Relatos Pratica Cajamar Junho2012

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 182

RELATOS DA PRÁTICA

1
DIRETORIA DE
EDUCAÇÃO DE
CAJAMAR
Proposta Curricular

D pr tic

Aprender&Aprender
Cajamar - SP
junho 2012

VERSÃO PRELIMINAR
Prefeitura do Município de Cajamar Disponível no portal da educação:
Daniel Fonseca http://cajamar.nucleoead.net/moodle
Prefeito Municipal http://www.cajamar.sp.gov.br
Lúcia Maria de Carvalho
Diretora de Educação Aprender & Aprender – Assessoria e
Osana Barbosa de Abreu Pinheiro Consultoria Educacional
Departamento Administrativo
Marcia Cristina de Oliveira
Cláudia Serrano Coordenação
José Carlos Teles dos Santos
Departamento Pedagógico Adriana Gonçalves de Almeida
Adriana Silva
Marcia Cristina de Oliveira Ana Lucia Graciani
Osana Barbosa de Abreu Pinheiro Kézia Cortez
Organização da Publicação Equipe Pedagógica
Ana Lúcia Del Vigna Missé M. das Mercês F. Sampaio
Andréa Duarte Assessoria Pedagógica e Revisão
Andréa Rodrigues Dalcin
Ivoneide Maria de Araújo Alves Paula Santos
Maria Claudinez da Silva Strublic Projeto Gráfico e Diagramação
Maristela de Souza Giusti Stella Regina Azevedo Alves dos Anjos
Rute Marcela Pereira da Silva Revisão
Telma Regina Belchior Prebianqui Meneguin Campos
Vivian Sotello de Siqueira
Supervisão de Ensino Diretoria de Educação de Cajamar
Andréa Ribas Bortoletto Relatos na prática / Diretoria de Educação de Cajamar;
Edna Maria de Souza
ilustração de Paula Santos. – Cajamar: Aprender & Aprender Assessoria
Elen Aparecida de Mesquita Xavier
Glaucia Rodrigues Inácio Peclat e Consultoria Educacional Ltda., 2012.
Lenenira Maria dos Santos 200 p.; il. – (Proposta Curricular da Rede Municipal de Educação do
Lilian Rolin Correa
Município de Cajamar; vol. 6)
Márcia Regina Ferreira
Maria de Lourdes de Moura Santos
Renata Fernandes Gomes Olaia ISBN 978-85-65842-00-6 (Coleção Completa: 6 volumes)
Vanessa Sotelo da Silva
ISBN 978-85-65842-06-8 (Volume 6)
Oficina Pedagógica
Juliana Gnewuch da Silva Vieira
Maria Eloiza Godinho Machado 1. Relatos. 2. Prática Pedagógica. 3. Currículo. 4. Proposta Curricular. I.
Maria Marta Ferreira Título II. Série. III. Santos, Paula (il.).
Psicopedagogas
Luiz Ricardo da Silva CDD: 371
Rodrigo Fogaça Shimizu
D635d
Assessoria de Comunicação e Fotografia

Assessores Externos
Marcelo Papaterra Escolas da Rede Municipal de Educação
Sonia Carbonell
EMEB Aline Cristina Santos de Paula
Arte
EMEB Antonio Pinto de Campos
Elizabeth Barolli EMEB Arnaldo Correia da Silveira
Ciências EMEB Bairro do Gato Preto
EMEB Demétrio Rodrigues Pontes
Isabel Porto Filgueiras
EMEB Dirce Eufrásio Brasil
Educação Física
EMEB Emellyne de Azevedo Aguiar
Ana Lúcia Graciani EMEB Emerson Cruz Machado
Marcia Cristina de Oliveira EMEB Ester Catarine Lozano
Educação de Jovens e Adultos EMEB Eva Rosa de Oliveira Santos
EMEB Jailson Silveira Leite
Gilberto Costa Pamplona
EMEB Jardim São Luiz
Geografia
EMEB Josué Moreira Sena
Roberto Catelli Junior EMEB Marcus Vinicius da Silva Batista
História EMEB Maria Gonçalves de Freitas Gonçalves
EMEB Parque Paraíso
Airton Pretini Junior
EMEB Profª Elaine Margarete Meneguim Silva
Fernanda Coelho Liberali
EMEB Profª Franceli de Fátima Missé Nascimento
Rosemary Schettini
EMEB Profª Lucy Aparecida Bertoncini
Língua Inglesa
EMEB Profª Maria de Lourdes Mattar
Alfredina Nery EMEB Profª Veneranda de Freitas Pinto
Língua Portuguesa EMEB Profª Vera Almeida Santos
EMEB Profª Rosa Helena Motta Marcondes Sousa
Silvia Longato
EMEB Profª Maria Elce Martins Bertelle
Matemática
EMEB Profº Antonio Carlos de Carvalho
Luciana Cury EMEB Profº Marcelo Antonio Ricomini Pascoal
Maria Ester Lopes Moreira EMEB Profº Odir Garcia Araújo
Educação Inclusiva EMEB República do Panamá
EMEB São Benedito
Suely Amaral
EMEB Thays Almeida Alves
Gestão
EMEB Vinícius Couto da Silva
Neide Noffs
Psicopedagogia
AGRADECIMENTOS
À toda comunidade escolar incluindo professores, ges-
tores, pais, educandos, funcionários e representantes
da comunidade assim como à toda equipe técnica
da Diretoria de Educação e assessores externos que
participaram com seus saberes e experiências para a
construção desta proposta curricular.
CURRÍCULO E PARTICIPAÇÃO
Exercendo a Democracia na Educação de Cajamar

É com orgulho que entregamos o resultado do processo de


reorientação curricular da rede de escolas municipais de Cajamar,
iniciado no segundo semestre de 2010. De forma democrática, com
ampla consulta às escolas e a toda comunidade escolar, a Prefeitura
de Cajamar, por meio da Diretoria de Educação, entrega os cadernos
curriculares que abordam os princípios, concepções e saberes que orientarão as
práticas de sala de aula e da escola como um todo nos diferentes níveis e modalidades
oferecidas pelo município: Educação Infantil, Ensino Fundamental, Educação de
Jovens e Adultos, além das Diretrizes e dos Relatos da Prática.

A participação e o caráter democrático foram os destaques desse processo que


contou com o envolvimento direto de professores, diretores escolares, assistentes de
direção, assessores pedagógicos, supervisores, assistentes pedagógicas, psicopedagogas,
funcionários de apoio e assessores externos, além dos educandos e da comunidade escolar
indiretamente envolvida nas discussões que deram origem a este material.

Os cadernos finalizados foram concebidos para subsidiar a prática e a reflexão


dos profissionais da educação que atuam diariamente na formação de crianças
e adolescentes matriculados na rede municipal. Eles manifestam a identidade
do professor que trabalha nas escolas de Cajamar e fazem parte do processo de
valorização desse profissional, dos seus saberes e habilidades.

Utilizem esta proposta curricular para ampliar as aprendizagens dos estudantes


que passam diariamente pelas escolas da cidade. Concretizem as ideias e concepções
aqui apresentadas, no dia a dia da sala de aula, para, juntos, construirmos uma
educação de mais qualidade, que valorize os saberes dos educandos e que dialogue
sempre que possível com a comunidade.

Com a entrega deste material, e mais do que isso, com a participação de todos os
que se envolveram para sistematizar os conhecimentos aqui apresentados, estamos
dando mais um passo na consolidação de uma educação de melhor qualidade para
nossas crianças, adolescentes, jovens e adultos. Ainda são poucos os municípios
do porte de Cajamar que se lançaram ao desafio de construir sua própria proposta
curricular e conseguiram sistematizar as diversas práticas vivenciadas pelos
profissionais da Educação. Esperamos que esse material sirva de referência para
outros municípios, buscando cada vez mais consolidar a nossa identidade enquanto
rede municipal. Parabenizo cada um de vocês por esta publicação!

Daniel Fonseca
Prefeito de Cajamar
IDENTIDADE E CURRÍCULO
Autores do Nosso Próprio Currículo

Explicitar nossos princípios e concepções pedagógicas de forma sistematizada,


não como uma cartilha com sequências didáticas prontas para serem reprodu-
zidas, mas como uma referência pedagógica de nossa identidade enquanto edu-
cadores é o espírito deste material entregue para a rede de escolas municipais.

Os cadernos finalizados, Diretrizes, Educação Infantil, Ensino Fundamen-


tal, Educação de Jovens e Adultos e Relatos da Prática, são fruto de um trabalho
articulado entre a nossa política de formação continuada, da gestão democrá-
tica que norteia nossas práticas e da busca constante pela melhoria das condi-
ções de trabalho dos profissionais da Educação.

Não por acaso, boa parte dos encontros realizados durante o Horário de
Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC) no decorrer de 2010 e 2011 estiveram vol-
tados para a discussão e registro das contribuições de todos os professores da
rede municipal sobre o processo de reorientação curricular. Os materiais fina-
lizados buscam dar voz a todos os profissionais que participaram direta e indi-
retamente desse importante momento de sistematização dos nossos saberes.

Acreditamos que os conteúdos de cada um dos cadernos podem orientar


as escolhas e as práticas a serem desenvolvidas nas escolas e nas salas de aula.
Com base neste material, a rede deve dar continuidade a sua trajetória de con-
quistas e aprimoramento, buscando ampliar a sua autonomia e a sua capacida-
de de produzir seu próprio conhecimento.

A palavra está lançada, confiamos agora na atuação de cada educador


para que os princípios e concepções aqui apresentados se manifestem de for-
ma a contribuir para que escola e comunidade se percebam sujeitos transfor-
madores de sua própria realidade e possam contribuir de forma efetiva para a
construção de uma sociedade mais justa e solidária.

Lúcia Maria de Carvalho


Diretora de Educação
O senhor… mire, veja: o mais
importante e bonito, do mun-
do, é isto: que as pessoas não
estão sempre iguais, ainda não
foram terminadas - mas que
elas vão sempre mudando.

(GUIMARÃES ROSA)
pr s nt ç o
Contar é muito, muito dificultoso. Não pelos anos que se
já passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas pas-
sadas – de fazer balancê, de se remexerem dos lugares.
(GUIMARÃES ROSA. Grande Sertão: Veredas. 1986)

Quem pretende se aproximar do próprio passado...deve


agir como um homem que escava. Antes de tudo, não deve
temer voltar sempre ao mesmo fato, espalhá-lo como se
espalha a terra, revolvê-lo como se revolve o solo.
(WALTER BENJAMIN, Escavando e recordando. 1987)

Quando iniciamos o trabalho de Reorientação Curricu-


lar na cidade de Cajamar, tivemos a oportunidade de co-
nhecer de perto os espaços escolares, o trabalho realizado
pelos seus profissionais, os educandos e a comunidade.
Em nossos momentos de diálogo, nas formações, nos
acompanhamentos realizados nas escolas, ou ainda nos
momentos mais informais dos lanches e café, as equipes
de supervisores, gestores e professores nos contavam, às
vezes com entusiasmo, outras com angústia, sobre os tra-
balhos que desenvolviam no dia a dia.

