Apostila Política Internacional

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POLÍTICA INTERNACIONAL

Sumário
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2

INTRODUÇÃO ......................................................................................... 3

RELAÇÕES INTERNACIONAIS .............................................................. 6

A SOCIEDADE INTERNACIONAL .......................................................... 8

CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL ................ 10


OS SUJEITOS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL.......................... 11
OS FUNDAMENTOS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL ............... 12
A ORDEM JURÍDICA DA SOCIEDADE INTERNACIONAL ............... 12
A IMPORTÂNCIA DA SOCIEDADE INTERNACIONAL ..................... 13
POLÍTICA INTERNACIONAL ................................................................ 14

POLÍTICA INTERNACIONAL, POLÍTICA DE PODER ....................... 31


FORMAS DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS .................................. 33
CONCLUSÃO ........................................................................................ 34

REFERÊNCIAS ..................................................................................... 38

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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INTRODUÇÃO

Por conta da indefinição de seu objeto e do óbvio entrelaçamento com a


política internacional, é muito difícil sustentar que as Relações Internacionais
sejam capazes de constituir uma nova ciência. É por isto que a trataremos aqui
como uma área temática, disputada por ramos do conhecimento contíguos,
porém distintos: a já referida Política Internacional e a Economia Política
Internacional. Aqui cabe um esclarecimento preliminar.

Como já foi salientado por diversos autores das mais variadas correntes
teóricas, a expressão “Economia Política” possui diversos significados
conflitantes. Para quem acredita que a Ciência Econômica é uma Hard Science,
este termo (geralmente, mas não necessariamente, acompanhado pelo termo
“clássica”) tende a ser usado de forma quase pejorativa: aquele gigantesco
emaranhado de pensadores heterogêneos que precederam a revolução
marginalista mas que, de certo modo, por perceberem os contornos da nascente
economia de mercado, forjaram conceitos e anteciparam alguns elementos que
culminaram na constituição da Ciência Econômica moderna, a qual só se tornou
uma ciência ao purgar todos os traços metafísicos e pré-científicos que poluíam
a mente destes “precursores” .

Mas, para desespero dos adeptos desta ortodoxia, a necessidade de


tentar reintroduzir a Política na Economia ressurgiu com vigor durante a crise do
sistema de Bretton Woods. Por conta da ampla aceitação deste tipo de
enquadramento na bibliografia específica sobre o tema , usarei a expressão
Economia Política Internacional aqui em um sentido muito preciso: como o tipo
de reflexão que, especialmente nos círculos de língua inglesa, se cristalizou a
partir de 1970, como uma tentativa de recombinar a política e a economia para
tentar apreender o conjunto de transformações que a economia mundial
atravessava. Embora controversa e, como veremos, passível de críticas, esta
percepção sobre as raízes e o significado da Economia Política Internacional é

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bastante arraigada. Isto cria um problema já de saída: especialmente entre 1970


e 80, a discussão sobre o estatuto teórico da Economia Política Internacional era
bastante similar à discussão no âmbito das Relações Internacionais:
necessariamente interdisciplinar, fortemente correlacionada aos problemas
internacionais contemporâneos mais prementes e, em alguns casos, em uma
constante busca por identificar precursores nos pensadores clássicos.

Tentarei mostrar como, tendencialmente, esta tensão foi equacionada


de forma distinta nos EUA e na Grã-Bretanha, dando origem a duas orientações
distintas. Mas esta temática estará subordinada à preocupação que é realmente
central neste estudo, isto é, a definição dos termos mais gerais em que os
problemas e as análises concernentes à dinâmica do sistema internacional têm
sido tratados por tradições que, no limite, são distintas. E o eixo da discussão
será uma visão sintética sobre o processo de constituição das Relações
Internacionais como área do conhecimento com pretensões científicas.

É dentro deste quadro que as conexões com a Política Internacional e


com a Economia Política Internacional serão estabelecidas. Antes de prosseguir,
é necessário fazer uma última observação. A princípio, seria possível objetar
que, do modo como estou expondo o problema, está ausente a geopolítica como
uma quarta variante ou tradição.

Tratar disto aqui só aumentaria a confusão. Para abordar seriamente do


assunto, seria necessário, ainda que rapidamente, esboçar a démarche da
geopolítica, desde a sua formação na segunda metade do século XIX, onde ela
se situava na confluência entre a História, a Geografia – entendida de forma
dinâmica, isto é, como o modo como a sociedade se integra ao meio – e sua
relação com constituição e luta dos Estados, até a sua feição mais
contemporânea, que sofreu a influência da autonomização das reflexões sobre
a Política e as Relações Internacionais. Além disto, se este tema fosse
incorporado, teríamos de tratar com alguma minucia das difíceis relações entre

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a Geopolítica e a Economia Política Internacional, em especial na sua variante


dita “crítica”, onde os laços com a História são mais vigorosos.

Há, também, outro motivo para deixar em segundo plano a Geopolítica.


Hoje ela está muito mais próxima da Política Internacional, por pelo menos dois
motivos:

1. O seu conceito operativo básico é, tal como na Política Internacional, o


equilíbrio de poder;
2. Por conta da centralidade do equilíbrio de poder, a Geopolítica tende a
conceber a forma e a dinâmica da economia internacional como uma
derivação indireta dos arranjos políticos entre as grandes potências.

Este mesmo padrão de raciocínio é típico das reflexões geopolíticas


contemporâneas sobre o declínio da Grã-Bretanha: o sentido dominante da
explicação repousa na tendência à bipolaridade, precipitada pela ascensão da
Alemanha (e acirrada pelo suposto isolacionismo estadunidense) e
sacramentada em 1907, com a Grã-Bretanha se sentindo forçada a aliar-se
contra a Alemanha. As considerações sobre as transformações econômicas a
depressão do XIX são vistas predominantemente como um gatilho para a
remodelação da rivalidade política, expressa na simbiose entre o capital
“nacional” e o Estado.

Essa orientação fica particularmente evidente também no debate atual


sobre o futuro do dólar: os autores identificados à Geopolítica centram a sua
análise na função de reserva de valor e usam como parâmetro básico as
possíveis transformações na correlação de forças entre as potências regionais
que poderiam criar um contrapeso à potência que emite a moeda padrão .

Em última análise, portanto, é o conceito de equilíbrio de poder que


ocupa uma posição central nestas interpretações.

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RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Na perspectiva dos entusiastas das Relações Internacionais, há uma


questão que opera como um verdadeiro divisor de águas: as RI podem constituir
uma disciplina autônoma (como a Sociologia, por exemplo, que “lutou” contra a
História, a Filosofia e a Economia Política Clássica para poder definir seu método
e seu objeto), ou, pelo contrário, ela está irremediavelmente atada à Política
Internacional, ou então, sob outro ponto de vista (claramente minoritário), à
Economia Política Internacional? Esta questão tem duas dimensões: a mais
banal diz respeito principalmente a indagações sobre o lugar a ser ocupado pelas
Relações Internacionais/Política Internacional na estrutura burocrática da
Universidade e das demais instituições de pesquisa.

A segunda dimensão desta indagação muito mais importante, mas que


nem sempre prepondera diz respeito ao tipo de conhecimento a ser produzido,
que demandas sociais ele visa atender e como ele pode ser empregado
concretamente pela sociedade. É este aspecto que será privilegiado aqui.

