Popper Epistemologia Sem Um Sujeito Conhecedor

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Direito


Linha de Pesquisa: Direito do Trabalho, Modernidade e Democracia
Disciplina: Metodologia
Professor: Vinícius Diniz

Camila de Paula Guimarães Baía


Karine Matoso

RESUMO DE AULA, EXPOSTA EM FORMA DE SEMINÁRIO SOBRE A


OBRA “CONHECIMENTO OBJETIVO – KARL R. POPPER"
CAPÍTULO 3 – EPISTEMOLOGIA SEM UM SUJEITO CONHECEDOR

BELO HORIZONTE
2020
Capítulo 3 – Epistemologia sem um sujeito conhecedor

1) Três testes sobre Epistemologia e o Terceiro Mundo

O principal tópico da palestra será o “terceiro mundo”, que é o mundo de


conteúdos objetivos do pensamento, especialmente de pensamentos científicos,
poéticos e obras de arte.
Popper considera, primordialmente, a existência de três mundos:
- 1º mundo – mundo de objetos físicos ou estados materiais;
- 2º mundo – mundo de estados da consciência ou estados mentais;
- 3 º mundo – mundo de conteúdos objetivos de pensamento.
Os habitantes desse 3º mundo seriam: sistemas teóricos, problemas e
situações de problema, argumentos críticos (principal - estado de uma discussão,
estado de um argumento crítico) e conteúdo de revistas, livros e bibliotecas.
Ao sustentar um 3º mundo provoca os filósofos de crença, que estão
interessados em nossas crenças subjetivas. O Autor é um realista. Sugere que há
mundos materiais e um mundo de estado de consciência e que esses 2 interagem. E há
também um 3º mundo.
Os opositores do 3º mundo argumentam que todos esses habitantes do 3º
mundo já pertencem ao 2º mundo, uma vez que pertencem aos estados mentais. Já o
Autor entende que não se pode relegar todas essas entidades ao 2º mundo.
Para justificar a existência mais ou menos independente do 3º mundo o Autor
considera 2 experiências de pensamento:
- Experiência 1 – todas as máquinas, equipamentos e aprendizado subjetivo
(pessoas) são destruídos. Mas sobrevivem bibliotecas e a capacidade humana de
aprender com elas.
- Experiência 2 – todas as máquinas, equipamentos e aprendizado subjetivo
(pessoas) são destruídos. Não sobrevivem bibliotecas e a capacidade humana de
aprender com elas. Desse modo nossa capacidade de aprender com os livros tornou-se
inútil. Não haverá reaparecimento de nossa civilização por muitos anos.
O Autor defende, nessa parte do texto, 3 teses principais, relacionadas à
epistemologia (teoria do conhecimento científico).

- 1ª TESE – IRRELEVÂNCIA DE UMA EPISTEMOLOGIA SUBJETIVISTA


A epistemologia tradicional tem estudado o conhecimento, o pensamento no
sentido subjetivo – “sei”, “estou pensando”, o que tem levado estudiosos a
irrelevâncias, pois estudavam algo que não tem significação para o conhecimento
científico. Pois o conhecimento científico não é conhecimento no sentido do uso
comum da palavra “sei”, pertence ao 2º mundo. O conhecimento científico pertence
ao 3º mundo, ao mundo das teorias objetivas, problemas objetivos e argumentos
objetivos.
A epistemologia tradicional se interessa pelo segundo mundo: pelo
conhecimento como uma certa espécie de crença justificável, crença baseada em
percepção. Em conseqüência, este tipo de filosofia da crença não pode explicar (e nem
mesmo tenta explicar) o fenômeno decisivo de que os cientistas criticam suas teorias e
assim as matam.
Diante disso, a epistemologia tradicional é sem importância. E grande parte da
epistemologia contemporânea é sem importância, incluindo aí a lógica epistêmica.
Qualquer lógico epistêmico pode combater a crítica do Autor, segundo ele,
dizendo que não visa a contribuir para a teoria do conhecimento científico.
A tese envolve 2 sentidos diferentes de conhecimento ou pensamento:
- 1) conhecimento ou pensamento no sentido subjetivo – estado de espírito,
consciência ou disposição para agir.
- 2) conhecimento ou pensamento num sentido objetivo, constituído de
problemas, teorias e argumentos. Nesse sentido, o conhecimento é totalmente
independente de qualquer alegação de conhecer que alguém faça,
independentemente da crença ou disposição de qualquer pessoa para concordar, ou
para afirmar ou para agir. O conhecimento no sentido objetivo é conhecimento sem
conhecedor, sem sujeito que conheça.

