Metodos em Demografia
Metodos em Demografia
Metodos em Demografia
Título
Métodos em Demografia
Autor
Ana Isabel Ribeiro
Editor
Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto
Rua das Taipas 135, 4050-600 Porto
(+351) 222 061 820
Design
Rogério Ribeiro
ISBN
978-989-35351-0-3
Capítulo 1:
18 INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA
18 Definição e objeto de estudo
20 História da demografia: das contagens à consolidação da demografia
25 Teorias da população
30 Teoria da transição demográfica
34 Transição epidemiológica
36 Bibliografia e leituras complementares
Capítulo 2:
38 DADOS DEMOGRÁFICOS: FONTES DE QUALIDADE
39 Recenseamentos
39 Aspetos gerais
43 Os recenseamentos em Portugal
47 Alternativas aos recenseamentos tradicionais
49 Registo civil
49 Aspetos gerais
51 Registo civil em Portugal
52 Estatísticas sobre as migrações
54 Inquéritos demográficos domiciliares
54 Inquéritos temáticos
56 Estimativas da população
56 Dados secundários internacionais
57 Qualidade da informação
57 Equação de concordância
57 Razão de masculinidade nos nascimentos
59 Qualidade de dados de idade
59 Índices de preferência digital
59 Índice básico de preferência digital
60 Índice de Whipple
62 Índice combinado de Myers
64 Métodos de redução do problema e ajustamento dos dados imperfeitos
65 Bibliografia e leituras complementares
66 Exercícios práticos
Capítulo 3:
68 COMPOSIÇÃO DA POPULAÇÃO POR SEXO E IDADE
69 Idade
69 Pirâmide etária
74 Índices-resumo e grupos funcionais
76 Idade mediana
78 Índice de dissimilaridade
80 Sexo
81 Bibliografia e leituras complementares
82 Exercícios práticos
Capítulo 4:
84 DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA POPULAÇÃO
84 Divisões territoriais
85 Densidade populacional
86 Distribuição absoluta e percentual
86 Rankings
87 Índice de redistribuição
88 Índice de concentração
90 Urbanização e definição de áreas urbanas
91 Mapeamento da população e Sistemas de Informação Geográfica
94 Bibliografia e leituras complementares
95 Exercícios práticos
Capítulo 5:
96 COMPOSIÇÃO SOCIOECONÓMICA E CULTURAL
96 Características etnoculturais
96 Raça e etnia
97 Língua
98 País de nascimento e nacionalidade
98 Religião
99 Características socioeconómicas
99 Escolarização
101 Analfabetismo
102 Escolaridade
103 Condição perante o trabalho
104 Setor de atividade
105 Ocupação
105 Situação na profissão
106 Rendimento
106 Índices multivariados
108 Índice de diversidade
109 Índice de segregação
110 Índice de GINI e curva de Lorenz
Capítulo 6:
116 CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO
116 Componentes do crescimento da população
119 Projeções e modelos de crescimento populacional
119 Crescimento aritmético
121 Crescimento geométrico
122 Crescimento exponencial
124 Crescimento logístico
124 Método das componentes
125 Bibliografia e leituras complementares
126 Exercícios práticos
Capítulo 7:
128 MORTALIDADE
128 Considerações gerais
129 Causas de morte e classificação internacional das doenças
131 Taxa bruta de mortalidade
132 Taxas específicas de mortalidade
133 Taxa bruta de mortalidade e proporção de mortes por causa
134 Padronização de taxas
134 Método direto de padronização
139 Método indireto de padronização
141 Comparação entre métodos
142 Comparação de taxas
142 Contingência dos pequenos números
144 Mortalidade mensal
145 Mortalidade materna e infantil
149 Bibliografia e leituras complementares
150 Exercícios práticos
Capítulo 8:
154 FECUNDIDADE, REPRODUÇÃO E NUPCIALIDADE
155 Taxa bruta de natalidade
156 Razão criança-mulher
156 Taxa de fecundidade geral
156 Taxa específica de fecundidade
157 Índice sintético de fecundidade
158 Reprodução
159 Nupcialidade e divórcio
160 Bibliografia e leituras complementares
161 Exercícios práticos
Capítulo 9:
164 MIGRAÇÕES
164 As migrações ao longo da história
166 Especificidade das migrações como fenómeno demográfico
168 Taxa bruta de emigração
169 Taxa bruta de emigração temporária
169 Taxa bruta de imigração
169 Taxa de crescimento migratório
170 Atratividade populacional por município e região em Portugal
Capítulo 10:
174 ESPERANÇA DE VIDA
174 Enquadramento histórico
176 Conceitos introdutórios
177 Construção de tábuas de mortalidade completas
185 Construção de tábuas de mortalidade abreviadas
190 Bibliografia e leituras complementares
191 Exercícios práticos
Capítulo 11:
194 SAÚDE E MORBILIDADE
194 Esperança de vida saudável
197 Prevalência e incidência
199 Anos de vida potencialmente perdidos
199 Método usando o limiar etário dos 70 anos
201 Método usando a esperança de vida
203 Anos de vida vividos com incapacidade
204 DALYs, Disability-Adjusted Life Years
204 QALY, Quality-adjusted life years
206 Bibliografia e leituras complementares
207 Exercícios práticos
21 Figura 2. Evolução da população mundial (em milhões) nos últimos 12 mil anos
(Fonte dos dados: Roser, Ritchie & Ortiz-Ospina (2013)).
47 Figura 6. Métodos usados na Europa para enumerar a população entre 2010 e 2011
(Fonte dos dados/adaptado de: Valente (2010)).
73 Figura 13. Pirâmide etária da freguesia das Lajes na ilha Terceira em 2001
(Fonte dos dados: INE).
111 Figura 16. Curva de Lorenz para o índice de GINI com base na escolaridade no
município do Porto.
121 Figura 18. Linha quebrada (quase curva) representando um crescimento geométrico.
157 Figura 23. Taxas específicas de fecundidade em Portugal, entre 1971 e 2020
(Fonte dos dados: INE).
167 Figura 24. Número anual de emigrantes portugueses, por sexo (1970-1988)
(Fonte dos dados: INE).
ÍNDICE DE TABELAS
26 Tabela 1. Cronologia de algumas das principais conceções em torno do
crescimento demográfico (Inspirada em Weeks (2012) e Bandeira (1996)).
105 Tabela 15. Grandes Grupos da Classificação Portuguesa das Profissões (CPP/2010)
107 Tabela 16. Alguns dos índices de privação socioeconómica mais utilizados
atualmente (Fontes da informação: UK Data Service (2012-2021);
Ribeiro et al (2017); Ribeiro et al (2018); Rey et al (2009)).
123 Tabela 20. Comparação de taxas e tempos de duplicação para vários modelos
de crescimento.
130 Tabela 21. Classificação de doenças proposta por Graunt (Fonte: Laurenti (1991)).
134 Tabela 23. Óbitos por causa de morte (% em relação ao total) em Portugal nos
anos de 2018 e de 1930 (Fontes: INE; Rodrigues, Moreira & Henriques (2010)).
135 Tabela 24. Estatísticas necessárias para o cálculo das taxas específicas de
mortalidade: população e óbitos por grupo etário (Fonte dos dados: INE & Instituto
Brasileiro de Opinião Pública e Estatística).
138 Tabela 25. Exemplo de padronização de taxas de mortalidade por idade pelo
método direto.
139 Tabela 26. Exemplo de padronização de taxas de mortalidade pelo método direto,
usando duas variáveis de padronização (sexo e idade) (Fonte: Rowland (2003)).
141 Tabela 27. Exemplo de padronização de taxas de mortalidade pelo método indireto.
145 Tabela 30. Indicadores de mortalidade mensal em Portugal ao longo do ano de 2013
(Fonte dos dados: INE).
158 Tabela 31. Cálculo do índice sintético de fecundidade com idades individuais e com
grupos quinquenais.
175 Tabela 32. Tábua de mortalidade de Graunt (Londres) (Fonte: Birch (1759)).
178 Tabela 33. Tábua de mortalidade completa para ambos os sexos, Portugal (2011-2013)
(Fonte de dados: INE).
186 Tabela 34. Tábua de mortalidade abreviada para ambos os sexos, Portugal (2011-2013)
(Fonte de dados: INE).
195 Tabela 35. Esperança de vida e esperança de vida saudável em Portugal (2014)
(Fonte dos dados: EUROSTAT).
196 Tabela 36. Exemplificação do cálculo da esperança de vida saudável para Portugal
2011-2013 (Fonte dos dados: INE & EUROSTAT).
202 Tabela 39. Exemplificação do cálculo dos AVPP/YLL (Portugal, 2011-2013, ambos
os sexos) com base na diferença entre a idade do óbito e a esperança de vida
(Fonte dos dados: INE).
203 Tabela 40. Seis principais contributos para os anos de vida vividos com incapacidade
(AVI/YLD) em Portugal e no Mundo em 2018 (Fonte dos dados: Institute for Health
Metrics and Evaluation).
AGRADECIMENTOS
Este trabalho não teria sido possível sem a ajuda e colaboração de várias pessoas
e instituições.
Finalmente agradeço à minha família, especialmente os meus pais, Ana Paula da Silva
Correia e José Rodrigues Ribeiro, pelo apoio incondicional, pelos conselhos e lições
de vida.
Um agradecimento especial ao meu pai, que teve a oportunidade de ler versões preliminares
deste livro e de dar as suas sugestões e críticas.
14
15
PREFÁCIO
Com este livro pretendo promover e reforçar o conhecimento dos conceitos, métodos
e problemáticas em torno da população, visando alcançar uma audiência alargada, uma
vez que a demografia é uma ferramenta de análise de alunos e profissionais de vários
ramos científicos.
16
Em paralelo, este livro pretende colmatar uma lacuna no conhecimento, que é a quase
ausência de livros e materiais que aprofundem as teorias e ferramentas demográficas mais
caras à saúde pública. Apesar de existirem diversos livros nacionais e estrangeiros de
demografia, destacando-se, em Portugal, os trabalhos de J. Manuel Nazareth (Demografia.
A ciência da população, 2004) e de Mário Leston Bandeira (Demografia. Objeto, teorias
e os métodos, 2004), é patente uma escassez de recursos que se debrucem sobre as teorias
e métodos demográficos mais usados em saúde pública, que naturalmente estão centrados
no cálculo da morbilidade e da mortalidade.
17
CAPÍTULO 1:
INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA
Interessa ainda referir que, embora a paternidade do termo seja atribuída a Guillard, a origem
da demografia enquanto ciência é comumente atribuída ao inglês John Graunt (1620-1674)
com a publicação em 1662 da primeira obra de cariz demográfico, intitulada “Natural and
Political Observations upon the Bills of Mortality”.
1 Por exemplo, em 1839, um certo capitão Bonnet editou uma “demografia universal e europeia”, que consistia
numa tabela que permitia comparar simultaneamente a evolução cronológica dos acontecimentos nos vários
países (Bonnet, 1839).
18
Desde o início, a demografia tem sido definida de diferentes formas por diferentes autores,
quer usando definições sucintas, quer mais abrangentes, refletindo a expansão do âmbito
do seu estudo que, desde a segunda metade do século XX, tem vindo a tornar-se cada
vez mais diverso e complexo. Weeks (2002), por exemplo, define-a simplesmente como
“o estudo científico da população”, enquanto Ross (1982) conceptualiza a demografia
como “o estudo quantitativo das populações humanas e das mudanças resultantes dos
nascimentos, óbitos e migrações”.
Segundo Siegel & Swanson (2004), a demografia preocupa-se atualmente com cinco
aspetos chave da população humana:
Interessa referir que estes cinco aspetos estão interligados e influenciam-se mutuamente.
Por exemplo, os baixos níveis de fecundidade causados por mudanças sociais e culturais
alteram a composição da população, tornando-a mais envelhecida e reduzida em termos de
dimensão, o que pode gerar múltiplas consequências sociais e económicas. Esta relação
intricada entre diferentes dimensões da demografia está patente na Figura 1.
19
Mortalidade e natalidade
Movimentos migratórios
Dinâmica da população
Composição etária
Por outras palavras, a demografia envolve o estudo da população, da sua dimensão, estrutura
e distribuição espacial, e das alterações espaciais e temporais causadas por mudanças nos
padrões de fecundidade, migração e mortalidade. Assim, entender os fatores responsáveis
por essas alterações faz também parte do âmbito de estudo da demografia.
As populações podem ser estudadas num ponto temporal específico (o estado da população),
avaliando-se a sua estrutura, distribuição e dimensão, mas também ao longo do tempo
(a dinâmica da população), analisando-se o seu crescimento.
Apesar de cada uma destas disciplinas ter linguagem própria, existe um conjunto de
conceitos e métodos que deverão constituir a língua franca de quem estuda as populações
humanas. Este livro, embora atribua uma maior ênfase aos métodos usados em saúde
pública, pretende igualmente precisar os conceitos e métodos chave da análise demográfica
na atualidade.
20
De facto, as primeiras preocupações com a contagem das populações surgiram com
as grandes civilizações e impérios - sumérios, egípcios, gregos e romanos - pois, até
então, a contagem da população não suscitava interesse dada a sua reduzida dimensão
e o crescimento incipiente.
Durante muito tempo, a dispersão condicionada pelo clima e pela capacidade do homem
nómada em lidar com a Natureza manteve bastante baixos os efetivos populacionais
(Figura 2). Outro motivo tem a ver com o estilo de vida caçador-coletor envolver a recolha
dos alimentos que a Natureza espontaneamente oferece. Ora, esta só pode comportar
um número relativamente reduzido de indivíduos até atingir a sua capacidade de carga -
o tamanho populacional máximo que o meio ambiente pode sustentar indefinidamente de
forma a atender às necessidades de alimento, habitat e água, entre outras.
10,000 BCE 8,000 BCE 6,000 BCE 4,000 BCE 2,000 BCE 0 2000
Figura 2. Evolução da população mundial (em milhões) nos últimos 12 mil anos (Fonte dos dados:
Roser, Ritchie & Ortiz-Ospina (2013)).
21
No Mesolítico (por volta de 10 000 a.C.), o grande crescimento das zonas florestadas obrigou
o homem a procurar as regiões à beira dos lagos, dos rios e dos mares, condições que
favoreceram a invenção da agricultura e a sedentarização. A riqueza em recursos alimentares
e madeireiros levou ao fabrico de utensílios e propiciou o crescimento demográfico.
No Neolítico (entre 8 000 e 5 000 a.C.), fruto da melhoria das condições de alimentação
e de habitação decorrentes da sedentarização da população e do surgimento da agricultura,
a população começou a crescer a um ritmo mais acelerado, crendo-se aliás que as primeiras
cidades no Médio Oriente já tenham surgido por volta de 9000 a.C.
É nesta época, com a fundação dos grandes impérios, que surgem as primeiras contagens
da população. O número de habitantes era uma questão de extrema importância para os
impérios: quanto maior a população, maior o poder militar e maiores as receitas fiscais,
pelo que o Estado precisava de realizar regularmente contagens da população. Existe
controvérsia na identificação do primeiro recenseamento (ou censo) dos tempos antigos2,
uma vez que os registos desapareceram e as menções existentes são essencialmente de
carácter literário, pelo que pouco se sabe ainda acerca da dinâmica populacional neste
período da história.
No Egipto Antigo consta que, na primeira dinastia, cerca de 3 mil anos antes da nossa era,
terá tido lugar um dos primeiros recenseamentos da história, seguido de recenseamentos
bienais e anuais nas dinastias seguintes (Nazareth, 2004). Outros defendem que o primeiro
censo foi realizado na China - em 2238 a.C., o imperador Yao mandou realizar um censo da
população e das lavouras cultivadas (INE, 2009-2014). Há também registos de um censo
do povo judaico no tempo de Moisés, cerca de 1700 a.C., e de recenseamentos anuais
realizados pelos egípcios, no século XVI a.C. (INE, 2009-2014).
É, contudo, aos romanos que devemos o termo recenseamento (de censere, ou seja,
estimar). Os romanos realizaram o seu primeiro recenseamento no século VI a. C., repetindo-
se a operação durante mais de 500 anos com periodicidade quinquenal, ocasionalmente
interrompida por guerras e perturbações políticas, tendo fins principalmente militares
e fiscais (Nazareth, 2004).
2 Não confundir estes recenseamentos com os recenseamentos modernos, exaustivos, com periodicidade
decenal e assentes em princípios rígidos. Os recenseamentos como os conhecemos atualmente surgem apenas
no século XVIII.
3 Período que se estendeu entre 900 e 1250, aproximadamente, e que se caracterizou por temperaturas
bastante acima do habitual, especialmente no Hemisfério Norte. Seguiu-se-lhe a chamada Pequena Idade do
Gelo, que – com interrupções – se estendeu até à Revolução Industrial.
22
Embora, após a queda do Império Romano, a prática de contagens populacionais fosse
pouco comum, na Idade Média (e sobretudo na Baixa Idade Média) realizaram-se diversas
contagens na Europa que merecem menção. No reinado de Carlos Magno (768-814)
e nas repúblicas italianas, séculos XII e XIII, tiveram também lugar contagens da população.
No século XI efetuou-se na Inglaterra o maior registo estatístico da época (finalizado em
1086), o Doomsday Book, encomendado por Guilherme, o Conquistador, com vista a estimar
a quantidade de impostos.
30000000
25000000
20000000
15000000
10000000
5000000
0
1350
1400
1457
1500
1550
1560
1580
1600
1620
1650
1680
1700
1715
1730
1740
1750
1760
1770
Figura 3. Evolução da população francesa entre 1350 e 1770 (Fonte dos dados: Dupâquier (1988)).
23
Embora nenhuma dessas epidemias tenha sido tão mortal como a primeira, a doença
voltou à Europa em cada geração até ao início do século XVIII. Porém, ao contrário do que
sucedera antes, as crises de mortalidade que marcaram o período 1350-1750 não impediram
o crescimento dos efetivos populacionais mundiais, ainda que de forma irregular e bastante
moderada, como se vê na Figura 3, referente a França. Foi com estas sucessivas crises de
mortalidade que ressurgiu o interesse na dinâmica da população.
Foi também por esta altura, mais concretamente no século XVI, em consequência da
Reforma, que se começaram a registar sistematicamente três eventos demográficos
essenciais: nascimentos, óbitos e matrimónios. Os registos paroquiais foram tornados
obrigatórios na Inglaterra em 1538, após a separação da Igreja de Roma, coincidindo no
tempo com a adoção dessa medida na Alemanha nas áreas de confissão luterana. Noutros
países protestantes, nomeadamente na Escandinávia, embora algumas paróquias por
iniciativa própria os fizessem há muito, só se tornaram universais no final do século XVII.
Por sua vez, no mundo católico, em 1563, o Concílio de Trento também decretou para os
párocos a obrigação de efetuar e manter atualizados registos dos batismos, casamentos
e sepulturas nos livros de assento paroquiais.
Além disso, Graunt construiu a primeira, ainda que rudimentar, tábua de mortalidade (tema
explorado no capítulo 10), hoje amplamente usada para o cálculo da esperança de vida.
Importa referir que ele não detinha qualquer educação formal na área e trabalhou grande
parte da vida como comerciante de roupas e tecidos. Depois da publicação desta obra, foi
em 1662 eleito membro da Royal Society, instituição destinada à promoção do conhecimento
científico fundada em 1660 em Londres. Com Graunt e o impulso do seu discípulo William
Petty (1623-1687), dá-se ainda o nascimento da chamada aritmética política, desenvolvida em
torno da Royal Society, que consiste no estudo das estatísticas económicas e demográficas
dos países e estados.
24
Apesar da mencionada longa história de contagens populacionais, estas tinham
essencialmente fins fiscais, militares e religiosos, não fornecendo, portanto, uma visão
global do estado da população. Em contrapartida, os recenseamentos modernos obedecem
a normas estritas e universais, devendo ter uma periodicidade fixa, ser exaustivos, enumerar
toda a população e ser realizados por um organismo e um pessoal especializados. Foi no
século XVIII, com a expansão da aritmética política e a noção de que as estatísticas são
factos indispensáveis às sociedades modernas, que a ideia de recenseamento e da melhoria
das estatísticas nacionais se impôs (Bandeira, 2004). O primeiro recenseamento moderno
ter-se-á realizado na Suécia/Finlândia (1749), estendendo-se de seguida à Noruega em
1760 e à Dinamarca em 1769. Os EUA seguiram o exemplo nórdico, com a realização de
recenseamentos obrigatórios desde 1790.
TEORIAS DA POPULAÇÃO
25
Tabela 1. Cronologia de algumas das principais conceções em torno do crescimento demográfico
(Inspirada em Weeks (2012) e Bandeira (1996)).
1300 a.C. “Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a Terra.” Génesis (Antigo Testamento)
26
De facto, já na Antiguidade alternavam atitudes populacionistas e antipopulacionistas.
Confúcio (551-479 a.C.), Platão (428-348 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.) consideravam que
o crescimento populacional excessivo baixava o nível de vida e levava à pobreza. Platão, por
exemplo, defendia a ideia de população estacionária, de crescimento zero, como uma forma
de garantir o desenvolvimento da nação, a democracia e a divisão do trabalho. Já para os
romanos, o poder de Roma e a extensão do seu império exigiam uma atitude populacionista.
Cícero (106-43 a.C.), por exemplo, referia que o crescimento da população assegurava
a substituição das perdas causadas pelas guerras e garantia que fosse possível colonizar
novos territórios. Do mesmo modo, os hebreus consideravam positivas a multiplicação
e a densidade populacionais.
Foi neste contexto que Thomas Robert Malthus (1766-1834), um abastado economista
britânico, publicou em 1798 um livro que a posteridade irá conhecer pelo nome de
“Ensaio sobre o Princípio da População” e que reavivou o debate entre populacionistas
e antipopulacionistas. Claramente antipopulacionista, Malthus defendia que as consequências
do crescimento populacional seriam inevitavelmente a pobreza e a miséria, porque
a população acabaria por exceder a oferta de alimentos, devido ao instinto do ser humano
em se reproduzir.
27
25 anos, crescendo de período em período, segundo uma progressão geométrica, enquanto
os recursos têm tendência a crescer em progressão aritmética.” (Nazareth, 2004).
A polémica em torno da sua obra acentuou-se com a segunda edição do ensaio e com
a inclusão do capítulo do “grande banquete da natureza”, onde Malthus abertamente
condenava a assistência aos pobres:
“Um homem que nasce num mundo ocupado, se não lhe é possível obter dos seus pais
os meios de subsistência... e se a sociedade não tem necessidade do seu trabalho,
não tem direito a reclamar a mínima parte de alimentação e, na realidade, está a mais.
No grande banquete da natureza não existe talher disponível para ele; a natureza diz
para ele se ir embora e não tardará a executar esta ordem salvo se recorrer à compaixão
de alguns convivas do banquete. Se estes se apertarem para dar lugar, outros intrusos
se apresentarão reclamando os mesmos favores. A notícia de que existem alimentos
para todos os que chegam enche a sala de numerosas pessoas. A ordem e a harmonia
da festa são perturbadas, a abundância que reinava anteriormente transforma-se em
fome e a alegria dos convivas é aniquilada pelo espetáculo de miséria e de penúria que
reinarão em todas as partes da sala e pelos clamores inoportunos daqueles que estão
furiosos por não encontrarem os alimentos que lhes tinham prometido.”
(retirado de Nazareth, 2004)
População
Produção alimentar
Quantidade
Catástrofe malthusiana
Tempo
28
Praticamente contemporâneas e coincidentes com as teses de Malthus, foram as opiniões
expostas em 1793 na China por Hong Liangji, filósofo e conselheiro do imperador Jiaqing,
através do ensaio “Sobre a Governação e o Bem Estar do Império”, onde mostrava
preocupação com a insustentabilidade do rápido crescimento populacional do país, face ao
menor crescimento dos recursos alimentares, mas acreditava que o problema poderia ser
aliviado pelas consequências demográficas de catástrofes naturais como cheias, secas
e pestes.
A teoria da Malthus acabou por ser em grande medida desmentida no século XX, visto
que a população mundial não cresceu ao ritmo previsto (a natalidade nas grandes cidades
acabou por abrandar devido ao uso de métodos anticoncecionais) e inovações nos métodos
de produção agrícola e industrial melhoraram sensivelmente os níveis de abastecimento
e alimentação.
Interessa referir que, em simultâneo com Malthus, outros autores – como William Godwin
e Condorcet – defendiam o pensamento oposto, ou seja, que o progresso tecnológico,
conjugado com uma melhor distribuição da riqueza, iria permitir que o crescimento
populacional prosseguisse, sem que tal comprometesse o aumento do nível de vida.
No mesmo sentido, embora de uma forma mais radical, se pronunciaram os teóricos socialistas
e marxistas, defensores de uma sociedade sem classes. Como se esperaria, Karl Marx
e Engels discordaram profundamente da visão de Malthus e argumentaram que a melhoria
das condições de vida só seria alcançada através de mudanças na estrutura social –
passagem do capitalismo para o socialismo e o comunismo.
29
Em 1932 é publicado um livro polémico (“Admirável Mundo Novo” ) que via o sexo como uma
atividade recreativa e não reprodutiva. Embora as ideias neomalthusianas tenham circulado
essencialmente em círculos minoritários (feministas, anarquistas), foram progressivamente
assimiladas pelas sociedades, contribuindo (segundo alguns) para a queda dos níveis de
fecundidade nos países de alto rendimento.
Vários autores contribuíram para o nascimento da referida teoria, nomeadamente John Stuart
Mill (que defendia que a população estabilizaria à medida que as pessoas procurassem
progresso social, cultural e moral) e Arsène Dumont (defensor da ideia de capilaridade
social, isto é, do desejo inato do homem em subir na hierarquia social, o que implicaria
menos descendência).
Porém, a ideia da existência de uma transição de altas para baixas taxas de natalidade
e mortalidade, com um aumento intersticial nas taxas de crescimento, levando a uma
população maior no final da transição do que no início, emerge em 1929 com Warren
30
Thomson (1887-1973). Thomson, com base em informação de diversos países referente ao
período 1908-27, criou três grupos de acordo com o padrão de crescimento populacional:
grupo A (norte da Europa, Europa Ocidental e Estados Unidos), que experimentava um
declínio no crescimento da população; grupo B (Itália, Espanha e países eslavos da Europa
Central), onde já começavam a reduzir-se a natalidade e especialmente a mortalidade;
e o grupo C (resto do mundo), onde não existia evidência de redução na mortalidade e na
natalidade. Contudo, foi Frank Wallace Notestein (1902-1983) quem, 16 anos depois, lançou
o termo transição demográfica e rebatizou os grupos de países A, B e C.
Mais tarde, com a constatação que muitos países apresentavam uma queda no número
de nascimentos particularmente acentuada, foi proposta uma quinta fase no modelo da
teoria da transição demográfica, que recebeu o nome de fase “pós-transição”, em que
o nível de fecundidade é tão baixo que não garante a substituição das gerações, pelo que
o crescimento demográfico é negativo. Esta fase está a ocorrer em alguns países europeus,
como é o caso de Portugal.
31
1º fase 2ª fase 3ª fase 4ª fase 5ª fase
quase-equilibrio antigo declínio da mortalidade declínio da fecundidade quase-equilibrio moderno pós-transição
40
30
20
10
Necessárias menos
crianças devido
São necessárias crianças para a agricultura,
Causas para a redução da Planeamento familiar;
muitas das quais morrem;
alterações na mortalidade infantil; Casamento tardio e melhoria do estatuto social
Religião/sociedade encoraja a natalidade;
natalidade Escolarização da e económico da mulher
Ausência de planeamento familiar.
mulher; Planeamento
familiar
Doenças, fomes
Causas para Melhoria dos cuidados de saúde, sistemas de
e conhecimentos Bons cuidados de saúde
alterações na água e saneamento e alimentação
médicos insuficientes > melhoria do estado de saúde da população
mortalidade > redução da mortalidade infantil
> elevada mortalidade
Todos os países de baixo rendimento já passaram ou estão a passar pela 2ª fase e muitos
já chegaram à 3ª fase. A totalidade dos países de alto rendimento encontra-se na 4ª e última
das fases clássicas da transição demográfica e alguns já entraram mesmo na pós-transição.
Porém, importa lembrar que estes países não transitaram ao mesmo tempo entre as várias
fases da transição demográfica.
32
Por exemplo, Portugal é um caso particular4, caracterizado pelo tardio recuo da mortalidade
(finais do século XVIII), decorrendo a queda da fecundidade (meados do século XX) num
espaço de tempo mais curto que a generalidade dos países europeus. Contudo, Portugal
“recuperou” o atraso com grande rapidez e é hoje um dos países mais envelhecidos do
mundo – apresentando uma esperança de vida elevada e níveis de fecundidade muito
baixos. Outra característica específica da transição demográfica portuguesa é o dualismo
entre o Sul (onde a evolução seguiu de perto o modelo europeu) e o Norte do país, onde se
manifestou mais tardiamente a queda da natalidade, sendo esta clivagem interpretada por
diversos autores como resultante das diferenças entre as duas regiões do país, em termos
de prática religiosa e de estrutura social (Bandeira, 1996).
b. Parâmetros não ajustados a todas as sociedades, pois mesmo dentro da Europa existem
grandes diferenças entre as datas de início da queda da natalidade e da mortalidade
e os seus níveis de partida variam muito de país para país.
e. Etnocentrismo, ou seja, a ideia de que o que aconteceu nos países de alto rendimento
irá acontecer da mesma forma nos restantes países..
4 Nem sequer enquadrável no chamado modelo de transição mediterrâneo, proposto por CJ. C. Chesnais para
Grécia, Itália, Espanha e Portugal (Bandeira, 1996).
