Aula 2. História Da Música II - Barroco.
Aula 2. História Da Música II - Barroco.
Aula 2. História Da Música II - Barroco.
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Não deveríamos esperar que o tratado de Descartes influísse diretamente na música do
seu tempo, sendo na realidade a sua posição filosófica e sua chamada à razão e à
experimentação direta os fatores decisivos. A música desse momento histórico é
francamente experimental, como se pode comprovar com os avanços no estilo
expressivo, na melodia acompanhada e no nascimento da ópera, necessitando além do
mais experimentar em um novo direcionamento harmônico. Estabelece-se a harmonia
tonal, com a redução dos modos ao maior (M) e ao menor (m).
Barroco
A palavra barroco, (barocco em italiano), é de origem portuguesa e significa
jóia ou pérola em forma irregular. Este termo foi utilizado primeiramente para descrever
o estilo exageradamente ornamentado, e ao mesmo tempo grandioso, da arquitetura e da
arte do s. XVII.
No barroco, o homem não se sente unicamente um vivo retrato de Deus, nem a medida e
o ideal de beleza, como na Renascença, mas sim uma pessoa sensível nas suas paixões e
fantasias. A arte barroca cultiva o luxo e o esplendor, a abundância e o extremo,
ampliando as fronteiras da realidade graças a um ilusionismo fantástico.
“O baixo contínuo é o fundamento mais completo da música que se executa com ambas
as mãos; a mão esquerda executa as notas prescritas, enquanto que a direita
acrescenta consonâncias e dissonâncias, para que disto resulte uma harmonia bem-
soante para a honra de Deus e legítima fruição do espírito, já que, como no caso de
toda música, também no caso do baixo contínuo, seu fim e sua causa última não há de
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ser outra que a honra de Deus e a recreação do espírito. Quando estes fatores não
acontecem, o resultado não será música propriamente dita, senão uma cacofonia
diabólica”.(J.S.Bach, 1738.)
Na maioria das vezes, o baixo contínuo barroco representa-se da seguinte forma: uma
simples linha do baixo tocada por um instrumento como o violoncelo, viola da gamba,
contrabaixo ou fagote. O compositor supunha que haveria outro executante de contínuo
tocando um instrumento capaz de produzir acordes, tal como o cravo, espineta, órgão,
alaúde ou teorba, com a capacidade de ir improvisando acordes sobre a linha do baixo,
preenchendo assim as harmonias necessárias. O ideal, portanto, é que houvesse ao
menos dois intérpretes para a realização do “basso continuo”.
Na maioria das vezes, os compositores incluíam as cifras abaixo das notas para indicar
com clareza os acordes que desejavam que fossem interpretados. Este tipo de baixo é
denominado baixo cifrado (baixo contínuo com as cifras).
Como foi dito anteriormente, o baixo serve como base para as vozes concertantes. O
princípio concertante supõe a individualização da voz solista, cuja liberdade de criação
aumenta ainda mais com a improvisação e os adornos e ornamentos próprios do
barroco. As vozes concertantes encontram na consonância harmônica sobre o baixo
contínuo a unidade da sua conjunção e independência (imagem de uma individualidade
que irrompe no recolhimento de um universo harmônico).
No barroco, pela primeira vez na história da música, surgiu uma grande variedade de
formas, técnicas e idiomas, que deram lugar a uma riqueza de material musical que
todavia sobrevive, ainda que de maneira transformada. O barroco foi testemunha da
primeira evolução da ópera, o oratório (sempre de caráter religioso) e a cantata
(religiosa ou profana), assim como a criação da sonata para instrumento solista, a sonata
em trio e o duo de câmera. Foi a época do prelúdio e da fuga, do prelúdio coral e da
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fantasia coral. Instituíram-se as importantes formas do concerto grosso e do concerto
para solista, que veremos em aulas posteriores.
Cada coro (grupo de instrumentos) era uma unidade independente, que podia situar-se
por separado nos diferentes pisos ou galerias das igrejas (Vide São Marcos em Veneza).
