28040-Texto Do Artigo-103551-5-10-20220413

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 16

Letícia Marques Lanna

ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NO BRASIL: atuação da República


Federativa do Brasil no combate ao crime organizado e o crime institucionalizado

CRIMINAL ORGANIZATIONS IN BRAZIL: the role of the federative republic


of Brazil in the fight against organized crime and institutionalized crime

Letícia Marques Lanna*

RESUMO

O objetivo central do artigo é analisar o tema das organizações criminosas no Brasil de forma
geral, primeiramente tecendo uma abordagem técnica, trazendo as principais
jurisprudências e leis a este respeito. Investigam-se as organizações criminosas,
enfatizando também as formas eficazes de combate ao crime organizado. De outra feita,
examinam-se a investigação criminal e os meios de obtenção de prova, no que diz respeito
aos meios taxativamente previstos e permitidos. Em seguida, averigua-se o procedimento
criminal a ser aplicado, trazendo referências tanto legislativas quanto jurisprudenciais e por
fim da execução penal. Outras abordagens temáticas são também correlacionadas ao texto
com analogias necessárias sobre organizações criminosas no Brasil, assim como acerca da
investigação criminal e processo e execução penal.

Palavas-chave: Organizações Criminosas. Combate Estatal ao Crime Organizado. Brasil. Crime


Institucionalizado.

ABSTRACT

The main objective of this Paper is to analyze the issue of criminal organizations in Brazil in
general, first weaving a technical approach, bringing the main jurisprudence and laws in this
regard. On the one hand, Criminal organizations are investigated, also emphasizing effective
ways of combating organized crime. On the other hand, the criminal investigation and the
means of obtaining evidence are examined, with regard to the means strictly foreseen and
allowed. Then, the criminal procedure to be applied is investigated, bringing both legislative
and jurisprudential references and, finally, the criminal execution. Other thematic approaches
are also correlated to the text with necessary analogies about criminal organizations in Brazil,
as well as about criminal investigation and criminal prosecution and execution.

Keywords: Criminal Organizations. State Combating Organized Crime. Brazil.


Institutionalized Crime.

Artigo submetido em: 16 de Agosto de 2020 e aprovado em 25 de Janeiro de 2022


*
Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Advogada. Email:
[email protected].

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo abordará a temática acerca das organizações criminosas no Brasil. Da


investigação criminal e do processo e execução penal são analisadas questões técnicas,
legislativas e jurisprudenciais.
A finalidade do processo penal no Estado Democrático de Direito é a avaliação dos
requisitos necessários para punição, mas concomitantemente é dever do juiz preservar as
garantias individuais do cidadão, já que a dignidade humana é fundamento da República
Federativa do Brasil. Atualmente, pode-se visualizar que as principais organizações criminosas
controlam as prisões e o comércio de drogas em vários Estados brasileiros , primordialmente
após a criação da Lei do Pacote Anticrime, tem se buscado conter as organizações criminosas.
Ademais, pode-se observar uma tendência no Direito Penal atualmente pela ressocialização do
apenado.
O intuito primordial do artigo é investigar sobre o tema de forma geral, primeiramente
fazendo uma abordagem técnica, trazendo as principais jurisprudências e leis;
posteriormente, analisando as organizações criminosas, não só verificando a atuação do
Estado no combate a atuação desse grupo criminoso, que tem cada vez mais influência no
Estado Brasileiro, ressaltando também as formas eficazes de combate ao crime organizado.

2 LEIS PENAIS E PROCESSUAIS PENAIS

2.1 Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013 e Lei 13.964/2019

O crime organizado atualmente é um problema global e as facções criminosas cada vez


mais estendem os seus domínios para fora dos países, isto é, é um elemento transnacional, que
transcende de uma nação para outra.
Ressalta-se que quando se pensa em criminalizar condutas de grupo no mínimo deve
haver estabilidade e permanência, entretanto no caso da organização criminosa a estabilidade e
permanência é mais especial ainda, pois além de ser um grupo estável, e permanente, esse grupo
tem que ser estrutura com hierarquia e divisão de tarefas, se aparentando com uma estrutura de
empresa.
A estabilidade consiste em um grupo fechado e determinado de pessoas, e a permanência
se define como a modalidade de crime em que a ofensa ao bem jurídico se dá de maneira
constante.
Verifica-se que, se não há estabilidade e permanência, trata-se de um mero concurso de
pessoas, nesse caso eventualmente podendo haver um aumento de pena.
A associação criminosa consiste no fato de "associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para
o fim específico de cometer crimes" (CP, art. 288, caput). São dois os elementos que integram
o delito: a conduta de associarem três ou mais pessoas; para o intuito específico de cometer
crimes.
Já, a organização criminosa é definida como a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas
estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, todos os membros sendo
remunerados, se reunindo para realizar inúmeras ações delituosas, cujas penas máximas sejam
superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional com o objetivo único ter
lucro.
Além do lucro as Organizações Criminosas têm como pano de fundo de sua atuação a
discriminação do ódio, do medo, do pânico e do caos social.
A criação, o financiamento ou a participação a qualquer título, ainda que por interposta
pessoa, que se constitua em atividade que integre esquema de organização criminosa está sujeita
as penas da Lei 12.850/2013 (Lei da Organização Criminosa).

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 194
Letícia Marques Lanna

Nos termos do artigo 2º da Lei 12.850/2013 (Lei da Organização Criminosa) tipifica


algumas condutas que são puníveis pela lei, por incentivar e fortalecer a atividade de uma
organização criminosa, como promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por
interposta pessoa, organização criminosa estabelecendo a pena abstrata de reclusão, de 3 (três)
a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais
praticadas, incorrendo nas mesmas penas quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a
investigação de infração penal que envolva organização criminosa.
As qualificadoras para o aumento de pena estão previstas nos parágrafos 2º, 3º e 4º do
Artigo 2º: aumento de pena até a metade para a utilização de arma de fogo; agravação da pena
para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da organização criminosa, ainda que não
pratique pessoalmente atos de execução; e aumento de pena de 1/6 (um sexo) a 2/3 (dois terços)
se há participação de criança ou adolescente, concurso de funcionário público, valendo-se a
organização criminosa dessa condição para a prática de infração penal, o produto ou proveito
da infração penal destinar-se, no todo ou em parte, ao exterior, se a organização criminosa
mantém conexão com outras organizações criminosas independentes, se as circunstâncias do
fato evidenciarem a transnacionalidade da organização.
A legislação também penaliza de maneira especial a participação de funcionário
público, mormente se policial, em esquema de organização criminosa, tendo a lei atrelada à
apuração pela Corregedoria de Polícia à participação, para acompanhamento da apuração, de
membro do Ministério Público, acompanhamento este que não se confunde com direção a do
procedimento instaurado:

Artigo 2º da Lei 12.850/2013, § 5º Se houver indícios suficientes de que o funcionário


público integra organização criminosa, poderá o juiz determinar seu afastamento
cautelar do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a
medida se fizer necessária à investigação ou instrução processual.
§ 6º A condenação com trânsito em julgado acarretará ao funcionário público a
perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo e a interdição para o exercício
de função ou cargo público pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao cumprimento
da pena.
§ 7º Se houver indícios de participação de policial nos crimes de que trata esta Lei, a
Corregedoria de Polícia instaurará inquérito policial comunicará ao Ministério
Público, que designará membro para acompanhar o feito até a sua conclusão.

Em regra, os crimes do Código Penal se o juiz quiser que o réu ou o condenado


funcionário público perca o cargo, tem que expressamente mencionar no acórdão a perda do
cargo. Entretanto, exemplos de exceções em que a menção da perda do cargo é desnecessária
são tortura e integrar organização criminosa.
Enfatiza-se que o efeito da condenação do funcionário público nas penas previstas
expressamente na Lei 12.850/2013 (Lei da Organização Criminosa), provoca um efeito
automático da condenação, isto é, acarreta a perda automática do cargo, isto é, o juiz não tem
que mencionar expressamente a perda do cargo no acórdão.
A atuação do crime organizado teve seu processo de crescimento fomentado
primordialmente em razão da Globalização, avanço da tecnologia, que facilitou a comunicação
entre os membros das organizações, facilitou a comunicação entre inúmeros traficantes, fora
dos países e cidades; a fragilidade das leis, devido sobretudo as brechas das leis, ao Poder
Judiciário e a impunidade; e o tamanho das fronteiras do Brasil, facilitando o tráfico de drogas,
tráfico de armas, roubo de cargas; e a corrupção, não somente no Poder Executivo, mas também

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

no Poder Legislativo, havendo grande contato entre membros de facções criminosas com
membros do Poder Legislativo, e também do Poder Judiciário.
A nova norma federal (Lei nº 13.964/2019), conhecida como Pacote ou Lei Anticrime
implementou modificações nas legislações penal e processual penal, tendo como objetivo o
endurecimento do combate às associações criminosas e o aperfeiçoamento do quadro normativo
penal brasileiro.
O pacote anticrime adicionou dois parágrafos ao artigo, tratando de questões processuais
importantes: o estabelecimento penal e o regime de cumprimento da pena.
Com a nova redação, as lideranças de organizações criminosas armadas ou com acesso
às armas iniciam o cumprimento da pena em estabelecimentos penais de segurança máxima, ou
seja, numa execução penal mais rigorosa.
Além disso, os réus condenados por integrar organizações criminosas ou por crimes
praticados através delas ficam afastados dos benefícios prisionais - como a progressão de
regime e o livramento condicional - quando existirem elementos que indiquem a manutenção
do vínculo associativo com a organização. O condenado, portanto, ficará restrito ao regime mais
rigoroso enquanto ainda houver algum tipo de vínculo ou contato com a organização criminosa
pela qual foi condenado.

2.2 meios de investigação criminal

Ressalta-se que no Brasil não há o crime – um tipo penal – de organização criminosa.


No entanto, o conceito previsto na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado
Transnacional tem reflexos nos campos do direito penal (causa de aumento ou diminuição de
pena) e do direito processual penal (técnicas de investigação).
Denominam-se ‘técnicas especiais de investigação’ os procedimentos habitualmente
utilizados na investigação de casos complexos de crimes graves, tais como tráfico de
entorpecentes, tráfico de armas e de pessoas; crimes cometidos por meio de organizações
criminosas, crimes financeiros, lavagem de dinheiro, terrorismo e seu financiamento,
principalmente.
Nos termos do art. 10 da Lei 10.850/2013, a infiltração de agentes pode ser iniciada a
partir de representação do delegado de polícia ou requerimento do representante do Ministério
Público. Na primeira hipótese, o Juiz, antes de decidir, dará vista ao Ministério Público, titular
da ação penal, que fará uma análise quanto aos pressupostos e requisitos para o deferimento ou
não da infiltração. Na segunda hipótese (pedido direito do Ministério Público), a Lei disciplina
que deverá haver uma “manifestação técnica do delegado de polícia”, a quem caberá verificar
a possibilidade fática (estrutura pessoal e material) de atender à demanda.
Ademais, a Lei 13.964/2019 (Lei do Pacote Anticrime) trouxe uma inovação
disciplinada no artigo 10-A da Lei 12.850/13 prevendo que será admitida a ação de agentes de
polícia infiltrados virtuais, somente se houver autorização judicial especifica para tal fim com
o fim de investigar crimes praticados pelas organizações criminosas, desde que demonstrado a
sua necessidade e indicados o alcance das tarefas dos policiais, os nomes ou apelidos das
pessoas investigadas.
Consoante art. 11 da Lei 12.850/2013, a representação ou o requerimento de infiltração
de agentes deverão demonstrar “a necessidade da medida, o alcance das tarefas dos agentes e,
quando possível, os nomes ou apelidos das pessoas investigadas e o local da infiltração”. O juiz
somente autorizará a medida “se houver indícios de infração penal de que trata o art. 1º e se a
prova não puder ser produzida por outros meios disponíveis” (art. 10, § 2º, da Lei 12.850/2013).
A análise dos referidos dispositivos legais, em conjunto com o estatuído no art. 53, I, da
Lei nº 11.343/2006, nos levam à conclusão de que a infiltração de agentes será cabível se
presentes três requisitos fundamentais, quais sejam:

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 196
Letícia Marques Lanna

(a) indícios dos crimes do art. 2º da Lei 12.850/2013 ou 33 a 37 da Lei 11.343/2006


nomes ou apelidos das pessoas investigadas e o local da infiltração.
(b) presença do princípio da proporcionalidade.
(c) demonstração do alcance das tarefas do agente infiltrado.
Em regra, os policiais possuem o dever de atuarem em toda ocorrência de flagrante
delito ou para prestar socorro, pois o art. 301 do Código de Processo Penal impõe a
obrigatoriedade de atuação nos casos de flagrante delito.
Entretanto, em alguns casos, o flagrante delito pode ser prorrogado, para o momento
mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e obtenção de informações, a denominada
ação controlada, sendo necessário apenas a prévia comunicação ao juiz competente, nos termos
do artigo 8º, §1º da Lei 12.850/2013, com o intuito de otimizar o trabalho do agente policial,
considerando que cada vez mais as organizações criminosas vem se tornando mais ágeis e
céleres, com utilização de equipamentos tecnológicos.
No caso da ação controlada (flagrante prorrogado) a autoridade policial, tendo
conhecimento dos fatos, retarda, propositalmente, a intervenção policial e aguarda o momento
mais oportuno para realizar a prisão em flagrante. O flagrante já poderia ter sido realizado, mas
não foi feito por conta de um juízo de conveniência e oportunidade.
A colaboração premiada é um meio de obtenção de prova, isto é, a colaboração premiada
sem outros meios de prova não é suficiente para condenar ou absolver qualquer delinquente.
Os requisitos inerentes à interceptação telefônica são: crime opinado com reclusão,
ordem judicial, último meio de prova, requisitos cumulativos.
É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e
das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na
forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal
(artigo 5º, XII, CF/88).
O Delegado de Polícia como último meio de obtenção de prova pode requerer uma
ordem judicial para uma interceptação telefônica para escuta, a maior de adquiri provas.
Esse meio de obtenção de prova vem a ser por meio de magmática, telemática,
informática.
Em regra, a ordem judicial para concessão de interceptação tem tempo de vigência de
15 dias, podendo ser prorrogado de 15 dias em 15 dias, sem limite de renovação, mas vindo a
ser extremamente necessário, pois ela vindo a ocorrer sem autorização judicial é considerada
como prova ilícita, e, portanto, inválida para utilização.
A serendipidade (crime achado) é o encontro fortuito de prova relacionada a fato diverso
daquele que está sendo investigado é o encontro fortuito de prova relacionada a fato diverso
daquele que está sendo investigado.
Existem duas possibilidades de descobrir o crime achado: se tem ligação com aquilo
que quer descobrir, relação de conexão e continência, e se o crime não tem ligação com o crime
que se investigado.
A organização criminosa para ser considerada crime hediondo deve ter cometido o
crime-fim, a ser considerado crime hediondo ou equiparado a esse.
A hediondez acarreta diversas consequências gravosas ao crime, dentre as quais a
inafiançabilidade, proibição de anistia, graça ou indulto e aplicação de regime inicialmente
fechado para cumprimento da pena (independentemente da quantidade de prisão aplicada); a
progressão de regimes e o livramento condicional ficam sujeitos a um período de tempo
superior à regra geral (2019, p. 227).

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

Nos termos do artigo 4º da Lei 12.850/2013 (Lei da Organização Criminosa), o juiz


poderá, a requerimento das partes, conceder a perdão judicial reduzir em até 2/3 (dois terços) e
pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha
colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que
dessa colaboração advenha um ou dois dos seguintes requisitos:
I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações
penais por eles praticadas;
II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas
pela organização criminosa;
V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

2.3 direitos e garantias fundamentais do investigado durante a investigação criminal

São direitos constitucionalmente assegurados aos investigados e acusados em


procedimentos estatais de persecução criminal, todos diretamente relacionados à questão da
instituição das técnicas especiais de investigação, a inviolabilidade da intimidade, da vida
privada, da honra e da imagem (art. 5º, inciso X, CF), a inviolabilidade do domicílio (art. 5º,
inciso XI, CF), a inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas,
de dados e das comunicações telefônicas, a inviolabilidade do sigilo profissional (art. 5º, inciso
XIV, CF) e o devido processo legal (art. 5º, inciso LIV, CF), do qual se extraem os princípios
do juiz natural (art. 5º, incisos XXXVII e LIII, CF), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º,
inciso LV, CF), da inadmissibilidade das provas ilícitas (art. 5º, inciso LVI, CF) e da presunção
de inocência (art. 5º, inciso LVII, CF).
São direitos e garantias constitucionais do indiciado: igualdade perante a lei, a
legalidade, proibição de tortura e tratamento degradante ou desumano, o devido processo legal,
das medidas de supressão de liberdade, o direito ao silêncio e a assistência jurídica.
Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias
mínimas: a) direito do acusado de ser assistido gratuitamente por um tradutor ou intérprete,
caso não compreenda ou não fale a língua do juízo ou tribunal; b) comunicação prévia e
pormenorizada ao acusado da acusação formulada.
Desde o seu preâmbulo, inclui além dos direitos civis e políticos também os sociais
dentre os direitos e garantias fundamentais, a Constituição Federal proíbe as penas cruéis (art.
5º , XLVII, e , CF/88), e garante ao cidadão-preso o respeito à integridade física e moral (art.
5º , XLIX , CF/88).

3 A ATUAÇÃO DAS PRINCIPAIS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS NO BRASIL

3.1 visão geral das organizações criminosas no brasil

O contexto histórico de formação das organizações criminosas remete ao êxodo rural


nas décadas de 70, marcado pela migração das pessoas do campo para as cidades,
evidentemente que os grandes centros urbanos, primordialmente Rio de Janeiro e São Paulo
acabaram ficando muito saturados e as pessoas tentando ocupar regiões próximas as respectivas
metrópoles acabaram formando comunidades, favelas, ou seja, regiões periféricas a essas
cidades, sobretudo Rio de Janeiro e São Paulo, entretanto há a formação de inúmeras
comunidades, regiões periféricas em todas as regiões do Brasil, não somente na Região Sudeste,
mas também com destaque para as Regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 198
Letícia Marques Lanna