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Vamos, inicialmente, partir dos pontos consensuais: o objeto das Relações


Internacionais compreende o sistema internacional, que é composto
prioritariamente pelos Estados e as instituições interestatais, mas que envolve
também os atores que se movem na zona transnacional: Ong´s, empresas
transnacionais etc.

Assim, a característica definidora do sistema internacional é o seu


formato anárquico, isto é, a inexistência de uma entidade soberana e legítima
capaz de ordenar as relações entre os atores que o compõe.

A mescla entre a dimensão interestatal o objeto por excelência da


Política Internacional e dimensão transnacional (em que, prioritariamente, se
move a Economia Política Internacional) é que traz ao centro da discussão,
reiteradamente, a questão do diálogo entre estas tradições e, simultaneamente,
impõe dificuldades crescentes à definição das RI como uma ciência ou, até
mesmo, como uma disciplina. Contudo, a simples existência dessa polêmica é
reveladora.

E o motivo é óbvio, embora nem sempre destacado. Pelo menos desde


a Era Moderna, o nascimento de uma nova área do conhecimento sempre esteve
ligado a demandas sociais específicas, as quais derivam de transformações
significativas na realidade social. Este processo de formação, uma vez iniciado,
gera padrões discerníveis que tendem para a especialização, isto é, a uma clara
delimitação do objeto e, simultaneamente, a criação de um método específico.
Em resumo: o ponto de partida é sempre uma tensão social, que exige respostas
que se situam simultaneamente no plano da prática e no plano intelectual.

A maturidade científica é supostamente atingida quando os


desenvolvimentos intelectuais perdem a conexão direta com os problemas
cotidianos. Neste estágio, surgem problemas estritamente teóricos, que dizem

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respeito prioritariamente ao método e a coerência do objeto, e que acabam por


produzir a disseminação de diversas correntes disputando a primazia.

Entretanto, antes de nos aventurarmos nesta questão decisiva, é


necessário retroceder um pouco, destacando as pressões sociais e os
ambientes institucionais que se encontram por trás da generalização das
reflexões em torno das Relações Internacionais.

A SOCIEDADE INTERNACIONAL

Devido à arraigada visão de que o Estado é a manifestação natural de


qualquer sociedade complexa, sempre houve resistência nos círculos científicos
à ideia de que o Sistema Internacional poderia ser concebido como uma
sociedade internacional. Mas, apesar disto, o cenário internacional apresenta
regras e padrões de conduta que vigoram até nos momentos de crise
internacional aguda.

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Logo, embora formalmente anárquico, o sistema internacional é provido


de um tipo de ordem que não pode ser concebida como um mero reflexo da
interação de Estados. Esta suposta ambiguidade sempre trouxe dificuldade para
a disciplina Relações Internacionais. Um estímulo importante veio de outro ramo
do conhecimento: a antropologia que, durante as décadas de 1950 e 1960,
renovou as perspectivas em torno do clássico tema das “sociedades primitivas”.

Diversos preconceitos foram derrubados. Em primeiro lugar, tanto na


economia quanto na política, muitas destas sociedades não são tão simples
assim. O termo “economia natural” perdeu a aura pejorativa: é exatamente pelo
fato das unidades econômicas terem elevado grau de autarquia que a economia
no sentido que os economistas atribuem ao termo é marginal na reprodução da
sociedade e, portanto, está sempre subordinada a outras relações sociais, que
engendram sistemas sofisticados de troca, que podem prescindir da moeda ou
da mediação dos mercados.

Além disto, praticamente todas as sociedades ditas “sem Estado”


possuem algum grau de segmentação social e mecanismos de disputa de poder
e de organização das relações sociais. Logo, são sociedades políticas, mesmo
que desprovidas de um aparelho baseado no monopólio da violência e
especializado na manutenção da ordem social.

Estavam dadas as condições para um diálogo cada vez mais sistemático


entre a Antropologia e a Política Internacional/Relações Internacionais. Uma das
primeiras correntes do pensamento a adotar a ideia de que o Sistema
Internacional pode ser concebido como uma sociedade peculiar foi a Escola
Inglesa das Relações Internacionais. Discutiremos logo em seguida as demais
características desta vertente teórica.

No momento temos de ressaltar apenas um aspecto central: a sociedade


internacional é, nesta corrente, essencialmente, vista como uma sociedade de

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Estados que, pragmaticamente, respeitam um conjunto de regras comuns. No


entanto, existem pelo menos outras duas formas de se conceber a sociedade
internacional.

Uma das matrizes, que antecede a escola inglesa, parte de Norman


Angell e situa o centro de gravidade não nas relações interestatais, mas,
sobretudo, nas relações transnacionais que se irradiam pelo sistema
internacional, explorando a porosidade das fronteiras. Neste caso, como bem
definiu Fred Halliday, tratasse de uma sociedade que vai além das fronteiras e
que, exatamente por causa disto, dilui a influência do Estado e, portanto, eleva
o poder do indivíduo.

Há também uma terceira forma de conceber a Sociedade Internacional,


muito influenciada por Burke: a criação geralmente pela tradição de normas
compartilhadas, que se fundam na conexão entre a estrutura interna das
sociedades e o ambiente internacional.

Comunidade internacional: consiste em agrupamentos formados


naturalmente, de viés orgânico, caracterizando um vínculo subjetivo e
espontâneo, em que as relações de trabalho se consubstanciam pela forte
participação dos seus semelhantes por se sentirem integrantes do grupo.

Na sociedade internacional, não existe este elemento de comunidade. O


que existe é uma sociedade de Estados e/ou organizações internacionais que
mantêm entre si relações mútuas baseadas em conveniência e interesse.

CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

➢ Sociedade Internacional (no Direito Internacional Público Clássico):

Universal: Abrange todos os entes do globo terrestre;

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Paritária: Uma vez que nela existe igualdade jurídica;

Aberta: Significa que qualquer ente que reúna determinadas


características pode se unir a sociedade Internacional.

➢ Sociedade Internacional Contemporânea:

Universal: A universalização é caracterizada por um cenário internacional


caminhando para a unidade, marcado pela eliminação das fronteiras. Um bom
exemplo para essa tendência são os blocos econômicos (Mercosul, União
Europeia).

Novos atores internacionais: Os novos atores internacionais representam


uma nova ordem mundial, na qual não existem apenas sujeitos internacionais,
dotados de personalidade jurídica internacional; mas também pessoas que
apresentam papel de destaque no cenário internacional. Exemplo: ex-chefes de
estado, grupos terroristas.

Anarquia: A anarquia no cenário internacional representa a atual estrutura


harmônica, em que os Estados são soberanos e independentes. A atual
sociedade é anárquica, ou seja, marcada pela ausência de um poder central que
dite as regras, oriente e subordine os Estados.

OS SUJEITOS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

São sujeitos de direito internacional público: Estados, organizações


internacionais intergovernamentais e indivíduos. Os atores incluem também as
ONGs e as multinacionais.

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OS FUNDAMENTOS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

O direito internacional público se baseia no consentimento e vontade


livre dos Estados. A sociedade internacional tem características próprias,
derivadas da especial circunstância da soberania e independência de seus
membros.

A ORDEM JURÍDICA DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

Ordem jurídica é um conjunto de princípios e regras destinados a reger


situações que envolvam determinados sujeitos. Não pertence ao conceito de
ordem jurídica a ideia de centralização de poder, apesar de que essa ideia
certamente existe no direito interno dos Estados.