- 2ª TESE – DA RELEVÂNCIA DE UMA EPISTEMOLOGIA OBJETIVISTA


O relevante para a epistemologia é o estudo de problemas científicos e
situações de problema, de conjecturas científicas, de discussões científicas, de
argumentos críticos e do papel desempenhado para a evidência em argumentos. O
Estudo de um 3º mundo de conhecimento objetivo amplamente autônomo é de
importância decisiva para a epistemologia.

- 3ª TESE – UMA ESPISTEMOLOGIA OBJETIVISTA PODE AJUDAR A LANÇAR LUZ


SOBRE O SEGUNDO MUNDO DE CONSCIÊNCIA SUBJETIVA, ESPECIALMENTE SOBRE OS
PROCESSOS SUBJETIVOS DE PENSAMENTO DOS CIENTISTAS.

- 4ª TESE (apoio) – O 3º mundo é um produto natural do animal humano.

- 5ª TESE (apoio) – O 3º mundo é amplamente autônomo, apesar de que


atuamos sobre ele e de que sejamos atuados por ele.

- 6ª TESE (apoio) – através da interação entre nós é o 3º mundo é que o


conhecimento objetivo cresce.
2) Uma abordagem Biológica do Terceiro Mundo

O Autor defende a existência de um 3º mundo autônomo com base em um


argumento biológico.
O Autor irá estudar as estruturas que os animais produzem, tais como teias,
ninhos, tocas, barragens, caminhos abertos por animais.
O Autor traz 2 categorias principais de problemas surgidos do estudo dessas
estruturas:
1) métodos/modos dos animais se comportarem quando constroem estruturas
2) estruturas propriamente ditas, química dos materiais, propriedades físicas,
geométricas, adequação das estruturas ao meio ambiente, funções biológicas das
estruturas.
O Autor entende que a existência das estruturas pode ser tida como criadora
de ambas as categorias de problemas. A segunda categoria (estruturas) é mais
fundamental, tudo que ela pressupõe da primeira categoria é o mero fato de que as
estruturas são de algum modo produzidas por animais. Essas considerações podem ser
aplicadas a produtos da atividade humana (arte, casas, ferramentas, ciência). Para o
Autor, o mais importante é a ciência, o que está no 3º mundo.

-1ª TESE – IRRELEVÂNCIA DE UMA EPISTEMOLOGIA SUBJETIVISTA


Para a resolução de problemas atuais em filosofia é imprescindível a distinção
entre 2 categorias de problemas – problemas de produção de um lado e problemas
ligados às estruturas produzidas.
Devemos sempre ter consciência da distinção entre problemas ligados à nossa
contribuição pessoal para produção do conhecimento científico e os problemas ligados
às teorias científicas, aos argumentos científicos.

-2ª TESE – DA RELEVÂNCIA DE UMA EPISTEMOLOGIA OBJETIVISTA


A segunda categoria de problemas, aquela relativa aos produtos produzidos é
mais importante que a primeira.
O estudo dos produtos é muito mais importante que o estudo da produção,
mesmo para uma compreensão da produção e de seus métodos.

-3ª TESE – UMA ESPISTEMOLOGIA OBJETIVISTA PODE AJUDAR A LANÇAR LUZ


SOBRE OS PROCESSOS SUBJETIVOS DE PENSAMENTO DOS CIENTISTAS.
Os problemas da segunda categoria são básicos para compreender os
problemas de produção. Podemos aprender mais sobre o comportamento de
produção estudando os próprios produtos.
Podemos aprender, acerca da heurística (ciência que tem por objeto a
descoberta dos fatos) e da metodologia estudando teorias pró e contra. Podemos
aprender muito do comportamento e da psicologia partindo do estudo dos produtos.
- abordagem objetiva – do terceiro mundo. Parte dos efeitos;
- abordagem subjetiva – do segundo mundo, behaviorista, psicológica,
sociológica do conhecimento científico. É causal.
Em todas as ciências a abordagem comum vem dos efeitos para as causas. O
efeito suscita o problema.

