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VI Seminário da Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Turismo

10 e 11 de setembro de 2009 – Universidade Anhembi Morumbi – UAM/ São Paulo/SP

Os Vizinhos Invisíveis:
impactos do turismo nos destinos turísticos e seus entornos na Costa Norte (CE, MA, PI)

David Leonardo Bouças da Silva 1


Helena Araújo Costa 2
Elimar Pinheiro do Nascimento 3
Resumo
Este artigo objetiva investigar os principais impactos socioambientais das atividades do setor
de turismo ao longo do roteiro integrado que perpassa Ceará (Jericoacoara), Piauí (Delta) e
Maranhão (Lençóis maranhenses). De cunho qualitativo, a metodologia empregada consistiu
em análises documentais; visitas exploratórias e entrevistas semi-estruturadas junto a 150
atores sociais-chaves do roteiro, em maio de 2008. Os resultados apontam que os impactos
negativos, tanto socioambientais quanto socioeconômicos, são nitidamente mais evidentes nos
principais destinos, como era de se esperar, apesar da expectativa local acerca dos resultados
positivos da atividade. Os entornos, por sua vez, permanecem alijados do processo, contudo
oferecem características preservadas do seu modo de vida, o que pode simbolizar potencial
para desenvolver um novo tipo de turismo, mais includente e com enfoque comunitário.

Palavras-chave: Impactos Socioambientais. Sustentabilidade. Turismo. Costa Norte.

Introdução
A noção de turismo sustentável se associa diretamente aos impactos gerados pela
atividade nos destinos e os limites que estes impactos impõem ao próprio futuro da atividade
turística, inserido em uma lógica de retroalimentação de sistemas complexos. No contexto da
sustentabilidade, o conjunto de impactos é tratado de modo sistêmico, sem setorizar as esferas
sociais, ambientais e econômicas, tampouco isolando o destino turístico de seu entorno.
O turismo sustentável é aquele que contribui para o desenvolvimento sustentável (DS)
do destino em que ocorre (HUNTER, 1997), ou seja, não apenas o que incorre em proteção
ambiental, mas aquele também ligado à viabilidade econômica a longo prazo e justiça social.
Tais dificuldades de equilíbrio se evidenciam ainda mais quando lógicas distintas de
exploração e preservação de áreas naturais se materializam no mesmo espaço social.
Neste contexto, o presente trabalho objetiva investigar os principais impactos da
atividade turística nas regiões de Jericoacoara, Delta do Parnaíba e Lençóis Maranhenses, em
seus destinos principais e arredores.

1
Mestre pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília. Professor do Departamento
de Turismo e Hotelaria da Universidade Federal do Maranhão. E-mail: [email protected].
2
Doutoranda do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília. Mestre em Turismo e
Hotelaria pela UNIVALI/SC. Email: [email protected].
3
Doutor em Sociologia, Université René Descartes, Paris V. Professor do Departamento de Sociologia e Diretor
do Centro de Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília. E-mail: [email protected].
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Turismo e seus Impactos: a problemática da sustentabilidade


