CW Organizações Criminosas e Criminalidade

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CONCEITOS INTRODUTÓRIOS SOBRE A

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
Aula 1
INTRODUÇÃO À LEI DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
No Brasil, foram várias as legislações que buscaram definir e
aprimorar o conceito de organização criminosa para que fosse
possível a sua persecução, de modo a estabelecer elementos
objetivos para diferenciar a prática de outros crimes previstos na
legislação, como a associação criminosa.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Compreender o conceito de organização criminosa, bem como o seu funcionamento não
é tarefa fácil. A importância da conceituação ultrapassa os fins meramente acadêmicos,
tendo em vista a atuação de inúmeros órgãos e agentes no sentido de apurar e combater
tal prática no mundo inteiro.
No Brasil, foram várias as legislações que buscaram definir e aprimorar o conceito de
organização criminosa para que fosse possível a sua persecução, de modo a estabelecer
elementos objetivos para diferenciar a prática de outros crimes previstos na legislação,
como a associação criminosa.
Nesta aula iremos definir o conceito de organização criminosa, visualizar a evolução
legislativa do tema, e diferenciá-la de outras práticas criminosas, examinandoa
aplicabilidade por extensão da Lei nº 12.850/2013.

CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E EVOLUÇÃO DA


LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

No Brasil, a Lei nº 9.034/1995 (atualmente revogada) foi a primeira a mencionar o termo


organização criminosa, dispondo “sobre a utilização de meios operacionais para a
prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas” (BRASIL,
1995). No entanto, não definiu o seu conceito.
Adiante, entrou em vigor a Lei nº 9.613/1998, chamada Lei de Lavagem de Capitais,
modificada posteriormente pela Lei nº 12.683/2012, que também previa crimes praticados
por organizações criminosas.
Conforme Dutra e Bonametti (2022), duas pessoas foram denunciadas pelo crime de
lavagem de capitais sob o argumento de que o conceito de organização criminosa estaria
no ordenamento, introduzido pela Convenção de Palermo (Decreto nº 5.015/2004).
No entanto, este argumento não seria aceito pelo Supremo Tribunal Federal (STF HC
96.007/SP) em obediência ao princípio da legalidade, de modo que o conceito não
poderia ser retirado de convenção internacional. Após tal decisão, foi editada a Lei nº
12.694/2012, que trouxe a primeira definição legal de organização criminosa:
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a
associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com
objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza,
mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4
(quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.

(BRASIL, 2012)
A referida legislação definiu organização criminosa “para os efeitos desta lei”, trazendo
controvérsias sobre a aplicabilidade do conceito para além da incidência da norma. Para
tanto, foi editada a Lei nº 12.850/2013, que trouxe o conceito de organização criminosa,
tipificando formalmente o crime. Conforme o Art. 1º §1º, da Lei nº 12.850/2013:

Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais


pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas,
ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente,
vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais
cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de
caráter transnacional.

(BRASIL, 2013)
O novo conceito exige a participação de pelo menos quatro pessoas, ao invés de três, tal
como previa a Convenção de Palermo e a Lei nº 12.694/2012.
A partir dos elementos trazidos pela legislação atual, é possível estabelecer a distinção
entre a organização criminosa e associação criminosa, outro crime que envolve a
associação de agentes para a prática de crimes.
A associação criminosa está prevista no Art. 288, do Código Penal (Decreto-lei nº
2.848/1940), sendo assim conceituada: “Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o
fim específico de cometer crimes” (BRASIL, 1940).
Além disso, a Lei nº 12.850/2013 ainda prevê mais dois casos de incidência, quais sejam:
“às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a
execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou
reciprocamente” e; “às organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a
prática dos atos de terrorismo legalmente definidos” (BRASIL, 2013).
Conforme Nucci (2021, p. 19), “estabelece-se a viabilidade de aplicação dessa legislação
a situações de delinquência que fogem ao conceito de organização criminosa, mas
provocam intensa danosidade social, merecendo o rigor estatal”.
A aplicabilidade por extensão da Lei nº 12.850/2012 está prevista em seu Art. 1º §2º, nos
incisos I e II, sendo este último com redação dada pela Lei nº 13.260/2016.

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA

Conforme visto, a Lei nº 12.850/2013 define organização criminosa como

a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e


caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com
objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza,
mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam
superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

(BRASIL, 2013)
Para melhor compreender o conceito, importante se faz a divisão dos elementos
constantes na legislação.
O primeiro elemento é a associação de quatro ou mais pessoas. Duas ou mais pessoas
também poderiam se associar de forma ordenada para obter vantagem mediante a prática
de crimes. No entanto, pelo estrito critério legal, não se trataria de organização criminosa
visto que o número mínimo de integrantes são quatro.
No âmbito de uma operação policial, “quanto ao agente infiltrado, não há como computá-
lo para constituir o número mínimo de quatro integrantes, pois a sua intenção é eliminar a
organização e não dela fazer parte”, conforme lições de Nucci (2021, p. 14).
Definida como “estruturalmente ordenada”, de forma que exista uma hierarquia,
“caracterizada pela divisão de tarefas”, ou seja, ainda que informalmente, deve existir a
divisão do trabalho, cada membro com sua atribuição no âmbito da organização.
A sua finalidade consiste em “obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza”, assim, a legislação não limitou o alcance da norma, não se tratando apenas de
vantagem de cunho econômico, mas de qualquer natureza.
Para alcançar o objetivo, a organização o faz “mediante a prática de infrações penais
cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos” “ou que sejam de caráter
transnacional” (BRASIL, 2013). Quando se tratar de infração penal que não se limite
apenas ao território nacional, tem-se caracterizada sua transnacionalidade e, neste
aspecto, independe a quantidade máxima de pena cominada, podendo se tratar de delito
ou contravenção penal.
Quanto ao crime de associação criminosa, vimos que se distingue da organização
criminosa e que seu conceito se encontra no Código Penal, sendo assim definido:
“Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes”
(BRASIL, 1940).
A ação nuclear deste crime é a associação, ou seja, formação de uma sociedade
criminosa. Trata-se de um delito plurissubjetivo, ou seja, é condição necessária para a
existência de associação criminosa o mínimo de três pessoas. Conforme leciona Estefam
(2022, p. 438):

Uma vez atingida a quantidade de agentes prevista em lei, unindo-se todos


de maneira estável e formando a sociedade criminosa, tem-se por completo
o delito; sua consumação, a partir daí, prolonga-se no tempo, perdurando
enquanto subsistir o vínculo para o esforço comum (crime permanente),
ainda que nenhuma das infrações genericamente planejadas venha a ser
efetivamente cometida.

No Código Penal, para que esteja configurada a associação criminosa, a reunião de


agentes deve ter caráter estável, não bastando uma associação ocasional para a prática
de crimes, tal como ocorre no concurso de pessoas, previsto no Art. 29, do Código Penal.
Conforme visto, no Art. 1º § 2º, da Lei 12.850/2013 há duas possibilidades de aplicação
da norma por extensão. A primeira é referente a infrações penais previstas em tratados ou
convenções internacionais assumidas pelo Brasil, tal como ocorre com o tráfico de drogas
e de pessoas. A segunda é referente às organizações terroristas, consoante definido na
Lei 13.260/2016.
APLICABILIDADE POR EXTENSÃO DA LEI 12.850/2013

A primeira legislação no Brasil a mencionar organização criminosa não se tratava de um


tipo penal incriminador, qual seja, a já revogada Lei 9.034/1995.
Deste modo, a conduta associativa voltada para a prática de crimes estaria tipificada no
Art. 288, do Código Penal, tratando-se da associação criminosa. Já a Lei 12.850/2013
tratou de delimitar o conceito de organização criminosa, bem como instituir o tipo penal
incriminador, com a cominação da respectiva pena, conforme se verifica em seu Art.
2º, caput:

Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por


interposta pessoa, organização criminosa:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas
correspondentes às demais infrações penais praticadas.

Em se tratando de crime comum, a associação de quatro ou mais pessoas não exclui


desse cômputo a figura da criança ou do adolescente, desde que tenham consciência de
estar integrando a organização criminosa para os fins que se amoldam ao conceito
previsto na lei.
O crime organizado se trata de circunstância fática sem previsão legal, de modo que
abrange todas as ações delituosas praticadas por organização criminosa, cujo conceito
desta se encontra na Lei 12.850/2013 atualmente.
A partir deste termo é possível conceber suas vertentes: o crime organizado por natureza
e o crime organizado por extensão. A primeira é referente à própria formação da
organização criminosa, cujo tipo penal se encontra no Art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013.
A segunda vertente remete aos crimes praticados pela organização criminosa. Andreucci
(2021, p. 210) leciona acerca do âmbito de aplicação da legislação:

Além de se destinar especificamente às ações praticadas por organizações


criminosas, a Lei n. 12.850/2013 também se aplica às infrações penais
previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a
execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no
estrangeiro, ou reciprocamente; e às organizações terroristas
internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional,
por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo,
bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas,
ocorram ou possam ocorrer em território nacional.

Tratando-se da hipótese prevista no Art. 1º §2º, inciso I, a competência para o julgamento


dos crimes será da Justiça Federal, conforme disposto no Art. 109, inciso V, da
Constituição Federal de 1988. Entretanto, Dutra e Bonametti (2022, p. 431) fazem uma
ressalva quanto à esta atribuição:

A única ressalva é que a CF/1988 fala que a justiça federal julgará os


crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a
execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no
estrangeiro, ou reciprocamente, e não as infrações penais. Nesse sentido,
cabe lembrar que a justiça federal não julga contravenções penais,
conforme art. 109, IV, da CF/1988.

A Lei 12.850/2013 também se aplica às organizações criminosas cujas práticas se


enquadrem no disposto na Lei 13.260/2016, que se refere à prática de atos terroristas.
A Lei de Organização Criminosa também promoveu alterações no Código Penal, no que
se refere a tipificação da associação criminosa, conforme diz Capez (2022, p. 108):
“Registre-se que, em sua redação original, o art. 288 do CP tipificava dois crimes, quais
sejam, quadrilha ou bando. Com a entrada em vigor da Lei n. 12.850/2013 (Lei do Crime
Organizado), o nomen iuris do delito foi alterado para associação criminosa”.

Saiba mais

Após delimitarmos e compreendermos o conceito de organização criminosa, é importante


também na dogmática penal a apuração da responsabilidade cada membro que a integra.
Para saber mais sobre a autoria e a participação no âmbito do crime organizado, leia o
artigo científico “Autoria e participação no contexto da criminalidade organizada”, de
autoria de Lurizam Costa Viana.

Aula 2
CRIME ORGANIZADO POR NATUREZA
Considerando o crescimento das associações criminosas no país, é
importante a criminalização das condutas que possuem o animus de
associação, em razão da danosidade que pode vir a ser causada por
um grupo por ser muito maior do que aquela a ser causada por um só
agente.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Compreendido o conceito de organização criminosa e os aspectos legais para a sua
configuração, necessário se faz analisar o tipo penal incriminador, previsto na Lei nº
12.850/2013.
Considerando o crescimento das associações criminosas no país, é importante a
criminalização das condutas que possuem o animus de associação, em razão da
danosidade que pode vir a ser causada por um grupo por ser muito maior do que aquela a
ser causada por um só agente.
Nesta aula, analisaremos o tipo penal de organização criminosa, de modo a compreender
os elementos que o integram: objetivo e subjetivo; elementos específicos dos tipos
penais: núcleo, sujeito ativo, sujeito passivo e objeto material; bem como consumação e
tentativa, além de examinar a pena cominada, agravante, aumento de pena, cumprimento
de pena e medida cautelar diversa da prisão.
ANÁLISE DO TIPO PENAL DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA: DISPOSITIVO
LEGAL; OBJETIVIDADE JURÍDICA; OBJETO MATERIAL; NÚCLEO DO
TIPO

Na análise da Lei nº 12.850/2013 (Lei de Organização Criminosa), verifica-se no seu Art.


2º, caput, a existência de uma norma penal incriminadora, cujas condutas descritas
caracterizam o crime organizado por natureza, quais sejam, “promover, constituir,
financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa”
(BRASIL, 2013). Conforme lições de Masson e Marçal (2021, p. 68):

Pela primeira vez aportou no ordenamento jurídico brasileiro o crime de


promover (fomentar, desenvolver, estimular, impulsionar, anunciar,
propagandear), constituir (compor, formar, dar existência), financiar (apoiar
financeiramente, custear despesas, prover o capital necessário para) ou
integrar (participar, tornar--se parte de um grupo, associar-se, estabelecer
conexão), pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa.

Para que se possa analisar o tipo penal, inicialmente deve-se compreender de que se
trata tal conceito.
Para Eisele (2021, p. 158) “o tipo é uma expressão da legalidade, que cumpre uma
função de garantia porque possibilita o conhecimento da hipótese de fato em relação à
qual incide a normal penal”.
Trata-se, portanto, de definir o objeto da norma e seus limites. Os elementos que integram
o tipo penal são basicamente dois: elemento objetivo e elemento subjetivo.
Consoante, Greco (2023, p. 245), diz que a “finalidade básica dos elementos objetivos do
tipo é fazer com que o agente tome conhecimento de todos os dados necessários à
caracterização da infração penal, os quais, necessariamente, farão parte de seu dolo”.
O elemento subjetivo diz respeito ao componente psíquico (estado de consciência), ou
seja, à vontade do agente. Em se tratando do crime de organização criminosa, o elemento
subjetivo do tipo é o dolo, manifestado pela vontade livre e consciente de associação de
caráter permanente para obter vantagem ilícita de qualquer natureza.
Os tipos penais também possuem elementos específicos, quais sejam, o núcleo, o sujeito
ativo, o sujeito passivo e o objeto material. O núcleo do tipo consiste no(s) verbo(s) que
indica(m) ação ou omissão do agente. No crime organizado por natureza, são quatro os
comportamentos comissivos (ações) indicados(as) no texto do Art. 2º, caput, da Lei nº
12.850/2013, quais sejam: “promover”, “constituir”, “financiar” e “integrar”.

O crime de organização encerra um tipo penal misto alternativo (de ação


múltipla, de condutas variáveis ou fungíveis). Destarte, ainda que
determinado sujeito venha a flexionar mais de um núcleo do tipo, apenas
um delito restará configurado se tudo ocorrer dentro de um mesmo
contexto, sem prejuízo de que a reprimenda seja elevada quando da
fixação da pena-base.

(MASSON; MARÇAL, 2021, p. 69)


O sujeito ativo se trata de quem pode praticar a conduta descrita na norma penal
incriminadora. Quando não houver qualquer condição pessoal do agente descrita na
norma, tem-se o chamado crime comum. Quando houver uma condição específica
descrita para o sujeito ativo, trata-se de crime próprio. Quanto ao sujeito passivo, este se
trata da pessoa ou entidade contra quem se pratica o crime (vítima). Não havendo como
vítima uma pessoa em específico, trata-se de crime vago, sendo sujeito passivo a própria
coletividade.
Já o objeto material é a coisa sobre a qual recai a conduta criminosa. Este conceito não
se confunde com o de objeto jurídico, pois o “objeto jurídico é o bem ou interesse que a lei
visa proteger quando incrimina determinada conduta” (GONÇALVES, 2022, p. 38).

SUJEITO ATIVO, SUJEITO PASSIVO, ELEMENTO SUBJETIVO.


CONSUMAÇÃO, TENTATIVA. AÇÃO PENAL

Elucidados os conceitos dos elementos específicos do tipo, necessária se faz sua


adequação ao crime organizado por natureza, previsto no Art. 2º, da Lei nº 12.850/2013.
Sendo o sujeito ativo aquele que pratica a conduta, o crime de organização criminosa é
classificado como comum, haja vista não se exigir na legislação qualquer condição
especial do agente.

Quanto ao sujeito ativo, não há de se exigir nenhuma qualidade ou


condição especial do agente (crime comum). Trata-se de crime
plurissubjetivo ou de concurso necessário, por somente se afeiçoar com o
número mínimo de quatro pessoas associadas. Diz-se, ainda, ser um crime
de conduta paralela, haja vista que os integrantes da organização auxiliam-
se mutuamente com o mesmo escopo.

(MASSON; MARÇAL, 2021, p. 253)


No tocante ao sujeito passivo, a própria coletividade é contra quem se pratica o crime em
comento. Seu objeto jurídico, ou seja, o bem juridicamente tutelado, é a paz pública. O
objeto material é a própria organização criminosa, cujo conceito se encontra no Art. 1º
§1º, da Lei nº 12.859/2013.
A consumação e a tentativa encontram seus conceitos no Código Penal Brasileiro, onde
se define em seu Art. 14, inciso I, o crime consumado “quando nele se reúnem todos os
elementos de sua definição legal” e no Art. 14, inciso II, o crime tentado “quando, iniciada
a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente” (BRASIL,
1940).
Ressalte-se, portanto, que nem todos os crimes possuem o mesmo instante consumativo.
Assim, a consumação varia de acordo com a infração penal praticada pelo agente. Em se
tratando do delito de organização criminosa na modalidade “integrar”, Dutra e Bonametti
(2022, p. 433) dizem que:

Por se tratar de crime unissubsistente, cuja consumação se dá em um único


ato, não admite tentativa. A consumação se dá no momento em que o
agente se associa. Atos praticados anteriormente, no sentido de estruturar
a organização criminosa, são meramente atos preparatórios.

O crime organizado por natureza se trata de delito permanente, cuja consumação se


perpetua, se prolonga no tempo. Deste modo, enquanto houver o animus de associação
de caráter estável pelos agentes para os fins descritos na Lei nº 12.850/2013, considera-
se consumado o crime de organização criminosa.
No tocante à tentativa, Masson e Marçal (2022, p. 80) apresentam a divergência
doutrinária:

Admite-se a tentativa em relação às condutas de promover e financiar a


organização criminosa se, cometido qualquer ato nesse sentido, a
finalidade buscada não se consumar por circunstâncias alheias à vontade
do autor (ex.: interceptação de panfleto tendente à promoção da
organização ou de dinheiro remetido para fins de financiamento). Porém, na
hipótese de constituição e/ou integração no grupo criminoso, a consumação
ocorre com a simples adesão de vontades, não se admitindo, pois, a forma
tentada.

O crime organizado por natureza é processado mediante a proposição de ação penal


pública incondicionada, ou seja, a acusação dos agentes envolvidos é feita sem a
necessidade de provocação dos órgãos de apuração por parte da vítima. Assim, o
Ministério Público não precisa de qualquer autorização para oferecer a denúncia.

PENA: AGRAVANTE, AUMENTO DE PENA, CUMPRIMENTO DA PENA,


MEDIDA CAUTELAR DIVERSA DA PRISÃO

Havendo uma ou mais de uma das condutas de promover, constituir, financiar ou integrar
organização criminosa, tem-se somente a prática de um delito, ou seja, o crime
organizado por natureza se trata de tipo penal misto alternativo.
Não há admissão da forma culposa, havendo exigência do dolo específico que se traduz
na vontade livre e consciente de se associar de forma permanente (estável) para obter
vantagem ilícita de qualquer natureza.
Todos os verbos que compõem o núcleo do tipo descrevem ações que podem ser
praticadas pelos agentes, sendo, portanto, um crime comissivo, cuja pena é de “reclusão,
de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais
infrações penais praticadas” (BRASIL, 2013).
A pena cominada para o crime de organização criminosa é classificada como privativa de
liberdade, cujas modalidades são a reclusão e a detenção. Conforme prevê o Art. 33, do
Código Penal, a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou
aberto.
Ressalte-se, também, que além da cominação de pena, a Lei nº 12.850/2013 apresenta
circunstância agravante (qual seja, o comando da organização criminosa) e causas de
aumento de pena para o crime organizado por natureza, bem como medida cautelar
diversa da prisão.
Para que se aplique ao crime a agravante prevista na legislação, basta que o(s) agente(s)
lidere(m) a organização criminosa, não havendo necessidade que pratique qualquer outro
ato referente a esta, pois consuma-se o crime quando há a associação dos agentes,
independente de qual papel desempenhem no âmbito da divisão de tarefas ou da
hierarquia existente.
Assim, “o agravamento da sanção por integrar a organização criminosa com status de
“comandante” acontecerá independentemente de sua contribuição para a prática de atos
executórios de infrações penais praticadas pela affectio criminis societatis” (MASSON;
MARÇAL, 2022, p. 83).
Diferentemente do que ocorre com a agravante, as causas de aumento de pena preveem
uma quantidade fixa desta a ser acrescentada na dosimetria. Consoante leciona Nucci
(2021, p. 88) as causas de aumento de pena “são circunstâncias legais, integrantes da
tipicidade incriminadora, que preveem elevações da pena, por cotas expressas em lei,
utilizadas na terceira fase da fixação da pena”.
Assim, são causas de aumento de pena para o crime organizado por natureza: o emprego
de arma de fogo; a participação de criança ou adolescente; o concurso de funcionário
público; o destino do produto ou proveito do crime, no todo ou em parte, para o exterior e;
a existência de conexão com outra(s) organização(ões) criminosa(s).
Observe-se que no Art. 2º §4º, inciso V, da Lei nº 12.850/2013 incide causa de aumento
de pena “se as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade da organização”.
Ocorre que tal causa não é aplicada em razão de a transnacionalidade ser elementar do
tipo penal incriminador. Trata-se de dupla punição pelo mesmo crime (bis in idem).
Por fim, quando houver indícios de que entre os integrantes da organização criminosa há
a presença de funcionário público, caso se verifique como necessário ao prosseguimento
da investigação ou produção de provas no âmbito do processo, pode o juiz determinar o
afastamento deste, conforme o Art. 2º §5º prevê, resultando em medida cautelar diversa
da prisão para o agente que possuir tal condição.

Saiba mais

No Brasil, umas das mais conhecidas organizações criminosas é o Primeiro Comando da


Capital (PCC), cuja atuação tem causado impactos não só no nosso país, mas, também,
em países vizinhos.
Para saber mais sobre essa organização criminosa e os aspectos penais de sua atuação,
leia a dissertação “A organização criminosa primeiro comando da capital: análise das
consequências penais da existência do PCC”, de autoria de João Santa Terra Júnior.

Aula 3
CRIME ORGANIZADO II
A Lei nº 12.850/2013 traz em seu arcabouço aspectos processuais no
que tange a investigação da prática dos crimes previstos em seus
dispositivos (crime organizado por natureza e crime organizado por
extensão).
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
A Lei nº 12.850/2013 traz em seu arcabouço aspectos processuais no que tange a
investigação da prática dos crimes previstos em seus dispositivos (crime organizado por
natureza e crime organizado por extensão).
Um desses aspectos é a adoção de medida cautelar diversa da prisão quando, havendo
indícios de que um funcionário público integra a organização criminosa, este poderá ser
afastado de forma cautelar do cargo ou função, sem prejuízo da remuneração, pelo juiz.
Nesta aula analisaremos outras particularidades da referida legislação, como os efeitos da
condenação; investigação em caso de participação policial, proibição de obtenção de
benefícios e demais aspectos e jurisprudência atualizada sobre o tema.
EFEITOS DA CONDENAÇÃO

Finalizado o processo, com o advento da sentença penal condenatória pelo crime de


organização criminosa, a Lei nº 12.850/2013 prevê um efeito automático extrapenal da
condenação, de forma que “A condenação com trânsito em julgado acarretará ao
funcionário público a perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo e a interdição
para o exercício de função ou cargo público pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao
cumprimento da pena” (BRASIL, 2013).
A finalidade primordial da sentença é fazer com que o agente cumpra a pena que seja
equivalente ao mal por ele praticado, como forma de prevenir e reprimir a prática de
outros crimes. Conforme lições de Greco (2023, p. 693):

Contudo, tal sentença, além de seus efeitos penais, que se encontram


localizados em diversos artigos da legislação penal e processual penal,
pode gerar, ainda, outros efeitos, a exemplo de tornar certa a obrigação de
reparar o dano causado pelo crime, ou mesmo a de fazer com que o
condenado venha a perder o cargo, a função pública ou o seu mandato
eletivo.

Assim, além dos efeitos penais, a sentença penal condenatória transitada em julgado traz
consigo outros efeitos, chamados de extrapenais, que funcionam como uma espécie de
pena acessória. De forma geral, os efeitos da condenação estão previstos nos Arts. 91,
91-A e 92 do Código Penal.
O efeito extrapenal da condenação pelo crime de organização criminosa se encontra no
Art. 2º §6º, da Lei nº 12.850/2013, conforme supracitado.
No que se refere à perda do cargo, há dois posicionamentos na doutrina. O primeiro é
referente à perda do cargo abrangendo qualquer atividade que o agente estiver
exercendo ao tempo da condenação. O segundo versa sobre a perda do cargo se
restringir somente ao que o agente estivesse ocupando quando da prática do delito de
organização criminosa.
Outro efeito extrapenal exposto no mesmo dispositivo é referente à interdição, ou seja, à
impossibilidade de o agente vir a ocupar outro cargo ou função pública pelo prazo de oito
anos, após o cumprimento da pena tendo, assim, efeitos futuros.
Em se tratando de efeitos extrapenais automáticos, estes independem da quantidade de
pena cominada, não precisando sequer serem declaradas a perda do cargo e a interdição
na sentença penal condenatória.
Importante, também, destacar que, quanto aos efeitos da condenação, o Código Penal foi
alterado pela Lei nº 13.964/2019, a chamada Lei do Pacote Anticrime, de forma que foi
acrescentado ao referido diploma legal o Art. 91-A §5º, com a seguinte redação:
Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e
milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo
da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das
pessoas, a moral ou à ordem pública, nem oferecem sério risco de ser utilizados para o
cometimento de novos crimes (BRASIL, 2019).
Os instrumentos do crime são aqueles objetos, ou seja, os itens materiais que foram
utilizados para a prática do delito. Destaca-se que o Pacote Anticrime também trouxe
alterações para a Lei de Organização Criminosa conforme se verá adiante.
INVESTIGAÇÃO EM CASO DE PARTICIPAÇÃO POLICIAL. PROIBIÇÃO DE
OBTENÇÃO DE BENEFÍCIOS

Conforme visto, são dois os posicionamentos da doutrina acerca da perda do cargo


público: um referente a abranger qualquer atividade que o agente estiver exercendo ao
tempo da condenação e a outra versando sobre se restringir somente ao cargo que o
agente estivesse ocupando quando da prática do delito de organização criminosa. A
questão chegou até o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Sobre o caso, assim nos elucida Masson e Marçal (2021, p. 108):

No caso, determinada pessoa havia praticado um delito enquanto era


empregado público da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.
Contudo, quando da sentença, o condenado já ocupava outro cargo, na
Universidade Federal de Pernambuco. Diante disso, o STJ fixou, como
regra, o entendimento consoante o qual: “a pena de perdimento deve ser
restrita ao cargo público ocupado ou função pública exercida no momento
do delito. Assim, a perda do cargo público, por violação de dever inerente a
ela, necessita ser por crime cometido no exercício desse cargo, valendo-se
o envolvido da função para a prática do delito”. Entretanto, abriu-se uma
exceção: desde que o magistrado a quo considere, motivadamente, “que o
novo cargo guarda correlação com as atribuições do anterior, ou seja,
naquele em que foram praticados os crimes, mostra-se devida a perda da
nova função, uma vez que tal ato visa a anular a possibilidade de reiteração
de ilícitos da mesma natureza, o que não ocorreu no caso. Dessa forma,
como o crime em questão fora praticado quando o acusado era empregado
público da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, não poderia, sem
qualquer fundamentação e por extensão, ser determinada a perda do cargo
na UFPE”.