Nesses relatos, que eram oralizados com detalhes e


singularidades, percebíamos o desenrolar de muitas ati-
vidades, de situações de aprendizagens, de experiências,
de erros e de acertos, que se davam nos processos educa-
tivos. Ao mesmo tempo, também percebíamos que o “ci-
clo” da aprendizagem, em muitas das práticas relatadas,
não se “fechava”, pois era naquele momento, de contar o
acontecido, que muitas das vezes os profissionais se da-
vam conta, admirados, dos conceitos e teorias aborda-
dos nos encontros de formação continuada. Percebiam,
ao contrário do alardeado pelo senso comum, que teoria
e prática andam juntas, e que incoerentes são os discur-
sos; estes sim, muitas vezes idealizados e distantes das
práticas e da vida real das escolas.

11
Diante dessas surpresas, lançamos ao grupo o desafio de es-
crever sobre suas experiências; foi solicitado que se escolhesse
uma experiência julgada como interessante, exitosa, inovadora.
Experiência que dialogasse com nossos estudos e intenções de
consolidar uma escola pública diferenciada, de qualidade, pau-
tada nos princípios da participação e da inclusão. O desafio foi
lançado ao grupo e aceito por quase todos.

Desde então, passamos a viver uma experiência tensa: esco-


lher, memorizar, escrever, ler, reler, reescrever e publicizar aquilo
que, talvez, estivesse destinado a ficar entre as quatro paredes de
cada sala de aula, ou de cada escola, ou pior, a ficar somente nas
lembranças desses profissionais.

Hoje tal processo encerra um ciclo. Juntamente com a Pro-


posta Curricular, os profissionais que atuam nas escolas munici-
pais da rede de Cajamar entregam o Caderno de Relatos da Prá-
tica. Socializam suas experiências e suas vivências, trazendo até
nós a oportunidade de nos emocionarmos, de refletirmos, de nos
indagarmos, de aprendermos sobre a educação que está sendo
vivida em Cajamar, explicitando parte daquilo que pode melho-
rar ou o que já se garante como uma educação de qualidade.

Agradecemos a coragem e generosidade desse grupo de


profissionais que se permitiu “voltar sempre ao mesmo fato, es-
palhá-lo como se espalha a terra” a fim de compreender o pro-
cesso vivido, analisá-lo, referendando-o teoricamente, e compar-
tilhá-lo com a Rede com a esperança fraterna de que esses relatos
da prática germinem entre as escolas e professores e deem bons
frutos. Comecemos este novo ciclo!

Aprender&Aprender

12 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

sum ´rio
1- O RECREIO DIRIGIDO “POR TODOS” 17
(EMEB Arnaldo Correia da Silveira)

2- LEITURA COM AUTONOMIA 20


(EMEB Profª Rosa Helena Motta Marcondes Sousa)

3- ESCOLA PARA CASA 23


(EMEB Dirce Eufrásio Brasil)

4- ROLAMENTO E CAMBALHOTA: MOVIMENTOS


QUE DERAM CERTO 27
(EMEB Profª Elaine Margarete Meneguim Silva)

5- REORGANIZANDO O TRABALHO
PEDAGÓGICO DAS CRIANÇAS PEQUENAS 32
(EMEB Emellyne de Azevedo Aguiar)

6- POR QUE BRINCAR? 39


(EMEB Emerson Cruz Machado)

7- CLASSIFICANDO BLOCOS LÓGICOS 47


(EMEB Emerson Cruz Machado)

8- MARCANDO A ROTINA NO CALENDÁRIO 49


(EMEB Emerson Cruz Machado)

9- VITRINE DE LIVROS 51
(EMEB Emerson Cruz Machado)

10- CONSCIENTIZAÇÃO DA IMPORTÂNCIA


DA PRESERVAÇÃO DA NATUREZA E DE UMA
ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL 54
(EMEB Profª Franceli de Fátima Missé Nascimento)

13
11-C ONSTRUINDO O LIVRO A PARTIR DO CONTO
“BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES” 56
(EMEB Profª Franceli de Fátima Missé Nascimento)

12- FAMÍLIA NA ESCOLA: ANGÚSTIA OU PRAZER? 59


(EMEB Bairro do Gato Preto)

13- INTERAÇÃO SOCIAL ENTRE AS CRIANÇAS E O


TRABALHO PEDAGÓGICO 66
(EMEB Profº Marcelo Antonio Ricomini Pascoal)

14- INTERAÇÃO E PARTICIPAÇÃO: SINÔNIMO DE


SUCESSO 68
(EMEB Profª Maria Elce Martins Bertelle)

15- O PROJETO “EXPRESSÃO CORPORAL” E SUA


DINÂMICA DE TRABALHO 70
(EMEB Maria Gonçalves de Freitas Gonçalves)

16- A HORA E A VEZ DA EDIÇÃO 72


(EMEB Profª Maria de Lourdes Mattar)

17- FLAUTA DOCE NA SALA DE AULA 78


(EMEB Profª Maria de Lourdes Mattar)

18- ESCOLA: ESPAÇO DE SENTIDOS E POSSIBILIDADES 84


(EMEB Profº Odir Garcia Araújo)

19- SARAU NA ESCOLA 89


(EMEB República do Panamá)

20- DESCOBRINDO E RECONSTRUINDO A HISTÓRIA


ATRAVÉS DA LITERATURA 95
(EMEB República do Panamá)

21- ARTE, ESPAÇO E A CRIANÇA 103


(EMEB Parque Paraíso)

14 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

22- LEITURA NOS DIFERENTES ÂMBITOS


DA ESCOLA 106
(EMEB Profª Vera Almeida Santos)

23- O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: AÇÕES


QUE FIZERAM A DIFERENÇA 111
(EMEB Profª Veneranda de Freitas Pinto)

24- O BRASIL NO PLANETA TERRA 116


(EMEB Eva Rosa de Oliveira Santos)

25- O POTE VAZIO E A CADEIRA DO DENTISTA 121


(EMEB Eva Rosa de Oliveira Santos)

26- PROJETO “ENTRE NA RODA” 124


(Maria de Lourdes de Moura Santos (Assistente Pedagógica de
Alfabetização)

27- ESTUDO, REFLEXÃO, AÇÃO: INGREDIENTES


IMPRESCINDÍVEIS PARA UMA BOA FORMAÇÃO
PROFISSIONAL 129
(EMEB Vinícius Couto da Silva)

28- O PROJETO “MOVIMENTO, ROLAMENTOS


E CAMBALHOTAS” 133
(EMEB Aline Cristina Santos de Paula)

29- COM ASAS AO AMANHECER 135


(EMEB Profº Antonio Carlos de Carvalho)

30- QUANDO ENSINO, APRENDO E QUANDO


APRENDO, ENSINO 139
(EMEB Thays Almeida Alves)

31- PROJETO “LEITURA” 143


(EMEB Profª Lucy Apparecida Bertoncini)

15
32- FAMÍLIA E ESCOLA FORMAM UMA EQUIPE
NO PROCESSO PEDAGÓGICO 147
(EMEB São Benedito)

33- EXPERIMENTANDO COM OS MATERIAIS


NÃO ESTRUTURADOS 151
(EMEB Marcus Vinicius da Silva Batista)

34- FAZ DE CONTA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 154


(EMEB Ester Catarine Lozano)

35- LER TEM UM POR QUÊ 158


(EMEB Ester Catarine Lozano)

36- BRINCAR É PRECISO! 163


(EMEB Ester Catarine Lozano)

37- OLHANDO, SENTINDO E CONVERSANDO


COM OS ESPAÇOS DA ESCOLA 167
(EMEB Ester Catarine Lozano)

16 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

1
O recreio dirigido
“por todos”1
Convivência harmoniosa, respeito, tolerância, participação, integração são palavras que
estão no dia a dia da escola, porém algumas ações presentes não estimulam ou demons-
tram tais atitudes. Nesse sentido, ações planejadas e retomadas são primordiais para o
cardápio escolar. Dentro deste cardápio destaco o recreio.

Percebi que seria fundamental direcionar as atividades neste momento tão impor-
tante, que possibilita a alimentação, mas que também pode ser muito rico. O que fazer
então para enriquecermos nosso recreio, evitarmos correrias e gasto de energia (que são
normais para a criança) com lutas, brigas e trombadas? Como transformar este ambiente
e ensinar as crianças através da vivência, estabelecendo regras de convivência harmonio-
sa, ouvindo das próprias crianças as regras que deveríamos colocar para facilitar nosso
dia a dia e não como imposição a ser seguida de punição?

Desta forma marquei uma reunião com as duas monitoras para que conversásse-
mos sobre algumas ações que poderiam direcionar e melhorar o intervalo. Sugeri que
pensássemos juntas o “como” fazer para que aquela situação se modificasse, até porque
sempre foi visível a dedicação e preocupação que as monitoras tinham com as crianças.
Então se fazia necessária uma intervenção e um trabalho em equipe.

As monitoras montaram uma rotina de atividades diversificadas e me apresenta-


ram este registro, que também serviria para garantir uma organização das atividades,
mas principalmente seria um registro das atividades mais “legais” e que agradavam
mais aos alunos. Realizaram assembleias junto aos alunos para que todos montassem
um “quadro de combinados”, que ficaria em local de fácil acesso e que deveria ser cum-
prido, afinal havia uma parcela grande de responsabilidade, já que, uma vez criado um
documento coletivo, “todos são responsáveis pelo seu sucesso”. Enviamos aos pais
nossa intenção para o horário do recreio, falando do Projeto Recreio. Dirigido, e os pais
sugeriram algumas brincadeiras e demonstraram total apoio à iniciativa do grupo de me-
lhorar o intervalo.

1. Texto elaborado por Marília Gabriela Rodrigues (Gestora) , com a colaboração do assessor pedagógico e das
monitoras educacionais da EMEB Arnaldo Correa da Silveira.

17
Professores, funcionários, gestores, enfim, todos se engajaram para a obten-
ção do sucesso desta inicativa, pois todos, sem exceção, percebiam a real necessida-
de de ações para acabar com a literal “bagunça” na hora do lanche.

Incentivar os alunos a aproveitarem de forma sadia o tempo do intervalo, com


o acompanhamento dos monitores; a utilizarem adequadamente (sem correrias
ou atropelo) os espaços educacionais da escola; proporcionar aos alunos um mo-
mento de diversão, alegria e interação, mantendo a ordem, de acordo com regras
combinadas para as atividades; estimular a coletividade, autonomia e habilidades
de cada aluno, utilizando os materiais disponíveis na escola eram os nossos ob-
jetivos. Eles estavam claros para todos e então passamos a contar com atividades
diversificadas que tornaram-se momentos de alegria e prazer dentro da escola. As
monitoras anunciavam em um quadro as atividades daquele dia e após o lanche as
crianças se organizavam já esperando as regras e o início das brincadeiras.

Como foi visível o êxito e como havia empolgação nos alunos foi sugerido
pelas monitoras uma parceria com o professor de Educação Física. Um torneio de
damas, o 1º Torneio de Damas da EMEB Arnaldo para alunos do 2º ao 5º ano, nos
meses de outubro e novembro. As crianças gostam muito de jogar e tal atividade
lúdica traz inúmeros benefícios para a aprendizagem, além do fato de que regras do
jogo prezam a concentração, um ambiente silencioso, de fala adequada, de respeito
aos turnos da fala (um fala, o outro ouve e vice versa), trabalho em dupla e, claro, a
participação de todos.