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Para finalizar, é preciso ressaltar que são três os princípios gerais que regem a música
instrumental do primeiro barroco. No relativo à forma, temos uma estrutura multi-
secional (em várias partes); no que se refere ao procedimento melódico, este é
caracterizado por variações extensas; no que se refere à textura, polaridade entre o baixo
e as vozes superiores.
Por outro lado, a enorme variedade da música instrumental pode ser dividida em três
categorias: 1-música de dança 2- formas especificamente instrumentais de caráter
rapsódico, como a tocata. 3 – Formas derivadas de modelos vocais.
1- Música de dança
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constituíram o centro da música instrumental da época. Elas foram as últimas fontes
para o futuro desenvolvimento da fuga e da sonata. O moteto e a chanson francesa
serviram como protótipos para o ricercar e a canzona (canzone de sonari),
respectivamente.
Por outro lado, a terminologia da literatura de sonata tem criado muitas confusões.
Segundo o uso mais coerente, as sonatas diferenciavam-se pelo número de suas partes
essenciais, incluindo o contínuo, e assim denominavam-se sonatas a due, tre, a cuatro...
Sem embargo, devido a que o contínuo estava sobre-entendido, a sonata a due se
chamava também sonata para solo, palavra que hoje em dia pode gerar certa confusão.
Devido a que para o contínuo geralmente se precisavam de dois executantes, a “sonata
para solo”, por exemplo, requeria três intérpretes. Pode-se salientar que não devemos
esquecer que o número de partes estruturais da música de câmera barroca não coincidia
com o número de intérpretes. O contínuo era sempre parte obrigatória e, portanto, as
excepcionais sonatas para violino solo de Bach, por exemplo, ou as Fantasias para
violino solo de Telemann, sem acompanhamento, levavam sempre a indicação “senza
basso”.
Mas o verdadeiro choque, a autêntica ruptura, se produz com a abertura da ópera Orfeo
de Monteverdi, estreada em Mantua em 24 de fevereiro de 1607 e publicada em Veneza
em 1609. Os primeiros verdadeiros “soli” para violino da história encontram-se nesta
ópera e nas suas “Vésperas da Virgem Maria” (1610). A própria idéia de uma abertura
já é revolucionária para a época, pelo fato de que outorga à escritura instrumental sua
nova dignidade de obra inteira.
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Esse é o momento histórico, onde se distinguem as “Sonatas de chiesa”, caracterizadas
pelos movimentos lento-vivo-lento, e as Sonatas de câmara, que adotam desde os anos
1630-1650 o modelo das suítes de danças.
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de Chiesa de Viadana de 1602....), somente se aplicava até então a simples motetes
acompanhados por um órgão ou diversos instrumentos. Corelli designa uma forma nova
que, independentemente das suas evoluções futuras, conservará as principais
características definidas por ele, o pai do “Concerto grosso”, que podia ser “Concerto de
chiesa” (adagio-allegro-adagio-allegro) e Concerto de câmara (forma das suítes de
danças). A aparição do Concerto impõe uma nova disciplina à técnica da composição
com o objetivo de se fazer ressaltar a parte principal, sem trivializar a parte do
acompanhamento, conservando um equilíbrio no conjunto, equilíbrio de timbres
especialmente, e preservando primordialmente o jogo de diálogo entre o todo e a parte
solista, que é a razão mesma do concerto.
Concertino: geralmente constituído por dois violinos (um do naipe dos primeiros e
outro dos segundos), uma viola e um baixo, que formam um grupo de
acompanhamento, mas onde os participantes podem se separar para enriquecer o
contraponto, com pequenas intervenções solísticas.
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3. Nascimento da ópera
Na Idade Média, sabemos que os “dramas litúrgicos” eram cantados e que também se
utilizava a música nos mistérios e nos milagres religiosos representados na época.
No caso dos madrigais que tinham diálogos no texto, a ação era sugerida musicalmente
empregando diversas combinações de vozes, uma para cada personagem, com um estilo
declamatório e silábico. Mais próximo à ópera propriamente dita, encontramos
madrigais nos quais o compositor utilizava como texto a cena dramática de um poema.