33
TRANSIÇÃO EPIDEMIOLÓGICA
34
3. Era das doenças degenerativas causadas pelo Homem – Nesta fase, as pandemias
infeciosas são definitivamente substituídas por doenças crónicas e degenerativas
e os agentes infeciosos deixam de ser os maiores contribuintes para a morbimortalidade,
sendo substituídos pelas causas antropogénicas. A redução da mortalidade fez com
que a esperança de vida superasse os 50 anos. A fecundidade passou a ditar
o crescimento populacional. Nos países de alto rendimento, esta transição marca o
fim do século XIX e o início do século XX. Neste período dá-se também uma drástica
redução na mortalidade infantil.
4. Era das doenças degenerativas tardias – Surge numa publicação mais recente de
Olshansky & Ault (1986) e descreve a fase em que muitos países se encontram desde
os anos 60. Caracteriza-se pelo avançar da idade da morte, devendo-se os incrementos
na esperança de vida sobretudo ao aumento da sobrevivência dos mais velhos.
O padrão de causas de mortalidade mantém-se, com o predomínio das doenças crónicas
e degenerativas.
35
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Graunt, J. (1939). Natural and political observations made upon the bills of mortality.
The Johns Hopkins Press.
INE (2009-2014, 16 abr. 2020). Breve história dos Censos. Instituto Nacional de Estatística.
https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=CENSOS&xpgid=censos_bhistoria
Lundquist, J. H., Anderton, D. L., & Yaukey, D. (2014). Demography: the study of human
population. Waveland Press.
Malthus, T. R. 1798. The Essay of the Population Principle. Oxford World’s Classics reprint:
xxix, Chronology.
McEvedy, C., & Jones, R. (1978). Atlas of world population history. Penguin Books Ltd.
Olshansky, S. J., & Ault A. B.(1986). The Fourth Stage of the Epidemiologic Transition:
The Age of Delayed Degenerative Diseases. The Milbank Quaterly, 64(3), 355-391.
Roser, M., Ritchie, H., & Ortiz-Ospina, E. (2013, 1 set. 2021). World Population Growth.
Our World in Data.
https://ourworldindata.org/world-population-growth
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
36
37
CAPÍTULO 2:
DADOS DEMOGRÁFICOS: FONTES DE QUALIDADE
38
RECENSEAMENTOS
Aspetos gerais
Como foi referido anteriormente, os primeiros censos datam de antes da nossa era, sendo
então realizados com fins militares e fiscais, pelo que mulheres, crianças (e escravos) não
eram normalmente enumerados. Data de 1853, com a realização do Congresso Internacional
de Estatística em Bruxelas, o início da normalização internacional dos recenseamentos da
população e a recomendação para a sua realização decenal. Atualmente, a ONU recomenda
que cada país realize pelo menos um censo a cada 10 anos e que este deverá ter lugar em
anos terminados em zero. Destaca ainda cinco princípios base dos censos:
5 Para a maioria dos dados, será o dia do censo; em alguns casos (informação acerca de fecundidade
e mortalidade), pode ser um período anterior ao censo (por exemplo, de duração 1 ano).
39
• O recenseamento deve ter uma periodicidade definida, devendo ser realizado em
intervalos de tempo regulares, pelo menos de 10 em 10 anos, para que a informação
possa ser comparável ao longo do tempo e entre países.
Embora o conteúdo dos recenseamentos varie de país para país e ao longo dos tempos,
atualmente, um conjunto mínimo de informações é considerado fundamental, de forma
a garantir comparabilidade internacional:
Interessa referir que o âmbito das questões dos recenseamentos tem vindo a alargar-se.
Por exemplo, muitos países já incluem questões acerca da presença de incapacidade (esta
variável surge pela primeira vez nas recomendações de 2000), de variáveis como a religião ou
a etnia (normalmente opcionais, dependendo muito a inclusão do seu reconhecimento como
relevantes pelos decisores nacionais) e ainda de informação sobre a fecundidade (serve
essencialmente para avaliar a qualidade da informação, através do cruzamento com dados
do registo civil ou de questionários, sendo por isso comum em países de baixo rendimento).
A Tabela 2 apresenta a lista de variáveis obrigatórias segundo as últimas recomendações
da ONU.
Tabela 2. Tópicos a incluir nos censos de acordo com as recomendações das Nações Unidas
(Fonte da informação: ONU (2017)).
41
A realização de um censo envolve múltiplas etapas, a saber: definição do enquadramento
legal e administrativo; campanhas de sensibilização; desenvolvimento do(s) questionário(s);
atualização e produção de cartografia; definição das áreas de enumeração; pré-teste (censo
piloto); análise de dados; avaliação da qualidade da informação; e difusão da informação.
• Custos demasiado elevados - Dificilmente podem ser reduzidos, a menos que se use
outras formas de enumeração ou recenseamentos de menor qualidade.
42
Nos inquéritos de qualidade pós-censo, um conjunto de áreas é amostrada e enumerada com
especial cuidado e os resultados são depois comparados com os obtidos no censo global.
Os métodos de validação, por outro lado, incluem técnicas simples que impedem o registo
de informação implausível (ex.: uma mulher com 25 anos que diga ter 20 filhos). Finalmente,
nos países com boa infraestrutura estatística, é possível comparar a informação do censo
com, por exemplo, dados do registo civil. Assim, por exemplo, o número de crianças com
menos de 10 anos que foram contabilizadas num censo deverá ter alguma correspondência
com o número de nascimentos/óbitos infantis que ocorreram nos 10 anos precedentes.
Os recenseamentos em Portugal
6 Era comum registarem apenas os fogos ou os homens válidos, consoante o objetivo a que se destinavam.
Mais tarde, durante o liberalismo, estes “recenseamentos” tornaram-se muito mais frequentes (realizaram-se 16
entre 1835 e 1862), pois era neles que se baseava o número de deputados a eleger em cada província do Reino.
7 Tal como os censos de 1838 e 1841 (para além de outros não mencionados na tabela), o censo de 1820,
publicado em 1826 no periódico Almanach Portuguez, foi da responsabilidade de Marino Miguel Franzini
(1779-1861), cuja longa vida foi pautada por uma atividade incansável e pioneira, ainda pouco conhecida da
generalidade dos portugueses, que não se restringiu à demografia, mas abrangeu áreas tão diversas como a
cartografia, a hidrografia, a meteorologia, a sismologia, a matemática, a economia e a política, entre outras.
8 Apenas o Continente.
43
Embora as orientações já indicassem que os recenseamentos deveriam ser realizados de
10 em 10 anos, o censo seguinte apenas se realizou em 1878, seguindo-se o de 1890.
A partir de então, os recenseamentos da população têm vindo a realizar-se, com algumas
exceções, em intervalos regulares de 10 anos. Por exemplo, a turbulência vivida com
a implantação da República em 1910 motivou a não realização do censo nesse ano, o qual
acabou por ter lugar em 1911.
44
XIII Recenseamento Geral da População
15 de abril de 1991 9 862 540
e III Recenseamento Geral da Habitação
Para assegurar a recolha de dados, é criada uma estrutura vasta e bem organizada, que
engloba o INE e as suas delegações, bem como as câmaras municipais e juntas de freguesia.
Antes da realização do censo, é necessária a elaboração e a execução de um conjunto de
instrumentos de apoio e de operações prévias: base cartográfica, enquadramento legal,
questionário e operações experimentais.
45
Um desses instrumentos é a base cartográfica de referência, denominada em Portugal BGRI
(Base Geográfica de Referenciação da Informação). Esta divide o território das freguesias
em pequenas unidades territoriais estatísticas − secção estatística, subsecção estatística
e lugar − e é um instrumento essencial de apoio, pois serve para planear e executar o trabalho
de campo e constitui a base para a difusão dos resultados. A secção estatística, por exemplo,
é uma unidade territorial contínua dentro de uma freguesia, com cerca de 300 alojamentos
destinados à habitação, e constitui a área de trabalho do recenseador. Já a subsecção
estatística é a unidade mínima de disseminação de dados e identifica a mais pequena área
homogénea de construção (ou não), dentro da secção estatística, correspondendo grosso
modo ao quarteirão nas áreas urbanas e ao lugar (ou parte dele) nas áreas rurais.
Antes do censo, são ainda realizadas operações experimentais que têm o objetivo de testar
e avaliar as opções técnicas e organizativas que melhor garantam o sucesso da realização
do censo. Os primeiros testes, usualmente levados a cabo na preparação de uma operação
censitária, dizem respeito aos questionários. O objetivo é testar a aceitação e o entendimento
das perguntas e respetivas instruções por parte da população, assim como conhecer
a opinião da população sobre a organização e o desenho dos questionários. Em Portugal,
um ano antes da operação censitária é efetuado um censo piloto, podendo ser realizadas
outras operações experimentais adicionais.
Os censos são operações que, para além das dificuldades nos trabalhos de recolha,
apresentam um volume de dados para tratamento extremamente pesado, quer no que respeita
à transferência de suporte papel para suporte informático, quer em termos de codificação de
algumas variáveis, quer ainda na validação e correção dos dados introduzidos em ficheiros.
46
Alternativas aos recenseamentos tradicionais
Porém, por motivos de ordem prática e económica, alguns países adotam outras formas
de recensear a população. Veja-se que, entre 2010 e 2011, cerca de metade dos países
europeus usaram alternativas aos recenseamentos tradicionais, nomeadamente registos,
uma combinação de registos e censo tradicionais e rolling census (Figura 6).
Islândia
Finlândia
Rússia
Noruega
Suécia
Estónia
Letónia
Dinamarca
Lituânia
Irlanda Bielorrúsia
Países
Baixos
Reino Unido
Polónia
Ucrânia
Alemanha
Bélgica
Luxemburgo República
Checa
Moldávia
Eslováquia
Áustria
Hungria
França Suíça Roménia
Eslovénia
Croácia
Bósnia
e Hezegovina Sérbia
Bulgária
Itália
Montenegro
Macedónia
Albânia
Portugal
Espanha
Grécia
Figura 6. Métodos usados na Europa para enumerar a população entre 2010 e 2011
(Fonte dos dados/adaptado de: Valente (2010)).
47
Alguns países deixaram de necessitar de realizar censos decenais (Áustria, Dinamarca,
Finlândia, Israel, Japão, Noruega e Suécia), ao adotar um sistema de registo populacional
onde a informação provém de registos administrativos (saúde, segurança social, finanças,
etc.). Neste sistema, cada pessoa tem um número de identificação único em todos os
registos, o que permite que a informação destes registos (nascimentos, casamentos, morte,
etc.) seja relacionada e atualizada no registo populacional central. Isto significa que estes
dados podem ser usados para análise longitudinal.
Países como o Canadá usam um recenseamento constituído por dois questionários. Aqui,
um questionário mais longo é aplicado a uma amostra da população, enquanto o questionário
breve é aplicado à totalidade. O questionário curto é usado para fins de contagem da
população, enquanto os questionários longos permitem explorar aspetos mais específicos,
muito embora isso impeça a disponibilização de informação para pequenas áreas.
48
REGISTO CIVIL
Aspetos gerais
• Cobertura universal, devendo incluir todas as informações de eventos civis que ocorrem
em todas as áreas geográficas e em todos os grupos populacionais do país.
• Disseminação regular dos dados, devendo fornecer (a) contagens sumárias mensais
ou trimestrais de eventos vitais com rapidez, de forma a fornecer informações para
programas de intervenção em saúde e para o cálculo de estimativas de população,
entre outros usos; e (b) tabelas cruzadas com cada tipo de evento vital de acordo com
características demográficas e socioeconómicas.
49
Tabela 5. Tópicos prioritários no registo de nascimentos e óbitos segundo as Nações Unidas
(Fonte: ONU (2014)).
Nascimentos
Data do nascimento
Data de registo
Local do nascimento
Local de registo
Natureza do parto (simples, gemelar)
Assistência (médico, enfermeira parteira, sem assistência, etc.)
Características da criança
Sexo
Peso à nascença
Características da mãe
Idade (ou data de nascimento)
Estado civil
Escolaridade
Local de residência habitual
Nados-vivos ao longo da vida
Nados vivos ainda vivos ao longo da vida
Mortes fetais ao longo da vida
Data de nascimento do último nado-vivo
Data de casamento
Características do pai
Idade (ou data de nascimento)
Estado civil
Escolaridade
Local de residência habitual
Óbitos
Data de ocorrência
Data de registo
Local de ocorrência
Local de registo
Causa de morte
Certificador
Idade (ou data de nascimento)
Sexo
Estado civil
Local de residência habitual
Local de residência habitual da mãe (no caso de óbitos infantis)
50
As estatísticas do registo civil, em particular as estatísticas vitais de nascimentos e óbitos,
são importantes para estimar o tamanho e o crescimento da população, já que estes números
só são por norma obtidos à data dos censos em intervalos decenais, e para avaliar/delinear
programas governamentais de saúde pública e de saúde materno-infantil.
Embora as operações censitárias exijam enormes esforços financeiros, estes são pontuais,
ao passo que um registo civil exige a manutenção de um sistema burocrático ininterrupto
em cada localidade, que envolve gastos permanentes. Por esta razão, em muitos países
de baixo rendimento o registo civil é ausente ou apresenta fraca qualidade. Apenas 25% da
população mundial vive em países com um sistema de registo de nascimentos e óbitos de
qualidade.
Interessa referir que, em países que não possuem um sistema adequado de registo civil
(como sucede ainda em muitos países africanos), são realizados censos e inquéritos
que, por esse motivo, frequentemente incluem também questões acerca dos óbitos e dos
nascimentos ocorridos entre os residentes do agregado familiar.
Em Portugal, a partir de 1536 (ou seja, ainda antes do Concílio de Trento que instituiu
a obrigação de manter registos paroquiais em todas as igrejas), a Igreja Católica tornou-se
responsável pelo registo dos nascimentos (ou melhor, dos batismos), casamentos e óbitos,
nos livros de assento paroquiais.
O registo civil em Portugal foi oficialmente instituído pelo “Código do Registo Civil” de 18
de fevereiro de 1911, logo após a implantação da República, sendo também determinado
que todos os registos paroquiais anteriores a 1911 gozassem de eficácia civil e fossem
transferidos das respetivas paróquias para as recém-instituídas conservatórias do registo
civil.
Em Portugal, são factos sujeitos a registo civil, entre outros: o nascimento e o óbito,
a filiação (ligação do filho com seus pais, seja biologicamente ou por adoção), o casamento,
a adoção, as convenções antenupciais (ex.: escolha do regime de bens que vigorará durante
o matrimónio), a regulação do exercício do poder paternal (definir o destino dos filhos, fixar
a pensão de alimentos e o regime de visitas do progenitor que não tem a cargo a criança),
a inibição ou suspensão do exercício do poder paternal, a interdição e a inabilitação
definitivas10, a tutela de menores ou interditos.
9 Trata-se do decreto nº 23 de Mouzinho da Silveira, que revolucionou todo o sistema administrativo português
e que foi publicado nos Açores, em plena guerra civil entre liberais e miguelistas.
10 A interdição é a declaração por sentença judicial de que um determinado indivíduo fica impedido, à face da
51
Às conservatórias compete também o registo de casamentos e óbitos ocorridos no
estrangeiro, quando tenham no seu arquivo o assento de nascimento de algum dos nubentes
ou do falecido, e a receção dos pedidos de emissão, substituição e cancelamento do cartão
de cidadão.
As estatísticas vitais (mortes, nascimento, nupcialidade), bem como as que dizem respeito aos
fluxos migratórios, saem regularmente na publicação anual do INE, Estatísticas Demográficas
(início 1967). Já as Estatísticas de Saúde (desde 1969), com uma periodicidade igualmente
anual, dão mais importância às causas de morte. As Estatísticas Demográficas têm maior
desagregação geográfica (município ou mesmo freguesia), enquanto as Estatísticas de
Saúde se ficam pelo nível da NUT 311. A nível internacional, as estatísticas do registo civil
são publicadas e compiladas regularmente nas publicações da Organização Mundial de
Saúde, “World Health Report” e “World Health Statistics”, e na da ONU, “Population and Vital
Statistics Report”.
Fixemo-nos no caso português. Até 1988, a recolha de informação estatística por parte do
INE, a respeito do fenómeno migratório, provinha da emissão do passaporte de emigrante e,
portanto, limitava-se ao fluxo de emigrantes portugueses para os países estrangeiros. Deste
modo, com a abolição nesse ano do referido passaporte (os emigrantes passaram a poder
usar um passaporte comum), houve uma interrupção da série estatística até então existente.
lei, de poder exercer diretamente e por si os seus direitos, por se encontrar incapaz de governar a sua pessoa
e os seus bens. Podem ser inabilitados todos aqueles que sofram de doença mental, de surdez-mudez ou de
cegueira, e em que, embora com permanência, a sua gravidade não seja suficiente para os impedir de praticarem
certos atos de gestão da sua pessoa e bens. Podem ainda ser inabilitados todos os que se tornem dependentes
de drogas ou álcool e ainda os que pratiquem com frequência atos ruinosos ou despesistas e sem justificação na
gestão dos seus bens (prodigalidade).
11 NUT, Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos.
52
A alternativa encontrada foi a inclusão em 1992 de um módulo sobre emigração no
Inquérito ao Emprego (efetuado por amostragem aos alojamentos familiares). Esse módulo
foi o Inquérito aos Movimentos Migratórios de Saída (IMMS), de periodicidade trimestral.
Assim, a partir de 1999, no âmbito de um protocolo de cooperação entre o INE e o SEF, passou
a dispor-se de informações detalhadas e atualizadas sobre os pedidos de autorização de
residência e a emissão do título de residente, pelo que se passou a controlar estatisticamente
o fenómeno da imigração. Persistem, no entanto, dificuldades na articulação entre os dois
organismos, até porque o conceito de “estrangeiro residente” continua a não ser idêntico
para ambos: o SEF segue a definição legal em vigor, ao passo que o INE remete para uma
duração da permanência em território nacional igual ou superior a um ano.
Refira-se que, para além destes organismos, intervêm também na gestão da emigração
de nacionais e no processo de entrada, permanência e saída de estrangeiros em território
nacional, entidades como a Direção Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades
Portuguesas (emissão de vistos de estudo, de estada temporária e de trabalho), a Inspeção
Geral de Trabalho (regularização da situação de trabalhadores estrangeiros), o Secretariado
Técnico dos Assuntos para o Processo Eleitoral (recenseamento eleitoral de emigrantes
e de residentes estrangeiros12) e a Direção Geral dos Registos e Notariado (naturalização
de cidadãos estrangeiros).
Contudo, ainda têm sido detetadas algumas fragilidades nos vários processos de recolha de
informações sobre os fenómenos migratórios, tanto ao nível da cobertura, como ao nível da
qualidade da informação recolhida.
INQUÉRITOS
12 Podem votar nas eleições portuguesas, para os órgãos das autarquias locais, desde que recenseados em
Portugal, cidadãos da União Europeia e, desde que tenham título de residência há pelo menos dois ou três anos,
cidadãos do Brasil, de Cabo Verde e de mais alguns países, essencialmente da Europa Nórdica e da América
Latina.
53
população (amostra). Em consequência dessa diferença, os censos não podem exceder
uma dimensão razoável (limitando assim o âmbito da informação recolhida), enquanto os
inquéritos podem ser mais extensos e ambiciosos, abordando temas mais específicos e com
mais detalhe.
Como referido atrás, manter um registo civil permanente é particularmente difícil em países
de baixo rendimento. Assim, nestes países, os inquéritos demográficos são normalmente
usados como alternativa. É verdade, claro, que estes inquéritos não permitem a monitorização
e a análise permanentes dos eventos vitais, nem apresentam a qualidade de um registo
civil. Porém, podem fornecer dados nacionais detalhados através de questões de natureza
retrospetiva.
Embora alguns inquéritos sejam feitos por entidades nacionais, há exemplos muito
relevantes de inquéritos realizados por agências internacionais, como as Demographic and
Health Surveys (Inquéritos Demográficos e de Saúde, DHS, iniciados em 1984 cobrindo
a população em geral), levadas a cabo pela consultora ORC Macro para a United States
Agency for International Development (USAID); as Living Standards Measurement Study
(LSMS, iniciados em 1980), realizadas com a assistência técnica do Banco Mundial; e as
Multiple Indicator Cluster Surveys (Inquéritos de Indicadores Múltiplos, MICS, iniciados em
1995, cobrindo indicadores de saúde materna e infantil), realizadas pela United Nations
Children’s Fund (UNICEF). Estes programas são desenvolvidos em países de África, Ásia,
América Latina, Caraíbas e Médio Oriente.
Inquéritos temáticos
Designação Descrição
54
Inquérito à Educação e Formação de Adultos A maioria dos países realiza periodicamente este
(União Europeia: AES), tipo de inquéritos, cujas informações alimentam
depois bases de dados internacionais, como a da
Organização Mundial de Saúde.
Inquérito às Condições de Vida e Rendimento Realizado desde 2004 (anual). Tem cariz transversal
(União Europeia: EU-SILC), e longitudinal, inclui indivíduos com 16 anos ou mais
e reúne variáveis relacionadas com o rendimento,
condições do alojamento, bem como algumas
informações sobre incapacidades físicas e estado
de saúde. Tem sido bastante usado em estudos
epidemiológicos. O último EU-SILC (2019) incluiu
a totalidade dos estados membros e alguns países da
EFTA.
Inquérito aos Movimentos Migratórios de Saída Realizado desde 1992 (anual). Surgiu em 1992 da
(IMMS) necessidade de obter informação estatística relativa
à emigração em Portugal, após a entrada em vigor
do Decreto-lei n.º 438/88, de 29 de novembro, que
aboliu o passaporte de emigrante. O passaporte
de emigrante era, até então, a fonte administrativa
utilizada para a recolha de informação estatística
relativa ao fluxo emigratório de nacionais. O IMMS
é utilizado como método de recolha da informação
estatística relativa ao movimento emigratório dos
residentes em Portugal e funciona como um módulo
anexo ao Inquérito ao Emprego (IE). Trata-se de um
inquérito por amostragem que visa obter informação
estatística sobre o movimento emigratório dos
residentes em Portugal, quer sejam portugueses ou
não, que deixam anualmente Portugal para trabalhar
ou viver no estrangeiro. O questionário incide sobre
os residentes de alojamentos selecionados de forma
probabilística (não há limites etários).
55
ESTIMATIVAS DA POPULAÇÃO
• International Data Base (IDB), uma base de dados online que contém tabelas
com informação socioeconómica e demográfica de vários países do mundo, da
responsabilidade do US Census Bureau.
• Eurostat, que publica informação comparada para todos os países da União Europeia ao
nível das NUT, proveniente de censos, estimativas da população e inquéritos europeus.
• Organização Mundial de Saúde, que, entre outros, publica a “WHO Mortality Database”,
uma compilação de dados de mortalidade por idade, sexo e causa da morte,
reportados anualmente pelos estados membros, provenientes dos seu sistemas de
registo civil.
56
QUALIDADE DA INFORMAÇÃO
Como referido ao longo deste capítulo, embora existam diversos sistemas de recolha
de informação demográfica, estes não estão livres de erros e imprecisões. Para manter
o rigor das análises demográficas, é comum procedermos a uma análise da qualidade da
informação. Embora existam métodos muito diversificados, adaptados aos diferentes tipos
de erros, apresentam-se a seguir algumas das técnicas mais utilizadas na identificação de
erros, quer nos censos, quer nos registos vitais. Estes procedimentos não costumam ser
aplicados em países onde a maior parte da população é escolarizada e a qualidade das
estatísticas é alta, mas apenas nos países de baixo rendimento.
Equação de concordância
Px+t = Px + N − O + I − E
A situação mais comum é existirem diferenças entre os dois membros da equação, devido
à falta de qualidade dos dados. A não concordância pode dever-se a má qualidade dos
recenseamentos, do registo civil ou dos sistemas de monitorização das migrações.
Nos países de alto rendimento com um registo de eventos vitais eficiente e recenseamentos
de qualidade, as diferenças encontradas advém normalmente do registo incompleto ou
errado dos movimentos migratórios, cuja contabilização rigorosa enfrenta problemas difíceis
de ultrapassar, mesmo em países onde os registos populacionais gozam de particular
fiabilidade.
Nascimentos masculinos
Razão de masculinidade = × 100
Nascimentos femininos
57
Assim, valores fora desse intervalo podem sugerir que tenha ocorrido de algum tipo de
subregisto. Porém, se o número de nascimentos observados não é suficientemente grande,
alguns desvios podem ser consequência direta de flutuações aleatórias. Assim, em função
do número de nascimentos observados, é necessário precisar a incerteza desse valor para
populações pouco numerosas.
Para um total de 1000 nascimentos temos, em teoria, 512 nascimentos masculinos e 488
nascimentos femininos, ou seja, uma proporção de rapazes de 51,2%.
Para testar estas relações, consideremos o seguinte exemplo: Segundo dados do registo
civil, no ano de 1890, nasceram na Mealhada (distrito de Aveiro) 141 rapazes e 147 raparigas.
Que poderemos afirmar acerca da qualidade dos dados, atendendo à aparentemente
anómala razão de masculinidade que eles evidenciam?
141
Razão de masculinidade = × 100 = 96
147
Limites de confiança
0,512 ± 0,058
58
Limites da razão de masculinidade
0,570
Limite superior = × 100 = 133
1 − 0,570
0,454
Limite inferior = × 100 = 83
1 − 0,454
Perante os resultados obtidos, apesar de terem nascido mais raparigas do que rapazes na
Mealhada, o que resulta numa relação de masculinidade de 96 por 100 raparigas, este valor não
é significativamente diferente da proporção esperada, pois (dado o quantitativo populacional)
a relação de masculinidade poderia variar entre 83 e 133 por cada 100 raparigas, sem que se
pudesse afirmar que diferia significativamente do valor esperado (105).
Nos censos é bastante comum que as idades declaradas difiram em alguns anos da idade
real. Por exemplo, tem sido detetada a preferência digital por valores terminados em “0”
ou “5” e também por números pares, assim como diferenças significativas entre sexos no
impacto desse arredondamento das idades. Interessante também referir que, em algumas
culturas, evitam-se números muito específicos como o 13 (Ocidente) e o 4 (Ásia Oriental)
(Swanson & Siegel, 2004) e dá-se preferência a outros, como o “3”, em países como
a Coreia e a China.
Também se tem reportado que, de um modo geral, se tende a exagerar a idade declarada
relativamente aos mais idosos. Pelo contrário, há uma tendência para não reportar a idade
“0” uma vez que muitos não consideram “0” uma idade e/ou não consideram ainda os recém-
nascidos como parte do agregado familiar. Mais, a existência de leis relacionadas com
a idade da reforma, idade de emancipação e idade de voto, pode também levar a sobre registo
dessas idades. Interessa referir que estes fenómenos são mais comuns em comunidades
com baixos níveis de escolaridade.
Apresentam-se a seguir alguns dos índices utilizados para detetar e comparar a preferência
digital em idades em censos e inquéritos demográficos. Para todos eles, assume-se que os
valores corretos estão retangularmente distribuídos, ou seja, que num intervalo de idades
relativamente pequeno os efetivos de cada idade deverão ser praticamente iguais ou que
(caso variem) o façam de maneira regular, isto é, aumentem ou diminuam linearmente com
a idade.
O mais simples destes índices é o índice básico de preferência digital. Para o seu cálculo,
seleciona-se um intervalo de idades centrado na idade para a qual se quer apurar se
há ou não preferência digital (ou o oposto). Por regra, o intervalo é de 3 ou de 5 anos
(necessariamente um número ímpar).
59
O índice calcula-se dividindo os efetivos (P) da idade em causa pelo valor médio dos efetivos
do intervalo de idades, sendo habitual multiplicar o quociente por 100.
Um índice superior a 100 indica atração; inferior a 100, aversão a esse valor numérico.
Por exemplo, assumindo um intervalo de 5 anos, se quisermos calcular o índice de preferência
digital para a idade 55, basta dividir o número de efetivos com idade 55 (P55) pelo número
médio de indivíduos com idades 53 a 57, conforme indicado na equação abaixo.
P55
Índice (55 anos; intervalo 5 anos) = × 100
1
× ( P53 + P54 + P55 + P56 + P57 )
5
O índice básico de preferência digital para a idade de 25 anos é dado pela fórmula abaixo
e indica um sobrerrelato da idade de 25 anos. Por outras palavras, o número de indivíduos
com idade de 25 anos é cerca de 41% superior ao número esperado.
612362
× 100 = 141
1
× ( 392742 + 416539 + 612362 + 388253 + 355076 )
5
Conclusão muito semelhante é obtida quando usamos um intervalo de 3 anos para o mesmo
cálculo, conforme se vê abaixo:
612362
× 100 = 130
1
× ( 416539 + 612362 + 388253 )
3
Já para a idade de 24 é de 88, indicando um sub-relato desta idade. Por outras palavras,
o número de indivíduos com idade de 66 anos é inferior ao número esperado.
416539
× 100 = 88
1
× ( 392742 + 416539 + 612362 )
3
Índice de Whipple
60
O método padrão consiste em comparar as idades terminadas em 0 e em 5 (consideradas
preferenciais) com a totalidade das idades num intervalo padrão de quarenta anos que
vai dos 23 aos 62 anos − embora esta escolha seja algo arbitrária, partiu-se do princípio
que as idades fora deste intervalo são mais afetadas por erros de comunicação e que,
especialmente nas mais avançadas, a variação dos efetivos populacionais não é tão linear.
A fórmula de cálculo é a seguinte, em que P diz respeito ao número de efetivos das idades
indicadas. No denominadordivide-se por cinco o número de efetivos com idades entre 23
e 62 visto que temos 5 vezes mais idades no denominador do que no numerador.
Tal como no índice anterior, o afastamento do valor 100 indica a existência de preferência
digital nas declarações de idades, neste caso, pelas idades terminadas em 0 ou 5, a situação
mais comum. O índice varia teoricamente entre 100 (ausência total de concentração) e 500
(caso limite em que todas as pessoas se declaram em idades terminadas em 0 e 5).