Importante que se comente também acerca do efeito da perda do cargo abrangendo a


cassação de aposentadoria.
A esse respeito, há duas correntes: a primeira corrobora a cassação da aposentadoria por
esta ser decorrente do exercício do cargo. Tal posicionamento era adotado pelo STJ
anteriormente. A segunda é referente à possibilidade de haver a cassação por ausência
de expressa previsão legal e, em se tratando de matéria penal, ser vedada a
interpretação in malam partem. Este é o entendimento atual de ambas as turmas do STJ.
Adiante, o Art. 2º §7º, da Lei 12.850/2013 prevê que “Se houver indícios de participação
de policial nos crimes de que trata esta Lei, a Corregedoria de Polícia instaurará inquérito
policial e comunicará ao Ministério Público, que designará membro para acompanhar o
feito até a sua conclusão” (BRASIL, 2013).
O dispositivo em comento tem por finalidade assegurar maior eficiência na investigação
policial quando houver participação policial nos crimes previstos na Lei de Organização
Criminosa, no intuito de obstar que o corporativismo venha a prejudicar os procedimentos
instaurados para apurar a prática dos delitos.
Além disso, a já mencionada Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) inseriu o §9º no Art.
2º, da Lei nº 12.850/2013, cujo texto prevê a proibição de obtenção de benefícios da fase
de execução penal. Desta forma:
O condenado expressamente em sentença por integrar organização
criminosa ou por crime praticado por meio de organização criminosa não
poderá progredir de regime de cumprimento de pena ou obter livramento
condicional ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios
que indiquem a manutenção do vínculo associativo.

(BRASIL, 2013)

DEMAIS ASPECTOS E JURISPRUDÊNCIA ATUALIZADA SOBRE O TEMA

O efeito da condenação previsto na Lei de Organização Criminosa é genérico e


automático, decorrente da previsão da lei e, desta forma, não depende da imposição
expressa do magistrado na sentença penal condenatória.
O dispositivo menciona como um de seus efeitos a perda do mandato eletivo. Observe-se
que diferentemente do que ocorre com a medida cautelar referente ao cardo ou função
pública, não há previsão expressa de afastamento das atividades parlamentares como
medida cautelar a ser adotada para apuração da prática dos delitos previstos na
legislação em estudo.

Quanto à perda do mandato eletivo, cuidando-se de senadores e deputados


federais, há a discussão no tocante à formalização da referida perda. Há
duas posições: a) decorre, automaticamente, de lei, assim que transite em
julgado a sentença condenatória, pouco importando o quantum da pena,
sem necessidade de deliberação do Parlamento, pois o condenado perde
os direitos políticos (art. 15, III, da CF); b) deve ser deliberada pela Casa
Legislativa correspondente (Senado ou Câmara), após o trânsito em julgado
da sentença condenatória, nos termos do art. 55, § 2.º, da Constituição
Federal. Em nosso ponto de vista, a segunda posição é a correta, pois a lei
ordinária não tem o condão de afastar a expressa disposição constitucional,
que sujeita a análise da perda do mandato, em caso de condenação
transitada em julgado, à deliberação da Casa Parlamentar correspondente.
O disposto pelo art. 15, III, da Constituição tem alcance genérico,
envolvendo qualquer condenado, mas a regra do art. 55, § 2.º, é especial
em relação à primeira. Norma especial afasta a aplicação de norma geral.

(NUCCI, 2021, p. 48)


No que concerne à investigação em caso de participação policial, a corregedoria
mencionada no texto legal será a da polícia judiciária, seja ela civil ou federal.
Quanto à Polícia Militar, importante que se mencione as alterações trazidas ao Código
Penal Militar (CPM) pela Lei nº 13.491/2017, de forma que a competência da Justiça
Militar foi ampliada para que abrangesse também o julgamento de crimes previstos na
legislação penal em geral (não somente no Código Penal Militar), de modo que o crime
militar passou a ter conceito mais abrangente, conforme disposto no Art. 9º, do Decreto-
Lei nº 1.001/1969, que trata de definir o conceito de crimes militares em tempo de paz.
Havendo, portanto, o caso de policiais militares constituírem uma organização criminosa,
conforme circunstâncias previstas no Art. 9.º, inciso II, do CPM, a investigação do crime
militar no âmbito policial, será acionada à corregedoria militar.
Relativo a proibição da obtenção de benefícios na execução penal, a manutenção do
vínculo associativo criminoso impede que o condenado pelo crime de organização
criminosa (seja crime organizado por natureza ou por extensão) possa usufruir do
benefício da progressão de regime de cumprimento da pena ou do livramento condicional,
ou seja, de retornar ao convívio social cumprimento a pena em liberdade mediante o
preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos previstos no Art. 83, do Código Penal.

Saiba mais

A Lei nº 12.850/2013 trata da investigação em caso de participação policial na


organização criminosa. Importante mencionar que a infiltração de agentes, sejam policiais
ou não, constitui uma importante tática de investigação para apurar a prática do crime.
Para saber mais sobre a infiltração de agentes, consulte a Enciclopédia Jurídica da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

Aula 4
OUTROS CRIMES DA LEI 12.850/2013
Nesta aula iremos analisar outros crimes da Lei 12.850/2013, tais
como impedimento ou embaraçamento da persecução penal; os
crimes ocorridos na investigação e na obtenção da prova; bem como
a jurisprudência atualizada sobre o tem e as disposições finais da lei.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
A Lei nº 12.850/2013 tratou de definir o conceito de organização criminosa, bem como as
hipóteses de aplicabilidade por extensão. A referida legislação traz em seu arcabouço o
tipo penal incriminador referente ao delito de promover, constituir, financiar ou integrar,
pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa. Além do crime de
organização criminosa propriamente dito, há outros tipos penais incriminadores
constantes na Lei nº 12.850/2013.
Nesta aula iremos analisar outros crimes da Lei 12.850/2013, tais como impedimento ou
embaraçamento da persecução penal; os crimes ocorridos na investigação e na obtenção
da prova; bem como a jurisprudência atualizada sobre o tem e as disposições finais da
lei.

CRIME DE IMPEDIMENTO OU EMBARAÇAMENTO DA PERSECUÇÃO


PENAL

A Lei nº 12.850/2013 tratou de definir o crime de promover, constituir, financiar ou


integrar, pessoalmente ou por pessoa interposta, organização criminosa, atribuindo-lhe a
pena correspondente. Ocorre que além desta, há outros tipos penais em seu arcabouço.
Observa-se, portanto, a existência de diversas normas penais incriminadoras dentre os
seus dispositivos.
Às normas penais incriminadoras é reservada a função de definir as
infrações penais, proibindo ou impondo condutas, sob a ameaça de pena. É
a norma penal por excelência, visto que quando se fala em norma penal
pensa-se, imediatamente, naquela que proíbe ou impõe condutas sob a
ameaça de sanção.

(GRECO, 2023, p. 57)


Nas mesmas penas cominadas no Art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013 “incorre quem
impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva
organização criminosa” (BRASIL, 2013).
O tipo penal incriminador em questão é o chamado crime de obstrução da justiça. Em
razão de o texto legal mencionar o termo “investigação”, entende-se que a interpretação
deve ser feita de forma a abranger qualquer procedimento investigatório. A esse respeito,
discorrem Masson e Marçal (2021, p. 121):

Tendo o legislador feito uso do termo investigação, inclui-se aí não apenas


o inquérito policial, mas também qualquer outro procedimento investigatório
criminal – como os PIC’s instaurados diretamente pelo Ministério Público
com esteio na Constituição da República e na Res. 181/2017-CNMP –,
desde que instaurados com o escopo de apurar “infração penal que envolva
organização criminosa”.

A questão ainda versa sobre a incidência do tipo penal quando o agente embaraçar ou
impedir o andamento do processo penal. São duas as correntes que abordam o tema: a
primeira versa sobre o tipo penal previsto no Art. 2º §1º, da Lei nº 12.850/2013 incidir
quando se tratar do processo penal em razão de o bem jurídico tutelado ser a própria
Administração da Justiça, não havendo que se falar em interpretação in malam
partem (MASSON; MARÇAL, 2021).
A segunda corrente defende a impossibilidade de haver interpretação extensiva da norma
pois, havendo omissão do legislador, não se pode haver interpretação in malam partem.
Importante destacar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) está
alinhada com a primeira corrente.

Da mesma forma, para o min. Edson Fachin, a melhor exegese do art. 2.º, §
1.º, da Lei 12.850/2013 reclama que o referido tipo penal englobe tanto a
fase inquisitorial como a etapa judicial da persecutio criminis, sob pena de
ofensa ao princípio da proporcionalidade, na acepção da proibição da
proteção deficiente do bem jurídico tutelado pela norma penal.

(MASSON; MARÇAL, 2021, p. 123)


Além disso, nos Arts. 18 e 19 foram previstos crimes relacionados à infiltração e à
colaboração com a Justiça (colaboração premiada).
Nos Arts. 20 e 21, tem-se a previsão de crimes referentes ao descumprimento da
determinação de sigilo das investigações que envolvam ação controlada e infiltração de
agentes, e à recusa ou omissão de dados cadastrais, dentre outros, requisitados pelas
autoridades, no curso de investigação ou do processo (ANDREUCCI, 2021).
DOS CRIMES OCORRIDOS NA INVESTIGAÇÃO E NA OBTENÇÃO DA
PROVA (ARTS. 18 AO 21 DA LEI 12.850/2013)

A Lei nº 12.850/2013 prevê também crimes contra a Administração da Justiça no combate


à organização criminosa. Em seu Art. 18, consta o delito de “revelar a identidade,
fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito” (BRASIL,
2013).
São três as condutas descritas da norma: revelar identidade, que se trata de dar
conhecimento sobre os elementos que irão individualizar a pessoa; fotografar, consistente
em registrar a imagem de alguém e; filmar, ou seja, registrar em película a movimentação
de algo ou alguém. O objeto material é a identidade do colaborador.
Conforme Nucci (2021, p. 155), “na própria Lei 12.850/2013 encontra-se o conceito de
quem é colaborador e quais são os seus direitos, dentre os quais o de possuir a
identidade e a imagem preservadas (art. 5.º, II e V)”.
Assim, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa (crime comum). O sujeito passivo é o
colaborador e o Estado (ambos interessados no sigilo da identidade).
Em seu Art. 19, a Lei de Organização Criminosa (LOC) prevê a conduta de “imputar
falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a
pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de organização
criminosa que sabe inverídicas” (BRASIL, 2013). Trata-se do delito de delação caluniosa:

Se o agente imputa falsamente a alguém a prática de fato definido como


crime, comete o delito de calúnia. Se transmite à autoridade o
conhecimento de um fato criminoso e do seu autor, prática conduta
permitida expressamente pelo Código de Processo Penal (art. 5.º, § 3.º).
Entretanto, a junção das duas situações (calúnia + comunicação à
autoridade) faz nascer o delito de denunciação caluniosa, de ação pública
incondicionada, porque está em jogo o interesse do Estado na
administração da justiça. Em particular, a Lei 12.850/2013 cria o art. 19
como uma espécie de denunciação caluniosa, cujo autor é o delator.

(NUCCI, 2021, p. 157)


Quanto ao crime de delação caluniosa, o sujeito ativo é o delator envolvido na
investigação; o sujeito passivo é o Estado e, secundariamente, a pessoa prejudicada pela
falsa imputação; o objeto material é a prática de infração penal ou a informação sobre a
estrutura de organização criminosa. Não há forma culposa.
Em seu Art. 20, a Lei de Organização Criminosa traz o crime de quebra de sigilo,
consistente em “descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a
ação controlada e a infiltração de agentes” (BRASIL, 2013). Descumprir é desobedecer,
deixar de seguir uma determinação.
No Art. 21 consta o crime de sonegação de informes, caracterizado por “recusar ou omitir
dados cadastrais, registros, documentos e informações requisitadas pelo juiz, Ministério
Público ou delegado de polícia, no curso de investigação ou do processo”, bem como
incorre na mesma pena quem “a mesma pena incorre quem, de forma indevida, se
apossa, propala, divulga ou faz uso dos dados cadastrais” (BRASIL, 2013).

JURISPRUDÊNCIA ATUALIZADA SOBRE O TEMA – DISPOSIÇÕES FINAIS


DA LEI
O bem jurídico tutelado pela norma penal constante no Art. 2º §1º, da Lei de Organização
Criminosa é a Administração da Justiça.
Seu objeto material é a investigação ou o processo penal, conforme corroborado pela
jurisprudência, em se tratando de infrações penais que envolvam organização criminosa.
Os núcleos do tipo penal são impedir e embaraçar, sendo um tipo penal misto alternativo.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, se tratando, portanto, de crime comum. Quanto
à possibilidade de um integrante da organização criminosa poder ser sujeito ativo deste
crime, há dois posicionamentos: o primeiro é referente a somente ser sujeito ativo
terceiros, ou seja, pessoas que não integrem a organização criminosa; o segundo
posicionamento versa sobre não haver qualquer impedimento para que integrantes da
organização criminosa que sejam sujeitos ativos do delito.

Nesse sentido, o min. Edson Fachin já reconheceu inviável a conclusão no


sentido de que eventual integrante de organização criminosa não poderia
ser sujeito ativo do delito de obstrução às respectivas investigações, “já que
a garantia da não autoincriminação é destinada a assegurar a amplitude
dos meios de defesa no processo penal adequado aos valores ínsitos de
um Estado Democrático de Direito, não se prestando a atuar como uma
causa supralegal de excludente de ilicitude em relação a condutas
comissivas que atentem contra a administração da justiça.” Pode figurar
como sujeito ativo do crime até mesmo o advogado que exercita de forma
irregular, abusiva, o seu múnus.

(MASSON; MARÇAL, 2021, p. 131)


O sujeito passivo do delito de obstrução da justiça é o Estado. O elemento subjetivo do
tipo é o dolo, não se admitindo a forma culposa por ausência de expressa previsão legal.
Quanto à consumação do ato de impedir, ela se dá quando há a cessação da persecução
penal, se tratando de crime material. Quanto ao ato de embaraçar, este restará
consumado quando houver perturbamento da persecução penal, sem que resulte em sua
cessação. O processamento do crime acontece mediante ação penal pública
incondicionada.
No tocante ao delito de quebra de sigilo, “o sujeito ativo somente pode ser o funcionário
público, responsável legal pelo trâmite dos papéis oficiais, desde a fase da investigação
até o final do processo, bem como aqueles que tiverem acesso aos autos, como, por
exemplo, o advogado” (NUCCI, 2021, p. 160).
Portanto, o sujeito passivo é o Estado, bem como a(s) pessoa(s) prejudicada(s) pelo
rompimento do sigilo. O objeto material é a determinação do sigilo. Então, só se admite a
forma dolosa, não havendo forma culposa para o delito, nem a exigência de um dolo
específico. Importante salientar que a competência será Estadual ou Federal, conforme a
natureza do processo que tramita na Justiça.
Tratando-se do crime de sonegação de informes, os núcleos do tipo são recusar (não
aceitar) e omitir (deixar de fazer; não mencionar), sendo um tipo penal misto alternativo,
ou seja, no mesmo contexto, a prática de um ou de ambos os verbos resultará na prática
de apenas um crime.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa a quem seja dirigida a requisição dos dados. O
sujeito passivo é o Estado tendo em vista que o bem jurídico tutelado é a Administração
da Justiça. Não se admite a forma culposa, mas exige o dolo específico referente à
intenção de prejudicar ou obstruir a ação da justiça.
Saiba mais

São diversas as possibilidades de ocorrência da investigação no tocante ao combate às


organizações criminosas, inclusive referente à prática de crimes que tentam obstar a ação
das autoridades contra o crime organizado.
Para saber mais sobre o combate ao crime organizado, leia o trabalho acadêmico
intitulado “Estudo sobre a investigação criminal com foco na lei de combate às
organizações criminosas”, de autoria de Eli Gomes Novaes.

Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE

DELITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Conforme visto durante esta Unidade, foi promulgada a Lei nº 12.850/2013, que define o
conceito de organização criminosa e estabelece medidas para o seu combate efetivo.
O conceito de organização criminosa, conforme definido pela referida lei, abrange a
associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenadas, com divisão de tarefas
e atuação por tempo indeterminado, com o objetivo de obter vantagem econômica por
meio da prática de infrações penais graves.
A aplicabilidade da Lei nº 12.850/2013 não se restringe apenas às organizações
criminosas tradicionais, como grupos voltados para o tráfico de drogas ou para o
contrabando de armas. A legislação abrange qualquer forma de organização que se
enquadre na definição estabelecida, independentemente do tipo de atividade ilícita por ela
praticada.
Dessa forma, pode-se utilizar a lei de forma extensiva para combater outras modalidades
de grupos criminosos, como aqueles voltados para a corrupção, lavagem de dinheiro,
fraudes financeiras, entre outros.
O crime de organização criminosa, previsto na Lei nº 12.850/2013, consiste em constituir,
financiar ou integrar, diretamente ou por meio de terceiros, organização criminosa.
A pena prevista para esse tipo penal varia de 3 a 8 anos de reclusão, além de multa.
Ademais do descrito, a lei também elenca outros crimes relacionados que podem ser
praticados por essas organizações, dentre eles os de revelação de identidade do
colaborador; delação caluniosa; quebra de sigilo e sonegação de informes.
Dentre os efeitos da condenação, destaca-se a perda de bens, direitos e valores
relacionados à prática criminosa. A legislação estabelece que os bens provenientes de
infrações penais praticadas pela organização criminosa serão objeto de sequestro,
perdimento e confisco de origem ilícita. Essa medida busca desestimular e desmantelar
as estruturas financeiras das organizações criminosas, privando-as dos recursos
adquiridos de forma ilícita.
No âmbito do combate à criminalidade organizada, a Lei nº 12.850/2013 desempenha um
papel fundamental ao estabelecer tipos penais específicos para coibir e reprimir as
condutas que visam a obstrução da investigação e da persecução penal. Dentre esses
crimes, destaca-se o crime de impedimento ou embaraçamento da persecução penal,
previsto no artigo 2º, § 1º, inciso II da referida lei.
O crime de impedimento ou embaraçamento da persecução penal consiste em dificultar
ou obstruir, de qualquer forma, a investigação ou a persecução penal que envolva
organização criminosa. Tal conduta busca prejudicar ou frustrar a atuação dos órgãos
responsáveis pela repressão aos crimes organizados, como a polícia e o Ministério
Público.
É importante ressaltar que o crime de impedimento ou embaraçamento da persecução
penal não se restringe apenas aos membros da organização criminosa, mas pode
abranger qualquer pessoa que atue com o intuito de prejudicar o andamento das
investigações ou da ação penal relacionada à organização criminosa.
A Lei nº 12.850/2013 busca, assim, proteger o regular funcionamento das instituições
encarregadas de reprimir os crimes organizados e garantir a aplicação da justiça.
A punição dessa conduta visa não apenas coibir a atuação dos infratores, mas também
resguardar a integridade do sistema de justiça e garantir que os responsáveis por crimes
organizados sejam devidamente investigados, processados e condenados.

REVISÃO DA UNIDADE

Neste vídeo revisitaremos os principais aspectos da Lei nº 12.850/2013 no que se refere


ao conceito de organização criminosa, aplicabilidade por extensão da Lei nº 12.850/2013,
tipo penal de organização criminosa, efeitos da condenação, investigação em caso de
participação policial, proibição de obtenção de benefícios e outros crimes da Lei nº
12.850/2013.

ESTUDO DE CASO

Contextualizando a aprendizagem sobre a Lei nº 12.850/2013 que trata do crime


organizado no Brasil, considere que em uma pequena cidade costeira que faz fronteira
com outros dois países há uma organização criminosa que vem atuando há meses,
controlando o tráfico de drogas local, bem como a lavagem de dinheiro e outras atividades
ilícitas.
A organização é conhecida por sua sofisticação e habilidade em se adaptar às
investigações policiais. O grupo é composto por mais de quatro pessoas, com uma
estrutura hierárquica bem definida e atuação por tempo indeterminado, onde os líderes
são responsáveis pelo planejamento das ações a serem executadas pelos membros.
Recentemente, a polícia recebeu informações sobre as atividades da quadrilha e decidiu
iniciar uma investigação para desarticular o grupo. As autoridades locais têm
conhecimento das atividades da referida organização, mas enfrentam dificuldades em
reunir provas suficientes para iniciar uma investigação e desmantelar o grupo, pois um
funcionário público municipal e um policial vêm auxiliando o grupo encobrindo suas
atividades.
Outro fator que dificulta a ação das autoridades é a existência de um delator que vem
prestando informações que não ficaram comprovadas, como a revelação de identidade de
pessoas que supostamente integram a organização criminosa, sendo-lhes atribuídas
falsamente a prática de crimes relacionados ao tráfico de drogas e lavagem de dinheiro,
bem como uma estrutura hierárquica e divisão de tarefas que não correspondem à da
organização criminosa em comento.
Além disso, durante a investigação restou comprovado que alguns familiares de membros
do grupo, apesar de não integrarem a organização, tem atuado no sentido de destruir
eventuais provas que incriminariam o grupo.
Diante dessa situação, é necessário que você, em conjunto com as autoridades adotem
uma estratégia para combater a organização criminosa de acordo com as disposições da
Lei nº 12.850/2013.
Com base na legislação que visa combater o crime organizado no país, discorra sobre a
forma que as autoridades podem fazer uso dos mecanismos legais para desmantelar as
atividades da organização criminosa, mencionando aspectos processuais previstos na Lei
nº 12.850/2013 e os crimes previstos na referida legislação pelos quais as pessoas
mencionadas no caso poderiam responder conforme o que foi estudado na Unidade.

Reflita

Você deverá analisar os aspectos relacionados ao conceito de organização criminosa, e o


tipo penal de organização criminosa. É importante que observe a presença de todos os
elementos que caracterizam a organização criminosa. Relembre aspectos processuais
importantes da Lei de Organização Criminosa (Lei nº 12.850/2013) como a investigação
em caso de participação policial e a possibilidade de adoção de medida cautelar diversa
da prisão no caso de haver indícios suficientes de que o funcionário público integra
organização criminosa.
É necessário analisar sobre os outros tipos penais presentes na legislação, os chamados
crimes contra a Administração da Justiça no combate ao crime organizado.
Para a resolução do estudo de caso analise o Capítulo I – Da Organização Criminosa
(Arts. 1º e 2º do diploma normativo em estudo, bem como o Capítulo II, Seção V – Dos
Crimes Ocorridos na Investigação e na Obtenção da Prova (Arts. 18 ao 21 da Lei nº
12.850/2013).

RESOLUÇÃO DO ESTUDO DE CASO

A primeira etapa para desmantelar a organização criminosa e punir os envolvidos é a


obtenção de provas que evidenciem a existência da organização e suas atividades ilícitas.
Uma vez que as provas foram obtidas, é possível dar início às ações de investigação e
desarticulação da organização.
Com base nas provas coletadas, o Ministério Público ofereceu denúncia contra os
membros da organização criminosa, acusando-os dos crimes previstos na Lei nº
12.850/2013, como a constituição, financiamento ou integração pessoal ou por interposta
pessoa em organização criminosa.
A denúncia foi apresentada ao Poder Judiciário, que conduziu o processo criminal.
Conforme mencionado, a organização criminosa que vem atuando há meses, controlando
o tráfico de drogas local, como também a lavagem de dinheiro e outras atividades ilícitas,
sendo o grupo composto por mais de quatro pessoas, com uma estrutura hierárquica
bem definida e atuação por tempo indeterminado.
Nos termos do Art. 1º, da Lei nº 12.850/2013:

considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais


pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas,
ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente,
vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais
cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de
caráter transnacional.

(BRASIL, 2013)
Restando evidente a presença de todos os elementos que a caracterizam. A instrução
processual foi realizada e, diante dos indícios de que o funcionário público municipal
integra organização criminosa, o juiz determinou seu afastamento cautelar do cargo, sem
prejuízo da remuneração, para auxiliar a instrução processual.
Diante dos indícios de participação do policial, a Corregedoria de Polícia instaurou
inquérito policial e comunicou ao Ministério Público que designou membro para
acompanhar o feito até sua conclusão.
Quanto ao delator, este será punido pela prática do crime de delação caluniosa, que
consiste em “imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de
infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura
de organização criminosa que sabe inverídicas”, nos termos do Art. 19, da Lei nº
12.850/2013.
Os familiares serão punidos pela prática do crime de impedimento ou embaraçamento da
persecução penal (Art. 2º §1º, da Lei nº 12.850/2013). Ao final do processo, considerados
culpados, os membros da organização criminosa foram condenados conforme as penas
previstas no Art. 2º, da Lei nº 12.850/2013.
O trabalho conjunto entre as autoridades competentes e o devido processo legal foram
fundamentais para a desarticulação da organização criminosa e a promoção da justiça.

RESUMO VISUAL
Fonte: elaborada pelo autor.
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E SEUS MEIOS DE
PROVA
Aula 1
DA INVESTIGAÇÃO E MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA

O crescimento da criminalidade organizada representa ameaça à


sociedade e ao Estado Democrático de Direito, seja pela gravidade
das infrações penais praticadas, ou pelo decréscimo da confiança
nas instituições.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
A criminalidade organizada é, atualmente, um dos maiores problemas a serem
enfrentados pelo Estado e pela sociedade.
Seu crescimento representa ameaça à sociedade e ao Estado Democrático de Direito,
seja pela gravidade das infrações penais praticadas, ou pelo decréscimo da confiança nas
instituições, gerando um aumento do sentimento de insegurança gerado na coletividade.
É importante conhecer e identificar de que forma a criminalidade organizada age, quais os
mecanismos utilizados para engendramento na estrutura do Estado.
Traremos os conceitos abordados na temática e, também, exemplos de situações atuais,
facilmente visualizadas no nosso cotidiano e os meios disponíveis para obtenção da
prova, dentro de uma investigação que envolva a criminalidade organizada.
Vamos lá?

