Jlgarcia, Gerente Da Revista, 2474-8115-1-CE

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Lesões gástricas em suínos: ocorrência e relação com a presença de Helicobacter spp

Lesões gástricas em suínos: Ocorrência e relação com o gênero, peso


ao abate e presença de helicobacter spp.1

Gastric lesions in swine: occurrence and correlation with sex, weight


and Helicobacter spp infection.

Letícia Yamasaki2; Felipe Malavolta de Souza Assis3, Victor José Vieira Rosseto3;
Ana Paula F.R.L. Bracarense4*

Resumo
O objetivo deste estudo foi determinar a ocorrência de lesões gástricas em suínos de abate e verificar a
relação das lesões com o gênero, o peso da carcaça e a presença de Helicobacter spp na mucosa
gástrica. Foram colhidos e examinados 236 estômagos de suínos. As lesões da pars esophagea e região
glandular foram classificadas conforme a severidade em graus 0, 1, 2 e 3. Fragmentos das regiões
aglandular e glandular foram processados para exame histológico e para pesquisa de Helicobacter spp.
A análise macroscópica revelou que 203 (86.1%) estômagos apresentavam algum tipo de lesão. A
ocorrência de erosões e úlceras na região aglandular foi observada em 104 (44.1%) animais e na região
glandular em 22 (9.3%). A ulceração na região gastroesofágica estava presente em 45 animais (19.1%),
dos quais 25 (21.1%) eram machos e 20 (16.5%) fêmeas. O peso médio da carcaça foi de 82.7 Kg nos
animais sem lesões e com paraqueratose na pars esophagea e de 79.5 Kg nos animais com erosões e
ulcerações. Utilizando a coloração de Warthin-Starry, observamos Helicobacter spp na mucosa gástrica
de 112 (47.5%) amostras. Destas, 54 (48.2%) foram classificadas como grau 2 ou 3 (pars esophagea) e 58
(51.8%) como grau 0 e 1. Dos animais positivos para o Helicobacter spp, 26 (23.2%) apresentavam
úlceras na pars esophagea e 24 (21.4%) apresentavam a mucosa sem alterações. Dos 124 (52.5%)
animais negativos, 50 (40.3%) foram classificados como grau 2 ou 3 e 74 (59.7%) como grau 0 ou 1. A
análise estatística revelou que não há diferença significativa entre suínos com ou sem lesões gástricas
em relação à presença de Helicobacter spp, gênero e peso da carcaça.
Palavras-chave: Suínos, Helicobacter spp., lesões gástricas.

1
Apoio financeiro: CNPq, CAPES e PROPPG/UEL.
2
Aluna do programa de Pós-graduação em Ciência Animal (área de concentração: Sanidade Animal; nível mestrado), UEL..
3
Bolsista iniciação científica CNPq, aluno do curso de Medicina Veterinária da Universidade Estadual de Londrina – UEL.
4
Laboratório de Anatomia Patológica, DMVP, CCA, UEL. Londrina, Paraná, Brasil. Caixa-postal: 6001. Tel: + 43 3371-4062. E-
mail: [email protected].
* autor para correspondência
Recebido para publicação 02/03/06 Aprovado em 04/08/06
463
Semina: Ciências Agrárias, Londrina, v. 27, n. 3, p. 463-470, jul./set. 2006
YAMASAKI, L. et al.

Abstract
The aim of this study was to investigate the association between the lesions of the gastric mucosa in
slaughter pigs and sex, carcass weight and presence of Helicobacter spp. Stomachs from 236 swine
were examined. Gastroesophageal lesions were classified in agreement severity in grade 0, 1, 2 and 3.
Fragments from the aglandular and glandular area were processed for histology and for identification of
Helicobacter spp in tissue sections. Macroscopic analysis revealed 203 (86.1%) stomachs with some
degree of lesion. Grade 2 and 3 lesions were observed in 104 (44.1%) animals. Grade 3 lesions were
observed in 25 (21.1%) castrated males and 20 (16.5%) females. The average carcass weight of animals
with grade 0 and 1 lesions and grade 2 and 3 was 82,5 Kg and 79,5 Kg, respectively. One hundred and
twelve (47.5%) pigs were positive for Helicobacter spp. by Warthin-Starry stain method ; among them,
54 (48.2%) had grade 2 and 3 lesions; and 58 (51.8%) had grade 0 and 1 lesions. One hundred and twenty-
four (52.5%) were negative for Helicobacter spp; among them 50 (40.3%) had grade 2 and 3 lesions, and
74 (59.7%) had grade 0 and 1. There was no significant difference between pigs with and without gastric
lesions in regard to the presence of Helicobacter spp, sex and weight.
Key words: Swine, Helicobacter spp., gastric lesions.

