O Trauma Na Infância em Mulheres Com Compulsão Alimentar
O Trauma Na Infância em Mulheres Com Compulsão Alimentar
O Trauma Na Infância em Mulheres Com Compulsão Alimentar
PUC-SP
São Paulo - SP
2020
Vivian de Freitas Bandeira
São Paulo - SP
2020
BANCA EXAMINADORA
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À minha mãe, Rose, por todo o cuidado e carinho dedicado a mim. Seu amor
e companheirismo são excepcionais;
Ao meu pai, Antônio, que desde pequenina me inspirava com suas leituras;
À Profa. Dra. Denise Gimenez Ramos, que com seu brilhantismo orientou
minuciosamente essa pesquisa e, por quem, tenho enorme carinho e gratidão. Tenho
o privilégio de tê-la conhecido e realizado minha dissertação de mestrado e iniciação
científica sob sua orientação;
contribuições;
Aos meus colegas do mestrado: Camila Galliez, Alice Figueira, Rubem Pugliesi,
Giancarlo Dedona, Bianca Gresele, Jefferson Pereira, Marisa Catta-Preta e Victor
Lippelt, que tornaram esta experiência mais leve e divertida com nossos cafezinhos.
Agradeço em especial a Cris Lembo pela amizade, a Rebeca Simão, pela revisão
ortográfica e a Jefferson Pereira, pelos cuidados estatísticos com o trabalho;
Figura 1 - Distribuição das idades e do nível de instrução das pessoas que utilizaram
a internet em 2017 .................................................................................................... 66
Figura 2 - Fluxograma de seleção dos participantes do estudo ............................... 71
Figura 3 - Interpretação do coeficiente de correlação .............................................. 85
LISTA DE QUADROS
AN = Anorexia Nervosa
BN = Bulimia Nervosa
TA = Transtorno Alimentar
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 17
3 TRAUMA NA INFÂNCIA............................................................................................. 31
6 MÉTODO.......................................................................................................................... 60
6.1 Objetivo ................................................................................................................................ 60
6.1.1 Objetivo geral .............................................................................................................................. 60
6.1.2 Objetivos específicos .............................................................................................................. 60
6.2 Caracterização do estudo ............................................................................................. 60
6.3 Participantes ...................................................................................................................... 60
6.3.1 Procedimento para seleção da amostra....................................................................... 60
6.4 Instrumentos ...................................................................................................................... 61
6.4.1 Ficha qualitativa anônima – Apêndice I ........................................................................ 61
6.4.2 Escala de compulsão alimentar periódica (ECAP) – Anexo I ........................... 62
6.4.3 Questionário sobre traumas na infância (QUESI) – Anexo II............................ 62
6.5 Procedimento de coleta de dados ............................................................................. 64
6.6 Local de coleta de dados .............................................................................................. 65
6.6.1 Características da população brasileira que possui acesso à internet ........ 65
6.6.2 Aspectos positivos e limitações do uso da internet como método de coleta
de dados.................................................................................................................................................................... 66
6.7 Procedimento de análise de dados quantitativos............................................... 67
6.8 Procedimento de análise de dados qualitativos ................................................. 68
6.9 Cuidados éticos ................................................................................................................ 69
1 INTRODUÇÃO
presença de afetos negativos, tais como, culpa e vergonha, após uma refeição; c)
maior consumo de gordura, maior número de refeições no período noturno e maior
ingestão de calorias em situações de estresse; d) maior dificuldade em se lembrar do
que comeram nas últimas 24 horas; e) consumo alimentar mais emocional e baseado
em sinais externos como, por exemplo, visão ou odor de um alimento, que em sinais
internos de saciedade; f) maior propensão a comorbidades psiquiátricas,
especialmente depressão e ansiedade, assim como sintomas mais severos; g) maior
nível de baixa autoestima; h) maior sofrimento subjetivo como, por exemplo, culpa,
raiva e vergonha em relação ao controle da comida; i) maior nível de prejuízos
funcionais e qualidade de vida inferior; j) histórico precoce de obesidade; k) maior
preocupação com o peso e corpo; l) maior engajamento em dietas, assim como maior
dificuldade para emagrecer; por fim, m) frequente flutuação de peso.
No que se refere à população com TCA sem obesidade, isto é, com peso
normal, o estudo de Montano, Rasgon e Herman (2016) comparou indivíduo com TCA
obesos e com peso normal. Os pesquisadores observaram que obesos com TCA,
quando comparados com indivíduos com TCA de peso normal: a) exibem episódios
de compulsão mais longos; b) consomem mais refeições e petiscos ao longo do dia;
c) se exercitam menos; d) pulam menos refeições; e) evitam poucos tipos de
alimentos; f) possuem menos restrições dietéticas; g) apresentam menos
preocupações com o peso.
2.3.1 Incidência
Stice, Marti e Rohde (2013), por meio de uma amostra de 496 adolescentes
mulheres dos EUA em um período de oito anos, encontraram uma incidência de 343
pessoas com TCA em cada 100.000 pessoas por ano. Em um estudo longitudinal
finlandês com 2.825 participantes mulheres, Mustelin et al. (2015) observaram no
período de quinze anos uma taxa de incidência de 35 pessoas com TCA em cada
100.000 pessoas ao ano.
2.3.2 Prevalência
integram uma rede complexa e multifatorial. Abaixo será descrito algumas destas
associações, sem estabelecer uma relação de causa e efeito, mas sim,
exemplificando a coocorrência do TCA com algumas variáveis.
Dunkley e Grilo (2007) observaram que pacientes com TCA apresentam alto
nível de autocrítica, supervalorização da forma corporal/peso e baixa autoestima. O
conceito de autocrítica negativa refere-se ao constante engajamento em
autoavaliações ou autojulgamentos negativos, em concordância com este aspecto,
Fairburn et al. (1998) observaram que essas pacientes possuem alto nível de
autoavaliação negativa. Ademais, Dunkley e Grilo (2007) apontam que
frequentemente a autoavaliação e o autovalor desses indivíduos são baseados na
forma corporal e peso.
Já a baixa autoestima, para Dunkley e Grilo (2007), indicaria uma visão
negativa mais global de si mesmo, que incluiria o corpo, mas não se restringiria a este.
Striegel-Moore et al. (2005) e Hilbert et al. (2014) também observaram que indivíduos
com TCA apresentam uma autoestima negativa, assim como maior propensão a
experienciar emoções negativas, tais como, medo, preocupação, tensão, ansiedade
e depressão.
2.4.5 Dieta
2.4.6 Obesidade
O trauma infantil foi associado, por Morgan e Claudiano (2005), a uma possível
precipitação do TCA. O trauma na infância é definido como um evento ameaçador
para a integridade do indivíduo, o qual desencadearia uma resposta emocional de
medo, desesperança e horror. O indivíduo na tentativa de gerenciar tais afetos se
engajaria no comportamento alimentar compulsivo (MARRAS; VELOSO, 2012;
SCHUPP, 2004).
Em síntese, observa-se que a compulsão alimentar possui uma coocorrência
com diversos fatores. Nos aspectos psicológicos, nota-se baixa autoestima,
autoavaliação negativa, supervalorização do corpo e propensão a experienciar
emoções negativas. No tocante à família, o criticismo, em especial em relação ao
corpo e o pouco afeto/cuidado parental também pareceram estar presentes. No
âmbito do coletivo se discute a influência das mídias e padrão social de beleza na
compulsão alimentar, assim como no engajamento de dietas rígidas que acabam
sendo mais prejudicais para o transtorno.