MEIOS DE INVESTIGAÇÃO E OBTENÇÃO DE PROVAS

Caro estudante, a complexidade das situações que envolvem o crime organizado fez com
que o Direito Penal e o Direito Processual Penal passassem a enxergar não somente a
figura do criminoso individual, mas também os crimes praticados dentro de contextos
associativos que transcendem as meras figuras da quadrilha ou bando, anteriormente
previstas no Código Penal, em sua redação original.
Foi necessária a adoção de novas técnicas de produção de prova, que acompanhassem o
incremento da atividade criminosa organizada, capazes de fazer frente aos ilícitos
perpetrados.
A Lei 12850/2013 passou a disciplinar com maior rigor as técnicas de investigação e
obtenção de prova, que podem ser utilizadas tanto na investigação preliminar, quanto na
ação penal propriamente dita, e que passaremos a ver adiante.
O artigo 3º da Lei 12.850 trouxe os meios de obtenção de prova no combate às
organizações criminosas, a saber: colaboração premiada; captação ambiental de sinais
eletromagnéticos, ópticos ou acústicos; ação controlada; acesso a registros de ligações
telefônicas e telemáticas, a dados cadastrais constantes de bancos de dados públicos ou
privados e a informações eleitorais ou comerciais; interceptação de comunicações
telefônicas e telemáticas; afastamento de sigilo financeiro, bancário e fiscal; infiltração de
agentes; cooperação entre instituições e órgãos das diversas esferas federativas.
Captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos
ou acústicos
A lei 12.850/2013 autoriza, expressamente, a interceptação ambiental de sinais
eletromagnéticos, ópticos ou acústicos.
Captar significa tomar conhecimento de conteúdo de comunicação alheia. O terceiro
passa a ter ciência do conteúdo de uma comunicação entre duas ou mais pessoas,
geralmente sem o conhecimento dos interlocutores.
Apesar de o dispositivo legal fazer referência ao termo captação, há que se inferir que a
captação de sinais eletromagnéticos, ópticos (filmagens e fotografias) ou acústicos
(gravação ambiental de conversa entre pessoas presentes) funciona, na verdade, como
elemento integrante do conceito de interceptação ambiental, também conhecido como
vigilância eletrônica (LIMA, 2019).

Quebra do sigilo fiscal e bancário. Quebra do sigilo


telefônico e telemático
A quebra do sigilo telefônico e telemático, apesar de prevista na Lei 12850/2013, faz
remissão a Lei 9296/96.
Como a regra nas comunicações telefônicas e telemáticas é sempre o sigilo (por
mandamento constitucional), para que se tenha acesso às conversas telefônicas e fluxo
telemático (comunicação digital, mensagens, emails etc.), é necessária autorização
judicial.
Da mesma forma, a Lei 12850/2013 contemplou a possibilidade de utilização, como meio
de obtenção de prova, dos instrumentos previstos na Lei Complementar 105/01 e do
Código Tributário Nacional.
A regra, no que diz respeito ao afastamento de referidos sigilos, segue o mesmo caminho
do sigilo telefônico e comunicações telemáticas. O artigo 1º, § 4º da Lei Complementar
105/01 enumera os crimes contemplados por ela, ou seja, cujas investigações ou ações
penais é cabível a medida.
Entre os crimes previstos, podemos citar: terrorismo; tráfico ilícito de substâncias
entorpecentes ou drogas afins; contrabando ou tráfico de armas, munições ou material
destinado à sua produção; extorsão mediante sequestro; contra o sistema financeiro
nacional; contra a Administração Pública; contra a ordem tributária e a previdência social;
lavagem de dinheiro ou ocultação de bens direitos e valores; praticado por organização
criminosa.
Já o artigo 198 do Código Tributário Nacional dispõe sobre o sigilo fiscal e disciplina de
que forma as informações fiscais do investigado ou acusado poderão ser remetidas ao
juízo.

Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a


divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação
obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito
passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou
atividades. (Redação dada pela Lcp nº 104, de 2001).
§ 1o Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art.
199, os seguintes: (Redação dada pela Lcp nº 104, de 2001).
I – requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça; (Incluído pela Lcp
nº 104, de 2001).
II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração
Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo
administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar
o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração
administrativa. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001).

(BRASIL, 2001)

A quebra do sigilo bancário e fiscal deverá ser precedida, quando no âmbito das
investigações ou da ação penal, da respectiva decisão judicial que a determine, da
mesma forma como acontece com as comunicações telefônicas e telemáticas.

COMPREENDER OS MEIOS DE INTERPRETAÇÃO E OBTENÇÃO DE


PROVAS

Neste bloco, analisaremos os meios de prova instituídos pela Lei 12.850/2013,


especialmente de que forma os instrumentos postos à disposição podem ser utilizados.

A captação ambiental
A captação ambiental de sinais acústicos, ópticos ou magnéticos pode ser feita por meio
de escutas, microfones, câmeras ocultas, monitoramento à distância, por satélite, antenas
ou outras formas de tecnologia.
A interceptação ambiental, portanto, é a captação de comunicação no recinto em que esta
ocorre, seja privado ou público, efetuada por terceiro, sem conhecimento dos
comunicadores. A escuta consiste na captação de comunicação em ambiente, feita por
terceiro, com o consentimento de um dos interlocutores.
Se a conversa captada for mantida em local público, sem expectativa de privacidade, sua
captação, ainda que sem autorização prévia, constitui prova lícita. Se acontecer em local
público, porém em caráter sigiloso, expressamente admitido pelos interlocutores, a
gravação sem autorização prévia constitui infração à privacidade, portanto, ilícita. Caso
aconteça em lugar privado e produzida sem prévia autorização judicial, constitui invasão
de privacidade.
Quanto à licitude da gravação ambiental clandestina, é pacífico na doutrina que, por força
do princípio da proporcionalidade, a divulgação de gravação não sub-reptícia de conversa
própria reputa-se lícita quando for usada para comprovar a inocência do acusado, ou
quando houver investida criminosa de um dos interlocutores contra o outro.

Captação ambiental. Captação em sentido amplo


O termo “captação” deve ser considerado em sentido amplo, do qual são espécies a
interceptação, a escuta e a gravação ambiental.
Interceptação ambiental ocorre quando o terceiro capta diálogo ou imagens envolvendo
duas ou mais pessoas, sem que nenhuma delas tenha conhecimento. Escuta ambiental
ocorre quando terceiro capta diálogo ou imagens envolvendo duas ou mais pessoas,
sendo que um deles saiba.
Gravação ambiental ocorre quando o diálogo ou imagens envolve duas mais pessoas é
captado, sendo que uma delas é a autora dos registros. Também chamado de gravação
ambiental clandestina (às ocultas).
Antes da Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime), a regra era de que se as pessoas
investigadas estivessem em ambiente público, não haveria necessidade de autorização
judicial, a não ser que a conversa tivesse caráter de confidencialidade, como uma
conversa entre cliente e advogado, por exemplo.Se a conversa ocorresse em local de
acesso restrito, era necessária autorização judicial.
Se a conversa captada for mantida em local público, sem expectativa de privacidade, sua
captação, mesmo que sem autorização prévia, constitui prova lícita. No entanto, se a
conversa for mantida em local público, mas com intenção explícita de ser confidencial
entre os interlocutores, a gravação sem autorização prévia constitui violação à
privacidade, portanto, ilícita. Já se a conversa ocorrer em um local privado e for gravada
sem prévia autorização judicial, constitui invasão de privacidade.

Interceptação das comunicações telefônicas e


telemáticas – Quebra do sigilo fiscal e bancário
O inciso V do artigo 3º da Lei 12.850/2013 faz remissão à reserva legal específica. A
interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas é regulamentada pela lei n.
9296/96 e o afastamento dos sigilos financeiro e bancário é disciplinado pela Lei
Complementar n. 105/01, e o afastamento do sigilo fiscal é disciplinado pelo Código
Tributário Nacional, no artigo 198.
Sendo assim, a previsão na Lei n. 12850/2013 não afasta, por óbvio, a incidência da
disciplina normativa que diz respeito ao afastamento dos sigilos em questão.
A regra, prevista na Constituição Federal, é a do sigilo das comunicações telefônicas e
telemáticas, como decorrência da proteção à intimidade do indivíduo (artigo 5º, X, da
Constituição).
Evidentemente, nenhum direito individual é absoluto, e por essa razão, a lei 9296/96 veio
trazer os requisitos que autorizam, em hipóteses excepcionais, o afastamento do sigilo
telefônico.
Como o afastamento em questão é medida de excepcional gravidade, necessária se faz a
presença de requisitos, como:

a. indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal.


b. imprescindibilidade da medida.
c. e que o fato investigado seja crime punido com pena de reclusão (artigo 2º, incisos
I a III).

Sendo assim, é necessário que se indique, com suficiente clareza, a autoridade policial ou
o membro do Ministério Público, os elementos razoáveis que apontem a autoria ou
participação do agente em infração penal, punida com pena de reclusão, e que a
finalidade de esclarecimento da verdade não possa ser obtida por outros meios.
O juiz decidirá, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, em decisão fundamentada,
que não poderá exceder o prazo de quinze dias (isso para a interceptação telefônica, que
é medida pela qual se colhe, em tempo real, toda a atividade desenvolvida no terminal
interceptado).
Acesso a dados cadastrais constantes de bancos de
dados públicos ou privados
O artigo 15 da Lei 12.850/2013 dispõe que o delegado de polícia e o Ministério Público
terão acesso, independentemente de autorização judicial, aos dados cadastrais do
investigado que informem exclusivamente a qualificação pessoal, filiação e endereço
mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores
de internet e administradoras de cartão de crédito.
Esses registros ficarão à disposição da autoridade judicial, Ministério Público e polícia,
para acesso direto e permanente, inclusive aqueles registros constantes nos bancos de
dados de concessionárias de telefonia fixa ou móvel.
Importante ressaltar que o acesso aos registros de identificação de números de terminais
de origem e destino das ligações telefônicas internacionais, interurbanas e locais serão
mantidos pelo prazo de 5 (cinco) anos, pelas concessionárias de telefonia.

INTERPRETAÇÃO E OBTENÇÃO DE PROVAS NA PRÁTICA

Com relação aos demais meios de prova, é fundamental ter em mente que a prova
produzida no decorrer da investigação ou ação penal que verse sobre o crime de
organização criminosa, assim como nos demais crimes, deve obedecer ao regramento
constitucional quanto à prova em geral. Isso significa dizer que qualquer determinação
judicial, no curso de ação penal ou investigação, deve ser realizada com observância ao
que determina a Constituição Federal no que diz respeito a produção da prova.
Sendo assim, a observância dos preceitos reserva de lei (artigo 5º, caput e II e LIV),
reserva de jurisdição e proporcionalidade das medidas deverá ser sempre a regra.

Licitude das gravações ambientais clandestinas


Quanto à licitude da gravação ambiental clandestina, é pacífico na doutrina que, por força
do princípio da proporcionalidade, a divulgação de gravação não-subpreptícia de
conversa própria reputa-se lícita quando for usada para comprovar a inocência do
acusado, ou quando houver investida criminosa de um dos interlocutores contra o outro.
Neste sentido, STF, 1ª Turma, HC 102.819/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 27/05/2011:

É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos


interlocutores sem conhecimento do outro.

STF. Plenário. RE 583937 QO-RG, Rel. Min. Cezar Peluso, j. em


19/11/2009 (Repercussão Geral – Tema 237).

Com a Lei n.º 13.964/2019 (Pacote Anticrime), foi inserido o art. 8º-A na Lei n.º 9296/96,
que exige prévia autorização judicial para a captação ambiental:

Art. 8º-A. Para investigação ou instrução criminal, poderá ser autorizada pelo
juiz, a requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, a captação
ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, quando:
I- A prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente
eficazes; e
II- Houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em
infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) aos ou
em infrações penais conexas.
§1º O requerimento deverá descrever circunstanciadamente o local e a forma
de instalação do dispositivo de captação ambiental ipsum dolor sit amet,
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(BRASIL, 1996)

No entanto, continua a ser desnecessária a autorização judicial em caso de captação


ambiental realizada por um dos interlocutores, conforme previsto no art. 10-A, § 1º, da Lei
9.296/96: Art. 10-A (...) § 1º Não há crime se a captação é realizada por um dos
interlocutores.

Requisitos para o afastamento do sigilo de ligações


telefônicas e telemáticas
A regra, prevista na Constituição Federal, é a do sigilo das comunicações telefônicas e
telemáticas, como decorrência da proteção a intimidade do indivíduo (artigo 5º, X, da
Constituição).
Evidentemente, nenhum direito individual é absoluto e, por isso, a Lei 9296/96 traz os
requisitos que autorizam, em hipóteses excepcionais, o afastamento do sigilo.
Como o afastamento em questão é medida de excepcional gravidade, necessária se faz a
presença de requisitos, como:

a. indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal.


b. imprescindibilidade da medida.
c. e que o fato investigado seja crime punido com pena de reclusão (artigo 2º, incisos
I a III).

Sendo assim, é necessário que se indique, com suficiente clareza, a autoridade policial ou
o membro do Ministério Público, os elementos razoáveis que apontem a autoria ou
participação do agente em infração penal, punida com pena de reclusão, e que a
finalidade de esclarecimento da verdade não possa ser obtida por outros meios.
O juiz decidirá, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, em decisão fundamentada,
que não poderá exceder o prazo de quinze dias (isso para a interceptação telefônica, que
é medida pela qual se colhe, em tempo real, toda a atividade desenvolvida no terminal
interceptado).

Afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal e


demais meios de obtenção de prova
Da mesma forma, a Lei 12850/2013 contemplou a possibilidade de utilização, como meio
de obtenção de prova, dos instrumentos previstos na Lei Complementar 105/01 e do
Código Tributário Nacional.
A regra, no que diz respeito ao afastamento de referidos sigilos, segue o mesmo caminho
do sigilo telefônico e comunicações telemáticas.
O artigo 1º, § 4º da Lei Complementar 105/01 enumera os crimes contemplados por esta,
ou seja, em cujas investigações ou ações penais é cabível a medida. São eles: terrorismo;
tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; contrabando ou tráfico de
armas, munições ou material destinado à sua produção; extorsão mediante sequestro;
contra o sistema financeiro nacional; contra a Administração Pública; contra a ordem
tributária e a previdência social; lavagem de dinheiro ou ocultação de bens direitos e
valores; praticado por organização criminosa.
Já o artigo 198 do Código Tributário Nacional dispõe sobre o sigilo fiscal e disciplina de
que forma as informações fiscais do investigado ou acusado poderão ser remetidas ao
juízo. A quebra do sigilo bancário e fiscal deverá ser precedida, quando no âmbito das
investigações ou da ação penal, da respectiva decisão judicial que a determine.
Com relação aos demais meios de prova, ressalta-se o fato de que a prova produzida no
decorrer da investigação ou ação penal que verse sobre o crime de organização
criminosa, assim como nos demais crimes, deve obedecer ao regramento constitucional
quanto a prova em geral.
Isso significa dizer que qualquer determinação judicial, no curso de ação penal ou
investigação, deve ser realizada com observância ao que determina a Constituição
Federal no que diz respeito a produção da prova. Sendo assim, a observância dos
preceitos reserva de lei (artigo 5º, caput e II e LIV), reserva de jurisdição e
proporcionalidade das medidas deverá ser sempre a regra.

Saiba mais

Poderá saber mais sobre o assunto em aula, bem como trazendo informações acerca do
trabalho desenvolvido no combate ao crime organizado, nos links a seguir.
Um deles trata-se de uma publicação sobre combate a organizações criminosas. Vale a
pena conferir, para ilustrar ainda mais o conhecimento adquirido em sala de aula. Confira:

• Combate a corrupção
• Linha do tempo
• Organizações Criminosas: o novo tipo de milícia

Aula 2
DA INVESTIGAÇÃO E MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA II

A Lei 12.850/2013, no intuito de acompanhar a complexidade que


também alcançou a criminalidade organizada, trouxe importantes
institutos que aprimoram a atividade policial e investigativa, e são
importantes instrumentos para coleta de elementos para formação da
culpa dentro da persecução penal.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Dentro da complexidade verificada na atividade criminosa moderna, muitas vezes os
instrumentos tradicionais de investigação mostram-se insuficientes à consecução dos
objetivos maiores da Lei, que é justamente a repressão aos delitos.
A Lei 12.850/2013, no intuito de acompanhar a complexidade que também alcançou a
criminalidade organizada, trouxe importantes institutos que aprimoram a atividade policial
e investigativa, e são importantes instrumentos para coleta de elementos para formação
da culpa dentro da persecução penal.
Veremos, nesta aula, instrumentos que estão à disposição para a coleta de elementos de
prova, dentro de uma investigação que envolva a criminalidade organizada.
Vamos lá?

AÇÃO CONTROLADA E INFILTRAÇÃO DE AGENTES E ACESSO A


REGISTRO

Existem situações concretas em que a investigação, caso siga o trâmite normal, acabará
desembocando na prisão dos integrantes do grupo até então investigado. Referida
providência, em determinados casos, acaba se mostrando pouco produtiva, tendo em
vista a necessidade de se descobrir outros integrantes do grupo ou suas ramificações.
Sendo assim, pelo menos em um primeiro momento, a legislação passa a permitir o
monitoramento das ações criminosas do grupo organizado, notadamente dos que
exerçam o comando deste.
Surge, então, a figura da ação controlada, que consiste no retardamento da intervenção
do aparato estatal, que segue agindo, todavia, diferindo a ação para o momento mais
oportuno sob o ponto de vista da investigação.

Conceito de ação controlada


A ação controlada é uma técnica especial de investigação, prevista na Lei de Drogas (Lei
11.343/06, artigo 53, II), na Lei de Lavagem de Capitais (Lei 9.613/98, art. 4º-B) e na Lei
de Organizações Criminosas (Lei 12.850, art. 8º).
A Lei das Organizações Criminosas (12.850/2013) trata da ação controlada, indicando
que consiste em retardar a intervenção policial ou administrativa relativa à ação praticada
por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida sob observação e
acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz à
formação de provas e obtenção de informações.
A ação controlada, na Lei 12.850/2013, fala, portanto, em retardamento da intervenção
policial ou administrativa, o que significa dizer que a não atuação poderá abranger não
somente ações policiais, mas também intervenções administrativas.
Isso, por consequência, permite inferir que agentes das receitas estadual e federal,
integrantes de agências de inteligência e outras autoridades administrativas poderão
retardar sua intervenção para que esta seja efetivamente implementada em momento
mais propicio sob o ponto de vista da coleta de elementos informativos.

Conceito de infiltração de agentes


A infiltração de agentes, outra técnica de investigação prevista na lei de organizações
criminosas, tem sua admissibilidade disciplinada no artigo 10, assim redigido:

A infiltração de agentes de polícia em tarefas de investigação, representada


pelo delegado de polícia ou requerida pelo Ministério Público, após
manifestação técnica do delegado de polícia quando solicitada no curso de
inquérito policial, será precedida de circunstanciada, motivada e sigilosa
autorização judicial, que estabelecerá seus limites.

(BRASIL, 2013)

A referida técnica consiste em introduzir um agente, dissimuladamente, na organização


criminosa, que passa a agir como um de seus integrantes, ocultando sua verdadeira
identidade, com a finalidade de identificar-se fontes de prova e obter-se elementos
capazes de permitir ser a organização desarticulada.
Assim, o agente policial se apresenta de forma disfarçada e infiltra-se na organização,
para, a partir daí, conhecer os meandros da atividade criminosa, a fim de se permitir sua
desarticulação.
A Lei 12.850/2013 prevê, portanto, a infiltração para agentes de polícia, excluindo a
autorização de particulares.

COMPREENDENDO A AÇÃO CONTROLADA, A INFILTRAÇÃO DE


AGENTES E OS ACESSOS A REGISTROS

Requisitos e características da ação controlada


Embora a lei não restrinja a utilização desse importante instrumento de investigação, a
ação controlada costuma ser utilizada com maior frequência nos delitos permanentes, que
permitem a prisão em flagrante enquanto não cessar a permanência, nos termos do
previsto no artigo 303 do Código de Processo Penal.
A ação controlada não é incompatível com o direito a não-autoincriminação. A Lei 12.850
não faz nenhuma referência expressa à necessidade de prévia autorização judicial para a
execução da ação controlada quando se estiver diante de crimes praticados por
organizações criminosas, a julgar do disposto no artigo 8º, § 1º:
A dispensa de prévia autorização judicial para o emprego da técnica da ação controlada
se justifica pela necessidade de preservação da agilidade da investigação, que não
poderia estar condicionada a eventual espera ou demora inerente à tramitação das
decisões judiciais. Sendo assim, se a autoridade policial ou administrativa verificar a
necessidade de utilização dessa técnica de investigação, poderá desde logo utilizá-la.
Todavia, se existe a dispensa de autorização, deverá a autoridade comunicar o juiz com
antecedência que, neste caso, estabelecerá seus limites e comunicará ao Ministério
Público, conforme dispõe expressamente o artigo já mencionado.
Essa comunicação imediata ao juiz é importante, também, para afastar a
responsabilidade criminal das autoridades por eventual crime de prevaricação, naquelas
hipóteses em que se estiver diante de uma situação de prisão em flagrante e esta não for
realizada.

Requisitos e características da infiltração de agentes


A técnica infiltração de agentes deverá ser previamente autorizada pelo juiz competente,
que estabelecerá seus limites na decisão. Podendo ocorrer na forma virtual, conforme
expressamente previsto no artigo 10-A da Lei 12850/2013.
A referida Lei traz como requisito para a infiltração de agentes a imprescindibilidade da
medida no artigo 10-A, § 3º. Ou seja, a infiltração somente será deferida se a prova não
puder ser produzida por outros meios disponíveis, e será autorizada pelo prazo de até 6
(seis) meses, sem prejuízo de eventuais renovações, desde que comprovada a
necessidade.
Todo o procedimento da infiltração de agentes será sigiloso, somente tendo acesso aos
autos o juiz, o Ministério Público e o delegado de polícia (art. 10-B, parágrafo único).
Desse modo, a fim de que ocorra a ação de um agente infiltrado, é necessário seguir um
procedimento que envolve a apresentação de um requerimento escrito, seja da autoridade
policial, seja do Ministério Público, seguido de autorização do juiz.
A decisão judicial que autoriza a infiltração tem validade de até 6 (seis) meses
prorrogáveis, dependendo da necessidade.
A partir do momento em que o agente infiltrado passa a integrar a organização como se
fosse um dos membros, agirá, evidentemente, como um criminoso, e é possível que os
demais integrantes exijam dele a prática de crimes.
Em determinados casos concretos, o agente infiltrado deverá acompanhar os demais
integrantes da organização, para não levantar suspeitas sobre sua real identidade,
viabilizando a colheita de elementos de informação na investigação.
Sendo assim, o artigo 10-C disciplina acerca da responsabilidade criminal do agente
infiltrado:

Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para, por meio da
internet, colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos no art.
1º desta Lei.

(BRASIL, 2013)

Evidentemente, a proteção se dá exclusivamente aos atos relacionados à finalidade da


investigação. O agente que não observar essa estrita finalidade deverá responder pelos
excessos praticados, contidos no art. 10-C, parágrafo único e artigo 13.
O agente infiltrado goza de proteção enquanto dura a investigação, e em momento
posterior. O artigo 14 assegura a preservação de nome, qualificação, imagem voz e
demais informações pessoais, bem como não ter sua identidade revelada, nem ser
fotografado ou filmado pelos meios de comunicação, sem sua prévia autorização por
escrito; assegura, também, o direito de recusar ou fazer cessar sua atuação infiltrada.

A AÇÃO CONTROLADA, A INFILTRAÇÃO DE AGENTES E O ACESSO AOS


REGISTROS NA PRÁTICA

Do acesso aos dados cadastrais do investigado


O artigo 15 da Lei 12850/2013 prevê a possibilidade de a autoridade policial e o Ministério
Público terem acesso aos dados cadastrais do investigado, independente de prévia
autorização judicial.
Assim, tendo já um indivíduo investigado, polícia e Ministério Público poderão ter acesso
aos dados cadastrais para sua correta qualificação e localização. Portanto, independente
de prévia autorização judicial, a polícia e o Ministério Público poderão ter acesso
exclusivamente aos dados cadastrais do investigado, que contenham:

a. Qualificação pessoal: nome, nacionalidade, naturalidade, data de nascimento,


estado civil, profissão, número de registro geral e número de CPF.
b. Filiação: indicação do nome do pai e da mãe.
c. Endereço: local de residência e trabalho.

Vejamos alguns entendimentos jurisprudenciais, para ilustrar o assunto: Neste primeiro


julgado, o STJ decidiu que não estão presentes os requisitos da infiltração de agentes em
caso de agente policial que representou o ofendido nas negociações de extorsão, sem se
infiltrar exatamente na OrCrim sem o propósito de angariar a confiança de seus membros
ou obter provas sobre a estrutura e funcionamento do bando:

Não há infiltração policial quando agente lotado em agência de inteligências,


sob identidade falsa, apenas representa o ofendido nas negociações da
extorsão, sem se introduzir ou se infiltrar na organização criminosa com o
propósito de identificar e angariar a confiança de seus membros ou obter provas
sobre a estrutura e o funcionamento do bando.

(STJ – 6ª Turma. HC 512.290-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. em


18/08/2020 (Info 677)

Neste outro caso, o STJ entendeu que assim como na interceptação telefônica, pode ser
que na infiltração policial, autorizada previamente pelo juiz, venha a ser descoberto,
casualmente, outros crimes que não aqueles para os quais a diligência (infiltração de
agentes) tenha sido dirigida, não maculando, de toda forma, a prova produzida, diante da
“descoberta casual”, ou “encontro fortuito”, plenamente admissível (também conhecido na
doutrina como “serendipidade”):

(...) 1. Não há violação ao princípio da ampla defesa a ausência das decisões


que decretaram a quebra de sigilo telefônico em investigação originária, na qual
de modo fortuito ou serendipidade se constatou a existência de indícios da
prática de crime diverso do que se buscava, servindo os documentos juntados
aos autos como mera notitia criminis, em razão da total independência e
autonomia das investigações por não haver conexão delitiva.
2. o chamado fenômeno da serendipidade ou o encontro fortuito de provas –
que se caracteriza pela descoberta de outros crimes ou sujeitos ativos em
investigação com fim diverso – não acarreta qualquer nulidade ao inquérito que
se sucede no foro competente, desde que remetidos os autos à instância
competente tão logo verificados indícios em face da autoridade (...)

(RHC 60871/MT, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, j. em 04/10/2016,


DJe 17/10/2016).

Saiba mais

Veja nos links a seguir julgados igualmente importantes do STJ, devidamente


comentados, e que são de grande valia para seus estudos dos institutos aqui tratados
(ação controlada e agente infiltrado):
• Comentários à infiltração de agentes de polícia na internet para investigar crimes
contra a dignidade sexual de criança e de adolescente,
• Interessante caso envolvendo infiltração policial, ação controlada, gravação
ambiental e cooperação com agência de inteligência.