1 895 096
Índice de Whipple = × 100 = 106
1 × ( 8 932 347 )
5
O índice de Whipple pode ser adaptado, de modo a averiguar se há preferência por outros
dígitos, designadamente pelos números pares, situação que também tem sido detetada em
alguns censos e países.
61
Índice combinado de Myers
Para compensar este viés, usa-se o método desenvolvido por Myers em 1940, em que essa
diminuição gradual dos efetivos populacionais é corrigida de um modo bastante engenhoso.
Como consequência, o processo de cálculo é mais elaborado do que o dos índices anteriores,
seguindo-se os seguintes passos, para idades compreendidas entre 10 e 89 anos:
c. Multiplicar cada uma das somas obtidas em a), respetivamente, pelos coeficientes
1, 2, …, 9, 10.
d. Multiplicar cada uma das somas obtidas em b), respetivamente, pelos coeficientes
9, 8, …, 1, 0.
e. Para cada um dos dígitos, somar os valores obtidos em c) e em d), obtendo as somas
combinadas.
g. Calcular (%) a proporção de cada dígito, dividindo a sua soma combinada pela soma
combinada total.
i. Finalmente, ó valor do índice de Myers é obtido dividindo por dois a soma dos valores
absolutos dos desvios.
O valor do índice de Myers pode, teoricamente, variar entre 0 e 90, indicando o primeiro
valor a ausência de preferência/aversão por qualquer dígito e o segundo, que todas as
idades foram declaradas com o mesmo dígito final.
62
Na Tabela 7 apresenta-se o cálculo do índice de Myers para o último censo (2011) do
Nepal. O resultado obtido sugere que pelo menos 15,64% das idades do censo devem estar
erradas, em virtude de preferência digital, particularmente por dígitos terminados em 0 e 5.
O mesmo se pode concluir do gráfico abaixo (Figura 7), onde está representada a distribuição
das idades em função dos diferentes dígitos.
Proporção
Soma Soma Desvios em
População População Ponderação Ponderação Soma combinada
Dígitos ponderada ponderada relação a
10-89 20-89 para (1) para (2) combinada de cada
(1) (2) 10%
dígito
(8) (11)
176063575 15,64
= ∑(7) = ∑(10) ÷ 2
20
18
16
14
12
10
0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Figura 7. Proporção (%) de idades terminadas em cada um dos dígitos (Government of Nepal, 2012).
63
Além disso, os desvios calculados para cada dígito permitem identificar aqueles que
atraem as preferências, assim como aqueles de que há uma certa aversão por parte dos
respondentes. Interessa referir, que – mesmo tendo em conta que este índice corrige o viés
causado pelo efeito da mortalidade – não é expetável ter exatamente 10% em cada dígito
e que ligeiras flutuações são perfeitamente normais, podendo resultar de eventos passados
(migrações, epidemias, etc.) que afetaram desproporcionalmente determinadas idades.
Apesar de não existir uma única solução para o problema da preferência digital, uma das
mais simples consiste em perguntar simultaneamente a idade e a data de nascimento.
Com efeito, perguntar apenas a data de nascimento também pode conduzir a um excesso
de anos de nascimento terminados em zero e cinco, introduzindo um erro semelhante ao
associado à pergunta sobre a idade.
Além desta abordagem, que ocorre a montante aquando da recolha da informação, existem
outros métodos matemáticos para corrigir o viés de relato, nomeadamente:
• Estimar o número de efetivos de cada idade com base na informação proveniente dos
registos vitais de nascimentos e óbitos, através da aplicação de fatores de correção
calculados com base no desfasamento verificado entre os dados de nascimentos
e óbitos e as contagens do censo.
64
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Government of Nepal. (2012). National Population and Housing Census 2011 (National
Report), Government of Nepal, National Planning Comission Secretariat, Central Bureau
of Statistics.
INE. (2009-2014, 16 abr 2020). Censos em Portugal de 1864 a 2011. Instituto Nacional
de Estatística.
https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=censos_historia_pt
Lundquist, J. H., Anderton, D. L., & Yaukey, D. (2014). Demography: the study of human
population. Waveland Press.
Morais, J. J. P., & Alarcão, A. (1976). A população de Portugal. Caderno do Centro de Estudos
Demográficos, 2, INE.
Siegel, J. S. and & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography.
Elsevier; 2004.
ONU. (2017). Principles and Recommendations for Population and Housing Censuses.
United Nations – Department of Economic and Social Affairs Statistics Division.
ONU. (2014). Principles and Recommendations for a Vital Statistics System, Revision 3.
United Nations.
ONU. (2005). Household Sample Surveys in Developing and Transition Countries. United
Nations. Department of Economic and Social Affairs Statistics Division.
Valente, P. (2010). Census taking in Europe: how are populations counted in 2010? Population
& Societies (467), 1.
65
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f.
1.2. Com base nos resultados obtidos, comente a qualidade dos dados do registo civil
nestas três localidades.
2. Considere os dados abaixo referentes aos dois mais recentes censos realizados
em Portugal (2011) e na Índia (2011).
Índia Índia
Idade Portugal Idade Portugal
Total Rural Urbano Total Rural Urbano
<1 96761 20311234 14884690 5426544 51 145233 7885966 4897835 2988131
1 94151 21755197 15731709 6023488 52 144244 7735164 4889862 2845302
2 96527 23056268 17065758 5990510 53 145385 5590790 3362750 2228040
3 96674 23974041 17778869 6195172 54 136804 6394912 3847481 2547431
4 98534 23710038 17525634 6184404 55 141349 15607546 10898605 4708941
5 103616 26054230 19294779 6759451 56 137406 7071837 4490778 2581059
6 102517 25654245 19041426 6612819 57 131697 4599026 2775906 1823120
7 104771 24826640 18149844 6676796 58 134948 6718934 4457250 2261684
8 108312 26968373 20206981 6761392 59 132251 5148712 3238975 1909737
9 105871 23424638 17114582 6310056 60 131443 17810689 13096491 4714198
10 116057 30552107 22687766 7864341 61 129562 6026813 4023713 2003100
66
Índia Índia
Idade Portugal Idade Portugal
Total Rural Urbano Total Rural Urbano
11 115378 24740946 17851313 6889633 62 132822 5745143 3958007 1787136
12 111425 27877307 20589319 7287988 63 123218 3994105 2545532 1448573
13 110868 24280683 17490173 6790510 64 117696 4086957 2667502 1419455
14 110867 25258169 18185923 7072246 65 122138 13022352 9771237 3251115
15 109927 25899454 18593646 7305808 66 116021 4511946 3132575 1379371
16 109576 24592293 17433799 7158494 67 111492 2605082 1693052 912030
17 113106 21217467 14448773 6768694 68 105273 3548373 2471777 1076596
18 115571 27958147 19559614 8398533 69 96777 2767230 1847629 919601
19 117070 20859088 13866640 6992448 70 99443 10986280 8376640 2609640
20 116632 28882735 19978794 8903941 71 101412 3084183 2122979 961204
21 115758 19978972 12952796 7026176 72 101225 2250929 1514640 736289
22 116039 23528225 15742514 7785711 73 97876 1366536 844391 522145
23 115768 19154055 12391339 6762716 74 96482 1520914 948950 571964
24 117868 19880235 12769603 7110632 75 96159 4772346 3497157 1275189
25 120191 27768078 18881232 8886846 76 88143 1667133 1108540 558593
26 127300 20076997 12914351 7162646 77 85413 835048 507424 327624
27 131808 16709350 10451269 6258081 78 83248 1068415 697401 371014
28 137211 22127016 14730861 7396155 79 76743 889561 573195 316366
29 139566 14732524 9090557 5641967 80 71425 3784938 2851018 933920
30 144439 30399029 20870895 9528134 81 63850 1027816 700733 327083
31 147281 13823245 8512794 5310451 82 59801 603793 388663 215130
32 151198 17613544 11567758 6045786 83 52941 380185 224362 155823
33 162139 12764541 8163530 4601011 84 49871 423497 255106 168391
34 168510 13994592 8796802 5197790 85 43827 1264798 896870 367928
35 170282 28422631 19443380 8979251 86 38395 447898 286266 161632
36 167193 15827717 10277082 5550635 87 32302 221411 130167 91244
37 162337 11692231 7314107 4378124 88 27307 235640 148689 86951
38 164089 17471758 11732906 5738852 89 22525 213420 135996 77424
39 160782 11726347 7295232 4431115 90 18840 833072 621449 211623
40 157660 28528992 19843604 8685388 91 12942 258297 173293 85004
41 154142 11567894 7204399 4363495 92 8870 153561 100081 53480
42 152330 13380642 8687455 4693187 93 7388 94630 59685 34945
43 153848 9334352 5869523 3464829 94 5807 106974 69479 37495
44 155118 9626232 5976027 3650205 95 4506 272534 198396 74138
45 156622 23872961 16396175 7476786 96 3776 120268 81063 39205
46 157824 10992678 6964766 4027912 97 2939 71413 46220 25193
47 152343 7951297 4832885 3118412 98 1996 104511 73026 31485
48 152299 11649592 7692893 3956699 99 1385 64571 46964 17607
49 151206 7851799 4801509 3050290 100 1526 605778 407464 198314
50 150694 21462422 15033860 6428562
Fonte dos dados: INE & Office of the Registrar General & Census Commissioner, India.
67
CAPÍTULO 3:
COMPOSIÇÃO DA POPULAÇÃO POR SEXO E IDADE
As variáveis sexo e idade assumem uma posição central em demografia. Estas podem ser
objeto de estudo por si só, podem ainda servir como variáveis explicativas para diversos
fenómenos demográficos ou até, como foi discutido no capítulo anterior, podem mesmo ser
utilizadas para avaliar a qualidade da informação de recenseamentos, registos e inquéritos.
É sabido que uma população envelhecida ou muito jovem pesa mais sobre os serviços de
saúde do que uma população adulta. A existência de um grande contingente de população
jovem significa também que existe uma enorme necessidade de investimento no emprego
e na educação. Da mesma forma, a presença de um grande contingente populacional jovem
adulto do sexo feminino – fecundidade alta – exige uma aposta nos cuidados materno-
infantis. No extremo oposto, populações envelhecidas, como a da maioria dos países
europeus atualmente, geram preocupação em torno da sustentabilidade do sistema de
pensões e obrigam a um aumento da provisão de serviços de saúde.
Neste capítulo iremos centrar-nos nas abordagens mais comuns para sumariar, numerica
e graficamente, a composição da população por sexo e idade.
68
IDADE
Para obter informação mais exata é comum questionar a data de nascimento, a idade do
indivíduo ou uma combinação de ambas as informações. Ainda assim, a informação de idade,
como vimos no capítulo anterior, está sujeita a erros na sua declaração pelo próprio ou por
um familiar – exagero nas idades dos idosos, arredondamento para idades terminadas em
0 e 5, atração/aversão por certos dígitos e erros de cobertura de certos grupos populacionais
(nomeadamente, para escapar à incorporação militar). Comparar populações de acordo com
a estrutura etária é uma análise frequente em demografia, existindo inúmeras ferramentas
utlizadas para esse fim, como a pirâmide etária, as medidas de tendência central e os
indicadores sumários de envelhecimento e de dependência.
PIRÂMIDE ETÁRIA
A melhor forma de analisar a distribuição da população por sexo e idade é através de uma
representação gráfica inconfundível da ciência demográfica – a pirâmide etária. Este gráfico
recebe o nome de pirâmide pois, nas primeiras fases da transição demográfica, assumia
uma forma piramidal: uma base larga que se estreita até chegar ao topo, refletindo elevadas
taxas de natalidade e mortalidade. Hoje, como iremos ver, a maioria dos países europeus
apresenta “pirâmides” com uma forma completamente distinta.
As idades ou grupos etários são representados num eixo vertical e os efetivos de cada sexo
em dois semieixos horizontais, o da esquerda para o sexo masculino e o da direita para
o feminino. Os grupos etários mais jovens são representados na base da pirâmide e os mais
idosos (ex.: 85 anos ou mais) no seu topo.
Os efetivos populacionais (de cada idade ou grupo de idades) são representados por
retângulos de largura constante, cujo comprimento é proporcional ao efetivo populacional.
69
85
85eemais
mais
80
80--84
84
75
75--79
79
70
70--74
74
65
65--69
69
60
60--64
64
55
55--59
59
50
50--54
54
45
45--49
49
40
40--44
44
35
35--39
39
30
30--34
34
25
25--29
29
20
20--24
24
15
15--19
19
10
10--14
14
55--99
00--44
5,00
5,00
5,00 4,00
4,00
4,00 3,00
3,00
3,00 2,00
2,00 1,00
1,00
1,00 0,00
0,00
0,00 1,00
1,00
1,00 2,00
2,00
2,00 3,00
3,00
3,00 4,00
4,00
4,00 5,00
5,00
5,00
Figura 8. Pirâmide etária da população portuguesa à data dos censos 2011 (Fonte dos dados: INE).
85eemais
85 mais
80--84
80 84
75--79
75 79
70--74
70 74
65--69
65 69
60--64
60 64
55--59
55 59
50--54
50 54
45--49
45 49
40--44
40 44
35--39
35 39
30--34
30 34
25--29
25 29
20--24
20 24
15--19
15 19
10--14
10 14
55--99
00--44
5,00
6,00 4,00 4,00
3,00 2,002,00 1,00 0,00
0,00 1,00 2,00
2,00 3,004,00 4,00 5,00
6,00
Figura 9. Pirâmide etária sobreposta da população portuguesa à data dos censos 2011
(barras a cheio) e população mundial em 2011 (Fonte dos dados: INE e ONU).
70
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
1960 1970 1981 1991 2001 2011
Figura 10. Gráfico circular e gráfico de área representando a população portuguesa por ciclos
de vida (Fonte dos dados: INE).
O resultado final deverá ser uma pirâmide como a que se apresenta na Figura 8, denominada
pirâmide simples, esta referente à população portuguesa à data dos censos de 2011. Porém,
sempre que queremos fazer comparações ao longo do tempo, entre regiões ou entre grupos
populacionais (ex.: de acordo com estado civil, nacionalidade), podemos usar as chamadas
pirâmides sobrepostas, onde se sobrepõem duas ou mais pirâmides. A Figura 9 apresenta
a pirâmide portuguesa sobreposta à pirâmide etária da população mundial, sendo nítidas
grandes diferenças, com Portugal a apresentar uma base da pirâmide estreita e um topo
alargado, denotando a presença de uma população envelhecida, e a população mundial
a apresentar ainda uma base alargada e uma forma tipicamente piramidal, reflexo da
predominância de crianças e jovens em grande parte do mundo.
As pirâmides etárias podem ser desenhadas manualmente, mas atualmente são usados
programas como o Microsoft Excel, SPSS ou R para produzir o mesmo resultado de forma
mais rápida e eficaz. No Anexo 2 é explicado passo a passo o processo de gerar uma
pirâmide etária em Microsoft Excel. Atenção que, embora a pirâmide seja a representação
gráfica da estrutura etária da população mais convencional, esta pode ser representada
também por gráficos circulares e gráficos de área, estes últimos particularmente úteis
para comparar ao longo do tempo o peso relativo dos grandes grupos etários (Figura 10).
Como se deixou já antever, a forma da pirâmide é a referência em relação à qual se fazem
comparações. Embora não exista uma terminologia padrão, é comum definir três grandes
tipos de pirâmides etárias, cada um associado a um determinado período da teoria da
transição demográfica, já explorada no Capítulo 1 (Figura 11):
71
Pirâmide em sino ou estacionária – Pirâmide intermédia entre as duas anteriores,
característica dos países da terceira da fase da transição demográfica. Apresentam um
grande número de adultos, devido aos baixos níveis de mortalidade, mas ainda têm um
elevado peso da população infantil, o que garante a manutenção da população.
65
idade
15
As pirâmides etárias são também um instrumento útil para analisar o impacto de eventos
históricos na estrutura da população – guerras, epidemias, vagas migratórias – e até mesmo
a qualidade dos dados de idade/sexo. Quando estes episódios causam muitas mortes ou
grande redução na fecundidade, surge o que se designa por classes ocas: grupos etários
cujo número de indivíduos é inferior aos dos grupos anterior e posterior. A pirâmide da Figura
12, referente à população italiana em 1931, reflete na perfeição a diminuição da fecundidade
ocorrida na I Guerra Mundial, na qual a Itália participou de maio de 1915 a novembro de 1918.
85 ou mais 1846-…
80-84 1847-1851
75-79 1852-1856
70-74 1857-1861
65-69 1862-1866
60-64 1867-1871
55-59 1872-1876
50-54 1877-1881
45-49 1882-1886
40-44 1887-1891
35-39 1892-1896
30-34 1897-1901
25-29 1902-1906
20-24 1907-1911
15-19 1912-1916
10-14 1917-1921
5-9 1922-1926
0a4 1927-1931
8,00 6,00 4,00 2,00 0,00 2,00 4,00 6,00 8,00
Figura 12. Pirâmide etária da população italiana em 1931 (Fonte dos dados: Instituto Nacional
de Estatística Italiano, ISTAT).
Além disso, algumas irregularidades patentes nas pirâmides etárias permitem detetar
a ocorrência de outros fenómenos demográficos, nomeadamente em localidades pequenas,
como é o caso de migrações seletivas de certos grupos populacionais. Por exemplo, a presença
de uma base militar numa localidade pode traduzir-se numa pirâmide desequilibrada com
um elevado número de efetivos masculinos em idade ativa, como acontece, por exemplo,
na freguesia das Lajes, ilha Terceira (Figura 13), particularmente entre os 15 e os 24 anos
de idade.
72
85 anos ou mais
85 ou mais
80 a 8480-84
anos
75 a 7975-79
anos
70 a 7470-74
anos
65 a 6965-69
anos
60 a 6460-64
anos
55 a 5955-59
anos
50 a 5450-54
anos
45 a 4945-49
anos
40 a 4440-44
anos
35 a 3935-39
anos
30 a 3430-34
anos
25 a 2925-29
anos
20 a 2420-24
anos
15 a 1915-19
anos
10 a 1410-14
anos
5-9
5 a 9 anos
0 a 40anos
a4
8,00
6,00 6,00 4,00 4,00 2,00
2,00 0,00
0,00 2,00 2,004,00 6,00
4,00 8,006,00
Figura 13. Pirâmide etária da freguesia das Lajes na ilha Terceira em 2001 (Fonte dos dados: INE).
85
85ou
85 anos oumais
ou mais
mais
80 a 8480-84
anos
80-84
75 a 7975-79
anos
75-79
70 a 7470-74
anos
70-74
65 a 6965-69
anos
65-69
60 a 6460-64
anos
60-64
55 a 5955-59
anos
55-59
50 a 5450-54
anos
50-54
45-49
45 a 4945-49
anos
40 a 4440-44
anos
40-44
35 a 3935-39
anos
35-39
30 a 3430-34
anos
30-34
25-29
25 a 2925-29
anos
20 a 2420-24
anos
20-24
15 a 1915-19
anos
15-19
10-14
10 a 1410-14
anos
5-9
5 a 9 anos
5-9
0 a 40anos
a0-4
4
8,00
6,00
6,00 6,00 4,00 4,00 2,00
2,00 0,00
0,00 2,00 2,004,00 6,00
4,00 8,006,00
Figura 14. Pirâmide etária da freguesia de Santo André em Santiago do Cacém em 2011
(Fonte dos dados: INE).
73
Índices-resumo e grupos funcionais
Em análise demográfica, quando se quer ter uma visão rápida da evolução ou da diversidade
das estruturas populacionais, opta-se por agrupar as idades num número reduzido de
grupos, de modo a tornar mais funcional a análise; daí a designação de grupos funcionais.
Para estudar a estrutura etária da população é frequente usar três grupos etários: os jovens
(0 aos 14 anos), os adultos (15 aos 64 anos) e os idosos (65 anos ou mais).
Com base neles, obtêm-se índices-resumo que nos permitem avaliar o grau de envelhecimento
ou rejuvenescimento de uma população. Os índices de dependência (índice de dependência
de jovens, idosos e total) estabelecem uma relação entre a população supostamente produtiva
e a não produtiva (ou seja, dependente) e permitem avaliar grosseiramente os encargos da
sociedade com jovens e idosos. Interessa referir que, durante o período de transição (fases
2 e 3 da teoria da transição demográfica), os índices de dependência de jovens aumentam,
começando depois a diminuir. O índice de dependência de idosos mantem-se baixo ao
longo da transição, mas começa depois a aumentar, até igualar o nível de dependência de
jovens. Em sociedades na 5ª fase da transição demográfica, onde os óbitos superam os
nascimentos, os níveis de dependência de idosos tendem a ser superiores aos de jovens.
Importa referir que os limites definidos para os intervalos de idade são bastante grosseiros
e amplos e não devem ser lidos de forma estrita. Além disso, são limites que mudam ao
longo do tempo e de acordo com o contexto social e geográfico. Em muitos países de baixo
rendimento, por exemplo, é comummente usado o limiar dos 60 anos para definir população
idosa.
13 Este indicador baseia-se na ideia de que são normalmente as filhas que assumem a responsabilidade de dar
apoio emocional e instrumental aos seus pais.
74
Tabela 8. Índices-resumo da estrutura etária da população (Fontes: Rowland (2013) e Nazareth (2014)).
Percentagem de P0−14
× 100% Mede a percentagem de jovens em relação à população total.
jovens P
Percentagem de
P15−64 Mede a percentagem de indivíduos potencialmente ativos em relação à população
potencialmente × 100%
P total.
ativos
Percentagem de P≥65
× 100% Mede a percentagem de indivíduos idosos em relação à população total.
idosos P
Percentagem
P≥85
de idosos muito × 100% Mede a percentagem de indivíduos idosos muito idosos em relação à população total.
P
idosos
O valor é inverso do indicador anterior, pois diz-nos quantos idosos existem por
Índice de P≥65
× 100% cada 100 jovens. É um indicador utilizado para medir o grau de envelhecimento
envelhecimento P0−14
demográfico.
Índice de
P0−14 Mede os encargos potenciais que pesam sobre a população ativa, em termos dos
dependência de × 100%
P15−64 jovens – ‘por cada 100 potencialmente ativos existem X jovens’.
jovens
Índice de
P≥65 Mede os encargos potenciais que pesam sobre a população ativa, em termos dos
dependência de × 100%
P15−64 idosos – ‘por cada 100 potencialmente ativos existem X idosos’.
idosos
Indicador que relaciona a metade mais jovem da população potencialmente ativa com
Índice de juventude P15−39
× 100% a metade mais velha. Mede o grau de envelhecimento da população potencialmente
da população ativa P40−64
ativa.
Índice de
P20−29 Relaciona o volume potencial da população que está a entrar na idade ativa com
renovação da × 100%
P55−64 o volume potencial da população que se está a reformar.
população ativa
Índice de P≥75 Indicador do envelhecimento demográfico que compara o peso dos idosos mais
× 100%
longevidade P≥65 jovens com o peso dos idosos menos jovens.
Índice de
P15−64 Relaciona o número de indivíduos em idade ativa (15 a 64 anos) com o número
sustentabilidade × 100%
P≥65 de indivíduos idosos (65 anos ou mais).
potencial
Índice de
pressão sobre P≥80 Relaciona o número de indivíduos com 80 anos ou mais com a população feminina
f × 100%
os cuidadores P50-64 entre os 50 e os 64 anos (população potencialmente cuidadora).
(‘caretaker ratio’)
75
Idade mediana
Para lidar com esta limitação, e uma vez que o valor da mediana é muito útil para medir
o grau de envelhecimento populacional, desenvolveram-se métodos para permitir a sua
estimativa, mesmo quando apenas se dispõe de quantitativos populacionais englobados
por grupos etários. Interessa referir que, nesse domínio, a mediana apresenta até algumas
vantagens sobre a média: não é afetada por valores extremos e pode ser calculada mesmo
quando temos dados agrupados com grupos etários terminais (ex.: 80 anos ou mais).
Idade mediana = l + ( N2 −F ) × ( fi )
em que
l é o limite inferior de idade do grupo etário que contém o meio;
N é a população total;
F é a frequência cumulativa de todos os grupos etários até ao grupo etário que contém o meio;
f é a frequência do grupo etário que contém o meio;
i é a dimensão do grupo etário que contém o meio (5 ou 10, para grupos etários quinquenais
ou decenais, respetivamente).
De acordo com esta expressão, a determinação da idade mediana pode ser efetuada através
da sequência de passos que adiante se exemplifica, recorrendo aos dados (Tabela 9) de
mortalidade por cancro da mama em Portugal no triénio 2015-2017.
76
Tabela 9. Idade das vítimas de cancro da mama em Portugal no triénio 2015-2017
(Fonte dos dados: INE).
Passo 3: Determinar o meio da distribuição, dividindo a população total por dois. Isto
é importante porque a idade desta pessoa – o indivíduo que está no meio desta distribuição
ordenada por ordem ascendente – corresponde à idade mediana da população. Na tabela
acima, o meio é 5215/2 = 2607,5.
Passo 4: Identificar o grupo etário em que o meio está localizado. Para tal, identifica-se
o primeiro grupo etário que tem uma frequência cumulativa maior que N /2, que é o grupo
dos 70-74 cuja frequência cumulativa é 2848, tendo o imediatamente anterior (65-69)
a frequência cumulativa de 2335. Obtemos então os seguintes parâmetros da expressão de
calculo da mediana: F = 2335, f = 513 e l = 70.
77
Agora, algumas palavras sobre o significado dos termos da expressão matemática utilizada.
Por outro lado, o quociente ( i ) exprime a diferença média de idades entre pessoas de
f
idades imediatamente contíguas do grupo etário que contém o meio, admitindo que as idades
se encontram uniformemente distribuídas. Neste caso é 0,00975 anos, ou seja, cerca de
3,6 dias.
Ao multiplicarmos 272,5 por 0,00975 obtemos 2,7 anos, significando isso que – admitindo
que as idades se encontram uniformemente distribuídas no grupo etário − o indivíduo do
meio da distribuição é 2,7 anos mais velho que o indivíduo mais novo do grupo etário 70-74.
Assim, somando 70 a este valor, obtemos que a idade mediana das vítimas de cancro da
mama em Portugal no triénio 2015-2017 era de 72,7 anos.
Quando se dispõe de dados não agrupados por grupos etários, mas se pretende estimar
a idade mediana com precisão superior à unidade, podemos igualmente seguir este método
- nesse caso, i seria igual a 1.
Vem a talhe de foice referir que também é comum calcular o valor da idade mediana, não
para toda a população, mas apenas para a população ativa. Na sequência de passos desse
cálculo, como é óbvio, não são tidos em conta os grupos etários dos mais jovens, nem dos
mais idosos.
Índice de dissimilaridade
Medida simples e versátil que pode ser usada para sumariar e comparar estruturas etárias de
duas populações. Mede a não correspondência entre duas distribuições etárias percentuais,
revelando que proporção de uma dada população deveria ser redistribuída pelos grupos
etários, para que esta correspondesse à distribuição etária da população padrão (ou de
comparação).
O índice de dissimilaridade varia entre 0 e 100. Um valor de zero significa que não há
diferenças entre as populações, enquanto um valor de 100 diz-nos que as populações são
totalmente diferentes. Porém, não nos permite dizer qual das populações é mais envelhecida
ou mais jovem, pois faz uso de valores absolutos de diferenças.
78
Em traços gerais, o índice de dissimilaridade é, portanto, metade da soma das diferenças
percentuais dos dois grupos a comparar. A divisão por dois justifica-se por estamos a lidar
com diferenças absolutas; doutra forma, estaríamos a contar duplamente as diferenças −
equivale a considerar uma única vez as diferenças positivas e as correspondentes diferenças
negativas.
Interessa referir também que, quanto maior for o número de grupos etários, maior tenderá
a ser o valor do índice de dissimilaridade, razão por que apenas são diretamente comparáveis
índices de similaridade baseados em idêntico número de grupos etários.
Tabela 10. Exemplificação do cálculo do índice de dissimilaridade (Fonte dos dados: INE).
79
SEXO
Em segundo lugar, porque a mortalidade, fator essencial da redução dos efetivos dos
diferentes grupos etários, é sempre mais precoce nos homens do que nas mulheres
(mortalidade em excesso masculina); consequentemente, à medida que avançamos na
idade, a superioridade masculina inicial vai desaparecendo. Normalmente, nos 20-30 anos
a importância dos dois sexos é igual, ao passo que nos últimos grupos etários o sexo feminino
tem sempre maior volume populacional do que o masculino. Outros fatores que afetam
a distribuição da população por idades, como as migrações e as guerras, tendem a acentuar
ainda mais estas assimetrias.
80
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
ISTAT (n.d., 30 ago 2021). Banche dati e sistemi informativi. Instituto Nazionale di Statistica.
https://www.istat.it/it/dati-analisi-e-prodotti/banche-dati
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
81
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
2. Com base nos dados fornecidos referentes aos municípios de Vinhais (distrito de
Bragança) e de Mafra (distrito de Lisboa) no ano de 2015, calcule os seguintes indicadores
e comente os resultados obtidos:
82
Vinhais Mafra
Total 8289 81961
0 - 4 anos 175 4316
5 - 9 anos 196 5206
10 - 14 anos 253 5345
15 - 19 anos 308 5036
20 - 24 anos 299 4308
25 - 29 anos 361 4542
30 - 34 anos 346 6071
35 - 39 anos 406 7894
40 - 44 anos 392 7770
45 - 49 anos 454 5629
50 - 54 anos 550 4930
55 - 59 anos 585 4344
60 - 64 anos 601 3742
65 - 69 anos 593 3540
70 - 74 anos 687 3183
75 - 79 anos 768 2576
80 - 84 anos 614 1982
85 e mais anos 701 1547
Fonte dos dados: INE
3. A tabela abaixo faz uma retrospetiva da distribuição da população portuguesa por grupos
etários desde o censo de 1960 até ao de 2011. Com base nos dados fornecidos, comente
a evolução da estrutura etária da população portuguesa nos últimos 50 anos, recorrendo
para tal ao cálculo dos indicadores etários que considera mais relevantes.
