se abre ao sol do amanhecer. Mas antes de poderdes convencer, de poderdes falar, de poderdes dar aos outros essa Libertao e Felicidade, deveis possuir por vs mesmos certeza absoluta; essa certeza - embora qualquer um afirme possu-la - evidenciar-se- na conduta, na atitude, nos atos, nas palavras, em vosso modo de agir, em toda a vossa vida, assim como nos dias que ides passar no acampamento. Como j disse, considerar-vos-o como transformados, pelo fato de vossa permanncia aqui; e penso que realmente verdade que tenhais sido transformados, que os vossos olhos, vossa mente e vosso corao tenham sido ampliados e tornados capazes de maior viso. Mas, eu teria grande cuidado em tomar essa responsabilidade, de deixar entrar em mim a idia de vossa superioridade sobre os outros. Uma simplicidade real deve brotar em vs, assim como o desejo de ajudar, mas no s da maneira que mais vos agradar; e se realmente tiverdes a afeio e o amor que so o produto das muitas hesitaes, tristezas, aspiraes e intenso desejo, ento sereis capazes de ajudar aos outros, pois se nesse desenvolvimento individual, de que vos vim falando, reside a Libertao, no tem isto outro propsito seno o de habilitar-vos a dar aos outros essa Felicidade e Libertao. Assim, eu teria cuidado - no que no vos deseje entusiastas, pois uma vez que se haja visto a luz e sentido o amor do Bem Amado, fica-se cheio de ardor, e se como estrela que flameja; mas, necessrio agir com sabedoria, com cuidado, discrio e dignidade. E isto diz respeito no a uns poucos somente, mas a todos vs em conjunto e a cada qual de per si. A ESTRELA - Vol. I - N. 7 - Julho de 1928

Do livro: A FONTE DA SABEDORIA (1923) O OLEIRO Poema de Jiddu Krishnamurti Como o oleiro, Para jbilo de seu corao, Modela o barro, 45

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Assim podes criar Para glria de teu ser, Teu futuro. Como o homem da floresta Que abre caminho Atravs da mata espessa, Assim podes abrir Por entre os turbilhes desta aflio, Um claro rumo Para a libertao de tuas tristezas, Para tua ventura perdurvel. Amigo, como de momento As montanhas misteriosas So ocultas pela neblina passageira, Assim tu ests oculto Na treva de tua prpria criao. Do que semeares, O fruto inevitvel, pesar sobre ti. Amigo, cu e inferno so palavras Para te conduzir reta ao, Mas no existem. Unicamente, As sementes de tuas aes Faro que venha ao ser A flor de teu anseio. Qual criador de imagens Modelando a forma humana Esculturando-a do granito, Assim, da rocha da tua experincia, Extrai tua eterna ventura. A vida morte, a morte renascer. Feliz o homem 46

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Que est alm do alcance das garras Dessas limitaes.

A NECESSIDADE DE MODIFICAR J. Krishnamurti


Discurso pronunciado por Krishnaji e dirigido s mulheres da ndia, na reunio anual da Associao das Mulheres Indianas, convocada em Adyar, Madras, ndia, no dia de Natal de 1927. Acreditamos ser ele de interesse para todos os nossos leitores e, portanto, temos o prazer de public-lo em A ESTRELA. Agradecemos a cortesia do Editor do Shri-Dharma pela permisso que nos deu de reproduzir este discurso.

A moralidade deve mudar continuamente, afim de acompanhar o progresso da vida; pois a vida muda sem cessar e no podeis por peias vida como s pondes na moral. A moral deve modificar-se de sculo em sculo afim de manter-se junto da sempre mutvel, sempre poderosa vida. No podeis limitar o mar, porm podeis tomar um rio e faz-lo correr por onde bem quiserdes. Enquanto o mar ilimitado, o rio pode ser represado por uma comporta afim de obedecer aos desgnios do homem. Assim, tambm, a moral o rio e a vida, oceano. Na ndia no mantemos a marcha par a par da vida; esforamo-nos para seguir a moral do passado. A vida acha-se limitada pela nossa tradio; e com a vida assim limitada, inventamos uma moral que estrangula a vida. Afim de entendermos a vida sempre mutvel, jamais constante - temos que determinar uma modificao na moral. Por todo o mundo, na Amrica, na Europa, em toda a parte, os povos acham a vida, to forte, to poderosa, to enrgica, que no tm outro remdio seno modificar a moral. Aqui, ns nos firmamos sombra de uma rvore - rvore religiosa que se supe abrigar nossa existncia, posto que tal no faa. Em nome da religio cometemos atrocidades e lhes chamamos religio. Na Rssia, onde a revoluo suprimiu a religio, dizem (no concordo plenamente com isto, porm em parte) que a religio uma droga, um narctico que adormece o povo; uma mscara por detrs da qual podeis ocultar a imoralidade, o escroquismo, tudo enfim, e chamar-lhe religio. Como da religio, dizem, libertemo-nos de Deus. Naturalmente no possvel libertar-se de Deus; seria a mesma coisa que extinguir o sol. Podeis criar uma barreira por detrs da qual vos oculteis do sol, porm no vos podereis libertar dele. Na ndia encontramo-nos ainda restritos pelas idias de moral, e seguros por tradies que foram, talvez, boas, h algumas centenas ou milhares de anos. Assim como uma rvore deixa cair as folhas (o que causa tristeza rvore), assim os seres devem modificar-se, devem ser vitais, irrequietos. A evoluo uma mudana contnua que avana sempre; e se vos quiserdes manter ao lado da evoluo, tambm vosso ponto de vista e vossas idias devem mudar. Feita esta introduo, olhemos para as nossas vidas; que cada qual contemple a sua e no a do vizinho. Em primeiro lugar a vida una, quer para os homens, quer para as mulheres. Visto existir a tristeza, no homem como na mulher, o sofrimento tambm existe tanto no homem como na mulher. Assim, dividir os seres humanos em homens e mulheres fundamentalmente, um erro. Por terem corpos diferentes, pensamos - os homens pensam - que elas devem ser tratadas de modo diferente e por diferente maneira educadas. No sofrero, porm, as mulheres do mesmo modo que os homens? No tm elas, por acaso, as mesmas dvidas, as mesmas dificuldades, as mesmas dores que os homens? Portanto, se olhardes as coisas sob um ponto de vista mais amplo, o sexo desaparece e assim deve ser. Com este desaparecimento de distino

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www.lojajinarajadasa.com na humanidade - homens e mulheres - a vida se tornar muito mais simples; e podemos resolver os problemas a que cada um de ns precisa fazer face. Contemplemos as nossas tradies, a nossa vida, os nossos costumes e hbitos, que determinam tanta tristeza, tanta degradao e sofrimento. Porm, antes, eu desejaria que ficasse entendido - pois avultar na mente do povo que sou ocidental nas minhas idias - que no sou nem Indiano, nem ocidental; sou um viajante do caminho que observa as coisas que por ele passam. Portanto, quando vejo algo errado (sob o meu ponto de vista, claro) natural que queira corrig-lo. Tomando uma atitude mental perfeitamente impessoal, qual a coisa que mais nos desperta a ateno? Duas, fundamentalmente; a questo, feminina e a questo da educao. Como sabeis, as mulheres muito mais do que os homens, so guardas da tradio. Se as mulheres se resolvessem a algo modificar no mundo, poderiam faze-lo amanh. So capazes de maior auto-sacrifcio do que os homens e, portanto, possuem uma fora maior. Porm a mulher, que um guarda da tradio, deve modificar a sua atitude mental, se quiser entender a vida. No mais deve ser uma escrava. Uso propositadamente esse termo porque as mulheres permitem que se as domine. Sei que muitas mulheres concordam comigo enquanto esto longe dos maridos; porm, quando voltam ao lar a dificuldade comea. Principiam, ento, os homens, a dominar. Porque ceder? Sois to boas quanto os homens! Na Amrica, em certas escolas, houve greves entre as estudantes porque os professores as tratavam com crueldade. Devereis, pois, formar uma Unio Feminina, no uma Associao; e fazer greve por coisas que tenham importncia. Eu vos direi o que tem importncia, pois que de vs depende a futura glria da ndia; porque a vs dada a glria de conceber filhos. Uma das coisas mais cruis que temos o matrimnio na infncia. No o encareis sob o ponto de vista dos pais ou das mes, porm sob o ponto de vista da criana. Suponde que vos fizessem executar coisas que aborrecsseis; que fareis? Resistir, lutar, debater, e fugir. Permiti que vos cite o exemplo de um rapaz amigo meu na Califrnia. Ele tinha cinco anos e costumava brincar comigo freqentemente. Um dia a me disse-lhe que lhe ia dar leo de rcino e o rapaz fez suas objees, como todos fazem. A me insistiu; o rapaz disse Est bem! Quando chegou a ora, a me no o pode encontrar; um amigo foi ach-lo trs milhas e meia distante de casa e perguntou-lhe porque se afastara para to longe. O rapazinho disse que sua me insistira em lhe dar leo de rcino contra a sua vontade e, portanto, ia pelo mundo afora ganhar a sua vida, e tinha cinco anos! Depois de muito tato e persuaso foi trazido para casa; porm no tomou o leo de rcino. No vedes que necessitais de independncia, de um esprito independente? Pensai por um momento: justo casar (mesmo que os Shastras digam que o podeis fazer) uma menina de onze anos ou menos, de idade? Todos vos haveis casado provavelmente com essa idade; conheceis a tristeza, o sofrimento, a calamidade que isso representa, e no obstante, porque o permitis ainda? Esquecei vossa religio, vossos livros sagrados, tudo; porm lembrai-vos de vossa tristeza, pois que da tristeza brota a flor da experincia. Conversei certa vez com uma jovem de dezessete anos. Tinha se casado aos onze. Sei que isto apenas um exemplo entre centenas e milhares deles. Aos quatorze teve um filho. como se fosse um boto prestes a abrir-se e a aspergir o seu perfume, ao qual se tirasse violentamente as ptalas. A menina sofreu uma operao e permaneceu enferma, no hospital, durante dois anos. Perguntei-lhe como se submetera a tudo isso e respondeu-me: Meu pai e minha me impeliram-me a faz-lo porque no desejavam que eu ficasse em casa. Karma, direis. Perguntei-lhe porque de todo em todo se submetera, e ela disse-me, o meu Karma; tantas lgrimas derramei ao pensar nesses horrores que no posso mais chorar; tenho apenas dezessete anos, mas somente espero pela morte! O marido, provavelmente, a maltrata; e estou certo que toda esta gente se julga muito religiosa. De que serve a religio, ou qualquer outra coisa, se permite que uma pessoa sofra? Aquela famlia provavelmente religiosa e assiste a todas as cerimnias sagradas, no entanto permite que a filha continue a suportar sofrimento e tristeza somente porque seguem as tradies. Sinto a maior dificuldade em reter as minhas lgrimas. Pensai na apavorante brutalidade, na crueldade, na sufocao que esta pobre jovem tem que suportar! Porque o permitir? Ser porque os livros sacros o dizem ou devido a qualquer tradio insensata? Que tem a tradio, que tem os livros sagrados que ver com a tristeza? Se os sacros livros, se a tradio no proporcionam a felicidade a todo o ser humano, no tem valor algum! Determinai, de uma vez por todas, quando voltardes para os vossos lares, no mais permitir que as vossas filhas sejam maltratadas. Nesta provncia (Madras) e em Bengala o matrimnio infantil pior 48

www.lojajinarajadasa.com que em qualquer outra parte. Sei que todos abanais a cabea em sinal de assentimento, algumas dentre vs choram por sentir a veracidade; porm, logo que haja terminado esta reunio voltareis a cair nas insensatas tradies de outrora. Talvez por haverdes fechado a mente e o corao no vedes o sofrimento como eu o vejo. Se no puderdes manter abertos a mente e o corao e se no encontrardes para isso razo suficiente - a razo a chave para abrir o corao - certamente estareis perdidos. A chave no se encontra nos livros sagrados ou na tradio, porm na tristeza que os cerca. Tomemos um outro assunto, o do matrimnio das vivas. Outro dia, em Madura, no Templo de Meenakshi, achava-me no Santurio quando entrou uma jovem viva. Subitamente comeou a cantar com voz extraordinariamente terna, externando nesse canto - no compreendi as palavras - tudo que havia sofrido e tudo por que estava passando. No podia mais conceber nem ter filhos; todos os prazeres infantis estavam mortos para ela. O amor e o afeto de seu marido - se o marido os havia proporcionado! - coisa rara - haviam terminado para ela nesta existncia. Restava a tristeza de um lar estril. Dever viver sozinha toda a sua vida ou tornarse a serva de outrem como acontece com a maioria das vivas. Provavelmente voltou para casa com o corao desolado e a mente inquieta. De quem a culpa seno vossa? Vs, mulheres, sois responsveis pela sua tristeza pois que permitis uma coisa to cruel. Cabe a vs essa to grande responsabilidade e no sabeis de que maneira utiliz-la. Porque no tentais fazer passar uma lei proibindo aos vivos novo matrimnio? Eles podem fazer o que lhes apraz, porm as mulheres no. Por que? Eles so os governadores no lar e em toda a parte. No vedes que isto depende de vs mesmas? Recusai-vos a cozinhar-lhes o jantar e num instante eles faro tudo o que quiserdes. Vejamos, agora, a questo da educao. Novamente a eterna questo do homem e da mulher. O homem recebe uma educao de espcie diferente; a mulher, praticamente, no recebe nenhuma; e pelo fato de no possurem a mesma educao ampla que os homens gozam, as mulheres educam os filhos de um modo cruel. Quem a pessoa mais importante no lar: o pai, a me, ou a criana? a criana, que tem diante de si o futuro; nela est toda a criao, ela o boto. E assim como cuidareis um boto com carinho, dando-lhe alimento apropriado e brigo, assim deveis tratar a criana. Contemplai vossos lares e os vossos filhos. As primeiras dentre as coisas que uma criana mais necessita so sono e sade; porm a criana toma alimento quando bem o entende e dorme onde lhe apraz, tem que acordar quando o pai come, porque a me precisa serv-lo. Talvez a criana esteja dormindo a um canto enquanto o pai se alimenta. No posso entrar em muitos detalhes. O que importa que a criana tenha cuidados apropriados e nutrio, um lugar tranqilo e asseado para dormir e lugares de recreio saudveis para brincar, em vez das costumeira ruas sujas. Os cuidados que dispensais mesmo aos animais de quem sois apaixonados no os proporcionais aos vosso filhos. A criana o estado, a gerao futura, tudo aquilo que possais imaginar. A criana o governador, deveria s-lo no lar, e no o pai ou qualquer outra pessoa. Vs, mes, deveis cuidar das crianas, no do antigo ponto de vista da tradio, porm do ponto vista da vida. Jamais sereis felizes crianas, homens ou mulheres se continuamente estiverdes a pensar na religio e adaptando e torcendo a Vida para acomod-la aos costumes. Pois a vida ilimitada e infinita. Pelo fato de constantemente aprisionardes a moral, deturpais a prpria vida, tornando-a dura e miservel. Assim, espero que se quiserdes ser realmente felizes, deveis libertar-vos da tradio, de tudo quanto limitar-vos possa, contemplado a vida na sua frescura e beleza. A ESTRELA - Vol. I - N. 8 - Agosto de 1928

FELICIDADE E LIBERTAO J. Krishnamurti


Sob a grande Arvore Banian na propriedade da Sociedade Teosfica em Adyar, Madras, ndia, reuniram-se, na tarde de 28 de Dezembro de 1927, cerca de trs mil pessoas para ouvirem uma exposio do grande tema da Felicidade e Libertao. Foi uma experincia nova no mtodo de exposio, pela primeira vez

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efetuado perante uma grande reunio de pessoas. O Sr. Krishnamurti exps as suas idias ao discutir os problemas sobre a meta da existncia. A novidade da exposio estava na prpria discusso em que vrios tomaram parte. Damos abaixo um registro verbal deste interessante polilogo.

Y. Prasad: Eis-nos em uma grande reunio. Dentro de dois dias, dispersar-nos-emos. De que mensagem seremos portadores? C. Jinarajadasa: Sinto, sempre que tomo parte em uma grande reunio, e nesta reunio impera um grande esprito de amizade de espcie sutil, que estou mais prximo daquilo que busco. Aps uma reunio tal como esta sinto que em mim foi liberto um poder maior para atingir os meus ideais e espero que, com o meu esprito de amizade haja sido capaz de contribuir para o auxlio de todas no aproximarem-se do seu ideal. O valor, para mim, no consiste tanto em quaisquer ensinamentos que tenham sido aprendidos aqui, porm mais no esprito de unidade que tivemos alimentado e na capacidade que houvermos desenvolvido no sentido de libertar fora espiritual. Krishnaji: Podereis libertar a fora espiritual mais facilmente se definidamente houverdes aprendido algo. C. J.: este, justamente, o meu ponto. Eu aprendi algo, porm tal no pode ser exposto em termos precisos. o fato de nos aproximarmos um pouco mais da unidade. Rama Rao: Que entendeis, exatamente, por fora espiritual? C. J.: Entendo por fora espiritual essa energia que est em todos ns, que se manifesta sob vrias formas, tais como o amor, a resistncia ao sofrimento, a ousadia e assim por diante, porm que, fundamentalmente possui a qualidade do auto-sacrifcio. Krishnaji: Entendeis, realmente, a compreenso da vida. C. J.: No mais amplo sentido da palavra Vida. Krishnaji: Portanto, o que importa compreender a vida sob o ponto de vista mais amplo, compreender tudo quanto tem lugar ao redor de ns a todo o instante. C. J.: Pessoalmente, interesso-me muito mais no compreender as relaes da vida que nos rodeia, consigo mesmo, do que as suas relaes para comigo. R. R.: Que quereis dizer exatamente? C. J.: Quero dizer que no possuo temperamento muito subjetivo e introspectivo, e que, para mim, existe uma fascinao muito maior em presenciar o jogo das foras da vida em si mesmas, do que interesse quanto ao modo pelo qual essas foras me afetam. Por exemplo, no me encontro to interessado em como alcanarei a felicidade, porm mais em como outros podero alcana-la. R. R.: No vos posso acompanhar com preciso. C. J.: Eis o caso: Quando olho para um quadro, meu interesse principal reside no admirar a sua beleza; entusiasmo-me pela sua beleza, sua maravilha como obra de arte; no penso, especialmente, no modo pelo qual me afeta. Krishnaji: Podeis olhar para um quadro que um artista haja pintado corretamente. Nesta vida ou antes dela haveis efetuado a introspeco. Muitas pessoas olham para ele do ponto de vista do artista. Podeis dizer que ele grande, quer vos impressione de um modo agradvel quer no. Ter-vos-eis adestrado a vos esquecerdes de vs mesmos. C. J.: Isto , simplesmente, o meu temperamento. Meu temperamento integral dizer Que belo quadro ele . No Grande? Sinto-me interessado e cheio da realizao de quo grande o

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www.lojajinarajadasa.com quadro para o povo em geral. Perante o quadro, quero esquecer tudo que se refere a mim mesmo. R. R.: Para voltar ao ponto inicial, porque no abandonar tais nomenclaturas, tais como fora espiritual, etc.? No vos parece que anuviam a mente? Y. P.: Krishnaji explicou a vida sob o ponto de vista mais grandioso. No entanto ela deve ser trazida s coisas concretas que todos ns sentimos e experimentamos. Afim de sermos capazes de compreender o mesmo sentimento nos outros precisamos, em nossa mente, limit-lo e defin-lo por meio de nomes. Como poderia ser de outro modo? Talvez os antigos nomes tenham sido de tal maneira colocados diante dos outros, que tenham chegado a tornar-se meras frmulas e no existe idia de vida por detrs deles e de sua qualidade mstica que une, enquanto que as meras frmulas criam barreiras e separam. A. Schvarz: E perdeis o significado real. Krishnaji: Afim de entender a vida que vibrante, que forte em cada um de ns, temos que entender qual a causa da dor, qual a causa da felicidade e da tristeza. No necessitais de palavras, quaisquer que elas sejam, para isso. P. K. Telang: Tendes que guardar as nomenclaturas. Podeis explicar o significado real dessas palavras ao mesmo tempo. Por qual outro modo explicareis a felicidade? Krishnaji: Em primeiro lugar dizem que a felicidade reside na posse de uma multido de coisas. Esta apenas um pequena parcela da Felicidade real. Ao vos esforardes para alcanar a felicidade por meio da posse de bens, s estareis tentando o primeiro degrau da escada. Quando subirdes um outro degrau, j no mais desejareis as posses. Desde que vos resolvais a ser realmente felizes, ento, na verdade estareis subindo a escada. P. K. T.: H sempre a necessidade da nomenclatura quando se tem que explicar ao povo o significado da Verdade ou da Felicidade. Krishnaji: Tendes dolos aos quais haveis coberto de flores, de vestidos, de Kunkuman. Por causa destas coisas, no vedes os dolos. preciso remover estas coisas para contemplar a imagem. I. P.: Isto aplica-se tambm nossa personalidade. Chegamos a nos libertar de todas essas superficialidades afim de compreendermos a vida. B. Sanjeeva Ras: Quereis dizer que necessitais que a coisa irreal seja retirada antes que possais ver a real. Podemos obter um vislumbre do pice da montanha, da base onde nos encontramos imersos nas irrealidades, nos nevoeiros do Vale? Krishnaji: Certamente, para mim, o pice a Felicidade, a Liberdade, a Libertao, que significa nos libertarmos de tudo, dos Deuses, das filosofias, dos desejos e de todas as espcies de coisas. Podeis demonstrar ao homem menos experiente que o pice da montanha existe e convid-lo para o contemplar. Suponde que um homem estabelece a meta como sendo o pice da montanha, nesse caso utilizar essa meta no sentido de julgar, pesar as suas aes durante a vida diria. Por inexperiente, por pequeno que seja, o que ele viu ser to incomensurvel que dir: No devo fazer isto; no devo fazer aquilo porque uma tal ao da minha parte se interpor, tapar, embaraar a viso que uma vez eu vi. Deve utiliz-la como comparao, como uma balana. Suponde que, por exemplo, Rama Rao proprietrio de uma carruagem. O desejo dos mais pobres que conhecem a Rama Rao, imitarem-no. Sua vida inteira est concentrada em chegarem situao de Rama Rao - terem um carro, uma casa grande; servos e todas as outras espcies de luxo. Porm, Rama Rao no feliz posto que possua todas essas coisas. Necessitais explicar ao homem que se esfora para imitar a Rama Rao, que anseia por essas coisas, que Rama Rao est longe do pice da montanha. Podeis gui-lo na observao, por intermdio de Rama Rao, que ele no feliz apesar de todas as suas posses. Por outras palavras, h um meio de adquirir experincia por intermdio de Rama Rao. C. J.: Experimento uma dificuldade. Dizeis que a Felicidade o que h de maior. Parece-me que tenho estado sempre em busca da Felicidade. Que isso tem sido a minha meta. Tenho passado 51

www.lojajinarajadasa.com por experincias, umas aps outras e realmente tenho experimentado a Felicidade. Uma vez mais nos solicitais a contemplar o pice da montanha. Porm tenho estado, constantemente, a contempl-lo e sou, porventura, algo mais feliz do que o era no comeo? Krishnaji: Suponde que uma vez haveis visto uma bela imagem ou um esplndido panorama, ou algo que d tranqilidade vossa mente, tal imagem ou panorama, a vs tornar em momento de depresso, aborrecimento ou m sade moral se assim o quiserdes; porm a depresso momentnea, aborrecimentos ou excitao to forte que vos subjuga, de modo que, momentaneamente, perdeis a beleza da viso. Uma vez tendo estabelecido aonde quereis ir, essa meta vos influenciar constantemente, corrigir-vos- sempre e vos encaminhar. Ser o vosso verdadeiro guia, mesmo que momentaneamente tenhais sido submersos pelas nuvens que aparecem entre a meta e vs prprios. Y. P.: Quereis, portanto, que as pessoas obtenham experincia dos outros? Vemos que eles alcanaram todas essas coisas, posses, confortos, etc., e no entanto, no so felizes. No provvel que a atitude mental que sugeris, a dependncia dos outros para as prprias experincias produzir crueza no mundo devido atitude indolente? O mundo que nos rodeia est cheio de todas as espcies de experincia se simplesmente abrirmos os olhos para contempl-las. Se nos adaptarmos a uma atitude negativa da mente, no provvel que nos conduza a uma inao absoluta, contrria evoluo? Qual o lado positivo, construtivo, da atitude mental que sugeris? Krishnaji: Jadu, tu no entendes meu pensamento de alcanar experincia por meio de Rama Rao. Vou explicar uma vez mais. Supe que existe uma casa de muitos andares e em cada andar h muitas janelas. Meu desejo ir para o ltimo andar e possuir a liberdade do ar livre. Quero chegar ao espao aberto onde os cus se me abrem. Se fixo isto como sendo a minha meta, ento, em vez de viajar horizontalmente posso viajar sempre verticalmente. Se no tenho meu desejo fixo, se o meu desejo no tem por objetivo o cu aberto que a Felicidade, ento vou ao primeiro andar onde h muitas janelas que do para a mesma rua e vou de janela em janela, adquirindo a mesma experincia, at haver espiado por todas as janelas, passando, ento, para o outro andar e assim por diante, at chegar aos espaos abertos. lsto desperdcio de tempo; e com isso cria-se Karma desnecessrio. Por outro lado se houverdes fixado a vossa meta desde o comeo, quando chegardes ao primeiro andar, espiareis por uma das janelas e adquirireis a experincia de todas as outras por comparao e rapidamente chegareis ao andar seguinte at atingirdes o espao aberto. Isto no implica atitude indolente. Ao contrrio, estareis sempre alerta. A libertao no resulta da negao mas da perfeio da mente, das emoes e do corpo fsico. De modo a tornar perfeito o corpo fsico e coloc-lo em harmonia com os outros dois necessitais dar-lhe completa limpeza, o que implica a utilizao dos processos modernos. Podeis colher experincia esmo, utilizando vossa imaginao em vistas da vossa meta. Malati Patwardham: Esta a diferena entre o caminho direto e o indireto. Quando espiardes em cada janela de cada um dos andares estareis ascendendo pelo caminho indireto. isto que Krishnaji entende pelo caminho direto. Olhais atravs de uma janela e experimentais as outras, utilizando a vossa imaginao. O caminho indireto leva-vos a experimentar por vs prprios, o panorama de todas as janelas de cada pavimento. C. J.: Em relao a isto desejaria mencionar uma coisa. Tenho longamente pensado na possibilidade das pessoas ganharem experincia vicariamente. H muitos anos, pensando sobre o assunto da Arte, pareceu-me que, quando uma pessoa responde mensagem da Arte cresce mediante experincia vicria. Tomai, por exemplo, o caso de Romeu e Julieta. Estuda este drama bem e intimamente e podereis, sem passar pela sua tragdia em vossa vida individual, obter roda a lio que ele encerra. Isto, porm, requer o temperamento artstico. B. S. R.: Todos, porm, ho alcanado o temperamento artstico? C. J.: Sim, todos - em algum ponto de sua natureza. (Silncio durante meio minuto) A. S.: Toda esta busca pela felicidade errnea. Sinto, que o nico modo de alcanar a Felicidade nos esforarmos por tornar os outros felizes.

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www.lojajinarajadasa.com Krishnaji: Este , precisamente, o meu ponto. Quando dizeis que sois felizes eu digo que, realmente, sois infelizes e tenho um remdio para vs. No que eu queira forar-vos de qualquer maneira. M. P.: A no ser que vs prprios sejais felizes, como podereis tornar felizes os outros? Krishnaji: Suponde que dais uma garrafa de whisky a um brio; ele pode pensar que bebendo ser feliz. Porm o que fazeis apenas proporcionar-lhe o olvido para a sua misria real. Quando as pessoas dizem que so felizes, no o so realmente no verdadeiro sentido. Apenas cobrem a infelicidade fundamental, que existe em suas naturezas pelas suas vrias atividades. Porm deveis compreender o que a verdadeira Felicidade antes que a possais proporcionar aos outros: tendes que perceber a meta. Necessitais experimentar o caminho que eu sugiro, e ento, quando houverdes alcanado um vislumbre da meta, podereis utilizar a fora desse vislumbre afim de proporcion-la aos outros. C. J.: Sustentais que algumas coisas, as cerimnias, por exemplo, constituem o caminho indireto e no a meta. Que dizer a respeito das pessoas que executam cerimnias? Para elas isso a meta, o cimo da montanha. Krishnaji: Est errado. Jammadas Dwarkadas: No poder ser uma droga administrada por partes interessadas para embal-los at ao sono? C. J.: No posso dizer que seja uma tal droga. Quando vejo um homem executando uma cerimnia com o sentimento de que est cooperando com Deus nessa execuo, no me dado afirmar que esteja iludido e que est desperdiando os seus esforos. J. D.: Pode ser o caso do cego conduzindo o cego, o ignorante acrescentando ignorncia do mundo. Y. P.: Sua inspirao acha-se dependente de algo cujo carter temporrio. A histria demonstra que to depressa os sacerdotes erram, todo o poder e inspirao se desmoronam. Devemos nos esforar para cultivar o hbito de obter inspirao das coisas belas, tais como o nascer do sol ou nas ptalas de uma flor, que so de um carter muito mais permanente do que o estar-se na dependncia de sacerdotes, ritos e cerimnias. B. S. R.: No , porm, o ritual, uma espcie de Arte? No constitui uma das mais elevadas criaes da mente humana? Krishnaji: No proporciona poder bastante para criardes como deveis criar. C. J.: Alguns indivduos, porm, obtm inspirao executando rituais. M. P.: Porm no bastante. Posto que possa ser um trabalho de Arte , contudo o caminho indireto. C. J.: Tem isso muita importncia, desde que l chegueis? Krishnaji: Tem importncia. Suponde que eu conheo uma estrada para a Estao Central de Trens que seja a mais curta, naturalmente preferirei esta a qualquer outra. C. J.: No se trata do tempo mais ou menos longo, porm uma questo de Felicidade. R. R.: Pode dar-se que eu prefira o caminho mais longo por ser cheio de sombra. K. S. Chandrasekhara Aiyar: Consiste a Felicidade em chegar rapidamente? M. P.: Aps ter visto o pice da montanha, no querereis mais seguir a rota mais longa. Y. P.: A Felicidade consiste na viso que houverdes alcanado mesmo quando ainda estiverdes no vale. Uma vez que tenhais obtido essa viso e houverdes determinado o rumo que quereis 53

www.lojajinarajadasa.com seguir, ento essa memria estar constantemente presente em vs. Ela vos dar Felicidade real ainda que externamente vos encontreis na tristeza e no sofrimento. K. S. C.: No devemos ignorar a felicidade do homem vulgar. Porque o perturbais? Porque no o deixar em paz? Sinto uma certa dose de felicidade em beber caf, em usar um relgio de ouro, etc.. Porque no fruir essa felicidade? P. K. T.: Porm essa no a felicidade real. Krishnaji: Suponde que haveis obtido essas coisas, suponde que tendes uma bela esposa e filhos. Porm, a despeito disso existe dentro de vs a todo instante uma insatisfao, um desejo de encontrar e estabelecer em vs prprios a Felicidade. Este desejo ferve dentro de vs a todo o instante. J. D.: Sr. Chandrasekhara Aiyar ser-me- dado proporcionar-vos um exemplo simples de que o que dizeis no perfeitamente concorde com a natureza humana? Suponde que, aps anos de dor e posse realmente comeais a amar um amigo e dele sois separado durante longo perodo. Quando sabeis que ele no se acha longe de vs, naturalmente tendes um intenso anseio por v-lo, ento todas as coisas, inclusive a posse de bens cessam de vos atrair e tornais o caminho mais curto que vos conduzir a ele. Y. P.: Se houverdes obtido um relgio de ouro possvel perd-lo; se possuirdes uma bela esposa, ela pode, talvez, morrer. Se repousardes nessas coisas para serdes feliz, jamais o podereis ser. A Felicidade uma coisa permanente. uma atitude da mente. Essas coisas so meramente superficiais. K. S. C.: Porque no gozar essas coisas agora e subir posteriormente para as coisas maiores? Que necessidade h de qualquer ensinamento sobre a Felicidade? Necessitam os peixes que se lhes ensine a nadar? No podemos, tambm, aprender instintivamente a ser felizes? Krishnaji: Ns, porm, no nos encontramos vivendo uma vida natural semelhante a dos peixes. Nosso mundo, diversamente ao deles, acha-se coberto de toda a espcie de coisas superficiais. Na Amrica, por exemplo, manipularam a perfeio do fsico. Dizem l: Tenhamos todas as coisas perfeitas no plano fsico. Isto no o bastante. Devemos utilizar estas coisas como degraus para algo mais e no como sendo a prpria meta. K. S. C.: Dizeis que o desejo por essas coisas mau? Krishnaji: No, ao contrrio, o desejo por essas coisas tem o valor que lhes prprio. O desejo pelas coisas, porm, em si mesmo, no produz a Felicidade. Y. P.: O que necessrio terdes continuamente a meta diante da vossa mente. C. J.: No existe, verdadeiramente, um grande perigo em nos concentrarmos sobre o problema da Felicidade? Vede a ndia, por exemplo, onde temos cinco milhes de Sannyasis. Todos eles buscam a felicidade; porm todos eles se acham absorvidos no eu. H muitos resultados prticos no que se refere ao progresso do povo? No estamos criando o mesmo perigo quando insistimos que as pessoas devem somente pensar na meta? Krishnaji: No, no vos podeis absorver no eu e por isso ser intil para os outros, desde que tenhais diante de vs a meta correta. Esses Sannyasis no estabeleceram a sua meta real. M. P.: Como podeis tornar os outros felizes a no ser que vs prprio o sejais? P. K. T.: As duas coisas se interdependem, no assim? B. S. R.: Eu, o homem mediano, no vejo o cume da montanha. Que que me capacitar a vlo? Krishnaji: esse o meu trabalho. K. S. C.: Destina-se a vossa felicidade a todos ou somente aos descontentes? 54

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Krishnaji: A todas as pessoas. A ESTRELA - Vol. I - N. 8 - Agosto de 1928

PARBOLA J. Krishnamurti As montanhas olham para a cidade e a cidade para o mar. Era o tempo de muitas flores e calmos cus azuis. Em uma casa grande que as rvores rodeavam Vivia um homem rico em bens terrenos. Visitara a capital de muitos pases em busca de cura. Era coxo e mal podia andar. Um estrangeiro de longnquas terras Cheias de sol veio por acaso cidade que olha para o mar, O coxo e o estrangeiro longnquo, Passaram um pelo outro, tocando-se, Em uma travessa estreita. O homem coxo curou-se e a cidade sussurrou de assombro. Mas no dia imediato o curado era levado priso Por certa imoralidade. Eerde, 6 de Julho de 1928.

KRISHNAJI Dra. Annie Besant estranho, quando olhamos em torno de ns contemplando o mundo tal qual e pensando no mundo como ser. Porm a estranheza decresce medida que relanceamos o olhar sobre os dois mil anos passados vendo o filho do carpinteiro, o "recm vindo da Galilia - e notando a desdenhosa pergunta: Pode algo de bom vir de Galilia? E os seus ensinamentos! Historietas para divertir crianas. No h filosofia profunda nem sutis argumentos. Olhando retrospectivamente atravs do vu resplandecente do culto e da devoo, dificilmente podemos conceber o sentimento com que o Romano arrogante, o Grego filsofo, o 55

www.lojajinarajadasa.com ortodoxo Hebreu, consideraram que esse Galileu de nascimento humilde, que exercera uma indstria manual em uma cidade de m reputao, um subjugado e desprezado em quem os seus prprios irmos no acreditavam. E no entanto foi ele o Christo o Filho de Deus Vivo, para o seu discpulo Pedro e para as geraes posteriores. Nosso Krishnaji teve da parte do mundo, uma recepo muito melhor que a que teve o Instrutor do mundo quando pela ltima vez trilhou as sendas do nosso mundo inferior. Foi ridicularizado, zombado, escarnecido, porm o poder interno evidenciou-se ultimamente com tanta fora atravs do vu da carne que multides o rodearam densamente e por meio de sua mensagem, iconoclasta como a tantos se afigura, veio uma fora impulsora que, conquanto em muitos ocasione oposio, no entanto penetra nos coraes que esto abertos: e vista pelos olhos que no forem deslumbrados pela sua luz quase cegante. E eu que o conheci desde a sua meninice, que vigiei o seu desenvolvimento, que amei a perfeio de seu carter ao desabrochar-se, que vi a virilidade elevada at a Divindade, alegremente dou o testemunho que Pedro prestou nos tempos que se foram. E agradecida me ofereo a mim mesma a ele como discpula, eu que fui sua guardi e me regozijando-me em reconhecer que posso continuar a servir neste mundo inferior da manifestao - tanto quanto ela possa ter lugar em um corpo fsico - d'Aquele perante quem, no mundo interno, todos nos curvamos em reverente devoo. A ESTRELA Volume I No 9

ENTREVISTA COM KRISHNAMURTI (Londres, Inglaterra, 20 de Junho de 1928)


No nmero de julho do BOLETIM INTERNACIONAL DA ESTRELA referimo-nos a urna entrevista com Krishnaji. Publicamos abaixo essa entrevista. Esperamos que seja possvel de tempos em tempos, no futuro, obter outras entrevistas de natureza similar. Servem a um propsito excelente e servem com xito para esclarecer muitos aspectos novos de Krishnaji.

ENTREVISTADOR: Numerosos jornais da Amrica relataram recentemente que haveis declarado no serdes o Instrutor, porm somente a voz do Instrutor. Devemos tomar isto como sendo a vossa atitude? KRISHNAJI: No, senhor, receio que eles estejam inteiramente errados. No se pode dar explicaes a algum que nos defronte sem ter idia daquilo de que se trata, sem ser mal compreendido. E. Qual , pois, a realidade, sob o vosso ponto de vista? K. A realidade que eu sou o Instrutor. E. Como surgiu a confuso? K. Eles entenderam mal o que se pretende indicar pela idia do veculo do Instrutor. Confundem-se com isso e trazem essa confuso para todas as entrevistas. E. Como aconteceu que vrios jornais fizeram distino entre a personalidade de Krishnamurti e o lnstrutor? K. Sr. eu o tenho dito muitas e muitas vezes que, de acordo com a minha opinio, Krishnamurti, como tal, no mais existe. Assim como o rio entra no oceano e nele se perde, assim

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www.lojajinarajadasa.com Krishnamurti entrou naquela Vida que se acha representada por alguns como o Christo, por outros como o Buddha, por outros ainda, como o Senhor Maitreya. Assim Krishnamurti, como entidade plenamente desenvolvida, entrou nesse Oceano de Vida e o Instrutor, pois do momento em que se entra nessa Vida - que o cumprimento de todos os Instrutores, que a vida de todos os Instrutores - o indivduo como tal cessa de existir. E. No devemos, portanto, preocupar-nos com o Ser glorioso que habita as montanhas do Himalaia? K. Isto de muito pouca importncia quando comparado com a Verdade, com o ensinamento. O que de importncia que todos se preocupem com o que eu digo, antes que com a personalidade do Instrutor, o corpo do Instrutor, onde ele mora e assim por diante. Isto levar a confuso. Sr. como se fosse este o caso: Quando um artista pinta um quadro, ele no quer que tenhais em considerao a sua personalidade como representada pelo quadro - ele quer que contempleis a beleza desse quadro. Ningum se importa em saber quem foi que pintou o quadro desde que ele seja belo. E. Fica entendido, pois, que de acordo convosco, a distino entre Krishnamurti e o Instrutor teve fim. K. No que a mim concerne finalizou, no mais existe. As pessoas, porm, que se querem aderir aos seus prprios preconceitos, seus prprios desejos e anseios, acreditaro no que lhes convier, pois o que quer que seja que no queiram receber em seu corao, podem dizer que emana de Krishnamurti e do que pessoalmente gostarem e o que lhes proporcionou o assim denominado conforto, diro que vem do Instrutor. Portanto o meu ponto de vista que, como a beleza do quadro depende, no do pintor, mas da prpria pintura, o que eu disser ficar dependente do seu prprio valor intrnseco e no da autoridade de minha conquista nem da autoridade de outrem. E. No inevitvel que pelo fato de nos proporcionardes este ponto de vista, vossa personalidade ser tornada a base de uma religio, apesar do vosso desejo de que isso no se faa em relao a vs? K. Se as pessoas forem insensatas sentir-se-o inclinadas a confundir a personalidade e a Verdade e a construir um templo ao redor da primeira formando uma religio. E. No se tem sempre dado o fato de que a Verdade sem expresso no pode ser realizada ou entendida? Em face disto, vs que tendes realizado a Verdade, deveis ser a Verdade para outrem e, portanto, vos tornareis o smbolo da Verdade para eles, com o perigo de que as pessoas adorem a personalidade? K. Sim, naturalmente, essa a minha opinio. Deveis aderir Verdade antes do que personalidade e deveis abraar Verdade antes do que autoridade de outrem. O inquiridor persistiu: E. No entanto existe este perigo inevitvel de formar-se uma religio com credos. K. S existe esse perigo inevitvel enquanto houver falta de compreenso; porm, no momento que o indivduo compreender, no haver formao de religio. Assim, o meu propsito principal tornar clara a Verdade a que atingi, proporcionar uma compreenso da Verdade que a Verdade para todos. E da se houver antes compreenso que proselitismo cego, os indivduos no criaro uma religio. E. Porque, desde que conheceis a Verdade, no podeis estabelecer regras e leis para os outros? K. Naturalmente eu poderia faze-lo, porm, ento seria limitar as pessoas a minha percepo da Verdade. Isso cristalizaria e a limitaria essa Verdade, a qual, digo, s pode ser desenvolvida por unigenidade individual (unigeness). O que eu sustento que impossvel limitar a Verdade pois isto significaria que estareis transfigurando a Verdade para o indivduo que limitado. Seria intil estatuir um mtodo cristalizado para que todos o sejam.

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A discusso, ento, voltou questo de fundar uma religio. E. Alguns de vossos adeptos dizem que viestes para fundar uma religio; e posto que negueis isto, eles sustentam que, por vossa causa e pelo que dizeis, uma religio ser inevitavelmente fundada depois. K. Primeiro de tudo, senhor, quando dizeis que eu tenho adeptos, permiti que vos afirme que no os quero nem jamais animarei a idia de proselitismo. Penso que h leis em alguns pases, que probem a quem quer que seja seguirem outrem pelas ruas, e se algum o fizer, pode ser detido e metido na priso. Do mesmo modo, espiritualmente desejaria que houvesse um sistema de polcia que encerrasse as pessoas em uma priso espiritual por seguirem os outros. Na verdade, isto acontece automaticamente. E. , ento, desejo vosso definidamente impedir a formao de urna religio em redor da personalidade de Krishnamurti e dar os passos necessrios para o evitar? K. No posso tomar providncia alguma - s posso insistir que a compreenso e no a crena cega, deve ser a meta. E. Pensais, porm, que haver urna religio depois de partirdes? K. Com isto no nos devemos preocupar. Depende da compreenso das pessoas. E. Haveis dito que sois o Buddha, o Christo, o Senhor Maitreya e mais do que eles. Como pode isto ser? K. Sustento que todos os Instrutores do mundo atingiram essa Vida que a finalidade da mesma. Da sempre quando qualquer ser entra nessa Vida, que a culminao de toda a vida, ento, ipso facto se toma o Buddha, o Christo, o Senhor Maitreya, pois que ali no mais existe distino. Portanto, quando, digo que esse estado mais do que eles, de fato, o do ponto de vista da compreenso do indivduo comum. E. Continuam o Buddha e o Christo com Suas existncias como indivduos? K. Continua a vida para alm da porta? O cumprimento da vida no aniquilamento - ao contrrio - sou muito mais ambicioso, muito mais impetuoso, muito mais ardente do que vs. a Vida! Portanto no pode ser aniquilamento, pois no possvel aniquilar a Vida! Quando disse que sou o Buddha, o Christo, o Senhor Maitreya e mais, no era questo de superioridade ou inferioridade. Juntei essa frase ainda mais, muito cuidadosamente, pois sabia que as pessoas em geral tem uma compreenso muito limitada a respeito do Buddha, e do Christo e por isso se eu dissera: "eu sou o Christo, o Buddha eles limitariam essa Realidade s suas prprias concepes do Buddha e do Christo, e a Vida no tem limites. E. Porque necessrio que vos chameis o Instrutor do Mundo? Exigiu o Buddha um ttulo? K. Ele chamava, a si prprio o Ser Iluminado! e Jesus denominava-se o Filho de Deus! Para mim, o termo Instrutor do Mundo", tem to pouca importncia como o tm O Filho de Deus ou O Ser Iluminado. E. Qual o propsito de possuir um tal nome ou ttulo? K. Para reconhecer e demonstrar a condio da mente e corao quando se alcanou a vitria. o mesmo que dizer: "Pintei um quadro". o mesmo que dizer: Escrevi um poema. uma afirmao do fato de se haver atingido, antes do que a estreita compreenso que dada aos rtulos e frases. O que tem importncia o que a frase indica. E. Porque usais o termo Instrutor que sugere a idia de ensinamento e implica um propsito? K. Como o mundo tem de atingir o cumprimento da vida eterna, para mim no tem a menor importncia a designao que a mim aplicam Ser Iluminado, Filho de Deus, ou qualquer 58

www.lojajinarajadasa.com outra coisa. Para mim isso no tem propsito - no mais do que quando o Buddha disse Eu sou o Ser Iluminado. No tem importncia o nome do carcereiro desde que ele possui a chave que h de abrir a porta da vossa priso! Semelhantemente, como eu possuo a chave para libertar a Vida de sua priso, no tem a mnima importncia o nome que dais chave ou a mim prprio. No me preocupo com o ttulo. E. Tem sido continuamente declarado nos jornais que estais em desacordo com diversos indivduos nos diferentes movimentos relacionados com a Sociedade Teosfica. No verdade que neste cumprimento da vida no pode existir discrdia real? K. Naturalmente, Sr.. E. Assim, de fato s na mente daqueles que enxergam a vida parcialmente e do seu limitado ponto de vista, que esta aparente discrdia surge? K. Estou perfeitamente de acordo convosco, Sr.. E. O vosso ponto de vista , porm, naturalmente, diferente do dos outros. K. Tende a ser, porm no quer isto dizer que ns disputamos acerca de tal. E. Quereis ento fazer entender que tendes a vossa verdade individual e o vosso trabalho individual? K. Mais do que isso. Vedes que outros tm transfigurado a Verdade. E. Deve, naturalmente, haver diferenas na expresso do entendimento de cada um em relao Verdade. Essas diferenas s vezes parecem opor-se. Devem, pois, ser encaradas como complementares umas das outras? K. Sr., no nos devemos preocupar com as expresses, porm, antes, com a vida. Encarais a vida do ponto de vista errado do telescpio quando contemplais as expresses da vida. Existe uma diferena fundamental. A vida no selvagem parece diferente da que reside em vs, diferente em sua expresso, porm tudo uma s Vida. Quem quer que no haja realizado essa vida, tem que transfigurar a Verdade e quando faz isto, est inconscientemente traindo a Verdade. E. Que tendes a dizer relativamente ao tipo da nova raa, nova civilizao na Califrnia, que gradualmente tem aparecido. K. Onde quer que exista um ambiente adequado para o cumprimento da Vida, ela se realizar. Para mim, digo-o novamente, isto apenas uma questo de barreiras de nacionalidade, e no da Vida. E. Quereis dizer que as barreiras de nacionalidade devem ser removidas antes que a Vida possa preencher o seu fim? K. Quando o vento sopra atravs dos vrios continentes, no leva consigo as nacionalidades dos pases por que passa. O mesmo se d com a Vida. E. Na ndia haveis exortado o povo atividade. Haveis dito na Amrica, -nos relatado - que ali se preocupavam com as sombras da vida. Os Americanos so muito ativos. Porque ento, os considerais como perseguindo fantasma? K. A atividade que perece, que no produz aquilo que eterno e perdurvel, de muito pouca utilidade. E. Porque os Hindus - to preocupados com filosofia e com o lado eterno da vida - se tornaram sonolentos e letrgicos?

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www.lojajinarajadasa.com K. O Hindu, o Oriental, diz que o fsico apenas a sombra do Eterno, da Verdade; e, diz ele, afim de entender a Verdade preciso deixar de lado a sombra e no me preocupar com esta, porm antes com a compreenso do Eterno. Assim, no se preocupa com o fsico. Preocupa-se mais com as qualidades de corao e mente. Da a doena, a desordem, o caos e a negligncia e a gradativa decadncia do fsico. Enquanto no Ocidente, toma-se a sombra por mais importante, mais vital, e o povo esquece a causa da sombra e interessa-se em decorar, embelezar e ampliar a sombra. Assim, tendes a os dois extremos: o homem que principalmente se preocupa com a vida oculta e o homem que somente se preocupa com a expresso da vida. O que eu quero fazer produzir a harmonia, entre os dois extremos pois a est a Verdade. A harmonia da Vida a compreenso da Verdade. E. a discrdia nas famlias e nas naes a negao dessa compreenso? K. Ao contrrio. um estgio necessrio atravs do qual tendes que passar. Sem desentendimento, sem revoltas, nunca podereis atingir a harmonia. um estgio necessrio que tem de ser atravessado por todos. O contentamento no felicidade. Contentamento estagnao e decadncia, enquanto que a felicidade vida e crescimento. E. a guerra um estgio necessrio para atingir essa harmonia? K. No. Se possuirdes o desejo, se estabelecerdes a meta, - que harmonia, que felicidade, atravs da libertao - ento esses estgios de revolta, de guerra, de luta, podem ser evitados deviam ser evitados. No vos deveis engolfar na lama, se puderdes salta-la. Como vedes, a minha discrdia deve ser diferente da vossa, minha revolta no deve ser a mesma que a vossa. No ser verdadeiramente uma revolta se ela se amoldar pela vossa. E. No acreditas na discrdia nacional por ser ela criada pelas polticas e pelos polticos? K. Certamente que no. A discrdia nacional , como a religio, uma forma padronizada de revolta; e desde o momento em que uma revolta assume um padro, no mais revolta. E. De modo que, afirmais definidamente que a guerra no uma coisa pela qual forosamente se tenha que passar, porm um estgio a ser evitado, se possvel for? K. Naturalmente. um estgio produzido pela estandardizao do pensamento, da revolta, da vida - no pela liberdade da vida, no pela revolta da vida. E. Em vossa opinio o mtodo de organizar vrios movimentos em prol da paz conduziro abolio da guerra? K. Eu vos pergunto novamente se podeis estabelecer um padro para a paz. Pois, uma vez mais, o problema individual o problema mundial. Portanto, voltemos ao problema da perfeio individual e o estabelecimento da paz no corao e na mente do indivduo. Boletim Internacional da Estrela Agosto de 1928

O INSTRUTOR DO MUNDO E A ORDEM DA ESTRELA Castelo de Eerde, Ommen, Holanda, Julho de 1928.

Pergunta I: Responder-nos- Krishnaji definidamente : 1. Se a Ordem da Estrela constitui, uma limitao para ele. 2. Se a Ordem uma barreira entre ele e o mundo. 60

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3. Se a Ordem no tem para ele utilidade. 4. desejo seu abolir a Ordem? Krishnaji: 1. A Ordem no uma limitao para mim, mas talvez o seja para vs. Podeis fazer da Ordem uma limitao que atue como uma barreira entre vs e os outros ou podeis fazer dela uma ponte. E, se uma ponte ou uma barreira, no depende de mim. Quando vou falar s pessoas, eles no consideram a mim nem a minha atitude para com a vida do ponto de vista de qualquer seita ou de qualquer corporao exclusiva e estreita. Da, a Ordem, em si, no uma limitao para mim. 2. Mais uma vez, isto depende de vs, no de mim. No fim de tudo, idias, pensamentos e sentimentos no tm nacionalidade nem individualidade, ou pelo menos, no as deveriam ter. E se indivduos pertencentes Ordem no entendem isto, criaro uma barreira. Se no desejardes excluir o mundo de vosso corao, no importa que o mundo vos exclua. Se desejardes dar vosso afeto a todo o transeunte, embora ele o recuse, no pode existir barreira entre vs e ele. Se em vossa mente existir a diviso de pessoas como pertencentes a grupos, tipos e movimentos, a classes definidas, a religies particulares, a crenas e seitas definidas, ento existir a barreira. As barreiras so criadas, no pelas instituies, mas pela limitao da prpria vida, pelo estrangulamento da vida por idias estreitas e estreitas concepes. 3. A Ordem tem utilidade no sentido de criar um ncleo de pessoas que desejam tratar sria e sinceramente dos assuntos que exponho perante elas, com uma considerao maior do que a daqueles que ainda no estudaram a questo. Penso que, durante algum tempo, pelo menos, ser til ter uma instituio flexvel como esta, no meramente para reunir membros, mas para evidenciar novas idias; no para converter, mas afim de ajudar os outros a realizarem essas idias seu prprio arbtrio; no tanto para pregar, como para servir de exemplo; no para efetuar reunies inmeras, mas para mostrar o caminho de atingir a realizao em virtude de nossa prpria vida individual; no para impor crenas, mas para criar compreenso, que est alm de todas as crenas. E se a contemplardes deste modo a Ordem nunca se poder tornar uma barreira entre aqueles que so membros e os que no o so. Ao contrrio, ser uma ponte pela qual as pessoas chegaro a compreender a nova concepo da vida. 4. Como disse, se a Ordem for uma ponte auxiliando s pessoa atravessar a difcil corrente da vida, ento ser til; se no o for ns a aboliremos. Espero que sereis o primeiro a abol-la. No me interesso muito por movimentos em si mesmos - e, por favor, no penseis que eu apoio especialmente este movimento por ser o nosso. A ordem at agora tem servido para reunir pessoas que talvez sejam um pouco mais srias, isto, porm, no significa necessariamente que eles entendem mais do que os outros, ou que possuam quaisquer privilgios particulares. Enquanto a Ordem for uma ponte que ajude as pessoas a atravessar a corrente, penso que poder ser til mant-la; porm, a partir do momento em que a sua utilidade tenha cessado - e isto deve ser julgado, no por mim, mas por parte de cada um de vs - ento ela deve desaparecer. Uma pessoa no poder nunca constituir uma barreira, - podem-se despedaar as suas idias - porm a maioria das pessoas que pertencem Ordem, os membros em seu conjunto, podem criar uma barreira, se usurparem a Verdade e fizerem mau uso da compreenso que alcanaram. II- PERGUNTA: De que modo as instituies se tornam limitaes? Krishnaji: Se fordes um observador imparcial, haveis de notar que a maioria das instituies tende a monopolizar, a usurpar a Verdade, que jamais pode ser usurpada, jamais pode ser monopolizada. A Verdade desptica, a Verdade no pode ser discutida, nem pode, quem quer que seja, ter opinio acerca da Verdade. A Verdade , e uma pessoa sbia esforar-se- por compreender por meio de meditao, antes do que pela simples discusso - no que no devamos discutir, porm no chegaremos Verdade por meio de contendas. A Verdade est para alm do pensamento, ultrapassa o sentimento, est para alm do artista, para alm do governante, para alm de todas as coisas. Da, para a mente limitada, a Verdade, 61

www.lojajinarajadasa.com em si, em sua pureza, no pode ser compreendida. E se as instituies tendem a transfigurar a Verdade com o propsito de servir sua prpria compreenso ou para proporcionar compreenso a outrem, essas instituies inevitavelmente ho de deteriorar tornando-se barreiras. Por esse motivo sou sempre um tanto prevenido em relao s instituies; porque elas conduzem ao desejo de formar proslitos e converter os outros; e colh-los em nosso particular viz estreito.

III PERGUNTA: Muito haveis dito para desencorajar-nos de trabalhos, credos e servio ativo ... Krishnaji: Se to facilmente vos deixais desanimar, ento aquilo que fazeis no pode ser de real valor. O mundo preocupa-se apenas se estais construindo essa ponte para auxiliar a homens e mulheres a atravessarem o golfo.

IV PERGUNTA: Ns servimos para nos esquecermos de ns mesmos - assim entendo vossas palavras. Quereis com isso indicar que a atividade no importante e o servio uma iluso? Ningum pode, realmente, ajudar a outrem? Krishnaji: A grande maioria das pessoas esfora-se por se esquecer de si mesma com trabalhos. O trabalho uma espcie de droga. No desencorajo a ningum para o trabalho, a vida seria montona sem trabalho e tambm o seria se apenas tivsseis idias Sem nunca lhes dardes expresso. Porm, como disse, a maioria das pessoas trabalha ou serve afim de esquecer-se de si prprias e de seus problemas. Se olhardes para dentro de vossos coraes e examinardes esta vasta energia criada pela idia de servio, verificareis que a maior parte dela constitui um meio de cplocardes de lado a vossa prpria compreenso. E eu sustento que, enquanto no houverdes resolvido vossos prprios problemas, enquanto o indivduo estiver ainda confuso e no estiver em paz, enquanto no houver serenidade em seu ntimo, ele no pode, realmente, servir a outrem. Ele pode pensar que est servindo, porm, por servio real eu entendo uma coisa muito diferente do servio ordinrio. Se fordes a um mdico que seja realmente grande ele vos dir que certas coisas so necessrias para efetuar uma cura radical. Porm, se fordes a um mdico inexperiente, ele s vos indicar como deveis tratar dos sintomas e no descer at a causa da vossa molstia. Agora tendes que escolher, entre aquilo que no servio eterno e aquilo que transitrio. E eu sustento que o servio que eterno s pode ocorrer se a pessoa que deseja servir houver solucionado o seu prprio problema e encontrado paz dentro de si mesma. Em relao pergunta sobre se a atividade no importante, minha resposta : atividade, no sentido ordinrio, criando obras que perduram um dia, no importante. Porm, a atividade que se relaciona com as coisas eternas, essencial. E vs tendes que decidir sobre o que eterno e o que passageiro. Todo o servio que no seja permanente, que no cure as feridas, ou abrande a fadiga do corao, uma iluso; porm o servio que preenche essa vacuidade do corao e da mente, eterno. Quanto ao fato de se algum pode, realmente, auxiliar a outrem digo-vos que na verdade podereis ajudar a outrem e no de um modo meramente momentneo, se vs prprios fordes grandes cirurgies e se tiverdes ultrapassado a necessidade de auxlio. Por favor, no penseis que isso seja uma questo de desencorajamento ou de encorajamento ou de proporcionar conforto ou esperana. No nenhuma destas coisas, muito mais nobre, mais belo, mais gracioso, do que todas essas coisas.

PERGUNTA V: Krishnaji diz que torcemos a sua mensagem para adapta-la s nossas crenas. Que que ele entende por nossas crenas? Sero as nossas prprias convices profundas que brotam da nossa prpria experincia? Ou a conseqncia do nosso raciocnio sincero? Ou o nosso conhecimento colhido? 62

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Krishnaji: Entendo tudo. Explicarei o que entendo. A Verdade sustento eu, no pertence a uma condio de vida. A Verdade no pode pertencer a uma expresso particular ou a uma espcie de conhecimento ou arrazoado. Est para alm de todas essas coisas. Crenas experincias, raciocnios, conhecimento, so condicionados, porm, a Verdade no pode ser condicionada ou limitada. E pelo fato de desejardes servir-vos desta Verdade sem a compreender, torceis essa Verdade para adapt-la s vossas particulares experincias, s vossas crenas particulares, ao vosso raciocnio e conhecimento. Podereis dizer: Como impedirei essa desfigurao? experincias, raciocnios, e conhecimento. Pelo exame contnuo de crenas,

Cresceis cada vez mais medida que colherdes e expelirdes. No crescereis se simplesmente colherdes e retiverdes a colheita dentro de vs. No fim de contas, quando comeis uma uva tomais o suco e lanais fora a pele. O mesmo se d com a verdadeira experincia; lanais fora o incidente e colheis a experincia. A experincia, porm, no deve condicionar a Verdade. Todos acreditam nisto ou naquilo e deixam de acreditar, nisso ou naquilo, e esperam que a Verdade se condicione, se limite sua crena ou descrena. E por que isso no acontece, existe o mistrio, existe a perturbao e a luta. No podeis reduzir nem transformar a Verdade. Posso mostrar aos indivduos a glria de um cimo de montanha em sua pureza, em sua serenidade, porm no posso conduzir essa grande altitude mente condicionada das pessoas. O que, portanto, tenho a fazer incentivar, estimular, criar nas pessoas o desejo de ir em direo ao eterno. Porm vede o que acontece pelo mundo. Dizem: o pobre, o ignorante o inexperiente, no compreender a Verdade, portanto, eu, que a compreendo um pouco mais traduzirei medida da sua compreenso. E da todas as parafernlias das religies. Se quiserdes que uma criana cresa, desde o momento que ela capaz de erguer-se e caminhar por seus prprios ps, deixais que o faa sozinho e no a ajudais o dia inteiro. Vs a auxiliais a fortalecer-se em lugar de lhe dar muletas que perpetuaro sua fraqueza. Pelo fato de a maioria das pessoas no mundo terem a idia falsa de que no podem compreender a Verdade em sua plenitude necessitam reduzir, condicionar, transformar a Verdade. O Buddha demonstrou que a Verdade no pode ser traduzida, condicionada, limitada para entendimento dos inexperientes. Porm, depois que ele morreu, seus discpulos tentam faze-lo e assim criaram uma religio. O mesmo se deu com o Christo e provavelmente dar-se- o mesmo hoje. Tenho muito desejo, anseio, compaixo em meu corao por ajudar as pessoas, porm digo que somente existe um caminho para ajudar e este o de tornar as pessoas fortes e dependentes de si mesmas, e no dos outros, e impeli-las para essa Verdade eterna que no pode ser condicionada. Nunca reduzais ou transformeis a Verdade, porm, antes, incitai o desejo intenso de atingir o ilimitado. A vida, ento, ser muito mais digna de viver-se do que quando estiverdes contentes em morardes no fcil conforto da Verdade condicionada. Tendes em redor de vs tanta Verdade condicionada, transformada para a compreenso dos inexperientes; porm, eu falo todo o tempo da verdade em seu estado incondicionado - posto que as palavras mais uma vez criem limitao, no a devo transformar, pois que, para mim, isso seria um atraioamento Verdade. No vos possvel verificar que transformando-a ela perde a sua simplicidade, a sua prstina nobreza e, assim criais complicaes? Uma vez que condicionais a Verdade, criareis esses abrigos de conforto onde existe a estagnao da mente e do corao. Tenho freqentemente ouvido as pessoas dizerem: Oh! fao estas coisas, no por mim, mas porque auxiliam os outros. Isto significa que aquilo que haveis atingido, estais transformando para que outros o conquistem, em vez de os guiardes a conquistar a seu modo prprio, que o nico meio de atingir. deste modo que todas as religies no mundo so fundadas. Da, o prprio altar no qual adoram a Verdade a traio Verdade. Porm, a simples repetio de que a religio uma traio Verdade, no representa compreenso ou verdadeira convico. Penso que foi Lao Tse que, quando encontrou a iluminao jamais falou nela, porm foi-se, deixando um livro. Quando os discpulos pediram ao Buddha que descrevesse o Nirvana, disse ele que aquele que disser que existe, erra, e aquele que disser que no existe, mente.