Introdução CARVALHO et al., 1999). A maior suscetibilidade


Lesões envolvendo a pars esophagea de suínos desta região à injúria é atribuída à falta do muco
foram descritas a partir da década de 50 em diversos protetor produzido pelo epitélio mucossecretor,
países, sendo associadas à produção intensiva. O presente na região glandular, e a incapacidade do
impacto econômico das doenças gástricas em epitélio estratificado produzir quantidade suficiente
suinocultura se dá pela taxa de mortalidade associada de bicarbonato para neutralizar o ácido gástrico
à forma hemorrágica aguda em matrizes (EMBAYE et al., 1990). O número de animais que
(KOWALCZYK, 1969) e pelas perdas econômicas apresentam ulcerações em ambas as regiões é
decorrentes de anemia crônica, anorexia e diminuição pequeno, sugerindo que os dois processos devem ter
do ganho de peso (O’BRIEN, 1993). Entretanto, etiologias distintas (CARVALHO et al., 1999).
existem controvérsias, visto que Guise et al. (1997) No Brasil, estudos demonstram a influência do
e Friendship et al. (1999) não constataram relação gênero na freqüência de úlceras gastresofágicas,
entre ulceração gástrica e queda no desempenho. sendo esta maior em machos castrados que em
Alterações como paraqueratose, erosões e fêmeas ou machos inteiros (MONTICELLI et al.,
ulcerações gástricas são encontradas em 43,7 a 1995; CARVALHO et al., 1999). Porém, em estudos
77,4% da população suína do Brasil (CARVALHO no exterior, outros autores não observaram esta
et al., 1999). Dentre estas, as úlceras gástricas são influência (GUISE et al., 1997; FRIENDSHIP et al.,
reconhecidas como uma importante doença em 1999).
suínos, com ocorrência variando de 13% a 22,9% A descoberta da associação entre a infecção pelo
(MUGGENBURG et al., 1964; ARGENZIO e Helicobacter pylori no homem e a presença de
EISEMANN, 1996; GUISE et al., 1997). No Brasil, gastrites, úlceras e neoplasias como adenocarcinoma
a ocorrência dessa lesão específica varia de 5,5% a e linfoma gástrico despertou um grande interesse a
23,5% (CIACCI et al., 1991; ROPPA et al., 1995; respeito da participação de bactérias no
CARVALHO et al., 1999). desenvolvimento de gastropatias (MARSHAL e
Desde os primeiros estudos sobre as doenças WARREN, 1984; SIMPSON et al., 1999).
gástricas de suínos, observou-se que as lesões na Atualmente o Helicobacter pylori é reconhecido
pars esophagea eram mais freqüentes do que na como a maior causa de doenças da mucosa gástrica
região glandular (MUGGENBURG et al., 1964; (ERNST et al., 2006), sendo a infecção essencial

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para o desenvolvimento de câncer gástrico no da carcaça e a presença de Helicobacter spp na