Tais regiões periféricas tem um histórico de carência de serviços públicos,


precipuamente de serviços de segurança pública, mas também serviços de habitação, serviços
relacionados a renda, a emprego, esses fatores somados acabaram fomentando a criminalidade.
Em pari passum a isso houve uma explosão do sistema carcerário brasileiro em
consequência aos fatos supracitados, grandes índices de criminalidade, acabando havendo
contato entre criminosos comuns e criminosos políticos na época da Ditadura Militar (1 de abril
de 1964 e que durou até 15 de março de 1985).
Os criminosos políticos oriundos de movimentos de esquerda, movimentos comunistas,
movimentos políticos e ideológicos, com grandes conhecimentos em relação a estruturação,
organização e hierarquia de movimentos, acabaram por transmiti-los aos presos comuns, sendo
crucial para a formação das organizações criminosas.
Atualmente as organizações criminosas no Brasil são voltadas sobretudo para a prática
do tráfico de drogas, tráfico de armas, tráfico de cigarros, falsificação de cigarros, falsificação
de mercadorias, roubo a bancos, roubo de cargas, desvio de verbas públicas da associação entre
o crime organizado e o Poder Público, para manter a principal base do crime organizado no
Brasil que é o Poder Econômico.
Diante desses fatores cumulados as organizações criminosas formaram verdadeiros
impérios no Brasil e constituem empresas do crime, sindicatos do crime, algumas dessas
organizações criminosas inclusive apresentam um estatuto próprio e regimes de previdência,
como o PCC.
O crime organizado atualmente é um problema global e as facções criminosas cada vez
mais estendem os seus domínios para fora dos países, isto é, é um elemento transnacional, que
transcende de uma nação para outra.
Além do lucro as Organizações Criminosas tem como pano de fundo de sua atuação a
discriminação do ódio, do medo, do pânico e do caos social. Inúmeros são os ataques das
organizações criminosas contra o Estado e contra a sociedade, exemplo deles foi a onda de
ataques orquestrada pelo PCC no ano de 2006, em que vários ônibus foram incendiados,
empresas privadas depredadas, baleadas e incendiadas, inúmeras unidades policiais e carros de
policiais militares e policiais civis também foram baleados, resultando em várias vítimas,
policiais mortos.
Recentemente no Estado do Pará houve uma rebelião em que duas facções criminosas
o Comando Vermelho e também outra facção que acabou derivando do Comando Vermelho,
entraram em choque no presidio em Alta Mira, em que 57 detentos foram mortos, 2 agentes
prisionais foram feitos reféns, mas depois foram liberados.
O crime organizado e a milicia traz inúmeros prejuízos à sociedade como a segurança
pública, com domínio sobre o que acontece nas regiões periféricas; a parte econômica; a ordem
econômica, o Estado deixa de arrecadar muito dinheiro com o tráfico de cigarros, com o roubo
de cargas, as empresas privadas deixam de lucrar, como o roubo aos bancos e roubo a cargas;
além dos prejuízos à saúde das pessoas, contrabando de cigarro, falsificação e contrabando de
remédios.
A atuação do crime organizado teve seu processo de crescimento fomentado
primordialmente em razão da Globalização, avanço da tecnologia, que facilitou a comunicação
entre os membros das organizações, facilitou a comunicação entre inúmeros traficantes, fora
dos países e cidades; a fragilidade das leis, devido sobretudo as brechas das leis, ao Poder
Judiciário e a impunidade; e o tamanho das fronteiras do Brasil, facilitando o tráfico de drogas,
tráfico de armas, roubo de cargas; e a corrupção, não somente no Poder Executivo, mas também

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

no Poder Legislativo, havendo grande contato entre membros de facções criminosas com
membros do Poder Legislativo, e também do Poder Judiciário.
Há diversas facções criminosas no Brasil, aproximadamente 70, como é o caso do
Primeiro Comando da Capital (PCC); Comando Vermelho; Sindicato do Crime; Família do
Norte; Família Monstro; Bando dos 30; Bando dos 40, atuando de maneira transnacional.

3.2 Principais organizações criminosas no Brasil

A fase pré-processual tem caráter administrativo e é de extrema importância para a


persecução penal, pois os elementos colhidos na fase investigatória posteriormente servirão
para preencher o requisito referente a justa causa, o mínimo lastro probatório para instauração
da ação penal (artigo 395, inc. III do CPP).
Ressalta-se que na ação penal privada e na ação penal pública condicionada a
representação o início das investigações, somente ocorrerá por iniciativa da vítima, entretanto
na ação penal pública incondicionada, o início das investigações independe do ofendido, pois a
autoridade policial ao tomar ciência do caso tem obrigação de dar início a respectiva ação penal,
sendo que a vítima nesse caso somente atua como assistente de acusação do Ministério Público.
O inquérito policial, procedimento pertencente à fase pré-processual tem caráter
inquisitivo, sendo gerido com concentração de poder na figura do delegado, em regra não
apresentando contraditório e ampla defesa. É também o inquérito policial um procedimento
discricionário, pois o delegado o conduzirá adaptando-o a realidade do crime investigado, não
possuindo rito pré-concebido em lei. O ritmo da investigação é dado pela autoridade policial.
Outrossim, em razão do caráter discricionário as diligências requeridas tanto pela vítima quanto
pelo suspeito poderão ser indeferidas pelo delegado, salvo o exame de corpo de delito quando
o crime deixar vestígios (artigo 158 do CPP). Entretanto, conforme doutrina majoritária por
imposição normativa, as requisições realizadas pelo juiz ou pelo Ministério Público deverão ser
necessariamente cumpridas, mesmo não havendo vínculo hierárquico, ressalvando-se as
hipóteses de manifesta ilegalidade.
Ademais, o inquérito policial é um procedimento sigiloso, não sendo aplicada a
publicidade comum (artigo 93, inciso IX da CF/88), cabendo ao delegado velar sobre o sigilo
(artigo 20 do CPP).
O juiz poderá decretar o segredo de justiça da investigação de forma que informações
não poderão ser compartilhadas com a imprensa, preservando-se a vítima na sua intimidade,
vida privada e família (artigo 201, § 6, do CPP). A decretação do segredo não obsta o acesso
do advogado ou do defensor aos autos, entretanto é necessário que o mesmo tenha procuração
nos autos.
O inquérito é direcionado ao titular da ação que formará a sua opinião delitiva, quanto
a deflagração ou não do processo, não cabendo ao delegado manifestar a sua opinião, é
meramente um elemento informativo e descritivo da prática delitiva.
Em nenhuma hipótese o delegado poderá arquivar a investigação (artigo 17 do CPP).
Toda investigação iniciada deve ser concluída e encaminhada a autoridade competente. O
delegado não tem competência para arquivamento do inquérito policial no Departamento de
Polícia.