PERGUNTA VI: Tem o termo Instrutor do Mundo algum significado para Krishnaji? 63

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Krishnaji: Sustento que s pode haver um Instrutor do Mundo em qualquer poca. S existe uma vida, e desde o momento em que a pessoa entra no preenchimento dessa vida, o Instrutor do Mundo, como Buddha foi o Iluminado e Christo o filho de Deus. Assim, se realmente compreenderdes o termo Instrutor do Mundo, sem ser de um ponto de vista limitado, ele equivalente a Iluminado. O que pretendo transmitir que cada um sente a vida como coisa separada dentro de si mesmo, aparte dos outros. A vida una, posto que suas expresses sejam mltiplas. Desde o momento em que um indivduo sente, sabe, e consciente da vida eterna que no pode ser dividida e atinge a compreenso dessa vida, no meramente de um modo intelectual, o Instrutor do Mundo. O termo tem uma certa significao e de valor como idia em redor da qual outras idias podem juntar-se, mas isto tudo. Julgais que importava ao Buddha ser chamado o Iluminado ou no? Porm isto ajudou a criar e por em movimento certo conjunto de pensamento que reuniu em redor de si outras idias, outras concepes. Se simplesmente adorardes, cultuardes um rtulo, a Verdade nunca se aproximar do vosso corao nem a compreenso daquilo para que o rtulo existe. O que digo para o mundo inteiro e no para uma nao particular, classe ou instituio. A Verdade e, portanto, o doador da Verdade para o mundo todo e no para qualquer grupo particular. Podeis encarar o Instrutor do Mundo sob qualquer ponto de vista que vos aprouver, porm, as pessoas no acharo dificuldade alguma em compreender se explicardes com simplicidade e no em termos complicados, em sries de crenas. Neste ltimo caso, naturalmente, a coisa torna-se confusa, algo de misterioso e difcil de alcanar. O que de importncia o perfume que a Verdade emite, no a substncia da flor. E a maioria das pessoas preocupa-se mais com a substncia, a forma e as dimenses da flor do que com o seu aroma. Quando a planta emite sua flor, o sbio para, contempla-a e goza o seu perfume enquanto que o no sbio passar adiante. Fui perguntado por um reprter de jornal que representava a opinio do mundo em geral: preciso que eu creia que sois o lnstrutor do Mundo para poder compreender vossa mensagem? Respondi: Olhareis pelo lado oposto do telescpio para verificardes a dimenso e a beleza de algo que examinardes? No fim de tudo, o que importa a pureza do alimento e no a decorao do vaso no qual trazido. Porm verificareis que para que o alimento seja mantido puro e limpo tambm o vaso deve ser limpo. No vos preocupeis tanto com o vaso mas antes com aquilo que ele contem, se o alimento suficiente, ou se ele tem valor para nutrir-vos.

PERGUNTA VII: Porque s h um lnstrutor do Mundo? Krishnaji: Como disse, s existe uma vida e o homem que a atinge o nico lnstrutor do Mundo. O indivduo que atinge essa vida, uniu o comeo e o fim - e no entanto no h comeo nem fim - ele construiu conscientemente uma ponte entre a origem e a meta ltima. Por origem entendo a vinda ao ser dessa vida que condicionada por uma multiplicidade de coisas. Um selvagem evolui e colhe para si mesmo cada vez mais experincia at que por fim se une a essa vida que eterna. Ento ter construdo a ponte sobre o abismo que existe entre o comeo e o fim, entre a origem e a meta onde existe a vida una. Esta a minha concepo do Instrutor do Mundo - e muito mais do que isto, que no posso exprimir por meio de palavras. A expresso Instrutor do Mundo somente um nome e, como rtulo, no tem valor. Tem-no, porm, e grande, para aqueles que se conservam amarrados aos rtulos, pela maya, a iluso das palavras. Pela criao ou pela vinda ao ser da flor da humanidade, pelo atingir dessa plenitude de vida, todos so responsveis. Por isto eu quero entender que para a criao do indivduo que atinge a vida eterna, sem comeo nem fim, na qual a origem e a meta tm seu ser, toda a vida condicionada prestou auxlio. Pela sua nsia de libertar-se, a vida condicionada ajudou a produzir esta Flor. Assim como o ltus embeleza as guas e assim como as guas so necessrias beleza de ltus, assim a escravido de todo o indivduo e o clamor de todo o indivduo escravizado ajuda a criar aquele que eternamente livre. Da, quando este ser, indivduo ou vida no torneis isto complexo ou pessoal quando esta vida que esteve separada, mantida escrava, atinge essa vida que como o oceano, sem limitao, ento essa vida condicionada torna-se o Instrutor do Mundo. Estou usando palavras que podeis desfigurar e utilizar de acordo com a vossa crena ou descrena, porm a Verdade 64

www.lojajinarajadasa.com nada tem que ver com crena ou descrena. A fragrncia da flor do ltus no depende do transeunte. A beleza do ltus criada pelas lgrimas do mundo. A vida eterna e, quando aps muitos sculos h um ser que atinge e preenche esta vida, seu deleite e glria tornar esta vida incondicionada compreendida por aqueles que ainda no a atingiram. Quer chameis a este ser o Instrutor do Mundo, o Buddha, o Christo ou qualquer outra coisa, no tem importncia. Dar gua aos sequiosos, abrir os olhos dos cegos, tirar os prisioneiros para fora da priso e dar luz aqueles que esto sentado na sombra por eles prprios criada, o deleite daquele que atingiu. E se as guas que instigam essa sede esto contidas em um vaso particular, ou se a voz daquele que chama ou no doce e musical coisa de muito pouca importncia. Enquanto houver dentro de cada um o desejo desperto de responder, de levar aos seus lbios as guas que mitigam a sua sede, de rasgar a venda que lhes cobre os olhos e ouvir o grito em sua priso - isso tem valor. E a limitao imposta vida pela iluso das palavras justamente a coisa que destri a voz do Mestre cantor.

PERGUNTA VIII: Se ele eterno, como pode ele ento, estar relacionado com aqueles que o precederam e com os que possam vir depois? Krishnaji: Quando se entrou nesta vasta vida, no h retrocesso ou avano, no se trata do que acontece queles que o precederam - ou o que vai acontecer aqueles que vm depois. Estais apenas contemplando rtulos, olhais s para as personalidades e por isso que surgem essas questes. Perguntais: Que acontece aqueles que precederam? Entraram nessa vida! Que acontecer aos que vierem depois? Entraro, tambm nessa vida! to infinitamente simples, sem complicao. A vida o preenchimento de todas as coisas e na liberdade dessa vida reside o atingir a Verdade. E os indivduos que atingiram essa vida, so eles prprios, a vida. a humanidade que pe limites a essa vida e a contempla atravs de suas limitaes. Esta vida que a flor da humanidade, que a liberdade da humanidade, que a consecuo da humanidade, que o comeo e fim da humanidade, essa vida que a Verdade eterna, no pode ser descrita por meio de palavras. Este mundo no possui palavras, ele existe e no existe. E do ponto de vista da limitao, do qual todos vs contemplais, no pode haver compreenso da imensidade que sem limitao. Quando um ser entra nessa vida, ele prprio a vida, ele a flor da humanidade. Quando vedes em um jardim, uma rosa mais bela do que as outras, se pudsseis perguntar rosa: Porque s mais bela que as demais? s o produto das lgrimas dos cus? Deu-te a vida maior beleza? Ela seria incapaz de explicar porm sustentaria: eu sou. E se fordes sbios, no despedaareis as ptalas, apartando-as para examin-las e apanhar o aroma. Espero ter tornado isto vago tanto quanto possvel, pois que, se o tornasse claro, anteporia uma limitao Verdade, ter-la-ia atraioado. *** Havendo eu atingido a outra margem, auxilio os outros a atravessarem a corrente; tendo eu atingido a salvao, sou o salvador dos outros; confortado, conforto os outros e os conduzo ao lugar de refgio. Encherei de alegria todos os seres cujos membros enfraquecem; darei felicidade aqueles que morrem de angstia. Eu lhes estenderei socorro e libertao. BOLETIM INTERNACIONAL DA ESTRELA, Agosto de 1928

A CENTELHA E A CHAMA J. Krishnamurti 65

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Ms a ms publicaremos em A Estrela as palestras dadas por Krishnaji ao grupo de estudantes reunidos no Castelo de Eerde o vero passado. No foram revistas por Krishnaji em pessoa, pois o ter que faze-lo implicaria na demora de muitos meses na publicao. Foram lidas cuidadosamente, entretanto, por vrios dos que estiveram presentes quando foram proferidas e que acreditam serem elas o exato registro verbal do que Krishnaji disse. A nota de certo modo pessoal - inevitvel quando se fala a um grupo de amigos representa exatamente a forma na qual as palestras foram dadas.

Houve uma vez uma pessoa com o nome de Krishnamurti que, desde o prprio incio das coisas percebeu que somente havia um fim, uma meta nica, sendo esta a unio com o Bem Amado e que, nesta unio, reside a Libertao e a Felicidade. Porm, antes de conseguir esta unio, esta Libertao e Felicidade, teve que desenvolver-se, teve que trilhar todos os caminhos, todas as rotas dessa montanha em que a humanidade habita. Assim, por vrios perodos de tempo, durante vrias vidas, em diversas pocas, passou de um estgio ao outro, de um para outro temperamento, de uma a outra experincia, de um desejo a outro, at haver explorado todas as avenidas que, pensava ele, levavam ao cimo da montanha. Cada caminho o conduziu um pouco mais para o alto, porm nenhum o levou ao fim, jamais lhe foi possvel conseguir o que desejava - a completa unio com o Bem Amado, com o Gur dos Gurs. Assim, aps haver experimentado, aps lutas, aps haver contemplado o azul dos cus e as nuvens escuras que ali existem, deixou finalmente de lado, todas essas coisas, todos os desejos, todo os afetos, todas as tristezas e prazeres, todos os caminhos, pois que todos os caminhos so estgios diferentes que s conduzem a um fim nico. Assim, colocou de lado todos esses caminhos e escutou a voz que era a resultante da experincia toda que havia colhido atravs de todas as avenidas de pensamento, de emoo e de ao. Colhendo essa fora, abandonou todas as coisas e, assim, tornou-se capaz de completar essa unio, essa unio com a chama, que produz a paz, que produz a libertao completa e a completa felicidade. Assim, os indivduos que, como Krishnamurti, s tm um desejo, um fim, pois toda a humanidade s tem um fim, um propsito, uma meta - esses indivduos tm que deixar de parte todas as coisas e aprender a confiar em si mesmos e a si prprios se estabelecerem na fora que houverem colhido da multido das suas experincias, de suas vrias experincias em muitas vidas. No h outro Instrutor que no Aquele que temos dentro de ns, no h verdade, exceto a verdade da auto-realizao, que desvenda a meta do indivduo e que a destruio do eu separado, a unio com o Bem Amado, a unio da centelha com a chama. Assim, eu vos desejaria ensinar como atingirdes esse fim, essa meta incomensurvel, essa vastido dentro da qual o eu separado cessa de existir e se desvanece. O que depois venha a acontecer ao eu separado, no tem importncia; se permanece dentro da chama ou se aparece de novo, s a chama pode responder. Para vos unirdes com a chama, para atingirdes o eu, para atingirdes a Libertao e a Felicidade, tendes que vos desenvolver, como esse indivduo, Krishnamurti, se desenvolveu. No podeis desabrochar e tornar-vos uma rosa em um nico dia, porm, se possuirdes intensidade de anseio, imenso poder e fora por detrs de vs, ela vos conduzir a essa altura onde podereis viver constantemente com o Bem Amado, embora ainda no estejais unidos com Ele. Afim de desenvolverdes os trs seres que existem dentro de cada um de vs, de um modo harmonioso, coordenado e sinttico, e dessa maneira produzirdes a unio, a harmonia e completa paz, tendes que haver passado por longa prtica e persistente luta. Sem apuro, sem cultura, e sem simplicidade, que a resultante das duas primeiras coisas, no haver unio nem contado com a chama. No podeis dividir a chama, pois que a chama uma; e simples porque inclui todos os milhes de centelhas existentes. E assim, se quiserdes alcanar a unio com a chama, tendes que vos tornar simples, essa simplicidade que nasce do refinamento e da cultura. Pois que a compostura, que a expresso externa dos internos pensamentos, mora na justia, e tendes que estabelecer em vs a correta e verdadeira compostura em todas coisas e em face de tudo. Afim de expressar esse refinamento e cultura que todas as pessoas sentem em grandes momentos de xtase, tendes que adestrar o corpo que a expresso externa, ou antes, que deveria ser a expresso externa de vossa grandeza interna, da vossa espiritualidade e nobreza.

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Assim, precisais primeiro que mais nada, examinar o corpo e, para alcanar esse domnio, necessrio prtica e cuidado contnuo pois assim, o corpo no se desenvolver desarmoniosamente e no admitir hbitos, tiques e desejos sbitos, sbitos aborrecimentos, cleras sbitas, de motivao prpria. O corpo meramente um instrumento desse eu que faz parte da chama; e assim como o eu que centelha dessa chama, se desenvolve mais e mais, se torna mais refinado, mais culto e cresce na aproximao da chama, o corpo necessita tambm representar, na forma exterior, os sentimentos internos, os internos pensamentos, a pureza interna. Para dominar as aes do corpo, para dominar-lhe os sentimentos, as paixes e os anseios, necessitais meditar regularmente. A espcie de meditao no tem importncia; se certas formas ou sistemas se vos adaptam melhor, adotai-as; porm o resultado que importante e no o sistema. Quer alcanceis o cimo da montanha por uma forma particular quer por outra, coisa de pouca importncia; o que importante que chegueis a esse estgio da mente e da emoo em que o corpo pode representar, pode agir, pode executar as coisas que desejardes. Junto ao fsico, que a expresso externa, deve existir uma realidade interna, o interno desenvolvimento das emoes e da mente. Continuo com a histria de Krishnamurti. Nos tempos em que o mundo era jovem, e havia deuses entre os homens, viveu uma entidade separada; uma alma aparte denominada Krishnamurti. No desenvolver este eu separado ele desejou crescer para chegar chama, que o desejo de todas as pequenas centelhas, de todas as fagulhas separadas que existem internamente em todos os que habitam no mundo. E durante o seu crescimento, desde centelha at chama, essa entidade separada, esse eu separado, Krishnamurti, desenvolveu-se pelo processo de emoes destrutivas, de emoes criativas, de emoes refinadas, de emoes compactas, mediante vrios estgios, vida aps vida, adquirindo e repelindo, acumulando e eliminando, at que, pouco a pouco, com o decorrer do tempo, viajando por um trilho sem rastro, alcanou esse estgio no qual verificou que, para possuir emoes durveis, para sentir amor e devoo, deve haver um constante adestramento do corao, deve existir paz e serenidade. Assim, determinou-se ele a construir um templo dentro de seu prprio corao, edificando um altar no qual pudesse adorar o seu Bem Amado com tranqilidade e ofertar a sua devoo com a certeza de que se desenvolveria at chegar chama e que, eventualmente, se tornaria a chama do Bem Amado. Assim, quando chegou a perceber que para tornar-se parte do Bem Amado o amor necessita ser impessoal, puro, forte, deixou de lado todas as coisas afim de atingir o cimo da montanha da Liberdade, da Libertao e da Felicidade. No perceber isto, ele verificou que tinha primeiro que colher a energia vital de todos os sentimentos destrutivos e construtivos - afim de que pudesse, com uma fora maior, com um maior poder, saltar at a chama e tornar-se parte dessa chama. E, na percepo da separatividade, naturalmente cresceu o desejo de tomar-se parte do Uno e pelo decorrer do tempo, pela acumulao e pela eliminao, pela destruio e pela criao, desenvolveu-se, cresceu at chegar a essa chama, tornando-se capaz de se fundir nela e tornar-se parte do Bem Amado. Pelo fato de se haver tornado parte dessa Eternidade, parte dessa chama eterna, parte desse Reino da Felicidade e da Libertao, pelo fato de ser uno com o Bem Amado tornou-se capaz de amar impessoalmente. Este indivduo que comeou como um eu separado h muitas vidas, desde muitos sculos, tornou-se capaz de ser participe do Bem Amado, de ser parte dessa chama, que o fez amar todo o mundo, pois que O Bem Amado habita em todos, plenos ou apenas parcialmente desenvolvidos que sejam. Assim, quero falar-vos do desenvolvimento desse amor que impessoal, que puro, que proporciona vitalidade e energia, que fora criativa, fora que purifica, porque cria e expande. Como disse anteriormente, existe em cada um de ns esta entidade emocional separada, que se acha aparte e distante das outras, criando e destruindo por si mesma, sem olhar ao mental e ao fsico. Sem considerao, sem pensamento, o ser emocional desenvolve-se por si mesmo at que aprende a adaptar-se e harmonizar-se com os outros dois. Enquanto esta lio no apreendida, enquanto este particular ponto de vista no for o seu, ter que sofrer, e no sofrimento, no existe somente destruio, mas tambm criao. Agora, se quiserdes desenvolver a centelha que se acha dentro de cada um de vs at chegar a ser uma chama magnfica que, a seu tempo, se torne parte da chama eterna que o 67

www.lojajinarajadasa.com corao do Bem Amado, necessitais fazer distino das energias e emoes criativas das destrutivas; e ento, entrareis nesse Reino da Felicidade que vos libertar de todos os cuidados terrenos, de todos os terrenos prazeres, de todas as terrenas tristezas, que vos libertar da roda da vida e da morte, e vivereis nesse cimo da montanha onde existe a paz eterna e a eterna harmonia. Afim de distinguirdes entre o que verdadeiro e o que evanescente, entre o que durvel e o que passageiro, tendes que criar um espelho e todo o sentimento que em vs surgir, quer da lama do egosmo quer da pureza da grande devoo, deve ser examinado. Este espelho apresentar vossa mente e vossa inteligncia o que tendes de escolher e o que deveis rejeitar, o que tendes de eliminar e o que deveis conservar. Porm, ao passo que este exame deve ser incessante e persistente, ele se torna tambm perigoso se vos tornardes centralizados em vs mesmos e muito mais interessados em vossos prprios sentimentos, nos vossos prprios desejos do que nos desejos e sentimentos dos outros; pois que deste egocentrismo, naturalmente, surge a morbidez, a depresso e a tristeza. Aqueles que buscam o caminho da paz devem lutar contra este perigo. Aqueles que buscam a Verdade, posto que examinem a si mesmos, posto que se inspecionem, faam indagao, e critiquem as emoes do eu, no devem ser mrbidos, no devem olhar apenas para dentro de si, porm devem voltar-se para o exterior com contentamento e atividade. Quais so, pois, as energias destrutivas que nos atam, que nos tornam estreitos e atuam no sentido da limitao? A clera e a irritao, o cime e o dio prendem, como tambm os aborrecimentos, as nossas invejas de outrem, o nosso dio a outrem, o nosso egocentrismo; tudo isto limita, liga, todas essas emoes so destrutivas. Por outro lado, existe somente uma energia construtiva, que pode ser desdobrada em mltiplas outras, e essa o amor. O amor, na sua forma mais rudimentar experimentado tanto pelos animais como pelos seres humanos, porm, desse amor, nasce a devoo, que o amor na sua mais alta expresso, que impessoal, puro forte e sereno. No desenvolver este amor superior tendes que passar da treva para a luz, do irreal para o real. Assim, seja qual for a forma do amor, ainda que mesquinha, no desenvolvida, no estgio de boto no aberto, apegai-vos a ele, animai-o, glorificai-o e tornai-o puro, pois o amor, seja qual for a sua forma, criador e expansivo. O amor de um indivduo por outro, posto que limitado, gradualmente evoluir para o amor da ptria, pela fora da evoluo, at que oportunamente se tome o amor por todo o mundo. Podeis traar para vs prprios o processo de expanso deste amor. Um tal amor, se for devidamente cultivado, verdadeiramente compreendido, produzir a cultura, o refinamento, pois que o refinamento e a cultura so produtos da considerao por outrem. Sem um corao calmo e, alm disso, vibrante, no compreendereis a chama que baila constantemente, que sempre est viva e eternamente ardendo. Assim, afim de produzirdes essa dana criativa do amor, tendes que possuir dentro de vs o percebimento de que sois parte da chama, parte desse mundo eterno no qual existe a Libertao e a Felicidade. Krishnamurti, na busca dessa Felicidade e Libertao que a todos igualmente espera, viveu outrora no vale, onde por muitas vidas foi escravo das emoes, dos desejos, dos anelos somente do corpo fsico. Pois que, em seu progresso para o cimo da montanha, esse indivduo teve que provar, que experimentar, teve que colher os frutos de todas as emoes, de todas as tristezas, de todos os prazeres afim de preencher e atingir o fim. Porm, pelo processo gradual do tempo, pelo sofrimento, por meio de desejos os mais intensos, tornou-se escravo das emoes, foi colhido no turbilho dos desejos e anseios e durante muitas vidas permaneceu nesse estado; depois, gradualmente, assim como a primavera vem aps o inverno fatigante, comeou ele a perceber que a Felicidade, e a Libertao s poderiam ser alcanados por meio da subjugao e domnio do corpo fsico e das emoes; e que, por isso, necessitava desenvolver a mente, pois que a mente o guia, o dominador. Vida aps vida, comeou a acumular experincias nessa mente, exatamente como se enceleira o gro. Como se constri um edifcio tijolo por tijolo, gradativa e vagarosamente, pelo trabalho, pela luta, pela tristeza, pela energia criativa e pela imaginao, assim tambm comeou, por meio desta experincia, a construir em sua mente o edifcio que o deveria levar morada do Bem Amado. E mediante a construo deste edifcio, por meio do aperfeioamento dos seres fsico, emocional e mental dentro de si mesmo, por meio da harmonizao gradual e do domnio dessas entidades, tornou-se capaz de entrar em contado com essa voz que a voz da experincia, que a intuio, a voz de toda a humanidade; pois o resultado da experincia o mesmo para todos, quando as lies da 68

www.lojajinarajadasa.com experincia houverem sido aprendidas. Como uma corrente que a princpio muito pequena e insignificante e colhe mais guas medida que avana, recolhe em si mesma outras pequenas correntes at que se torna um rio caudaloso e se une ao oceano, assim Krishnamurti tornou-se capaz de colher experincia, pouco a pouco, vida aps vida. Posto que insignificante a comeo, pelas suas lutas, pelos seus anseios, pelos seus prazeres, pelas suas devoes e pela sua energia, tomou-se capaz de ser como uma torrente rumorosa, e assim pode unir-se ao Bem Amado. Assim, o comeo e o fim, assim a noite e o dia se juntaram. Posto que fosse uma pequena individualidade no comeo, tornou-se capaz de ver o Bem Amado e de, a seu tempo, perder-se a si prprio nessa conscincia, nessa chama, nessa Libertao e Felicidade. Afim de atingir esta Libertao e Felicidade que a meta para todos, que para todos a finalidade, aqueles que procuram tal finalidade tem de compreender, devem aprender a dominar, a guiar e adestrar as suas mentes. A maioria das pessoas d-se ao trabalho de manter o corpo fsico belo, jovem, vvido, cheio de energia e to destro quanto possvel; porm, como a mente no percebida, no lhe prestam tanta ateno quanto ao corpo fsico; aquele porm, que quiser atingir a Libertao, aquele que quiser compreender esta Felicidade, aquele que se quiser unir com o Bem Amado, aquele que quiser proporcionar Felicidade e Libertao aos outros, tem que aprender a despender uma grande parte do seu tempo e energia afim de criar uma corrente grande e pacfica. Necessita possuir uma mente dominada e apesar disso elstica, que ceda, que no seja estreita, uma mente desejosa de aprender, apurada e culta; e para aquisio de uma tal mente, a experincia durante muitas vidas se faz necessria. Pois das lies da tristeza e da dor, das lies dos anseios e imensos desejos, nasce a inteligncia - a inteligncia que discerne, escolhe e encaminha. Afim de atingir a Libertao a mente que deve atuar como guia e no os entusiasmos, quer das emoes, quer do corpo fsico. Pois a mente um criador ou um destruidor e, como a mente est sempre construindo ou destruindo por si mesma, sem atender aos seres emocional e fsico, enquanto no for levada harmonia com os outros dois, no cultivar a intuio. O mais elevado propsito da mente desenvolver essa intuio que encaminhar o nosso ser inteiro de vida em vida. Como na mente existem os lados construtivo e o destrutivo, consideremos, em primeiro lugar, o construtivo. A meta e o fim para todos, independentemente de temperamento, independentemente de nacionalidades, independentemente de todas as coisas, a Libertao e a Felicidade; e no desenvolvimento do lado criativo da mente reside a compreenso da meta. Aqueles, portanto, que quiserem ser libertos, que quiserem entender esta felicidade, necessitam estudar e compreender todas as faces da vida e no uma somente. Ao ajudar os outros a atingirem a Libertao e a Felicidade temos que encarar todas as formas de vida - religio, poltica, cincia e arte. Todo o ser humano, quer ele seja de uma regio distante ou de nosso prprio pas, deseja atingir esta Libertao e Felicidade; qualquer destas formas pode ser o seu meio de ating-la. Aqueles que quiserem ajudar a outrem realmente de um modo duradouro, necessitam buscar por que linhas melhor podem utilizar suas energias criativas. Do lado destrutivo da mente - pois enquanto no atinge o estado de Libertao toda pessoa possui tanto o lado construtivo como o destrutivo encontra-se a intolerncia. A no ser que compreendais que a Libertao e a Felicidade constituem a meta, a finalidade para todos, manifesta-se a intolerncia; e desta intolerncia nasce a critica e o sentimento de superioridade. Porm, quando compreenderdes que o fim para o homem a libertao, como a finalidade do rio o oceano, no haver mais intolerncia, nem crtica, nem dio, nem sentimento de superioridade. Uma outra face destrutiva da mente, o exagero da importncia do eu separado, do eu que naturalmente, pelo decurso do tempo, durante o perodo de ascenso, da plancie at ao cimo da montanha, glorificado, torna-se cada vez mais poderoso, at que, finalmente destrudo e torna-se parte do eterno, do Bem Amado, parte dessa chama. Enquanto isto se no houver realizado, a importncia do eu, o exagero do eu, existe em todos ns e da nasce o orgulho do indivduo, da nasce o orgulho destrutivo e desse orgulho vem a crueldade, a crueldade mental da superioridade, da indiferena e deste nasce a arrogncia, o orgulho de raa, de casta, de riqueza, de cultura, de refinamento. Assim, aquele que quiser desenvolver o lado construtivo de sua mente, necessita compreender que, a Libertao e a Felicidade so a meta nica e que somente trabalhando para isso a intuio o auxiliar.

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www.lojajinarajadasa.com Na sentido de construir este lado criativo do intelecto, preciso que haja solido, tempo para pensar, tempo para colheita, para contemplao, para sonho, para meditao. Necessitais aprender a dominar a mente, a tornar a mente ativa e, ao mesmo tempo, obediente; e, quando for completa a unio dos trs seres dentro de vs, ento a voz da intuio vos guiar para sempre e vos conduzir Libertao e Felicidade. A Libertao e Felicidade um produto de vs prprios, posto que todos, ao ating-la caminham juntos; uma criao individual, posto que todos, ao criarem-na, se encontram reunidos; a descoberta deste Reino da Felicidade e Libertao decorre de uma energia e esfora individual, mas, ao descobrir este Reino da Felicidade e Libertao vos encontrareis com todas as pessoas do mundo que se esforcem, que conquistem e que alcanarem o xito. Assim, a mente, o corao e o corpo, quando unidos, se juntaro ao Bem Amado, ao Eterno e a essa chama da qual cada eu individual uma centelha. A ESTRELA - Vol. I N. 9 Setembro de 1928

OS DESCONHECIDOS J. Krishnamurti

Nas grandes altitudes Onde os montes nevados Vo de encontro ao firmamento azul, Reparei dois estranhos. Palestramos um pouco E nos separamos depois Para nunca mais. Como duas naves Nas guas abertas do mar Passam uma pela outra E seus viajantes Acenam mutuamente Para no mais se verem, Assim se deu conosco Neste oceano da vida. As vezes sentia-me triste A passagem De um desconhecido, Por algum lugar solitrio. 70

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Porm ontem Quando os dois desconhecidos Com quem me deparei Desapareceram Nas voltas de uma senda estreita, Meu corao foi com eles, E comigo eles ficaram; De que pas, A que f pertenciam, Eu no sei Nem de tal cuido. Estavam como eu, Num lugar solitrio, Buscando vises novas, Galgando alturas maiores, Vencendo perigosos caminhos, Para descerem ao vale Novamente. Esta incessante luta Para galgar o cimo da montanha, Raramente lhe atingindo a glria, Porm voltando sempre s plancies, Onde o homem faz sua morada Tem sido o meu lidar Vida aps vida. Porm agora, desconhecidos, Atingi o pinculo Da serra misteriosa. Conheo muito bem 71

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As lutas que ela implica, As grandes fendas que dividem, Os precipcios em que os homens se despenham. Conheo muito bem A multido de sendas Circundando a montanha Mas todas se encontrando No trilho estreito Para alm do qual Todos tm que subir Se quiserem alcanar O cume da montanha. S existe um caminho Que l wm cima conduz Para alm desse atalho. No qual todas as sendas Convergem. Desconhecidos, No sei Onde estais vs Por que alegrias, Porque lutas passais. Porm, vs sois eu mesmo. Como duas estrelas Vm de sbito ao ser Numa noite escura, Assim vs dois Entrais em minha viso E nela vos firmais. Meu corao o corao Do meu Bem Amado, 72

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Abrange a multido. desconhecidos meus, Uma vez mais Viremos a encontrar-nos, Vs e eu. Habito na morada Que o fim De todo o jornadear. Unir-se ao Bem Amado amar tudo. Pois que em tudo Habita o Bem Amado. A ESTRELA Vol. 1 N. 9 - Setembro de 1928

VERDADE OU LEALDADE J. Krishnamurti


(Discurso Inaugural, Acampamento da Estrela, 4 de Agosto de 1928)

Quero palestrar muito seriamente esta manh e espero que me presteis vossa cuidadosa ateno, e por isto eu entendo que deveis encontrar-vos mais prontos a ouvir do que a efetuar o sacrifcio dos no sbios, mais ansiosos por compreenderdes por vs mesmos, do que por submeterdes vosso entendimento, por limitado, por inexperiente que seja, autoridades externas, influncias, imaginaes e propsitos exteriores. Assim, durante a prxima semana, a fim de poderdes tornar perfeitamente claro a vs prprios o que tenho a inteno de dizer-vos, muito gostaria que exclusseis de vossas mentes todas as coisas que tende a complicar, tais como crenas, dogmas, meias verdades, tomadas da compreenso de outrem; e tentsseis acompanhar-me durante toda esta semana com corao lmpido e mente equilibrada. Como terra crestada que espera a chuva que h de produzir a verde folhagem, flores perfumadas e sombras aprazveis, assim, tambm, durante dezessete anos, haveis construdo por vossas mos certos abrigos de conforto nos quais imaginais que podeis descobrir a Verdade; nos quais pensais atingir essa eterna felicidade, essa certeza de propsito, essa esperana durvel que h de nutrir e encorajar vossas mentes e coraes. E assim como a chuva, traz existncia renovos verdes dos ramos mortos de ontem, assim a Verdade produzir o entendimento em vs, se realmente expelirdes todas as vossas mesquinhas fantasias, vossas semi-adquiridas verdades, vossas pequenas esperanas, vossas crenas nebulosas, e se examinardes as vossas mentes e vossos coraes lmpida e puramente com uma nsia que provenha do xtase do propsito. Para algumas pessoas, temo eu que este Campo se tenha tornado um hbito, como um lugar de veraneio durante o estio onde se reunam para uma temporada agradvel. Outros, 73

www.lojajinarajadasa.com porm, vm aqui no tanto para gozarem o ar livre, o espao aberto, as rvores verdejantes e a tranqilidade, mas para buscarem como distinguir entre o que importante, essencial, perdurvel e o que no importante, no essencial, transitrio. E se viestes para o Campo para no inquirir, para no duvidar, mas simplesmente para vos divertirdes, meramente para buscar um abrigo para consolo vosso, ento o Acampamento, em si mesmo, tornar-se-vos- intil. Apraz-me sugerir-vos que, enquanto aqui estiverdes durante esta semana, devereis duvidar de tudo, por tudo de lado, tudo quanto houverdes colhido durante estes dezessete anos; pois que, se quiserdes subir, grandes altitudes, pouco podereis levar convosco; se quiserdes mergulhar nas guas profundas pouca coisa devereis conduzir convosco. Assim, tambm, do mesmo modo, se quiserdes compreender a Verdade que vos vou expor, que para mim a Verdade absoluta absoluta no sentido de ser infinita -, deveis deixar de parte a colheita destes mltiplos anos. Porm, ao passo que efetuais isto, no vos deveis tornar negativos, porque, ento, sereis influenciados pelo que eu digo enquanto aqui estiverdes; e to depressa deixeis este lugar sereis influenciados por outrem. Assim, eu vos incitaria, a cada um de vs, individualmente e no coletivamente, a duvidardes de tudo; e, como no estais - acostumados a duvidar, isto vos vai ser muito difcil. S encontrareis a Verdade colocando de lado tudo quanto houverdes alcanado e no sentindo-vos satisfeitos com o resultado de vossa experincia. pela negao constante, pelo constante por de lado tudo que houverdes ganho, de modo a subir mais alto, que entrareis no Reino da Felicidade onde existe a Verdade que o remate da vida. Chegamos a uma poca em que cada um de ns tem de certificar-se por si mesmo, manter-se por si mesmo, em que cada indivduo deve defrontar seu prprio entendimento e em que cada qual tem que decidir se transigir com pequenas coisas que so uma traio Verdade. Eu vos explico o que entendo por isto. Abrir curso s pequenas coisas , s vezes, necessrio e no tem muita importncia. Se algum me pedisse para vestir um casaco cinzento em vez de um azul, certamente eu o faria; porm, se algum me pedisse para transigir com a Verdade, o que significa desperdcio de energia em coisas que no tm valor, ento eu no o faria. Como disse, chegamos a um tempo em que precisamos decidir (no digo isto como uma ameaa, no o digo seno com a esperana de convidar-vos a entrar nesse Reino da Felicidade, Nirvana, Libertao ou como quer que o chameis); porm, assim como haveis esperado durante dezessete anos, esperando, inquirindo, maravilhando-vos, considerando ansiosamente todas as coisas, e como a chuva desce a uma terra crestada, assim, no final desses anos o esperado acontecimento teve lugar - se fordes sbios, equilibrados, e se estiverdes desejosos de encontrar a verdade que absoluta, que, no conhece variao, que incondicionada, ilimitvel, ento deveis estar preparados para vos despojardes de tudo que houverdes conquistado. No vos impele a vida constantemente para a frente, no vos deixando, permanecer em um lugar nico? No vossa tristeza criada pela estagnao, pela imaginao de que obedecendo a autoridades externas encontrareis a Verdade? Para encontrardes a Verdade, como vo-lo disse, deveis desejar negar tudo quanto houverdes acumulado. Durante estes dois anos ltimos, como as guas suaves que serpenteiam atravs das plancies, assim temos coleado sem qualquer propsito definido. No desenvolvemos essa branca chama que necessria afim de queimar as escrias acumuladas. E pelo fato de ter havido o esprito de avano fcil e suave compreenso, de autoridade, de engano, chegou o tempo em que, cada qual, sem ser embaraado ou impelido por outrem deve decidir por si mesmo se quer reconciliar pequenas coisas com a Verdade. Como disse, no podeis transigir com a Verdade e pelo fato de todos estarem tentando conciliar o inconcilivel manifesta-se a tristeza, h a luta, a discusso, e a confuso. Embora vos junteis aqui todos os anos para me escutardes, e para gozardes o ar livre e a fogueira do Acampamento, se no fordes sbios esta reunio ser intil. Se no inquirirdes desde o prprio incio as vossas razes para aqui estardes, o Acampamento no ter valor para vs. Se no houverdes duvidado dos prprios alicerces de vossa estrutura, vossa edificao no perdurar. Como haveis de construir para um sculo ou para muitos, muitos sculos sobre alicerces fracos que no duraro um ano? Tudo que houverdes construdo poder ser derrubado pela dvida por haverdes baseado vosso entendimento, atravs das idades, sobre a autoridade, sobre o culto pessoal. Peo-vos, no vos agiteis, no desencadeeis vossas emoes, no permitais que o vosso intelecto se aposse de vs. Para entender sabiamente, preciso que tenhais harmonia da mente e do corao e a compreenso que nasce com o esprito do conhecimento. Durante este Acampamento quero que vs, atravs das vossas ansiedades, das vossas agitaes, do vosso excitamento, tenhais um sonho que seja duradouro; e alcanceis a viso que perdura. 74

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E s podereis efetuar isto, se possuirdes um entendimento claro dos propsitos da vida e da plenitude que advm desse entendimento. Portanto, se fizerdes convite dvida a partir deste momento mesmo e no deixardes que ela insidiosamente rasteje para as vossas mentes e coraes, ento, aquilo que restar ser a Verdade e o que no for essencial nem permanente passar, e sereis capazes de ir para o mundo e satisfazer a sede ardente, a tristeza de todos. Que tendes que temer? Por que vos achais todos ansiosos? Porque estais vos esforando por conciliar vossas crenas com o inconcilivel que a Verdade, esforais-vos por achar abrigos onde no os h, esforais-vos por encontrar esperana onde ela no existe. A Verdade no proporciona esperana; mas d a compreenso e, desde o momento que tenhais compreenso, tudo mais de secundria e, portanto, falvel importncia. E, como tendes que vos retirar no final deste Campo e vos dispersar pelo mundo, se no houverdes entendido, se por vs prprios no houverdes encontrado a Verdade, porm se tiverdes desviado vossa compreenso sobre a autoridade de outrem, todos os ventos e tempestades da dvida exterior destruiro aquilo que houverdes construdo durante esta curta semana. Assim, quisera que vs construsseis comigo esse poo que extinguir a sede de todos os povos do mundo. A nica coisa de importncia na vida, a nica coisa essencial, o nico propsito vital da vida dissolverdes os vossos problemas, estabelecerdes as guas da vida dentro de vs mesmos e no simplesmente tomar as guas ralas de outrem, ou as guas que em mim se acham estabelecidas. Isto assunto bastante srio para que continueis a vos sentir satisfeito de brincardes com os instrumentos que escavam o poo. Espero que todos vs estejais pensando comigo, pois que, se meramente vos derdes a escutar as palavras que utilizo, perdereis o significado que sob elas se encontra. Necessitais, antes, colher esse esprito de entendimento que se encontra por detrs de todas as palavras. Assim, pois, enquanto vos encontrardes neste Acampamento, durante esta curta semana, eu sugeriria que buscsseis a solido - essa solido de que vos atemorizais tanto. No deis ouvidos a outrem, por sbia e profunda que seja a sua interpretao da Verdade; no permitais que as vossas emoes e a vossa mente sejam arrebatadas, porm mantende-as sob domnio, em equilbrio, para plena compreenso da Verdade. E quando buscardes a solido, longe dos torvelinhos das dvidas de outras pessoas, de suas perguntas, ansiedades e fantasias, se vs prprios convidardes a dvida, ento descobrireis esse poo de Verdade cujas guas saciam a sede do mundo. E como hbito do homem o egocentrismo, sugeriria que mais que nunca estivsseis centralizados em vs mesmos, afim de que a vossa ego-centralizao se torne to forte, to pura, que encontreis a Verdade, que removais todas as sombras e extirpeis toda a desarmonia de vossas mentes e coraes afim de que permaneam puros. No fim de tudo, ter uma compreenso plena, com harmonia da mente e do corao, eis o propsito da Vida. Necessitais de tantas coisas para vos auxiliar e guiar, tantas muletas para proporcionarem o entendimento. As muletas no do o entendimento; dificultam a marcha; impedem, embaraam a vossa marcha para adiante. Durante esta semana, deitai fora todas as vossas muletas, deitai fora todas aquelas coisas que imaginais serem to necessrias para a purificao e fortificao das vossas mentes e coraes. Assim como no verde recncavo existe uma primavera perptua, que o mantm fresco, vvido e alegre, assim, tambm, se puserdes de lado todos os cuidados oriundos de vossas fantasias, aquelas coisas que at agora haveis considerado essenciais para o vosso crescimento, encontrareis uma primavera que conservar vossa mente e vosso corao eternamente jovens, jubilosos, brilhantes. Depois disto, se me dado sugerir-vos uma coisa sem ser erradamente entendido, no sejais leais a ningum, porm sede leais a vs prprios. Por serdes leais a tantas pessoas, haveis vos esquecido de como serdes leais Verdade que vs mesmos. Para vs, lealdade a uma pessoa maior do que a lealdade Verdade; espero que nunca sejais leais a mim, mas que o sejais antes a vs mesmos e, ento, encontrareis uma primavera perptua que manter vossas mentes e coraes eternamente puros, afim de que a todos sejais leais no mundo. Pelo fato de serdes leais a um indivduo, excluis de vossa mente e corao a lealdade devida a todos e a lealdade devida a vs prprios. Assim, se fordes sbios durante esta semana, encontrareis aquilo que buscais; encontrareis a fora e a compreenso que vos dar sua manuteno, sua grandeza, seu poder para vos elevar. Chegou o tempo, como o disse, em que no mais deveis transigir com a Verdade; em que no mais vos deveis sujeitar s imposies da autoridade, pois se o fizerdes, no encontrareis o eterno e absoluto. Durante muitos anos haveis boiado a fluxo das guas suaves onde no h muitas rajadas e tempestades, porm onde tudo segue pacificamente; e agora haveis chegado aos mares abertos, quer o queirais quer no, onde existem tempestades e 75

www.lojajinarajadasa.com tormentas, onde todos os vossos navios naufragaro de modo a serdes experimentados quanto vossa compreenso da vida, que por vs prprios haveis estabelecido no reino da Verdade. No que a mim se refere, encontrei a Verdade e esta Verdade em mim est estabelecida; e como me escutais todos os dias, vou criar em vossos coraes e em vossas mentes uma tempestade de dvida, uma tempestade de ansiedade, afim de que encontreis felicidade duradoura, sem variao e por meio dela realizeis a finalidade da vida. Geralmente, vindes a este acampamento para serdes protegidos contra as vossas ansiedades, as vossas dvidas, porm durante esta semana, vou arrebatar-vos, se o puder, todos os travesseiros, todas as muletas, de que dependeis; no porque eu seja rude, mas porque estou enamorado da vida, enamorado de cada um de vs e vos quero enamorar de todas as coisas e no somente de uma nica manifestao dessa vida. Sei que vos retirareis daqui dizendo: quo duro e cruel ele ; porm, o que preferis? Um mdico que vos cure e vos d o poder de vos manterdes eternamente com sade, ou um mdico que vos d drogas momentneas para curar vossos sintomas sem tocar na raiz da doena? Assim falo no por ser rude, mas ao contrrio, por um imenso afeto que tenho no meu corao e por causa deste afeto, deste amor, quero mostrar-vos o caminho para atingirdes a primavera eterna cujas guas devem limpar vossas mentes e coraes. Podeis ter - como sei que tendes - grande devoo a esta forma, porm no tendes a mesma devoo Verdade que o que em vs eu quero despertar. Podeis dar-me vosso afeto; podeis demonstrar-me vossa devoo, porm, na realidade, isto no de grande importncia; o que importante, que vos torneis discpulos da Verdade, no do intermedirio, - no da sombra que se mantm entre vs e a Verdade. Assim, digo-vos novamente que chegou o tempo em que no mais podeis reconciliar vossas pequenas crenas coma Verdade; antes quero uma pessoa que no tente transigir com a Verdade, do que milhares que continuamente estejam traindo a Verdade; antes quisera uma pessoa que compreendesse do que milhares delas que meramente se limitem a repetir as minhas palavras com mscara diferente. Assim, durante esta semana, afim no serdes insensata, mas sim sabiamente transtornados, espero que prepareis vossas, mentes e coraes, deles tirando todas as ervas daninhas que contm. Pois ides ser derrubados. No me importa que no final desta semana, todos vs decidais no voltar ao Campo no prximo ano; no me preocupa se no fim desta semana no mais me conserveis em vossos coraes e mentes, porm quero mostrar-vos que aquilo que falso, que transitrio, jamais vos poder levar Verdade e Felicidade. Afim de atingirdes, afim de obterdes a finalidade, tendes que passar por grandes descontentamentos, grande revolta, grande tumulto, porm vs no quereis passar por isto. E como no tendes tido vontade de o fazer nestes ltimos dois anos, e por ter chegado agora o tempo de se fazer isto, eu o farei para vs, no por crueldade; no por ser rude, no por falta de afeio, mas, ao contrrio, por amor. Estou apaixonado, no por vs, mas pelo que est para alm de vs, no pelos vossos semblantes e vestidos mas pelo que Vida, pelo que o Bem Amado. E porque estou enamorado, quero vos tornar nobres, puros, fortes, afim de que vossa manifestao, vossa expresso, perdure e d o consolo que provem do entendimento. Assim, se fordes sbios, daqui por diante, durante esta semana estareis preparados para duvidar de tudo. Todos os vossos sistemas, vossas filosofias, vossas meias-verdades devem desaparecer para encontrardes o Eterno. E espero que no deis ouvidos a ningum, porm que somente escuteis a vossa intuio, o vosso entendimento, e deis uma polida recusa a todos aqueles que quiserem ser vossos intrpretes. No fim de tudo, o problema individual o problema do mundo. Se o indivduo for feliz, harmonioso e estiver em paz, ao redor dele haver felicidade, harmonia e paz. Quando deixardes este campo quero que tenhais estabelecido por vs prprios essa paz e essa compreenso que no podem ser abaladas. A ESTRELA Vol. I N. 10 Outubro de 1928

A BUSCA DO BEM AMADO J. Krishnamurti

Amigo, 76

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Eu indico o caminho Que abre teu corao vinda do Bem Amado Como o metal precioso achado grande profundeza E sua descoberta Fundo tens que sondar No corao do mundo, Assim tens, Se contemplar quiseres A face ao Bem Amado, Que bem fundo sondar teu corao, E despedaar Vu aps vu Que encobrem a Glria, A Luz da tua vida. Como o fogo Se entenebrece Com espessa fumaa Antes de vir a ser A chama que ruge, Assim, amigo, Teu corao e mente Esto em treva nevoenta Que pode ser dispersa S pelo teu desejo E purificado propsito. Amigo, Teu Bem Amado, Desejo de teu corao, o meu Bem Amado. 77

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Em tempos pretritos Havia um vu Que O separava de mim, Porm hoje Destru Essa separao E O recebi dentro de meu corao. Ali habito E consumido estou Por Seu amor. E digo-te Que o meu Bem Amado o Bem Amado de todos. Ele e eu somos um, Inseparveis estamos, Na eternidade e para sempre. Sim. Eu encontrei o caminho Que te oferece o xtase Do propsito Que em ti evolver a beleza Da Vida, Que te dar ventura E a todos. Que te ser portador do conforto Da verdade. Amigo, No esperes pelas sombras escuras Que ho de encher o vale interceptando A vista ensolarada da montanha, Pois que luz do dia 78

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Podes ver o caminho Que te h de conduzir s grandes altitudes Onde as nvoas da vida No te ho de confundir. este o tempo Em que avanar devers Na luz meridiana O Bem Amado contigo Pois Ele e eu somos um. Amigo, Assim como no inverno No podes semear as sementes Que te ho de dar A nutrio do ano a vir, Assim em horas de treva, De luta e confuso No podes deitar os alicerces Da felicidade duradoura Que h de ser a primavera Da tua vida. Amigo, Como na primavera Em que toda a semente Brota do solo Para a glria de sua conquista Assim nos dias De teu rejubilar grandioso Todo o ato de teu pensar, Toda a ao de seu sentir Vir a ser Para plena fruio 79

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E h de proporcionar-te O pesar que lhe implcito. Amigo, Como ao cair das folhas triste Ver a verde folhagem Desmaiar e morrer, Angustioso tambm Que vinda a desolao Ningum venha livrar-te Das sombras de tua criao. Amigo, H pocas para tudo. Este o tempo Em que avanar tu deves Na meridiana luz. O Bem Amado contigo Pois Ele e eu somos um. Qual viajor Com plena cincia De seu roteiro Deixa de lado Todas as coisas que o sobrecarregam Na jornada, Assim, amigo, Deixa tudo de lado Tudo o que te embaraa Em tua viagem Em busca do Bem Amado. Pois sem o Bem Amado No haver consolo, 80

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Nem to pouco regozijo, Nada de permanente Em tua felicidade, Mas antes, Haver confuso, Luta e conflito nos propsitos, Escurido e busca, E a labuta e a misria. Amigo, O Bem Amado s tu, Mas para o realizares E para conserv-lO Firme em teu corao, Seguro em tua mente necessrio que no exista Recinto escuro e oculto Em teu ser. Nenhum pseudo-consolador Nem Deuses agradveis Que te dem advertncias Fceis de seguir, Cobias que te prendam, Crenas a te abrigarem Em sua escura sombra, Pensamentos, Afetos que te sejam embaraos. Amigo, Persegue o eu De um a outro abrigo De um templo a outro maior De um desejo a outro ainda mais vasto 81

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De uma vaidade a outra mais potente E sem piedade expulsa-o De suas delcias pela senda abaixo, Inquire-o sem cessar Em suas mortais incertezas At que pelo tempo amigo O conduzas luz meridiana Onde no deite sombra Onde se una Com o Bem Amado. Ento sentirs O Bem Amado, Ento sers Semelhante a ti mesmo. Amigo, H pocas para tudo. E este o tempo Em que caminhar deverias Na luz meridiana Pois o Bem Amado comigo Pois Ele e eu somos um. A ESTRELA Vol. I N. 11 Novembro de 1928

O TEMPO DA COLHEITA DA VIDA J. Krishnamurti


Ms aps ms publicaremos em "A Estrela" as palestras realizadas por Krishnaji, para um grupo de estudantes reunidos, no vero passado, no castelo de Eerde. No foram revistas por Krishnaji, pois isto importaria em uma demora de muitos meses em sua publicao. Leram-nas, no entanto, cuidadosamente,

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varios daqueles que a elas assistiram e estes as consideram reproduo correta e exata do que ento disse Krishnaji. O tom quase pessoal - inevitvel, falando-se a um grupo de amigos - traduz com preciso a forma por que foram pronunciadas as palestras.

Em meu quarto, onde havia muitas flores, onde havia muito sol, apesar de estarem fechadas todas as janelas, eu vi ontem uma borboleta esvoaando contra as vidraas: ela via o cu azul, do outro lado, e procurava fugir para o ar livre e portanto, para a liberdade. Eu a observei por algum tempo. Primeiro ela subiu para ver se havia alguma passagem em cima; depois veio para baixo; esvoaou pela janela toda sem poder achar nenhuma sada, at que afinal eu abri a vidraa e deixei-a sair. Assim so os homens; esto presos numa gaiola de cristal, e procuram fugir para o ar livre. Mas, antes de experimentar um intenso desejo de fugir, (como o da borboleta quando cobia as flores, o perfume, o mel e as suas companheiras), os homens procuram saber de que vidro feita a gaiola, que idade tem o cristal, quem o manufaturou, em que poca foi formado, se ele possui o seu correspondente em outros planos, se o Logos o criou ou se ele foi feito pelo homem, e se o plano fsico o nico em que existe o sofrimento. Ao contrrio da borboleta, eles no tm desejo algum de fugir, eles no tm desejo algum de se libertarem por completo e de voar para a imensidade na qual h ventura e liberdade. Eles sabem que essa liberdade, essa libertao e essa felicidade existem; mas, antes de realiz-las, antes de poder goz-las, eles precisam de fazer todo aquele minucioso exame, dos pormenores da construo, do material do vidro da gaiola. Esto presos a essas coisas sem valor, e no podem encontrar a liberdade que as suas almas amam, pela qual anseia o seu ser inteiro. E o meu propsito, durante estas prelees, tem sido mostrar-vos como estais aprisionados nessa gaiola de cristal. Embora percebais a luz do sol, a liberdade l fora, continuais contudo fechados na gaiola de cristal. E, enquanto no desejardes fugir, enquanto no buscardes Libertao e Felicidade, permanecers engaiolados, porque a vossa Libertao s poder vir quando for aniquilada a gaiola de cristal que vos aprisiona. Tal aniquilao consiste no desdobramento do eu, o que eventualmente, a destruio do eu. E porque tendes orgulho de vossas pequenas vaidades, de vossas pequenas interrogaes, de vossas pequenas ansiedades, que estais ainda encerrados na gaiola de cristal. Todavia, no momento em que perceberdes a imensidade do firmamento azul, no momento em que sentirdes o ar fresco e gozardes do hlito das montanhas, no momento em que no questionardes a gaiola, mas lutardes para despedala com a vossa prpria energia, com a vossa prpria fora criadora, ento comear a realizao interna, ento dar-se- o desdobramento, o desenvolvimento do eu. Nas minhas prelees, tenho procurado mostrar-vos que nenhuma autoridade externa, por magnfica, por admirvel que ela seja, nos pode ajudar. A nica autoridade que deveis obedecer est dentro de vs. Nunca foi meu desejo criar partidrios para mim, nem para o meu modo de pensar; desejei sempre criar em vs o anseio de encontrar a Verdade por vs mesmos, de fugir para aquela plena liberdade, onde se alcana a verdadeira destruio do eu. E, se compreendestes as minhas prelees, achareis que a Verdade o nico guia, o nico Guru, o nico altar em que deveis adorar, e a Verdade o Bem Amado, e o Bem Amado est dentro daqueles que sofrem, que anseiam, que se esforam por achar a Verdade. E o Bem Amado vem para aqueles, e bate a porta do corao daqueles que tm semelhante anseio, que tm o desejo intenso de descobrir e de ser um com o Bem Amado. Como a rvore est carregada de muitas folhas, assim est o homem carregado de ansiedades, tormentos, perturbaes, prazeres ,e alegrias. Como as folhas caem e secam durante o outono, assim, do homem que atingiu a Libertao e a Felicidade afastam-se todas as tristezas, todas as penas, todos os prazeres. Ele eternamente uno com a grande, duradoura, perptua felicidade. Porque aquilo que estabelecerdes dentro de vs jamais poder ser duvidoso, nem poder jamais haver reao contra aquilo que construistes por vs mesmos. A Libertao e a Felicidade, e os meios para conquist-las acham-se em vossas prprias mos, esto ao alcance do vosso prprio poder, so o objetivo final de todos. Se elas estiverem firmemente estabelecidas dentro do corao e da mente de quem as busca, embora este 83

www.lojajinarajadasa.com permanea por muitos dias, como a rvore, carregado de folhas de ansiedade, de tristeza e de prazer, ele poder sempre fazer secar as suas ansiedades, as suas tristezas; poder sempre faze-las cair como folhas no outono. Como no h dvida alguma para mim de que se possa atingir aquela Felicidade, procurei sempre, nas minhas prelees, estabelecer em vossas prprias mentes a viso da Libertao, de modo a no haver nenhuma duvida para vs, de modo que pudsseis ver a realidade por vs mesmos e apreender a verdade daquela viso. E isto afim de que, quando estiverdes no mundo, longe deste lugar, no haja de novo nenhuma questo, nenhuma dvida, nenhuma ansiedade, nenhuma pesquisa, nenhuma investigao ou tatear na escurido. Uma vez firmemente estabelecida a realidade dentro de vs mesmos, podereis sempre retirar-vos para esse recanto de vossa mente e de vosso corao, e buscar ali conhecimento, buscar entusiasmo, inspirao. Para aqueles que procuram, h somente uma fonte de entusiasmo, deleite e felicidade, e essa fonte est dentro deles mesmos; e aqueles que contam com outrem para obter animao e felicidade, fracassaro em suas pesquisas. Aqueles que tiveram a ventura de estar aqui durante estes dias conseguiram, penso eu, estabelecer firmemente a verdade dentro de si mesmos, de modo a no haver daqui por diante nenhuma hesitao na busca dessa verdade. E isto possvel porque criastes em vs mesmos, em vossas prprias mentes e em vossos prprios coraes, o edifcio, o altar e o templo nos quais podeis adorar sem nada externo - pois vs mesmos sois o vosso deus e a realizao da Felicidade e da Libertao. Para obter essa Libertao e essa felicidade, mister que tenhais capacidade de amar, de devoo, e grandes energias, afim de construir este edifcio com magnificncia, de modo que o que tiverdes construdo o tenha sido por vs mesmos, com o vosso prprio material, com o vosso prprio sofrimento, com os vossos prprios prazeres. Porque aquilo que for criado com as vossas prprias mos, durar sempre, e o que for criado com as mos de outrem no durar um s dia. Se isto ficar bem estabelecido dentro de vs mesmos, as vossas hesitaes em busca da Verdade terminaro para sempre. Assim como, no tempo das chuvas, os pequenos regatos e os grandes rios aumentam o volume de suas guas e correm cada vez mais rapidamente para o mar, assim tambm quando o Bem Amado chega, quando o Bem Amado est convosco, atingis mais depressa o vosso alvo; os rios dos vossos coraes e de vossas mentes carregar-se-o de muitas guas, as quais vos impulsionaro para aquele alvo - que a Libertao para todos. De modo que se tiverdes essa mente e esse corao, (feliz oportunidade!) no precisareis esperar que a evoluo venha, impulsionar-vos, impelir-vos, pois, por haverdes percebido o Bem Amado, por estar convosco o Bem Amado, tereis vossas mentes e vossos coraes ampliados e - embora isso leve ainda muito tempo - entrareis naquele oceano de Libertao e Felicidade. O fraco tornar-se- forte e o forte avivar a sua fora. Aqueles que amam tero o seu amor engrandecido e glorificado, e os sofredores buscaro conforto e tero conforto, porque neles unicamente mora o conforto que buscam. Por estar convosco o Bem Amado que todas essas coisas so possveis. Se tiverdes encontrado - e vs tendes capacidade para grande devoo, grande energia e amor - mantereis o Bem Amado em vosso corao e em vossa mente nos tempos de grandes sofrimentos e de grande ansiedade. E, porque tendes o Bem Amado dentro de vs, como eu O possuo eternamente dentro de mim, porque O percebestes por um momento, deveis amar a Verdade, porque a Verdade o Bem Amado. A Verdade a nica coisa que todos devem buscar, pela qual todos devem lutar, pondo de lado todas as outras coisas afim de procurar a luz que iluminar o pesquisador em seu caminho para a paz. Durante as nossas conversaes aqui, eu abri o meu corao afim de que pudsseis perceber a minha Felicidade, porque essa Felicidade a Felicidade do meu Bem Amado, e eu preciso dar aos outros aquilo que possuo. E, porque o meu Bem Amado encheu-me com o Seu amor, no h para mim nenhum esforo, nenhuma luta, nenhuma hesitao, nenhuma pesquisa, nenhum perigo de ficar satisfeito com o transitrio, com o passageiro. Por isso eu, por minha vez, vos darei esse amor, e o darei ao mundo em geral. E, porque h sofredores por toda a parte, porque a tristeza e o prazer se vo sucedendo um ao outro, aqueles que

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www.lojajinarajadasa.com experimentaram este amor que est dentro deles mesmos, que o do Bem Amado, - daro, enchero os coraes dos sofredores, dos tristes, dos fracos e dos fortes. Estivestes comigo durante as ltimas seis semanas, ou mais, no Castelo, e o meu intenso propsito foi mostrar-vos, a todos, os vossos prprios coraes, mostrar-vos as nossas prprias mentes, de modo a vos capacitar a fortificardes os vossos prprios desejos e a purificardes as vossas prprias mentes afim de perceberdes, e, portanto, de atingirdes a Libertao. E eu penso que aqueles que procuraram cuidadosamente e lutaram consigo mesmos por descobrir a meta, encontraram essa meta; e, por isso mesmo que a encontraram, ser-lhes- mais fcil ating-la, e ajudar os outros a avist-la e ating-la tambm. E porque eu alcancei essa Libertao e essa Felicidade, foi minha inteno dar-vos tambm uma grande parte delas, darvos foras suficientes para lutar afim de alcan-las, desejo suficiente de, por vs mesmos, pordes de lado todas as coisas afim de obter aquelas. Como disse por terdes estado comigo, foi minha inteno tornar-vos perfeitos em pouco tempo. possvel, em razo de estar o lnstrutor convosco, alcanardes aquela perfeio em um breve perodo de tempo e, por conseguinte, fazerdes desaparecer o tempo; e, porque estivestes comigo e eu abri o meu corao. para vs e vo-lo dei, podeis agora prosseguir. Porque percebestes (e alguns dentre vs chegaram mesmo a aproximar-se mais daquela glria), precisais prosseguir e d-la, e repart-la, e partilha-la com os outros. Porque alcanastes - no digo a Libertao completa, pois isso no verdade porque avistastes o caminho de vossa vida, porque palmilhastes esse caminho, est dentro de vs agora o tornar-vos perfeitos em breve tempo. Porque vistes a face do prprio Bem Amado, Ele habitar em vossos coraes e pacificar as vossas mentes. Foi minha inteno, durante estas palestras, dar-vos aquilo que eu tenho dentro de mim, fortificar-vos em vossos prprios propsitos. E porque percebestes, haveis de ser sbios no corao e poderosos na fora, e nisso que consiste o vosso dever especial, o vosso prprio dever, aquele que criastes para vs mesmos. Onde quer que estejais agora, haveis de ser os discpulos daquela Libertao e daquela Felicidade. Porque o meu Bem Amado habita em mim, eu senti uma imensa afeio por vs todos, e no estou nada triste nem contrariado por vos irdes embora; mas, ao contrrio, sinto-me feliz por terdes tido a alegria de ver esta Libertao com vossas mentes, e de experimentar esta Felicidade com os vossos coraes. E, daqui por diante, onde quer que fordes, da-la-eis aos outros, se fordes sbios, afim de fortalecerdes a vossa prpria Felicidade, afim de purificardes a vossa prpria viso. Sereis sbios se a derdes aos outros; e no sereis sbios se a guardardes para vs mesmos, se a ocultardes, se a retiverdes para vs mesmos. Vs a destruireis se no a partilhardes, se no a repartirdes com algum. Senti que muitos dentre vs compreenderam, mas muitos dentre vs esto ainda presos nas prprias redes, nas prprias complicaes, e foi muito difcil para mim destruir essa rede, afim de vos libertar. Vs no desejais, pelo menos alguns, ser livres e por isso preferis permanecer na rede; pois, quando vos achais livres, no estais seguros, ficais indecisos. No experimentais a necessidade de ser livres porque tendes medo de vs mesmos, e por causa desse medo, preferis permanecer em vossa prpria rede, em vossas prprias limitaes e dvidas, sombra de outrem. Muitos de vs, penso eu, viram, porm, que a conquista da Libertao e daquele Reino de Felicidade no est fora, mas dentro; no est disposio de outrem, nem sob a autoridade de outrem, nem posse de outrem, mas est dentro de vs mesmos. E foi meu propsito fazer-vos entrar no meu corao, porque ali encontrareis aquele Reino e aquela Libertao que est em vossos prprios coraes. E, porque os vossos coraes estavam encobertos, e as vossas mentes enfraquecidas e enevoadas, foi meu propsito esclarecer as vossas mentes e os vossos coraes, de modo a estabelecer neles esta Libertao e esta felicidade, afim de que no haja nenhuma sombra de dvida, nenhuma questo, nenhuma pesquisa ou hesitao. E, agora que alguns de vs entraram em meu corao e partilharam dele, deveis partir e d-lo a outrem; e, pelos vossos atos, pela vossa conduta - porque na conduta habita a retido - sereis julgados. Sereis conhecidos somente pelas vossas vidas, pela vossa conduta, e no fora, nem pelo vosso aperfeioamento superficial, ou conhecimento superficial, mas pelo modo por que preencherdes os vossos dias aqui em Eerde. A ESTRELA Vol. I N. 11 Novembro de 1928 85

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O BEM AMADO EM TUDO J. Krishnamurti Meu Bem Amado e eu Somos um. DEle provim. Meu ser nEle est. Sem Ele eu sou Como a nuvem Que vagueia, de abrigo Em abrigo, Sem lugar para repouso. Nele est Minha glria, Pois que nEle Todas as coisas existem E eu em tudo. Amigo, Falo-te Do caminho que leva ao corao Do bem Amado. Pois sou o Bem Amado, Meu Bem Amado e eu Somos um. Como a gota de Orvalho Penetra no oceano, Assim me tornei uno Com meu Bem Amado. O Bem Amado

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www.lojajinarajadasa.com Est em tudo, Tudo est no Bem Amado. A haste de erva Que o homem pisa A grande rvore copada Que d abrigo, O verde rptil, Que aterroriza aos homens, A mosca que incomoda, O mercador de doces O pssaro cantor Que deleita aos ouvidos, O leo feroz Que aterroriza O corao da floresta, O brbaro simples Que os homens desprezam, O homem de grande cincia Que a muitos satisfaz, O adorador de muitos deuses Que vai de templo em templo. A Vida una, Como eu e o Bem Amado Somos um. H s uma Senda Para o corao do Bem Amado. Esta Senda reside Em ti mesmo, Em teu prprio corao. Dela eu te falarei. Muitas formas haver

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www.lojajinarajadasa.com De Sua manifestao, Mas s h uma Senda, amigo, E esta me levou Ao corao do meu Bem Amado. Em tempos Em que eu obedecia s leis dos deuses Do mundo, Andava pelos caminhos Que aos seus santurios levavam, E ali Era colhido no poder De sua autoridade mnima. Mas a rajada do descontentamento Arrastava-me para adiante, E jamais permanecia No abrigo Do templo. Como algum que vagueia De lugar em lugar Em busca de conforto duradouro Assim vagueava eu, Pondo de lado os confortos Que me levaram ao sono, At que, com o tempo Abri meu corao; E ali achei o meu Bem Amado. Muito te informaro, amigo, Que h de haver muitas obras,

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www.lojajinarajadasa.com Muitas Sendas, Para se aproximar ao Bem Amado. Sim, haver, Porm todas conduzem Senda nica, Pois que s uma existe Para o corao do Bem Amado. Dela eu te falarei. Se quiseres descobrir Meu Bem Amado Que em mim habita, amigo, Ento precisas Por de lado teus deuses, Teus confortos e semi-autoridades. Deves limpar-te Da vaidade do teu pouco saber. Tens de purificar Teu corao e mente. Tens que renunciar a tudo Teus companheiros, Teus amigos e famlia, Teu pai, tua me, Tua irm e teu irmo, Sim, Deves tudo renunciar. Precisais destruir Completamente o eu Para achar o Bem Amado. Amigo, Querers caminhar

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www.lojajinarajadasa.com luz de simples vela Quando eu te dou A luz do Bem Amado? Digo-te, Meu Bem Amado e eu somos um, Conheo a Senda, Vem comigo, E eu te levarei Ao meu corao Onde o Bem Amado habita. Muitos reflexos h Que desmaiam e morrem, Eu possuo, porm, A verdade Que eterna. Dela te darei eu, Amigo. Porque duvida o teu corao? s tu feliz nas sombras? Do-te os homens, acaso A substncia que Satisfaz a tua fome? Tu brincas pelos rios Cheios de gua Porm no satisfazem A tua sede ardente. Contente ests Com o que decadente? Amigo, Meu corao pesa de amor Por ti.