Observou-se um alto nível de comorbidades psiquiátricas, em especial
depressão e ansiedade, além de não psiquiátricas como, por exemplo, obesidade. A
taxa de mortalidade e tentativa/ideação suicida foram altas em indivíduos com TCA,
quando comparado à população geral, mas não em relação a outros TA . Também foi
observado uma correlação positiva entre TCA e autolesão e, por fim, TCA e trauma
na infância.
Tendo em vista que o trauma na infância seria um fator de risco para o
desenvolvimento da compulsão alimentar e um elemento que agrava o quadro
30
alimentar, foi descrito no capítulo seguinte a definição de trauma infantil e seus efeitos
danosos – no âmbito psicológico e fisiológico – na vida de um indivíduo.
31
3 TRAUMA NA INFÂNCIA
momento (flashbacks), fazendo que a experiência traumática seja revivida (VAN DER
KOLK, 2015).
Como resultado disso, o indivíduo traumatizado pode apresentar um discurso
fragmentado; aparentar estar distraído, distante ou desconectado; permanecer em
permanente impressão de perigo; apresentar-se hipervigilante, isto é, preparado para
ser agredido e violado a qualquer momento, por fim, assusta-se facilmente com
acontecimentos corriqueiros (VAN DER KOLK, 2015).
Assim, a experiência do presente fica nebulosa e embotada, enquanto alguns
elementos das memórias fragmentadas e intrusivas do passado traumático são
intensos e vívidos. A pessoa sente-se presa e congelada em um lugar que deseja
desesperadamente sair, a vivência traumática. Entretanto, é importante destacar que
muitos indivíduos traumatizados, devido ao descolamento do afeto e imagem
traumática, não fazem relação entre o elemento intrusivo e o evento traumático (VAN
DER KOLK, 2015).
Quando o indivíduo vivencia um trauma na infância, segundo Bromberg (2001),
a estrutura dissociativa é ativada. A dissociação é definida pela American Psychiatric
Association (2014) como uma cisão ou separação de componentes intrapsíquicos ou
uma desconexão entre uma ideia e uma emoção e, usualmente, se apresenta em
indivíduos que possuem um trauma psíquico. Partes da personalidade do indivíduo
traumatizada ficam dissociadas a fim de restringir e de suprimir determinados
pensamentos insuportáveis. A dissociação causa danos severos na função integrativa
do indivíduo, isto porque ele pode apresentar declínio das funções pessoais e
profissionais, além de consequente atrofia nas capacidades psicológicas que foram
suprimidas. Entretanto, a dissociação protege o traumatizado contra a completa
fragmentação da personalidade e evita o contato com a memória traumática (HARRIS,
2009; VAN DER KOLK, 2015).
Além da dissociação, pode ocorrer a supressão de pensamentos; minimização,
negação; e alteração da percepção e senso de realidade, em que o indivíduo refugia-
se na fantasia, evitando defensivamente o contato com o mundo real. Um exemplo
disso seria a sensação de que o evento traumático não está acontecendo com a
própria pessoa, que observa de fora seu corpo toda a situação ou que tudo não passa
de um sonho (HERMAN, 2015; KALSCHED, 2013a; VAN DER KOLK, 2015). É
comum, segundo Ramos e Matta (2018), o uso de fantasia de onipotência como
proteção para a vivência de rejeição ou humilhação, seja esta real ou temida.
33
hormônios como o cortisol, hormônio do estresse (VAN DER KOLK, 2015). O estudo
de Rabin (2007) observou que o cortisol pode contribuir para o desenvolvimento de
obesidade.
Além destas quatro estruturas, Van der Kolk (2015) observou uma desativação
da área de Broca, região responsável pela expressão da linguagem. Pode-se
considerar que trauma fica registrado em estruturas pré-verbais, por conta disso é
difícil organizar a experiência traumática em uma história coesa e coerente com
começo, meio e fim. Embora nomear, sentir e identificar as emoções possam ajudar
o indivíduo a voltar a criar uma narrativa para sua vida, isso não é suficiente. O autor
aponta que o indivíduo precisa aprender a tolerar as emoções, sensações e
percepções, sem ser sequestrado por estas.
Como observou-se, o trauma na infância influencia de maneira direta os
estados corporais e, por isso, a autorregulação e reconhecimento desses estados
ficam prejudicadas, pois dependem de uma relação harmoniosa do indivíduo com seu
corpo. Indivíduos traumatizados sentem-se inseguros, desconfortáveis e estranhos
dentro do próprio corpo (VAN DER KOLK, 2015).
O corpo constantemente tem seus sinais de alerta viscerais acionados por
qualquer estímulo, por conta disso o indivíduo não consegue discriminar o que é
seguro, daquilo que é perigoso e prejudicial. A fim de controlar estes processos, ocorre
uma desconexão entre emoções e estados corporais e, consequentemente, uma
cisão com suas necessidades fisiológicas. A própria tentativa de resolução dos sinais
de alerta do corpo, isto é, a desconexão, paradoxalmente acaba por prejudicar ainda
mais o discernimento sobre o que está acontecendo dentro do próprio corpo (VAN
DER KOLK, 2015).
Além do indivíduo traumatizado apresentar dificuldades em discriminar e em
descrever reações fisiológicas, isso também ocorre no âmbito das reações
emocionais. Por conta disso, o indivíduo traumatizado registra as reações emocionais
como físicas, isto é, sentem fome, dor nos músculos, enxaqueca, ataque de asma,
irregularidades no intestino e entre outros sintomas somáticos em vez de sentir-se
triste ou com raiva. O que faz que apresente dificuldade em cuidar de si mesmo e
decidir o que é melhor para si, podendo acarretar diversos tipos de transtornos, sendo
um deles o TCA (VAN DER KOLK, 2015).
Comer de maneira compulsiva, assim como abuso de substâncias,
automutilação, dissociação e engajamento em comportamentos de risco seriam
35
estratégias de enfrentamentos disfuncionais que, segundo Van der Kolk (2015), são
adotadas frequentemente por estes indivíduos para tentar regular esses afetos
esmagadores.
A partir das observações realizadas nesse capítulo acerca do trauma na
infância e suas múltiplas consequências, propõe-se estudar os mecanismos
subjacentes ao funcionamento da compulsão alimentar e suas possíveis relações com
o trauma na infância, a partir do enfoque da psicologia analítica, que será tema do
próximo capítulo.
36
4.1.1 Senhorita C.
A busca por comida é sempre a busca pela mãe positiva, que acaba por se
transformar em mãe negativa, quando a segurança, proteção e amor que a
comida deveria proporcionar se transforma em culpa, ódio e vergonha
(WOODMAN, 2002, p. 49).
isolamento, como estratégia defensiva para lidar com os sentimentos de rejeição, ora
demanda extrema de atenção, que visaria suprimir estes sentimentos. Wahba (2017)
também se refere a algumas estratégias defensivas, descritas por Schmitt (2006),
como forma de lidar com a rejeição e a vergonha: retirada, evitação, ataque a si próprio
e ao outro.
A retirada e a evitação fazem que o indivíduo com compulsão alimentar se isole
do convívio social. A fim de compensar a sensação de privação afetiva, abandono e
rejeição, a comida – “companheira fiel e leal” (informação verbal)1– representaria um
recurso familiar, que não irá abandoná-lo ou rejeitá-lo. Por se tratar de algo controlável
e palpável, não há surpresa nem frustração. Sendo assim, o relacionamento passa a
ocorrer primordialmente com a comida, com pouco espaço para o contato com o outro
(GADOTTI; BORGES; SAMPAIO, 2017; WAHBA, 2002, 2017).