Aula 3
DA COLABORAÇÃO PREMIADA

Nesta aula, trataremos da colaboração premiada, importante


instrumento de obtenção de prova na persecução penal que verse
sobre organizações criminosas.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Como vimos nas aulas anteriores, o sistema de investigação da criminalidade organizada
demanda a utilização de recursos que desafiam a complexidade da vida moderna.
Dentre os instrumentos trazidos pela Lei 12.850/2013, muito se fala sobre a possibilidade
de utilização de declarações dos envolvidos nos crimes para fins de produção de prova e
incriminação e identificação dos demais autores de delito, nos crimes de autoria coletiva,
especificamente naqueles praticados no contexto de organizações criminosas.
Nesta aula, trataremos da colaboração premiada, importante instrumento de obtenção de
prova na persecução penal que verse sobre organizações criminosas.
Vamos lá?

DA COLABORAÇÃO PREMIADA

Desde tempos imemoriais, convive o ser humano com a figura da traição. No Direito não
poderia ser diferente. A ação de um indivíduo em apontar os demais autores da infração
penal, obtendo benefício em troca, surge como uma ferramenta crucial para
desmantelamento das organizações criminosas. Essa prática é prevista como meio de
produção de prova na Lei 12.850/2013.
A colaboração premiada pode ser, assim, conceituada como:

Técnica especial de investigação por meio da qual o coautor e/ou partícipe da


infração penal, além de confessar seu envolvimento no fato delituoso, fornece
aos órgãos responsáveis pela persecução penal informações objetivamente
eficazes para a consecução de um dos objetivos previstos em lei, recebendo,
em contrapartida, determinado prêmio legal.

(LIMA, 2019, p. 808)

A colaboração premiada apresenta natureza jurídica de ato negocial entre investigado ou


acusado e acusação, mediante o qual a par de confessar a prática do fato, este fornece
elementos hábeis à elucidação dos crimes objeto da persecução penal.
As consequências da colaboração do agente não dependem da consecução, do
atendimento a todos os resultados previstos no artigo 4º da Lei 12.850/2013. O agente
fará jus aos prêmios legais previstos no caput do artigo levando-se em consideração sua
personalidade, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato
criminoso, além, evidentemente, da eficácia da colaboração.

(...) o juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir
em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por
restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente
com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração
advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I - A identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e
das infrações penais por eles praticadas;
II - A revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização
criminosa;
III - A prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização
criminosa;
IV - A recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações
penais praticadas pela organização criminosa;
V - A localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

(BRASIL, 2013)

COLABORAÇÃO PREMIADA: REQUISITOS E CONSEQUÊNCIAS, PONTOS


POSITIVOS E NEGATIVOS

A colaboração premiada deve ser voluntária, ou seja, deve expressar um ato de vontade
do agente, independentemente dessa vontade ter sido espontânea ou não.
É necessário, então, a plena manifestação de vontade do agente, ainda que tenha sido
aconselhado por terceiro, mas que venha com plena consciência da realidade, resultante
de escolha deliberada sem má-fé. Não se faz necessário, na colaboração premiada,
perquirir-se acerca dos motivos que levaram o colaborador a assim proceder.
Para que o agente faça jus aos benefícios penais e processuais penais estipulados pela
Lei, é indispensável aferir-se a relevância e a eficácia objetiva das declarações prestadas
pelo colaborador.
O artigo 5º da Lei 12.850/2013 traz os direitos do colaborador:

I - Usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica; ter


nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservadas;
II - Ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;
III - Participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;
IV - Não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser
fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;]
V - Cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou
condenados.

(BRASIL, 2013)
O artigo 6º prevê que o termo de acordo da colaboração premiada deverá vir por escrito,
contendo relato da colaboração e possíveis resultados; condições da proposta do
Ministério Público ou do delegado de polícia; declaração de aceitação do colaborador e
seu defensor; assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de
polícia, colaborador e seu defensor, e especificação das medidas de proteção ao
colaborador e sua família, quando necessário.
Portanto, é legitimada pela Lei a celebração da colaboração premiada tanto ao membro
do Ministério Público, quanto ao delegado de polícia. Neste último caso, sendo o
Ministério Público o titular da persecução penal, deverá concordar com a proposta
oferecida pelo delegado de polícia e submetê-lo à homologação pelo juiz. Se, em
manifestação, o Ministério Público não concordar com a proposta de acordo oferecida
pelo delegado de polícia, o juiz não poderá homologar a colaboração.
Havendo recusa à proposta de colaboração premiada por parte do Ministério Público, será
realizado segundo o previsto no artigo 28 do Código de Processo Penal, ainda com a
redação antiga, remetendo-se a questão à apreciação do Procurador-Geral de Justiça,
que decidirá sobre o oferecimento da proposta.
A proposta, de acordo de colaboração premiada, é retratável até a homologação.
Portanto, até que seja feita pelo juiz, podem as partes (Ministério Público e investigado ou
acusado) voltarem atrás no acordo celebrado. Neste caso, as provas auto incriminatórias
produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor,
de acordo com o art. 4º, § 10 da Lei 12.850/2013.
Com a homologação do acordo, pelo juiz, no qual serão analisados os requisitos do § 7º,
o colaborador renuncia, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio, estando
sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade (§ 14 do artigo 4º). O acordo
homologado poderá ser rescindido em caso de omissão dolosa sobre os fatos objeto da
colaboração (§ 17 do artigo 4º).
Por fim, a homologação do acordo de colaboração premiada pressupõe que o colaborador
não mais se envolva nas condutas ilícitas objeto da colaboração, sob pena de rescisão,
conforme § 18 do artigo 4º (BRASIL, 2013).

COLABORAÇÃO PREMIADA: DEMAIS ASPECTOS E EXEMPLOS

A colaboração premiada é um importante instrumento para produção da prova no


contexto da investigação e persecução penal das organizações criminosas. Vejamos
alguns tópicos de julgados do STJ:
No primeiro, firmou-se o entendimento de que a vítima não pode ser colaboradora, uma
vez que é a interessada na tutela punitiva. O acordo de colaboração premiada é firmado
entre Ministério Público e investigado ou acusado, não podendo a vítima assumir a
posição de colaboradora. Confira:

HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. AGENTE COLABORADOR.


VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE. BUSCA E APREENSÃO. FUDAMENTO APENAS
NO ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA. IMPOSSIBILIDADE.
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DEI NDÍCIOS MÍNIMOS DE
AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. REVIGAÇÃO DA PRISÃO
PREVENTIVA. EXTENSÃO AOS CORRÉUS.
1. Nos termos do § 6º do art. 4º da lei 12.850/2013, ‘o juiz não participará das
negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de
colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o
defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre
Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor’. (...)
2. Consta da peça acusatória que o colaborador ‘é pessoa que era comerciante
de bebidas, comidas e cigarros em Duque de Caxias que, inicialmente, fora
vítima da ORCRIM denunciada, pois teve cigarros apreendidos (roubados) e
que passou a ser obrigado, mediante grave ameaça, a vender os produtos do
bando, mas posteriormente passou a trabalhar no grupo criminoso; contudo,
voltou a ser vítima do grupo, porque o colaborador premiado passou a temer
por sua vida e de sua família, tendo procurado a estrutura estatal disposto a
contar tudo o que sabia e pedir proteção’.
3. A Lei 12.850/2013 é peremptória ao dizer que ‘medidas cautelares reais ou
pessoais’, ‘recebimento de denúncia ou queixa-crime’ e ‘sentença condenatória’
não serão decretadas ou proferidas com fundamento apenas nas declarações
do colaborador (art. 4º, § 16).

(BRASIL, 2013)

Neste outro julgado, assentou-se a ilicitude da colaboração premiada firmada co-


advogado que, sem justa causa, entregou às autoridades documentos e gravações
obtidas em virtude de mandato que lhe fora outorgado, violando o dever de sigilo
profissional:

RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR


HABEAS CORPUS. EXCEPCIONALIDADE. LEI N. 12850/2013.
COLABORAÇÃO PREMIADA FEITA POR ADVOGADO. NATUREZA JURÍDICA
DE MEIO DE OBTENÇÃO DE PROVA (...) VIOLAÇÃO DE SIGILO
PROFISSIONAL. (...) NULIDADE DO ACORDO DE COLABORAÇÃO
PREMIADA. PRECEDENTES DO STJ. (...)
3. É possível a anulação e declaração de ineficácia probatória de acordos de
colaboração premiada firmados em desrespeito às normas legais e
constitucionais.
4. O dever de sigilo profissional importo ao advogado e as prerrogativas
profissionais a ele asseguradas não têm em vista assegurar privilégios
pessoais, mas sim os direitos dos cidadãos e o sistema democrático.
5. É ilícita a conduta do advogado que, sem justa causa, independentemente de
provocação e na vigência de mandato, grava clandestinamente suas
comunicações com seus clientes com objetivo de delatá-los, entregando às
autoridades investigativas documentos de que dipõe em razão da profissão, em
violação ao dever de sigilo profissional imposto no art. 34, VII da lei n.
8906/1994. (...)

(STJ – RHC 164.616-GO, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma,
j. em 27/09/2022, DJe 30/09/2022)
Saiba mais

Veja no link a seguir os julgados do STJ sobre o assunto – colaboração premiada. Vale a
leitura, para entender como se desenvolveu o entendimento do Tribunal que faz a
interpretação da Lei infraconstitucional do país sobre esse tema:

• Colaboração premiada.

Aula 4
ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E SUAS DIMENSÕES

No nosso dia a dia, podemos perceber, nos telejornais e no mundo


virtual, que a todo momento surgem novas atividades que demandam
uma atuação mais eficaz no combate às atividades ilícitas
desenvolvidas por grupos que se organizam na macrocriminalidade.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Conforme vimos anteriormente, o Estado conta com diversos instrumentos para combate
ao crime organizado. Todavia, podemos perceber no nosso dia a dia, nos telejornais e no
mundo virtual, que a todo momento surgem novas atividades que demandam uma
atuação mais eficaz no combate às atividades ilícitas desenvolvidas por grupos que se
organizam na macrocriminalidade.
Nesta aula, veremos como a atuação desses grupos impacta negativamente na
sociedade brasileira, e quais são as formas de identificação dessas ações ilícitas por eles
praticadas.
Bons estudos!

ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS: DIMENSÕES ESTRUTURAIS, MEIOS DE


INTERROMPER E SEGURANÇA ESTATAL

Como visto nas aulas anteriores, sempre que estivermos diante de um grupo formado por
mais de quatro indivíduos, associados de forma permanente e estável, e de forma
estruturalmente ordenada, com divisão de tarefas, unidos, enfim, para a prática de
diversos crimes (crimes estes com penas máximas superiores a quatro anos, praticados
no Brasil, ou crimes e contravenções praticados dentro e fora do Brasil), estaremos diante
de uma organização criminosa.
Podemos perceber, também, que a atuação desses grupos organizados causa enorme
prejuízo à coletividade, não apenas porque causa na população um sentimento de
descrédito perante as instituições de segurança pública, mas também porque essa
atuação acaba impactando na própria economia do país.
Neste bloco, falaremos como se organiza – a partir de números retirados de fontes oficiais
– o crime organizado no Brasil e os impactos deste na democracia.
Por trás das notícias que vemos diariamente nos jornais, acerca da atuação dos grupos
organizados no Brasil, mais especificamente das facções criminosas que tomaram espaço
nas prisões brasileiras, temos um fenômeno histórico e sociológico que remonta à década
de 1960. Nessa época, o Brasil passou por mudanças significativas, deixando de ser um
país com uma população de maioria rural, para, na década de 1980, ter a maior parte da
população concentrada nos centros urbanos.
Essa migração de pessoas, sendo grande parte sem acesso à educação, somada às
crises econômicas mundiais, e – por que não – às crises internas, foram um dos fatores
que levaram ao aumento da criminalidade no país. Some-se a isso a ausência do Estado
em áreas importantes, como educação, saúde, moradia etc.
Entende-se, então, que o aumento da população com pouca ou nenhuma condição de
vida, a exclusão social, embora não sejam causa da criminalidade, fornecem território e
integrantes para o crime organizado. No entanto, não são apenas esses fatores que
contribuem para a ocorrência da criminalidade organizada.
A falta de perspectiva em uma sociedade em que o indivíduo é validado pelo que possui,
não pelo que ele realmente é; a falta de perspectiva causada pela ausência de mobilidade
social, por falta de oportunidades aos indivíduos oriundos das classes menos favorecidas;
e, ainda, o sentimento de descrédito nas instituições, que podem ser considerados fatores
importantes para o aumento do crime organizada.
Não existem elementos seguros que possam apontar os fatores reais desse aumento,
mas a comparação dos índices de violência, bem como dos números de presos,
atualmente, vinculados a facções criminosas, nos levam a um quadro que talvez nos faça
compreender a real situação do país atualmente.
Some-se a isso o sentimento de impunidade, especialmente quanto aos crimes praticados
contra a Administração Pública ou nos crimes de lavagem de capitais, que geralmente
envolvem pessoas integrantes das camadas mais abastadas da sociedade.
O Brasil possui aproximadamente 53 (cinquenta e três) facções criminosas em atuação.
Em cada Estado e no Distrito Federal há pelo menos um grupo com presença registrada.
Segundo levantamento feito pelo Fórum Nacional de Segurança Pública, organizações
como PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho) se rivalizam na
disputa por territórios e têm atuação nacional.
A facção de origem paulista (PCC) está presente no DF e em outros 24 estados. Já o
grupo nascido no Rio de Janeiro (CV) atua em 13 Estados, além do DF. Tais informações
constam na edição especial do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em
25/07/2022.
De acordo com o Índice Global do Crime Organizado, primeiro levantamento dessa
natureza, recém-lançado pela Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Transnacional
(GI-TOC, 2022), comparado aos demais países, o Brasil é o 22º dos 193 estados-
membros da ONU com o maior índice de criminalidade organizada. Na América do Sul,
fica atrás apenas de Colômbia, Venezuela e Paraguai. No quesito “mercado criminoso”
(criminal market), o Brasil ocupa o 11º lugar.

COMPREENDENDO AS DIMENSÕES ESTRUTURAIS, OS MEIOS DE


INTERROMPER E A SEGURANÇA ESTATAL EM RELAÇÃO ÀS
ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

A Constituição brasileira notabiliza-se por regulamentar e proteger a cidadania. Neste


sentido, apresenta mecanismos de proteção de dois elementos importantes.
O primeiro deles é a proteção dos direitos e liberdades individuais face às ameaças
representadas pela força e poder das instituições do Estado (controle do uso dos meios
de violência na produção da ordem social). O segundo é a proteção da vida e propriedade
dos cidadãos ameaçadas por condutas criminosas (âmbito da eficiência no controle
social).
Partindo do pressuposto que o Estado se organiza e por meio dessa organização chama
para si a responsabilidade de controle social e proteção ao direito do cidadão, pode-se
inferir com razoável facilidade que os agentes estatais devem nortear sua atuação com
base na publicidade e transparência de seus atos, que culminam a visibilidade das ações
do Poder Público e com a participação na gestão da coisa pública.
Sendo assim, condutas de agentes públicos ou particulares que tratam com o Poder
Público, que venham a transgredir, ainda que minimamente, regras de conduta, estão
incluídas no conceito de corrupção, em sentido amplo. Esse é um dos desafios a serem
enfrentados no combate ao crime organizado, que também se verifica no âmago da
organização do Estado, como veremos a seguir. com os crimes contra a Administração
Pública.
Neste sentido, no combate ao crime organizado, o Estado deve pautar-se também pela
transparência e publicidade, minimamente exigidas dentro do estado democrático de
direito.
É necessário pensar estratégias de combate, sem sacrifício dos direitos humanos
assegurados, e, ainda, ter como objetivo a realização da justiça social, sendo este um
desafio dos tempos atuais, diante do quadro desastroso em que se encontra a nossa
segurança pública.
Assim, reconhecer que o crime organizado faz parte da rotina do brasileiro implica
reconhecer, também, que as velhas estratégias de combate devem ser abandonadas e
que o combate efetivo só pode ser alcançado se não houver abandono das garantias
mínimas do cidadão.
É preciso superar a propaganda governamental e o senso comum que tratam o combate
ao crime organizado como uma luta do bem contra o mal, em que o Estado, representante
da ordem, da paz e do progresso, trava um combate civilizatório contra grupos violentos
que desafiam sua autoridade legítima colocando o país no rumo da barbárie.
O passado e o presente da relação entre o Estado e o crime organizado revelam uma
realidade que desmente essa caricatura. Estado e crime organizado estão
permanentemente conectados, numa relação tensa e explosiva, porém constante. Para
começar, o crime organizado no Brasil surge diretamente das ações e omissões do
Estado. As maiores facções nasceram no ventre do Estado: nas prisões, onde as
violências praticadas diretamente contra os corpos e as vidas dos detentos, ou
indiretamente, por meio do desrespeito aos direitos mais básicos, forneceram o
combustível necessário para que as facções explodissem.
Ao se expandir, o crime organizado amplia suas relações com o Estado, por meio da
corrupção de agentes e de acordos tácitos, que as forças de segurança
permanentemente são forçadas a assumir no contexto da “guerra às drogas”, esse
conflito impossível de ser vencido. E, ao combater as facções que ajudou a criar, o Estado
brasileiro frequentemente adota estratégias de uso da força que utilizam um grau de
barbárie que não deve nada ao crime organizado.
Portanto, levando-se em consideração que o crime organizado se origina das lacunas
deixadas pelo Estado no cumprimento de seus deveres básicos, há que se concluir que a
ação necessária para seu combate deve obedecer, como corolário do Estado
Democrático de Direito, ao mínimo de respeito aos direitos e garantias fundamentais do
indivíduo.

DIMENSÕES, FORMAS DE INTERROMPER E PROTEÇÃO ESTATAL NA


PRÁTICA
A atuação do Estado no sentido da prevenção e combate à criminalidade perpassa,
necessariamente, o respeito a direitos fundamentais do indivíduo. De que maneira se
realiza a compatibilização do combate às organizações criminosas com a preservação
mínima dos direitos fundamentais?
O Brasil é um país de proporções continentais, que ocupa posição de país dos mais
violentos do mundo. A violência experimentada, evidentemente, não tem causa única,
entre tantas, temos altos índices de corrupção, que gera um sentimento de descrédito nas
nossas instituições.
Essa situação resulta em uma perspectiva em que o individualismo acaba sendo
preponderante na vida das pessoas, levando a um sentimento de falta de limites.
Neste contexto, as ações do Estado constituem, inicialmente, a implantação de uma
política Nacional de Segurança pública, prevista na Lei 13.675/2018, que institui o
Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e cria a Política Nacional de Segurança
Pública e Defesa Social (PNSPDS), com a finalidade de preservação da ordem pública e
da incolumidade das pessoas e do patrimônio, por meio de atuação conjunta,
coordenada, sistêmica e integrada dos órgãos de segurança pública e defesa social da
União, Estados, DF e Municípios, em articulação da sociedade (art. 1º).
Dispõe, também, que “a segurança pública é dever do estado e responsabilidade de
todos, compreendendo a União, Estados, DF e Municípios, no âmbito das competências e
atribuições legais de cada um” (BRASIL, 2018) Portanto, a segurança pública depende de
ação articulada de todos os entes federativos.

O Sistema Único de Segurança Pública


O Sistema em questão prevê, como decorrência da ação articulada de todos os entes
federativos, operações e colaborações nas estruturas federal, estadual e municipal.
Assim, as Secretarias de Segurança e as guardas municipais serão integrados para atuar
de forma cooperativa, sistêmica e harmônica (SOUSA, 2022),
Assim, as operações, que podem ser tanto ostensivas, investigativas ou mistas, podem
ocorrer de maneira articulada, especialmente quando se tratar de enfrentamento a
organizações criminosas.
O artigo 3º estabelece a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social
(PNSPDS), que traz os seguintes princípios:

I. Respeito ao ordenamento jurídico e aos direitos e garantias individuais e coletivos;


II. Proteção, valorização e reconhecimento dos profissionais de segurança pública;
III. Proteção dos direitos humanos, respeito aos direitos fundamentais e promoção da
cidadania e da dignidade da pessoa jumana;
IV. Eficiência na prevenção e no controle das infrações penais;
V. Eficiência na prevenção e na redução de riscos em situações de emergência e
desastres que afetam a vida, o patrimônio e o meio ambiente;
VI. Participação e controle social;
VII. Resolução pacífica de conflitos;
VIII. Uso comedido e proporcional da força;
IX. Proteção da vida, do patrimônio e do meio ambiente;
X. Publicidade das informações não sigilosas;
XI. Promoção da produção de conhecimento sobre segurança pública;
XII. Otimização dos recursos materiais, humanos e financeiros das instituições;
XIII. Simplicidade, informalidade, economia procedimental e celeridade no serviços
prestados à sociedade;
XIV. Relação harmônica e colaborativa entre os poderes;
XV. Transparência, responsabilização e prestação de contas.

(BRASIL, 2018)
A Lei estabelece, ainda, as diretrizes da PNSPDS em seu artigo 3º, dentre os quais a
ação integrada entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em ações de
segurança pública e políticas transversais para a preservação da vida, meio ambiente e
dignidade da pessoa humana.
Em seu artigo 6º, estabelece os objetivos da PNDSPDS, nos incisos de I a XXVI, que
direcionarão a formulação do Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social,
estabelecendo estratégias, metas, indicadores e ações para alcance desses objetivos.
Como estratégias de ação do Estado, o artigo 7º estabelece que:

a PNSPDS será implementada por estratégias que garantam integração,


coordenação e cooperação federativa, interoperabilidade, liderança situacional,
modernização da gestão das instituições de segurança pública, valorização e
proteção dos profissionais, complementaridade, dotação de recursos humanos,
diagnóstico dos problemas a serem enfrentados, excelência técnica, avaliação
continuada dos resultados e garantia da regularidade orçamentária para
execução de planos e programas de segurança pública.

(BRASIL, 2018)

A lei estabelece, também, a criação de Conselhos de Segurança Pública e Defesa social,


compostos por:

I. Representantes de cada órgão ou entidade integrante do Susp;


II. Representante do Poder Judiciário;
III. Representante do Ministério Público;
IV. Representante da OAB;
V. Representante da Defensoria Pública;
VI. Representantes de entidades e organizações da sociedade cuja finalidade esteja
relacionada com políticas de segurança pública e defesa social;
VII. Representantes de entidades de profissionais de segurança pública.

(BRASIL, 2018)
Além das diretrizes adotadas na elaboração dos planos de ação pelo Estado e no efetivo
acompanhamento dessas políticas, especialmente no combate ao crime organizado, a
referida lei traz o Programa Nacional de Qualidade de Vida para profissionais da
Segurança Pública (Pró-vida).
Esse programa tem como propósito a preservação e monitoração à qualidade
psicossocial e de saúde dos profissionais de segurança pública e defesa social,
integrando sistemicamente as unidades de saúde dos órgãos que compõem o SUSP.
A política de atenção aos profissionais inclui diretrizes relacionados à prevenção da
violência autoprovocada e do suicídio, que também são fatores importantes para uma
atuação efetiva com a minimização dos danos aos agentes públicos (artigos 42 a 42-E).
Saiba mais

As duas publicações indicadas trazem informações acerca dos números da criminalidade


do Brasil, conforme Anuário de Segurança Pública, publicado em dezembro de 2022 e,
também,o Relatório elaborado pelo Organized Crime Index Report, divulgado em 2022.
São publicações que ajudarão a entender a situação do Brasil perante os demais países,
no que diz respeito à criminalidade organizada.

Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE

MÉTODOS E TÉCNICAS DE PRODUÇÃO DE PROVA

Olá, estudante! Vamos revisar o conteúdo apresentado na Unidade 2.


A Lei 12.850/13 traz todo um sistema de métodos de investigação e produção de prova,
previstos a partir do artigo 3º. Registre-se, aqui, os mais importantes.

Colaboração premiada
A colaboração premiada é instrumento de investigação em que o autor do crime confessa
seu envolvimento no fato e fornece aos órgãos responsáveis pela persecução
informações e elementos eficazes para a investigação ou ação penal, recebendo, em
troca, determinado prêmio legal.
Com a homologação do acordo de colaboração premiada, o colaborador renuncia ao seu
direito ao silêncio, sujeitando-se ao compromisso legal de dizer a verdade.

Afastamento do sigilo telefônico e de comunicações


telemáticas
A regra prevista na Constituição é a da proteção da intimidade do indivíduo. Todavia,
como nenhum direito individual é absoluto, a Lei 9296/96 traz os requisitos que autorizam,
excepcionalmente, o afastamento do sigilo.
São eles:

• Indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal.


• Imprescindibilidade da medida.
• Que o fato investigado seja crime punido com pena de reclusão.

Afastamento do sigilo financeiro, bancário e fiscal


Segue os mesmos fundamentos relativos ao sigilo telefônico e comunicações telemáticas,
sendo previsto na Lei complementar 105/01 e no Código Tributário Nacional.
O artigo 1º, § 4º da Lei Complementar 105/01 enumera os crimes contemplados,
mostrando quando será cabível a quebra do sigilo bancário e financeiro: terrorismo; tráfico
ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; contrabando ou tráfico de armas,
munições ou material destinado a sua produção; extorsão mediante sequestro; contra o
sistema financeiro nacional; contra a Administração Pública; contra a ordem tributária e a
previdência social; lavagem de dinheiro ou ocultação de bens direitos e valores; praticado
por organização criminosa.

Ação controlada
É técnica especial de investigação, prevista na Lei de Drogas (Lei 11.343/06, artigo 53, II),
na Lei de Lavagem de Capitais (Lei 9.613/98, art. 4º-B) e na Lei de Organizações
Criminosas (Lei 12.850, art. 8º).

consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou administrativa


relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde
que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se
concretize no momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de
informações.

(BRASIL, 2013)

Exige apenas a prévia comunicação ao juízo.

Infiltração de agentes
Técnica especial de investigação que consiste em introduzir um agente,
dissimuladamente, na organização criminosa, que passa a agir como um de seus
integrantes, ocultando sua verdadeira identidade, com a finalidade de identificar fontes de
prova e obter elementos capazes de permitir ser a organização desarticulada. Esta ação é
permitida apenas com autorização judicial.
A partir do momento em que o agente infiltrado passa a integrar a organização como se
fosse um dos membros, ele passará a agir, evidentemente, como um criminoso, e é
possível que os demais integrantes exijam do agente infiltrado a prática de crimes.
Em alguns casos, o agente infiltrado deverá acompanhar os demais integrantes da
organização, para não levantar suspeitas sobre sua real identidade, viabilizando a colheita
de elementos de informação na investigação. Sendo assim, o artigo 10-C disciplina
acerca da responsabilidade criminal do agente infiltrado.

Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para, por meio da
internet, colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos no art.
1º desta Lei.

(BRASIL, 2013)

Acesso a registros, dados cadastrais, documentos e


informações
O artigo 15 da lei prevê a possibilidade de a autoridade policial e o Ministério Público
terem acesso aos dados cadastrais do investigado, independente de prévia autorização
judicial, especialmente aos que contenham a qualificação pessoal, filiação e endereço do
investigado.