As monitoras criaram uma ficha de inscrição, através da qual os interessados


puderam inscrever-se no campeonato. O professor fez uma tabela grande que ficava
visível para acompanhamento de todos dos jogos, os treinos eram disponibilizados
no horário do recreio e os jogos foram organizados de modo a serem realizados às
quintas-feiras nas aulas de Educação Física. Disponibilizei para a escola tabuleiros
no canto dos jogos e peças, as monitoras ajudavam com as regras e, logo, no inter-
valo o que se notava era “um grande torneio que estava por vir”.O fechamento do
trabalho estava previsto para um sábado letivo (em novembro), pois no sábado po-
deríamos contar com a participação da comunidade na escola. Nosso combinado
foi ordenar os vencedores (1º, 2º e 3º lugares), porém foi distribuída uma premia-
ção simbólica a todos os participantes como forma de incentivo e agradecimento à
participação e compromisso das crianças. Conseguimos finalizar os jogos, premiar
os vencedores e convidar para a participação nas próximas atividades planejadas.

Percebemos enormes avanços desde que houve a implementação das ativida-


des dirigidas. Elas foram de extrema importância dentro da escola, e com certeza
fora dela, pois as aprendizagens são conceituais, mas muito mais atitudinais (que

18 - RELATOS DA PRÁTICA
eram nosso grande foco), já que o problema naquele momento centrava-se nas
atitudes, nas relações interpessoais, no respeito às diferenças, tolerância e partici-
pação. Iniciamos um processo que foi longo, mas que rapidamente nos trouxe re-
sultados. Para o ano letivo de 2012 estamos com as duas monitoras em licença ges-
tante (retornarão no 2º semestre), o que dificulta a continuidade das ações, já que
as monitoras foram peças chave para o “como” e “o que” fazer, porém continuamos
com nossas ações e planejamos algumas atividades de jogos para o 2º semestre.

Priorizamos a autonomia como habilidade fundamental dos alunos da escola


e claramente percebemos que houve e há avanços significativos quando ações são
planejadas com o coletivo, quando todos participam, quando todos são correspon-
sáveis pela permanência ou não do projeto, quando todos se sentem pertencentes
ao grupo, quando todos os sujeitos educacionais estão intrinsecamente ligados às
ações planejadas e ao seu desenvolvimento e ainda quando todos participam dos
ganhos e avanços somados e refletem sobre quais ações retomar para melhorar.

Avaliar é caminhar com um Currículo Escolar voltado à significação e res-


significação de conteúdos, sejam eles conceituais, procedimentais ou, e principal-
mente, atitudinais, já que para que ocorra o desenvolvimento pleno dos sujeitos,
o aluno deve estar aberto a receber diariamente experiências humanizadoras, mas
necessariamente ter sensibilidade para entendê-las, percebê-las e internalizá-las.
Internalizá-las neste contexto e, sobretudo, diante da concepção de visão de reali-
dade a partir da sensibilidade, buscando a entrada no campo da afetividade como
meio de aprendizagem em seu contexto enquanto sujeito do mundo.

19
2
Leitura com autonomia2

Para mim a leitura sempre foi algo muito importante. Lembro-me de que foi mi-
nha mãe quem me fez tomar gosto pela leitura, antes mesmo de eu aprender a ler,
pois ela contava muitas histórias e dizia que as conhecia através dos livros que lera
quando criança. Foi graças à importância que minha mãe sempre deu aos livros e
suas histórias que cresci acreditando que quem lê aprende muito mais e por isso
sempre incentivei meus alunos a lerem.

O projeto Estudar Prá Valer amplia o repertório dos alunos quanto aos gêne-
ros e portadores, porque a leitura, propriamente dita, fica muito a cargo dos pro-
fessores e eu queria que meus alunos se tornassem mais autônomos para a escolha
do que ler, quando ler e por que ler.

Percebi que, além do clube de leitura trabalhado em sala de aula, isso deveria
se estender para fora dos muros da escola. Foi então que decidi realizar um trabalho
específico com leitura. Para mim ele nem tinha ainda as características ou ideais de
um projeto, eu queria apenas que os alunos conhecessem e se interessassem por
outras leituras para além dos livros infantis com os quais sempre tiveram contato.

Separei então algumas caixas e passei a selecionar os materiais. Eram revistas


e livros dos mais diversos assuntos: culinária, fábulas, curiosidades, contos, quadri-
nhos, poesias etc.

Apresentei o material aos alunos e disse-lhes que aquele seria nosso “canto de
leitura”. Percebi um grande entusiasmo da turma. Após manipularem os exemplares,
perguntei-lhes se haviam percebido a maneira como estavam organizadas as publica-
ções e eles se interessaram em saber o porquê. Expliquei que cada tipo de texto serve
para alguma coisa. A revista de culinária, por exemplo, serve para prepararmos um
prato diferente, a de curiosidades para aprendermos sobre coisas que não conhece-
mos. Um aluno comentou que as poesia são lidas quando se está apaixonado e todos
acharam graça. Aproveitei este momento para mostrar-lhes que isso não era uma
verdade absoluta: disse-lhes que há poesias sobre amor, sim, mas que há também
poesias sobre bichos, coisas, acontecimentos diversos e não apenas sobre o amor
entre as pessoas. Uma poesia pode ser sobre raiva, amizade etc.
2. Autoria? EMEB Profª Rosa Helena Motta Marcondes Sousa

20 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Nossa conversa seguiu informalmente sobre cada gênero e eu ia mostrando


a eles que cada leitura tem um propósito diferente e que precisamos saber o que
queremos encontrar em um texto. Disse-lhes também que toda leitura traz um co-
nhecimento novo!

Nos dias que se seguiram percebi que o interesse pelo cantinho da leitura só
aumentava, os alunos começaram a me questionar sobre a “grossura” dos livros,
dizendo que não dava tempo de ler tudo na sala, foi quando sugeri que levassem as
publicações para casa e todos adoraram a ideia.

Fiz então uma ficha de empréstimo para cada criança, onde registrávamos a
data de retirada, o título e a data de entrega dos livros e revistas.

Confesso que fiquei um pouco preocupada no início, pois além dos livros da
escola, havia muitos livros e revistas que eram meus e eu não queria que fossem
perdidos ou danificados. Essa preocupação logo passou, os alunos demonstraram
uma grande responsabilidade em manter todos os exemplares muito bem cuida-
dos e organizados. Os alunos me surpreenderam! Eles levavam os livros e revistas
para casa com frequência e se empolgavam ao perceber que a ficha de empréstimos
estava ficando “cheia” e teria de ser trocada. Alguns até comentavam: “Nossa, eu já
li tudo isso?!” e comparavam suas fichas para ver quem já havia levado mais livros
para casa.

Fiquei muito feliz ao perceber o resultado de todo esse trabalho nas produ-
ções escritas dos alunos - que melhoraram bastante. Notei que eles ficaram mais
participativos e críticos nas discussões sobre os assuntos estudados em sala de aula.

Uma das coisas que mais me agradou foi quando os alunos começaram a tra-
zer livros, revistas e gibis de suas casas, participando ativamente do nosso “canto
da leitura”. Percebi então, o quanto estavam realmente envolvidos com aquele es-
paço, com as aprendizagens conquistadas.

É claro que nem todos se envolveram com a mesma intensidade. Alguns se


dedicaram mais, outros menos, mas creio que meu objetivo foi alcançado: fazer
com que meus alunos lessem com autonomia.

Tenho certeza de que muitos deles se tornarão adultos leitores, afinal, os li-
vros e as histórias têm esse poder de “prender”, de nos fazer “querer mais”.

O último capítulo de um livro é sempre o início de um novo conhecimento.

21
22 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

3
A escola para casa3

É muito bom e construtivo participar de um projeto como este. Momentos como esse fica-
rão para sempre gravados na memória de nossas crianças. O momento de leitura em família
traz para a criança o prazer de estar perto de pessoas tão queridas (que a vida, o trabalho
acabam distanciando), instiga sua imaginação e a faz ir para lugares que não podemos ir na
vida real. No momento da leitura percebo que a Fernanda viaja em sua imaginação: é bom
olhar para ela e saber que podemos ir para muitos lugares, sem ao menos sair da casa.
(MÃE DE EDUCANDA – FASE III – B , 2011)

A EMEB Dirce Eufrásio Brasil, em conformidade com as Diretrizes Curriculares


Nacionais para Educação Infantil, que preconiza, no seu inciso III, “(...) possibili-
tem às crianças experiências de narrativas, de apreciação e interação com a linguagem
oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos”, con-
sidera a leitura como uma vertente importantíssima que deve estar presente no dia
a dia da criança. De acordo com o RCN4,

(...) a leitura de histórias é um momento em que a criança pode conhecer a forma de viver, pen-
sar, agir e o universo de valores, costumes e comportamentos de outras culturas situadas em
outros tempos em lugares que não o seu. A partir daí ela pode estabelecer relações com sua
forma de pensar e o modo de ser do grupo social a qual pertence...”.

Baseada nessas afirmações, a equipe desta escola proporciona vários momen-


tos de leitura para os alunos. As crianças da EMEB Dirce Eufrásio, na faixa etária
de 01 a 03 anos, estão em pleno processo de desenvolvimento, gostam de brin-
car, explorar objetos e ambientes, dançar, ouvir história, apreciam muito o contato
com os livros e se encantam a cada dramatização. Cantinhos da leitura com gibis,
revistas e livros, rodas de histórias, baú de histórias, são momentos em que fica
claro o encantamento do aluno com a leitura.

Na reunião de pais em 2010, percebemos que havia um pequeno grupo que já vi-
venciava momentos de leituras com os filhos e traziam depoimentos orais significativos
sobre esta ação. No entanto a maioria não apresentava hábitos de leitura. Alguns pais
chegavam a ser céticos quanto à possibilidade de crianças “tão pequenas” lerem.

3. Elaborado por Zilma Prota (Gestora) e Roberta Santos (Assessora Pedagógica).


4.Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF. CONHECIMENTO DO MUNDO. 1998. V
3. Pag 143.
23
Muitas eram as dúvidas dos pais: “nossa, será que ela vai prestar atenção? Que-
ria ser uma formiguinha pra ver minha filha ouvindo história, porque em casa ela não
pára”. Com questões assim, estava clara a necessidade dos pais participarem desses mo-
mentos com os filhos, certificando-se de que é possível ler, “mesmo sem saber ler”.

Desta forma, em 2010, algumas professoras elaboraram o Projeto Biblioteca Vo-


lante: cada criança, duas vezes por semana, levava um livro para ser compartilhado com
a família. Vale ressaltar que o livro escolhido fazia parte do repertório de histórias já lidas
na escola. Os alunos voltavam comentando sobre o livro, bem como sobre as situações
vivenciadas de interação com a família. Os pais, por sua vez, nas reuniões e nos horários
de entrada e saída dos alunos, relataram estar convencidos de que poderiam, sim, ler
para os seus filhos e sobre o quanto era prazeroso esse momento.

Baseados nessa experiência fundamentada em estudos proporcionados Di-


retoria da Educação de Cajamar, pelos H.T.P.Cs da própria unidade escolar, e no
acompanhamento da supervisora, que focou o nosso olhar para a beleza desta pro-
posta e para a possibilidade de ampliar e formar a comunidade leitora, decidimos,
coletivamente, ampliar o Projeto.