Os dois mecanismos defensivos supracitados, associados à culpa e à
vergonha, podem fazer que o episódio compulsivo ocorra de maneira ilícita e privada.
Para Borges (2011) se, de um lado, o alimento é legal, lícito, de outro, o modo e/ou a
quantidade de alimento ingerido o torna ilícito, justificando o ato de comer em segredo.
Segundo Gadotti, Borges e Sampaio (2017), o ato de comer, em geral, é entendido
como pecaminoso, transgressor e sombrio e, por isso, deve ser realizado de maneira
clandestina.
Wahba (2017) descreveu que além da culpa e da vergonha, que podem ser
associadas a um baixo senso de autoestima, há presença de insegurança e de
depressão. Na depressão, Liberman (1994) e Austin (2005) descrevem que a comida
desempenharia a função de equilibrar o organismo deprimido, pois proporciona uma
dose de prazer imediato que preenche o tédio e injeta ânimo.
Sendo assim, o comer seria uma forma de autogratificação, prazer, conforto,
excitabilidade imediata e alívio para um sofrimento interior, supostamente
compensando a estrutura egóica desadaptada. Entretanto, foi observado por
1
Expressão utilizada popularmente
45
Woodman (1995) que o comer também poderia ser uma forma de punir o corpo e a si
mesmo. É neste ponto que se observa o aspecto paradoxal sagrado-profano da
comida/comer, pois ao mesmo tempo que protege, também pune.
Como observado por Woodman (2002), os indivíduos com compulsão
alimentar não possuem um ego adaptado, estruturado e discriminado o suficiente para
controlar e refrear o comer compulsivo. Além disso, Liberman (1994) pontua que o
indivíduo com compulsão alimentar não consegue confrontar seus afetos negativos
como ódio e raiva, seja por não ter aprendido a expressá-los, seja porque a expressão
destas emoções geraria sentimentos de culpa.
Assim como a raiva e o ódio, também são reprimidos ou comprometidos a
inveja, o desejo, o prazer e a sexualidade (WOODMAN, 1995; GRYNICK, 2016).
Como aponta Hollis (1998), aquilo que o indivíduo não consegue tolerar de maneira
consciente será projetado em uma pessoa, uma substância ou um comportamento.
Por conta disso, essas emoções inconscientes e energias agressivas e violentas
reprimidas se orientam para o indivíduo em forma de auto-ódio, comportamento
autodestrutivo, autopunição e não enfrentamento heroico do mundo adulto, o que
poderia culminar em um episódio de compulsão alimentar (AUSTIN, 2005; WAHBA,
2002).
Situações de frustração, estresse, cansaço, irritação e sono também são,
segundo Liberman (1994), potenciais desencadeadores de um episódio de compulsão
alimentar, isto porque são confundidas com vontade de comer ou fome fisiológica. A
desconexão com o próprio corpo faz que o indivíduo tenha dificuldade em
compreender suas próprias necessidades fisiológicas como, por exemplo, a
saciedade.
A sigla FISC (Fome, Irritação, Sono e Cansaço) do grupo de Comedores
Compulsivos Anônimos (CCA) é utilizada para alertá-los dos gatilhos
desencadeadores da compulsão alimentar e está em concordância com o descrito por
Liberman (1994). Por fim, como aponta Woodman (1995), a comida para estes
indivíduos parece ter se tornando um modo de canalizar todo e qualquer tipo de
emoção ou sensação.
46
pelos irmãos João e Maria. O ambiente familiar, que supostamente deveria prover
segurança e conforto, é instável e os coloca em situação de risco: fome e ameaça
oriunda da floresta. A experiência de serem rejeitados pela mãe, negligenciados pelo
pai e de se perceberem perdidos no bosque é traumática. O mundo real torna-se
hostil, instável e amedrontador, por não saberem como lidar com esse mundo são
atraídos pelo que falta – mundo doce das fantasias – simbolizado pela casa da bruxa.
Esta promete cuidado ao oferecer comida, quando seu objetivo principal era engordá-
los para devorá-los.
O complexo materno negativo foi representado, na análise de Wieland-Burston
(1996) do conto supracitado, pela figura da mãe rejeitadora de João e Maria, a qual
propõe ao pai que os abandone na floresta, figura paterna omissa e pela figura da
bruxa devoradora, que os engordava para poder comê-los, ou seja, o complexo
materno e o arquétipo da bruxa estariam alinhados na polaridade negativa. A falta de
um complexo materno positivo nesse conto, o qual possa desempenhar um papel
mediador, faz que os personagens fiquem à deriva de seus próprios estados
fisiológicos e afetivos. Bromberg (2001) propõe que a compulsão alimentar é uma
tentativa prolongada de controle da desregulação afetiva oriunda do trauma infantil.
A emergência do complexo materno negativo é representada na possibilidade
de João e Maria serem comidos e destruídos pela figura da bruxa. Entretanto, Maria
elabora um plano de ação para enganar a bruxa devoradora, o qual possibilitou que a
matassem e escapassem da situação de aprisionamento. Assim, despotencializando,
segundo Wieland-Burston (1996), o complexo materno negativo.
Dan (1991) discorre sobre o aspecto dúbio do ingerir ou não os doces contidos
na casa da bruxa. Não comer os doces representaria morrer de fome e comê-los
significaria o aprisionamento e, subsequente, possível aniquilamento. Ainda sobre
este aspecto dual, pode-se pensar que a compulsão alimentar e a comida possuem
um aspecto destrutivo e protetor, por um lado, ameaça aniquilar o indivíduo, por outro,
protege o indivíduo de afetos, pensamentos e sensações inconscientes insuportáveis.
Rejeitar o afeto/alimento da figura materna, ainda que este afeto seja negativo,
significaria a morte; aceitar a mãe protetora/devoradora significaria o aprisionamento
(GRYNICK, 2016; KALSCHED, 2013a).
Além do conto de João e Maria, também pode-se utilizar como exemplo o caso
clínico descrito por Austin (2013). Durante o processo de análise de Jenny, a autora
(2013) tentou compreender: o que Jenny estava expressando por meio da sua
49
e TCA na vida adulta. Para tanto, os pesquisadores compararam este grupo com
pacientes de um ambulatório oftalmológico. Observou-se uma correlação significante
positiva entre abuso sexual infantil e AN, sendo o risco deste TA cinco, oito vezes
maior em indivíduos com histórico de abuso sexual infantil. A prevalência de abuso
sexual infantil em mulheres com TCA foi alta, porém não se constatou uma diferença
estatística. A prevalência de abuso sexual infantil foi alta tanto na população
psiquiátrica, como no grupo controle oftalmológico, população não psiquiátrica.
Burns et al. (2012) observaram uma associação positiva entre a frequência dos
episódios de compulsão alimentar, os escores da escala de dificuldades na regulação
emocional e o abuso emocional infantil em mulheres americanas. O abuso físico e
sexual não foram estatisticamente significativos para os episódios de compulsão
alimentar. Além disso, o abuso emocional e a dificuldade na regulação emocional
foram associados significativamente e positivamente entre si. Para os autores, estes
dados confirmam a hipótese de que o episódio de compulsão alimentar é um modo
desadaptado de lidar com estados emocionais negativos, indicando uma habilidade
precária de regulação emocional. A curto prazo, o episódio de compulsão refrearia
afetos negativos e proporcionaria alívio e calma.