REVISÃO DA UNIDADE

Neste vídeo de revisão de conteúdo vamos repassar os principais aspectos tratados na


unidade, sobre as técnicas de investigação e meios de obtenção de prova.

ESTUDO DE CASO

Suponha que em determinado inquérito policial instaurado para apurar a comercialização


de substância entorpecente (“Skank”), a autoridade policial tome conhecimento de que
Sérvulo está em permanente contato com um grupo organizado para trazer grande
quantidade de substância para a cidade.
O delegado de polícia, então, representa pela interceptação do terminal telefônico
pertencente a Sérvulo, o que é deferido pelo juiz da cidade. No monitoramento do
terminal, descobrem que ele recebeu quantidade razoável da substância, que está
armazenada em seu apartamento.
A autoridade policial, então, representa, pela busca e apreensão da substância e prisão
temporária de Sérvulo, o que é novamente deferido. Com a apreensão da droga e sua
prisão, a autoridade policial toma conhecimento de que ele mantém contato com grandes
distribuidores de substância, e detém a qualificação e informações em documentos que
mantém em outro local, que são importantes para o desmantelamento da organização.
Com base nesses dados, é possível à autoridade propor um acordo de colaboração
premiada? Quais as condições que a autoridade poderá impor a Sérvulo, e quais os
benefícios que poderá auferir com esse acordo? Neste passo, poderá ser deferido ao
investigado algum tipo de proteção, quando do fornecimento de elementos? Quem terá
legitimidade para oferecer o acordo de colaboração? Como será realizada a formalização
deste?

Reflita

Crime organizado no Brasil, sua extensão e impactos na democracia brasileira


O Brasil tem, possui aproximadamente 53 (cinquenta e três) facções criminosas em
atuação. Em cada Estado e no Distrito Federal há pelo menos um grupo com presença
registrada. Segundo levantamento feito pelo Fórum Nacional de Segurança Pública,
organizações como PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho) se
rivalizam na disputa por territórios e têm atuação nacional.
A facção de origem paulista (PCC) está presente no DF e em outros 24 estados. Já o
grupo nascido no Rio de Janeiro (CV) atua em 13 Estados, além do DF. Tais informações
constam da edição especial do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em
25/07/2022.
De acordo com o Índice Global do Crime Organizado, primeiro levantamento dessa
natureza, recém-lançado pela Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Transnacional
(GI-TOC, 2022), comparado aos demais países, o Brasil é o 22º dos 193 estados-
membros da ONU com o maior índice de criminalidade organizada. Na América do Sul,
fica atrás apenas de Colômbia, Venezuela e Paraguai. No quesito “mercado criminoso”
(criminal market), o Brasil ocupa o 11º lugar.
Corrupção e suas dimensões. Crimes correlatos. Lavagem de dinheiro. Lei
Anticorrupção
A corrupção vem tipificada no Código Penal como crime, mas há diversos outros crimes
elencados no Título XI do Código, crimes contra a Administração Pública, que
acompanham o crime de corrupção e que costumam ocorrer dentro do contexto da
criminalidade organizada. Temos também a lavagem de dinheiro, prevista na lei 9613/98.
Outros crimes bastante comuns dentro da criminalidade organizada são os previstos na
Lei de Tóxicos (lei 11.343/2006), que prevê o delito de tráfico de drogas (artigo 33) e os
relacionados a ele.
Como forma de enfrentamento ao crime organizado e visando a minimização dos
prejuízos sofridos pela Administração Pública com as práticas criminosas, em 2013 foi
editada a Lei anticorrupção (12.843/13, regulamentada pelo Decreto 8420/2015),
prevendo a responsabilidade objetiva (que independe da verificação do dolo ou culpa da
pessoa jurídica em caso de dano à Administração pública), intentando também a
possibilidade de acordo de leniência.
A responsabilidade objetiva, prevista na Lei Anticorrupção, baseia-se no risco potencial de
dano ao patrimônio público, e não exclui a responsabilidade individual dos dirigentes ou
administradores das pessoas jurídicas que tenham tomado parte em ilícitos praticados
contra a Administração Pública.
Já o acordo de leniência vem previsto no artigo 16 da lei em questão, por meio do qual a
pessoa jurídica entrega informações e provas sobre atos de corrupção de que tem
conhecimento e sobre os quais assume sua responsabilidade objetiva.

RESOLUÇÃO DO ESTUDO DE CASO

O caso traz hipótese de tráfico ilícito de entorpecentes, além do crime de organização


criminosa, previsto no artigo 2º da Lei 12.850/2013. Nesse contexto, a autoridade policial,
verificando que Sérvulo tem ainda elementos importantes a oferecer que possam
desbaratar a organização criminosa, irá propor acordo de colaboração premiada,
mediante o fornecimento de informações e elementos de prova importantes e eficazes a
tanto.
Ressalte-se que a autoridade policial não poderá firmar acordo de colaboração, poderá
iniciar as tratativas, mas quem firmará o acordo será o Ministério Público (promotor de
justiça ou procurador da República, dependendo se o crime for julgado na justiça estadual
ou federal).
Será importante que Sérvulo forneça elementos objetivamente eficazes, não bastando
suas declarações. Nos termos do artigo 4º da lei 12.850/2013, o juiz poderá conceder o
perdão judicial, reduzir em até 2/3 da pena privativa de liberdade ou substituí-la por
restritiva de direitos. O colaborador terá direito a proteção de sua intimidade, não podendo
ter sua identidade ou endereço revelados, nos termos do disposto na lei 12.850/2013.

RESUMO VISUAL
CRIMINALIDADE ORGANIZADA
Aula 1
O CRIME ORGANIZADO

Verificaremos agora os primeiros passos, origens históricas e


histórico legislativo, até chegarmos ao contexto contemporâneo
legislativo de punição do crime de organização criminosa.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante! Nesta Unidade, continuaremos aprofundando os conhecimentos sobre as


Organizações Criminosas.
Conforme se aprontada ainda mais na temática, será possível avançar na construção de
um conhecimento sólido, de modo que possamos descobrir características e noções
básicas desta criminalidade.
Verificaremos os primeiros passos, origens históricas e histórico legislativo, até
chegarmos ao contexto contemporâneo legislativo de punição do crime de organização
criminosa.
Após, abordaremos a extensão do crime organizado no país, apontando alguns dos
principais delitos relacionados, encerrando nossa abordagem nesta aula com um
aprofundamento sobre os principais impactos das organizações criminosas na
democracia brasileira.
Caminhemos juntos nessa jornada!

O CRIME ORGANIZADO NO BRASIL

Quando falamos em organizações criminosas, é importante ressaltar que qualquer que


seja seu ramo de atividade, local de atuação ou surgimento (no Brasil ou outros países do
mundo), dois podem ser considerados seus principais objetivos: adquirir poder, e garantir
mais Riquezas (CAMPOS; SANTOS, 2007, p. 2).
Tendo estes dois principais objetivos, pode-se constatar que com o avançar da tecnologia
e da sociedade do risco, com instrumentos cada vez mais modernos na atuação dos
sujeitos, também a criminalidade organizada se tornou mais complexa, e “organizada”
valendo-se inclusive de estruturas e ações lícitas para tentarem maquiar seus bens e
valores obtidos com práticas ilícitas, sendo aqui relevante a prática de delitos associados
à corrupção, e lavagem de ativos ilícitos.
O processo de construção destes grupos pode ser dividido em pelo menos 3 grandes
momentos (que iremos relacionar a características comuns a todos eles na sequência):

1. Em um primeiro momento surgem as organizações criminosas de grupos


tradicionais que se reúnem na sociedade para prática de delitos “comuns”,
enfrentados pela criminologia tradicional.
2. Com a “modernização” dos grupos, e o avançar do poder econômico, muitas
organizações passam a se orientar para o âmbito de uma criminalidade
empresarial, com uma caracterização mais complexa de suas estruturas de poder
e organização.
3. Por fim, para consolidar ainda mais seu poder e ganhos, essas atividades em
alguma medida passam a se associar ao âmbito da atividade política (PEREIRA,
2021, p. 361).

Em termos globais podemos observar a existência de algumas organizações (ou proto


organizações) criminosa já no século XV (a título de exemplo pode-se citar as Máfias
Italianas ou a Yakuza Japonesa, com origens medievais).
No Brasil, de acordo com Eduardo Araújo Silva (2003) as organizações criminosas
surgiram como reflexos do movimento conhecido como cangaço, com ampla atuação no
Nordeste brasileiro, e que durante o final do século XIX e início do século XX causou
inúmeros problemas com fazendeiros e coronéis da região.

os cangaceiros tinham organização hierárquica e com o tempo passaram a


atuar em várias frentes ao mesmo tempo, dedicando-se a saquear vilas,
fazendas e pequenas cidades, extorquir dinheiro mediante ameaça de ataque e
pilhagem ou seqüestrar pessoas importantes e influentes para depois exigir
resgates.

(SILVA, 2003, p. 26)


Quanto ao primeiro crime organizado punido em terras brasileiras, o mesmo autor
menciona que foi o “jogo do bicho” o primeiro a ser criminalizado (SILVA, 2003, p. 26), no
contexto em que grupos organizados, especialmente associados a policiais e políticos
corruptos, se organizavam para controlar esses jogos tão lucrativos.
Podemos observar que o crime organizado no Brasil ganhou forças na medida em que as
atividades criminosas individuais aumentavam exponencialmente, sendo mais “lucrativo”
realizar ações em bando ou quadrilha, maximizando lucros, e contendo riscos.
Por fim, qualquer que seja sua origem ou natureza, pode-se afirmar que o crime
organizado impacta negativamente no processo democrático de um país, em especial no
caso brasileiro, na medida em que, para maximizar ganhos e poder, inevitavelmente, as
organizações criminosas irão contaminar agentes públicos e políticos, desvirtuando o
processo democrático de tomada de decisões.

A EXTENSÃO DO CRIME ORGANIZADO

Para aprofundarmos um pouco mais sobre as organizações criminosas, é importante


reforçar que o conceito e a caracterização de “organizações” criminosas, demanda um
aprofundamento teórico sobre o próprio conceito de crime, aglutinando categorias de um
“direito penal, cuja tradição jurídico-científica liberal se vê aos poucos confrontada por
uma crítica comunitarista” (PEREIRA, 2022, p. 362).
Para melhor interpretarmos o conceito de crime organizado, é relevante considerar que
independentemente de definições legais, que falaremos na sequência, os crimes
organizados possuem as seguintes características:

a. há uma finalidade lucrativa, e com um movimento financeiro/econômico elevado, o


que conduz à necessidade de constantes medidas para tentar “lavar” os recursos
arrecadados com a empreitada criminosa. É comum a utilização de pessoas
laranjas, ou empresas de fachada, dificultando ainda mais o rastreio do “caminho”
do dinheiro.
b. o crime organizado é dotado de um elevado poder de corrupção de agentes
públicos (nesse sentido afirma Silva (2003, p. 29) “é pela corrupção que o crime
organizado se infiltra nas sociedades democráticas”).
c. tendo em vista a força econômica e política, estas organizações possuem um
altíssimo poder intimidatório.
d. há um elevado ímpeto expansionista, delimitando-se e fincando raízes regionais e
internacionais.
e. dentro das organizações, geralmente, há uma estrutura piramidal bastante sólida,
em que os agentes de uma determinada classe/categoria, não conhecem
exatamente os que estão acima
f. ocupam espaços de poder e controle que deveriam ser destinados a atuação
estatal, sendo uma característica bastante marcante, em especial em comunidades
mais carentes.
g. por fim, observa-se uma prática criminosa difusa, com vítimas e agentes dispersos
em diversas camadas sociais.

Do ponto de vista legislativo, em terras brasileiras, a Lei 9034/95 foi o primeiro diploma
normativo que se preocupou com o Crime organizado de maneira específica, definindo
em seu texto alguns procedimentos investigatórios que versavam sobre o delito de
quadrilha ou bando, então descritos no art. 288 do Código Penal Brasileiro.
Entretanto, essa lei era bastante limitada, na medida em que não definiu claramente em
termos jurídicos o que seria um crime organizado, ou praticado por organização
criminosa.
Posteriormente, em 2004, o Brasil incorporou ao ordenamento jurídico a Convenção de
Palermo (Decreto 5.015/2004), fixando-se o conceito de “grupo criminoso organizado”
como sendo um grupo “estruturado de três ou mais pessoas”, com propósitos de cometer
crimes graves.
Até que nos anos de 2012 e 2013, com as Leis 12.694/2012 (que versa sobre o
julgamento dos crimes de organização criminosa), e a Lei do Crime Organizado
(12.850/2013) o conceito de crime organizado passou a ser definido no art. 1ª, §1º desta
última lei, como:

I. uma associação de quatro ou mais pessoas.


II. com uma forma estruturada e ordenada pela divisão de tarefas.
III. com o objetivo de obter vantagem de qualquer natureza, mediante prática de
infrações penais, cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos.
IV. ou, que seu caráter seja transnacional.

OS IMPACTOS DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NA DEMOCRACIA

Para conseguirmos visualizar exemplos práticos de organizações criminosas e seus


respectivos impactos na democracia, bem como extensão de efeitos e poder, é importante
observar algumas das espécies de organizações, que são classificatórias, representando
características que predominam, não sendo uma classificação estanque e imutável.

1. Organizações criminosas tradicionais ou clássicas: a principal característica


dessas organizações é seu caráter intimidatório. Essas organizações criminosas
geralmente se estendem por locais pré-determinados, e concentram suas
atividades em maximizar seus lucros por meio do exercício de códigos de condutas
e ações intimidatórias bastante marcantes, sempre com uma atuação difusa,
autônoma e permanente. Geralmente se alinhavam a classes políticas, e não
detinham intenções internacionais.
2. Organizações criminosas em forma de Rede (Network – Rete Criminale –
Netzstruktur): essas organizações possuem como principal característica a não
existência de uma hierarquia clara, sem quaisquer rituais ou estruturas bem
definidas ou permanentes e com a possibilidade de impactos transnacionais.
A ideia central dessas organizações é servirem como uma rede, em que criminosos
ou grupos criminosos se unem para aproveitar oportunidades de ganhos em
determinado setor específico. A ideia é agirem coletivamente enquanto as
oportunidades criminosas estiverem latentes, desmantelando-se com o término
dessas oportunidades.
Como exemplo prático, imaginemos que um grupo de agentes políticos percebe
uma oportunidade de praticar atos espúrios no controle de determinada estatal
petrolífera, ou relacionada a produção de energia, podendo auferir enormes lucros
individuais e coletivos; iniciam suas atividades junto a essa estatal, expandindo
suas atividades até a outros países. Não haverá entre eles qualquer nível
hierárquico, com regras estanques e bem estabelecidas. Ora, uniram-se apenas
para aproveitar a oportunidade de maiores lucros.
3. Empresarial: neste modelo, a organização criminosa é organizada e se
desenvolve a partir de pressupostos próprios, constituindo, inclusive, atividades
lícitas em um contexto empresarial para legitimar suas ações, e ao mesmo tempo
aproveitando de toda a estrutura empresarial típica de uma empresa lícita.
É como nessa modalidade de organização criminosa a fabricação e/ou prestação
de serviços lícitos, portanto, sendo essas atividades quase que sempre financiadas
pelas empreitadas criminosas. Por sua característica empresarial, geralmente
buscam agir “na espreita”, não sendo tão visíveis quanto outras espécies de
organização criminosa.
4. Endógenas: por fim as organizações criminosas endógenas são aquelas que
atuarão dentro da própria estrutura do Estado, seja na esfera Federal, Estadual ou
Municipal, e em qualquer dos Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário),
composta por agentes políticos e funcionários públicos para a prática de crimes
contra administração, associados ou não a outras modalidades delitivas.

Assim, qualquer que seja a organização criminosa, na prática, em alguma medida haverá
uma afetação à democracia e a condução das políticas públicas como um todo, em
especial em áreas mais vulneráveis socialmente, pois onde o Estado não é capaz de
ocupar o poder, tal vácuo de poder é ocupado por esses agentes, maculando a autonomia
e liberdade das instituições democráticas, tão importantes para a manutenção do Estado
de Bem Estar social (CLEMENTINO, 2008), impedindo o livre exercício de direitos, e a
igualdade entre os agentes que ocupam os espaços sociais de poder.

Saiba mais

Para se aprofundar nos temas abordados em aula leia a obra do professor Roberto Porto.
PORTO, Roberto. Crime organizado e sistema Prisional. Grupo GEN, 2008. E-
book. ISBN 9788522467068. Págs: 60 a 73.

Aula 2
CORRUPÇÃO E SEUS ASPECTOS

Nesta aula iremos analisar a corrupção dentro do cenário do Direito


Penal, com todas as suas vertentes e os principais tipos penais
correlatos. Falaremos bastante do crime de peculato, praticado por
funcionário público em detrimento do Estado.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Nesta Unidade, continuaremos aprofundando nossos conhecimentos sobre as
Organizações Criminosas. Estaremos diante de temas que irão formar uma noção
importante e básica sobre a criminalidade especializada.
Nesta aula iremos analisar a corrupção dentro do cenário do Direito Penal, com todas as
suas vertentes e os principais tipos penais correlatos. Falaremos bastante do crime de
peculato, praticado por funcionário público em detrimento do Estado.
Ainda, abordaremos os crimes do colarinho branco, com um foco direcionado para o as
ações de agentes governamentais. A ação de combate a corrupção será abordada com
muita ênfase durante o nosso curso, com especial atenção às leis penais anticorrupção.
CORRUPÇÃO E SUAS DIMENSÕES – TIPOS PENAIS CORRELATOS

Os crimes praticados por funcionário público contra a administração pública, em geral,


são os chamados “delitos funcionais”. O Código Penal ainda usa a expressão “funcionário
público”.
Além daqueles previstos no CP, há outros crimes contra a administração pública previstos
em leis especiais, como na Lei 8.666/1993 (Lei de Licitações) e no Decreto-Lei 201/1967
(Responsabilidade dos Prefeitos).
Trata-se de crimes gravíssimos, praticados contra a administração pública e contra os
administrados, direta ou indiretamente atingidos. Apesar disso, não há um crime funcional
hediondo ou equiparado a hediondo.
Com efeito, não existe no rol de crimes hediondos sobre qualquer delito funcional. No
Congresso Nacional já existe um projeto de lei pretendendo conferir hediondez ao menos
à concussão e à corrupção.
A despeito de graves, as penas cominadas a esses crimes não são tão rigorosas, pois
não proporcionam eficiente repressão e prevenção. Há crimes funcionais de menor
potencial ofensivo. Além disso, inúmeros crimes funcionais admitem suspensão
condicional do processo;

1. Com o advento da Lei 12.403/2011, todos os delitos funcionais passaram a ser


afiançáveis. Mas há dois momentos em que o legislador deu atenção aos crimes
funcionais:
Crimes funcionais estão sujeitos à extraterritorialidade incondicionada da lei penal
brasileira (art. 7º, I, “c”, CP).
2. Após a Operação Anaconda, o Congresso Nacional fez um projeto, que foi
transformado em lei alterando o art. 33, §4ºdo Código Penal: o condenado por
crime contra a administração pública, seja funcionário público ou particular, só irá
progredir de regime após reparar o dano ou restituir a coisa.

O Direito Penal conceitua funcionário público em seu artigo 327 do CódigoPenal, podendo
ser dividido em:
Funcionário público típico (art. 327, caput, CP):quem exerce, embora transitoriamente
e sem remuneração:

• Cargo público (estatutário).


• Emprego público (celetista).
• Função pública (tem um dever para com a administração). Ex.: jurado, mesário.

Funcionário público atípico ou por equiparação (art. 327, §1º, CP): a partir da lei
9983/00, ampliaram a definição (“... e quem...”). Houve esta ampliação devido à política
de desestatização (concessão, permissão).
Equipara-se a funcionário público quem:

• Exerce cargo, emprego ou função em entidade.


• Trabalha para empresa prestadora de serviço.
• Ou empresa.

Somente será equiparado a funcionário público quem executar atividade típica – voltada
para o administrado, para o cidadão – da Administração Pública. Se uma empresa
contratada para funcionar num cerimonial de recepção a um chefe de governo estrangeiro
exerce atividade atípica.
A extensão do referido parágrafo só se aplica nas hipóteses em que o funcionário público
equiparado é sujeito ativo ou também quando vítima? Será possível, por exemplo,
desacato em face de gerente do Banco do Brasil?
1ª corrente: a equiparação somente se aplica aos crimes em que o funcionário público
atípico é sujeito ativo. Aliás, se quisesse o legislador dilatar o conceito de funcionário
público aos casos em que ele aparece como vítima do delito, não teria incluído a
disposição em causa somente no capítulo dos crimes funcionais.
2ª corrente: aplica-se também aos crimes nos quais o funcionário público é sujeito
passivo. O conceito definido no art. 327 do CP se estende não só a toda a parte especial
como às leis extravagantes, tendo a característica de regra geral.

CRIMES DE COLARINHO BRANCO

A expressão colarinho branco está relacionada a um crime não violento, praticado por
pessoas que detenham grande poder na sociedade ou que possuam cargo público, e que
usam dessa vantagem para praticar um crime, como peculato, fraude, extorsão,
apropriação indébita, dentre outros.
A Lei 7.492/86, a chamada Lei do Colarinho Branco, apresenta em seu contexto os crimes
contra o Sistema Financeiro Nacional. Ela define instituição financeira, como a pessoa
jurídica de direito público ou privado, que tenha como atividade principal ou acessória,
cumulativamente ou não, a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros
de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a custódia, emissão, distribuição,
negociação, intermediação ou administração de valores mobiliários.
Ainda, equipara-se à instituição financeira a pessoa jurídica que capte ou administre
seguros, câmbio, consórcio, capitalização ou qualquer tipo de poupança, ou recursos de
terceiros, a pessoa jurídica que ofereça serviços referentes a operações com ativos
virtuais, inclusive intermediação, negociação ou custódia e a pessoa natural que exerça
quaisquer das atividades referidas neste artigo, ainda que de forma eventual.
Podemos destacar algumas condutas criminosas previstas nesta Lei, como imprimir,
reproduzir ou, de qualquer modo, fabricar ou pôr em circulação, sem autorização escrita
da sociedade emissora, certificado, cautela ou outro documento representativo de título
ou valor mobiliário, que prevê uma pena de reclusão, de dois a oito anos, e multa.
Destacamos que aquele que imprime, fabrica, divulga, distribui ou faz distribuir prospecto
ou material de propaganda relativo também respondem pelo mesmo delito. Também é
crime a divulgação de informação falsa ou prejudicialmente incompleta sobre instituição
financeira, com uma pena de reclusão de dois a seis anos e multa.
Ainda, é previsto como crime contra o sistema financeiro nacional gerir fraudulentamente
instituição financeira, com uma previsão de pena de reclusão, de três a doze anos, e
multa. Ainda, quem induz ou manter em erro, sócio, investidor ou repartição pública
competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhe informação
ou prestando-a falsamente, responderá por uma pena de reclusão de dois a seis anos e
multa.
Emitir, oferecer ou negociar, de qualquer modo, títulos ou valores mobiliários falsos,
falsificados ou sem registro prévio de emissão junto à autoridade competente, em
condições divergentes das constantes do registro ou irregularmente registrados ou sem
lastro ou garantia suficientes, nos termos da legislação ou sem autorização prévia da
autoridade competente, quando legalmente exigida pratica crime e ficará sujeito a uma
pena de reclusão de dois a oito anos e multa.
Também, quem exigir, em desacordo com a legislação juro, comissão ou qualquer tipo de
remuneração sobre operação de crédito ou de seguro, administração de fundo mútuo ou
fiscal ou de consórcio, serviço de corretagem ou distribuição de títulos ou valores
mobiliários pratica crime sujeito a uma pena de reclusão de um a quatro anos e multa.

LEI ANTICORRUPÇÃO

Em 1 de agosto de 2013 foi criada a Lei 12.846, dispondo sobre a responsabilização


administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração
pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências.
Essa Lei deve ser aplicada às sociedades empresárias e simples, personificadas ou não,
independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a
quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras,
que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de
direito, ainda que temporariamente.
As pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente, nos âmbitos administrativo e
civil pelos atos lesivos praticados em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não, não
excluindoa responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de
qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito, sendo
responsabilizada independentemente da responsabilização individual das pessoas
naturais.
Os dirigentes ou administradores somente serão responsabilizados por atos ilícitos na
medida da sua culpabilidade. Subsiste a responsabilidade da pessoa jurídica na hipótese
de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão societária.
Nas hipóteses de fusão e incorporação, a responsabilidade da sucessora será restrita à
obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado, até o limite do
patrimônio transferido, não lhe sendo aplicáveis as demais sanções previstas na Lei
12.846/2013, decorrentes de atos e fatos ocorridos antes da data da fusão ou
incorporação, exceto no caso de simulação ou evidente intuito de fraude, devidamente
comprovados.
As sociedades controladoras, controladas, coligadas ou, no âmbito do respectivo contrato,
as consorciadas serão solidariamente responsáveis pela prática dos atos previstos na Lei
12.846/2013, restringindo-se tal responsabilidade à obrigação de pagamento de multa e
reparação integral do dano causado.
A Lei anticorrupção descreve uma série de condutas criminosas que são prejudiciais à
administração pública, tanto nacional quanto estrangeira. Entre essas condutas,
destacam-se aquelas praticadas por pessoas jurídicas, que atentem contra o patrimônio
público, os princípios da administração pública ou os compromissos internacionais
assumidos pelo Brasil.
Esses atos são definidos como prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente,
vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada,
comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a
prática dos atos ilícitos; comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou
jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários
dos atos praticados.
No que se refere às licitações e contratos, constitui crime frustrar ou fraudar, mediante
ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento
licitatório público, impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de
procedimento licitatório público, afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou
oferecimento de vantagem de qualquer tipo, fraudar licitação pública ou contrato dela
decorrente.
Entende-se como delito, também, criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica
para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo, obter vantagem ou
benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos
celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da
licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou manipular ou fraudar o
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública.

Saiba mais

Leia as páginas 1104 a 1283 da obra Código Penal Comentado do Professor Rogério
Greco.
GRECO, R. Código Penal Comentado. 12. ed. Niteroi: Ed. Impetus, 2018.

Aula 3
LAVAGEM DE DINHEIRO

A origem da expressão "lavagem de dinheiro" se deu na Convenção


das Nações Unidas contra o tráfico de drogas, concluída em Viena
em 20 de dezembro de 1998, conhecida como a Convenção de
Palermo, e foi ratificada no Brasil pelo Decreto 154 de 26 de junho de
1991.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante! Nesta Unidade, continuaremos aprofundando nossos conhecimentos


sobre o crime de Lavagem de Dinheiro, ou Lavagem de Capitais.
A origem desta expressão se deu na Convenção das Nações Unidas contra o tráfico de
drogas, concluída em Viena em 20 de dezembro de 1998, conhecida como a Convenção
de Palermo, e foi ratificada no Brasil pelo Decreto 154 de 26 de junho de 1991.
Essa expressão teve origem nos Estados Unidos da América, em 1920, em Chicago,
como a denominação money laundering. Em alguns países da Europa como Espanha e
Portugal utilizam a expressão branqueamento de capitais.
Bons estudos!

