De Posse Obrigatória

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1.

LIBERDADE COMO FUNDAMENTO DA ACÇÃO HUMANA


1.1. Noçao de Liberdade

O termo Liberdade designa a capacidade que todo o homem possui de agir de acordo com a sua
própria decisão: é a capacidade de autodeterminação.

Como condição do agir humano, a liberdade pressupõe: Autonomia do sujeito face as suas
condicionantes. Embora o homem esteja sempre condicionado por factores externos e internos,
para que a sua acção seja considerada livre, é necessário que ele seja a causa dos seus actos, ou
seja, que tenha uma conduta livre. Consciência da acção – a acção humana é a manifestação de
uma vontade livre, portanto, consciente dos seus actos. Este pressuposto implica que o sujeito não
ignore a intenção, os motivos, as circunstâncias, assim como as consequências da própria acção;
Escolhas fundamentadas em valores – a acção hmana implica sempre a manifestação de certas
preferências, implicando o homem nessa escolha.

1.1.1 Formas e tipos de Liberdade

A liberdade pode ser interior ou exterior. A liberdade interior compreende: a liberdade


psicológica – capacidade que o homem tem de fazer ou não uma determinada coisa. É a isenção
de impulsos internos sobre a sua vontade de agir de uma determinada forma; é a capacidade de
decidir por si mesmo; Liberdade moral – ausência de qualquer constransgimento de ordem
moral, como por exemplo, o medo de punições ou de infringir leis, ameças, etc. manifesta-se na
adesão voluntária, intencional e consciente a valores estabelecidos por si como meta a atingir ao
longo da vida.

A Liberdade exterior, por sua vez, compreende os seguintes tipos: Liberdade sociológica –
autonomia do sujeito face aos constrangimentos impostos pela sociedade; Liberdade física –
ausência de qualquer constrangimento físico. Por exemplo, um portador de deficiência física nos
membros superiores pode estar privado de praticar determinada modalidade desportiva;
Liberdade política – ausência de qualquer constrangimento de natureza política. Por exemplo,
um sujeito que não deve votar, por ser um prisioneiro, não tem liberdade política.

1.2. DA LIBERDADE HUMANA À RESPONSABILIDADE MORAL

O Homem pode escolher agir de acordo com as normas impostas pelas regras morais exteriores
(as leis jurídicas e as regras sociais e os padrões culturais do grupo ou cultura a que pertence) e
ainda, agir de acordo com as normas internas e os valores interiorizados que lhe são ditados pela
consciência. No entanto, só quando o Homem age segundo regras e valores da sua consciência,
perante outras possibilidades) é que este se torna um sujeito ético-moral e a sua acção é
considerada acção moral.
Assim sendo, na acção moral, a liberdade está ligada à responsabilidade, estas são duas
características da acção moral. Ou seja, se o indivíduo opta livremente por realizar uma acção
moral, isto é, de acordo com a sua consciência e perseguindo os fins que estão associados ao bem,
não pode deixar de ser e de se assumir responsável pela sua acção.

A responsabilidade moral pode definir-se como a característica em virtude da qual a pessoa deve
responder pelos seus sctos, reconhecendo-os como seus e assumindo as suas consequências ou
efeitos perante os outros e perante a si mesmo e a sua consciência.

1.2.1. Condições do agir moral

Imputabilidade – só é responsável por um determinado acto aquele a quem esse mesmo acto é
imputado, ou seja, aquele a quem é atribuída a sua autoria; Consciência – o sujeito age
conscientemente, com o conhecimento da causa, isto é, não ignora as circunstâncias em que a sua
acção se desenrola e, de certa forma, pode controlar as consequências imediatas do seu
comportamento. Por isso, quanto maior for o grau do seu conhecimento e de educação que o
sujeito moral (a pessoa) tiver, tanto maior será a responsabilidade. Se uma pessoa age por
ignorância inculpável ou por inadvertência ao bem e ao mal, a sua responsabilidade será atenuada
ou suprimida, visto que só é responsável pelo bem ou pelo mal que a própria pessoa reconhece
existir no acto e também pelas consequências que por si forma previstas. Intencionalidade – o
acto realizado é intencional, ou seja, deriva de uma decisão consciente, voluntária e livre do
sujeito, não sendo este forçado a agir de uma determinada forma por normas exteriores a si ou
impostas.

2. A JUSTIÇA E O DEVER
2.1. Noção de Justiça

Segundo Aristóteles a justiça é uma virtude ou qualidade que consiste na vontade firme e
constante de dar a cada um o que lhe é devido. A justiça, enquanto virtude, pressupoe a existencia
de uma pessoa que tem o direito a um objecto que lhe pertence e outra que tem o dever correlativo
de o respeitar.