Apesar da decisão favorável, veio à tona certo receio, por parte de alguns profes-
sores, quanto à possibilidade de extravio de alguns livros. Contudo, era um risco pelo
qual valeria a pena passar e assim o fizemos. A gestão tranquilizou o grupo neste mo-
mento, no que se refere à manutenção do acervo, levando à reflexão sobre o direito
do aluno em ter acesso a livros de boa qualidade, contribuindo assim para sua forma-
ção: “(...) a melhor forma de desestabilizar algumas crenças dos professores era convencê-
-los a realizar a ação, dar algum sentido a ela e, na sequência, refletir sobre a experiência”.5

Por conseguinte, em 2011 deu-se início ao Projeto Institucional Leitura em


Família, abrangendo todos os alunos desta escola e as suas famílias com o objetivo
de ampliar os momentos de leitura dos pequenos e proporcionar aos pais condi-
ções de fazê-los através do empréstimo de livros. É como se um pouco da escola
fosse levado para a casa de cada um!

O projeto pressupõe o empréstimo semanal de livros de boa qualidade do


acervo da escola, levados para casa pelas crianças e escolhidos por elas. Alguns são
pré-selecionados pelas professoras, especialmente aqueles de maior interesse das
crianças ou os lidos durante a semana, no caso das crianças da Fase I. Já nas Fases II
e III, as professoras em roda de conversa anunciam, de acordo com a tabela, quem
levará a maleta e orientam as crianças a escolherem seus livros. A oportunidade de
escolha favorece o desenvolvimento da autonomia de modo prazeroso e assim as
5. Revista Avisa lá., Nº49. Fevereiro 2012. Pág.06.

24 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

crianças vão desenvolvendo gradativamente suas preferências.

Além do livro, esta maleta contém um caderno de registro, onde os pais po-
dem relatar como foi o momento da leitura em casa, através da escrita, de desenhos,
fotografias e outros. Algumas histórias são relidas na escola no momento da roda e,
na sequência, a professora lê também o registro dos familiares para socializar com
as demais crianças. É um momento riquíssimo, pois oferece à criança a oportuni-
dade de expressar a experiência leitora em família. Neste momento a criança se
sente valorizada, orgulhosa pelo compartilhamento dos momentos que vivenciou
em sua casa. É como se um pouco da casa de cada um viesse para a escola!

Entender as necessidades de um filho é muito importante para conseguir participar


melhor do desenvolvimento dele. Ler na companhia do filho é estimulante e ensina
o pai e a mãe a observarem melhor a criança e foi tudo isso que aconteceu nessa ex-
periência tão maravilhosa. Alguns minutos de silêncio na sala de estar, uma família
reunida trocando experiências e carinhos, uma história pequena, porém interessan-
te, lida e relida várias vezes e uma criança cada vez mais interessada, animada e en-
tusiasmada, com um rato que esconde ‘molanguino’. ‘Mãe cadê o urso? Ele sumiu?
Pai, esconde o molanguino!’. Acredito que não há a necessidade de muitas fórmu-
las para conhecer um filho e fazer dele alguém com quem você vá contar pela vida
toda, basta a aproximação, o olhar e a troca de amor e foi isso que essa experiência
proporcionou a mim e minha família. Obrigada!
(MÃE DE EDUCANDO MATRICULADO NA FASE II A – 2011)

De acordo com os relatos apresentados nos registros e em conversas infor-


mais com os pais, percebemos o quanto o projeto foi significativo, mudando al-
gumas concepções, como foi o caso de uma mãe “que não gostava de ler para o fi-
lho”. Ela justificava que não “tinha tempo, pois tinha muitos afazeres domésticos”.
Conversamos com ela sobre a importância do incentivo à leitura e como o filho
dela se encantava ao ouvir histórias e folhear livros. Orientamos que reservasse
a hora de dormir do filho para esse momento, para que assim não atrapalhasse
seus compromissos, ela se propôs a tentar e acabou dando certo, nos agradeceu
por mais um momento agradável que proporcionamos a ela e seu filho.

Muitos depoimentos registrados nos cadernos foram socializados na reu-


nião de pais e no fechamento dos projetos, proporcionando troca de experiên-
cias entre famílias. Também possibilitaram aos professores um conhecimento
mais específico de como a família trata a leitura e de como intervir nessas dinâ-
micas. Em nenhum momento a escola quer atribuir aos pais a responsabilidade
da formação do aluno leitor, mas sim ampliar parcerias, espaços e possibilidades,
compartilhando aquilo que se tem de prazeroso e significativo na escola. Perce-
bemos que é necessário iniciar o projeto já nos primeiros meses do ano e não

25
apenas no segundo semestre como fizemos anteriormente e também pensamos
que, apesar das ações serem positivas, devemos refletir sobre alguns pontos para
melhoria do projeto, como, por exemplo, em envolver mais os pais e as crianças
em outras etapas e não somente na execução do mesmo.

Sabemos que esta ação configura-se apenas como um pequeno passo para a
formação de uma comunidade leitora. Intencionamos desdobrar o projeto consti-
tuindo um acervo específico para os pais, pois se eles puderam constatar que seus
bebês se encantaram com a leitura, que leem “mesmo sem saber ler”, que têm livros
preferidos, por que eles também não podem usufruir dessas experiências?

26 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

4
Rolamento e Cambalhota:
movimentos que deram certo6

O movimento é uma importante dimensão do desenvolvimento e da


cultura humana. As crianças se movimentam desde que nascem, ad-
quirindo cada vez maior controle sobre o seu próprio corpo e se apro-
priando cada vez mais das possibilidades de interação com o mundo7

A EMEB Professora Elaine Margarete Meneguim da Silva atende crianças de 4 a 6


anos e, como é próprio desta faixa etária, elas apresentam grandes necessidades de
movimentar-se. Diante disso, as professoras planejam propostas que visam o de-
senvolvimento de novas capacidades relacionadas ao movimento, garantindo mo-
mentos como: parque (correr, subir, descer, escorregar etc), brincadeiras dirigidas
e livres (batata quente, dança da cadeira, pato, pato, ganso etc) e cantos (escritório,
casinha, boneca, carrinho, ligue-ligue, massinha etc).

Brincar é muito importante porque, enquanto estimula o desenvolvimento in-


telectual da criança, também ensina, sem que ela perceba, os hábitos mais necessá-
rios a esse crescimento, como a persistência, tão importante em todo aprendizado8.

Desta forma o movimento é uma das linguagens que a criança utiliza para interagir
com o ambiente que a cerca. Através dele a criança conhece mais sobre si mesma e sobre
o outro e aprende a se relacionar. Vale ressaltar a importância da motricidade nessa faixa
etária, uma vez que as crianças na primeira infância possuem uma inteligência motora que
utilizam como forma de compreender o mundo e a si mesmas.

Pautada nessa necessidade e na importância que o movimento tem para o


desenvolvimento da criança é que a equipe docente composta por 03 professores
que atuaram na Fase IV (crianças de 4 anos) e 5 professores que atuaram na Fase V
(crianças de 5 anos) iniciou os estudos em momentos de HTPC sobre o rolamen-
to e a cambalhota, onde foi possível ler, discutir as dúvidas, socializar os medos, as
6. Relato da “Sequência Didática: rolamento e cambalhota”, desenvolvida na EMEB Professora Elaine Margarete
Meneguim da Silva e produzida pela Assessora Pedagógica Paula Tauhali de Freitas Kawano.
7. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil. Vol. 2 e 3. Brasília: MEC/SEF, 1998.
8. BETTELHEIM, Bruno. Uma Vida para seu Filho. Pais bons o bastante. Editora Campus, Rio de Janeiro: 1988.

27
angústias e assistir vídeos do desenvolvimento do rolamento e da cambalhota com
a mesma faixa etária que atendemos. Os vídeos foram realizados pela assessora
externa do movimento9, que nos auxiliou na elaboração da sequência didática por
meio dos encontros de formação dos assessores pedagógicos.

Confesso que, quando fui propor ao grupo o trabalho com o rolamento e a


cambalhota fiquei muito insegura, pois o grupo demonstrava muita preocupação
e medo de machucar a criança. Porém, após o estudo, leitura de textos, vídeos,
o trabalho com a atividade ficou mais claro e o grupo sentiu certa tranquilidade
para elaborar e desenvolver a sequência didática, cujo objetivo é o conhecimento
do corpo. A partir da elaboração e execução da sequência didática, temos o relato
de algumas professoras10 sobre o processo de estudo, elaboração e execução da
proposta de trabalho, bem como as necessidades identificadas e as aprendizagens
conquistadas por todos (crianças e professoras).

RELATO DA PROFESSORA DA FASE V A – PERÍODO: MANHÃ


Ao receber a proposta da sequência didática, o que mais me preocupou foi pen-
sar em como organizar o momento da cambalhota para que eu pudesse orientar e
acompanhar todas as crianças com o intuito de evitar qualquer tipo de acidente.
Além disso, esse é um grupo bastante agitado e a organização também deveria fa-
vorecer o tempo de espera para a realização da atividade.

Após assistir os vídeos das aulas realizadas em outras EMEBs, fiquei ainda
mais preocupada. Nas duas escolas as aulas foram realizadas pela formadora, que
contou com o auxílio da professora da turma e da professora auxiliar (no caso da
creche) e ainda sob os olhos do grupo de assessores pedagógicos (que estavam em
momento de formação). Em nossa escola vivemos outra realidade, não contamos
com professores auxiliares, as estagiárias participam de um rodízio para atender a
todos os grupos e as monitoras educacionais auxiliam no refeitório, ou seja, rea-
lizar esta sequência didática se tornou um desafio pessoal e individual para mim.

Planejei as atividades e decidi enfrentar a realidade. No primeiro momento,


de acordo com a sequência planejada, realizamos uma roda de conversa que teve
como tema gerador diversas imagens de pessoas realizando rolamentos e camba-
lhotas no telão do data show. Conversamos sobre o tema e os cuidados que deve-
mos ter ao realizar os movimentos. Em seguida, coloquei um colchão no centro da
roda, tomando os devidos cuidados com o espaço e solicitei que demonstrassem
de que forma realizavam os movimentos propostos. Uns realizaram sem grandes

9. Isabel Filgueiras, assessora externa na área do Movimento na Educação Infantil.


10. Ana Paula da Silva C. Santos, Fase VA, manhã e Valdirene Regina C. Bacharelli, Fase VD, tarde.

28 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

dificuldades, outros com medo e, apenas duas crianças não quiseram se arriscar.

Durante a demonstração, conversamos sobre as dificuldades encontradas e


refletimos sobre as possíveis soluções para saná-las. Realizei diversas vezes a ati-
vidade para que percebessem, na prática, os cuidados que havíamos discutido an-
teriormente e então as crianças que não quiseram realizar o movimento anterior-
mente se encheram de coragem. O fato veio a confirmar aquilo que já sabemos
sobre a importância do “fazer junto”, ou seja, a participação do professor durante
as atividades propostas que, neste caso específico, serviu, entre outras coisas, para
mostrar que todos podem realizar este movimento e encorajar os menos corajosos.

Após a realização da sequência foi possível perceber que as crianças maiores,


em sua estatura, apresentaram mais dificuldades para coordenar os movimentos,
talvez por não terem experimentado quando menores. Isso me fez refletir e pensar
em ampliar as propostas de movimento para os meus alunos.