3.3 principais crimes cometidos pelas organizações criminosas no brasil

O Primeiro Comando da Capital (PCC) é uma fração criminosa do Centro de


Reabilitação, de alta periculosidade.
A Organização Criminosa em diversão ações como resgate de presos, ataque as
autoridades lideradas pelo Marcola, organizado sob o Estatuto do PCC respeito e solidade

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 200
Letícia Marques Lanna

acima de tudo, a luta pela liberdade, justiça e paz, a união contra a injustiça dentro das
prisões, liberdade e resgaste dos presos integrantes do PCC, com a ajuda mútua para
contratação de advogados.
O Comando Vermelho surgiu em 1979, no Sistema Prisional Brasileiro, a partir da
colaboração entre criminosos políticos e criminosos comuns durante a Ditadora Militar,
com o intuito de melhorar as condições dos presos.
Os princípios primordiais do Comando Vermelho são "cinco pilares" da facção:
liberdade, respeito, luta, justiça e união. Outra anotação registra os "10 mandamentos do
Comando Vermelho.
Entre os membros fundadores da facção, que se tornaram notórios depois de suas
prisões, estão os líderes Rogério Lemgruber, William da Silva Lima, o "Professor"; Luiz
Fernando da Costa, o "Fernandinho Beira-Mar";[5] Márcio dos Santos Nepomuceno, o
"Marcinho VP"; Gilberto Martins da Silva, o "Mineiro da Cidade Alta"; Elias Pereira da
Silva, o "Elias Maluco"; e Fabiano Atanásio da Silva, o "FB".O CV possui ramificações
em outros estados brasileiros como Acre, Amapá, Alagoas, Ceará, Distrito Federal, Mato
Grosso, Pará, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima e Tocantins.
O Primeiro Comando da Capital é uma das maiores organizações criminosas do
Brasil. A facção atua principalmente em São Paulo, mas também está presente em todos os
estados brasileiros, além de países próximos como Paraguai, Bolívia, Colômbia e
Venezuela. Possui cerca de 30 mil membros, sendo 8 mil apenas no estado de São Paulo.
A organização é financiada principalmente pelo tráfico de drogas, mas roubos de
cargas, assaltos a bancos e sequestros também são fontes de faturamento. O grupo está
presente em 90% dos presídios paulistas, os negócios particulares dos líderes e da própria
facção têm um faturamento estimado pela inteligência policial em, no mínimo, 400 milhões
de reais por ano. Alguns policiais e promotores acreditam que esse número pode chegar a
cerca de 800 milhões de reais.

3.4 Influência das organizações criminosas no estado

Os “crimes institucionalizados”, são conceituados como sistema de fraudes


abençoado pelo poder central do país e sustentado por uma rede de apoio que percorre os
Três Poderes do Estado”.
Enfatiza-se que a formação de um ciclo vicioso entre políticos e empresas privadas:
são criados diversos privilégios que facilitam a inserção dessas instituições para prestação
de serviços públicos e, em contrapartida, elas financiam as campanhas políticas desses
facilitadores para que esse ciclo continue.
O respectivo crime, que não tem vítimas específicas, gera grande prejuízo à
população que fica à mercê da má administração daqueles que deveriam prezar pelo bem-
estar de todos em geral.
Os hospitais com atendimentos precários, a falta de creches para atendimentos dos
necessitados, estradas instáveis e inseguras são exemplos do descaso político, tão presente
em nosso país, que colocam em risco a vida dos cidadãos.
A população é a responsável por eleger seus representantes políticos e, ao invés
destes trabalharem em favor daqueles, o que se nota são governantes agindo em favor
próprio, buscando benefícios particulares.
As várias características do crime organizado fazem com que haja uma fragilidade
nos poderes do nosso Estado.

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

No Brasil, a integração desse crime com o Poder Público resulta no principal modo
de atuação dessa prática ilícita, uma vez que esta se mistura com as atividades estatais e se
camufla a elas.
Por esse motivo, esse é de difícil identificação e, como consequência, há uma grande
taxa de impunidade
Em regra, todas as partes que atuam nesses esquemas estão acordadas: as empresas
vencedoras da licitação; as que apresentam propositalmente para perder; os agentes
públicos responsáveis pela contratação; os políticos que os nomearam e os intermediários.
Tudo isso torna a investigação mais difícil e a maleabilidade da organização criminosa,
maior.
Portanto, são as condições que permitem a execução desse crime, os possíveis
autores e vítimas, as particularidades que possibilitam a caracterização desse delito, a
diferenciação deste em relação a outras atividades ilícitas e como se desempenha a
criminalidade política no nosso país.

4 A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DIANTE DE ORGANIZAÇÕES


CRIMINOSAS

4.1 visão geral

Na atualidade do Brasil, o Crime Organizado teve a seguinte evolução: inicialmente,


constituía-se no Tráfico de Drogas (maconha e cocaína) e no assalto a bancos; posteriormente
surgiram novas drogas no cenário nacional e hoje são comercializadas tanto a maconha e a
cocaína, como o haxixe, a heroína, o LSD, o êxtase e o crack, ressaltando que a quantidade da
droga também aumentou. Com o passar dos anos a segurança nos estabelecimentos bancários
melhorou e o foco do crime organizado passou a ser o Roubo de Cargas.
Até início de 1985 nos morros cariocas só se encontrava maconha, mas foi a partir do
verão daquele mesmo ano que os morros foram invadidos por uma nova droga, a cocaína.
A evolução contínua do Crime Organizado se deve a mais completa ausência de
políticas de controle da criminalidade, associado a miséria em que vive boa parte da população
brasileira. Em um país onde a distribuição de renda é tão desigual, onde impera a fome, o
desemprego, a falta de Educação, de habitação, etc., ou seja, onde não são efetivadas as
garantias mínimas para uma vida digna, o Crime Organizado surge como uma opção de vida,
vez que oferece, mesmo que por meios ilícitos, a possibilidade de uma vida mais digna e
humana.
O Crime Organizado alcançou tão grandes proporções porque ocupou perante a
população mais carente um lugar que deveria, antes, ter sido ocupado pelo Estado, sendo que
perante a parcela da população mais abastada surgiu como forma de aumentar ainda mais suas
riquezas e seu poder. Tal é a realidade que há quem diga que o Crime Organizado é tal como
um câncer no seio da sociedade, vez que corrompe todos os seus segmentos em todas as esferas
de poder. Ressaltando que, de acordo com a Polícia Federal, o tráfico de entorpecentes
constitui-se na mais preocupante modalidade de Crime Organizado, conforme dados citados
por Oliveira.
Neste sentido cumpre dizer que o tráfico ilícito de entorpecentes tem diversas etapas e
atividades que vão desde a produção até o consumo da droga.
As organizações que traficam cocaína mantêm o controle de todas as etapas, salvo o
caso das organizações menores que preferem se associar a uma de maior porte no momento da
distribuição da droga. Vale dizer, ainda que no Brasil as drogas mais traficadas e consumidas
são a maconha e a cocaína, segundo dados da Polícia Federal.