A inexistência de um poder centralizador no Direito Internacional gera a


ideia de que a ordem jurídica da sociedade internacional é descentralizada, uma
vez que nesse âmbito jurídico, diferentemente do sistema jurídico interno, não
vai existir uma centralização de poder nem uma autoridade com o poder de impor
aos Estados as suas decisões.

Assim, não existe ainda nenhum órgão com jurisdição geral capaz de
obrigar os Estados a decidirem de determinada maneira suas disputas. A
participação como parte de um conflito de um Estado em Tribunais Internacionais
requer o consentimento expresso dele, sem o qual os Tribunais não podem
exercer jurisdição sobre ele. Assim, as relações jurídicas internacionais se
desenvolvem em nível horizontal, o que evidencia o caráter das normas de
organização da sociedade internacional.

A subordinação, clássica da ordem interna, vai dar lugar à coordenação


(ou cooperação) na ordem internacional, motivo pelo qual a vontade e o
consentimento dos Estados ainda é o motor da sociedade internacional
contemporânea.

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O fato da ordem jurídica internacional ser horizontal, sem um poder


central autônomo, não significa que não exista, nesse plano do direito
internacional, um sistema de sanções, o que é visualizado na Organização das
Nações Unidas. O que ocorre é que essas sanções podem ser ditas como mais
imperfeitas do que as típicas do direito interno dos Estados. Apesar de ser
descentralizada, existem normas de conduta interna entre os sujeitos de DIP.
Mesmo ainda embrionárias, essas normas compõem uma ordem jurídica. Nada
depois da cena internacional, principalmente depois da criação da ONU em
1945, leva a crer ser incompatível o conceito de descentralização com a
existência de um sistema de normas capaz de gerenciar as atividades da
sociedade internacional.

A IMPORTÂNCIA DA SOCIEDADE INTERNACIONAL

A vida em sociedade é permeada de conflitos interpessoais, e na


sociedade internacional igualmente há tensões entre os atores, tendo em vista
as inúmeras disputas entre os sujeitos, uma vez que há diferenças e interesses
variados entre os mesmos. O Direito Internacional surgiu no momento da
assinatura do Tratado de Westfalia, em 1648, na Idade Moderna, no qual fora
reconhecida a Independência da Suíça e da Holanda. Embora boa parte dos
juristas reconheça a existência de um direito internacional apenas a partir da Paz
de Vestfália, marco histórico do Estado-nação moderno, é inegável que os povos
da Antiguidade mantinham relações exteriores: comerciavam entre si, enviavam
embaixadores, vinculavam-se por meio de tratados e outras formas de
obrigação, e assim por diante.

O desafio que o direito internacional hoje enfrenta, nesta era de risco e


de globalização, é o de construir, sobre os alicerces da soberania nacional e dos
direitos dos estados, uma nova ética global, assente nos direitos humanos, no
estado de direito constitucional e no direito penal internacional. Este é um

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horizonte que já desponta: a do direito internacional como nova ética da


globalização.

POLÍTICA INTERNACIONAL
Política internacional é a conduta e o conjunto de decisões adotadas
pelo estado em suas relações com outros estados, na defesa de interesses
gerais, humanos, como a guerra e a paz, o armamento e o desarmamento. As
deliberações sobre os rumos da política internacional de um estado são tomadas
geralmente pelos funcionários do mais alto posto de um governo, como o
presidente da república ou o primeiro-ministro, e executadas pelo ministro
encarregado das relações externas do país. A área de atuação da política
internacional é vasta e seu exercício se dá em nível multilateral, em organismos
internacionais, conferências de cúpula ou reuniões de vários estados.

Tendo como referência o mainstream, especialmente no caso dos


países de língua inglesa, é quase consensual a ideia de que o interesse pela
Economia Política Internacional enquanto um campo acadêmico relativamente
autônomo ganhou impulso na década de 1970, no mesmo ambiente que
favoreceu a generalização da reflexão em torno das Relações Internacionais: a
percepção de que uma crise geral estava em curso e que, portanto, parecia cada
vez mais fundamental rever as formas de conhecimento cristalizadas durante a
grande expansão (e intensa burocratização) da Universidade que se seguiu à
Segunda Guerra mundial. Susan Strange, em um texto provocativo, publicado
em 1970, deu um passo importante ao reivindicar a necessidade de constituir a
Economia Política Internacional como uma disciplina autônoma, porém baseada
na articulação entre dois ramos excessivamente especializados: a Economia
Internacional e Relações Internacionais.

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Como havia uma percepção generalizada de que as transformações


significativas na Economia Mundial estavam reforçando as perspectivas mais
radicais tais como o marxismo e a teoria da dependência que sempre
mantiveram viva a relação entre a Economia e a Política, pareceu plausível
aproximar estes dois campos do conhecimento, mas sem afrontar o
establishment.

Com o arrefecimento relativo da tensão nuclear durante a deténte, os


especialistas em Política e Relações Internacionais ficaram mais propensos a
abrandar o peso quase absoluto da dimensão interestatal e integrar de forma
mais consistente as reflexões dos economistas.

O “desafio” proposto por Strange na Inglaterra foi rápida e


entusiasticamente aceito no outro lado do Atlântico, em especial por autores
como Charles Kindleberger, Robert Keohane e Joseph Nye (que atuaram em
uníssono por quase 20 anos), Stephen Krasner e, ao seu modo, Robert Gilpin.
Na ocasião, nos círculos acadêmicos estadunidenses, a reflexão sobre as raízes
e a dinâmica da interdependência estava sendo transposta para o reino da
política, em um esforço para se levar em conta o papel dos Estados e dos atores
não-estatais (tais como, por exemplo, as empresas transnacionais), a
possibilidade de um retorno do protecionismo que poderia despedaçar de vez as
estruturas do comércio internacional.

Com esta mudança de terreno, e levando em conta o vocabulário


constituído pelas Relações Internacionais, a polêmica tendia a aparecer
inicialmente como uma contraposição entre a centralidade das relações
transnacionais (muito associadas às “forças do mercado”) ou das relações
interestatais na estruturação da ordem internacional.

Frente a esta polarização inicial, foram buscadas soluções conciliatórias.


E é exatamente esta busca que sedimentou a reflexão sobre a Economia Política

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Internacional. Vamos começar pelo que ocorreu nos EUA. Lá, a trajetória foi
bastante curiosa: institucionalmente, foram os cientistas políticos que se
apoderam da agenda de pesquisas, marginalizando os economistas (que, na
verdade, cederam voluntariamente o espaço) e, no final das contas, a própria
Economia Política Internacional acabou se convertendo em um ramo das
Relações Internacionais.

Mas esta “vitória” da Ciência Política foi ilusória: na realidade, como ficou
ainda mais claro no período imediatamente posterior, a despeito dos movimentos
da superfície, o que marcou a década de 1970 e 80 foi a colonização definitiva
do mainstream da Ciência Política estadunidense pela problemática da
concepção ortodoxa de Ciência Econômica, que estava extravasando o seu leito
de origem. Este período, na realidade, é a condensação de um longo e sinuoso
processo, cujas raízes são muito anteriores.