homem (BRENNER et al., 2004). Em suínos, a mucosa gástrica.
etiologia e fisiopatologia das úlceras gástricas
permanecem incertas. No passado as pesquisas
enfocaram fatores dietéticos e relacionados ao stress Material e Métodos
(ARGENZIO e EISEMANN, 1996). Recentemente, Foram utilizados 236 estômagos de suínos, colhidos
a ocorrência de lesões gástricas foi associada à por conveniência durante o abate, em um frigorífico
presença de Helicobacter spp. (QUEIROZ et al., com Serviço de Inspeção Federal, localizado na
1996). macroregião de Londrina. Os animais eram de
A associação entre Helicobacter spp e a diversas linhagens, com idade entre 140 e 150 dias.
ocorrência de úlceras gastroesofágicas em suínos Por ocasião da colheita das amostras foram anotados
tem sido controversa. Estudos afirmam que as o gênero e o peso da carcaça. Os animais provinham
bactérias do gênero Helicobacter predispõem o de 19 municípios que foram agrupados em
estabelecimento de úlceras (BARBOSA et al.,1995; mesoregiões.
PARK et al., 2004; MALL et al., 2004). Entretanto, Os estômagos foram examinados externamente
outros autores relatam que esta associação é e incisados ao longo da curvatura maior para exame
inconsistente (MELNICHOUK et al., 1999; interno. As alterações macroscópicas de pars
KRAKOWKA et al., 2005; SZEREDI et al., 2005). esophagea encontradas foram anotadas e
O objetivo deste estudo foi determinar a classificadas conforme sua localização, tipo e
ocorrência lesões gástricas em suínos de abate e gravidade, seguindo o modelo de classificação
verificar a relação das lesões com o gênero, o peso modificado de MORÉS et al. (2000) (quadro 1).

Quadro 1 – Classificação das alterações macroscópicas de estômago suíno, modificado de MORÉS et al. (2000).
Londrina, Paraná, 2006.
Escore Pars esophagea Região glandular
Grau 0 Ausência de alterações macroscópicas, epitélio de aspecto liso e Ausência de alteração
brilhante.
Grau 1 Paraqueratose, epitélio proliferado, rugoso e sem brilho. Hiperemia, edema e/ou hemorragia
da mucosa.
Grau 2 Erosões com comprometimento de menos de 33% da região Presença de erosões
gastresofágica.
Grau 3 Ulcerações ativas ou crônicas em mais de 33% da região Presença de ulcerações
gastresofágica.

Fragmentos de regiões pré-estabelecidas da pars de Wharthin-Starry (WS) para pesquisa de bactérias


esophagea, corpo, fundo e piloro foram colhidos e de formato espiralado nos fragmentos de mucosa
fixados em solução tamponada de formalina a 10%. gástrica. Os cortes foram examinados com objetiva
Nas amostras classificadas com lesão grau 3, tanto de 100x. A superfície mucosa, região de fóvea e
em região glandular quanto pars esophagea, foram lúmen glandular foram examinados em toda a sua
colhidos também fragmentos da lesão para análise extensão.
histológica. Os fragmentos foram então submetidos
Os percentuais de ocorrência de bactérias nos
ao processamento histológico de rotina. Os cortes
grupos com e sem lesão gástrica foram comparados
de 4¼m de espessura foram corados pelo método
pelo teste do Qui-quadrado, ficando estabelecido 5%
como nível de significância.

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Resultados ocorrência de lesões de grau 2 e 3 na pars


esophagea (Figura 1) foi observada em 104 (44,1%)
Ao exame macroscópico verificou-se que 203
estômagos e na região glandular em 22 (9,3%). As
(86,1%) estômagos apresentavam algum tipo de
lesões de grau 3 na pars esophagea estavam
lesão. As lesões de grau 1 foram as mais freqüentes
presentes em 45 estômagos (19,1%) e na região
em ambas as regiões, com 33,5% na região de pars
glandular em cinco (2,2%)(Tabela 1).
esophagea e 41,5% na região glandular. A

Figura 1 – Graus de lesão 2 e 3 (respectivamente) de estômago de suíno em idade de abate (setas); pars esophagea.
Londrina, Paraná, 2006.

Quanto ao gênero, dos 236 animais avaliados, 115 eram machos e 121 fêmeas, sendo que 80% dos
machos e 75,2% das fêmeas tinham algum grau de lesão macroscópica na pars esophagea. A ocorrência
dos diferentes graus de lesão no estômago está descrita na tabela 1. À análise estatística não se evidenciou
influência do gênero sobre a ocorrência de lesões gástricas.

Tabela 1 – Ocorrência de lesões de grau 1, 2 e 3 no estômago de suínos oriundos do Estado do Paraná, segundo o
gênero. Londrina, Paraná, 2006.