3) A Objetividade e Autonomia do Terceiro Mundo

Segundo Popper, razão para errônea abordagem subjetiva é o fato, por


exemplo, de que um livro nada é sem um leitor. Essa concepção é errada. Um ninho de
vespa é um ninho de vespa mesmo depois de abandonado.
Os livros ou uma biblioteca conterão conhecimento objetivo (verdadeiro ou
falso, útil ou inútil) e não é o fato de alguém o ler que vai o transformar em um livro.
Ele é um livro, independentemente do fato de alguém o ler ou não. Para pertencer ao
terceiro mundo o livro deve ser apenas capaz de ser aprendido.
A ideia de autonomia é central na teoria do Autor. Autonomia no sentido de
que apesar de o terceiro mundo ser uma criação humana, dele decorre, ainda que sem
intenção, outras interações, outros problemas.
A autonomia é apenas parcial, os novos problemas levam a novas criações ou
construções e podem assim acrescentar novos objetos ao terceiro mundo. E cada um
desses fatos criará novos fatos não pretendidos, novos problemas inesperados e novas
refutações.
O processo pode ser assim descrito:
P1(problema) – TT (teste teórico) – EE (eliminação erros) - P2(outro problema)

4) Linguagem, Crítica e o Terceiro Mundo

As mais importantes criações humanas, assim como os mais importantes


efeitos de retrocarga sobre nós mesmos decorrem das funções mais altas da
linguagem humana (função descritiva e argumentativa).
A linguagem, a formulação de problemas, a emersão de novas situações de
problemas, teorias concorrentes, crítica mútua por meio de argumentação, tudo isto
são os meios indispensáveis do crescimento científico. As funções ou dimensões mais
importantes da linguagem humana são a função descritiva e a argumentativa. O
crescimento dessas funções é, naturalmente, obra nossa, embora elas sejam
conseqüências não pretendidas de nossas ações. Só dentro de uma linguagem assim
enriquecida é que a argumentação crítica e o conhecimento no sentido objetivo se
tornam possíveis.
São consideradas funções inferiores da linguagem a auto-expressão e
sinalização.
Pontos importantes, segundo Popper:
-A linguagem que tem que se exteriorizar, para fora do corpo senão não há
objeto para discussão crítica.
-A este desenvolvimento das funções superiores da linguagem é que devemos
nossa razão.
Com a evolução da função argumentativa da linguagem, a crítica se torna o
instrumento principal de crescimento.
O mundo autônomo das funções superiores da linguagem torna-se o mundo da
ciência. E o esquema válido para o mundo animal torna-se o esquema do crescimento
do conhecimento através da eliminação de erros por meio da crítica racional
sistemática já mencionada:
P1(problema) – TT (teste teórico) – EE (eliminação erros) - P2(outro problema)
Esse é o esquema da procura da verdade por meio da discussão racional.
O Autor trata, também de duas formas de conhecimento, a saber:
- conhecimento subjetivo – certas disposições inatas para agir e suas
modificações adquiridas;
- conhecimento objetivo – conhecimento científico, teorias conjecturais,
problemas abertos, argumentos.
Todo o trabalho em ciência é dirigido para o crescimento do conhecimento
objetivo. Esse trabalho é falível e há padrões objetivos que podemos não atingir.