O estudo de Imperatori et al. (2016), realizado na Itália com mulheres com
sobrepeso e obesas, observou que o TCA foi associado com o trauma infantil em
todas as suas dimensões, incluindo o abuso sexual, embora esta tenha sido a
associação mais fraca. O abuso emocional foi seguido em frequência pelo trauma
global, negligência física, negligência emocional e abuso físico. A ansiedade e a
depressão também apresentaram uma correlação positiva com TCA, enquanto o IMC
apresentou uma correlação positiva com depressão, negligência física e trauma
global, respectivamente. Os autores sugerem que a compulsão alimentar previne ou
alivia estados emocionais negativos advindos de experiências traumáticas na infância.
O uso da comida seria uma estratégia de enfrentamento desadaptada para
autorregulação emocional e gerenciamento de estados emocionais desagradáveis.
Caslini et al. (2016) observaram, por meio de uma revisão sistemática e meta-
análise, que o abuso emocional infantil, seguido pelo físico e sexual infantil
apresentam uma correlação positiva com TCA. Segundo os pesquisadores, estes
achados fornecem maior evidência para o entendimento da compulsão alimentar
como modo de manejar situações adversas resultantes do trauma na infância e uma
reação a estes abusos sofridos.
55
dissociação que o grupo controle saudável. Os autores observaram que quanto maior
o nível de dissociação, de trauma infantil e do IMC, maior a severidade dos episódios
de compulsão alimentar.
O estudo de Baek et al. (2018) objetivou determinar os efeitos dos sintomas de
compulsão alimentar na tentativa de suicídio e no transtorno depressivo maior (TDM)
em uma população coreana. Foram selecionados participantes com TDM e compulsão
alimentar e participantes com TDM e sem compulsão alimentar. Cabe ressaltar que o
primeiro grupo era mais jovem que o segundo, sendo que o grupo dos mais jovens
apresentou um número maior de comorbidades psiquiátricas, tais como: transtorno
por uso de substância, transtorno de ansiedade, TEPT e histórico de tentativa de
suicídio. Além disso, o grupo com compulsão alimentar apresentou maior nível de
presença de qualquer tipo de trauma; trauma precoce; trauma na vida adulta e trauma
sexual, isto é, estupro ou agressão sexual que o grupo sem compulsão alimentar.
Observou-se uma correlação positiva entre tentativa de suicídio com compulsão
alimentar e trauma sexual. O trauma sexual aumenta a compulsão alimentar,
juntamente com o uso de substância, ansiedade e tentativa de suicídio. Além disso, a
compulsão alimentar e a ansiedade mostraram uma associação bidirecional, isto é, se
afetam mutuamente. Os autores inferiram que a compulsão alimentar pode ser usada
para acalmar ou entorpecer a si mesmo após uma experiência traumática.
Belli et al. (2019) avaliaram os níveis de dissociação e trauma infantil, por meio
do CTQ, em obesos graves com e sem TCA na Turquia. Os pesquisadores
observaram que os pacientes com TCA apresentaram maiores pontuações para
dissociação que os obesos graves sem TCA. Além disso, os pacientes obesos com
TCA pontuaram de maneira significativamente mais alta nas subescalas de
negligência e abuso emocional na infância, quando comparado ao grupo de obesos
sem TCA.
Quilliot et al. (2019) avaliaram, em um grupo de pacientes franceses obesos
com cirurgia bariátrica marcada, a associação entre eventos psicológicos adversos na
infância e TCA na vida adulta. A prevalência de TCA nesta população foi de 34,9%. O
trauma psicológico na infância estava significativamente correlacionado com
pacientes com TCA. A negligência emocional foi o trauma infantil mais
predominantemente associado com o TCA, tanto para homens quanto para mulheres.
Nos homens também foi observado uma correlação entre trauma infantil global e TCA,
58
enquanto nas mulheres, uma correlação entre abuso físico, abuso sexual, trauma
global e presenciar violência doméstica com TCA.
Braun et al. (2019), por meio da análise de um estudo epidemiológico nacional
realizado nos EUA, observaram que mulheres que sofreram trauma na infância
apresentavam um número alto de sintomas de compulsão alimentar.
Em síntese, a partir da análise das pesquisas que relacionaram trauma infantil
e TCA/compulsão alimentar, pode-se realizar algumas observações quanto ao
impacto que o trauma infantil tem no desenvolvimento e agravamento deste quadro
alimentar. Em diversos estudos foram observados uma correlação positiva entre
trauma infantil e TCA/compulsão alimentar (AFIFI et al., 2017; BAEK et al., 2018;
BECKER; GRILO, 2011; BRAUN et al., 2019; CASLINI et al., 2016; IMPERATORI et
al., 2016; MOLENDIJK et al., 2017; PALMISANO et al., 2018; PALMISANO;
INNAMORATI; VANDERLINDEN, 2016; QUILLIOT et al., 2019), indicando que o
trauma infantil pode ser um fator de risco desencadeador do TCA e que a presença
do trauma infantil agrava a severidade dos episódios de compulsão alimentar.
Alguns estudos sugeriram a relação entre um tipo de trauma infantil específico
e o TCA. O abuso emocional foi o tipo de trauma infantil que mais se destacou no que
se refere à associação significativa e positiva com o TCA e a episódios de compulsão
alimentar (AFIFI et al., 2017; BURNS et al., 2012; CASLINI et al., 2016; FEINSON;
HORNIK-LURIE, 2016a, 2016b; HYMOWITZ; SALWEN; SALIS, 2017; IMPERATORI
et al., 2016). Em outros estudos, observou-se que a negligência e abuso emocional
foram os tipos de trauma infantis mais determinantes para o TCA e episódios de
compulsão alimentar (AMIANTO et al., 2018; BECKER; GRILO, 2011; BELLI et al.,
2019; MOLENDIJK et al., 2017; PALMISANO et al., 2018). Apenas um estudo indicou
que exclusivamente a negligência emocional possuía uma correlação significativa e
mais frequente com o TCA (QUILLIOT et al., 2019).
No que se refere ao abuso sexual na infância, os estudos apresentaram
resultados mais dispersos. Em algumas pesquisas não foram observados uma
correlação positiva entre TCA e abuso sexual (BURNS et al., 2012; PARAVENTI et
al., 2011), enquanto que em outros esta correlação era existente, embora não fosse
a mais frequente e significativa (AFIFI et al., 2017; AMIANTO et al., 2018; BECKER;
GRILO, 2011; CASLINI et al., 2016; IMPERATORI et al., 2016; PALMISANO et al.,
2018). Apenas em um estudo, o trauma sexual, não necessariamente na infância, foi
a associação mais significativa e frequente. Neste estudo o trauma sexual foi
59
6 MÉTODO
6.1 Objetivo
6.3 Participantes
6.4 Instrumentos
Após a aprovação do post por parte dos administradores dos grupos, descrita
na seleção da amostra, foi realizado uma postagem disponibilizando um link da
plataforma SurveyMonkey. Na postagem, juntamente com o endereço eletrônico da
pesquisa, a pesquisadora disponibilizava informações e instruções sobre a pesquisa,
a fim de motivar a participação dos membros dos grupos (APÊNDICE II).
O link da plataforma SurveyMonkey continha o termo de consentimento assim
como a ficha qualitativa anônima e as duas escalas, ECAP e QUESI, nesta sequência.
