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em tempos de crise
RESUMO
ABSTRACT
Nos últimos anos, sobretudo, com a crise acelerada pela Covid-19, o capital reitera
medidas de ajuste neoliberal que já vinham em processo enquanto saída da crise financeira
mundial, deflagrada em 2008. No Brasil, diante da redução drástica de postos formais de
trabalho, ganham força as estratégias de incentivo ao empreendedorismo como alternativa
ao desemprego. Seduzidos pela ideia de ser “dono do seu próprio negócio”, muitos
trabalhadores, em escala individual, passam a redefinir a sua personalidade jurídica e
registrarem uma empresa em seu nome, assumindo a responsabilidade com encargos
sociais e custos relacionados a compra de mercadorias e meios de trabalho.
A nossa argumentação sugere que essa alternativa tem demonstrado contradições:
na medida em que contribui para o ocultamento dos índices de desemprego1 realçando a
preocupação do Estado com os trabalhadores em atividades informais, tem potencializado
novas formas de precarização do trabalho e incorporação da mais-valia ao processo
produtivo, enquanto mecanismo de contra tendência à queda da taxa de lucro.
Essas atividades situam-se, predominantemente, na esfera da circulação, lócus da
venda de serviços e mercadorias por pequenas e microempresas e microempreendedores
individuais, aparentemente, descoladas da esfera produtiva do capital e, portanto, “à
margem” de suas determinações macrossociais. Em vista disso, supomos que a aceleração
da crise contemporânea e o seu desdobramento em diversos níveis da vida social,
representa a capacidade de reprodução ampliada do capital.
Nesse contexto de crise, as políticas voltadas ao trabalho e a renda são recolocadas,
notadamente, no epicentro do debate das agendas governamentais, sob a orientação dos
organismos internacionais e com forte apelo ideológico do empreendedorismo. De acordo
com o estudo da CEPAL e da OIT2, destacam-se como recomendação imediata à recessão
a) o apoio dos serviços de proteção social básica e b) a proteção das pequenas e médias
empresas e dos trabalhadores da economia informal3 através de incentivos financeiros.
Seguindo a recomendação, o governo brasileiro regulamentou o Programa Nacional
de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (PRONAMPE), sancionado
1
Na nossa interpretação, tornar-se MEI significa sair das estatísticas oficiais de emprego informal e desemprego
De acordo com a PNAD, "a taxa de informalidade – soma dos trabalhadores sem carteira, trabalhadores
domésticos sem carteira, empregador sem CNPJ, conta própria sem CNPJ e trabalhador familiar auxiliar".
Disponível:https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/26913-
desemprego-cai-em-16-estados-em-2019-mas-20-tem-informalidade-recorde Acesso 7/9/2020.
2
Situação trabalhista na América Latina e no Caribe maio de 2020 Número 22: Trabalho em tempos de
pandemia: desafios contra a doença de coronavírus (COVID-19). De acordo com as estimativas da OIT, o
trabalho informal é a fonte de renda para muitos lares na América Latina e no Caribe, onde a taxa média de
informalidade é de aproximadamente 54%. Disponível: <https://www.cepal.org/es/publicaciones/45557-
coyuntura-laboral-america-latina-caribe-trabajo-tiempos-pandemia-desafios frente > Acesso em 16 jun 2020.
3
O termo se refere a setorizalização da economia – formal e informal – adotada, originalmente, nas formulações
expostas no Relatório do Quênia (OIT, 1972) e nos trabalhos do Programa de Emprego para a América Latina e
o Caribe (PREALC), que se revela presente até hoje em seus estudos.
pela Lei nº 13.999/2020, com o objetivo de desenvolver e fortalecer os pequenos negócios.
O programa prevê investimentos de 15,9 bilhões e uma linha de crédito até o limite de 30%
da receita bruta obtida em 2019, com a participação de diversos bancos públicos. O público
alvo a ser atingido pelo programa são as pequenas e microempresas com faturamento de
R$ 360 mil a R$ 4,8 milhões por ano, não contemplando, portanto, os Microempreendedores
Individuais (MEI), cujo faturamento é expressivamente menor4.
Importa destacar que esse cenário de expansão do empreendedorismo já havia sido
verificado no Brasil desde a década de 1990, com a intensificação da reestruturação
produtiva no país, inspirada nos receituários políticos e ideológicos definidos no Consenso
de Washington5, que reconfigurou os setores produtivos conforme a dominância econômica,
político-ideológica e social do capital portador de juros, como veremos na seção seguinte.
