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Resumo: O presente estudo visa discutir sobre como a rede de apoio pode contribuir a respeito das
questões emocionais de mulheres que sofreram aborto espontâneo. Sua relevância é observada sobre a
possibilidade de ampliar a discussão do conteúdo no meio acadêmico, por haver poucos estudos a respeito
desse tema. Portanto, foi realizada uma revisão sistemática de literatura, nisso, foi possível perceber que
o luto da perda gestacional não é reconhecido socialmente, e isso desenvolve transtornos emocionais nas
mulheres, sendo assim, é necessário que a família auxilie a mulher durante um momento como este, para
que possa elaborar seu luto.
Abstract: The present study aims to discuss how the social support can contribute to the emotional issues
of women who have suffered miscarriage. Its relevance is observed on the possibility of expanding the
discussion of the content in the academic environment, due to the few studies on this topic. Therefore, a
systematic literature review was carried out. In this, it was possible to perceive that the grief of gestational
loss is not socially recognized, and this develops emotional disorders in women, so it is necessary for the
family to have the woman experience this moment so that you can work out your mourning.
Para uma melhor compreensão, é necessário abordar que o aborto ocorre quando há expulsão
ovular antes de completar 22 semanas de gestação. Considera-se como abortamento precoce
quando o feto não chega à décima terceira semana de vida, e, tardia quando este acontece
entre a 13ª semana e 22ª semana. Por conta disso, é necessário que haja o acompanhamento
clínico e ultrassonográfico para que o profissional da saúde possa avaliar o estado em que se
encontra a gravidez. O abortamento pode muitas vezes ser evitado, sendo então imprescindíveis
as consultas regulares ao obstetra. A mulher também deve ficar atenta nos sintomas físicos que
o abortamento normalmente apresenta, como, por exemplo, sangramentos e dores pélvicas,
pois ao notar essas diferenças em seu corpo ela já pode recorrer ao atendimento médico para
que possa fazer o tratamento certo e evitar futuros abortamentos (Ministério da Saúde, 2010).
O enfoque desta pesquisa foi analisar através da literatura sobre a importância da família e do
cônjuge durante o luto materno por abortamento, tal como compreender de que maneira esse
suporte contribui na prevenção de possíveis transtornos psiquiátricos que surgem na decorrência
do aborto. A pesquisa realizou-se por meio de uma revisão de literatura, a fim de levantar
publicações científicas sobre aspectos emocionais presentes em mulheres que sofreram de
aborto espontâneo, além de estudar a importância do papel da família diante a situação.
1
Psicóloga. Pós-Graduanda em Psicodrama Psicoterapêutico pela Associação Paranaense de Psicodrama.
Graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Associação Paranaense de Psicodrama, Curitiba-PR,
Brasil. E-mail: [email protected]
Submetido em: 29/06/2020. Primeira decisão editorial: 17/09/2020. Aceito em: 26/11/2020.
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Para que possamos compreender melhor sobre como essa é dar subsídios aos profissionais no apoio
o assunto do estudo, Freitas e Barros (2015) apontam que às mulheres e às famílias, a fim de que consigam
a morte de um filho que ainda está em fase de gestação apoiar a gestante para superar essa fase, visto que
tem um grande impacto para os pais, especialmente é uma temática pouco explorada na literatura.
a mãe, pois é ela quem vivencia diretamente esse Sendo assim, o objetivo desta pesquisa é, revisar na
processo em função das transformações corporais. No literatura, quais são as reações emocionais presentes
caso do abortamento, a mãe ainda terá de enfrentar o em mulheres que sofreram de abortamento não
procedimento para a retirada do feto, o qual pode ser induzido, e qual o papel da rede de apoio em relação
extremamente invasivo. a elaboração desse luto.
Embora a gestante sofra diretamente com o
luto, também é importante pontuar que os familiares Fundamentação Teórica
e amigos sentem a perda, porém, em muitos casos
existe um silenciamento vindo destes, no quesito
O aborto é a expulsão ovular antes de
de querer que a mulher acelere seu processo de
completar 22 semanas de gestação. Considera-se
elaboração. Ou seja, esses indivíduos passam a
como abortamento precoce quando o feto não chega
realizar comentários de que logo essa mãe poderá
à décima terceira semana de vida, e, tardia quando
engravidar novamente, no intuito de substituir o filho
este acontece entre a 13ª semana e 22ª semana.
perdido. E nesses casos, ocorre uma desvalidação e
A manifestação física de um abortamento pode
silenciamento do luto, ainda mais quando a gravidez
ser percebida por dores pélvicas e sangramentos
se encontra em estado inicial e ocorreu a perda, pois
excessivos durante a gestação, sendo importante a
socialmente não se é aceito o luto, pelo fato do início
mulher procurar por seu médico quando estiver com
da gestação ser algo pouco visto já que a barriga não
esses sintomas (Ministério da Saúde, 2010).