Estes exemplos não podem ser considerados como experimentos conscientes de uma
ópera primigênia, mas sim usos dos artistas para dar maior expressividade as suas obras.
Sem embargo, as experimentações mais conscientes em adaptar o madrigal para fins
dramáticos, podemos encontrá-las nos “ciclos de madrigais”, também chamados de
“comédia de madrigais”. Representavam uma série de cenas ou estados de ânimo, com
uma música ligeira e adaptada ao espírito das palavras, que se converteram em pequenas
peças onde se unificava drama e canto. Os personagens se diferenciavam mediante
grupos de vozes, que contrastavam umas com outras, e com diversos solos. A comédia
de madrigal mais famosa foi “L´Amfiparnaso” (As ladeiras do Parnaso) de Orazio
Vechi (1550-1605), obra composta em 1597.
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Este panorama é o que se encontra na ante-sala da aparição da ópera tal e como a
conhecemos atualmente. Não obstante, neste ponto há de se fazer referência a uma
forma que para muitos historiadores constitui a última etapa do madrigal e a primeira da
ópera, que é a poesia pastoral. Destaca não somente a temática de referência (que será a
primeira da ópera primigênia: temas mitológicos, históricos, pastoris, bucólicos), mas
também o fato de que a música aparece como a linguagem natural para expressar as
imagens poéticas que se pretende representar.
Chegados neste ponto será a tragédia grega a que aparece como ícone para as obras dos
literatos da época. O problema de adaptar a “música à palavra” ou a “palavra à música”
seria um dos principais desafios entre os eruditos e os artistas do momento.
De grande relevância a nível teórico será a obra do historiador Girolamo Mei, quem,
entre 1562 e 1573, publicou “De modis musicis antiquorum” (Sobre os modos musicais
dos antigos), obra que em linhas gerais vinha a contradizer as anteriores teorias
renascentistas, pelas quais se pensava que nas tragédias gregas só existia uma parte
musical a cargo dos coros. Mei, considerado o maior erudito do seu tempo sobre a
Grécia Antiga, após uma árdua busca e tradução das obras clássicas, descobriu que os
atores também atuavam como solistas em algumas ocasiões, com o que a tragédia grega
era em boa medida cantada.
Este fato supôs uma mudança de atitude em uma Itália que sempre gostou de se mirar
no passado. O drama, a partir desse momento, foi aceito como algo susceptível de
musicar e começou a se considerar pobre a falta da parte solista a um texto. Esta
circunstância voltou a deixar de manifesto a impossibilidade do madrigal em dar
resposta às novas tendências e à necessidade de procurar um novo gênero.
Junto a estes precedentes, que se desenvolveram nas últimas décadas do século XVI,
existe um desencadeante que de alguma maneira marca a origem do novo gênero
operístico: a chamada Camerata Fiorentina, nome designado por Giulio Caccini (1551-
1618) para se referir à Academia criada em Florença por Giovanni Bardi em 1570, da
qual ele mesmo formava parte. Assim, em 1577 foram lidas na referida Academia as
obras de Mei com grande interesse e coincidiram com ele em que os gregos eram
capazes de obter efeitos carregados de força com sua música, já que esta utilizava as
sonoridades ascendentes e descendentes, ritmos e tempos para criar diferentes emoções
no ouvinte. A linha melódica começa a ter grande importância por si mesma, sem ter de
se enlaçar com outras para adquirir beleza, e acompanhada por algum instrumento. É o
nascer da melodia acompanhada. O próprio Girolamo Mei afirmava que os gregos eram
capazes de provocar o sentimento no público graças a que a música empregada consistia
em uma só melodia.