“De repente, a relação Estado-capital disseminava a grande descoberta: o que fora força de
trabalho podia e devia, agora, tornar-se empresa” (TAVARES, 2018, p. 112). São dadas as
condições legais necessárias às experiências de trabalho por conta própria.
Buscando compreender suas bases histórico-ontológicas, partimos do suposto do
empreendedorismo como tendência ideológica da sociedade burguesa em sua fase de
expansão monopólica, formulada em meados do século XX pelo liberal austríaco Joseph A.
Schumpeter (1961) e, buscando estabelecer um fio condutor na direção do trato crítico do
empreendedorismo na contemporaneidade, perguntamos ao longo das discussões tratadas
neste artigo, quais as bases materiais que particularizam o empreendedorismo no
capitalismo contemporâneo? poderíamos considerá-lo como ideologia da crise fundada pelo
pensamento liberal? E, neste sentido, também estaria cumprindo função à reprodução do
capital?
Diante do cenário de crise, em que o capital necessita cada vez mais de respostas
que não só garantam a recuperação de suas taxas de lucro, mas que possa estabelecer um
consenso entre as classes, supomos que a reedição do empreendedorismo na
contemporaneidade reforça o projeto de dominação burguesa, buscando legitimar uma
forma de trabalho, hegemonicamente, descolada da totalidade social (HARVEY, 1996;
ANTUNES, 2018; CANTALICE, 2013; SOUZA, 2016, TONET, 2016).
Longe da pretensão de esgotar a complexidade que contempla tais questões,
pretendemos, especificamente, resgatar contribuições teóricas no debate sobre
empreendedorismo no Serviço Social, a partir das reflexões suscitadas, algumas delas que
4
Até R$60 mil, podendo contratar até um funcionário, são os chamados trabalhadores por conta própria,
fortemente atingidos pela crise atual, de acordo com a Lei Complementar nº 128/2008.
5
O Consenso de Washington foi um conjunto de medidas formuladas em novembro de 1989 por economistas de
instituições financeiras situadas em Washington como o FMI e o Banco Mundial e que se tornaram oficiais
quando passaram ser "receitadas" para promover o "ajustamento macroeconômico" dos países em
desenvolvimento.
se encontram em aberto6. O trabalho tem como fonte de pesquisa o levantamento de dados
estatísticos, oriundos de pesquisas realizadas anteriormente e revisão bibliográfica de
autores clássicos e contemporâneos, no sentido de provocar reflexões acerca das
peculiaridades do empreendedorismo na contemporaneidade.
Dentre outros temas discutidos em seu livro, destacamos a importância dada por
Schumpeter ao acesso a crédito como meio de fomento ao empreendedorismo. “De onde
vêm as somas necessárias à aquisição dos meios de produção necessários para as
combinações novas, se o indivíduo em questão por acaso não as tiver? (SCHUMPETER,
1934, p. 83), indagou o economista em uma de suas análises, se referindo a importância do
crédito como referência para o desenvolvimento do “espírito empreendedor dos homens de
negócios” da época. Essa realidade repõe na ordem do dia a clássica do laissez-faire e a
promessa da suposta liberdade buscada no mercado, formulada por Adam Smith em “A
riqueza das nações” (1776).
Ainda sobre as análises do mesmo autor, no livro Capitalismo, socialismo e
democracia (1961), Schumpeter contraria as formulações neoclássicas do desenvolvimento
econômico como evolução natural e harmoniosa, problematizando o complexo de
contradições expressas no desenvolvimento, do qual denomina Destruição Criadora.
Nesse último livro, ao analisar o contexto da Grande Depressão de 1929, enquanto
os neoclássicos afirmavam que o capitalismo havia atingido o seu limite de desenvolvimento
e, portanto, levaria ao esgotamento. O economista afirmava o contrário: seria a
oportunidade dos empresários investirem em novos negócios, inovando as suas forças
produtivas e os hábitos de consumo. Tais investidas combinadas a divulgação em massa
dos novos produtos eliminaria a concorrência e os tonariam acessíveis a todos. Portanto,
na concepção shumpeteriana, o processo de desenvolvimento econômico associado ao
acesso a bens de consumo levaria a redução das desigualdades de renda e, supostamente,
ao bem-estar de todos e fim do capitalismo. Em consequência disso, tem-se
a abertura de novos mercados, estrangeiros e domésticos, e a organização da
produção, da oficina do artesão a firmas, como a U.S. Steel, servem de exemplo do
mesmo processo de mutação industrial, que revoluciona incessantemente a
estrutura econômica a partir de dentro, destruindo incessantemente o antigo e
criando elementos novos (SCHUMPETER, 1961, p. 110).
