Cirurgia Genital Mulher Trans

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Guia do Episódio de Cuidado

Cirurgia Genital – Mulher Trans

As cirurgias de afirmação de gênero referem-se às técnicas cirúrgicas utilizadas para modificações corporais em pacientes
transgêneros. Entretanto, não é toda pessoa transgênero que será submetida a essas cirurgias. Algumas receberão procedimentos
cirúrgicos para reduzir a disforia de gênero, traduzida como o extremo desconforto com a diferença entre a identidade de gênero e as
características anatômicas presentes.

Os procedimentos cirúrgicos são: feminização da face, redução da cartilagem tireoide, aumento mamário, neovulvovaginoplastia,
cirurgia para adequação da voz, cirurgias sobre o contorno corporal.

A cirurgia de afirmação genital é procedimento considerado eficaz para pacientes com disforia de gênero. Os índices de satisfação são
elevados com redução da disforia, determinando benefícios psicológicos e sociais. Assim como qualquer procedimento cirúrgico, a
qualidade do atendimento prestado antes, durante e após a cirurgia, de afirmação genital, têm impacto direto nos resultados.

Esse tratamento cirúrgico faz parte de um atendimento multidisciplinar iniciado com equipe de psicólogo, psiquiatra e
endocrinologista, e o cirurgião deve compreender sua atuação como parte desse tratamento.

1. IDENTIFICAÇÃO 3. EXAME FÍSICO

• Nome Social • Altura e peso


• Nome de Registro • Distribuição da pilificação na região genital, em especial a região
• Sexo atribuído ao nascimento da base da haste peniana
• Gênero com o qual se identifica • Avaliação perineal quanto a: cirurgias anteriores, lesões e
cicatrizes, comprimento do pênis e presença de fimose
• Avaliação testicular: localização e trofismo
• Avaliação quanto à existência de hérnias da parede abdominal,
em especial, as inguinais

2. ANAMNESE

Dados pessoais relevantes:

• Idade em que reconheceu sua identidade de gênero


• Orientação sexual atual
• Acolhimento da família para identidade de gênero.
• Companheiro(a) atual
• Tempo de vivência no gênero desejado
• Tempo de acompanhamento com endocrinologista, psiquiatra e psicólogo
• Expectativa em relação às mudanças

História clínica pregressa relevante:

• Uso atual de hormônios


• Idade do início da atividade sexual
• Descrição da atividade sexual atual
• Hábito intestinal, função urinária
• Tratamentos cirúrgicos/lesões anteriores

Antecedentes pessoais e familiares de patologias. Especial atenção para:

• Coagulopatias
• Eventos tromboembólicos
• Tabagismo
• Etilismo
• Uso de drogas ilícitas
• Uso de silicone industrial
• Diabetes
• Perfil sorológico
4. AVALIAÇÃO MULTIPROFISSIONAL 5. EXAMES LABORATORIAIS PRÉ-CIRÚRGICOS

Observar a necessidade de indicação formal da genitoplastia • Hemograma completo


feminizante pela equipe multiprofissional formada por: • Coagulograma
• ECG
psicólogo, psiquiatra, endocrinologista, além do cirurgião, • Raio-X Tórax AP/Perfil
com seguimento mínimo de um ano. • Ajustar para a idade e comorbidades conforme
recomendações da Sociedade Brasileira de Anestesiologia

6. PREPARO PRÉ-OPERATÓRIO ESPECÍFICO

• Interrupção de estrógenos e tabagismo trinta dias antes da cirurgia.


• Discutir sobre perda da capacidade reprodutiva após a cirurgia com atenção à proteção da autonomia reprodutiva da paciente -
banco de reprodução humana.
• Considerar a necessidade de epilação definitiva na base da haste peniana e 2,0cm no entorno; com intervalo mínimo de um mês
para a cirurgia desde a última sessão de depilação.
• Indicar necessidade de malhas cirúrgicas para a região genital e de meias para prevenção de eventos tromboembólicos.
• Indicação primária de técnica de inversão peniana com neoclitóris.
• Discutir pelo menos uma opção de técnica cirúrgica diversa da inversão peniana, como o uso de enxertos de pele ou mucosa.
• Não indicar técnicas com utilização de segmentos digestivos como opção primária.
• Apresentar Termo de Consentimento Livre e Esclarecido específico para cirurgia de afirmação genital - modelo anexo.
• Desnecessidade de preparo intestinal.

7. ALOCAÇÃO

• Cinco diárias em apartamento de Clínica Médica Cirúrgica.


• Não há necessidade de cuidados em Unidade de Terapia Intensiva.

8. TRATAMENTO CIRÚRGICO

ANESTESIA:

• Geral com bloqueio, idealmente, cateter de peridural para controle álgico pós-operatório até o terceiro dia;
• Antibioticoprofilaxia com cefazolina.

