Uso e Manejo Da Materia Organica 2013

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Capítulo 7

Uso e manejo da matéria orgânica


para fins de fertilidade do solo
Marco Antonio de Almeida Leal
Fabiano de Carvalho Balieiro
Caio Teves Inácio
David Vilas Boas de Campos
José Guilherme Marinho Guerra
Everaldo Zonta
Luiz Rodrigues Freire

Os solos tropicais apresentam, em sua maioria, baixa fertilidade


natural, ou seja, elevada acidez, baixos teores de matéria orgânica e de
N, e baixos teores de Ca, Mg e K trocáveis e de P disponível. Essas
características advêm de diversos fatores de formação do solo, como
visto no Capítulo 2, mas, principalmente, da ação pretérita do clima,
que proporciona condições mais intensas de reação com minerais
(intemperismo) e de lavagem de nutrientes do perfil do solo.
Dessa forma, nesses solos predominam óxidos e hidróxidos de
ferro e alumínio e minerais de argila 1:1, com pouca reserva de nutrientes
para as plantas. A composição química e o arranjo cristalino desses
minerais conferem características que limitam a fertilidade química dos
144 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

solos, ou seja, a capacidade de provimento de nutrientes em quantidade


adequada às culturas. Por isso, a matéria orgânica do solo (MOS) nes­
ses solos assume papel importante na manutenção e na sustentabilidade
dos ecossistemas naturais e agroecossistemas, pois é responsável por
armazenar boa parte dos nutrientes do solo e é fonte de transformações
diversas, intermediadas por organismos do solo.
Embora o Estado do Rio de Janeiro apresente pequena dimensão
territorial, em comparação com outros estados da Federação, suas
feições geológicas, geomorfológicas e pedológicas, e o tornam com­
plexo em termos de ambientes. Decorre disso que os teores de carbono
(C) e a própria fertilidade de seus solos variam muito, conforme a
localização geográfica, a paisagem e a estratégia de manejo adotada.
Em áreas das baixadas metropolitana e litorânea, por exemplo, encon­
tram-se solos mais frágeis e também os que apresentam as maiores
reservas de C em seus perfis, tais como os Organossolos, os Gleissolos,
os Espodossolos e os Cambissolos Flúvicos. Nos relevos mais aciden­
tados, típicos da Região Serrana e de parte das regiões Norte e Noroeste,
encontram-se solos bem drenados, como os Argissolos, os Latossolos
e os Cambissolos Háplicos, geralmente com cobertura vegetal, formada
de pastagens. Esses ambientes, com reserva significativamente menor
de C, também estão sujeitos a severos problemas de erosão, o que
acarreta perda de solo superficial e de matéria orgânica.
Neste capítulo, é abordada a importância da MOS para a manu­
tenção da fertilidade do solo, bem como são sugeridas práticas a serem
adotadas para elevar seu teor nos agroecossistemas fluminenses. Para
tanto, se faz necessário conhecer os compartimentos da MOS e suas
características.

7.1 Compartimentos e características da MOS


De forma simplificada, a MOS pode ser dividida em dois grupos:
substâncias não humificadas (SNH) e substâncias húmicas (SH). No
primeiro grupo (SNH) estariam representadas as substâncias “reco­
nhecíveis” quimicamente, como carboidratos simples, polissacarídeos,
aminoácidos, proteínas, gorduras, lignina, resinas, pigmentos, ácidos
orgânicos, entre outros. Esse grupo de substâncias, com exceção da
lignina e das resinas, apresenta fácil degradação no solo, sendo utilizados
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 145

como substratos pela biota do solo. Já as SH são representadas por


substâncias complexas e heterogêneas, com composição química
indefinida, que apresentam recalcitrância no solo, o que significa alta
resistência à degradação microbiana. Embora não seja o escopo deste
capítulo, deve-se mencionar que é possível separar as frações orgânicas
do solo por métodos químicos ou físicos e, assim, obter informações
sobre a representatividade desses compartimentos. É possível, também,
avaliar a qualidade de agroecossistemas por meio do monitoramento de
frações ou dos compartimentos da MOS.
De modo geral, a ação antrópica de transformação de paisagem
natural em agroecossistemas acarreta perda mais rápida de frações
lábeis (matéria orgânica leve, C dissolvido na solução e C associado à
biomassa microbiana do solo) do que de frações mais recalcitrantes,
normalmente protegidas pela fração mineral do solo. Na Figura 1,
ilustram-se esses compartimentos e os mecanismos relacionados à
proteção e à suscetibilidade à decomposição.

Figura 1. Modelo descritivo do arranjo espacial de partículas minerais e


orgânicas do solo. As letras próximas de cada fração representam meca­
nismos de proteção contra a decomposição: A, recalcitrância; B, oclusão; e C,
complexação/ligação com partículas minerais. COM: complexo organomineral;
MONC: matéria orgânica não complexada.
Fonte: Roscoe e Machado (2002).
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Em contrapartida, muitas práticas de manejo podem incrementar


os teores de C do solo (ver item 7.1). A adoção de técnicas conserva­
cionistas, a exemplo do sistema de plantio direto – que é baseado no
mínimo revolvimento do solo, com manutenção de palha sobre o solo
– tem sido responsável pelo incremento da fertilidade de solos
intemperizados em diversos ambientes. Nesse sentido, em trabalho
desenvolvido em Paty de Alferes, região onde predominam Latossolos
e Argissolos e relevo mon­tanhoso, com atividade tipicamente agrícola
e provedora de parte das hortaliças que abastecem a cidade do Rio de
Janeiro, foi possível observar como o uso do solo e as práticas agrícolas
adotadas podem alterar a estrutura do solo e reduzir o teor de C do solo
(Tabela 1).

Tabela 1. Diâmetro médio dos agregados do solo (DMP) e teor de


carbono orgânico na camada de 0 a 5 cm de um Latossolo Vermelho
sob o efeito de distintos usos e manejos, em Paty de Alferes, RJ.