A reflexão das autoras nos remete a algumas teses pós-modernas sobre trabalho. O
que se convencionou chamar de pós-modernidade9, que ganha impulso com a crise de
superacumulação da década de 1970, e segue na passagem do século XX para o século
XXI, trata-se, na realidade, de novas tendências funcionais ao projeto de dominação
9
Indicamos: LYOTARD, Jean François. A Condição Pós-moderna. Tempos Pós- modernos e CANTALICE,
Luciana B. de O. As incidências pós-modernas na produção do conhecimento em Serviço Social. (Tese de
Doutorado). Rio de Janeiro: PPGSS/UERJ.
burguesa, em conformidade com a chamada acumulação flexível10. Ou, nos escritos de
Harvey (1996), uma condição histórico-geográfica, marcada por uma falsa ilusão de uma
sociedade de produtores independentes, uma sociedade sem vendedores de força de
trabalho, posto que o contrato de compra e venda da força de trabalho vai se
metamorfoseando, reduzindo tais fenômenos a processo isolados da totalidade social.
É inegável que essa tendência seja expressão dos limites cada vez maiores de
acesso ao trabalho formal e, consequentemente, do desemprego e pauperismo da classe
trabalhadora. Ou, dito a partir da própria teoria marxiana, trata-se do “material humano a
serviço das necessidades variáveis de expansão do capital e sempre pronto para ser
10
Utilizando-se das teses de Piore e Sabel (1984), Harvey (1996, p.140) afirma: a acumulação flexível, como vou
chamá-la, é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apóia na flexibilidade dos
processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo
surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros,
novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e
organizacional.
explorado, independentemente dos limites do verdadeiro incremento da população” (MARX,
2010, p. 735).
No capítulo 23 do livro I de O Capital, ao tratar sobre a lei geral da acumulação
capitalista, Marx demonstra que o crescimento da força de trabalho sobrante é parte
constitutiva do modo de produção capitalista e condição necessária à acumulação,
fenômeno também denominado pelo filósofo de superpopulação relativa.
No contexto de crise contemporânea, a coexistência de múltiplas faces da
informalidade disponíveis ao capital à níveis de exploração cada vez mais elevados, reitera
a assertiva marxiana. São as ocupações situadas na esfera da circulação e da venda de
serviços e mercadorias, cuja natureza se funda, de modo insubstituível, na produção de
mais valia pelas grandes empresas e setores produtivos. Ou seja, a reprodução do capital
ocorre sem que ele precise, necessariamente, investir em força de trabalho.
Ao criticar as formulações dos economistas clássicos e contrariar o suposto caráter
imanente da lei do valor, Marx demonstra que quanto maior o grau de desenvolvimento do
capital, menor é a necessidade de força de trabalho para atender a um dado nível de
acumulação. Isto quer dizer que:
11
Lembremos das teses dos economistas indianos Amartya Sem no livro Desenvolvimento como liberdade
(2000) e Muhammad Yunus (2008) no livro O banqueiro dos pobres.
12
A Lei Complementar nº 128/2008 que alterou a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa (Lei Complementar nº
123/2006) cria a figura do Microempreendedor Individual. Constituem critérios para o cadastro: o faturamento
limitado a R$ 81.000,00 por ano, a não participação como sócio, administrador ou titular de outra empresa, a
contratação de até no máximo um empregado e que exerça uma das atividades econômicas previstas no Anexo
XI, da Resolução CGSN n. 140, de 2018, o que relaciona todas as atividades permitidas ao MEI. Disponível: <
http://www.portaldoempreendedor.gov.br/legislacao> Acesso 15/04/2021.
Como vimos, o empreendedorismo enquanto ideologia fundada pelo pensamento
liberal tem suas raízes e bases histórico-ontológicas no trabalho. Neste sentido, falar sobre
a função do empreendedorismo no capitalismo contemporâneo implica recorrer ao arsenal
teórico da ontologia do ser social, nas formas de produzir e de se reproduzir da sociedade
capitalista e, não menos importante, na ampliação nas formas geradoras de valor,
produzidas nesse estágio de acumulação sob a hegemonia financeira13.