As crianças demonstraram tanto interesse que pudemos realizar as demais


etapas (circuito com as seguintes estações: cambalhota do banco, cambalhota com
as pernas afastadas, com os braços abertos, cambalhota inventada; cambalhotas
consecutivas com diferentes desafios: pernas unidas, afastadas, lentas, rápidas, le-
vando um objeto no queixo - tecido, bolinha de algodão ou de papel -, montagem
de um circuito com as atividades que mais gostaram) e repeti-las diversas vezes
sem grandes preocupações com os possíveis acidentes e tempo de espera, pois gos-
tavam de observar os colegas, dar dicas, auxiliar.

A partir de então, a sequência deixou de ser um problema para mim. Aprendi que
é possível realizar tais movimentos com segurança, desde que sejam bem planejados e
muito bem conversada com o grupo, pois realizávamos rodas de conversa antes e após
cada atividade, a fim de apresentar a proposta, construir as regras e combinados e, pos-
teriormente, finalizar a atividade com uma reflexão e exposição das ideias e sentimentos
suscitados durante a realização dela (facilidades, dificuldades, dicas e sugestões que au-
xiliassem a realização do movimento) e combinados para realizá-los novamente, promo-
vendo assim uma troca de experiências entre os alunos.

As crianças puderam conhecer esportes, lutas e ginásticas que utilizam movimen-


tos de rolamento e cambalhota; experimentar o movimento da cambalhota e perceber
a melhor posição da cabeça, do quadril e o impulso dos braços; explorar diferentes
posições dos membros superiores durante o movimento, ampliando as possibilidades
de realização dele; solucionar problemas típicos e descrever e comparar diferentes for-
mas de realizar os movimentos, além de realizá-los com muito prazer e entusiasmo. Foi
então que passei a curtir os momentos juntamente com as crianças.

29
RELATO DA PROFESSORA DA FASE V D – PERÍODO: TARDE
“Cambalhota sim! Por que não?”

A princípio o tema assustou! Camba-


lhota, ai! Senti a cabeça rolar.

Em outros tempos distantes, mil nove-


centos e noventa bolinhas, eu fazia com
os alunos, mas após um curso fui alertada
do perigo que eles corriam. Por isso ha-
via descartado esta brincadeira da minha
prática por medo de machucar as crian-
ças. Por outro lado, com a estratégia da
assessora em apresentá-la, seu jeitinho de convencer, pelo trabalho realizado nas outras
EMEBs (assistido pelo DVD), pelo meu sobrinho (3 anos) tentando me ensinar o que
aprendeu esse ano com a sua professora na creche, eu não resisti e nem poderia deixar
de oportunizar isso aos meus alunos. Questionei então: ‘Por que não experimentar?’ E
então experimentei a partir do planejamento da sequência elaborada como os demais
professores da Fase V.

Para as crianças foi só alegria e satisfação em demonstrar o que podem fazer com
seu corpo. Aqueles que conheciam começaram a exibir. Viraram com duas mãos a prin-
cípio, depois com uma e agora alguns já viravam sem o apoio das mãos no colchão. De
perna aberta, fechada, duas cambalhotas seguidas, com ou sem interferência.

E ajudaram a incentivar os que não conheciam. Mostraram sua técnica, apesar de


eu ter conversado e orientado sobre a maneira mais segura de fazer.

Foi uma aula, duas, três, quatro treinando, depois com outros desafios, com outros
convidados a fazer. Até a assessora virou conosco.

Enfim, foi muito bom, melhor está sendo, pois as crianças querem mais! Alguns
necessitam de outras oportunidades para melhorar seu desempenho no controle do
corpo. Ah, o medo do princípio passou. Veio a certeza de que precisamos oportunizar às
crianças essa brincadeira. Na nossa infância virávamos cambalhotas em casa brincando
com nossos irmãos mais velhos. Hoje em dia muitas dessas brincadeiras estão desapare-
cendo; então, por que não resgatá-las na escola? Quer lugar melhor para isso?

30 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Concluindo...

O trabalho com a sequência didática: rolamento e cambalhota possibilitou aos


educandos a construção de novas aprendizagens, como a utilização do movimen-
to de rolamento lateral com proficiência e possibilidades de variação do espaço, do
tempo e no relacionamento, além da experimentação de diferentes posições dos
membros superiores no movimento de cambalhota.

As crianças pequenas estão envolvidas no processo de desenvolvi-


mento e de refinamento das habilidades motoras fundamentais para
grande variedade de movimentos estabilizadores, locomotores e ma-
nipulativos. Isso significa que elas devem envolver-se em muitas expe-
riências coordenadas e, na perspectiva humanista, saudáveis, projeta-
das para aumentar o conhecimento do corpo e do seu potencial para
o movimento.11

Enfim, a escola deve promover aprendizagens significativas, que estejam atre-


ladas às necessidades de cada faixa etária, assegurando o respeito à diversidade
e à cultura, levando em consideração os processos vivenciados pelos educandos,
resultado de um trabalho intencional do professor.

11. GALLAHUE, David L.; OZMUN, John C. Compreendendo o Desenvolvimento Motor - bebês, crianças, adolescentes
e adultos. São Paulo: Phorte, 2001.

31
5
Reorganizando o trabalho
pedagógico das crianças pequenas12

A ideia de coerência profissional indica que o ensino exige do docente


comprometimento existencial, do qual nasce autêntica solidariedade
entre educador e educandos, pois ninguém se pode contentar com
uma maneira neutra de estar no mundo. Ensinar, por essência, é uma
forma de intervenção no mundo, uma tomada de posição, uma deci-
são, por vezes, até uma ruptura com o passado e o presente.
(PAULO FREIRE. Pedagogia da autonomia. 1996)

Paulo Freire revela todo o sentido do trabalho que procurei organizar ao longo de 2011.
Isso porque, assim como ele, acredito que realmente ninguém pode se contentar com
uma maneira neutra de estar no mundo e foi por essa razão que me propus a buscar
caminhos e conhecimentos para reorganizar o trabalho pedagógico das professoras que
atuam com as crianças de 0 a 3 anos.

A EMEB Emellyne de Azevedo Aguiar atende anualmente uma média de 150


crianças no período integral e, além disso, conta ainda com os segmentos da Edu-
cação Infantil (Fases IV e V) e Ensino Fundamental (1º ano).

No entanto,oobjetivoaquiécontextualizarotrabalhodesenvolvidocomascrian-
ças do período integral, muito curiosas e sempre dispostas a aprender, como também
ensinar àqueles que fazem parte do seu dia a dia. E foi através de acompanhamentos
em sala de aula e de todo o trabalho desenvolvido nas formações em HTPCs que
evidenciamos um indicador importante, o de rever o trabalho pedagógico que vi-
nha sendo realizado.

Tanto os professores do período integral, como eu, gestora, resolvemos rever


o que já há algum tempo vínhamos trabalhando com os pequenos, procurando res-
significar o que seria de fato trabalhar com o binômio ‘educar’ e ‘cuidar’. Isso por-
que, analisando a rotina diária das crianças, o cuidar estava se sobrepondo ao educar.
Com isso não estou querendo dizer que uma coisa deve ser separada da outra. Ao
contrário, tanto o cuidar como o educar devem caminhar juntos. Para isso, precisá-
vamos estudar mais e buscar novos aprendizados, para enfim organizarmos o traba-
12. EMEB Emellyne de Azevedo Aguiar – Juliana Donizete Costa Rezende – Diretora de Escola.

32 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

lho pedagógico, estabelecendo na rotina momentos que evidenciassem os cuidados,


como também as ações planejadas por parte dos professores envolvendo o brincar, a
leitura, o movimento e as experiências artísticas e sensoriais.

Naquele momento ainda não falávamos em conjuntos de experiências e nem


havíamos tomado conhecimento da Resolução Nº 05 de Dezembro de 2009, que
traz todos os objetivos e eixos de trabalho para a criança pequena, mas já sinalizá-
vamos que do jeito que vínhamos caminhando não dava mais, ou seja, os profes-
sores davam indícios de que precisavam ir além, buscar novos conhecimentos e
consequentemente novos aprendizados.

Foi então que participamos do curso de formação13, com ênfase na rotina do tra-
balho com os pequenos, o que acabou nos desestabilizando ainda mais, pois mexeu
diretamente com nossas convicções e necessidades de ampliarmos os nossos saberes.

A proposta de trabalho com rotina foi apresentada através do curso exata-


mente com o intuito de despertar nos professores a reflexão com base no que fa-
ziam no dia a dia com seus alunos. A formadora, na ocasião, discutiu o que mais
fazíamos com as crianças, ou seja, levantou a questão: O que vocês mais fazem,
cuidam ou educam?

De início essas questões causaram um enorme desconforto aos participan-


tes do grupo, especialmente porque foram sinalizadas através de uma ação, a de
apontarmos os horários, desde o momento em que a criança chegava à escola até
a sua saída, e tudo o que fazíamos. Assim, chegamos à conclusão de que passáva-
mos muito mais tempo cuidando, trocando fraldas, dando banho, alimentando e
colocando pra dormir, do que trabalhando as experiências e propondo ações pe-
dagógicas com os pequenos. Ensinar é uma forma de intervenção no mundo e foi
essa a provocação que a formação como um todo disparou em mim, uma vez que a
cada encontro sentia a necessidade de olhar para o meu grupo, para a minha reali-
dade e refletir sobre as possíveis transformações que poderiam ser feitas.

Sendo assim, levei novas ideias para o grupo de professores e começamos a


colocar as ‘mãos na massa’, levando em consideração que se trata de um grupo ex-
tremamente receptivo e pronto a abraçar novas ideias e concepções. Aliás, penso
que é essa energia e vontade que movem o nosso grupo e fazem dele um diferen-
cial muito precioso.

As ideias a que me refiro comungam com o fato de que apenas descrever a


rotina do dia a dia no caderno de planejamento das professoras do período integral
13. CEDUC – Gestão e Terceirização de Creches nas Empresas.

33
não bastava, ou seja, precisava haver um detalhamento mais específico do que seria
proposto para as crianças de1 a 3 anos durante o dia e na semana como um todo.

Diante disso, propus numa de nossas formações que analisassem o que vi-
nham fazendo em termos de planejamento, destacando o que envolvia o cuidar e
o que envolvia o educar na prática diária. Assim, resolvemos que seria necessário
rever a forma de planejar. Foi então que pensamos num outro instrumento de tra-
balho. Organizamos um caderno intitulado “Caderno de Planejamento Pedagógi-
co” e combinamos que a rotina de trabalho diária deveria ser especificada uma úni-
ca vez, no início do caderno, sendo pensada através dos horários de permanência
com as crianças e o que seria feito durante este tempo.

Assim, as professoras precisavam distribuir no tempo em que estariam com as


crianças, por exemplo, o horário do café, da troca, do parque, do almoço, da escova-
ção de dentes, como também os momentos destinados às atividades pedagógicas.

Chamamos de atividades pedagógicas as propostas envolvendo as rodas de


história, de música, de movimento e as experiências envolvendo a apreciação e o
fazer artístico, bem como as experimentações sensoriais, ou seja, o trabalho com
‘melecas’, materiais não estruturados, dentre outros. Chamamos aqui de materiais
não estruturados as oficinas e experimentações propostas às crianças, envolvendo
os materiais não industrializados, podendo ser canos de PVC, conduítes, panos e
tecidos diversos, blocos de madeira, cones de linhas de costura.