83
CAPÍTULO 4:
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA POPULAÇÃO
A forma como a população se encontra distribuída no espaço (por regiões ou por áreas
urbanas/rurais) tem implicações diversas, pelo que foram desenvolvidas diferentes formas
de exprimir essa distribuição.
Os métodos discutidos nos restantes capítulos deste livro aplicam-se também a pequenas
áreas geográficas e, portanto, não serão revisitados neste capítulo. Neste capítulo iremos
incidir nas formas de organização territoriais, apresentar indicadores sumários acerca da
distribuição geográfica da população e terminar com uma breve apresentação de conceitos
básicos de mapeamento e de Sistemas de Informação Geográfica (SIG).
DIVISÕES TERRITORIAIS
Interessa referir que existe uma grande diversidade de divisões territoriais a serem
usadas no mundo. Algumas são de natureza administrativa/geopolítica, como os distritos,
municípios e freguesias em Portugal. Somam-se a estas, divisões funcionais que visam
delimitar os territórios de acordo com um critério cultural, social ou físico que lhes imprime
homogeneidade (em função de predominância etnolinguística, de níveis de urbanização
ou de tipos climáticos, por exemplo). E existem ainda as divisões estatísticas, destinadas
a harmonizar as unidades de divulgação de informação estatística, e as divisões censitárias,
84
cujas fronteiras são normalmente delimitadas durante essas operações. Em Portugal, são
exemplos de divisões estatísticas as NUT e de divisões censitárias, as secções e subsecções
estatísticas, unidades operacionais do recenseamento da população (para mais pormenores,
ver Capítulo 2).
Interessa referir que (em Portugal, como noutros países) as divisões territoriais têm vindo
a sofrer alterações (criação, extinção, fusões, alterações das fronteiras) ao longo do tempo,
o que lança desafios ao estudo de séries temporais de dados referentes a estas unidades
geográficas. Normalmente, a solução passa por agregar as áreas, de forma a gerar unidades
territoriais com fronteiras comparáveis ao longo do tempo, embora tal inevitavelmente
implique alguma perda de informação relevante e nem sempre seja de solução fácil.
DENSIDADE POPULACIONAL
População total
Densidade populacional =
Área total
Trata-se de uma medida simples, mas que pode ser enganadora, pois normalmente inclui
no denominador áreas onde a população não pode residir, como reservas naturais, áreas
comerciais e industriais e mesmo corpos de água, levando a valores de densidade populacional
artificialmente baixos. Para contornar esta situação, é prática corrente subtrair à área total
a área das zonas desabitadas, como acontece na construção de mapas dasimétricos
(ver secção sobre Sistemas de Informação Geográfica).
Por outro lado, é comum duas localidades, regiões ou mesmo países apresentarem
valores de densidade populacional praticamente idênticos, suscitando a ideia de que são
semelhantes. Porém, o regime de ocupação do território pode ser totalmente díspar. Basta
imaginar uma localidade constituída por habitações unifamiliares que ocupam o território de
forma contínua e outra com um enorme arranha-céu habitado por múltiplas famílias, mas
rodeado por espaços de lazer com parques e jardins. É perfeitamente possível que o valor
da densidade populacional destas localidades seja semelhante.
Outro problema desta medida prende-se com o facto de dar uma falsa noção de
homogeneidade. Por exemplo, segundo as estimativas populacionais de 2020 publicadas
pelo INE, a Região Norte de Portugal tinha uma densidade populacional de 168 habitantes
por km2, mas cidades como o Porto ou Vila Nova de Gaia apresentavam uma densidade
populacional de 5236 e 1781 habitantes por km2, respetivamente. Em Portugal, país
relativamente pequeno, existem municípios do Alentejo com densidades populacionais da
ordem dos 5 habitantes por km2, mas, por outro lado, nas grandes áreas metropolitanas,
a densidade populacional é 1000 vezes maior, chegando aos 7800 hab/km2 na Amadora.
85
DISTRIBUIÇÃO ABSOLUTA E PERCENTUAL
RANKINGS
Tabela 11. Ranking da população portuguesa por distritos em 1991 e 2011 (Fonte dos dados: INE).
86
ÍNDICE DE REDISTRIBUIÇÃO
n
IR = 0,5 ∑ | xi − yi |
i=1
em que
x é a distribuição percentual da população no primeiro momento;
y é a distribuição percentual da população no segundo momento;
i é uma dada unidade geográfica, podendo ser município, região, etc.;
n é o número de unidades geográficas.
O índice de redistribuição é igual a metade da soma das diferenças absolutas entre as duas
distribuições percentuais. Os passos para a obtenção deste parâmetro são os seguintes:
• Somar as diferenças;
Varia entre 0 e 100 (%) e dá-nos a percentagem de população que teria de ser redistribuída
para que a distribuição populacional fosse idêntica nos dois momentos.
87
Tabela 12. Exemplificação do cálculo do índice de redistribuição em Portugal entre 1991
e 2011 (Fonte dos dados: INE).
ÍNDICE DE CONCENTRAÇÃO
n
IC = 0,5 ∑ | xi − yi |
i=1
em que
x é a percentagem da população total em cada unidade geográfica;
y é a percentagem da área total que corresponde a cada unidade geográfica;
i é uma dada unidade geográfica, podendo ser um município ou região;
n é o número de unidades geográficas.
Um índice de valor zero denotaria que cada região/município continha uma proporção da
população total equivalente à proporção de área total que ocupa, isto é, uma densidade
populacional uniforme em todo o país. Por oposição, um índice perto de 100 indicaria que
88
a população estava concentrada em apenas numa região. O valor máximo deste índice é
igual a 100 menos a percentagem de área total da região com mais população14.
14 Porquê esta subtração? Imagine-se um país composto apenas por duas regiões: uma pequena, ocupando
apenas 5% da área do território e outra ocupando todo o resto (95% da área do país); o máximo possível de
concentração seria toda a gente viver na região mais pequena. Ora, se calcular o IC, este será 95% (e não
100%). Já por se exemplo essa região tivesse 10% da área do país e toda a gente vivesse nela, o índice seria
90%. Neste caso limite, o índice mede a diferença entre a % da população total que essa região deveria ter (se
a distribuição fosse uniforme), ou seja, apenas 5% ou 10%; e a % da população do país que ela efetivamente
tem, que neste caso hipotético é 100%.
89
URBANIZAÇÃO E DEFINIÇÃO DE ÁREAS URBANAS
Segundo as Nações Unidas (ONU, 2019), atualmente mais de metade (55%) da população
mundial vive em cidades, mas prevê-se que essa proporção vá atingir os 68% em 2050.
Em 1959 eram apenas 30%. Em Portugal a proporção é 65%, mas tem vindo a aumentar
continuamente desde os anos 60, quando ainda era 35%. Existe claro uma grande
variabilidade a nível do globo. A América do Norte é o continente com maior proporção de
população urbana (82%), seguido da América do Sul (81%) e da Europa e Oceânia (74%).
Na Ásia, a população urbana ronda os 50% e em África é ainda inferior (43%). Daí se
esperar que, até 2050, sejam precisamente os países africanos e asiáticos a contribuir mais
para o aumento da população urbana mundial.
Interessa referir que as definições do que é uma área “urbana” e do que é uma área “rural”
variam imenso de país para país, mas também de acordo com a organização e a área do
conhecimento. Segundo a ONU, uma localidade (ou lugar) é um aglomerado populacional no
qual os habitantes vivem perto uns dos outros e que possui uma designação (ONU, 2017).
Tal inclui indiferentemente cidades, vilas e aldeias, etc. Uma grande localidade normalmente
faz parte de um aglomerado urbano que contém a cidade, mas também a área periférica
suburbana adjacente. Assim, o aglomerado urbano não é equivalente à localidade, sendo
uma outra forma de organização territorial que pode incluir mais do que uma localidade.
As localidades urbanas tendem a ser definidas com base no número de habitantes, densidade
populacional e existência de equipamentos e funções administrativas, havendo também
uma multiplicidade de definições. Existem países, altamente povoados, em que o critério
da dimensão populacional não é suficiente para distinguir entre áreas urbanas e rurais, pois
muitas zonas densamente povoadas podem exibir padrões sociais e económicos tipicamente
rurais. Assim é comum complementar a definição com critérios estruturais como a presença/
ausência de saneamento, escolas, serviços de saúde, equipamentos recreativos, etc.
90
Além disso, o INE disponibiliza dois indicadores para determinar o nível de urbanidade
e ruralidade das freguesias portuguesas:
• Tipologia das áreas urbanas, uma classificação tripartida das freguesias do território
nacional em áreas predominantemente urbanas (APU), áreas medianamente urbanas
(AMU) e áreas predominantemente rurais (APR). Esta classificação baseia-se em
critérios morfológicos (ocupação do solo), na densidade populacional e na dimensão
absoluta da população.
Até aos anos 60, os mapas eram construídos utilizando técnicas de desenho manuais, o que
limitava a sua produção. Nos anos 1980, surgem os primeiros programas de mapeamento
em meio digital, os SIG, impulsionando assim o uso de mapas enquanto ferramenta essencial
no entendimento da distribuição dos fenómenos sociais e demográficos. Os SIG são uma
classe especial de sistemas de informação que mantêm o registo de eventos e objetos, mas
também onde esses eventos e objetos acontecem ou existem. Os SIG foram desenvolvidos
para recolher, armazenar, organizar, manipular e analisar informações geográficas.
Mapa coropleto: O termo "coropleto" vem das palavras gregas "choros" (local) e "plethos"
(intensidade). Assim, um mapa coropleto é um mapa temático que representa, através de
diferentes cores ou intensidades de cor, dados quantitativos – razões, proporções e taxas
– atribuídos a áreas. As informações quantitativas são geralmente agrupadas em classes,
utilizando-se essencialmente quatro tipos de critérios de classificação: quebras naturais,
quartis, desvios padrão e intervalos iguais. Num mapa coropleto, as classes correspondentes
a valores mais elevados do fenómeno a caracterizar são representadas com tons mais escuros
e as correspondentes a valores mais baixos, com cores mais claras. Não há regra fixa para
determinar o número de classes a usar para mapear uma determinada variável. Depende da
complexidade do fenómeno em estudo. No entanto, é geralmente recomendado não exceder
10 classes (o olho humano não pode distinguir mais de 10 intensidades de cor, nem mais de
12 cores) e não ficar abaixo de 4 classes (muito generalista).
91
Mapa de densidade de pontos: É usado para representar valores absolutos (ex.: número
de habitantes ou de óbitos). Neste mapa, um ponto pode indicar qualquer previamente
definida quantidade; por exemplo, 100 habitantes. O leitor deve ter cuidado em não
interpretar os pontos como locais reais, pois estes são por regra arbitrariamente colocados
e espaçados no mapa. Ao construir o mapa de densidade de pontos, é muito importante
escolher um tamanho de ponto apropriado (não pode ser muito pequeno, nem muito grande)
e um número apropriado de pontos, o que depende do valor que atribuímos aos pontos.
Mapa de símbolos proporcionais e gráficos: Usa símbolos cujo tamanho varia de acordo
com a magnitude da variável que representa. Os símbolos mais usados são círculos (cujo
raio é proporcional à raiz quadrada do valor da variável), quadrados (cujo lado é proporcional
à raiz quadrada do valor), triângulos e esferas. Esses mapas também podem conter gráficos
(geralmente de barras ou circulares) para representar uma variável categórica. Nesse caso,
os gráficos podem variar de tamanho de acordo com o valor absoluto da variável e a área
das barras/setores varia de acordo com os valores relativos de cada classe.
A seguir apresentam-se exemplos destes tipos de mapas (Figura 15). O uso de SIG envolve
um conjunto de conhecimentos relacionados com a cartografia, o que foge ao escopo deste
livro. Os interessados em aprofundar esta temática poderão recorrer aos livros de leitura
complementar indicados abaixo. Além disso, este livro faz-se acompanhar de um tutorial
(Anexo 3) a realizar em software livre e gratuito, de forma aos leitores poderem ter um
primeiro contacto com as técnicas e métodos de mapeamento.
92
0,2% - 0,6%
0,7% - 1,0%
1 Ponto = 26 000
1,1% - 2,5%
266026 - 800000
800001 - 2000000 5
10
2000001 - 5842307 15
Figura 15. Diferentes tipos de mapas: densidade de pontos, coropleto, símbolos proporcionais
e mapa de fluxos.
93
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Aikins, E R. W., & Ribeiro, A. I. (2020). Elements of Health and Medical Geography. Kendall
Hunt Publishing Company.
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
ONU. (2019). World urbanization prospects: the 2018 revision CD-ROM Edition. Department
of Economic and Social Affairs. United Nations.
ONU. (2017, 10 set 2021). Population density and urbanization. United Nations.
https://unstats.un.org/unsd/demographic/sconcerns/densurb/default.htm
94
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
1. Com base nos dados fornecidos, calcule o índice de redistribuição para o período 1981-
2011 e o índice de concentração em 1981 e em 2011, para os municípios que constituem
o distrito de Bragança. Explique os valores obtidos e interprete os resultados.
95
CAPÍTULO 5:
COMPOSIÇÃO SOCIOECONÓMICA E CULTURAL
Neste capítulo, iremos definir as variáveis socioeconómicas e culturais mais comuns e abordar
os indicadores mais utilizados para caracterizar a composição da população em termos sociais,
económicos e culturais. Começaremos com indicadores mais descritivos e unidimensionais,
como as proporções, e apresentaremos depois índices multivariados e outros indicadores
mais complexos usados para caracterizar o nível de desigualdade social e económica de um
dado contexto espácio-temporal.
CARACTERÍSTICAS ETNOCULTURAIS
Raça e etnia
Embora raça e etnia tenham sido amplamente negligenciadas nas estatísticas oficiais da
maioria das nações durante a maior parte do século passado, hoje um grande número de
países tenta caracterizar as suas populações através de algum tipo de classificação racial
ou étnica. Existem, no entanto, muitas áreas do mundo em que as tensões étnicas dificultam
a obtenção desses dados. Mais, as próprias definições de raça e etnia são controversas
e variam de país para país, não existindo qualquer definição padrão, o que faz com que
a informação sobre raça e etnia seja uma das menos precisas, para além de dificilmente
comparável entre países diferentes.
96
Cada país implementa e desenvolve as suas definições e terminologias de forma a ir ao
encontro das suas necessidades estatísticas e administrativas. No entanto, há várias décadas
que as Nações Unidas emitem recomendações sobre a realização de operações censitárias
com vista a garantir qualidade e comparabilidade internacional. Na documentação produzida
pela ONU é desaconselhado o uso do termo “raça” e as questões relacionadas com a etnia
são entendidas como tópicos não prioritários, dada a referida dificuldade em obter informação
internacionalmente comparável.
Por causa destes constrangimentos, muitas nações não incluem questões relacionadas com
raça e etnia nos recenseamentos e inquéritos à população. Portugal, por exemplo, não inclui
qualquer questão a este respeito nos censos. A nível mundial, de acordo com dados referentes
ao ano 2000, entre 147 países, apenas 54% incluíam nos censos uma questão acerca da
etnia, variando esta proporção entre 70% em África e 37% na Europa (ONU, 2003).
Língua
97
País de nascimento e nacionalidade
Religião
A religião está relacionada com a nacionalidade e a etnia, mas apresenta valor adicional
,pois determina padrões comportamentais, nomeadamente em relação à natalidade,
nupcialidade, mortalidade e migrações. As Nações Unidas classificam a religião como um
tema não prioritário. Cada país que pergunta a religião no seu censo deve usar a definição
mais adequada às suas necessidades administrativas e estatísticas. Tal como a etnia,
a existência de uma questão acerca da religião tem sido alvo de debate devido a receios
de que a informação seja usada de forma incorreta e mal-intencionada, nomeadamente em
países onde existem conflitos religiosos, onde a prática religiosa (ou de uma determinada
religião) sofre algum tipo de coação ou onde existe uma religião oficial. Em Portugal,
os campos acerca da religião são de resposta facultativa.
Também neste caso, a caracterização desta variável recorre à análise da sua distribuição
percentual ou ao uso dos índices de dissimilaridade e de segregação.
98
CARACTERÍSTICAS SOCIOECONÓMICAS
Alguns poderão questionar por que é que aspetos relacionados com as condições sociais
e económicas da população são relevantes no ensino e na investigação demográficas.
As condições socioeconómicas têm sido alvo de estudo na demografia, nomeadamente
enquanto fatores determinantes da dinâmica da população. Basta pensar que o modelo
teórico paradigmático da demografia, a teoria da transição demográfica, apresenta como
propulsor dessa transição mudanças sociais e económicas que ocorrem no seio das
populações (como é o caso da escolarização das mulheres, que antecedeu o declínio da
fecundidade). Interessa referir também que este subcapítulo trata das características sociais
e económicas como se fossem relativamente independentes, mas estas estão intimamente
relacionadas.
Escolarização
Interessa referir que matrícula escolar e frequência escolar são noções distintas, se bem que
geralmente muito relacionadas. Um aluno pode estar matriculado numa instituição de ensino
e não frequentar as aulas por vários motivos.
Em Portugal, estes indicadores baseiam-se nas estatísticas do censo, onde existe uma
questão sobre a frequência escolar, e em estatísticas de natureza administrativa provenientes
da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, que disponibiliza informação acerca
do número de alunos inscritos nos diversos níveis de escolaridade.
Alguns dos indicadores de escolarização mais usados encontram-se listados na Tabela 14.
Em traços gerais, temos taxas brutas de escolarização, onde não se especifica a idade ou
o nível de ensino; e taxas específicas de escolarização por idade e nível de ensino, destinadas
a estudos mais específicos ou rigorosos. Importa salientar que, apesar da denominação
taxa, a maioria destes indicadores são na realidade proporções e expressam-se em termos
de percentagem.
99
Tabela 14. Indicadores de escolarização mais utilizados.
E × 100%
P
E
Taxa bruta de ∑34
a = 5 Pa
escolarização
(denominador Relação percentual entre o número de alunos a frequentar
em que:
restrito à qualquer nível de ensino e a população em idade escolar
população em E = Número de alunos de todas as (5 - 34 anos).
idade escolar) idades a frequentar qualquer nível
de ensino
∑34
a = 5 Pa = População total
Ea
× 100%
Pa
Taxa específica de Relação percentual entre o número de alunos a frequentar
escolarização em que: qualquer nível de ensino com uma dada idade e a população
por idade dessa mesma idade.
Ea = Número de alunos com a idade a
a frequentar qualquer nível de ensino
Pa = População total com a idade a
El
× 100% Relação percentual entre o número de alunos a frequentar um
Pa
dado nível de ensino e a população com idade para frequentar
Taxa específica de esse mesmo nível de ensino.
escolarização por em que: (Por exemplo, embora teoricamente qualquer pessoa possa
nível de ensino El = Número total de alunos a frequentar estar a frequentar o ensino secundário, é mais provável que
o nível de ensino l isso aconteça em indivíduos com idades entre os 14 e os
Pa = População total com idade para 18 anos.)
frequentar esse nível de ensino
Eal
× 100%
Pa
Taxa específica de Relação percentual entre o número de alunos com uma
escolarização por em que: determinada idade a frequentar um dado nível de ensino e a
nível de ensino Eal = Número total de alunos com idade a população com idade para frequentar esse mesmo nível de
e idade a frequentar o nível de ensino l ensino.
Pa = População total com idade para
frequentar esse nível de ensino
100
Além destes indicadores, e porque a proporção de alunos a frequentar o ensino está
relacionada com os níveis de juventude e de envelhecimento da população, é comum utilizar
medidas padronizadas de escolarização. Nestas, utiliza-se uma estrutura etária padrão
e aplica-se a esta as taxas específicas de escolarização por idade, de forma a obter uma taxa
única (ao invés de taxas específicas para um x número de grupos etários) já ‘corrigida’, que
permite estabelecer comparações entre países e regiões com estruturas etárias distintas.
O tema da padronização de taxas será aprofundado no Capítulo 7.
Analfabetismo
É preferível que os dados sobre alfabetização sejam obtidos para todas as pessoas com
10 ou mais anos de idade, pois essa é a idade em que é suposto que qualquer criança
já saiba ler e escrever. Assim, um dos indicadores mais usados, a taxa de analfabetismo,
também chamada taxa bruta de analfabetismo ou taxa geral de analfabetismo, é definida do
seguinte modo:
I × 100%
P
em que
I corresponde ao número de indivíduos com 10 anos ou mais que não sabem ler nem escrever
P é o número total de indivíduos com 10 anos ou mais
Nos países em que foram feitos grandes avanços na educação nos últimos anos, a taxa bruta
de analfabetismo ainda pode ser alta, devido à inclusão das coortes menos alfabetizadas.
Deste modo, a apresentação de índices de analfabetismo para grupos etários, não apenas
fornece uma indicação da magnitude do problema de analfabetismo para os diferentes
segmentos etários da população, mas também fornece algumas indicações da eventual
mudança histórica no analfabetismo. Para tal, é comum calcular a taxa específica de
analfabetismo por grupo etário:
Ia
× 100%
Pa
em que
Ia corresponde ao número de indivíduos que não sabem ler nem escrever com a idade a
Pa é o número total de indivíduos com a idade a
101
Este indicador apresenta algumas limitações. Primeiro, em países de alto rendimento, com
elevados níveis de literacia, a taxa de analfabetismo tem perdido grande parte do seu interesse
enquanto indicador de desenvolvimento social. Segundo, o conceito de saber ler e escrever
pode ser interpretado de diferentes formas em diferentes países e tal pode dar origem a um
sub-relato diferencial. Terceiro, enquanto num país com altos níveis de analfabetismo, uma
pessoa não terá muita relutância em intitular-se analfabeta ao responder a um inquérito ou
censo, num país com elevado nível de alfabetização, muitos analfabetos poderão hesitar em
se identificar como tal, por ser uma situação socialmente não muito bem aceite, podendo-se
considerar até estigmatizante.
Escolaridade
Normalmente, a escolaridade é medida, não pelo número de anos que uma pessoa
passou na escola, mas pelo nível mais alto que ele foi capaz de concluir. Para fins de
comparação internacional, são necessários os dados do censo populacional para três níveis
de ensino: primário, secundário e pós-secundário. Além disso, para garantir uniformidade,
é recomendado que os países classifiquem os níveis de escolaridade de acordo com
a Classificação Internacional Normalizada da Educação (ou classificação equivalente).
g+
Da
× 100%
Pa
em que
g+
Da corresponde ao número de pessoas com idade a que concluíram o nível g ou mais
Pa corresponde à população com idade a
102
Em Portugal calculam-se frequentemente as seguintes proporções:
• Proporção da população residente com pelo menos o ensino básico completo: população
residente com 15 ou mais anos de idade, com o 3º ciclo do ensino básico concluído, em
relação à população residente com 15 ou mais anos de idade. Expressa-se através de %.
À população que está envolvida na produção de bens e serviços chamamos população ativa.
Assim, os ativos são a mão-de-obra disponível para trabalhar, incluindo-se na população
ativa os trabalhadores que estão empregados e os desempregados. O desempregado
é quem está à procura de emprego, seja novo emprego ou primeiro emprego.
Por sua vez, a população empregada, segundo o INE, inclui qualquer indivíduo com idade
mínima de 15 anos que, no período de referência, se encontrava numa das seguintes
situações: a) tinha efetuado trabalho de pelo menos uma hora, mediante pagamento
de uma remuneração ou com vista a um benefício ou ganho familiar em dinheiro ou em
géneros; b) tinha um emprego, não estava ao serviço, mas tinha uma ligação formal com
o seu emprego; c) tinha uma empresa, mas não estava temporariamente ao trabalho por
uma razão específica; d) estava em situação de pré-reforma, mas encontrava-se a trabalhar
no período de referência.
População empregada
× 100
População ativa
População desempregada
× 100
População ativa
103
Além destes indicadores, é também comum calcular a taxa de atividade, que estabelece
a relação entre a população ativa e a população total:
População ativa
× 100
População total
Esta taxa pode também ser restrita aos indivíduos em idade laboral (no caso português,
os que possuem idade igual ou superior a 15 anos), usando a expressão seguinte:
Setor de atividade
104
Ocupação
Situação na profissão
• Empregado (Pessoa que trabalha num local em que o contrato explícito ou implícito
de emprego concede ao titular uma remuneração básica independente da receita da
unidade para a qual ele trabalha).
• Trabalhador por conta própria (Pessoa que trabalha num local em que a remuneração
depende diretamente dos lucros - ou do potencial de lucros - decorrentes das transações
de mercado com os bens e serviços produzidos).
105
Rendimento
Por sua vez, a riqueza representa os recursos disponíveis para uma pessoa ou família
e é normalmente medida pelo número de bens que uma pessoa ou família possuem
(ex.: casas, carros, investimentos, etc.). As medidas de riqueza tornaram-se úteis porque
geralmente fornecem uma imagem mais abrangente do bem-estar económico do que as
medidas de rendimento. A informação sobre rendimento e riqueza provém geralmente de
censos e inquéritos temáticos.
Índices multivariados
Por incluir uma ampla gama de variáveis, considera-se que elas refletem melhor a natureza
multidimensional da privação. Os índices multivariados de privação começaram a ser
desenvolvidos na década de 70 no Reino Unido, mas atualmente quase todos os países
106
europeus têm o seu próprio índice de privação ou usam uma medida já estabelecida, como
o índice de Carstairs & Morris, o índice de Townsend ou o Índice de Privação Europeu. A
Tabela 16 sumaria a forma de cálculo de cada um desses índices, muito embora para sua
melhor compreensão se recomende a leitura dos trabalhos metodológicos originais.
Tabela 16. Alguns dos índices de privação socioeconómica mais utilizados atualmente (Fontes
da informação: UK Data Service (2012-2021); Ribeiro et al (2017); Ribeiro et al (2018); Rey et al
(2009)).
Índice Fórmula
Índice de Privação Europeu Soma ponderada de oito variáveis pré-selecionadas com base em critérios
Portugal (Censo 2011) teóricos e estatísticos depois de normalizadas para a média nacional (z-score):
% de alojamentos ocupados por não-proprietários
% de alojamentos sem retrete
% de alojamentos com 5 divisões ou menos
% de residentes em trabalhos de colarinho-azul (ou seja, operários)
% de residentes com baixo nível de escolaridade (≤6 anos)
% de residentes a trabalhar por conta própria ou por conta de outrem
(i.e. não empregadores)
% de residentes desempregados à procura de emprego
% de residentes estrangeiros
Índice de Privação Europeu Soma ponderada de oito variáveis pré-selecionadas com base em critérios
Portugal (Censo 2001) teóricos e estatísticos depois de normalizadas para a média nacional (z-score):
% de alojamentos ocupados por não-proprietários
% de residentes com baixo nível de escolaridade (≤6 anos)
% de alojamentos sem retrete
% de alojamentos sem duche/banheira
% de alojamentos com 5 divisões ou menos
% de residentes em trabalhos de colarinho-azul (ou seja, operários)
% de residentes desempregados à procura de emprego
% de residentes mulheres com 65 anos ou mais
Índice de Carstairs & Morris Soma ponderada de quatro variáveis normalizadas (z-score):
% de homens desempregados à procura de emprego
% de residentes que não possuem carro próprio
% de residentes em alojamentos sobrelotados
% de residentes de baixa classe social (ou seja, operários)
Índices de privação Indicador constituído por dezenas de variáveis cobrindo sete grandes domínios:
socioeconómica do rendimento, emprego, educação, saúde, crime, barreiras à habitação e serviços,
Reino Unido e ambiente.
107
ÍNDICE DE DIVERSIDADE
Este indicador mede o quão diversa é uma população em relação a uma ou mais variáveis, em
particular variáveis de natureza socioeconómica e cultural. É usado para analisar a distribuição
da população de acordo com variáveis categóricas como a língua, a ocupação, a religião, etc.
Se estivermos a lidar com variáveis contínuas (por exemplo, idade e rendimento), a diversidade
é normalmente expressa através de parâmetros estatísticos convencionais como o desvio
padrão e o intervalo interquartil. Após normalização, este índice varia entre 0 (homogeneidade
total, todos os elementos pertencem à mesma categoria) e 1 (heterogeneidade total, os
elementos estão distribuídos de forma equitativa por todas as categorias).
Aw = 1 − [ ( x1 )2 + ( x2 )2 + ( x3 )2 ... + ( xn )2 ]
1
Aw máximo = 1 −
n
Para facilitar comparações, é possível normalizar o índice de forma a fixar o valor máximo
em 1, recorrendo-se à expressão
Aw
Aw normalizado =
Aw máximo
Tabela 17. Exemplificação do cálculo do índice de diversidade (Fonte dos dados: INE).
108
Os índices de diversidade do Cávado (0,19) e da Grande Lisboa (0,50) são substancialmente
diferentes, o mesmo sucedendo com os correspondentes valores normalizados - 0,21
e 0,57, respetivamente - obtidos pela sua divisão pelo valor máximo possível do índice, que
é 0,88, pois a religião está subdividida em oito categorias (1 – 1/8 = 0,875). Estes resultados
revelam que a população de Grande Lisboa é muito mais heterogénea na religião do que
a do Cávado.
ÍNDICE DE SEGREGAÇÃO
Existem diversos indicadores de segregação, muito embora todos eles partam do índice
de dissimilaridade. Os índices de segregação são particularmente utilizados em estudos
urbanos, ao nível de pequenas áreas geográficas, para identificar por exemplo a existência
de guetos ou de forte segregação espaço-social.
Tabela 18. Exemplificação do cálculo do índice de segregação (Fonte dos dados: INE).
109
ÍNDICE DE GINI E CURVA DE LORENZ
A curva de Lorenz mostra em que medida uma dada distribuição é desigual em comparação
com uma distribuição equilibrada. A curva de Lorenz é um diagrama de dispersão com
eixos de igual comprimento onde se representa a distribuição cumulativa de duas variáveis.