O termo de consentimento livre e esclarecido – TCLE – (APÊNDICE III) foi
transformado em um documento on-line. Após a leitura do termo de consentimento, o
participante foi questionado se concordava em participar da pesquisa, podendo clicar
no botão sim ou no botão não para responder esta questão. Se o participante optou
pelo botão sim, em que concordava com o termo, foi dado prosseguimento a pesquisa,
65
sendo liberado o acesso aos questionários; caso o participante optasse pelo botão
não, não era dado prosseguimento a pesquisa e o participante era direcionado para
uma página que não dava acesso aos questionários e finalizava a pesquisa. Aqueles
participantes que concordaram com o termo de consentimento tiveram acesso a ficha
qualitativa anônima. A pesquisa foi elabora de tal forma que os participantes só
poderiam ter acesso ao próximo questionário quando completassem a ficha qualitativa
anônima. Após completarem a ficha qualitativa anônima, os participantes tinham
acesso ao ECAP e, apenas após responderem todas as perguntas do ECAP, tinham
acesso ao QUESI, não havendo possibilidade de pular uma pergunta ou um
questionário.
O endereço eletrônico – link – para que os participantes respondessem os
questionários eletrônicos on-line ficaram disponíveis nos grupos de Facebook durante
o período de três meses (09 de setembro 2019 a 09 de dezembro de 2019). Durante
este período, a pesquisadora repostava semanalmente o link de sua pesquisa. Após
tal período a coleta de dados na internet foi encerrada. Após a finalização da coleta
de dados a pesquisadora, juntamente com um estatístico, avaliaram a pontuação do
ECAP e excluíram aqueles participantes que não pontuaram para compulsão
alimentar no ECAP.
relações e conexões entre os códigos existentes a fim de criar categorias mais amplas
ou centrais. O Selective Coding ou Theoretical Coding visa a identificar o conceito
central daquela categoria ou a história que a circunda e compará-los com teorias já
existentes. A codificação termina quando o pesquisador identifica que os códigos
estão saturados e são suficientes para embasar a teoria emergente (EZZY, 2002).
Após a realização da análise temática, a pesquisadora contratou uma
assistente de pesquisa com graduação em psicologia pela PUC-SP para revisar as
categorias estabelecidas pela pesquisadora. Nas categorias em que houve
divergências entre a pesquisadora e a assistente de pesquisa foram discutidas em
conjunto até que se chegasse a uma percepção convergente.
7 RESULTADOS E DISCUSSÃO
O cálculo amostral foi realizado por meio do programa GPower versão 3.1.9.4.
No cálculo foi considerado que esse estudo contemplasse uma análise de regressão
múltipla. As seguintes premissas foram consideradas: tamanho do efeito (f2) esperado
de 0,1; erro do tipo I (α) de 5%; poder do teste (1-β) de 99%; duas variáveis de
predição; e hipótese bilateral. Com isso foi obtida uma amostra de 186 participantes.
Considerando o descarte de 10% da amostra por possíveis erros no preenchimento
do questionário, a amostra mínima foi de 207 participantes.
Foi registrado, como pode ser observado na figura 2, 1.574 acessos ao link dos
questionários disponibilizados nos grupos de Facebook. Destes, 729 foram
preenchidos completamente e 845 foram preenchidos parcialmente. Aqueles
participantes que não preencheram todos os questionários disponibilizados foram
excluídos pela pesquisadora no momento da avaliação dos dados.
Por meio da ECAP foi possível observar a pontuação de cada participante no
que se refere à compulsão alimentar. Dos 729 participantes que preencheram os
questionários completamente, 77 não pontuaram para compulsão alimentar e, por ser
tratar de um critério de exclusão estabelecido pela pesquisadora, foram excluídos do
estudo. Sendo assim, 652 participantes pontuaram para compulsão alimentar e
permaneceram elegíveis para pesquisa. Destes 652, com o objetivo de manter a
homogeneidade do estudo, foram excluídos: 11 participantes do gênero masculino; 23
participantes que moravam no exterior; 08 participantes que apresentaram Índice de
massa corpórea (IMC) < 18,5, considerado abaixo do peso pela Organização Mundial
de Saúde e 06 participantes que apresentaram inconsistências nos dados por meio
da análise estatística outlier. Por fim, 604 participantes foram considerados elegíveis
para participar do estudo.
71
Participantes
elegíveis para a
pesquisa: 604
Participantes que
pontuaram para Participantes
compulsão excluídos por
alimentar: 652 serem do gênero
Participantes que
completaram os masculino,
morarem no
questionários: 729
Participantes excluídos exterior, estarem
Participantes que com IMC <18,5 e
acessaram os por não pontuarem para
Participantes compulsão alimentar: 77 apresentarem
questionários: 1.574 inconsistências
excluídos por
responderem nos dados: 48
parcialmente os
questionários: 845
7.1.3 Idade
Kessler et al. (2013) observaram que o início do TCA ocorre entre os 15.5 anos
de idade e os 27.2 anos, estes dados se aproximam dos achados por Hudson et al.
(2007), que notaram o início do TCA entre 17 e 32 anos de idade. A presença deste
transtorno em uma população jovem está de acordo com o observado pela
pesquisadora nessa amostra.
Há de se considerar que, segundo os dados do IBGE (2017), a população entre
18 e 29 anos de idade possui maior acesso à internet, como pode ser observado na
figura 1 descrita no subcapítulo local de coleta de dados.
7.1.4 Gênero
7.1.5 IMC
O IMC da amostra foi calculado a partir dos dados de altura e peso fornecidos
pelos participantes. O cálculo e os parâmetros utilizados tiveram como base as
diretrizes fornecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS, [s.d.]). Os oito (08)
participantes que apresentaram IMC < 18,5, considerado abaixo do peso pela OMS,
foram excluídos da amostra.
Pode-se observar na tabela 2 que apenas 20,4% da amostra está dentro dos
parâmetros adequados de peso, enquanto 79,6% apresenta sobrepeso ou obesidade
grau I, II e II. Estes resultados estão de acordo com o estudo de Hudson et al. (2007),
em que 19% da amostra possuía peso normal; 35,7% sobrepeso; 45,4% obesidade
grau I, II e II; e com o estudo de Kessler et al. (2013), em que 1,3% apresentou baixo
peso; 31,7% peso normal; 30,7% sobrepeso e 36,2% obesidade grau I, II e II.
Nota-se também a alta prevalência de obesidade (48,9%) em pessoas com
TCA em concordância com os estudos de Forteza e Miguel (2014); Montano, Rasgon
e Herman (2016) e Sadock, Sadock e Ruiz (2017).
Porcentagem
Nível de instrução Frequência
(%)
Não frequentou escola 1 0,2%
Ensino fundamental
3 0,5%
incompleto
Ensino fundamental completo 13 2,2%
Ensino médio incompleto 25 4,1%
Ensino médio completo 129 21,4%
Ensino superior incompleto 201 33,3%
Ensino superior completo 131 21,6%
Pós-graduação 101 16,7%
Total 604 100,0%
Fonte: Elaborada pela própria autora, 2020.
a cinco (05) SM, enquanto 40,9% da amostra possui renda familiar maior ou igual a
seis (06) SM. Embora a maior parte dos participantes tenha um alto nível de instrução,
os participantes apresentam uma renda familiar igual ou inferior a cinco (05) SM. Um
estudo australiano, realizado por Mulders-jones et al. (2017), e outro brasileiro,
desenvolvido por Freitas et al. (2008), indicaram que a renda não foi uma fator
estatisticamente significativo para o TCA.