A “Revolução Marginalista” já tinha livrado os economistas da


“metafisica” e do subjetivismo ao delimitar muito precisamente o objeto da
Economia e, a partir daí, isolar os comportamentos econômicos do homem. Este
movimento havia se dado em clara oposição não somente à Escola Histórica
Alemã o opositor mais evidente mas também à sociologia e à antropologia que,
naquela altura, estavam mapeando a ampla variabilidade dos comportamentos
sociais.

Porém, ao longo do tempo, alguns economistas se deram conta de que


a metafísica não tinha sido totalmente purgada: ainda era muito frequente a tese
de que o comportamento econômico do homem era o resultado de traços da
natureza humana (como o egoísmo e a competitividade) ou de uma inata
propensão à troca. Embora tenha insistido com veemência na especificidade dos
comportamentos econômicos do homem, é bastante conhecida a crítica de
Schumpeter à tendência de os economistas tomarem o homo economicus como
um traço da natureza humana, ao invés de um simples recurso heurístico, cuja

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única função é ilustrar a lógica do comportamento econômico. Uma “mini


revolução”, capaz de radicalizar o que já havia sido posto em movimento,
começava a se delinear.

O aspecto fundamental é a combinação entre o pressuposto sobre a


diversidade dos indivíduos96racionais em condições de escassez. Isto é, a
Ciência Econômica começava a ser vista essencialmente como uma ciência da
escolha em situações de escassez (onde os atores coletivos enquanto simples
agregados de indivíduos devem ser vistos como a unidade de análise).

Logo, a análise econômica podia, portanto, ser estendida para qualquer


domínio social que tivesse pelo menos quatro características: uma variedade de
fins (inerente à própria ideia de que os indivíduos são idiossincráticos ou dotados
de livre-arbítrio); uma gradação de importância entre estes fins; a limitação dos
meios para obtê-los (escassez) e a possibilidade de empregar tais meios de
formas variadas. Estava aberta a possibilidade de expandir esta lógica para a
maior parte das esferas da existência social (e até mesmo, para a biosfera:
hienas, lobos, ursos, bactérias etc. Todos são maximizadores de utilidades e
adequam seu comportamento em função da escassez dos recursos).

As raízes desta “mini revolução” se situam já na década de 1930, mas,


dadas as condições adversas ao laissez faire a partir desta data, este estilo de
pensamento ficou dormente até encontrar um terreno favorável. As tensões
gerais da década de 1970 possibilitaram o seu desabrochar, embora de forma
ainda tímida. E este mesmo clima gerou as discussões que culminaram na
consolidação da Economia Política Internacional nos EUA.

É bastante difundida a visão de que este ramo do conhecimento se


estruturou inicialmente no debate em torno da Teoria da Estabilidade
Hegemônica, associada ao nome de Charles Kindleberger. Mas algumas
qualificações são necessárias. Essa “teoria” foi deduzida a partir da publicação

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de The World in Depression (1973), especialmente com base em um elemento


de sua explicação sobre as raízes da crise de 1929: a tese de que sua
profundidade, grande extensão e resiliência se devia à falta de uma clara
liderança internacional capaz de estabilizar e coordenar o sistema.

Como evidência, de forma bastante controversa, ele contrapôs dois


períodos marcados por uma clara liderança internacional (a Grã-Bretanha na
segunda metade do XIX, os EUA no imediato pós II Guerra Mundial) com o
entreguerras, cuja peculiaridade era exatamente a falta de liderança: a Grã-
Bretanha tinha vontade mas não tinha mais condições e os EUA tinham
condições mas não aspiravam liderar.

Mas, a princípio pelo menos, o autor não tinha nenhuma pretensão de


criar uma “teoria” deste tipo. Ele inclusive rejeita o termo hegemonia, enfatizando
a predileção pelo termo liderança e, até mesmo, responsabilidade (isto é, o país
líder assume a responsabilidade pelo sistema). Quem batizou a teoria foi um de
seus adversários: o termo “estabilidade hegemônica” foi cunhando por Robert
Keohane a partir de uma crítica às posições de Kindleberger (e de Robert Gilpin).
Um dos pilares da interpretação de Kindleberger repousa na ideia de que o líder
é o principal ofertador e regulador dos bens coletivos a estabilidade em especial
e, por extensão, teria de cumprir pelo menos cinco funções críticas:

➢ Manter um mercado relativamente aberto para mercadorias


excedentes;
➢ Prover linhas de crédito contra-cíclicas (ou pelo menos estáveis);
➢ Garantir um mínimo de estabilidade no sistema cambial;
➢ Coordenar as políticas macroeconômicas e v) operar como um
emprestador de última instância.

A primeira vista e levando em conta o papel ativo de Kindleberger na


formulação e implementação do Plano Marshall, enquanto ocupou cargos no

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Departamento de Estado entre 1945 e 48 a tendência dominante foi rotular esta


variante da Teoria da Estabilidade Hegemônica como “benigna”, isto é, fundada
no pressuposto de que o país líder, mesmo sendo capaz de exercer uma forte
influência na estruturação do sistema (que, portanto, tende a assumir uma forma
compatível com seus interesses), acaba por arcar com a maior parte dos custos
de gestão.

Mas há uma dimensão do seu pensamento que não é tão magnânimo.


Por depender de uma liderança durante a constituição e nos momentos de
desajuste, uma economia internacional liberal não é capaz de se autorregular.

Este tipo de economia sequer é capaz de se estruturar de forma


espontânea: sem que um Estado poderoso adquira a habilidade de internalizar
e moldar um conjunto de regras favoráveis ao free trade, a tendência geral é o
protecionismo e políticas defensivas, que inviabilizam uma ordem liberal. Logo,
o comércio e a finança internacional não possuem nenhuma tendência natural à
abertura ou à expansão. Além disto, Kindleberger ressalta na edição original
deste livro e reforça a mesma a posição 13 anos depois, em sua reedição que
este papel de liderar a economia mundial só poderia ser feito por um país.

Como a percepção era de que a liderança dos EUA e o próprio sistema


de Bretton Woods começava a entrar em crise, estas afirmações geraram um
intenso debate, que, de certo modo, estruturou tanto as Relações Internacionais
quanto a Economia Política Internacional nos EUA.

Como, por motivos óbvios, os Cientistas Políticos tendem a ver a


economia mais como um recurso de poder (isto é, um meio, não um fim), não
tardou a formulação de uma perspectiva centrada na visão oposta, isto é, de que
o hegemon só arcava com os custos na medida em que ele fosse capaz de
traduzir a liderança em vantagens concretas, especialmente no que diz respeito
à dimensão da segurança internacional. Robert Gilpin embora tenha reconhecido

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em diversas ocasiões a importância seminal dos estudos de Kindleberger foi,


como veremos logo a frente, um dos principais expoentes desta crítica.

Uma segunda objeção, encabeçada por Keohane, refletindo sobre a


variante atribuída à Kindleberger, fundamenta-se na ideia de que, logicamente,
não há nada que restrinja a capacidade de coordenar a ordem internacional e
prover os bens coletivos a apenas um Estado: dois ou mais Estados podem agir
em conjunto, proporcionando a estabilidade em todos os níveis da interação no
sistema internacional, isto é, desde a segurança à gestão dos regimes e da
economia.