Estas variáveis podem ser, por exemplo, a população e o rendimento (caso queiramos
avaliar desigualdade de rendimento) ou a distribuição geográfica de um grupo maioritário
e de um minoritário (caso queiramos avaliar segregação espacial). O resultado será um
gráfico de forma quadrada com valores entre 0 e 1 em cada um dos eixos e com uma linha
diagonal desde o topo até ao fim do gráfico que indica ausência de diferença entre as duas
distribuições cumulativas.
110
Tabela 19. Exemplificação do cálculo do índice de GINI com base na escolaridade no município
do Porto (Fonte dos dados: INE).
PROPORÇÃO
LOCALIDADE PROPORÇÕES
RAZÃO ENTRE CUMULATIVA
PRODUTOS CRUZADOS
Ensino Níveis PROPORÇÕES Ensino Níveis
Área geográfica
superior inferiores superior inferiores
i X Y X /Y Xi Yi Xi ×Yi +1 Xi +1×Yi
A B C D E F G H
Origem 0,0000 0,0000
Nevogilde 0,0408 0,0155 2,64 0,0408 0,0155 0,0022 0,0018
Foz do Douro 0,0730 0,0386 1,89 0,1138 0,0541 0,0091 0,0083
Massarelos 0,0394 0,0255 1,55 0,1533 0,0795 0,0252 0,0218
Cedofeita 0,1202 0,0851 1,41 0,2735 0,1646 0,0697 0,0626
Lordelo do Ouro 0,1065 0,0901 1,18 0,3800 0,2547 0,1167 0,1120
Aldoar 0,0598 0,0524 1,14 0,4399 0,3071 0,2035 0,1888
Ramalde 0,1750 0,1557 1,12 0,6149 0,4628 0,3995 0,3700
Paranhos 0,1848 0,1869 0,99 0,7997 0,6497 0,6018 0,5841
Bonfim 0,0993 0,1029 0,96 0,8990 0,7526 0,7126 0,6998
Santo Ildefonso 0,0308 0,0401 0,77 0,9298 0,7927 0,7460 0,7415
Miragaia 0,0056 0,0096 0,58 0,9354 0,8023 0,7592 0,7532
Vitória 0,0034 0,0093 0,36 0,9388 0,8116 0,9133 0,8061
Campanhã 0,0545 0,1613 0,34 0,9933 0,9729 0,9836 0,9709
Sé 0,0047 0,0174 0,27 0,9980 0,9902 0,9980 0,9902
São Nicolau 0,0020 0,0098 0,21 1,0000 1,0000
SOMAS 1,0000 1,0000 5,54 5,32
Índice de Gini
(soma de G 0,22
menos soma de H)
1,00
0,90
0,80
superior
0,70
superior
0,60
ensino
ensino
0,50
% cumulativa
% cumulativa
0,40
0,30
0,20
0,10
0,00
0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00
% cumulativa outros
% cumulativa níveis
outros de ensino
níveis de ensino
Figura 16. Curva de Lorenz para o índice de GINI com base na escolaridade no município do Porto.
111
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
INE (2011, 10 set 2021). Classificação Portuguesa das Profissões: 2010. Instituto Nacional
de Estatística.
https://www.ine.pt/xurl/pub/107961853
Rey, G., Jougla, E., Fouillet, A., & Hémon, D. (2009). Ecological association between a
deprivation index and mortality in France over the period 1997 – 2001: variations with spatial
scale, degree of urbanicity, age, gender and cause of death. BMC Public Health, 9 (1), 33.
doi:10.1186/1471-2458-9-33
Ribeiro, A. I., Mayer, A., Miranda, A., & de Pina, M. d. F. (2017). The Portuguese Version of
the European Deprivation Index.: An Instrument to Study Health Inequalities. Acta Médica
Portuguesa; Vol 30, No 1 (2017): JanuaryDO - 10.20344/amp.7387.
Ribeiro, A. I., Launay, L., Guillaume, E., Launoy, G., & Barros, H. (2018).
The Portuguese version of the European Deprivation Index: Development
and association with all-cause mortality. PloS one, 13(12), e0208320.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.0208320
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
ONU. (2003). Ethnicity: A Review of Data Collection and Dissemination Social and Housing
Statistics Section Demographic and Social Statistics Branch. United Nations Statistics
Division.
ONU. (2017). Principles and Recommendations for Population and Housing Censuses.
United Nations – Department of Economic and Social Affairs Statistics Division.
112
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f.
1. Com base nos dados fornecidos referentes à distribuição da população de acordo com
etnia nos Estados Unidos em 2010, determine o índice de diversidade normalizado para
as várias regiões. Interprete e comente os resultados obtidos.
Negros ou Afro-
37926254 6143605 6871170 21664983 3246496
americanos
Índios Americanos e
2263342 122721 389633 742752 1008236
Indígenas do Alasca
113
2. Com base nos dados fornecidos, referentes à distribuição espacial da população de
Lisboa em função do nível de escolaridade, determine o índice de segregação e o índice
de GINI. Interprete e comente os resultados obtidos, estabelecendo uma comparação
com os resultados obtidos para a cidade do Porto (Tabelas 18 e 19 e Figura 16).
Freguesia Ensino superior Outro nível Freguesia Ensino superior Outro nível
Ajuda 13448 2136 Prazeres 5807 2289
114
115
CAPÍTULO 6:
CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO
C = Pn − P0
Assumindo uma população fechada, não afetada por migrações externas, o crescimento
populacional traduz o balanço entre os nascimentos (N ) e as mortes (O ), ocorridos num
dado período de tempo (t ).
C = Nt − Ot
116
Contudo, a maioria das populações não é fechada e, numa população aberta, existem quatro
modos de alterar o tamanho de uma população – entradas (nascimentos e imigração, I )
e saídas (mortes e emigração, E ). Assim, a equação do crescimento populacional deve
ser ampliada:
C = Nt − Ot + It + Et
Ambas são mais frequentemente expressas em termos relativos, sob a forma de taxas.
A vantagem de usar taxas prende-se com o facto de permitirem comparar o crescimento
populacional entre épocas e zonas geográficas distintas. É expectável que, num país grande,
os valores do crescimento absoluto sejam superiores aos de um país pequeno, pelo que só
os valores do crescimento relativo (ou seja, das taxas) nos permitem responder à pergunta
acerca de qual desses países regista um crescimento populacional mais rápido.
Pn − P0
TCE = × 100%
Pm
Nt − Ot
TCN = × 100%
Pm
It − Et
TCM = × 100%
Pm
Deste modo, a taxa de crescimento efetivo (TCE ) pode também ser obtida simplesmente
somando as duas taxas anteriores:
Atente-se no facto de os valores destas taxas (assim como dos correspondentes crescimentos
absolutos) não serem necessariamente positivos. Por exemplo, Portugal em grande parte
deste início de milénio tem registado taxas de crescimento efetivo anuais negativas (perde
população), resultado das igualmente negativas taxas de crescimento natural e migratório.
Como acontece com qualquer indicador demográfico, esta tendência não pode ser
generalizada a todo o território português, existindo áreas onde este saldo continua a ser
positivo.
117
POPULAÇÃO MÉDIA VS. POPULAÇÃO A MEIO DO ANO
Admitindo que, como é habitual, se pretende calcular a taxa de crescimento
populacional anual, o procedimento mais correto consiste em usar como
denominador, não o efetivo populacional no início do ano, mas sim a “population
at risk”, isto é, a população exposta aos eventos que determinam a variação do
tamanho da população durante esse ano: nascimentos, mortes e migrações.
P1 − P0
Pm =
2
Por sua vez, a população a meio do ano é, por norma, o efetivo populacional
no dia 1 de julho, parâmetro que vários institutos nacionais de estatística
disponibilizam. A sua utilização, como medida da população exposta aos
eventos demográficos ocorridos no decurso do ano, justifica-se por ser razoável
supor que a população aumenta ou diminui de modo regular.
Assim, o valor da população a meio do ano seria em princípio uma boa medida
da população média, nos casos em que não se dispõe dos valores intermédios
necessários para a estimar. Porém, nas situações em que a população residente
varia sazonalmente ou de forma muito irregular, o valor da população no dia
1 de julho poderá ser tão pouco representativo da população média anual, como
a população no dia 1 de janeiro ou no dia 31 de dezembro.
Resta referir que, dado que em grande número de áreas geográficas as variações
anuais dos efetivos populacionais são modestas, a opção por uma ou por outra
das medidas acima referidas não se traduz em diferenças significativas nos
valores das taxas de crescimento populacional.
118
As taxas que acabamos de definir usam como denominador a população média ou a meio
do período a que se referem. Contudo, quando o objetivo é efetuar previsões de crescimento
populacional, como veremos de seguida, são calculadas outras taxas de crescimento, que
usam como denominador ou referência a população no início do período.
Crescimento aritmético
Uma população cujo crescimento é aritmético (2, 4, 6, 8…) tem sempre a mesma variação
absoluta anual. Por exemplo, se uma população inicialmente de 200 000 habitantes aumentar
anualmente 5000 habitantes, nos anos seguintes será sucessivamente 205 000, 210 000,
215 000…
É na assunção deste modelo de crescimento que foi definida a taxa de variação anual da
população r 16 ou taxa de crescimento aritmético
Pn − P0
n
r =
P0
15 Isto no caso de se estar a estudar a variação temporal de estratos da população. Exemplos: população rural
vs. urbana, população agrupada por setores de atividade, etc.
16 Frequentemente expressa também sob a forma de uma percentagem.
119
No caso mais comum, em que as duas contagens são separadas de um ano, faz-se
simplesmente
P1 − P0
r =
P0
Note-se que, embora o crescimento anual absoluto (C ) seja constante, as taxas anuais de
variação da população não o são, pois o denominador é alterado de ano para ano, à medida
que a população (P0 ) varia.
35000
30000
25000
população
população
20000
15000
10000
5000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
São muito raros os exemplos de populações atuais que variem de acordo com as premissas
do crescimento aritmético – aliás, este normalmente só tem aplicação prática em contextos
empresariais e financeiros. Contudo, como atrás se referiu, uma das medidas mais usadas em
demografia, nomeadamente pelos institutos nacionais de estatística, a taxa de variação anual
ou taxa de crescimento aritmético, é definida com base neste modelo de crescimento.
Pn = P0 + r × n × P0 ou Pn = P0 × ( 1 + r × n )
em que
Pn é a população no final do período
P0 é a população no início do período (o ano inicial usado para o cálculo de r )
120
Desta equação pode ser derivada a expressão que dá um parâmetro muito usado em
estudos demográficos, o tempo de duplicação td ou “doubling time”, entendido como o tempo
necessário para que a população duplique, assumindo o mesmo ritmo de crescimento:
1
td =
r
Tendo em conta o que atrás foi dito, a aplicabilidade destas equações na previsão da
evolução futura de quantitativos populacionais restringe-se a períodos relativamente curtos,
onde não tenham ocorrido grandes mudanças nos fatores demográficos.
Crescimento geométrico
Para a mesma taxa anual, o crescimento geométrico (desde que positivo) conduz, com
o decorrer do tempo, a efetivos populacionais maiores que o crescimento aritmético pois,
enquanto no modelo aritmético a variação absoluta anual é constante, no modelo geométrico
os incrementos absolutos anuais têm de aumentar continuamente, para que o valor da taxa
se mantenha – grosseiramente teremos 2, 4, 8, 16...
O modelo geométrico produz uma linha quebrada (Figura 18) que se assemelha a curva
suave.
455000
405000
355000
305000
255000
população
205000
155000
105000
55000
5000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
121
A taxa de crescimento anual (r ) é dada por:
n
Pn 1⁄n Pn
r = ( P0
)
− 1 ou r = √
P0
− 1
P1
r = − 1
P0
Para estimar a população futura, ao fim de n anos, esta taxa poderá ser aplicada à população
no início do período:
Pn = P0 × ( 1 + r )n
Da equação pode-se também obter uma expressão para o tempo de duplicação, segundo
este modelo de crescimento:
ln 2
td =
ln ( 1 + r )
Crescimento exponencial
1205000
1005000
805000
população
605000
405000
205000
5000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
122
A correspondente taxa de crescimento anual (r ) é dada por:
P
ln ( Pn0 )
r =
n
P
r = ln ( P10 )
Para estimar a população futura, ao fim de n anos, esta taxa pode ser aplicada à população
no início do período:
a
Pn = P0 × e rn
em que e é uma constante matemática (= 2,71828…), por vezes designada número de Euler.
ln 2
td =
r
Tabela 20. Comparação de taxas e tempos de duplicação para vários modelos de crescimento.
Por outro lado, é possível constatar também que, embora para taxas anuais idênticas
o crescimento exponencial seja mais rápido que o geométrico, os valores da população
previstos e os tempos de duplicação assumindo crescimento exponencial são rigorosamente
iguais aos obtidos assumindo crescimento geométrico, desde que as taxas de crescimento
de ambos (agora necessariamente diferentes) sejam calculadas a partir dos mesmos valores
populacionais.
rgeométrico = e rexponencial − 1
18 No modelo aritmético, para que o crescimento absoluto permaneça constante, as taxas de crescimento anual
têm de diminuir com o tempo. Neste caso, apresentam-se os valores para 2020-2021 e 2021-2022.
123
Crescimento logístico
A curva logística é uma curva em “S”, em que no período inicial o crescimento populacional
é lento, seguindo-se um período de crescimento exponencial e, por fim, um plateau
(Figura 20).
população
tempo
Em primeiro lugar, é feita uma projeção da evolução de cada um destes indicadores, tendo
em conta as variáveis de que dependem. Obtida a evolução futura de cada componente da
dinâmica populacional, torna-se possível prever os valores de cada uma ao longo de uma
janela temporal, o que permite estimar os efetivos populacionais nos momentos pretendidos.
Apesar da incerteza inerente a este método, até porque a evolução futura de algumas das
componentes (o caso mais flagrante são as migrações) é difícil de prever, é o mais usado
pelos institutos de estatística na produção das projeções da população.
124
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Lundquist, J. H., Anderton, D. L., & Yaukey, D. (2014). Demography: the study of human
population. Waveland Press.
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
125
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f.
A. M. R. A. R. A.
Portugal Norte Centro Alentejo Algarve
Lisboa Açores Madeira
2009 10 573 479 3 705 980 2 337 787 2 808 205 762 068 445 824 246 900 266 715
2010 10 572 721 3 693 585 2 331 642 2 822 761 758 707 451 304 246 757 267 965
2011 10 542 398 3 687 224 2 316 169 2 827 050 754 385 446 140 247 194 264 236
2012 10 487 289 3 666 234 2 298 938 2 818 388 748 699 444 390 247 549 263 091
2013 10 427 301 3 644 195 2 281 164 2 807 525 743 306 442 358 247 440 261 313
2014 10 374 822 3 621 785 2 263 992 2 809 168 733 370 441 468 246 353 258 686
126
2. Segundo os dados disponibilizados pelo INE à data dos censos, o município de Alcochete
apresentava uma população de 10169 habitantes em 1991 e de 13010 habitantes em
2001. Com base nesta informação:
2.3 Visite o website do INE e confronte o valor estimado para 2011 e 2021 com os
obtidos nos resptivos censos. Comente os resultados obtidos.
127
CAPÍTULO 7:
MORTALIDADE
CONSIDERAÇÕES GERAIS
O evento que determina a mortalidade é a morte ou óbito. Talvez porque a morte seja um
evento preciso, facilmente definível, e ocorra apenas uma vez para cada indivíduo, as técnicas
usadas para analisar a mortalidade têm uma longa história e são mais desenvolvidas do que
as relacionadas com a fecundidade e as migrações. Os estudos de mortalidade remontam
aos trabalhos pioneiros realizados por Graunt (1662) e William Farr (1851), este conhecido
por propor a primeira classificação internacional de doenças (CID).
Para fins estatísticos, óbito é definido pelo INE como a “cessação irreversível das funções
do tronco cerebral”. Também pode ser definido como o “desaparecimento permanente de
qualquer sinal de vida em qualquer momento após o nascimento com vida”. Embora esta
definição exclua os óbitos que antecedem o nascimento, estes são também registados
(os denominados óbitos fetais). Para o INE, o óbito fetal corresponde à “morte de um
produto da fecundação antes da expulsão ou extração completa do corpo da mãe,
independentemente da duração da gravidez”. O óbito é assinalado pela circunstância do
feto, depois de separado, não respirar, nem manifestar quaisquer outros sinais de vida tais
como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical ou contrações efetivas de
qualquer músculo sujeito à ação da vontade. Aqui se incluem nados-mortos, mas também
abortos espontâneos e planeados.
128
As estatísticas de mortalidade assumem um papel central na prática e investigação em saúde
pública. Além de essenciais na medida e na previsão dos efetivos populacionais, permitem
caracterizar populações do ponto de vista epidemiológico, monitorizar tendências e padrões
de doenças e ainda, do ponto de vista mais prático, o estabelecimento de orientações com
vista à promoção da saúde, alocação de recursos, planeamento de serviços e definição
de prioridades na política de saúde. As estatísticas de mortalidade servem de substituto
às estatísticas de saúde em países onde as segundas não existem ou são incompletas.
O aumento da sobrevivência deve-se em grande parte à recolha e sistematização de
estatísticas da mortalidade, análise de tendências e análise de diferenças entre países
e regiões. Tal permitiu identificar fatores de risco e áreas prioritárias de intervenção.
Conforme referido no capítulo 2, o registo civil é o sistema mais importante para contar
mortes. Porém, em países sem registo civil estruturado, é comum obter informação de
mortalidade através de questionários demográficos domiciliários, onde são frequentemente
incluídas questões retrospetivas acerca do número de óbitos no agregado familiar no ano
anterior. O óbito é normalmente registado à data do evento e no local de residência do
falecido (de jure).
No entanto, a primeira tentativa sistemática conhecida foi a preconizada por John Graunt,
e apareceu na sua afamada publicação de 1662, "Natural and Political Observation Made
Upon the Bills of Mortality", onde analisou a mortalidade de Londres, a partir dos dados
registrados nas paróquias, segundo variáveis como sexo, idade e causa.
129
Tabela 21. Classificação de doenças proposta por Graunt (Fonte: Laurenti (1991)).
Depois desta primeira sistematização das doenças, entre os séculos XVII e XIX, outras
tentativas foram feitas por vários médicos e cientistas: Platter, Sydenham, Linneu (“Genera
Morborum” ), Francois de Lacroix (”Nosologia Methodica” ), Vogel, Cullen (“Synopsis
Nosologiae Methodicae” ), etc. Estas classificações, contudo, quase sempre não passavam
de exercícios médicos, à maneira de trabalhos académicos, sem aplicações aparentes.
Acima de tudo, não havia uma classificação universalmente aceite, o que dificultava
e praticamente impedia a comparação entre países da informação sobre a frequência das
causas de morte. No século XIX, surgiram as primeiras tentativas nesse sentido.
130
A classificação de Bertillon apresentava 14 grupos ou capítulos que, em conjunto,
compreendiam 161 categorias ou causas de morte (Tabela 22). Esta é a base da atual CID
que vai hoje na sua 10ª revisão.
I Doenças Gerais
X Vícios de Conformação
XI Primeira Idade
XII Velhice
A mortalidade pode ser expressa usando diferentes tipos de taxas e indicadores. Uma das
medidas mais simples e básicas é a taxa bruta de mortalidade. A taxa bruta de mortalidade
(M ) corresponde ao risco que os indivíduos de uma população têm de morrer, no decorrer
de um dado período, geralmente 1 ano. É o quociente entre o total de óbitos (O ) no decurso
de um ano e a população média desse ano (ou, na sua falta, a meio do ano), P , sendo
normalmente expresso por 1000 habitantes:
O
M = × 1000
P
Como as taxas brutas são afetadas pela estrutura etária, não é válido comparar populações
distintas usando taxas brutas, mas sim taxas padronizadas (abordadas adiante).
131
Às vezes, para representar um período mais longo e/ou obter estimativas mais estáveis,
é calculada uma taxa média anual, a partir de óbitos ocorridos durante dois ou três anos.
Essas taxas podem ser calculadas de maneiras diferentes, como adiante se exemplifica com
a taxa média anual para um triénio.
O1 + O 2 + O 3
M = × 1000
P1 + P2 + P3
Outro procedimento, que normalmente produz valores semelhantes, passa por dividir a
média aritmética dos óbitos anuais pela população média no ano intermédio:
1 (O + O + O )
1 2 3
3 × 1000
M =
P2
Tendo em vista a estreita relação entre idade e risco de morte, a idade pode ser considerada
a variável demográfica mais importante na análise da mortalidade. Nenhuma outra
característica geral do falecido ou do evento oferece uma pista tão definida quanto ao risco
de mortalidade. Outras características do falecido, como sexo, estatuto socioeconómico
e local de residência, são também elementos de importância primordial.
Em conformidade com o que foi atrás dito, as taxas específicas são aquelas que apresentam,
no numerador e/ou no denominador, outras especificações, para além da área de estudo
ou do período temporal. Essas especificações podem ser sexo, idade, nível de instrução,
ocupação, rendimento, causa de morte, etc.
Assim, a taxa específica de mortalidade por idade expressa o risco de morte numa dada
idade ou faixa etária (a) e é obtida através da razão entre o total de óbitos nessa idade ou
grupo etário, num dado período, e a população desse grupo etário ou idade no meio do
período em estudo. É também normalmente expressa por 1000 habitantes:
Oa
Ma = × 1000
Pa
132
Conhecidas as taxas específicas por idade, também é possível obter a taxa bruta de
mortalidade pois, no fundo, a taxa bruta de mortalidade nada mais é que a média
O
ponderada das taxas específicas por idade ( P a ), com pesos tanto maiores quanto maior
a
a proporção dos efetivos ( Pa ) de cada grupo etário (a):
P
∞ Oa Pa
∑
a=0
( Pa )( P )
Por exemplo, numa população mais jovem, será atribuído maior peso às taxas específicas
das idades entre os 0 e os 14 anos, o que dará um valor mais baixo para a taxa bruta
de mortalidade do que o registado em populações mais envelhecidas. É isto que justifica
a necessidade de padronizar taxas por idade. Analogamente, podem ser definidas taxas
específicas por sexo, sexo e idade, nível de escolaridade, etc.
As taxas de mortalidade por causa de morte (Mc ) são obtidas usando a fórmula abaixo,
sendo neste caso habitualmente expressas em óbitos por 100 000 habitantes:
Oc
Mc = × 100 000
P
Por sua vez, para obter a proporção de mortes por causa, basta ter a distribuição dos óbitos
por causa de morte, pelo que pode ser calculada mesmo em períodos e locais em que
a informação populacional não está disponível. Essa proporção mede o peso relativo das
diferentes causas de morte e resulta da seguinte fórmula:
Oc
× 100%
O
Na Tabela 23 apresenta-se a distribuição da proporção de mortes por causa nos anos de 2018
e de 1930 em Portugal, sendo notória a passagem de uma fase da transição epidemiológica
marcada pelo predomínio das doenças transmissíveis para a fase atual, em que predominam
as doenças não transmissíveis do tipo crónico.
133
Tabela 23. Óbitos por causa de morte (% em relação ao total) em Portugal nos anos de 2018
e de 1930 (Fontes: INE; Rodrigues, Moreira & Henriques (2010)).
PADRONIZAÇÃO DE TAXAS
As taxas padronizadas podem ser calculadas pelo método direto ou pelo método indireto,
os quais irão ser apresentados de seguida. Resumidamente, no método de padronização
direta é usada uma estrutura etária padrão, enquanto na padronização indireta é usado um
conjunto padrão de taxas específicas por idade.
No método direto de padronização é calculada uma média ponderada das taxas específicas
na população em estudo, usando como pesos a distribuição (por idade, sexo, etc.) de
uma certa população padrão. A taxa padronizada pelo método direto diz-nos qual seria
a taxa bruta na população estudada, se essa população tivesse a mesma distribuição que
a população padrão, no que respeita às variáveis para as quais o ajuste foi realizado.
134
No ano em questão (2018), o Brasil tinha uma taxa bruta de mortalidade de 6,14 por mil
habitantes, enquanto a taxa bruta portuguesa era quase o dobro: 11,05 por mil.
Contudo, é do conhecimento geral que a população portuguesa é uma das mais envelhecidas
do mundo, ao passo que a população brasileira ainda é relativamente jovem, tendo essa
diferença nas pirâmides etárias certamente reflexo na diferença existente a nível das taxas
brutas de mortalidade. Só assim se compreende que haja mais óbitos por mil habitantes
em Portugal do que no Brasil, apesar de as taxas específicas de mortalidade portuguesas
serem – com a única exceção do grupo dos muito idosos – invariavelmente inferiores às
correspondentes brasileiras.
Tabela 24. Estatísticas necessárias para o cálculo das taxas específicas de mortalidade:
população e óbitos por grupo etário (Fonte dos dados: INE & Instituto Brasileiro de Opinião
Pública e Estatística).
Por esse motivo, a grande questão a que pretendemos dar resposta é: ‘‘Qual seria a taxa
bruta de mortalidade do Brasil, se a população do Brasil tivesse a mesma estrutura etária
que a população de Portugal?’’.
1. Escolher a população padrão, aquela cuja distribuição etária será o padrão de comparação
de todas as populações a padronizar.
2. Listar as contagens de cada grupo etário da população padrão, assim como as taxas
específicas por idade da população a padronizar.
135
3. Calcular o número esperado de óbitos que ocorreriam na população padrão, caso esta
fosse sujeita às taxas específicas de mortalidade da população a padronizar.
4. Somar o número de óbitos esperados, para obter o número total de óbitos que seriam
esperados na população padrão.
5. Calcular a taxa bruta padronizada por idade, dividindo pela população padrão total
a soma do número de óbitos esperados (e multiplicando depois por 1000).
∑ Ma Pa
taxa padronizada (método direto) =
P
em que
P é a população padrão total;
Pa é a população padrão de um determinado grupo etário;
Ma é a taxa específica de mortalidade para um determinado grupo etário, na população
a padronizar, ou seja, ( Oa ).
Pa
Importa referir que a utilização de populações padrão diferentes leva a resultados igualmente
diferentes, pelo que a população padrão a usar deve ser aquela que permitirá comparações
mais úteis e lógicas, ou seja, em princípio uma que tenha uma distribuição etária o mais
próxima possível do conjunto das populações em estudo.
136
10
5
%
0
0-4 5-9 10-14 15-19 20-24 25-29 30-34 35-39 40-44 45-49 50-54 55-59 60-64 65-69 70-74 75-79 80-84 +85
Retomando o nosso exemplo, o resultado final (Tabela 25) mostra que, se o Brasil tivesse
a estrutura etária de Portugal, a sua taxa bruta de mortalidade seria de 12,88 por mil, um
número que é mais do dobro do observado, 6,14 por mil. Seria, por outro lado, superior
à de Portugal (12,88 vs. 11,05 por 1000), o que está em sintonia com os valores igualmente
superiores de quase todas as taxas específicas, como atrás se referiu.
137
Tabela 25. Exemplo de padronização de taxas de mortalidade por idade pelo método direto.
138
Tabela 26. Exemplo de padronização de taxas de mortalidade pelo método direto, usando duas
variáveis de padronização (sexo e idade) (Fonte: Rowland (2003)).
O valor obtido (12,95 por mil) não é, como se esperaria19, rigorosamente coincidente com
o da taxa de mortalidade apenas padronizada para a idade (12,75), e muito diferente
e superior ao da taxa bruta (apenas 2,18 por mil), pois a população do Kuwait é muito jovem.
É usado quando as taxas específicas por idade da população a estudar são estatisticamente
instáveis e/ou desconhecidas, situação comum em países de baixo rendimento. É também
muitas vezes usado quando queremos comparar os níveis de mortalidade de pequenas
áreas (ex.: municípios) com os níveis de mortalidade de uma área maior (ex.: país).
No método indireto, as taxas específicas da população padrão são aplicadas aos efetivos
de cada grupo etário da população em estudo, para obter os óbitos esperados nesta última,
os quais representam o número de óbitos que ocorreriam, caso a população em estudo
tivesse as mesmas taxas de mortalidade específicas que a população padrão.
19 Como refere Rowland (2003), a diferença advém da desigualdade entre as taxas (quer a bruta, quer a
padronizada por idade) dos dois sexos – a taxa bruta masculina é 10,3 por mil e a feminina, 15,5 por mil.
139
Seguidamente, é obtido o parâmetro razão padronizada de mortalidade, RPM (ou SMR,
Standardized Mortality Ratio), dividindo o número de óbitos registados pelo número de óbitos
esperados. Finalmente, a taxa de mortalidade padronizada pelo método indireto é calculada,
multiplicando o SMR pela taxa bruta da população padrão.
1. Escolher uma população padrão e obter as taxas específicas de mortalidade por grupo
etário dessa população padrão.
O
RPM =
∑ Ma Pa
em que
Ma é a taxa específica de mortalidade de um determinado grupo etário, na população padrão;
O são os óbitos totais registados na população a padronizar;
Pa é o efetivo de um determinado grupo etário da população a padronizar.
Uma razão de 1 (ou 100, uma vez que a RPM é habitualmente expressa em termos de
percentagem) significa que o número de óbitos esperado é idêntico ao número de óbitos
registado. A RPM mede assim o grau de similitude entre populações, assumindo que ambas
(a padrão e a padronizada) têm as mesmas taxas de mortalidade específicas.
140
Tabela 27. Exemplo de padronização de taxas de mortalidade pelo método indireto.