Porcentagem
Estado civil Frequência
(n=604)
Solteira(o) 281 46,5%
Em um relacionamento 126 20,9%
Casada(o) 172 28,5%
Divorciada(o) 22 3,6%
Viúva(o) 3 0,5%
Total 604 100,0%
Fonte: Elaborada pela própria autora, 2020.
Grilo (2019), sendo considerado por, segundo Ulfvebrand et al. (2015) e Passos,
Stefano e Borges (2005) o TA com maior nível de comorbidades psiquiátricas.
É interessante notar que embora a porcentagem de indivíduos que relataram
algum diagnóstico psiquiátrico ou psicológico em algum momento da vida tenha sido
elevada (57%, n=344), um número reduzido de participantes indicaram, vide tabela 8,
nunca terem feito acompanhamento psiquiátrico (46,6%) e psicológico (24,8%). Este
dado pode levantar dúvidas quanto ao fato deste diagnóstico ter sido fornecido por
um profissional da área da saúde mental, especialmente por se tratar de um
autorrelato do diagnóstico psiquiátrico/psicológico. Sendo assim, não é possível
afirmar que estes indivíduos tenham sido diagnosticados em algum momento da vida
com estas patologias.
compulsão alimentar nos estudos de Fairburn et al. (1998), Becker e Grilo (2011),
Feinson e Hornik-Lurie (2016a) e Baek et al. (2018).
Pontuação Porcentagem
Classificação ECAP Frequência
ECAP (%)
ECAP moderada 18 - 26 139 23,0
ECAP grave ≥ 27 465 77,0
Total 604 100,0
Fonte: Elaborada pela própria autora, 2020.
Amplitude da
ECAP n M (DP) IC 95%
escala
ECAP
18 - 26 139 22,23 (2,616) 21,79 - 22,67
moderado
ECAP grave 27 - 48 465 35,53 (5,433) 35,03 - 36,02
ECAP total 18 - 48 604 32,47 (7,461) 31,87 - 33,06
IC 95%: Intervalo de confiança a 95%.
n: Frequência dos participantes.
Fonte: Elaborada pela própria autora, 2020.
QUESI – Pontuação de
Frequência Porcentagem (%)
minimização/negação
0 367 60,7
1 158 26,2
2 64 10,6
3 15 2,5
Total 604 100,0
Fonte: Elaborada pela própria autora, 2020.
Fonte: DANCEY, C.P.; REIDY, J. Estatística sem matemática para psicologia. 7ª ed. Porto Alegre:
Penso, 2019.
O coeficiente de regressão não padronizado para IMC foi de 0,203 (IC de 95%
variando de 0,116 a 0,289) e para trauma na infância foi de 0,094 (IC de 95% variando
de 0,060 a 0,128). Como os intervalos de confiança não incluíram valor negativo,
pode-se concluir que os coeficientes de regressão populacionais tanto para o IMC
quanto para o trauma infantil são positivos (IMC: t=4,579, p-valor<0,001; QUESI:
t=5,399,p-valor<0,001), indicando que tanto IMC quanto trauma na infância (QUESI)
estão positivamente correlacionados ao ECAP.
Os coeficientes de regressão padronizados (β) mostram que o trauma infantil
(β=0,215) é um previsor mais forte que o IMC (β=0,182) para a compulsão alimentar
(ECAP). O trauma infantil contribuiu separadamente 21,5% para prever a compulsão
alimentar (ECAP). Todavia, ambas as variáveis – trauma infantil e IMC – estão
positivas e significativamente relacionadas ao ECAP.
Não foram estabelecidas categorias prévias nas perguntas abertas, pois foram
elaboradas a partir dos relatos feitos pelas participantes e com base na análise
temática de Ezzy (2002). O discurso das participantes poderia ser classificado com
mais de uma categoria, sendo priorizado para a análise as categorias com
porcentagem ≥ 10%. Ademais, todas as perguntas abertas e as categorias foram
correlacionados com o ECAP e QUESI, aquelas que apresentaram uma correlação
significativa foram descritas.
Eu tinha acabado de ser mãe, meu filho dava muito trabalho. Ele só chorava
(e eu chorava junto). Minha vida estava toda mudada. Eu era nova. Fui morar
com o pai do meu filho. Vivia em um casamento abusivo e cheio de traições
(Participante 161).
quando você passa por suas experiências sozinhas, sem o apoio familiar,
sem carinho e sem atenção isso te marca negativamente [grifo nosso]. Você
é a gordinha da escola, você não se sente feliz. Isso grava marcas durante
sua vida. Também o fato de não ter ninguém para conversar ou dividir os
problemas. Além disso, minha família é muita fechada, nunca houve
conversas ou diálogos. Demonstração de afeto como abraçar, beijar não
tenho essa lembrança. Meu pai sempre trabalhou muito, 3 filhos para criar,
aluguel, família, etc. Minha mãe hoje percebo que era frustrada por ter a
obrigação de ficar em casa cuidando da gente. Sua criação tbm [sic] a afetou,
91
mãe morreu cedo, foi trabalhar em casa de família muito nova, então nunca
fez o que queria e quando teve 3 filhos, esses os atrapalharam. Sempre
escutei que devia ter feito aborto, seria melhor (Participante 198).
Meu pai me bateu porque eu não quis comer tudo. Eu tinha 3 anos. Desde
então não como os alimentos que estava comendo nesse dia. Isso restringiu
muito minha alimentação. Então minha mãe, na tentativa de me fazer comer,
me recompensava com comidas que eu aceitava. Passei a ver a comida
como válvula de escape. Também quando minha irmã nasceu e eu tinha
ciúmes (Participante 598).
Lembro que apanhava por não limpar o prato quando era pequena e comecei
a conseguir comer cada vez mais (Participante 634).
Ainda não trabalhei isso com a minha psiquiatra, mas acredito que minha
relação com a minha família tenha muito a ver com isso, tanto nos momentos
92
onde eles são mais abusivos (como para me proteger deles, mesmo que isso
não faça sentido), quando eles são amorosos demais e forçam uma relação
que nunca existiu (como para me provar que me amo) e quando eles me
abandonam completamente (como para me dar o amor que preciso)
(Participante 192).
Talvez o abandono. Minha mãe foi embora de casa quando eu tinha 10 anos.
Meu pai foi embora quando eu tinha 16, que foi quando fui colocada para a
rua. Me mudei de Santo André para Santos e a comida era minha única forma
de prazer em um mundo que não tinha espaço para mim. Aí vieram
relacionamentos abusivos, baixa autoestima, empregos ruins e o combo todo
da falta de sorte. Eu sou uma pessoa que não merece amor e consideração
apesar de todos os esforços em tentar ser alguém legal. A comida é uma
forma de prazer e aconchego. Inexplicável a relação (Participante 570).
Desde pequena eu comia mais que outras crianças, minha mãe sempre me
chama "carinhosamente" de gorda (Participante 275).
Após separação dos meus pais, onde minha mãe tinha atitudes negligentes,
como me deixar sozinha e sem comida saudável, comecei a descontar tudo
em comer sem estar com fome. Também sentia muita ansiedade
(Participante 368).
Por fim, a vivência de um trauma na infância e/ou vida adulta, associada por
Morgan e Claudiano (2005) a uma possível precipitação da compulsão alimentar,
foram relatadas pelas participantes. Algumas das experiências traumáticas na infância
e/ou vida adulta descritas foram: assédio/abuso sexual; agressão/violência física ou
doméstica e abuso emocional. Apesar de não ter sido observado uma correlação
estatística significativa entre abuso sexual na infância e compulsão alimentar, uma
parcela reduzida das participantes relataram a ocorrência deste abuso na infância e
na vida adulta.