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www.lojajinarajadasa.com Vem a mim E eu te darei Do meu amor, Que alterao no conhece Que no decai Nem jamais esmaece, Pois o meu Bem Amado e eu, Somos um. Dele eu provenho, Eu te direi Da Senda oculta No corao do meu Bem Amado. A ti eu abrirei O portal Que te admitir morada do meu Bem Amado. O vale jaz na sombra De uma nuvem espessa, E eu habito O cimo da montanha Sim, Meu Bem Amado e eu, somos um. A ESTRELA Vol. I N. 11 Novembro de 1928

EU SOU TUDO J. Krishnamurti

Eu sou o firmamento azul e a nuvem negra. Eu sou a cachoeira e o som que ela produz Eu sou a imagem esculpida e a pedra abandonada, 91

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Eu sou a rosa e a ptala que tomba Eu sou a flor do campo e o Ltus sagrado Eu sou as guas santas e a lagoa tranqila Eu sou a arvore de cima das montanhas Eu sou a haste da erva na plcida alameda Eu sou o primaveril rebento e a copa sempre verde. Eu sou o brbaro e o sbio Eu sou o piedoso e o mpio Eu sou o devoto e o herege Eu sou a meretriz e a virgem Eu sou o liberto e o homem no tempo Eu sou a renncia e o possuidor orgulhoso Eu sou o destrutvel e o indestrutvel, Eu no sou Isto nem Aquilo No sou o liberto, nem aquele ainda enleado, No sou o cu nem o inferno No sou as filosofias nem os credos No sou o Guru nem o discpulo Amigo, Eu tudo contenho. Sou lmpido qual o veio da montanha, Simples como a folha primaveril que rebenta. Poucos me conhecem. Felizes aqueles Que deparam comigo. A ESTRELA - Vol. I - N. 10 - DEZEMBRO DE 1928

NO PODES LIMITAR A VERDADE J. Krishnamurti

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Amigo, Tu no podes limitar a Verdade. Ela como o ar, Aberto, ilimitado, Indomvel, Indestrutvel, No habita em um templo nico, Nem podes encontra-la em um nico altar. No pertence a Deus algum, Por muito zeloso que seja o Seu adorador Podes tu descobrir De que flor Colheu a abelha o doce mel? O' amigo, Deixa a heresia ao hertico, A religio ao ortodoxo, Porm colhe a Verdade Da poeira de tua experincia. A ESTRELA - Vol. I - N. 10 - DEZEMBRO DE 1928

NO POSSO TE ENSINAR A ORAR J. Krishnamurti

No te posso te ensinar a orar, amigo, Nem ensinar-te a chorar. No sou o Deus das tuas longas preces, Nem a causa de tuas mltiplas tristezas, Elas so feitas pela mo do homem. Vem comigo, amigo, 93

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E eu te levarei Fonte da Felicidade. O riso como o mel No corao da flor perfumada. Dele te saciars No jardim das rosas, Onde todo o desejo cessa Exceto o de assemelhar-se ao Bem Amado. Este lago da Sabedoria No foi feito pela mo do homem Nem os degraus que levam s suas lmpidas guas. Ali te encontrars com todo o homem O pardo, o branco, preto, o amarelo Em suas guas puras Contemplars a face do meu Bem Amado Vem, amigo, Deixa toda a alegria passageira, Tuas ardentes nsias, Tuas tristezas que pungem Teu amor que fenece, Teus desejos sempre renovados. Pois todas essas coisas levam somente prece A causa de muitas lgrimas. Como o vento que passa a vida do homem Como a rosa que murcha o amor humano. Glria e fora Que se esvaem apenas em um dia. Profundamente bebi nessa nascente. Meu Bem Amado encheu-me 94

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Com as delcias da eternidade. A ESTRELA - Vol. I - N. 10 Dezembro de 1928

OS OBJETIVOS DA ORDEM DA ESTRELA J. Krishnamurti


Discurso em uma reunio de organizadores da Ordem no Castelo de Erde em Ommen durante o Congresso da Estrela em Agosto de 1928.

Ao apresentar-vos as boas vindas a Ommen, gostaria tambm de vos dizer como me sinto feliz ao ver novamente tantos rostos conhecidos vindos de pases to diversos. Espero que no fim do Campo retirar-vos-eis mais certos de vs mesmos, capazes de distinguir entre o que permanente e o que passageiro. A fim de poderdes encontrar o eterno devereis considerar, no os efeitos, porm antes, a causa de todas as coisas. Espero que seguireis o meu pensamento por inteiro e com considerao, pois tenho muito que vos dizer e preciso resumi-lo para vs to claramente quanto me for possvel. Desejo que penseis cuidadosamente, por ser chegado o momento em que cada um tem de tomar suas prprias decises, em que vos devereis tornar como o ao temperado, tornar como uma chama branca de modo que possais mudar o curso do pensamento e do sentimento no mundo, e no meramente seguir suavemente preso em meandros, como o tendes feito at agora. Como viestes de todas as partes do mundo para ouvir-me, e voltareis para os vossos vrios pases a fim de levar-lhes a vossa compreenso, devereis estar certos de vosso conhecimento e firmes em vossa concepo da Verdade, e no vos deveis incomodar mais com reconciliaes, concedendo e procurando ajustar uma coisa outra. Tomei uma resoluo de nunca ceder a coisas que tenham apenas um valor momentneo, e de ocupar-me sempre e continuamente, sem vacilar, com a causa fundamental das coisas, porque o edifcio s ser perfeito e duradouro se a sua fundao for profunda e resistente. Antes de ir mais longe, quero deixar perfeitamente claro para vs todos que no desejo ser colocado em um pedestal para ser adorado, nem formar uma nova religio, que no tenho discpulos, nem desejo forar pela autoridade a aceitao daquilo que para mim conhecimento, o comeo e o fim da vida. Se simplesmente torcerdes o que vos digo a fim de poder ser ajustado aos vossos prprios pensamentos e efetuar uma reconciliao com as vossas prprias crenas, ser uma perda de esforo. Digo, que o que tenho para vos dar poder curar e sanar todas as feridas; e quando compreenderdes isto no vos sentireis mais feridos em vossas mentes e em vossos coraes nem vos prendereis mais na roda da tristeza. Porm para que possais realmente compreender, no tomeis o que coloco ante vs para tentar torce-lo e amolda-lo s vossas velhas concepes da verdade. Eu falo da copa da arvore, e no deveis confundi-la com a verde folha da grama. No penseis que a Libertao, a Felicidade, e a Vida podero ser torcidas e utilizadas para se adaptarem s vossas velhas idias. Se no concordardes comigo no me incomodarei, se estiverdes violentamente em desacordo com o que digo, tanto melhor, pois que, neste caso estareis dispostos a contender, a discutir e a procurar compreender o meu ponto de vista. Porm, se simplesmente disserdes, concordo convosco, - e ento torcerdes as minhas palavras a fim de se ajustarem s vossas velhas idias, as novas idias vos despedaaro. A Verdade que vos apresento demasiado adorvel para ser rejeitada e excessivamente grande para ser aceita sem pensar. Se quiserdes compreender, devereis vir com a inteno, no 95

www.lojajinarajadasa.com de fazer a Verdade descer at vossa compreenso, porm antes, de subir s grandes alturas onde ela se encontra. S percebereis verdadeiramente quando tiverdes vs prprios vos elevado s grandes alturas. Agora chegamos considerao da Ordem da Estrela e de seus objetivos. Muitas pessoas se tm dirigido a mim - tanto aqui como em outros lugares - pedindo-me para abolir a Ordem. Uma tal Organizao, dizem elas, desnecessria. Tenho-as ouvido sempre, e tenho procurado encontrar a razo de tal desejo. Por terem visto organizaes usurparem a autoridade e ficarem dominadas por personalidades que elas desejam abolir a Ordem. A Ordem da Estrela dever ser uma ponte para as novas idias e no a corporificao delas. Ela dever ser como uma ponte atravs da qual aqueles que obtiverem um vislumbre da Verdade possam levar algo de sua compreenso para o mundo em geral. Deste ponto de vista a Organizao til, mas se os seus membros fizerem dela um fim em si mesma, ento dever extinguir-se. Nenhuma organizao, qualquer que seja sua espcie contm a Verdade. A fim de se poder encontrar a Verdade no necessrio pertencer a uma organizao qualquer. No devemos fazer da Estrela uma organizao cristalizada. Se disserdes ao mundo, Tereis de passar pela Organizao da Estrela a fim de poderdes compreender a Verdade, estareis ento pervertendo a Verdade. Considerai as organizaes que j existem no mundo e que dizem: Ns contemos a verdade, e a fim de que possais compreende-la tereis de passar atravs de nossos portais. A Verdade no reside em nenhuma organizao, nem tampouco no ncleo de qualquer movimento que seja. As organizaes e os movimentos devero existir, somente como pontes para a Verdade. Reclamar autoridade como sendo o vaso que contm a Verdade transforma-la em um potencial inferior. Estou utilizando o termo transformar em seu sentido tcnico - como em uma estao de energia a eletricidade recebida em alta voltagem e ali passa pelos transformadores sendo assim reduzida a sua voltagem a fim de poder ser ento utilizada. Tenho algo que mais precioso que uma adorno, mais estimvel do que qualquer jia, e auxiliareis as pessoas a compreend-lo despertando nelas o desejo de procurar, de se afastarem de suas velhas tradies, hbitos e costumes e deixar que a vida se derrame atravs delas. Ora, a fim de guardar a Vida - que jamais poder ser limitada - esta organizao dever ser flexvel, dever encorajar as pessoas que discordem dela, que no acreditem na idia do Instrutor do Mundo, porm que possam ter uma aspirao de encontrar o blsamo que trar tranqilidade a um corao dolorido e a uma mente perplexa. S podereis conservar uma organizao cheia de vida quando no for restrita a uma forma particular de crena. As organizaes se transformam em barreiras quando as crenas se tornam mais vitais do que a vida em si, ou quando elas se acham mais ocupadas com o crescimento prprio do que com a compreenso da Verdade. Perguntaram-me porque no me ligo a certos movimentos. Oponho-me a eles? No sou antagonista de ningum nem de movimento algum. S me preocupo com as idias que libertam a vida em cada um. de maior importncia destruir as dificuldades, os empecilhos que prendem a vida do que criar novas formas, novas fantasias e novos fantasmas para serem adorados. Se no formos cuidadosos no comeo, no meio, e no fim, destruiremos a prpria coisa que buscamos, desorientaremos os nossos desejos e perverteremos a nossa prpria aspirao de atingir. Depende de cada um de vs a maneira pela qual encara a Verdade. Desejais construir uma nova forma, outra religio, outro Deus, outro credo? Eu sustento que todos criam dificuldades para a vida. Precisais de uma muleta para vos levar ao topo da montanha? Uma fraqueza, a menos que a tenhais vencido e assim vos fortalecido, ser sempre um empecilho. As religies, as crenas, as formas e os dogmas so barreiras entre os povos; e quebrando essas barreiras libertareis a vida. A maioria das pessoas do mundo se preocupam com a criao de novos ritos, novas religies, novos dogmas e novos deuses. Elas convidam as outras para deixarem as suas velhas prises e virem para outras novas. Que valor tem uma gaiola nova para um pssaro que deseja estar solto, para uma vida que se torna miservel na limitao? Depender de vs evitar que a Verdade seja novamente trada por vossos esforos de reduzi-la ao nvel da compreenso da multido, como sempre tem sido feito pelas religies e 96

www.lojajinarajadasa.com seus partidrios. Eles dizem, como as pessoas no compreendem a Verdade, ns lhe vamos auxiliar levando-lhes a Verdade ao seu nvel inferior. Isto jamais poder ser feito, pois a Verdade livre, ilimitada e acha-se alm do pensamento, alm de todas as formas e paramentao das religies. Nem a Verdade, nem tampouco a Vida podero ser mantidas com peias; e no preenchimento dessa Vida, que a Verdade, onde reside a Felicidade. Se compreenderdes que a Verdade jamais poder ser reduzida, transformada em um potencial inferior, condicionada, ento encorajareis as pessoas a procur-la e no procurareis traze-la ao nvel delas. Quando uma criana est comeando a andar, se fordes um pai sbio, deixa-la-eis cair, e nessa mesma queda ela se robustece. No podereis trazer para baixo a beleza do cimo da montanha; no podereis segurar os ventos com as mos, nem conter as guas em um pano. Assim, para os que se acham imersos na tristeza, que se acham em luta, que estejam procurando compreender, devereis dizer, Ide em direo Verdade, lutai, sobrepujai todos os obstculos; ao invs de procurardes trazer a Verdade, rebaixada, condicionada e limitada pela vossa compreenso particular. Tanto na limitao como na restrio h sempre a tristeza; e em separar-se das restries, em libertar a vida que se encontra a Felicidade. Assim, repito, no pervertais o que vos digo a fim de poder ajustar-se s vossas idias particulares. Estou falando do que eterno, daquilo que nunca poder ser mudado, ou capturado e preso em restries. E se somente repetirdes as minhas palavras, com uma mente que se ache limitada e condicionada e um corao mantido em uma priso, no compreendereis. Se no estiverdes procurando, se no tiverdes rejeitado tudo a fim de encontrar a Verdade estareis simplesmente repetindo palavras atravs de uma mascara. Um homem que tenha de voar em um aeroplano ocupar-se- de seu aeroplano e da maneira de voar. Se um homem em uma bicicleta aproximar-se dele e lhe perguntar de que maneira poder utilizar uma bicicleta no ar, ele responder, No h ligao entre um aeroplano e uma bicicleta. Se bem que sejam ambos capazes de movimentarem-se, so no entanto diferentes. Antes que possais criar compreenso no mundo que vos rodeia devereis estar certos de vs prprios. Convidais as pessoas para virem para a vossa priso da Estrela - para pedir-lhes que tenham um novo corpo de crenas, para impor-lhes novas condies de vida, novas limitaes? Por vos achardes vs prprios presos, se bem que em uma priso um tanto maior, desejais que outros venham para a vossa priso. No esta a maneira de encontrar a felicidade, no esta a maneira do Bem Amado, no esta a maneira da Verdade; estes se acham longe das limitaes, e no os encontrareis por meio das prises, mas pela liberdade. No desejo converter nenhum de vs ao meu ponto de vista, pois, como frequentemente tenho repetido, procurar converter algum uma outra grave forma de preconceito. Eu estou certo por mim de que aquilo de que vos falo eterno; estou certo de que atingi, estou certo da unio com a vida que o Bem Amado; assim, eu sou a vida que o Bem Amado. A esta vida nada se poder adicionar ou dela retirar. Ao dizer isto no quero criar um redemoinho emocional de modo que acrediteis no que vos digo. No vos quero prender ainda mais pela minha compreenso da Verdade - e ela se tornar uma priso se vs mesmos no tiverdes o desejo de vos separar de tudo que prende. Se no estiverdes certos - no devido ao que vos digo, porm por ser a Verdade to vital, to imensa que dever chamar a si cada um de vs - se essa certeza no for toda poderosa, ento, todas as vossas crenas, todas as palavras que vos sarem dos lbios sero coma cinzas atiradas ao vento. Por terdes sido levados pela branda corrente das guas de autoridades duvidosas - uso o termo com muito cuidado, parque afinal de contas toda a autoridade poder ser sempre duvidosa, pois poder ser derrubada e destruda como uma rvore - se uma nova autoridade falar, novamente a aceitareis sem pensar, desde que estejais habituadas a obedecer. Vs aceitais por autoridade e deixais de o fazer, tambm por autoridade, sem vos preocupardes com a Verdade. essa Verdade que quero estabelecer em vossas mentes. Desejo que estejais certos, sem depender de qualquer condio que seja, que aquilo que vos estou dizendo a Verdade, no por vos terem dito que sou isto ou aquilo, mas pelo valor intrnseco da Verdade que vos trago. Como j disse anteriormente, no quero seguidores, nem discpulos, no sou ambicioso, nem quero criar no mundo uma organizao gigantesca, em seu sentido restrito. Se o quisesse pedir-vos-ia obedincia e ento vos pediria para nunca duvidar; porm, ao contrrio, eu vos 97

www.lojajinarajadasa.com peo para convidar a dvida de modo que as vossas crenas possam passar por uma prova, de modo que dos vossos desejos e das vossas ansiedades possa nascer o permanente, o eterno. Se no compreenderdes, ento o que criardes em vossos vrios pases no ser baseado no permanente, mas em algo que se corromper e perecer. Eu vos asseguro, que antes desejaria ter aqui uma ou duas pessoas que realmente compreendessem, que fossem adamantinas, que nunca se ocupassem de coisas sem valor, do que mil pessoas sem compreenso, que cedessem a coisas que no so essenciais, coisas sem importncia. Assim, procurai saber por vs mesmos se a vossa compreenso acha-se baseada em crena, estabelecida por meio de autoridade, ou se a vossa prpria aspirao, o vosso prprio desejo de encontrar a Verdade que vos traz a mim. Isto demasiado srio para nos servir de brinquedo, demasiado importante para ser torcido por falta de compreenso. Chegamos a uma poca em que cada um tem de tomar a deciso de poder colocar de lado o que no for essencial, as coisas sem valor, a fim de libertar a vida, e devemos ser adamantinos em nos cingir quilo que for essencial e necessrio para libert-la. Se fordes livres, ento ajudareis outros a serem livres. Se fordes escravos, auxiliareis os outros a se tornarem tambm escravos, e tornareis esta organizao escravizadora, condicionadora, uma priso para a Vida, por vossa falta de compreenso. Porm se verdadeiramente compreenderdes, criareis com grandeza e para a eternidade. A ESTRELA - Vol. I - N. 10 Dezembro de 1928

PRTICA A MENSAGEM DE KRISHNAJI?


A discusso que se segue teve lugar durante o acampamento da Estrela em Ommen, em 6 de agosto de 1928. Como as questes de que tratam so de importncia vital para todos aqueles que buscam tornar o ensino de Krishnaji uma fora viva em suas vidas, ns o reproduzimos neste nmero de A ESTRELA.

Lady EMILY LUTYENS: este o primeiro ano desde que Krishnaji nos comeou a instruir, e compreendo como o que ele nos tem dito nos auxiliar a resolver os problemas da vida. At ao presente temo-nos esforado por aplicar a verdade que Krishnaji coloca perante ns, aos nossos problemas e temos falhado, como sempre falharemos, pois que isto constitui um condicionamento da Verdade. O que temos a fazer agora tomar nossos problemas e coloca-los face a face diante da Verdade ou vida e esforarmo-nos por aplicar os problemas Verdade em vez de aplicar a Verdade aos problemas. Se fizermos isto, muitas das coisas que nos perturbam presentemente, desaparecero completamente e verificaremos a soluo dos que permanecerem. Tenho pensado sobre vrios problemas da vida com os quais todos nos incomodamos e verificado como, conduzidos face a face ante a Verdade, a luz vem e se projeta sobre esses problemas, dando-lhes um novo significado. C. SUARES: No sei quais so esses problemas em conjunto. No vejo, absolutamente, a questo quanto ao modo de solver os problemas, mas quanto ao modo de sentir a vida. No fim de tudo, penso que, em conjunto, o ensinamento de Krishnaji psicolgico. Onde encontrareis essa Verdade cuja luz ides por vossos problemas? YADUNANDAN PRASAD: Penso que o ponto de vista de Krishnaji referente vida - ao chocar-se conosco, no nos da tanto uma idia concreta, no sentido de pensarmos com idias concretas na vida ordinria, d-nos uma espcie de perfume da vida ou algo intangvel no sentido de experincia espiritual ou viso espiritual, ligados que estamos na vida ordinria, cada um de ns, educadores, msicos, artistas, gente de negcios, ou seja o que formos - no podemos deixar de sofrer uma reao em nosso aspecto prtico; no quer isto dizer que, esta reao expresse necessariamente a vida em sua plenitude, porm permanecer sempre cambiante e levando-nos a uma consecuo maior. No semelhante ao solver de um problema, porque isto implicaria uma atitude final e conduziria ao sentimento de que essa soluo deveria ser imposta

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www.lojajinarajadasa.com sociedade ou s pessoas que nos rodeiam. Pessoalmente sinto que a reao natural, em qualquer caso, no tanto solver, como remover automaticamente o problema. Sra. MARGARET COUSINS: Chamareis a isso uma mudana de atitude? YADUNANDAN PRASAD: Exatamente, uma mudana de atitude, porm mutvel sempre. Lady EMILY LUTYENS: Se pudsseis imaginar um governo de pessoas que tivessem visto a Verdade, que a meta ultima, no criariam elas, necessariamente as leis que auxiliassem o mundo, o povo a quem governassem a dirigir-se a si prprio para a meta que liberdade, em lugar do que est acontecendo na poca presente? Sra. H. B. ANTONIEWIKZ: Para mim, o que Krishnaji nos diz muitssimo prtico. Porque todo o homem - seja ele qual for - possui algo de grande em sua vida. Sua religio, porm, sempre lhe ensinou certas mximas, dogmas, e a no seguir esta coisa grande nica em sua vida, porm, ao contrrio, a esquece-la, a esquecer sua vida e a pensar em qualquer outra coisa. Esta coisa grande perfeitamente diferente em cada pessoa - pode ser um grande amor ou qualquer outra coisa, no importa, desde que seja o que h de grande em sua vida. E uma vez que o homem possa entender isto, pode livremente obedecer a este grande apelo de sua vida sem pensar se incorrer em pecado ou egosmo, desde que seja a coisa reta a executar em sua vida; ento pode leva-la a efeito sem se atemorizar seja do que for fora de si mesmo, seja padre ou seja deus. Ento, naturalmente, o que Krishnaji diz ter a mais prtica das aplicaes vida, a todos libertando. SANJlVA RAO: Realmente no vejo ainda a explicao deste ponto. Na verdade gostaria de saber se acompanhando os ensinamentos Krishnaji os problemas se resolvem por si mesmos. DOUGLAS CHRISTIE: Afigura-se-me que, desde que compreendais o propsito da vida os problemas se resolvero por si. SANJlVA RAO: Em lugar de reorganizarmos a vida, a vida se reorganiza a si mesma ao redor de ns. D. RAJAGOPAL: Krishnaji declara que o que ele diz intensissimamente prtico para ele - que no uma esperana ou sonho vago - porm algo que poderia ser realizado. Talvez Krishnaji pudesse tornar isto um pouco mais claro para ns, dizendo-nos em que sentido isso to prtico para ele. Parece to pouco prtico para outros. KRISHNAJI: Os problemas vem existncia - pelo menos este o meu modo de encarar a questo, - somente quando o indivduo luta contra a vida. Concordais com isto em princpio? Depois, se o indivduo se adapta a si prprio vida, o problema cessa de existir. Sra. COUSINS: Seguindo a linha de menor resistncia? KRISHNAJI: No sei se a linha de menor, se a de maior resistncia. Eu exponho a coisa deste modo. Problemas, dificuldades, provas, existem afim de serem vencidas e nos tornarmos mais fortes. Que sejam criadas por outra pessoa ou por ns, no coisa de grande importncia. Se a todo o instante estivermos a olhar para as dificuldades, jamais as venceremos. Se, porm, olharmos somente para a vida e a ela nos adaptarmos os problemas desaparecero. RALPH CHRISTIE: No parece que sempre comeamos estas discusses criando um vasto cortejo de imaginrios problemas, que imediatamente comeamos a nos perder no meio deles; e que o que haveria de prtico seria descer ao problema do indivduo que o problema do mundo? - Porm, qual o problema individual? Sra. COUSINS: O problema individual est dentro de cada um. Y. PRASAD: Neste mundo complicado o problema individual acha-se, at certo ponto, entremeado com o problema social. Muitas pessoas acham-se na posio de possurem aquilo a que chamam autoridade para estabelecer certas regras de direo para os outros. Na poltica, na educao, na filosofia, em todos os ramos de pensamento prtico, os lderes at certo ponto encaminham os pensamentos e as acusaes de outrem. Portanto, o problema individual acha99

www.lojajinarajadasa.com se entremeado com o problema social. esta, exatamente, a dificuldade. Antes que tenhamos tempo e oportunidade de solver o nosso problema individual, a posio social de alguns dentre ns fora-nos a solver ou o menos a assentar o problema social diretamente. Lady EMILY LUTYENS: Se solverdes vosso prprio problema auxiliareis, necessariamente, a solver o problema do mundo, pois que sois parte mundo. RAJAGOPAL: Krishnaji, haveis afirmado que o problema individual o problema do mundo. Dado o fato de haverdes triunfado, deveis necessariamente haver passado atravs do processo de soluo do problema ou, de algum modo, haver verificado esse problema como no existente para ns. Porque, se disto fizermos uma frase: O problema individual o problema do mundo - e a repetirmos uma vez e outra, pode ser que em um certo sentido filosfico ou metafsico, ela possa, at dado ponto, ter significao, porm dentro de pouco tempo tornar-se- de pouca valia. Lady EMILY LUTYENS: Seja-me dado repetir; eu penso de mim prpria como um indivduo em relao com outros indivduos; isto que eu denomino o problema de mim mesma na vida familiar. Se, depois, sairdes para fora da famlia para algo maior, ter o problema da educao, como o das escolas, que um problema para aqueles que se esto esforando por adestrar e instruir as crianas. E acredito que, dado o fato de que Krishnaji salienta a liberdade como a meta de toda a consecuo, penso que devereis educar as crianas luz dessa meta. Isto lana um fluxo de luz em todo o problema da educao no que se refere aos pais e professores. Se levardes isto mais longe ainda, at ao adestramento dos criminosos que so somente crianas em um sentido mais amplo da palavra, a encontrareis uma nova concepo que ser formidavelmente til. Parece-me que resolver o problema integral de como tratar os delinqentes na sociedade. Ultimamente ele nos esteve expondo uma concepo magnfica sobre cultura e civilizao. E penso que nada pode haver de mais prtico (tal como o entendemos) do que trabalhar em direo a essa expresso externa da vida, que ele chama cultura e civilizao. Portanto, de qualquer ngulo que as encareis, parece no haver limite aplicao prtica das suas idias. C. SUARES: Penso, porm, que o ponto em debate este: se por ns prprios no sentirmos essa meta e liberdade ltima, gradualmente tentaremos estabelecer frmulas tais como Libertao, etc. sem saber o que realmente significam. Assim, a coisa mais prtica a fazer estabelecer a meta em ns prprios, sem muito nos preocuparmos de como expressa-la. D. RAJAGOPAL: No pensais, porm, que talvez concreto - o dizer que temos de ver a meta? Do nosso ponto de vista, neste instante, se virmos uma meta como coisa definida e para ela nos dirigirmos, verificaremos que essa meta no a coisa final. C. SUARES: Absolutamente; para mim a meta no um lugar para onde eu v, porm sim uma mudana em todo o meu ser e esta mudana, eu o senti, - est se tornando criadora. No fim de tudo, eu penso que para um indivduo a meta encontrar a auto-expresso de si mesmo. D. RAJAOOPAL: Quando dizeis meta - a meta que Krishnaji entende - eu tomo-a como uma meta infinita que no pode ser alcanada nem pode ser limitada. Se verdes a meta, se para l fordes, e quando houverdes alcanado esse estgio, verificardes que a meta recua sempre, que acontece? Y. PRASAD: Quando dizeis infinita, no subentendeis algo inatingvel. Entendeis infinita no sentido de que no podemos verificar, agora, definidamente, o que ela . Se sempre inatingvel deve ser uma meta de desespero. D. RAJAGOPAL: Porm quando dizeis. aos outros: fixai vossa meta imediatamente, geralmente a pessoa a traduz em termos concretos e dirige-se vagamente para ela. No se trata, porm, de caminhar em direo a ela, de simplesmente vos tomardes a meta de que falais. antes um ajustamento constante e uma busca. Y. PRASAD: Uma criao constante. Eu entendo assim: enquanto o povo ler palavras tais como Amor, Justia, Libertao, Felicidade, etc., e basear sobre essas palavras sistemas para solver problemas, no haver esperana. Se, porm, essas mesmas pessoas se tornarem a

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www.lojajinarajadasa.com meta, ento estaro criando constante e livremente. Um verdadeiro criador jamais sabe como se expressar a si prprio no futuro. D. RAJAGOPAL: Sim. Por outras palavras: o estabelecimento de uma meta que se pudesse tornar concreta, realmente condiciona a Verdade. C. SUARES: Penso que o que precisamos fazer fundar uma gerao de gente que viva no eterno e esta gerao transmitir a chama a outra gerao e assim por diante. Lady EMILY LUTYENS: Gostaria de perguntar a Krishnaji, que vai fundar escolas, que ideal ir ele colocar perante as crianas nessas escolas? DOUGLAS CHRISTIE: O ideal a colocar diante das crenas nas escolas ser, suponho eu cultura! Lady EMILY LUTYENS: Quer lhe chameis cultura, quer chameis liberdade ainda aquilo que chamo a meta e o que o Sr. Rajagopal sugere to concreto que condiciona a Verdade. M. FRIEDMAN: Minha opinio que o ensinamento de Krishnaji est absolutamente fora da prtica em relao a nossa vida. No podemos adaptar o vo ao rastejar sob terra. lmaginai um rio, uma impetuosa torrente e ao lado da torrente todas as espcies de rvores e plantas crescendo, com as razes e ramos na gua, e entre os ramos e razes achando-se todas as espcies de rs e peixes que, se ocultam e ali vivem. Vem ento uma r e diz: H uma grande corrente que vos pode levar longe. Abandonai, pois, todos os vossos ramos e vinde para o meio da gua. Outra r pode dizer: absolutamente impossvel, no podemos viver sem os nossos ramos. No podemos adaptar a Verdade aos nossos problemas, temos que comear nova vida sem todos os nossos problemas. Tudo que queremos adaptar as novas verdades de Krishnaji s nossas velhas verdades, nossa vida. impossvel. Pois que a nossa vida no verdade. No podemos adaptar a Verdade inverdade. Temos que comear uma vida nova. C. SUARES: Porm isto no significa que quando houverdes comeado essa nova vida, essa coisa nova no seja prtica. Torna-se prtico logo que a vivais. M. FRIEDMAN: Ento a palavra prtica, no adequada. C. SUARES: Sim, porque vos achais ainda tratando com circunstncias exteriores. M. FRIEDMAN: Para o pssaro o ar natural, porm para o peixe absolutamente destitudo de praticabilidade. No podemos cogitar do modo de tornar as asas prticas para os peixes. Sr. COUSlNS: Podeis, se subirdes da lagarta borboleta. (CORO GERAL): Os Smiles no tem utilidade ... Oh! isto no acabar jamais ... podemos continuar eternamente ... etc. Sra. RAMONDT: Penso que no haveria valor algum nos ensinamentos de Krishnaji se eles no fossem prticos. A mim parece que os podeis por em prtica em todos os departamentos da vida. Desde o momento em que assumi o cargo de Secretria Geral da S. T. Holandesa que me tenho esforado por praticar esta simplificao, por colocar o objetivo original - a formao de um ncleo de fraternidade - no centro de nossas atividades. Se alcanssemos xito no formarmos uma Fraternidade real, a vida tornar-se-ia muito menos complicada. Temo, no entanto, que estabelecendo uma meta para ns prprios e os outros, estejamos, na maioria dos casos, criando limitaes. No entanto penso que tudo o que podemos fazer nos tornarmos claros em relao aos nossos mais elevados ideais e no nos permitirmos a ns prprios sentirmo-nos satisfeitos com qualquer transigncia. Isto parece prtico. RAJAGOPAL: Quando discutimos a palavra prtico, entendemos algo que pode ser realizado pela maioria da humanidade. PRASAD: Quando o Sr. Friedman - diz que temos de modificar completamente a nossa vida, isto significa que ele usa as palavras mudar a nossa vida em lugar da palavra prtico.

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www.lojajinarajadasa.com RAJAGOPAL: Nos sentido individual, tudo prtico. quando queremos tornar prtico para as multides, quando um indivduo fala dos milhes de pessoas existentes no mundo, que o ideal deixa de ser prtico. Para a maioria das pessoas no pode ser prtico. por isto que eu quero me esforar por sublinhar esta distino. ou no prtico para o indivduo? Penso que , se o desejar bastante fortemente, como Krishnaji que o descobriu. Se, porm, perguntarmos se prtico para a vasta maioria dos seres humanos, em um particular perodo de tempo, ento a resposta ser: no. Pelo fato de nos esforarmos por penetrar nas mentes e coraes de milhes de pessoas no mundo e imaginarmos se um ideal ou no prtico para eles, surge a confuso. KRISHNAJI: Porque chamar urna multido, quando unicamente necessitais averiguar se pratico para vs? Deixai momentaneamente a multido. Como disse o Sr. Friedman: h uma multido de espcies, tais como peixes, rs, antlopes, pssaros, etc.; e se um membro de uma espcie aplica o seu entendimento daquilo que eu digo, a uma outra espcie, naturalmente que isto lhe parecer impraticvel. Porm cada, espcie pode aplicar o que estou dizendo em seu prprio nvel e ento ser prtico. Assim, regressemos ao indivduo e vejamos se o que eu digo ou no prtico para ele. Eu digo: em absoluto, inquestionavelmente, sem dvida, o que h de mais prtico; mesmo que tudo o mais o no seja. Agora, digo eu, para o indivduo s poder ser prtico se ele verificar sua limitao. Esta a premissa maior, da qual temos que partir. Ora, um selvagem que vive somente para o gozo torna sua vida fsica, sua vida corporal cada vez mais complicada. Orna o seu corpo com penas, com pinturas; sai a matar os outros, complica sua vida pela multiplicao de coisas puramente fsicas. Assim , tambm, o homem denominado civilizado - talvez um pouco mais evoludo, posto que no orne o seu corpo em to grande escala, e embora no saia a distribuir a morte, ainda que no coloque uma pena em seus cabelos - muito complicado mental e emocionalmente. Possui desejos, grande poro de necessidades, de anseios mentais e emocionais. Todos so complicados, posto que em nveis diferentes. E utilizar essas complicaes, para ir em direo simplicidade a soluo da vida? RAJAGOPAL: Porm, quando as pessoas pensam em ideais e os apresentam ao mundo em geral, cometem, penso eu, o erro de esperar que um ideal particular seja realizado por todos. KRISHNAJI : impossvel. RAJAGOPAL: Se concordais nisto, ento o problema torna-se muito simples. Volta-se ao ponto originrio - iniciar o trabalho dentro de si mesmo. KRISHNAJI: Este o meu ponto constante desde o comeo. RAJAGOPAL: Meu ponto este: muitos destes movimentos e instituies contm pessoas to preocupados com o ideal a ser realizado, pela vasta maioria das pessoas que no se preocupam em apresentar o ideal exemplificado por eles prprios. Assim, falham no propsito real. No ser a futilidade de pretender criar opinio pblica devida a isto? Sra. DE MANZIARLY: Eu - a unidade - esforo-me por me expressar a mim mesma individualmente, como todas as outras unidades tm de o fazer. Neste processo de expressarem-se livremente, as unidade comeam a mudar e podemos conceber uma famlia de unidades novas, concorrendo a uma nova unidade sob a forma de grupo, onde o problema individual no choque com os problemas de outrem. Esta grande unidade nova ser j composta de novas unidades. Um indivduo desta espcie desposar um outro indivduo novo e ambos tero filhos que j sero educados no meio da corrente quando ainda rs pequenas. E resolvero seus problemas de um modo novo e tornar-se-o uma nova unidade maior. PRASAD: Chamamo-lhe enxames. Sra. DE MANZIARLY: Se tiverdes muitas destas unidades familiares e enxames, poderemos falar de uma nova massa. Por meio de esforos individuais de expresso, uma nova massa foi j criada. Portanto, no h egotismo neste novo ensinamento, nem esquecimento dos outros, porm simplesmente isto significa que o comeo tem que ser efetuado pelo indivduo. Antes de mais nada, tm que ser transformadas as unidades. KRISHNAI: No podeis transformar a multido se no vos haverdes transformado a vs prprios. No podeis meramente subir a uma plataforma e pregar a fraternidade, se dentro de vs a luta continua. 102

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PRASAD: Assim, no h utilidade alguma em falar da soluo de problemas comuns a todos. RAJAGOPAL: Dando-se, porm, que existam problemas em si, aparte dos problemas individuais que simultaneamente necessitem soluo? KRISHNAJI: No. Eu digo que se o indivduo resolver seu problema, no se chocar seja com quem for. Eu resolvi meu problema integral referente aos desejos, s paixes, aos anseios, s aspiraes; atingi e resolvi esses problemas. Agora no me chocarei mais com pessoa alguma. PRASAD: Isto perfeitamente verdade. Dizeis, portanto, que enquanto no houvermos resolvido o problema individual no nos devemos incomodar em absoluto acerca dos problemas da comunidade. Porque, se todas as unidades tiverem resolvido seus problemas, elas prprias, automaticamente se organizaro em enxames sociais harmoniosos? KRISHNAJI: Os problemas sociais existem enquanto vos encontrardes nas garras das condies sociais. Isto , se estiverdes no vale, os problemas do vale existiro ainda para vs. PRASAD: H, porm, uma realidade nas relaes das unidades ou no h realidade? RAJAGOPAL: esta, precisamente, a minha questo. H certos problemas, comerciais, sociais e prticos com os quais, como indivduos, nada temos que ver, e sim somente como funcionrios. Por exemplo, se a municipalidade de Ommen deseja fazer uma estrada atravessando certas terras, isto um problema da municipalidade; como indivduos, no nos achamos relacionados com ele, porm podemos com ele relacionar-nos em nossa capacidade de vereadores municipais de Ommen. KRISHNAJI: Naturalmente. Eu seria o primeiro a dizer, ide frente, constru a estrada, vos ajudarei. RAJAGOPAL: Porm o homem cujas terras vo ser atravessadas pela estrada pode opor-se fortemente. Sra. DE MANZIARLY: No, se ele houver evoludo neste sentido, no se opor. RAJAGOPAL: Madame, admitis que existem problemas - o social, o poltico, o educacional todos criados aparte dos problemas do indivduo? Sra. DE MANZIARLY: Sim, porm a soluo reside, se nos dado falar desta nova soluo, na transformao da multido pela transformao das unidades. Naturalmente, o problema social existe e resolvido muito prontamente em teoria, porm no na prtica. Falamos na paz e preparamo-nos para a guerra, tal como se est dando em todas as naes; ou por outro lado, em uma esquina haver ligas anti-alcolicas e na outra fabricao de lcool, pelo fato de algum querer enriquecer fabricando esse produto. Porm, em uma sociedade onde ningum deseje produzir lcool, ningum ter que formar ligas anti-alcolicas. RAJAGOPAL: Assim, Krishnaji, como o haveis dito, enquanto estivermos no vale esses problemas existiro. Uma pessoa pode andar de aeroplano sobre o vale, porm, mesmo ao abandonar esse vale esses problemas existiro ainda para os outros. Qual a relao existente entre a pessoa do aeroplano e as pessoas do vale? Como pode mostrar a eles o panorama do vale? KRlSHNAJI: Descendo e dizendo: Vinde, vinde para o meu aeroplano. RAJAGOPAL: Pregando, simplesmente ou proporcionando-lhes o prprio exemplo? KRISHNAJI: Naturalmente de ambos os modos, pelo preceito e pelo exemplo. RAJAGOPAL: Bem, uma pessoa que no atingiu, porm que se encontra em vias de atingir, no h mal em falar, pode falar da luta. Isto o que muita gente se est esforando por fazer hoje em dia.

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www.lojajinarajadasa.com Lady EMILY LUTYENS: isto que eu entendo relativamente educao. Vs fundais escolas, porm no obtereis professores que tenham todos atingido meta. Tereis, porm, aqueles que hajam alcanado uma viso dela e, portanto, que colocaro esta viso perante as crianas. E pondo esse plano em ao, verificaro que o mais prtico e praticvel objetivo educacional jamais apresentado. C. SUARES: O que eu digo isto: esta meta no coisa semelhante ao fato de haverdes visto ontem uma casa, antes algo que em vs foi criado e que cria. PRASAD: Vedes porm Lady Emily, que a palavra liberdade na mensagem de Krishnaji acontece adaptar-se vossa forma favorita de educao e, portanto, dizeis que a meta se enquadra nos melhores ideais de educao. Pode, porm existir uma pessoa cuja viso sobre educao tendam aprovao da disciplina, do domnio, da direo e no entanto pode ela ser uma ardente seguidora da verdade no que se refere meta. Pode dizer que o refreamento do fsico o mtodo apropriado e que deve existir disciplina. Lady EMILY LUTYENS: Como Krishnaji em pessoa o disse: a disciplina uma passagem para a meta, pois no ? De modo que o homem que aprova a disciplina ter tambm a meta em vista. PRASAD: Parece-me que se nos esforarmos por trazer a meta para baixo e a fizermos adaptarse em tais coisas concretas, estaremos sempre no campo do conflito. Lady EMILY LUTYENS: Ento pergunto novamente Krishnaji: o que que ides colocar perante as crianas nas escolas que ides fundar? KRISHNAJI: Tudo que coloco diante de vs. Sra. DE MANZIARLY: No vos parece que estamos falando de duas coisas complementares - de corpo e de esprito? Se h um homem que fala a respeito de disciplina e outro que fala de liberdade, pelo fato de existir a necessidade de disciplina para o corpo e liberdade para o esprito. necessrio a disciplina que proporciona bons hbitos. Em idade muito tenra, quando a questo da liberdade no vem tona, remos que adquirir hbitos. Para isso existe a disciplina. Os hbitos bons so necessrios. No se deve deixar uma criana discutir as razes porque deve assoar o nariz. No se trata a de uma aplicao da idia de liberdade, porm de matria de senso comum. PRASAD: Portanto, o que eu digo isto: se tiverdes em vs o esprito aventuroso, sereis mental e espiritualmente diferentes dos outros e se estiverdes testa de uma instituio de educao, no vos esforareis por trazer a termos concretos esse ideal, porm sim de radicar o esprito de liberdade. A aplicao prtica, porm depender da pesquisa psicolgica e cientfica. E ento, qualquer mtodo prtico de educao no ser tomado como coisa final. Crescero sempre no sentido de tomarem formas menos rgidas e de libertar mais vida. Assim, eu diria: antes de mais nada, conquistai o esprito aventuroso e depois utilizai todo o vosso mental e as outras faculdades para defrontar a vida prtica com esse esprito de aventura. JACQUES BIENFAIT: Isto se aplica tambm s nossas relaes com outros e no somente crianas. Pois que o mesmo mtodo que usado aqui, que o de Krishnaji, o de juntar em redor de si um certo nmero de pessoas para ajud-las a sorverem seus problemas individuais , at certo ponto, aplicvel tambm a outras pessoas que se juntem em redor de ns. Elas ganharo alguma coisa com esse contado, o que obtiveram ser ainda passado adiante a pessoas com quem entrem em contado tambm e, assim, os contados sero numerosos. RALPH CHRISTIE: Parece-me muito fcil. Penso que a dificuldade reside em que, quando daqui sairmos e nos encontramos com as outras pessoas, elas se encontram to profundamente abismadas em sua viso pessoal que quase fora necessrio uma exploso para as fazer sair desse estado. KRISHNAJI: No discutamos se a Verdade prtica, ou no . A partir do momento em que perguntais se ela pratica, estareis destruindo o propsito para o qual ela existe. FRIEDMAN: Preocupamo-nos sempre em melhorar a vida, em lugar de deixa-la prosseguir. Para mim, porm, aplicar perfeita, sincera e fortemente vida humana ou nossa prpria vida, o 104

www.lojajinarajadasa.com que Krishnaji diz formarmos um esplndido, um perfeito, caos sublimssimo. Todos ns falamos a respeito de escolas, famlias, sociedades, comunidades e assim por diante, por que somos de uma complexidade e seja-me dado diz-lo de um altrusmo complexo. Pensamos que sempre que falarmos de alguma coisa temos imediatamente que pensar em nosso prximo; porm no nos compete a ns pensarmos em nosso prximo. KRISHNAJI: Concordo plenamente, senhor. Por isso que volto ao ponto de onde partimos. Por Deus, no tomemos em considerao o nosso vizinho antes de nos tomarmos a ns prprios, pois que no altrusmo o ajudarmos o nosso prximo a se tornar mais cego do que j . E portanto, voltamos outra idia, a de que no podeis arrastar os outros vossa viso da felicidade, vossa viso da verdade, vossa viso da vida, porque isto significaria a converso, por outras palavras: vs lhes estareis dando alguma coisa que eles precisam aceitar afim de atingirem. SUARES: Este todo o meu ponto. Um dia algum perguntou-me Que posso eu fazer? Que estais vs fazendo? Eu lhe respondi Sede um gnio! Ele voltou novamente em outro dia e perguntou: Que estais vs fazendo? Eu lhe respondi Bem, eu estou em vias de tentar tornarme um gnio. Penso que um gnio um criador e aquele que cria no se preocupa com os outros. Preocupava-se Beethoven por acaso com as pessoas que no ouviam msica? FRIEDMAN: Krishnaji, vs nos haveis proporcionado o exemplo do poo cheio de gua, porm nem todos a utilizaro da maneira adequada. Imaginemos o caso afortunado ou desafortunado de que o vosso ensino se tome amplamente difundido por todo o mundo; torna-se moda, por exemplo e todo o homem comea a aplic-lo a si mesmo; isto produzir uma pequena revoluo em sua vida particular. Na maioria dos casos revolver as pessoas. Sob o ponto de vista do seu prximo, o homem que estiver revolvido, ser das pessoas do mundo, a mais impossvel com quem se viver, haver um perodo, imaginemo-lo assim, em que toda a gente no mundo ser impossvel no grau mximo, para o seu prximo e haver um pequeno caos divino no mundo, como nos haveis dito. Isto porm, no desejado, porque o povo teme o caos. Tem medo dele. Falamos constantemente de problemas sociais e de comunidades. Isto, porque tememos que a realizao individual, da nossa verdade passe desapercebida ou seja mal julgada pela comunidade. Cada um de ns sente de modo perfeitamente incisivo que a vida que nela dorme, quando for permitida fluir livremente, trar consigo toda a lama e toda a estagnao que tem colhido atravs de eons do passado. E todos se sentem horrivelmente atemorizados com isso. Portanto, todos falam de problemas sociais por temor de seu prximo. Em minha opinio vosso ensinamento pode parecer no social - como a-social - e s vezes pode parecer at anti-social. Alm disso, no pode ser aplicvel a todo o indivduo na sociedade. para todos; porm, pessoas h que ho de temer po-lo em prtica, outros disso tero vergonha e poucos o praticaro, porm estes mesmos sero apontados como as pessoas de vizinhana a mais temvel. PRASAD: No penso que Krishnaji seja, anti-social. Os liames sociais no esto fixados. So variveis. E, portanto, permanecem em todos os nveis. Se os indivduos, como unidades, mudam, os liames sociais variaro e realmente no anti-social o mudar rapidamente em direo Verdade. Eu prprio antevejo e espero uma grande mudana na ndia, como resultado direto do ensinamento de Krishnaji. Os milhes de habitantes da ndia, acham-se realmente estagnados, afastados do fluxo da vida, devido barreira da tradio. Ora, quando esta mensagem ali chegar com plena fora e se espalhar entre os milhes de pessoas ali existentes, a barreira ser varrida em grande extenso e eles sero arrastados para uma nova vida. Adaptaro automaticamente a ela as relaes sociais. Sra. DE MANZIARLY: Provavelmente existe algo de realmente novo que est vindo. Gastamos todo o tempo em discutir velhos termos - sociedade, anti-social, social. Imaginai agora que est se aproximando outra idia nova. Algo de universal. Uso a palavra universal porque, no sei que coisa nova essa. Imaginai que o Sr. Friedman tenha razo, que Krishnaji seja anti-social por ser universal. A mera sociabilidade pode achar-se no caminho da universalidade. Eu porm, vos digo que no me atemorizo se algum disser que sou anti-social, ao encontrar-me pr algo que ainda no tem nome. H, na realidade, coisas novas aproximando-se e to novas que para elas no temos termos, to novas que tememos o afastamento das velhas. Por exemplo, a idia do Mestre sem um discpulo algo de to novo que logo a princpio se diz que impossvel De modo que exatamente assim: e as pessoas que gostam do antigo sentem-se triste ou

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www.lojajinarajadasa.com anuviada e atemorizada. Dizem: ele no tem compaixo, no h nele sentido social, ele no entende a fraternidade. Sra. RAMONDT: Se tivermos que tornar prtico este ensino, no implica isto tambm que, ao passo que nos esforamos por alcanar a meta por ns prprios e esforando-nos por ating-la, nos esforaremos por pratic-la no mundo ao aplic-la tambm aos problemas mundiais? No seria prtico o ensino se no pudesse ser aplicvel aos problemas do mundo, se tivssemos que esperar. Mas esperar at que todos sejam perfeitos, seria um processo longo. Deveramos criar circunstncias novas e novas oportunidades, de maneira a tornarmos mais fcil para outras pessoas verem a meta. No assim? No poderemos ajudar no poltico a vinda do divino superfcie falando-lhe da meta tal como a vemos? RAJAGOPAL: A questo esta: fareis com que o povo veja mais facilmente a meta tornando as circunstncias mais fceis? Vedes que toda a questo gira em torno disto: estais seguros da meta tal como a vedes, sabeis o que ela ; e quereis criar o divino no poltico de modo a tornar mais fcil para ele o enxergar a meta tal como vs a vedes. Eu porm sustento que a meta no to clara como o pensais. KRISHNAJI: Portanto, quero voltar em linha reta a isto: a meta para vs no a mesma que a de outrem e, no entanto, sempre a mesma para mim. Quando percebeis essa meta ela no semelhante minha, e quando eu a percebo no semelhante vossa e, no entanto, sempre a mesma. Portanto haver ordem e no caos se cada qual procurar sua meta. No h utilidade em insistir com outra pessoa: No esta a meta que precisais ter. Quando dizeis a outrem: Olhai, eu quero mostrar-vos a meta e a senda que deveis trilhar, estareis destruindo o verdadeiro propsito daquilo de que vos estou falando, daquilo que eu quero fazer. A ESTRELA - Vol. I - N. 10 - Dezembro de 1928

PERGUNTAS E RESPOSTAS J. Krishnamurti


Acampamento da Estrela 1928

No se alcana a Verdade, que incondicionada e ilimitada, sem derramar lgrimas. No podereis compreender a vida sem ter lutas, dificuldades, dvidas. Quanto mais as tiverdes, maior segurana tereis em vossa compreenso. Sei que isto pode parecer duro, mas espero que compreendeis. Muitos de vs acham-se incertos, procurando descobrir por si mesmos; se me dado fazer-vos uma sugesto, dir-vos-ei que procureis manter sob domnio as vossas emoes, com maior firmeza ainda do que at aqui; no deixeis que elas disparem, arrebatando-vos tambm. Nem vos deveis to pouco intelectualizar a ponto de vos tornardes duros e calejados. Conservai-vos eqnimes, se me permitis a sugesto, mantendo cuidadoso equilbrio entre a mente e as emoes. No penseis sequer um instante que vos quero transtornar ou que vos queira forar a tomar alguma resoluo. No vos desejo urgir nem coagir, em modo algum. Tudo quanto desejo apresentar-vos para vosso exame, e portanto para vossa compreenso, aquilo que descobri ser a Verdade. Podeis coloc-la em dvida; podeis dizer: No isto o que desejo; no sois o verdadeiro Instrutor. Mas no vos deixeis enredar em vossas emoes para depois vos sentirdes como transtornados. No esse o caminho para achar a Verdade. Se fsseis a um museu ou galeria de pintura, no ireis criticar quadro por quadro, a menos que fsseis um grande crtico de arte; no em tanto, desejais criticar e rejeitar sem exame cuidadoso algo muito mais difcil de compreender do que um quadro, algo que muito mais real do que uma pintura, e que a prpria Vida. No deveis dizer: Krishnamurti pede-me que renuncie. No vos peo que renuncieis a coisa alguma, porque no creio que exista tal renncia; no creio que exista o sacrifcio. Para 106

www.lojajinarajadasa.com algum que seriamente compreenda, no h renncia, nem sacrifcio ou reconciliao. No desejo que faais coisa alguma desta espcie; e, por favor, acreditai-me quando digo que vos falo com todo o meu corao. Por que vejo que a maior parte dos homens se sente infeliz e sempre lutando, desejo prestar auxlio. No fosse esse o meu desejo, eu no estaria aqui; preferiria, de muito, afastar-me para um lugar sossegado. No penseis que vos estou dizendo isto por dureza de corao. No desejo convencer-vos de que devas acreditar ou rejeitar isto ou aquilo. Desejo que tudo examineis, de modo imparcial e so, sem vos deixares levar quer pelas emoes, quer por teorias intelectuais. Pessoa cultivada a que no pr-julga de forma alguma seja o que for por desejo, e capaz de examinar todas as coisas imparcialmente, e que no se deixa transtornar por suas emoes e preconceitos. Tenho certeza do que vos apresento pois conheo-o por mim mesmo: vs porm, no o conheceis desta forma, e por isso, no vos sintais transtornados, nem to pouco irritados ou cheios de superioridade. Examinai isto e vede se no a nica soluo no mundo que poder dar uma felicidade perene, se no a nica senda para achar a Verdade e essa liberdade que felicidade. Essa a atitude que deveis adotar e no a da mera aceitao ou rejeio daquilo que digo. Desejais aquilo que achei e para o terdes, para o viverdes e abraar, deveis aproximar-vos disso, de um modo so, com equilbrio das emoes e da mente. No ser com o vos tornardes super-srios, que descobrireis a verdadeira proporo das coisas. E se rsseis um pouco mais de vs mesmos, e de todas as vossas teorias, assim como tambm das minhas, tudo estaria melhor. Pergunta - Se a Ordem da Estrela uma ponte, que leva o vosso ensinamento ao mundo, no poderiam outras pregaes, movimentos, cerimnias e at Igrejas, servir tambm de ponte para os ensinamentos e para colocar as pessoas em contato convosco e com a Verdade que representais? Krishnamurti - Disse-me outro dia um amigo meu: Adquiristes uma preveno contra as cerimnias. Ora, eu no tenho, preveno contra as cerimnias. Seria um absurdo fazer das cerimnias um princpio contra o qual combater. coisa to pouco essencial, do meu ponto de vista, quanto que faa bom ou mau tempo. Tire portanto de vossas mentes a idia de que deseje atacar as cerimnias ou tenha preveno contra elas. No se deve fazer das cerimnias um principio essencial compreenso da Verdade e, portanto, da Vida. Depois, quanto ao que respeita s organizaes, desejaria dizer-vos isto: no penso que seja necessrio a algum pertencer a qualquer organizao, mesmo Estrela. As organizaes sempre usurpam a Verdade, e assim h o perigo de que, ao invs de guiar as pessoas por sobre a ponte, em direo Verdade, elas as impeam de a alcanar. Por essa razo que sou sempre um receoso quanto organizaes. Fazeis uma cadeira para vos servir de assento, mas seria absurdo assent-la sobre vs. Assim tambm com as organizaes. Se o movimento da Estrela como que uma ponte - e espero que o seja para transmitir as idias que apresento e que deveis examinar - vs que sois a ponte, que constitus a organizao. Sois os alicerces da ponte. Se os alicerces no forem firmes, a ponte desabar. Se no tiverdes a firmeza e pureza de seus propsitos - de trazer o mundo para mais perto do absoluto, da Verdade indmita, ser ento intil e at perigoso uma organizao. Peo-vos, no julgueis que por ser eu o chefe desta organizao, deseje manter a todo custo este movimento; no me importa isso, porque, como com todo o cuidado tenho dito sempre e sempre, as organizaes, no so em si mesmas, coisa to essencial. Muitas pessoas h que no esto de acordo com a existncia das organizaes no querem assumir compromissos, afirmar crenas, aceitar condies. E esta organizao da Estrela existe puramente para propagar a idia, e no para ser um tabernculo da Verdade. Vai nisto uma grande diferena. Esta organizao no deveria proclamar-se como o caminho especial para a Verdade, ou proclamar-se de posse de uma beno especial. Nenhum movimento, nenhuma organizao religiosa deve jamais dizer-se possuidora de uma beno especial, nem declarar que seja a senda que conduz Verdade. Isto seria uma limitao da vida e portanto uma traio Verdade. Onde quer que haja uma pesquisa, uma aspirao, um desejo de procurar a Verdade, ali est a Verdade - e no em uma organizao de qualquer tipo, por santificada que seja. Podem outras organizaes auxiliar em estabelecer contado entre as pessoas e a Verdade que representais?" - Isto no depende das organizaes, mas de vs. Amigo, sois vs que fazeis as organizaes; podeis faz-las grandes, amplas, tudo incluindo e no excluindo nada ou podeis torn-las estreitas, limitadas, conjunto fechado de pessoas dogmticas, de mentalidade estreita e crdula. Isto no depende de mim, mas de vs. 107