Taxas específicas de
mortalidade (/1000) População a padronizar Óbitos esperados
Idades da população padrão (Brasil) (Brasil)
(anos) (Portugal)
A B A × B ÷ 1000
0-4 12195 14 787 557 12195
5-9 1246 14 537 829 1246
10 - 14 1547 15 182 024 1547
15 - 19 3629 16 439 846 3629
20 - 24 5458 17 294 780 5458
25 - 29 7484 17 068 593 7484
30 - 34 10178 17 296 659 10178
35 - 39 12124 16 661 965 12124
40 - 44 19910 14 879 035 19910
45 - 49 30661 13 281 287 30661
50 - 54 44259 12 293 932 44259
55 - 59 58217 10 746 091 58217
60 - 64 69722 8 797 470 69722
65 - 69 76751 6 823 731 76751
70 - 74 87252 4 938 529 87252
75 - 79 105465 3 376 250 105465
80 - 84 125246 2 191 860 125246
85 ou mais 287988 1 897 462 287988
Óbitos esperados no Brasil ( = TOTAL ) 959332
Óbitos observados (Brasil) 1280204
Razão padronizada de mortalidade 1,334
Taxa padronizada (/1000) pelo método indireto (Brasil) 14,75
Como se vê, a taxa pelo método direto é 12,88 por mil e a obtida pelo método indireto
é 14,75. Não são iguais, nem tal seria de esperar, pois o seu cálculo baseia-se em estruturas
etárias e taxas de mortalidade específicas diferentes, mas ambas corretamente mostram
que a mortalidade no Brasil é superior à portuguesa, ao invés do que a taxa bruta sugeria.
141
Tabela 28. Vantagens e desvantagens de cada um dos métodos de padronização.
COMPARAÇÃO DE TAXAS
A resposta a questões deste tipo, envolvendo comparação de taxas, não pode ser dada
olhando simplesmente para os seus valores e vendo qual deles é o maior, pois qualquer
valor é passível de uma incerteza cuja dimensão depende do tamanho da população ou do
número de óbitos.
Uma das formas de contornar este problema é associando ao valor da taxa um intervalo de
confiança a 95% (IC95%), o que significa que é inferior a 5% o risco de o valor verdadeiro da
taxa ficar fora desse intervalo de confiança. Adicionalmente, pode-se também usar um teste
estatístico – normalmente o T-test – para comparar diretamente os valores das taxas ou
ainda modelos de regressão. São métodos cuja exploração está fora do âmbito do presente
trabalho, pelo que se aconselha a leitura de obras estatísticas dedicadas ao tema.
142
Assim, é bastante comum encontrar taxas de mortalidade (ou qualquer tipo de taxas)
de uma determinada área geográfica (uma freguesia, um município ou mesmo um país)
cujos valores oscilam muito ao longo do tempo, não porque haja uma genuína variação da
mortalidade, mas apenas porque um aumento ou diminuição aleatórias de um ou dois óbitos
é suficiente, face ao pequeno número de óbitos registados ou à reduzida população, para
alterar apreciavelmente o quociente que nos fornece a taxa.
Tabela 29. Exemplo ilustrativo do Problema dos Pequenos Números (Fonte dos dados: INE).
Mas, mesmo tratando-se de uma doença mais comum ou mesmo da mortalidade global, o
mesmo tipo de instabilidade de valores de taxas seria encontrado se as calculássemos para
áreas geográficas de pequena dimensão populacional. Atente-se no seguinte:
• Para uma freguesia com 100 habitantes20, tal equivaleria a 1 morte anual.
• Bastaria uma morte adicional, para a taxa de mortalidade dessa freguesia atingir 20 por mil
(o dobro da média nacional), ao passo que uma morte a menos daria uma taxa de 0 por mil.
Como lidar com estas situações? Há várias formas de evitar ou, pelo menos, minimizar
o problema dos pequenos números, a saber:
1. No caso de causas pouco frequentes, opta-se frequentemente por calcular taxas trianuais
(ou quinquenais, etc.) – a taxa média de três ou cinco anos consecutivos é muito menos
sujeita a flutuações estatísticas do que uma taxa anual.
20 Antes da fusão de freguesias em 2013, havia 115 freguesias com menos de 100 habitantes em Portugal.
143
4. Finalmente, quando se calculam taxas padronizadas, o problema pode ainda ser
atenuado pela utilização do método da padronização indireta.
MORTALIDADE MENSAL
Para ajustar o número de óbitos à dimensão do mês, é usual aplicar a conversão seguinte:
365 ou 366
Om ×
(12 × nm )
Nesta fórmula, o número de óbitos de cada mês (Om ) é multiplicado por um fator corretor
que depende do tamanho do mês. Esse fator é o quociente entre o número de dias do ano
(365 ou 366, consoante seja comum ou bissexto) e o produto de 12 pelo número de dias do
mês (nm ) em questão (28, 29, 30 ou 31). Deste modo, corrige-se o efeito da duração do mês,
obtendo-se o número de óbitos que deveriam ter ocorrido se o mês tivesse a duração média
de 366/12 ou 365/12, isto é, aproximadamente 30,5 ou 30,4 dias.
Em termos práticos e para um ano comum, o número de óbitos de meses com 31 dias
é multiplicado por 0,981 (ou seja, ligeiramente reduzido), o de meses com 30 dias é multiplicado
por 1,014 (ou seja, ligeiramente aumentado) e o do mês de fevereiro é multiplicado por
1,086, ou seja, é aumentado em quase 9%, o que compensa o efeito de ser um mês mais
curto que todos os outros.
Posteriormente, o número de óbitos corrigido poderá ser dividido pela população para obter
uma taxa de mortalidade mensal.
365 ou 366 × Om
IMM ×
O × nm
Equivalente a…
Om
nm
IMM ×
O
365 ou 366
144
Um IMM de valor 100 corresponde a uma mortalidade igual à média anual e um índice
superior ou inferior a 100, a uma mortalidade respetivamente superior ou inferior à
média anual.
Tabela 30. Indicadores de mortalidade mensal em Portugal ao longo do ano de 2013
(Fonte dos dados: INE).
Taxa
População Taxa bruta Óbitos
Óbitos ajustada IMM
média anual mensal ajustados
mensal
Janeiro 10458 10 457 295 100,0 10268 98,2 116
A Tabela 30, referente ao ano de 2013 em Portugal, mostra que os meses com excesso
de óbitos foram os meses de Inverno (dezembro, janeiro, fevereiro e março) e ainda julho,
um mês com níveis de mortalidade geralmente baixos, mas que em 2013 coincidiu com
uma onda de calor particularmente letal.
Uma das medidas mais conhecidas e usadas em demografia é a taxa de mortalidade infantil.
Essa taxa é efetivamente um dos mais sensíveis indicadores de saúde. Funciona como uma
medida do desenvolvimento humano e social de um país, muito embora possa não ser muito
útil para comparar entre si países em fases mais avançadas da transição epidemiológica
e demográfica.
A taxa de mortalidade infantil traduz o número de óbitos de crianças com menos de 1 ano
de idade (O 0 ) observados durante um determinado período de tempo, geralmente um ano,
referido ao número de nados vivos do mesmo período (N ), e é habitualmente expressa em
número de óbitos de crianças com menos de 1 ano por 1000 nados-vivos.
O0
× 1000
N
145
Muito embora a taxa se refira aos óbitos de crianças menores de um ano, devido
à grande desigualdade na distribuição dos óbitos no decorrer do primeiro ano de vida,
é comum subdividir temporalmente este período (Figura 22) e definir para cada subdivisão
o correspondente indicador de mortalidade infantil.
1 ano
Mortalidade infantil
Mortalidade pós-neonatal
28 dias
Mortalidade neonatal
Mortalidade neonatal tardia
7 dias
Mortalidade perinatal
Nascimento
28 semanas de gestação
Conceção
Com efeito, os óbitos infantis estão principalmente concentrados nas primeiras semanas
de vida. Esta distribuição, contudo, pode variar de população em população, pelo efeito
conjugado de diversas fatores/causas determinantes, geralmente classificados em duas
grandes categorias: endógenos e exógenos.
146
Já os fatores endógenos referem-se às condições relacionadas com a gestação e parto
(cobertura e qualidade da assistência pré-natal e perinatal, deformações congénitas,
traumatismos causados pelo parto, etc.). Afetam mais a mortalidade perinatal e neonatal.
O<28 dias
× 1000
N
O<7 dias
TMNP = × 1000
N
• Taxa de mortalidade neonatal tardia - número de óbitos em crianças com 7 dias ou mais
e menos de 28 dias de idade relativamente ao total de nados-vivos no mesmo período.
O<7−27 dias
× 1000
N
• Taxa de mortalidade perinatal - quociente entre a soma dos óbitos em crianças de menos
de 7 dias de idade (mortalidade neonatal precoce) com o número de fetos-mortos com
28 semanas ou mais de gestação e a soma do número de nados-vivos com o número de
fetos-mortos com 28 semanas ou mais de gestação, no mesmo período.
f
O<7 dias +O≥28 dias
× 1000
f
N +O≥28 dias
147
• Taxa de mortalidade fetal tardia (TMFT ), número de fetos-mortos com 28 ou mais
semanas relativamente ao total de nados-vivos e de fetos-mortos com 28 ou mais
semanas do mesmo período.
f
O≥28 dias
TMFT = × 1000
f
N +O≥28 dias
Outro indicador relevante é a mortalidade materna, uma importante causa de morte evitável.
Refere-se ao número de óbitos maternos ocorridos durante a gestação ou no período de um
ano após o seu termo, independentemente da duração ou da localização da gravidez, mas
devido a causas diretas ou indiretas com ela relacionadas (excluem-se causas acidentais ou
incidentais). A taxa de mortalidade materna (TMM ) calcula-se da seguinte forma:
óbitos maternos
TMM = × 1000
N
O número de nados-vivos surge no denominador por ser uma boa aproximação do efetivo
populacional das gestantes expostas ao risco de morte por causas maternas. Idealmente,
devia ser calculado em relação ao número de mulheres que conceberam, mas não é possível
estimar esse parâmetro.
148
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Rodrigues, T., Moreira, M. J., & Henriques, F. (2008). A população portuguesa. Das longas
permanências à conquista da modernidade. População e Sociedade, 21.
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
149
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
Taxa específica de
População Óbitos
mortalidade (/1000)
Grupo etário
México USA México USA México USA
150
2.1. Determine a taxa bruta de mortalidade dos EUA e do México. Comente os resultados.
2.3. Apesar de, na generalidade das situações, ser preferível usar o método direto
de padronização, o método indireto é usado em algumas situações. Indique-as.
3. Com base na informação abaixo referente aos níveis de mortalidade por doenças
circulatórias em Portugal (padrão) entre 2015-2017 e à distribuição etária da população
da Ribeira Grande (Açores), determine a razão padronizada de mortalidade e a taxa de
mortalidade padronizada pelo método indireto desta localidade, sabendo que ocorreram
237 óbitos em 2015-2017. Interprete e comente os resultados obtidos.
151
4. Usando os dados abaixo retirados das Estatísticas Demográficas do INE de Portugal
para os anos de 2003, 2005 e 2014, determine os correspondentes valores do índice
mensal de mortalidade. Represente os índices graficamente e identifique os meses em
que este fenómeno demográfico tem menor e maior intensidade em Portugal, discutindo
as diferenças entre os anos em estudo.
152
153
CAPÍTULO 8:
FECUNDIDADE, REPRODUÇÃO E NUPCIALIDADE
A fecundidade (também chamada natalidade), assim como a estrutura familiar, são temas
de grande importância na demografia do presente. Atualmente, os contrastes internacionais
em termos de crescimento populacional são em grande medida explicados pelos diferentes
níveis de fecundidade entre nações e continentes.
Por exemplo, nos países de baixo rendimento, ainda subsistem elevadas taxas de natalidade,
o que garante famílias de grande dimensão e um ritmo de crescimento acelerado, havendo
por isso uma grande preocupação em controlar o número de nascimentos. Nos países de alto
rendimento, vive-se a situação oposta: as baixas taxas de natalidade têm lançado alertas,
motivados pelo declínio dos efetivos populacionais, pelo envelhecimento da população
e pelas ameaças pendentes sobre a sobrevivência futura dos sistemas de pensões e de
apoio social.
154
Ou seja, segundo esta definição, a idade gestacional não é relevante. Por outro lado,
os demógrafos usam múltiplos termos para se referir ao mesmo fenómeno: nascimento,
fecundidade, reprodução e natalidade.
N
TBN = × 1000
P
Porque inclui no denominador população de todas as idades e sexos, esta taxa não
é estritamente uma medida de risco. Além disso, é muito afetada pela estrutura etária da
população, visto que uma população mais jovem estará tendencialmente associada a um
maior número de nascimentos. Uma forma de minimizar o problema passa pelo uso de
técnicas de padronização, amplamente discutidas no capítulo referente à mortalidade.
Tal como acontece com a mortalidade, por vezes é relevante produzir uma taxa de natalidade
média anual baseada em registos de vários anos consecutivos. Para o seu cálculo, aplicam-
se as fórmulas do Capítulo 7 (Subcapítulo: Padronização de taxas), obviamente substituindo
no numerador os óbitos pelos nascimentos.
155
Razão criança-mulher
P0−4
f
× 1000
P15−49
N
TFG = f
× 1000
P15−49
O período fértil é normalmente definido pelo intervalo de 15 a 49 anos de idade, mas pode
ser iniciado antes em países em que a gravidez na adolescência é relevante. Esta taxa,
porém, não permite distinguir as idades em que o fenómeno assume maior expressão.
De facto, na maioria dos países, são raros21 os nascimentos ocorridos entre as idades de 45
e 49 anos; daí também por vezes se restringir o denominador às idades entre 15 e 44 anos.
Uma vez que a taxa de fecundidade varia fortemente com a idade da mulher, é extremamente
útil obter medidas de fecundidade por idade ou grupo etário. A taxa específica de fecundidade
por idade da mulher (TEFa ) é o quociente entre o número de nados-vivos de mães de uma
determinada idade/grupo etário (Na) e o número de mulheres nessa mesma idade/faixa
etária (Paf )
Na
TEFa = × 1000
Paf
21 Contudo, em Portugal e num contexto de quase estagnação da natalidade, a taxa de fecundidade aos 45-49
anos quase triplicou entre 2011 e 2020.
156
200
180
160
140
120
100
80
60
40
20
0
15 - 19 anos 20 - 24 anos 25 - 29 anos 30 - 34 anos 35 - 39 anos 40 - 44 anos 45 - 49 anos
1971 1981 1991 2001 2011 2020
Figura 23. Taxas específicas de fecundidade em Portugal, entre 1971 e 2020. (Fonte dos dados: INE).
O padrão das TEF em Portugal tem o formato que se apresenta acima (Figura 23),
constatando-se que, ao longo do tempo, o pico da fecundidade tem vindo a migrar para
idades cada vez mais avançadas – hoje situa-se no grupo etário dos 30-34 anos, quando em
1981 ocorria entre os 20 e os 24 anos.
Além das taxas específicas por idade, são também frequentemente calculados indicadores
acerca da idade materna, como as idades média e mediana das mães; da ordem dos
nascimentos, como a taxa de fecundidade do primeiro, segundo, terceiro filho e assim por
diante; e ainda taxas de fecundidade de acordo com o estado civil (casado vs. não casado).
Finalmente, é também possível calcular indicadores de fecundidade paterna, utilizando as
expressões matemáticas precedentes, mas substituindo os efetivos maternos por paternos.
O seu valor é a soma das taxas específicas de fecundidade por idade, entre os 15 e os 49
anos, registadas num determinado período (habitualmente um certo ano). No caso mais
comum de se usar grupos etários quinquenais, é necessário multiplicar o somatório das taxas
específicas de fecundidade por cinco, porque a taxa específica de fecundidade corresponde
a nascimentos durante um ano, mas cada grupo etário tem 5 anos de dimensão.
45 -49
Através deste exemplo hipotético (Tabela 31), eis o motivo dessa multiplicação por 5:
157
Tabela 31. Cálculo do índice sintético de fecundidade com idades individuais e com grupos
quinquenais.
O valor mínimo do índice sintético de fecundidade, para que haja substituição de gerações,
é 2,1. São necessários 2 filhos por mulher para que estes substituam o pai e a mãe. Claro que
tal implica que ambos sobrevivam até à idade dos pais. Como isso nem sempre acontece,
o valor 0,1 é adicionado, para compensar os efeitos da mortalidade prematura, assim como
do desigual número de rapazes e raparigas à nascença. Este valor é usado atualmente
na maioria das nações, mas no período pré-transição, devido à elevada mortalidade,
era necessário um índice sintético de fecundidade de 6 para que a população não diminuísse
(Rowland, 2014). Por outras palavras, o valor mínimo do índice sintético de fecundidade
varia em função dos níveis de mortalidade prematura de um dado local.
Atualmente (2020 - INE), o ISF português, 1,40 crianças por mulher em idade fértil, está
muito abaixo do necessário para garantir a renovação da população. A título de comparação,
nos anos 60 esse valor era de cerca de 3 crianças/mulher.
Reprodução
Na
TEFaf = × 1000
Paf
45 -49
158
NUPCIALIDADE E DIVÓRCIO
Num esforço para padronizar a classificação do estado civil, a maioria dos países que
realizam censos populacionais usa as seguintes categorias gerais, aplicáveis a quase todas
as culturas: (1) solteiro/a (nunca casado/a), (2) casado/a e sem separação legal, (3) viúvo/a
e não se casou, (4) divorciado/a e não se casou novamente e (5) casado/a, mas legalmente
separado. Além disso, é comum incluir questões acerca da união de facto, para indivíduos
que vivem juntos sem que haja uma relação matrimonial entre ambos.
Outras categorias de estado civil, embora não tão comuns, podem ser necessárias em
países/culturas onde existem práticas como concubinato, poligamia, levirato (casamento do
irmão do marido falecido com a sua viúva), sororato (casamento da irmã da falecida esposa
com o seu viúvo).
Uma das formas mais comuns de medir a nupcialidade de uma população é através da taxa
bruta de nupcialidade, quociente entre os casamentos/matrimónios (M ) num dado período
e a população média desse período. É também habitual exprimi-la por 1000 habitantes.
M
× 1000
P
Porém, essa taxa não é a ideal para comparar populações com diferentes estruturas etárias
e de género, pois a probabilidade de casar depende muito da idade e do estado marital
anterior. Novamente é comum utilizar-se métodos de padronização para a idade e o sexo.
D
× 1000
P
Em áreas com dados mais detalhados, as medidas mais utilizadas são a taxa geral de
nupcialidade e a taxa geral de divorcialidade. Em ambas, a população de referência é restrita
às pessoas em idade de casar. Geralmente, ambas as taxas são expressas como o número
de casamentos/matrimónios ou divórcios por 1000 pessoas com 15 anos ou mais.
M × 1000
P≥15 anos
D × 1000
P≥15 anos
Estas taxas são frequentemente calculadas em separado para homens e para mulheres.
Além disso, são também comumente calculadas taxas específicas por idade e por sexo,
uma vez que a frequência do casamento e divórcio varia muito de acordo com estas duas
variáveis, sendo também por vezes determinada a idade média ou mediana de casamento.
159
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
160
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
161
NOTA: Os dados populacionais referem-se à população residente média anual. Os
correspondentes valores da população total são 10 289 898, 10 503 330, 10 573 100 e
10457295, respetivamente, para 2000, 2005, 2010 e 2013.
162
163
CAPÍTULO 9:
MIGRAÇÕES
Quando falamos de migrações referimo-nos a três situações muito distintas, embora todas
elas envolvendo a mudança de residência da pessoa migrante: 1) emigração (saída da
unidade espacial de observação para um país diferente); 2) imigração (entrada na unidade
espacial de observação de pessoas oriundas de um país diferente) e 3) migrações internas
(entradas e saídas na unidade espacial de observação de pessoas provenientes de outras
unidades espaciais do mesmo país).
164
a respeito das migrações dos nossos antecessores hominídeos e do próprio Homo sapiens,
respetivamente.
Estas primitivas migrações foram certamente determinadas por fatores ambientais, como
secas, inundações e alterações climáticas, ou por crescimentos populacionais excessivos
que exauriram os recursos existentes nas regiões onde viviam. É bom de ver que estamos
a falar de populações humanas recolectoras, uma vez que a agricultura só começou a ser
praticada há uns 10 mil anos.
Contudo, a motivação ecológica nunca deixou de ser a causa determinante da maioria das
migrações populacionais, ao longo dos tempos. A colonização grega e fenícia no Mediterrâneo,
as invasões bárbaras e vikings no 1º milénio, as colonizações europeia na América e na
Oceânia e russa na Sibéria e Ásia Central (séculos XVI – XX) e, mais recentemente, as
sucessivas vagas de emigração Sul-Norte e Leste-Oeste, que tiveram como destinatários os
países ricos da Europa Ocidental e da América do Norte, são alguns dos mais elucidativos
exemplos de deslocações populacionais, frequentemente intercontinentais, cujo principal
motor foi a procura de locais que pudessem assegurar uma melhoria das condições de vida.
Na mesma categoria deverá ser integrado o êxodo das populações rurais para as cidades,
iniciado na Europa do século XVIII com a Revolução Industrial, mas generalizado a todos
os continentes com o passar dos tempos, que ainda é um fenómeno demográfico muito
importante nos países mais pobres da América Latina, Ásia e África.
O panorama das migrações, contudo, não ficaria completo se não fossem mencionadas
também as migrações forçadas, ou seja, aquelas em que populações inteiras (ao arrepio
da sua vontade) foram obrigadas a abandonar as suas terras ancestrais, quer de um modo
definitivo, quer temporário.
Basicamente, este tipo de migrações tem por origem dois fenómenos distintos,
a escravatura22 e a expulsão de populações. A primeira, embora seja praticada há milénios,
só adquiriu alguma relevância demográfica com a constituição dos primeiros impérios
e, nomeadamente, o Império Romano, que a praticou em larga escala, trazendo para
a metrópole como escravos, às centenas de milhar, prisioneiros de guerra e populações
submetidas. Contudo, foi na época da expansão europeia, que acompanhou e se seguiu
aos descobrimentos marítimos, que o comércio de escravos africanos produziu em poucos
séculos transformações demográficas radicais em vastas áreas do globo e, em particular,
nos continentes africano e americano.
A nova composição étnica não foi revertida com o fim da escravatura, tendo esta aliás sido
prolongada por migrações, em condições frequentemente não muito diferentes das do
trabalho escravo, de milhões de trabalhadores indianos, chineses e javaneses para trabalhar
nas plantações das Guianas, África do Sul, Malásia, Sri Lanka e outras colónias britânicas
e holandesas, só para citar as deslocações de maior envergadura.
22 Não nos referimos obviamente à escravatura como resultado de dívidas ou de punição por outros crimes,
já que esta era praticada sobre elementos da própria população e, por isso, não determinava normalmente a
deslocação do escravizado para outro país ou região.
165
Por sua vez, o fenómeno da expulsão de populações – embora demograficamente menos
relevante, porque muito mais localizado no espaço e no tempo – não deixa de ter importância
em certos contextos espaciais e temporais. São sobejamente conhecidas as limpezas étnicas
levadas a cabo no decorrer da guerra civil jugoslava, as deportações de povos inteiros
ordenadas por Estaline durante e após a 2ª Guerra Mundial, assim como a expulsão para
a Alemanha de cerca de 15 milhões de alemães da Polónia, Checoslováquia e outros países
do leste europeu, entre 1945 e 1948. Mas muitos outros processos semelhantes ocorreram
no século XX e nos séculos precedentes: a expulsão dos judeus e dos mouros da Península
Ibérica ou a dos gregos da Turquia em 1923, o confinamento dos índios norte-americanos
nas reservas e as sangrentas trocas de populações entre a Índia e o Paquistão por ocasião
da independência e partilha da Índia em 1947 são apenas mais alguns exemplos.
Um outro tipo de migrações, que não sendo formalmente migrações forçadas, dificilmente
podem ser consideradas como resultando da livre opção dos deslocados, são as vagas de
refugiados desencadeadas por perseguições religiosas e étnicas, guerras entre estados,
guerras civis, redefinição de fronteiras e independência de novos estados. Embora, mais
uma vez, essas situações não sejam de agora – basta lembrar a diáspora judaica causada
por séculos de intolerância religiosa ou a mais recente diáspora palestiniana originada pela
criação do estado de Israel – os séculos XX e XXI, com as duas guerras mundiais e uma
série de outros conflitos de maior e menor escala, ficaram marcados pela deslocação de
milhões de pessoas em vários continentes, em fuga da devastação e das violações de direitos
humanos provocadas pelas fações em combate ou simplesmente porque as alterações
políticas as transformaram em cidadãos de segunda no seu próprio país de origem.
A relevância das migrações como fenómeno demográfico pode ser aferida pelos mais recentes
números publicados pelas Nações Unidas (UN, 2017). A meio de 2017, contabilizavam-se
em todo o mundo cerca de 257,7 milhões de migrantes23, o que correspondia a 3,4% da
população mundial – por outras palavras, um em cada 30 habitantes do nosso planeta. Esse
número não parou de crescer nas últimas décadas, quer em termos absolutos, quer mesmo
em termos relativos: em 1990, o número de migrantes (152,5 milhões) era pouco mais de
metade do atual e correspondia a 2,9% dos residentes no planeta.
Como seria de esperar, os principais destinos internacionais das migrações (UN, 2017)
são os países mais ricos. A proporção de 3,4%, estimada a nível mundial, reparte-se muito
desigualmente: 14,1% de imigrantes nos países de alto rendimento, contra apenas 1,4%
e 1,6%, respetivamente, nos países de médio e de baixo rendimento.
23 Esse número refere-se apenas a migrações internacionais, não incluindo, portanto, os efetivos das migrações
internas. Desse número, 25,9 milhões (ou seja, 10% do total) eram refugiados, proporção ainda assim algo
inferior à verificada em 1990, altura em que os refugiados eram mais de 12% dos migrantes.
166
de emigrantes, em relação à sua população eram a Palestina (77,3%), Porto Rico (51,7%) e a
Bósnia-Herzegovina (47,3%), dois dos quais em que a motivação económica era claramente
superada pela procura de segurança face a conflitos políticos e militares.
Pela sua dimensão e, principalmente, porque são muito mais difíceis de contabilizar com
rigor do que fenómenos demográficos como a mortalidade e a natalidade, as migrações são
uma “dor de cabeça” frequente para quem efetua estudos demográficos, nomeadamente
quando se pretende estudar a evolução, ao longo de um intervalo temporal dilatado, dos
efetivos, da estrutura etária e da composição étnica da população de um país ou região.
Até porque, especialmente no caso das migrações por motivos económicos, a sua presença
pode conduzir a desvios sistemáticos e significativos na distribuição de uma população de
um país por idade, sexo e área geográfica, cujo impacto na dinâmica populacional (como já
referimos) dificilmente se pode subestimar. Isso é consequência da seletividade deste tipo
de migrações: de um modo geral, envolvem apenas determinados setores da população
ativa e apresentavam até há bem pouco, em Portugal, uma clara predominância do sexo
masculino (Figura 24).
60000
50000
40000
30000
20000
10000
homens mulheres
Figura 24. Número anual de emigrantes portugueses, por sexo (1970-1988) (Fonte dos dados: INE).
Por esse motivo, de modo análogo aos fenómenos demográficos já anteriormente abordados,
as migrações podem e devem ser quantificadas com a maior precisão possível, para
o que foi definido um conjunto de indicadores que exprimem as diversas modalidades deste
fenómeno. Contudo, pela sua maior relevância e porque são os únicos que se encontram
normalmente disponíveis nas estatísticas nacionais, abordaremos sucinta e unicamente os
indicadores que medem a emigração e a imigração internacionais.
167
Segundo o Observatório das Migrações (Pires et al, 2018), Portugal atualmente encontra-
se entre os países que detêm um maior número total de emigrantes (em 27º lugar com
2,3 milhões de emigrantes), valor que se torna mais expressivo quando olhamos para os
números relativos (13º lugar no mundo e primeiro lugar na União Europeia com 21,9% da
população), i.e., ponderando o número de emigrantes de acordo com a população do país
de origem. Em contrapartida, a proporção de imigrantes na população residente (apenas
8,5%) era em Portugal das mais baixas da União Europeia.
TBE = EP × 1000
P
6,00
5,00
4,00
3,00
2,00
1,00
0,00
1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000 2004 2008 2012 2016 2020
Figura 25. Taxa bruta de emigração em Portugal (Fonte dos dados: INE).
24 Por vezes e para certos propósitos, é igualmente definida uma taxa bruta de emigração (ou imigração) total,
a qual inclui também os emigrantes temporários.
168
Uma outra variável que é frequente considerar no estudo do fenómeno da emigração é a
proporção de cada um dos destinos no total de emigrantes. Embora essa proporção não
assuma importância quando o que se pretende é quantificar os efetivos populacionais que
abandonam o país de origem, fornece, contudo, importantes pistas para a previsão da futura
evolução do fenómeno migratório.
TBET = ET × 1000
P
TBI = IP × 1000
P
Tal como sucede com a emigração, além do número total de imigrantes permanentes entrados
no país durante um ano, é frequentemente útil conhecer o peso relativo – a proporção – de
cada um dos países de onde eles provêm. No caso português, por exemplo, as estatísticas
divulgadas pelo INE normalmente permitem a discriminação entre os imigrantes provenientes
de países da União Europeia e os que provêm do resto do Mundo.
Durante 2019, segundo o INE, o saldo migratório foi positivo (o número de imigrantes superou
em 44 506 o número de emigrantes), traduzindo-se numa taxa de crescimento migratório de
+0,43%. A título de comparação, no ano anterior esse saldo tinha sido quatro vezes menor
(11 570). O saldo migratório verificado em 2019 foi determinante para que, pela primeira
vez desde 2009, a taxa de crescimento efetiva tivesse sido positiva (+0,19%), uma vez que
a taxa de crescimento natural continuou a ser negativa (-0,25%).
169
ATRATIVIDADE POPULACIONAL POR MUNICÍPIO E REGIÃO EM
PORTUGAL
De acordo com os resultados do Censo 2011, em Portugal, quase quatro em cada dez
(38,5%) residentes eram naturais de um município diferente daquele em que residiam ou
eram mesmo naturais de um outro país. Contudo, esta proporção diferia imenso de município
para município português.