Ao tratar da contribuição do turismo para o DS, evidencia-se a necessidade de conhecer
os impactos e riscos ligados à atividade turística. Comumente, os autores tendem a enfocar em
uma perspectiva do ambiente que circunda esta atividade, negligenciando uma visão mais
integradora. Todavia, Leiper (1995) apresenta uma análise resumida e sistemática de impactos
do turismo, contemplando esferas econômicas, socioculturais e físicas.
Os impactos econômicos advêm, especialmente, do fato de turistas serem consumidores
temporários no local visitado. Entre os principais efeitos positivos estão: ganhos de divisas e
créditos na balança de pagamentos; faturamento das empresas; taxas e impostos para os
governos; emprego e renda, e o efeito multiplicador econômico. Estes impactos, recorrentes
na literatura, promovem o desenvolvimento regional, sobretudo, a partir do alto multiplicador
econômico proveniente da vasta gama de produtos e serviços consumidos no local (LAGE e
MILONE, 2001). Esta acepção se baseia em pressupostos de que o turismo traz divisas com
dispersão de gastos, inclusive entre parcelas pobres da população (WORLD BANK, 2006).
Entretanto, é necessário atentar também aos impactos econômicos negativos
provenientes do turismo, quais sejam: inflação e acréscimo no custo de vida da comunidade;
especulação imobiliária; aumento do poder de consumo causando impacto cultural e
ambiental, e foco excessivo no turismo como monocultura – que perturba e desvia recursos e
interesses de outras atividades econômicas regionais tradicionais (VALLS, 2006) – fato este
ignorado enquanto problema, mas crucial na busca da sustentabilidade (SHARPLEY, 2000).
Quanto aos impactos socioculturais, Leiper (1995) admite possíveis mudanças –
positivas e/ou negativas – em crenças, valores, comportamentos e costumes resultantes da
interação com turistas. Os impactos negativos se referem: à sobrecarga na visitação com perda
da hospitalidade do morador, o que Liu (2003) entende como capacidade de carga psicológica
ou social; à perda da identidade local e comoditização, na medida em que tradições são
replicadas para atender demandas do turismo de massa; aos prejuízos às culturas tradicionais,
em virtude do efeito demonstração para turistas; a empregos com pouco valor agregado
(baixos salários e baixo status social); neocolonialismo, porquanto a atividade de algumas
empresas multinacionais do turismo é entendida como nova forma de colonização. Por outro
lado, entre os impactos positivos, Leiper (1995) cita a integração entre locais e turistas, e o
renascimento cultural de artesanatos e costumes devido ao crescente interesse turístico e o
entendimento entre povos.
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Na categoria de impactos em ambientes físicos são compreendidos ambientes


naturais e construídos. Em impactos negativos, Leiper (1995) enfatiza: conflitos advindos de
prejuízos ao ambiente físico: energia, ar, água e vegetação prejudicados pelo turismo massivo;
poluição da paisagem e excesso de infraestrutura construída; segregação física entre locais e
turistas por meio da construção de espaços que excluem os moradores. Já os possíveis
impactos positivos concernem à revitalização de lugares históricos abandonados e à
recuperação de áreas naturais para fins turísticos, afora a instalação de equipamentos para
gestão de resíduos sólidos, obras de saneamento e melhorias na saúde da população.
Portanto, enxergam-se situações diametralmente opostas, pois o turismo potencialmente
promove externalidades positivas, mas também pode gerar comprometimentos sociais,
econômicos e ambientais (KRIPPENDORF, 2003), fato que remete à necessidade de pensar
formas mais sustentáveis de turismo (CURTIN; BUSBY, 1999). Contudo, poucos são os
casos concretos de sustentabilidade do destino turístico (LIU, 2003).
Para Sharpley (2000), o turismo permanece polarizado, reforçando desigualdades
regionais e internacionais, embora surjam novos centros atrativos em países marginalizados.
Como ilustração, em 2007, 60% dos desembarques mundiais ocorreram em trinta países-
membros4 da OCDE. A operacionalização local do turismo continua concentrada em suas
elites político-econômicas, gerando enclaves e guetos, com grupos verticalizados e
polarizadores em suas operações (OCDE, 2008).

Visão Sistêmica do Turismo na Costa Norte


A Costa Norte, denominada comercialmente como Rota das Emoções, é um dos roteiros
integrados resultantes do Programa de Regionalização do Turismo no Brasil, cujo objetivo é o
de “promover o crescimento econômico, a criação e manutenção de novos postos de trabalho,
de forma a buscar o desenvolvimento sustentável nas regiões turísticas envolvidas” (MTUR,
2005a). A região consiste em uma faixa litorânea que perpassa os estados do Maranhão, Piauí
e Ceará, incluindo 12 municípios em três regiões: Região dos Lençóis Maranhenses (MA):
Araioses, Tutóia, Água Doce do Maranhão, Paulino Neves e Barreirinhas; Região do Delta
(PI): Cajueiro da Praia, Luís Correia, Ilha Grande, Parnaíba; Região de Jericoacoara (CE):
Jijoca de Jericoacoara, Camocim, Barroquinha.