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Se outras organizaes podem auxiliar, no o sei. Nem me diz respeito. Se vos dissesse eu que algumas auxiliam e outras no, e assim por diante, perguntar-me-eis porque certas organizaes prestam auxilio e outras no. No so as organizaes que revelam a Verdade; o indivduo que compreende que presta auxlio; o indivduo que encontrou a Verdade que cria duradouramente. A Verdade no depende de organizaes de qualquer espcie, sejam da maior antigidade, ou as mais modernas. E porque, cada organizao afirma ser algo de especial, possuir sendas especiais para a Verdade, que atraioam e corrompem a Verdade. Considerai diligentemente e tereis a compreenso; rejeitai violentamente sem pensar, e no haver compreenso. Pouco adianta dizer-me: Foi-nos dito isto e aquilo. Contra isto no tenho resposta. O que me preocupa a purificao e a estabilidade da mente e do corao e no as organizaes de qualquer espcie. Afinal, se a mente e o corao no esto puros, quem vos pode falar de sua pureza e de sua fora, seno vs mesmos? Que organizao vos poder ajudar a purific-los, seno vs mesmos? Porque dependeis de organizaes, tanto religiosas como morais, e de autoridade externa para vossa fora, purificao e sustento, estas organizaes usurpam e pervertem vossa compreenso. Pergunta - Pois que Krishnaji no quer transigncias, no deveramos abandonar todos os movimentos que no fossem a Estrela? Krishnaji - No vos direi o que abandonar ou no abandonar. Para mim no h transigncias, por que no tenho com que transigir. No posso transigir com algo que para mim no tem utilidade. Para algum que alcanou a outra margem, no pode haver transigncias com a margem deixada para trs. Terminou o que com ela tinha que ver. H transigncias, tem que haver transigncias, para algum que ainda tem que aprender a fazer a travessia, que somente est pesquisando, que todo o tempo est a olhar para a outra margem, mas sem a coragem, a determinao, o desejo necessrio para atingi-la. Se abandonardes algum movimento por algum vos ter dito para fazer assim, estareis meramente fechando-vos em uma nova gaiola. A tendncia moderna no de ingressar em movimentos, assumir compromissos ou subscrever certos objetivos definidos. Tenho falado a muita gente na Amrica, ndia ou Europa, que me pergunta: Devemos, ingressar em vossa Ordem? Eu lhes digo: No, em absoluto. Falai a alguma pessoa jovem, que tenha entusiasmo, e, vereis que nem sempre desejar ingressar em seja o que for. Muita gente ingressa em movimentos pelo desejo de procurar a salvao, de procurar a certeza, de procurar conforto. Ningum de fora vos pode salvar - salvar uma palavra curiosa - mas usemo-la neste momento. Uma vez que sejais vosso prprio guia, vossa prpria autoridade e vosso prprio criador, tudo est bem. muito mais simples firmar-vos em vosso prprio eu, do que dependurardes vossa alma das cavilhas de um movimento. Pergunta - Dizei-nos por favor os modos pelos quais podemos dificultar o vosso trabalho. Krishnaji - Eis uma pergunta honesta! Temo que estejais realizando isso com todo o xito, pela no compreenso do que vos vou dizendo. Amigo, no o meu trabalho que estais fazendo. Estais fazendo o vosso trabalho e no o meu. Podeis criar-vos dificuldades a vs mesmos ou ajudar-vos a vs prprios. Meu trabalho o de auxiliar-vos a despertar vosso desejo de consecuo, de iluminao, de libertao e o modo por que alcanceis isto, no de to grande importncia. Alcanareis, mas o modo pelo qual maiores dificuldades possais ocasionar, esse depende de cada um de vs. Muitos pensam que esto prestando auxlio. Temo que a primeira coisa que devam compreender, seja a de que no esto ajudando; porque, quando uma vez admitis que no estais auxiliando, desbravais o solo para poderdes construir, desbastando a floresta da incompreenso e abrindo caminho luz. Mas se, ao contrrio, disserdes: Compreendo tudo, tudo muito simples ento por esse modo que podeis ser destrutivo, e deixar de prestar auxlio. No entanto, muitos de vs esto a dizer a todo instante: Oh! Compreendo-vos perfeitamente! Pergunta - Pensa Krishnaji que hajam determinados movimentos, organizaes ou grupos, que tenham o poder de dificultar o seu trabalho no mundo? Krishnaji - Deixo isto a vs; as organizaes, grupos, movimentos, tudo isto, sois vs prprios. Se no compreenderdes, no podereis auxiliar; e se no puderdes auxiliar, tambm no o podero fazer as organizaes e grupos ou movimentos a que pertencerdes. , assim, um 108

www.lojajinarajadasa.com circulo vicioso. Deveis resolver primeiro, o vosso problema, alcanar primeiro vs a compreenso e ento as organizaes, grupos, seitas e movimentos no sero de muita importncia. Pergunta - Depois de ter-nos mostrado a meta e acentuado a necessidade da destruio, podeis esclarecer-nos mais um pouco os meios de atingirmos a meta? Muito tem sido acentuado o lado destrutivo do trabalho. Porque que to vagamente se tem falado do lado construtivo? Krishnaji A necessidade de destruio - No sei de que!... Depois de nos ter mostrado a meta... - Eu no vos mostrei a meta. Desejo despertar em vs o desejo de ver a meta e vs a vereis. Se eu vos mostrasse a meta, a Verdade absoluta e sem fim, ela no seria a Verdade para vs; e se vos traasse o caminho conduzindo Verdade, no seria esse o caminho para vs. fcil traar uma senda, estabelecer certas leis ticas e morais a que devais sujeitar-vos; mas esse no o meu intento ... "Podeis esclarecer-nos um pouco mais os meios de atingirmos a meta?" - Mas por certo, isto que tenho estado tentando fazer! Isto o que tenho procurado explicar. Mas, vs que deveis compreender, vs deveis criar a meta, a senda, e no eu. Desejareis que eu vos dissesse: "Levantai-vos de manh a tantas e tantas horas, meditai tantas outras horas. Alimentai-vos disto e no daquilo. Pensai isto e no aquilo. Desejareis que vos traasse certas raias que limitassem a vossa vida e a vossa compreenso. Pensareis ento que nisto que consiste mostrar-vos o caminho. A vida se encarrega de apontar o caminho quele que deseja compreender a Verdade. pelo fato de vos isolardes, de vos afastardes da vida, que desejais vos aponte a meta, assim como o caminho que a ela conduz. Tenho observado pessoas de vida muito sistematizada, levantando-se a uma hora precisa, alimentando-se da maneira prescrita para se ser considerado espiritual - seja isso o que for - e que no pensam nas coisas em que lhes foi dito no pensassem. Tenho observado gente assim e observado como lhes falta frescura vida. No atravs de limitaes, da observncia estreita e pouco inteligente de pequenas disciplinas, que podeis alcanar. A Verdade est muito alm destas disciplinas, sistemas e observncias. A Verdade nada tem que ver com a maneira de vos alimentardes nem com aquela por que meditais, ou o caminho por onde chegueis compreenso, ela diz: Eu existo, e se amais, lutai com a vossa vida, com cada um dos acontecimentos do dia e procurai e compreender, mas no estabeleais limitaes vossa compreenso. Muito tem sido acentuado o lado destrutivo do trabalho. Porque que to vagamente tem-se falado do lado construtivo? No podeis criar, sem primeiro destruir as complicaes que cercam a vida, sem simplificar a esta. No podeis construir onde j existam outros edifcios. Se quiserdes construir, precisais ter espao aberto no qual lanar alicerces profundos. Isto no destruio. Estais sempre a considerar o aspecto negativo, por que vos mais conveniente e jamais o lado positivo, que o lado construtivo. Se escutardes com ateno, vereis que no h nem destruio nem construo. Se abrirdes as portas vida e no procurardes torce-la, ela construir onde for necessrio; mas, pelo fato de procurardes torce-la, de procurardes regul-la, que h para vs a renncia que destruio, e perda de tempo; e que h para vs sacrifcio, por terdes que endireitar aquilo que est torto. Pergunta - acertado considerar os movimentos espirituais em geral corno semelhantes ao movimento de Krishnaji? No so inteiramente diversos? Krishnaji: - Antes de tudo, eu no tenho nenhum movimento. Recuso-me a me deixar transformar numa causa, de modo a, por meu intermdio, poderdes salvar as vossas vidas. Muita gente deseja causas, para com elas tornar mais belo o seu prprio desejo e ampliar a sua prpria aspirao. Desejam evoluir atravs da causa de um terceiro, de preferncia a crescerem por si mesmos. Mas, a ltima coisa que eu deseje fazer lanar um movimento. Por isso no h como perguntar se alguns movimentos so a mesma coisa que o movimento de Krishnaji. Tudo considerado, eu no desejo - e digo isto com toda a sinceridade e espero que o acrediteis com a plenitude de vosso corao - eu realmente no desejo criar mais urna gaiola para vs. O que acontece na maior parte das organizaes, das corporaes religiosas, dos movimentos que nelas sempre vos pedem que deixeis vossa gaiola, por pequena e estreita, e que entreis para uma outra gaiola igualmente pequena e estreita. Ser talvez um pouco maior, mas ainda assim ser uma gaiola. E o que eu faria, e o que eu farei no ter gaiola nenhuma e provocar e despertar o ardente desejo da libertao, para que no vos crieis gaiolas em torno de idias, em torno de personalidades. Mas, no prprio instante em que venhais a me considerar como o autor de um novo movimento lanado em oposio a outro qualquer, toda a minha concepo da vida estar desvirtuada. Perguntou-me em Paris o reprter de um jornal se eu era teosofista ou se era hindusta, se era isto ou aquilo mais; e se todos deviam se tornar teosofistas, hindustas e 109

www.lojajinarajadasa.com membros da Estrela, afim de compreenderem o que digo. Respondi-lhe: No precisais absolutamente tornar-vos teosofistas ou membros da Estrela. E acrescentei que no era nem teosofista nem no teosofista. Tudo isso afinal so meros rtulos e h algo de maior que est para alm dos rtulos. No bom abrigar-se algum por detrs de um rtulo, ou deleitar-se com um movimento. Quanto pergunta No so inteiramente diferentes?- se assim os julgais porque o devem ser. Quando o primeiro quadro cubista foi exibido em Paris, verdadeiro furor se levantou contra ele, mas essa pintura em breve veio a ser apreciada. Todos tinham certas idias a respeito e hoje o cubismo est perfeitamente na moda. Se tivsseis perguntado a um pintor cubista: Estais lanando o cubismo, por oposio ao antigo modo de pintar?, - ele responderia: No, isto coisa inteiramente diversa daquilo a que esto acostumados vossa mente e vosso corao. Isso mesmo o que est acontecendo hoje; assim tambm h muitas pessoas no mundo que ora se apegam crtica, dizendo que vim para destruir isto ou aquilo, e que no que ensino nada h de construtivo. Qualquer coisa de novo - embora haja nada de novo sob o sol - est sujeito a ser incompreendido a princpio. Mas, haver tambm outras pessoas que abriro suas mentes razo e se apegaro a isso que novo e deste modo raciocinando e lutando, abriro os seus coraes a uma felicidade maior. Pergunta - A impresso que temos em geral de um Instrutor do Mundo, vem associada com a da compaixo. Alguns acham falta dessa qualidade nos vossos ensinamentos. Podereis definir vossa concepo da compaixo? Krishnaji - Um cirurgio que v uma molstia combalindo aos poucos um homem, diz: Para que se cure, devo oper-lo. Vem outro mdico menos experimentado e d-lhe alimentos e o induz sonolncia. Qual dos mdicos considerareis mais compassivo? Desejais conforto oriundo da decadncia e que imaginais ser compaixo, afeio e amor puro. Tereis a sombra desse conforto, mas se eu vo-lo desse, no realizaria trabalho de um verdadeiro Instrutor, de um ser que alcanou. Se ao contrrio, eu vos apontasse vossas prprias fraquezas, que so as causas de muitas doenas, direis: isso no compaixo. Quando vos atormenta o sofrimento, ides ter com um mdico para que vo-lo alivie. Se o mdico for sbio, ele no vos dir que continueis a alimentar-vos da mesma forma que at a, continueis a desfrutar os mesmos fugitivos prazeres da vida; ele vos dir que deixeis vossos prazeres, vossos gozos passageiros e que abandoneis essas coisas por algum tempo para reunir energias. Mas no desejais um mdico assim; porque ele vos fala a verdade, -vos mais difcil segu-lo e compreend-lo, quando podeis chamar um outro mdico que alimente as vossas futilidades e vos d inmeros confortos passageiros, - o mdico da verdadeira compaixo. Quo pouco compreendeis a compaixo! Quando uma me v seu filho caindo, embora, ocasionalmente possa ajud-lo, o seu desejo que cresa forte e assim, no vive a procurar impedir que caia. No chamareis a isso compaixo, afeio, amor? O que mais nobre ou grande - despertar a fora que est oculta em todo ser, para que por si mesmo empreenda a ascenso da encosta da montanha ou deix-lo permanecer fraco e empurra-lo montanha acima? Havia uma vez um homem que era paraltico. Curou-se, mas poucos dias depois foi mandado para a priso por determinado ato de imoralidade. O que seria melhor curar os desejos que causam as feridas ou curar as feridas momentneas, o que somente poderia levar a maiores tristezas e penas? Todos vs desejais conforto e esperana, e o cu a danar-vos na frente, e a isto chamareis compaixo. Desejais ser levado de uma esperana a outra esperana, de aspirao a aspirao, de desejo a desejo, de satisfao em satisfao. Ao homem que vos oferea isto, dareis os louros da compaixo; enquanto que ao homem que no vos d esperanas, mas vos traz a compreenso real da vida, de modo a poderdes vs mesmos, vencer todas as indisposies, doenas e tristezas, e penas, dizeis: esse homem no tem corao ou seu corao seco e vazio. Se no tendes a compreenso real da compaixo criareis a sombra do conforto, como tantos o fizeram, e por esse modo traireis a Verdade. Se no compreendeis a compaixo no seu mais completo sentido, construireis muitas gaiolas, adornando-as e decorando-as e tornando-as belas. Se no compreendeis essa qualidade da afeio, construireis templos em que haver 110

www.lojajinarajadasa.com imagens gravadas para conforto passageiro dos outros, o que ser novamente menosprezar e portanto trair a Verdade. Se no compreendeis esse amor, criareis na encosta da montanha abrigos que tiraro as foras e o conservaro nas trevas. Boletim Internacional da Estrela N. 9 rgo Oficial da Ordem da Estrela Setembro e Outubro de 1928

PERGUNTAS E RESPOSTAS II J. Krishnamurti


Reunio dos Organizadores Nacionais

PERGUNTA: Dizeis que as organizaes s so de real valor se no pretenderem ser os repositrios da Verdade. Para que a Ordem da Estrela permanea como ponte entre a Verdade e o mundo, at que ponto se deve dissociar de movimentos que, de acordo com a opinio de muitos, se proclamam serem receptculos da Verdade? Por favor atentai no que h de praticamente implcito nesta pergunta. KRISHNAJI: Jamais preciso dissociar-se ativamente seja do que for; com a atitude prpria podem-se executar todas as coisas. Se vos dissociardes dessas instituies - e no sei a que instituies vos referis nesta pergunta - vossa dissociao implicaria o temor de vos emaranhardes. Por temerdes o contgio das doenas, vs as evitais, se porm, estiverdes limpos, sos e fortes, doena alguma vos tocar. No desejo que a Ordem se torne um tabernculo da Verdade. Devemos tomar cuidado, pois, para que a instituio se conserve pura, no sentido de atuar como uma ponte. PERGUNTA: Em nosso desejo de no transigirmos com a Verdade podemos sentir ser do nosso dever o dissociarmo-nos de instituies espirituais e religiosas. No pode tal ato, de parte de um Organizador Nacional envolver a Ordem em uma outra forma de crena ou descrena? KRISHNAJI: Depende do indivduo. Sei tudo que esta pergunta implica. No vou decidir por vs, posto seja isto o que desejais. Gostareis que eu dissesse: Dissociai-vos de tudo; desta, daquela e daquela outra instituio. Que aconteceria se tal vos aconselhasse. Obedecereis pela minha autoridade, porm em vossas mentes haveria incerteza e desta incerteza adviria infelicidade e grande perturbao. Se, porm, por vs prprios decidirdes e estiverdes seguros em vossa deciso, no vacilareis e a vossa deciso ser o vosso guia. Todos haveis sido educados na confiana em autoridades, porm a Verdade jamais se encontra na autoridade de outrem, a Verdade no se acolhe ao abrigo da autoridade. Assim pois, tendes que abandonar todas as autoridades e depender de vs mesmos. Pelo fato de haverdes sido nutridos e apoiados pela autoridade, por todas as vossas esperanas terem sido estabelecidas na autoridade, atemorizai-vos quando eu digo: no dependais da autoridade, porm do vosso prprio conhecimento da vida, da vossa intuio, que a consumao de toda a inteligncia, a qual, ainda uma vez, o resultado da experincia. Quereis que eu exera autoridade, porm isto me seria impossvel, pois que eu sustento que a autoridade destri a compreenso; eu mantenho que s vencereis mediante as vossas prprias lutas, pelas vossas prprias dvidas, pelo vosso prprio entendimento da vida. Durante muitos anos aceitei muitas crenas, nunca as questionei, jamais convidei a dvida a entrar, porm, ao contrrio disso, evitava-a. Quando comecei a pensar por mim mesmo, no 111

www.lojajinarajadasa.com mais aceitei a autoridade de quem quer que fosse e comecei a projetar a sombra da dvida sobre tudo. Por este modo expulsei todas as dvidas e tornei-me a realidade. Agora, estou seguro do que permanece comigo. No tenho medo, pois ningum pode dar-me ou tirar-me a Verdade que me pertence. preciso que no mais sejais crianas a quem se diga o que deveis e o que no deveis fazer. No por este processo que se encontra a Verdade. PERGUNTA: Os membros da Ordem da Estrela desejam estabelecer os vossos ideais no mundo. Podem os vossos ideais ser expressos em termos concretos para os outros ou deve cada qual buscar esses ideais por si mesmo? Nesta ltima hiptese, pode haver trabalho coordenado? No se dar conflito? KRISHNAJI: Quereis dar a entender que o que eu digo, no bastante concreto. Quereis disciplinas, quereis caminhos traados retos, estreitos, regulares, pelos quais possais caminhar. Quereis que eu te diga que, se seguirdes isto, atingireis; se seguirdes aquilo, no atingireis. No haveis compreendido que o que eu digo prtico ao ltimo ponto. Se para vs no , prtico, porque o no aplicais a vs mesmos e, portanto, no ter o poder de derrubar a escura floresta das crenas, na qual vos achais perdidos. No que se refere ao conflito, digo que, se cada qual for uma lmpada para si mesmo, e por ela a si mesmo guiar, no projetar sombras sobre a face de outrem. Eu no quero altercar seja com quem for; no quero entrar em conflito com pessoa alguma, porque sigo aquilo que sei ser justo e jamais entrarei em conflito com outrem. Vs porm, pelo fato de no estardes seguindo a vossa prpria luz e, a todo instante vos achardes em dvida, questionando essa luz prpria, indagando sobre se certas injunes de autoridades no sero mais acertadas, projetais sombras, e da criais a confuso. PERGUNTA: A maioria dentre ns, tem que se empenhar em alguma atividade no criativa em virtude de razes prticas, e verificamos que freqentemente somos direta ou indiretamente arremeados naquilo que consideramos ao oposta Verdade. At que ponto estaremos justificados nisto? KRISHNAJI: Esta pergunta baseia-se em outra: o que importante e o que no , luz da Verdade? No isto? Precisais primeiro descobrir o que a Verdade e depois que houverdes compreendido - posto que no tenhais atingido - jamais cedereis, jamais transigireis com essa Verdade, posto que em coisas que sejam de muito pouca importncia luz da Verdade, possais ceder e transigir. PERGUNTA: A maioria dentre ns tm, at agora, confiado em fontes externas no sentido de obter inspirao espiritual. Vs nos solicitais a abandonar essas fontes como inteis. Que colocaremos em seu lugar? KRISHNAJI: Eu no vos solicito rejeitar coisa alguma. Se confiardes na inspirao externa h sempre a probabilidade, mesmo a certeza de que a vossa inspirao se esvair. Eu digo: para vossa inspirao, confiai na prpria Vida; enamorai-vos da Vida e a Vida vos inspirar sempre. Enamorai-vos da Verdade, da Meta em direo qual a humanidade luta e no necessitareis de inspirao externa. No vos estou retirando coisa alguma, vs prprios que retirais aquilo de que no mais necessitais. No vos estou esvaziando a taa, pode acontecer que a tenhais enchido de guas impuras e, verificando agora que elas esto impuras, as deiteis fora e enchais a taa de novo. Por favor, apercebei-vos de que eu no estou arrebatando-vos seja o que for. Pelo contrrio, se bem compreenderdes, verificareis que no somente estais enchendo as vossas taas, como tambm as taas dos outros com as guas duradouras que extinguiro para sempre toda a sede. Se, porm, no compreenderdes, vossa taa permanecer vazia ou cheia at aos bordos com guas impuras. Temo que estejais sempre considerando o lado negativo daquilo que eu digo, sem olhardes nem o positivo nem o dinmico, porm sim o esttico; e por causa disto sentis que sois deixados sem coisa alguma, que ficais vazios como uma casca. Se na realidade algum puder arrebatar-vos daquilo que possuis ento porque tal no digno de ser possudo. Eu daria as boas vindas de bom grado a quem quer que me arrebatasse as coisas que no valem a pena ser possudas. Como pensais vs que podereis buscar o duradouro, o eterno? continuamente pondo de lado as coisas que houverdes reunido, avanando sempre, jamais permanecendo em um abrigo por muito confortvel, por protetor que ele seja - pois ai se 112

www.lojajinarajadasa.com encontra a estagnao e a decadncia. Vs vos atemorizais das chuvas que vm e que ho de lavar o acmulo das impurezas das idades e tornar puras todas as coisas. PERGUNTA: Qual o melhor modo de responder s pessoas que fazem perguntas acerca da Ordem da Estrela? Quando digo que acreditamos na presena do Instrutor do Mundo, verifico que difcil explicar-lhes o que o Instrutor do Mundo. KRISHNAJI: Um dia estava conversando com um amigo meu, na Amrica, que jamais ouvira falar acerca do Instrutor do Mundo. Falei com ele durante muitas horas. Por fim ele disse "No sei quem sois, se sois o Messias ou o Instrutor do Mundo, porm o que dizeis parece ser justo e vou me esforar por compreender e viver de conformidade com tal compreenso. Mais tarde ele perguntou-me: " preciso que eu aceite o fato de serdes o Instrutor ou o Messias?" Eu lhe respondi: No vos preocupeis com isto. Se o que vos digo contem a Verdade em si, - se brilha pela sua prpria luz, devereis seguir e compreender essa luz e tudo quanto importa. Pelo fato de estar eu seguro do que sou, coisa muito simples para mim; mas, pelo fato de vos encontrardes incertos encontrareis tais dificuldades. pelo fato de acreditardes na autoridade que desejais transplantar essa autoridade para os coraes dos outros. Se vs como indivduos, houverdes compreendido e estiverdes transformando as vossas vidas, a vossa atitude em conjunto, vossas mentes e coraes, ento o povo vos escutar e ficareis capacitados a proporcionar-lhes o blsamo que h de curar as suas feridas. pelo fato de vos sentirdes incertos, pela fato de em vossas mentes existir confuso e distrbio que no sabeis o que responder. PERGUNTA: Se formos perguntados em que campo repousa a nossa crena de que vs, Krishnaji, sois o Instrutor do Mundo, que resposta vos aprazia que dssemos? KRISHNAJI: Sei que o inquiridor pessoa muito sria, porm a sua seriedade o transvia. Se meramente repetirdes as palavras que de mim aprenderdes, elas no tero valor algum para quem quer que seja. Como sabeis que eu sou o Instrutor do Mundo? Alguns dentre vs no conhecem nem a Krishnamurti, nem ao Instrutor do Mundo. divertido e, tambm, sob um ponto de vista, trgico, o prestardes tanta importncia s palavras. Tenho repetido continuamente que no tem importncia o poo de que extras as guas, desde que elas sejam puras, desde que mitiguem a sede dos homens. Vs vos preocupais com a construo do poo e no com as guas que ele contm. PERGUNTA: Um amigo meu disse-me que, desde que conheceu Krishnaji e seus ensinamentos sente que foi grandemente ajudado a encarar a vida com maior entendimento. Por seu turno ele quer ajudar a Krishnaji atingindo essa felicidade interna da qual Krishnaji fala, porm as circunstncias da sua vida so to integralmente adversas no sentido de tornarem para ele possvel a felicidade, que sente claramente no poder alcanar essa harmonia interna e calma que parece ser a condio preliminar para a felicidade e, portanto, para a libertao. Que deveremos responder a esse tal amigo e que podemos ns, que provavelmente nos encontramos em circunstncias menos adversas de vida, fazer para auxili-lo? KRISHNAJI: Por outras palavras, ele simplesmente sente que no pode alcanar essa harmonia interna. Ora, no se pode obter essa harmonia distanciando-se das circunstncias peculiares da vida. No se pode obter essa felicidade longe do mundo. Porque ento haveis de tornar essa felicidade algo aparte da vida, do mundo? E eu vos digo: a prpria vida do mundo, em sua consecuo, felicidade. PERGUNTA: Dizeis que Deus o homem purificado. Explicai, por favor, isto. KRISHNAJI: Amigo, no sois Deus manifestado em limitaes? No preencher, no libertar essa vida limitada, atingireis a Suprema Inteligncia sem limitaes, que ultrapassa o pensamento. Onde est a dificuldade? Dado o fato de a maioria das pessoas no mundo julgarem que Deus um Ser de barba longa, que se preocupa com cada indivduo isoladamente, guiando-o e protegendo-o, a Vida e semelhante idia de Deus entram em conflito. Se, porm, tratardes a Deus como sendo essa Inteligncia - Deus, Verdade, Felicidade, Libertao - e no algum ser

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www.lojajinarajadasa.com super-humano distanciado de ns, ento, essa Vida em si mesma vos ser uma inspirao, essa Vida vos guiar e proteger. Vida Deus, Nirvana, Liberdade, e todas as coisas. Esta vida, em sua consecuo, em sua liberdade perfeio. No busqueis, porm, o conforto por detrs dessas palavras, nem o abrigo contra entendimento, a luta, a tristeza e os regozijos da Vida. PERGUNTA: Terei eu entendido a opinio que freqentemente tendes dado relativamente ao valor das cerimnias? Refere-se ela somente nossa atitude interna em relao com elas a qual deve ser de desapego? KRISHNAJI: Se vos fiardes seja no que for para vossa felicidade, para vossa compreenso, ento aquilo em que confiardes jamais vos dar satisfao. Perguntais-me se as cerimnias devem ser postas de lado. No coloqueis de lado coisa alguma. Fazei aquilo que julgardes correto sem ser por causa do que eu digo. Digo eu que todas as coisas de que dependeis so muletas e vos limitam. Se quiserdes atingir o entendimento tendes que coloc-las de lado, porm isto deve sobrevir como um resultado de vosso entendimento e no em virtude da persuaso de outrem. PERGUNTA: So o Instrutor do Mundo e a Me-do-Mundo encarnaes dos princpios Universais Masculino e Feminino? KRISHNAJI: A Vida no nem masculina, nem feminina. Como me preocupo somente com a Vida, essas coisas tem pouca importncia para mim. Preocupo-me com a maneira de libertar a Vida, e essas expresses da Vida so para mim, digo-o de novo, de pequena importncia. a vida masculina ou feminina? Nas expresses da Vida existem homem e mulher, porm, a Vida que importa, no todas essas expresses dela. Essas formas da Vida so, para vs, importantes, e no a Verdade e a via para a sua conquista, a qual a via para a libertao da Vida. luz da Verdade as coisas que no so essenciais passam, as essenciais permanecem. Para, porm, atingir o entendimento disto, tendes que lutar, tendes que vos esforar, tendes que verter lgrimas e ter dvidas. No repitais, acompanhando-me, palavras sem as compreenderdes, pois que a autoridade semelhante a uma ciznia perniciosa que medra no jardim e mata todas as belas flores. Quero que vos certifiqueis de que a Vida que tem importncia, de que s a Vida tem valor. Eu preocupo-me com a Vida e o modo de libertar essa Vida, afim de que a felicidade possa ser atingida. PERGUNTA: A Teosofia, como todas as religies, ensina-nos a seguir a manifestao divina em seus estgios de involuo e evoluo. O Instrutor, porm, diz que o homem pode atingir a libertao em qualquer estgio de evoluo. No h perigo de violar as leis da evoluo, buscando libertar-nos antes do tempo? KRISHNAJI: Como poder qualquer pessoa libertar-vos? Como poder qualquer autoridade externa, por magnfica e grande que seja, libertar-vos de vossos desejos, de vossos anseios, de vossos pesares? Tendes que vos libertar deles por vs mesmos - e ningum pode fazer isto por vs - e ento no haver quebra das leis da evoluo, mesmo que vos liberteis j amanh. Podeis ligar o futuro ao presente. Em um dia esplndido, quente, cheio de sol, as flores que vm existncia regozijam-se e no perguntam porque foram produzidas antes das outras. PERGUNTA: A igreja Catlica Liberal ou no um instrumento direto do Instrutor do Mundo, como em 1925 no Congresso da Estrela em Ommen a Dra. Annie Besant declarou ser? Ela naquela ocasio falou, como o afirmou, por ordem e em nome do Senhor Maitreya, o Instrutor do Mundo, e agora, pelos lbios de Krishnamurti, o Senhor declara que religio e Igrejas no tem importncia. Que dizer acerca desta contradio? KRISHNAJI: Digo que cerimnias, igrejas, crenas, religies, so desnecessrias para a libertao da Vida. No direi jamais: Sim ou No. Isto seria um modo muito fcil de sairdes da 114

www.lojajinarajadasa.com nossa dificuldade e nesta direo encontra-se a autoridade e no o cultivo do entendimento. Porque que fazeis seja o que for na vida? Pelo fato de algum vos dizer que o faais? Porque pintais, porque compondes ou cantais ou fazeis qualquer outra coisa? Porque algum vos compele a isso? No obedecer autoridade de outrem est a escravido da Vida. Se eu disser sim ou no a esta pergunta, qual ser a vossa atitude mental? Vs prprios tendes que decidir. Deveis sair para fora do abrigo da autoridade e procurar. Neste caminho, somente, se encontra a liberdade e o atingir da felicidade. Eu no quero dizer: rejeitai um e aceitai o outro e por esse modo, novamente criar a confuso em nossas mentes. Vs prprios necessitais ponderar acerca das coisas, fazer o que julgardes reto, e no agir por meio de autoridade. Esforai-vos por encarar todas essas questes, sob um ponto de vista no limitado. Na limitao encontra-se a confuso e o tormento e longe de toda a limitao reside a clareza e o entendimento. Todas as religies, como disse, so o produto do pensamento gerado, cristalizado. No podeis sistematizar o pensamento. Nenhum grande Instrutor quis fundar jamais uma religio. O verdadeiro entendimento no reside na escravido. Sinto perturbar todos os vossos edifcios cuidadosamente construdos. Viestes para ouvir-me; tomareis aquilo que vos for conveniente e agradvel ao corao e rejeitareis o que vos for desagradvel. Provavelmente perguntar-me-o de novo como freqentemente o tm feito: sois realmente o Instrutor? Vs tendes que averiguar por vs mesmos quem eu sou. No haveis de verificar isto por meio de contradies, altercaes, discusses, controvrsias; porm sim, esforando-vos na direo da Verdade; eis como descobrireis. *** Espero que tendo feito estas perguntas, vossas mentes e coraes estejam libertos da confuso. Todas essas perguntas so baseadas, no no desejo de encontrar a Verdade, porm antes no desejo de criar novas autoridades em lugar das antigas. Eu quero mostrar-vos o caminho para a libertao da Vida; vs, porm, a todo o instante vos preocupais com coisas que no so essenciais. No so perguntas a respeito da Vida, porm acerca das vrias manifestaes dessa mesma Vida, que so as numerosas sombras projetadas atravs dessa manifestao. Quando entenderdes aquilo de que o mundo necessita, todas as trivialidades fenecero como folhas no outono. Porm, aquilo que eterno, essa felicidade que perptua e essa Verdade sem variao, sem comeo e nem fim, realmente, no vos interessa. Preocupais-vos principalmente acerca da sombra imediata da autoridade, o presente imediato no qual sois apanhados. Isso, para vs de mais importncia do que aquilo que vos estou dizendo. Porm, assim como o cume da montanha um mistrio para o vale, assim para o homem que habita nas plancies, onde residem as sombras, que so vises mutveis do eterno, a Verdade um mistrio. Eu quero que no estejais sempre a contemplar permanecendo nos vales, nas plancies, mas sim no cimo da montanha. Boletim Internacional da Estrela N. 10 rgo Oficial da Ordem da Estrela Novembro de 1928

UM SONHO ME ADVM POR ENTRE MULTIDO DE DESEJOS J. Krishnamurti

Quando a mente tranqila 115

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Calma de pensamento, e casto o corao Com a plenitude do amor incorrupto, Ento descobrirs, O amigo, Um mundo para alm das iluses das palavras.

Est dentro dele a unidade de toda a Vida. Nele reside a fonte silenciosa A qual sustenta os mundos em sua dana. Ah, diz fonte que se esquea de si mesma!

Nesse mundo no h cu nem inferno, Nem passado, presente, nem futuro, Nem pensar deceptivo Nem os suaves murmrios de amor moribundo. No h deuses, ali, Nem tempo impenetrvel Nem tu nem eu Porm somente a Vida que e que no .

Oh, procura esse mundo Onde a morte no baila em seu xtase sem sombras, Onde as manifestaes da Vida So como fardos que um lago espelhado conduz.

Est ao redor de ti E sem ti no existe. Rasga o vu que te separa E une-te fonte 116

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A qual sustenta os mundos em sua dana.

Ah! Diz fonte que se esquea de si mesma! A Estrela Ano II N 1 e 2 Janeiro e Fevereiro de 1929

TEMPO J. Krishnamurti
Este artigo um captulo de um novo livro LIFE IN FREEDOM que contem os discursos do Sr. Krishnamurti nas reunies do Acampamento da Fogueira em Benares, Ojai e Ommen durante o ano de 1928.

Para aqueles que descobriram a Verdade e atingiram o preenchimento da Vida que Felicidade e Libertao o tempo e as complicaes do tempo cessam. Aqueles, porm que esto ainda sujeitos ao jugo da experincia, so limitados pelo passado, o presente e o futuro. Vs que quereis descobrir a Verdade que absoluta e infinita, deveis realizar que sois o produto do passado e o resultado de vossa prpria criao. Estais trazendo existncia, de dentro de vs prprios, aquilo que haveis semeado no passado. E assim como o homem o produto do passado, assim, pelas suas aes de hoje ele pode dominar o futuro. O amanh depende de hoje e, portanto, o dia de hoje determina o de amanh. Dominando o futuro, tornaivos senhores do futuro. Trazeis o futuro para o presente. Todos no mundo se acham ligados pelas tradies, os medos, a vergonha, as crenas, a moral do passado. Se constantemente estiverdes a olhar para traz, jamais descobrireis a Verdade. A descoberta da Verdade eterna est sempre na vossa frente. Se na verdade compreenderdes isto, no vos apegareis ao passado. No estareis sempre a ser condicionados pelos pensamentos, pelas aes, pelos sentimentos, pelas ticas do passado, porque nele reside a estagnao e a escravido da vida. Cortai a ligao do passado como um homem dos bosques abre seu caminho atravs da floresta escura para alcanar os espaos abertos e frescas brisas. Pois o passado liga sempre, por glorioso, por bem amadurecido, por frutuoso que haja sido e o homem que quiser ser livre deve olhar eternamente para a frente. Se quiserdes caminhar, construir e criar no abrigo da eternidade, no deveis trazer o passado para conflitar com o presente. Pelo fato de a vossa mente e corao estarem ligados por tradies e crenas, pelos livros sagrados do passado, pelas sombras escuras dos templos e deuses rememorados, no entendeis quer o presentes, quer o futuro. O tempo, como o homem o entende, separa-vos da vossa meta. Assim, para aniquilardes o tempo deveis viver agora de tal modo que vos tornareis donos do futuro, de forma que o futuro se torne o presente. As pessoas gostam de pensar em si mesmas como glorificadas no futuro, ou repousando sobre os louros daquilo que foram no passado. Que idia confortante! A crena em vossa grandeza em algum futuro distante no vos auxiliar a defrontar a vida no presente, quando lutais, quando h confuso em vossa mente e corao. Eu no quis ser grande em um futuro distante, porm desejei se feliz no presente, quis ser livre no presente, quis ultrapassar todas as limitaes do tempo. Assim, convidei o futuro para o presente e da, conquistei o futuro.

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www.lojajinarajadasa.com No vivais no futuro, nem nas coisas mortas de ontem, porm, vivei antes no imediato agora, com a compreenso de que sois um produto do passado e que pelos vossos atos de hoje podeis dominar o amanh e assim vos tornardes senhores do tempo, donos da evoluo e, portanto, senhores da perfeio. Ento vivereis com intensidade maior, ento todos os segundos sero contados e todos os momentos sero de valor. Porm, vs vos atemorizais de um tal presente. Antes quereis muito mais ser condicionados pelo passado, porque vos horrorizais do futuro. Porm, o futuro no para ser temido por aqueles que caminham na via do entendimento. Se quiserdes chegar ao preenchimento da vida, deveis convidar o futuro para o presente e por meio deles criar um conflito em vos mesmos. Mediante o contentamento, no alcanareis a felicidade, mas sim um estado de estagnao. Se quiserdes conhecer a verdadeira felicidade preciso que haja primeiro esse conflito interno que trar existncia em vs a flor da vida. Ponde de lado o passado com todas as suas glrias, belas e terrveis, todas as suas tradies, amplas e no entanto to condicionadas, todos os seus sistemas de moral que estrangulam a vida e olhai para dentro do vosso prprio corao e mente para descobrirdes o que est adiante de vs no futuro. Pois assim como sois o produto do passado, assim o futuro se torna presente e nesse presente viveis. A Estrela Ano II N 1 e 2 Janeiro e Fevereiro de 1929

PARBOLA J. Krishnamurti

H uma montanha, muito alm das plancies e colinas, cujo grande cimo domina o escuro vale e o mar aberto. No lhe escondem a face calma, nem nuvens nem nevoeiros. Est acima das sombras do dia e da noite. Da vasta plancie, ningum a pode perceber. Alguns logram divis-la, mas ningum lhe alcanou a base. Um nico em cada milnio concentra suas foras e atinge a essa morada da eternidade. Falo do cimo desta montanha, serena, infinita, alm de todo o pensamento. Clamo de alegria. Um dia, um homem divisou pela entreabertura de uma nuvem, a face calma da montanha. Deteve quantos por ali passavam, que se demoravam para responder-lhe, deles indagando o caminho que o levaria para alm dos nevoeiros. Disseram-lhe uns: segue este caminho; e outros lhe indicaram: segue aquele. Depois de muitos dias de confuso e de esforo, chegou at as colinas. Um homem cheio de anos, sbio no que respeitava aos caminhos das colinas, disse: Eu conheo a senda. No podeis alcanar a montanha, amigo, se no for fortalecido pelo poder que provem da adorao da imagem daquele santurio. E muitos dias se passaram em paz. Cansado de adorar, ele indagou de um homem que parecia ter grande compreenso.

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www.lojajinarajadasa.com Sim, disse este eu sei o caminho. Mas, para conseguirdes a realizao de vosso desejo, levai isto convosco. Sustentar-vos- em vosso cansao. E deu-lhe o smbolo de sua luta. Outro clamou: Conheo sim, o caminho. Mas, muitos dias devem ser passados no isolamento de um santurio, na contemplao de minha representao da eternidade. Conheo o caminho, disse mais um outro. Deveis, porm, executar estes ritos, compreender estas leis ocultas; tendes que entrar para a companhia dos eleitos e ater-vos ao conhecimento do que vos der. Cantai bem alto em louvor desse reflexo que buscais, disse outro ainda. Vinde, segui-me, obedecendo em tudo quanto vos disser. Eu conheo o caminho, um disse tambm. No longo tempo assim despendido, a face calma da montanha por inteiro foi esquecida. Agora ele vagueia de colina em colina, repetindo: Sim, eu conheo o caminho. Mas... H uma montanha muito para alm das plancies e colinas, cujo cimo domina o escuro vale e o mar aberto. No lhe escondem jamais a face calma, nem as nuvens, nem nevoeiros densos. Paira acima das sombras do dia e da noite. Um nico em muitos milnios concentra sua fora e alcana essa morada da eternidade. Falo do cimo dessa montanha serena, infinita, alm de todo pensamento. Clamo de alegria. A Estrela Ano II N 1 e 2 Janeiro e Fevereiro de 1929

POEMA J. Krishnamurti

Oh! Ama a Vida. Nem o comeo nem o fim Sabem de onde ela veio. Pois ela no tem comeo nem fim. A Vida .

No preenchimento da Vida no h morte, Nem a dor da grande solido. A voz da melodia, a voz da desolao, O riso e o clamor plangente 119

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No so seno Vida em vias de consecuo.

Mergulha no olhar de teu prximo E alia-te com a Vida. Dentro dela est a imortalidade, Vida eterna imutvel sempre.

Existe, eternamente, variao gloriosa Na monotonia do dia e da noite.

Para quem no est enamorado da Vida, A Imortalidade no existe E sim o fardo da dvida E o solitrio temor do vasto isolamento.

Todas as coisas so grandes com a Vida. Feliz quem desvendou a origem de todas as coisas, E a ela se uniu perduravelmente.

Ama a Vida, no ames simplesmente. E teu amor, ento, no sofrer corrupo. Ama a Vida e teu discernimento sustentar-te-. Ama a Vida e no sers transviado Da senda do entendimento.

Qual os campos da terra se encontram divididos, Dividiu o homem a Vida E assim criou a tristeza. 120

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No cultuem antigos Deuses Nos altares com incenso e flores suaves. Mas antes, vem, Ama a Vida com grande regozijo, Clama no xtase do jbilo Pois no existe enredo no bailado da Vida.

Vem, vem, Pois eu sou essa Vida, livre imortal, E dessa vida eu canto, A origem da eternidade! A Estrela Ano II N 1 e 2 Janeiro e Fevereiro de 1929

POEMA J. Krishnamurti

A Verdade no bem nem mal. A Verdade no amor nem dio. A Verdade no o puro nem o impuro, A Verdade no santa nem profana, A Verdade no simples nem complexa, A Verdade no do cu nem do inferno, A Verdade no moral nem imoral, A Verdade no de Deus nem do Diabo, A Verdade no virtude nem vcio, A Verdade no nascimento nem morte, A Verdade no est na religio nem fora dela.

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A Verdade como as guas espraia-se, Sem lugar de repouso. Pois a Verdade Vida. Vi a montanha descendo para o vale ... A Estrela Ano II N 1 e 2 Janeiro e Fevereiro de 1929

A AURORA QUE VEM J. Krishnamurti

Assim como um homem na floresta se quiser alcanar os espaos abertos tem que abrir por si mesmo um caminho atravs da escurido dos bosques, assim todo aquele que deseja atingir a libertao da vida, tem que cortar para si mesmo uma abertura atravs das coisas no essenciais, as que no tem valor em si mesmas e so de importncia secundria. H muitas pessoas no mundo desejosas de sacrificarem as suas vidas, os seus ideais, porm muito poucas h que compreendem e, e isto de muito maior valor do que a renncia. Pois que da plenitude do entendimento advm a consumao da vida. A vida, que existe em cada um de ns, divina em si mesma e o atingir da liberdade, o alcanar da Verdade que felicidade, advm mediante o pleno desdobramento dessa mesma vida. Enquanto a vida for mantida em escravido, h probabilidade de luta e sereis colhido na roda dos nascimento e da morte, da tristeza e da misria, do mal e do bem. A vida em sua plenitude no pode ser condicionada pela crena ou pela religio, por credos ou dogmas, porm, dado o fato de que muitas pessoas desejam ligar a vida por meio dessas coisas, existe a desventura. Por todo o mundo existem estabelecidas leis de moral que nada tm que ver com a vida. Elas atuam como suporte para o fraco, porm, despedaam-se ao mais ligeiro esforo que sobre elas se exera. Pelo fato de todos se esforarem por amoldarem suas vidas a padres estabelecidos de moral, de crenas de religies, de dogmas e credos, existe o caos, existe o sofrimento e a desgraa. Podeis dizer Vs criareis desventura maior dando liberdade vida imediatamente; e eu vos respondo: Tudo o que tendes a fazer, se fordes inteligentes e sem empecilhos, olhar em derredor e verificar se existe ou no o caos, se no h desgraa, se no existe sufocao e opresso da vida no momento presente. Da, uma verdadeira desordem, uma desordem divina, necessria a fim de produzir a divina ordem. A ordem divina somente pode ser produzida por meio da libertao da vida, no pela escravido, no pela obedincia aos ditames de outrem, no colocando-se o indivduo sob o jugo da tradio e da autoridade. Quando libertais essa vida que divina, e a consumais, vs prprios vos tornais Deus. Por Deus no entendo o Deus da tradio, porm o Deus que est em todos e esse Deus somente pode ser realizado por meio do preenchimento da vida. Em outras palavras, no existe Deus, exceto o Deus manifesto no homem purificado, tornado perfeito. Quando atribus a autoridade externa uma lei e ordem espiritual e divina, estais limitando e sufocando essa mesma vida que desejais consumar e a qual quereis dar liberdade. Se houver limitao, haver escravido e da, sofrimento. De acordo com o meu ponto de vista, crenas, religies, dogmas e credos nada tem que ver com a vida e, portanto, com a Verdade. Na consumao da Vida por meio da experincia, existe a libertao. A libertao no uma qualidade ou condio qualquer negativa, porm, ao contrrio, se realmente a entende, o 122

www.lojajinarajadasa.com poder criativo que existe em tudo. Na mais plena expresso desse poder criativo est a glria da vida. Para usar um smile - se fordes a um templo com as mos vazias no sereis recebidos pelos Deuses, porm, se fordes com muitas flores, com grandes desejos, grandes ambies e grandes anseios, vs o sereis. Para atingirdes este preenchimento da vida deveis vir com grandes sobrecargas de desejos e anseios consumados e no sufocados ou oprimidos. Pelo fato de por tantos sculos no passado o homem haver modelado a sua vida por crenas estabelecidas, no teve capacidade para consumar a vida. Ento, perguntar-me-eis, de que maneira posso consumar a Vida? Que devo fazer para dar liberdade Vida? Eu conheo o modo por que atingi: se porm disser o que tendes de fazer, isso ser uma nova limitao da Verdade. Expor um mtodo definido de consecuo seria qualificar e negar a prpria coisa que eu sustento ser a Verdade, e da, seria uma traio Verdade. No desejo de modo algum impor autoridade ou destruir vosso poder de pensamento e sentimento quando digo que encontrei essa Verdade e atingi a libertao e por isso sou a corporificao da felicidade. Assim como a flor d seu aroma sem nada pedir em troca, assim eu vos pediria que tomsseis o que eu vos dou com compreenso. Nada quero em troca; no quero o vosso culto, no quero que me acompanheis, pois se me acompanhardes, corrompereis a Verdade. A minha maneira de atingir foi a de haver eu adorado em todos os santurios, consciente ou inconscientemente nesta vida; segui, obedeci, pus uma limitao quilo mesmo que desejava libertar. E observei os outros nessa luta para libertar, para consumar a vida. Vi multides em luta para libertar a vida opressa pelo desejo de outrem. Vi pessoas sbias, mas a quem faltava essa eterna felicidade, solitrias por no haverem consumado a vida, sozinhas, ainda que rodeadas pela multido, por no haverem realizado ou atingido a vida. Vi todas essas coisas. E assim como o rio cujo volume de guas o arrasta para o oceano, assim fui eu arrastado pelo volume de minha prpria experincia, pela minha prpria compreenso, produzindo-se da, a consumao. Pelo fato de estar eu livre, no condicionado por qualquer crena, no colhido por nenhuma sociedade, ordem, religio, ou credo e novamente digo isto com toda a sinceridade, e espero que acrediteis, com o entendimento do vosso corao desejaria tornar livres a todos, no convid-los para a minha gaiola particular porque no tenho gaiola. Meu receio que pelo fato de todos desejarem entrar para uma gaiola maior do que a que tm, se sirvam do que digo para construrem uma outra gaiola. Isto seria a negao, o atraioamento da Verdade. Eu quero, se o puder, mostrar-vos a luz, porm tendes que acender vs prprios o vosso archote na eterna chama. Uma vez que tenhais estabelecido o entendimento e o afeto dentro de vs, no sereis derrubados pelo vento da autoridade ou colhidos pela rede da tradio, ou no nevoeiro das crenas. A decepo vem ao corao e a corrupo mente quando repetis frases que no compreendeis, quando trilhais a experincia de outrem, quando buscais abrigo na sombra da autoridade. A decepo e a corrupo no vos perseguiro quando na verdade estiverdes obscurecidos pela tristeza e desejardes despedaar os grilhes dessa tristeza. Se a Verdade no for real para vs, posto que desejais ajudar o mundo ou a vs prprios - o que o mesmo no alcanareis xito e na realidade, somente vos estareis enganando a vs e aos outros. Para ajudardes verdadeiramente, tendes de haver vs prprios ultrapassado a necessidade de auxlio; para na realidade poderdes dar, tendes de no mais necessitar receber; para verdadeiramente amar, tendes de estar para alm do amor corrompido. Pelo fato de agora vos achardes incertos do vosso propsito, essa incerteza cria perturbao e descontentamento dentro de vs, porm, quando vossa meta se tornar clara para vs, dessa mesma incerteza uma grande certeza nascer; de vosso descontentamento um grande entendimento sobrevir. Se no houverdes acendido vosso archote na chama eterna da Verdade, as antigas e poderosas tradies e crenas, as magnficas estruturas das religies vos mantero escravos.

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www.lojajinarajadasa.com Se no tiverdes acendido dentro de vs a chama do desejo da liberdade, no podereis criar com grandeza; somente estareis brincando nas sombras do manifestado. Assim como as sombras se esvanecem, assim tambm as vossas obras. Por todo o mundo as sombras se aprofundam e a purificao e a consumao da vida recua cada vez mais para a retaguarda. Uma nova concepo de vida est nascendo no mundo e vs deveis esforar-vos por compreender, pois que existe algo de muito mais maravilhoso, muito mais convidativo, muito mais belo na aurora, a nascer amanh do que no por do sol de hoje. A Estrela Ano II N 1 e 2 Janeiro e Fevereiro de 1929

DISCUSSO EM EERDE J. Krishnamurti

Krishnaji: Certo dia, na Califrnia, estava falando aos meninos e meninas de uma escola. Todos eles se interessavam pelas idias que eu lhes ia apresentando, as mesmas que vos venho apresentando. A gerao dos mais jovens no aspira articulao de crenas, dogmas e religies, mas abrem seu caminho nova concepo da vida, como a flor aos pingos da chuva. Queixai-vos de no poderdes atrair a juventude ao vosso redor. Sei a razo. Quereis que tomem a peito vossas prprias crenas estreitas; quereis que aceitem vossa prpria forma particular de culto. No atras a juventude e essa a razo pela qual no vos conservais jovens, vs mesmos. Tenho falado a grande nmero de jovens e tm-me ouvido com maior compreenso, receio bem, de que alguns de vs. Isto assim acontece, por no convidardes o mundo para o vosso corao; convidais a estreiteza e a limitao. J. V.: Possuam estas crianas experincias de vidas passadas ou nasceram com novas idias? Krishnaji: No sei, quanto ao passado; tm certamente o desejo de examinar as novas idias e isto quanto basta para a compreenso. No dizem: Os velhos so bons o bastante. No importa se isto resulta ou no da experincia passada. Os resultados a esto. Querem saber, querem pr de lado o que velho e experimentar o que novo. Deveis poder oferecer-lhes o material com que pudessem fazer a experincia. J.: Sou tambm um trabalhador e vejo que os jovens querem algo ainda mais amplo que a Ordem da Estrela. Dizem-na dogmtica. Krishnaji: Vs a tornais dogmtica. Rajagopal: Sinto que toda a estreiteza e o tradicionalismo que procuramos introduzir na Ordem no deviam existir nela. Criamos complicaes fteis, porque no compreendemos que a Ordem meramente um conjunto de amigos que tem idias comuns, com muitos diferentes meios de expresso. Apegamo-nos ainda aos velhos mtodos de explanar aos outros aquilo em que cremos, mtodos que so cheios de limitaes, estreitos e usados. No tenho tido dificuldades em explanar Krishnaji aos que algumas vezes me tm vindo ouvir. No creio que tenham levado a impresso de que eu pudesse incutir-lhes as minhas idias. Transformamos as nossas idias em dogmas e esperamos que os outros as aceitem. Ouvimos do prprio Krishnaji a declarao de que a Ordem da Estrela meramente uma organizao, um agrupamento, uma unio de pessoas, que no deixam excluir os outros do seu ponto de vista, do seu interesse e portanto penso que no devia haver dificuldades. H algumas pessoas que, ou por no compreenderem o objetivo da Ordem ou por no gostarem de organizaes, pedem a sua dissoluo. Esquecem a existncia de milhares de pessoas que pela Ordem se interessam; se assim , porque no lhes

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www.lojajinarajadasa.com permitir que nela trabalhem? queles que se interessem pelas organizaes deve ser dada tambm a liberdade, que outros reclamam para si, de expressarem seu prprio ponto de vista. Krishnaji: Concordo bem. Fao tanta propaganda quanto vs todos fazeis. Tenho falado na ndia e em outros pontos, mas nunca pedi a quem quer que seja que ingresse na Ordem. No interessa pessoa comum saber se a conscincia do Instrutor do Mundo funciona desta ou daquela maneira todas estas complicaes por que vos interessais. Essa pessoa pergunta apenas: O que tendes a dizer? Se o que disserdes for so e razovel e no exigir inmeros artigos de f, estarei disposto a examin-lo; do contrrio, isso no me interessar. Eis tudo quanto querem saber. Costumais pr em primeiro lugar a crena no Instrutor do Mundo e pedindo a pessoa em questo que a aceite; digo-vos, porm, que essa crena no necessria compreenso da Verdade que trago. No que respeita Ordem, sois vs que a estais tornando estreita, no eu. Podeis limit-la ao ponto de excluir a todo o mundo, dizendo: Credes primeiro e depois trabalharemos juntos. Primeiro trabalhemos juntos e deixemos de lado as crenas. quelas pessoas que, como Rajagopal o disse ainda agora, tem em seu corao a crena e na mente a convico da necessidade de formar uma organizao em torno do Instrutor do Mundo, deve ser permitido fazer o que desejam, mas contanto que no excluam quem quer que seja da Ordem. A Vida no pode ser conservada em priso. Porque assim o tentais fazer, vm a tristeza, vm as contendas. O que precisais pois fazer? No, convidar as pessoas a ingressarem na ordem e sim, tornar conhecidas as idias. Mas o valor das idias no depende da expresso Instrutor do Mundo, e sim da prpria grandeza intrnseca de tais idias. F. C.: Mas porque ento termos a expresso Instrutor do Mundo nos objetivos da Ordem? Krishnaji: O Buddha usou o termo O Iluminado e Cristo, o de Filho de Deus. Pensais acaso que tivesse alguma importncia para Eles no serem chamados Filho de Deus ou O Iluminado? O nome serve como um foco, em torno do qual outras idias se podem congregar e nada mais. Como o Buddha disse que era O Iluminado, assim eu digo que sou o Instrutor do Mundo. Podeis, porm inventar um outro termo. O nome em si mesmo de muito pouca importncia; mas tem importncia como uma idia em torno da qual outras se congreguem, se podeis compreender o que desejo dizer. V. Ia fazer a mesma pergunta que F. C.. O termo Instrutor do Mundo no usual; no do uso comum. Ns compreendemos o que com ele exprimis, mas outros podem ter dificuldades. Krishnaji: muito simples. Instrutor do Mundo aquele que vai pelo mundo a ensinar. Se assim o explanardes eles compreendero. No h melhores palavras para expressar isto na lngua inglesa. Rajagopal: A dificuldade surge, parece-me por terdes em vossas mentes um fundo de quadro para essa expresso. Partimos, muitos de ns, da idia nos ltimos dezessete anos; estivemos a anunciar essa idia ao pblico em geral, relacionando essa idia com Krishnamurti. Agora no usamos a palavra Christo ou Buddha mas usamos um termo que expressa o significado que pretendemos transmitir O Instrutor do Mundo. Se alguns preferem chamar Krishnamurti ao Instrutor do Mundo e outros chamar Instrutor do Mundo a Krishnamurti, o que h nisto que deva nos preocupar? tudo muito simples se tomardes o trabalho de explic-lo; o Instrutor do Mundo a pessoa que tem uma mensagem para cada indivduo do mundo que o queira ouvir. No vejo porque tantas dificuldades em torno de palavras. Se desejais abolir certos termos, outros tero de substitu-los e ento outras pessoas faro objees ao fraseado que houverdes escolhido. Por que tanto nos preocupamos com palavras? Pessoalmente, eu, embora muito cuidadoso quanto ao uso das palavras, tenho procurado e penso que o consegui no me apegar s palavras, mesmo quando pronunciadas por Krishnaji, e sim buscar e alcanar a vida por detrs das palavras. Isto me deixa cheio de entusiasmo e sempre cheio de interesse e de alegria. Entretanto se comear a me apegar s palavras Krishnaji emprega termos que um dia me trazem uma certa impresso diferente, dependendo isto muito de minha disposio de esprito estarei cheio de entusiasmo num dia e no outro, inteiramente abatido, no que respeita ao Instrutor do Mundo. Quem quer que considere isto honestamente consigo mesmo, chegar a mesma concluso. A compreenso do que diz Krishnaji depende tambm da disposio de esprito do indivduo. Por isso, no s o tipo ordinrio de tolerncia deve inspirar todos quantos 125

www.lojajinarajadasa.com rodeiam a Krishnaji, mas sim uma super tolerncia. Inumerveis perturbaes se deram no passado e se do no presente e se daro no futuro, pelo fato de tanto nos preocuparmos com a nossa prpria compreenso especial de sua mensagem, e embora Krishnaji declare expressamente que no deseja que procuremos convencer a outros despendemos grande espao de tempo argumentando, procurando mostrar a outros que o seu ponto de vista errneo, que sua compreenso se acha, ainda que ligeiramente, desviada. Por que no deixar cada qual cuidar de si tanto dentro como fora da Ordem, e procurar simplificar realmente o problema do indivduo? Se Krishnaji me dissesse: Dissolvamos a Ordem, eu concordaria, no pelo fato de aceitar o alvitre em virtude da autoridade, mas pelo fato de estar vendo sempre as limitaes, a extraordinria complicao de uma organizao. Por outro lado, porm, no havendo organizao, ento como o tenho dito - h alguns que discordam os ricos sempre tero a possibilidade de v-lo, por possurem os recursos que lhes daro a oportunidade, enquanto que milhes de pessoas jamais dele se poderiam aproximar, no fossem os Acampamentos de Ojai, Ommen e ndia. Todo o objetivo da organizao de criar essa oportunidade. Exagerais a importncia da organizao e depois desejais destru-la. Pondes sobre vs a cadeira em que vos devereis sentar. Se considerardes a Ordem da Estrela antes de tudo como uma organizao destinada a auxiliar Krishnaji em seu trabalho, no haver dificuldades. Por que confundir o maquinismo de uma organizao com a vida espiritual dos indivduos que a ela pertencem? A que surgem as complicaes. Parece-me que se usssemos de certa discriminao, alguns destes problemas desapareceriam. Que os jovens venham a vs ou no venham isto depende da compreenso do indivduo que lhes fala. Nada adianta queixarmo-nos de que s atramos pessoas de idade; pelo fato de nos sentirmos idosos, que somente atramos pessoas de idade. E as pessoas de idade tambm devem ser levadas em considerao. Assim tambm aqueles que no sejam extraordinariamente inteligentes. A mensagem de Krishnaji no se destina somente a pessoas a quem sem indelicadeza possamos chamar de gnios, e sim para toda espcie de gente, inteligente ou no, bonita ou feia. Tenho intensa convico de que, se apenas quisermos procurar descobrir o verdadeiro objetivo deste movimento, o veremos como um auxlio, como uma ponte. Se o transformarmos numa barreira ou empecilho, darei todo o apoio idia de dissolv-lo imediatamente. Krishnaji: Para o caso de algum de vs ainda no houver compreendido o que se pretende significar com a expresso Instrutor do Mundo, parece-me conveniente explic-lo mais amplamente. Sustento que existe uma Vida eterna, que a Fonte, a Meta, o Princpio sem Fim. Somente nesta Vida est a plena realizao. E todo aquele que atingir a realizao desta Vida tem a chave da Verdade sem limitaes. Esta Vida para todos. Nesta Vida, o Buddha, o Christo, entraram. Do meu ponto de vista, eu atingi, eu entrei nesta Vida. Esta Vida no tem forma, como a verdade no tem forma, nem tem limitaes. E a esta Vida cada qual tem que voltar. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929

O FIM NO COMEO C. Jinarajadasa Um dos grandes erros em que incidimos o de dividir a vida em duas metades. A maneira mais comum separar a vida em boa e m. Uma vez isto feito, tornamo-nos aliados de uma e inimigo da outra. A partir desse instante, o nosso julgamento o de um partidrio, significando isto que nele j h um desvio. A religio, que insiste em classificar as coisas e os acontecimentos em bons e maus, , por isso mesmo sempre unilateral. O verdadeiro homem

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www.lojajinarajadasa.com espiritual tem grande trabalho para eliminar de sua natureza essa uniteralidade que lhe imposta por sua religio. O vislumbre real comea quando o homem passa a aceitar a vida como um todo, e no fendida em duas partes. Enquanto chamar bem felicidade e mal ao que penoso, ele est sendo atrado por uma destas coisas e repelido pela outra. Ora, atrao e repulso so foras e tais foras comeam a agir, a primeira para unir o objeto atraente ao atrado e a segunda prendendo o objeto repelido quele que o repele. O homem que ama o bem e desgosta do mal objeto da atuao de foras do exterior; ele no pode se isolar suficientemente para compreender a ao destas foras. Tal homem pode ser muito religioso e professor de uma srie de credos, mas ainda lhe falta descortnio. Seu Ego, sempre o segue, com os seus gosto e no gosto. No pode ver a coisa tal qual . Entretanto, sem este descortnio, ele tem de estar constantemente a desviar-se da senda direta para a sua meta, muito embora ansioso e ardentemente desejoso de ating-la. Os sbios hindus sempre procuraram uma nica meta alcanar o Um Sem Segundo. Pois para eles onde quer que houvesse a possibilidade de existir um eu como coisa distinta do no-eu, a inevitavelmente aparecia o Karma, porquanto o eu tem que atuar sobre o no-eu e este sobre aquele. Com essa atuao comea o Karma e, com ele, logo gira a longa ronda do nascimento, morte, vida no espao intermdio do cu e de novo nascimento. A nica Libertao possvel, portanto, firmar-se nesse Uno Sem Segundo. Se a finalidade da evoluo para uma alma conhecer-se como o Uno Sem Segundo, essa finalidade est implcita em cada instante compreendido entre o incio e o fim do tempo. A meta que parece to distante existe mesmo no primeiro passo em sua direo. O idealismo e o realismo que to freqentemente so opostos um ao outro, so na realidade inter conexos e as coisas tais quais como so mesmo agora j so moldes das perfeitas coisas tais quais devem ser. Segue-se da que o sentir-se unificado com o Um Sem Segundo uma experincia possvel mesmo agora, quando ainda to distante nos encontramos da Libertao, e devidamente assentarmos a meta, dela nunca nos afastando; a alegria de alcan-la estar sempre mais prxima, mesmo que o corpo fique extenuado, como se a ponto de partir-se. Isto porm, a Vida indivisa e total para aqueles que clamam por essa Vida.

Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929

A CHAMA J. Krishnamurti

H alguns anos eu conversava com um grande amigo meu, algum que no pensa inteiramente minha maneira, ainda que concorde comigo em muitas coisas que, porm, no to intransigente como eu. Disse-me ele que eu era suave como as guas que serpeam, sem ter o fogo necessrio para a destruio das coisas inteis e a criao das essenciais. E terminou dizendo: se quiserdes fazer algo na vida tendes de possuir a chama branca para levar por diante a vossa proposta. Pelo fato de encontrar oposio s vossas idias as guas doces que serpeam sero dominadas e desviadas para outros propsitos de irrigao que no o de dar vida s terras crestadas. Tenho pensado durante estes ltimos dois anos, considerando acerca do que ele disse, e cogitado se no chegou o tempo de que a chama branca comece a arder. Eu sustento que a chama da qual falou o meu amigo necessria, porm que necessrio tambm ter pacincia.