POSICIONAMENTO:

• Necessária a utilização de meias, compressor de membros inferiores, perneiras, manta térmica superior.

CIRURGIA:

• Em posição ginecológica, cirurgia do tipo aberta;


• Caixa de períneo e caixa de plástica;
• Tempo médio: cinco horas;
• Necessidade de hemoderivados: não;
• Necessidade de radiologia intraoperatória: não;
• Exame de congelação intraoperatória: não;
• Exame anatomopatológico: sim, para testículos;
• Material especial: sim:
- Esponja VAC System média (uma);
- Curativo compressivo perineal com bandagem elástica (Tensoplast).
9. PÓS-OPERATÓRIO

Pós-operatório imediato e 1o dia de pós-operatório:


• Dieta Leve.
• Manter antobioticoprofilaxia até retirada de dreno, sonda vesical de demora e molde vaginal.
• Repouso no leito.
• Cuidados específicos: avaliar sangramentos/saturação do curativo, hematoma, cuidados com dreno e com sonda
vesical de demora.
• Manter compressor pneumático e meias.
• Fisioterapia respiratória.
• Iniciar profilaxia medicamentosa para evento tromboembólico de acordo com protocolo institucional - observar
se há cateter de peridural.
• Desnecessidade de exames de controle.

Prescrição Dose Via Frequência

Cefazolina 1g IV 8/8h

Dipirona 1g IV 6/6h

Cetoprofeno 100 mg IV 12/12h

Ondansetron 8 mg IV 8/8h

Dimorf decimal 2 mg IV 4/4h Se dor

Pantoprazol 40 mg IV 1x/dia

Enoxaparina 40 mg SC 1x/dia até 7 dias

2o dia de pós-operatório:
• Dieta leve laxativa.
• Deambulação - Fisioterapia respiratória e motora.
• Remoção de Dreno de port-a-vac se débito abaixo de 30 ml/24h.
• Remoção de curativo e limpeza de ferida operatória.
• Manter sonda vesical de demora, molde vaginal e compressor pneumático.

3° dia de pós-operatório:
• Dieta geral laxativa.
• Deambulação - Fisioterapia respiratória e motora.
• Remoção de Dreno de port-a-vac se ainda não foi removido.
• Limpeza e manutenção de curativo com gaze algodonada (Zobec) e malha cirúrgica (calcinha tipo short).
• Manter sonda vesical de demora, molde vaginal e compressor pneumático.

4o dia de pós-operatório:
• Dieta geral laxativa.
• Deambulação - Fisioterapia respiratória e motora.
• Retirar sonda vesical de demora - observar sinais de retenção urinária e necessidade de sondagem vesical de
alívio.
• Retirar molde vaginal e observar sangramentos/prolapsos. Introduzir dilatador vaginal reutilizável com orientação
para a paciente passar a realizar a retirada e reintrodução da maneira apropriada e higienização do dilatador.
• Limpeza genital - orientações para que a paciente passe a realizar a higienização genital: no banho externamente
e internamente com ducha vaginal e sabonete líquido.
• Manutenção de curativo com gaze algodonada (Zobec) e malha cirúrgica (calcinha tipo short) - deve haver
pressão moderada sobre a região genital.
• Observar hábito intestinal, se obstipada, prescrever supositório de glicerina e laxante formador de bolo.

5o dia de pós-operatório:
• Dieta geral laxativa.
• Deambulação - Fisioterapia respiratória e motora.
• Observar a capacidade de higienização genital da paciente, utilização do dilatador vaginal com segurança.
• Alta hospitalar.
10. SEGUIMENTO APÓS A ALTA

PRIMEIRO MÊS:
Consultas semanais até completar um mês.
Observar deiscências, infecção, hematomas, necrose de tecidos.
É comum haver secreção proveniente do canal vaginal, podendo ser necessário orientar que a paciente realize higienização até três
vezes ao dia, incluindo o canal vaginal.
Realizar toque vaginal cuidadoso e exame especular para avaliar o revestimento do canal vaginal.
Manter o dilatador inicial até completar um mês.

SEGUNDO MÊS:
Passar para o dilatador 2, mantendo sessões de dilatação três vezes por dia por trinta minutos.
Observar deiscências, infecção, hematomas, necrose de tecidos.
Realizar toque vaginal cuidadoso e exame especular para avaliar o revestimento do canal vaginal, observação especial deve ser dada
na direção do canal vaginal sob efeito da dilatação feita pela paciente, ajustes podem ser necessários na orientação.
Nesse período o neoclitóris fica extremamente sensível, com hipersensibilidade, o que pode causar incômodo à paciente.
Manter o dilatador 2 até o mês seguinte.