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Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Coréia, República Tcheca, Dinamarca, Finlândia, França, Grécia, Hungria,
Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Luxemburgo, Holanda, Nova Zelândia, Noruega, Portugal, Eslováquia, Espanha,
Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido, Estados Unidos.
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Figura 1 - Municípios integrantes da Costa Norte


Fonte: LIMA/COPPE/UFRJ – Ministério do Turismo

A visão de futuro presente no planejamento estratégico da região menciona tornar-se


“um destino sustentável de referência nacional e internacional, por seus produtos únicos,
diferenciados, que integram natureza, aventura, esportes relacionados com vento e água, e
cultura, num cenário de sol e praia” [grifo próprio] (SEBRAE, SENAC et al., 2006) p. 60).
O turismo no território vincula-se, principalmente, a lazer, contemplação, esporte e
aventura no meio ambiente natural realizado na zona costeira. Os principais atrativos da
região são os Parques Nacionais dos Lençóis Maranhenses e de Jericoacoara, afora as Áreas
de Proteção Ambiental Federais do Delta do Parnaíba e de Jericoacoara, sendo estes os
atrativos naturais de maior interesse turístico da região (LIMA/COPPE/UFRJ, 2006).
Além dos atrativos principais, existem os complementares: no Maranhão, Rio
Preguiças, Atins e Caburé em Barreirinhas; os Pequenos Lençóis em Paulino Neves, a
observação dos guarás em Tutóia. No Piauí, ilhas do Delta atingidas via Parnaíba e da praia
Pedra do Sal em Ilha Grande; praia de Luís Correia e projeto do peixe-boi em Cajueiro da
Praia. No Ceará – que predomina o turismo de sol e mar – as praias de Camocim, as lagoas de
Jijoca, as caminhadas para a Pedra furada em Jericoacoara e a visitação à Vila de Tatajuba5.
Resumidamente, a Costa Norte apresenta um contexto de acentuada pobreza –
consubstanciado em baixos IDHs (PNUD, 2006) – e de fragilidade ambiental, com perda de
identidade cultural em alguns casos, escassas alternativas econômicas e disparidade na
inserção de seus destinos no mercado turístico. Por outro lado, tem recebido crescente atenção
de políticas públicas, com destaque para intervenções vinculadas ao turismo, firmando o
pioneirismo nacional na criação de um consórcio interestadual para gestão turística da região.

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Informações obtidas em observação de campo e visitas a websites de operadoras e de receptivos locais.
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Economicamente, algumas cidades têm como principal setor produtivo o turismo,


particularmente nos três municípios-âncoras (Barreirinhas, Parnaíba e Jericoacoara). Os
demais exercem atividades de pesca e agricultura, sendo raras as indústrias manufatureiras.
Apesar da inexistência de estatísticas consolidadas do roteiro, estudo realizado por
Sebrae, Senac e Mtur (2006) mostrou que o fluxo de turistas nos principais núcleos indutores
da Costa Norte – Barreirinhas e Jijoca de Jericoacoara – totalizou quase 160.000 pessoas em
2004, 80.754 e 74.725 pessoas, respectivamente. No mesmo ano, Camocim detinha menos de
10% da demanda de turistas de Jericoacoara, ratificando a concentração do turismo em alguns
poucos locais, embora a Costa Norte seja considerada de grande potencial turístico no país
pelo Governo Federal, com indicações no Plano Cores do Brasil (MTUR, 2005b).

Metodologia
O estudo qualitativo consistiu em levantamento de dados secundários por meio de
investigação documental-bibliográfica (BARBETTA, 2002) e três visitas exploratórias em
nove municípios da Costa Norte6 ocorridas em outubro e novembro de 2006 e maio de 2008.
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com 150 atores sociais do turismo,
englobando: entes do mercado, Estado, sociedade civil organizada e trabalhadores. O roteiro
de entrevistas, flexível e adaptável a cada entrevistado, foi composto pelas seguintes questões:
Atualmente, qual é o principal problema ligado a sua atividade/ocupação? Quais são os
principais problemas da cidade? Quando é a alta/baixa estação do turismo na cidade? Quais
são os principais benefícios do turismo para a cidade?