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www.lojajinarajadasa.com Essa primavera, em Ojai, observava eu um pardal a construir seu ninho exatamente do lado de fora de meu dormitrio. Era um ninho muito precrio, por ter sido construdo exposto ao sol aberto. Quem quer que viesse e inconscientemente empurrasse o toldo inevitavelmente destruiria o ninho. Eu o observava dia a dia e vi o ninho vindo existncia, vi os imensos esforos da me-pssaro, suas lutas gigantescas para criar um ninho bonito, no qual depositou trs ovos sucessivamente, noite aps noite. Na construo desse ninho, em posio to precria, e na produo dos jovens pssaros, a despeito do descaso dos seres humanos e da crueldade dos outros animais, esse pequeno pardal lutava contra o mundo inteiro na sua criao. Ele tinha a chama branca necessria para contender, para lutar e afirmar-se a si mesmo. E esse pardal deu-me o entendimento necessrio de que a chama branca vem, no por um sbito espocar, porm mediante a pacincia, a contnua afirmao da verdade essencial, pelo contender contnuo contra as pequenas coisas da vida, contra as estreitezas da crena e o mesquinho entendimento. Ter-me-ia sido muito fcil o arremessar-me contra a parede da ortodoxia e da tradio e dos grupos de crena, j h alguns anos, porm isso teria sido pouco sbio, pois que a muralha achava-se ento muito forte; poucas pessoas havia que realmente compreendessem, e que, por esse fato, ajudassem a abrir uma brecha na muralha. Porm agora, decorrido o tempo que aqui tenho estado, esta chama branca fortificou-se dentro de mim e jamais transigirei seja com o que for, jamais tentarei conciliar coisas que no pertencem verdade. Pessoalmente, jamais porei de lado o eterno por amor ao transitrio. Tenho cogitado acerca de quantos de vs possuem a chama, quantos dentre vs so semelhantes ao ao forjado pelas vossas prprias mos, pelo vosso prprio entendimento e pelo vosso prprio contender contra a vida. Eu estou agora seguro em mim mesmo, estou seguro daquilo que digo. Ainda que todos discordem de mim, ainda que todos lutem contra mim, ainda que todos me desentendam naquilo que eu digo. Quanto mais desentendimento houver, quanto mais divergncia de opinies, mais seguro estou. Quisera que o mesmo acontecesse convosco, no por causa do que eu digo, mas pela vossa prpria percepo. Ento esse conhecimento e sabedoria dar estabilidade ao vosso entendimento, de modo que nada possa destru-lo; de modo que sempre alimenteis a chama branca que queima as escrias, as coisas inteis da vida, e destri as inmeras muletas e divises que mantm o povo separado. As doces guas coleantes so muito mais agradveis de contemplar-se, e deliciosas de sobre elas deslizar, porm se quiserdes ir para o mar onde h muitas vagas, tormentas e tempestades, tendes de abandonar as doces guas coleantes, deixando-as para trs, tendes que coloc-las de lado e aventurar-vos a descobrir a vossa prpria sabedoria, e conhecimento contra essas coisas que no so essenciais e so destitudas de importncia. Para isso preciso ter coragem, no a coragem estpida nascida da falta de reflexo, porm a coragem nascida do entendimento, a coragem nascida da inteligncia. Como talvez se d o fato de alguns dentre vs concordarem comigo, e vejam e sintam e saibam e compreendam comigo, digo: se no transigirdes com a verdade, ento a realizao da felicidade e ponderao dessa felicidade no mundo tornar-se- certeza. Porm, se vs, que haveis percebido, que tendes conhecido, que haveis considerado e entendido comigo, no tiverdes a chama branca e meramente estiverdes coleando com as doces guas, no criareis, no vos anteporeis s velhas crenas e tradies. O tempo de colear brandamente passou, - no talvez para vs outros, - mas, para mim... No para aqueles que houverem visto, que houverem conhecido, que houverem compreendido, no para as pessoas que a todo o instante se preocupam com a conciliao e a transigncia, porm para aqueles que convidaram a dvida a entrar e venceram essa dvida, e puseram de parte a conciliao. No podeis estabelecer conciliaes com a verdade a verdade no pode ser torcida, dobrada ao vosso propsito. Jamais curvareis a verdade ao vosso particular entendimento, mas ao contrrio, tereis que tornar flexvel o vosso entendimento junto verdade; endireitai as coisas que estiverem tortuosas afim de entenderdes a verdade. E para que possais endireitar essas coisas que foram entortadas, necessitais uma chama. Se quiserdes dobrar o ao para lhe dar um molde particular, tendes que o aquecer; assim pois, se quiserdes endireitar, tornar retas em vs essas coisas que foram entortadas, tendes que ser aquecidos pela chama branca da verdade. Tendes que ser como o mar contra o qual nada se pode antepor, cujas guas esto em contnuo movimento, jamais tranqilas, destruindo sempre as barreiras que os homens lhe antepem para as conter. Se uma pessoa estiver morrendo e a quiserdes fazer reviver, e faze-la voltar vida, vosso doce temor de a ferir no vos deter no convidar o cirurgio que h de curar. No verdadeiro o afeto que teme ferir; amoroso aquele que luta contra o falso sentimento, as vs esperanas e os prazeres passageiros. Se vs que haveis visto, sustentardes 128

www.lojajinarajadasa.com a verdade sem transigncia, avanaremos juntos; se assim no for, permanecereis sobre as doces guas coleantes deslizando suavemente, com os vossos prazeres particulares, vossos deleites, suaves conciliaes, e a Verdade e eu ficaremos longe. De que serve todos vs concordardes comigo, simpatizardes comigo, sorrirdes com deleite ao que digo, se no houver a verdadeira alterao em vossa mente e corao, se no se der o endireitamento daquelas coisas que esto tortas? Eu vos digo que a Verdade muito sria para que com ela se brinque; ela muito perigosa para terdes uma parte de vosso corao no templo da Verdade e outra parte no templo das irrealidades e meias verdades. Pois este caminho o da tristeza, o caminho da contenda, o caminho das crenas vs que ho de decair. Se no possuirdes esta chama branca que vem do entendimento, que nasce da pacincia, no entrareis nesse reino onde habita a Verdade. Como uma flor suave que decai e perece, assim ser aquele que meramente se apega aos doces gozos, porm, se quiserdes ser como a rvore que resiste a toda a tormenta e se balana a todas as brisas, necessitais deleitar-vos na Verdade e caminhar luz da Verdade. *** A busca da Verdade mais importante do que a mera crena. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929

CONSTRUIR SOBRE O ENTENDIMENTO J. Krishnamurti

Desejara resumir tudo quanto vos hei estado dizendo aqui durante a ltima semana, afim de tornar claro s vossas mentes o meu ponto de vista. O mais importante para mim possuir o desejo de liberdade, no baseada na autoridade pessoal, no engrandecimento pessoal ou nos desejos pessoais, porm no valor intrnseco dessa mesma liberdade que consigo traz a felicidade. No pelo fato de eu vos querer livres; no porque vos deseje felizes, que deveis desejar a felicidade. Busca-se liberdade por via desse grande desejo que nasce dentro de ns como resultado de grande luta, grande sofrimento, e grandes anseios. Se no possuirdes este desejo de liberdade, vossa estrutura integral se encontrar baseada sobre a autoridade e, da, acha-se sujeita a ser abalada e destruda pelo prprio processo de construo. Aquilo que tem de durar sculos, no pode ser obra de um homem somente. Sociedades, instituies, corporaes religiosas baseadas sobre a idia do homem ou sobre a autoridade de um homem ou sobre a sua personalidade, esto sujeitas a serem pervertidas e deturpadas. Se este ponto se encontrar claro em vossa mente, no sereis abalados em vosso entendimento pela autoridade ou pelo deslumbrante esplendor de uma personalidade qualquer. Se buscardes esse entendimento que se baseia no no encantamento de grandes frases ou na luz de um outro indivduo, porm em vosso prprio desejo, ele perdurar; de outro modo, ele perecer. Eu no quero seguidores, pois a partir do momento que seguis a outrem, no podereis verdadeiramente construir. Eu jamais quis discpulos. Aborreo prpria idia de algum se intitular meu discpulo. Sde antes os discpulos desse entendimento que o fruto do pensamento amadurecido e do grande amor, sde os discpulos de vosso prprio entendimento.

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www.lojajinarajadasa.com Eu tomo isto muito a srio, - to seriamente, que no transijo com ningum sobre este ponto, por muito grande que esse algum seja. Se realmente seguirdes vosso entendimento da Verdade, seguireis a mim. Porm, se somente seguirdes o entendimento de outrem, atraioareis toda a verdade, destruireis com uma das mos o edifcio que estiverdes construindo com a outra. Vs me haveis perguntado como levar minha mensagem ao mundo. Se esta mensagem no se houver tornado a vossa tambm, no ter valor algum. Se vos quiserdes assemelhar ao gramofone em seus registros, repetindo minhas frases, formareis uma outra sociedade, outra religio, outro templo no qual havereis de estrangular a vida. Afim de convencerdes a outrem da verdade existente em vosso entendimento, daquilo que porventura aqui houverdes colhido, deveis vs prprios tornar-vos essa mensagem. Se minha personalidade ou minha autoridade pode dominar vossos coraes e vosso pensamento, ento a autoridade e encanto de um outro pode sobrepor-se tambm a todo o vosso entendimento. Se baseardes o entendimento na autoridade ou no culto pessoal, ela no poder ter fundamento perdurvel e da maior importncia o compreender isto. Nos antigos tempos a autoridade decorrente dos feitos de um homem era utilizada para expandir seus ensinamentos e entendimentos da vida. Agora no deve ser assim; ao contrrio, a conquista de um outro homem deve despertar o entendimento em vs mesmos, e pela fora desse entendimento saireis para o mundo, porm no sob a bandeira pessoal ou sob a autoridade da conquista de outrem. Ser-me-ia muito mais fcil dizer: Citai-me, utilizai-me como vossa autoridade, para espalhardes o que eu estou ensinando. Se, porm, fizsseis isto, a mensagem no seria de vosso entendimento. Se, ao contrrio, compreenderdes e realmente viverdes esse entendimento em vossa vida diria, ento no haver corrupo ou limitao da Verdade. Eu no quero edificar. Vs, que estais vivendo aqui em Eerde, que estais edificando este lugar sobre o vosso entendimento da Verdade; e se vosso entendimento for pequeno, vossa edificao ser pequena. Se for construda sobre a autoridade, ruir. Se, porm, vosso entendimento for grande, vosso edifcio ser grande, perdurvel, resistindo a todas as tempestades. No vos deixeis arrastar por minhas palavras, porm pensai profundamente na verdade que diante de vs coloco. Podeis tornar vossa vida em Eerde um espelho, onde o esforo individual para compreender se reflita sem perverso. Em muitas instituies a organizao devora os indivduos que a compem e o homem que a edificou. Quando o fundador desaparece, a prstina beleza de sua idia desaparece tambm. A alicerce sobre o qual deveis construir vosso edifcio deve ser o entendimento liberto. Fazei a coisa reta pelo fato de vs prprios o quererdes fazer. No compete a mim ou a outrem dizer-vos o que reto. Se partirdes desta idia, essencial que sejais francos convosco mesmos. No vos enganais a vs prprios com belas idias, com desejos pessoais, com preconceitos pessoais, com entendimento estreito. Se vos encolerizardes e fordes francos acerca dessa clera, vossa franqueza a matar. Se porm, estiverdes encolerizados e tentardes encobrir essa clera com a desculpa da ao de outrem, jamais a vencereis. O mesmo acontece com a paixo. Se possuirdes uma paixo fsica, se aprenderdes a compreender a razo dela e a vs prprios no enganardes, ento essa paixo no se assenhorear de vs. Se quiserdes fazer algo que seja contrrio ordem estabelecida na sociedade, quer se trate de uma seita, ou de uma religio e houverdes meditado cuidadosamente sobre as conseqncias de vossa ao, estareis em pleno direito de a executardes; estareis efetuando a coisa que para vs reta. Isto, porm, exige inteligncia e o exame impessoal de vs prprios e o no vos deixardes arrebatar por mesquinhas emoes relativas a coisas que no tenham importncia. O mundo sofre em virtude dos ditos da autoridade, ao passo que deveria ser encorajado a buscar o entendimento. Cavai um poo em vosso prprio jardim em lugar de seguirdes o impulso da multido que vos quer levar a qualquer reservatrio afim de mitigardes a vossa sede. 130

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Iremos ao encontro de muitas dificuldades no futuro. De ano para ano, eu espero, as dificuldades aumentaro cada vez mais. E quanto maior a dificuldade, maior o entendimento exigido. por isto que eu desejara que todos vs passsseis atravs de dificuldades tremendas. Pode parecer-vos uma coisa dura este meu desejo, sob um certo ponto de vista se, porm, o contemplardes sob um ponto de vista so e de juzo equilibrado, concordareis comigo. No devereis fazer deste lugar um mosteiro moderno, confortvel para onde visseis evitar dificuldades, onde o esforo individual fosse negligenciado, onde conflitos emocionais e levantes fossem temidos. No fim de tudo, qual a caracterstica do verdadeiro religioso? O poder de vencer a circunstncias luz de sua percepo da verdade. Se sua percepo for mesquinha, pouco vencer; porm, se sua percepo for vasta, seus desejos sero imensos e ele desafiar montanhosas dificuldades para serem vencidas. O desejo s pode ser acrescentado e tornado esplndido pela compreenso verdadeira. Se vossa percepo for limitada, vossos desejos sero limitados. Se, porm, a vossa percepo for vasta e livre como os cus abertos, ento os vossos desejos sero amplos, livres de empecilhos. Quando possurdes esta ampla percepo, no mais sereis limitados pela mesquinhez, pelo cime, pela clera, pelos medos, prazeres e desprazeres. O que vitalmente importa, que compreendais, que me faais em pedaos vs que ides construir e eu no. Se possurdes a verdadeira percepo da vida ela afetar o modo de vos comportardes, o modo de conversardes, o modo de sentirdes. Quando estiverdes colricos, ciumentos e cheios de vs mesmos, isto demonstrar que ainda no haveis adquirido grande percepo. Deveis estar vigilantes para no perderdes um nico incidente de vossa vida, do qual possais extrair a essncia de seu perfume. Vs ides criar a opinio pblica, vs ides para o mundo com o perfume de Eerde. Se o vosso perfume de entendimento desaparecer depois de poucas horas de exposio brilhante luz do sol, no ter valor. essencial possuir este ponto de vista amplo, esta percepo verdadeira, este entendimento e amor vida. Sobre ele podeis construir um edifcio que jamais poder ser destrudo. Quando com a verdade fordes, ento podereis agir com verdade. No podeis separar vosso ser de vossa ao. Se pelo menos houvesse uns poucos no mundo que realmente compreendessem, poderamos criar um mundo novo, alteraramos a expresso da vida. Se, porm, no houver entendimento, outra religio, outra seita, outra igreja, outro deus ser criado. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929

O OUVINTE IDEAL C. Jinarajadasa


Introduo a uma das reunies de Perguntas e Respostas de Krishnaji, no Acampamento de Ojai, de 1928, por C. Jinarajadasa no revista pelo autor.

Quero transmitir-vos um trecho de conselho que deu o Bispo Leadbeater em relao queles que vem ouvir a Krishnaji. Temos em Krishnaji uma personalidade nica. Nenhum de 131

www.lojajinarajadasa.com ns teve experincia antecipada de uma tal personalidade por que, quando ele fala, fala a vrias partes de ns mesmos. Ns, sob um aspecto, achamo-nos sobre o plano fsico, operando atravs do crebro fsico, o que mais se acha em contato com a personalidade e a mente inferior. Existe tambm a mente superior, o ego, que est por detrs; existe a natureza de Buddhi e ainda outros aspectos. O orador ordinrio apela para a vossa conscincia apenas no plano inferior. Quando Krishnaji responde a perguntas, fala conjuntamente a todas as partes de vs. E por isto que ele nico particularmente, no entendimento da verdade quando o escutais. Portanto, quando ele falar, atentai. Esforai-vos por serdes um ouvinte ideal, que com desapaixonamento se esfora por entender a sua mente. E quando vos estiverdes esforando por escutar, atentos, perguntas e mais perguntas iro surgindo em vossa mente, pondo-o em conflito. Deixai de lado essas perguntas de desafio durante o tempo que o ouvirdes. Tomai-as depois novamente, porm no permitais vossa mente inferior interferir com correntes subsidirias enquanto ele fala. Sede semelhante a um verdadeiro cientista que depara dasapaixonadamente com um fato novo. Quando Krishnaji vos disser algo que no entenderdes e que parea complicar o vosso problema de vida no cedais ao aborrecimento. O Bispo Leadbeater resume o seu conselho nas seguintes palavras: Tome o que puderdes e deixai de lado o que no puderdes tomar. Quando estiverdes escutando, reacionai, em face do ensinamento, se o puderdes. Se no o puderdes, no forceis. Acima de tudo, durante o tempo em que ele estiver explicando, no permitais que a vossa mente inferior confunda o que ele diz com uma poro de outras perguntas. Fazei tudo isso depois que deixardes o acampamento, porm, durante este tempo, sede um ouvinte ideal. Lembrai-vos de que Krishnaji no est falando somente para ns aqui; ele est falando para toda a humanidade e falando para as geraes futuras. Por que alimentais a presuno de que podereis solver todos os problemas ou que podereis entender tudo quanto ele diz? No tenteis resolver tudo agora. A coisa mais importante esta escutai; e ponderai em vosso corao o que no puderdes entender. Eis um nico tpico de conselho que eu vos quisera dar, pessoalmente. Quando quer que faais uma pergunta, esforai-vos por vos lembrardes do vosso carter representativo. No faais perguntas que meramente se refiram a vossas dificuldades e problemas pessoais. Esforai-vos, se o puderdes, por pensar: o que que o mundo quereria saber? Uma oportunidade nica se nos oferece agora para alcanar alguns indcios da verdade. Podeis expor vossos prprios problemas, porm, antes de decidirdes sobre uma pergunta, perguntai a vs prprios: ser esta a coisa que o mundo quer conhecer, a que h de auxiliar a evoluo do mundo? E portanto, como as reunies de perguntas se tornam uma parte da mensagem de Krishnaji, e como ele deseja que lhe faam perguntas, recordai-vos de fazer perguntas tais que o mundo nos sculos que ho de vir se sinta feliz de escutar. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929

PROPAGANDA J. Krishnamurti Disseram-me que eu falo contra a propaganda. Como pode isto ser, se viajo por todo o mundo afim de propagar a minha idia? Isto propaganda. Desejo dissipar as sombras da mente humana. Quero que as pessoas sejam mais felizes do que so, e que sintam que dentro delas prprias reside a vitalidade, que se acham sufocadas por complicadas teorias, crenas e autoridades. Esta a melhor espcie de propaganda, porque torna o povo feliz. Porm, se vs entenderdes mal a minha idia da propaganda, refugiar-vos-eis em uma atitude negativa;

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www.lojajinarajadasa.com direis: no necessito fazer coisa alguma! Isto ser, novamente, um infortnio, se no examinardes as coisas pelo seu valor intrnseco e saltardes a concluses sem exame crtico. H duas maneiras de efetuar a propaganda: uma tornando-se um exemplo vivo, a outra o esforar-se por impor as prprias idias aos outros, palestrando, chamando, por meio da insinceridade. loucura tentar convencer a outrem quando se no possui a certeza. Isto acalenta um esprito de insinceridade e hipocrisia, que tem de ser despedaado pela vida. E, como eu sou essa vida, quisera despedaar todas as insinceridades e hipocrisias. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 1 e 2 (da anual em Ingls) Dezembro de 1928 e Janeiro de 1929

O DESEJO A VIDA J. Krishnamurti

Desejo vida. Vida em consumao, a perfeio do Desejo.

Assim como o aroma de uma flor solitria desejo Que fenece com a morte da flor, O qual em si mesmo no tem ser Mas nasce para o regozijo com a Vida;

Como as guas rugidoras tumultuando atravs da escurido do vale Oculto, ululante, terrvel o desejo. Irado como as guas que buscam a liberdade o desejo. Ai daquele que por ele colhido.

Atravs do vale escuro Jazem os campos ridentes, 133

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E o aroma de muitas flores. O temor do desejo o expulsar da Vida. A Estrela Ano II No. 3 e 4 Maro e Abril de 1929

UMA VISO DA VIDA J. Krishnamurti

Um dia, de minha janela, contemplei o campo verde, ensolarado, distncia. Quisera falar deste cenrio, quisera descrever esta viso. Pelo fato de a maioria das pessoas no mundo se preocupar continuamente com as coisas que imediatamente as rodeiam, cujas sombras as empolgam, quando um homem vem de campinas verdes e lhes entoa o canto dos cus abertos, no fazem caso de ouvi-lo. Seus pesares e complicaes so para eles mais importantes que a vida que habita a campina verde. S se preocupam com as expresses da vida, porm, para alm de todas as expresses, existe a vida eterna, e nessa vida existe a unidade. Quisera mostrar o caminho da liberdade queles que esto presos escravido, pois somente na liberdade pode existir felicidade, e felicidade o que todos desejam. Tenho visto pessoas inmeras nos meandros da religio, nos meandros da riqueza, nas gaiolas dos desejos e nas sombras das crenas, e no so felizes. Seus semblantes traem-lhe a angstia; na riqueza de suas mentes e coraes no encontro sua consecuo. Quisera abrir-lhes as portas e mostrar-lhes o caminho para a felicidade. Tenho observado pessoas em todas as condies de vida e verificado que se encontram escravizadas pelas circunstncias que as rodeiam, pelos seus credos; acham-se colhidas pelos laos das religies, da riqueza, dos temores, acreditando que tais coisas so necessrias para o preenchimento da vida. Tenho-os observado envoltos na sombra de suas obras; e no h contentamento em seus coraes, nem grandeza em suas mentes. E, disse eu a mim mesmo: estes so os caminhos que criam complexidades. Deve haver uma via simples; deve existir uma via direta. Tendo sido educado com certas idias, eu as coloquei de lado, visto no estar contente com o que me havia sido dado. Busquei para alm delas todas, e atingi minha meta. Convidando a dvida, achando-me em revolta e em descontentamento, jamais aceitando autoridade de outrem, crescendo em solido e em fora, encontrei a minha felicidade. Desde que encontrei a felicidade e sou esta felicidade; visto que descobri a Verdade e sou esta Verdade quisera mostrar-vos a senda. O caminho para a felicidade encontra-se em vosso prprio corao e em vossa prpria mente e, em sua purificao reside a consecuo. No na dependncia de auxlio externo para vos apoiar, nem pela confiana na religio, nos ditames, leis de conduta, leis de retido e moral; porm, sim, desenvolvendo a vossa prpria fora, que percebereis a Verdade, e pelo vosso prprio desejo inato atingireis a liberdade. Para compreenderdes a vida, tendes que purificar vossa mente e vosso corao e estabelecer harmonia dentro de vs prprios. Durante muito tempo vos haveis apegado s autoridades, s crenas; haveis lutado, e no sois felizes. Haveis tido vossas religies, vossas cerimnias, vossos livros, e vossas maneiras de encarar a vida, e estas no vos trouxeram a felicidade. E agora eu vos digo: experimentai a minha senda.

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www.lojajinarajadasa.com Para poderdes alcanar a felicidade, tendes que pr de lado aquelas coisas que no so essenciais e olhar para a vida nos campos abertos, afim de vos guiardes. Somente por esta viso da vida podereis crescer, ser sustentados e nutridos. Se fordes alimentados por coisas que no sejam essenciais, d-se a fadiga de corao e a corrupo da mente. Deveis cultuar quilo que incorruptvel, deveis dar o vosso amor quilo que se acha para alm da corrupo. pelo vosso prprio entendimento que crescereis. Pelas vossas prprias lutas e desejos que atingireis. Mantenha o desejo constantemente aberto atravs de todas as sombras e trevas do vale e atingireis como eu atingi o cimo da montanha. Todos os templos me prenderam, toda a imagem despertou em meu corao um xtase, toda a filosofia me proporcionou um deleite mente: e fiquei prisioneiro de todas elas. Pelo fato de as colocar de lado e buscar aquilo que est para alm da filosofia, para alm das escuras imagens esculpidas, para alm da armadura das religies, atingi; porque no mais me abrigam, acho-me livre. A Verdade que jamais pode ser condicionada, que jamais pode ser limitada, reside em mim. O que h de temer nisto? O que h a para desentender? Que h a que possa determinar ansiedade? Nenhum de vs feliz com vossos sistemas, vossas filosofias, vossas cerimnias, vossos credos, vossas religies e vossos Deuses; e, no entanto, temeis abandon-los. Todos vs desejais ser felizes e, no entanto, temeis deixar de lado vossos pequenos contentamentos. Se vossas crenas podem ser despedaadas, no so dignas de serem possudas. Se vossos sistemas so to frgeis que no podem resistir s tempestades da dvida e da tristeza, merecem perecer. Se o vosso culto ou adorao no despertou o perfume da felicidade em vosso corao e mente, pouco valor tem. Olhai para dentro de vs prprios e averigueis se estais livres de todas as coisas dos amores; das vossas adoraes; de vossas teorias; de vossas crenas. Contemplai e veja se h dentro de vs o xtase de propsito e o poder de criar no eterno. Se no tiverdes dentro de vs o intenso anseio de atingir a libertao, tanto vs como as vossas palavras sero como as sombras que passam. No vos digo isto por dureza, porm sim porque sois infelizes, porque vos encontrais lutando, porque existe o descontentamento em vosso corao e mente, e por isso que eu quisera mostrar-vos a via para a felicidade. No vos posso, porm, mostrar a senda ou tornarvos compreensivos se exigirdes que a Verdade seja deprimida, estreitada, e condicionada, se encarardes a Verdade com a vossa limitada viso. No h solido para o homem que compreende; no h solido para aquele que est buscando a Verdade. Todas as coisas so suas companheiras e amigas. Todos vs temeis a solido e, no entanto, todos estais solitrios e por causa deste medo, no existe entendimento. Sede responsveis, para convosco prprios, por todas as vossas aes. No busqueis abrigo na autoridade externa. Para poderdes atingir, mantende-vos em vossos prprios ps. Para preencherdes a vida colocai-vos para alm de toda a experincia. Para grandemente amardes, sede portadores de afeto, em vosso corao, por todas as coisas. A Estrela Ano II No. 3 e 4 Maro e Abril de 1929

NO TENHO NOME J. Krishnamurti

No tenho nome, Sou como as frescas brisas das montanhas, 135

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No tenho abrigo, sou como as guas que vagueiam. No tenho santurios, como os Deuses escuros Nem sou a sombra profunda dos templos. No tenho livros sagrados Nem estou amadurecido na tradio.

No estou no incenso Subindo aos altares elevados, Nem na pompa de grandes cerimnias. No estou na imagem esculpida Nem no rico canto da voz melodiosa. No me ligo a teorias Nem estou corrompido pelas crenas. No sou colhido na escravido dos credos Nem na angstia piedosa dos sacerdotes. No estou atado por filosofias Nem amarrado ao poder de suas seitas.

No sou elevado nem baixo, Nem suave nem rude. Eu sou o cultuador e o cultuado. Sou livre.

Meu som o som do rio Clamando pelos mares sem fim Vagueando, vagueando ...

Eu sou Vida.

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www.lojajinarajadasa.com A Estrela Ano II No. 3 e 4 Maro e Abril de 1929

O PERFUME DO MUNDO J. Krishnamurti

Como da matriz profunda da montanha Nasce a corrente rpida, Assim da profundeza do meu corao Brotou um jubiloso amor Em eterna unio com o amor mutvel O perfume do mundo.

Por vales ensolarados correm guas formando lago aps lago Sempre a vaguear, jamais tranqilas. Assim o meu amor Vazando-se de corao em corao.

Como a corrente clara da montanha se torna impura Ao perpassar pelas ruidosas moradas dos homens, Assim meu amor contaminado, Tem sido ao passar de mo em mo, Corrompido pela confuso do amor.

Como as guas se movem tristemente Pelas trevas, em vale cavernoso, Assim tem vindo a fluir o meu amor, Tardo, com vergonha do desejo fcil.

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Como as rvores altas so destrudas Pelo impulso das guas Cuja fora lhe nutriu as profundas razes, Assim o meu amor rasgou cruelmente O corao no seu rejubilar. Despedacei a rocha sobre a qual crescera.

E, como o lago amplo e imvel Foge agora para o mar bailante Cujas guas no tem limites, Assim o meu amor na perfeio de sua liberdade.

Acho-me em unio eterna com o amor mutvel Que o perfume do mundo. A Estrela Ano II No. 3 e 4 Maro e Abril de 1929

O RIO DA VIDA J. Krishnamurti

Um rio que corre rapidamente e constantemente procura caminho para os mares abertos, forma, freqentemente, s margens, poas de gua estagnada que perduram durante um ano inteiro, at que a estao chuvosa venha e lave as guas paradas, propelindo-as para a corrente principal. A vida para mim semelhante a este rio, e sustento que mais rpido e fcil entrar no mar aberto da libertao e da felicidade, nadando na corrente principal da vida do que permanecer nas guas estagnadas, retardadas, onde a vida no existe, onde se criam crenas, e executam ritos e se fazem muitas coisas que so desnecessrias ao progresso humano. A palavra progresso soa desagradavelmente aos meus ouvidos, pois que o progresso necessita certas obrigaes e exigncias que ligam. O homem que apanha um animal selvagem na floresta e o coloca em uma jaula, pode pensar que, por hav-lo domado, o auxiliou em seu progresso. Ele, porm, somente o aprisionou em uma jaula. O progresso acha-se definido no dicionrio como avano para adiante. Porm, sem o conhecimento de vossa meta ftil o avanar. Sem um propsito na vida, o homem assemelha-se ao animal selvagem aprisionado em uma jaula. Em lugar de procurar libertar-se da jaula, d-se ao trabalho de enfeitar-lhe os vares.

138

www.lojajinarajadasa.com A maioria das pessoas, pelo processo da indiferena e do olvido, expulsam de suas mentes a tristeza e a dor que existe no mundo. Constroem, em redor de si mesmas, paredes que lhes proporcionam o abrigo e o conforto da estagnao. Pelo fato de viverem em um estreito crculo, sua atitude de corao e mente limitada e, em vista desta limitao, julgam todas as coisas. Criam para si mesmas jaulas de religies, de credos e de dogmas. Em lugar de desejarem escapar para o ar aberto e para a liberdade, permanecem em suas estreitas gaiolas cujas barras adornam, em vez de as despedaar. Entretanto, sem liberdade, no pode existir verdadeira felicidade. Se quiserdes nadar pela rpida corrente, no ligueis a vida crena, orientai-a pela razo. Quando estabeleceis crenas com a finalidade de viverdes nobremente, a vida torna-se complicada, porque ento tendes de obedecer a certas leis, executar certos ritos, cultuar certos Deuses, e obedecer aos seus ditames. Por exemplo, acreditais que existe um Nirvana ou um cu e que, afim de l entrardes, tendes que fazer ou no fazer certas coisas. Tendes f em uma coisa acerca da qual nada conheceis e depois baseais vossas aes nessa f. Acontece, no entanto, que se viverdes nobremente, inevitavelmente criareis um cu. A vida mais importante do que a crena. O preenchimento da vida mais importante do que o desenvolver de teorias e dogmas. Todas as pessoas desejam, no mundo, a felicidade felicidade no sentido verdadeiro, que no depende da autoridade, quer de Deuses, quer das escrituras porm, em lugar de a buscarem diretamente, fazem da crena a coisa mais importante e, assim, se transviam; so aprisionadas em um templo ao lado da estrada. Imaginai que quissseis subir ao cimo de uma montanha. No caminho ascensional h muitos abrigos e em cada abrigo existe um deus particular clamando pela vossa obedincia. Seus intrpretes querem que escuteis este rito, que sigais aquele caminho de superstio. Por qualquer rasgo de boa fortuna ou em virtude de vosso prprio sofrimento, sois forados a sair de um santurio, mas somente, para correr para outro. E assim continuais sempre, pelo fato de submeterdes a vida crena. Ao passo que, se sujeitardes a vida razo, ao entendimento, encontrareis a liberdade. Eu sempre desejei a liberdade. Sempre andei descontente com dogmas, crenas e credos. Verifiquei que muito poucos se libertavam dessas ligaduras e que, havendo encontrado essa liberdade, a proporcionavam aos outros. Em uma floresta espessa, podeis notar como uma pequena planta luta para crescer; porm, as grandes rvores lanam sobre ela a sua sombra e no lhe permitem desfrutar a luz do sol e o ar fresco. Assim como a pequena planta da floresta luta para crescer, assim cada qual deve lutar para atingir a libertao. Assim como a semente que est sob a terra forada pela vida interna a despedaar o solo duro e defrontar a luz, assim, tambm se algum for impelido pelo seu desejo de atingir a liberdade, despedaar todas as limitaes circundantes. A maioria das pessoas filiam-se a religies e a sociedades afim de as utilizarem como cabides onde possam dependurar seus problemas no resolvidos; porm, a libertao alcana-se fazendo face vida, e no fugindo dela. As pessoas sacrificam-se por uma idia, porque no dominam essa idia. Se uma idia no conduz liberdade e a um maior entendimento da vida, que utilidade pode ter? A vida pode ser atada pelas idias como o tem sido pela moral. Mas a vida flui, continuamente, para a frente e a moral estacionria. A moral deveria mudar constantemente, para manter o passo com a vida e, no entanto, aplicamos uma moral que tem milhares de anos aos problemas de hoje, e por essa forma, criamos dificuldades. Seguimos as tradies dos sculos passados, em lugar de criar novas tradies, todos os dias, pelas quais possamos julga e nos orientar para resolvermos os problemas da vida. Pelo fato de eu haver encontrado a liberdade, quisera tornar livres todos os homens; se, entretanto, eu der indicaes para atingir a liberdade, elas somente sero aplicveis a uma gerao. Se expuser regras mediante as quais os homens devam viver, essas regras sero tambm uma limitao. Adestrai-vos a vs mesmos, pela observao. Este o processo mais simples. Todos os outros so complicados. Quando vejo pessoas vencidas e escravizadas por uma idia, aprendo, por observao, que suas idias no lhes proporcionam liberdade, e apenas matam a vida. Aprendei a observar a vida e jamais estareis atados. uma mania moderna as pessoas filiarem-se a sociedades, instituies, a este e aquele movimento, para auxiliarem os outros a progredirem. Progredirem em direo a que? H somente uma meta para todos, que a liberdade e a felicidade. E, se for 139

www.lojajinarajadasa.com propsito fixo do homem atingir esta meta, isto se tornar a fonte nica de inspirao de que ele necessita. A felicidade jamais vos vir do exterior, tem de nascer dentro de vs. Podeis criar uma rosa falsa, de papel, porm ela artificial, sem fragrncia. No podeis criar a rosa verdadeira, ela tem que nascer do labor da terra. Aps muitas estaes de ventos, chuvas, sol, espera e luta, nasce a rosa. Assim tambm deve nascer, do vosso interior, a verdadeira felicidade. A maioria das pessoas so ligadas pelos seus afetos, pelos seus desejos, pelas suas ambies, pelas suas tradies. Na obedincia a estas coisas no existe a liberdade. Aqueles que se acobertam sob a sombra da autoridade, nunca vero o firmamento aberto e as estrelas cintilantes, jamais gozaro as frescas brisas do cu. Eu atingi os cus abertos da liberdade, para jamais me tornar a ligar, para jamais tornar a ser colhido com estreitas limitaes. Eu quisera propelir outros a atingirem esta liberdade, porm, cada qual tem de encontr-la a seu prprio modo, que o caminho direto do entendimento. Os homens podem procurar a liberdade por muitos caminhos, porm no fim, a vida os forar a voltarem ao verdadeiro caminho do entendimento que jaz dentro deles prprios. A Estrela Ano II No. 3 e 4 Maro e Abril de 1929

PARBOLA J. Krishnamurti

Em meu jardim h vida e morte, o riso de muitas flores e o choro das ptalas que caem. Uma rvore morta e uma rvore verde contemplam-se uma a outra. o auge do vero e as sombras danam livres em redor da rvore morta. O cntico das guas no a far bailar, nem a chuva chamar existncia as folhas ocultas. Ah! Ela est to estril, to vazia! Quem a nutrir, quem a ir acariciar com vida? Os cus distantes contemplam a rvore morta e a rvore viva. *** Atravs do inverno doloroso, jaz escondida uma semente de amorosa promessa. Ventos frios, rajadas despedaantes, tempestades barulhentas, retardam a lindeza da semente. Dias escuros e horas sem sol, negam a glria da semente. Com a brisa suave do clido sol a semente desperta para a vida. Atravs do peso da terra dura, a vida irrompe e se rejubila. Cresceu no p, a beira da estrada, entre as pedras ociosas. Com sua nica flor, danava o dia inteiro. Um menino a caminho de casa, arranca-a e joga-a fora. 140

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Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 5 e 6 (da anual em Ingls) Fevereiro e Maro de 1929

EXPECTATIVA E CONSECUO Lady Emily Lutyens Agora que o Instrutor est conosco, s vezes til retroceder em pensamentos, aos dias de espera e verificar at que ponto se achavam afastadas da realidade as crenas e as esperanas que possuamos. Isto era inevitvel, dada a circunstncia de estarmos na expectativa de algo totalmente fora da linha das nossas experincias; e no entanto, ainda essas crenas errneas se apegam a ns em alguma extenso e nos tornam difcil o compreender a Verdade que Krishnaji coloca diante de ns. Examinemos algumas delas. 1o) Espervamos algo sensacional, sobrenatural, algo que viesse lisonjear a nossa curiosidade e estimular os nossos desejos de excitabilidade. 2o) Todos espervamos que quando o Instrutor viesse, nos tornaria todas as coisas fceis, carregaria com os nossos pesares, solveria os nossos problemas e nos ensinaria a viver. 3o) Pensvamos muito naturalmente que ele teria discpulos e cuidvamos de nos adestrar para serv-lo dignamente. Filiamo-nos ao Grupo de Auto Preparao porque supnhamos ser ele passagem para o discipulado. 4o) Aqueles dentre ns que ramos teosofistas (a maioria) sentamo-nos certos de que, ao passo que seria difcil para as pessoas do mundo exterior, compreenderem o Instrutor, isto no aconteceria a ns, porque, certamente, ele seria teosofista e seu ensinamento se basearia na doutrina Teosfica. Nosso estudo Teosfico havia nos ensinado tanto, acerca dos Instrutores do Mundo no passado, coisas que os outros no conheciam, que, certamente, isso nos ajudaria a compreender o Instrutor no presente. Agora, porm, que o Instrutor se encontra entre ns, e o que que verificamos? 1o) Que em sua vinda nada houve de sensacional, nada de sobrenatural, nada que induza ao excitamento ou curiosidade. Krishnaji tornou-se o Instrutor, to simples e naturalmente, to formosamente, como um boto de rosa que abre as ptalas ao sol. Alguns acham-se desapontados queriam que houvesse um pouco mais de sensao. Um membro referiu-me a sua desiluso pelo fato de Krishnaji, ao falar, no usar a voz direta, por outras palavras, no usar outra voz que no a sua normal. Porm, no mais belo assim? No mais glorioso contemplar a perfeita flor da humanidade do que qualquer estranho fenmeno fsico? Ns, porm, no queremos apreciar a Krishnaji como ele , queremos disseclo, queremos reduzi-lo a pedaos, inquirir qual a proporo em que a conscincia se um Ser maior se manifesta atravs dele perguntas essas que so ao mesmo tempo, inteis e impertinentes. Se ele no foi suficiente para ns, em sua nobre simplicidade, no nos aproximaremos da Verdade que ele representa, apegando-nos curiosidade e s asseres ignorantes. 2o) Agora que o Instrutor aqui se encontra, muitos verificaram que a vida se tornou mais difcil em vez de mais fcil e, em lugar de resolver todos os nossos problemas, ele nos deu outros mais, para resolvermos por ns prprios. Em lugar de carregar os nossos fardos ele busca tornar-nos mais fortes para os carregamos ns mesmos. No acalenta a nossa fraqueza, apela para a nossa fora. No isto muito mais grandioso e admirvel do que se ele fizesse tudo 141

www.lojajinarajadasa.com por ns e assim aumentasse a nossa debilidade? Se ele retira de ns todas as muletas, porque verifica que temos fora bastante para nos mantermos por nossos ps. Deveramos nos regozijar pelo uso desabitual de nossos membros sem empecilhos. A Vida apela para a vida em cada um de ns. 3o) Agora que ele aqui est, informa-nos que no quer discpulos ou seguidores. Algumas pessoas ficaram terrivelmente chocadas com estes dizeres. Porm, quo mais esplndido o apelo que Krishnaji nos faz, do que o seria qualquer proselitismo pessoal? Sede discpulos da Verdade, diz ele e ento caminharemos juntos e seremos eternos companheiros. A personalidade passa, a Verdade eterna. 4o) Os teosofistas acham mais fcil de entender a Krishnaji do que as pessoas do mundo exterior? No acredito ao contrrio. A teosofia uma teoria de vida enormemente complicada; Krishnaji coloca, diante de ns, uma Verdade que grande em sua simplicidade e ns nos esforamos por adapt-la s nossas concepes teosficas e porque se no adapta, perturbamo-nos. Olhamos para ele atravs de culos teosficos, esforamo-nos por enquadrar seu ensinamento dentro de gria teosfica, inquirimos se, por Vida, Krishnaji quer dizer eu conscincia; esforamo-nos por complicar tudo que ele torna simples. Para aqueles que encaram a teosofia como uma verdade viva, em vez de uma forma concreta, estas dificuldades no surgiro. Vemos que a Dra. Besant (um exemplo to nobre para ns) reconheceu em Krishnaji o Instrutor do Mundo que traz uma nova expresso da Sabedoria Divina ao mundo e, portanto, ela prpria fechou sua Escola de Teosofia com suas formas antiquadas de estudar e tentar compreender a Verdade Viva do Instrutor. Sejam os alunos dessa Escola to sbios e to leais quanto a Dra. Besant. Muitos, porm, so acossados pelo medo de perderem alguma coisa, de perderem sua oportunidade de salvao. Disseram-nos, tnhamos lido acerca do caminho do discipulado, que o nico que conduz Iniciao, que nos salvar para sempre, e agora Krishnaji diz que a Libertao pode ser alcanada em qualquer estgio da evoluo. Se ns abandonarmos esses canais que, dizem-nos, levam Iniciao, e no encontrarmos a Libertao, onde ficaremos? No inferno da oportunidade perdida. Pessoas comeam j a inquirir o que acontecer quando Krishnaji se for. Perguntam se o caminho do discipulado ficou fechado, agora que o caminho direto est aberto, e se continuar aberto este caminho depois que ele houver partido. Que completa falta de entendimento tais perguntas evidenciam. Acha-se, por acaso, o caminho direto aberto ou fechado por mando de outrem ou pelo vosso? Pode a simples unio com o Bem Amado que Vida ser obtida para vs ou por outrem que no vs prprios? Oh! Gerao insensata e covarde! Atemorizai-vos da grande aventura, temeis percorrer o deserto de vosso prprio corao sozinhos, se no for com o abrigo imortal. Apegai-vos aos vossos abrigos, s vossas autoridades, aos vossos escassos lusco-fusco, enquanto que a glria da vida passa adiante. Quando fordes discpulos da Verdade, no necessitareis de outro Mestre, quando entrardes na liberdade da Vida, no necessitareis de outra Iniciao. Algum maior do que os vossos livros, do que os vossos ritos, do que as vossas religies e as vossas crenas aqui se encontra. Deixemos as pequenas coisas passarem, ao menos enquanto o Maior de todos est conosco. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 5 e 6 (da anual em Ingls) Fevereiro e Maro de 1929

MEDITAO COLETIVA J. Krishnamurti

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www.lojajinarajadasa.com Meditar criar, e contemplar coligir o material com que podeis criar. Ao contemplardes, ao exteriorizardes vossa devoo, acumulais material. Quando contemplais, sonhais, ides a outros planos, a outros prados, e colheis; e quando meditais, concentrais tudo quanto reunistes e construs. Assim, quando meditais, deveis concentrar-vos, embora seja isto muito difcil. Somos todos indivduos diferentes uns dos outros e todos queremos alcanar a fonte da Vida. Sabemos o que esta fonte e quando meditamos em conjunto, devemos alcan-la juntos. Posso alcan-la, talvez, mais rpido que algum outro e, outras pessoas muito mais rpido do que eu. Mas precisamos adiantarmo-nos juntos, e sentir juntos. E quando todos estamos trabalhando juntos, progredindo juntos, e realmente nos alegrandos juntos, h uma diferena em nosso aspecto, em nossa atitude, onde quer que vamos. No vagueeis em vossos pensamentos, quando meditando juntos. Podeis faz-lo quando no jardim vos encontrardes, por vs mesmos; ento deveis contemplar e acumular. Mas, quando meditais, deveis concentrar-vos e construir. Esquecei vossos gurus, vossas distintas sendas, vossos vrios tipos, vossos temperamentos diferentes. S h um Mestre no mundo, um s Instrutor, uma s Fonte e, se tocardes esta Fonte, se nela vos desalterardes, ento ajudareis a humanidade. O Amado, a quem seguimos, todas as coisas. Quando pensais nele, quando sois parte dele, quando ele se torna vs mesmos, esqueceis vossos temperamentos e tipos. Todos ns somos um, todos queremos felicidade, todos aspiramos a Verdade, todos desejamos ser livres. *** A meditao deveria ajudar-vos a entrar em contato com a realidade da vida, com a beleza da vida e com a felicidade que eterna. A meditao deveria dar-vos o mpeto de que necessitais para alcanar espiritualmente. Deveis vigiar-vos, recolher-vos e compor-vos, de modo que mente e corao se tornem tranqilos, de maneira a poderdes, como uma lagoa tranqila, espelhar a glria do Amado. Ento tereis essa tranqilidade, essa paz, essa dignidade controlada e esse grande amor que vossa herana natural, No vos estagneis, no vos apegueis a vossos antigos padres, mas adquir sempre novas e frescas idias. Subi um pouco mais alto, de modo a terdes uma diferente viso do cimo da montanha, assim como do vale, e uma viso diferente da aurora, e se isto fizerdes, ganhareis nova fora, uma vitalidade nova, uma felicidade nova. Quer sejais instrudos ou ignorantes, jovens ou velhos, deveis todos lutar por atingir a amizade real, a felicidade duradoura que nasce da realizao da suprema Verdade. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 5 e 6 (da anual em Ingls) Fevereiro e Maro de 1929

O VALOR DA INDIVIDUALIDADE J. Krishnamurti

O esprito de individualidade vem prevalecendo por toda parte sobre o esprito de aristocracia. Entendo por aristocracia uma aristocracia de cultura, de refinamento de pensar e sentir. O esprito burgus que um esprito de mesquinhez, estreiteza e mediocridade deseja deprimir o esprito da verdadeira nobreza, que no a nobreza dos ttulos e da posse de uma multido de coisas. O desejo de seguir, de imitar, de ser leal, que prevalece no mundo em geral, a anttese da compreenso real. Todos quereis ser livres, mas a liberdade s pode ser alcanada quando estiverdes acima da lealdade, acima do desejo de imitar e de se amoldar aos pensamentos de outros. Mesmo entre as pessoas cultas, h a tendncia para reduzir todas as idias a formas, a certos padres definidos e concretos, reproduzindo depois, essa concretizao em si mesmos. O

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www.lojajinarajadasa.com nico meio de ultrapassar esse estgio de limitao, que em sua essncia mediocridade, aspirar verdadeira felicidade. Muita gente pensa que a felicidade significa poder cada qual fazer o que bem lhe agrade; mas a verdadeira felicidade no implica falta de disciplina, de restrio ou auto domnio. Se me permitis, por um momento, eu tomarei o meu prprio exemplo. Sempre quis ser livre e penso que agora sou livre dos crculos traados ao meu redor, isto , das circunstncias que me cercavam. Todos temos na vida circunstncias especiais que nos foram, que nos impulsionam a amoldar-nos a um certo padro particular. O gnio aquele que se liberta dessas circunstncias, que as ultrapassa em desenvolvimento. Como queria ser livre, tinha que permanecer vigilante, vendo que crculos se traavam em redor de mim. muito fcil seguir, ser leal a algum outro; mas muito difcil ser leal a si mesmo. Parece-me que o esprito de mediocridade s pode ser dominado se todos procurarem, a cada momento, lutar, pr de lado as influncias que o impulsionam a conformar-se, a amoldar-se a um padro. A concordncia e a aquiescncia do tipo errado gera a mediocridade. Mas, se houver uma real revolta da mente e um imenso desejo de afeio e de compreenso, ento o esprito de mediocridade pode ser sobrepujado. Levar a mente a um estado de grande revolta, parece-me ser o primeiro dever de todos, porque, ento, nascer a verdadeira compreenso. Preferiria haver-me com pessoas que fossem contrrias a tudo quanto digo, mas que se esforassem por entender, do que com pessoas que comigo concordem a cada instante, porm sem compreenso. Tenho visto, em todo o mundo, que posso falar com pessoas que so absolutamente isentas de uma convico, que so cpticas, cheias de preconceitos, que zombam nas entrevistas como nas reunies pblicas mais facilmente do que com aqueles que imitam ou seguem cegamente e levantam, assim, um muro entre a compreenso e eles prprios. O verdadeiro contentamento vem pela compreenso, e a estagnao resulta da satisfao de si mesmo. Aqui em Eerde no deve haver estagnao, porque aqui deveramos cultivar o esprito de absoluta liberdade de pensamento. No h outra retido a no ser a retido da conduta e esta s pode nos advir com o verdadeiro desejo do esprito de liberdade. Eerde deveria produzir, no a mediocridade, e sim mentes e coraes que tenham em si a qualidade do gnio; e s podeis ter isto se, como fim do quadro da vida, houver o desejo de liberdade. Outra tendncia prevalecente em toda parte o desejo de citar autoridade. Isto acontece especialmente na ndia, onde a mente cultivada no esprito do passado. A tudo quanto digo, logo objetam: isto no est escrito em nossos livros sagrados, Sri Krishna no disse isto, o Buddha no disse aquilo; e assim, continuamente se julgado, no pela verdade do presente, e sim pela tradio e pela autoridade do passado. A concordncia, com compreenso, a essncia da amizade. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 5 e 6 (da anual em Ingls) Fevereiro e Maro de 1929

PARBOLA J. Krishnamurti

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www.lojajinarajadasa.com H uma pequena cidade, que se abriga sombra de uma grande montanha. H muita gente nessa cidade, mas apenas uma cidade com inmeras lojas. A loja das flores, com flores de vivo e alegre colorido, onde o povo vai ter com o corao cheio de riso. A loja em que vendem roupas, deleita para a vaidade dos que dela saem. A loja onde vendem brinquedos, nela entram homens graves e crianas. Do lado de fora da loja onde se vendem alimentos, um mendigo espera. H uma casa cheia de tristeza, onde procuram libertar o povo de seus mortos. Quo infelizes os que ali moram! Uma casa onde vendem Deus, onde ensinam o temor e, depois, o caminho para dominar esse temor. Nessa casa tem muitos corredores escuros, nos quais os adoradores se perdem. Um homem, com vestes vistosas, fala da beleza de uma Divindade desconhecida. H outra casa muito bem construda, onde conservam, na mais perfeita ordem, as criaes mortas do passado. Um dia em que havia muitas sombras alegres, um estrangeiro chegou e o povo deleitouse com sua visita, pois eram poucos os estrangeiros que chegavam quela cidade. Celebraram festas em sua honra e a cidade encheu-se de jbilo. Mostraram-lhe suas lojas, sua casa de tristeza e o edifcio dourado onde tinham Deus para venda. Desce rua uma procisso de pessoas a chorar os mortos. Olham para o estrangeiro, dele esperando uma palavra de conforto, mas eis que ele ri. Porque acha-se enamorado da Vida e por ele passa a morte. No o compreenderam, mas correram-no para fora dos portais da cidade. O estrangeiro sobe ao cimo da montanha que domina essa cidade populosa. A Estrela Ano II No. 5 e 6 Maio e Junho de 1929

AS PORTAS DO ETERNO J. Krishnamurti

A soluo nica para os problemas do mundo, o nico blsamo que h de curar todas as feridas e tristezas, a Verdade, que libertao e felicidade. Isto no algo mstico, como muita gente supe. Nisto, como em todas as coisas, h um lado mstico e um lado prtico, e sua compreenso no depender do indivduo torc-lo ou no, para adapt-lo ao seu particular temperamento. Quando isto for compreendido com o corao e a mente, levar consecuo da paz e da serenidade interna. Resolvendo os vossos problemas individuais, solvereis o problema do mundo, Os indivduos criam o mundo e, por isso, se o indivduo tiver paz no seu interior, ser capaz de criar 145

www.lojajinarajadasa.com a paz, a serenidade e a compreenso em torno de si. Essa paz, essa compreenso das lutas e vs aspiraes e desejos do mundo, essa imensa certeza, surge somente quando percebeis o significado da vida, quando vedes e compreendeis a meta. Como um rio em um deserto, que surge e vagueia at perder-se nas areias, assim so as criaes dos homens que no tem propsito fixo na vida, que so dominados pelas sombras do presente. Aqueles que quiserem criar ao abrigo do eterno, devem ter compreenso de sua meta, a viso da Verdade. Sem esta viso e compreenso, nada do que criarem ser duradouro. Ser como o perfume de uma flor que se desvanece. Enquanto que, se criarem tendo a compreenso no corao e na mente, isso ter em si o selo da eternidade. A verdade no pode ser compreendida unicamente do ponto de vista intelectual. No h ningum que seja exclusivamente dominado pelo intelecto; nem h tambm quem somente pelas emoes oriente sua vida. No podeis separar as emoes e o intelecto, e esperar compreender a vida partindo meramente do ponto de vista estreito e limitado de qualquer destes dois elementos. A plena realizao da vida resulta da conjuno harmoniosa do intelecto e das emoes. Qual a diferena entre o selvagem e o homem civilizado? O selvagem e uso a expresso em seu sentido literal pinta o corpo, orna-se de penas e contas e usa outros mtodos molestos para se adornar externamente. O homem aparentemente civilizado, tem as complicaes da beleza interior; tem suas penas mentais, suas pinturas emocionais, suas inmeras contas doutrinais. O homem civilizado do mundo poder no adornar o seu corpo maneira brbara do selvagem, contudo, so muitas vezes selvagens sua mente e suas emoes. Internamente, pouco difere do selvagem, somente no o mostra externamente. Mas o homem verdadeiramente civilizado est para alm de todos os adornos, para alm de todas as complicaes e, para sua beleza, no depende das coisas externas, porque alcanou a simplicidade da vida. A evoluo segue uma espiral ascendente, no sentido de uma simplicidade sempre maior em todas as coisas. Muitos desejam mostrar o caminho para a compreenso da vida, mas se no tm em si a simplicidade, criam novas barreiras, novas incompreenses, novos vus entre o mundo e sua meta. Como o elefante que abre caminho na floresta e a deixa, assim, aberta para ser trilhada por outros, igualmente o indivduo que tem a compreenso da Verdade, abre caminho atravs das brenhas e da confuso do mundo. No podeis auxiliar verdadeiramente o mundo, por maior que seja a vossa aspirao de prestar auxlio, se no houverdes, vs prprios, descoberto essa Verdade que eterna. Todos desejais abrir os olhos que esto cegos, libertar aqueles que esto presos, levar a luz aos que se acham envoltos nas trevas que por si mesmos criaram. Mas, somente podeis abrir os olhos aos cegos, e libertar os prisioneiros de sua priso de ignorncia, se houverdes realmente compreendido a Verdade, se houverdes realmente alcanado a liberdade e a felicidade. Se somente podeis criar essas coisas que perecem e passam, como o perfume da flor, ento que valor tero tais coisas para o mundo? Tantos so os que criam sombra do presente; aqueles que compreendem devem criar ao abrigo do eterno. Mesmo que tenha alcanado apenas uma viso fugaz da Verdade, em algum momento tranqilo, jamais retornaro s suas gaiolas de limitao. Quem houver alcanado essa liberdade, desejar que todos no mundo sejam livres. Somente pode auxiliar e guiar, verdadeiramente, o indivduo que houver achado a paz dentro de si mesmo, e est certo de sua compreenso da liberdade da vida; e no aquele que jaz envolto nas sombras por ele prprio criadas ou se acha retido como um prisioneiro na gaiola da tradio. So muitos os que seguem em direo ao portal do eterno, mas h alguns poucos que j venceram esse portal e, por isso, prosseguem de costas voltadas para ele. Estes nunca projetam uma sombra sobre a senda daqueles que vo trilhando o caminho que leva a esse portal; pois se tornaram um com a luz eterna.

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www.lojajinarajadasa.com A Estrela Ano II No. 5 e 6 Maio e Junho de 1929

DOIS POEMAS J. Krishnamurti

I Oh! Alegra-te! H troves nas montanhas E longas sombras matizam a face verde do vale. As chuvas suscitam brotos verdes Nos troncos mortos de ontem. L no alto, entre as rochas, Uma guia est fazendo o ninho.

Todas as coisas so grandes na vida.

Oh! Amigo, A vida enche o mundo. Eu e tu estamos em unio eterna.

A vida como as guas Que nutrem reis e mendigos igualmente. Vaso de ouro para o rei, Para o mendigo vaso de barro, Que se despedaa na fonte; Cada qual estima igualmente o seu vaso.

H isolamento, Pavor na solido,

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www.lojajinarajadasa.com Mgoa do morrer do dia, Tristeza de uma nuvem que passa.

A vida destituda de amor, Peregrina de casa em casa, E ningum h que lhe proclame o encanto. Como o de um pedao de rocha grantica Transformado numa imagem tumular, Que os homens tm por sagrada, Mas pisam a rocha no caminho Que leva ao templo.

Oh! Amigo, A vida enche o mundo. Vs e eu estamos em unio eterna.

II Contm a gota de chuva em sua plenitude A raivosa torrente Ou as espelhantes guas de um profundo lago de montanha? Alimenta uma s gota de chuva, em seu isolamento, A solitria rvore na colina? Cria a gota de chuva, isolada em sua grande descida, O som mavioso de muitas guas? Mata a gota de gua, apenas com sua pureza, A sede agonizante?

Estou cantando o Cntico da Vida. Neste cntico,

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www.lojajinarajadasa.com Oh! Amigo, No existe nem eu nem tu, Mas a Vida, que , de tudo, a Bem Amada.

S os ignorantes correm atrs da sombra De si mesmo na Vida. E a vida escapa-lhes Porque vagueiam nos caminhos da sujeio Da a luta da separatividade numa grande unidade. Porque na Vida no existe nem eu nem voc. A Estrela Ano II No. 5 e 6 Maio e Junho de 1929

A CONSECUO DA VERDADE J. Krishnamurti

A compreenso da Verdade nos vem atravs da plena realizao da vida e desenvolvendo a esta e dando mais amplos objetivos possveis de expanso, que atingis libertao e felicidade. Eu faria disto o alicerce de todo pensamento ou sentimento, porque sustento que a libertao a nica meta para a humanidade. Quando houverdes divisado a meta quer sejais um artista, um msico, um economista ou um educador criareis ao abrigo do eterno, em vez de o fazerdes ao abrigo das sombras do manifestado. Muita gente no mundo se sente presa nas muralhas do presente por no convidar para junto de si o futuro. O presente como uma grande sombra sob a qual se cria sem a compreenso do eterno. Houve outrora um homem que desejou alcanar a verdade. Foi ter com um Gur, um Instrutor, e pediu-lhe que o admitisse como discpulo. Respondeu o Gur: No disponho de tempo para vos atender, ide-vos embora. Assim, o pesquisador seguiu adiante, mas voltou depois e de novo pediu ao instrutor que o admitisse e o instrusse na senda da Verdade. Pela segunda vez, o Instrutor lhe disse: No disponho de tempo para vos atender, ide-vos embora. Passado algum tempo, porm, tornou de novo persistindo em seu pedido. Ento o Instrutor lhe disse: vem comigo e levou-o a um tanque prximo, cheio de gua. Entraram e o Instrutor manteve o aspirante debaixo da gua por muito tempo. Quando este no mais podia permanecer mergulhado, soltou-o e perguntou-lhe o que mais desejava enquanto esteve submerso. Foi-lhe respondido que era o ar o que mais havia desejado. Ento, o Instrutor concluiu: Quando vosso anelo pela Verdade for to desesperado como o vosso desejo de ar o foi ainda a pouco, havereis de alcan-la. Desejaria despertar em vs um desejo to ardente, uma to veemente aspirao de encontrar a Verdade, quanto o desejo de ar que sente um homem que se afoga. A Verdade somente alcanada quando desejais realizar plenamente a vida, no mais a temendo; quando no a evitais, ou torceis, ou ainda, quando no procurais escond-la sob o abrigo do conforto fcil; mas, ao contrrio, convidais igualmente a tristeza, o prazer, a alegria e a dor, para plenitude de vosso corao.

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www.lojajinarajadasa.com Entretanto vossa meta irreal e, assim, criais inmeras barreiras a vos separarem da meta eterna. Pelo fato de em cada mente existir o desejo de evitar a experincia da vida, que surge a iluso do mal e do bem. Todas as religies sustentam que dominando tal coisa e evitando tal tentao, tornar-vos-eis aptos a compreender a Verdade e que praticando o bem, podeis esperar serdes admitidos no cu. Para mim, isto evadir-se da vida e no realiz-la plenamente. Quando houverdes firmado para vs prprios o que essencial, ou seja a pesquisa da Verdade, tudo o mais deixa de ser essencial e se torna intil; assim, a tentao deixa de ser um problema. A fim de ajudar aos homens a vencer a tentao, obras tem sido estabelecidas, baseadas em crenas, dogmas e temores. Uma aranha tece com admirvel cuidado e grande delicadeza a sua teia, mas, quando surge a ventania, essa teia intrincada em um instante destruda; assim quando sopra o vendaval da tristeza e ruge o tufo da dvida, tudo o que foi construdo para vencer a tentao desaparece e destrudo. Tendes inmeras teorias e crenas e, no entanto, quando morre algum a quem amais, vossas doutrinas no vos aliviam esse vcuo, esse sentimento de ausncia. Enquanto que, se tratardes todo incidente como um passo para a realizao da vida, como uma experincia que vos permitir crescer e aproximar-vos assim de vossa meta, ento convidareis todas as coisas para vosso corao, as tristezas como os prazeres, tudo que a vs parece bem ou mal. Os homens se lanam poltica, educao, ao servio e s inmeras atividades que os ajudam a esquecer-se de si mesmos; mas, sustento que enquanto a vida interior no estiver plenamente realizada, quando no se lhe d os seus plenos objetivos de desenvolvimento, h certeza de resultar tristeza e misria. Para fazer completa a vida, deveis receber com agrado em vossos coraes, toda experincia, seja a mais desagradvel ou deleitosa. No pode haver outra meta para a humanidade seno a plena realizao da vida, que somente vos pode vir se inteiramente estiverdes senhores de vs mesmos, se no dependerdes de uma autoridade externa ou do auxlio das religies ou do fugir s tentaes. Assim como a chuva vem a terras ressecadas, assim a Verdade vos apresentada. Assim como a chuva improdutiva no solo imprprio, assim a Verdade no plantar sua semente em vossa mente e corao, se no houver em vs luta pela plena realizao da vida. Para mim a nica meta, o nico mundo que eterno, que absoluto, esse mundo da Verdade. Esse mundo no se impe, no pode ser discutido, nem a seu respeito ningum pode dar opinio. Mas, se houverdes preparado o solo e desejardes semear as sementes da Verdade com cuidado e fino deleite, ento, por vs mesmos o penetrareis. Presentemente a felicidade e a liberdade da vida so meras palavras que a vosso gosto interpretais, de modo amplo ou estreito, agradvel ou desagradvel. Desejaria despertar-vos um to intenso desejo de encontrar a Verdade, que somente permanecesse em vs isso que eterno, e tudo o mais desaparecesse como a nuvem levada pelo vento. O desejo de se tornar senhor de si mesmo, de no se apoiar na autoridade, de no construir sobre a esperana, de no fugir ao temor, de no evitar as tentaes, mas de transcend-las, estranho a maioria das pessoas. Muitos de vs so levados a pensar no cu, pelo incitamento da esperana que vos acalenta; mas, no h cu nem esperana, no sentido absoluto; so criaes da mente dos homens; por isso no podem ter o cunho da eternidade. Deveis ser verdadeiros discpulos da Verdade Eterna, discpulos cheios de compreenso e no meros imitadores, a repetir idias e palavras, semelhana de outrem. Tornai-vos criador da verdadeira vida, desprovida de forma. Muita gente cultua uma idia e se apega a forma dessa idia, esquecendo o imenso mundo que vive para alm de todas as formas e que no um mundo misterioso e oculto, mas um mundo que jaz dentro de cada um de ns e por todos ns tem de ser descoberto. Quando a vida no plena, h espaos vazios e esses espaos vazios causam remoinhos de tristeza e sofrimento e luta constante. enchendo esses vazios que a vida encontra a sua plena realizao. A Estrela Ano II No. 5 e 6 Maio e Junho de 1929 150

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A VERDADEIRA BASE DA VIDA J. Krishnamurti

Para podermos trabalhar de modo adequado e auxiliar realmente, devemos conhecer a verdadeira base da vida, devemos saber qual o verdadeiro manancial da nossa energia. Se cremos na fraternidade, devemos primeiro examinar e ver de que maneira compreendemos a palavra irmo. Parece-me que fraternidade traz a idia de destruio do eu, de destruio dessa semente venenosa que se desenvolve no indivduo e o isola dos outros, que o faz sentir-se separado dos demais, enquanto que, se compreendermos corretamente a fraternidade, a teremos como a unio do eu com todas as coisas; e desta unio nasce o entusiasmo, a aspirao de trazer os outros at luz desta Verdade, na qual o eu separado deixa de existir. Para podermos auxiliar, verdadeiramente, devemos ter tocado a fonte de nosso ser; e desta fonte podemos partir para renovar todas as coisas. Para compreendermos a verdade de sermos diferentes e, ao mesmo tempo nicos, devemos ter conhecimento e experincia. A unidade no significa havermos destrudo a variedade ou diferena ao contrrio, seria coisa desoladoramente montona que todos fssemos idnticos, que todos tivssemos os mesmos pontos de vista, o mesmo raciocnio. Todos olhamos a Verdade, mas cada um atravs de sua prpria compreenso individual. A diferena entre uma pessoa comum e o gnio, est em haver este tocado a fonte que a Verdade. A pessoa comum no ser, realmente, til ao mundo, apesar do seu desejo de prestar auxlio, por no haver ainda percebido a Verdade. Assim os que desejam auxiliar devem primeiro compreender algo da verdade. Muitos de vs, presentemente, so ainda como crianas que precisam ser instrudas; mas com o decorrer do tempo e medida que lutardes, tanto individual como coletivamente, por adquirir por vs prprios o conhecimento, esse conhecimento se vos tornar inerente. E quando o conhecimento se houver tornado vosso, quando se tornar vossa prpria aquisio, aps sofrimentos, pesares e intensas alegrias, ento vossas aes e sentimentos, quaisquer que sejam, tero o selo da Verdade. Portanto, deveis fixar a Beleza como aspirao dominante na vida. Beleza que no significa acmulo de coisas superficiais, mas sim, simplicidade. A simplicidade grandeza; a simplicidade de carter, a simplicidade de mente, a simplicidade de corpo, cria a perfeio. Olhemos momentaneamente para os gregos. No tinham eles nenhuma de nossas comodidades modernas, nenhum dos adornos da nossa moderna civilizao, mas tinham esse sentido da verdadeira beleza, que simplicidade. No podeis ser verdadeiramente belos se no tiverdes belas mentes e coraes limpos, se no tiverdes grandes e nobres idias e sentimentos. Pela criao da beleza superficial podeis pensar haver alcanado a perfeio; mas quando despida de suas vestes fsicas, nela encontramos logo a fealdade do estgio selvagem, A espiritualidade significa beleza: beleza no pensamento, beleza no sentimento e beleza na ao. Muitos de vs estais sempre a procura de novos meios e modos de alcanar a perfeio fsica, mas no voltais as vossas mentes para o que duradouro. Se partirdes do reto ponto de vista, da reta fonte, tornareis o fsico mais belo porque tereis mentes e coraes que so realmente nobres, realmente grandes. Muitos pensam que espiritualidade significa seriedade e tristeza. A espiritualidade, quando bem compreendida, a cincia da felicidade; porque a nica meta digna de ser atingida a perfeita felicidade que nos vem quando tendes vosso corpo, vossa mente e vossas emoes perfeitamente unificadas e harmonizadas com a vossa vontade. O que que causa a felicidade ou a infelicidade? A infelicidade surge quando no haveis dominado a ansiedade ou a depresso. 151

www.lojajinarajadasa.com Mas, quando tiverdes descoberto a fonte que Verdade e Vida, no mais sereis escravos da nsia pela prosperidade ou pela tristeza, e o mundo no mais ter domnio sobre vs. As coisas transitrias no mais tero valor e sabereis permanecer de parte e vigilantes. Se olhardes para a espiritualidade como um reino onde podeis encontrar a felicidade, aonde chegareis sempre que divisardes grande beleza, logo que tiverdes grande viso, desde que lerdes grande literatura, sempre que sentirdes profunda tristeza ou grande alegria; por esse processo, ela se tornar parte de vs mesmos, e, assim, vivereis eternamente em seu reino. A espiritualidade j no ser ento, o conhecimento dos livros, nem estar nas teorias sobre a vida, mas palpitar dentro de vs mesmos. Quando a houverdes achado, possuireis a felicidade que no pode ser destruda, que o tempo ou a idade no apagam. Deste ponto de vista, onde quer que haja luta, a tristeza, ou a alegria, onde quer que haja o desejo de viver nobremente e atingir a Verdade, a est o caminho da espiritualidade que a verdadeira base da Vida. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 7 e 8 (da anual em Ingls) Abril e Maio de 1929

UMA ENTREVISTA COM Krishnaji No Castelo de Eerde, Ommen, Holanda R. L. C.