Gênero Grau 1 (%) Grau 2 (%) Grau 3 (%) Total (%)


Aglandular* Machos 37 (32,1) 30 (26) 25 (21,7) 92 (80)
Fêmeas 42 (34,7) 29 (23,9) 20 (16,5) 91 (75,2)
total 79 59 45 183
Glandular** Machos 44 (38,2) 10 (8,7) 2 (1,7) 56 (48,7)
Fêmeas 54 (44,6) 7 (5,8) 3 (2,5) 64 (52,9)
total 98 17 5 120

*Qui-quadrado=0,88; p=0.6429
**Qui-quadrado=1.22; p=0,5428

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Em relação ao peso médio da carcaça, verificou-


se que os animais com lesões na pars esophagea
de grau 0 e 1 apresentaram peso médio de 82,7 kg e
os com lesões de grau 2 e 3, 79,5 kg. A média de
peso dos animais infectados por bactérias espiraladas
foi de 78,9 kg e a dos não infectados 77 kg. À análise
estatística não se evidenciou influência da presença
de lesões gástricas ou de Helicobacter spp sobre o
peso médio da carcaça.
Utilizando a coloração de Warthin-Starry,
constatou-se a presença de Helicobacter spp (Figura
Figura 2 - Fotomicrografia de estômago de suíno corado
2) colonizando a mucosa gástrica em 47,5% (112/ pelo método de Warthin-Starry. Presença de bactérias de
236) dos animais analisados. Os microrganismos formato espiralado (seta) na glândula gástrica, objetiva
foram observados principalmente na superfície 100X. Londrina, Paraná, 2006.
mucosa e na região da fóvea do estômago glandular.
A presença de Helicobacter spp foi verificada Dentre os 236 estômagos analisados, 45 (19,1%)
principalmente nas regiões de piloro, corpo e fundo, apresentavam ulcerações na região de pars
sendo que raramente foram observadas na região esophagea, sendo que em 26 (57,7%) verificamos
de pars esophagea.O número de amostras positivas a presença de Helicobacter spp. Na região glandular
para a presença de Helicobacter spp nos diferentes observamos lesões de grau 3 em cinco animais, sendo
graus de lesão da região aglandular e glandular está que em três observamos bactérias na mucosa gástrica.
descrito na tabela 2. Quando analisamos as lesões de graus 0 e 1 de região
glandular observamos que 100 (46,7%) desses
estômagos tinham Helicobacter spp. Já nos animais
classificados como graus 0 e 1 de pars esophagea,
constatamos a presença de Helicobacter spp em 58
(43,9%) animais (Tabela 2).

Tabela 2 – Presença de Helicobacter spp na mucosa gástrica de suínos de abate com diferentes graus de lesão.
Londrina, PR, 2006.
Presença de Helicobacter spp Grau 0 Grau 1 Grau 2 Grau 3 Total
Pars esophagea* Positivo 24 34 28 26 112
Negativo 29 45 31 19 124
Total 53 79 59 45 236
Glandular** Positivo 49 51 9 3 112
Negativo 67 47 8 2 124
Total 116 98 17 5 236
*Qui-quadrado=2,64; p= 0,4502
**Qui-quadrado=2,61; p=0,4554

Dos 112 estômagos positivos para a presença da sem alterações. Constatamos úlceras de região
bactéria, 26 (23,2%) apresentavam úlceras na pars glandular em três animais dos 112 em que se observou
esophagea e 24 (21,4%) apresentavam a mucosa Helicobacter spp, e 49 (43,7%) animais sem

