Variação Linguística

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A linguagem é uma parte fundamental da experiência humana,

manifestando-se por meio da fala, escrita, gestos, música e diversas outras


formas que facilitam a comunicação. Ela desempenha um papel crucial na
expressão de pensamentos, emoções e ideias, conectando as pessoas e
permitindo a troca de informações e conhecimentos.
Para compreender Labov, é fundamental refletir sobre a natureza da
linguagem humana, destacando dois aspectos principais: seu caráter
eminentemente social e sua constante variabilidade. A língua e a sociedade
estão interligadas de tal maneira que uma não pode existir sem a outra. A
língua serve como meio de comunicação e é vista como um produto e
expressão da cultura a que pertence (MONTEIRO, 2000).
Estudos de Monteiro (2000) cita que Labov (1972) explora o paradoxo
saussuriano, que afirma que, embora a língua (langue) seja um sistema
compartilhado por todos os falantes e possa ser estudada a partir de um único
indivíduo, o discurso (parole) só pode ser analisado observando o uso da
linguagem em contextos sociais. Apesar de Saussure definir a língua como um
fato social, ele excluiu a dimensão social da linguística e pressupôs a
homogeneidade como essencial para a descrição. Assim, elementos fora do
sistema abstrato da língua foram desconsiderados pelos estruturalistas
ortodoxos.
As primeiras tentativas de definir o campo da sociolinguística, lideradas
por Bright (1966) e Fishman (1972), foram imprecisas, deixando a disciplina
sem um marco teórico claro e enfrentando desconfiança de linguistas
estabelecidos. Mesmo sem atingir totalmente seus objetivos, Bright foi pioneiro
ao tentar especificar o conteúdo da sociolinguística, apontando que seu foco
deveria ser a diversidade linguística. Ele argumentou que um sistema
linguístico monolítico, sem variações, não pode explicar as associações entre
língua e estrutura social. Bright identificou três principais dimensões da
diversidade: a identidade social do emissor, do receptor e as condições da
situação comunicativa (MONTEIRO, 2000).
Cabe enfatizar que os esforços para descrever a heterogeneidade
linguística e compreender a influência dos fatores sociais sobre a linguagem só
tiveram sucesso com os trabalhos de Labov, pioneiro da teoria da variação
linguística. Na década de 1960, a maioria dos estudos linguísticos ainda
ignorava o contexto social, focando em idioletos. Labov argumentou que a
linguagem, por sua natureza social, exige uma abordagem social e chegou a
considerar o termo "sociolinguística" redundante. No entanto, ele reconheceu
que a linguagem não é apenas um fenômeno social, mas também envolve
aspectos psicológicos e fisiológicos, justificando a relevância de outras
abordagens, como a psicolinguística (MONTEIRO, 2000).
O autor mencionou essa questão para destacar que, embora a
linguagem tenha um caráter social, ela também envolve outros aspectos, como
psicológicos e fisiológicos. Isso justifica a importância de diferentes
abordagens, além da sociolinguística, como a psicolinguística, mostrando que a
linguagem é um fenômeno complexo que não pode ser totalmente explicado
por uma única perspectiva.
Monteiro (2000) cita que a relação entre língua e sociedade vai além da
simples transmissão de informações, desempenhando também um papel
essencial no estabelecimento de relações sociais. O autor apresentou estudos
de Trudgill (1979), na qual ilustra a interação entre dois desconhecidos que
falam sobre o tempo em uma estação de trem, sugerindo que a conversa ajuda
a reduzir o constrangimento social e permite aos falantes obter informações
sobre o outro. A língua reflete e acompanha a evolução da sociedade,
reforçando a conexão íntima entre ambos e desempenhando um papel
fundamental na comunicação e interação social.
O autor menciona essa relação intrínseca entre língua e sociedade para
enfatizar que a linguagem não é apenas um meio de comunicação, mas
também uma ferramenta crucial para estabelecer e manter relacionamentos
sociais. Ao usar o exemplo de Trudgill sobre dois desconhecidos conversando
sobre o tempo, o autor ilustra como a linguagem permite a troca de
informações e ajuda a compreender o status social e a identidade do outro.
Monteiro (2000) aborda a relação entre linguagem, cultura e
pensamento, levantando questões sobre a influência da língua no modo de
pensar dos povos e se diferentes línguas resultam em diferentes organizações