Impactos do Turismo na Costa Norte

Região de Jericoacoara
A Vila de Jericoacoara concentra maior parte do fluxo de turistas, com grande público
internacional, reputação e oferta bastante diversificada. No início do ano predomina o turismo
doméstico, mas, a partir de agosto, a demanda é na maior parte estrangeira, ocasionando alta
nos preços de hospedagens e passeios (época considerada mais rentável). O elevado custo de
vida local e as limitações físicas de Jericoacoara ocasionam uma tendência de dotar áreas
próximas de estrutura para visitantes, embora as demais localidades ainda apresentem

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Não foram visitados apenas os municípios de Água Doce do Maranhão (MA), Cajueiro da Praia (PI) e
Barroquinha (CE) em razão da dificuldade de acesso à época das visitas exploratórias.
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visitação mínima ou ausência de infraestrutura turística (pousadas, restaurantes, agências de


receptivo e etc.).
A concepção de aldeia global atribuída à Vila de Jericoacoara – tratada a partir deste
ponto também como Jericoacoara – pode ser justificada pelas inúmeras identidades refletidas
na culinária, produtos comercializados ou, até mesmo, nas pessoas de diferentes origens que
passeiam ou trabalham pela região. Os povoados circunvizinhos7, de onde provém boa parte
da mão-de-obra, são nitidamente pobres, carentes de infraestruturas básicas, assentando suas
práticas de subsistência na agricultura – feijão, milho e mandioca – e em atividades
extrativistas como a cata do caranguejo e na pesca sem inserção significativa no mercado.
O modus vivendi destas localidades se distingue da imagem de sol e mar, pois são
comunidades pesqueiras, relacionadas ao mangue, com vida bastante rústica e rural, a partir
da agricultura e criação de animais para subsistência. Desse modo, poder-se-ia inseri-las na
esfera do turismo, aproveitando seu estilo de vida, sua produção artesanal (normalmente, fibra
da carnaúba e crochê) ou incrementando a produção agrícola para abastecer o turismo local.
O Córrego do Urubu apresenta estrutura inicial de pousadas às margens da Lagoa
Azul, com preços mais acessíveis que os de Jericoacoara. Não foram encontrados quaisquer
sistemas de hospedagem familiar ou de organizações comunitárias, voltados à estruturação do
turismo. Já Camocim apresenta estrutura ocupada pelo turismo regional – no carnaval e fim
de ano – e um resort conhecido por sua escassa ocupação. Os demais meios de hospedagem
constituem estadia para comerciantes de outras localidades. O turismo mais representativo
ocorre na praia de Maceió e na Barra dos Remédios que abrigam residências de veraneio,
além de pousadas e restaurantes voltados para os turistas, principalmente de Sobral e Granja.
Em Barroquinha, a sede municipal é distante da praia, principal atrativo potencial. Na
cidade, não é possível precisar os impactos advindos do turismo porque não há visitação
relevante. A secretaria de turismo municipal se mostra articulada e interessada em um padrão
diferenciado de turismo, baseado na experiência com as comunidades pesqueiras.
Por diversas vezes, nas entrevistas com atores sociais do Ceará, alegou-se que o
padrão de desenvolvimento de Jericoacoara seria indesejável para outras localidades devido
ao seu caráter excludente e massificador, comentário remarcado nos discursos provenientes de
Camocim e Barroquinha. Este fato também ocorreu nas regiões do Delta do Parnaíba e dos