Moreira & Maias (2017) sintetizaram a informação proveniente do Censo 2011 em Portugal,
categorizando os municípios portugueses em cinco classes de um parâmetro designado
atratividade populacional, equivalente à proporção da população de um determinado
município que não é natural desse município.
• Às duas primeiras classes (atratividade baixa e muito baixa) correspondia uma proporção
de não naturais inferior a 34,1% e nelas se enquadravam mais de ¾ dos municípios
portugueses, correspondendo às duas regiões autónomas e às regiões Norte, Centro
e Alentejo, excluindo alguns municípios isolados, localizados principalmente no litoral.
• Do lado oposto, os municípios com atratividade alta e muito alta, onde a proporção de
naturais variava entre 46,2 e 70,6% dos residentes, eram apenas 1/8 dos municípios
portugueses e localizavam-se quase exclusivamente na Grande Lisboa (e áreas
limítrofes) e no Algarve, a par de alguns municípios da Área Metropolitana do Porto
e dos casos particulares do Entroncamento e de Sines.
A inclusão da emigração, contudo, alteraria substancialmente este panorama, uma vez que
há regiões – o caso mais flagrante são os Açores – em que o esse fenómeno (que se pode
também considerar uma forma de repulsividade demográfica) tem uma expressão numérica
muito superior ao das migrações para outras regiões do país.
170
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Lundquist, J. H., Anderton, D. L., & Yaukey, D. (2014). Demography: the study of human
population. Waveland Press.
Moreira, H., & Maias A. (2017). Naturalidade versus Residência em Portugal. Revista de
Estudos Demográficos, 56, 65-93.
Pires, R. P., Pereira, C., Azevedo, J., Vidigal, I., & Veiga, C. M. (2018). Emigração Portuguesa.
Relatório Estatístico 2018.
https://doi.org/10.15847/CIESOEMRE052018
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
UN (2017). United Nations, Department of Economic and Social Affairs. International migrant
stock : The 2017 revision.
https://www.un.org/en/development/desa/population
171
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
1.3. Calcule as proporções relativas dos cinco países que forneceram mais imigrantes
a Espanha e dos cinco destinos mais populares da emigração espanhola.
172
173
CAPÍTULO 10:
ESPERANÇA DE VIDA
ENQUADRAMENTO HISTÓRICO
A noção de tábua de mortalidade foi introduzida por John Graunt em 1662. Na Tabela 32
apresenta-se a tábua de mortalidade construída por ele para a população de Londres,
onde se pode observar o número de sobreviventes para diferentes idades. Nesta época,
em Londres, segundo as suas estimativas, apenas 25% dos indivíduos sobreviviam até
aos 26 anos e apenas 1% até aos 76 anos. A tábua de mortalidade de Graunt é relevante,
não pelos arcaicos métodos estatísticos empregados, mas pelo facto de introduzir a ideia
de ser possível utilizar informação de mortalidade de rotina para estimar probabilidades de
sobrevivência em diferentes idades.
174
Tabela 32. Tábua de mortalidade de Graunt (Londres) (Fonte: Birch (1759)).
From whence it follows, that of the said 100 conceived there remains alive at six years end 64.
Breslau foi selecionada visto que a tábua de mortalidade desenvolvida por Halley assenta
no pressuposto de que a população é estacionária (igualdade entre número de óbitos e de
nascimentos e ausência de migrações) e Breslau – cidade situada longe das principais rotas
comerciais – cumpria quase na perfeição este pressuposto, ao contrário do que sucedia com
Londres e Dublin, duas cidades de cujas tábuas de mortalidade já então se dispunha, mas
que Edmond Halley excluiu por não satisfazerem esses critérios.
Desde então, foram divulgadas várias tábuas, a maioria sobre países europeus, em
particular os países escandinavos. Nos Estados Unidos, o cálculo de tábuas completas
começou oficialmente em 1900-02, associado aos Recenseamentos da População, com
periodicidade decenal. Atualmente, as tábuas de mortalidade, sobretudo as abreviadas,
calculam-se anualmente, sendo a esperança de vida um dos indicadores-chave em análise
demográfica e em temas de natureza económica, como é o cálculo da idade da aposentação.
Em Portugal, a publicação anual das tábuas abreviadas iniciou-se em 1945.
Como veremos mais adiante, a construção destas tabelas requer a existência de um sistema
de registo civil fidedigno que garanta que todos os nascimentos e falecimentos sejam
notificados correta e atempadamente. Contudo, se tal é normalmente possível nos países
de alto rendimento, em grande parte dos países de baixo rendimento estas estatísticas não
são suficientemente fiáveis e, em alternativa, os cálculos da esperança de vida baseiam-se
em outras fontes, como inquéritos domiciliários e censos populacionais.
25 Breslau localiza-se na Polónia e designa-se presentemente Wroclaw, mas era na altura uma cidade
maioritariamente alemã.
175
CONCEITOS INTRODUTÓRIOS
Embora se usem coortes hipotéticas para a construção da maioria das tábuas de mortalidade,
também é possível usar tábuas baseadas em coortes reais, ou seja, indivíduos de uma
mesma geração são de facto seguidos desde o nascimento até à morte. Às tábuas baseadas
em coortes reais chamamos de tábuas de coorte (ou longitudinais ou de geração).
Porém, visto que as anteriores obrigam ao seguimento de cada indivíduo desde o nascimento
até ao fim da vida, as tábuas mais usadas são as tábuas de momento ou transversais. Estas
assentam na análise transversal de uma geração fictícia (normalmente 100 000 indivíduos),
sujeita às taxas específicas de mortalidade observadas para cada idade (ou grupo etário)
num dado ano (ou, mais comummente, num período de dois ou mais anos). Por exemplo,
a taxa de mortalidade entre os 80 e os 81 anos para uma tábua de mortalidade referente
ao ano de 2019, irá assentar nos níveis de mortalidade de uma coorte nascida em 1939.
A consequência disto é que, na maioria dos casos, a esperança de vida estimada usando
tábuas de momento será inferior à da coorte nascida no ano a que a tábua de mortalidade
se refere, pois o processo de cálculo utilizado não tem em conta as melhorias normalmente
verificadas nos níveis de sobrevivência, com a elevação do nível de vida e os progressos
da Medicina.
176
Consoante a amplitude do intervalo de idades no qual assenta a informação que permite
o cálculo das taxas de mortalidade específicas, as tábuas são também classificadas em dois
tipos: completas ou abreviadas. As primeiras contêm dados para cada idade singular (idade
ano a ano) desde o nascimento até ao limite superior adotado (normalmente 85 anos) e as
segundas para grupos de idades quinquenais ou mesmo decenais, usando-se estas quando
não se dispõe dos valores dos óbitos e das populações para cada idade individual, como
frequentemente sucede quando se pretende calcular a esperança de vida a nível municipal
ou mesmo regional.
Esta secção visa fazer uma descrição detalhada, passo a passo, da construção de uma
tábua de mortalidade completa e do consequente cálculo das esperanças de vida, para
diferentes idades. Iremos partir da tábua de mortalidade para ambos os sexos para Portugal
(2011-2013) para exemplificar esses passos (Tabela 33).
177
Tabela 33. Tábua de mortalidade completa para ambos os sexos, Portugal (2011-2013)
(Fonte de dados: INE).
entre as idades x e x +1
Óbitos reais no período
por idade
x Px Dx Mx qx px lx dx Lx Tx ex
0 92651,5 848 0,00305086 0,00304467 0,99696 100000 304 99797 8071292 80,71
178
37 167793,0 471 0,00093568 0,00093524 0,99906 98492 92 98446 4396652 44,64
38 164476,0 525 0,00106399 0,00106342 0,99894 98400 105 98348 4298206 43,68
39 162532,5 571 0,00117105 0,00117036 0,99883 98295 115 98238 4199858 42,73
40 162196,5 632 0,00129884 0,00129799 0,99870 98180 127 98117 4101621 41,78
41 159142,0 703 0,00147248 0,00147140 0,99853 98053 144 97981 4003504 40,83
42 155074,5 784 0,00168521 0,00168379 0,99832 97909 165 97826 3905523 39,89
43 153112,5 812 0,00176776 0,00176620 0,99823 97744 173 97657 3807697 38,96
44 153019,5 950 0,00206945 0,00206731 0,99793 97571 202 97470 3710040 38,02
45 154168,0 1006 0,00217512 0,00217275 0,99783 97369 212 97264 3612569 37,10
46 155622,0 1113 0,00238398 0,00238114 0,99762 97158 231 97042 3515306 36,18
47 156920,0 1266 0,00268927 0,00268566 0,99731 96927 260 96796 3418264 35,27
48 155680,5 1365 0,00292265 0,00291839 0,99708 96666 282 96525 3321467 34,36
49 153550,0 1466 0,00318246 0,00317740 0,99682 96384 306 96231 3224942 33,46
50 152936,0 1580 0,00344371 0,00343779 0,99656 96078 330 95913 3128711 32,56
51 151945,5 1679 0,00368334 0,00367657 0,99632 95748 352 95572 3032798 31,67
52 147956,5 1783 0,00401695 0,00400889 0,99599 95396 382 95204 2937227 30,79
53 144258,0 1980 0,00457514 0,00456469 0,99544 95013 434 94796 2842023 29,91
54 142962,0 1973 0,00460029 0,00458973 0,99541 94579 434 94362 2747226 29,05
55 139798,0 2113 0,00503822 0,00502556 0,99497 94145 473 93909 2652864 28,18
56 138144,0 2181 0,00526262 0,00524881 0,99475 93672 492 93426 2558955 27,32
57 136329,0 2365 0,00578258 0,00576591 0,99423 93180 537 92912 2465529 26,46
58 132360,0 2403 0,00605168 0,00603342 0,99397 92643 559 92364 2372617 25,61
59 131768,5 2477 0,00626604 0,00624647 0,99375 92084 575 91797 2280253 24,76
60 132554,0 2667 0,00670670 0,00668429 0,99332 91509 612 91203 2188457 23,92
61 130898,0 2903 0,00739252 0,00736530 0,99263 90897 669 90563 2097254 23,07
62 127900,5 3062 0,00798016 0,00794845 0,99205 90228 717 89869 2006691 22,24
63 127401,0 3196 0,00836205 0,00832723 0,99167 89511 745 89138 1916822 21,41
64 121762,5 3389 0,00927762 0,00923479 0,99077 88765 820 88355 1827684 20,59
65 114751,0 3554 0,01032380 0,01027079 0,98973 87946 903 87494 1739328 19,78
66 116100,5 3653 0,01048804 0,01043333 0,98957 87042 908 86588 1651834 18,98
67 113908,0 3981 0,01164975 0,01158229 0,98842 86134 998 85635 1565246 18,17
68 107623,0 4258 0,01318801 0,01310162 0,98690 85137 1115 84579 1479610 17,38
69 101499,5 4299 0,01411830 0,01401933 0,98598 84021 1178 83432 1395032 16,60
70 96880,5 4572 0,01573072 0,01560796 0,98439 82843 1293 82197 1311599 15,83
71 96403,0 4911 0,01698080 0,01683784 0,98316 81550 1373 80864 1229403 15,08
72 97266,5 5529 0,01894794 0,01877011 0,98123 80177 1505 79425 1148539 14,33
73 96735,0 6189 0,02132630 0,02110130 0,97890 78672 1660 77842 1069114 13,59
74 94158,5 6859 0,02428175 0,02399049 0,97601 77012 1848 76088 991272 12,87
75 93446,5 7551 0,02693520 0,02657727 0,97342 75165 1998 74166 915184 12,18
76 92800,0 8153 0,02928520 0,02886258 0,97114 73167 2112 72111 841018 11,49
77 87222,0 8879 0,03393257 0,03336647 0,96663 71055 2371 69870 768907 10,82
78 82267,0 9687 0,03925025 0,03849478 0,96151 68684 2644 67362 699038 10,18
79 79265,5 10199 0,04288961 0,04198916 0,95801 66040 2773 64654 631676 9,57
80 74870,0 10963 0,04880905 0,04764626 0,95235 63267 3014 61760 567022 8,96
81 69580,5 11462 0,05491002 0,05344275 0,94656 60253 3220 58643 505262 8,39
82 61413,5 12071 0,06551763 0,06343942 0,93656 57033 3618 55224 446619 7,83
83 54217,5 12521 0,07698006 0,07412692 0,92587 53415 3959 51435 391395 7,33
84 48964,0 12617 0,08589304 0,08235613 0,91764 49455 4073 47419 339960 6,87
179
Note-se que os valores obtidos nesta exemplificação não são rigorosamente iguais aos
encontrados nas estatísticas nacionais, pois o INE aplica funções matemáticas mais
complexas, no cálculo de algumas funções para as idades mais avançadas - para mais
informações sobre os métodos utilizados, consultar a informação metodológica disponibilizada
pelo INE. Aliás, existe grande variabilidade dos métodos usados pelos vários departamentos
de estatística nessas situações limite, sendo a opção por uma ou por outra expressão
matemática fundamentalmente determinada pelas dinâmicas populacionais vigentes numa
ou noutra região geográfica e numa ou noutra época.
O primeiro passo para o cálculo de uma tábua de mortalidade é obter o número de indivíduos
(Px ) de cada idade (x ) e o correspondente número de óbitos anuais (Dx ). Para reduzir
o impacto de flutuações aleatórias no número de óbitos anuais, como atrás se referiu,
é normalmente considerado o número total de óbitos em vários anos consecutivos, obtendo-
se a partir dele a média anual. Neste caso, será considerado o número de óbitos durante
o triénio 2011-2013, usando-se como referência a população residente em Portugal a meio
desse triénio.
Esta informação permitirá o cálculo das taxas específicas de mortalidade (Mx ) para cada
idade, usando a expressão:
Dx
Mx =
Px
Exemplificando (Tabela 33), a taxa de específica de mortalidade para a idade de 4 anos será
D4 13
M4 = = = 0,00013097
P4 99260
em que o valor de D4 resulta da divisão por três – média aritmética – do número total (39) de
óbitos de crianças com 4 anos de idade durante o triénio em questão.
Na maioria dos casos, a conversão é efetuada mediante a aplicação da relação matemática (1)
Mx
qx = (1)
1 + 0,5 × Mx
26 É aliás bastante comum que as tábuas de mortalidade omitam as colunas iniciais com a população e os
óbitos reais, assim como as correspondentes taxas de mortalidade específicas, iniciando com o quociente de
mortalidade, por ser este o único parâmetro a ser usado no cálculo das seguintes colunas da tábua.
180
Assim, por exemplo, o quociente de mortalidade entre as idades dos 4 e dos 5 anos é dado por:
q4 = 0,00013097
= 0,00013096
1 + 0,5 × 0,00013097
Porém, importa entender como foi deduzida a relação matemática utilizada, para
compreender o porquê da sua utilização. Como atrás se referiu, o quociente de mortalidade
é a probabilidade de um indivíduo morrer durante o ano de vida a que se refere. Por outras
palavras e usando o exemplo anterior, é a probabilidade de um qualquer indivíduo residente
em Portugal, que tivesse completado os 4 anos de idade no dia 1 de janeiro de 201227
(às 00h00), morrer entre essa data e o dia 31 de dezembro de 2012 (às 24h00). Admitindo
que o risco de ele morrer não é diferente do de outras pessoas da mesma idade, essa
probabilidade pode obter-se simplesmente dividindo o número de mortes de pessoas com
4 anos de idade ocorridas durante o ano de 2012 – em rigor, para minimizar as flutuações
aleatórias, utiliza-se antes a média anual de óbitos no triénio 2011-2013 – pela população
em risco, ou seja, todas as pessoas que a 1 de janeiro de 2012 tinham 4 anos de idade.
Assim, teríamos
q4 = D4
P4 (1.1.2012)
Porém, para sabermos qual a população que tinha completado 4 anos de idade no dia
1 de janeiro, temos de somar às pessoas que ainda permanecem vivas a meio do ano (que
é aquele de que dispomos, P4) o número de pessoas de 4 anos que faleceram no decorrer
desse meio ano. Admitindo que o risco de morrer é uniforme ao longo do 5º ano de vida,
podemos estimar esse número como sendo igual a metade dos óbitos ocorridos durante
esse ano e assim teremos
q4 = D4 D4
=
D P4 + 0,5 × D4
P4 + 4
2
Se dividirmos agora por P4 o numerador e o denominador da fração, obtemos por sua vez
D4
q4 = P4 M4
=
P4 + 0,5 × D4 1 + 0,5 × M4
P4
27 O ano de 2012 é o ano central do triénio 2011-2013 para o qual se está a calcular a esperança de vida.
181
Por outro lado, como se referiu, na dedução da expressão do quociente de mortalidade
assumiu-se que o risco de morrer se encontra uniformemente distribuído ao longo de um
ano da vida, suposição que (tendo em conta que o intervalo de tempo é pequeno) não
introduz um apreciável erro na estimativa. Existe, contudo, uma exceção importante,
o primeiro ano de vida, visto que a mortalidade infantil tende a concentrar-se nos primeiros
meses ou semanas.
Neste exemplo, à semelhança do procedimento adotado pelo INE, iremos utilizar a expressão
(2), que atribui maior peso às mortes nos primeiros meses de vida,
q0 = M0
(2)
1 + 2 × M0
3
0,00305086
q0 = = 0,0030447
2
1+ × 0,00305086
3
Finalmente, como não é habitual dispor de valores suficientemente fiáveis dos efetivos
populacionais para idades individualizadas iguais ou superiores aos 85 anos, é comum
agrupá-los num grupo etário aberto (85 anos ou mais), para o qual o quociente de mortalidade
ou probabilidade de não sobrevivência (∞q 85) é, por definição, igual à unidade.
∞q 85 = 1
px = 1 − qx
No exemplo em questão, a probabilidade de sobreviver até fazer um ano de idade é dada por
182
Passo 4: Calcular o número de sobreviventes na idade x (lx)
lx = lx − 1 × px − 1
Ou seja, a esmagadora maioria da coorte (99,7%) permanece viva ao fim de um ano. Para
outras idades, parte-se do correspondente número de sobreviventes da idade anterior.
Assim, por exemplo, o número de sobreviventes com a idade de 40 anos é dado por
Repare-se que, aos 40 anos de idade, a proporção de sobreviventes ainda é quase 98,2%,
só descendo abaixo dos 50% na avançada idade de 84 anos.
dx = lx × qx
dx = lx − lx + 1
d 3 = l3 × q3 = 99652 × 0,99986 = 14
d3 = l 3 × l 4 = 99652 × 99638 = 14
Como seria de esperar, o número de óbitos esperados no grupo etário aberto dos 85 anos ou
mais é exatamente igual ao dos sobreviventes no início desse grupo etário. No final, a soma
dos óbitos esperados deverá perfazer 100 000 visto que toda a coorte terá de desaparecer.
Aliás, essa possibilidade de verificação dos cálculos efetuados é a principal vantagem que
advém de introduzir esta coluna.
183
Passo 6: Calcular o número médio de pessoas vivas entre as idades x e x + 1 (Lx )
Embora se disponha já do número de pessoas (de entre as 100 000 iniciais) que supostamente
atingiram cada uma das idades possíveis (lx), como se fez ver na fundamentação do cálculo
do quociente de mortalidade, é necessário ter em conta que entre duas idades exatas
consecutivas há uma diminuição gradual do número de sobreviventes.
Lx = 1 × ( lx + lx + n )
2
Como seria de esperar, para o cálculo do número médio de pessoas vivas durante
o primeiro ano de vida usa-se uma fórmula ligeiramente diferente que dá um peso maior aos
sobreviventes à idade exata de 1 ano, visto que a mortalidade infantil tende a concentrar-se
nos primeiros dias/semanas de vida. Na metodologia seguida pelo INE, é dado o peso de
2/3 aos sobreviventes no final do ano e apenas 1/3 aos 100 000 indivíduos recém-nascidos
– expressão (3). Outras entidades optam por pesos ligeiramente diferentes.
L 0 = ( lx + 2 × l 1 ) ÷ 3 (3)
Por último, a expressão matemática que permite o cálculo do número médio de pessoas
vivas para o grupo etário final (85 anos e mais) corresponde ao quociente entre número de
sobreviventes no início desse grupo etário e a taxa específica de mortalidade por idade para
esse grupo
L 85
∞L 85 =
∞M 85
45382
∞L 85 = = 292542
0,15513069
184
Passo 7: Calcular os anos completos que se espera serem vividos a partir da idade x (Tx )
∞
Tx = ∑ Lx + i
i=0
Por exemplo, o total de anos que se espera viver a partir dos 75 anos de idade será dado por
T 75 = L 75 + L 76 + L 77 + L 78 + L 79 + L 80 + L 81 + L 82 + L 83 + L 84 + ∞L 85
= 74166 + 72111 + 69870 + 67362 + 64654 + 61760 + 58643 + 55224 + 51435
+ 47419 + 292542 = 915184
Note-se que o valor de T 0 tem forçosamente de ser igual à soma de todos os valores que
compõem a coluna L x .
A coluna final da tábua de mortalidade fornece o número de anos de vida que os indivíduos
de idade x poderão esperar viver, ou seja, por outras palavras, a sua esperança de vida (ex )
ao atingirem essa idade. Calcula-se fazendo o quociente entre o total de anos se espera
ainda viver (Tx ) e o número de pessoas inicialmente com nessa idade (lx ).
Tx
ex =
lx
T0 8 071 292
e0 = = = 80,71 anos
l0 100 000
Como atrás se referiu, o uso de tábuas de mortalidade abreviadas é comum quando não
se dispõe de quantitativos populacionais (ou óbitos) para cada idade individualmente
considerada, mas apenas para grupos etários, normalmente quinquenais. Essa situação
é frequente em países com registos populacionais pouco sistemáticos ou fiáveis ou quando
185
a unidade geográfica pretendida é pequena (por exemplo, município), muitas vezes em
virtude da aplicação de regras de confidencialidade dos registos de base populacional.
Antes do mais, é costume inserir uma coluna adicional contendo a dimensão do grupo etário
(n), parâmetro que será incorporado na simbologia das diferentes funções calculadas. Como
atrás, construir-se-á a tábua de mortalidade (neste caso, abreviada) para ambos os sexos
para Portugal (2011-2013) (Tabela 34).
Tabela 34. Tábua de mortalidade abreviada para ambos os sexos, Portugal (2011-2013)
(Fonte de dados: INE).
Probabilidade de sobrevivência
Quociente de mortalidade
Óbitos esperados
idades x e x +n
Idade exata
na idade x
x ou mais
Grupo etário
x n nPx nD x n Mx nq x np x lx n dx nL x Tx ex
0 0 1 92651,5 848 0,00305086 0,00304467 0,99696 100000 304 99797 8068018 80,68
1-4 1 4 392805,5 207 0,00017566 0,00070239 0,99930 99696 70 398642 7968221 79,93
5-9 5 5 518698,5 167 0,00010732 0,00053646 0,99946 99626 53 497994 7569578 75,98
15 - 19 15 5 555048,0 409 0,00024562 0,00122737 0,99877 99518 122 497286 6573859 66,06
20 - 24 20 5 576202,5 703 0,00040669 0,00203136 0,99797 99396 202 496475 6076573 61,13
25 - 29 25 5 622196,5 852 0,00045645 0,00227964 0,99772 99194 226 495405 5580098 56,25
30 - 34 30 5 732700,5 1377 0,00062645 0,00312735 0,99687 98968 310 494066 5084693 51,38
35 - 39 35 5 829560,5 2423 0,00097361 0,00485622 0,99514 98658 479 492095 4590626 46,53
40 - 44 40 5 782545,0 3881 0,00165315 0,00823174 0,99177 98179 808 488876 4098532 41,75
45 - 49 45 5 775940,5 6216 0,00267031 0,01326300 0,98674 97371 1291 483627 3609655 37,07
50 - 54 50 5 740058,0 8995 0,00405148 0,02005430 0,97995 96080 1927 475582 3126028 32,54
55 - 59 55 5 678399,5 11539 0,00566972 0,02795238 0,97205 94153 2632 464185 2650446 28,15
60 - 64 60 5 640516,0 15217 0,00791914 0,03882699 0,96117 91521 3553 448722 2186260 23,89
65 - 69 65 5 553882,0 19745 0,01188280 0,05769989 0,94230 87968 5076 427149 1737538 19,75
70 - 74 70 5 481443,5 28060 0,01942769 0,09263903 0,90736 82892 7679 395262 1310389 15,81
75 - 79 75 5 435001,0 44469 0,03407578 0,15700385 0,84300 75213 11809 346543 915127 12,17
80 - 84 80 5 309045,5 59634 0,06432063 0,27705263 0,72295 63404 17566 273105 568584 8,97
186
Passo 1: Calcular taxas específicas de mortalidade por idade (nMx)
O cálculo das taxas específicas de mortalidade ( nMx) para cada grupo etário apenas difere
do adotado nas tábuas completas na medida em que, quer a população real a meio do
período considerado (no exemplo em causa, 2011-2013), quer os óbitos ocorridos, dizem
respeito ao grupo etário e não a uma idade individual, pelo que a expressão a utilizar apenas
difere da anterior na introdução do símbolo n.
nD x
n Mx =
nPx
5D25 284
5M25 = = = 0,00045645
5P25 622 196,5
em que o valor de 5D25 resulta da divisão por três – média aritmética - do número total (852)
de óbitos de pessoas com 25 – 29 anos durante o triénio em questão.
n × nMx
nqx = (4)
1 + 0,5 × n × nMx
em que a multiplicação das taxas específicas de mortalidade por n tem em conta que as
primeiras são anuais, enquanto o grupo etário tem uma dimensão superior.
5 × 5M 30 5 × 0,00062645
5q 30 = = = 0,00312735
1 + 0,5 × 5 × 5M 30 1 + 0,5 × 5 × 0,00062645
187
1M 0
1q 0 = (5)
1 + 2 = 1M 0
3
n px = 1 − n qx
De modo idêntico ao adotado nas tábuas completas, este cálculo pressupõe multiplicar entre
si o número de sobreviventes do grupo etário imediatamente anterior e a probabilidade de
sobrevivência durante o grupo etário correspondente.
lx = lx − 1 × n px −1
nd x = l x × nqx
O número médio de pessoas vivas entre duas idades consecutivas x e x+n , nLx , também
se baseia na média aritmética do número de sobreviventes lx e lx+n nessas duas idades,
multiplicada pela diferença (n ) entre as duas idades.
nL x = 1 × ( lx + lx+n ) (6)
2
O valor é multiplicado pela amplitude do intervalo, uma vez que em cada grupo etário
existem várias coortes (no grupo etário dos 1-4 anos, existem quatro coortes diferentes;
nos seguintes, cinco), representando este valor o número total de sobreviventes das várias
coortes.
188
Para se compreender melhor o que esse valor representa, admitindo que os 310 óbitos
esperados28 se distribuíram de maneira uniforme pelos cinco anos que compõem o grupo
etário, ou seja, morrendo 62 pessoas durante cada ano de idade e a meio dele estando
ainda vivas 31 dessas pessoas (isto é, metade), os 98 968 indivíduos iniciais (com 30 anos
exatos) dariam lugar a uma população média de 98 937 pessoas com 31 anos de idade, 98
875 com 32 anos, 98 813 com 33 anos, 98 751 com 34 anos e, finalmente, 98 689 com 35
anos.
Somando os efetivos dessas cinco coortes, obtém-se para número médio de pessoas
vivas desse grupo etário, 494 065, ou seja, exatamente o mesmo28 resultado obtido com
a expressão (6).
l85
L 0 = ( lx + 2 × l 1 ) ÷ 3 e ∞L 85 =
∞M85
Passo 7: Calcular os anos completos que se espera serem vividos a partir da idade x (Tx )
Tal como antes, esta obtém-se simplesmente somando o número médio de pessoas vivas
em cada grupo etário com idade igual ou superior a x.
∞
Tx = ∑ nLx+n
i=0
Assim, o total de anos que se espera viver a partir dos 50 anos de idade será dado por
T50 = 5L50 + 5L55 + 5L60 + 5L65 + 5L70 + 5L75 + 5L80 + ∞5L85 = 475582 +
4641185 + 448722 + 427149 + 395262 + 346543 + 273105 + 295489 = 3126028
De modo idêntico ao das tábuas completas, obtém-se fazendo o quociente entre o número
de anos de vida completos que se espera que vivam a partir da idade x (Tx ) e o número de
sobreviventes nessa idade (lx ):
Tx
ex =
lx
T0 8 068 018
e0 = = = 80,68 anos
l0 100 000
valor que, por sinal, não difere sensivelmente do obtido recorrendo à tábua completa.
28 O valor exato de 5d 30 não é 310, mas sim 309,51, o que introduz uma ligeira diferença nos valores
apresentados, como resultado dos arredondamentos.
189
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
Bellhouse, D. (2011). A new look at Halley's life table. Journal of the Royal Statistical
Society. Series A (Statistics in Society), 174 (3), 823-832.
Birch, T. (Ed.). (1759). Collection of Yearly Bills of Mortality, from 1657 to 1758 Inclusive.