A partir dos anos 2000, particularmente, no rastro da crise financeira que atingiu uma
das principais economias mundiais14, evidencia-se uma busca inexorável pela valorização do
capital acumulado. Segundo Marques e Nakatani (2009, p. 63), trata-se de uma crise
provocada pela hipertrofia do capital fictício 15. Ou seja, grande parte do capital global se
especializa na apropriação do valor produzido e uma menor parte investe na produção
desse valor. Esta apropriação chega ao ápice quando falta capital para ser apropriado:
caem as taxas de lucro e o capital entra em crise (CARCANHOLO, 2009).
Nas suas lições sobre a lei do valor, Marx (2010) demonstra as formas
multifacetadas do processo de transformação do dinheiro em capital, que passa desde a
produção do excedente econômico, identificado em sua grandeza como mais-valia e
extraídas da produção e circulação de mercadorias, até a forma especifica assumida pelo
capital como portador de juros, definido com suas próprias palavras, como um “[...] capital
vadio, à espera de aplicação” (LIVRO III, Volume V, capítulo XIX). De acordo com
Carcanholo e Nakatani (2015), a remuneração do capital fictício está constituída pelos juros
auferidos e pelos ganhos obtidos pelo capital especulativo parasitário, forma desenvolvida
do capital fictício.
Em tese, a saída da crise seria desvalorizar o capital concentrado, o que implicaria
em maiores investimentos nos setores produtivos e, consequentemente, a geração de novos
postos de trabalho.No entanto, os Estados continuam a adotar medidas neoliberais de
contenção de gastos sociais, enquanto medidas de ajuste necessário à retomada da taxa
média de lucro do capital.
As novas determinações da produção global capitalista traduz a relação estabelecida
entre capital produtivo e o que Marx no capítulo XXI do livro III de O capital denominou
capital portador de juros. Ao examinar o desenvolvimento do sistema de crédito no capítulo
13
Indicamos os livros A mundialização financeira: gênese, custos e riscos (1998) e A finança mundializada:
raízes sociais e políticas, configurações, consequências (2005). Ambos de autoria do economista francês
François Chesnais.
14
A primeira manifestação dessa crise ocorreu na esfera financeira, não por acaso, nos Estados Unidos, país
onde se desenvolveu um maior grau de capital fictício. Para esta compreensão sugerimos a análise de Charles
R. Morris (2008), autor do livro “O crash de 2008: dinheiro fácil, apostas arriscadas e o colapso global do crédito.
São Paulo: Aracati, 2009”.
15
Segundo Chesnais (1998, p. 268): “Na época em que Marx escreveu, essas representações de um capital
público ou privado ainda eram pouco numerosas: limitavam-se aos títulos dos empréstimos tomados pelo Estado
e às ações. Nas páginas que tratam do que ele chama de capital fictício, Marx estudou, com inegável fascínio, a
maneira como as instituições financeiras (entre as quais a Bolsa) são capazes de fazer com que um crédito ou
um título se desdobre para viver muitas vidas (livro III, capítulo XXIX e XXX)”.
XXV do Livro III, Marx (2017) chama a atenção para o fato de que este é uma expressão
desenvolvida da produção capitalista haja vista a sua função à aceleração do
desenvolvimento das forças produtivas e valorização do capital.
Sobre tais circunstâncias, importa destacar que essa nova dinâmica de acumulação,
que modificou a finalidade do processo de valorização do capital por intermédio da
mercadoria dinheiro, só pode existir, teoricamente, destruindo valor de uso. Os leitores desta
tradição teórica sabem que o dinheiro se converte em capital na medida em que se vincula
ao movimento global, sendo, portanto, na forma inicial dinheiro que se gesta o processo
capitalista de produção.
Tais tendências reforçam a hipótese central de Antunes (2018) no livro O privilégio
da servidão, a de que se processa uma nova morfologia de trabalho denominada de novo
proletariado de serviços da era digital. Nesse cenário em que o empreendedorismo aparece
como alternativa à crise16, o trabalho digital tornou-se mediação fundamental. Sem relação
patronal, sem propriedade dos meios de produção, são “empreendedores de si mesmos”,
com jornadas exaustivas e salários rebaixados (pagos por peça), algumas vezes,
transformada em dívida, a exemplo do emblemático serviço dos entregadores. Explica o
autor:
Como o capital não se valoriza sem realizar alguma forma de interação entre
trabalho vivo e trabalho morto, ele procura aumentar a produtividade do trabalho,
intensificando os mecanismos de extração do sobretrabalho, com a expansão do
trabalho morto corporificado no maquinário tecnológicocientífico-informacional.