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Mangue Seco, Lagoa Grande, Guriú, Córrego do Urubu e Córrego da Forquilha.
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Lençóis Maranhenses, em razão da descaracterização local, da forte especulação imobiliária,


do alto custo de vida e da agitação dos grandes centros em períodos de alta.
Evidenciam-se impactos negativos do turismo na Vila de Jericoacoara, em função do
deslocamento da população para a periferia devido à venda de seus terrenos para empresários
do turismo, do aumento de custo de vida e da falta de oportunidades de trabalho,
principalmente para os que tradicionalmente viviam da pesca (FONTELES, 2004). Entre os
efeitos negativos, cita-se tráfico de drogas, violência e exploração sexual de menores.
Lixo e poluição estão mais associados ao mau comportamento do morador e à falta de
mecanismos para gerir os resíduos sólidos, do que em função da visitação (destacando o
turista regional – Sobral e Fortaleza – como o com conduta menos adequada). O trânsito de
veículos sobre dunas, em toda a região de Jericoacoara, gera desgaste ambiental considerável,
caso de Morro Branco, no povoado de Tatajuba.
Alarmante impacto resultante do crescimento turístico de Jericoacoara é a
reconfiguração dos hábitos locais, a exemplo de Mangue Seco, em que a comunidade
envolveu-se com o turismo, deixando de lado atividades tradicionais de subsistência como
pesca e agricultura, para trabalhar em pousadas e restaurantes da região, motivada também
pela escassez de renda e pela aspereza e dificuldade de lidar com essas práticas antigas.
Apesar das situações negativas, o turismo na região de Jericoacoara proporcionou
também impactos positivos, sobretudo na Vila: trabalho e renda para as populações locais e
do entorno; obras em saneamento básico (melhoria no abastecimento de água/energia);
melhoria de equipamentos, infraestrutura e serviços turísticos; valorização do patrimônio
natural; dinamização das economias locais; estímulos à organização social; envolvimento de
organizações externas para estruturar a cadeia turística e produtiva local, como o Sebrae,
ITCP/COPPE/UFRJ, Mtur e ONGs.

Região do Delta do Parnaíba


A atividade turística no Delta ocorre, principalmente, em áreas frágeis representadas
tanto pela Área de Proteção do Delta do Parnaíba quanto por sua Reserva Extrativista, tendo
Parnaíba como principal núcleo receptor. Todavia, este município ainda tem participação
tímida no turismo, constituindo um centro comercial regional de grande relevância para
cidades dos arredores do Piauí e para as ilhas do Delta que pertencem, majoritariamente, ao
Maranhão. O setor turístico nesta região ainda constitui uma alternativa econômica, ao
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contrário da realidade que permeia Jericoacoara e Barreirinhas, pois o Piauí apresenta o fluxo
mais incipiente de toda a Rota, com pouca visibilidade dos atrativos, resultando em baixa
visitação e demandando investimentos variados, como em infraestrutura urbana.
Na costa leste piauiense, Cajueiro da Praia demonstra crescente inserção no turismo,
em especial, devido ao escritório do Projeto Peixe Boi, principal atrativo local. Em Ilha
Grande, uma das principais entradas para o passeio no Delta, o deslocamento até o Porto dos
Tatus pouco ou nada interage com a população local, embora exista potencial turístico por
meio de artesanato, grupos culturais e estilo de vida tradicional baseado na cata do caranguejo
e na agricultura. Atualmente, existem iniciativas de fomento à hospedagem familiar por meio
da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP/COPPE/UFRJ) e do resgate
cultural promovido pelo Sebrae/Parnaíba.8. A Ilha das Canárias abriga cinco comunidades e
apenas Morro do Meio e Canárias possuem alguma visitação, posto que consistem em paradas
rápidas em passeios do Delta e pouco contribuem com a comunidade (MATTOS, 2008).
Os principais impactos ambientais negativos tangem à falta de saneamento básico e de
gestão de resíduos sólidos, gerando complicações ambientais em todas as localidades. Além
disso, Parnaíba sofre com a poluição sonora causada por publicidade volante (bicicletas,
carros de som) e casas de show noturnas; Em Cajueiro da Praia, estes impactos se relacionam
à carcinicultura, à pesca com bomba, principalmente a partir de Chaval, e à divisão de espaço
entre pescadores e esportistas de kite surf, na praia de Barra Grande. Luís Correia, na alta
estação do turismo, apresenta acúmulo de lixo nas vias públicas, comprometimento da
infraestrutura da cidade e de seus distritos, como as praias e atrativos turísticos.
Embora com reduzido fluxo de turistas, alguns impactos positivos são notados:
trabalho e renda para as populações locais e do entorno; obras em saneamento básico
(melhoria do abastecimento de água/energia); construção e melhoria de infraestrutura e
equipamentos turísticos; profissionalização da mão-de-obra; diversificação das economias
locais; valorização e oferta de cursos de capacitação para produção de artesanato; valorização
do patrimônio natural; estímulos à organização social; impulso à atividade empresarial para a
estruturação dos destinos turísticos piauienses; envolvimento de organizações externas para
estruturar a cadeia turística e produtiva local, como o Sebrae, ITCP/COPPE/UFRJ, Mtur;
internacionalização da preocupação ambiental por meio de ONGs nacionais e internacionais.