Entrevistador: Desejaria fazer-vos algumas perguntas sobre certas idias que h muito tenho em mente. Como ser que os ideais que explanais alcanaro o povo? Krishnaji: Ficaro, durante algum tempo, limitados a poucas pessoas. Entrevistador: Como ho de alcanar as massas populares em todo o mundo? Krishnaji: Isto depende destes poucos. Entrevistador: No pode dar-se o caso de vossos ideais se perderem no deserto da ignorncia e da apatia, assim como s vezes, um rio absorvido pelos areais do deserto? Krishnaji: No penso assim. No creio que os ideais possam ser mortos. Entrevistador: Consideremos a Amrica, como o exemplo de um pais a cujo respeito se possa dizer que as coisas materiais e as posses se desenvolveram mais rapidamente que a cultura. Achais que as vossas idias esto se espalhando pela Amrica? Krishnaji: No o sei. Entrevistador: Posso at mesmo imagin-las se difundindo; mas, criaro razes ou... Krishnaji: Morrero, quereis dizer? Entrevistador: Sim, no se poder dar o caso da corrente ser absorvida pelo areal? Krishnaji: O que desejais saber, exatamente, e a que tende a vossa pergunta?

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www.lojajinarajadasa.com Entrevistador: Como que estas idias, que admito serem de interesse vital, como poderemos conseguir que... Krishnaji: Que elas alcancem o povo? Entrevistador: Sim, v-las espalhadas pelo povo, no s agora, mas tambm no futuro? Krishnaji: Essa toda a questo. Sinto que se realmente compreenderem o que lhes estou ensinando, o consideraro como questo de vida ou de morte. Entrevistador: Sim. Krishnaji: E, assim, tendo-o como imprescindvel, ho de transmit-lo a outros. Entrevistador: Bem. Ento, afinal a questo ser essa: cada indivduo deve encar-lo como questo de vida ou de morte, para si no no sentido estreito. Krishnaji: No, no. Entrevistador: Num sentido profundo e vital. Agora, um outro ponto. Do Senhor Buda foi dito que desejava vaguear como o elefante isolado, como um ser que podia abrir uma senda na mata, para ser trilhada por outros... Krishnaji - E outras pessoas, certo, o poderem seguir. ENTREVISTADOR - Mas precisamos de conseguir um certo nmero de pessoas. Krishnaji - Certo numero de elefantes. Essa justamente a questo. ENTREVISTADOR No indica isso o imenso valor da combinao? Krishnaji - E por isso que h necessidade de pessoas que realmente compreendam. mais necessrio ter pessoas que realmente compreendam, do que meros seguidores; porque estes podem afastar-se da senda do elefante isolado, como tem acontecido atravs das idades. Mas, as pessoas que compreenderem nunca o faro. ENTREVISTADOR - Exatamente. Porm h o seguinte: reafirmais, constantemente, que atingistes a meta, que achastes a Verdade, mas... Krishnaji - Continuai, senhor. ENTREVISTADOR - ...mas, a Verdade que clara e definida para ser compreendida Algumas vezes, parece-me entrever um individualmente, entrar em direto contato da Verdade? atingistes, parece no se ter tornado suficientemente pela maioria das pessoas. Eu no a percebo bem. lampejo. Dizeis que toda e qualquer pessoa pode, com a Vida. Ora, essa a Verdade ou parte somente

Krishnaji - No podeis dizer, "Essa a Verdade inteira". Quanto mais a investigais, mais se desenvolve. E como agora estejamos ocupados com a explanao de uma faceta da Verdade, logo todo mundo pensa que essa faceta particular, do momento, a nica faceta. Ao contrrio, desde o momento em que houverdes compreendido, alcanareis mais e mais. como as guas de uma fonte perene. ENTREVISTADOR - ...sempre mais abundante, por mais que dela tiremos. Mas h em todo o mundo um constante pedido de definies, decises e concluses. Krishnaji - Sim, essa a primeira dificuldade: compreender que no podeis limitar a Verdade. E pelo fato de terem estado a limitar a Verdade, por tanto tempo, que desejam que continue esta restrio.

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www.lojajinarajadasa.com ENTREVISTADOR - Uma vez que tratamos disto, no ser justo dizer-se que a maioria dos artistas esto fazendo exatamente o mesmo que fazem as pessoas na maioria, isto , dando definies, limitando a Verdade, embora fazendo-o com maior perfeio? Krishnaji - Expressando-a de acordo com seu modo particular... ENTREVISTADOR - Restringindo-a e, por isso mesmo quase infalivelmente, caindo no desconforto? Krishnaji - Naturalmente. ENTREVISTADOR Poderamos passar a um estgio mais alto e dizer que o supremo artista aquele que renunciou a tentar exprimir a Verdade e que prefere sent-la em si prprio? Krishnaji - Naturalmente, mas deve express-la. ENTREVISTADOR - Poderia faze-lo atravs da perfeita tranqilidade, como o taosta? Krishnaji - Sim, mas essa uma das expresses... ENTREVISTADOR - Uma inteiramente simples. Krishnaji - Mas, j, por si, uma limitao. ENTREVISTADOR - Tendes, por vezes, assim como no mtodo oriental de pesquisa da Verdade, a especializao, tal como em alguns sistemas de Yoga, mas no ser possvel que alguma parte do nosso modo de exprimir as coisas, diga respeito por igual, a todos os aspectos da vida? Krishnaji - Isso certo, senhor. isso a harmonia da vida. ENTREVISTADOR - No chegareis, ento, a super-especializar? Krishnaji - Naturalmente, no. Que bem traria isso? como um homem que fosse possuidor de um excelente intelecto e tivesse ressequidas as suas emoes. Estaria especializado no intelecto; mas isso como possuir uma bela rvore que no d flores; uma linda flor que no tenha perfume. ENTREVISTADOR - Prosseguindo, deste ponto, no ser possvel dizer-se que a mente que prende a maioria das pessoas hoje? Krlshnaji - Mas penso que devemos desenvolver a mente to bem quanto as emoes. ENTREVISTADOR Dizei-o por outra maneira. Ser exato dizer-se que a mente o nico instrumento que a maioria de ns utiliza hoje em dia? Krishnaji - No tenho essa certeza. No penso que seja assim. No penso que pessoa alguma possa julgar alguma coisa, jamais, exclusivamente pelo intelecto, unicamente pela inteligncia. Ao contrrio, a grande maioria usa algo que uma mistura de emoo e pensamento. ENTREVISTADOR - Mas podereis encontrar uma pessoa que seja somente intelecto, com tudo o mais posto de lado? Que seja apenas mental? Krishnaji - E mortas as emoes? ENTREVISTADOR - Frias. Krishnaji - So muito poucas. ENTREVISTADOR - Tornando, agora, idea da combinao tendente a alterar o futuro, - tendes em vista um certo nmero de pessoas se combinando para tornar simples a vida, para realizar uma definida simplificao da vida diria?

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www.lojajinarajadasa.com Krishnaji - Para simplific-la, sim. Mas simplific-la, no significa pr de parte as coisas teis, que foram inventadas para auxlio do mundo. Vede, um aparelho de limpar o p por meio do vcuo, algo simples e deve ser usado. Pensai no tempo gasto com a limpeza de uma sala. Podeis andar de joelhos e limp-la, mas isto vos tomar tempo. Um aspirador vcuo fa-lo- em menos tempo e melhor. Devemos aprender a usar as coisas que forem teis. ENTREVISTADOR - Por isso mesmo, o mundo parece lanar-se, numa corrida louca atrs de tais coisas. Krishnaji - Essa justamente a questo. porque pensam que as coisas so um fim, por si mesmas, e lhes vo dar felicidade, paz e tranqilidade; quando, pelo contrrio, isso no acontece. ENTREVISTADOR - E devemos substituir a idia de que so um fim em si mesmas, pela de que so apenas teis? Krishnaji - O povo comea a compreende-lo. ENTREVISTADOR - H um outro ponto a cujo respeito vos desejaria ouvir: Existe uma definida escola de idias em todos os pases, que sustenta ser toda tendncia favorvel ao internacionalismo, fundamentalmente contrria aos melhores interesses da raa. Krishnaji - Sim? ENTREVISTADOR - Esses nacionalistas acham que a pureza das raas humanas deve ser mantida. Krishnaji - Senhor, somente a pureza do corpo que considerais, no ? ENTREVISTADOR - Em parte, no que isto naturalmente implica. Krishnaji - No podeis impedir que as idias passem de pas a pas. As idias so como o ar. ENTREVISTADOR - As idias so internacionais, sim - mas. . . Krishnaji - Algumas pessoas podero fazer objees, mas no podeis viver sem ar e no podeis viver sem idias; e as idias no tm nacionalidade. ENTREVISTADOR - Enquanto incuas e no afetem realmente a humanidade, elas podero circular livremente. Krishnaji - As idias gradualmente mudam todas as coisas. ENTREVISTADOR - Esse o meu ponto. Ho de resultar, essas idias, em grandes alteraes ltimas? Krishnaji - Por certo. ENTREVISTADOR - Ou conseguiro, umas tantas individualidades fortes, manter os povos onde se encontram? Krishnaji - Um minuto s, senhor. Considerai o Partido Trabalhista na Inglaterra. H dez anos todo o mundo ria dele. Agora, ele vai subindo e at o temem. Exatamente dessa maneira... ENTREVISTADOR As idias ho de crescer e florescer. Krishnaji - Naturalmente. Assim como a idia da Liga das Naes. A princpio todo o mundo a achava risvel. ENTREVISTADOR - Mas, consideremos os primrdios do cristianismo. O que foi que manteve vivas as idias essenciais do mais remoto cristianismo? No tero sido as perseguies dirigidas

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www.lojajinarajadasa.com contra os cristos? Podem as vossas idias progredir, propagar-se e afetar o mundo, sem haver necessidade de alguma espcie de tremenda luta? Krishnaji - Naturalmente, essa a questo. ENTREVISTADOR - Suponde que eu retorne ao meu pais e que eu e os outros mais, que partilhamos de vossos pontos de vista, nos limitemos a viver quieta e naturalmente, as vossas idias permanecero? Krishnaji - Algo de meramente intelectual. Concordo inteiramente. ENTREVISTADOR - Devemos fazer alguma coisa. Devemos fazer conferncias ou algo de novo? Krishnaji - A primeira coisa modificarmo-nos, ns mesmos. A prtica deve vir primeiro e no o preceito. Mudai-vos, primeiro interiormente, depois sas a fazer conferncias. ENTREVISTADOR - Compreender primeiro as idias e depois sair a campo. Krishnaji - O que fizeram Pedro e Paulo e os demais? Encheram-se, primeiro, de entendimento, depois saram a campo, com a chama de seu entusiasmo, dizendo consigo: Sairei a falar destas coisa de que tenho conhecimento. ENTREVISTADOR - Quer-me parecer que no nos poderemos desviar, por completo, da antiga idia de propaganda. Krishnaji - Mas a propaganda, moda antiga, intil. A propaganda com a prtica e o definido exemplo, tem muito mais poder. Importa viv-la. a vossa prpria chama que v-la far empreender, e no o fato disto vos ter sido indicado por outra pessoa. *** A discusso passou ento a versar sobre as idias do Sr. Krishnamurti, relativas guerra. *** ENTREVISTADOR - Ouvi que a freqentemente, em vossas palestras, vos referis guerra. Parece-me que muito daquilo que a humanidade tem conseguido lhe tem vindo atravs da guerra. As guerras religiosas muitas vezes tm libertado os homens de pequenas tiranias, do cerimonialismo, e tm, numa grande medida, firmado a liberdade de pensamento. Poderiam, esses bons resultados, ter sido obtidos de outro modo? Krishnaji - De outro modo, sem ser pela guerra, quereis dizer senhor? De outro modo que no seja a guerra? ENTREVISTADOR - Sim, exatamente, sem ser pela guerra. De outro modo que no seja a luta. Krishnaji - como se disssseis: tornei-me forte por causa da doena... ENTREVISTADOR - No. Mas eu o diria de outra maneira: a guerra me parece o resultado da revolta inteligente - em larga escala. Krishnaji - No estou de acordo. revolta pouco inteligente. Considero a guerra como a revolta da estupidez. ENTREVISTADOR - Sim. Krishnaji - Vede os resultados. A guerra como o rio, que transborda do leito. H um excesso tremendamente devastador. um intil, e estpido desperdcio de inteligncia. Um desperdcio que origina, sempre, mais e mais contendas. Tudo isto surge, penso, pelo fato de se ignorar o verdadeiro propsito da vida; portanto, todas essas coisas resultam da vida v. ENTREVISTADOR - Isso mesmo. Mas, esse aspecto vo da vida... 156

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Krishnaji - No se trata do verdadeira aspecto vo da vida e sim de inutilidade da vida, no de quanto a vida v. ENTREVISTADOR - Bem, consideremos essa inutilidade da vida. Isto existe no mundo, hoje em dia, e vai dando como resultado uma situao em que a qualquer momento se pode dar a inundao, o transbordar das guas. Krishnaji - Sim, sim. O que que desejais perguntar? ENTREVISTADOR - Embora tivsseis dito, sempre e sempre, que podemos fugir necessidade da guerra, no vejo bem que tenhamos alcanado o estgio em que isso seja possvel. Krishnaji - Mas, isto, o mesmo que dizer-se que ainda no atingimos o estgio em que podemos progredir, em que podemos praticar o bem, sem praticar o mal. No coisa acertada dizer a algum que no poder gozar sade, a no ser adoecendo. Pensai nisto. ENTREVISTADOR - Pode ser que novos esforos sejam feitos, tendendo a encadear a humanidade fisicamente, visando eliminar as pequenas nacionalidades e, a menos que os indivduos se revoltem contra o opressor, maiores males resultaro. Krishnaji - No. Como podeis saber? ENTREVISTADOR - Eu no o sei. Imagino-o meramente. Deveramos antes, talvez, procurar remover as causas? Krishnaji - Mas, naturalmente. No nego que, afinal, do mal sempre tem resultado e resultar sempre o bem. Mas isto no razo para querer o mal, - a fim de que, em ltima analise, dele resulte o bem. Por que no encarar logo a coisa de frente e conseguir o bem de todas as coisas removendo as causas? Senhor, no haveis de dizer - deixai que assim o expresse que, para que as pessoas possam apreciar a liberdade, devem ser postas na priso. ENTREVISTADOR No. Vejo-o. Vejo o argumento aplicado simplesmente guerra ... Krishnaji Mas deve ser aplicado a tudo. ENTREVISTADOR - H ainda uma pergunta que vos desejava fazer sobre assunto de que j tratastes em vossas palestras. No ser o grande ritualista, no poder o grande ritualista ser simplesmente como um grande artista trabalhando atravs desse meio particular? Se assim no for, no vejo como podereis deixar de ir de encontro a todas as grandes igrejas, s magnificantes catedrais da Europa, e de outras partes do mundo. Krishnaji Eis-nos, agora, a dizer de novo: devemos passar pelo mal para alcanar o bem? Quereis dizer, senhor, que no podeis criar as igrejas, os templos, essas maravilhosas construes pelo puro amor da beleza? ENTREVISTADOR - Naturalmente que podem ser criadas. Krishnaji - Vossa idia a seguinte: "Deixai-nos ter as nossas cerimnias primeiro, pois delas resultaro um sistema que nos dar poderes para criar uma igreja perfeita. Porque seguir este caminho complicado? ENTREVISTADOR - O templo surge como uma expresso da vida. Krishnaji - Mas afinal, uma igreja simplesmente uma casa, um templo. ENTREVISTADOR - Sim, mas a casa construda para nela se morar, e a idia daquilo a que se destina a catedral, que determina a sua construo. E parece-me que um grande ritualista pode ser considerado como uma espcie de artista que usa a catedral como seu quadro de fundo.

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www.lojajinarajadasa.com Krishnaji - Concordo inteiramente. Ele pode ser o artista, mas ir alm se disser: "Isto , um auxilio para a humanidade". Nenhum artista o diz. ENTREVISTADOR - No. Krishnaji - Ele apenas cria. No diz como o ritualista: "Este um estgio por que tendes que passar". ENTREVISTADOR - Vejo a possibilidade de vossas idias influenciarem os indivduos de um modo que no redunde no desabrochar da chama viva do entusiasmo. No poder dar-se o caso de obterdes um tipo de pessoas que sejam completamente simples e boa, um tipo a que o mundo no dar ateno? Krishnaji - No penso assim. Afinal de contas, a evoluo h de prover a isso. Pode levar um tempo maior ou menor. Vede s, senhor, como algum a semear num campo. Algumas sementes amadurecero e outras no. ENTREVISTADOR - E, aplicando isto ao que estava dizendo, considerareis essa gente simples, como aquelas sementes que no houvessem germinado? Krishnaji - No. Sero aquelas que frutificaro, que produziro. Deve ser assim, pois de outro modo, no haveria esperana. Tomemos o exemplo de Pedro, Paulo e todos os outros apstolos de Jesus. Por que no morreram as suas idias? Porque eram fortes no nimo de cada um deles e porque as circunstncias eram tais que permitiram a sua ao. ENTREVISTADOR - No teria sido o fato da igreja da poca aceitar essa idias, adotando-as e mantendo-as diante do pblico? Ou teriam sido os martrios? Krishnaji - No foi a igreja da poca. Foram as torturas, os martrios. Ningum se preocupa com o que eu digo, todos riem e, mesmo os nossos prprios amigos, nada sabem, pois somente acabo de comear. Dizem consigo: "No sei se isto estar certo ou errado, se plausvel, se ser o fim, se esta a senda para a meta, se ele nos est ensinando a Verdade ou se est hipnotizando a si mesmo e enganando-se a si prprio. Acham-se incertos e o que devo fazer, neste momento, eliminar a incerteza. como se desbastasse uma floresta, para construir uma casa que proteger a floresta do fogo. Faz-se mister abrir uma clareira, para conseguir um espao apropriado. ENTREVISTADOR - Achamo-nos nesse estgio. Krishnaji - Naturalmente. ENTREVISTADOR - Uma pergunta final: falais da meta a ser atingida e de pessoas que no tem certeza se este o mtodo, o meio de atingir. Ser possvel a algum indivduo alcanar a meta, uma vez que tenha uma simplicidade real em sua vida interior, uma perfeita calma e paz, ou h mister de algo mais do que isso? Krishnaji - Naturalmente, senhor, absolutamente. ENTREVISTADOR - Alguma grande experincia mstica? Krishnaji - Isso vir tambm. Afinal, muita gente simples, encantadoramente gentil, como as guas suaves e tranqilas; contudo, no possuem ainda a grandeza, e o que lhes d essa magnitude, a experincia, o sofrimento, as grandes alegrias, grandes estmulos e rejeies. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 7 e 8 (da anual em Ingls) Abril e Maio de 1929

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KRISHNAMURTI E STOKOWSKI
(Artigo de fundo do jornal O mundo de Amanh) Um jornal que trata, intensamente, de problemas sociais concretos, no pode deixar de se interessar pelas artes e pela influncia da sua caracterstica fora tnica no progresso da civilizao. Eis a arte a investigar a arte da vida: uma palestra, aparentemente casual, e que transborda, entretanto, de conhecimentos profundos sobre questes que preocupam todas as mentes ativas. Palestra realizada no Castelo de Eerde, Ommen, (Holanda) entre J. Krishnamurti e Leopoldo Stokowski, clebre regente da Orquestra Philadelphia.

Stokowski: Toda a arte tem seu meio de expresso. O drama tem palco, atores, luzes, roupagens, cenrio; a escultura pedra ou madeira; a poesia palavras; a pintura tela e tintas; a msica a vibrao do ar. Parece-me que a msica a menos material de todas as artes e contudo, talvez possamos conceber uma arte mais sutil ainda. Fiquei impressionadssimo com um rgo luminoso e colorido o Clavilux, inventado por Thomas Wilfred, de Nova York. Desenvolveu o inventor algo que faz pensar em uma nova arte de cor, dotada de forma e movimento, a qual me sugeriu a possibilidade de aspectos musicais extremamente sutis, quase espirituais e a idia de que surgir, um dia, uma arte imaterial, de puro esprito... Krishnamurti: No pensai que o importante no seja tanto a comparao de uma arte com outra, e sim a evoluo do indivduo que produz tal arte? Relativamente possibilidade do aparecimento de uma arte mais sutil que a msica, no ser caso de inspirao? A inspirao, se acordo com a minha idia, conserva a inteligncia entusiasticamente desperta. St.: Sinto que a inspirao quase um ritmo ou uma melodia, como msica, que ouo bem no fundo de mim mesmo, longe, longe. K.: Porque sois msico, ouvireis a todo instante essa inteligncia para a qual estais desperto, e a interpretareis pela msica. Um escultor exprimiria a mesma inteligncia em pedra. Vedes o ponto a que deseja chegar? O que importa a inspirao. St.: Julgais, pois, que a inspirao tem muita analogia ... K.: ... sim, conexo... St.: com a inteligncia? K.: No sentido em que estou empregando, sim. Eis a o ponto capital. Se no fordes inteligente, jamais sereis um grande criador. A inteligncia, quando mantida como uma flama viva, sempre meio de inspirao. No gosto da palavra meio, pois usada em tantos sentidos... Se conservardes a inteligncia constantemente desperta, ela buscar idias, novas maneiras de se relacionar com a vida. E a isso que chamo inspirao. Concebeis uma nova idia porque conservais vossa inteligncia sempre acordada. St.: Entretanto, no essa a sensao que tenho de mim. Posso descrev-la deste modo: quando me sinto inspirado, como se me lembrasse, me tornasse consciente de alguma coisa que tivesse penetrado em meu crebro, cinco ou dez minutos antes. J estava ali, mas no penetrava na conscincia. Sinto que se achava ali, muito antes, latente e no sei h quanto tempo e que se apresenta no momento. K.: Dir-vos-ei que a inteligncia a trabalhar para atingir a idia, Falemos concretamente: um ser sem inteligncia jamais seria inspirado no mais alto sentido da palavra.

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www.lojajinarajadasa.com St.: No mais alto, no, K.: Sinto-me inspirado quando vejo alguma coisa bela, uma bela paisagem, ouo uma bela msica ou lindas poesias, porque a minha inteligncia est sempre alerta. Mantenho-a alerta e, diante do belo, experimento a necessidade de traduz-lo em algo que os outros entendam, no assim? St.: Essa uma forma de expresso. K.: H centenas de formas. Sou apenas uma delas, no sentido em que estamos discutindo, pois h a forma do poeta, do escultor, do msico e tantas outras. St.: Sinto dentro de mim que a inspirao vem de um plano mais elevado do que a inteligncia. K.: No, a inteligncia o plano mais elevado. Senhor, a inteligncia, para mim, a acumulao da experincia, o resultado da experincia. St.: Qual a relao entre a inteligncia no sentido que dais a essa palavra, e intuio? K.: No podeis separar a intuio da inteligncia na mais alta significao. Um homem hbil no um homem inteligente, ou melhor, um homem hbil no necessariamente um homem inteligente. St.: No, mas h muitas vezes grande distncia entre um homem inteligente e um homem intuitivo. K.: Sim, porque se trata de bitola nova, de uma escala muito diferente. Intuio o supremo ponto de inteligncia. St.: Ah, agora estamos de pleno acordo. K.: A intuio o supra-sumo da inteligncia e, para mim, manter desperta essa inteligncia inspirao. Ora, s podeis conservar alerta essa inteligncia, da qual a intuio a mais elevada expresso, pela experincia, sendo a todo instante como uma criana perguntadora. A intuio a apoteose, a acumulao da inteligncia. St.: Sim, isso verdade. Posso fazer-lhe uma outra pergunta? Se, como dizeis, a libertao e a felicidade so o alvo de nossas vidas individuais, qual a meta final de toda a vida coletivamente? Ou, em outras palavras como responde a Verdade, conforme a enunciais, s perguntas: Por que estamos na terra? Para que meta estamos evoluindo? K.: A questo , portanto: Se a meta para o indivduo a libertao, qual ela para a coletividade? E eu vos respondo que exatamente a mesma. Que que separa os indivduos? A forma. A vossa forma diferente da minha, mas a vida oculta em mim e em vs a mesma. Logo, a vida unidade; e a vossa vida e a minha vida ho de, semelhantemente, culminar naquilo que eterno, naquilo que libertao e felicidade. St.: Na totalidade do plano da vida no encontrais nenhum alvo, alm da libertao e felicidade, nenhum desgnio ou funo ulterior para o total da vida? K.: Agora, senhor, no vos assemelhais criana que pedisse: Ensina-me matemtica superior? Eis a minha resposta: Ser intil ensinar-vos matemtica superior se no estudardes primeiro lgebra. Se entendermos esta coisa particular, a divindade dessa vida que se estende diante de vs, pouco importa discutir o que est alm, pois seria debater uma coisa incondicionada com uma mente condicionada. St.: Isso est perfeitamente respondido, claro e breve. A gente se lembra melhor do que breve.

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www.lojajinarajadasa.com Sempre me pareceu que as obras de arte deviam ser annimas. Pergunto-me vezes: um poema, um drama, uma tela ou uma sinfonia, a expresso do seu criador, ou este apenas o canal atravs do qual fluem foras criadoras? K.: Eis um ponto que me interessa realmente. St.: Bem, sois poeta e eu msico. O que me interessa comparar nossas sensaes ao criarmos em nossos respectivos meios. No vos sentis sempre completamente estranho ao que escreves? K.: Sim, decerto. St.: Eu tambm... e, quando acordo no dia seguinte, digo a mim mesmo: Fui eu que escrevi isso? Isso no se parece nada comigo! K.: Pois bem, isso inspirao. a vossa intuio, o ponto supremo de vossa inteligncia, a agir subitamente. Se mantiverdes a vossa mente, as vossas emoes e o vosso corpo puros e fortes, e em harmonia, ento esse altssimo ponto de inteligncia, a partir do qual age a intuio... St.: ... agir constantemente... K.: ... e conscientemente... St.: E a gente pode viver com isso... K.: Por certo. Isso o nico guia. Considerai, agora, por exemplo, poetas, dramaturgos, msicos, todos os artistas: deviam ser annimos, desprendidos de tudo quanto criassem. Penso que essa a grande verdade. Existir, dar e desprender-se do que se d. Compreendeis o que quero dizer? Em resumo, os grandes artistas do mundo, os grandes instrutores do mundo, deviam dizer: prestai ateno, apresento-vos alguma coisa que, se a compreenderdes realmente, desenvolver, sem soluo de continuidade, a vossa inteligncia, agir como se fosse a vossa intuio. No me adoreis, porm, como indivduo fazei de conta que nada fiz. Infelizmente, muitos artistas desejam ver seus nomes no quadro, desejam ser admirados. Suspiram por graus e ttulos. St.: Eis agora uma questo muito, muito velha. a Verdade relativa ou absoluta? ela a mesma para todos ns, ou difere de indivduo a indivduo? K.: No nada disso, senhor. St.: Ento, o que ela? K.: No de a pode descrever. No podeis descrever aquilo que vos d inspirao para escrever msica, podeis? Se vos perguntassem: isso absoluto ou relativo? respondereis O que estais a perguntar? No nada disso. Bem vedes, no podeis dizer se absoluto ou relativo. Est muito alm da matria, do tempo e do espao. Observemos, por exemplo, a gua daquele rio. Est limitada pelas margens. E direis ao olhar para ela: A gua est sempre limitada, porque vedes as margens estreitas que a encerram. Mas, se estivsseis no meio do oceano onde nada vsseis a no ser gua, direis: A gua ilimitada. St.: Essa resposta perfeita... no precisais dizer mais nada completa. H um padro ou critrio de beleza na arte, ou deve cada pessoa achar a sua prpria beleza, aquela a que responde? A questo se relaciona com o gosto. O mundo est sempre a dizer: isto de bom gosto, aquilo de mau gosto. Com que autoridade ele diz isso?

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www.lojajinarajadasa.com K.: E eu vos direi: com a sua prpria autoridade. St.: Essa resposta pessoal. Ento pode qualquer pessoa dizer o que bom ou mal em arte? K.: No. Todavia, afirmo que a beleza existe por si mesmo, acima de todas as formas e de todas as aparncias. St.: Ah, ento uma coisa imperecedoura? K.: Como o eterno perfume da rosa. Senhor, ouvis msica e eu ouo msica: ouvis um vastssimo plano de vibraes, eu ouo apenas parte dele mas essa parte ajusta-se a todo o vosso plano. St.: Sim. uma questo de absoro pessoal, de experincia. Assim, a resposta semelhante da outra pergunta: em si mesma ao mesmo tempo relativa e absoluta, mas para ns relativa. K.: Isso mesmo! St.: Vemos projetos da vida, nas artes, em nosso corpo, nas mquinas, em tudo; e o projeto de um automvel feito sempre com a idia de sua funo. Qual a funo da vida, de toda a vida? K.: Exprimir-se em si mesma. St.: Como pode derivar-se a ordem de vossa doutrina de liberdade? K.: Porque, senhor, a liberdade o alvo comum de todos bem o sabeis. Se cada homem compreender que a liberdade o alvo comum, em se adaptando, em se amoldando a esse alvo comum, ele s poder criar a ordem. St.: Quereis dizer que, aspirando ao ideal de libertao, ao ideal de beleza, atingiremos todos, finalmente, o mesmo alvo? K.: Com certeza. No assim? St.: ... e assim vir a ordem? K.: H agora meia dzia de indivduos, e entre eles eu e vs, que tm, todos, idias diferentes relativamente ao alvo final. Entretanto, se ns todos nos detivssemos e perguntssemos: Qual a meta suprema para cada um de ns? Responderamos: libertao e felicidade para cada um e para todos. Assim, mesmo que trabalheis num sentido e eu no outro, trabalharemos sempre ao longo de nossas prprias linhas, em direo ao mesmo alvo. Ento, haver ordem. St.: Como haveria a Sociedade, organizada sobre a liberdade, tratar o homem que tirasse a vida de outrem? K.: Atualmente, a Sociedade agindo sem alvo, lana-o numa priso ou mata-o. uma vingana justa. Mas, se eu ou vs fssemos as autoridades que estabelecem leis para a Sociedade, no nos esqueceramos um instante sequer, que para o assassino, como para ns mesmos, a meta idntica liberdade. No justo que o matem por haver ele matado tambm. Seria melhor dizer-lhe: Escute, empregaste mal a vossa atividade, pois destrustes uma vida que procurava alcanar a liberdade por meio da experincia. Vs tambm precisais de experincia; mas, experincia que prejudica a outrem, que se intromete com outrem, no pode conduzir-vos felicidade e libertao supremas. Precisamos criar leis baseadas na sabedoria, que a culminao da experincia, e no na idia de vingana. Se tivsseis um filhinho, e esse filhinho fizesse alguma coisa ruim, no o poreis imediatamente de castigo a um canto. Explicar-lhe-eis a razo porque no devia agir daquele modo. 162

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St.: Mas o que fareis com uma criana que no pudesse ainda falar nem entender o que estveis dizendo? K.: Iria proteg-la contra coisas que fossem perigosas para os outros ou para ela mesma. Afinal de contas, um assassino no passa de uma criana... St.: Sim, tomareis o assassino e o impedireis de ferir aos outros e a si prprio, e o educareis... K.: Sim, educ-lo-ia... ST.: Qual o supremo ideal de educao? K.: Ensinar criana, desde pequenina, que o seu alvo a felicidade e a liberdade, e que o meio de alcan-las reside na harmonia de todos os corpos mental emocional e fsico. St.: E, quando a criana fracassar nesse ideal e ferir-se a si mesma ou a terceiros, ou destruir qualquer espcie de beleza, como lhe descrevereis, qual dever ser o mtodo ideal de educao capaz de deter o curso destruidor por ela seguido? K.: Pondo-a em condies de poder ver o ideal, isto : dando-lhe conselhos, exemplos... Sois msico, e se eu estivesse aprendendo convosco, observaria cada movimento que fizsseis. Sois, com efeito, um mestre de msica, e eu preciso aprender. Compreendeis? Eis o meu ponto capital o exemplo tudo. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 7 e 8 (da anual em Ingls) Abril e Maio de 1929

A VIDA EM LIBERDADE de J. Krishnamurti (Comentrio da Dra. Annie Besant)

"D-me entendimento e eu cumprirei a Tua Lei; sim, cumpri-la-ei de todo o meu corao." Assim orava um antigo hebreu, e muitos de ns tm o costume da empregar as palavras como uma aspirao; pois bem sabemos que o Imortal Governador Interno pode responder ao anelo que torna as cascas permeveis Sua fora. O ltimo livro de Krishnaji nos incita a novos esforos afim de cultivar e fortalecer esta preciosssima qualidade, cujo exerccio constantemente aconselhado - em seus discursos e escritos. Neste livro, A Vida em Liberdade" de Krishnaji, est autobiografada a sua prpria Vida interna, esto traadas as suas prprias experincias, desde a primeira revolta interna, atravs de varias pesquisas e rejeies, at encontrar-se a si mesmo e atingir, assim, a perfeio. Um dos enganos de entendimento consiste em nos agarrarmos ltima experincia e ltima renncia de Krishnaji, como se tal renncia, baseada no largo conhecimento prprio e na prpria acumulao de experincias por ele realizadas, pudesse ser copiada por qualquer de ns que ainda no tenha alcanado aquele estado por si mesmo.

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www.lojajinarajadasa.com Eis um exemplo frisante do que viemos dizer: Krishnamurti, em criana, chegou aos Ps de seu Gur e, em seu primeiro livrinho, diz que as palavras no so suas, mas do Mestre que o ensinou. "Sem Ele, eu nada teria feito, mas com o Seu auxlio pus os ps na Senda." No grau em que se acha agora, ele no precisa de ensinamentos de ningum. Todavia, mos sbias e fortes guiaram-lhe os vacilantes passos quando ele principiou a trilhar a estreita e antiga senda. Para ns, ainda retumba a apelo do clarim: "Desperta! Levanta-te! Busca as grandes Instrutores e espera, porque o caminho estreito, sim, estreito como o fio de uma navalha." Buscando a Krishnaji, buscamos o Gur dos Gurs. Ser capaz de partilhar a sua fora conosco, a glria do Christo. "Vim para que possais ter Vida, e t-la mais abundantemente." Havemos de rejeitar o gracioso oferecimento, e recusa-lo grosseiramente? No precisamos ns de entendimento, e no precisamos mais dele quanto mais elevado o ensinamento? O Gur convida-me a procurar o meu prprio caminho, e esse o meu caminho. "Eu vos ajudarei a atingir o alvo que buscais... ento (o itlico meu) estareis, apto a vos guiardes atravs da escurido." Esse o auxilio que d o Gur, o auxlio para o homem se libertar a si mesmo. Temos, ento, os ensinamentos relativos trina natureza do homem - corpo, emoes, mente - a constituio do eu inferior. Certa dificuldade se origina da acepo diferente em que se tomam algumas palavras tcnicas. Por exemplo Krishnaji emprega, penso eu, "desejo" onde eu empregaria "vontade". Mas compreendemos isto pelas qualidades atribudas ao desejo - "o alvo que desejais atingir" pode-se dizer que familiar; "o alvo que atingireis" significa intensidade de propsito, de inteno: "precisais de estabelecer definitivamente o vosso alvo, e lutar continuamente para alcan-lo ." O alvo para a mente : "a purificao do eu"; para as emoes, o amor desinteressado; para o corpo, a beleza. Os trs ho de trabalhar em harmonia, e haveis de ter a necessria e verdadeira compreenso para cooperar com a vida. "O vosso alvo, que o alvo do mundo - atingir o Reino da Felicidade." "Aqueles que buscam compreender a vida devem fixar a sua percepo interna na Verdade Eterna, que o desdobrar da vida." "A teia da Vida tecida de coisas comuns, e as coisas comuns so experincia". Estabelecei por isso dentro de vs aquilo que eterno, e as presentes sombras se desvanecero." Krishnaji descreve o seu perodo de revolta, quando tinha de buscar tudo por si mesmo saudabilssimo perodo de preparao para o crescimento. Revoltava-se contra as distines sociais, contra a "algaravia" e reunies teosficas, porque devia encontrar tudo por si mesmo. Reunies trabalhistas, reunies comunistas, no o satisfaziam to pouco. Nada o contentou, realmente, enquanto ele no entrou "no mar da Libertao" - "a simples unio com o BemAmado." "O Atingimento", diz ele, "no para alguns, e sim para todos, em qualquer estgio de evoluo em que se achem." Isto eu no entendo, vou, portanto, p-lo de lado, por algum tempo. Continua ele: "Podeis perceber o Bem Amado quando tiverdes aprendido a traduzir as penas e prazeres ordinrios da vida em termos de eterna Verdade. Pode, entretanto o embrionrio selvagem, fazer essa transformao? Parece-me que no pode, assim como um boto de flor no pode transformar-se em fruto numa hora. Talvez eu no compreenda bem o que Krishnaji quer dizer.

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www.lojajinarajadasa.com A sua ltima palestra no Campo, pode ser lida na msica que o vento compe por entre as rvores da floresta; na praia, quando as ondinhas se quebram mansamente, para de novo encrespar-se sobre o oceano; na encosta de uma montanha, com um precipcio a vossos ps e um pico engolfado nas nuvens. Deixai-vos ir; possvel que vos acheis a vs mesmos e vos torneis livres. Melhor seria que fizsseis o vosso prprio comentrio em vez de ler o meu, pois talvez colhsseis a flor da vida. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 7 e 8 (da anual em Ingls) Abril e Maio de 1929

O OBJETIVO DO ACAMPAMENTO
(Fragmentos da mensagem de Krishnaji na abertura do Acampamento Indiano da Estrela, Guindy, Madrasta, 1929).

Pretendo, esta semana, expor-vos o importante objetivo de nossa presente reunio. ___ Viestes aqui para conhecer o que penso, digo-o sem presuno. Viestes de todos os pontos da ndia para sondar, descobrir por vs mesmos, cuidadosamente, o que essencial na vida e rejeitar tudo o mais. S podereis rejeitar, pr de lado, se fordes capazes de pensar com clareza e preciso. E isso que eu desejo despertar em cada um de vs durante esta semana, e isso que vs deveis buscar, a todo instante, esta semana. Do contrrio vossos esforos sero perdidos. ___ Deveis descobrir claramente, por vs mesmos, o propsito da vida, e estabelecer assim, por vs mesmos, uma diretriz precisa de conduta de que vos no desviareis. Eis a o que deveis fazer, eis o que fareis neste Campo - tentar descobrir, por vs mesmos, onde est a Verdade. ___ No momento em que a perceberdes, os vossos desejos se tornaro, proporcionalmente, vastos, ricos e poderosos. Como um matagal precisa de ser derrubado afim de que o ar puro e a luz do sol penetrem, assim precisais de procurar destruir, durante esta semana, todas as supersticiosas criaes que erigistes em redor de vs prprios, todas as crenas desnecessrias ao vosso bemestar moral, todas as idias desnecessrias estabilidade de vossa mente e de vosso corao... Durante esta semana, enquanto eu estiver falando, descobri ... quanto podeis destruir e, ao mesmo tempo, construir. ___ Para construir, deveis primeiro examinar os alicerces. Precisais primeiro, descobrir se o vosso pensamento profundo, se os vossos sentimentos so claros. S ento que podereis 165

www.lojajinarajadasa.com construir. Do contrrio, se construrdes sem conhecer a profundidade dos vossos pensamentos e sentimentos, a construo no resistir prova do tempo. ___ Qual a utilidade de todas as vossas teorias, de todas as vossas filosofias, se ainda sois prisioneiro da tristeza, se ainda sois escravo de todos os desejos, se estais ainda sob o jugo das paixes? Eis a nica coisa que importa, eis o nico perfume que d fora para a luta da vida. Assim, durante esta semana deveis descobrir qual o objetivo da vida... Para descobrir o objetivo de toda vida, mister que tenhais grande inteligncia e grande propsito. ___ O que entendo por inteligncia o seguinte: a capacidade de discernir, cultamente, o essencial do no-essencial... Esta a mais alta capacidade de inteligncia... e requer constante vigilncia, agudeza e grande cautela. E isto vos d pensamentos racionais, graas aos quais podereis encontrar a Verdade por vs mesmos, e nunca pensamentos supersticiosos. Direis que "isso demanda tempo"; mas, para um homem que est buscando a Verdade, o tempo no existe. ___ Se no lutardes constantemente, se no fizerdes grandes esforos para varrer os preconceitos de vosso matagal, as crenas cegas e as supersties, jamais encontrareis a verdade e ficareis presos roda do sofrimento. O que pretendo fazer ... animar esse desejo de vos libertardes de todo sofrimento; no inventar novas teorias, nova moral, novos sistemas e novos deuses, mas sim, dar-vos aquele grandioso propsito que s pode vir graas a uma constante vigilncia e ao despertar da inteligncia. ___ A inteligncia (e j expliquei o que entendo por inteligncia) no tolerar nenhuma autoridade, no poder tolerar nenhuma autoridade. Desde o momento em que no tiverdes o desejo de distinguir entre o essencial e o no essencial, mas unicamente o desejo de seguir ou imitar, estareis matando a vida. ___ Se fordes sinceros, na busca da Verdade - e o sois decerto, pois viestes de to longe e com tanto sacrifcio - haveis de alterar os mnimos hbitos de pensar e de sentir afim de discernir, de descobrir se estais seguindo o essencial. ___ Portanto, considerai, examinai, investigai cuidadosamente os vossos coraes e as vossas mentes, afim de descobrir o que deveis fazer esta semana. E o meu propsito ajudar-vos a descobrir o que deveis fazer; no imprimir em vossas mentes aquilo que eu devo fazer, mas aquilo que desejais fazer. mister descobrirdes que deveis banir todos os vossos preconceitos e crenas estreitas, e ter a inteligncia bem desperta a cada momento do dia. Senhores, temos uma inteno muito sria; mas, para elevar a prtica ao nvel da teoria, precisais de alcanar o triunfo da verdadeira percepo, e o triunfo da verdadeira percepo, h de ficar estabelecido dentro de ns, antes de deixarmos o Campo. Esse o objetivo deste Campo.

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DISCERNIMENTO J. Krishnamurti

A faculdade do discernimento o que constitui a diferena entre o aristocrata e o burgus. Pessoalmente, aceito a idia da aristocracia, isto , da verdadeira aristocracia; no a da pessoa que possui um ttulo e se d importncia, mas a da que, instintivamente, possui o reto sentimento, em qualquer momento e sob qualquer circunstncia. No dizer comum, tal pessoa um cavalheiro. Se ampliarmos esta idia e nos transportarmos para um outro plano, o cavalheiro se torna o homem espiritual. O aristocrata aquele que tem sido treinado durante idades, no somente nesta vida, mas tambm nas passadas. Tem se submetido a restries aqui, feito esforos ali, at que se tornou instintivo o proceder retamente, quer se encontre numa choupana ou num palcio, na casa do pobre ou no Ashram do Mestre. Longo e constante treinamento o ensinou a manter certos padres, enquanto que o burgus , naturalmente rstico, e por sua rusticidade transtorna os outros. Por no ter sido treinado ele incapaz de discernir entre o justo e o injusto, entre o belo e o feio, e, para ele, tudo uma confusa massa de idias. So estas coisas que marcam uma pessoa e por elas se afere seu valor, Na Senda, ambos podem existir, o burgus e o aristocrata, mas este segue sempre na vanguarda, porque sente ser seu dever servir de exemplo, e isto lhe imprime uma nobreza essencial. Isso torna-o ansioso por voltar-se para os outros, a fim de auxili-los, e sua nobreza no o deixa sentir-se orgulhosamente distinto ou superior. E tambm, o sentimento de superioridade s pode vir da ignorncia, e se desvanecer logo que seu possuidor aprenda que a Senda infinita, que nessa Senda h milhes adiante dele e milhes atrs. Assim, temos que criar uma nova aristocracia. As distines estaro entre os que sabem e os que no sabem, entre os que duvidam e os que crem. Quando o Instrutor vem, como j veio, e quando Ele fala, certas pessoas compreendero logo e outras no, alguns julgaro erroneamente e outros reconhecero a Verdade. Se tendes exercitado o discernimento retamente, sabeis o que ser superior a tudo o que acontece, no reto significado da palavra. Os acontecimentos passam ao p de vs e vos deixam intactos. Se so grandes, caminhareis com eles; se so nobres, vos sentireis mais nobres; se so pequenos, deix-los-eis passar por vs. Se vos exaltais, somente de maneira equilibrada. Utilizai vossa exaltao para tornar-vos maiores, para marchar um pouco mais alm. a faculdade do discernimento que distingue o santo e o sbio, do selvagem. Se o selvagem tem que fazer sua escolha entre duas coisas feias, ele provavelmente escolher a mais feia; mas, o sbio escolhe entre o belo e o ainda mais belo, porque sua faculdade de percepo e discernimento cresceu com o exerccio. Ele no tem mais que fazer sua escolha entre coisas pequenas, ele se desligou delas, est acima delas. Deveis caminhar pelo cume das montanhas, no conservando o mesmo nvel, mas subindo cada vez mais, sem nunca resvalar para traz. Se escorregais ao subirdes uma montanha, isto significa que tendes de fazer um esforo maior para alcanar o nvel que antes haveis atingido. Se quereis alcanar o cume, deveis continuar, no parar, no deveis relaxar vossos esforos. Podeis gastar tempo, mas, no resvaleis para trs. Para conseguirdes discernimento, deveis aplicar tempo e trabalho nisso, deliberadamente e com pacincia. Podeis agir rapidamente e subitamente, quando tiverdes alcanado certo estgio, pois haveis treinado na reta direo; mas nos primeiros estgios, deveis gastar tempo e pesar vossos motivos, vossas aes, vossos sentimentos. Tomai o exemplo do msico. Durante muitos anos ele se exercita privativamente, antes de se arriscar a apresentar-se ante o pblico. 167

www.lojajinarajadasa.com o mesmo que se d com aqueles que esto trilhando a Senda da evoluo; devem ter treinamento e mostrar meticuloso cuidado na escolha das coisas colocadas diante de si; pois, quanto mais percorrais essa Senda, maior ser a necessidade de elevado discernimento. No negligencieis esta qualidade, pois, se a desenvolverdes, adquirireis tambm as outras. Se fordes a corporificao, a essncia do discernimento, nenhuma outra qualidade necessitareis no mundo, porque esta inclui todas as outras. Se desenvolverdes esta qualidade at a sua perfeio, utilizareis vossa inteligncia, vossas emoes, vosso corpo todo, para criar uma nova atmosfera. porque no a adquirimos que estamos continuamente lutando. Uma vez a tenhais adquirido, nada no mundo poder tocar-vos. E ento comea a real felicidade, a real glria de pensar, sentir, agir e viver. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 7 e 8 (da anual em Ingls) Abril e Maio de 1929

A VERDADE NA LIMITAO J. Krishnamurti

Uma poro das guas sagradas do Ganges pode ser recolhida e guardada em um pequeno vaso, levada s mais distantes partes da ndia e, cuidadosamente conservada como um tesouro, adorada e colocada como que em um altar. Mas, as guas perenes do Ganges continuam a fluir incessantes, a todos os momentos. Nenhum homem pode poluir ou macular a pureza de suas guas. So livres, incondicionadas e em contnuo movimento, rumo ao mar. Assim como o vaso do oleiro que contm um pouco dessa gua sagrada, pode ser quebrado em mltiplos pedaos, assim aquele que adora o que condicionado, o que verdade limitada, que acalenta em seu corao uma verdade parcial e no toda a Verdade, descobrir que nela jaz a corrupo, a decadncia e a tristeza. Cada homem cria uma sombra, para seu conforto, num fragmento da Verdade, ao invs de procurar a Verdade toda, em sua transcendncia e pureza. Aqueles que procuram abrigo na verdade limitada, trouxeram para seus coraes gurus e instrutores. Por maior que seja o Guru, ele no o Todo, por mais nobre que seja o instrutor, ele ainda uma limitao. Assim como nas guas do Ganges, que se conservam em vasos pequenos, h corrupo e poluio, assim, para os que procuram o conforto e adoram a parte e no o Todo, h tristezas; mas, para aquele que adora o Todo, no h tristeza no h iluses, pois a Senda da Verdade a Senda do Bem Amado. Assim como uma ptala no contm a vida toda do ltus e fenece quando separada da flor, assim para aquele que adora uma verdade parcial, ao invs da Verdade inteira, h tambm decadncia. A parte pode ser corrompida, enquanto que, dentro do Todo, crescem e recebem nova vida todas as coisas. Uma verdade parcial pode, aparentemente, proteger e guiar por algum tempo, mas a Verdade inteira o nico guia real, o nico amigo real. A parte pode e h de satisfazer os desejos daquele que a procura, mas se algum quiser atingir o Bem Amado, que Verdade, tem que deixar de lado essas coisas que assim alcanou. Se deseja trilhar a Senda direta a Senda que leva ao Bem Amado, a Senda que conduz ao Todo, onde no h corrupo, a senda que a prpria Vida deve enamorar-se da Vida toda e no de uma parte dela, deve enamorar-se, de preferncia, da flor inteira em vez de apenas uma de suas ptalas, Se adorar a parte, encontrar a confuso, a luta dos gurus, o conflito das filosofias e religies, das crenas e Dogmas. Enquanto que se adorar a Verdade toda, que o Bem Amado, no haver conflito, pois, assim, estar adorando a prpria Vida.

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www.lojajinarajadasa.com Para trilhar essa senda, para atingir o Bem Amado, para a plena realizao da Vida, nunca deve deter a sua busca, no deve nunca trazer para o seu corao os confortos momentneos das verdades parciais. Desejo mostrar o caminho para a Verdade toda, para o corao do Bem Amado, pois eu o ating. A princpio, eu adorei a ptala, adorei os vrios dolos, as imagens gravadas que se abrigam nos templos; de comeo, eu trouxe para o meu corao, aquilo que estava perto, porque tinha receio da distante, misteriosa e fugidia viso do Eterno. Trouxe para o meu corao aquilo que era agradvel, suave, enganador. Assim como a montanha misteriosa para o vale, assim a Verdade inteira se me afigurava misteriosa. No compreendia que a parte se acha contida no Todo e que rejeitando o Todo, apenas estava criando confuso para mim mesmo. Mas, como tinha grandes desejos, eu fui movido pela tristeza, pela dvida e pela f, at compreender que quem deseja encontrar o caminho para o Bem Amado, no deve se abrigar no limitado, mas procurar a Verdade toda. Pelo fato de, com a mente limitada, no poderdes divisar o Todo que livre e ilimitado tomais para vs o que condicionado. E porque essa verdade condicionada se torna como uma muleta para vs, ela vos detm e vos enfraquece. Afim de abrir mo de todas as muletas, deveis convidar o sofrimento, deveis despertar a dvida. A tristeza d o perfume da compreenso e quando possus o conhecimento, no mais procurais os abrigos onde jazem a confuso e o caos. Se trouxerdes para o vosso corao a viso da meta e no permitirdes que nenhum mediador vos empane essa viso, haver certeza de propsito, certeza da consecuo. Pela constante rejeio das coisas que no tm valor, no mais sereis envolvidos pelas controvrsias das crenas, das fs profissionais e das irrealidades transitrias. Transigi nas pequenas coisas, se o quiserdes, mas nunca contemporizai quanto Verdade. Adorai a prpria Verdade, que a vida em cada um, e a descobr o Bem Amado. Que a Vida, em sua plenitude, vos d de sua experincia. Abr as portas da Verdade incondicionada, pois ali jaz a nica certeza, a nica senda direta para a consecuo. Todas as outras Sendas levam a uma traio da Verdade. Os homens, por todo o mundo, procuram condicionar a Verdade, que no pode ser limitada; torn-la mais estreita. Rode-la de crenas, traindo-a, portanto. Com essa traio, criaram religies, confuso, atritos, competies, uma luta insana. Quero que adoteis as minhas crenas e quereis que eu adote as vossas. Vosso instrutor vos parece maior que o meu e este parece-me maior que o vosso. Esse o pensamento da maioria das pessoas. Cada qual quer que o condicionamento, sob seu ponto de vista, seja aceito, e uns competem com os outros, enquanto que a Senda para o Bem Amado, que Vida, est plena na realizao dessa Vida que o Todo e no a adorao de uma das partes. O Bem Amado Vida, mas se adorardes essa Vida em sua forma condicionada, haver sempre a luta, a incerteza e o atrito. Enquanto que se adotardes a vida incondicionada, que livre e sem limitao, no precisareis de mediador, pois a Vida ser vosso guia e vosso Guru e, ento, descobrireis que vs prprios sois o Guru, o Bem Amado. Enquanto adorei a verdade condicionada, enquanto me apeguei s coisas no essenciais, houve sempre incerteza em minha mente e o desejo de que outros tambm viessem para dentro da gaiola de minha particular limitao. Passei de uma verdade condicionada, de uma limitao a outra limitao, at perceber que o perfume total se contm no ltus inteiro e no em nenhuma de suas ptalas. Escapei de dentro de minha limitao e aspirei o ar da liberdade, trouxe para o meu corao o Todo, de preferncia parte, e realizei plenamente a Vida. E, assim, me tornei o Bem Amado. Para aquele que atingiu, que alcanou essa viso do Bem Amado sobre a face da vida, no h atrito, nem luta, nem condio, nem limitao, nem Guru nem discpulo, h somente a Vida. Enamora-se da Vida, porque viu a face do Bem Amado. A compreenso da Vida jaz na descoberta da fonte e da meta e, no grande vcuo que h de permeio, encontrareis o Bem Amado. A Estrela No. 7 Julho de 1929

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UMA ENTREVISTA COM KRISHNAJI SOBRE PROBLEMAS DA POCA ATUAL


Uma Senhora que membro proeminente de uma organizao feminina internacional muito conhecida, foi apresentada a Krishnaji em Londres, e foi por ele convidada a vir ao Castelo de Eerde, na Holanda. Durante a sua estadia ali, ela lhe props, numa entrevista especial, algumas questes sobre problemas da poca, especialmente no concernente as relaes dos sexos e a educao de crianas. Esta senhora, que deseja permanecer annima, permitiu-nos publicar esta entrevista no Boletim.

Entrevistante: Haveis dito que no h nenhuma distino entre o homem e a mulher. Que quereis significar exatamente com isso? Krishnaji: Ao dizer isso, tenho em mente e assim tendes que pensar, seno pareceria que estou apenas jogando com as palavras que a vida subjacente em toda forma uma, as expresses desta vida no so de grande importncia. Entrevistante: Sim, mas direis que a expresso diferente? Krishnaji: A expresso diferente, mas insensato dar grande importncia expresso. Entrevistante: Compreendo. No deveramos prezar a forma tanto quanto a vida subjacente em toda forma? Krishnaji: A Unidade sim de preferncia diversidade. Entrevistante: Mas, no direis que a funo da mulher diferente da do homem? Krishnaji: Certamente. Entrevistante: E que ela no desempenha a expresso da vida nela, se no preenche a sua funo? Krishnaji: Certamente que no. Entrevistante: Deveriam ambos conservar suas expresses distintivas sem as exagerar? Ambos so expresses da vida? Krishnaji: Penso que absurdo emprestar importncia to tremenda s distines entre homens e mulheres. Quando encontro algum, encaro essa pessoa como um ser humano. No digo: Este um homem; esta uma mulher. Entrevistante: Direis que bom haver organizaes para tratar especialmente dos problemas femininos, ou que auxiliando os indivduos a compreenderem a vida que resolveremos todos os problemas? Krishnaji: bom haver organizaes, mas no exagerar-lhes a importncia alm das propores de vidas. Entrevistante: ao invs de organizaes separadas para mulheres, no seria melhor que em cada caso, homens e mulheres trabalhassem juntos, de um lado e de outro? Krishnaji: Eu optaria pelo ltimo. certamente melhor acentuar a unidade dos seres humanos, do que acentuar a diversidade das formas, isto , dos homens e mulheres separadamente. Se mantiverdes organizaes separadas para homens e mulheres, tendereis a conserv-los afastados uns dos outros, que o que acontece no presente e absurdo.

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www.lojajinarajadasa.com Entrevistante: Pensais que com a transformao das condies do mundo, tambm se transformaro os cdigos que regulam as relaes entre homens e mulheres? Krishnaji: Seguramente, no h dvida. Entrevistante: Se cometerem erros, no processar da transformao, isso ainda melhor que continuar a manter os cdigos tradicionais de moralidade? Krishnaji: Certamente. Porque, conservar-se sempre no mesmo lugar significa estagnar-se. Eu sou totalmente pela mudana, mesmo que ao process-la se cometam erros. Os enganos pouco importam. Entrevistante: Na ndia a mulher encara seu marido como um deus e o casamento para toda a vida. Na Amrica justamente o oposto; ali h igualdade entre marido e mulher, e o divrcio freqente. Qual , em vossa opinio, o sistema que melhor concorre para a felicidade da famlia, da nao, da maioria? Krishnaji: No podeis perguntar qual o melhor sistema, porque no podeis estabelecer um sistema para servir de padro a todo o mundo. No podeis estereotipar um cdigo de moral para todas as naes. Um sistema pode ir muito bem num pas e muito mal num outro. No podeis fazer crescer uma flor tropical num clima frio. Entrevistante: No admitis que em qualquer caso inconveniente haver predominncia de um sexo sobre outro? Krishnaji: Admito, por certo. Entrevistante: Achais, ento, til aos diferentes pases que eles experimentem formas diferentes de relaes entre os sexos, ainda que o resultado parea s vezes indesejvel? Krishnaji: Sim. As pessoas devem fazer as coisas por si mesmas. No bom dizer: Achei uma casa que se adapta a mim, e por isso todos devem adotar o mesmo tipo de casa. Entrevistante: Diremos ento que so justificveis as experincias de dois seres humanos, em suas relaes mtuas? Krishnaji: Seguramente. Eles tem o perfeito direito de fazer experincias entre si se o desejarem. Entrevistante: Tem sido geralmente aceito que um homem pode conhecer o mundo, como se diz, antes do casamento, ao passo que uma mulher no o pode; mas os reformadores tm pleiteado um s padro de pureza para os homens e mulheres. Esta defesa de um padro nico parece estar tomando rumo diferente do apontado pelos reformadores. Em vez de igualdade de pureza, parece que est resultando uma igualdade de licena. Direis que isto uma etapa do progresso da velha conveno de um padro para homens e outro para mulheres? Krishnaji: Preferiria ir alm de tudo isso. Quero dizer que este modo de encarar o problema s conduz a todas as espcies de discusses e de outros problemas. Mas, se compreendeis que a ltima felicidade, para todos, depende, no da desordem das emoes para qualquer sexo, porm da harmonizao das emoes, todos estes problemas se desvanecero. Entrevistante: Que pensais das experincias comunais com referncia educao das crianas, que esto sendo agora feitas na Rssia e na Palestina? Krishnaji: Devo dizer que, em certos casos podem ser excelentes, e em outros no. Repito que no podeis estabelecer um padro que todos devam seguir. Entrevistante: Direis ento que uma experincia interessante e que deveremos aguardar os resultados para ver? Krishnaji: Suponde que uma criana necessite muita afeio; provavelmente a obteria no lar, e neste caso a vida do lar lhe seria prefervel. Mas, se a me precisa trabalhar e est sempre fora, 171

www.lojajinarajadasa.com ento seria prefervel uma espcie de instituio comunal. Mas insisto em pensar que no podeis ensaiar e sistematizar uma educao para todo mundo. Eu faria experincias em pequenas comunidades e escolas, para observar os seus resultados, em lugar de tomar as crianas de uma nao inteira, para submet-las ao mesmo sistema. Entendeis o meu pensamento? Entrevistante: Entendo-o. Na Inglaterra, por exemplo, temos agora em todo o pas a vida do lar e a escola pblica praticamente estandardizada para toda a nao. E nenhuma experincia se permite fazer nessa estandardizao. Como podeis romper essa condio? Krishnaji: Arremessando-vos contra ela. Entrevistante: sim, mas em questo de educao o vosso filho que tendes de arremessar contra ela. Krishnamurti: Faria a experincia com o meu filho. Entrevistante: Mesmo com o risco de que ele vos maldissesse mais tarde? Krishnaji: Certamente: vosso dever. Entrevistante: Pensais que se tendes um ideal de vida diferente do da comunidade, vosso dever educar vosso filho segundo esse ideal e tentar assim demolir a tradio? Krishnaji: Acima de tudo, ele vosso filho, e vs sois parcialmente responsvel por ele. Fazei a experincia sem indagar se ele vos amaldioar depois. Afinal, ele poder maldizer-vos do mesmo modo, embora sigais a tradio. Entrevistante: Pensais que deve haver completa liberdade em todas as relaes de famlia? Krishnaji: No entendo bem. Entrevistante: Quero dizer, que no devia existir nem cime nem sentimento de posse? Krishnaji: Certo que no, especialmente em relao s crianas. Entrevistante: Quereis dizer que devemos compreender que a criana tem vida prpria independente para desenvolver? Dissestes outro dia que os homens esto presos s suas prprias criaes; aplicar-se-ia tambm isto s mes e seus filhos? Krishnaji: Muito certamente. Se no dais liberdade a vossos filhos, quando eles crescerem se afastaro da famlia, e ento vossos coraes se trituraro. Entrevistante: O pai prudente dar, pois, liberdade a seu filho, para ele aprender por seus prprios erros e por sua prpria experincia. Krishnaji: Certamente; afinal vs cresceis pela experincia. Mas, enquanto ele jovem, deveis tentar colocar diante dele a sua meta final. Entrevistante: A educao de uma criana comea antes que ela possa falar: como podeis ento colocar a meta diante dela? Krishnaji: Enquanto jovem, deveis proteg-la de prejudicar-se a si e aos outros; depois, mais tarde, por conselhos, lhe explicareis o que conduzir a felicidade final. Entrevistante: Como podeis inculcar disciplina sem represso? Krishnaji: Qualquer que seja a disciplina que exerais, deve estar baseada na meta que a criana h de finalmente alcanar, isto , a liberdade e a felicidade. Eu lhe mostraria a direo do seu crescimento, sua ltima perfeio, e a auxiliaria a adaptar-se nesse sentido. Deveis visar a meta em tudo que fazeis, portanto, vossa disciplina deve tender a auxiliar a criana a compreender que, a um certo estgio, ela transcender toda a disciplina.