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 202
Letícia Marques Lanna

No que se refere à criminalidade organizada de um modo geral, um fato interessante


pode ser notado nos últimos tempos, é a terceirização de algumas atividades pelas grandes
organizações criminosas, tal situação pôde recentemente ser observada em um assalto a bando
ocorrido no município de São Miguel do Araguaia, em Goiás, onde várias agências bancárias
foram assaltadas simultaneamente de modo a confundir e dificultar a ação da polícia.
Uma vez descobertos os assaltantes, ficou comprovado que as armas, de uso restrito,
utilizadas no assalto não estavam em poder dos assaltantes, mas sim teriam sido “alugadas”
para aquele fim. Outra modalidade de Crime Organizado muito em voga nos últimos tempos é
o Tráfico de Animais Silvestres e o Comércio irregular de Madeiras nobres da região amazônica
e da mata atlântica. O destino destes recursos naturais brasileiros é o mercados norte-americano
e o europeu, o que dá uma conotação transnacional a esta modalidade de Crime Organizado
(SILVA, 2003, p. 26/27). Cabe ressaltar, também, a importância da corrupção para a
manutenção, evolução e disseminação do Crime Organizado no Brasil. Segundo consta, a
corrupção contumaz de agentes públicos e políticos brasileiros gera uma outra modalidade de
crime organizado, que consiste no desvio de vultuosas quantias de dinheiro dos cofres públicos
para contas particulares abertas em paraísos fiscais localizados no exterior.
Diante do exposto, vale destacar o ensinamento de Luiz Flávio Gomes, segundo o qual
não existe nenhuma facção do Crime Organizado brasileiro que tenha conotação a nível
internacional, o que não significa que não exista Crime Organizado no país, muito pelo
contrário, existe sim e se propaga de forma impressionante.
Embora não haja no Brasil uma facção do Crime Organizado com atuação internacional,
existem diversas organizações criminosas internacionais que atuam no país, ocultadas pelas
dificuldades de investigação e pelas lacunas legislativas que fazem do país um excelente local
de refúgio e atuação para essas organizações.
Tal incidência aumentou ainda mais nos últimos tempos, quando a repressão ao Crime
Organizado, em especial ao Tráfico de Drogas, efetivada nos países vizinhos com o apoio dos
Estados Unidos, ocasionou a instalação de pequenos laboratórios no Brasil com a finalidade de
misturar a droga a outros produtos químicos, além é claro das facilidades de escoamento da
“produção”.

5 ENFRENTAMENTO DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NO BRASIL

Na década de 80, foi constituída uma Comissão Especial sobre o Crime Organizado, no
Congresso Nacional, que tinha como relator o então Deputado Federal Michel Temer e por
objetivo estudar a legislação vigente de forma a elaborar uma lei eficaz no combate ao Crime
Organizado.
Em 1988 é promulgada a vigente Constituição Federal brasileira, a primeira após o
regime Militar, e que instituiu um Regime Democrático e Social de Direito, logo valorou com
precisão as garantias individuais. Em 1995, foi sancionada a lei de “Combate ao Crime
Organizado” – Lei n.° 9.034/95 – esta lei “veio com tantos defeitos” que foi impossível sua
aplicação de forma ampla. Tais defeitos constituíam na paradoxal figura do Juiz Inquisidor em
um Sistema Acusatório, tal como adotado pelo Brasil após a Constituição Federal de 1988.
E na ausência de uma definição precisa para o Crime Organizado, de forma a delimitar
sua esfera de atuação e permitir sua efetiva repressão. Todavia, com a referida lei também
ocorreram alguns avanços, tais como a identificação criminal, a delação premiada, etc.
Ainda no intuito de combater a criminalidade organizada foi promulgada a Lei n.
9.613/98, que dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, tal

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

lei constitui-se numa tentativa de evitar a lavagem de dinheiro no país, já que como já foi dito
esta é a atividade que torna mais vulneráveis as organizações criminosas.
No que se refere à delação premiada, a Lei de Proteção às Testemunhas, promulgada
em 1999, Lei n. 9.807/99, foi muito importante para auxiliar a delação. Outra lei relevante para
o combate do Crime Organizado foi a Lei n.° 10.217/01 que alterou a Lei n. 9.034/95 e
introduziu na legislação processual brasileira a inovação da infiltração de agentes de polícia ou
“de inteligência” nas organizações criminosas, com o objetivo de verificar o modus operandi e
colher provas, isso, é claro, com a devida autorização judicial.
Para muitos esta lei trouxe progresso para o combate ao Crime Organizado, todavia,
mas há quem diga que a lei não foi clara e por isso pode gerar mais dificuldades que soluções
para a problemática em questão.
Em regra, apesar da Constituição Federal de 1988 ofereça um extenso rol de direitos e
garantias individuais, o que deveria favorecer a aplicação do Direito penal, o que ocorre é que
a legislação penal e processual penal vigente é arcaica e deficiente, vez que oriunda de uma
época em que vigia um Estado totalitário, o que impossibilita a efetiva aplicação de um Direito
Penal Democrático.
Os legisladores têm aceitado os reclamos do Movimento da Lei e da Ordem, ofendendo
diretamente os fundamentos e princípios do vigente Estado Democrático e Social de Direito,
além disso, outro fator de propagação do clima de violência e insegurança é a incerteza da
aplicação das leis vigentes, vez que se por um lado a corrupção se faz presente em todas as
esferas do poder, por outro o sistema prisional não cumpre com a sua função.