Sistema de manejo DMP (mm) C orgânico (g kg-1)


Cobertura com gramínea 4,2 21,8
Plantio direto 3,0 18,5
Tração animal 2,2 16,8
Plantio convencional 2,0 11,4
Solo exposto 1,7 6,9
Fonte: Pinheiro et al. (2004).

7.2 Ciclagem de nutrientes


na unidade de produção agrícola
O teor de MOS varia conforme o balanço entre a quantidade de
matéria orgânica que entra e a quantidade que sai do solo. As principais
entradas ocorrem por meio da deposição de resíduos da vegetação que
se desenvolve in situ e por meio da adição de adubos orgânicos ou de
cobertura morta. As saídas estão associadas principalmente à erosão e
à decomposição da matéria orgânica (via respiração microbiana), porém,
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 147

em solos arenosos, a perda de matéria orgânica, na forma de C dissol­


vido, pode ser significativa. Diversos fatores afetam a velocidade de
decomposição dos resíduos orgânicos no solo. Materiais orgânicos com
baixo teor de N, ricos em lignina e hemicelulose, apresentam decom­
posição lenta. Em adendo, solos argilosos, com elevada acidez, secos
ou mal drenados, baixas temperaturas e o manejo do solo com pouco
ou nenhum revolvimento também contribuem para uma reduzida
velocidade de decomposição. Em contrapartida, resíduos orgânicos
ricos em N, amido e celulose, principalmente em solos arenosos, com
boa umidade e pH neutro, em condições de temperatura elevada, e
manejo do solo com muito revolvimento representam condições
favoráveis para a ocorrência de altas taxas de decomposição da MOS.
Em unidades de produção, podem ser realizadas diversas ativida­
des produtivas, entre as quais ocorrem fluxos de energia e de nutrientes,
que podem resultar em esgotamento do estoque de nutrientes em
uma determinada atividade e acúmulo em outra. A sustentabilidade
das unidades de produção está diretamente relacionada à realização de
manejos que possibilitem transferir rapidamente nutrientes de ativida­
des onde estão em excesso, como aviários e confinamentos bovinos,
para atividades onde os nutrientes estão sendo demandados, por
exemplo, as lavouras.
A técnica da compostagem é uma ferramenta muito importante
nesse processo de gerenciamento de resíduos orgânicos, pois, quando
feita corretamente, acelera a decomposição de resíduos vegetais e
animais, reduz as perdas de nutrientes e intensifica o fluxo de nutrientes
entre os diversos compartimentos do sistema de produção. A com­
postagem promove a distribuição de nutrientes para fora do ponto
gerador do resíduo, especialmente dejetos animais (aviários ou confina­
mentos de bovinos e suínos). O uso contínuo e em quantidade muito
elevada desses dejetos, como adubos orgânicos, pode trazer impactos
ambientais negativos, tanto ao solo quanto aos recursos hídricos. Daí a
importância de se dispor de um processo de tratamento que permita o
armazenamento e o transporte para outras unidades agrícolas, não
produtoras desses excedentes, mas demandadoras de nutrientes.
Nesse sentido, a integração que envolva produção vegetal e
animal confere maior eficiência de manejo dos recursos naturais, menor
dependência de insumos externos e menor geração de resíduos. Em
contrapartida, pode aumentar a demanda por mão de obra. A compos­
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tagem é um processo importante na integração das unidades de


produção, pois acelera o fluxo de nutrientes entre os diversos subsiste­
mas e reduz as perdas.
A compostagem consiste na biodegradação de resíduos orgâni­
cos, em um processo predominantemente aeróbio (em presença de
O2), com uma fase termofílica longa (55 ºC a 70 ºC), favorecido por
técnicas de montagem de pilhas ou leiras. Os diferentes tipos de
resíduos devem formar uma mistura adequada para a compostagem,
principalmente quanto à relação C/N (carbono orgânico/nitrogênio
total), à porosidade (que influencia o fluxo de ar) e à umidade inicial.
Por isso, na prática, essas misturas podem ser feitas com toda sorte de
resíduos orgânicos disponíveis, como: restos vegetais das culturas
agrícolas; estercos animais, que são fontes de nutrientes, principalmente
de N; podas de árvores; e aparas de madeira, que são fontes de C e
conferem porosidade à leira de composto. As temperaturas atingidas
na compostagem, o tempo do processo e a alta atividade biológica são
importantes para promover a eliminação de fitopatógenos e de outros
patógenos comuns ao homem, além de reduzir a viabilidade de semen­
tes de plantas concorrentes que estejam misturadas ao resíduo
orgânico. Isso tem relação direta com a viabilidade agronômica da
utilização do adubo ou fertilizante orgânico. A duração da compostagem
será determinada pelas características da matéria-prima, pela velocidade
de decomposição e pelas especificações desejadas no produto final.
A literatura científica apresenta períodos que variam de alguns dias a
alguns meses. Quanto maior o período de compostagem, maior será o
grau de estabilização e de maturação do produto final; todavia, o custo
do processo e as perdas de massa e nutrientes, principalmente de N,
serão maiores.

7.3 Adubação orgânica


Para a realização de adubações orgânicas eficientes, é importante
definir o objetivo da adubação, pois a matéria orgânica atua de duas
maneiras simultâneas: como condicionadora, melhorando principal­
mente as características físicas do solo, e como fornecedora de
nutrientes. Adubos orgânicos utilizados com a finalidade precípua de
fornecer nutrientes devem possuir elevados teores de elementos
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 149