A proposta que levei ao grupo seria organizar esse tempo didático e em se-
guida planejar o que seria feito a cada semana e mais especificamente a cada dia,
considerando sempre as necessidades de cada faixa etária.

Então teríamos uma rotina fixa pensada como no exemplo abaixo:

ROTINA DA FASE I (CRIANÇAS DE 01 ANO)


Período da Manhã
Das 07:00 às 07:30: Acolhimento das crianças e famílias.
Das 07:30 às 08:00: Café no refeitório e troca das crianças.
Das 08:00 às 08:30: Cantos de atividades com materiais não estruturados.
Das 08:30 às 09:00: Atividade Pedagógica.
Das 09:00 às 09:30: Brincar (Brinquedoteca, Solário ou Parque).
Das 09:30 às 10:30: Higienização das mãos e almoço.
Das 10:30 às 11:00: Escovação de Dentes e Troca.
Das 11:00 às 13:00: Soninho.

34 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

A partir dessa rotina, as professoras teriam então que pensar “O quê? Como?
Para quê?” realizar determinada atividade pedagógica no tempo destinado a esta ação.

Mas não é só isso!

O tempo destinado aos cantos de atividades, à atividade pedagógica em si e ao


brincar, a cada dia da semana, precisa estar especificado envolvendo o que trabalhar,
como trabalhar e para quê trabalhar. Esse movimento despertou nas professoras a
necessidade de repensar o seu planejamento, considerando o que as crianças em cada
fase e faixa etária precisam. Com isso, o planejamento pedagógico de uma turma de
Fase I, no período da manhã, por exemplo, seria parecido com o que revela o quadro
abaixo, considerando o que seria proposto em um dos dias da semana:

SEGUNDA-FEIRA

Cantos de Atividades: Organizar no espaço da sala de aula um canto com canos


de PVC coloridos organizados no tapetão, a fim de que as crianças possam se mo-
vimentar no espaço e com isso interagir com os referidos materiais, explorando
suas experiências.
Atividade Pedagógica: Roda de Leitura: organizar na sala, em especial no cantinho
da leitura, um sofá utilizando os colchonetes e, no tapete, dispor os fantoches que
serão utilizados para contar a história “Os três porquinhos”. A história será contada
utilizando esses recursos para que as crianças possam se envolver nesse momento.
Após contar a história para as crianças, disponibilizar os fantoches para que as crian-
ças os explorem, tocando e experimentando as sensações que produzem.
Brincar: A proposta com brincar de hoje será no parque de areia. Levar as crianças ao
parque de areia junto com os baldinhos, pazinhas, panelinhas e potinhos diversos.
Organizar as crianças neste espaço para que interajam com os objetos, com os espa-
ços e entre si, a fim de que possam brincar e experimentar as sensações que a areia e
o brincar produzem.

A partir desse planejamento, junto com o grupo de professores, dialogamos sobre


a necessidade de irmos além dele e foi então que nasceu a necessidade do registro.

Até então as professoras registravam suas práticas, mas não era um hábito de
fato. No entanto, a partir do momento em que discutimos uma nova forma de pla-
nejar as ações com as crianças, sentimos a necessidade de um registro mais reflexivo
desta prática. Isso porque a tríade planejar, avaliar e replanejar envolvem a prática do
registro, que possibilita rever o que foi feito, repensar as ações, ver o que deu e o que
35
não deu certo, a fim de que o replanejamento possa contribuir para novas ações.

Assim, o grupo chegou à conclusão de que a cada semana, além de organizar


o planejamento pedagógico, deveria também registrar a prática. Esse registro po-
deria ser feito com base em algo que deu certo durante a semana, sobre algo que foi
planejado e que não tenha dado certo, sobre uma criança que mais chamou a aten-
ção, enfim, sobre o que gostariam de registrar e de compartilhar com as gestoras.

Isso mesmo! Compartilhar com as gestoras, pois o propósito desse registro


também dialogava com uma devolutiva nossa a partir da leitura do que as profes-
soras haviam planejado, bem como a partir do que haviam registrado.

Penso que a devolutiva do gestor é algo preponderante neste processo, pois


deve reforçar as boas práticas das professoras e sinalizar o que precisa ser refletido
por parte delas, de forma a garantir a eficácia da prática pedagógica.

No entanto, a partir do momento em que dialogamos sobre a necessidade


do registro, muitas formas de registro foram estudadas e sinalizadas pelas próprias
professoras. Numa das formações em HTPC, estudamos sobre a importância do
registro escrito, do registro fotográfico com legendas que pudessem fazer referên-
cias às imagens, bem como do registro de algo que as próprias crianças houvessem
produzido, como, por exemplo, um traçado ou um desenho.

Conseguimos então definir qual seria o instrumento a ser utilizado no ano de


2011. Após todo esse processo, restava-nos discutir sobre as modalidades organi-
zativas que contemplaríamos a fim de que o planejamento pedagógico não fosse
construído aleatoriamente.

Dessa ação nasceu a ideia de contemplarmos as atividades pedagógicas na


modalidade ‘atividades permanentes’ durante o primeiro semestre de 2011, tendo
em vista que nesse período lidamos muito com a chegada e saída das crianças,
todo o processo de acolhimento e adaptação. Para o segundo semestre, combina-
mos que além das atividades permanentes, faríamos um trabalho com as crianças
através de um projeto que fosse pensado a partir das necessidades de aprendiza-
gem das crianças, estabelecendo com isso um produto final, ou seja, finalizando as
propostas num objetivo compartilhado com as elas.

Feito isso, havia chegado o momento de pensarmos o que queríamos que as


nossas crianças aprendessem ao longo do ano e assim cada dupla de professor se
debruçou sobre os referenciais teóricos, tanto os Referenciais Curriculares Na-
cionais para Educação Infantil, como a Coleção Educadores (MEC), tendo como

36 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

ponto de partida os teóricos Piaget, Vygotsky e Wallon, com o propósito de estu-


dar um pouco melhor as fases e estágios do desenvolvimento infantil, traçando os
objetivos focados nas aprendizagens para 1 ano, 2 anos e 3 anos, que seria o públi-
co envolvido.

A partir desse estudo, concluímos que o trabalho com as crianças pequenas


seria pautado no trabalho com a leitura, com o movimento (tão inerente a essa fai-
xa etária), com o brincar (enquanto uma especificidade ímpar para o desenvolvi-
mento das crianças) e a expressividade artística, envolvendo tanto o trabalho com
a Arte como com a Música.

E o resultado foi surpreendente! Isso porque descobrimos no grupo que po-


díamos ir além dos cuidados com as crianças pequenas, visto que o cuidar se so-
bressaía em relação ao educar. No entanto, vale ressaltar que as professoras tinham
práticas pedagógicas realizadas com as crianças. Já trabalhavam considerando as
modalidades organizativas (atividades permanentes, sequências didáticas e proje-
tos), através de um plano de ação, mas muito era pensado e pouco chegava à prá-
tica propriamente dita e muitas vezes as professoras se frustravam, pois ainda não
haviam conseguido se organizar dentro do tempo didático.

De forma geral, as necessidades relativas aos cuidados das crianças eram aten-
didas, mas faltava algo que era essa organização do tempo e do planejamento em si,
que aos poucos foram sendo sinalizados pelas próprias professoras.

Assim, organizar esse trabalho pedagógico possibilitou que as crianças se di-


vertissem, interagissem e ganhassem maior autonomia, principalmente no desen-
volvimento da oralidade. O principal de tudo isso é que se mostraram essencial-
mente felizes no espaço da creche.

Em linhas gerais, conseguimos contemplar a reorganização do trabalho peda-


gógico através dos estudos em HTPC, de modo que o cuidar e o educar passaram
a ser vistos de outra forma, ou seja, a partir de uma organização do tempo didático,
dando ao professor a visão de que é preciso pensar que um depende do outro, mas
que precisa haver uma organização e um planejamento para que isso aconteça qua-
litativamente.

Os meus objetivos enquanto gestora desse grupo vêm sendo alcançados, par-
tindo do pressuposto de que a partir de um olhar atento sobre a prática do profes-
sor podemos dialogar sobre as ações que o grupo já tinha e sobre outras possibili-
dades que foram surgindo a cada formação.

37
E que objetivo é este?

Reorganizar o trabalho que já vinha acontecendo na creche, mas que preci-


sava ser ressignificado a partir de novas ações. Ações estas que já faziam parte da
prática pedagógica do professor, tendo em vista que já trabalhavam com as moda-
lidades organizativas e com o brincar propriamente dito, mas que neste momento
precisavam ser contextualizados a partir da ampliação de novos conhecimentos. E
foi exatamente isso que conseguimos fazer.

Agora é o momento de avaliar. Avaliar o percurso realizado, as ações desen-


volvidas e os resultados alcançados. Avaliar para localizar as necessidades e se com-
prometer com a superação. Pensar sobre o que deve ser avaliado e quais as inter-
venções necessárias no processo de ensino e aprendizagem.

Com isso, posso dizer que nossa maior conquista foi percorrer todo um pro-
cesso juntos, estudando cada passo, dialogando sobre as práticas e as ações desen-
volvidas e perceber que o nosso grupo tem muita disponibilidade a aprender e
interagir com novas práticas.

A nossa maior dificuldade? Acredito que seja acomodarmos em uma mesmi-


ce, pois devemos estar atentos e buscando aprender algo novo sempre que somos
provocados por alguma situação no espaço de atuação profissional.

E o próximo passo? Continuar estudando e inovando a nossa prática. Acredi-


tar que a educação é algo que está sempre em constantes mudanças e inovações e
que não podemos nos acomodar, pois só crescemos quando questionamos, quan-
do dialogamos com parceiros mais experientes e nos aventuramos a experimentar.

38 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

6
Por que brincar?14

Ele garante que o cérebro – e nas crianças quase sempre o corpo – fique
estimulado e ativo. Isso, por sua vez, motiva e desafia o participante
tanto a dominar o que é familiar quanto a responder o desconhecido
em termos de obter informações, conhecimentos, habilidades e enten-
dimento. (...) Em todas as idades, o brincar é realizado por puro prazer
e diversão e cria uma atitude alegre em relação à vida e à aprendiza-
gem. Isso certamente é uma razão suficiente para valorizar o brincar.
(MOYLES, 2002. p. 20-21).

O brincar é com certeza um dos meios pelos quais os seres humanos exploram
uma variedade de conhecimentos, ações e experiências em diferentes situações
para os mais variados propósitos. Por exemplo, quando os alunos são colocados
em situações de faz de conta em um canto de atividades diversificadas de casinha
(utensílios de cozinha, panelas, fogão, geladeira, bonecas, colchonetes que repro-
duzam uma casa de “verdade”) as crianças podem experimentar e vivenciar papeis,
ou seja, brincar de ser mãe, pai, filhinho, tio, irmã etc. Nesta situação eles viven-
ciam experiências reais do seu cotidiano e também têm a oportunidade de colocar
em jogo conhecimentos sobre as relações da sociedade em que vivem e sua com-
preensão sobre a formação desta.

