A Obrigação Pelo Sacrifício

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A obrigação pelo sacrifício

Verifica-se a responsabilidade pelo sacrifício sempre que a lei preveja o direito à indemnização a
quem viu os seus direitos sacrificados em resul- tado de uma actuação lícita destinada a fazer
prevalecer um direito ou um interesse de valor superiorê+'.
O caso mais importante em que a lei prevê uma responsabilidade pelo sacrifício ocorre no
estado de necessidade (art. 339.o, n.o 2), em que, con- forme se referiu, é justificada a conduta
do agente que sacrifica bens patri- moniais alheios para evitar um perigo actual de um dano
manifestamente superior, quer do agente quer de terceiro. Nesse caso, a lei impõe impera-
tivamente que o agente deva indemnizar o prejuízo causado se o dano for provocado por sua
culpa exclusiva. Nos outros casos, admite-se, mas ape- nas como possibilidade, que o tribunal
conceda uma indemnização equita- tiva, condenando nela não só o agente como todos os que
tiraram proveito do acto ou contribuíram para o estado de necessidade

Uma outra situação de responsabilidade pelo sacrifício ocorre ainda no caso previsto no art.
81.o, n.o 2, em que se admite a revogação de quais- quer limitações voluntárias aos direitos de
personalidade em ordem a per- mitir ao agente, em qualquer momento, o livre exercício da sua
personali- dade, com obrigação, no entanto, de indemnizar as legítimas expectativas da outra
parte. Naturalmente que o direito geral de personalidade tem valor superior ao de um simples
direito de crédito, o que torna lícito o sacrifício deste último, mas esse sacrifício deve ser
compensado com uma indemni- zação, sob pena de se pôr em causa a eficácia vinculativa
desses negócios.
São ainda casos de responsabilidade pelo sacrifício as situações de ingerência lícita em prédio
alheio para captura de enxame de abelhas (art. 1322.o), apanha de frutos (art. 1367.o),
reparações ou construções (art., 1349.o), e, bem assim os casos de constituição de servidões
legais (arts.
1554.o, 1559.o, 1560.o, n.o 3 e 1561.o, n.o 1) e a revogação do mandato (arts. 1170.o, n.o 1, e
1172.o).

A obrigação de indemnização
5.1. Generalidades
A obrigação de indemnização é tratada nos arts. 562.o e ss. como uma modalidade das
obrigações. Efectivamente, ela constitui uma categoria autónoma de obrigações em virtude de
possuir uma fonte específica (a im- putação de um dano a outrem), ter um conteúdo próprio
(prestação de equivalente ao dano sofrido) e um particular interesse do credor (a elimi- nação
do dano que sofreu).

Este especial conteúdo da obrigação de indemnização vai implicar certas especialidades


processuais na sua reclamação. Assim, em primeiro lugar, a exigência da indemnização não
implica uma determinação exacta do montante dos danos antes da propositura da acção,
podendo ela ser pro- posta sem essa indicação e, inclusivamente, no decurso dela, ser exigido
um aumento da indemnização se o processo vier a revelar danos superio- res aos inicialmente
previstos (art. 569.o). Mas também o próprio tribunal não necessita de determinar o valor exacto
dos danos, para atribuir a indemnização podendo esta ser estabelecida equitativamente, dentros
dos limites que se tiverem como provados (art. 566.o, n.o 3). Caso não seja possível determinar
logo o montante dos danos, poderá a fixação da in- demnização ser remetida para execução de
sentença (cfr. art. 661.o, n.o 2 C.P.C.), admitindo-se ainda nesse caso que o tribunal condene
logo o devedor, dentro do quantitativo que considere já provado.

5.2. Formas de indemnização


O regime geral da obrigação de indemnização é referido no art. 562.o que prescreve que "quem
estiver obrigado a reparar um dano é obrigado a reconstituir a situação que existiria se não se
tivesse verificado o evento que obriga à reparação", acrescentando ainda o art. 566.o, n.o 1, que
"a indemnização é fixada em dinheiro sempre que a reconstituição natural não seja possível, não
repare integralmente os danos ou seja excessiva- mente onerosa para o devedor

Da articulação destas duas normas resulta uma clara primazia da reconstituição in natura sobre
a indemnização em dinheiro, o que quer dizer que é primordialmente através da reparação do
objecto destruído ou da entrega de outro idêntico que se estabelece a obrigação de
indemnização. Como atrás se explicou, tal corresponde à defesa, no nosso direito, de uma
concepção real do dano.
Haverá, porém, fixação da indemnização em dinheiro no caso de a reconstituição natural não ser
possível. Efectivamente, se o objecto des- truído é de impossível reparação e se, por ser de
natureza infungível, não se admitir a sua substituição por outro, a solução correcta é a atribuição
da indemnização em dinheiro.
Também haverá fixação da indemnização em dinheiro sempre que a reconstituição natural não
repare integralmente os danos.
Efectivamente, nesse caso, através da reconstituição natural não será obtida a satisfação do
interesse do credor, pelo que para se obter essa satisfação se terá que recorrer à indemnização
em dinheiro. Parece, no entanto, que a indemni- zação em dinheiro deverá ser estabelecida em
complemento à reconstitui- ção natural para eliminar os danos não abrangidos por esta e não em
sua substituição.
Finalmente, ocorre a fixação da indemnização em dinheiro sempre que a reconstituição natural
seja excessivamente onerosa para o devedor. Esta previsão deve ser interpretada restritivamente
sob pena de se pôr em causa o direito do lesado a dispor do seu próprio patrimónios.