LAVAGEM DE DINHEIRO

É por meio da lavagem de capitais, bens, direitos e valores obtidos com a prática de
crimes que são integrados ao sistema econômico-financeiro, com a aparência de terem
sido obtidos de maneira lícita.
Podemos citar como exemplos de pessoas jurídicas criadas para lavar dinheiro uma
locadora de filmes, ou mesmo restaurantes, academias de ginástica etc. Para falar em
lavagem de capitais, o Supremo Tribunal Federal analisou o caso da “máfia dos fiscais”,
na capital de São Paulo, onde um único cheque foi suficiente para caracterizar a lavagem
de capitais.
A lei de Lavagem de Capitais apresenta gerações: 1ª Geração: o único crime antecedente
era o de tráfico de drogas. 2ª Geração: envolve uma ampliação do rol de crimes
antecedentes, porém permanece um rol taxativo. É o que acontecia com a lei
brasileira. 3ª Geração: consideram que qualquer crime grave pode figurar como delito
antecedente do crime de lavagem de capitais. É o que acontece na Espanha e na
Argentina e hoje também no Brasil, com o advento da lei 12.683 de 2012 que alterou a Lei
9.613/ de 1998.
De acordo com Grupo de Ação Financeira –GAFI sobre lavagem de dinheiro:

a. Colocação (placement): consiste na introdução do dinheiro ilícito no sistema


financeiro, dificultando a identificação da procedência dos valores. Existem as
técnicas utilizadas para a sua identificação:
1. Smurfing - é o fracionamento de grandes quantias em pequenos valores (art.
10, Lei n. 9613/98).
2. Utilização de estabelecimentos comerciais que trabalham com dinheiro em
espécie.
b. Dissimulação (layering – colocar camadas): nesta fase é realizada uma série de
negócios ou movimentações financeiras a fim de impedir o rastreamento e encobrir
a origem ilícita dos valores (sistema bancário).
c. Integração (integration)- nesta fase já com a aparência lícita os bens são
formalmente incorporados ao sistema econômico, geralmente, por meio de
investimentos no mercado mobiliário ou imobiliário.
Importante citar que não é preciso o preenchimento das três fases para a sua
consumação do delito de lavagem de capitais.

Com relação ao bem jurídico tutelado pela lei de lavagem dinheiro, temos 4 correntes
sobre o tema:

a. Bem jurídico tutelado é o mesmo bem jurídico tutelado pelo crime antecedente.
b. Bem jurídico tutelado seria a Administração da justiça, porque o cometimento da
lavagem torna difícil a recuperação do produto do crime.
c. Bem jurídico tutelado é a ordem econômico-financeira.
d. A lavagem de capitais ofende dois bens jurídicos:
1. O sistema econômico-financeiro.
2. O bem jurídico tutelado pelo crime antecedente.

Importante salientar que é cabível a aplicação do princípio da insignificância – que está


condicionada a 4 pressupostos:

• mínima ofensividade da conduta.


• ausência de periculosidade social da ação.
• reduzido grau de reprovabilidade do comportamento.
• inexpressividade da lesão jurídica provocada.

CRIMES CORRELATOS, MECANISMOS DE LAVAGEM DE DINHEIRO

Quando se trata da análise dos delitos em estudo, não é necessária a reunião de


processos do crime antecedente e o de lavagem de capitais. Surgem então os
questionamentos: Poderá ocorrer a absolvição do crime antecedente? Qual o fundamento
que gerou a absolvição do agente?
O processo e julgamento do crime de lavagem de capitais não precisam
tramitar obrigatoriamente em simultaneus processus com o crime antecedente. Se isso
for possível, deverá ocorrer, mas daí não se pode concluir que a reunião dos processos
seja obrigatória.
Exemplo:
Comarca X – processo de tráfico.
Comarca Y – processo de lavagem.
Conclusões: a condenação pelo crime antecedente não é pressuposta para a condenação
pelo crime de lavagem.
Com isso, podemos destacar que a comprovação da ocorrência do crime antecedente
figura como uma questão prejudicial homogênea (mesmo ramo do direito) do mérito da
ação penal relativa ao crime de lavagem e para a caracterização do delito de lavagem de
capitais, o fato anterior previsto como crime antecedente deve ser típico e ilícito, não se
exigindo a culpabilidade – princípio da acessoriedade limitada, de acordo com o art. 2º, §
1º, Lei n. 9613/98.
Caso haja a absolvição do autor do crime antecedente com o fundamento na inexistência
do fato, não constituir o fato de infração penal ou existir circunstância que exclua o crime,
não será possível a punição do delito de lavagem de capitais.
Por outro lado, se o autor do crime antecedente for absolvido com base em causa
excludente da culpabilidade, subsiste a possibilidade de punição pelo crime de lavagem
de capitais. Presente uma causa extintiva da punibilidade em relação ao crime
antecedente, nada impede a condenação pelo crime de lavagem de capitais.
Exceções: abolitio criminis e anistia impedem a condenação pelo crime de lavagem. Se o
crime antecedente ficar na modalidade tentada, pode ter condenação por crime de
lavagem de capital? Não impede a condenação do agente pelo crime de lavagem, mas
desde que tenham sido produzidos bens aptos a serem lavados.
O juiz, ao julgar o crime de lavagem, deve dizer de maneira incidental qual o crime
antecedente. Estabelece o Artigo 1.o da Lei 9.613 de 1998 que é crime de lavagem de
dinheiro ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação
ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de
infração penal, com uma pena de reclusão, de três a dez anos, e multa.
Ainda, incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens,
direitos ou valores provenientes de infração penal converte em ativos lícitos, os adquire,
recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta
ou transfere, importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.
Ainda, pratica também a lavagem de dinheiro quem utiliza, na atividade econômica ou
financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal; participa de grupo,
associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária
é dirigida à prática de crimes.
A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do Código Penal. A pena
será aumentada de um terço a dois terços se os crimes definidos como lavagem de
dinheiro forem cometidos de forma reiterada, por intermédio de organização criminosa ou
por meio da utilização de ativo virtual.

PROGRAMAS DE COMPLIANCE E FORMAS DE CONTROLE PELO


ESTADO

Um dos principais objetivos da criminalização da lavagem de capitais é o ataque ao braço


financeiro das organizações criminosas, pelos seguintes motivos:

a. Confisco de bens e valores, que promove asfixia econômica da organização


criminosa.
b. Insuficiência e ineficiência das penas privativas de liberdades.
c. Capacidade de controle das organizações criminosas do interior dos presídios.
d. Rápida substituição dos administradores das organizações criminosas.

A Legislação pátria contempla algumas medidas cautelares especificas no combate à


lavagem de dinheiro e com isso combate a atos de corrupção. Medidas cautelares:

a. Apreensão: trata-se de medida cautelar decretada com o objetivo de apreender


coisas, objetos e documentos de interesse para instauração do processo, de
acordo com o art. 240 do CPP.
Busca e apreensão em escritório de advocacia: esse escritório é considerado, pela
CF, um domicílio. O mandado de busca e apreensão deve ser específico e
pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo
vedada a utilização de documentos e objetos pertencentes a clientes do advogado
averiguado, salvo se tais clientes também estiverem sendo investigados como
partícipes ou coautores pela prática do mesmo crime que deu origem ao mandado.
(art. 7º do Estatuto da OAB).
Deve ser cumprido durante o dia e iniciado durante esse período nada impede que
se prolongue durante noite. Em estabelecimento comercial – a parte que está
aberta ao público não é considerada domicílio, já para as reservadas, ou seja, atrás
do balcão é domicílio. As autoridades fazendárias precisam de autorização judicial
para ingressar nos estabelecimentos comerciais.
b. Sequestro de bens valores: é uma medida assecuratória, fundada no interesse
público e antecipativa do perdimento de bens como efeito da condenação, no caso
de bens que sejam produto do crime ou adquiridos pelo agente com a prática do
fato delituoso. (art. 91, II, “b”, CP).
Pode haver sequestro de bens imóveis e móveis, se não for cabível a busca e
apreensão. (art. 125 e 132, CPP). Uma vez feito o sequestro – o prazo para o início
da ação penal de 120 dias. (art. 4º, § 1º, Lei 9613/98). É importante lembrar que no
CPP o prazo é de 60 dias.
Esse prazo não tem caráter absoluto, admitindo a jurisprudência sua prorrogação
com base no princípio da proporcionalidade.
Restituição de coisas apreendidas: O Art. 4º, § 2º da Lei 9613/98 diz que se o
indivíduo pretender a restituição dos objetos apreendidos ou sequestrados durante
o curso do processo, não só deverá comparecer pessoalmente, como também
comprovar a licitude de sua origem; caso ao final do processo o MP não comprove
a ilicitude da origem dos bens, o acusado deverá ser absolvido, com a
conseqüente restituição dos bens.
c. Arresto: é uma medida assecuratória fundada no interesse privado que tem por
finalidade assegurar a reparação civil do dano causado pelo delito, em favor do
ofendido ou de seus sucessores. O arresto recai sobre qualquer bem que integre o
patrimônio do acusado, desde que suficiente para garantir a futura recomposição
patrimonial.

Saiba mais

Recomendamos a leitura das páginas 507 a 543 da obra Leis Penais e Processuais
Penais comentadas do Professor Guilherme de Souza Nucci.
NUCCI, G. S. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. v. 2, 13.ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2020.
Aula 4
MERCADOS ILÍCITOS E CRIME ORGANIZADO

A Lei 11.343/2006 revogou expressamente as Leis 6.368/76 e


10.409/2002, regulamentando o tema tráfico de drogas. Importante
frisar que a Lei 6.368/76 utilizava a expressão “tóxicos”.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante! Nesta unidade, iremos aprofundar nossos conhecimentos sobre o crime
de Tráfico de Drogas, que atualmente está definido na Lei 11.343 de 2006, e possui o
rótulo de ser um crime assemelhado a crime hediondo.
A Lei 11.343/2006 revogou expressamente as Leis 6.368/76 e 10.409/2002,
regulamentando o tema tráfico de drogas. Importante frisar que a Lei 6.368/76 utilizava a
expressão “tóxicos”.
Antes dessa lei, era crime contra a saúde pública previsto do Código Penal. A Lei
11.343/2006 criou o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD, que
foi criado com o objetivo de ser um sistema informativo e orientador de políticas públicas.
Bons estudos!

TRÁFICO DE DROGAS

A objetividade jurídica do tráfico de drogas é que se trata de um crime contra a saúde


pública. A parte criminal da lei de drogas se preocupa com a saúde pública da
coletividade em geral, e não do usuário.
Não há crime na conduta que prejudique somente quem a praticou. O objeto material é a
pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta criminosa. Os crimes de tráfico de drogas
estão tipificados como normas penais em branco, as quais a conduta criminosa depende
de complementação.
Trata-se de uma norma penal homogênea quando a complementação está prevista em
outra lei, enquanto a heterogênea é aquela cujo complemento está previsto em ato
administrativo. N Brasil, os crimes estão previstos em uma norma penal em branco
heterogênea, pois a relação de drogas está prevista em ato administrativo, na Portaria n.
344/1998.
A portaria traz o nome do princípio ativo da droga, pouco importando o nome comercial
que se dê a ela. A materialidade é provada por exame pericial: auto de constatação da
natureza da substância – exame preliminar para autorizar prisão em flagrante e denúncia;
exame químico-toxicológico; exame para fundamentar condenação.
Como regra geral, é crime comum, pois podem ser praticados por qualquer pessoa. Nos
termos do art. 40, II, a pena será aumentada se ao agente executar o crime prevalecendo-
se de função pública, a exemplo, um carcereiro ou professor que utiliza da função para
levar drogas para presídio ou escola. Entretanto, temos uma exceção onde o tráfico de
drogas será crime próprio ou especial, onde aquele que depende de situação jurídica ou
de fato diferenciada a respeito do sujeito ativo.
A exceção é o artigo 38 que prevê “Prescrever ou ministrar, culposamente, drogas, sem
que delas necessite o paciente, ou fazê-lo em doses excessivas ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar” (BRASIL, 1998)
A conduta de prescrever droga só pode ser feita por médicos ou dentistas. A conduta de
ministrar só pode ser feita por farmacêuticos ou enfermeiros.
Um ponto a ser destacado é que esse tipo de crime é considerado vago, ou seja, tem
como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica, que no caso é a
coletividade.
Quando o sujeito do crime é a coletividade, a ação será pública incondicionada.
Em regra, os crimes previstos na Lei de drogas são dolosos, com intenção. No entanto,
existe uma exceção.
O Art. 38 diz que “Prescrever ou ministrar, culposamente, drogas, sem que delas
necessite o paciente, ou fazê-lo em doses excessivas ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar” (BRASIL, 1998). Tratando-se, então, de um crime
culposo.
Na hipótese de o médico fornecer, deliberadamente, a receita de alguma droga, a conduta
não será enquadrada no art. 38, mas sim no crime de tráfico de drogas. É crime de perigo
presumido ou de crimes de risco.
A consumação se dá com a mera exposição do bem jurídico a uma probabilidade de
dano. Não precisa ser provado no caso concreto, pois é presumido de forma absoluta
quanto à prática de conduta prevista em pela lei. Essa presunção é absoluta, isto é, não
cabe prova em contrário.
Todos os crimes da Lei de drogas são de ação pública incondicionada.

CRIMES RELACIONADOS AO TRÁFICO DE DROGAS

O artigo 33 da Lei de drogas estabelece que importar, exportar, remeter, preparar,


produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar,
trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas,
ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar é crime com uma pena de reclusão de cinco a quinze anos e pagamento de
quinhentos a mil e quinhentos dias-multa.
Também será considerado tráfico de drogas quem importa, exporta, remete, produz,
fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta,
traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado
à preparação de drogas; semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em
matéria-prima para a preparação de drogas; utiliza local ou bem de qualquer natureza de
que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que
outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
Importante frisar que o Pacote Anticrime, Lei 13.964 de 2019 criou a figura do agente
policial disfarçado, criando o inciso IV no Artigo 33 com a seguinte redação: vende ou
entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de
drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a
agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta
criminal preexistente. Também será tráfico quem induzir, instigar ou auxiliar alguém ao
uso indevido de droga ou oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a
pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem.
Pune-se também a conduta de quem fabricar, adquirir, utilizar, transportar, oferecer,
vender, distribuir, entregar a qualquer título, possuir, guardar ou fornecer, ainda que
gratuitamente, maquinário, aparelho, instrumento ou qualquer objeto destinado à
fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, com uma pena de reclusão, de três
a dez anos, e pagamento de mil e duzentos a dois mil dias-multa.
A associação criminosa ligado ao tráfico de drogas também terá punição. Quem se
associar, duas ou mais pessoas, para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o crime de
tráfico de drogas ficará sujeito a uma pena de reclusão, de três a dez anos, e pagamento
de setecentos a mil e duzentos dias-multa.
Além disso, é importante destacar que financiar ou custear a prática de tráfico de drogas
também constitui crime, ficando sujeito a uma pena de reclusão de oito a vinte anos, e
pagamento de multas que variam de mil e quinhentos a quatro mil dias-multa. Também,
quem colaborar como informante com grupo, organização ou associação destinados à
prática de tráfico de drogas responderá pela sua conduta.

A TRANSNACIONALIDADE DO CRIME ORGANIZADO

O Artigo 40 da Lei de drogas prevê causas de aumento de pena de um sexto a dois


terços. Dentre tais causas, destacamos quando a natureza, a procedência da substância
ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciar a transnacionalidade do
delito. A prática depende de dois ou mais países.
Não exige-se transposição da fronteira, pois majorante configura-se com a prova da
intenção de destinação internacional da droga, ainda que não consumada a transposição
de fronteiras. Aliás, a Súmula 607 do Superior Tribunal de Justiça prevê que: “A majorante
do tráfico transnacional de drogas (art. 40, I, da Lei n. 11.343/2006) configura-se com a
prova da destinação internacional das drogas, ainda que não consumada a transposição
de fronteiras” (BRASIL, 2006).
A Competência para julgamento em tais hipóteses será da Justiça Federal, e a
investigação ficará a cargo da polícia federal. A denúncia será feita pelo Ministério Público
Federal.
No que se refere a importação de drogas via postal ou correspondência, decidiu o
Superior Tribunal de Justiça que na hipótese em que drogas enviadas via postal do
exterior tenham sido apreendidas na alfândega, competirá ao juízo federal do local da
apreensão da substância processar e julgar o crime de tráfico de drogas, ainda que a
correspondência seja endereçada a pessoa não identificada residente em outra
localidade.
Isso porque a conduta prevista no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006 constitui delito
formal, multinuclear, que, para a consumação, basta a execução de qualquer das
condutas previstas no dispositivo legal, dentre elas importar, que diz respeito a fazer vir
de outro país, estado ou município; trazer para dentro.
Logo, ainda que desconhecido o autor, despiciendo é o seu reconhecimento, podendo-se
afirmar que o delito se consumou no instante em que tocou o território nacional, entrada
essa consubstanciada na apreensão da droga.
Ressalte-se, por oportuno, que é firme o entendimento da Terceira Seção do STJ no
sentido de ser desnecessário, para que ocorra a consumação da prática delituosa, a
correspondência chegar ao destinatário final, por configurar mero exaurimento da
conduta.
“Dessa forma, em não havendo dúvidas acerca do lugar da consumação do delito, da
leitura do caput do art. 70 do CPP, torna-se óbvia a definição da competência para o
processamento e julgamento do feito, uma vez que é irrelevante o fato da droga estar
endereçada a destinatário em outra localidade” (CC 132.897/PR, rel. Min. Rogerio Schietti
Cruz, 3ª Seção, j. 28.05.2014, noticiado no Informativo 543). O juízo competente é do
local em que se consumou o delito, qual seja no local da apreensão.
Conforme estabelece a Súmula n. 528 do Superior Tribunal de Justiça, "Compete ao Juiz
Federal do local da apreensão da droga remetida do exterior pela via postal processar e
julgar o crime de tráfico internacional" (BRASIL, 2014)
Feita a necessária digressão sobre os julgados inspiradores da Súmula n. 528/STJ,
constata-se que o Ministro Rogerio Schietti Cruz, no julgamento do CC 134.421/TJ (DJe
4/12/2014), propôs a revisão do seu posicionamento para, exclusivamente no caso de
importação de droga via correio (ou seja, quando conhecido o destinatário), reconhecer
como competente o Juízo do local de destino da droga.

Saiba mais

Recomendamos a leitura das páginas 701 a 779 da obra Leis Penais e Processuais
Penais Comentadas do Professor Guilherme de Souza Nucci.
NUCCI, G. S. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. v. 2, 13.ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2020.

Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE

DISCRIMINAÇÃO

Nesta Unidade aprendemos o conceito de Crime Organizado, o seu processo de


construção, que pode ser dividido em pelo menos 03 grandes momentos, em que em um
primeiro momento surgem as organizações criminosas de grupos tradicionais que se
reúnem na sociedade para prática de delitos “comuns”, enfrentados pela criminologia
tradicional.
Posteriormente, com a “modernização” dos grupos, e o avançar do poder econômico,
muitas organizações passam a se orientar para o âmbito de uma criminalidade
empresarial, com uma caracterização mais complexa de suas estruturas de poder e
organização e por fim, para consolidar ainda mais seu poder e ganhos, essas atividades
em alguma medida passam a se associar ao âmbito da atividade política.
Estudamos, também, a divisão do conceito de funcionário público, como sendo típico,
quem exerce, embora transitoriamente e sem remuneração e Funcionário público atípico
ou por equiparação. Equipara-se a funcionário público quem:

a. Exerce cargo, emprego ou função em entidade;


b. Trabalha para empresa prestadora de serviço;
c. Ou empresa.

A Lei 7.492/86, conhecida como Lei do Colarinho Branco, apresenta em seu contexto os
crimes contra o Sistema Financeiro Nacional.
Define instituição financeira, como a pessoa jurídica de direito público ou privado, que
tenha como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não, a captação,
intermediação ou aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou
estrangeira, ou a custódia, emissão, distribuição, negociação, intermediação ou
administração de valores mobiliários.
Ainda, equipara-se à instituição financeira a pessoa jurídica que capte ou administre
seguros, câmbio, consórcio, capitalização ou qualquer tipo de poupança, ou recursos de
terceiros, a pessoa jurídica que ofereça serviços referentes a operações com ativos
virtuais, inclusive intermediação, negociação ou custódia e a pessoa natural que exerça
quaisquer das atividades referidas neste artigo, ainda que de forma eventual. Também,
analisamos a lavagem de dinheiro.
Aliás, é por meio da lavagem de capitais, bens, direitos e valores obtidos com a prática de
crimes que são integrados ao sistema econômico-financeiro, com a aparência de terem
sido obtidos de maneira lícita. Podemos citar como exemplos de pessoas jurídicas
criadas para lavar dinheiro uma locadora de filmes, ou mesmo restaurantes, academias
de ginástica.
Por fim, estudamos o tráfico de drogas, com suas definições legais bem como a
transnacionalidade do crime organizado.

REVISÃO DA UNIDADE

Neste vídeo resumiremos os conteúdos abordados nesta Unidade, falaremos sobre o


crime organizado no Brasil, além das condutas relacionados a atos de corrupção.
Também, da importante Lei de lavagem de dinheiro e a Lei que define o tráfico de drogas
no Brasil, definindo a figura do agente policial disfarçado.

ESTUDO DE CASO

Imaginemos que Pedro dos Santos decide se dedicar ao mundo ilícito, iniciando sua
atividade no tráfico de drogas, passando a comercializar ilegalmente cocaína.
Com isso, decide ir até escolas do bairro em que vive para oferecer a droga para
estudantes universitários, que frequentam cursos profissionalizantes. Passou a viver
dentro de uma universidade, convivendo com jovens estudantes daquela casa de ensino.
Recebia a cocaína de uma transportadora que se fazia de comercio de eletrônicos.
A mercadoria chegava através de caminhões vindo da Bolívia e do Peru, passando
sempre pelo Estado do Mato Grosso do Sul. Pedro dos Santos se dirigia para a cidade de
São José do Rio Preto, de avião, ficava hospedado em hotel daquela urbe, e no horário
combinado ia ao encontro de um boliviano, geralmente em restaurantes populares e
pegava a mercadoria.
Em seguida, se dirigia para o aeroporto e retornava para a capital de São Paulo, onde
comercializava a droga ilícita. Fazia isso duas vezes por semana.
Não chamava a atenção das autoridades policiais, uma vez que se vestia de forma
simples, com aparência estudantil, causando tênis, calça jeans e camiseta de cor neutra,
sem chamar a atenção. A droga era despachada no bagageiro do avião, sempre
acompanhado de chocolates e roupas para desviar qualquer atenção.
Durante uma operação de rotina, a Polícia Civil de São José do Rio Preto, guiada por
cães farejadores, identificaram a mala de Pedro dos Santos. Com isso, fizeram a abertura
da mala e encontraram em seu interior aproximadamente 23 quilos de cocaína.
Conseguiram identificar que a droga era peruana, e continha características de ser da
Bolívia.
Pedro foi identificado dentro da aeronave, sendo conduzido até a sede da Delegacia de
Polícia no interior do aeroporto de São José do Rio Preto. Naquele local, Pedro dos
Santos, inicialmente, negou qualquer envolvimento com aquela mala.
Entretanto, depois de ver as imagens do circuito interno do aeroporto, confessou todo o
crime, informando que a droga era oriunda da Bolívia e do Peru, e que estaria levando o
entorpecente para a capital de São Paulo para vender aos estudantes daquela cidade.
Como delegado de polícia, o que você deveria fazer diante de tal situação?

Reflita

O crime de tráfico de drogas está previsto no Artigo 33 da Lei de Drogas, Lei 11.343 de
2006. Ainda, o artigo 40 da mesma legislação prevê causas de aumento de pena de um
sexto a dois terços.
Dentre as causas, destacamos quando a natureza, a procedência da substância ou do
produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do
delito. A prática depende do envolvimento de dois ou mais países.
Devemos destacar que a Súmula 607 do Superior Tribunal de Justiça prevê que: “A
majorante do tráfico transnacional de drogas (art. 40, I, da Lei n. 11.343/2006) configura-
se com a prova da destinação internacional das drogas, ainda que não consumada a
transposição de fronteiras” (BRASIL, 2006).
A competência para julgamento em tais hipóteses será da Justiça Federal, e não dá
Justiça Estadual, e a investigação ficará à cargo da polícia federal. A denúncia será feita
pelo Ministério Público Federal.

RESOLUÇÃO DO ESTUDO DE CASO

Ocorreu um crime. Pedro dos Santos se tornou um traficante. Passou a vender cocaína
nas faculdades da cidade de São Paulo. Recebia a cocaína de uma transportadora que se
fazia de comercio de eletrônicos.
A mercadoria chegava através de caminhões vindo da Bolívia e do Peru, passando
sempre pelo Estado do Mato Grosso do Sul. Pedro se dirigia para a cidade de São José
do Rio Preto de avião, ficava hospedado em hotel daquela urbe, e no horário combinado
ia ao encontro de um boliviano, geralmente em restaurantes populares e pegava a
mercadoria. Durante uma operação de rotina, a Polícia Civil de São José do Rio Preto,
guiada por cães farejadores, identificaram a mala de Pedro dos Santos. Com isso, fizeram
a abertura da mala e encontraram em seu interior aproximadamente 23 quilos de cocaína.
Conseguiram identificar que a droga era peruana, e continha características de ser da
Bolívia. Pedro foi identificado dentro da aeronave, tendo sido conduzido até a sede da
Delegacia de Polícia no interior do aeroporto de São José do Rio Preto.
Naquele local, Pedro dos Santos, inicialmente, negou qualquer envolvimento com aquela
mala. Entretanto, depois de ver as imagens do circuito interno do aeroporto, confessou
todo o crime, informando que a droga era oriunda da Bolívia e do Peru, e que estaria
levando o entorpecente para a capital de São Paulo para vender aos estudantes daquela
cidade.
Fica demonstrado que Pedro dos Santos praticou o crime de tráfico de drogas, definido no
Artigo 33 caput da Lei 11.343/2006. Ainda, ficou caracterizado que a droga era
proveniente do Peru e da Bolívia, países sulamericanos que integram a divisa com o
Brasil.
O artigo 40 da mesma legislação prevê causas de aumento de pena de um sexto a dois
terços. Dentre elas, destacamos quando a natureza, a procedência da substância ou do
produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do
delito.
Entretanto, a competência para julgamento em tais hipóteses será da Justiça Federal, e
não dá Justiça Estadual. Sendo assim, o delegado deverá encaminhar a ocorrência para
a Polícia Federal, que será atuado em flagrante delito pelo crime de tráfico internacional
de drogas.