5 – Observações históricas

5.1 – Platão e Neoplatonismo


Pelo que se sabe Platão foi o descobridor do terceiro mundo. Toda a filosofia
ocidental consiste de anotações de Platão. Popper faz 3 observações sobre as teorias
de Platão, sendo duas delas, críticas:
-1) Platão descobriu o terceiro mundo e a retrocarga do 3º mundo sobre nós
mesmos.
-2) O terceiro mundo de Platão era divino, imutável, verdadeiro. Assim, há um
grande vácuo entre terceiro mundo dele e o de Popper, vez que o dele é feito pelo
homem e é mutável, podendo ter teorias verdadeiras ou não.
-2) Platão acreditava que o terceiro mundo nos forneceria explicações finais. Os
habitantes do 3º mundo se tornam conceitos e não teorias, argumentos,
problemas. Assim, Platão, como outros filósofos essencialistas, estão mais
interessados no significado essencial de palavras no que na verdade ou falsidade
de teorias.
Segundo Popper, cientistas pensam que conceitos e sistemas conceituais tem a
mesma importância que teorias e sistemas teóricos estão ainda sofrendo do erro
principal de Platão. Os conceitos são meios de formular teorias. Os conceitos são
instrumentais, podendo sempre ser substituídos por outros.
5.2 – Hegel
Segundo Popper Hegel era um platônico medíocre, cujo mundo de ideias estava
mudando. As ideias de Hegel, em contraste às ideias de Platão, eram fenômenos
conscientes, pensamentos que habitavam espécie de consciência, mente ou
espírito.
As diferenças entre o “Espírito Objetivo” e o “Espírito Absoluto” de Hegel e o
terceiro mundo de Popper são:
1) Para Hegel o homem não é o criador da criação artística e da filosofia. É a
divina autoconsciência do Universo que move o homem. Os indivíduos são
instrumentos do espírito da época. Contra isso, Popper entende que o elemento
criativo individual entre um homem e sua obra é da maior importância.
2) A similaridade entre as teorias é superficial. Enquanto Popper trabalha para
eliminar os erros e contradições de seus problemas, resultando na criação de um
novo problema, Hegel não pensa em eliminar contradições, pois as considera boas.
A eliminação do erro leva ao crescimento objetivo do nosso conhecimento,
segundo Popper.
3) Enquanto as ideias de Platão estão num céu divino, Hegel entende seu
“Espírito” como consciência divina, onde as ideias habitam. O Espírito não é só
consciente, mas um ser. Diferentemente, o terceiro mundo de Popper não tem
qualquer similaridade com a consciência humana.

5.3 – Bolzano e Frege


O que Popper chama de terceiro mundo tem muito em comum com a teoria de
Bolzano que trata de proposições e verdades em si mesmas que habitam o terceiro
mundo de Frege.
O terceiro mundo de Popper se assemelha mais de perto ao universo de
conteúdos objetivos de pensamento de Frege, que faz clara distinção entre
pensamento objetivo e subjetivo.

5.4 – Empirismo (doutrina segundo a qual todo conhecimento provem unicamente


da experiência).
O empirismo, compreendido em seu cenário histórico, tinha como principal
problema a justificação racional da cristandade em comparação com o
conhecimento científico. Isso explica porque o conhecimento é completamente
encarado como uma espécie de crença justificada pela evidência dos nossos
sentidos. Só aceitamos as proposições que podem ser provadas, verificadas, pela
evidência dos nossos sentidos.
As proposições ou são falsas ou são verdadeiras, não existe uma terceira via.
6 – Apreciação e Crítica da Epistemologia de Brouwer

Popper critica Brouwer não como matemático e sim por sua epistemologia e
sua filosofia de matemática intuicionista.
Popper tenta compreender a epistemologia de Brouwer conjecturando que ela
brota de uma tentativa para resolver uma dificuldade na filosofia da matemática de
Kant.
Para entender Brouwer precisamos analisar sua formação kantiana. Para Kant,
a intuição é fonte de conhecimento, e a intuição pura é uma fonte infalível de
conhecimento, dela emerge a certeza absoluta.
Já Kant tirou essa doutrina de Plotino, Santo Tomás, Descartes e outros.
Originariamente, intuição significava percepção, o que vemos, percebemos quando
olhamos para outro objeto.
Mas de Plotino em diante desenvolve-se um pensamento discursivo em
contraste à intuição, que era o modo de Deus conhecer tudo de relance. Já o
pensamento discursivo é o modo humano, em que argumentamos passo a passo.
Kant sustentava que a intuição dos sentidos pressupõe a intuição pura: nossos
sentidos não podem fazer seu trabalho sem antes ordenar suas percepções de
tempo e espaço (intuição pura). A intuição pura se limita estritamente ao campo
de validade a priori, que é distinta do modo intelectual ou discursivo de pensar.
Para Kant, a geometria e a aritmética são decorrentes da intuição pura e, portanto,
válidas a priori, totalmente dissociadas do modo intelectual ou discursivo de
pensar.
Ocorre que, segundo Popper, essa teoria das fontes de conhecimento
matemático de Kant sofre de equívocos, pois ainda que se admita tudo o que ele
diz, fica claro que na geometria de Euclides, quer se use ou não a intuição pura se
faz também uso da argumentação intelectual, de dedução lógica.
Diante disso, resta claro que há uma lacuna ou mesmo uma contradição na
teoria de Kant ao excluir da geometria e da aritmética os argumentos discursivos.
Brouwer resolveu esse problema dizendo que devemos distinguir entre dois
níveis, um nível intuitivo e mental, essencial para o pensamento matemático, a
construção do objeto matemático e outro discursivo e linguístico e essencial para a
comunicação somente.
Com essa teoria Brouwer resolveu, na filosofia da matemática 3 grandes
conjuntos de problemas:

1) Problemas epistemológicos (relativos à teoria do conhecimento)


concernentes à fonte de certeza matemática. Esses problemas foram resolvidos
pela doutrina da intuição como fonte de conhecimento e pela doutrina de que uma
prova matemática é uma construção sequencial.
2) Problemas ontológicos (estuda a natureza do ser) concernentes à natureza
de seu modo de existência. Esses problemas foram resolvidos com uma doutrina
que tinha 2 lados: de um lado havia o construtivismo e de outro o mentalismo, que
situava todos os objetos matemáticos no segundo mundo de Popper. Os objetos
matemáticos existiam exclusivamente como construções da mente humana.

3) Problemas metodológicos concernentes às provas matemáticas. Rejeição


por Brouwer da lei do terceiro excluído. Rejeição de provas indiretas e à demanda
que a existência só pode ser provada pela construção efetiva do objeto
matemático em questão.
Brouwer também nega o platonismo, que entende que os objetos matemáticos
têm um modo autônomo de existência, podem existir sem terem sido construídos
por nós, sem ter sido provado que existem.
Posteriormente, Popper faz uma apreciação e crítica da epistemologia de
Brouwer.
Segundo Popper uma das grandes realizações de Brouwer é ter visto que a
matemática, o terceiro mundo são criações do homem.
Outra grande realização de Brouwer foi o reconhecimento de que objetos
matemáticos devem existir antes que possamos falar a respeito deles.
Posteriormente, Popper critica as soluções dadas por Brouwer nos três
conjuntos principais da filosofia da matemática.

1) Problemas epistemológicos (teoria do conhecimento) – O mais importante é


abandonar a filosofia equivocada da intuição como fonte infalível de
conhecimento. Tudo é bem vido como fonte, inclusive a intuição. Mas nada é
seguro e somos todos falíveis.

2) Problemas ontológicos (natureza do ser) – É inevitável a ação recíproca


entre a construção intuitiva e a formulação linguística, que necessariamente
envolve raciocínio discursivo e portanto lógico.

3) Problemas metodológicos – o motivo original da matemática intuicionista de


Brouwer era a segurança, a procura de métodos seguros, infalíveis, o que seria
proporcionado através de suposições e meios lógicos mais fracos. Popper entende
que tal raciocínio só tem validade para provas e não para a crítica. Para a
refutação, o sistema de crítica deve ser forte. A virtude está numa teoria que pode
suportar uma crítica forte. Não há problemas se uma teoria tem consequência
contra-intuitivas.
7) Subjetivismo em Lógica, Teoria da Probabilidade e Ciência Física

Não é de surpreender que o esquecimento do terceiro mundo e


consequentemente a valorização de uma epistemologia subjetiva ainda esteja
amplamente difundido no pensamento contemporâneo. Seguem abaixo algumas
tendências.

7.1) Lógica epistêmica


Ela lida com fórmulas tais como “a (sujeito conhecedor) conhece
p(proposição)” e “a (sujeito conhecedor) crê que p(proposição)”. Seguindo Popper
isto nada tem a ver com o conhecimento científico. O cientista não conhece nem
crê. O que faz então o cientista (S)? Ele tenta compreender, pensar em
alternativas, críticas para p.