essenciais às plantas, apresentar susceptibilidade à decomposição, e


liberação desses nutrientes em velocidade compatível à demanda da
cultura. Adubos orgânicos com reduzidos teores de nutrientes, princi­
palmente de N, não devem ser utilizados com esse propósito e podem
até mesmo causar imobilização de elementos essenciais presentes na
solução do solo, o que acarreta redução da disponibilidade para as
culturas. Por exemplo: se o material orgânico tiver um teor relativamente
elevado de N (> 1,5%) e baixa relação C/N (< 20), será um bom
fornecedor de nutrientes; caso contrário, agirá fundamentalmente
como condicionador de solo, se aplicado em quantidade superior a
20 t ha-1.
Os principais tipos de adubo orgânico encontrados no Estado do
Rio de Janeiro são: estercos, compostos, resíduos urbanos, vinhaça e
adubos verdes. Os estercos são formados pelos excrementos sólidos
e líquidos dos animais, misturados ou não com materiais vegetais
usados para a formação de cama, como palhas diversas e capins.
A composição química dos estercos é variável e depende de alguns
fatores, como: espécie, idade e manejo do animal, fonte alimentar, tipo
de cama utilizada na manipulação do esterco antes de sua aplicação e
condições climáticas. Por isso, é compreensível que os resultados de
análise publicados variem consideravelmente (Tabela 2).
Os variados tipos de esterco são, geralmente, aplicados ao solo
das seguintes maneiras: a) evacuação direta sobre pastagens ou outras
áreas; b) aplicação direta do esterco puro ou na forma de cama;
c) aplicação das partes líquidas e semissólidas diretamente no campo.
A eficiência dos estercos, como adubo orgânico, depende dos métodos
de coleta, preparo e armazenamento, época e método de aplicação,
características do solo e padrão de crescimento e absorção de nutri­
entes da cultura a ser adubada. Os estercos substituem adequadamente
os fertilizantes sintéticos industriais, principalmente quando estão
disponíveis em quantidade suficiente e de fácil acesso.
Para diminuir as perdas de N e aumentar o teor de fósforo nos
estercos, pode-se incorporar a ele de 30 kg a 50 kg de superfosfato
simples por tonelada de material. É recomendável que o esterco não
fique armazenado em local em contato direto com o solo, nem que
fique exposto à chuva, pois, nessas condições, as perdas de nutrientes
são maiores. Na Tabela 2, são apresentados teores de elementos
essenciais comuns a alguns dejetos orgânicos usados como fontes de
150 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

matéria-prima para a compostagem, ou como adubos orgânicos apli­


cados diretamente no solo.
Em virtude da demanda de biodiesel, também estarão à disposição
dos produtores as tortas dessas oleaginosas, cujos restos culturais
(cascas e torta) são altamente recomendáveis para reúso na própria
cultura, com vista a garantir a ciclagem dos nutrientes e a reduzir a com­
petição por adubos minerais com as culturas produtoras de alimentos.
Essas tortas também servem de potenciais adubos orgânicos para
outras culturas, inclusive para as produtoras de alimentos. E já existem
resultados favoráveis com o uso da torta da mamona.
A torta de mamona é produzida a partir da extração do óleo das
sementes, e é um importante subproduto da cadeia produtiva da
mamona. É um produto rico em nitrogênio, de baixa relação C:N, que
tem mostrado, experimentalmente, bons resultados, inclusive quando
utilizado em cobertura. Quando aplicado no plantio, alguns dados
experimentais mostram que sua mineralização é rápida. A Tabela 2
indica os teores médios de nutrientes da torta da mamona.
A vinhaça é um subproduto da fabricação do álcool, produzido na
proporção de 13 L a 14 L para cada litro de álcool. É também conhecida
pelos nomes de vinhoto, calda, restilo, tiborna, garapão e caxixi.
Por conta da elevada demanda bioquímica do oxigênio (DBO) da
vinhaça, a prática tradicional de despejo desse resíduo em curso d’água
tem causado sério prejuízo ambiental. No Estado do Rio de Janeiro,
diversos trabalhos de pesquisa foram conduzidos pela Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Departamento de Solos, no
período de 1979 a 1985, visando a avaliar formas de aproveitamento da
vinhaça como fertilizante e consequências de sua utilização sobre o
sistema solo-água-planta.
A composição da vinhaça é muito variável (Tabela 3), porque
depende principalmente da natureza e da composição da matéria-prima
originária e do processo industrial de destilação. Como componente
básico, a vinhaça contém cerca de 80% a 90% de água, e o restante é
de material sólido.
A fração sólida é composta de material orgânico (cerca de 70%)
e mineral; neste último, além do potássio, que é o nutriente que
predomina, ocorrem nitrogênio, cálcio, magnésio e fósforo. Como, na
Tabela 2. Componentes de alguns adubos orgânicos de origem animal e compostos orgânicos (base
matéria seca).
Componentes
C % de
Esterco Local Macronutrientes totais (g kg-1) Micronutrientes (mg kg-1) C/N pH
(g kg-1) H2O
N P2O5 K2O Ca Mg Fe Mn B Cu Zn
Bovinos
Leiteiro(1) RS 11 9 11 7 3 – 620 – – 70 – – 8,2 –
Curral(2) RS 17,6 7,1 25,7 12,6 6,1 4.106 510 – 31 64 – – 11,4
Curral(3) MG 12,6 10,8 14,5 11,8 2,3 – – – – – – – – 50
Curral(4) RJ 21,1 4,3 24 – – – – – – – – 13 7,2 –
1,17 0,46
Chorume (g/litro) – 109 12 60 0,8 1,1 – – – 272 – 6,7 –
mg/L mg/L
Galinhas
Com maravalha(1) RS 19 27,5 15,6 65 10 – 240 – 210 – – 8 57,7
Sem maravalha(2) RS 27 54 43,2 67,1 6,1 2.300 837 – – 590 – – – –
Sem maravalha(4) RJ 40 12,1 21,1 – – – – – – – 172 – 8,4 –
Frango com
SC 32 38,9 13,2 – – – 0 – – – – – – 16,5
maravalha(5)
Frango com
RJ 25,3 12,9 – – – – – – – – 395 15,3 7,3 –
maravalha(6)
Frango com
RS 25 36,6 24 22 5 – 300 – – 270 – – 8,4 –
maravalha(1)
Suínos(2) RS 23,2 47,2 19,4 32,5 7,7 8.800 643 – – 422 – – – 62
Composto orgânico
Fazenda(7) – 14 13,7 8,5 6,4 2 5.480 1.272 35 260 182 – – – –
Fazenda(6) RJ 8,7 28,1(8) – – – – – – – – 180 21 7,6 52
Resíduo urbano(9) RJ 14 2,3 10,2 16 2 – 860 130 1.180 870 166 12 7 –
Resíduo urbano(10) RJ 15,2 12,1 6,7 54 4,7 – – – – – 126 8 7,9 19,4
Tortas
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo

Mamona(11) 30–60 27–37 5–14 5–18 1–2 – – – – – 280–300 6–12 – –


Outros
Composto de apara RJ 22,3 48,1 37,6 24,7 3,0 3.802 404 32 15 161 387 17 8,3 –
de grama(12)
(8)
O material foi enriquecido com farinha de ossos antes de ser composto.
Fonte: (1)Ernani e Gianello (1982); (2)Holanda (1981); (3)Aidar et al. (1976); (4)Almeida et al. (1982); (5)Scherer e Bartz (1981); (6)Almeida, D. L.
151

et al. (1982), (7)Malavota (1976); (9)Mazur et al.(1983); (10)Peixoto(1984); (11)Freitas (2009); (12)Benites et al. (2004).
152

Tabela 3. Composição média e algumas características de vinhaça de usinas do Estado do Rio de Janeiro.
Sólidos Condutividade
DBO N N N P
totais -1 elétrica a 25°C % C C/N K+ Ca++ Mg++ Fe++ Na+
Usina (mgO2
L ) total NO3- NH4+ total pH
(mg L-1) (mmhos cm-1)

(mg L-1)

Usina 1(1) 16.430 32.356 5,2 1,0 - 1.078 14,0 529 25,8 1.200 42,8 31,8 54,3 41,0 4,2

Usina 2(1) - - - 0,8 75,9 112 - - 27,0 1.010 232,0 200,0 - - 3,4

Usina 3(1) 41.425 59.872 9,0 2,2 - 119 3,5 7,0 - 916 -‑ - - 42,5 3,4

Usina 4(2) 55.220 65.960 18,0 2,0 - 714 3,5 10,5 168,5 3.800 333,2 269,1 74,3 130,0 4,2

Usina 5(2) - - - 1,8 44,9 392 - - 28,0 1.130 484,0 366,0 - - 4,1

Usina 6(3) 27.380 71.326 6,3 - - 539 3,5 10,5 29,0 128 100,0 107,1 85,7 70,0 4,0

Usina 7(3) 18.250 33.976 4,9 1,0 - 294 3,5 7,0 30,5 664 71,4 72,3 57,1 60,0 3,4

Tipos de vinhaça: (1) caldo: destilação do álcool após fermentação alcoólica direta do caldo de cana; (2)melaço: após fermentação alcoólica do
mosto de melaço, resultante do caldo de cana para a extração do açúcar; (3) mista: após fermentação alcoólica do mosto preparado pela mistura
de melaço e caldo.
Fonte: UFRRJ (1981).
Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 153

fração sólida, prevalecem a matéria orgânica e o potássio, a vinhaça


pode ser considerada um fertilizante orgânico rico em potássio.
Dois aspectos devem ser considerados quanto à adição de
vinhaça in natura ao solo, visando à fertilização: a) o manejo do resíduo,
de forma a obter o máximo de vinhaça a ser aplicada sem prejuízo para
o crescimento da cultura, para as características do solo, para a quali­
dade da água do lençol freático e para a taxa de escorrimento superficial;
e b) o nível de fertilidade do solo, de modo a estabelecer a quantidade
de vinhaça a ser aplicada por unidade de área, visando a suprir as
necessidades de potássio da cultura.
Para determinar a quantidade de vinhaça a ser aplicada, pode ser
usada a curva de resposta à adubação potássica. Mas, como as concen­
trações de K e de N são altamente variáveis, esses elementos devem
ser quantificados para determinar os teores supridos pela vinhaça. Se,
no manejo dos resíduos, altas doses forem utilizadas, vários problemas
poderão sobrevir, tais como dificuldade de maturação da cana-de-
açúcar, baixa qualidade do caldo e salinização do solo – este último,
principalmente nos solos da Baixada Campista, que já têm elevado
potencial de salinização.
Vários resíduos urbanos têm potencial de uso como condicio­
nadores de solo e fonte de nutrientes. O lodo de esgoto, por exemplo.
Ele é um material sólido orgânico ou inorgânico, removido das águas
residuais provenientes de residências e estabelecimentos comerciais e
industriais, nas estações de tratamento de esgoto. A concentração de
nitrogênio, fósforo e potássio no lodo depende das contribuições
recebidas pelas águas residuais, do tipo de tratamento a que foram
submetidas e do manejo do lodo, entre a sua produção e a sua aplicação
ao solo. O principal inconveniente do uso do lodo é a possibilidade de
ocorrência de metais pesados em sua constituição, a qual traz, como
consequência, poluição ambiental e dos alimentos.
Adubos orgânicos geralmente são obtidos de resíduos e subpro­
dutos agrícolas e industriais, que podem apresentar diversos graus de
contaminação química e/ou biológica. Estercos podem estar contami­
nados com organismos patogênicos ao homem, aos animais e às
plantas, com propágulos de plantas concorrentes, além de metais
pesados e resíduos de medicamentos. Prova evidente disso é o
aumento do nú­mero de ocorrências de contaminação de esterco bovino
154 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

por herbicidas, em virtude da crescente utilização desse produto.


Resíduos industriais e urbanos também podem apresentar diversos
tipos de contaminação química e biológica. Há evidentes esforços para
se controlar a produção, o transporte, o armazenamento e a aplicação
de fertilizantes orgânicos, os quais devem estar adequados às diversas
normatizações, nos âmbitos federal, estadual e municipal, sobre
vigilância sanitária, meio ambiente e agricultura.