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www.lojajinarajadasa.com Entrevistante: Muito bem. De fato a disciplina deve ser apenas uma ponte para a liberdade. Krishnaji: Absoluta liberdade. Entrevistante: Credes ser possvel eliminar-se todo o temor da educao das crianas? Krishnaji: Seguramente. Entrevistante: Mesmo que as pessoas que as rodeiam ainda sofram de temores? Krishnaji: Oh, absolutamente. Estou certo de que se pode conseguir isso. Est sendo feito na Califrnia. As crianas ali nada parecem temer. Entrevistante: Direis ento que o medo , em grande parte, uma questo relativa ao meio; mas, algumas crianas no nascem mais nervosas que outras? Krishnaji: Sim, mas isto pode ser auxiliado no se acrescentando a esse medo; medo de proceder mal, medo de cometer erros, e outros medos. Entrevistante: Como ensinareis os jovens a vencer seus instintos e dificuldades sexuais? Krishnaji: Expor-lhes-ia meu ponto de vista por um smile. Se desejais produzir uma rosa perfeita, tendes de cortar os botes que impedem o crescimento da flor perfeita. Entrevistante: Mas antes que nasa o desejo de tornar a rosa perfeita, no continuariam a expressar-se os desejos menores? Krishnaji: Certamente. Mas enquanto eles se expressarem, importa-vos exercer-lhes domnio para imped-los de prejudicarem-se e aos outros. Entrevistante: Por outras palavras, deve uma comunidade proteger seus cidados? Krishnaji: Sim, porm, tendo sempre em vista esse ideal ltimo. Entrevistante: Ento, ao elaborar as suas leis, uma nao deve ter tambm em vista essa meta final para todos os cidados? Krishnaji: Certamente. O governo sbio levar em conta o que melhor para o seu povo. Entrevistante: Nesse caso definireis sbio o governo que guie seu povo para a liberdade ltima? Krishnaji: Sim. Entrevistante: Direis que no se deve temer os desejos, nem reprim-los, e que quanto mais desejos tenhamos tanto melhor? Krishnaji: Tanto melhor, sim. Entrevistante: Mas como conseguir isso na prtica? Krishnaji: Consegue-se praticando. Se tendes muitos desejos, gradualmente os eliminareis um a um, at que permitireis que certos desejos predominem e outros feneam. Entrevistante: Ento quereis dizer que, em certo estgio, cada qual deve satisfazer seus desejos, mas quando se exorbite, prejudicando o resto da comunidade... Krishnaji: A comunidade sempre vela por si. Entrevistante: Mas deve uma pessoa satisfazer os desejos que talvez possam prejudicar somente a ela?

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www.lojajinarajadasa.com Krishnaji: Certamente. No podeis evit-lo, ningum pode fazer isso, nem mesmo as leis o fazem. No podeis evitar que algum se embriague, se esse o seu desejo, mas quando ela se torne prejudicial, podeis ento interferir. Entrevistante: E antes disso, no procurais evit-lo? Krishnaji: Que podeis fazer? Entrevistante: Quereis dizer que ser prefervel deix-lo experimentar, a tentar for-lo a ser sbrio. Krishnaji: Certamente, pois se o forais, ele realmente no mudar. Entrevistante: Ento direis que m a proibio tal como est sendo praticada em alguns pases? Krishnaji: No penso assim. Se interpretais o que digo sob um ponto de vista negativo, produzireis o caos, mas se tiverdes leis elaboradas por homens que viram a meta e necessitam auxiliar aqueles que ainda no a viram, a trabalhar para essa meta, resultar da, ento, a ordem. Entrevistante: A meta de que falais pode ser o guia daqueles que a viram, mas qual deve ser o guia daqueles que no a viram? Krishnaji: As leis estabelecidas pelos homens que viram a meta e que esto auxiliando o povo na consecuo dessa meta. Entrevistante: Dizeis que no h bem nem mal, mas que tudo experincia; significa isso que toda experincia tem valor idntico? Krishnaji: Depende do indivduo. No podeis afirmar que toda experincia de valor idntico para todas as pessoas. Entrevistante: Deve cada um percorrer as experincias chamadas do mal? Krishnaji: No, certamente, mas isso pode ser imprescindvel para alguns; depende do desenvolvimento individual. Cada um deve percorrer todas as experincias, mas no necessitam percorre-las todas em realidade podem faz-lo por substituio, pela imaginao. Entrevistante: Direis tambm que a beleza e a fealdade so ambas expresses da vida, ou que a fealdade apenas uma falta de harmonia? Krishnaji: Uma falta de harmonia, seguramente. E por certo o mal a mesma coisa. Entrevistante: De sorte que a fealdade e o mal so realmente uma deformao do bem, e a tristeza o reverso da alegria? Krishnaji: Todos so necessrios ao crescimento, mas podem ser experimentados por substituio. Entrevistante: Que pensais da respectiva importncia de uma boa hereditariedade e de um bom meio? Krishnaji: Ambos so necessrios. No podeis comparar o filho de um selvagem com o de um homem civilizado. Entrevistante: Isso quer dizer que se tirsseis uma criana de uma hereditariedade muito m, mesmo um bom meio no a transformaria muito? Krishnaji: Certo que no. Necessitais ambas as condies para o completo desenvolvimento da criana.

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www.lojajinarajadasa.com Entrevistante: Que pensais de Voronoff e suas experincias? Krishnaji: Penso que so brbaros. Entrevistante: Admitis que as experincias no mundo da forma podem prejudicar a vida? Krishnaji: No direi que prejudicam a vida, mas retardam seu desenvolvimento. Entrevistante: O esforo para criar um homem-macaco... Krishnaji: retardar esse desenvolvimento. Entrevistante: Pensais que um cientista essencialmente experimentador deve ensaiar tudo, ou considerais que certas experincias so inadmissveis? Krishnaji: Devo dizer que elas so inadmissveis se envolvem prejuzos ou crueldade para com animais ou para a humanidade, como numa guerra. Entrevistante: Achais inadmissvel todas as experincias que se praticam nos animais? Pois nem todas elas envolvem crueldade, como por exemplo, a da dieta. Krishnaji: No podeis dizer quais so as cruis e quais no. Podeis muito bem prejudicar um animal fazendo experincias com sua alimentao... Entrevistante: Direis ento que no se justificam quaisquer experincias nos animais, mesmo para o progresso do conhecimento humano ou o alvio do sofrimento humano? Krishnaji: Sim, certamente. Entrevistante: acertado apelar-se sempre, para uma criana, para que proceda bem por amor a alguma pessoa? Krishnaji: No, por certo. Entrevistante: O apelo a que me refiro o freqentemente feito s crianas: Fazei isso porque teu pai ou tua me gostaria, ou porque agradar a Deus. Krishnaji: Eu jamais faria isso. Eu lhe ensinaria a respeitar o que justo a palavra justo muito difcil de se usar eu lhe ensinaria a respeitar o valor intrnseco das coisas. Entendeis o que isto significa? A verdadeira proporo das coisas. Entrevistante: Supondo, por exemplo, como freqentemente acontece, principalmente numa casa pequena, a me com uma forte dor de cabea e o filho fazendo barulho: no pedireis silncio ao menino em ateno a sua me? Krishnaji: Pedir-lhe-ia por certo. Solicitar-lhe-ia que respeitasse os vossos sentimentos como lhe respeitareis os seus se ele estivesse atacado do mesmo mal. Devemos despertar os sentimentos de respeito mtuo; por outras palavras, despertar o desejo de amenizar o egosmo. Entrevistante: Se no se deve existir outro motivo de conduta seno o desejo de preencher a vida, no poder esta atitude resultar num grosseiro egosmo? Krishnaji: O egosmo sempre existe, convenamo-nos disso. O que nos compete fazer purificar esse egosmo. Entrevistante: Permiti-me dar o exemplo de uma organizao religiosa. Encontram algum considerado pecador, e por apelos baseados no amor de Deus ou de um Salvador, procuram desvi-lo de seu caminho errado. Acreditais que este resultado tenha atingido a raiz do mal e que seja permanente? Krishnaji: No, certamente. como se tapassem a superfcie de um buraco. Pem-lhe uma tbua delgada em cima, e to logo algum pise nessa tbua, ela cede. 175

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Entrevistante: Praticamente direis que os problemas que acabo de vos apresentar surgem porque a humanidade... Krishnaji: Procura subterfugir da vida. Entrevistante: Porque teme a humanidade encarar a vida em sua brutalidade, em sua crueldade? Krishnaji: Em sua intensidade, em sua entusistica intensidade. Entrevistante: O que digo que a vida uma coisa cruel. Krishnaji: No digo o mesmo. A vida uma coisa essencialmente alegre, mas quando amarrais a vida com todas estas rgidas moralidades e tradies, dogmas e credos, ento vem a misria. Entrevistante: A misria surge mais da escravido da vida do que da sua liberdade? Krishnamurti: Seguramente. Liberdade de vida no significa desordem de vida, no significa caos, nem cada qual fazendo o que lhe apraz. Isso no liberdade de vida. A rvore, se a amparais e protegeis enquanto nova, crescer direito, porque desenvolveu sua resistncia; mas se a tornais delicada, ela se vergar. Entrevistante: De sorte que se conclui praticamente que todas as crueldades, misrias, sofrimentos, pecados existentes no mundo provm... Krishnaji: Do medo. em conseqncia do medo que a humanidade tem enfaixado a vida em cdigos de moralidade e sistemas de crenas. Entrevistante: E assim as leis e cdigos elaborados pelos homens produziram as mesmas misrias que eles procuravam debelar? Krishnaji: Certamente, porque as leis humanas foram elaboradas por homens que no haviam percebido a meta final para a qual se dirigem. E eis porque to importante insistir primeiro no objetivo final, e da seguiro todos os regulamentos, todas as disciplinas. Entrevistante: Prevedes que conseguireis pessoas suficientes para compreender vosso ponto de vista e realizar vossas idias? Krishnaji: Isso no me preocupa. No me importa se no fim de minha vida tiver trinta ou trezentas pessoas que entendam. Sou como o artista que pinta um quadro porque esse seu dever; do contrrio ele se sentir infeliz, e para no se sentir infeliz, ele deve obedecer a esse impulso criativo. Entrevistante: Para quem percebeu, mesmo vagamente, o que o preenchimento da vida, no um desperdcio de tempo estar preso a compromissos? Krishnaji: Afirmo que quando percebestes ou atingistes a meta, no existem compromissos nem renncias. Se vistes a meta, cessa a existncia de compromissos. ento uma questo de atitude diferente. Entrevistante: Eu preferiria isso de um ponto de vista prtico. Supondo que um estadista compreendesse vosso ponto de vista, no seria para ele desperdcio de tempo continuar a protelar o estado atual das coisas, em vez de renunciar sua presente posio e penetrar at s suas razes? Krishnaji: Devo insistir que todo compromisso um retrocesso da Verdade, tentar reduzir algo que no pode ser reduzido, e que para quem compreendeu a vida estes compromissos so impossveis. Libertai-vos da pequena sabedoria, e a grande sabedoria vos iluminar.

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A Estrela No. 7 Julho de 1929

Parbola J. Krishnamurti

Havia certa vez um homem cujo corao estava satisfeito com a Vida. Ele amava a Vida e, por isso, amava todas as coisas. Ele era amigo do mais humilde assim como do mais elevado. Pois no a Vida como as guas, que refrigeram o santo e o louco? Este homem era muito procurado pela sua sabedoria. Um dia, quando os cus estavam azuis e o sol quente, as formigas saram de seus profundos ninhos e se espalharam pela superfcie da Terra, de modo que o caminho parecia mover-se com elas. Em sua clarividente sabedoria, o amante da Vida viu um homem se afogando no sorridente lago azul. Ele se precipitou no caminho para salv-lo das guas ondulantes, mas esmagando muitas formigas. O povo se perturbou e dizia: Como pode ser este homem o verdadeiro amante da Vida, se ele destri? Quo louco ramos ao esperar dele o amor! Agora ele vaga solitrio entre as montanhas. Ah! Quo pouco se ama! A Estrela No. 7 Julho de 1929

POEMAS J. Krishnamurti

I Na corrupo do conhecido Est o homem sufocado Pelo pavor do ignorado. Qual uma nuvem que vai, sozinha, procura de um vale no eterno. Assim, acossado pelo medo,

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www.lojajinarajadasa.com Cria o homem fora do conhecido A projeo da imagem de Deus. Com essa proteo multiplica-se o medo. Estranho o caminho na sombra do medo. A voz do medo clama, E o homem sobrecarrega a terra Com a seduo de um dem distante e o horror de um inferno prximo. A sombra do medo cobre a terra. Entre si e o medo. O homem erige um templo para a imagem do seu Deus; E em suas fundas sombras, Nasce uma religio de grande panplia. Cuja ameaa regulada por um padre amvel. Contra esse medo que ele denomina morte, Procura, o homem, um caminho para a continuao da vida E, nessa busca, o medo o mestre de seu amor. O sacrifcio do ignorante est dominado pelo medo. A sobrecarga da riqueza o pavor do rico. Os pobres so obcecados pelo desejo de possuir. A inveja, o dio, a ambio, o orgulho da dignidade, o juzo da conveno, O bem, o mal e a crueldade de uma moral opressiva, So os marcos no caminho do medo. Se o medo for a fonte do pensamento, Haver escurido na terra. Se a borbulhante fonte do amor for corrompida pelo medo, Suas guas claras criaro sede ardente Na boca dos homens. Ah, amigo, O encanto da vida no filho do medo, Porm jaz na matriz do conhecimento. O medo causa as lgrimas do mundo,

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www.lojajinarajadasa.com O riso alegra, no despertar de um amor leal. O brejo seco anseia pela chuva prxima.

II A dvida um precioso ungento, Conquanto ainda h de curar excelentemente. Eu te digo: chama a dvida Com toda a inteireza do teu desejo; Apela para a dvida Todas as vezes que tua ambio Sobrepujar os outros em pensamento; Desperta a dvida Quando teu corao rejubilar de amor. Porque eu te digo, A dvida gera o eterno amor, A dvida preserva a mente da corrupo. Assim a estabilidade dos teus dias Assentar no conhecimento. Como as guas impetuosas rugem pelo vale Assim, para proveito do teu corao E para o grande vo do teu esprito, Deixa entrar os rojes da dvida com sua impiedosa destruio. Porque eu te digo: Assim como as terras secas esperam as chuvas frescas, Assim, no preenchimento da Vida, A dvida precioso ungento Para as feridas vivas das lembranas angustiosas. No entre a dvida sombriamente em teu corao; Que ela chegue, pelo contrrio, como auras frescas das montanhas Que acordam as sombras do vale, Chame a dvida dana, 179

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O decadente amor de um esprito contentado. Eu te digo: A dvida um precioso ungento; Conquanto arda, h de curar excelentemente.

III No coloques teu amor no olor de uma violeta murcha. Porm, guarda em teu corao esse amor que Vida, Esse amor que o Bem Amado. Como uma grande chama desafia toda a corrupo. Assim o amor do Bem Amado. Oh, amigo, Porque precisas tu da quieta gravidade dos templos Quando a Vida dana na rua? Oh, amigo, Porque ests envolto no medo Da morte, do isolamento, da mgoa, Quando a Vida folga em redor de ti, nos campos olorosos? Oh, amigo, Porque buscas o conforto passageiro, Quando a Vida nos d o seu eterno conhecimento? Oh, s o criador de grandes montanhas Em vez de procurar guias Que te levem acima, por teus trilhos perigosos. Sou a Vida, sou o Bem Amado, A chama que desafia toda corrupo. Ah, vem comigo. Anda na estrada da Vida Ama o que no d morte. A Estrela e Boletim Ano II No. 8 e 9 Agosto e Setembro de 1929 180

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RENNCIA E TRANSIGNCIA J. Krishnamurti

Para o homem que a si fixou, como objetivo da existncia, o desenvolvimento e a plena realizao da vida e a conservao da Verdade e da Felicidade, no pode existir isso que se chama renncia. Haver renncia no fato da roseira florescer em rosa? A roseira produz a rosa porque no pode ser de outro modo. de sua natureza produzir beleza e fragrncia. Muitas pessoas se apegam as suas pequenas vantagens e consecues, aos seus pequenos incentivos e pequenas esperanas, as suas estreitas crenas e dogmas; mas, ao procurar a Verdade, tem que abandonar estas limitaes que eles prprios criaram para sua vida. Para estas pessoas que h e tem que haver renncia. Atravs das idades, em todas as religies, a renncia vem sendo considerada como algo necessrio para a consecuo espiritual. Somente quando a Verdade foi limitada e condicionada e quando estais presos a esta verdade condicionada, que, para vs, a renncia se torna um ideal. Mas, se tiverdes fixado o vosso objetivo, se tiverdes constantemente, a viso da meta eterna diante dos olhos e se vos adiantardes continuamente em sua direo, ento deixais de lado aquilo que acumulastes e que nenhum valor mais tem para vs; e nisto no pode haver renncia. No conservai convosco os incidentes de vossa vida, apenas recolheis em vosso corao e mente, a substncia de tais incidentes. Se vos apegais ao prprio incidente, ento que h renncia e sacrifcio. Assim como as ervas crescem nas guas estagnadas, assim complicaes inmeras envolvem o corao e a mente daqueles que esto cheios de contentamento em crenas e dogmas, daqueles que desconhecem as tempestades da dvida. Para o homem que tem medo da dvida, a renncia existe. Sem a capacidade de duvidar, ele no pode ter a perspectiva verdadeira, que significa que no capaz de rir-se de si mesmo. A seriedade afetada no leva Verdade; conduz apenas desiluso. Deveis ser capazes de ver a vida e suas variaes, em proporo verdadeira e, para isto, deveis estar constantemente observando e deveis pesar tudo na balana da dvida. Como todas as coisas na natureza se acham continuamente lutando por novas expresses da vida, assim deveis constantemente estar rejeitando o passado que morto e lanando-vos a novas realizaes. Se tiverdes vossa viso constantemente fixada sobre a meta, no haver dor nessa rejeio e sim, alegre preenchimento da vida. A idia da renncia se acha associada a da dor; no h, porm, dor em renunciar a algo que j ultrapassaste no vosso crescimento. Quando recolheis ao corao o resultado de uma experincia, no h sacrifcio em passar alm; vs a deixais, simplesmente de lado. Quando derdes vida sua plena expresso, crescereis retamente, pois tudo o que torto resulta das peias impostas vida pelas crenas e dogmas. Uma vida que livre cresce naturalmente reta, e numa tal vida no h renncia; mas para uma vida que foi tornada torta, h renncia, sacrifcio e transigncias constantes. A Estrela e Boletim Ano II No. 8 e 9 Agosto e Setembro de 1929

A DISSOLUO DA ORDEM DA ESTRELA

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www.lojajinarajadasa.com J. Krishnamurti

Nota Editorial O Boletim Internacional da Estrela, dada a nova organizao aps a dissoluo da Ordem, destaca-se da Revista, a partir do nmero de Agosto, para constituir publicao aparte. Ser, porm, distribudo aos assinantes de A ESTRELA, juntamente com esta, at Setembro. Da em diante, passar a ser distribudo s e em lugar desta ltima, que finaliza definitivamente seu curso com o nmero de Setembro, incluso nesta edio. A todos os nossos amigos e cooperadores, os mais cordiais agradecimentos pela generosa co-participao e auxlio prestado. O Editor Nacional

Vamos discutir, esta manh, a dissoluo da Ordem da Estrela. Muitas pessoas ficaro contentssimas, outras tristes. No um assunto nem para regozijo nem para tristeza, porque inevitvel, como vou expor. Deveis, talvez, lembrar-vos da histria em que se diz que o diabo e um amigo caminhavam por uma rua e, em dado momento, viram um homem a sua frente que apanhou algo do cho, contemplou-o e meteu-o no bolso. O amigo perguntou ao demnio: O que que esse homem apanhou? Um pedao da Verdade, disse o diabo; Ento, isto uma mau negcio para voc, retrucou o amigo. Oh, no, absolutamente, retrucou o demnio, eu vou ajudar a organiz-lo. Eu sustento que a Verdade uma terra sem caminhos e dela no podereis vos aproximar por nenhum caminho, por nenhuma religio, por nenhuma seita. este o meu ponto de vista e ele adiro de modo absolutamente incondicional. A Verdade, sendo sem limites, incondicionada, inacessvel por qualquer caminho, qualquer que ele seja, no pode ser organizada: nem instituio alguma deve ser formada para guiar ou coagir as pessoas a seguirem por um caminho particular qualquer. Se entendes isto, primeiramente, ento vereis como impossvel organizar uma crena. Uma crena uma questo puramente individual e no podeis nem deveis organiz-la. Se o fizerdes, ela se tornar morta, se cristalizar, tornar-se- um credo, uma seita, uma religio para ser imposta aos outros. isto que cada qual, no mundo inteiro, est tentando fazer. A Verdade reduzida e tornada um brinquedo para aqueles que so fracos e para aqueles que se encontram momentaneamente descontentes, A Verdade no pode ser trazida para baixo, mas o indivduo necessita fazer o esforo para elevar-se at ela. No podeis trazer o cimo da montanha para o vale. Se quiserdes atingir o cimo da montanha, tendes que passar atravs do vale, subir gradativamente, sem vos atemorizardes com os perigosos precipcios. Tendes que subir para a Verdade, ela no pode ser trazida para baixo ou organizada para vs. O interesse em idias sustentado principalmente pelas instituies, porm as instituies somente despertam o interesse superficial. O interesse que no nascer do amor Verdade, pelo seu prprio valor, e que, ao contrrio, surgir de uma instituio, no tem nenhum valor. A instituio torna-se uma moldura na qual os membros podem adaptar-se convenientemente. Eles no mais se esforam por alcanar a Verdade ou o cume da montanha, porm, pelo contrrio, cavam para si um nicho conveniente, no qual se colocam ou deixam que a instituio os coloque, e consideram que, por esse modo, a instituio os levar Verdade. Assim, esta a primeira das razes, sob meu ponto de vista, pelas quais a Ordem da Estrela deve ser dissolvida. A despeito disto, vs, provavelmente, vireis a formar outras ordens, continuareis a pertencer a outras instituies que busquem a Verdade. Eu no quero pertencer a instituio alguma de natureza espiritual, entendei isto, eu vos peo. Eu utilizaria uma instituio que me conduzisse a Londres, por exemplo; este um tipo de instituio inteiramente diferente, puramente mecnica, semelhante a um poste de telgrafo. Farei uso de um automvel ou de um vapor para viajar, pois so apenas mecanismos fsicos que nada tm a 182

www.lojajinarajadasa.com ver com a espiritualidade. Asseguro, mais uma vez, que nenhuma instituio pode conduzir o homem Espiritualidade. Se uma instituio for criada com esse propsito, se torna uma uma priso, que necessariamente deixa o indivduo invlido e o estabelecer a sua singularidade, que est na descoberta por si incondicionada Verdade. Assim, pois, dado o fato de ser eu o Chefe da la. Ningum me persuadiu a tomar esta deciso. muleta, impede prprio Ordem, uma debilidade, de crescer, de da absoluta e resolvi dissolv-

Isto no um ato magnfico; porque eu no quero seguidores e digo-o francamente. A partir do momento que segues a algum, cessas de seguir a Verdade. No me preocupa se prestais ateno ou no ao que eu digo. Pretendo fazer certa coisa no mundo e vou faz-la com inabalvel concentrao. Somente me preocupo com uma coisa que essencial: libertar o homem. Desejo libert-lo de todas as gaiolas, de todos os temores, e no fundar novas religies, novas seitas, nem estabelecer novas teorias, novas filosofias. Ento, naturalmente, perguntar-me-eis porque percorro o mundo falando continuamente. Dir-vos-ei porque razo fao isto: no porque eu queira fazer proselitismo nem por desejar um grupo separado de discpulos especiais. (Como os homens gostam de ser diferentes de seus semelhantes, por mais ridculas, absurdas e triviais que sejam estas diferenas! Pois eu no quero encorajar esse absurdo). No tenho discpulos, no tenho apstolos, seja na terra ou seja nos reinos da espiritualidade. No tambm a iluso do dinheiro nem o desejo de viver uma vida confortvel que me atrai. Se quisesse viver uma vida cmoda no viria para um Acampamento ou viver num pas mido! Falo francamente, pois desejo que isto fique bem estabelecido de uma vez por todas. No quero que se perpetuem, ano aps ano, estas discusses infantis. Um reprter de jornal que me entrevistou considerou um ato grandioso dissolver uma instituio na qual existem milhares de membros. Para ele era um grande ato, e disse: O que fareis depois, como haveis de viver? No tereis mais seguidores, o povo no vos escutar. Se somente houver cinco pessoas que escutem e que VIVAM, que tenham suas faces voltadas para o Eterno, isto ser suficiente. De que me serve possuir milhares de seguidores que no compreendam, que estejam inteiramente tomados por preconceitos, que no queiram o que novo, porm, que ao contrrio, pretendem torcer o que novo para adapt-lo s suas estagnantes e estreis personalidades? Se falo assim, firmemente, por favor, no me entendais mal; no por falta de compaixo. Se fordes a um cirurgio para ser operados, no bondade de sua parte operar-vos, ainda que vos cause dor? Assim, de maneira semelhante, se falo diretamente, no por falta de real afeto ao contrrio. Como disse, tenho somente um propsito: o de tornar o homem livre, impeli-lo para a liberdade, ajud-lo a romper com todas as limitaes, pois somente isto lhe dar felicidade real, lhe dar a realizao incondicionada do eu. Porque sou livre, no-condicionado, integral no uma parte, no relativo, mas sim a Verdade inteira que eterna desejo que aqueles que buscam entender-me sejam livres; que no me sigam, que no faam de mim uma gaiola sob a forma de uma religio ou uma seita. Ao contrrio, ser livres de todo o medo: do medo da religio, do medo da Salvao, do medo da espiritualidade, do medo do amor, do medo da morte, do medo da prpria vida. Assim como um artista pinta um quadro, por encontrar deleite na pintura, pelo fato de ser isso a sua auto-expresso, a sua glria, o seu bem estar, do mesmo modo eu fao isto que estou fazendo, e no porque deseje algo, seja de quem for. Vs estais acostumados autoridade, ou a atmosfera da autoridade que pensais vos h de conduzir espiritualidade. Pensais e esperais que uma outra pessoa possa, por seus extraordinrios poderes um milagre transportar-vos para esse reino da eterna liberdade que Felicidade. Todo o vosso ponto de vista sobre a vida encontra-se baseado na autoridade. Tendes me escutado durante trs anos, sem que mudana alguma se tenha operado em vs, exceto em muito poucos. Agora, analisai o que vos estou dizendo, sede crticos, afim de poderdes compreender completa e fundamentalmente. Quando buscais uma autoridade para vos conduzir espiritualidade, manifesta-se em vs, automaticamente, a tendncia a constituir uma organizao ao redor dessa autoridade. Pelo 183

www.lojajinarajadasa.com fato da criao dessa instituio, que pensais, ajudar essa autoridade a vos levar espiritualidade, sois colhidos em uma gaiola. Se vos falo francamente, por favor lembrai-vos que no o fao por aspereza, nem por crueldade, nem pelo entusiasmo do meu propsito, porm porque necessito que entendais o que vos estou dizendo. por esta razo que aqui estais e seria um desperdcio de tempo, se no vos explicasse clara e decisivamente, o meu ponto de vista. Durante dezoito anos vos haveis estado preparando para este acontecimento, para a Vinda do Instrutor do Mundo. Durante dezoito anos vos haveis organizado, tendes aguardado algum que viesse dar um novo deleite aos vossos coraes e mentes, que transformasse a vossa vida inteira, que vos proporcionasse um novo entendimento; por algum que vos elevasse a um novo plano de vida, que vos desse um novo encorajamento, que vos tornasse livres e vede agora o que acontece! Considerai, raciocinai por vs mesmos e julgai de que modo esta crena vos tornou diferentes no pela diferena superficial de ser o portador de um distintivo, o que seria trivial e absurdo. De que modo uma tal crena varreu em vs tudo na vida que no essencial? Esta a nica maneira de julgar: de que modo sois mais livres, mais plenos, mais perigosos para todas as sociedades baseadas no falso e no no essencial? De que modo os membros desta organizao da Estrela, se tornaram diferentes? Como disse tende vos estado preparando durante dezoito anos para mim. No me importo se acreditais ou no, que eu seja o Instrutor do Mundo. Isto de muito pouca importncia. Dado o fato de pertencerdes a Ordem da Estrela, haveis dado vossa simpatia, vossa energia ao reconhecimento de ser Krishnamurti o Instrutor do Mundo e o haveis feito parcial ou plenamente; plenamente por parte daqueles que realmente esto buscando; parcialmente, aqueles que se acham satisfeitos em suas meias verdades. Haveis vos estado preparando durante dezoito anos, e vede quantas dificuldades surgem no caminho do vosso entendimento, quantas complicaes, quantas coisas triviais. Vossos preconceitos, vossos medos, vossas autoridades, vossas igrejas novas e antigas todas essas coisas, sustento, constituem uma barreira ao entendimento. No posso ser mais claro do que estou sendo. No quero que concordeis comigo, no quero que me sigam, quero que compreendais o que estou dizendo. Este entendimento necessrio porque vossa crena no vos transformou, somente vos complicou, e isto pelo fato de no quererdes defrontar as coisas como elas so. Vs quereis ter vossos deuses pessoais novos deuses em lugar dos velhos, novas religies em vez das antigas, novas frmulas substituindo as antigas todas igualmente sem valor, todas elas barreiras, todas ela limitaes, todas elas muletas. Em vez das antigas distines espirituais, tendes novas variaes espirituais, em lugar dos antigos cultos, tendes cultos novos. Todos vs dependeis, para vossa espiritualidade de uma outra pessoa, dependeis de outro para vossa felicidade e de outro dependeis para vossa iluminao; e apesar de vos haverdes estado preparando para mim durante dezoito anos, quando vos digo que todas estas coisas so desnecessrias, quando vos digo que necessitais deix-las de lado e olhar para dentro de vs mesmos, buscando a iluminao, a glria, a purificao e a incorruptibilidade do eu, nem um de vs o quer fazer. Talvez haja uns poucos que o queiram, porm, bem poucos. Ento, por que ter uma organizao? Por que ter pessoas falsas e hipcritas seguindo-me, a mim que sou a corporificao da Verdade? Por favor, lembrai-vos, que nada estou dizendo de spero ou desprovido de bondade, porm chegamos a uma situao em que precisamos fazer face s coisas tais quais elas so. Disse no ano passado que no condescenderia. Poucos me escutaram. Este ano tornei isto absolutamente claro. No sei quantos milhares de pessoas, por todo o mundo membros da Ordem tm estado se preparando para mim, durante dezoito anos, e no entanto, no querem agora escutar, incondicional e totalmente, aquilo que eu digo. Ento, por que ter uma organizao? Como disse anteriormente, meu propsito tornar os homens incondicionalmente livres, pois sustento que a nica espiritualidade a incorruptibilidade do si mesmo que eterno, que a harmonia entre a razo e o amor. Esta a absoluta, e a incondicionada Verdade que a 184

www.lojajinarajadasa.com prpria Vida. Quero, portanto, tornar o homem livre, faze-lo regozijar-se como o pssaro nos cus lmpidos, aliviado, independente, cheio do xtase de sua liberdade. E eu, para quem vos haveis estado preparando no decorrer de dezoito anos, agora vos digo que vos deveis libertar de todas essas coisas; deveis ficar livres de todas as vossas complicaes, de vossos emaranhados. Para que ter uma organizao para cinco ou dez pessoas no mundo que compreendem, que esto esforando-se e que puseram de lado todas as coisas triviais? E no pode haver uma instituio para auxiliar as pessoas dbeis a encontrar a Verdade, porque a Verdade est em todos, no est longe, no est perto: est eternamente ali. As organizaes no vos podem libertar; nem o culto organizado nem a imolao de si prprio por uma causa, podem tornar-vos livres; nem vos constituirdes em uma corporao, nem o vos lanardes realizao de obras vos libertar. Voc usa uma mquina de escrever para escrever cartas, mas voc no a pe em um altar e lhe rende culto. Porm, isso que acontece convosco, quando fazeis das organizaes a vossa principal preocupao. Quantos membros h nela? Esta a primeira pergunta que me fazem todos os reprteres. Quantos seguidores tendes? Pelo nmero deles ajuizaremos se o que dizeis falso ou verdadeiro. No sei quantos h. No me preocupo com isso. Como disse, ainda que apenas haja um homem tornado livre, isto ser o bastante. Uma vez mais, alimentais a idia falsa de que somente certas pessoas possuem a chave para o Reino da Felicidade. Ningum a tem. Ningum tem a autoridade para ter essa chave. Essa chave vosso prprio ser, e somente no desenvolvimento, na purificao e na incorruptibilidade desse ser que est o Reino da Eternidade. Assim, haveis de verificar quo absurdo o conjunto, a estrutura que haveis criado buscando auxlio externo, dependendo dos outros para vosso conforto, para vossa felicidade e para vossa fora. Estas coisas somente podem ser encontradas dentro de vs prprios. Ento, por que ter uma organizao? Estais acostumados a que vos digam o quanto avanastes, qual o vosso status espiritual. Que infantil! Quem, seno vs prprios pode dizer se vs sois bonito ou feio por dentro? Quem, seno vs prprios pode dizer se vs sois incorruptvel? Vs no sois srios nestas questes. Ento, por que ter uma organizao? Porm, aqueles que realmente desejarem compreender, que esto buscando encontrar aquilo que eterno, que no tem comeo nem fim, caminharo juntos com maior intensidade, sero um perigo para tudo que no seja essencial, para todas as irrealidades e sombras. E se concentraro, se tornaro a chama, pelo fato de compreenderem. Tal o corpo que devemos criar e esse o meu propsito. Em virtude deste entendimento real haver verdadeira amizade. E devido a essa verdadeira amizade que pareceis no conhecer dar-se- a cooperao real da parte de cada um. E isto, no por causa da autoridade, no por amor da salvao, no pela imolao por uma causa, mas em virtude de realmente compreenderdes e da serdes capazes de viver no eterno. E isto algo muito maior do que todo prazer, que todo sacrifcio. Assim, essas so algumas das razes pelas quais, aps cuidadosa considerao por dois anos, tomei esta resoluo. No um impulso momentneo. Nenhuma pessoa me persuadiu a isso no me deixo persuadir em tais coisas. Durante dois anos tenho estado pensando a este respeito, lentamente, cuidadosamente, pacientemente, e agora resolvi dissolver a Ordem, pelo fato de ser seu Chefe. Vocs podem formar outras organizaes e esperar por outra pessoa. Nada tenho que ver com isso, nem com o criar de novas gaiolas ou de novas decoraes para essas gaiolas. Minha nica preocupao tornar os homens absoluta e incondicionalmente livres. A Estrela e Boletim Ano II No. 8 e 9 Agosto e Setembro de 1929

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DISSOLUO DA ORDEM D. Rajagopal

A dissoluo da Ordem da Estrela indica um novo comeo. Ela o resultado lgico dos ensinamentos de Krishnamurti e corresponde ao desenvolver de seu pensamento. O problema geral, tornou-se o problema individual e tem que ser resolvido individualmente. A instituio, como tal, cessou de existir. Em seu lugar, para fins prticos, foi criado um mecanismo que ser suficiente para os interessados, porm, que no tem pretenso alguma de possuir significado espiritual. Se a Ordem da Estrela do Oriente, fundada em 1911, expressou a intuio e a esperana de alguns; se em 1927 a Ordem da estrela, expressou a realizao das esperanas de alguns; a dissoluo da Ordem, como corporao separada, significa a queda de barreiras e privilgios, que se interpunham entre os poucos e muitos. Essas barreiras no foram nunca to obstrutivas que chegassem a impedir o mundo externo de reconhecer a grandeza de Krishnamurti e de por ele se interessar, porm tenderam para a cristalizao para a fossilizao mesmo e certamente com o andar do tempo, conduziriam formao de um novo culto. Seguramente, isto o oposto daquilo que Krishnamurti tem em vista. Ele luta, sempre, contra a cristalizao do pensamento que, para ele, o que representam todas as religies, e ele combate tambm a autoridade. A importncia desta anteposio autoridade demonstra-se pelo fato de que, ao passo que poucos reconheceram em Krishnamurti, mesmo em seus primeiros anos, o potente Instrutor, muitos no vm nele agora esse Instrutor, e justamente aqueles que mais prontamente, a princpio, o aceitaram como tal, sob a autoridade de outrem, foram os primeiros a dele duvidar hoje. O lado formal, a letra, cessou de existir e somente o esprito de convico perdura. De agora para o futuro, somente o sopro desse esprito inspirar uma nova consagrao na busca da eterna Verdade. Era muito fcil ceder a iluso de que um simples certificado de filiao trazia consigo incluso, um certificado de entendimento. Era muito fcil o estar satisfeito com uma adeso nominal, porm, ser difcil, sem o abrigo dessa formalidade, resistir prova de liberdade. Somente na liberdade, porm, que podemos por prova a nossa fora e julgar a medida do nosso entendimento. A Ordem estava radicada na crena, porm essa crena no foi forte, to vital que chegasse a modificar, integralmente, o carter de quem a aceitou. As instituies jamais criaram grandes homens, ao contrrio, os grandes homens tm aparecido, a despeito das instituies. A grandeza de Krishnamurti no foi criada pela Ordem da Estrela, porm, pelo seu esforo e luta individuais. E agora ele necessita, para o seu trabalho, daqueles que forem grandes pelo entendimento e se acharem acesos de entusiasmo. Mais uma vez, isto deve ser a resultante do esforo individual. Como instituio, no chegamos a produzir essa tempestade que tem de abalar o mundo e o perigo estava em que a Ordem, se continuasse a existir, tendesse a tornar-se um abrigo para os indiferentes e os fracos. A tormenta vir, porm, atravs de indivduos e no por meio de uma instituio, qualquer que ela seja. Para encurtar razes, a Ordem foi dissolvida pelo Chefe, atento ao fato de sua existncia no mais se justificar. O MECANISMO O mecanismo acima mencionado, tirar proveito de algumas facilidades j existentes. Eerde continuar como centro Internacional de nossas atividades. Este lugar to belo em si mesmo, e ao qual tanto auxlio generoso tem sido proporcionado, oferece oportunidades nicas para que o povo se rena em nmero considervel e entre em contato pessoal com 186

www.lojajinarajadasa.com Krishnamurti. O Acampamento de Ommen, famoso, agora, por todo o mundo, pode acomodar trs mil pessoas e, seguramente, em parte alguma se pode conceber que exista um conjunto mais belo para a explanao dos ensinos de Krishnamurti. Posto que Krishnamurti deseje falar em cidades, sales, em quaisquer lugares que ofeream ambiente adequado, , no entanto, evidente que um Acampamento o mais simples dos mtodos para reunio de grandes multides, por um certo perodo de tempo. Ojai, na Califrnia, onde tambm anualmente se rene um Acampamento, ser o centro das atividades para a Amrica. A ndia suprir as necessidades da sia, e a Austrlia concentrar suas atividades em Sidney, onde o Anfiteatro erigido do lado oposto das cabeceiras da cidade oferece um local ideal para as reunies. Em todos esses lugares, aqueles que se interessarem por Krishnamurti tero a oportunidade de entrar em contato pessoal com ele. A seguir, em importncia, vem o processo da palavra impressa, por meio de livros, panfletos, artigos, etc., que levaro as idias de Krishnamurti a um pblico consideravelmente mais vasto. Este segundo departamento enquadra-se, naturalmente, nos domnios do Star Publishing Trust, que tem seu escritrio principal em Eerde, Ommen, Holanda. O nome Estrela, conservado apensa para fins prticos e no tendo em vista qualquer significado oculto ou mstico. Este Boletim (o nome antigo conservado por convenincia, at que outro melhor seja encontrado) tomar um carter inteiramente novo e servir de elo entre Krishnamurti e todos aqueles que se interessarem pelas suas idias. No mais ser apenas um registro dos afazeres internos de uma sociedade, porm uma revista que ter como uma de suas principais feies, relatos das palestras de Krishnamurti e de suas atividades, juntamente com artigos de interesse geral e bibliografias de livros e magazines. Esta revista capacitar todos os que o desejarem a terem informes autnticos relativos a Krishnamurti. As vrias revistas da Estrela agora existentes por todo o mundo, cessaro completamente a sua publicao a partir de Janeiro prximo. A existncia de Centros Internacionais, e a formao do Trust de Publicaes foram tornadas possveis em vista do generoso apoio daqueles que desejaram fazer chegar o ensinamento de Krishnamurti ao alcance de todos. Essa mesma generosidade de intenso interesse assegurar a continuao do trabalho, sua prosperidade e crescimento. Krishnamurti tem insistido sobre o ponto de que se quisermos atingir a paz e harmonia internas e voltar nossas faces na direo da meta de libertao, temos que deixar de lado todas as coisas no essenciais. De nenhuma instituio se necessita para atingir a Verdade como repetidamente ele o tem acentuado. A Verdade no poder ser sistematizada, no pode ser organizada e uma tentativa dessa espcie finalizaria pela traio Verdade. A dissoluo da Ordem simplesmente acentua o fato de que cada indivduo livre para expressar suas prprias crenas a seu prprio modo; e onde quer que esta convico repouse sobre um alicerce seguro, produzir sua florescncia em uma vida nova. A Estrela e Boletim Ano II No. 8 e 9 Agosto e Setembro de 1929

EXCERTOS J. Krishnamurti

Por que suportar este turbilho, esta angstia, este embate incessante de dor, de prazer, de sofrimento, de luta, quando pelo vosso cuidadoso entendimento do propsito da vida, podeis alterar, podeis remover essa nuvem que projeta uma sombra atravs do vosso caminho? Portanto, tendo a Vida como vosso Gur, como vosso motivo, como a Verdade nica, tornai-vos

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www.lojajinarajadasa.com discpulos dela. Ento vossa mente conhecer a verdade no verdadeiro, entender o falso na falsidade, e ver o real na realidade. ___ Um ungento que cura toda a tristeza, todas as feridas, todo o sofrimento, encontra-se naquilo que durvel, naquilo que vida e disso que eu falo. ___ Suponde que eu estivesse no mundo ao tempo em que o Buddha esteve na ndia, e por mim mesmo houvesse verificado que existia um grande ser humano que havia entendido a vida, que era a consumao da vida, que era a beleza da vida; em quem exista o todo e no a parte. Sabendo tudo isto e animado do ardente desejo de entend-lo, pensareis que eu tendo-me voltado para ele, depois diria que tinha um outro servio a fazer no mundo, que queria permanecer sombra de uma religio ou funcionar por meio de um canal particular qualquer, quando ele prprio continha toda a Vida? Pois de igual modo eu vos digo agora, e o digo sem vaidade, com entendimento prprio, com plenitude de mente e de corao, que eu sou aquela flor plena que a glria da Vida, qual todos os seres humanos, tanto individualmente bem como todo o mundo tm de chegar. Ojai Star Camp, 1929 Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 10

VISLUMBRES DO ACAMPAMENTO DA ESTRELA Compilado de Relatrios

Dirio do Acampamento segunda-feira, 27 de Maio: Comearam a chegar ao Campo pessoas vindas de todas as partes dos Estados Unidos, da Austrlia, da Nova Zelndia, da ndia, Java, Cuba, Sucia, Holanda, Guatemala, Mxico e Canad. tarde, Krishnaji deu as boas vindas s setecentas pessoas que se tinham reunido nesse dia para um Camp-Fire sem formalidades, pois que a abertura oficial do Acampamento no viria a ter lugar seno no dia seguinte. Mr. Robert Logan de Filadlfia e o Sr. Luiz Zalk, gerente do Campo proferiram algumas breves palavras; o Sr. Yadunandam Prasad falou da aquisio de um milhar de acres de terra em Benars, ndia, onde se planejou estabelecer uma escola.

tera-feira, 28 de Maio: Krishnaji abriu oficialmente o Acampamento s dez horas da manh. Os seguintes excertos so tirados de um relatrio do seu discurso:

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DISCURSO DE ABERTURA, DE KRISHNAJI Gostaria de vos perguntar a razo pela qual haveis vindo ao Acampamento. Como no podeis responder-me, responder-vos-ei eu. Haveis vindo de muitas partes da Amrica, primeiro que tudo para verificar se o que os outros dizem acerca de Krishnamurti verdadeiro; e em segundo lugar, para averiguardes por vs mesmos aquilo que Krishnamurti realmente ; e em terceiro lugar, para por vs mesmos descobrirdes os meios de viver retamente. Eu somente me preocupo com esta ltima parte: isto , como viver retamente. No me preocupa muito o que vs imaginais que eu sou. Eu sei. Muitos de vs pensais sobre isto o que vos disseram que penssseis. Alguns sabem, por si mesmos, intuitivamente ou por meio do sofrimento e pelo entendimento da plenitude de meus discursos. Aqui viestes para averiguar a maneira de viverdes, a maneira pela qual haveis de conduzir as vossas vidas afim de poderdes encontrar essa Verdade que ininterrupta. Antes de descobrirdes isto, tendes que passar por um processo de rejeio e muitos poucos dentre vs o pretendem fazer... pelo fato de j estarem de posse de idias muito precisas, e definidas daquilo que eu teria a dizer, acham muito difcil de compreender aquilo que eu realmente digo... muito difcil isto, por j terdes em vossas mentes, muito clara e definidamente, a idia daquilo que eu sou. Disseram-vos quem eu era e qual a modalidade de meu ensinamento; qual a forma de meu trabalho, quais os meus discpulos especiais, quais os movimentos que ho de vir tomar a dianteira. Portanto, tendes todas essas barreiras contrrias ao entendimento da Verdade... A inteligncia, a verdadeira inteligncia, o equilbrio, entre a razo e o afeto. Quero, primeiro que mais nada, portanto, estabelecer em vossas mentes este equilbrio, afim de que, por vs mesmos descubrais as coisas, em vez de serdes informados por outrem, sobre aquilo que eu pretendo dizer. Quero que por vs prprios compreendais aquilo que eu digo. E deixai que eu acrescente: digo exatamente aquilo que tenho em mente significar. Tenho considerado cuidadosamente cada uma de minhas palavras; e seria insensatez dizer "Ele no quer dizer exatamente o que diz." Muitos de meus amigos esto j principiando a dizer: "Ns o conhecemos melhor em outro lugar. somente uma parte de sua conscincia que est funcionando". Quo infantis so estas coisas! Eles no conhecem bem o Instrutor, nem Krishnamurti, porm externam opinio acerca de ambos. Agora, se aceitardes uma ou outra destas coisas, andareis de modo insensato. No aceiteis nem uma nem outra. Nem o que eu digo nem o que outrem vos diz; raciocinai, porm, por vs mesmos, afim de que, por meio desse raciocnio, em vs nasa a flor do entendimento. Agora, digo-vos que sou ntegro, - inteiramente incondicionado. Digo isto no para ter seguidores. No pretendo coisa alguma de ningum: nem seguidores, nem dinheiro, nem louvores, nem lisonja - tenho somente o desejo de estimular os outros reta conduta na vida. Digo que sou ntegro e qualquer pessoa que diga o contrrio, agir insensatamente, porque no sabe. No digo isto para vos convencer... pois tal no o meu desejo... Quero firmar em vossas mentes e despertar em vossos coraes o desejo pela Verdade; e, quando tiverdes esse desejo, encontrareis os meios, a tcnica, o modo de a atingir. Assim pois, por favor, como vos disse, utilizai vossa anlise crtica relativamente ao que digo. No permitais que outrem, seja quem for, inclusive eu, vos convena de algo que no entendais, por velho e amadurecido pela tradio ou por novo e moderno que seja. Pois no vedes, amigos? Todos vs aqui viestes acreditando ou no acreditando que eu tenha algo para dar e mostrar. Como podereis achar o que pretendeis se vossa mente estiver j imbuda de preconceitos, se j estiverdes antecipadamente pensando: "Agora Krishnamurti quem fala; agora outra pessoa?" Direis que Krishnamurti quem fala, quando tal vos convier; direis que outra pessoa qualquer, quando vos satisfizer o que ele diz. Andei ultimamente por todo o mundo, da ndia para a Europa e de l para a Amrica e por toda a parte, a mesma coisa. Todos sabem melhor do que eu o que se passa acerca de minha pessoa - alegra-me ver o que h de divertido nisto tudo, porm, o simplesmente vos divertirdes, no tem valor. Todos podemos rir. Muito me tenho rido com a falta de senso do que muitas pessoas dizem isto, porm, tambm de muito pouco valor. O que tem valia o viverdes pelo fato de haverdes compreendido. Esta a nica coisa de importncia; no meras

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www.lojajinarajadasa.com palavras, palavras e palavras. No importa o que acreditais ou o que deixais de acreditar; a que sociedade pertenceis ou a que sociedade no pertenceis, tudo isso infantil e ridculo. Porm, aqui viestes como membros da Estrela, acreditando que Krishnamurti o Instrutor do Mundo. Pelo menos haveis referendado essa crena. uma infelicidade isto, porque no o sabeis. Alguns dentre vs sabem, porm a grande maioria dos que subscreveram seu nome a essa crena, no sabem. Se tivsseis esse conhecimento tereis sido diferentes do que sois e vs no sois, de maneira alguma, diversos do homem mdio comum; e a que est a tristeza de tudo isto. Eis algo de semelhante: se vsseis um grande quadro, desejareis vos tornar pintores e ficareis entusiasmados por descobrir o mestre que o havia pintado; ento ireis at ele e dele aprendereis com todo o ardor. Vs, porm, no vos interessais por isso. Estais no presente momento, interessados em saber se quem est falando, fulano ou sicrano, ou se outra pessoa - porm, no se o que estou dizendo ou no a verdade. No vedes o que estais perdendo com todas essas contendas relativamente a coisas no essenciais? No vos estou falando com dureza ou com falta de afeto. Ao contrrio. Digo que encontrei essa flor que a consumao de toda a vida, esse perfume que o entendimento de toda a vida, essa Verdade que contnua, qual todo o ser humano tem de chegar. E para isto fazerdes tambm, tendes que abandonar todas as coisas, afim de encontrar essa, pois que a Verdade ntegra, completa, contnua. Quereis que essa Verdade seja para vs traduzida de um modo particular, segundo vossa prpria estreiteza; quereis que ela seja trazida para baixo at vs, que vos seja dada em um smbolo especial. No aceitareis a Verdade em sua inteireza. O Cristo dir: "Eu quero a Verdade pelo Cristianismo." O Hindu dir o mesmo relativamente ao Hindusmo. Porm no alcanareis a Verdade deste modo. Nenhuma religio, seita ou sociedade contm a Verdade. Tendes que sair, vs mesmos, da sombra e ir para a luz do sol. Espero que considereis isto e que algo faais a este respeito... Pensai, por um momento, por vs mesmos, como eu o tenho freqentemente feito. Suponde que eu estivesse no mundo no tempo em que Buddha esteve na ndia, e por mim mesmo houvesse averiguado existir um grande ser humano que havia compreendido a vida e que era, ele prprio, a consumao da vida, a beleza da vida; em quem se encontrava o todo e no a parte. Sabendo de tudo isso e possudo do ardente desejo de compreend-lo, pensais que eu, tendo estado junto dele, depois me voltaria para outro lado, dizendo que tinha outro trabalho a fazer no mundo, que queria permanecer na sombra de uma religio qualquer, ou funcionar atravs de um canal particular, quando ele prprio em si mesmo continha integralmente a vida? Pois do mesmo modo eu vos digo agora - e digo-o sem presuno, com entendimento prprio, com plenitude de mente e corao, que sou aquela flor plena que glria da vida, qual todos os seres humanos, tanto indivduos como o mundo inteiro, tem de chegar. Alguns de vs podem verificar aquilo de que outros tero dvidas e outros ainda, por sua convenincia, descobriro frases que aderem em suas mentes e as fazem, assim, perder o perfume... No vos digo isto como uma ameaa ou coisa semelhante; ou vs quereis a beleza, a perfeio da vida, ou no a quereis. Se a no quereis, deixai-a de lado. Se a quereis, tomai-a to ardentemente que chegueis a sacrificar tudo por essa coisa nica. No estreiteza isto quando um homem que se afoga clama por ar, no o faz por estreiteza. Ele deseja o ar, afim de poder respirar e viver, ser feliz e regozijar-se. Isto no estreiteza; no limitao. Assim, tendes que tomar uma resoluo sobre aquilo que pretendeis fazer: ou pertencer congregao dos mortos... ou, despedaar todas as barreiras, pr de lado vossas coisas colaterais, coisas ntimas, no essenciais para poderdes sair para a luz do sol. Por favor, compreendei que jamais podereis atingir a Verdade por meio de um canal particular; pois que a Verdade contnua e no pode ser dividida... No fim de tudo, que a Verdade? vida, a compreenso e a posse desta plenitude de vida que felicidade, que perfeio. Assim, para obterdes isso, tendes que abandonar todas as pequenas parcialidades e correr de encontro plenitude com ardente ansiedade.

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www.lojajinarajadasa.com Quando vem a luz do sol j no necessitais ler luz de vossa vela, deixais de lado a vela, por muito que a ameis, por muito suave que seja a sua luz. Assim, se quiserdes aquilo que eu vos digo ser a absoluta, incondicionada Verdade, o todo - se quiserdes esta Verdade, ento tendes que pr de lado todas essas coisas infantis. Se quiserdes o que no essencial, estou de perfeito acordo; unicamente apercebei-vos disto. No jogueis com ambas as coisas. Ou bem quereis essa perfeio que Verdade, essa incorrupo que a prpria vida, ou quereis o conforto - conforto que respira autoridade, a qual por sua vez respira temor. A maioria dentre vs atemoriza-se de tal modo com aquilo que estou dizendo, que permanecem inseguros. Perfeitamente; porm, em meio de vossa incerteza no vos encontrais ansiosos por encontrar o que certo. Quereis ser informado por outrem do que verdadeiro e do que falso, pelas vossas autoridades favoritas, pelas vossas tradies de ontem. Assim, espero que vos apercebais que chegou o tempo em que tendes que abandonar vossas amas, vosso estado infantil, para sairdes a buscar. Qual a diferena existente entre vs e o homem comum? No muito grande, sinto diz-lo, consiste no fato de poderdes dizer: "Abandonamos as velhas formas da verdade." Abandonastes todas as velhas idias da verdade para descobrir as novas, porm no as haveis descoberto, por estardes estabelecendo novas formas, novas teorias, novos dogmas, novos credos, novos cultos, novos ritos, novos deuses. Este no o modo de encontrar a Verdade. Para encontrar essa Verdade que absoluta, incondicionada, livre, vs prprios tendes que ser incondicionados, livres, absolutos; isto , tendes que varrer em redor de vs tudo quanto coloca uma limitao em vossas mentes, em vossos coraes, e buscar essa liberdade que a prpria Verdade. Vindes ouvir-me todos os anos e ledes aquilo que freqentemente digo, porm a todo instante traduzis o que digo para adapt-lo s vossas convenincias. Tenho ouvido pessoas dizerem: "Oh, ele no quer dizer integralmente o que diz, ele lanou sobre isso uma complexidade, ele no possui o todo, porm ns conhecemos a integralidade e vos diremos o que o todo. Isto necessrio e aquilo no o . Isto est certo e aquilo est errado." Seguramente que no mais sois crianas para que se vos diga o que deveis fazer, o que deveis pensar, e por qual maneira vos deveis conduzir, o que tendes de cultuar e o que no tendes! Senhores, que buscais? Sombras que obstruem a luz, conforto que no existe, em lugar da Verdade que proporciona esse entendimento que ultrapassa o conforto. Que que estais buscando? Se buscais conforto, vireis a ter deuses inumerveis, novos santurios, novos ritos, nova literatura, que abafar a vida em vossos coraes e mentes... Que que vs, como indivduos que sofrem, que se regozijam, que pensam, que sentem, que lutam, que so colhidos pelas paixes, inseguros, incertos - que que quereis?... A borboleta queima-se na luz e feliz a borboleta. E se vs vos quereis queimar nessa Verdade de que vos falo, sereis felizes tambm. Porm deveis querer, deveis estar ansiosos, deveis possuir o grande desejo que vos impulsione a descobrir essa Verdade que eterna. Assim, que que, como indivduos sensatos, com propsito definido e sbios em sua escolha, quereis? No vedes que disso depende o que haveis de alcanar, aquilo que ireis possuir? No vedes que disso depende vossa capacidade de entender? No vedes que disso depende a vossa fora para atingir, a vossa firmeza de desgnio, o vosso xtase, o vosso entusiasmo? No podeis aceitar idias ou pensamentos de minha concepo, ou de outrem, porm, se vossas idias nasceram daquilo que eterno, duradouro, ento podereis viver segundo essas idias. Assim, para achardes o que duradouro, o que eterno, tendes que pr de lado o que passageiro, o que no essencial, o que trivial. Vs me pedis: "Por favor, dizei-me o que essencial?" Como posso eu dizer-vos o que essencial? "Eu sei o que essencial para mim, e sei como atingi isso que essencial, que incomparvel, ilimitado, livre, absoluto. Para mim essa Verdade o estar livre de todos os desejos, libertar-se de todas as experincias e a partir do momento que tenhais vos apercebido disto, verificareis que ningum vos pode salvar, exceto vs prprios.

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www.lojajinarajadasa.com A grandeza do homem consiste em ningum poder salv-lo; esta a grandeza, a glria do homem. Porm, o que que todos vs buscais? Quereis ser salvos, quereis adorar em altares feitos por mos humanas, quereis cultuar deuses criados pela vida, e por isso que vos digo: Adorai essa vida que est em todas as coisas, pois que a vida criou deus e homem, - a vida que livre, ilimitada, incondicionada e absoluta. Pois esta a Verdade... Eu no me importo se no ano prximo houver somente duas pessoas no Acampamento. ... Um homem que seja sincero, que compreenda, vale por uma multido que clama vmente sem entendimento; pois que este homem viver de eternidade em eternidade. Assim, amigos, durante este Acampamento, espero ser capaz de vos ajudar em vossa escolha, a descobrirdes por vs mesmos e a perceberdes, por meio de felizes vises, aquilo que vir a estabelecer a paz e o entendimento em vossos coraes, que vos dar apoio, aquilo que vos sustentar em vossa integridade. Pois no existe maior verdade do que essa de que vos haveis de unir a essa vida que eterna, pois nessa vida est a imortalidade". _____ No Camp-Fire da tarde, o Sr. Henry Eicheim, o bem conhecido compositor e autoridade em musica oriental, fez uma conferncia sobre a interpretao ocidental da musica oriental, com exemplos executados pela Sra. Eicheim. No fim da conferncia, algumas de suas composies foram tocadas - impresses que ele colhera escutando sinos de templos, preges na praa do mercado, canto de adorantes. Krishnaji esteve presente e iniciou a reunio pelo acender da fogueira.

quarta-feira, 29 de Maio: Uma discusso foi travada, de manh, em Oak Grove, dirigida por Mr. Robert Logan. Perguntas foram diretamente feitas pelo auditrio - sobre educao, sobre entendimento da vida, sobre o uso adequado e o mal uso das instituies, - e discusses foram travadas, entre membros do auditrio e Krishnaji. Entre outros, Mr. Burr Macintosh, amplamente conhecido nos Estados Unidos por o "Filsofo Divertido", falou dentre o auditrio e prestou graciosa contribuio Krishnaji. Esta nova espcie de reunies evidenciou-se como uma experincia fascinante, e foi amplamente apreciada pelos assistentes. Algumas das observaes feitas por Krishnaji so dadas abaixo.

pergunta "Onde que a obedincia entra em vosso plano de educao?" Krishnaji deu resposta nos seguintes termos: "Porque que a criana, qualquer que, seja, deve obedecer? Seria eu quem dever levla a obedecer em certas coisas. Uma criana obedecer a outra pessoa se por ela tiver respeito. Se dentro de mim eu tiver respeito pela criana, por mim e pelos outros, a criana me respeitar tambm e quando eu lhe pedir que faa certa coisa, sensivelmente ela o far... Como sabeis, todos ns queremos fazer os outros nos obedecerem quando ns prprios no obedecemos... Os indivduos que exigem obedincia, reverncia, autoridade, no deveriam ter lugar na educao." Um outro inquiridor quis saber se havia graa que, vinda do alto, pudesse ajudar. De acordo com Krishnaji no h: "No h graa vinda do alto que possa ajudar... Se confiardes na autoridade exterior para vos ajudar, no alcanareis o que desejais. Ningum pode cancelar vosso karma, como vs o denominais. Ningum vos pode dar essa consecuo, essa felicidade, esse entendimento que buscais, do exterior. um processo contnuo de aquisio... Nenhum ser divino planta dentro de vs o entendimento. Nenhuma soma de culto, nenhuma poro de f, de esperana, ou o quer

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www.lojajinarajadasa.com que vos apraza chamar, despertar essa flor em vs. Ela vem pelo vosso contnuo desdobramento, pela luta, pela angstia, pelo regozijo, pelo entendimento..."

At onde levar a ausncia de desejos sem estupidificar a ambio e por esse modo deter o progresso humano? Foi esta uma pergunta que confundiu certa pessoa. "Por favor, no impeais o desejo", foi a resposta. "No podeis deter o desejo; isto , se tentardes nulificar o desejo, estareis mortos, porm, se quiserdes que os vossos desejos sejam magnficos, livres, ento vossa percepo da vida ser magnfica..."