5.1 execução penal

Após a sentença penal condenatória transitada em julgado, a pena aplicada ao sujeito


ativo da conduta delituosa passa a ser regida pela Lei de Execução Penal – Lei n. 7.210/84.
Já no artigo primeiro da lei em comento encontram-se os seus objetivos primordiais,
quais sejam, a efetivação das disposições da sentença ou da decisão criminal, de modo a
reprimir e prevenir novas práticas delituosas e possibilitar que o condenado e o interno tenham
condições de se reabilitarem de forma que quando estiverem novamente em liberdade possam
conviver pacificamente, sem voltarem a delinquir.
A Lei de Execução Penal, conforme nos esclarece o professor Haroldo Caetano da Silva,
foi “inspirada na Nova Defesa Social, que instaurou um movimento de política criminal
humanista na ideia de que a sociedade somente é defendida quando se busca a reinclusão do
condenado ao meio livre.
Enfatiza-se que a ideia ressocializadora e a pena privativa de liberdade é encontrar um
meio de reeducar os apenados a viver em sociedade uma vez que estes estarão privados desta
mesma liberdade.
A execução penal, de acordo com o item da exposição de motivos da LEP, não está
adstrita aos ditames do Direito Administrativo, pois engloba princípios do Direito Penal e
também do Direito Processual Penal. Para alguns estudiosos da execução penal, dadas essas
particularidades, existiria na verdade um ramo autônomo do Direito que se constituiria no
Direito Penitenciário.
Mencionadas algumas das discussões decorrentes da LEP, o que se pode afirmar com
convicção é que esta lei, embora tenha sido promulgada antes da Constituição de 1988 é um
dos diplomas legais em maior consonância com a dita Carta Magna.
Nota-se que na leitura desta lei o respeito aos direitos e garantias fundamentais da pessoa
humana, ainda que privada de um de seus maiores direitos que é a liberdade em decorrência de
uma sentença penal condenatória.

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 204
Letícia Marques Lanna

Análise que se propõe da presente lei em sede deste trabalho diz respeito às
consequências de sua inefetividade ou falta de aplicação para o surgimento cada vez mais
frequente e numeroso de facções criminosas organizadas dentro dos presídios brasileiros.
Assim, diante do disposto nos artigos 10 e 11 da LEP cabe refletir se a assistência aos
presos ali prevista vem sendo efetivada nos presídios brasileiros e principalmente se em algum
lugar deste imenso país pode-se afirmar com convicção que os que ali estão presos sairão dali
aptos a viverem dignamente em sociedade.
O PCC no final de 1998 e início de 1999, em Sorocaba São Paulo, encabeçou uma das
maiores rebeliões já ocorridas neste país, onde foram feitos reféns os próprios familiares dos
presos, o que até então não havia acontecido devido ao “Código de ética” firmado entre os
presos de que as suas famílias eram intocáveis.
Segundo dados da OAB/SP, previamente da rebelião uma equipe que havia feito uma
visita aquele presídio e formalizou uma notícia sobre a gravidade da situação não só lá mais em
outros presídios, decorrente da superlotação carcerária e do desrespeito à LEP, situação essa
que tornava, e ainda torna, os presídios brasileiros verdadeiros celeiros de marginalidade e
criminalidade.
Feitas as considerações acima e diante de tudo o que já foi narrado e discutido neste
trabalho pode-se afirmar com certeza que a inefetividade da LEP é um dos principais elementos
ensejadores da criação e proliferação das facções criminosas organizadas dentro do sistema
prisional.
Não há como se ressocializar um indivíduo que privado da sua liberdade não tem o
mínimo de dignidade necessária para ser tido como um ser humano, aliás, é bom lembrar que a
Constituição prevê que todos têm direito a uma vida digna, sem exclusão de qualquer pessoa
ou de qualquer situação em que esteja.
É preciso ressaltar que para tudo há uma solução, basta que existam pessoas sérias e
empenhadas em fazer valer a Lei de Execução Penal, sendo que uma das primeiras medidas a
serem tomadas deve ser a reavaliação dos presos do Sistema Prisional verificando a situação de
cada um deles, de forma a se fazer justiça, dando, quanto a execução da pena, a cada um o que
é seu de direito.
Em segundo lugar deve ser feita uma operação anticorrupção dentro dos presídios de
maneira a retirar dos quadros funcionais todos aqueles que participam ou de qualquer modo
concorrem para que as facções criminosas tenham acesso a armas, drogas, celulares e etc.

5.2 Comparação com instrumentos de investigação criminal de outros países

Nos Estados Unidos, em virtude do federalismo “sui generis” ali adotado, há diversos
sistemas processuais no território estadunidense.
O Inquérito Policial teve seus princípios fixados no século XIX. Continua sendo o
mesmo procedimento extrajudicial de cunho inquisitorial e presidido somente por ocupantes do
cargo de Delegado de Polícia. Também manteve o seu caráter escrito e burocrático, que acaba
por prejudicar a celeridade das investigações.
Observando o juizado de instrução francês, apesar de possuir diversas falhas que
possuírem algumas condições a serem sanadas, pode-se extrair de tal sistema investigatório
algumas particularidades para incorporá-las ao padrão nacional de investigação.
Se quando do advento do atual Código de Processo Penal o país carecia de infraestrutura
viária e de comunicações eficazes, a realidade atual é diferente.