8
Sabe-se também da instalação do empreendimento Ecocity Brasil, cujo mote principal é o de ser o “epicentro
do turismo ecológico mundial”. ECOCITY, 2008. Disponível em: http://www.ecocitybrasil.com/portugues.
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Região dos Lençóis Maranhenses


De acordo com estimativas não-oficiais do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio), em 2006, constatou-se que mais de 50.000 pessoas estiveram no
Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (PNLM), em apenas um dos seus trechos de
visitação (Lagoa Azul e do Peixe), deixando o Maranhão na segunda colocação no
quantitativo de visitação da Rota das Emoções. Ao contrário de Jericoacoara, o turismo no
PNLM é de longos períodos de baixa estação (cerca de nove meses de baixa e três meses de
alta), com mais de 35% do fluxo de visitantes concentrado em janeiro e julho apenas.
No PNLM, a realidade entre os municípios é bem distinta. Enquanto Barreirinhas
recebe expressivo fluxo de visitantes, Paulino Neves e Tutóia são praticamente desconhecidos
do público, dispondo assim de pequena oferta de pousadas e restaurantes, e carentes de
agências de receptivo (pousadas locais se articulam para oferecer os passeios).
Paulino Neves atrai um público que busca mais tranqüilidade, rusticidade e, por
apresentar acesso precário, potencializa atividades de off-road. Em outra vertente, Tutóia,
situada entre o Delta e os Pequenos Lençóis, é utilizada como ponto de apoio aos passeios no
Delta, apresentando condições de suporte apenas para grupos menores. Na visão local, o
desenvolvimento turístico é projeto distante e, portanto, não motiva investimentos em
equipamentos e serviços turísticos (bugues, lanchas, diversificação dos passeios, entre outros).
Em Barreirinhas, a atividade turística é diretamente responsável pelos impactos, em
oposição às demais localidades. Relatos confirmam que o recente turismo cresceu
abruptamente, sem preparação local para receber turistas, gerando mudanças significativas no
modo de vida da população. Os benefícios identificados, provenientes do turismo, concernem
à elevação do poder aquisitivo e da oferta de trabalho. Entretanto, percebe-se danos ligados à
atividade turística desregrada: ocupação territorial e problemas com drogas e prostituição.
Como parte da pesquisa bibliográfica, identificou-se divergências entre o plano de
manejo do PNLM e o plano diretor (PD) de Barreirinhas, motivo de grandes conflitos entre o
poder público municipal, empresários locais e o ICMBio/Barreirinhas. Os principais
problemas se referem ao PD prever zonas de expansão urbana na Zona de Amortecimento
(ZA) do PARNA Lençóis Maranhenses que, de acordo com o artigo 49, Lei 9.985/00, é
considerada zona rural, como também pela permissividade da instalação de empreendimentos
de qualquer escala, natureza e proporção no povoado de Caburé – zona de amortecimento do
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PNLM, Área de Proteção Ambiental e Área de Proteção Permanente (restinga) – portanto,