2.1.1. Dimensões da Justiça

Segundo Carlos Dias Hernandes, a noção de justiça exprime uma tripla dimensão: Ético-moral
– referida ao homem justo como virtude pessoal, designa a imparcialidade e a capacidade de, nas
relações com os outros, antepor as exigências morais aos interesses subjectivos ou de conjugá-los
adequadamente; Ético-social – é a sociedade ou o sistema político justo, no qual existem relações
sociais institucionalizadas, ordenadas e coerentes, no interior das quais cada um recebe o que é
seu, isto é, o que lhe corresponde; refere-se aos deveres do Estado e da política para com os
cidadãos, ou seja, dar a cada um aquilo que tem direito; Jurídico-legal – é o sistema de leis
(Direito) que estabelecem de modo positivo o que é seu, o que corresponde a cada um nas diversas
circunstâncias adequadas a sua realização e cumprimento. A justiça é aplicada quando a lei é
cumprida.

2.2. Noção de dever

O dever é um princípio que está ligado a dimensão ético-pessoal da Pessoa e define o fim da acção
e a sua moralidade. O dever é uma realidade interna que leva a vontade de agir de determinada
maneira, sem violentar, mas que, no entanto se impõe como expressão de uma ordem que impera
absoluta e incondicionalmente que é cumprimento e respeito pela lei moral.

Na execução do dever, a liberdade é a condição essencial: a liberdade é condição importante do


dever, visto que dever fazer uma coisa ou seguir um princípio implica necessariamente a
possibilidade de não a fazer.

Assim sendo, o dever so se impõe ao Homem e não ao animal ou a uma coisa. Os animais e as
coisas estão submetidos ao determinismo. Pelo contrário, o Homem submete-se a um conjunto de
regras, normas ou leis que pode aceitar ou recusar, e é na aceitação ou na recusa que se manifesta
a liberdade.

2.2.1. Tendências de fundamentação do dever

Tendência teísta – defende que o verdadeiro fundamento do dever é Deus, criador e legislador
supremo da Natureza e do Homem;

Tendência positivista – defende o dever como algo resultante da expressão exercida pela
sociedade sobre os indivíduos que, com o tempo, se foi interiorizando e se transformou em
obrigação de consciência. Os positivistas negam a transcendência do dever, baseando-o na própria
razão humana ou na sociedade;

Tendência racionalista – defende como fundamento do dever a própria razão humana, autora de
todas as leis e, por isso, também das leis morais.

3. A PESSOA COMO SER DE RELAÇÕES

A pessoa é o ser humano nas suas relações com o mundo e consigo próprio. Por pessoa entende-
se o ser humano como fruto das relações e valores vividos por ele. As relações que estabele são
as seguintes: a relação com os outros (o outro individual, a família, o grupo de amigos, os colegas,
os vizinhos, os desconhecidos, etc.); as relações estabelecidas com o mundo que o rodeia, no
sentido da sua relação com as diversas instituições humana (a sociedade e a cultura em que vive,
o Estado que o rege e a sua política e sistema legal – Direito – as instituições religiosas, as
instituições comerciais e laborais, entre outras) e também ccom a Natureza circundante.
3.1. A relação consigo próprio

Falar da relação da pessoa consigo próprio, é pensar na forma como o indivíduo olha para si e se
vê enquanto pessoa, e nisto, a forma como julga as suas acções e finalidade de vida. Em suma, ao
olhar para dentro de si e analisar-se, o ser humano descobre-se pessoa, pois este só existe enquanto
ser social que estabelece relações com os outros e com o mundo natural e humano que o cerca.

Na sua relação consigo próprio, a consciência é a base do indivíduo moral. É a consciência que
tem a função de orientar, ordenar, avaliar e criticar todos os actos humanos, ou melhor, fazer com
que as acções de cada ser humano sejam acções morais e que as suas decisões tenham sempre
uma base ética. A consciéncia moral, sempre ligada à razao, é a sua capacidade que permite ao
ser humano conhecer-se a si próprio.

Pela sua capacidade racional e ética, a Pessoa na sua relação consigo mesmo é chamado a cultivar
bons e nobres sentimentos (amor, amizade, solidariedade, justiça, altruísmo); a respeitar-se como
homem ou mulher, reconhecendo a sua dignidade; a desenvolver bons hábitos em conformidade
com as normas morais vigentes na sua sociedade, evitando a ganância, a inveja, o rancor e o
ciúme.

3.2. A relação com o outro

A relação da Pessoa com o outro pode ser entendida em dois âmbitos opostos. Por um lado, o
outro pode ser visto como um tu-como-eu, pois ele é um eu, mas que não sou eu. O outro é sempre
definido em função do eu e o eu só se reconhece como tal e encontra plena complementaridade
face a um outro eu: eu sou eu na minha relação com o outro. Nele eu me reconheço e me projecto
com uma pessoa. É na pessoa do outro que se situa a minha dignidade. Por isso, o que diz respeito
ao eu deve reconhecer-se na pessoa do outro, no que se refere à dignidade e ao valor absoluto de
ser pessoa.