7.4 Recomendações de adubação orgânica


A recomendação da quantidade de adubo orgânico a ser empre­
gada pode ser calculada seguindo-se diversos critérios. Partindo-se do
pressuposto que, geralmente, o N é o nutriente mais demandado em
adubações, mas que é, também, o elemento que pode provocar maio­
res problemas de contaminação das fontes de água, recomenda-se
basear as recomendações das adubações orgânicas nos teores de N
dos adubos e na proporção do N presente, que será recuperado pela
cultura após a realização da adubação, utilizando-se sempre a matéria
seca como base para o cálculo.
O teor de N deve ser determinado em análise de laboratório. Se
isso não for possível, o valor poderá ser estimado por meio de tabelas
disponíveis em várias fontes, lembrando que, ao contrário dos adubos
sintéticos, os adubos orgânicos não são materiais padronizados, e,
assim, sua composição pode apresentar grande variação. A Tabela 2
mostra valores de teores de nutrientes para alguns dos principais
adubos orgânicos.
A proporção do N presente no adubo orgânico, que é recuperada
pela cultura logo após a adubação, depende de diversos fatores, como
características do adubo, do clima, do solo e do ciclo da cultura.
Em termos gerais, para o Estado do Rio de Janeiro, podemos estimar
que a recuperação média de N pela cultura, logo após a adubação
orgânica, está em torno de 30% para ambientes quentes, como ocorre
na Baixada Fluminense, e em torno de 20% para ambientes frios, como
é o caso da Região Serrana.
Deve-se evitar a utilização de adubos orgânicos com teores de N
abaixo de 1,0, principalmente no caso de materiais pouco humificados.
A recuperação do N contido nesses materiais é muito reduzida,
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 155

podendo ocorrer imobilização do N disponível no solo. Também se


deve evitar a utilização de grande quantidade de adubo com elevados
teores de matéria orgânica pouco humificada, pois isso pode causar
problemas de anaerobiose temporária nos poros do solo.
É importante estar consciente que a determinação das reco­
mendações de adubação orgânica é muito mais complexa do que a da
adubação mineral, pois envolve materiais pouco padronizados, com
desempenho muito mais sujeito à influência de fatores ambientais. Por
isso, recomenda-se que o cálculo da quantidade de adubos orgânicos
utilizados também deve considerar as doses geralmente empregadas
desses insumos, e não ultrapassar as doses máximas recomendadas,
conforme está apresentado na Tabela 4.

Tabela 4. Valores de doses geralmente empregadas e de doses


máximas recomendadas para os principais adubos orgânicos.

Doses geralmente Doses máximas


Adubo orgânico empregadas recomendadas
tonelada de matéria seca por hectare
Esterco de ruminantes 10 40
Esterco de aves 5 20
Torta de oleaginosas 1 4
Composto orgânico pouco 10 40
humificado
Composto orgânico muito 10 60
humificado

7.5 Maturidade e estabilidade


O principal requisito para que adubos orgânicos sejam utilizados
de forma segura no solo é o seu grau de estabilidade ou de maturação,
que implica matéria orgânica estável e ausência de componentes
fitotóxicos, de sementes de concorrentes e de organismos patogênicos
às plantas e aos seres humanos. Quando esses materiais são
adicionados ao solo, isso pode resultar em impacto negativo sobre o
156 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

crescimento das plantas por causa da redução do oxigênio na zona


radicular ou da presença de compostos fitotóxicos.
O termo “maturidade” é normalmente usado na avaliação do
potencial de crescimento da planta ou da fitotoxicidade de materiais
orgânicos, enquanto o vocábulo “estabilidade” geralmente está relacio­
nado com a atividade microbiana. Entretanto, as duas palavras estão
muito correlacionadas, pois substâncias fitotóxicas são produzidas por
microrganismos em materiais orgânicos pouco estabilizados. A esta­
bilidade é atingida quando a matéria orgânica de fácil biodegradação é
totalmente degradada. A maturidade, que implica a ausência de limita­
ções ao crescimento das plantas, é avaliada com mais eficiência por
meio de bioensaios de crescimento vegetal.
A estabilidade é uma característica importante para se avaliar a
qualidade de um composto, mas é de difícil mensuração. A maioria dos
critérios utilizados na avaliação do processo de compostagem é basea­
da em parâmetros físicos e químicos do material orgânico, e seus
comportamentos refletem a atividade metabólica dos microrganismos
envolvidos no processo de compostagem. Esses parâmetros abrangem
a redução da temperatura, o grau de autoaquecimento, o consumo de
oxigênio, os efeitos fitotóxicos, a CTC, o conteúdo de MO e de nutrien­
tes, e a relação C:N.
Alguns autores têm proposto índices de maturidade baseados no
monitoramento das substâncias húmicas, tais como ácidos húmicos e
ácidos fúlvicos. Entre os índices de maturidade propostos, os mais
representativos são aqueles que medem a evolução dos ácidos
húmicos (AH) comparada com a evolução dos ácidos fúlvicos (AF).
A razão AH/AF é considerada o melhor indicador de maturidade e humi­
ficação. Bernal et al. (1998) apresentam os seguintes indicadores de
maturidade e estabilidade para alguns materiais orgânicos, como
composto de lixo urbano e lodo de esgoto:
• A maturidade dos compostos pode ser definida em termos
de nitrificação. Quando a concentração de NH4+ diminui e o
NO3 - aparece, o composto é considerado pronto para ser
usado. Um alto nível de NH4+ indica materiais pouco estabi­
lizados, sendo determinado o valor de 0,04% como a
concentração máxima para os compostos de lixo urbano
serem considerados maduros. A relação C:N menor que 12 e
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 157