Contudo, a crítica mais devastadora que é congruente com a ideia de


uma hegemonia mantida por uma concertação de potências em afinidade com
laços transnacionais entre os principais Estados era baseada em uma simples
questão, reiterada por Keohane, Krasner e Nye no calor dos acontecimentos: se
a hegemonia de um só pais é tão fundamental para garantir a operação de uma
economia liberal, porque a interdependência internacional aumentou na década
de 1980, onde supostamente a hegemonia dos EUA e a capacidade dos Estados
controlarem as corporações transnacionais - estava em declínio? Estes eram os
termos gerais do debate. Podemos agora destacar o que é realmente essencial.

Em certo sentido, esta “teoria” situa-se em um ponto de interseção entre


duas correntes do pensamento muito distintas: o realismo político e o liberalismo,
onde de um modo geral, predomina a segunda. No limite, a Teoria da
Estabilidade Hegemônica não passa da transposição dos axiomas básicos do
liberalismo para a arena internacional, levando em conta, entretanto, sua
peculiaridade: a forma anárquica de ordenamento político.

Todos os modelos produzidos pela Ciência Econômica têm como


pressuposto básico (porém, por vezes oculto) a presença do Estado como a
única autoridade formal capaz de ofertar em seu território os bens coletivos

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essenciais: a moeda, o direito e o poder de coerção (polícia, exército). Somente


por conta da presença do Estado é que os “atores econômicos” podem reduzir
com segurança a sua autonomia isto é, abdicar da capacidade de, enquanto
unidades econômicas, produzirem diretamente seus meios de vida e, desse
modo, sociabilizarem-se por intermédio das redes de interdependência
articuladas pelo mercado.

Logo, as regras do jogo na economia nacional são fundamentalmente


diferentes das que caracterizam a economia internacional. Disto decorre que a
ausência de uma fonte de autoridade centralizada e estável modifica
essencialmente os parâmetros do sistema e o comportamento dos agentes.

Assim, a forma e o grau de abertura da economia internacional


dependem da estabilidade da política mundial que, por sua vez, tem como base
uma configuração do equilíbrio de poder aceita pelos Estados mais poderosos e
seus respectivos blocos no poder. É daí que parte o axioma básico da Teoria da
Estabilidade Hegemônica, em sua formulação mais geral: a hegemonia de uma
potência é a forma mais estável de distribuição de poder e, portanto, a que
permite um maior grau de desenvolvimento da economia internacional pois,
supostamente, a preponderância do hegemon faz com que ele possa (se
desejar...) emular, de forma limitada, as funções de um Estado mundial.

Contudo, a despeito destas observações gerais, Robert Gilpin, que


possui uma relação ambivalente com esta corrente teórica, ressaltou com mais
veemência um aspecto do pensamento de Kindleberger: a simples
preponderância de uma potência não garante que a ordem seja liberal. Para que
isto ocorra são necessárias ao menos 3 condições:

➢ A potência hegemônica precisa possuir estruturas econômicas e


políticas internas (a capacidade de internalizar as regras do free

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trade, na formulação de Kindleberger) compatíveis com uma


economia mundial liberal;
➢ Deve existir um número considerável de potências intermediárias
compatíveis com um sistema econômico internacional aberto;
➢ Deve preponderar um ambiente ideológico geral propício ao
pensamento liberal (comunidades epistêmicas, embedded
liberalism (ou algo do gênero)) para que os interesses da potência
dominante possam aparecer como coincidentes com os interesses
gerais.

Outro elemento da posição de Gilpin e que também coincide com a visão


de Kindleberger é a tese de que os “sistemas hegemônicos” são intrinsecamente
instáveis e, embora possuam durações variáveis, inevitavelmente, entram em
declínio. Uma das fontes de crise deriva da própria estrutura da economia política
internacional, isto é, o fato de estar ancorada na tensão entre a lógica do
mercado e do Estado, que gera um descompasso entre a distribuição de poder
político e econômico: o próprio dinamismo do mercado cuida de redistribuir a
riqueza e, desse modo, a criar instabilidades crescentes.

A segunda fonte de instabilidade é a possibilidade na verdade, do modo


como Gilpin raciocina, isto é quase uma tendência geral do hegemon explorar a
sua posição dominante para satisfazer suas necessidades e objetivos mais
imediatos, tendendo ao unilateralismo e ao uso de medidas coercitivas,
precipitando desse modo a redução de sua legitimidade.

O grande mérito de Gilpin foi tentar assimilar boa parte das críticas à
Teoria da Estabilidade Hegemônica e, o que é mais importante, vinculá-la às
preocupações mais gerais sobre a dinâmica e as condições que presidem a
transformação social. Isto o obrigou a confrontar conceitos, teorias e hipóteses
oriundas de tradições distintas

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➢ Realismo político, marxismo, perspectiva do sistema-mundo, a


teoria da economia dual etc.
➢ E levar em consideração o que ele costuma chamar de
“experiência histórica”.

Logo, ele é um exemplo vívido do estilo de reflexão produzida nos EUA


após as tensões e incertezas vivenciadas na década de 1970. Por um breve
momento, parecia ter surgido a possibilidade de um diálogo entre a Ciência
Política e a Economia, nutrido pela história. Mas o resultado final foi
decepcionante: o que se verificou nos círculos acadêmicos dominantes nos EUA
foi a subordinação da Economia Política Internacional às Relações
Internacionais que, embora reconheçam diversos “atores”, só aceita uma lógica,
a baseada no indivíduo racional como a unidade fundamental da análise: os
“cientificistas” ganharam a disputa contra os “tradicionalistas”. Na Grã-Bretanha
a trajetória foi um pouco diferente.

A forte herança da escola inglesa de Política Internacional tendeu a


afastar a reflexão do estilo que predominou nos EUA. Outra fonte importante de
diferenciação veio da Ciência Econômica, em especial, devido ao forte
protagonismo exercido por Susan Strange na fundação da Economia Política
Internacional na Grã-Bretanha.

A principal característica do seu pensamento além do pendor herético e


saborosamente polemista é o seu profundo senso prático que se materializa na
capacidade de ir direto ao que é realmente essencial, sem conceder muito a
floreios “teóricos” ou a modismos acadêmicos. Foi com este espírito que ela
ajudou a consolidar uma das características fundamentais da escola britânica: a
tendência à multidisciplinaridade, apoiada no resgate das tradições da Economia
Política Clássica, mas com uma clara ênfase em uma noção de poder
multifacetada e abrangente e, talvez este seja o traço decisivo, o foco nos

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grandes problemas do sistema internacional, com vistas a compreender as suas


possibilidades de transformação.

Entretanto, foi o modo como Strange concebia o papel das finanças


quando muitos estavam ainda hipnotizados com uma visão muito restrita “da
produção” e seu entrelaçamento com as demais formas de poder do poder do
Estado em especial, que criou uma das linhas de maior influência da escola
inglesa de Economia Política Internacional, que rapidamente transbordou para
estudos de inspiração geopolítica e sociológica, aumentando progressivamente
a diferença com a reflexão predominante nos EUA. O modo como ela delimita o
campo já evidencia a divergência:

A definição, portanto, que eu darei ao estudo da economia política


internacional é que ela abrange os arranjos sociais, políticos e econômicos que
afetam os sistemas globais de produção, trocas e distribuição, e a mistura de
valores aí refletidos. Estes arranjos não são fruto de ordenação divina, nem o
resultado fortuito do mero acaso.