94
Em relação à pergunta: “Você acredita que todas as vezes que come está com
fome?”, 97,2% (n=587) das participantes responderam que não, enquanto 2,8%
(n=17) disseram que sim. Diferentes fatores, para além da fome, motivaram o comer.
Quando estou entediada como para me animar. Quando estou triste para
recompensar, como se fosse um conforto, um abraço amigo, uma forma de
prazer. Quando estou feliz eu como, pois penso que o momento feliz merece
ficar ainda melhor (Participante 570). [Categorias: Tédio/Tempo ocioso;
Tristeza; Felicidade; Busca por emoções/sensações positiva]
O trecho “ao final, sinto meu vazio expandindo” do relato 701 ilustra que,
segundo Hollis (1998), não se trata de uma estratégia de regulação emocional eficaz.
Ademais, para além de ser uma busca por emoções/sensações positivas
(10,6%), funcionando como um mecanismo de compensação e autorregulação que
proporciona estados de excitabilidade e euforia a fim de apaziguar os estados
melancólicos e depressivos, também observou-se o comer na presença da emoção
de felicidade (11,9%), ilustrado no relato abaixo, e como uma estratégia de
enfrentamento para lidar com problemas e frustrações (9,9%), aspecto que será
abordado posteriormente.
Pode-se pensar que a finalidade do comer não seria apenas a busca por
emoções/sensações positivas (10,6%) para regulação emocional ou apaziguamento
de afetos negativos, mas também um potencializador de afetos positivos (11,9%),
visto que o indivíduo come na presença da emoção felicidade. Também pode-se
refletir que, embora as categorias “busca por emoções/sensações positivas” (10,6%,
n=62) e “forma de lidar com situações de frustração” (9,9%; n=58) possam parecer
uma porcentagem reduzida da amostra, compreender o uso que se faz do comer exige
um certo grau de elaboração das participantes.
Ademais, a comida aparece como forma de autogratificação e de recompensa
por algum desconforto vivido. Entretanto, é interessante destacar que na categoria
“Outros”, 0,8% das participantes (n=5) indicaram que o comer seria uma forma de
autopunição, ilustrado no relato 392. A dualidade contida no significado da comida e
do comer para estes indivíduos também foi observada por Woodman (1995).
Por fim, foram relatados aspectos que estariam mais ligados a estados
fisiológicos: cansaço (n=12); sono/insônia (n=7); falta da sensação de mastigação
(n=6); TPM (n=5) e dor (4).
Não muito bem. Sou muito insegura e tendo a achar que sou a culpada por
muitas das coisas que dão errado em minha vida, ou por não me encaixar em
grupos/não agradar pessoas. É difícil lidar com frustrações sem jogar toda a
98
Sim, estou acima do peso, afeta minha saúde física e minha autoestima
(Participante 155). [Categorias: Ganho de peso; Saúde física; Baixa
autoestima]
Ganhei muito peso ao longo dos anos, sem me dar conta de quão grave é
meu problema, e nesse ganho de peso entra todo um conjunto, qualidade de
vida prejudicada, auto estima, episódios depressivos e já até cheguei a perder
emprego por conta do peso, as vezes gasto dinheiro de pagar contas porque
na hora só penso em comer (Participante 178). [Categorias: Ganho de peso;
Saúde física; Baixa autoestima; Aspecto social/profissional/amoroso; Saúde
mental; Aspecto financeiro]
Quando como me sinto suja e tenho vergonha de sair de casa pq [sic] tenho
medo do que os outros vão pensar sobre meu peso (Participante 151).
[Categorias: Ganho de peso; Aspecto social/profissional/amoroso; Vergonha;
Julgamento; Baixa autoestima]
O descontrole alimentar, ilustrado pelos relatos 131 e 729, foi descrito por 13%
das participantes. A sensação de descontrole é, segundo American Psychiatric
Association (2014), um aspecto central no diagnóstico do TCA. Esta foi caracterizada
pelas participantes como um desejo, impulso ou necessidade desenfreada,
incontrolável e irracional pelo comer. Necessidade, considerada análoga ao uso de
substância por algumas participantes, que só pode ser cessada com o consumo e o
fim do alimento. É importante ressaltar que embora todas as participantes tenham
compulsão alimentar, apenas 13% relataram a sensação de descontrole alimentar.
Gasto meu dinheiro com besteira, como muitas coisas que não são
saudáveis, engordo bastante e minha autoestima fica um lixo. Minha vida
inteira é tentar emagrecer. As vezes consigo, mas depois engordo de novo.
Me sinto mal também por parecer que eu não consigo controlar minhas
próprias ações (Participante 517). [Categorias: Ganho de peso; Baixa
autoestima; Aspecto financeiro; Insatisfação corporal; Pensamento fixo na
comida; Saúde física]
101
Dos 491 participantes que responderam que a comida tem um papel central em
suas vidas, como pode-se observar no quadro 11, 41,8% indicaram que apresentaram
pensamentos fixos na comida.
102
A comida é meu lugar seguro, sempre q como algo que me satisfaz de fato,
é como se alimentasse minha alma. Me sinto bem no resto do dia. E muitas
vezes, quando não me sinto bem, precisa comer esse "algo" diferente e que
me satisfaz. Às vezes isso é difícil de acontecer, daí saio comendo tudo, em
busca de algo pra preencher esse vazio (Participante 172). [Categorias:
Comer proporciona emoções positivas; Descontrole alimentar]
Além disso, como exemplificado na fala 271, segundo Hollis (1998) o episódio
de compulsão alimentar pode se tratar de um mecanismo que previne uma angústia
maior, funcionado como uma proteção.
Por fim, ao mesmo tempo que a comida despertaria emoções positivas (33%)
e seria uma forma de lidar com problemas (20%), ela também é desencadeadora de
diversas emoções negativas, tais como: vergonha, frustração, culpa, arrependimento,
tristeza, raiva, decepção, desânimo, vulnerabilidade e ódio voltado para si e/ou para
comida. Usualmente estas emoções foram relatadas após as participantes terem
sinalizado o consumo da comida. Tal dualidade da comida pode ser ilustrada nos
relatos 652 e 340:
Por causa dos meus problemas de autoestima sempre lidei com a comida
como minha inimiga, ela é a fonte e a resolução de todos os meus problemas
(Participante 340). [Categorias: Forma de lidar com problemas/emoções;
Comer proporciona emoções positivas; Comer desencadeia emoções
negativas]
Não sei explicar, apenas faz com que eu me sinta melhor enquanto como,
mas depois faz me sentir a pior pessoa do mundo (Participante 538).
[Categorias: Comer proporciona emoções positivas; Comer desencadeia
emoções negativas]
Quanto à pergunta: “Você se sente insatisfeita com seu corpo?”, 3,1% (n=18)
das participantes responderam que não se sentem insatisfeitas com seu corpo e
96,9% (n=585) relataram que sim, indicando o alto índice de insatisfação corporal
nesta população. Ao serem questionadas: “De que forma esta insatisfação corporal
afeta os episódios de compulsão alimentar?”, pode-se observar no quadro 12 que
58,6% das participantes indicaram que a insatisfação corporal aumenta sua
compulsão alimentar e 33,2% desencadeia emoções negativas. As emoções
negativas, por sua vez, também são fatores antecedentes e subsequentes ao episódio
de compulsão alimentar.