TERCEIRO MÊS:
Observar se o dilatador 2 já está sendo introduzido completamente. Em caso negativo, reorientar a paciente quanto à necessidade
de aderência às dilatações, frequência e intervalo de tempo; postergue a progressão para o dilatador seguinte. Caso a dilatação
esteja satisfatória, progredir para o dilatador 3, mantendo sessões de dilatação três vezes por dia por trinta minutos.
Observar pontos de granulação, áreas deiscentes com cicatrizes por segunda intenção e extrusão de pontos.
Realizar toque vaginal cuidadoso e exame especular para avaliar o revestimento do canal vaginal e a direção e conformidade da
dilatação.
Atividades físicas sem carga podem ser liberadas após passados dois meses da cirurgia.

QUARTO MÊS:
Observar se o dilatador 3 já está sendo introduzido completamente. Em caso positivo, progredir para o dilatador 4 e manter o
padrão de dilatação.
Observar padrão de cicatrização e intervenha se houver queloide ou cicatrização hipertrófica.
Realizar toque vaginal cuidadoso e exame especular para avaliar o revestimento do canal vaginal e a direção e conformidade da
dilatação.
Após três meses da cirurgia, exercícios com carga podem ser liberados, mas com a ressalva de evitar agachamento e leg press, e
mesmo outros exercícios com carga extrema, devido ao risco de prolapsos através da fraqueza muscular sobre o assoalho pélvico,
criada com a conformação da neovagina.
Com a redução da hipersensibilidade do clitóris, é possível encorajar a paciente a se tocar para que reconheça as sensibilidades da
nova anatomia. Caso haja resistência da paciente, considere avaliação psicológica/psiquiátrica para que a paciente consiga dar um
ressignificado às estruturas anatômicas ali presentes.

QUINTO E SEXTO MESES:


Nesse período, é comum que os tecidos estejam na fase final de remodelamento cicatricial, com maior resistência à progressão da
dilatação. Caso não haja um canal vaginal funcional e maior do que doze centímetros de profundidade e 3 cm de diâmetro, ainda é
possível aumentar as dimensões através de dilatações, mas os intervalos de tempo para passar de um dilatador para o próximo
serão consideravelmente maiores.
O intercurso sexual, tanto vaginal quanto anal, somente devem ser autorizados a partir do sexto mês após a cirurgia, sempre com
lubrificação adequada para evitar prolapsos da pele do canal vaginal.
Realizar toque vaginal cuidadoso e exame especular para avaliar o revestimento do canal vaginal.
A partir do sucesso em utilizar molde de 16-18 cm de comprimento por 3,5 cm de largura, considera-se que o canal está de
dimensões adequadas. Caso a paciente inicie as atividades sexuais no canal vaginal, a frequência das relações e a qualidade delas é
que irão determinar se haverá necessidade de manter as dilatações. Geralmente, a dilatação uma vez ao dia é necessária até que a
paciente complete um ano de cirurgia.
Caso a paciente tenha dificuldades com as sensibilidades das estruturas e com o desenvolvimento da sexualidade com a nova
anatomia, considerar reavaliação pela equipe multidisciplinar para suporte nesse sentido.
O seguimento deve ser mantido após seis meses, ou seja, quando completar um ano após a cirurgia. A partir daí, retornos anuais.
Será necessário que a paciente faça acompanhamento ginecológico após os seis meses de cirurgia.
Referências

[1]Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº 2.265/2019. Dispõe sobre o cuidado específico à pessoa com incongruência de
gênero ou transgênero e revoga a Resolução CFM nº 1.955/2010. Brasil; 2020.
[2]Bowman C, Goldberg J. Care of the Patient Undergoing Sex Reassignment Surgery (SRS). 2006 Vancouver Coastal Health,
[3]Transcend Transgender Support & Education Society, and the Canadian Rainbow Health Coalition.
[4]Cornelisse VJ, Jones RA, Fairley CK, Grover SR. The medical care of the neovagina of transgender women: a review. Sexual Health.
2017 Oct 1;14(5):442-50.
[5]Berli JU, Knudson G, Fraser L, Tangpricha V, Ettner R, Ettner FM, Safer JD, Graham J, Monstrey S, Schechter L. What surgeons need
to know about gender confirmation surgery when providing care for transgender individuals: a review. Jama Surgery. 2017 Apr
1;152(4):394-400.
[6]Perovic SV, Stanojevic DS, Djordjevic ML. Vaginoplasty in male transsexuals using penile skin and a uretthral flap. BJU Int. 2000;
86:843-50.

Código Elaborador: Revisor: Aprovador: Data de Data de


Documento: Rodrigo Itocazo Mauro Dirlando C Haggeas Da Silveira Elaboração: Aprovação:
CPTW267.1 de Oliveira Fernandes 13/10/2021 13/10/2021

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