A Lógica Cultural Do Capitalismo Tardio (JAMERSON)
A Lógica Cultural Do Capitalismo Tardio (JAMERSON)
A Lógica Cultural Do Capitalismo Tardio (JAMERSON)
Sendo escrito em 1996, começa debatendo sobre o olhar pessimista sobre o possível fim de
características que marcaram a modernidade (o fim da ideologia, da arte, da luta de classes, a crise
do leninismo, da social democracia, do Estado…)
Essa crise se configuraria no chamado pós-modernismo, caracterizado por uma ruptura, uma
quebra radical, segundo os defensores de sua existência. Atenuamento ou extinção (ou repúdio
ideológico ou estético) do centenário movimento moderno.
O desgaste do modernismo faz com que o que vem depois se torne caótico e heterogêneo.
“...mas será que isso implica uma mudança ou ruptura mais fundamental do que as mudanças
periódicas de estilo, ou de moda, determinadas pelo velho imperativo de mudanças estilísticas do
alto modernismo?” (p.28).
Essa ruptura não deve ser lida como mera questão cultural, embora as teorias do
pós-modernismo coincidam com a chegada da chamada sociedade pós-industrial, também
conhecida como sociedade de consumo. Essas teorias possuíam uma missão ideológica de
demonstrar que as novas formações sociais não obedecem às leis do capitalismo clássico.
A tradição marxista resiste a essas formulações, exceto por Mandel, que em “O capitalismo
tardio” se propõe a demonstrar que ela se trata de um novo estágio do capitalismo.
A nova geração dos anos 60 confronta o movimento moderno como um conjunto de velhos
clássicos, que “pesam na cabeça dos vivos como um pesadelo”, como disse Marx, em um contexto
diferente (p.30).
A produção estética hoje está integrada à produção das mercadorias em geral: “a urgência
desvairada da economia em produzir novas séries de produtos que cada vez mais pareçam
novidades…, com um ritmo de turn over cada vez maior, atribui uma posição e uma função estrutural
cada vez mais essenciais à inovação estética e ao experimentalismo” (p.30).
“De todas as artes, a arquitetura é a que está constitutivamente mais próxima do econômico,
com que tem, na forma de encomendas e valor de terrenos, uma relação virtualmente imediata”
(p.30).
Análise de Um par de botas, Vincent Van Gogh (duas maneiras de ler o quadro):
● Para evitar que a reprodução extensiva da imagem a torne objeto decorativo, é preciso
entender seu contexto, do contrário “o quadro vai continuar a ser um objeto inerte, um
produto final reificado, impossível de entender como um ato simbólico propriamente dito,
como práxis e produção” (32).
Pensando-a como produção, para voltar à situação em que foi feita, poderíamos enfocar na
matéria-prima com a qual foi feita. Em Van Gogh, essa matéria poderia ser compreendida
como um mundo objeto da miséria agrícola. O uso de cores vivas para representar um
mundo opressivo parece, para o autor, um gesto utópico, que produz um novo domínio dos
sentidos e se mostra como um espaço semi-autônomo parte de uma recente fragmentação
sensorial imposta pela divisão do trabalho no capitalismo e busca compensá-la.
● A análise central de Heidegger (Der Ursprung des Kunstwerks), que traz a ideia de que a
obra de arte surge da fratura entre a Terra e o Mundo — a ausência de sentido na
materialidade do corpo e da natureza e a doação de sentido na história e no social.. Os
sapatos do camponês recriam ao seu redor o mundo objeto ausente que antes era o seu
contexto original. Para Heidegger, “...a pintura de Van Gogh é o desvelamento do que o
instrumento, o par de sapatos, de verdade é… Essa entidade emerge do descobrimento do
seu ser” (p.34).
Esse descobrimento é por meio da mediação da obra de arte, que faz com que o mundo
ausente (a vida cotidiana, o trabalho braçal, a vida do campo) se revele nela. Essa análise
mostra que um tipo de materialidade (a própria terra e seus objetos) é transformada em uma
nova materialidade, de tinta a óleo.
Jameson compara a obra com o quadro Diamond dust shoes, de Andy Warhol. Muito diferente do
quadro de Van Gogh, a pintura de Warhol não invoca um significado mais profundo de imediato; o
conteúdo parece fetichista, tanto no sentido freudiano da subconsciência quanto no sentido trazido
por Marx, do desejo pela mercadoria. Aqui, entramos numa das questões centrais do
pós-modernismo num sentido mais político: a obra de Warhol é centrada na mercantilização,
enfatizando o fetichismo pela mercadoria na emergência do capitalismo tardio.
Retornando ao alto modernismo, O grito, de Munch, expressa um emblema que costuma ser
chamado de era da ansiedade, mas pode ser lido como a expressão desse tipo de afeto e também
como uma desconstrução virtual da própria estética da expressão. que dominou o alto modernismo
mas parece ter desaparecido no pós-moderno.
A teoria contemporânea (crítica do modelo hermenêutico) é, para o autor, um fenômeno
estritamente pós-moderno. Ela repudia quatro elementos fundamentais da profundidade: o dialético
(da essência e da aparência, bem como da ideologia); o modelo freudiano (do latente e do
manifesto); o modelo existencialista (autenticidade e inautenticidade, alienação e desalienação) e; a
oposição semiótica entre significante e significado.
Essa falta de profundidade não é somente metafórica. Ela se expressa nas cidades, na vida
cotidiana, no caminhar e se deparar com grandes volumes confusos, na substituição dos tecidos
urbanos; torna nossas antigas percepções de cidade arcaicas, sem substituí-las.
Sugere uma hipótese histórica mais geral: os conceitos como ansiedade e alienação não são
mais possíveis no mundo pós-moderno. Essa mudança na dinâmica da patologia cultural pode ser
caracterizada como aquela em que a alienação do sujeito é deslocada pela sua fragmentação.
O fim do ego burguês provoca o esmaecimento dos afetos e o fim do estilo único e individual
(como as pinceladas únicas de cada artista).
O esmaecimento do afeto também pode ser lida como o esmaecimento da grande temática
do alto modernismo (do tempo e da temporalidade)