A forma da determinação da indemnização em dinheiro é estabele- cida no art. 566.o, n.o 2, que
refere que "sem prejuízo do estabelecido nou- tras disposições a indemnização em dinheiro tem
como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder
ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos". Trata-se da
denominada teoria da diferença, nos termos da qual se faz uma avaliação do dano em sentido
patrimonial, mediante a apreciação concreta das alterações verificadas no património do
Iesadoê>". Para apreciação des- sas alterações efectua-se uma comparação entre a situação
patrimonial actual efectiva do lesado e sua situação patrimonial actual hipotética se não
existissem danos.
A teoria da diferença tem, porém, uma aplicação limitada, na medida em que o cálculo
patrimonial que estabelece não é possível a não ser estando em causa danos patrimoniais
presentes.

Um outro caso em que a teoria da diferença falha diz respeito à situa- ção dos danos de
natureza continuada. Assim, por exemplo, se alguém, em consequência de uma lesão, vê
reduzida a sua capacidade para prestar tra- balho ou para auferir outro tipo de rendimentos, é
manifesto que o dano não fica eliminado com a atribuição de um valor para cobrir a diferença
entre a sua actual situação patrimonial real e a sua situação patrimonial hipotética nesse
momento.

Titularidade do direito de indemnização


Haverá ainda que resolver a questão da titularidade do direito de indemnização. Genericamente
pode dizer-se que o titular do direito de indemnização é apenas o lesado, ou seja, o titular dos
direitos ou interes- ses que a lei visava proteger. Quanto a terceiros, mesmo que estes tenham
sofrido reflexamente danos em consequência da actuação do lesante não serão abrangidos na
indemnização. Assim, por exemplo, alguém que con luzindoo seu veículo atropele um jogador de
futebol poderá ter que indemnizar o jogador por todos os prejuízos e lucros cessantes
resultantes das lesões sofridas, mas o próprio clube não terá direito a indemnização por se ver
privado do jogador durante certo tempo.

Já se examinou a questão do dano-morte e dos danos não patrimoniais em consequência da


morte da vítima, a que se referem os arts. 496.o, n.os 2 e 3, caso em que, conforme se salientou,
outras pessoas, além da vítima, podem considerar-se titulares do direito de indemnização por
danos não patrimoniais próprios.
Há, porém, ainda em caso de morte da vítima outros titulares do direito da indemnização.
Efectivamente, o art. 495 .o, n.o 1, refere que "no caso de lesão de que proveio a morte, é o
responsável obrigado a indemnizar as despesas feitas para salvar o lesado e todas as demais,
sem exceptuar as do funeral". Verifica-se, assim, que, conduzindo a morte da vítima à realiza-
ção de despesas, o causador dessa morte é obrigado a indemnizá-las.
Para além disso, quer em caso de morte, quer em caso de lesão cor- poral, a lei prevê que
tenham direito a indemnização "aqueles que socor- reram o lesado, bem como os
estabelecimentos hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído
para o tratamento ou assistência da vítima" (art. 495.o, n.o 2). Efectivamente, estas entidades
têm naturalmente direito à remuneração.

5.4. Prescrição da obrigação de indemnização


A prescrição da obrigação de indemnização encontra-se prevista no art. 498.o, sendo esse
regime genericamente aplicável a toda a responsabi- lidade civil, com excepção da
responsabilidade obrigacional, sujeita ao mesmo regime de prescrição da obrigação incumprida.
A prescrição da obrigação da indemnização depende da ultrapassa- gem de um de dois prazos
que a lei estabelece em alternativa: em primeiro lugar, o prazo de prescrição ordinária a contar
do facto danoso, que como se sabe é de vinte anos (art. 309.o); em segundo lugar, um prazo de
três anos a contar do momento em que o lesado tem conhecimento do direito que lhe compete -
ou seja, sabe que está lesado - mesmo que desconheça a pessoa do responsável ou a extensão
integral dos danos. Se o lesado dei- xar passar um destes dois prazos sem exigir a indemnização
(cfr. art. 323.0, n.o 1) o lesante poderá opor-lhe eficazmente a prescrição do seu direito (cfr. art.
304.o, n.o 1).
No entanto, se se tratar de um facto ilícito que constitua crime sujeito a um prazo de prescrição
mais longo, passa a ser esse prazo o aplicável, pelo que, enquanto for possível a instauração do
procedimento criminal, é também possível a exigência da indemnização correspondente (art.
498.o, n.o 3).
Ocorrendo a pluralidade de responsáveis pelo dano, em que con- forme se sabe o regime
aplicável é o da solidariedade, a lei estabelece que prescreve igualmente no prazo de três anos
após o cumprimento o direito de regresso entre os responsáveis (art. 498 .o, n.o 2).
A prescrição do direito de indemnização não afectará, porém, outros direitos que o lesado tenha
contra o lesante em resultado da sua conduta, designadamente a acção de reivindicação e a
acção de restituição por enri- quecimento sem causa (art. 498.o, n.o 3).

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