Ao contrário, eles são o resultado de decisões humanas tomadas no


contexto de instituições constituídas pelo homem, por conjuntos de regras auto
institucionalizadas e costumes. Mas a questão fundamental não diz respeito
apenas às dimensões do objeto afinal, como vimos, para muitos, até mesmo
micro-organismos e animais gregários maximizam utilidades e pautam seu
comportamento de acordo com a escassez - mas, essencialmente, como tentarei
apontar, tal alargamento se combina a uma reação à já saliente influência do
“individualismo metodológico”.

Logo, um dos eixos centrais de sua abordagem é que, para tentar


escapar da capciosa tensão entre a determinação do político e do econômico
típica da disputa entre economistas e cientistas políticos, Strange propõe uma
outra distinção: poder relacional e estrutural.

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A primeira forma de poder é, segundo ela, a forma mais empregada


pelos autores realistas na bibliografia convencional de Relações Internacionais:
a capacidade (ou habilidade) de um ator A fazer com que B faça algo que, de
outro modo, não faria. Como se sabe, é exatamente essa a definição de poder
empregada por Robert Dahl, e que gerou infindáveis debates na Ciência Política
estadunidense.

De acordo com Susan Srange, o problema com esta definição é duplo:


o poder relacional é uma forma direta e consciente de exercício de poder,
dificilmente aplicável no terreno das relações internacionais, onde se acentuam
os efeitos não intencionais das ações e formas indiretas de exercício de poder
(como parece ser o caso do poder estrutural). A segunda forma é mais
controversa e exige alguma elaboração.

Como já apontei, Susan Strange sempre teve uma postura mais


pragmática: ela subordina a reflexão teórica aos problemas sociais que visa
apreender. A noção de poder estrutural surgiu no meio de suas interpretações
sobre as tensões das décadas de 1960 e 80, muito antes de ganhar uma forma
teórica mais acabada. Ela chama de poder estrutural a capacidade de modelar
embora nunca fique claro exatamente de que modo isso se processa-as
estruturas onde se dão as interações, isto é, delimitar o escopo e definir os
parâmetros onde o poder relacional se manifesta.

Na segunda metade da década de 1980 ela desenvolveu um pouco mais


o argumento, definindo com mais clareza cada uma delas e, sobretudo, as suas
dinâmicas.

Ela discrimina quatro estruturas: Segurança, Produção, Conhecimento e


Finança. Ou, em termos mais simples: quem detém o poder estrutural é capaz
de controlar a violência organizada, o modo como as mercadorias e serviços são

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produzidas, a oferta e a demanda de crédito e, por fim, controle sobre as crenças,


conhecimento e as ideias.

Em seu entender, não há nenhuma hierarquia predefinida entre elas,


embora uma delas possa dominar. No caso dos EUA, de forma recorrente, ela
afirma que a dimensão financeira é a sua principal fonte de poder, sobrelevando-
se inclusive sobre a sua capacidade militar. A noção de poder estrutural talvez
por ser muito vaga acabou sendo bastante influente, gerando diversos estudos
importantes, centrados na relação entre Poder e Finança e o papel essencial dos
Estados na configuração do chamado “neoliberalismo”.

Para citar apenas dois exemplos: o excelente livro States and the
Reemergence of Global Finance de Eric Helleiner é herdeiro direto da linha
aberta por Strange, especialmente no que diz respeito à capacidade de os EUA
explorarem o seu poder estrutural para forçar o fim da regulação à finança e,
desse modo, enterrarem de vez o que havia sobrado da era de Bretton Woods.
Outro livro importante, embora um pouco exagerado, que busca combinar a ideia
de poder estrutural à crítica de Susan Strange à “teoria” dos regimes
internacionais típica da escola americana é A Roleta Global, de Peter Gowan.

Contudo, o ponto alto do livro é o modo como ele vincula as


determinações no plano do sistema internacional (“globalização”) onde o papel
dos EUA e dos demais Estados proeminentes é decisivo com as transformações
internas nos principais países (“neoliberalismo”). Este parece ser um caminho
bastante frutífero, que flui quase naturalmente da confluência entre as Relações
Internacionais e a Economia Política Internacional. Outra figura chave da escola
inglesa é o canadense Robert Cox.

Mas a sua obra é bastante peculiar pois, por sempre subordinar a sua
reflexão a uma perspectiva emancipatória radical, ele tende a todo momento a
ultrapassar os marcos da Economia Política Internacional e das Relações

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Internacionais. Sua concepção de estrutura, que praticamente se confunde com


a sua noção de produção, por exemplo, discrepa radicalmente da forma usual
como ela é concebida, mesmo no pensamento autoapelidado de crítico. Ela
sempre é contraditória.

Como toda estrutura, ela gera regularidades, sem as quais a vida social
não seria possível. No entanto, como as estruturas são constituídas
essencialmente pela polarização social, elas são dinâmicas e sujeitas à
transformação.

São sempre, portanto, estruturas históricas, isto é, totalidades limitadas,


que constrangem e dinamizam as forças sociais. A seu ver, estas estruturas
históricas podem ser decompostas em três categorias ou forças principais.

As capacidades materiais (similares ao conceito marxista de forças


produtivas), que congregam a capacidade produtiva dinâmica (que inclui a
tecnologia embebida nos instrumentos e na organização da produção) e os
recursos (acumulados ou passíveis de serem mobilizados pela produção); as
ideias, isto é, o conjunto de significados intersubjetivos que atravessam todas as
divisões sociais, bem como as diversas imagens coletivas em antagonismo (as
formas de identidade, que não necessariamente se restringem a classes ou
frações de classe particulares) e, por fim, as instituições, entendidas de forma
ampla (isto é, que consistem em combinações específicas entre ideias e poder
material). Contudo, o ponto mais relevante de sua abordagem diz respeito ao
modo como ele concebe a própria formulação teórica.

Toda teoria tem, necessariamente, uma perspectiva um ponto de vista e


um propósito e, portanto, deve ser observada inicialmente como ideologia.

Teorias que reivindicam a atemporalidade e a neutralidade axiológica,


por tomarem o status quo como uma realidade imutável, sempre oferecem

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apenas “soluções” ajustadas a este horizonte, presas, portanto, à racionalidade


instrumental.

A este tipo de “teoria” Cox dá o nome de problem solving theories.


Contudo, nos momentos de crise social intensa, onde as pressões da realidade
sobre a consciência são muito intensas, o pensamento social é forçado a romper
estes limites, abrindo o caminho para a materialização de teorias críticas: isto é,
visões totalizantes que, mediante uma crítica radical das problem solving
theories vigentes e demais formas de saber denunciando seus interesses
ocultos e seu papel como obstáculo à mudança - visam transcender os limites
ao pensamento e à ação social, para tentar superar a crise por uma via
emancipatória.

Logo, uma teoria crítica é profundamente enraizada na História, pois ela


parte de uma perspectiva genealógica e prospectiva. No primeiro caso, porque
a compreensão das raízes históricas do presente é fundamental para
desconstruir os discursos reificados (que se cristalizam nas problem solving
theories, por exemplo) e explicitar os constrangimentos às possibilidades de
emancipação.

É prospectiva porque tem por objetivo detectar os futuros possíveis que


se abrem à ação humana e, desse modo, propor linhas de ação prática, no intuito
de produzir uma sociedade melhor.