a relação NH4+ / NO3 - menor que 0,16 também são aceitas


como indicativos de maturidade. No entanto, em termos de
relação C/N, valores abaixo de 12 para compostos orgânicos
podem ser difíceis de ser alcançados, já que, geralmente, um
processo de compostagem adequado necessita de materiais
de mais alta C/N, o que se reflete na composição do produto
final. Valores acima de 18 até 25 podem não ser limitantes
para o uso do composto na prática. Algumas formas de
manejo podem reduzir os efeitos negativos da imobilização
de nitrogênio. Por exemplo, o composto pode ser aplicado na
superfície do solo, sem incorporação, ou ser aplicado com
maior antecedência em relação à data de semeadura,
promovendo a sua biodegradação no solo sem afetar a
cultura. Por sua vez, a relação C/N mais alta, ou seja, com
mais carbono orgânico, traz benefícios para a estrutura do
solo e para a formação da matéria orgânica, o que resulta em
melhoria da maioria dos indicadores de qualidade do solo
(Tabela 5) e em manutenção da capacidade produtiva a longo
prazo.
• O processo de humificação produz grupos funcionais e au­
menta a oxidação da matéria orgânica, levando a aumento da
CTC. Valores maiores que 60 cmolc dm -3 são indicativos
da maturidade dos compostos de lixo urbano. A relação
CTC/C-orgânico também é utilizada, sendo os valores de
1,7 mmol g -1 e 1,9 mmol g -1 os limites inferiores descritos
para a maturidade de composto de lixo urbano e de lodo de
esgoto, respectivamente.
• As frações carbono solúvel (Cw) e de ácidos fúlvicos geral­
mente diminuem durante a compostagem em virtude de
seus elevados conteúdos de substâncias facilmente degra­
dáveis (açúcares, aminoácidos, peptídeos, etc.). O valor de
Cw < 1,7% é usado como um indicador de maturação. O ín­
dice de maturidade (Cw/N-orgânico) também é um indicativo,
sendo aceitos valores maiores que 0,55.
• A relação AH/AF aumenta durante o processo de compos­
tagem, sendo valores maiores que 1,9 propostos como indi­
cadores de maturidade para compostos de lixo urbano e de
lodo de esgoto.
158 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

Tabela 5. Indicadores de qualidade do solo.


Propriedades
Propriedades físicas Propriedades biológicas
químicas
Densidade do solo pH Carbono na biomassa
microbiana
Profundidade de Condutividade elétrica N na biomassa microbiana
enraizamento
Taxa de infiltração de água Capacidade de troca de Minhocas
cátions
Capacidade de retenção Matéria orgânica Enzimas
de água
Estabilidade de agregado N mineralizável Supressividade de doenças
K trocável
Ca trocável

Fonte: Mitchell (2000).

7.6 Fonte de nutrientes


Para os adubos orgânicos, principalmente o composto orgânico, a
disponibilidade de nutrientes para as plantas depende do processo de
decomposição biológica no solo dessa matéria orgânica (mineralização).
A maior parte do nitrogênio (N) do fósforo (P) e do enxofre (S) está
conservada na forma orgânica (matéria orgânica) e na biomassa
microbiana. A exceção é o potássio (K), que estará mais prontamente
disponível. A elevada capacidade de troca de cátions (CTC) permite
também que os nutrientes aplicados ao solo fiquem em formas trocáveis
e sejam aproveitados com mais eficiência pelas raízes das plantas,
evitando perdas por lixiviação. Esse efeito é especialmente importante
para o potássio (K+), o cálcio (Ca++), o magnésio (Mg++) e o nitrogênio na
forma de íon amônio NH4+.
A literatura científica relata que a disponibilidade de nitrogênio no
primeiro ano após a incorporação do adubo orgânico ao solo pode variar
de 15% a 50% do total aplicado. A aplicação de fontes de matéria
orgânica deve ser realizada periodicamente, para aumentar a quantidade
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 159

total de nitrogênio orgânico no solo e, consequentemente, o potencial de


mineralização para a manutenção da capacidade produtiva.
O uso do adubo orgânico pode ser concomitante ao uso de
fertilizantes sintéticos convencionais; nesse caso, podendo aumentar a
eficiência da aplicação dos nutrientes solúveis presentes neste último.
A duração dos efeitos benéficos do adubo orgânico no solo vai depender
de fatores climáticos e das caracterísiticas do solo e do manejo, que
influenciam a mineralização da matéria orgânica.
Adubos orgânicos são fontes também de micronutrientes (boro,
cloro, cobre, ferro, manganês, molibdênio, níquel e zinco). Tais elementos
atuam no metabolismo vegetal, especialmente na ativação de deter­
minadas enzimas. O molibdênio, por exemplo, é fundamental para a
fixação biológica de nitrogênio (FBN), pela associação entre rizóbio e
leguminosas. A falta de micronutrientes pode limitar a capacidade
produtiva do solo. Solos arenosos tendem a apresentar baixos teores de
certos micronutrientes, o que torna mais premente a aplicação de
adubos orgânicos. No entanto, como os teores de micronutrientes nos
adubos orgânicos variam, é preciso recorrer à análise química para se
determinar a quantidade de micronutriente a ser aplicada.

7.7 Condicionamento de solos


A MOS, representada por compostos de origem vegetal e animal
em distintos estádios de decomposição, exerce diversas funções no
solo: atua na formação e na estabilização da estrutura do solo, por meio
do fornecimento de substâncias agregantes, como polissacarídeos,
ácidos orgânicos e exsudados de raízes, ou mesmo pela ação mecânica
exercida pelas hifas de fungos do solo.
Em se tratando de fertilidade do solo, a MOS é importante na
geração de cargas do solo. Por sua vez, a matéria orgânica humificada,
estabilizada biologicamente, é intrinsecamente associada à fração
mineral do solo, graças a sua natureza coloidal e a grupos dissociáveis,
como carboxílicos e fenólicos. Exerce benefícios variados para o
agricultor e para o meio ambiente. Ela é responsável pela maior parte
das cargas dependentes de pH do solo. Estudos mostram que a MOS
representa de 25% até 97% da CTC do solo. Ademais, podem com­
plexar elementos como Al e outros, formando quelatos, reduzindo o
160 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