RESUMO VISUAL
CRIMINOLOGIA E CRIME ORGANIZADO
Aula 1
ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DA CRIMINOLOGIA

Nesta aula identificaremos os aspectos teóricos e práticos da


criminologia para fazer uma análise completa do que vem a ser cada
um dos objetos de estudo dessa intrigante disciplina. Não apenas o
aspecto puramente teórico será conceituado, mas tudo aquilo que
deve ser conhecido no campo prático e que possui influência no
surgimento do crime e do criminoso.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante!
Entender o conceito de criminologia é fundamental para compreender as motivações que
levam ao surgimento do crime e do criminoso, demonstrando que a criminalidade possui
várias nuances.
Nessa parte introdutória, é importante conhecer tal conceito e a forma metodológica que
ela se utiliza para identificar os seus objetos de estudo, quais sejam, o crime, o criminoso,
a vítima e a pena.
Assim, nesta aula identificaremos os aspectos teóricos e práticos da criminologia para
fazer uma análise completa do que vem a ser cada um dos objetos de estudo dessa
intrigante disciplina. Não apenas o aspecto puramente teórico será conceituado, mas tudo
aquilo que deve ser conhecido no campo prático e que possui influência no surgimento do
crime e do criminoso.
Com esses conhecimentos, será possível aplicar no cotidiano forense as informações
adquiridas com o intuito de desvendar as motivações que levam o criminoso a praticar um
determinado tipo de crime.
Bons estudos!

INTRODUÇÃO À CRIMINOLOGIA

O termo Criminologia foi formatado pela primeira vez pelas penas de um dos maiores
estudiosos da área, chamado Raffaelle Garófalo (1851-1934). Considerado o pai da
criminologia, italiano da cidade de Nápoles, desenvolveu as ideias de seu Professor
Cesare Lombroso.
Com os estudos de Garófalo, a Criminologia passou a gozar de um status de ciência
autônoma, o que possibilitou a conceituação dessa tão importante disciplina.
O conceito atual pode ser identificado como um conjunto de conhecimentos que estuda o
fenômeno e as causas da criminalidade, a personalidade do delinquente, sua conduta
delituosa e a maneira de ressocializá-lo.
Assim, pode-se dizer que a criminologia é uma ciência autônoma que estuda o criminoso,
o crime, a vítima, os controles sociais formais e informais que atuam na sociedade, bem
como a forma de prevenção da criminalidade.
O fenômeno crime é um tema dos mais intrigantes. Como é cediço, tal fenômeno permeia
a humanidade desde os tempos mais remotos, como é o caso bíblico de Caim e Abel.
Desde então, o homem passou a conviver com o crime, suas causas e consequências.
Em alguns momentos históricos, o crime passou a ter, inclusive, o fator glamour em torno
daqueles que o praticavam, como é o caso da máfia italiana e do lendário Al Capone,
durante a “lei seca”, em Chicago.
Atualmente, o crime ainda exerce uma influência muito grande na sociedade, como se vê
nas organizações criminosas e nas comunidades carentes, em que o traficante é o “dono
do morro” e nutre-se do respeito e do medo dos moradores de dada localidade. A
criminologia estuda essa sistemática e faz um diagnóstico acerca das soluções que
podem ser aplicadas no seio social.
O criminoso é visto como aquele que pratica uma conduta proibida por lei e que deve
receber uma punição por tal fato (pena), devendo ser levado ao presídio como forma de
neutralização de atos futuros e com viés de ressocialização.
A inserção da vítima no conceito é algo bem acertado, pois em muitos casos o seu
comportamento pode influenciar na prática criminosa. Em inúmeros eventos, a vítima
incita o agente a cometer o crime, devendo tal fator ser considerado para o estudo do
surgimento da criminalidade.
Não foi com outra razão que o Código Penal de 1940 inseriu em sua Parte Geral, com a
Reforma de 1984, o “comportamento da vítima” como algo necessário para o Juiz dosar a
pena do condenado, como se depreende do art. 59, caput, parte final, do CP.
Por fim, a pena deve ser lembrada como uma medida que leva à neutralização do
criminoso e que deve buscar efetivação da sua ressocialização, uma vez que após o
cumprimento dela, ele irá voltar ao convívio social e deve estar melhor do que quando foi
para o cárcere.

APROFUNDANDO OS CONHECIMENTOS

Com o objetivo de aprofundar a parte introdutória da criminologia, deve ser compreendido


o seu método para identificar cada um dos seus objetos de estudo.
O método utilizado é o empírico, também chamado de pragmático, uma vez que o
estudioso do crime, da vítima e dos demais elementos conceituais terá de fazer uma
observação no campo dos fenômenos para aquilatar de forma correta toda a sua
essência.
Percebe-se que tal método é experimental, pois, diferentemente das ciências exatas, o
estudioso da Criminologia não irá encontrar respostas prontas para a análise de seu
objeto, devendo observar os fenômenos sociais que norteiam a criminalidade e, com base
nisso, encontrar uma solução para o caso concreto.
Cumpre ressaltar que cada caso concreto terá uma solução diferente, o que deixa claro
que o método aplicado é também conhecido como indutivo, bem diferente do método
dedutivo, muito utilizado na Matemática para solucionar as suas equações fechadas e
sem nenhuma diferença de um caso para outro, todos eles seguindo uma regra já
deduzida de algum teorema.
No método indutivo, procura-se, previamente, analisar e observar, para somente depois
encontrar uma regra para aquele caso concreto, podendo ela variar de um caso para
outro.
Essa análise fenomenológica feita pela Criminologia deixa transparecer que a cada ano
que se passa as respostas sociais para um determinado tipo de crime tende a mudar, pois
o dinamismo social e a evolução das práticas criminosas mudam constantemente, sendo
então necessário que o estudioso acompanhe tais modificações.
Essas modificações só são possíveis pelo método empírico, em que se acompanha de
perto todas as transformações sociais por que passa a sociedade.
Acerca da temática do crime, do criminoso, da vítima e da pena, importante ressaltar que
todos esses elementos devem ser estudados numa concepção mais ampla e com
complexidade maior.
Destaca-se que o conceito de crime a ser estudado pela criminologia vai muito além
daquele analisado pelo Direito Penal tradicional, como algo que viola a lei penal
(meramente formal), ou pela tradicional visão analítica ou tripartida (fato típico, antijurídico
e culpável).
A análise do criminólogo deve ser bem mais ampla, e estudar o crime na sua concepção
social, como algo que viola as chamadas expectativas sociais, expressão cunhada por
Niklas Luhmann (1927-1998), na sua famosa teoria dos sistemas.
A vida em sociedade é orientada em torno de expectativas, significando que os homens
esperam determinado comportamento do seu semelhante. Se essa expectativa é
quebrada, por exemplo, quando alguém ofende um bem jurídico alheio tutelado
penalmente, tem-se a figura do crime como algo que desestabiliza a sociedade.
Cada membro da sociedade esperava que seus bens jurídicos fossem respeitados, o que
não ocorreu, gerando a insegurança social. Sob esse enfoque é que se entende o crime
numa visão sociológica, ou seja, como um fenômeno que viola o equilíbrio do sistema que
estava em perfeita harmonia.

APLICANDO À PRÁTICA OS CONCEITOS APRENDIDOS

Um ponto importante em relação ao conceito da Criminologia e os seus objetos de


estudo, destacam-se as técnicas de investigação. Por meio delas, a criminologia passa a
investigar os fatos da realidade e encontrar respostas concretas aos seus problemas. As
técnicas são bem intuitivas e fáceis de serem compreendidas, a saber:

1. percepção imediata do fato criminoso.


2. levantamento do local do crime e sua documentação fotográfica.
3. observação dos instrumentos e produtos do crime.
4. exame biocriminológico do acusado para traçar sua personalidade, tipo físico e sua
genética.
5. investigações paralelas, que permitem um estudo comparado do criminoso com
cidadãos comuns, para tentar analisar semelhanças e diferenças, com o fim de
distinguir o comportamento desviado.
6. estudos genealógicos.
7. estudo de casos criminais, por meio da leitura de processos.
8. notícias publicadas na imprensa.
9. anotações funcionais feitas por profissionais que trabalharam na investigação do
delito, como médicos, sociólogos e assistentes sociais.
10. autodescrição dos criminosos, como diários, cartas, biografias, memórias.
11. estudos das provas indiciárias, que puderam levar à identificação do autor, para
analisar se elas são viciadas na origem ou não.
12. avaliação psicológica por meio de testes, para analisar o criminoso e as
testemunhas.
13. exame cadastral dos criminosos, como órgãos públicos, residência e telefones.
14. estudos do corpo de delito.
15. observação dos novos tipos de prisão e métodos de execução das penas e
medidas de segurança.
16. elaboração de enquetes, com o fim de saber a opinião da sociedade sobre algum
crime ou fato criminoso.

Cumpre ressaltar que, atualmente, alguns concursos públicos, notadamente os da área


investigativa (Delegados Civil e Federal), estão dando ênfase em suas provas na análise
de tais técnicas de investigação, uma vez que no exercício da sua função fatalmente
depararão com tais possibilidades.
Outro aspecto prático da aplicação dos conceitos da Criminologia é no que diz respeito ao
forte apelo midiático para a proliferação de condutas transviadas e criminosas, tomando-
se como exemplo seriados que retratam a vida de seriais killers e outros tantos
transgressores que despertam o interesse do consumidor em assistir a eles.
Nesse sentido, a Criminologia influencia o modo de pensar de determinada parcela da
cultura dominante, criando uma certa adoração à cultura do crime, principalmente àquilo
que o circunda, como personagens caricatos que representam o modelo transgressor e
adorado pelos jovens.
Essa projeção da criminologia no cotidiano das pessoas é algo que por si só já bem
demonstra a importância do estudo de tal ciência no âmbito jurídico, podendo citar como
exemplos os inúmeros clipes de música que enaltecem a cultura do crime.. Essa é a
imagem do “sucesso” representado pelo mundo do crime, o que denota uma ideia errada
de que o crime compensa.
Ainda no mundo do entretenimento, percebe-se claramente nos esportes como futebol,
basquete e lutas marciais, que são os mais populares atualmente nos canais de televisão,
a figura contemplada do “bad boy”.
Nos mais variados esportes, o torcedor sempre nutre uma adoração maior por aquele
jogador considerado “durão”, “fora dos trilhos” e com comportamentos rebeldes. Isso é o
que atrai a atenção e, consequentemente, entra no imaginário popular.

Saiba mais

Nessa obra, todos os temas tratados são abordados de forma mais pormenorizada,
citando exemplos, doutrinas e jurisprudências correlatas com a disciplina em testilha.
GONZAGA, C. Manual de Criminologia. 4. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023.

Aula 2
ASPECTOS CRIMINOLÓGICOS DA MACROCRIMINALIDADE

Um sistema punitivo que leva em consideração as características


pessoais do agente, não pode ser eficiente naquilo que se propõe,
devendo a Criminologia ser uma forma de oxigenar os estudos da
prática penal, demonstrando que não pode haver distinção social
quanto à aplicação de pena entre os cidadãos de uma dada
sociedade.
INTRODUÇÃO
Olá, estudante! Nesta aula, a abordagem passa para os pontos da macrocriminalidade,
explicando a seletividade do Direito Penal na aplicação das penas para pessoas
específicas, destacando-se a origem social, a classe econômica e a cor da pele.
Um sistema punitivo que leva em consideração as características pessoais do agente,
não pode ser eficiente naquilo que se propõe, devendo a Criminologia ser uma forma de
oxigenar os estudos da prática penal, demonstrando que não pode haver distinção social
quanto à aplicação de pena entre os cidadãos de uma dada sociedade.
Nesse ponto, os controles penais devem ser esmiuçados nos aspectos informais e
formais, sendo compreendidos como exemplos de estimagtização social por meio de sua
aplicação, bem como servindo de supedâneo para mostrar que o Direito Penal constitui
um instrumento de dominação social da classe econômica mais abastada, qual seja, a
elite.
Isso é facilmente compreensível quando se visitam as cadeias e presídios públicos e
constata-se que os reclusos são sempre oriundos das classes econômicas mais
desfavorecidas, o que certifica a seletividade natural do sistema penal.
Bons estudos!

INTRODUÇÃO À MACROCRIMINALIDADE

O surgimento da macrocriminalidade organizada pode ser devidamente estudado no


contexto da Criminologia, pois se trata de uma associação diferencial como já se viu.
No Brasil, a regulamentação legal para o combate das organizações criminosas foi feita
pela Lei n. 12.850/2013, exigindo-se a reunião de 4 (quatro) ou mais pessoas com o fim
de praticar infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou
sejam de caráter transnacional, conforme conceito do art. 1º da citada lei.
Como se trata de uma criminalidade organizada e voltada para a prática de infrações
penais com o escopo de lucro, o seu método profissional de intimidação difusa é de
extrema gravidade e coloca em xeque a segurança pública, decorrendo disso a
necessidade de combater eficazmente esse tipo de associação.
Atualmente, pode-se dizer que é o tipo de criminalidade mais difícil de combater, pois está
estruturalmente voltada para a consecução de benefícios para os seus integrantes, a
qualquer custo.
A seletividade do sistema penal significa que a criminalização é desigualmente distribuída
entre os vários grupos e classes sociais, apesar da prática de condutas legalmente
definidas como crime ocorrer em todos eles e que a Lei, em princípio, é igual e geral para
todos, resultando a desigualdade no momento da seleção dos criminosos pela Polícia,
Ministério Público e Justiça.
O chamado controle social informal explica o comportamento delinquente de acordo com
as regras sociais, sem a intervenção do Estado. São espécies de controles sociais
informais a escola, a família, a Igreja e, atualmente, a opinião pública.
De outra feita, o controle social formal representa a intervenção estatal no surgimento e
na rotulação dos comportamentos desviados ou criminosos, sendo exemplo dele a
Polícia, o Ministério Público e o Poder Judiciário.
Os controles sociais constituem formas de influência no modo de agir e pensar do ser
humano. Desde cedo, o homem passa a ser influenciado pelas mais variadas formas de
controle, como a escola, a Igreja e a família, para serem citados alguns. Isso formata a
personalidade de alguém e permite que a pessoa passe a obedecer aos dogmas
impostos socialmente.
Todavia, os controles sociais podem gerar uma insatisfação de algum integrante da
sociedade, que entende como errôneos os papéis sociais impostos a ele. Com isso, pode
ter o surgimento do crime, a forma de alguém rebelar-se contra o sistema social.
É notório que outras formas de insatisfação com o sistema existem, mais brandas, como
não respeitar filas em supermercados ou bancos, bem como não tratar com gentileza o
semelhante, todavia esses descumprimentos de papéis sociais não geram consequências
mais graves a alguém.
O importante é saber que todos estão sujeitos aos controles sociais existentes, devendo a
obediência ser a regra, sob pena de restar impossível a coexistência numa sociedade
organizada.
O crime, então, é um fenômeno tido como uma conduta desviada daquilo que a sociedade
exige das pessoas, etiquetando-se os desviados como criminosos, tomando-se por base
os controles sociais.

APROFUNDANDO OS CONHECIMENTOS

Em se tratando de controles sociais informais, a começar pela escola, onde as crianças


aprendem as primeiras lições da vida, pode-se dizer que esse é um controle
extremamente marcante.
Na escola é onde são lecionadas as primeiras regras do que é certo e errado, bem como
onde os comportamentos são estigmatizados, sempre tomando por base o status social
das pessoas que se relacionam.
Trata-se de fato notório que os mais abastados da escola gozam de uma certa
superioridade sobre os demais, sendo aqueles jovens que lançam tendências e ditam o
que é certo e errado fazer.
Perceba-se que no âmbito das escolas, por meio de várias práticas, como o bullying, que
será a seguir explicitado, criam-se criminosos num futuro bem próximo, devendo ser feita
uma supervisão ou controle social informal desde cedo para evitar que tais tragédias
ocorram. Crimes serão evitados com a correta aplicação dos controles sociais informais
desde cedo, como é o caso do exercido pelas escolas.
Nesse contexto, quem não se encaixa no grupo dominante sofre as mais variadas
discriminações, ocorrendo o bullying, conceituado como atos de violência física ou
psicológica intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo ou grupo de indivíduos,
causando dor e angústia e sendo executados dentro de uma relação desigual de poder.
Outra forma de controle social informal é a família, que desde a infância ensina a noção
de certo e errado, principalmente com os exemplos paternos. Os pais funcionam como
espelhos para a educação dos filhos, que imitam tudo o que eles fazem.
Se os pais praticam atos ilícitos ou reprováveis em casa, como abusos sexuais, uso de
drogas e tabagismo, há uma tendência de os filhos também seguirem por esse caminho,
pois desde cedo estão tendo esse tipo de exemplo diário no seio familiar.
Percebe-se, portanto, que o determinismo social está agindo dentro da própria família,
pois o meio em que a criança vive poderá fatalmente influenciar nas suas escolhas.
Por essa ótica, o surgimento do crime pode ocorrer em virtude dos maus exemplos que os
filhos possuem dentro da própria casa, sendo o comportamento parental muito importante
para ditar o que os filhos devem seguir.
Assim, se tiver bons exemplos, vai praticar boas condutas. Ao contrário, se presenciar
péssimos exemplos, natural que tenha isso como o correto e pratique condutas
semelhantes. Daí a importância dos pais na educação dos filhos como meio de impedir o
surgimento de condutas criminosas.
Ainda dentro do tema controle social informal, tem-se a Igreja. Importante destacar que a
Igreja refere-se a todas as religiões que ditam as condutas certas e, em alguns casos
raros, fornece maus exemplos, como os casos de abusos sexuais cometidos por padres,
pastores etc.
Os comportamentos tidos como corretos são salutares e permitem que as pessoas sigam
práticas virtuosas. Todavia, como já se viu em mais de uma ocasião, alguns desvios e
abusos são cometidos dentro do próprio local onde se exerce a liberdade de culto e de
religião, o que torna o exemplo bem negativo, podendo influenciar o comportamento
futuro daqueles que foram abusados.

APLICANDO À PRÁTICA OS CONCEITOS APRENDIDOS

Em termos práticos, muitos crimes surgem por causa dessa violência praticada pelos
controles sociais impostos pelo grupo dominante que, nos Estados Unidos da América, é
representado pelo chamado “popular”, ou seja, aquele garoto ou garota que pertence ao
time da escola, é chefe de torcida ou possui carro do ano e que humilha os demais
colegas por se sentir superior.
Diante disso, o humilhado começa a criar em sua mente o desejo de cometer crimes
contra o “popular”, nascendo disso tristes episódios como os retratados pelo cineasta
Michael Moore no documentário Tiros em Columbine.
Nesse documentário é retratada a violência entre os jovens americanos e que culminou
num massacre em que várias pessoas foram vítimas de homicídio na escola local de
mesmo nome (Columbine High School).
No documentário não há certeza de quem é a culpa dos homicídios, excluindo-se, claro,
os dois jovens que entraram na escola na hora do lanche no refeitório e abriram fogo. O
que se pesquisa é a origem da ideia criminosa por parte dos dois atiradores.
Se a culpa seria do Governo, da forma de criar os filhos, do sistema de ensino, entre
outras indagações. O que importa é a sugestão de que cada um tem a sua parcela de
culpa na formação dos dois criminosos, sendo esse o estudo da Criminologia.
Esse tipo de relação está intimamente ligado ao labelling approach ou teoria do
etiquetamento, em que se rotula a pessoa como o “popular” ou “impopular”,
desencadeando péssimos conflitos psicológicos e até mesmo casos de depressão em
jovens que buscam a todo custo pertencer ao chamado grupo dominante.
Uma vez inseridos no círculo dos mais populares, passam a subjugar, humilhar e
discriminar os que ficaram foram do aludido círculo e, por fim, chegam até mesmo a
cometerem crimes ou serem vítimas de massacres como já exposto acima.
Para não ir muito longe, no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, ocorreu um episódio
semelhante, na escola municipal Tasso da Silveira, no bairro de Realengo: um homem
armado entrou na escola e matou vários estudantes, sobretudo meninas.
Esse ódio se deu pelo fato de ele ter sofrido bullying na infância de pessoas do sexo
feminino que não tinham interesse nele e o discriminavam. Diante dessa relação
psicológica de dor, surgiu a vontade criminosa de realizar os homicídios contra as
meninas, que no dia do crime representavam as outras que no passado teriam
feito bullying contra ele.
A criminologia, em aspectos práticos, explica que esse tipo de comportamento deve ser
evitado e vigiado desde cedo, notadamente nas escolas, sob pena de ocorrerem ainda
muitos massacres que teriam sido originários lá na infância e maturados ao longo da vida
adolescente, culminando com os trágicos episódios aqui retratados.

Saiba mais

Nesta obra, destaca-se a análise pormenorizada acerca do fenômeno do bullying, que é


de suma importância na sociedade moderna, bem como possui recortes importantes de
comportamentos estigmatizantes.
CALHAU, L. B. Bullying: o que você precisa saber. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.
Veja também:
NUCCI, Guilherme de S. Criminologia. Grupo GEN, 2021. E-book. ISBN 9786559641437.

Aula 3
MACROCRIMINALIDADE E O PROCESSO PENAL BRASILEIRO

Toda acusação formalmente feita contra alguém deve ser pautada


pelo princípio constitucional da presunção de inocência, sendo defeso
qualquer tipo de pensamento que prejulgue algum fato antes do
trânsito em julgado.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante! Nesta temática, inicia-se o estudo pelo princípio constitucional da


presunção de inocência, devendo toda acusação formalmente feita contra alguém ser
pautada por essa diretriz, sendo defeso qualquer tipo de pensamento que prejulgue algum
fato antes do trânsito em julgado.
Além disso, na toada de estudos criminológicos, destacam-se os chamados crimes de
colarinho branco como detentores de um cinturão da impunidade, pois o Direito Penal
funciona como instrumento de dominação social da classe rica contra a classe mais
desfavorecida, o que será demonstrado de forma exemplar nessa aula.
Deve ser lembrado, ainda, que a denúncia criminal na macrocriminalidade possui um cariz
diferenciado, pois os crimes processados são mais difíceis de serem enquadrados,
demandando um conhecimento prático mais avançado para a sua deflagração.
Por fim, destacam-se que existem duas funções da pena no Direito Penal, mas, na
prática, nem sempre ambas são realizadas no contexto criminal.
Bons estudos!

ASPECTOS INICIAIS DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

O princípio constitucional da presunção de inocência encontra guarida na Constituição


Federal, devendo ser entendido que todo cidadão é considerado inocente até o trânsito
em julgado da sentença condenatória no âmbito penal. Tal princípio é fundamental para
viver-se num Estado Democrático de Direito.
A temática dos crimes de colarinho branco pode ser conceituada como sendo os crimes
cometidos por pessoas de alta renda ou a considerada elite econômica, muitas vezes
representada por empresários e políticos que praticam delitos que estão ao seu alcance
(sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e corrupção) como forma de realizarem os seus
luxuosos desejos pessoais.
Historicamente, os crimes cometidos pelos altos executivos americanos eram chamados
de white-collar, tendo como exemplos a sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. Pelo que
se percebe, claramente, os executivos sempre estão bem alinhados em ternos caríssimos
e com camisas com colarinho-branco impecável, daí surgindo a expressão colarinho-
branco.
De outro lado, os operários braçais que trabalham no chão da fábrica, bem como
motoristas de ônibus e pessoas de baixa renda, usam uniformes azuis com colarinhos da
mesma cor, o que se convencionou chamar de blue-collar ou colarinho-azul.
A principal crítica que se faz é de que os criminosos de colarinho-branco dificilmente são
responsabilizados criminalmente por suas condutas, gozando de um verdadeiro “cinturão
de impunidade”, devido a seu alto status e poder econômico a justiça criminal não
consegue alcança-las, por conta de suas influentes amizades com funcionários públicos.
O mesmo não ocorre com os criminosos de colarinho-azul, pois o sistema penal parece
ter sido feito apenas para eles, bastando uma visita em qualquer penitenciária para
constatar que as celas estão recheadas de pessoas da mesma cor e do mesmo estrato
social.
Por outro lado, a denúncia criminal deflagrada nesse tipo de macrocriminalidade é bem
diferente daquela operada nos crimes tradicionais, uma vez que demanda uma análise
mais detalhada acerca dos fatos complexos que norteiam esse tipo de criminalidade mais
sofisticada.
Os órgãos de investigação demandam uma estruturação mais robusta e avançada para
coibir os avanços tecnológicos da macrocriminalidade do colarinho-branco, não sendo
fácil investigar esse tipo de violação a bem jurídico.
Em última análise, a função da pena pode ser investigada no seu aspecto retributivista,
consubstanciado no mero encarceramento como meio de fazer com que o condenado
pague o mal do crime com o mal da pena.
Já o aspecto ressocializador é realizado quando se busca a reinserção social do
condenado na sociedade, podendo ser praticado, por exemplo, quando se permite a
progressão de regime ou a remição da pena pelo trabalho ou pelo estudo.
No Brasil, por mandamento legal, ambas as funções da pena devem ser buscadas pelo
operador do Direito, não sendo suficiente que se concretize apenas a ideia retributivista,
como comumente ocorre na maioria das vezes em que se executa uma pena contra
alguém.