mentais. Ele menciona Humboldt, que sugeriu que a língua está ligada à
mentalidade nacional, implicando que diferentes povos poderiam ter formas
distintas de pensamento. Essa ideia foi ampliada por Sapir e Whorf, cujas
conclusões indicam que a língua molda a percepção do mundo, funcionando
como uma grade através da qual os falantes categorizam e compreendem a
realidade. Assim, a linguagem não apenas reflete a sociedade, mas também
influencia e controla a forma como os indivíduos percebem e interpretam seu
ambiente.
Em relação as diferenças linguísticas e diferenças cognitivas, é
destacado que embora línguas de origem europeia compartilhem semelhanças
devido a raízes comuns e contatos culturais, isso não implica que suas visões
de mundo sejam idênticas. A hipótese de Sapir-Whorf sugere que a percepção
da realidade é condicionada pela língua que se fala, e linguistas como
Malmberg argumentam que a categorização das impressões sensoriais é
influenciada pelo sistema linguístico, moldando a visão de mundo do falante.
No entanto, o autor ressalta que, atualmente, a hipótese do determinismo
linguístico não deve ser aceita de forma absoluta, embora reconheça que
existem indícios de que a língua pode influenciar o pensamento, especialmente
para aqueles que falam mais de uma língua (MONTEIRO, 2000).
De acordo com estudos de Labov (2008) para o estudo de uma
comunidade de fala, é importante que uma variável linguística tenha três
propriedades principais: ser frequente, aparecendo repetidamente na
conversação natural; ser estrutural, ou seja, estar bem integrada em um
sistema funcional mais amplo; e ter uma distribuição altamente estratificada,
variando entre diferentes faixas etárias ou grupos sociais. Há também critérios
conflitantes: por um lado, o traço deve ser saliente para os falantes e
pesquisadores, facilitando o estudo das atitudes sociais; por outro, deve ser
imune a distorções conscientes para garantir a confiabilidade dos dados.
Portanto, Labov estabelece que essas variáveis precisam ser
frequentes, estruturais e apresentar uma distribuição estratificada para garantir
que o comportamento linguístico possa ser devidamente observado em
diferentes contextos e grupos sociais.
Sendo destacado que as propriedades que uma variável linguística deve
ter para ser eficaz no estudo de uma comunidade de fala, incluindo a
frequência de ocorrência em conversas naturais, a estruturação dentro de um
sistema amplo de unidades funcionais e a estratificação, que indica uma
distribuição assimétrica entre diferentes faixas etárias ou estratos sociais. Além
disso, ele menciona uma contradição entre a busca por traços salientes que
revelem a relação entre atitudes sociais e comportamento linguístico e a
necessidade de que esses traços sejam imunes a distorções conscientes, o
que facilita a confiabilidade dos dados (LABOV, 2008).
Labov (2008) cita que durante as entrevistas preliminares em Martha's
Vineyard em 1961, foram observadas mudanças estruturais na linguagem que
paralelamente refletiam transformações ocorrendo no continente, influenciadas
pelo padrão do sudeste da Nova Inglaterra. Notou-se uma rápida extinção do
fonema /o/ breve, a fusão das vogais baixas posteriores /a/ e /o/, além de
importantes alterações na distribuição fonêmica, como a perda da distinção
entre /or/ e /or/, e a substituição do fonema inicial /hw/ por /h/.
Os estudos preliminares em Martha's Vineyard sugeriram que as
variações na altura do primeiro elemento dos ditongos /ay/ e /aw/ poderiam ser
mais interessantes do que as mudanças observadas anteriormente. Ao invés
do padrão comum do sudeste da Nova Inglaterra ([ar] e [au]), os nativos de
Martha's Vineyard frequentemente usam [ei] e [eu], ou até mesmo [ǝi] e [ǝu].
Esse aspecto dos ditongos centralizados é notável para os linguistas, mas
passa despercebido pelos falantes, sendo imune à distorção consciente. Além
disso, há um paralelismo estrutural entre /ay/ e /aw/, caracterizado por uma
ampla liberdade estrutural nos alofones permitidos pelo sistema, sem que isso
cause confusão com outros fonemas, já que não existem ditongos crescentes
semelhantes com elementos baixos ou centrais nesse contexto (LABOV, 2008).
Em resumo, Labov utiliza esses dados para argumentar que as
mudanças linguísticas em Martha's Vineyard não são apenas fenômenos
isolados, mas refletem e interagem com padrões maiores de mudança
linguística e social na região. Essas observações ajudam a entender como a