é visível, bem como o corpo da mulher ainda não
Como abordado anteriormente, a perda de
sofreu toda mudança que uma gravidez proporciona
um feto que ainda se encontra em desenvolvimento
(Faria-Schutzer et al., 2014).
pode acarretar em muita dor e sofrimento para a
Portanto, é importante compreender como
mulher que o estava gestando, justamente pelo fato
ocorre a elaboração desse luto, pois é provável
de criar uma idealização de seu filho. O abortamento
que exista um vínculo entre a mãe e o bebê que
pode gerar conflitos tanto na mulher quanto em
está crescendo em seu útero, visto que desde a
seu parceiro, sendo que ambos se encontram em
concepção – quando planejada, criam-se fantasias
desamparo diante a perda, porém, seus sentimentos
sobre a maternidade, o que quando se interrompe,
não são compreendidos e com frequência são
gera angústia nessa mãe. Sofrer o silenciamento pela
negligenciados pelas outras pessoas, pois há uma
população diante um aborto não induzido, faz com
dificuldade na população em conseguir se sensibilizar
que muitas mulheres se sintam inseguras, gerando
pelo momento que o casal está passando.
ansiedade em suas futuras gestações. Quando dada a
Entretanto, por mais que essas mães que
notícia da perda do feto, além da família, também é de
perderam seus filhos na gestação busquem por
importância da equipe de saúde se manter atenta ao
apoio familiar, não serão todos que conseguirão
estado emocional em que se encontra a mulher por
compreender o momento que ela e seu marido
conta da situação vulnerável que se encontra exposta
estão passando. Tal assunto é pertinente, visto que
(Freitas & Barros, 2015; Faria-Schutzer et al., 2014).
de acordo com a OMS, em 2015 no Brasil, houve
Em decorrência de tal problemática, a
192.239 abortamentos espontâneos, sendo que em
proposta dessa pesquisa é compreender por meio
2014 o número chegou a 206.230 (Fernandes, 2017).
da literatura como a família pode contribuir para que
Em caso de morte de crianças recém-nascidas,
uma mãe possa elaborar seu luto diante uma perda
o hospital fornece serviços de sepultamento para as
gestacional, a fim de que se evitem complicações
famílias, ou encaminha o corpo para o IML. Porém,
psiquiátricas futuras. A relevância de uma pesquisa
essa realidade não acontece com mortes pré-natais,
Autor e
Amostra Metodologia Resultados
Ano
As famílias não reagem bem com a notícia do
Foram abortamento, sendo que tanto o homem quanto a
entrevistados mulher sofrem. Estes alegam que para elaborar o
Meaney et Entrevista semiestruturada
6 homens e 10 luto, é importante encontrar formas de expressar sua
al. (2017) e análise fenomenológica
mulheres em uma dor. Normalmente, casais que sofrem com aborto
maternidade tendem a procurar suporte emocional através de
parentes e amigos, por se sentirem mais acolhidos.
As mulheres que sofrem de aborto sentem muita
culpa com o ocorrido e acreditam que tenham feito
algo de errado. Existe a crença de que seu corpo
falhou com seu lado feminino. Os autores relatam
Kersting Artigos
que a família e amigos podem não reconhecer essa
& Wagner sobre aborto Revisão de literatura
perda, ainda mais quando o casal pretende realizar
(2012) espontâneo
um funeral para se despedir do bebê. Além disso,
os homens demonstram menos o luto pelo qual
estão passando e isso pode acarretar conflitos no
relacionamento.
Antes de discutir a respeito do papel da família em tais situações, é necessário abordar sobre o
luto em si. Os autores Leal e Moreira (2016), assim como Kate (2014), trazem em seus artigos que, não há o
reconhecimento do abortamento espontâneo como uma forma de perda, pois, as famílias que sofreram de
morte fetal não possuem seu luto reconhecido, devido ao fato das pessoas não reconhecerem o feto como
alguém que fazia parte da família, além disso, a própria mulher também possui dificuldades em reconhecer sua
própria perda. Portanto, Kate (2014) explora em seu estudo, justamente esta temática, visto que a sociedade
em si, não compreende o processo do luto, devido ao fato de vivermos em um ritmo dinâmico, o qual, não
é permitido parar, e como a finitude é o encerramento de um ciclo, normalmente se torna algo evitado de
ser falado culturalmente. Isso faz com que haja negligência entre as pessoas quando se é necessário apoiar
alguém que está passando por um luto.
E, como Leal e Moreira (2017) discutem sobre essa questão da falta do reconhecimento do próprio
enlutado, Kate (2014) traz em seu artigo um trecho sobre como deve ser realizado o trabalho do luto:
[...] o trabalho de luto – adaptação à perda – envolve quatro tarefas básicas, essenciais para que a
pessoa/sistema familiar recuperem o equilíbrio e completem o luto: aceitar a realidade da perda,
experienciar a dor da perda, ajustar-se/adaptar-se a um ambiente no qual a pessoa/objeto desejado
não existe e transferir a energia emocional investindo-a noutras relações. (Kate, 2014, p. 10)
De acordo com o artigo de Lemos e Cunha (2015) e de Carmeneiro et al. (2015) as modificações
corporais que ocorrem durante a gravidez, faz com que a mulher normalmente crie uma fantasia em relação
ao bebê que está gestando, e ao sofrer de um aborto, os indícios da gravidez somem, causando abalo psíquico
na mulher, gerando ansiedade com a possibilidade em ter novas perdas gestacionais. Nota-se que diante a
coleta de dados dos autores, o sentimento de tristeza e impotência eram os mais presentes nas mulheres que
sofreram de aborto, sendo que, uma participante relata que teria sido “o desfazer de um sonho” (Carmeneiro
et al., 2015, p. 112).
A perda desse sonho faz com que as mulheres anseiem por uma gravidez futura, entretanto, os
autores divergem na questão deste sentimento, pois, algumas participantes relataram possuir medo e
angústia de passar por uma nova gravidez e sofrer novamente de abortamento, enquanto outras alegam