efeito tóxico deles, ou as chances de contaminação de cursos de água


de superfície e subterrânea. Pesticidas também podem ser adsorvidos
a moléculas orgânicas, diminuindo sua mobilidade e elevando as
chances de ser biodegradadas.
A MOS pode atuar de forma positiva também sobre o P, que
normalmente é fixado (adsorvido) pelas argilas 1:1 e óxidos de Fe e Al
encontrados nos solos. A imobilização temporária do P na biomassa
microbiana do solo permite manter o P longe do contato com os óxidos,
mas sua com­partimentação vai variar conforme for o manejo da matéria
orgânica. As substâncias húmicas, que são formadas paralelamente à
decom­ posição dos resíduos do solo e que possuem normalmente
peso molecular e recalcitrância mais elevados, assumem papel decisivo
na diminuição da adsorção de ânions fosfato por óxidos de Fe e Al.
Decorre disso que, seja pela introdução de adubos fosfatados solúveis
ou não, seja pela mineralização do P da biomassa microbiana do solo,
as culturas terão mais chances de absorver o ânion fosfato em solos
com elevados teores de MOS, do que em solos com baixos teores.
As substâncias húmicas, presentes nos adubos orgânicos ou
formadas em seu processo de decomposição, também são respon­
sáveis por parte dos importantes benefícios da matéria orgânica, como
o aumento da CTC do solo, favorecendo a produtividade agrícola.
Segundo Canellas e Santos (2005, p. 224):
Além de indiretamente favorecer os processos de absorção de
íons mediante a formação de complexos organometálicos solúveis,
as substâncias húmicas ativam rotas bioquímicas específicas tal
como fazem alguns hormônios vegetais.
Em virtude de sua diversidade biológica, a aplicação de adubos
orgânicos pode ter efeito supressivo sobre certos fitopatógenos no
solo. A diversidade microbiana contribui para a supressão de fitopa­
tógenos, graças a quatro tipos de interação ecológica: competição,
antibiose, parasitismo/predação e indução sistêmica da resistência do
hospedeiro. A compostagem pode ser considerada um meio de multi­
plicação de agentes de controle biológico de fitopatógenos no solo, a
exemplo de espécies de Trichoderma (Trichoderma asperellum e
Trichoderma hamatum) e Aspergillus spp., reconhecidas como agentes
no controle biológico, em virtude de sua alta capacidade de competição
e indução de resistência sistêmica. Efeitos supressivos foram identifi­
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 161

cados em diversos gêneros de fitopatógenos, como: Fusarium sp.,


Pythium sp., Phytophora sp. e Rhizoctonia sp.

7.8 Qualidade e valor do adubo orgânico


Adubos orgânicos são comercializados principalmente com base
no volume, pois geralmente se comercializa a carga fechada de um
caminhão. Mas os efeitos do fornecimento de nutrientes e de condi­
cionamento do solo são dimensionados com base na massa seca do
produto, pois os teores de nutrientes e de matéria orgânica são
calculados com base na massa seca da amostra. Desse modo, para se
avaliar a capacidade de fornecimento de nutrientes de um fertilizante
orgânico, é necessário converter o volume da carga em quantidade de
massa seca presente. Quando o objetivo é o condicionamento do solo,
proporcionado pela matéria orgânica, deve-se também levar em conta
o teor de carbono ou de matéria orgânica. É comum encontrar adubos
orgânicos que, além de apresentarem muita umidade, estão misturados
com solo ou areia. Como a densidade do solo ou da areia é aproxi­
madamente 10 a 20 vezes maior que a densidade da matéria orgânica,
basta misturar um pequeno volume desses materiais para reduzir
significativamente o teor de matéria orgânica do material.
Quando o objetivo principal é o condicionamento do solo, deve-
se basear no teor de matéria orgânica do material; mas também é
importante levar em conta o grau de humificação do adubo orgânico.
Materiais orgânicos frescos, com elevados teores de açúcares solúveis,
amido, proteína e celulose, possuem menor capacidade de condicio­
namento do solo do que materiais estabilizados e maduros, com
elevado grau de humificação.

7.9 Manejo da matéria orgânica


para conservação da fertilidade
Vários sistemas de produção e de manejo permitem a preservação
ou o retorno dos estoques de C do solo quanto à qualidade compatível
com a obtenção de boas produtividades, pois é errôneo pensar que,
obrigatoriamente, tem-se que atingir os níveis de C encontrados sob a
162 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

vegetação original da área. Neste item, são apresentados alguns


exemplos de sistemas produtivos e de manejo da vegetação com
potencial de ser replicados com sucesso em várias situações agrícolas
fluminenses.
O componente arbóreo ou o arbustivo, em alguns sistemas
conhecidos como agroflorestais, funcionam também como adubos
verdes; porém, preferiu-se citá-los separadamente, como forma de
evidenciar os benefícios adicionais do hábito de crescimento dessas
plantas, em comparação com aqueles em que são utilizadas espécies
herbáceas de hábito ereto ou escandente. São eles:

7.9.1 Adubação verde de sistemas de produção de


culturas anuais

Esse assunto é abordado com detalhes no Capítulo 8.

7.9.2 Arborização de pastagem e de agroecossistemas

As espécies arbóreas plantadas com essa finalidade geralmente


possuem algum valor comercial, além de proporcionarem ao solo
ganhos de matéria orgânica e nutrientes, os quais beneficiarão também
as espécies forrageiras, anuais ou perenes, plantadas em consórcio na
mesma área. Várias são as alternativas de combinação de espécies a
serem inseridas nesses sistemas, sendo a aptidão edafoclimática, a
arquitetura de copa e do sistema radicular e a função ecológica da
espécie os fatores determinantes da sua seleção.

7.9.3 Plantio em aleias

Nesse sistema, as espécies arbóreas ou arbustivas formam


corredores, onde são dispostas as linhas de plantio de culturas anuais.
A principal finalidade do método é tornar perene a deposição de
resíduos vegetais (senescentes ou oriundos de poda) no solo. Dessa
forma, pretende-se manter ou aumentar a produtividade das culturas
anuais a partir da melhoria da fertilidade e do microclima local, seja pela
ciclagem de nutrientes, seja pelo controle de ervas daninhas, seja, por
fim, pela adição de cobertura morta. Espécies como o feijão-guandu
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 163

(Cajanus cajan), a gliricídia (Gliridia sepium), a leucena (Leucaena


leucocephala) e o ingá (Inga spp.) têm sido utilizadas nesses sistemas,
por possuírem copa mais aberta e proporcionarem a passagem de luz
para outras culturas, além de apresentarem elevada capacidade de
rebrota. Esse sistema permite uma cobertura constante do solo,
reduzindo, assim, a intensidade dos processos erosivos.