linguagem se adapta e evolui em resposta a fatores sociais e culturais.
Assim, evidencia-se que Labov (2008) explica que, ao estudar o padrão
de centralização das variáveis linguísticas (ay) e (aw), estas são preferidas em
vez dos fonemas /ay/ e /aw/. Enquanto as diferenças subfonêmicas em /ay/ e
/aw/ são consideradas variação livre e insignificante, as variantes (ay) e (aw)
apresentam diferenças significativas em sua distribuição, carregando
informações sociolinguísticas relevantes. Os parênteses indicam uma
abordagem analítica que foca na variação, ao contrário das barras que
representam categorias invariantes e cujas variações internas são
desconsideradas.
O estudo sobre as variantes linguísticas (ay) e (aw) em Martha's
Vineyard utilizou perguntas para evocar juízos de valor, coletando respostas
em contextos emocionais variados. Foram realizadas 69 entrevistas com
falantes nativos, representando cerca de 1% da população local e abrangendo
diversas ocupações e grupos étnicos, como ingleses, portugueses e índios.
Além das entrevistas, também foram feitas observações em locais públicos,
como lanchonetes e lojas. A centralização das variantes foi quantificada, com
valores de (ay) em 75 e (aw) em 39. A análise indicou que a centralização
aumenta com a faixa etária, atingindo um pico entre 31 e 45 anos, levantando
questões sobre se esse padrão representa uma mudança sonora histórica ou
uma variação normal associada à idade (LABOV, 2008).
O estudo também analisou a interação entre padrões linguísticos e
sociais, examinando a centralização das variantes entre diferentes grupos.
Além disso, investigou o significado social da centralização, considerando
como essas variações linguísticas podem refletir e influenciar identidades e
relações sociais dentro da comunidade. Labov (2008) conclui que a
centralização é vista como uma atitude positiva em relação a Martha's
Vineyard, independentemente de fatores como faixa etária, ocupação, grupo
étnico e geografia. Ao analisar as entrevistas, os informantes podem ser
classificados em três categorias: positiva (sentimentos claramente favoráveis à
ilha), neutra (sentimentos ambivalentes) e negativa (desejo de viver em outro
lugar).
A diversidade linguística é a existência de várias línguas em um mesmo
espaço geográfico. Pode ser estudada de maneira abrangente, considerando
as diferenças entre línguas de nações distintas, ou de forma restrita,
analisando as variações regionais que geram sotaques, por exemplo.
Sociólogos e linguistas contemporâneos, através da sociolinguística, têm se
dedicado ao estudo desse fenômeno. A diversidade linguística é considerada
uma fonte de riqueza e criatividade para o desenvolvimento pessoal e social.
(HUMANIZAE, 2022).
Fernandes (s/a) cita em seus estudos que a variação linguística pode ser
classificada em quatro tipos principais: geográfica, histórica, social e
situacional. Variação Geográfica: Refere-se às diferenças linguísticas
relacionadas ao local em que a língua é usada, como os regionalismos entre o
português do Brasil e de Portugal. Variação Histórica: Relaciona-se ao
desenvolvimento da língua ao longo da história, como as diferenças entre o
português medieval e o atual. Variação Social: Está relacionada aos grupos
sociais envolvidos, como as distintas formas de fala entre um orador jurídico e
um morador de rua, conhecidas como socioletos. Variação Situacional: Ocorre
de acordo com o contexto, como as diferenças entre situações formais e
informais, incluindo o uso de gírias por determinados grupos sociais.
Essas diversas formas de variação linguística são naturais e enriquecem
a língua, evidenciando sua adaptabilidade e flexibilidade em resposta às
necessidades e à diversidade humana. Compreender e respeitar essas
variações é fundamental, pois elas refletem a riqueza cultural e social das
comunidades de falantes.

REFERÊNCIAS

FERNANDES, Márcia. O que é variação linguística (tipos e exemplos). S/A.


Disponível em https://www.todamateria.com.br/variacoes-linguisticas/. Acesso em 01
out. 2024.

HUMANIZAE. Diversidade linguística e cultural. 2022. Disponível em


https://humanizae.com.br/blog/diversidade-linguistica-e-cultural. Acesso em 01 out.
2024.

LABOV, William. Padrões sociolinguísticos. São Paulo, Parábola Editorial,


2008.

MONTEIRO, José Lemos, 1944- Para compreender Labov / José Lemos


Monteiro. - Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

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