O segundo aspecto importante é que, como já foi adiantado na discussão


sobre a teoria das Relações Internacionais, uma teoria só pode ser
genuinamente crítica se for reflexiva. Logo, uma teoria crítica deve se esforçar
para tentar definir os limites à ação humana constituídos historicamente e
moldados também pelas percepções sobre o futuro em cada caso concreto e,
simultaneamente, levar em consideração os limites intrínsecos ao conhecimento,
dos quais, evidentemente ela compartilha. Em resumo: uma teria crítica deve ser

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capaz de identificar as possibilidades imanentes de transformação social


emancipatória.

A comparação entre a postura de autores como Robert Cox e Susan


Strange com o estilo de reflexão de Robert Keohane, Joseph Nye e até mesmo
Gilpin revela as diferenças entre a tradição estadunidense e britânica.

Nos EUA, como tentei apontar, a reflexão em torno das Relações


Internacionais absorveu e, de certo modo, eclipsou a Economia Política
Internacional. Mas, no processo, para usar uma palavra de predileção de seus
adeptos, ambos ramos do conhecimento foram dominados por um mesmo
“paradigma”: o mal afamado “individualismo metodológico”. Na Grã-Bretanha a
influência do que os cientificistas chamam pejorativamente de “tradição clássica”
foi muito mais intensa, fato que aumentou o peso da História e a tendência à
interdisciplinaridade, diluindo as pressões em favor de um modelo de
pensamento baseado nas ciências naturais.

Mas, no final das contas, em formas e intensidades distintas, nos dois


casos a Economia Política Internacional continua prisioneira de uma capciosa
tensão, adequadamente exposta por Geoffrey Underhill: Se a maior parte da
bibliografia em Economia Política Internacional insiste que a autoridade política
e os mercados são interdependentes e não podem ser analiticamente
considerados de forma isolada, a sua relação é usualmente retratada como uma
relação de antagonismo interdependente.

A lógica política, particularmente a lógica dos Estados, puxa em uma


direção. A lógica econômica, a lógica os mercados, puxa em outra. A sagacidade
ou a legitimidade política pode ser invocada para controlar as forças de mercado,
ou as forças de mercado podem derrotar a tentativas de definição política dos
resultados, mas nos dois casos, Estados e mercados existem em repulsão.

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Podem afetar um ao outro de forma recíproca, mas eles permanecem processos


separados dento de um todo social mais vasto.

Contudo, embora o diagnóstico seja excelente, a solução proposta pelo


autor para tentar superar o “cabo de força” entre o Estado e o Mercado é pouco
convincente. A ideia é tentar substituir a dicotomia Estado versus Mercado por
uma perspectiva baseada na simbiose entre os dois, mediante um modelo
exoticamente batizado de state-market condominium que tenta embaralhar, de
forma confusa, a lógica dos processos com a dos atores tendo como uma das
diretrizes um traço bastante singular da interpretação de Susan Strange: [a] sua
insistência de que não devemos focar nos Estados e mercados enquanto tais,
mas na interação entre a autoridade política e o mercado. Autoridade política
não é uma prerrogativa nas instituições formais dos Estados e suas ramificações
de governança tais como os regimes, mas está presente também nos agentes
do mercado como parte do condomínio Estado-Mercado.

O mercado é governança, mesmo que ele pareça operar em misteriosas


formas privadas. Este tipo de “fusão” é uma solução pior do que a proposta por
Robert Cox, por exemplo, que aparentemente se assemelha a esta visão, ao
propor a interpenetração do Estado e da Sociedade Civil como um dos marcos
do período contemporâneo. Mas ele o faz de forma muito mais sofisticada e
dinâmica, pois congrega a “internacionalização” do Estado (que ajuda a
amalgamar Estado e Sociedade Civil em uma escala internacional) e da
Produção (que exige a interpenetração entre elementos do poder público e do
setor privado) levando em conta o modo como esta articulação ganha concretude
na configuração de uma estrutura de classes peculiar, onde a “autoridade
política” nos termos aqui definida, se concretiza nos atritos entre a classe dos
“administradores transnacionais” (que combina elementos da vida privada e
autoridades públicas), e as forças sociais que tendem ao nacionalismo.

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É claro que esta postura gerou e continuará a gerar diversas


controvérsias. Mas, pelo menos em potência, ela aponta para a necessidade de
tentar suplantar as especialidades acadêmicas e recoloca no centro da análise
o conflito entre as classes e os grupos sociais enquanto forma suplementar de
identidade social.

POLÍTICA INTERNACIONAL, POLÍTICA DE PODER

A análise das relações entre os países e a literatura sobre o tema


mostram que o poder é o elemento básico da política internacional, como o é da
política interna. Por isso, o objetivo supremo da política internacional seria a
aquisição do poder e os estados teriam seu comportamento internacional
regulado pelo princípio da acumulação do poder. Dentro dessa ordem de ideias,
o poder é o meio de fazer amigos e intimidar os inimigos. Por essa razão
tornaram-se dominantes nos estudos atuais de política internacional os
problemas do armamento, da diplomacia e da economia do poder, do
imperialismo regional e universal, das alianças, da balança de poder e da guerra.

Da maneira como se comportam as nações na esfera internacional se


conclui que os interesses que as orientam podem pertencer a uma de três
ordens:

(1) Os que se explicam pela tentativa de exercer influência sobre certas


áreas e certos povos que se encontram fora da jurisdição do estado. Essa
intenção de subordinação dá lugar ao que se chamou política imperialista. As
nações que se pautam permanentemente por esses interesses são
consideradas potencialmente agressoras.

2) Os que visam a preservar a autodeterminação e dos quais resultam


ações opostas à intervenção de outras nações. As nações que se orientam por
esses interesses são chamadas potencialmente agredidas.

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(3) Finalmente, os que correspondem à necessidade de obter uma


colaboração voluntária de outros estados para a consecução dos objetivos
nacionais. Esses interesses existem tanto nas nações fracas como nas fortes e
para protegê-los é necessário conquistar uma posição que permita oferecer uma
compensação ao estado cuja cooperação se deseja. É o que se chama o poder
de barganha, por meio do qual todos os estados fracos ou fortes executam uma
parte apreciável de sua política externa ou internacional.

Daí resultam três diferentes padrões de política internacional, que


podem ser classificados de acordo com a distribuição do poder, a saber: o
sistema imperial, o sistema múltiplo e o sistema bipolar. O sistema imperial
consiste na predominância de uma nação sobre certo número de estados
subordinados a ela. A estabilidade desse sistema é grande e os conflitos são,
quase sempre, marginais. Sua existência pode ser ameaçada pela
desintegração do elemento predominante, pela ascensão de um grupo de
membros subordinados a uma posição em que podem desafiar o dominador e
pelo desafio vindo de fora. O exemplo clássico desse padrão de relações
internacionais é o império romano e, posteriormente, o império britânico.

O sistema múltiplo distingue-se pelo número de unidades que dispõem


de força aproximadamente igual e se combinam ou se opõem umas às outras
em posições sempre mutáveis. Suas principais características são a flexibilidade
e a incerteza em relação à força relativa, às diretrizes futuras de seus membros
e a propensão para guerras limitadas ou de resultados provisórios. O exemplo
desse sistema é o agrupamento dos estados europeus que vigorou desde o
Tratado de Vestfália, firmado em 1648, no final da guerra dos trinta anos, até o
começo da primeira guerra mundial, em 1914, com exceção das guerras
napoleônicas.