incompatível à utilização turística atual (SILVA, 2008).
Quanto aos notáveis impactos ambientais negativos, destaca-se a grande quantidade de
lixo acumulada no percurso entre Paulino Neves e Caburé e a forte presença de animais. Ou
ainda, falta de ordenamento urbano e de pavimentação, escassez de água potável e
necessidade de restauração ambiental das margens do Rio Novo, além da possível instalação
de campos de exploração de petróleo off shore, que podem limitar o futuro turismo. Em
Barreirinhas, a ocupação desordenada do espaço resulta em periferização, acompanhada de
tráfico de drogas, violência e exploração sexual de menores. Ademais, a diminuição na oferta
de pescados é percebida desde Tutóia até Santo Amaro, passando por Caburé e Barreirinhas.
Os impactos positivos do turismo nos Lençóis Maranhenses são: geração de trabalho e
renda; obras em saneamento básico (melhoria do abastecimento de água/energia); construção
e melhoria de infraestrutura e equipamentos turísticos; maior profissionalização da mão-de-
obra local; diversificação, estruturação e ampliação das atividades econômicas da região;
melhoria das vias de acesso a Barreirinhas; valorização e oferta de cursos de capacitação para
produção do artesanato local; valorização do patrimônio natural; estímulos à organização
social; aumento da preocupação local com resíduos sólidos; impulso à atividade empresarial
na estruturação dos destinos turísticos; envolvimento de organizações externas para estruturar
a cadeia turística e produtiva local, como o Sebrae, ITCP, Mtur, ONGs, entre outros.

Considerações Finais
Objetivou-se, neste trabalho, investigar os principais impactos socioambientais do
turismo na Costa Norte, incluindo as regiões de Jericoacoara, Delta do Parnaíba e Lençóis
Maranhenses. Os atores sociais entrevistados, em suas mais diversas instâncias, revelam uma
série de impactos da atividade turística para as localidades. As três regiões apresentam, em
comum: geração de trabalho e renda, obras em saneamento, melhoria da infraestrutura
equipamentos e serviços turísticos, valorização do patrimônio natural, estímulos à
organização social e produtiva direta ou indiretamente ligada ao turismo e dinamização das
economias locais (efeitos positivos); desgaste dos ecossistemas, exclusão das populações
periféricas, falta de cuidado e tratamento com os resíduos sólidos, especulação imobiliária e
conflitos quanto ao uso turístico na UC (principais impactos negativos).
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Ratifica-se a disparidade do turismo entre as localidades investigadas, porquanto os


destinos apresentam estágios de vida bastante diferenciados e forte distinção quanto aos
serviços e fluxo turísticos. Jericoacoara apresenta superior variedade e sofisticação de
equipamentos turísticos, respondendo pela maior parte da demanda estrangeira na Costa
Norte. Lençóis Maranhenses conta com uma infraestrutura turística mais simples, com fluxo
crescente de turistas nacionais e começa a despertar interesse internacional. No Delta, a
atividade turística é a mais incipiente em termos de infraestrutura e demanda, predominando o
fluxo local e regional. As demais localidades consistem, atualmente, em pontos de passagem e
não em destinos, com fluxo residual de turistas e baixa profissionalização da mão-de-obra.
Apesar dos impactos negativos gerados pelo turismo, percebe-se, em todas as cidades,
uma expectativa, talvez superestimada, quanto aos ganhos com a atividade, mesmo diante dos
possíveis efeitos danosos causados a outros setores da economia, como a pesca tradicional.
Entretanto, ainda se revelam ressentimentos de naturezas opostas: dos municípios que se
consideram marginalizados pelo turismo, como Camocim e Paulino Neves, mas também
daqueles que tiveram um crescimento desordenado, como Jericoacoara.
Os impactos, positivos ou negativos, são sentidos com nitidez nos três principais
destinos da região: Barreirinhas, Parnaíba e na Vila de Jericoacoara. Seus entornos
permanecem excluídos do processo, servindo como origem da mão-de-obra apenas. Todavia,
a existência de modos de vida ainda preservados nestes locais periféricos potencializa a sua
inserção, enquanto atrativos com enfoque mais integrador e comunitário.
Afinal, pensar a sustentabilidade do turismo significa preocupar-se sistemicamente não
somente com os destinos centrais, mas com a disseminação de benefícios para seus arredores,
causando transbordamentos que ofereçam melhores condições de inserção dessas localidades.

Referências

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