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

Embora de não primar em excelentes rodovias e conexões de internet semelhantes a de


países desenvolvidos, os gargalos materiais de outrora já não mais atravancariam a implantação
do juizado especial.
A carreira de Delegado de Polícia, com o advento da lei 12830/2013, foi reconhecida
como sendo de natureza jurídica, essencial e exclusiva de Estado.
O Delegado de Polícia poderia ser considerado como juiz de instrução, não havendo
necessidade de repetição de colheita de atos probatórios semelhantes, sendo que os trabalhos
investigativos realizados pela autoridade policial teriam cunho jurisdicional.
Da mesma forma que no sistema francês, as partes teriam oportunidade de intervenção
no feito, estabelecendo-se o contraditório e ampla defesa.
Após diligências de caráter unilateral pela polícia com o único condão de verificar se há
mínimos indícios de cometimento de delito e de autoria delitiva, a colheita de provas pelo juiz
de instrução se iniciaria.
Somente após a formação do conjunto probatório apto a firmar uma convicção sobre a
procedência das acusações é que o caso seria submetido a um órgão jurisdicional competente
para julgamento.
Dos sistemas investigatórios estadunidenses também é possível extrair algumas
características que poderiam ser proveitosas no país. Com a coleta de materialidade e autoria
delitiva, o Ministério Público, que seria cientificado do início da investigação preliminar a
instrução, poderia abreviar o curso processual com medidas de transação penal.
Com base nas provas preliminares carreadas, o órgão acusador poderia propor transação
penal com a parte investigada antes de iniciada a fase de instrução. Outrossim, se não aceita
pela parte a transação, após o fim da instrução, nova oportunidade de transação seria realizada.
Em qualquer dos casos, a transação necessitaria de homologação de órgão jurisdicional
propriamente dito.
Diante de todo o exposto, observa-se que tal proposta aproveitaria a estrutura policial
existente, não necessitando de novas contratações em massa para atender tal sistemática. A
celeridade processual seria evidente e desde a colheita de provas o contraditório e ampla defesa
estariam assegurados, evitando-se qualquer prejuízo às partes.

6 GLOBALIZAÇÃO NO CRIME ORGANIZADO

A atuação do Crime Organizado no período pós Guerra Fria demonstra que a Revolução
Tecnológica ocorrida neste período e que gerou mudanças radicais nos meios de transportes e
nas comunicações, não serviram apenas para a globalização da economia, mas também para a
globalização do crime, pois as respectivas mudanças ocorreram a tal velocidade que os
governos se viram incapazes de controlar a movimentação de bens, serviços, pessoas e ideias
em seus países
Segundo Jeffrey Robinson, o Crime Organizado transnacional é responsável pela
manutenção da economia de diversos países latino-americanos, a situação é tão grave que em
muitos países o fim do Crime Organizado seria o mesmo que a decretação de falência destes
países.
Mas não é apenas na América Latina que o Crime Organizado participa de forma
considerável do PIB, segundo Enzo Musco a lavagem de dinheiro participa com percentuais
considerais do PIB da Itália, Holanda e Germânia. De acordo com o mesmo, a lavagem de
dinheiro é um fenômeno macroeconômico, que interessa ao direito por ferir uma pluralidade de
princípios do Direito Penal e por representar um perigo e uma ofensa a ordem econômica.
Atualmente o meio mais utilizado para a lavagem de dinheiro é a Internet, por movimentar uma
grande soma sem qualquer fiscalização, proporcionando um verdadeiro “Paraíso Fiscal on
line”.

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 206
Letícia Marques Lanna

Toda essa engenhosidade do Crime Organizado afronta a estrutura clássica do Direito


Penal, vez que não atinge bens jurídicos individuais, mas sim bens jurídicos transindividuais.
Neste sentido Andréa R. Castaldo afirma que “o Direito Penal clássico encontra forte resistência
para modelar a própria estratégia de prevenção e repressão do crime organizado, pois o modelo
tradicional de ilícito penal era historicamente concentrado em um delito de evento
‘monosubjetivo’, lesivo de bens jurídicos individuais”.
Dados colhidos durante uma conferência do jurista italiano Enzo Musco, no I Congresso
Nacional de Direito Penal e Criminologia, ocorrido em Salvador-BA, nos dias 13, 14 e 15 de
abril de 2000.
Como se vê é preciso que o Estado “abandone os antigos conceitos de crime e criminoso,
passando a adotar uma postura mais agressiva, especializada e ágil para frear essa nova ordem
criminosa, isso antes que ela corroa de forma irreversível as bases do Estado.

7 APONTAMENTOS FINAIS

Em decorrência das circunstâncias, ser tido como concluído, o que pode ser dito é que
numa visão panorâmica da problemática foi iniciado um trabalho que merece ser melhor
desenvolvido de forma a trazer maiores expectativas de melhoras para um problema que atinge
não só a população carcerária, mas a sociedade como um todo.
Dessa forma, é preciso ressaltar que Movimento como o da Lei e da Ordem são
superficiais, não atendem às raízes do problema, buscam soluções imediatistas, desprezam os
princípios inerentes a dignidade pessoa humana e desprezam a ressocialização do apenado.

REFERÊNCIAS

ANJOS, J. Haroldo dos. As raízes do Crime Organizado. Florianópolis: IBRADD, 2002.

BASTOS, Winter. Capitalismo e politicagem fazem crime organizado no Brasil. Mídia


Independente.

CERVINI, Raúl. Crime Organizado: Enfoques criminológico, jurídico (Lei 9.034/95 e


político-criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. JESUS, Mauro Zaque de. Crime
Organizado: a nova face da criminalidade.

LIMA, Regina Campos. A Sociedade Prisional e suas facções criminosas. Londrina: Edições
Humanidades, 2003.

LIPINSKI, Antônio Carlos. Crime Organizado & Processo Penal. Curitiba: Juruá, 2003.
MAIA, Rodolfo Tigre. O Estado desorganizado contra o crime organizado – anotações à Lei
Federal 9.034/95 (organizações criminosas). Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1997.

MICHAEL, Andréa. Crime Organizado funciona como holding, diz estudioso. Folha.

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime Organizado: aspectos gerais e mecanismos legais.


São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. MUSCO, Enzo. O Crime Organizado: conferência [abril

193 VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425
Artigo: Organizações criminosas no Brasil: atuação da República Federativa do Brasil no combate ao
crime organizado e o crime institucionalizado

2000]. Salvador: I Congresso Nacional de Direito Penal e Criminologia, 2000. Anotações sobre
a conferência.

OLIVEIRA, Luciano Francisco de. Crime Organizado: a geada negra. 2021.

ROBINSON, Jeffrey. A globalização do Crime. Trad. Ricardo Inojosa. Rio de Janeiro:


Ediouro, 2001.

ROESLER, Átila da Rold. A falácia do combate ao crime organizado. Jus Navigandi,


Teresina, a. 8, n. 318, 21 mai. 2004. Disponível em: Acesso em: 10 de dezembro de 202

VirtuaJus, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 193-205, 2º sem. 2021 – ISSN 1678-3425 208

Você também pode gostar