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O sistema bipolar caracteriza-se pela predominância de dois poderes de


forças aproximadamente iguais, em torno dos quais se agrupam os outros
estados em grau maior ou menor de adesão. Esse sistema é rígido e estável
enquanto persiste uma distribuição equivalente de poder entre os dois poderes
dominantes. O exemplo é a estrutura das relações internacionais que vigorou
desde o final da segunda guerra mundial até a dissolução da União Soviética.

São, portanto, os padrões de poder que realmente regulam as relações


entre os estados, do que se conclui que a política é inseparável do poder. Os
estados e os governos existem para exercer o poder. Em cada país e no mundo
como um todo existe sempre um equilíbrio estável de poder, um equilíbrio
instável ou então nenhum equilíbrio. A política externa de uma nação consistiria,
então, na arte de mobilizar todos os elementos integrantes do poder nacional,
com o propósito de defender os interesses nacionais na esfera internacional.

FORMAS DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

A essência da política internacional é, portanto, a luta pelo poder. Os


estados que possuem amplo poder para influir no curso dos acontecimentos
mundiais são chamados potências, ao contrário dos estados que cessaram de
ser ou nunca foram protagonistas no teatro da política internacional. Nas inter-
relações estatais entre as potências e as não-potências, há, pelo menos, cinco
tipos específicos; a competição, a cooperação, a oposição, o conflito e a
conciliação. Todas essas interações estão exemplificadas no curso da história.
Uma das maneiras mais duradouras encontradas pelas grandes potências para
equilibrar essas relações, sob qualquer de suas formas, foi a chamada balança
de poderes.

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CONCLUSÃO

Embora extremamente complexas, as interações entre os três ramos do


conhecimento aqui discutidos estão ganhando alguns contornos mais definidos.
Uma primeira aproximação do problema irá apontar que, pelo menos desde a
década de 1970, há uma tendência à multiplicação dos temas e ao
entrecruzamento dos objetos que, aparentemente, aponta para a
interdisciplinaridade. Mas isto não se processa de modo uniforme. Pelo contrário.

A despeito das inúmeras sutilezas e variantes há, no plano do saber, um


grande movimento que se ramifica em duas grandes tendências em polarização,
que se manifestam com um colorido especial em cada uma das três áreas do
conhecimento em pauta. De um lado, uma tendência à aproximação do método
das ciências naturais, caricaturada pelos adversários como “positivismo” ou
“cientificismo”. De outro, situa-se outra tradição, rotulada de “tradicional” pelos
seus antagonistas, muito mais afeita à História e, de certo modo, à hermenêutica.

Seus adeptos gostam de serem chamados de “críticos”, epíteto que,


evidentemente, não é reconhecido por seus rivais. No primeiro pólo, os diversos
temas e a concatenação dos objetos (a “interdisciplinaridade) é possível pela
generalização de uma lógica cuja base fundamental é o indivíduo em situações
de escassez, onde a alternância entre a cooperação e o conflito é explicada
essencialmente pelas pressões competitivas dos diversos sistemas que
constrangem os atores sociais (entendidos, sempre, enquanto unidades em
competição).

Esta mesma lógica é a base tanto das perspectivas mais ortodoxas muito
mais restritivas, no que tange à possibilidade de um conhecimento
interdisciplinar quanto das mais heterodoxas. Neste caso, para articular objetos
distintos (ou, pelo menos, para combinar o domínio da Economia e da Política),
como tentei indicar, é comum recorrer a tipos ideais e/ou então à metáfora de

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um “jogo” disputado em múltiplos tabuleiros, onde a especificidade do “tabuleiro”


modifica as capacidades relativas dos atores e, portanto, altera as estratégias e
as interações.

Logo, essencialmente, o que permite o diálogo entre disciplinas distintas


é, exatamente, a ideia de que, em todos os casos, há uma disputa entre atores
racionais por recursos finitos, que gera uma tendência geral à maximização dos
rendimentos e minimização dos custos. O outro polo é muito mais heterogêneo.

O único elemento unificador é a rejeição às premissas e ao estilo de


análise dos “cientificistas” /” positivistas” /” behavioristas”. É importante salientar
que o próprio fato de não existir um consenso mínimo em como rotular o bloco
antagônico revela a heterogeneidade. Como apontei, em uma “solução”
improvisada e precária, alguns “internacionalistas” (sic.) tendem a recorrer,
especialmente nos manuais, a uma definição negativa do seu campo: teorias ou
correntes “pós-positivistas”.

De qualquer modo, este terreno deve ser hoje compreendido como um


foco de resistência, que assumiu um formato defensivo, especialmente depois
de 1991. Porém, as condições que alçaram a lógica do indivíduo no centro da
ação e da reflexão social estão se deteriorando rapidamente. Mas, por si só, isto
não impulsiona a tradição crítica.

Em primeiro lugar, a tensão entre a dinâmica do Estado e do Mercado


precisa ser mais bem problematizada. E a melhor forma de fazer isso envolveria
integrar a discussão no movimento das forças sociais que, em última análise,
são mobilizadas pelas classes em antagonismo, levando em consideração as
estruturas internas das sociedades e o modo como elas interagem com o sistema
internacional. Isto nos leva ao último ponto a ser destacado.

Assistimos hoje a um nítido descompasso entre os fundamentos teóricos


que deveriam sustentar os ramos de conhecimento aqui discutidos e,

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essencialmente, as análises conjunturais efetivas. Uma observação atenta sobre


as discussões recentes no mainstream basta para constatar o óbvio: os
argumentos veiculados pelos principais periódicos especializados, a despeito
dos seus modelos matemáticos de eficácia duvidosa, não são muito diferentes
dos jornais e revistas destinadas aos leigos. Boa parte da perspectiva dita crítica,
por sua vez, nem sempre leva às últimas consequências a ideia de que vivemos
em um momento de profundas transformações.

Frente aos desafios típicos de uma era de transição, é muito mais


cômodo aferrar-se à tentativa de ressuscitar ipsis literis discussões que podiam
fazer sentido na década de 1960 e 70, mas que, hoje, não tem força sequer para
tentar preservar o status quo. Mas vamos às análises da conjuntura. Tudo parece
girar em torno de duas determinações básicas.

No plano do sistema mais geral, o foco irradiador é a política externa


estadunidense e seus desdobramentos mais imediatos, especialmente no que
diz respeito às ações das demais potências (onde a China tem sido vista cada
vez mais como o segundo grande protagonista). No que diz respeito aos Estados
tomados individualmente, o foco incide quase exclusivamente na Política
Econômica e na Diplomacia.

Tudo como se não houvesse causas estruturais a desafiar a teoria no


que ela melhor pode oferecer: um conjunto de interpretações do cenário
internacional fundado na distinção entre as agitações da superfície e as forças
mais profundas que constrangem e, simultaneamente, potencializam a ação
humana.

Descobrir a configuração atual destas forças e a melhor forma de


exprimi-las teoricamente é o primeiro passo para delimitar a zona suscetível ao
potencial transformador da ação humana, fato que não só libertaria a reflexão
sobre o sistema internacional da paralisia atual, como também enriqueceria o

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debate realmente relevante: a avaliação rigorosa das alternativas


emancipatórias que o fim da ordem da Guerra Fria e da utopia liberal podem ter
colocado ao nosso alcance.

O segundo passo, ainda mais decisivo e necessário, que deve ser


pensado de forma concomitante, é o modo de traduzir este diagnóstico em um
projeto político exequível, capaz de guiar a ação prática.

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