APROFUNDANDO OS CONHECIMENTOS

Os chamados crimes de colarinho branco devem ser estudados dentro de uma concepção
social, destacando-se que entre as classes sociais mais privilegiadas a tolerância ao
crime é maior, pois a identificação de tais pessoas é bem maior e a aceitação para os
crimes de colarinho-branco é mais comum.
Na atual conjuntura brasileira, essa associação é facilmente perceptível, uma vez que a
promiscuidade entre a iniciativa privada e o setor público tornou-se algo natural. Dessa
forma, a associação é mais coesa e os crimes praticados em comum são mais aceitos,
como sonegação fiscal, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e desvio de verbas
públicas.
Os crimes praticados por ambos os lados (público e privado) são os mesmos, o que torna
mais aceitável a sua prática, existindo, nesse ponto, a aplicação do princípio
constitucional da presunção de inocência até o trânsito em julgado, o que já não ocorre
quando se trata de crime de colarinho-azul.
Percebe-se, então, a ideia de associação diferencial para a prática de crimes de
colarinho-branco quando alguém vislumbra a possibilidade de ter os mesmos bens que os
mais abastados possuem, como sói acontecer com políticos que querem ter o mesmo
padrão de vida dos altos empresários.
Ora, os políticos e demais funcionários públicos só devem ter um padrão de vida
adequado à sua evolução patrimonial. Mas, nessa sinergia com a iniciativa privada e o
acompanhamento dos crimes que eles praticam, faz com que o integrante do setor
público também se sinta seduzido a ter condutas semelhantes.
Daí surge a ideia de uma associação entre eles para a prática de crimes comuns, sempre
almejando o ganho estratosférico. Não obstante, a visão puramente criminológica, deve
ser ressaltado que no campo do Direito Penal tal associação também tem destaque
jurídico, notadamente na forma da Lei n. 12.850/2013, em que se definiu o que vem a ser
uma organização criminosa.
Pelo que se constata, a associação agora tida como criminosa no âmbito dos crimes de
colarinho-branco é aquela feita com o intuito de obter vantagem de qualquer natureza,
que no caso em tela sempre será a busca pelo lucro ilícito. Por meio dessa lei é que se
realiza a denúncia criminal para os delitos da macrocriminalidade organizada.
Quando Sutherland criou a expressão “associação diferencial”, o seu principal enfoque
nem era nos crimes de colarinho-azul, uma vez que os criminosos integrantes desse tipo
de criminalidade não são organizados para a prática de delitos, mas sim mostrar que os
criminosos de colarinho-branco são organizados para a prática dos mais variados delitos.
Cria-se, portanto, uma sociedade empresária com fins aparentemente lícitos, mas com o
escopo fundamental de mascarar uma série de crimes graves, como lavagem de dinheiro,
evasão de divisas, sonegação fiscal, entre outros.
Coincidência ou não, parece que o festejado autor estava tendo uma premonição do que
seria a criminalidade padrão do mundo moderno, podendo ser citado como exemplo as
mais variadas operações policiais envolvendo os criminosos de colarinho-branco.
Todavia, como último ponto a ser estudado, a função da pena chamada de
ressocializadora não existe para esse tipo de criminalidade de colarinho-branco, eis que
os seus representantes criminais estão mais do que reinseridos socialmente e cometem
esse tipo de criminalidade por pura ganância.

APLICANDO À PRÁTICA OS CONCEITOS APRENDIDOS

Para fins de aplicação prática da impunidade dos crimes de colarinho-branco, várias leis
estão sendo feitas para beneficiar esse tipo de criminalidade. Como a Lei n. 10.684/2003,
que em seu art. 9 permite a extinção da punibilidade dos crimes de sonegação fiscal
quando a agente pagar o tributo devido.
Tal ocorrência não é aceita para um simples crime de furto, em que o agente pode ser
beneficiado, quando muito, pelo arrependimento posterior previsto no art. 16 do CP, como
simples causa de diminuição de pena.
Na mesma linha de pensamento, surge a Lei n. 13.254/2016, que em seu art. 5º prevê a
extinção da punibilidade de vários crimes, na maioria espécies de crimes de colarinho-
branco, para quem pagar o imposto devido e repatriar o valor depositado no estrangeiro
de forma ilícita. São simples demonstrações de que o Direito Penal para as pessoas da
elite é mais benevolente.
Uma última e curiosa constatação é a de que os crimes de corrupção passiva, peculato e
toda a sorte de crimes contra a Administração Pública não são considerados hediondos
para a aplicação da Lei n. 8.072/90, com as suas restrições legais, como progressão de
regime após o cumprimento de dois quintos ou três quintos (primário ou reincidente),
prisão temporária de 30 (trinta) dias, vedação de anistia, graça e indulto.
Apesar de existir um Projeto de Lei n. 5.900/2013 alçando tais crimes ao patamar de
hediondos, até hoje não fora votado e positivado em lei, o que demonstra a dificuldade de
transformar em algo mais grave aquilo que os próprios pares cometem diariamente. Trata-
se de uma cristalina aplicação da impunidade aos crimes de colarinho-branco.
Não é somente na seara legislativa que há benefício penal para os mais abastados. Nos
julgamentos feitos pelo Poder Judiciário pode ser constatado claramente que há uma
tendência a beneficiar criminosos de colarinho-branco em detrimento de pessoas mais
humildes.
Em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal determinou a soltura de empresário
acusado de ter cometido inúmeros crimes de colarinho-branco, uma vez que ele não era
considerado uma ameaça social.
Todavia, deve ser lembrado que um dos crimes imputados a ele era o de corrupção ativa,
de gravidade enorme, apesar de imediatamente não ser tão lesiva a sua prática. por essa
razão, foi liberado porque não havia necessidade de garantir a ordem pública.
Em outros julgamentos de crimes patrimoniais, os Tribunais Superiores vêm decidindo
pela manutenção no cárcere de pessoas que cometem crimes de colarinho-azul, como
meros furtos, pela simples questão de estarem em reiteração delitiva.
Desse modo, é como se os mais variados crimes de corrupção ativa praticados por
criminosos de colarinho-branco não fossem constantes desde sempre, alguns praticados
até mesmo depois de deflagrada alguma operação policial, o que demonstra a
disparidade de tratamentos entre essas duas criminalidades.

Saiba mais

Nessa obra, a autora explica os criminosos psicopatas e demonstra que possuem um


grave transtorno de personalidade, sendo importante para compreender alguns crimes
bárbaros que ocorrem na sociedade.
SILVA, A. B. B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. Rio de Janeiro: Objetiva,
2008.
Veja também:
HUSS, Matthew T. Psicologia forense: pesquisa, prática clínica e aplicações. Grupo
A. E-book. ISBN 9788536325545. 2010.

Aula 4
CRIMINOLOGIA NA ATUALIDADE

A execução penal será destacada como mecanismo importante de


efetivação das ideias da criminologia para uma correta
ressocialização daquele que deverá voltar ao convívio social.
INTRODUÇÃO

Olá, estudante! No mundo contemporâneo, a criminologia pode ser vista como uma
disciplina que procura compreender, pelo método empírico, as motivações do criminoso e
as características do crime dentro da sociedade. Isso é extremamente relevante para que
o estudante possa identificar todas as facetas da criminalidade no meio social em que
vive.
Tais reflexões serão feitas por meio dos estudos da criminologia no ambiente social onde
o crime surge, também sendo relevante demonstrar os fundamentos e objetivos que as
penas privativas de liberdade possuem na ressocialização do criminoso.
Em contrapartida, a execução penal será destacada como mecanismo importante de
efetivação das ideias da criminologia para uma correta ressocialização daquele que
deverá voltar ao convívio social.
Bons estudos!

ASPECTOS INICIAIS DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

A Criminologia na atualidade pode ser vislumbrada como sendo um importante


mecanismo de compreensão do surgimento do crime e do criminoso na sociedade,
valendo-se do paradigma etiológico consubstanciado no estudo do caso concreto.
Pela forma empírica de desvendar as nuances da criminalidade, identificam-se vários
aspectos do meio ambiente urbano que podem influenciar na prevenção do crime, tais
como policiamento ostensivo, organização das comunidades e implementação de
políticas públicas.
Acerca das funções da pena, deve ser relembrado que o Direito Penal brasileiro
prescreve claramente que os seus fins são de duas espécies, quais sejam, a prevenção
geral e a prevenção especial.
A prevenção geral é o efeito da aplicação da pena na sociedade, podendo ser positiva e
negativa. A positiva é quando a pena aplicada faz com que a sociedade seja integrada,
daí o nome função integradora, ocorrendo quando a sociedade acredita nos efeitos da
pena e fica unida na expectativa de que o Direito Penal está resolvendo os problemas da
criminalidade.
Já a prevenção geral negativa é quando a sociedade percebe que a aplicação da pena
gera um exemplo para que ninguém cometa delitos, ou seja, a imposição de pena faz com
que todos tenham receio de praticar delitos, uma vez que a consequência disso é a
prisão, daí ocorrer uma função exemplificadora.
A prevenção especial tem por enfoque o criminoso, sendo analisado o efeito da pena em
sua pessoa. Ela também pode ser positiva e negativa. A prevenção especial positiva é
quando o agente, em virtude do cumprimento da pena, aufere os efeitos da
ressocialização, sendo perfeitamente reinserido no convívio social e sem voltar à
criminalidade.
Já a prevenção especial negativa é basicamente a neutralização do condenado que se
encontra recolhido ao cárcere e não tem como cometer novos delitos, exatamente pelo
fato de estar preso e sem possibilidade de praticar novos crimes na sociedade.
Quanto aos benefícios existentes para o cumprimento de pena e concomitante
ressocialização, destacam-se a progressão de regime, a remição da pena pelo trabalho e
pelo estudo, saídas temporárias, entre outros.
Somente com essa reinserção social gradativa é que a pena terá cumprido o seu papel
ressocializador. Por isso, com esse viés ressocializador, o Supremo Tribunal Federal
cunhou a súmula vinculante 56, em que se determina o cumprimento da pena em regime
domiciliar, caso inexistam os regimes semiaberto e aberto, pois ninguém poderá cumprir a
pena no regime mais gravoso a que ele tem direito.
Com o intuito de conceder à pena o caráter ressocializador, todas as interpretações legais
devem estar atinentes àquilo que beneficia o condenado, pois se deve primar pelo seu
retorno ao convívio social, devendo o Estado estar atento para novos mecanismos de
cumprimento de pena que permitam a reinserção social.

APROFUNDANDO OS CONHECIMENTOS

No que diz respeito às funções da pena na sociedade moderna, destacam-se os crimes


de colarinho-branco em que dificilmente são aplicadas as penas e devidamente punidos.
Nesse tipo de criminalidade não existe a prevenção geral positiva, ficando a sociedade
desacreditada quanto à punição nesses crimes.
Assim, pode-se dizer que inexiste a prevenção geral positiva para os crimes de colarinho-
branco, uma vez que eles são de difícil punição e a sociedade não coloca fé na aplicação
de pena, o que gera uma desintegração e fragilização na confiança nas Instituições.
Em virtude disso, ao contrário, quando são feitas punições desse tipo de criminalidade de
crimes de colarinho-branco, a sociedade passa a acreditar novamente no sistema penal,
pois isso não é costumeiro historicamente no Brasil. Com a concretização de prisões e
punições, a sociedade passa a integrar-se novamente (função integradora) e acredita que
existe uma luz no fim do túnel.
A prevenção geral também pode ser negativa, tendo o viés social de exemplificação, ou
chamada função exemplificadora. Ao aplicar-se a pena a alguém, a sociedade sente esse
fato como um exemplo do que ocorre quando se comete certo tipo de crime.
Quando se mata, trafica ou rouba, o sistema penal imediatamente age e coloca o acusado
atrás das grades, exemplificando que esses tipos de crimes geram punições, o que coage
a sociedade a não praticar determinado tipo de delito. Em outras palavras, quem mata,
pratica a mercancia de drogas e rouba será inevitavelmente punido pelo sistema penal.
Por outro lado, a prevenção geral negativa não é tão sentida, mais uma vez, nos crimes
de colarinho-branco. Isso se dá porque não há aplicação de penas para esse tipo de
criminalidade. Dificilmente alguém é punido por esse tipo de crime, o que causa na
sociedade o estímulo de cometer esses delitos, uma vez que a punição é algo cada vez
mais distante.
Atualmente, os crimes de colarinho-branco, por não serem devidamente punidos, geram
até uma certa ideia utilitarista na população de praticá-los, pois se ninguém está sendo
punido e muitos estão praticando, a sociedade passa a fazer igual e ingressar no mundo
da criminalidade.
Em virtude disso, aumentam-se os crimes de sonegação fiscal, lavagem de dinheiro,
evasão de divisas e certos crimes contra a Administração Pública (peculato, corrupções
passiva e ativa etc.).
Já a prevenção especial analisa os efeitos da pena na pessoa do acusado. Da mesma
forma que a prevenção geral, ela também é subdividida em positiva e negativa.
A prevenção especial positiva enfoca o lado útil da aplicação da pena, consistente na
ressocialização do condenado. Quando alguém está cumprindo pena, devem ser
permitidos a ele os benefícios da execução penal, como a progressão de regime, a
remição da pena pelo trabalho e pelo estudo, saídas temporárias, entre outros. Somente
com essa reinserção social gradativa é que a pena terá cumprido o seu papel
ressocializador.
A prevenção especial negativa, com enfoque mais voltado ao condenado em si, almeja-se
que ele não volte a delinquir, uma vez que a aplicação de pena e consequente envio ao
cárcere impedirá que se pratiquem novos delitos. Essa é a função chamada de
neutralizadora. Uma vez que ele se encontra recolhido ao estabelecimento prisional, o
cometimento de novos delitos torna-se bastante difícil.
Deve ser apenas destacado que, no Brasil, como é comum acontecer, não é fácil fazer
valer qualquer espécie de prevenção, até mesmo a especial negativa, que tem por fim
neutralizar o condenado.
Em episódio recente de carnificina humana, alguns presidiários no norte do país se
rebelaram e mataram os rivais pertencentes a outra facção criminosa, num verdadeiro
banho de sangue. Ora, aparentemente neutralizados, os presidiários cometeram inúmeros
crimes de homicídio, restando totalmente falha a prevenção especial negativa nesse
ponto.
Pelo que se percebe com o que foi dito acima acerca das prevenções no Direito Penal,
elas não são hábeis, em todas as suas vertentes, de impedir novos cometimentos de
delitos, tanto pela parte do condenado quanto por parte da sociedade.

APLICANDO À PRÁTICA OS CONCEITOS APRENDIDOS

Quanto às implicações do pensamento moderno da criminologia na execução da pena,


infere-se o julgado pretoriano acerca da possibilidade da remição da pena pelos estudos,
como sendo forma de fazer valer a almejada reinserção social, não devendo ser olvidado
que a remição pelo trabalho já é uma possibilidade legal aceita na Lei de Execução Penal
há bastante tempo e não é passível de controvérsias.
Essa forma de ressocialização somente foi permitida por causa dos estudos da
criminologia moderna sobre os benefícios penais que devem ser aplicados na fase da
execução penal, conforme decisão praticada no acórdão abaixo transcrito sobre a
matéria, nesses termos:

EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO
PENAL. REMIÇÃO DA PENA. APROVAÇÃO TOTAL NO ENEM (EXAME
NACIONAL DO ENSINO MÉDIO).
INCENTIVO AO ESTUDO E À RESSOCIALIZAÇÃO COMO FINALIDADE
PRECÍPUA DA PENA. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO ART. 126 DA LEI
DE EXECUÇÃO PENAL - LEP. POSSIBILIDADE. RECOMENDAÇÃO N.
44/2013 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ. PRECEDENTES.
CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO PRETÉRITA. MATÉRIA NÃO DEBATIDA
PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INOVAÇÃO RECURSAL.
IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de o
Reeducando ter direito à remição da pena, pelo estudo, em
decorrência da aprovação parcial no Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM.
2. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do HC n. 602.425/SC (Julgado
em 10/03/2021, Rel. p/ acórdão Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA),
adotou o entendimento de que a Recomendação n. 44/2013 do Conselho
Nacional de Justiça, ao dispor sobre as atividades educacionais
complementares para fins de remição da pena pelo estudo, deve ser
interpretada de forma a incentivar os apenados ao estudo e à readaptação ao
convívio social.
3. No caso, o Agravante foi aprovado em 5 (cinco) áreas de conhecimento do
ENEM, razão pela qual, conforme a jurisprudência dominante nesta Corte
Superior, tem direito à remição de 100 (cem) dias de pena, acrescida de 1/3
(um terço) pela conclusão do ensino médio, nos termos do art. 126, §
5.º, da LEP, totalizando 133 (cento e trinta e três) dias de pena.
4. Não se admite inovação recursal nas razões do agravo regimental.
5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no HC 759569 / SP, STJ)


Pelo escólio do acórdão acima transcrito, percebe-se que, com o fim de ampliar ao
máximo o pensamento de ressocialização, o simples fato de o apenado não ter sido
aprovado na totalidade no exame do ENEM, isso não teria o condão de impedir a remição
da pena pelos estudos, pois ele conseguira uma aprovação parcial e tal fato deve ser
considerado.
Não foi outra a ideia colocada de forma cristalina na Lei n. 7.210/84, em seu artigo 126,
permitindo-se a remição da pena pelos estudos, de forma mais ampla possível, remindo-
se um dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino
fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação
profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias.
Importa dizer que as atividades de estudo poderão ser desenvolvidas de forma presencial
ou por metodologia de ensino à distância e deverão ser certificadas pelas autoridades
educacionais competentes dos cursos frequentados, denotando a ideia de aulas feitas
pelo sistema on-line ou gravado.
Além disso, o tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um
terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o
cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de
educação.
Essa importante forma de remição da pena não exclui à feita pelo trabalho, ensejando a
contagem de três dias de trabalho para descontar um dia de pena do total que ele deve
cumprir, sendo possível cumular a remição da pena pelos estudos com a remição feita
pelo trabalho, uma vez que tal possibilidade legal existe e facilita a reinserção social do
condenado, pois ele está realizando duas funções socialmente úteis.
Tais interpretações somente são possíveis pela tônica da criminologia moderna que
busca as melhores respostas sociais concretas para a prevenção da criminalidade no
ambiente social.

Saiba mais

Nessa obra, o autor demonstra a importância de se conhecer a fundo o sistema penal de


punição, com todas as nuances existentes, tais como falhas e acertos existentes no
intrigante mundo das Ciências Criminais.
FOUCAULT, M. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. 8. ed. Petrópolis: Vozes,
1991.
Leia também:
PRADO, Luiz R. Direito Penal Constitucional - A (Des)construção do Sistema Penal.
Grupo GEN, 2020. E-book. ISBN 9788530991586. Página: 204 e seg.

Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE

ASPECTOS FUNDAMENTAIS DA CRIMINOLOGIA MODERNA

Nesta unidade, vimos o conceito de Criminologia, a importância de identificar o método


empírico nas pesquisas do surgimento do crime e do criminoso, a contribuição da vítima
no comportamento do criminoso e os efeitos da pena.
O primeiro elemento conceitual consubstanciado no crime foi abordado no viés social, não
sendo utilizado o Direito Penal com seu método dogmático que divide o crime em fato
típico, ilícito e culpável, sendo essa divisão intimamente ligada ao conceito lógico-abstrato
de crime.
O criminoso deve ser analisado no aspecto social também, dentro da temática voltada
para o local em que ele realizou o delito, sendo consideradas todas as nuances em torno
do agente que praticou o ilícito penal.
A vítima possui relevante participação na análise da criminalidade, pois ela pode dar
causa ao cometimento do crime, o que enseja a valoração do seu comportamento para
fins de dosimetria da pena.
Após os estudos dos objetos acima delineados, restam os efeitos da pena que devem ser
divididos no aspecto retributivista e ressocializador.
Na sequência, buscou-se detalhar os controles sociais informais e formais como situações
de estigmatização social e que devem entrar no conhecimento do estudante que almeja
compreender o complexo mundo das Ciências Criminais.
Dentro dessa temática, foram estudados os controles sociais formais exemplificados pela
Polícia, Ministério Público e Poder Judiciário. Por outro lado, ressaltam-se os controles
sociais informais que foram trabalhados na Escola, Igreja e Família.
Nesse ponto, foi citada a seletividade do sistema penal que explicita que a criminalização
é desigualmente distribuída entre os vários grupos e classes sociais, apesar da prática de
condutas legalmente definidas como crime ocorrer em todos eles e que a Lei, em
princípio, é igual e geral para todos, resultando a desigualdade no momento da seleção
dos criminosos pela Polícia, Ministério Público e Justiça.
Em suma, na temática dos controles sociais destacaram-se as formas de influência no
modo de agir e pensar do ser humano. Desde cedo, o homem passa a ser influenciado
pelas mais variadas formas de controle, como a escola, a Igreja e a família, para serem
citados alguns. Isso formata a personalidade de alguém e permite que a pessoa passe a
obedecer aos dogmas impostos socialmente.
Além disso, foi possível compreender a criminalidade do colarinho-branco e os motivos
pelos quais há uma crescente impunidade desse tipo de infração penal, destacando-se as
mais variadas leis produzidas para beneficiar os seus autores.
Os criminosos de colarinho-branco não são responsabilizados criminalmente por suas
condutas, valendo-se de um verdadeiro “cinturão de impunidade”, pois estão num
determinado estrato social que a justiça criminal não consegue alcançar, em razão do
poder econômico que ostentam e pelas amizades envolvendo os altos escalões estatais.
Mesma sorte não possuem os criminosos de colarinho-azul, pois o sistema penal parece
ter sido feito apenas para eles, bastando uma visita em qualquer penitenciária para
constatar que as celas estão recheadas de pessoas da mesma cor e do mesmo estrato
social, restando o Direito Penal como um importante instrumento de dominação social.
Por fim, foram analisadas as prevenções da pena e os benefícios da execução penal,
fazendo um estudo acerca da remição da pena pelos estudos como forma relevante de
ser feita a ressocialização do condenado na sociedade.

REVISÃO DA UNIDADE

Neste vídeo, abordaremos a temática estudada nesta unidade, de forma a poder aplicar
os conceitos teóricos aprendidos aos casos concretos do cotidiano forense, buscando
identificar os motivos do surgimento do crime, do criminoso e, em última análise, da
criminalidade.
Com esses conhecimentos, será intrigante desvendar o mundo das Ciências Criminais
que compreende a Criminologia, o Direito Penal e o Processo Penal.
ESTUDO DE CASO

Agora será o momento em que você irá aplicar os conceitos teóricos aprendidos nessa
unidade no caso prático, de forma a desvendar os problemas comuns existentes no
cotidiano forense.
Imagine que você é um consultor do Poder Executivo local e necessita de ofertar uma
solução prática ao seguinte caso concreto: numa determinada cidade do interior do Brasil,
mais precisamente em Januária, Minas Gerais, ocorreu um episódio fatal, na escola
municipal local, em que um homem armado entrou na citada escola e matou vários
estudantes, ressaltando-se que apenas foram eliminadas as pessoas do sexo feminino.
Esse fato se deu em razão de ele ter sofrido bullying na infância realizado por pessoas do
sexo feminino que não tinham interesse nele e o discriminavam. Durante muitos anos, ele
tentava conversar com as meninas para socializar e era motivo de chacotas e zombarias,
por causa da sua origem humilde, da cor da sua pele e por ter a língua presa.
Isso tudo fez com que ele fosse afastado de todos, crescendo com ódio dentre dele que
era alimentado pela omissão dos funcionários da escola que nada faziam, tais como
diretores, professores e ajudantes. Todos assistiam inertes a essa situação e não
entendiam que poderiam fazer algo, pois isso deveria ser função dos pais dele.
Diante dessa relação psicológica de dor, depois de anos e não mais estar naquela escola,
surgiu a vontade criminosa de regressar até o local onde estudou e realizar os homicídios
contra as meninas que estudavam lá, ainda que não fossem aquelas que praticaram
todas as zombarias que ele sofreu, mas que no dia do crime representavam as outras que
no passado teriam feito bullying contra ele.
Tudo isso estava guardado em sua mente e não poderia ser eliminado senão quando ele
colocasse para fora, punindo, ao seu modo de ver, as pessoas que representavam aquilo
que ele sofrera no passado.
Infelizmente, esse fato ocorreu e os governantes locais não querem que isso se repita,
necessitando de sua ajuda para apresentar qual tipo de controle social deveria ser melhor
trabalhado para prevenir tais práticas horrendas e que marcam para sempre uma dada
comunidade.
Assim, como consultor do Poder Executivo, apresente a melhor forma de solucionar e
conscientizar melhor a população local e os integrantes das escolas públicas para evitar
novos ataques como esse que chocou toda a comunidade local.

Reflita

Existem inúmeras situações de casos concretos que foram representadas em filmes que
podem diagnosticar situações bem semelhantes com a realidade social de uma dada
comunidade, onde o crime, o criminoso e a criminalidade possuem uma simbiose com o
meio social em que eles surgem.
Perceba-se, então, que no âmbito das escolas, por meio de várias práticas, como
o bullying, que será a seguir explicitado, criam-se criminosos num futuro bem próximo,
devendo ser feita uma supervisão ou controle social informal desde cedo para evitar que
tais tragédias ocorram.
Crimes serão evitados com a correta aplicação dos controles sociais informais desde
cedo, como é o caso do exercido pelas escolas.
Nesse contexto, quem não se encaixa no grupo dominante sofre as mais variadas
discriminações, ocorrendo o fenômeno mais atual nas escolas, que é
o bullying, conceituado como atos de violência física ou psicológica intencionais e
repetidos, praticados por um indivíduo ou grupo de indivíduos, causando dor e angústia e
sendo executados dentro de uma relação desigual de poder.
A expressão bully correlaciona-se com os chamados “valentões”, que nas escolas
tiranizam e amedrontam os mais fracos, sendo essa relação de desigualdade causada por
força física superior e, modernamente, por questões financeiras, uma vez que os mais
ricos tendem a criar grupos entre si e impedem a entrada dos mais pobres, o que causa,
nesses últimos, angústia e frustração.
Para tornar mais clara a questão, inclusive com a visão adotada pelo Poder Legislativo
brasileiro, cita-se a Lei n. 13.185/2015, que conceituou o que vem a ser o bullying e ainda
trouxe várias práticas comuns que são feitas por meio desse famigerado meio de
intimidação.

RESOLUÇÃO DO ESTUDO DE CASO

No caso em epígrafe, na função de consultor do Poder Executivo local, importante


destacar que deve ser ressaltado que existem os controles sociais informais e formais,
mas que na presente situação demandará a análise apenas do controle social informal
consubstanciado na escola.
Pelo que se percebe, os homicídios praticados foram em razão do bullying sofrido na
escola que ele estudou e que ninguém fez nada para evitar ou amenizar a situação,
havendo uma transmissão de responsabilidade para os pais do aluno, o que está
totalmente em descompasso com a responsabilidade da escola e de seus protagonistas,
quais sejam, professores, diretores e funcionários em geral que trabalham com essa
importante política pública que é a educação.
A escola é o primeiro contato do indivíduo com uma instituição de controle alheia à
família, em que se permeiam vários relacionamentos entre crianças das mais variadas
classes sociais. Esse intercâmbio cultural gera padrões de comportamentos, pois as
crianças passam a falar, vestir-se e portar-se como os integrantes daquele grupo escolar.
Tais padrões comportamentais são forjados desde cedo, sendo a professora ou a diretora
da escola outro personagem importante em tal padronização, pois ela está numa posição
de ensinar e repreender quando alguém comporta-se de forma desviante ao que se exige.
Assim, a professora do jardim de infância, também é responsável por criar um padrão de
comportamento que o adulto de hoje possui, não sendo esse um fator único na
formatação do caráter de alguém, mas se trata de elemento importante e marcante na
vida das pessoas. Logo, todos esses personagens devem ser conscientizados da
importância do papel que exercem no cotidiano dos alunos de uma dada escola pública.
Se fossem melhor compreendidos e estudados os controles sociais que permitem a
estigmatização desde cedo, facilmente a situação do caso concreto teria um outro
desfecho, pois os personagens que atuam na educação, estariam inseridos no contexto
de impedir a perniciosa prática do bullying, conscientizando os alunos a não praticá-lo
àqueles considerados mais desfavorecidos, sendo essa a opinião a ser levada em
consideração para implementar ideias e conscientizações na escola local e evitar novas
situações como a que ocorrera.

RESUMO VISUAL

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