Outro exemplo são os cantos de atividades diversificadas com jogos de


percurso que proporcionam o aprendizado de vários conhecimentos matemá-
ticos como contagem, estabelecimento de relações entre a quantidade con-
tada e o número que a representa, noção de localização ao deslocar o peão
sempre no mesmo sentido em uma pista, sem hesitação na primeira casa, ou
ainda o estabelecimento de correspondências entre a quantidade e número tirado
no dado e o deslocamento das casas. Isso tudo a criança realiza brincando, sem a
intenção de desenvolver tais conhecimentos, sendo este o objetivo do professor.

Brincar é, neste sentido, uma ação aprendida na cultura na qual se está inseri-
do, e que possibilita às crianças se constituírem como sujeitos em um ambiente em
constante transformações, ou seja, embora os conteúdos das brincadeiras se mo-
difiquem de acordo com a cultura infantil de cada lugar e com o tempo, a essência
14. Relato de experiência escrito pelas gestoras Aparecida Ramalho Leite, Jaqueline Pinto Ferreira e Sandra Regina
Azevedo da EMEB Emerson Cruz Machado sobre as reflexões sobre o brincar vivenciadas em 2011.

39
do brincar permanece firme para todas as crianças.

Garantir um espaço destinado ao brincar na escola, para que as crianças


criem e desenvolvam suas brincadeiras, não apenas em horários e locais destinados
previamente(como parques e pátio para recreação), mas também no espaço da sala
de aula de forma planejada e intencional proporcionada pelo professor, é assegurar
uma educação que compreenda a importância que ele, tem para o desenvolvimen-
to, aprendizagem e o bem-estar das crianças, assumindo a posição de que ao brincar
nossas crianças estão a todo tempo aprendendo. Mais do que isso, para nós o brincar
precisa dar lugar à invenção e à produção de novos significados, saberes e práticas,
sempre mediado por processos ativos, onde as crianças possam colocar em jogo suas
vivências, pois sabemos que a partir de suas experiências elas reelaboram situações do
seu cotidiano, bem como reinventam outras.

É importante destacar que as crianças não brincam para aprender, mas apren-
dem brincando, pois ao brincar estão a todo tempo aprendendo a realizar ações
sozinhas ou com pouca ajuda de outros parceiros mais experientes (adultos e crian-
ças); a valorizar ações de cooperação e solidariedade; socializar-se por meio da in-
teração com seus pares (adultos e crianças), desenvolvendo a percepção sobre estes;
explorar os próprios potenciais e limitações; experimentar e vivenciar diferentes pa-
péis sociais através do faz de conta; desenvolver a confiança em si mesmo e em suas
capacidades, além da atenção, imitação, memória e imaginação, conhecer e ampliar
o repertório de jogos e brincadeiras e suas regras, ter autonomia para escolher e
criar suas próprias brincadeiras; criar estratégias para resolver situações-problema
do cotidiano e em jogos e brincadeiras; a cuidar e organizar os brinquedos.

Refletindo sobre as considerações levantadas acima e levando em considera-


ção que o brincar é um dos eixos da educação infantil, percebemos a necessidade
de retomar a questão do brincar na escola tem sido um ponto de extrema impor-
tância já há algum tempo, pois observamos, enquanto gestoras, que o brincar, ape-
sar de ser contemplado pela rotina do professor e das crianças, de ter seu espaço
garantido especialmente no que diz respeito aos momentos de parque e cantos de
atividades diversificadas (que fazem parte do plano de ação de todas as fases e anos
como atividade permanente), o “como” é colocado em prática merece um olhar de
estranhamento por todos os profissionais da escola.

Os cantos de atividades diversificadas têm seu espaço na rotina escolar ga-


rantido diariamente no início da aula e por aproximadamente 30 minutos, pla-
nejados e mediados pelo professor que organiza vários cantos ou espaços da sala
com: jogos, faz de conta, artes visuais, leitura etc., proporcionando às crianças que
escolham o que irão fazer, do que e como irão brincar diante das opções apresen-

40 - RELATOS DA PRÁTICA
tadas. Além de ter opção de escolha, a criança também deve ter opções para como
brincar, seja sozinha, seja em pequenos grupos, ou com toda a turma. Por isso a
garantia da diversidade de opções ou ambientes organizados de forma confortável
e convidativa, por temas, recursos ou tipos de materiais, que devem estar sempre
acessíveis às crianças, é tão importante. O trabalho com os cantos diversificados,
além de desenvolver os conteúdos voltados ao brincar, também contribui para os
voltados à formação social e pessoal e para as diversas áreas de conhecimento. Por
isso ele é um eixo necessário para o desenvolvimento dos nossos pequenos alunos.

O parque, outro momento garantido diariamente pela rotina das crianças por
aproximadamente 30 minutos, seja de forma livre (entende-se por forma livre a
garantia da exploração dos materiais, brinquedos e espaços deste ambiente de for-
ma segura e mediada pelo professor ou de forma orientada, que proporcione mo-
mentos de intervenções no espaço – cordas ligando os brinquedos, amarradas em
árvores para “escalada”, pneus organizados com a intenção de criar obstáculos ou
caminhos, tecidos etc.) ou através de sugestões de brincadeiras feitas pelo profes-
sor ou pelas crianças. Ambas contribuindo para o desenvolvimento de autonomia,
criação e interação.

Fomos surpreendidas pelo fato de que não é a falta de espaço ou de tempo


na rotina escolar que não permite com que o brincar seja contemplado ou mesmo
priorizado, pois como citamos acima, ambos os momentos sempre estiveram ga-
rantidos na rotina diária das professoras, mas sim a forma como era desenvolvido
com as turmas. O que quer dizer que a necessidade estava em olhar para o “como”
o professor estava conduzindo estes momentos, sem a falta de intencionalidade
em oferecer experiências nas quais as crianças pudessem adquirir sentimento de
identidade e de pertencimento ao grupo no qual convivem, ao mesmo tempo em
que pensam e aprendem sobre uma variedade infinita de práticas sociais e relações
humanas, bem como desenvolvem habilidades cognitivas, linguísticas e sociais.

Sabíamos que não seria uma tarefa fácil mexer em algo que estava cristaliza-
do na prática das professoras, mas que era preciso olhar para o que é proposto e
como estamos propondo este momento rico em significados do ponto de vista da
criança, isto é, refletindo sobre nossa prática e ampliando nosso conhecimento em
relação ao brincar, em direção a uma educação de qualidade e que garanta à criança
o direito de ser criança.

Diante desta conclusão começamos a fazer algumas provocações em relação ao


brincar no conselho de classe do 2º bimestre e quando questionamos as professoras so-
bre as observações que haviam feito em relação ao brincar, nos deparamos com a cons-
tatação de que para a maioria delas “o brincar perdia seu espaço, era deixado de lado

41
frente às demandas das outras áreas de conhecimento e suas expectativas, o que tornava
a rotina apertada” já que “diante dos mapeamentos de oralidade, escrita e leitura e das
observações em matemática para as Fases IV e V e as avaliações do 1º ano do Ensino
Fundamental não percebiam como o brincar é um dos principais norteadores da pro-
posta da rede no que diz respeito às crianças de 4 a 6 anos”.

Com as colocações feitas pelas professoras, nos sentimos confusas e ao mes-


mo tempo responsáveis pela mudança dessa visão e atitude, visto que esta rotina
apertada ou mesmo a hierarquização das áreas não é o que tem emperrado o tra-
balho do brincar na escola, mas sim o “como” ele tem sido realizado. Decidimos,
então, fazer um estudo sobre o brincar para ressignificar o mesmo, focando primei-
ramente um dos momentos privilegiados na rotina diária do professor enquanto
atividade permanente, os cantos de atividades diversificadas.

A atividade permanente ‘cantos diversificados’ constituiu-se, assim, como


foco de acompanhamento no segundo semestre, com o intuito de observar cuida-
dosamente o brincar construído culturalmente na interação com o meio, os obje-
tos e os sujeitos no contexto pedagógico, a fim de que fosse possível ajudar nossas
professoras a refletirm sobre sua prática e modificar a mesma, já que o brincar é de
fundamental importância para o desenvolvimento infantil.

Nós, gestoras da escola, em conjunto com a supervisora da unidade, fizemos um


acompanhamento mais detalhado com uma professora da Fase V. Este acompanhamen-
to teve como objetivo observar a prática da professora e fazer um estudo em relação a
esta para que houvesse uma reflexão, ampliando-a e realizando-a de forma planejada e
cuidadosa. O acompanhamento envolveu, além das visitas em sala de aula, devolutivas
à professora, estudo e orientação para o planejamento de atividades, levantamento de
demandas para o HTPC sempre num estudo coletivo entre nós, gestoras da escola, a
professora, a supervisora da unidade e os demais professores.

Eu, enquanto assessora pedagógica, observei as demais turmas da escola, sen-


do possível acompanhar de forma planejada (presença do gestor na sala durante
o período de realização da atividade), as fases IV e V e através de observação das
rotinas de todas as salas.

Durante os acompanhamentos foi possível confirmar nossas observações anterio-


res: os cantos de atividades diversificadas acontecem diariamente por 30 minutos no
horário de entrada das crianças, mas que esta prática está cristalizada, acontece sempre
da mesma forma, pois, na maioria das vezes, eram sempre as mesmas brincadeiras, com
a mesma organização de cantos e situações propostas para todas as fases e anos, descon-
siderando muitas vezes o que é necessário nos diferentes momentos da infância.

42 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Em nenhum momento da rotina na escola infantil deve o educador estar


tão inteiro e ser tão rigoroso no sentido de estar atento às crianças e aos
seus próprios conhecimentos e sentimentos quanto na hora de brincar.
(FORTUNA, 2011. p.10)

A partir de então passamos a refletir enquanto gestoras que cabia a nós, tam-
bém, a tarefa de ressignificar o brincar. Debruçamos-nos, assim, sobre alguns estu-
dos para ampliar nossos conhecimentos, como o Referencial Curricular Nacional
para a Educação Infantil, a Proposta Curricular Jundiaí: educação infantil de 4 a 5
anos, Janet R. Moyles (2002), Alfredina Nery (2007), Revista Pátio (Abril/Jun),
Orientações curriculares: expectativas de aprendizagens e orientações didáticas
para Educação Infantil (2007) e Vygotsky (2008).

Fortalecidas e compreendendo melhor o universo do brincar, levamos o es-


tudo para os HTPCs pautadas em nossa reflexão inicial de que há o espaço/tempo
na rotina do professor para o brincar e que ele é primordial para o desenvolvimen-
to das crianças e do observado em nossas visitas. Neste primeiro estudo levanta-
mos com elas a importância do brincar, o que ele proporciona para as crianças e
em que momentos ele acontecia na escola. Ao responderem os questionamentos
demonstraram que teoricamente elas sabem exatamente a importância do brincar
e sabem muito sobre o que ele proporciona às crianças e que ele está presente em
vários momentos da rotina delas.

Bem, isso nos sinalizou uma contradição, pois elas nos pontuaram que não
havia espaço/tempo para o brincar em sua rotina inicialmente e nos apontaram
diversos momentos em que ele acontece neste HTPC, ou seja, existe espaço/tem-
po para o brincar na escola. Deixando claro para nós que a necessidade, realmente,
estava em olhar para as suas práticas, pois elas possuem o conhecimento sobre o
brincar, mas falta que este esteja refletido em sua prática diária, segundo o que per-
cebemos nos acompanhamentos e na análise da rotina semanal.