7.2) Teoria da Probabilidade


A epistemologia subjetivista tem forte posição no campo do cálculo de
probabilidade. Esse cálculo é ainda vastamente interpretado num sentido
subjetivo, como um cálculo de ignorância ou de conhecimento subjetivo incerto.
Popper combateu essa interpretação subjetiva do cálculo da probabilidade por
mais de 30 anos.

7.3) Ciência Física


A teoria subjetiva do conhecimento entrou na ciência com bastante força e
teve como ponto de entrada original a teoria subjetiva da probabilidade e
espalhou-se pela mecânica quântica, estática pela teoria da entropia e pela teoria
da informação.

8) A Lógica e a Biologia da Descoberta

Do ponto de vista objetivista a epistemologia torna-se a teoria do crescimento


do conhecimento. Torna-se a teoria da solução de problemas, da construção, da
discussão crítica, avaliação e teste crítico de teorias conjecturais concorrentes.
A avaliação ou apreciação de teorias concorrentes é anterior ao teste. Também
é anterior ao teste o conteúdo empírico de uma teoria, isto é, sua força para
resolver problemas preexistentes, problemas estes que dão origem à teoria. Por
fim, problemas e teorias concorrentes são anteriores aos testes.
A avaliação a posteriori de uma teoria depende inteiramente do modo pelo
qual resistiu a testes severos e engenhosos. A avaliação a posteriori depende
amplamente de seu valor a priori, sendo que as teorias desinteressantes não
precisam sequer serem testadas. Por outro lado, as teorias altamente testáveis são
importantes ainda que deixem de passar em seu teste, pois podemos aprender
imensamente com o insucesso.
O alvo devem ser teorias que sejam não só intelectualmente interessantes e
altamente testáveis, mas também que tenham passado de fato por testes severos
e que caso se torne manifesto seu caráter conjectural por sua refutação, deem
origem a problemas novos, inesperados e frutíferos.
Esse ciclo pode ser novamente descrito pelo diagrama de Popper
repetidamente usado:
P1 (problema 1) – TT (teste teórico) – EE (eliminação de erros) – P2(problema 2)
O processo de aprender não é um processo repetitivo ou cumulativo, mas sim
um processo de eliminação de erro.

9) Descoberta, Humanismo e Autotranscedência

Para um humanista, a abordagem de Popper pode ser importante pois sugere


um novo modo de encarar a relação entre os sujeitos e os objetos de seus
esforços: o conhecimento objetivo crescente e o terceiro mundo crescente.
A velha abordagem subjetiva de interpretar o conhecimento como uma relação
entre a mente subjetiva e o objeto conhecido, que Russel, chama de “crença” ou
“julgamento”, uma vez que a obra de uma pessoa é encarada como expressão de
seu estado íntimo. Segundo Popper essa abordagem deve ser substituída por outra
muito diferente.
Deve-se admitir que o terceiro mundo, o mundo do conhecimento objetivo é
de feitura humana. E deve-se admitir que esse mundo existe autonomamente
gerando seus próprios problemas e também que o impacto desse mundo sobre
qualquer um de nós excede o impacto que qualquer um de nós possa produzir
sobre ele.
Para Popper, o mais importante não é a autonomia do terceiro mundo e sim a
relação entre nós mesmos e a obra, o que se pode ganhar desta relação. Tudo
depende do dar e tomar entre nós mesmos e nossa obra. Essa interação entre
nossas ações e seus resultados é o meio pelo qual transcendemos a nós mesmos, a
nossos talentos, nossos dotes. Esta autotranscedência é o fato mais notável e
importante de toda vida e de toda evolução, especialmente da humana.
A vida é solução de problemas de descoberta de novos fatos, de novas
possibilidades, por meio de experimentar as possibilidades concebidas em nossa
imaginação. No nível humano, essa experimentação é feita quase que inteiramente
no terceiro mundo.
O segundo mundo (mundo da mente) torna-se, no nível humano, cada vez mais
o elo entre o primeiro mundo e o terceiro: todas as nossas ações no primeiro
mundo são influenciadas pela apreensão do terceiro mundo por nosso segundo
mundo.

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