7.9.4 Manejo do pousio

O sistema de agricultura migratória ou de pousio é aquele em que


o agricultor rotaciona áreas de uso com áreas sem uso agropecuário,
podendo essa ser uma área de vegetação nativa. Esse sistema permite
que a área seja mantida com cobertura vegetal natural, diminuindo,
assim, a exposição do solo aos agentes erosivos (vento e água), além de
reduzir a pressão sobre os remanescentes florestais nativos, como fonte
de madeira para uso local. A introdução de espécies pioneiras ou
secundárias iniciais fixadoras de N2 atmosférico – como o ingá (Inga
edulis), o vinhático (Plathymenia foliosa), o mongolo-jacaré (Parapiptadenea
gonocanta) e o angico-vermelho (Anadenantera macrocarpa) – pode
contribuir para a diminuição do tempo de pousio, pela restauração
antecipada da fertilidade de solos degradados. Vale ressaltar que se deve
dar preferência a espécies nativas da flora brasileira nos programas de
enriquecimento de capoeiras.

7.9.5 Plantio de contorno ou em terraços

Em áreas de relevo suave-ondulado e ondulado utilizadas para


cultivo agrícola, espécies arbóreas, arbustivas ou mesmo gramíneas,
como capim-vetiver (Vetiveria zizanioides (L.) Nash), capim-elefante
(Pennisetum purpureum) e capim-colonião (Panicum maximum), são
plantadas em curva de nível, de modo a formarem barreiras contra o
escoamento superficial da água e, assim, reduzir a erosão hídrica do
solo. O plantio de árvores e arbustos nas cristas de terraços tende a
estabilizar o solo por meio do seu sistema radicular profundo e da
serapilheira depositada sobre o solo, além de protegerem a cultura
intercalar contra os ventos excessivos e assim reduzir a perda de
umidade do solo, que favorece a erosão eólica.
164 Manual de calagem e adubação do Estado do Rio de Janeiro

7.9.6 Cercas vivas e moirão vivo


Espécies arbóreas, arbustivas ou gramíneas e herbáceas podem
ser inseridas em faixas, como cercas vivas, nos sistemas agropecuários
de produção, preenchendo as funções de proteção, abrigo e quebra-
vento. O cipreste-comum (Cupressus lusitanica) tem sido apontado por
Manual... (2008) como espécie promissora no estabelecimento de
cortinas de proteção, e é encontrado em várias propriedades da Região
Serrana do Rio de Janeiro. Espécies selecionadas para essa finalidade
devem ser plantadas perpendicularmente à direção dos ventos, em
linhas únicas ou múltiplas, protegendo as culturas de ventos quentes,
frios ou secos, da deposição de poeira, de aerossóis salinos (em regiões
costeiras), entre outros. Geralmente, espécies de gramíneas e herbáceas
são plantadas na base das cortinas de plantas árboreas para proteger
contra a ação de ventos, que transportam partículas de solo de áreas
circundantes.
O sabiá (Mimosa caesalpiniifolia) é uma espécie nativa com
grande potencial de uso como cerca viva. Além de possuir acúleos, que
impedem a passagem de animais, fixa o nitrogênio em associação com
bactérias diazotróficas, é tolerante à queima e suporta a poda, ou seja,
rebrota com facilidade, além de possuir flores melíferas e taxa de rápido
crescimento, o que proporciona uma cobertura também rápida do solo.
O moirão vivo visa ao plantio de linhas de espécies arbóreas ou
arbustivas dentro ou entre propriedades rurais, dividindo piquetes ou
delimitando suas fronteiras. Espécies utilizadas para esse fim, como a
Gliricidia sepium, também podem representar um bancos de proteínas
em associação com o plantio de espécies herbáceas ou arbustivas
fixadores de N2, para aumentar a qualidade das pastagens. Dessa forma,
aumenta-se a capacidade de suporte das pastagens, retardando ou
mitigando os processos de degradação associados à perda da
produtividade do solo e do poder de resiliência do substrato.
Em todos esses sistemas, enfatiza-se a manutenção da cobertura
do solo durante todo o ano, e não apenas no período de cultivo agrícola.
Essa prática visa amortecer o impacto erosivo das chuvas, atenuar as
variações de temperatura na camada superficial do solo, conservar sua
umidade e aumentar a estabilidade das unidades estruturais do solo
(os agregados). Dessa forma, aumenta-se a resistência das forças de
coesão e adesão que mantêm, unidas, as partículas primárias do solo
Capítulo 7 – Uso e manejo da matéria orgânica para fins de fertilidade do solo 165

(argila, silte e areia), contra as forças de natureza externa, como o


impacto, a abrasão e o atrito, e as oriundas do escape do ar interno dos
agregados.
A inserção de leguminosas herbáceas, arbustivas ou arbóreas,
que se associam com bactérias diazotróficas (responsáveis pela fixação
biológica de N2 - FBN) e com fungos micorrízicos, tem sido apontada
como uma alternativa ecológica e econômica para o manejo de solos
tropicais. Ela permite que uma quantidade significativa de N seja
incorporada aos sistemas agrícolas, diminuindo, assim, os gastos com
fertilizantes e o passivo ambiental resultante do seu uso. Essa introdução
adicional de N, em combinação com características bioquímicas da
serapilheira (como os teores de polifenóis) dessas espécies, permite
que o solo estoque mais C, com consequências positivas sobre a sua
agregação na superfície, aumentando a percolação da água no perfil e
diminuindo o escoamento superficial e a erosão.

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