O outro como um tu-como-eu deve constituir objecto único e a minha razão de ser Pessoa. Ele é
valor absoluto. Por isso, na nossa relação, o outro merece e deve ser aceite tal como ele é (como
pessoa), colaborando com ele para o seu contínuo aperfeiçoamento humano, como um sujeito
diferente e com singularidade própria, interioridade profunda que se revela a seu modo e
infinitamente aberto.

Por outro lado, o outro pode ser visto sob contrato. Aqui, a relação com o outro é estabelecida
mediante um contrato que estabelece um conjunto de regras que vinculam uns aos outros,
estabelecendo acordos de vontades. Tais acordos estão fundados nas leis escritas ou em práticas
costumeiras e nelas boa-fé, isto é, a intenção primária de não enganar o outro no acordo e não se
deixar enganar. Estes contratos estão na base de nossa vivência social. São estabelecidos em todas
as sociedades onde existam o Estado, a política e o Direito. A justiça social é o resultado da
existência destes contratos. No contrato, os homens encaram-se reciprocamente como sujeitos
com interesses convergentes, paralelos ou até divergentes e com responsabilidade pelo bem
próprio, do outro e pelo mútuo benefício.

3.3. A relação com trabalho

O trabalho pode ser definido como toda a actividade, seja ela material ou espiritual com vista a
um resultado útil. Trata-se de uma actividade que visa a transformação de algo, mediante o uso
de instrumentos. Por isso, o trabalho humano é o resultado da intervenção, por um lado, de
condições internas (temperamento, caráter, intelecto e comportamento), inerentes ao próprio
sujeito; e por outro lado, encontramos as condições físicas, técnicas, econômicas e sociais, que
são de natureza externa ao sujeito que trabalha.

Para que uma actividade possa ser considerada trabalho, é necessário que seja:

• Uma acção transitória, em que é possível, através dela, chegar-se a um resultado concreto;
• Uma acção que requeira o uso do corpo para transmitir energia, distinguindo-se da
actividade meramente reflexiva;
• Uma acção que implique esforço e perseverança.

Assim, na sua relação com o trabalho, o Homem é chamado não apenas a transformar o mundo
em mundo para si, mas, fundamentalmente, a harmonizá-lo. Por outras palavras, o Homem na sua
qualidade de Pessoa, é chamado a tornar o mundo cada vez mais habitável, hospitaleiro e
confortável. Aqui, encontramos o valor cósmico do trabalho, mediante o trabalho, o Homem
rejeita viver num mundo organizado pelo natural e transforma-o, submetendo-o ao seu controlo e
humanizando-o. Pelo trabalho, o Homem dignifica-se, pois este possui, para si, um valor
personalista, ou seja, antropológico: a natureza humana não nasce perfeita. Ela aperfeiçoa-se,
tempera-se, enriquece-se através do trabalho.

3.4. A relação com a Natureza

Desde que o ser humano adoptou um modo de vida fundamentado na técnica e ciência, a sua
relação com a Natureza e consequentemente, com o ambiente tornou-se cada vez mais hostil.
Filósofos com Francis Bacon (1551-1626), Galileu (1564-1642), Descartes (1596-1650) e
Newton (1642-1727) viam a ciência e técnica como condições que possibilitavam a melhoria das
condições da vida e a eliminação da miséria humana. Por isso, nos seus ideais, estes filósofos
preconizavam um tecnicismo na relação do Homem com a Natureza e o conhecimento era
encarado como o meio de dominar, transformar e manipular a Natureza.

Nos séculos XVII, XVIII e, em especial no século XIX, com a revolução industrial, assistiu-se a
uma vontade de dominar e transformar o mundo cujo lema era “O Homem transforma a
Natureza”. Desta transformação resultou o aumento do crescimento econômico, uma produção e
um consumo cada vez mais acentuados, o crescimento da população mundial e das zonas
urbanizadas. Tudo isto constituía aos olhos dos observadores incautos um grande progresso da
técnica e da ciência. E como onde há benefícios, há também malefícios, o progresso técnico-
cientifico alterou radicalmente a relação do Homem com o seu habitat (o meio ambiente),
provocando a contaminação das águas, dos lençóis freáticos, dos solos. A poluição industrial
provocou a destruição da camada do ozono, rios transformados em esgotos. Regista-se também a
redução dos recursos naturais, a devastação das áreas florestais e a extinção de algumas espécies
animais.

Pensando nas gerações vindouras e cientes da gravidade da situação, vários filósofos,


organizações internacionais e movimentos ecologistas consideram que o problema do meio
ambiente ou, se quisermos, da Natureza, é um problema global, porque diz respeito a toda a
humanidade e sustentam a necessidade de se estabelecer um contrato, de carisma moral e político
com a Natureza. Este contrato consiste na exploração cuidada dos recursos que a Natureza possui
de forma a manter o equilíbrio natural e a pensar no futuro das gerações vindouras – o chamado
desenvolvimento sustentável.

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