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alteração macroscópica. A análise estatística não espiraladas na mucosa gástrica de 47,5% dos animais
demonstrou influência da presença da bactéria sobre avaliados. Resultado superior ao observado por
a ocorrência de lesões gástricas. Queiroz et al. (1990), que utilizaram metodologia
diagnóstica semelhante e inferior ao relatado por
Cantet et al. (1999) e Young et al. (2001), que
Discussão utilizaram a PCR.
A análise dos resultados revelou que 86,1% A associação entre Helicobacter spp e a
dos estômagos apresentavam algum grau de lesão, ocorrência de úlceras gastroesofágicas em suínos tem
valor superior ao descrito por Carvalho et al. (1999), sido controversa. Estudos afirmam que as bactérias
que relataram freqüência de 77,4%. Em relação às do gênero Helicobacter predispõem o
lesões na pars esophagea, observamos que 44,1% estabelecimento de úlceras (QUEIROZ et al., 1990;
dos animais apresentavam lesões de grau 2 e 3, sendo BARBOSA et al., 1995; PARK et al., 2004; MALL,
19,1% de ulcerações. Estes resultados são et al., 2004). Entretanto, diversos autores afirmam
semelhantes aos descritos em outros estudos que esta associação é inconsistente
(MUGGENBURG et al., 1964; ROPPA et al., 1995; (MELNICHOUK et al., 1999; KRAKOWKA et al.,
CARVALHO et al., 1999). Poucas são as citações 2005; SZEREDI et al., 2005). Os resultados
na literatura que se referem a alterações na região encontrados sugerem que não há associação entre
glandular. Entretanto, constatamos que 9,3% dos as lesões gástricas e o Helicobacter spp, pois o
animais apresentavam erosões e ulcerações de região número de animais com lesões gástricas
glandular, ocorrência superior às relatadas acompanhadas da presença do Helicobacter spp não
anteriormente (MUGGENBURG et al., 1964; foi significativamente diferente dos animais com
ROPPA et al., 1995; CARVALHO et al., 1999). A lesões gástricas e sem a bactéria. A razão para esta
escassez de relatos caracterizando as lesões diferença de resultados permanece incerta.
macroscópicas da região glandular pode ser um fator
O mecanismo pelo qual o Helicobacter pylori
que influenciou nesta diferença de resultados.
causa lesão em estômagos humanos é bem conhecido
Os percentuais de ocorrência de Helicobacter (MARSHAL e WARREN, 1984; BRENNER et al.,
spp em suínos são bastante variáveis. A ocorrência 2004; ERNST et al., 2006), porém esses estudos são
da bactéria variou de 9,4 e 10,8% segundo Queiroz escassos quando se trata de Helicobacter spp em
et al. (1990) e Grasso et al. (1996). Cantet et al. suínos. Uma das características da doença gástrica
(1999) observaram 80% de positividade para de humanos causada pela infecção pelo
Helicobacter spp em um total de 60 amostras de Helicobacter pylori é o seu caráter de cronicidade.
estômagos suínos, utilizando a reação em cadeia pela Numa escala temporal, talvez os suínos infectados
polimerase (PCR). Young et al. (2001) encontraram não desenvolveram doenças gástricas devido ao curto
resultado positivo em 63,8% das amostras, também tempo de vida. Sabe-se que suínos voltados para a
utilizando PCR. A sensibilidade para o diagnóstico reprodução (matrizes) são mais predispostos a lesões
de Helicobacter spp varia de acordo com a gástricas graves (KOWALCZYK, 1969) e tais lesões
metodologia utilizada. Segundo De Groote et al. podem estar associadas ao Helicobacter spp.
(2000), a PCR é o método diagnóstico mais sensível
CARVALHO et al. (1999) sugerem que as lesões
e específico quando comparado a outros métodos
erosivas e ulcerativas de região glandular devem ter
utilizados para diagnóstico de infecção por
etiologias ou mecanismos de agressão distintos. O
Helicobacter spp. em animais. Neste trabalho, ao
Helicobacter spp é uma bactéria que vive em meio
utilizarmos a impregnação argêntica como método
ao muco protetor da mucosa gástrica e a região de
diagnóstico, constatamos a presença de bactérias

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pars esophagea é uma região desprovida de muco Referências