105
Porcentagem - apenas
De que modo a insatisfação com o
pessoas que afirmaram estar
corpo afeta os episódios de Frequência
insatisfeitas com o corpo
compulsão alimentar
(n=585)
Aumento da compulsão 343 58,6%
Emoções negativas 194 33,2%
Emoções negativas pós-compulsão 109 18,6%
Fracasso 109 18,6%
Emagrecer/dieta 90 15,4%
Emoções positivas pós-compulsão 38 6,5%
Outros 33 5,6%
Fonte: Elaborado pela própria autora, 2020.
Fico triste por estar com um corpo doente e deformado por conta da
alimentação. Fico muito triste e como ainda mais (Participante 267).
[Categorias: Aumento da compulsão; Emoções negativas]
Afeta muito pois já estou com um peso excessivo e quando percebo que
estou comendo muito eu penso que sou uma porca gorda que merece tudo
que está passando e ai eu como mais e mais (Participante 75). [Categorias:
Aumento da compulsão; Emoções negativas pós-compulsão]
Começo uma dieta, logo, dou uma falhada e como o dobro por não conseguir
me controlar (Participante 55). [Categorias: Aumento da compulsão;
Emagrecer/dieta; Fracasso]
Por fim, foi relatado em menor proporção os afetos positivos que sucederam a
compulsão alimentar (6,5%), os quais eram utilizados como forma de consolo ou
compensação pelo corpo supostamente fracassado.
autolesão foram partes específicas do corpo, como barriga e perna ou partes que
consideravam gordas.
Já tentei suicídio 5 vezes entre meus 8-14 anos, em momentos de muita raiva
por ter comido unho e arranho minha barriga, como se tivesse um monstro
ali, tento tira-lo (Participante 36). [Categorias: Autolesão; Ideação/Tentativa
de suicídio]
Vontade de morrer por não ter persistência para perder peso (Participante
110). [Categorias: Ideação/Tentativa de suicídio]
direciona seus impulsos agressivos contra si mesmo. Para o autor, uma parte tirânica
e crítica do ego deve morrer simbolicamente para que haja possibilidade de mudança
e renascimento psíquico.
A categoria ideação/tentativa de suicídio (variável categórica) foi
correlacionada de maneira significativa e positiva com o trauma na infância global e
abuso emocional (QUESI), como pode ser observado no quadro 15. Sendo assim,
quando maior a gravidade do trauma global na infância e abuso emocional
autorrelatado maior o nível de ideação/tentativa de suicídio. O ECAP não apresentou
uma correlação significativa com esta categoria e, por isso, não consta no quadro 15.
compulsão alimentar, maior o prejuízo na vida sexual (variável categórica). Não houve
correlação estatística desta pergunta com o QUESI.
Não consigo ter relações sexuais sem sentir nojo e vergonha do meu corpo
(Participante 55). [Categorias: Baixa autoestima; Insatisfação
corporal/aparência]
111
Já fiquei um ano sem transar com meu namorado pois tinha vergonha do meu
corpo (Participante 170). [Categorias: Insatisfação corporal/aparência;
Outros]
Evito ver meu parceiro quando estou me sentindo gorda, não transo com luz
acesa e temos brigas frequentes pela minha falta de autoestima
(Participante 336). [Categorias: Insatisfação corporal/aparência; Baixa
autoestima; Outros]
Bom, eu nunca tive um orgasmo com meu parceiro, não por que ele não se
esforça e sim pq [sic] eu não consigo relaxar, eu fico pensando se ta [sic]
chato pra ele, fico pensando se ele se sente atraído pelo jeito q eu sou mesmo
etc. Talvez seja por isso q eu não consigo relaxar e me desligar de tudo na
hora (Participante 518). [Categorias: Disfunções sexuais; Baixa autoestima]
Das 392 participantes que relataram que a compulsão alimentar atrapalha sua
vida e relações sociais, 44,4% (n=174), como pode ser observado no quadro 19,
relataram evitar interações e situações sociais.
113
Muitas e muitas vezes não tenho vontade de sair, muito menos me arrumar,
sinto que todas as minhas amigas são mais magras e mais capazes do que
eu (Participante 39). [Categorias: Evitação social; Roupas; Baixa
autoestima]
Nunca sinto que sou boa o suficiente pra [sic] sair e ter uma vida porque acho
meu corpo feio (Participante 335). [Categorias: Baixa autoestima; Aparência
física]
Eu acho que sou mais gorda que meus colegas por isso sinto raiva deles
(Participante 374). [Categorias: Aparência física; Outros]
A raiva, para Hollis (1998) e Gilbert (1998), seria uma forma de encobrir a
experiência emocional de vergonha, frustração e solidão. Além da experiência objetiva
de avaliação social negativa, algumas participantes relataram ter uma sensação de
estarem sendo observadas ou ridicularizadas, exemplificadas na fala 216 e 592:
Me sinto mal em algumas festas que vou, pois a maioria das mulheres são
magras e altas e sinto como se as pessoas estivessem me observando
(Participante 592). [Categorias: Aparência física; Avaliação social negativa]
Não gosto de me arrumar porque nada fica bom e não gosto que as pessoas
me vejam assim. Quando me maqueio [sic] me sinto uma palhaça
(Participante 441). [Categorias: Roupas; Vergonha; Baixa autoestima]
Watson, Clark e Tellegen (1988) e validada para população brasileira por Carvalho et
al. (2013).
p-
Antes (n=604) Depois (n=604)
Afetos positivos valor*
Não Sim Não Sim
Alegria 64,4% 35,6% 85,4% 14,6% <0,001
Animação 76,2% 23,8% 93,5% 6,5% <0,001
Calma 88,1% 11,9% 78,3% 21,7% <0,001
Confiança 80,8% 19,2% 93,4% 6,6% <0,001
Coragem 77,3% 22,7% 93,7% 6,3% <0,001
Disposição 60,3% 39,7% 93,4% 6,6% <0,001
Empolgação 62,4% 37,6% 93,0% 7,0% <0,001
Entusiasmo 76,5% 23,5% 95,4% 4,6% <0,001
Força 75,2% 24,8% 93,5% 6,5% <0,001
Inspiração 78,6% 21,4% 94,0% 6,0% <0,001
Orgulho 77,8% 22,2% 96,0% 4,0% <0,001
Cheio de energia 77,6% 22,4% 93,9% 6,1% <0,001
Relaxamento 88,6% 11,4% 62,7% 37,3% <0,001
*: Teste de McNemar
Fonte: Elaborado pela própria autora, 2020.
7.3.11 Autoestima
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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APÊNDICE
Olá pessoal, sou psicóloga formada pela PUC-SP e com capacitação em transtornos
alimentares pelo PROATA-UNIFESP. Estou realizando uma pesquisa de mestrado
voltada para o público que possui questões alimentares.
Sua contribuição é de extrema importância, pois poderá auxiliar aqueles que sofrem
com compulsão alimentar, além de ajudar a melhorar a capacitação de profissionais
na área.
Trata-se de uma pesquisa totalmente anônima, voluntária e para maiores de 18 anos.
Os questionários estão divididos em três blocos de perguntas e a duração média para
respondê-las é vinte (20) minutos.
Muito Obrigada, sua participação vai fazer a diferença!
Segue abaixo o link para responder as perguntas da pesquisa:
https://pt.surveymonkey.com/r/pesquisacompulsao
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ANEXOS
23) Tentaram me forçar a fazer algo sexual ou assistir coisas sobre sexo.