A. Miller.
Siegel, J. S., & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
190
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
Mx Mx
Idade exata Idade exata
Homens Mulheres Homens Mulheres
191
34 0,00107872 0,00043251 77 0,04609231 0,02535119
35 0,00114212 0,00050017 78 0,05223472 0,03032665
36 0,00130701 0,00049717 79 0,05638490 0,03387108
37 0,00133185 0,00056070 80 0,06358542 0,03897183
38 0,00150392 0,00064947 81 0,07129481 0,04442873
39 0,00169303 0,00067798 82 0,08467372 0,05397082
40 0,00180102 0,00082381 83 0,09872883 0,06436540
41 0,00215755 0,00082123 84 0,10960759 0,07272958
42 0,00240413 0,00099952 85+ 0,17774613 0,14459005
Fonte dos dados: INE
Idade exata
no início do nqx npx lx ndx nLx Tx ex
grupo etário
0 0,01082 0,98918 99 279 7 408 808
1 0,00306 0,99694 395 067 7 309 529
5 0,00200 0,99800 492 583 6 914 463
10 0,00202 0,99798 199 491 593 6 421 879
15 0,00485 0,99515 98219 476 489 905 5 930 286
20 0,00629 0,99371 97743 615 487 178 5 440 380
25 0,00673 0,99327 97128 654 484 006 4 953 203
30 0,00765 0,99235 96474 738 480 527 4 469 196
35 0,0092 0,99080 95736 881 476 480 3 988 669
40 0,98780 94856 1157 471 385 3 512 189
45 0,01786 0,98214 93698 1673 464 308 3 040 804
50 0,02745 0,97255 92025 2526 2 576 496
55 0,04174 0,95826 438 155 2 122 686
60 0,06308 0,93692 415 291 1 684 531
65 0,09921 0,90079 80353 381 837 1 269 240
70 0,15945 0,84055 72381 333 054 887 404
75 0,26999 0,73001 60840 263 135 554 350
80 0,42849 0,57151 44414 174 492 291 214
85+ 1 0 25383 116 722 116 722
Fonte: Adaptado de Carrilho & Patrício (2004)
192
3. Com base nas taxas específicas de mortalidade por grupo etário fornecidas referentes
à população de Espanha entre 2013-2015 e nas instruções fornecidas ao longo deste
capítulo, construa a tábua de mortalidade correspondente de forma a obter os valores da
esperança de vida à nascença.
0 0,002779408
1-4 0,000138399
5-9 0,000082222
10 - 14 0,000088508
15 - 19 0,000175846
20 - 24 0,000262017
25 - 29 0,000298119
30 - 34 0,000387885
35 - 39 0,000559185
40 - 44 0,000979592
45 - 49 0,001804817
50 - 54 0,003030630
55 - 59 0,004717077
60 - 64 0,006974919
65 - 69 0,010277493
70 - 74 0,015996027
75 - 79 0,028554689
80 - 84 0,052351804
85+ 0,133614865
193
CAPÍTULO 11:
SAÚDE E MORBILIDADE
Uma das principais limitações do indicador esperança de vida (para além da possibilidade
de ser mal interpretado e da dificuldade do seu cálculo para pequenas áreas geográficas)
prende-se com o facto de nada dizer sobre se os anos de vida que se espera ainda viver
serão vividos ou não com saúde.
Com o intuito de medir o tempo que se espera ainda viver livre de doenças e de incapacidades,
foram desenvolvidos os indicadores esperança de vida saudável (HLE, healthy life expectancy
ou healthy life years) e esperança de vida livre de incapacidade (DALY, disability-free life
years ou disability-free life expectancy). Em ambos, o enfoque deixa de ser apenas na
quantidade de anos vividos, mas principalmente na qualidade com que são vividos.
194
Tabela 35. Esperança de vida e esperança de vida saudável em Portugal (2014)
(Fonte dos dados: EUROSTAT).
Esperança de vida (anos) Esperança de vida saudável (anos) % de anos de vida saudáveis
Esta informação, na Europa, provém do “European Union Statistics on Income and Living
Conditions” (EU-SILC), já mencionado antes, e mais concretamente das questões acerca de:
195
Tabela 36. Exemplificação do cálculo da esperança de vida saudável para Portugal 2011-2013
(Fonte dos dados: INE & EUROSTAT).
Prevalência de incapacidade
% anos saudáveis
Idade exata
Grupo etário
exatas
exatas
x nLx ex π HLE %HLE
Passo 2: Calcular o número de anos completos vividos sem incapacidade entre idades
exatas
( 1 − π ) × nLx
196
Passo 3: Calcular o total de anos completos vividos sem incapacidade em idades
exatas
∑ (( 1 − π ) × n Lx )
Também como no cálculo da esperança de vida, o valor da esperança de vida saudável para
uma determinada idade exata x é obtido dividindo o total de anos completos vividos sem
incapacidade em idades exatas, pelo número de sobreviventes nessa idade (n Lx ), o que
equivale à utilização da seguinte expressão matemática:
∑ (( 1 − π ) × nLx )
lx
Finalmente, pode-se ainda estimar a proporção de anos vividos de forma saudável (última
coluna), dividindo entre si os valores da esperança de vida saudável e da esperança de vida:
HLEx
× 100
ex
PREVALÊNCIA E INCIDÊNCIA
Antes de passarmos à explicação de alguns dos indicadores sumários mais utilizados para
medir a carga de doença na população, nomeadamente os anos de vida perdidos por morte
prematura, por incapacidade e os DALY (Disability Adjusted Life Years), é fundamental
precisar com maior rigor duas medidas epidemiológicas muito utilizadas e que servem de
base para o cálculo destes indicadores. Essas medidas são a prevalência e a incidência.
A prevalência pode ser definida como o número de pessoas afetadas numa população, num
dado momento, dividido pelo número de pessoas dessa população nesse mesmo momento,
ou seja, a proporção da população afetada pela doença naquele momento.
A prevalência é uma espécie de fotografia da população num dado momento, em que vemos
quem tem a doença e quem não tem. Não tem em conta quando a doença se desenvolveu
(alguns indivíduos podem ter desenvolvido a doença ontem, outros há 20 anos atrás), nem
portanto a sua duração. Consequentemente, o numerador da expressão anterior inclui uma
197
miscelânea de pessoas cuja doença se desenvolveu em diferentes épocas, pelo que não
é uma verdadeira medida do risco. Se o quisermos medir, teremos de usar a incidência,
porque esta inclui apenas os novos casos, num período específico durante o qual estes
eventos ocorreram.
O que pode fazer variar a prevalência? O seu valor aumenta através do aumento da
incidência, ou seja, adicionando novos casos. A prevalência pode, porém, também diminuir,
devido à morte ou à cura dos doentes (em menor escala, pode dever-se ainda à longa
duração da doença, à emigração de saudáveis/imigração de casos, à melhoria dos meios
de diagnóstico e ao aumento da declaração). A cura e a morte têm exatamente o mesmo
efeito sobre a prevalência. Há assim uma situação dinâmica, em que o surgimento contínuo
de novos casos (incidência) aumenta a prevalência, enquanto a morte ou a cura a fazem
diminuir (Tabela 37).
Tabela 37. Causas do aumento ou diminuição da prevalência.
Aumento Diminuição
Por sua vez, a incidência, como vimos, mede a frequência com que surgem novos casos.
A taxa de incidência de uma doença é calculada dividindo o número de novos casos de
doença ocorridos durante um período específico de tempo pelo número de pessoas que
compõem uma população em risco de desenvolver a doença, no mesmo intervalo de tempo.
Definida deste modo, a taxa de incidência (It ) é uma medida de risco associada a uma
população ou ao subgrupo desta29 que pode desenvolver a doença: escalão etário, sexo,
exposta a determinado fator ambiental, etc. Tal reflete-se no denominador da taxa, onde
(a par da duração da exposição, normalmente expressa em anos) surge o número de
pessoas em risco de desenvolver a doença, ou seja, pessoas que poderão ser contadas
também no numerador.
198
Nº de eventos novos durante um intervalo de tempo (n) n
It × =
Nº de pessoas em risco (N) × duração da exposição (D) N ×D
Existe uma relação entre a incidência e a prevalência, aproximadamente válida para uma
situação estável, em que as taxas se mantêm e a emigração é igual à imigração
P = I ×D
sendo, portanto, possível estimar a duração média da doença (D) dividindo a prevalência
pela incidência.
Atenção que, nesse cálculo, a unidade de tempo em que vem expressa a duração média da
doença é determinada pela unidade da taxa de incidência – por exemplo, se este for uma
taxa anual, a duração será também em anos. Por outro lado, há que ter em atenção que
as duas taxas terão de ser expressas de modo idêntico – ambas por mil ou por 100 mil, por
exemplo.
Uma forma indireta de quantificar o impacto das doenças na esperança de vida faz uso do
indicador Anos de Vida Potencialmente Perdidos (AVPP; em inglês YLL, Years of Life Lost),
que estima o número de anos de vida não vividos porque a morte ocorreu prematuramente.
Este indicador é um complemento importante à informação sobre taxas de mortalidade.
O total de AVPP pode ser calculado por causa, sexo, região, fator de risco ou outra variável
de interesse.
199
Tabela 38. Exemplificação do cálculo dos AVPP/YLL (Portugal, 2011-2013, ambos os sexos) com
base na diferença entre a idade do óbito e o limite de 70 anos (Fonte dos dados: INE).
70 anos
x n nD x n Px
85 - ∞ 85 ∞ 112045 - 0 37348 0 0
2. Estimar a idade média da morte31 para cada grupo etário, somando ao ano inicial metade
da sua dimensão.
3. Obter, para cada grupo etário, o número de anos que faltariam para atingir os 70 anos,
subtraindo aos 70 anos a idade média da morte desse grupo etário.
30 Se partirmos (como é o caso) de uma tábua de mortalidade, em que se usa o número de óbitos de um
triénio, torna-se necessário dividi-los por 3.
31 A média aritmética entre as idades iniciais de cada grupo etário e do grupo etário subsequente é uma
medida aproximada da idade média a que ocorrem as mortes no grupo etário, na falta de dados mais exatos.
A aproximação é bastante razoável, com a única exceção do primeiro ano de vida.
200
5. Finalmente, obter os AVPP/YLL totais, somatório dos valores dos vários grupos etários.
Por outro lado, quando se pretende comparar causas de morte, também é comum dividir
os AVPP/YLL associados a cada causa – em cujo cálculo apenas são utilizados os óbitos
associados a essa causa – pelos AVPP/YLL totais, obtendo assim a proporção atribuível
a cada causa.
Embora o Instituto Nacional de Estatística use a metodologia anterior para estimar os anos
de vida perdidos, os AVPP/YLL são normalmente calculados com base na esperança de
vida, o método adoptado pelo consórcio Global Burden of Disease (GBD).
Segundo esta equipa, os AVPP/YLL devem ser entendidos como a distância entre a idade
do óbito e a esperança média de vida nessa idade, pelo que o cálculo envolve o uso de uma
tábua de mortalidade ou requer que se disponha da esperança de vida em cada idade ou
grupo etário.
201
Tabela 39. Exemplificação do cálculo dos AVPP/YLL (Portugal, 2011-2013, ambos os sexos) com
base na diferença entre a idade do óbito e a esperança de vida (Fonte dos dados: INE).
da morte
x n nD x ex nPx
2. Estimar a idade média da morte33 para cada grupo etário, somando ao ano inicial metade
da sua dimensão, com exceção do último grupo etário, em que é adicionada ao ano
inicial desse grupo a esperança média de vida nesse ano.
3. Estimar a esperança de vida à idade média da morte em cada grupo etário, através da
média aritmética das esperanças de vida na idade inicial desse grupo e na idade inicial
do grupo etário seguinte.
202
5. Calcular o total de AVPP/YLL, somando os AVPP/YLL de cada grupo etário.
Como seria de esperar, o valor da taxa de AVPP/YLL, calculado com base na esperança de
vida, é bastante superior (mais do triplo) ao obtido anteriormente (e aliás usado pelo INE),
que se baseava na expetativa de que o indivíduo – independentemente da idade já atingida
– não ultrapassasse os 70 anos de idade, ignorando por esse motivo o contributo para o total
de AVPP/YLL de todos os indivíduos que ultrapassem essa idade.
Do mesmo modo que no método anterior, também é possível obter valores discriminados
por causa de morte e calcular o impacto de cada causa nos AVPP/YLL globais.
Para estimar os Anos Vividos com Incapacidade (AVI) ou Years Lived with Disability (YLD) para
uma determinada causa, sexo e grupo etário, o número de casos de doença/incapacidade
(I, “number of incidence cases”) é multiplicado pela duração média (L, “average length of
the disease, until remission or death”) da doença em anos e por um fator de ponderação
(DW, “disability weight”) que reflete o impacto da doença sobre a saúde/incapacidade dos
indivíduos, expresso numa escala numérica de 0 (perfeita saúde) a 1 (morte).
YLD = I × DW × L
Os fatores de ponderação são disponibilizados pelo GBD e foram estimados com base em
informação recolhida em inquéritos aplicados à população de vários países, selecionados de
forma a constituírem uma amostra representativa da população mundial.
Recentemente, contudo, uma nova metodologia de cálculo foi introduzida pela GBD,
recorrendo à prevalência (assumida como aproximadamente igual ao produto da incidência
pela duração da doença, como atrás se referiu), em vez da incidência:
YLD = P × DW
Tabela 40. Seis principais contributos para os anos de vida vividos com incapacidade (AVI/YLD)
em Portugal e no Mundo em 2018 (Fonte dos dados: Institute for Health Metrics and Evaluation).
Portugal Mundo
203
Ao contrário do que poderia supor, em Portugal, o contributo conjunto das doenças do
sistema circulatório não excede os 5% (sendo o maior o da doença isquémica do coração,
com apenas 1,13%, pelo que não surge na tabela), ao passo que os diferentes tipos de
doenças cancerígenas somados não iam além dos 2%.
Uma perspetiva obviamente muito diferente se retiraria da análise dos AVPP/YLL por causa
de morte, tendo em conta que esses dois grupos de causas são os que mais contribuem
para os “anos de vida potencialmente perdidos”. Seria, portanto, muito redutor ter apenas
em consideração os óbitos ou a incapacidade para a estimativa do peso das doenças na
esperança de vida saudável, como se verá a seguir.
Um DALY equivale a um ano de vida saudável perdido. Esta medida é universalmente usada
por investigadores e decisores e permite comparações entre países e regiões, entre sexos
ou mesmo entre fatores de risco. O seu valor resulta simplesmente da soma dos YLL com
os YLD:
DALY = YLL + YLD
O DALY, atrás mencionado, foi o primeiro dos indicadores do estado de saúde das populações
a combinar dados de mortalidade e de morbilidade. O seu aparecimento foi consequência do
aumento da esperança de vida nos países de alto rendimento e do crescente impacto das
doenças crónicas e agudas na qualidade de vida das populações e nos sistemas de saúde.
O QALY, aliás, é uma medida altamente controversa. Algumas críticas incidem sobre
o facto de a sua aplicação cega nas decisões sobre tratamentos poder ir contra os interesses
204
individuais de cada paciente; outras, sobre os valores limite calculados para o custo dos
tratamentos de cada doença, por muitos considerados demasiado baixos.
Uma crítica ainda mais contundente tem a ver com a possibilidade de serem desvalorizados
os tratamentos dos pacientes em pior estado de saúde e mais idosos, uma vez que os
seus valores de QALY são mais baixos, sendo pelo contrário priorizados os tratamentos
dos pacientes mais jovens e com doenças mais facilmente remissíveis. A isto respondem os
defensores do QALY que os recursos de saúde são cada vez mais limitados.
O grau de controvérsia deste e de indicadores similares levou inclusive a que, nos EUA,
o programa conhecido por “Obamacare” proibisse o uso dos QALYs na decisão sobre os
tratamentos a adotar para as diferentes doenças.
205
BIBLIOGRAFIA E LEITURAS COMPLEMENTARES
IHME. (2020). Institute for Health Metrics and Evaluation. University of Washington.
http://www.healthdata.org
Siegel, J. S. & Swanson, D. A. (2004). The Methods and Materials of Demography. Elsevier.
Sullivan, D. F. (1971). A single index of mortality and morbidity. HSMHA health reports, 86(4), 347.
206
EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Nota: Dado o grande número de dados, recomenda-se o uso de uma folha de cálculo para
realizar os exercícios. Os dados estão depositados nesta página web:
https://figshare.com/s/49ac84b1319ec78c4b1f
1. Com a positiva evolução da esperança de vida, interessa cada vez mais saber se os
anos de vida são vividos de forma saudável. A tabela abaixo apresenta a proporção
de pessoas a viver sem incapacidade em cada um dos grupos etários. Partindo desta
informação e da informação contida na tábua de mortalidade abaixo, determine:
Idades nLX Tx
2.1. AVPP
2.2. AVI
2.3. DALY
207
3. Com base na informação abaixo, referente aos óbitos por neoplasias malignas, por
doenças circulatória e por causas externas em Portugal, determine os anos de vida
potencialmente perdidos (AVPP) e a taxa de AVPP, associados a cada causa e compare
o peso das duas causas em relação ao total de AVPP. Use para os cálculos o método de
cálculo baseado no limiar teórico de 70 anos. Comente os resultados obtidos.
5 - 9 anos 45 14 4 8 486308
10 - 14 anos 47 8 3 13 519945
208
Anexo 1:
CORREÇÃO DOS EXERCÍCIOS PRÁTICOS
Capítulo 2
1.1.
Razão de Masculinidade
Município Nascimentos masculinos Nascimentos femininos
e IC95%
1.2.
Os resultados revelam que, apesar da razão de masculinidade de Aveiro (108) ser diferente
do valor esperado (105), situa-se dentro do intervalo de confiança a 95% desse valor, pelo
há razões para admitir que o registo dos nascimentos apresenta boa qualidade.
Por sua vez, a razão de masculinidade de Almodôvar (83) situa-se fora e abaixo do intervalo
de confiança a 95% dos valores desse parâmetro, pelo que há razões para admitir que tenha
havido sobre registo dos nascimentos femininos.
Finalmente, a razão de masculinidade de Vila Verde (123) situa-se fora e acima do intervalo
de confiança a 95% dos valores desse parâmetro, pelo que há razões para admitir que tenha
havido sobre registo dos nascimentos masculinos.
2.1.
55 anos: 199
65 anos: 231
55 anos: 216
65 anos: 246
209
Índice básico de preferência digital (Índia, áreas urbanas)
55 anos: 161
65 anos: 177
55 anos: 102
65 anos: 103
2.2.
20,0
18,0
16,0
14,0
12,0 10,2 10,1 10,1
9,8 9,8 9,9 10,0 10,0 10,0 10,0
10,0
8,0
6,0
4,0
2,0
0,0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
2.3.
Os dados relativos às idades em Portugal apresentam muito boa qualidade, patentes nos
índices de preferência digital e de Whipple próximos de 100 e no valor do índice de Myers,
que revela que apenas 0,46% das idades foram reportadas de forma errada. Pelo contrário,
os dados relativos às idades na Índia apresentam muito má qualidade, patentes nos índices
de preferência digital e de Whipple muito acima de 100 e no valor do índice de Myers, que
revela que perto de 13% das idades foram reportadas de forma errada. Na Índia, verificou-
se ainda que este padrão é mais acentuado nas zonas rurais, que apresentaram um índice
de Whipple acima de 175, revelando muito má qualidade da informação, potencialmente
explicado pelos maiores níveis de iliteracia entre os residentes das zonas rurais.
210
Capítulo 3
1.
85 e mais anos
80 - 84 anos
75 - 79 anos
70 - 74 anos
65 - 69 anos
60 - 64 anos
55 - 59 anos
50 - 54 anos
45 - 49 anos
40 - 44 anos
35 - 39 anos
30 - 34 anos
25 - 29 anos
20 - 24 anos
15 - 19 anos
10 - 14 anos
5 - 9 anos
0 - 4 anos
2.
211
Capítulo 4
1.
2.
Não seria apropriado visto que os distritos de Braga e do Porto são compostos por um
diferente número de municípios (14 em Braga e 18 no Porto) e é sabido que quanto maior o
número de unidades territoriais maior a probabilidade de ter valores mais altos de índice de
redistribuição.
3.
Ver Anexo 3
Capítulo 5
1.
Índices de diversidade
Nordeste 0,57
Centro-Oeste 0,44
Sul 0,67
Oeste 0,73
2.
212
Os resultados, mais exatamente os referentes ao índice de GINI pela sua maior
comparabilidade, sugerem que a população de Lisboa está ligeiramente mais segregada do
que a do Porto.
Curva de Lorenz
0,9
0,8
0,7
0,6
0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0
0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1
213
Capítulo 6
1.
A. M. R. A. R. A.
Portugal Norte Centro Alentejo Algarve
Lisboa Açores Madeira
Taxa de crescimento efetivo (%)
2009 0,10 -0,18 -0,17 0,57 -0,34 1,29 0,09 0,59
2010 -0,01 -0,34 -0,26 0,52 -0,44 1,22 -0,06 0,47
2011 -0,29 -0,17 -0,67 0,15 -0,57 -1,15 0,18 -1,40
2012 -0,52 -0,57 -0,75 -0,31 -0,76 -0,39 0,14 -0,43
2013 -0,57 -0,60 -0,78 -0,39 -0,72 -0,46 -0,04 -0,68
2014 -0,50 -0,62 -0,76 0,06 -1,35 -0,20 -0,44 -1,01
Taxa de crescimento natural (%)
2009 -0,05 0,03 -0,33 0,21 -0,54 0,02 0,14 -0,10
2010 -0,04 0,02 -0,34 0,22 -0,54 0,08 0,10 -0,04
2011 -0,06 0,00 -0,34 0,21 -0,52 -0,01 0,15 -0,03
2012 -0,17 -0,12 -0,47 0,11 -0,60 -0,15 0,11 -0,20
2013 -0,23 -0,17 -0,51 0,03 -0,65 -0,24 -0,04 -0,23
2014 -0,22 -0,17 -0,49 0,06 -0,65 -0,21 0,00 -0,38
Taxa de crescimento migratório (%)
2009 0,15 -0,20 0,16 0,37 0,21 1,27 -0,05 0,69
2010 0,04 -0,35 0,08 0,29 0,10 1,14 -0,16 0,51
2011 -0,23 -0,17 -0,32 -0,05 -0,05 -1,14 0,03 -1,37
2012 -0,36 -0,45 -0,27 -0,41 -0,16 -0,24 0,03 -0,23
2013 -0,35 -0,43 -0,27 -0,42 -0,07 -0,22 0,00 -0,45
2014 -0,29 -0,44 -0,27 0,00 -0,70 0,01 -0,44 -0,63
2.
Capítulo 7
1.
214
2.
2.1.
2.2.
2.3.
Deve ser usado na ausência de informação de mortalidade por grupo etário e/ou quando
lidamos com pequenos números de casos e/ou populações.
3.
Taxa padronizada pelo método indireto Ribeira Grande: 7,1 por 1000
4.
215
200
180
160
140
120
100
80
60
40
20
0
15 - 19 anos 20 - 24 anos 25 - 29 anos 30 - 34 anos 35 - 39 anos 40 - 44 anos 45 - 49 anos
Capítulo 8
1.
2000: 11,7
2005: 10,4
2010: 9,6
2013: 7,9
2000: 45,9
2005: 42,1
2010: 40,0
2013: 34,1
216
Índice sintético de fecundidade (filhos por mulher)
2000: 1,55
2005: 1,42
2010: 1,39
2013: 1,21
2000: 0,75
2005: 0,69
2010: 0,69
2013: 0,59
2.
Capítulo 9
1.1.
1.2.
1.3.
217
Capítulo 10
1.
2.
2.1.
2.2.
2.3.
2.4.
2.5.
2.6.
3.
Capítulo 11
1.
1.1.
53,7 anos
1.2.
66,5%
218
2
2.1.
AVPP = 25
2.2.
2.3.
DALY = 35
3.
219
Anexo 2:
PIRÂMIDES ETÁRIAS USANDO MICROSOFT EXCEL
Passo 1: Calcular a proporção de população em cada um dos grupos etários e sexo, dividindo
o número de efetivos de cada um dos grupos etários e sexo pela população total de ambos
os sexos. De forma a que as barras referentes ao sexo masculino fiquem posicionadas do
lado esquerdo, como dita a convenção, coloque um sinal menos nas proporções calculadas
para o sexo masculino.
220
Passo 3: Para que o gráfico fique com um aspeto de pirâmide, é importante fazer alguns
ajustes, nomeadamente:
Formatar o eixo dos x de forma a que os rótulos surjam à esquerda ao invés de aparecerem
no eixo central.
Formatar o eixo dos x de forma a que o rótulo das percentagens não apresente valores
negativos.
Formatar a série de dados de forma a que as barras surjam de forma alinhada e não
desfasada.
221
Remover elementos desnecessários (como legendas), ajustar a dimensão do gráfico e
alterar cores e tamanhos de letra.
222
Anexo 3:
Certifique-se que está ligado à internet para ser possível fazer download do software.
Depois da instalação, abra o programa QGIS e crie um novo projeto. Este será o aspeto do
ambiente de trabalho que surgirá no ecrã.
34 Esta era a versão mais recente disponível à data de construção deste tutorial. Porém, periodicamente, saem
novas versões do software pelo que poderá selecionar a versão mais recente.
223
De seguida, carregue os mapas no formato shapefile (encontram-se numa pasta zipada,
que deverá descomprimir, no seguinte local: https://figshare.com/articles/online_resource/
MAPEAMENTO_DA_DISTRIBUI_O_DA_POPULA_O_USANDO_QGIS_Tutorial_/16553976
usando os passos Camada>Adicionar camada vectorial… . Depois deverá selecionar a
fonte dos dados vetoriais35.
Repare que o mapa estradas é um mapa de linhas e o mapa cidades é um mapa de pontos.
35 Num modelo vetorial, cada objeto do mundo real é classificado num tipo geométrico: pontos, registados como
pares de coordenadas simples; linhas, registados como séries de pares de coordenadas ordenadas; e polígonos,
registados como uma ou mais linhas que se fecham para formar uma área poligonal.
224
3. De seguida, carregue os mapas no formato raster, usando o comando Camada>Adicionar
camada raster….. Adicione a camada raster36 referente ao relevo de Angola (‘AGO_msk_alt.
vrt’) e aprecie o resultado.
4. Para ligar e desligar temas, use a check box da secção Camadas. Aqui também pode
alterar a ordem de visualização das camadas, arrastando as camadas para cima ou para
baixo. Experimente ligar e desligar mapas e alterar a ordem por que são apresentados.
36 Num modelo raster (também chamado modelo matricial), o espaço é dividido em células geralmente quadradas,
ou seja, numa matriz. A variação geográfica de um dado fenómeno (ex.: relevo) é expressa, atribuindo diferentes
valores/propriedades a essas células.
225
6. Cada camada vetorial, tem uma tabela de atributos associada onde informação referente
a cada objeto geográfico está armazenada. Pode aceder à tabela de atributos, clicando
com o botão direito do rato sobre a camada de informação e clicando de seguida em Abrir
tabela de conteúdos’ Também pode aceder diretamente à tabela de atributos, usando
o botão Abrir tabela de conteúdos localizado na Barra de Atributos. Experimente abrir
a tabela de conteúdos do mapa das províncias de Angola.
7. Uma forma de inquirir os objetos presentes nos temas carregados, é usando a função
Identificar Elementos, localizada na barra de atributos. Esta ferramenta permite-lhe visualizar
os atributos de cada objeto geográfico. Clique numa das províncias angolanas e observe o
resultado.
8. Na barra de atributos também encontra a função Medir Linha, Medir Angulo e Medir Área.
Explore estas funções.
226
9. Na secção Camadas, pode igualmente alterar a simbologia (cores, transparência,
contorno, adicionar etiquetas) de cada camada.
Para tal, clique duas vezes sobre a camada e aceda às Propriedades. Aqui terá acesso
a vários separadores. Experimente, por exemplo, alterar a cor da camada referente às
províncias de Angola em Simbologia e adicionar os nomes das mesmas em Etiquetas (Single
Label>NAME).
Pode também editar as propriedades da camada raster. Porém, as opções disponíveis são
ligeiramente diferentes. Por exemplo, em Simbologia, pode ajustar as cores da imagem; no
separador Pirâmides, pode acelerar a visualização de um raster e, no separador Histograma,
pode verificar as estatísticas do raster.
10. Como em qualquer software, é possível gravar um projecto através do comando Guardar
como. O ficheiro resultante tem a extensão ‘.qgz’. O ficheiro do projeto de QGIS NÃO contém
dados geográficos, contém apenas as referências relativas ao LOCAL onde se encontram os
dados geográficos presentes no projeto. Em caso de necessidade, por exemplo, se alguns
dados geográficos mudarem de localização no file system, o ficheiro ‘.qgz’ pode facilmente
ser editado para fazer as correções em causa.
227
PASSO 3: JUNÇÃO DE TABELAS
1. Os softwares SIG permitem integrar informação gráfica e tabular através de uma operação
de junção, desde que esteja presente um atributo em comum.
Como pode ver, existe um código unívoco de nome ID, que é semelhante ao código
OBJECTID que encontra no mapa de províncias que já se encontra no seu projeto QGIS.
É este código que permitirá trazer a informação demográfica para a tabela de atributos
do mapa das províncias. Nota: Caso este código estivesse ausente, teria de o adicionar
previamente ao ficheiro .csv e só depois adicionar o ficheiro .csv ao projeto QGIS.
228
PASSO 4: CONSTRUÇÃO DE UM MAPA TEMÁTICO
Com esta informação, já podemos construir um mapa temático que mostre as diferenças
na proporção de população com ensino superior (variável ‘prop_ensinosup’) ao longo das
províncias angolanas.
Caso estivesse a lidar com uma variável do tipo categoria (ex.: nome, religião predominante,
etc.), teria de usar Categorizado e atribuir cores distintas.
229
PASSO 5: PREPARAÇÃO DO LAYOUT
Com base no mapa temático acima, pretende-se agora criar uma imagem que possa ser
impressa e integrada num documento/relatório. Tal envolve a construção de um layout onde,
além o mapa propriamente dito, deverá incluir uma legenda, o norte geográfico, a escala
e quaisquer outros elementos necessários à correta interpretação do mapa.
Comece por adicionar o mapa das províncias no modo Nova Composição de Impressão,
em Adicionar Mapa à Composição. Insira também a legenda, o norte geográfico e a escala.
Pode inserir e editar estes elementos na Barra de Ferramentas situada na lateral esquerda.
Quando estiver satisfeito com o layout pode exportar em Composição > Exportar como
imagem…
230