O assunto das instituies tornou-se muito popular. Disse um orador: "Em nossa infncia tivemos jogos adequados ao gozo dela. Porque no poderemos, agora, como adultos, fazer coisas na obra de nossas instituies para alegria deles, como se estivesses brincando com seres humanos?" Krishnaji respondeu: "A partir do momento em que organizardes o pensamento, ele torna-se uma religio e est morto. Se, porm, usardes de uma instituio para levar esse pensamento ao exterior, coisa que muito difcil de fazer, ento estareis perfeitamente justificados no utiliz-la..." Sr., porque que buscais o contado com os vossos semelhantes? Para os ajudar, no assim? Por isso que essas instituies existem. Esta a idia primordial que est por detrs da maioria das instituies: auxiliar. Eu quero porm, que vs prprios verifiqueis se verdadeiramente estais auxiliando. Eu no vos estou pedindo que abandoneis instituio alguma. No me interesso por isso... "

Uma observao sua, a respeito da unicidade individual, foi muito grfica: "Tendes um mosaico feito de pequenas pedras de cores inumerveis. Suas dimenses precisam de ser perfeitas, suas cores tambm; cada pequena pedra necessita ser acabada, ntegra, e o conjunto precisa ser perfeito. Assim, cada pedra... necessita ser produzida em seu prprio eu, to perfeitamente quanto possvel; ento ela se adaptar ao todo. Porm, primeiro tendes que possuir uma viso do todo e ento a modalidade de vosso desenvolvimento ser nica."

Pela tarde, as crianas da Escola do Valle de Ojai e da Escola Mdia divertiram o Acampamento com danas e cantos. Em seguida Krishnaji agradeceu-lhes em nome do Acampamento e convidou-as a voltarem no ano prximo. Uma passagem da palestra do Camp-Fire: "...De corruptibilidade em corruptibilidade, por meio da corrupo, tendes que crescer para a perfeio: tendo, porm, estabelecido isso, que o padro - no do mundo, mas para o mundo - tendo este padro como vosso guia, ento vos tornareis, por vs mesmos, o guia verdadeiro, ento vos tornareis o verdadeiro mestre de vossas aes; ento estareis em posio de julgar, por vs mesmos, da qualidade de vossa incorrupo."

quinta-feira, 30 de Maio:

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www.lojajinarajadasa.com A nova forma - ou falta de forma - de meditao que est sendo experimentada neste Acampamento, parece ter obtido um grande xito. Ningum l, ningum canta, ningum dirige, nenhum assunto dado. As pessoas renem-se hora designada, vibra-se um gongo, e cada pessoa, por si mesma, medita sobre qualquer ideal ou pensamento que deseje. No fim de cinco minutos o gongo soa novamente e a meditao est terminada.

Krishnaji na reunio da manh fez referncia ao propsito de lhe fazerem perguntas, e depois respondeu a algumas delas, do seu ponto de vista. As notas seguintes, tomadas por alto, daro uma idia do fio das respostas: "Estas perguntas vo agora ser respondidas - no para resolver vossos problemas - mas, antes, para despertar maior interesse, ulterior entendimento em virtude das minhas respostas. Assim por favor, no penseis que pelo fato de eu as responder, as haveis solucionado. Ao contrrio, estas questes j esto resolvidas por mim. Estas so as perguntas que gentilmente me haveis formulado e eu as responderei somente at ao ponto em que elas se me apresentem; e, se as aceitardes como autoridade final temo que chegueis a verificar que elas no resolvem vossos problemas.

PERGUNTA: Podereis descrever-nos, por favor, os sentimentos ou a reao, isto , o estado de conscincia experimentado no corpo fsico por algum que houvesse atingido a Libertao? KRISHNAJI: Srs., eu vos posso descrever um sentimento que muito poucos, provavelmente ho experimentado, porm de que vale isso? Eu vo-lo explicarei, at onde tal me for possvel, por meio de palavras, porm muito frustrante a tentativa de pr algo em palavras! Quando atingis a Libertao, essa perfeio, vs sois todas as coisas, em vs todas as coisas cessam e tm o seu ser... No nada de sentimental nem intelectual, nem coisa emocional, porm como o vento, rpida como as guas violentas ela tudo. Em vs existe o processo integral desde o prprio comeo at o fim - vos sois, ah, sois realmente, o criador, pois que a encontrais absoluto equilbrio... ... A Verdade no relativa, absoluta; e, para a pessoa que apanhada pelo relativo, o absoluto escapa sempre, e assim muito difcil compreender, a no ser que vos prprios vos tenhais tornado incorruptveis; e eu estou interessado nisto e no em descrever-vos o que e ao que se assemelha como sentimento. Isto sabereis quando houverdes atingido... ... A raiz da imortalidade entendimento e o verdadeiro comeo do entendimento a verdadeira disciplina colhida do final preenchimento de toda a vida...

PERGUNTA: Em relao queles que no compreendem plenamente a vossa misso ou ensinamentos e mesmo que jamais possam plenamente vir a entend-los mediante apresentao, pode algum mal resultar do esforo para compreender? KRISHNAJI: Sr., porque tornais isto a minha misso e ensinamento? No isto o que vs pessoalmente desejais? No quereis ser livres e felizes? No , pois, minha misso. misso vossa. o que vs estais buscando e no o que eu estou buscando. Pelo fato de a tornardes minha que no compreendeis. Porque vos no apercebeis de vosso sofrimento, de vossa estreiteza, de vossas limitaes, de vossa corrupo da vida, dais a outrem a autoridade de vos conduzir. E como eu no aceito essa autoridade, intil dizer que meu ensinamento ou minha mensagem. a mensagem e o ensinamento da vida, que est em todas as coisas e em todos; e a partir do momento que entendais isto, ela ser vossa e no minha. Assim, pelo fato de ser vossa, meu propsito somente despertar esse conhecimento, esse desejo, de por vs prprios descobrirdes. E, pelo fato de ser vossa, tendes que lutar e compreender...

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PERGUNTA: Como se pode estimular o desejo da liberdade? KRISHNAJI: Como pode o homem que se acha em uma priso, estimular o desejo de liberdade? Que pergunta! Srs., no o sofrimento de outrem, no so as lgrimas de outrem, o riso, o regozijo, a corrupo, suficientes para dar-vos esse desejo ardente de libertar aos outros e a vs prprios? Vs, porm, quereis estmulo artificial, uma droga, um incentivo, uma recompensa pelas vossas boas aes e quereis que eu vos fale de um novo Deus, ao qual possais fazer oferendas, para vosso estmulo, para construirdes um novo altar. Espero que estejais pensando nisto; no aceitando o que vos digo, nem rejeitando-o. As sombras que danam, a luz clara do sol, o pssaro que voa, a luz sobre as guas, o sofrimento de homem ou da mulher, o deleite, o regozijo de vosso prximo - se isto vos no proporciona suficiente desejo, ai de vs! ... Assim como a vida uma, as formas dessa vida so mltiplas. A partir do momento que compreendais que as formas tm pequeno valor, ento elas tero seu lugar. Para, porm, chegar a essa vida perfeita, tendes que tornar vossa prpria forma to perfeita quanto possvel.

PERGUNTA: At que ponto existe liberdade de ao? KRISHNAJI: Ela absoluta. O homem livre de fazer exatamente o que deseja, e o faz agora, de um modo ou de outro. Pelo fato de ser livre, quer encontrar desculpas para sua corrupo. Pelo fato de ser livre, teme andar errado e inventa teorias, credos, igrejas, templos... O homem, sendo livre, absoluta e incondicionalmente, sendo seu prprio senhor... est limitado, e atravs dessa limitao tem que lutar pela liberdade e este o processo da vida...

PERGUNTA: O trabalho por uma sociedade tender unicamente a estreitar a nossa viso e eficincia? KRISHNAJI: Uma vez mais, isto depende de vs, pois se vossa mente for estreita, tudo que fizerdes ser estreito.

PERGUNTA: Que que em nossa natureza nos faz executar coisas contrrias ao nosso melhor julgamento, e como vencer esta dificuldade? KRISHNAJI: No fazendo mal. Lutando. Mais uma vez, Sr., a idia de vencer algo - no se trata de vencer. No existe coisa que se parea com falncia. Se eu no tiver fora para subir ao topo da montanha, fao o esforo, caio, e torno a fazer outro. Isto no significa que eu esteja falhando. ... Estragareis tudo se baseardes vosso entendimento nos indivduos, mesmo que seja em Krishnamurti. Existe coisa muito maior do que esta forma a que chamais Krishnamurti, que a Vida; e dessa Vida que eu falo e dessa Vida eu vos compeliria a vos tornardes discpulos, dessa vida eu vos convidaria a vos enamorardes..." ___ Pela tarde teve lugar uma reunio administrativa, durante a qual novos e importantes anncios foram feitos. Em relao ao Acampamento da Estrela de Ojai, os planos para 1930 foram anunciados pelo Sr. Luis Zalk; e depois o Sr. Rajagopal falou acerca de propostas de modificaes na Ordem da Estrela.

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www.lojajinarajadasa.com "Beleza" foi a nota fundamental do Camp-Fire, tarde. Primeiro Krishnaji acendeu o fogo e cantou dois hinos Snscritos, um Luz, outro Beleza; depois um trio oculto, de msicos, tocou. Krishnaji falou ligeiramente sobre a Beleza lendo em seguida trs de seus poemas. "Beleza esse amor que incapaz de perverso. Com este deve o homem preocupar-se antes de poder criar..."

sexta-feira, 31 de Maio. ... "Um nico ato de entendimento colocar o homem em um pinculo de grande viso... De nada serve o meramente vos congregardes em um coro de concrdia. Se, porm, um de vs realmente viver um ato, um pensamento, que tenha seu alicerce na raiz da imortalidade - que a prpria vida - ou tenha um sentimento que radique no alicerce do eterno, ento isto vos colocar em uma condio que vos proporcionar um entendimento maior, um maior regozijo, um maior desdobramento daquilo que eterno... Ignorncia aquilo que criado pelo indivduo, dentro de si mesmo, pela inter-mistura, e combinao do que passageiro e do que perdurvel. Portanto a ignorncia no tem comeo, mas tem um fim... Aquilo que real, no prende. Aquilo que passageiro prende, corrompe, e estabelece limitao. Assim, o sbio, tendo isto como medida para si mesmo, pela qual julga suas aes, seus pensamentos, suas emoes, sua vida inteira, como um todo, comear a desembaraarse da ignorncia que a inter-mistura do real e do irreal, da vida e da morte... ... Portanto, no podereis matar o eu, porm podeis faz-lo crescer e tornar-se to grande, to vasto, que inclua toda a vida..."

Krishnaji, tarde, sentou-se sem formalidades entre ns, no Camp-Fire, em vez de o fazer a certa distncia das pessoas, como de costume. Ele e outros fizeram narrativa de varias lendas de diferentes pases, que foram muito apreciadas pela assistncia. No houve palestra.

Sbado, 1. de Junho. Muitas perguntas foram feitas na reunio da manh. Os pontos principais das respostas acham-se aqui resumidos: "... No fim de tudo, se seguirdes a um indivduo, criareis por meio desse indivduo, um altar, e da, pela limitao de vossos desejos, limitais aquilo que estais buscando... No vedes que isto que vos tenho estado dizendo por estes ltimos dias; que a partir do momento que por vs prprios percebais a meta, o objetivo, o preenchimento de toda a vida, ento no mais querereis seguir a ningum, exceto Verdade; ento no confiareis em ningum mais, exceto na Verdade; ento, no querereis o conforto de coisa alguma e de ningum. Porm, do entendimento da Verdade, ter nascido a fora em vs prprios. ... Se no disssseis, como o fazeis, que Krishnamurti disse isto e aquilo, porm se verificsseis que o que eu havia dito era a verdade, pelo seu valor intrnseco, ela seria vossa e podereis repet-la com segurana - com essa certeza que no pode ser abalada por nenhuma dvida nem por pessoa alguma. Isto o que eu quero criar em vossas mentes e em vossos coraes; no o desejo de seguir a Krishnamurti, porque Krishnamurti morrer... Todas as formas so coisas transitrias; elas guardam em si mesmas sua decadncia ltima e aquilo de que vos estou falando no conhece decadncia. A partir do momento que aderires quilo que

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www.lojajinarajadasa.com no morre, ento vossa integridade, vosso propsito, vosso xtase ser durvel, fundamental, ter seu alicerce naquilo que eterno." ___ "Srs., h revolta no mundo contra a ordem estabelecida, a tradio, etc., porm esta revolta no inteligente, do meu ponto de vista. Esta revolta semelhante a uma corrente que inunda suas margens; porm a revolta inteligente escolhe o que essencial, selecionando essa coisa essencial na luz dessa liberdade, dessa perfeio que eu descrevi..."

PERGUNTA: "Qual, pois, a verdadeira ou positiva funo da mente? KRISHNAJI: Julgamento so e equilibrado, a funo da mente, porm para chegar a esse julgamento, a mente necessita ter sua contraparte igualmente equilibrada e esta o afeto. Este o perigo da diviso do corao e da mente. Como disse ontem, no podeis dividir a mente e o corao, so a mesma substncia... ___ ...Por favor, apercebei-vos de que tendes que atingir este oceano, este mar da vida, sem limitao, sem corrupo, que livre e eternamente ativo. E dever-vos-eis regozijar com algum que o haja atingido e encontrado, tirando de si mesmo, boas novas para vos dar; e pela descoberta e pelo entendimento, alterar at as condies de vossos pensamentos, o estado de vossos coraes, para que vs prprios venhais acolher-vos a esta sombra de perfeio... ... No se trata de se necessitais ou no disso. questo de se o quereis, se quereis ser felizes, se quereis ser livres, e estabelecer-vos, a vs prprios, na perfeio. E a maioria dentre vs no o quer e da todas estas perguntas inumerveis e vs. No quereis isto como um homem faminto deseja alimento. No o quereis como um sedento deseja a gua. No o quereis como um homem que se afoga quer ar, como um homem que se acha coberto de feridas deseja um blsamo curador. Um ungento que cura toda a tristeza, todas as feridas, todo o sofrimento, encontra-se naquilo que durvel e naquilo que vida, e disso que eu falo. ___ ... Vs matais o futuro por meio do passado: estais mais interessados pelo morto de ontem do que pelo vivo de hoje e do futuro, a flor da vida de amanh. ___ PERGUNTA: No a teoria da liberdade individual realmente anrquica e uma perigosa ameaa vida social, pois que todas as comunidades contm indivduos que so falhos em sua concepo quanto aos seus deveres para com outrem? KRISHNAJI: Sr., porque vos preocupais acerca dos outros? Porque no viveis vs prprios? Sempre vos preocupais com o vosso prximo, com a sua fraqueza, suas murmuraes, sua corruptibilidade - Preocupai-vos com o criminoso e a sociedade, enquanto que em vosso prprio corao que est o criminoso. Chamais anarquia liberdade individual. Se o indivduo no feliz, como no o na poca presente, ele cria o caos e a anarquia em redor de si, pelo seu egosmo, pela sua crueldade... ... Todos vs estais to preocupados em auxiliar a outrem. uma coisa muito bonita o ajudar a outrem; porm que auxilio o vosso? Lev-lo para uma outra gaiola, para outro caos, para outra sombra? Ou quereis torn-lo livre? Quereis por acaso que ele evolua em sua prpria formosura? H duas espcies de influncias - uma tirnica, e a outra que proporciona animao, que proporciona entendimento, que d simplicidade e afeto. Vossa influncia tirnica. Quereis que todos sejam de uma espcie particular e para isto que tendes todas essas religies, esses atos de moral.

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www.lojajinarajadasa.com Porm, existe uma outra influencia que, quando verdadeiramente compreendida, proporciona nutrio, encorajamento, pois que cada indivduo precisa encontrar por si mesmo e atravs de si mesmo aquilo que perdurvel". Um trio de peas em um ato para as quais o pblico fora convidado, foi representado a tarde: a adaptao de Michael de Tolstoi feita por Miles Malleson, Dark Lady of the Sonnets (A Dama Sombria de Sonnets) de George Bernard Shaw e Rosalinda de James Barrie. Os desempenhos foram dirigidos por Beatrice Wood e foram muito apreciados pelo auditrio.

Fragmento da palestra do Camp-Fire: "Que pois que vs quereis na vida - amor, posses, ou esse sentimento de conforto que os homens chamam felicidade? Se esta a jia oculta no secreto santurio de vosso corao, ento ide em busca dela e adquiri aquilo que desejais; se, porm, por outro lado, desejais a felicidade que eterna, essa vida que absoluta, incondicionada - se este o vosso desejo, se isto que est oculto no santurio de vosso corao, ento procurai-o. Assim como o ltus utiliza a lama para produzir seus lindos botes, assim utilizareis a vida transitria para produzir a perfeita flor de vosso entendimento...

domingo, 2 de Junho. Em vista do interesse que a discusso livre de quarta-feira despertou, uma outra reunio semelhante foi combinada para esta manh. Um certo numero de pessoas fez perguntas a Krishnaji e externou tambm suas idias acerca dele e de seu trabalho. Como o pblico havia sido convidado, mais de um milhar de pessoas estiveram presentes. Entre as observaes feitas, houve estas: "Sinto," disse um orador, "que medida que passa o tempo, a mensagem central de Krishnaji vai produzir mudanas absolutamente revolucionrias nos valores que so dados s artes... Presentemente elas so olhadas como luxo. As artes se tornaro to essenciais na vida do estudante do futuro, como o alimento e a bebida". A idia de Krishnaji acerca de arte foi essencialmente a seguinte: "No fim de tudo, pintar quadros, escrever poesias, so somente expresses do que se sente interiormente. Se sentirdes resumida, mesquinhamente, vossos escritos, vossas pinturas, vossa inteira expresso ser mesquinha; se, porm, souberdes como viver, ento vossa arte, seja ela qual for, ter a marca do eterno...

Expressou-se enfaticamente assim, sobre a inutilidade do medo: "Sustento que nenhum propsito til pode provir do medo. No tem importncia se se tem em vista obter comportamento reto, reta conduta ou paz. Se pelo medo fizerdes uma pessoa agir retamente, isso no ser ao reta. Srs., no podereis produzir a formosura por meio do medo, a beleza pelo temor e por isso que tendes tantas catstrofes, guerras, tanto egosmo, competio velhaca e corrupo tudo isto provm do medo ou, da falta de verdadeiro entendimento".

Os cantores de Bach executaram vrios trechos escolhidos na reunio da tarde, estes trechos foram seguidos da conferncia pblica de Krishnaji. ...O homem autoridade absoluta para si mesmo, o homem seu prprio senhor, no tributrio das circunstncias exteriores; ele, por suas prprias tristezas, pelas suas 198

www.lojajinarajadasa.com complicaes, pelos seus desentendimentos, faz parte do mundo e o mundo que o rodeia sua expresso... ... A vida no tem processo tcnico de preenchimento; a vida no tem um rumo especial que deva ser trilhado para atingir sua glria; a vida no possui meditao ou Yoga especial. pela assimilao constante e pela rejeio, pelo exame, pela anlise, pela cuidadosa considerao sobre cada pequeno acontecimento do dia, que se cresce para a perfeio... ... Nada podeis atingir pelo medo, seja em que tempo for, porque, a partir do momento que tenhais medo em vosso corao e em vossa mente, estais antepondo uma limitao a esse desejo que busca a liberdade... ... Desejo ser, e a purificao desse desejo o preenchimento da vida. Digo uma vez mais, para a verdadeira afeio o padro reto o amor que desapegado pelo fato de ter apego todas as coisas. semelhante flor que d perfume a todo transeunte e no cuida de quem recebe a sua deliciosa fragrncia; assim deve ser o verdadeiro amor. E na direo disto, todo o afeto deve lutar, deve evolver, deve progredir - na direo desse perfeito amor. Perguntar-me-eis agora: "Como havemos de fazer isto? Como chegaremos a esse perfeito amor?" Unindo-se a algum, ainda que de maneira dbil, de corruptibilidade em corruptibilidade, at que chegueis a essa incorruptibilidade do amor, que requerida. No existe outra maneira seno por meio da luta constante, do esforo, da colheita de grandes tempestades de amor e de sua rejeio...

Em concluso do programa pblico, Ruth St. Denis, a famosa danarina, deu uma interpretao original de alguns dos poemas de Krishnaji. "No realizar a grande Verdade, melhor fora que casseis de uma grande altura do que da calada. A mediocridade da vida, a pequenez da vida, consiste, no em cair, porm em cair de um lugar pouco elevado. Se casseis de grande altura, do telhado das casas, das grandes montanhas, ento o mundo se regozijaria e saberia que havia um grande homem, pois que sua queda fora grande. Pois a mediocridade, a pequenez da mente e a pequenez da emoo, sufoca a Verdade e ela no se pode coadunar com aqueles que se acham temerosos de sua queda... Pois, possuindo pleno entendimento dessa eterna Verdade, ou parcial que seja, vosso amor deveria de hoje por diante, resistir vaga da corruptibilidade. Pois que, se dez pessoas houvesse, se houvesse uma realmente capaz de puro e desapegado afeto, desse que proporciona encorajamento, que se destaca sempre com clareza, no sentido da perfeio de todo o amor, ento esse indivduo nico, despertaria no corao de muitos, esse amor que no pode ser manchado pela corrupo... ...Passareis pelas pessoas e elas se maravilhariam e receberiam conforto da vossa existncia.

Deste modo terminou o acampamento de Ojai, de 1929. Boletim Internacional da Estrela Ano II No. 10

PALESTRAS DE KRISHNAMURTI

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www.lojajinarajadasa.com ANTES DO ACAMPAMENTO DA ESTRELA


Sbado, 20 de Abril, Krishnaji deu a sua primeira palestra de 1929 em Oak Grove, em Starland, Ojai, onde cerca de mil e duzentas pessoas, mais ou menos, estavam presentes para ouv-lo. Na maioria eram pessoas no membros da Ordem da Estrela, vindos de Los Angeles, Hollywood, Santa Brbara, Ventura; Santa Paula e outras cidades circunvizinhas em um raio de quinze a oitenta milhas de Ojai. Uma pessoa do auditrio, viera de automvel percorrendo duzentas milhas! Oak Grove, pode-se dizer, um dos mais belos recantos da vizinhana e o mais adequado a prover uma atmosfera em harmonia com os ensinos de Krishnaji. As folhas verdes novas, com o sol a brilhar atravs, o tapete de relva por debaixo, a sensao de paz, aumentada pela msica dos pssaros, forneciam um conjunto apropriado mensagem de Krishnaji, de liberdade e libertao. Eis aqui alguns trechos escolhidos de suas palestras, tiradas de apontamentos de meu livro de notas:

"Cultivai uma vida sria, no afetada - uma seriedade que seja lgica e crtica, porm, apesar disso, extremamente alegre... O pensamento criativo no nacional nem ligado de maneira alguma pelas divises artificiais que so obra do homem. Todas as pessoas tm os mesmos anseios e desejos, os mesmos pensamentos e emoes; o pensamento e a emoo so a essncia da Vida, e somente a Vida Verdade. Desde que a Vida no pode ser limitada nem separada por barreiras, o pensamento e a emoo do homem no podem ser repartidos. O preenchimento da vida o perfeito equilbrio do pensamento e da emoo. Se quiserdes encontrar a Verdade, no vos deveis deixar restringir por barreiras, deveis abandonar todas as seitas e mesmo as religies, deveis ser livres para encontrar a Verdade". "Tende que rejeitar tudo para tudo descobrir. Porm deveis rejeitar pela razo, no pela compulso ou pelo medo e ento o entendimento vir. Ponde de lado vossos preconceitos tirnicos, como vo-lo disse, e pensai livremente comigo, afim de poderdes caminhar comigo na integridade de vosso corao e no com o medo da perda de uma salvao futura... A coragem para lutar atravs da vida - livres e destemidos - somente pode vir com a segurana de propsito e com a viso ou percepo da Meta, e a certeza do propsito da vida, que no uma ddiva divina ou uma viso misteriosa. atingida pelo verdadeiro equilbrio do pensamento e sentimento e a busca de experincia com um fim. As pessoas lutam, mas buscam o abrigo do conforto, do qual se origina o medo. No vos abrigueis sombra de um deus rememorado. No permaneais contentes pelo que houverdes alcanado. A maioria dos homens lutam na pesquisa da verdade e essa luta termina quando eles se filiam a um movimento religioso. Somente a tristeza e a dor os arranca do conforto desse abrigo para uma luta ulterior e posterior pesquisa. Assim eu lutei e pesquisei e atingi, porm digo isto no para que me cultueis ou me utilizeis como uma autoridade ou muleta na vossa incerteza, porm para mostrar-vos que a perfeio no um capricho, ou um milagre e que pode ser atingida por todos por meio do esforo, por meio da luta e da incessante vigilncia". "Eu no vos quero ensinar a orar; no quero criar novas cerimnias em troca das velhas, pois que elas no tem utilidade real. No vos quero dar novas teorias em lugar das antigas, pois que a Vida no ser e no pode ser limitada por quaisquer teorias. No pode efetuar-se uma salvao miraculosa em virtude da tristeza de outrem. A humanidade e o indivduo, cada um pelos seus prprios esforos, tem de conquistar aquilo que eterno e por meio disso estabelecer a harmonia" . Em outra reunio o auditrio era ainda maior. Foi dedicada a perguntas e respostas, porm houve uma breve introduo, em palestra, na qual Krishnaji caracterizava os proslitos como folhas agitadas pelo vento. Quando o vento parava, as folhas detinham-se e permaneciam estacionrias. "O povo confia na interveno divina para sua salvao", disse ele, "porm o indivduo livre. Se a interveno divina fosse um fato, no haveria tanta tristeza e sofrimento no mundo, tanto desentendimento, do qual surgem as lgrimas da existncia. Buscai por vs mesmos e 200

www.lojajinarajadasa.com ento, o que buscardes, ser vosso para sempre. Um prisioneiro guardado na priso que no tem a formosura das sombras, que no possui as frescas brisas, que tem um horizonte limitado, cujo gozo est encerrado nas quatro paredes da priso, qual o seu desejo? Ser livre! Similarmente um homem que tenha sofrido grandemente, que esteja colhido numa rede de tristeza, que esteja solitrio, cuja tristeza se acumula como as nuvens acasteladas, qual ser o seu desejo? Ser livre. Porm, se no houverdes sofrido, se no fordes um prisioneiro, embora na posse de muitas coisas, se no houverdes sentido a frieza, a solido e o isolamento, se no houverdes lutado, se somente fordes um selvagem de calas, ento a liberdade no tem significado para vs. Para atingir, tendes que caminhar atravs do vale da misria, tendes que conhecer a tristeza ainda que no tenhais deleite no estar tristes. Na realidade no existe nem tristeza nem dor, pois somente no vale que existem a sombra e a luz; porm, quando atingirdes, j no existir tal coisa. No h vida nem morte. Assim, para poderdes atingir, tendes que ter experincia; ela, porm, deve ser realizada com propsito, pois de outra maneira meramente catica e no criativa. Se possuirdes este propsito da vida que liberdade, felicidade e verdade, ento toda a experincia deixar atrs de si um resduo no qual podeis basear-vos e construir vossa fora, vossa integridade e vossa grandeza; e ento vos tornareis um deus, pois o homem Deus e no existe outro Deus seno o homem tornado perfeito. Se buscardes, como auxlio, um deus externo, jamais o encontrareis. Podeis pensar que sim, porm ele no ser eterno, pois somente a Vida eterna e a Vida Deus. Quando libertardes esse Deus interno, atingireis". Fazendo uma analogia grfica da pesquisa do homem em prol da Verdade, Krishnaji fez referncia estria de um grupo de borboletas que se haviam reunido fresca sombra das folhas verdes na primavera, e estavam discutindo sobre a natureza do sol. Uma velha borboleta avanou e disse: "Eu vou sair para descobrir a verdade acerca do sol". Todas esperaram e quando ela voltou, disse: "O Sol luz e a luz muito poderosa, muito forte para que dela nos aproximemos". Outra borboleta replicou: "Isto no bastante, queremos conhecer a verdade". Uma outra saiu aventura e ao voltar disse: "O sol quente e o calor to grande, to poderoso, que nos no podemos nos aproximar muito. Chamusquei minhas asas". Mais uma vez as borboletas no se satisfizeram e uma terceira arriscou-se, voou em linha reta para o sol e destruiu-se na busca da verdade. Essa unificou-se com a verdade e no mais voltou. Krishnaji, em seguida passou a responder a perguntas que lhe haviam sido feitas. A primeira surgiu das observaes da tarde precedente e versava sobre se era preciso filiar-se a uma sociedade para a consecuo. Krishnaji em resposta disse que no necessrio pertencer a uma igreja, o essencial o entendimento da vida e isto no se alcana necessariamente pelo fato de a pessoa filiar-se a uma sociedade. A maioria das pessoas buscam conforto em uma instituio ou igreja, e da seu esforo para entender a vida detm-se quando se filiam a tal sociedade. Uma outra pergunta inquiria se era possvel a todos alcanarem a libertao nesta vida, ou se era apenas o comeo de um esforo que por ltimo conduziria liberdade. Em resposta ele disse: "se o desejo em um homem for forte, cheio de propsito, constante, ele alcanar. Liberdade perfeio e a perfeio no um exotismo na natureza. a resultante natural do crescimento, como o de uma flor perfeita". A outra pergunta pedia provas da reencarnao. A resposta foi: "No existe prova. A reencarnao desnecessria vida ou ao crescimento, porm eu v-la explicarei rapidamente como idia. Existe um abismo entre o homem e o seu propsito, ao qual damos o nome de tempo; e este tempo acha-se dividido por muitas vidas. O que importante saber, no se h muitas vidas nesse abismo e quantas, porm sim trazer a meta at ns, objetivando-a, tornadoa uma realidade atual, afim de evitar o abismo. Porm para isto conseguirdes, deveis estar constante e agudamente focalizados em vossa meta, em cada ao. Isto mais importante do que uma prova da existncia do abismo a que chamamos reencarnao. Isto simplicidade e do carter do gnio o ser simples; porm, simplicidade no crueza, o mais completo refinamento". A ltima pergunta foi se a Verdade era puramente intelectual ou assunto de convico interior. Krishnaji respondeu rapidamente dizendo que no era uma coisa nem outra. A vida era o equilbrio de ambas.

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www.lojajinarajadasa.com Ao encerrar desta reunio, declarou ele que no queria que as reunies se tornassem congregaes convencionais ou ajuntamentos formalsticos, porm, tomassem o aspecto de um esforo para buscar a Verdade, para raciocinar juntos, e criar entendimento juntos. Uma vez, a despeito de ser uma tarde nevoenta e fria, cerca de seiscentas pessoas vieram para escutar a Krishnaji em sua palestra de fim de semana. Houve uma rpida introduo s perguntas e respostas: "Para entender as respostas, no deveis julgar de imediato. Tudo que posso fazer levar-vos a pensar e em vosso prprio considerar, a resposta vem. Para serdes um grande criador, tendes, que ser um grande destruidor. Deveis ter a coragem de derrubar e o gnio para construir. Isto vem somente em virtude de colocar de lado, pelo momento, o presente, o imediato, e pela luta com o pensamento." "Se quiserdes criar beleza no mundo, se quiserdes criar uma ordem diferente no mundo, no deveis pensar tendo em vista o imediato, porm, apagando o presente, olhar o preenchimento da vida".

Uma pergunta que lhe fizeram, foi "Qual a compulso interna que nos propele na evoluo?" Ao que ele respondeu: "Vs prprios, vossos desejos. A vida semelhante a corrente de gua duma montanha que cai desde o cimo, e ela, como um rio, busca libertar-se no oceano aberto. Conhecer os prprios desejos, e v-los em operao na vida diria, control-los e domin-los, - esta a nica coisa essencial- Um homem sbio, por meio do entendimento e do domnio dos seus desejos, modela a sua vida para a verdadeira liberdade". Um outro inquiridor pediu-lhe a elucidao de seu enunciado sobre "a no existncia do bem e do mal, sendo tudo matria de experincia". Krishnaji explicou: No existe mal nem bem, do ponto de vista do eterno, porm existe o bem e o mal para o homem que vive na sombra do presente que continuamente est mudando; e por isto que ele se atemoriza tanto. Para atingir essa libertao, essa liberdade, deve ele haver ultrapassado o bem e o mal, o que significa estar para alm de todo o medo - medo do presente, medo do passado e medo do futuro. ___ Em uma outra reunio de mil e duzentas pessoas, Krishnaji, disse: "A vida e deve ser simples, direta, e sempre orientada na persecuo dessa verdade que liberdade". A vida em cada um deveria ser to direta que chocasse a todos, to simples que fosse a absoluta cultura, to genuna que nascesse da liberdade. Se quiserdes encontrar essa fonte de vida que se acha estabelecida dentro de cada um, posto que coberta por uma multido de desejos, ambies, - para descobrirdes essa fonte da vida no deveis adorar em um altar qualquer que seja, nem emaranhar-vos no elaborado dos credos, das tradies e das complexidades das religies". "Deveis duvidar de todas as tradies, hbitos, costumes estabelecidos, e ento somente, encontrareis aquilo que durvel." "Quando digo que precisais voltar simplicidade da natureza, no quero dizer que vos deveis tornar condicionados como a natureza o , limitados como a natureza, inconscientes como a natureza. A natureza segue um padro. O homem no pode seguir um molde. livre. "A vida no conforto; a vida um processo de luta contnua na direo da evoluo, na direo da perfeio.

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www.lojajinarajadasa.com "Precisais ter, no somente a mentalidade que especula, porm a mentalidade que se deleita nas sombras". ___ Algumas notas ulteriores sobre pontos elevados de seu discurso, foram: "Orais, adorais, executais ritos e cerimnias, buscais auxlio externo para vossa integridade, para vosso propsito na vida. Jamais o encontrareis assim. Se deixsseis de adorar, de orar, de executar ritos e olhsseis para dentro de vs mesmos e por esse modo estabelecsseis um equilbrio de entendimento na mente e no corao, encontrareis o que desejais". "O homem Deus; e a partir do momento em que percebais que nesta vida que limitao existe tristeza, ento, nesse momento exato, comeais a atingir". "Primeiro tendes que verificar onde a Vida se consuma e qual o propsito da Vida, e ento todos os vossos problemas de sexo e uma centena de coisas outras encontraro soluo. A experincia, com propsito, divina, criativa; a experincia sem propsito catica, destrutiva". "Tenho dito uma vez e outra que desnecessrio possuir um instrutor, que desnecessrio um mediador. perfeitamente verdade que eu prprio j me sentei e adorei; porm voltei sempre sobre mim mesmo. Apenas a que tive de libertar-me a mim prprio e no no santurio de outrem ou por meio de um deus qualquer. Desde que assim encontrei a mim mesmo, o mesmo vos diria a vs que fizsseis. No vos senteis em um templo, qualquer que seja ou aos ps de um instrutor qualquer. No sigais a ningum, no cultueis a ningum, porm libertai essa vida que se acha na escravido da tristeza. Ento sereis capazes de dar liberdade s multides. "A vida no somente desejo, pensamento, emoo ou outras coisas mais, porm algo que somente pode ser atingido pelo equilbrio, pela harmonia de todas essas coisas; isto o que eu entendo pela compreenso da vida; no nada de misterioso que somente possa ser alcanado por meio da meditao profunda, intuitivamente, porm que pode ser adquirido por meio da luta constante, pondo de lado as coisas no essenciais." "Que se entende por um homem inteligente? Um homem inteligente um indivduo que escolhe o perdurvel entre o passageiro, que escolhe o essencial no no essencial, que diferencia entre o amargo e o doce e conhece a Verdade no verdadeiro, que distingue o falso na falsidade; um homem inteligente, um homem perfeito um homem tal".

___ A vida um rio que constantemente muda seu curso e o meio do entendimento o seguir deste rio - no ao leito seco e deserto. Boletim Internacional da Estrela Ano II No 10

QUE O ENTENDIMENTO SEJA A LEI J. Krishnamurti 203

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Na Stima Concentrao Internacional realizada em Erde, Ommen, Holanda, Agosto de 1928, foram feitas ao Sr. Krishnamurti muitas perguntas concernentes as questes que perturbam, na atualidade, a mente de numerosas pessoas. As respostas a essas perguntas foram de natureza to fundamental e de to vasto alcance, que julgamos imperioso public-las. Haver muitas pessoas que encontraro nas suas respostas uma soluo para as prprias dificuldades.

Krishnamurti: Responderei a todas estas perguntas, segundo o meu ponto de vista, sem basear as minhas respostas em qualquer autoridade que seja. Sei que todos vs desejareis que se fundassem as minhas respostas na autoridade, mas sinto dizer-vos que ficareis desapontados a esse respeito. No vou instar-vos a aceitar aquilo que tenho como a Verdade absoluta; deixo-o ao vosso critrio, pois somente este valioso, somente este duradouro, e somente ele vos deve guiar, sustentar e proteger. Prosseguiremos, pois, tendo isso em mente, e peo-vos pacincia e ateno, pois bem sei que no prximo ano se no compreenderdes inteligentemente, fareis as mesmas perguntas. Pergunta: Certos conceitos que tem sido emitidos a respeito de vs e de vossa obra parecem diferir to fundamentalmente de vossa doutrina e da Verdade que expondes, que gratos vos seramos se nos pudsseis expressar uma opinio, a esse respeito. Em 1925 elegestes sete Apstolos, sendo que cinco restantes no haviam ainda alcanado o necessrio grau de Arhat. Dizeis agora que no tendes discpulos. Krishnamurti: Repito que no tenho discpulos. Cada um de vs discpulo da verdade, desde que compreenda a Verdade e no se ponha a seguir outros indivduos. No tenho seguidores. Espero que no considereis a vs mesmos como meus seguidores, porque, se o fizerdes, estareis pervertendo e traindo a Verdade que eu defendo. No tenho discpulos; no tenho seguidores; mas, se compreenderdes a Verdade que vos ofereo, em toda a sua simplicidade e grandeza, e amardes essa verdade pela sua prpria beleza, tornar-vos-eis ento discpulos dessa Verdade. No tenhais cuidados sobre quem discpulo e quem no o . Que empenho o vosso de julgar os outros! Aspirais qualidade de discpulo com o fito de serdes persuadidos ou dissuadidos, com o fito de vos arrimardes em algum, de serdes protegidos por algum; mas, meu amigo, quando dependeis de outra pessoa, ai de vossa vida! Espero, pois que esteja agora perfeitamente claro que no necessito de discpulos nem de seguidores; porque eu sustento que ser discpulo de um indivduo qualquer trair a Verdade. A nica maneira de alcanar a Verdade ser discpulo da prpria Verdade, sem necessitar de intermedirio. No vos choqueis, no vos sintais desapontados a Verdade nem sempre aprazvel. A Verdade rude para aqueles que no compreendem, mas a Verdade amvel, delicada, generosa e encantadora para aqueles que compreendem. Nessas condies, amigo no existe a categoria de discpulo, a no ser para aqueles que compreendem que ser discpulos no seguir indivduos, porm s a Verdade em seu sentido absoluto, a Verdade infinita. E vs que tanto vos deleitais como vosso culto das personalidades, que tanto vos deleitas com vossos intermedirios, achareis difcil aceitar a Verdade, mas no estou aqui para vos agradar. No vos torneis seguidores nem discpulos de indivduos, mas tornai-vos o tabernculo da Verdade sem princpio nem fim, e ento as questes concernentes a quem apstolo, quem discpulo, quem Arhat, se dissiparo, porque nenhum valor tem. Quando galgais uma encosta elevada e encontrais pelo caminho indicadores da direo, vs vos detendes para adorar esses indicadores, ou prosseguis a marcha, deixando-os para trs? Ponderai com toda a seriedade sobre este assunto; deliberai, criteriosamente, com vosso corao, e por esse meio alcanareis o entendimento. No h compreenso no culto das personalidades. Os rtulos que adorais carecem de significao. Bem sei que terei dvidas sobre o que estou dizendo, e que minhas afirmativas suscitaro em vs um sentimento de incerteza, mas, meu amigo, eu vos digo que a verdade nada tem que ver com as personalidades mesquinhas e tirnicas que adorais, sejam elas quais forem. A Verdade transcende todas as graduaes, porquanto essas graduaes s existem por causa das limitaes humanas. Pergunta: A Igreja Catlica Liberal e Ordem Co-Manica foram apontadas como duas organizaes especialmente escolhidas pelo Senhor Maitreya para levar avante a vossa obra. Mas vs dizeis que todos os rituais e cerimnias so desnecessrios e reduzem a Verdade.

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Krishnamurti: Continuo a sustentar que todas as cerimnias so desnecessrias evoluo espiritual. Quanto vos agradaria se eu dissesse, pela maneira mais autoritria, que elas so necessrias, ou que no o so! Quanto vos deleitaria se eu dissesse: A Vontade, senhores, continuais a celebrar as vossas cerimnias! ou No, senhores, deixai de celebrar cerimnias porque vos sentireis ento em vosso elemento. PERGUNTA: A Igreja Catlica Liberal e Ordem Co-Manica foram apontadas como as duas organizaes especialmente escolhidas pelo "Senhor" Maitreya para levar avante a vossa obra. Mas vs dizeis que todos os rituais e cerimnias so desnecessrios, e reduzem a Verdade. KRISHNAMURTI: Continuo a sustentar que todas as cerimnias so desnecessrias evoluo espiritual. Quanto vos agradaria se eu dissesse, pela maneira mais autoritria, que elas so necessrias, ou que no o so! Quanto vos deleitaria se eu dissesse: " vontade, senhores, continuai a celebrar as vossas cerimnias!" ou "No, senhores, deixai de celebrar cerimnias" porque vos sentireis ento em vosso elemento. Mas, porque eu no digo tal coisa, porque no baseio o que expresso em autoridade alguma, ficais intrigados, e na vossa ansiedade d-se uma confuso de propsitos, acentuando-se o que no essencial e perdendo-se de vista o que essencial. Eu digo que todas as cerimnias no so essenciais para o preenchimento da vida. Mas, replicareis: "Que direis das cerimnias da Igreja Catlica Liberal e da Co-Maonaria?. Amigo, vs deveis formar vossa opinio a esse respeito. No a mim que cabe form-la. Como vos agradaria, se eu formulasse uma opinio para vs! Sois todos como crianas incapazes de se susterem nas pernas e caminhar desamparadas. H dezessete anos que vos preparais e estais presos na vossa prpria criao. No vos sirvais de mim como de uma autoridade, no digais que Krishnamurti desaprova as cerimnias. Eu no aprovo, nem reprovo. Se desejais celebrar cerimnias, vs as celebrareis, e essa uma razo suficiente em si mesma; se no desejais celebr-las, no as celebrareis, e tambm essa uma razo suficiente em si mesma. Tais dificuldades s se manifestam quando o indivduo est empenhado em obedecer, quando est atemorizado - atemorizado pela idia de perder o man espiritual que julga existir na organizao de que faz parte. Nenhuma organizao, por mais amadurecida pela tradio, por mais firmemente estabelecida que seja, contm a verdade. Se desejais procurar a Verdade, deveis fazer-vos ao largo, distanciar-vos das limitaes da mente e do corao humanos, e descobri-la ento, - e essa Verdade est dentro de vs mesmos. No muito mais simples fazer da prpria Vida o alvo, da prpria Vida o guia, o Mestre e o Deus, do que ter intermedirios, gurus, que inevitavelmente reduziro a Verdade e, portanto, a trairo? PERGUNTA: Dizem que, com vossa vinda a evoluo foi acelerada em todos os seres e que o nmero de Iniciados, no mundo, crescer rapidamente. Mas vs dizeis que esses degraus, no Caminho, no so essenciais e que a libertao pode ser alcanada em qualquer fase da evoluo. KRISHNAMURTI: Digo que a libertao pode ser alcanada em qualquer degrau da evoluo, pelo homem que compreende, e que no essencial render culto a esses degraus, como vs o fazeis. Assim como tendes, na vida mundana, um sentimento de classe, que vos infunde reverncia pelos ttulos aristocrticos, assim tambm tendes um sentimento de classe de ordem espiritual; no h muita diferena entre estas duas coisas. Por essa razo, deveis desenvolver a compreenso e o desejo de alcanar vosso alvo, e esquecer todos esses graus e as pessoas neles situadas. Que valor tm eles para vs? Porque perdeis de vista alvo da vida, porque no desejais alcan-lo com todo o ardor, com todo o interesse e energia, esses graus, com os seus rtulos, vos prendem e escravizam. Seguramos um brinquedo frente de uma criana, fim de estimul-la a andar, e a criana que sensata no se pe a adorar esse brinquedo, porque o seu desejo andar. Vs no sois crianas. Entretanto, estais adorando um brinquedo. Eu vos digo que a Vida muito sria para brincar-se com ela, e, como j disse, chegado o tempo de decidirmos se vamos continuar, como crianas, a admirar brinquedos, ou se vamos ser homens e mulheres adultos, dispostos a rejeitar tudo quanto pueril, a fim de descobrir a Verdade. Encontrar e estabelecer a Verdade depende de vs mesmos e de ningum mais. Se eu destruisse todos os vossos arrimos atuais, logo inventareis outros, para satisfazer o vosso desejo de apoio, inventareis logo outras idias fantsticas. Direis que no creio em nada dessas coisas. No creio nem descreio. Para mim elas tm valor insignificante, em comparao com a jia mais preciosa deste mundo, que a Vida. 205

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Podereis alcanar a libertao em qualquer degrau da evoluo, se possuirdes um desejo ardente de alcan-la, se nutrirdes o anelo de rejeitar todas as coisas que no so essenciais de vos agarrardes, to fortemente como a morte, s coisas que so vitais, essenciais. E para determinardes o que essencial e vital, deveis observar, deveis estar atento para tudo quanto se passa em redor de vs. A vida uma tela tecida dos fatos comuns de cada dia e, se no utilizardes esses fatos, perdereis o significado das pequeninas coisas, com as quais as grandes coisas so construdas. PERGUNTA: Disseram-nos que a Me Universal ir manifestar-se a fim de completar a vossa obra e que o discpulo atravs do qual Ela atuar j foi eleito. Mas vs nos dizeis que, na Verdade, no existem estas distines de macho e fmea, porque a Vida uma s. KRISHNAMURTI: Digo que a Vida uma s, embora as expresses da Vida sejam mltiplas. Na Verdade, no existe nem macho nem fmea; como pode existir? Tendes um corpo diferente do meu; mas, no tendes a mesma tristeza, as mesmas dores, as mesmas ansiedades, e as mesmas dvidas? O de que necessitais uma mente pura e um corao cheio de amor, e ento todas essas coisas perdero a importncia, Ningum vai completar a minha obra, seno vs mesmos. Talvez o que digo no vos agrade e, por isso, desejeis outra imagem para adorar e tereis uma tal imagem, por vs mesmos fabricada, seja esta ou outra qualquer. Enquanto no aspirardes Verdade no seu sentido absoluto, enquanto no aspirardes liberdade, inventareis para vs mesmos muitas frases, muitas imagens, muitos rtulos, e vos enleareis nas complicaes das filosofias e das crenas. Se desejardes a Verdade como um homem que se afoga deseja o ar, no necessitareis dessas complicaes. Mas, preferis satisfazer-vos com coisas fceis, agradveis, suaves, a enfrentar uma luta rude com vs mesmos, a compreender a vs mesmos e, assim, vencerdes. No ides, depois, citar-me como autoridade. Recuso-me a servir-vos de apoio. No irei para uma clausura, para ser venerado por vs. Quando trazeis para dentro de um quarto o ar puro da montanha, perde esse ar a pureza e sobrevm a estagnao: e nenhum homem judicioso se deixar prender nessas coisas que pervertem e fazem estagnar a mente e o corao. Porque eu sou livre, porque encontrei esta Verdade que no tem limites, que no tem princpio nem fim, no me deixarei condicionar por vs. Podeis expulsar-me de vossos coraes e de vossas mentes, mas eu no vos servirei de arrimo, nem me deixarei prender na clausura de vossas pequeninas iluses. PERGUNTA: Dizeis que no h Deus; que no h nem o bem nem o mal; que no existe lei moral. Em que difere, pois, a vossa doutrina da de qualquer materialista? KRISHNAMURTI: Minha doutrina difere totalmente da do materialista, e se no o percebestes, lamento-vos. Eu nunca disse que no h Deus. O que eu disse que s existe Deus conforme se manifesta em cada um de ns, e que, quando houverdes purificado aquilo que est dentro de vs mesmos, achareis a Verdade. claro que Deus existe; mas no vou empregar a palavra Deus, porquanto ela assumiu um significado muito especial e estreito. Para uns ela sugere um punho possante e iroso; para outros, um ser de longas barbas; para outros, uma Inteligncia Onipotente, Onisciente e, Suprema. Isso eu prefiro chamar Vida, porque nos aproxima mais da Verdade, porquanto vs tendes de lidar com a prpria Vida, e no com o culto que rendais a um ser exterior, enganando a vs mesmo. A Verdade, tal como a Vida, como o raio de sol: se sois sensato, abrir-lhe-eis as janelas; se no sois sensato, descereis as cortinas. Se estivsseis enamorado da Verdade, essas imagens no teriam mais valor nenhum para vs. ... que no existe nem bem nem mal. Est visto que no h nem o bem nem o mal. O bem aquilo que no tememos; o mal, aquilo que tememos. Se, portanto, destruirdes o temor, estareis espiritualmente preenchidos; mas, se ficardes condicionados pelo temor como o estais continuar a existir o mal, o bem e a moral, para sustentar-vos, na vossa fraqueza. Quando estiverdes enamorados da vida e puserdes esse amor acima de todas as coisas, e julgardes por esse amor, e no pelo vosso temor, desaparecer ento esta estagnao que chamais moral; o que ocupar vosso pensamento ser, ento, o quanto estais enamorados da Vida, e no quanto mal e quanto temor existe no vosso corao. Ou, melhor vs julgareis pelo 206

www.lojajinarajadasa.com vosso amor, e no pelo vosso temor. Eu sei que vos probem de julgar; mas, como sempre julgais, porque ento no julgar de acordo com a Verdade? E para julgardes segundo a Verdade, preciso que estejais, apaixonados pela Vida; mas, ento, nunca julgareis, em circunstncia alguma. Porque no estais enamorados da vida, vs julgais pelos vossos padres de moralidade; pelo bem e pelo mal; pelo temor de cu e inferno; e por isso opondes uma barreira quele amor, quela compreenso da vida. PERGUNTA: Sustentam certas pessoas que, se bem o Instrutor Universal no se preocupa com a fundao de uma nova religio, o Bodhisattva Maitreya, em Sua Conscincia Csmica maior, se interessa por todas as religies e credos, e os apoia. KRISHNAMURTI: Mas, que idia confortvel! Como adorais as palavras! Vs estais enamorados de rtulos, e no da Verdade. Que significais por "Conscincia Csmica"? A Vida? Como possvel dividir a Vida em Instrutor Universal e Bodhisattva? O gente de pouco entendimento! Percebeis o que esta pergunta implica? - O que vos agrada atribuis ao Bodhisattva; o que vos desagrada atribuis ao Instrutor Universal ou - quem sabe? - a Krishnamurti. Mas, que que vs mesmos pensais? Onde ficou vossa compreenso, depois de tantos anos? Como enganais a vs mesmos com todas estas palavras! Dividis a Vida em Instrutor Universal e Bodhisattva, e o que agradvel procede de um, o que no agradvel procede do outro ou, se nenhum dos dois serve, ento procede de Krishnamurti. Que tem a Verdade com os termos "Instrutor Universal", Bodhisattva, ou Krishnamurti? Que tem a vida com esses nomes? Se fordes arrebata dos, agora, pela minha autoridade, sereis arrebatados, futuramente, por outra autoridade qualquer. Obedecereis a mando da autoridade e desobedecereis a mando da autoridade. Vossa compreenso fica muda, no caso. Desejais conforto a toda hora e esse conforto vs o encontrais em palavras na autoridade, nos deuses e dogmas. Mas, se puderdes perceber que no existe conforto, e sim compreenso, no ficareis enredado em palavras, em idias, ou no que dizem os livros, ou sombra dos deuses que adorais. Que pressa tendes em julgar, sem conhecimento! Em aceitar, sem compreenso! PERGUNTA: Disseram, tambm, que o Christo atua essencialmente atravs da Igreja Catlica Liberal e somente uma parcela de sua Conscincia se manifesta atravs de Krishnamurti. Podeis dar-nos vossa opinio a respeito desses dois pontos? KRISHNAMURTI: Vs aceitais o que vos agrada, e rejeitais o que vos desagrada. A Verdade, que a Vida, nada tem com pessoa alguma nem com organizao alguma. Amigo, estais a brincar com estas coisas. No so elas de importncia capital para vs, mas para mim elas so de vital interesse. Importa-me muito a Verdade e o despertar em cada um de vs o desejo de descobrir essa Verdade. O que vos importa a conscincia de Krishnamurti. Mas como o podeis saber, se no conheceis nem Krishnamurti nem o Christo? No sei quem vos diz essas coisas, mas, como vos seduzem os belos efeitos de palavras! -- No me interessam organizaes. No me interessam sociedades, religies, dogmas; o que me interessa a Vida, porque eu sou a Vida. No almejais a Vida e o preenchimento da Vida, que a Verdade; uma passageira sombra de conforto, nesta ou naquela organizao, uma dose de palavras suaves e de idias agradveis, so suficientes para vossa limitada compreenso. Assim, pois, amigo, estais preso nessas coisas. Porque Vida vs antepondes as organizaes, a autoridade de outro, as frases de outro, estais prisioneiro e sufocado. Eu vos falo a respeito do cume da montanha, que no conhece sombras, que nunca est toldado de nuvens, que constante e eterno, e o que vos interessa so os vales que jazem sua sombra. Se desejais compreender o cume da montanha, deveis deixar o vale, e no permanecer nele, adorando, de longe, o alto da montanha. - Amigo, no vos preocupeis sobre quem eu seja; vs nunca o sabereis. No desejo que aceiteis qualquer coisa do que vos digo. Nada necessito de qualquer de vs; no desejo a popularidade; no preciso de vossa lisonja nem de vossa obedincia. Porque estou enamorado da vida, nada preciso. Estas questes no so de grande importncia; o que tem importncia o fato de que estais obedecendo autoridade e permitindo que vosso julgamento seja pervertido por ela: Vosso julgamento, vossa mente, vossos afetos, vossa vida, esto sendo pervertidos por coisas destitudas de valor, e nisso que reside o sofrimento. Vi, num templo indiano, uma famlia de smios - pai, me e filho. O filhote estava sempre agarrado me, no a deixando nunca. E, numa fazenda de criao de lees, na Califrnia, eu vi uma leoa com seu filhotinho. Este andava livremente pelos arredores, independente da me. 207

www.lojajinarajadasa.com Que preferis: ser apegado como o macaco ou independente como o leo? O homem que deseja libertar-se de todas as suas limitaes, deve jogar para longe todos os arrimos. Se desejsseis subir s alturas, no levareis convosco todos os vossos haveres, vossos ttulos, vossos rituais e vossos amigos. Abandonareis todas essas. coisas, para subirdes sozinho. Subir livre de embaraos no significa egosmo. No vos torneis a enganar com essa idia. Se desejais subir, ser sensato faz-lo com determinao, com perseverana, sem a carga de complicaes. A Verdade no depende de pessoa alguma, por mais que ameis essa pessoa. Ela est acima das pessoas, acima dos deuses que imaginais e dos lgubres santurios dos templos. Eu sei o que sou; sei qual a minha finalidade na Vida, porque sou a prpria Vida, sem nome, sem limitao. E porque eu sou a Vida, desejo instar-vos a adorar essa vida, no na forma que Krishnamurti, porm a vida que reside dentro de cada um de ns. Lanai fora toda essa bagagem de crenas, religies e cerimnias, e encontrareis a Verdade. PERGUNTA: Devemos entender que no h razo para temermos levar at s suas ltimas concluses o que as vossas palavras implicam? KRISHNAMURTI: Porque o temeis? De que tendes medo? Medo de que o que eu digo seja a Verdade? Medo de abandonardes as coisas a que h tanto tempo vos apegais? Como julgais possvel achar alguma coisa na vida se tendes medo de levar vossos pensamentos e sentimentos at as ultimas concluses? Amigo, vs alcanareis a Verdade se deitardes fora o que haveis adquirido, e no se vos apegardes a essas coisas. Esta a nica maneira de se achar a Verdade. Se desejais dinheiro, no procedeis com crueldade para acumulardes vossas riquezas? Mas no desejais a Verdade por essa maneira. No quero dizer que sejais egostas e cruis - porque, quando caminhais na direo da Verdade, no h lugar para o egosmo e a crueldade. Se praticais qualquer ao impelido pelo medo ou a mando de outro, ai de vs, porque ao longo deste caminho jaz a tristeza e a dor. PERGUNTA: Tendes uma doutrina para as massas, e outra para vossos discpulos escolhidos? KRISHNAMURTI: No tenho discpulos escolhidos. Quem so as massas? Sois vs. em vossas mentes que existem as distines entre as massas e os escolhidos, entre o mundo exterior e o mundo interior. em vossas mentes que corrompeis, que "reduzis" a Verdade. amigo! Se estais enamorado da vida, vs envolvereis todas as coisas nesse amor, tanto as transitrias como as permanentes. Quereis uma doutrina especial para uns poucos eleitos, porque em vossos coraes existe a segregao, a separao; desejais ,confinar as guas puras da vida e guard-las para vs. Podeis perguntar ao sol se ele brilha para as massas ou para uns poucos eleitos? Podeis perguntar s chuvas se elas se destinam s plancies ou s montanhas? Se no compreendeis, suporeis, como sempre se sups, que o meu ensino se destina a uns poucos e por essa forma "reduzireis" e traireis a Verdade. Porque existe limitao em vosso, corao, dividis a gua da vida, que se destina aos reis e aos mendigos, indistintamente. Quer proceda de uma fonte de ouro, quer de um regato, essa gua a mesma e acalma a sede de todos, sem distino de pigmentos, castas, credos e dos especialmente eleitos. porque durante tantos anos; durante tantos sculos, durante tantas idades, a Verdade tem sido limitada e "reduzida", que novamente desejais limit-la, e com efeito j o estais fazendo, quando perguntais "A Verdade destina-se s massas ou a poucos escolhidos?". Dizeis que as massas no compreendem; que lhes dificlimo aprender; que somente uns poucos so capazes de alar-se s alturas. Julgais que eu no possuo tanta afeio e tanto amor como qualquer de vs? Mas, porque j subi todos os vossos degraus, eu vos digo: No subais esses degraus, mas evitai-os, deixai-os de lado e reuni as vossas foras para a ascenso. PERGUNTA: Dizeis que Deus s existe em ns, e que no h outro Deus. Tereis a bondade de explicar um pouco mais essa importante assero, j que todo o mundo cr num Deus fora de ns, um Criador, de todas as coisas, e vs mesmo falais do Bem-Amado, do Guru o nome no tem importncia - e outros falam do Budha, do Christo, de Deus. Como podeis conciliar esses conceitos? KRISHNAMURTI: Uni-vos com a vida, e vos unireis com todas as coisas. Como est dito nessa pergunta, os nomes no tm importncia. Se estais enamorado da Vida, ento vs vos unireis com a Vida, quer a chameis Budha ou Christo, quer lhe deis outro nome qualquer. Como 208

www.lojajinarajadasa.com podereis unir-vos com a Vida? No o 'podereis, certamente, se criardes complicaes, porem o podereis se criardes o ardente desejo da Verdade, o qual destri todas as complicaes. Mas dizeis: "Como poderei ficar enamorado da Vida?" Pela experincia. "Como poderei colher experincia?" Aceitando a experincia. "Como poderei aceit-la?" - No vos separeis da Vida. Vedes ao redor de vs tristezas e sofrimentos sem fim e, se vos limitardes a ver, sem observar, no haver confortamento do corao nem purificao da mente. PERGUNTA: Diz Krishnamurti que no devemos seguir nem obedecer a autoridade alguma. At que ponto pode esse princpio aplicar-se aos membros da Sociedade Teosfica que, a muitos respeitos, so governados pela autoridade? Ou, tambm, at que ponto ele aplicvel autoridade do prprio Krishnamurti? KRISHNAMURTI: Eu preferia que no disssseis: "Diz Krishnamurti ...". Se citais a mim, ao lado de todas as outras autoridades a que vos submeteis, perdereis a gua preciosa que eu vos trago. "Diz Krishnamurti que no devemos, seguir nem obedecer a autoridade alguma. At que ponto pode esse princpio aplicar-se aos membros da Sociedade Teosfica que, a muitos respeitos, so governados pela autoridade? Ou, tambm, at que ponto ele aplicvel autoridade do prprio Krishnamurti?". Quereis que vo-lo diga? No obedeais. Porque vos sujeitardes a outros indivduos? Porque estais prontos a aceitar, vs criais a autoridade e essa a raiz venenosa, essa a semente que vos cumpre destruir. Desejais adquirir o conforto pela obedincia. No penseis que eu esteja em oposio a Sociedade Teosfica. No estou. desperdcio de energia estar em oposio a qualquer coisa, que seja. Se comeardes a espalhar que eu vos incitei desobedincia, estareis criando outra autoridade, qual rendereis culto. E se obedecerdes, porque eu vo-lo aconselhei, estareis igualmente criando outra autoridade, qual rendereis culto. Ignoro que na Sociedade Teosfica sejais impelidos obedincia. Ignoro-o; pode ser que sim, mas isso no me interessa. Se no for na Sociedade Teosfica que obedeceis, vs o fareis em outra organizao qualquer. O desejo de obedecer inato em cada um de vs e esta a razo por que criastes essas organizaes. O que me interessa a purificao do vosso desejo e no o estabelecimento de uma autoridade. Desejo vida, e se fortalecerdes esse desejo, se purificardes esse desejo, se o enobrecerdes, se lhe derdes vitalidade, lhe derdes o xtase da demanda de um alvo, quebrareis ento todas essas coisas pequeninas que vos barram o caminho. No fui sempre instado pelos meus amigos a seguir esta ou aquela coisa? No me disseram eles, sempre: "Cuidado com o que fazeis, com o que dizeis! - Tomai cuidado de vossa posio. - Deveis dizer isso e no deveis dizer aquilo. "A pacincia um dom divino! - Tivesse eu obedecido a qualquer deles, jamais teria encontrado aquela felicidade eterna e absoluta. Porque pus em dvida justamente as coisas que eles sustentavam, porque nunca aceitei prontamente coisa alguma que me fosse apresentada, eu encontrei aquele Reino que eterno e imutvel; eu preenchi a Vida. E desejo diz-lo a vs: Fazei o mesmo; mas no o faais porque eu o digo, porm porque vs tambm desejais entrar nesse Reino, vs tambm desejais encontrar aquela paz absoluta, aquela libertao que o pice de toda a experincia, aquela Verdade que no criao de pessoa alguma, de nenhuma organizao, de nenhuma igreja. PERGUNTA: Sois o Christo, de volta ao mundo? KRISHNAMURTI: Amigo, quem julgais que eu sou? Se eu disser que sou o Christo, vs ireis criar uma nova autoridade. Se disser que no o sou, criareis igualmente outra autoridade. Julgais que a Verdade tem algo que ver com o que vs pensais que eu seja? Vs no estais interessados na Verdade; estais interessados no vaso que contm a Verdade. No desejais beber da gua, mas desejais saber quem foi que modelou o vaso em que est contida a gua. Amigo, se eu vos digo que sou o Christo e outro disser que o no sou, onde ficareis? Lanai fora o rtulo, que nenhum valor tem. Bebei a gua, se ela pura. Eu vos digo que possuo essa gua pura; possuo o blsamo que purifica e que cura soberanamente. E vs me perguntais: "Quem sois? EU SOU TODAS AS COISAS, PORQUE EU SOU A VIDA!

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