protetor. Os fatores de patogenia e os mecanismos ARGENZIO, R.A.; EISEMANN, J. Mechanisms of acid
de agressão à mucosa gástrica podem agir de forma injury in porcine gastroesophageal mucosa. Am. J. Vet.
diferente na pars esophagea e na região glandular Res., v.57, p. 564-573, 1996.
de suínos, o que justifica mais investigações sobre a BARBOSA, A.J.A.; SILVA, J.C.P.; NOGUEIRA, M.M.F.;
patogenia das lesões gástricas, bem como sobre as PAULINO Jr., E.; MIRANDA, C.R. Higher incidence of
Gastropirillum sp. in swine with gastric ulcer of the pars
espécies de Helicobacter que infectam suínos.
oesophagea. Vet. Pathol., v.32, p. 134-139, 1995.
A influência do gênero na freqüência de úlceras BRENNER, H.; ARNDT, V.; STEGMAIER, C.; ZIEGLER,
gastresofágicas já foi reportada por outros autores H.; ROTHENBACHER, D. Is Helicobacter pylori infection
(MONTICELLI et al., 1995; CARVALHO et al., a necessary condition for noncardia gastric cancer? Am.
1999). Entretanto, outros estudos não verificaram a J. Epidemiol., v. 159. p. 252-258, 2004.
relação do gênero e as úlceras gástricas ou qualquer CANTET, F.; MAGRAS, C.; MARAIS, A.; FEDERIGUI,
outra doença do estômago dos suínos (GUISE et al., M.; MÉGRAUD, F. Helicobacter species colonizing pig
stomach: molecular characterization and determination of
1997 e PARK et al., 2004). Verificamos que não
prevalence. Enviroment Microbiol., v.65, p. 4672-4676,
houve influência do sexo na ocorrência de lesões 1999.
gástricas, o mesmo relatado por Guise et al. (1997) e
CARVALHO, L.F.O.S.; OLIVEIRA, C.J.B.; MARTINEZ,
Park et al. (2004). P.A.O.; MAZZUCATO, B.C.; ALESSI, A.C. Freqüência de
Ao analisarmos o peso médio da carcaça ao abate, lesões gástricas em suínos destinados ao abate na região
de Ribeirão Preto, SP. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.51,
dos animais com e sem lesão, observamos que as
p.223-227, 1999.
médias foram semelhantes, não sendo possível
CIACCI, J.R.; MORES, N.; SOBESTIANSKY, J. Úlcera
relacionar as lesões gástricas com uma diminuição
gástrica como causa de morte e como achado de necropsia
significativa no peso da carcaça. Poucos são os em três rebanhos suínos. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec.,
relatos encontrados relacionando lesões gástricas e v.43, p.525-533, 1991.
peso do animal. Kowalczyk (1969) relatou que na DE GROOTE, D.; DUCATELLE, R.; VAN DOORN, L.J;
forma assintomática da doença gástrica, a taxa de TILMANT, K.; VERSCHUUREN, A.; HAESEBROUCK, F.
crescimento dos animais é adequada para os padrões Detecion of “Candidatus Helicobacter suis” in gastric
da produção industrial. Nesta forma o diagnóstico é samples of pig by PCR: comparison with other invasive
diagnostic techniques. J. Clin. Microbiol., v. 38, p. 1131-
feito no abatedouro com a observação de alterações
1135, 2000.
como paraqueratose, erosões ou úlceras. Nossos
resultados estão de acordo com o relatado por outros EMBAYE, H.; THOMLINSON, J.R.; LAWRENCE, T.L.J.
Histopathology of oesophagogastric lesions in pigs. J.
autores e sugerem que mesmo as lesões mais graves Comp. Pathol., v.103, p. 253-264, 1990.
(graus 2 e 3) não afetaram significativamente o
ERNST, P. B.; PEURA, D. A.; CROWE, S. E. The translation
desenvolvimento dos animais (KOWALCZYK, 1969; of Helicobacter pylori basic research to patiet care.
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Desta forma, podemos concluir que a ocorrência FRIENDSHIP, R.M.; MELNICHOUK, S.; SMART, N.L.
de lesões na mucosa gástrica é elevada nos suínos Helicobacter infection: what should a swine practitioner
know? Swine Health Prod., v.7, p.167-172, 1999.
abatidos na região Norte do Estado do Paraná.
Apesar da alta ocorrência, não foi possível GRASSO, G.M.; RIPABELLI, G.; SAMMARCO, M.;
RUBERTO, A.; IANNETTO, G. Prevalence of
estabelecer a relação entre a infecção por
Helicobacter-like organisms in porcine gastric mucosa. A
Helicobacter spp e a presença de tais lesões. study of swine slaughtered in Italy. Comp. Immun.
Conclui-se também que não houve relação entre a Microbiol. Infect. Dis., v. 19, p. 213-217, 1996.
ocorrência de lesões gástricas, o gênero e o peso da
carcaça.

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GUISE, H.J.; CARLYLE, W.W.H.; PENNY, R.H.C. Gastric O’BRIEN, J.J. Gastric ulcers. In: LEMAN, A.D.; STRAW,
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