Nesse movimento, todos os espaços possíveis se tornam potencialmente geradores
de mais-valor (ANTUNES, 2018, p. 39).
16
Pensemos no Vamos Ativar o Empreendedorismo (VAE), criado pela grande mídia em 2020, em meio à
pandemia e financiado por diversas instituições financeiras, como o Itaú e o Bradesco.
17
Termo comumente utilizado pelas instituições de fomento ao empreendedorismo e adotado pelas políticas
sociais. “Uma a análise da evolução das taxas de empreendedorismo no país nos últimos 20 anos mostra que,
em tempos de recessão econômica, é comum que os brasileiros recorram ao empreendedorismo por
necessidade, como alternativa de ocupação e renda. Isso já ocorreu em períodos anteriores (a exemplo do que
foi verificado entre os anos de 2014 e 2016).
Disponível:<https://www.agenciasebrae.com.br/sites/asn/uf/NA/mesmo-com-pandemia-pais-registra-recorde-na-
abertura-de-mei,028f6d7ad1c47710VgnVCM1000004c00210aRCRD> Acesso 24/11/21.
Os dados são incontestáveis. Mesmo em condições de pandemia, o Brasil alcançou
no final de 2020 recorde no número de registros de MEI, com um total de 11,3 milhões de
MEIs ativos, 20% a mais do que no fim de 2019, quando o segmento tinha 9,4 milhões de
registros (Portal do Empreendedor, 2020)18. No entanto, os dados revelam que apesar do
empreendedorismo se constituir como alternativa ao desenvolvimento e da “livre” escolha
dos trabalhadores, as condições objetivas não deixam dúvidas:
Segundo pesquisa divulgada pela Neon, responsável pela plataforma MEI Fácil,
53% destes empreendedores viviam com até R$ 1 mil reais por mês ao fim do ano
passado. Ainda segundo a pesquisa, nos últimos meses, 52% dos empreendedores
individuais buscaram auxílio financeiro com parentes e amigos. E apenas um em
cada cinco obteve empréstimo com bancos ou instituições financeiras tradicionais
(NEON, 2020)
18
Disponível: < https://www.cnnbrasil.com.br/business/numero-de-novos-microempreendedores-individuais-bate-
recorde-em-2020/> Acesso 24/11/21.
19
Disponível em: < http://www.portaldoempreendedor.gov.br/estatisticas> Acesso em: 20 de Out 2020.
20
De acordo com a PNAD, "a taxa de informalidade – soma dos trabalhadores sem carteira, trabalhadores
domésticos sem carteira, empregador sem CNPJ, conta própria sem CNPJ e trabalhador familiar auxiliar".
Disponível: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/26913-
desemprego-cai-em-16-estados-em-2019-mas-20-tem-informalidade-recorde.
21
Disponível:https://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2020/08/07/microempreendedores-atingem-inadimplencia-
de-5712percent-na-paraiba-aponta-o-sebrae.ghtml acesso 14/04/21.
Os dados acima ratificam a contradição entre os discursos de incentivo ao
empreendedorismo e as condições objetivas experimentadas pelos trabalhadores, no
tocante a desproteção associada ao endividamento. Nesta direção, as desigualdades de
classe – inerentes à sociedade capitalista – são canceladas e os indivíduos passam a se
distinguir pelas e aptidões individuais e subjetivas, cuja referência comum é o mercado.
Seguindo essa linha de análise, as relações sociais de produção e reprodução social
são polarizadas, como se pertencessem a extremos opostos. Neste sentido, “o
empreendedorismo se apresenta como uma função especial, para além da sociedade de
classes e dos conflitos entre capital e trabalho” (VALENTIM; PERUZZO, 2018).
A despeito das análises da categoria trabalho nas teorias pós-modernas afirmarem o
fim da sociedade do trabalho e por em xeque a sua centralidade ontológica na sociedade
contemporânea, a nossa argumentação principal sugere que, o empreendedorismo tratado
como tendência da reprodução do capital, se constitui como mais uma expressão de
negação das contradições de classe e dos valores emancipatórios fundados na
modernidade.
4. CONCLUSÃO
5. REFERÊNCIAS
CANTALICE, Luciana B. de O. As incidências pós-modernas na produção do conhecimento
em Serviço Social. (Tese de Doutorado). Rio de Janeiro: PPGSS/UERJ. (Sínteses
Conclusivas)
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