Nesta mesma linha, Vincenzo Galilei (1520-1591), o pai do famoso astrônomo Galileo
Galilei, publicou em 1581 o “Dialogo della musica antica et della moderna”, onde
criticava-se o madrigal, defendendo o conceito de que somente uma única linha
melódica, com alturas e ritmos apropriados, poderia expressar um verso dado. Portanto,
se varias vozes cantavam diferentes melodias e palavras, em ritmos e registros
diferentes (em alusão ao madrigal do século XVI), a música jamais poderia transmitir a
mensagem emocional do texto devido ao caos que produzia. Portanto, a maneira correta
de musicar as palavras era empregar uma melodia de caráter solista para realçar
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meramente as inflexões naturais da fala de um bom orador ou ator. Por isso, os
intelectuais florentinos resolveram substituir a polifonia pela monodia acompanhada,
canto a uma voz sustentado por instrumentos. Inventaram uma espécie de recitação
musical, que preservava a inteligibilidade do texto dramático, ao mesmo tempo em que
o revestia de uma beleza e de uma solenidade novas. Exemplificando esta teoria sabe-se
que Galilei musicou alguns versos da obra de Dante, que infelizmente não se conservam
na atualidade.
É também um dos promotores da monodia (canto a uma voz). Ao desenvolver esse novo
estilo melódico, menos rígido, mais adaptado à expressão dramática, Monteverdi
inaugurou uma nova era musical, a da ópera moderna.
Entre as dezoito óperas que escreveu, apenas três sobreviveram ao saque de Mântua
ocorrido em 1630: Orfeo, O Coroamento de Popéia e O Retorno de Ulisses à sua
Pátria. Da ópera Ariana, resta um fragmento muito belo (a lamentação de Ariana).
Monteverdi será o primeiro em utilizar uma ampla gama de recursos sonoros para pôr
em cena a tragédia do filho de Apolo e sua amada Eurídice. Da mesma forma emprega
recitativos de maior extensão e riqueza lírica que os que se conheciam nos poemas
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musicados, assim como duos, trios, conjuntos vocais e danças. O autor faz uso de uma
variedade instrumental desconhecida até então.
Monteverdi será, portanto, como o demonstra a evolução da sua obra, o elo entre a
música renascentista (chamada de “prima prattica” ) e a música barroca (chamada de
“seconda prattica”).
Os principais temas das primeiras “óperas” serão, igual que nos poemas pastoris
anteriores, de caráter bucólico, pastoril, mitológico. Neste marco, a história de “Orfeo”
é bem atrativa por suas possibilidades trágicas, e o fato de que tudo gire ao redor do
semideus com o “dom da música” a faz idônea para sua representação. O argumento de
Orfeo tem servido como centro temático em muitas obras e não somente no terreno da
ópera.
Link da ópera:
http://www.youtube.com/watch?v=0mD16EVxNOM
Fábula com música em um prólogo e cinco atos, com libreto de Alessandro Striggio.
Personagens:
-Musa, a Música....……………………….......Soprano
-Orfeo ………………………….Tenor
-Eurídice ………………………….Soprano
-Uma mensageira ……………………… Soprano
-A Esperança .………………………… Soprano
-Proserpina …………………………..Soprano
-Caronte ………………………….. Baixo
-Plutão ………………………..... Baixo
-Apolo .……………………….....Barítono
-Ninfa …………………………..Soprano
-Coro (pastores, espíritos, sombras)
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Foi estreada com motivo das festas de carnaval, em 24 de fevereiro de 1607, no Palácio
Ducal de Mântua.
Prólogo: A Música (sop), espécie de quintessência alegórica das nove Musas, lembra a
vocação musical de Orfeo e anuncia a ação.
Ato II: Uma mensageira (sop) anuncia que Eurídice está morta, mordida por uma
serpente. Orfeo, atribulado, decide ir buscá-la no Inferno.
Ato III: Orfeo emprega todos os recursos de seu canto para comover o barqueiro do
Inferno, Caronte (b); adormece-o e cruza o rio Estige.
Ato IV: Tocada pelo canto de Orfeo, Prosérpina (sop) obtém de seu esposo Plutão (b),
rei dos Infernos, a ressurreição de Eurídice, com a condição de que Orfeo não a olhe
antes de ter saído do reino das Sombras. Incapaz porém de resistir à tentação, Orfeo
volta-se e perde-a novamente.
Ato V: Orfeo geme, desesperado. Apolo (t ou bar), seu pai, convida-o então a segui-lo
até o Olimpo, onde poderá rever Eurídice entre as estrelas.
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