Diante da colocação delas refletimos sobre o espaço e o tempo do brincar em


seu trabalho dialogando com o artigo “O lugar do brincar na Educação Infantil”, ex-
traído da Revista Pátio Educação Infantil que trata de forma breve e clara da impor-
tância do brincar na educação infantil e o papel que ele desempenha na escola e de
que forma este deve ser oferecido para as crianças, refletindo sobre o cuidado para
que tipos de materiais, brinquedos e como disponibilizar este leque de opções para
as crianças e enfatizando o papel do professor neste momento rico em significados.

Posteriormente retomamos o debate em outro HTPC e percebemos alguns


pontos importantes: a falta de uma organização, comprometendo a diversificação
dos cantos e uso constante de alguns materiais (brinquedos), temas e propostas. Re-

43
lacionamos o que tinham de planejamento com o que levantaram no primeiro mo-
mento de estudo e o que havia sido observado nos acompanhamentos. Percebemos
juntas que seria preciso retomar o brincar e, principalmente neste momento, os cantos
de atividades diversificadas, lembrando que algumas professoras não tinham esta prá-
tica no nível de ensino em que atuavam e que as que já tinham, precisavam retomar,
refletir e ressignificar as práticas, pois o “como” não estava proporcionando às crianças
opções de atividades lúdicas que favorecessem suas necessidades e interesses.

Sabemos que a mudança de prática demanda um tempo e que é um processo


diferenciado para cada professor. Portanto, este trabalho que iniciamos no 2º semes-
tre de 2011 começou a repercurtir em algumas salas de aula, que trouxeram novas
propostas para os cantos de atividades diversificadas, tais como a construção de brin-
quedos, espaços diferenciados e organizados pelas crianças e a oferta de materiais
não estruturados etc., possibilitando aos alunos que sejam protagonistas da sua pró-
pria brincadeira. Embora esses momentos ainda aconteçam de forma muito tímida,
demonstram indícios de reflexão e de mudança na prática destes professores.

Quanto às crianças, percebemos que, quando as novas possibilidades foram


oferecidas a elas, inicialmente ficaram surpreendidas com o novo e acabaram muitas
vezes sem saber como se comportar ou brincar com o que lhes era oferecido. Em
um dos acompanhamentos, por exemplo, a professora montou uma casinha com:
cozinha (mesa de jantar com toalha e flores, geladeira, fogão e utensílio de cozinha),
quarto (colchonete, penteadeira, bonecas) e sala (sofá, mesa de centro, televisão) e
separou os ambientes fazendo uso das cadeirinhas. Um canto inusitado e que não era
parte da rotina dos alunos, de forma que eles não souberam como lidar com a nova
situação: não perceberam as cadeirinhas como “paredes” e não conseguiram fazer
uso da organização proposta. Isso deixa claro que a oferta precisa ser constante e me-
diada pelo adulto e que oferecer simplesmente brinquedos não é suficiente, embora
já seja um bom começo. Planejar com os alunos também é uma excelente situação
para que eles sugiram os ambientes e sua forma de organização, pois desta forma es-
tarão refletindo sobre a construção do espaço e saberão brincar com o mesmo.

Pensando neste percurso vivenciado até aqui, reforçamos que é necessário refletir
sobre o fato de que as crianças não aprendem a brincar sozinhas, da mesma forma que
não desenvolvem a linguagem sozinhas, é no contato com o meio, com a cultura e com
a com as pessoas qual convivem, ou seja, na interação com o meio sócio-histórico cons-
truído pelas transformações da sociedade e da cultura que elas aprendem o significado
dos objetos e dos brinquedos; é que elas aprendem a brincar.

Portanto, embora brincar seja uma ação espontânea da criança, ela não é na-
tural, ela acontece na mediação, na interação entre sujeito e objeto, fundamentos

44 - RELATOS DA PRÁTICA
importantes para que o sujeito possa aprender e se desenvolver cada vez mais, sen-
do este um processo contínuo e em constante movimento e mudança. Por isso o
brincar precisa receber uma atenção dos professores e, como todas as outras ativi-
dades, ser planejado, observado e avaliado, mas sem esquecer da sua especificidade
que é simplesmente brincar.

Ressignificar o papel dos cantos de atividades diversificadas na escola em que


atuamos implica refletir junto com os professores sobre sua atuação e como eles
têm realizado a mesma durante este momento tão importante em sua rotina.

Alternando momentos de participação mais ativa e direta, nos quais suge-


re, convida e propõe brincadeiras, com momentos de observação serena e
atenta, o educador infantil cria as condições necessárias para que a brin-
cadeira transcorra em sintonia com as diversas necessidades das diferen-
tes crianças, em um clima de confiança e continência.
(FORTUNA, 2011. p. 10).

Portanto, é de extrema importância que o professor também brinque junto com


as crianças, seja mediador, seja modelo, converse, troque experiências, ideias com elas e
possa também observá-las nestes ricos momentos de interação e aprendizagem.

Essa tarefa tem nos movimentado cada vez mais. Estudamos, observamos as
práticas na escola, refletimos e nos fortalecemos enquanto gestoras, pois mobilizar
os professores na escola em que atuamos constitui-se um desafio para nós. Este
desafio apenas está começando e o maior aprendizado foi perceber que, embora
exista a prática, nem sempre ela é realizada de acordo com o ponto de vista da
criança, de forma planejada e intencional e por isso precisamos voltar não apenas
nossos olhos, mas todos os nossos sentidos para elas. Neste momento, nos dedi-
car ao brincar e à valorização de seus benefícios para as crianças, é fundamental,
pois, como salientamos no início deste relato, o brincar é importante para todas as
crianças independente de sua cultura, sexo, raça ou cor. Ele está inserido na vida de
qualquer grupo social sem perder sua essência.

Desta forma, é necessário definir novos caminhos pedagógicos que favore-


çam o reencontro com a cultura infantil, valorizando trocas e formas de ver e de
significar o mundo que favoreçam a construção da autonomia.

45
R f r nci s BIBLIOGR FIC s
BASSEDAS, E.; HUGUET, T.; SOLÉ, I. Aprender e Ensinar na Educação Infantil. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1999.

BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/ SEF, 1998. Vol 1, 2 e 3.

BROUGÈRE, G. Brinquedo e Cultura. São Paulo: Cortez, 1994.

JUNDIAÍ (SP). Secretaria Municipal de Educação. Proposta Curricular Jundiaí: educação


infantil de 4 a 5 anos — Jundiaí, SP: SMEE, 2011.

MOYLES, Janet R. Só brincar? O papel do brincar na Educação Infantil. Porto Alegre:


Artmed, 2002.

NERY, Alfredina. Modalidades organizativas do trabalho pedagógico: uma possibilidade.


In: Brasil, Ministério da Educação. Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para
inclusão da criança de seis anos de idade. Brasília: MEC/SEB, 2007.

Revista Pátio. Brincar e aprender. Abril/Jun 2011 (foram usados todos os artigos, mas foi
citado apenas FORTUNA, Tânia Ramos. O lugar do brincar na Educação Infantil. p. 8-10).

SÃO PAULO (SP). Secretaria Municipal de Educação. Diretoria de Orientação Técnica.


Orientações Curriculares: expectativas de aprendizagens e orientações didáticas para
Educação Infantil. Secretaria Municipal de Educação – São Paulo: SME / DOT, 2007.

VYGOTSKY, Lev Semenovich. Interação entre Aprendizado e Desenvolvimento. In:


VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos
processos psicológicos superiores. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

SITE

http://www.ibmcomunidade.com.br/kidsmart/detleitura (“Projeto IBM - Kidsmart Brasil:


material de apoio à formação - cantos de atividades diversificadas”).

46 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

7
Classificando
blocos lógicos15

No início de 2011, realizei um diagnóstico de matemática com as crianças da Fase IV da


EMEB Emerson Cruz Machado, com o intuito de levantar as aprendizagens relaciona-
das ao Eixo Grandezas e Medidas. Diante desse diagnóstico, percebi a necessidade de
um trabalho sistematizado envolvendo a classificação de objetos, visto que os alunos não
apresentaram conhecimentos sobre as estratégias de classificação.

Envolvida nessa necessidade do trabalho com a matemática e frente às expec-


tativas de aprendizagens voltadas para a classificação, foi planejada uma sequência
didática com este foco. Esta proposta de trabalho visou a exploração de uma grande
variedade de ideias matemáticas através do lúdico, incorporando os contextos de ex-
periência e linguagem natural no desenvolvimento dos alunos.

As atividades propostas estavamorganizadas segundo um ambiente de inves-


tigação, exploração, interação, socialização e troca de informações presentes o tem-
po todo. Exemplos: separação por blocos parecidos, classificação dos objetos pela
cor, classificação por tamanho, etc.

Ao propor essas atividades para as crianças, pensei em realizá-las de maneira


gradativa, trazendo a cada dia um desafio diferente, para que as crianças pudessem
ir além do que conheciam, fazendo as interferências no sentido de levar cada alu-
no a ampliar progressivamente suas noções matemáticas. As crianças participaram
ativamente das situações propostas, algumas compreendiam e realizavam a ativi-
dade com maior autonomia, outras necessitavam da minha intervenção e então eu
explicava, dava exemplos, questionava, para elas pudessem estabelecer estratégias
para classificar.

Segundo Smole (2000), o professor precisa saber também que os alunos neces-
sitam de um tempo para desenvolver os conceitos e as ideias matemáticas trabalhadas
na escola. Essas ideias e conceitos se desenvolveram através do trabalho pontual e das
intervenções que realizei no decorrer das atividades que propus.
15. Professora da Fase IV-D, Cheila Cristiane Azevedo Rogério, da EMEB Emerson Cruz Machado.

47
Fiquei surpresa quando percebi que, mesmo em outras situações de sala de aula,
os alunos começaram a classificar os objetos, como ao usar os blocos de montar nos
cantos de atividades diversificadas ou ao guardar os brinquedos. Sendo assim, avalio
que o trabalho desenvolvido foi significativo, possibilitando às crianças que utilizas-
sem o que foi aprendido em diferentes situações, ou seja, a classificar os objetos da
mesma classe por critérios diferentes (tamanhos, cores, espessuras e formas).

De acordo com Smole (2000), afirma que, é fundamental que as crianças sin-
tam-se participantes num ambiente que tenha sentido para elas, para que possam
engajar-se em sua própria aprendizagem. O ambiente da sala de aula pode ser visto
como uma oficina de trabalho, sendo este um espaço positivo, com muita comu-
nicação. E essa foi a maior aprendizagem que tive, pois percebi que as atividades
de classificação faziam sentido para as crianças num contexto de troca e interação,
envolvidas em um espaço prazeroso, acolhedor, de trabalho sério e organizado.

Considero esse trabalho produtivo e pretendo desenvolver no próximo ano


letivo, adaptando e reavaliando a minha prática, sempre que surgir algo inesperado.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


SMOLE, Katia Stocco. Uma primeira conversa: uma proposta de matemática para a educação
infantil. In: Brincadeiras infantis nas aulas de Matemática. Porto Alegre: Ed. Artmed. 2000.

48 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

8
Marcando a rotina
no calendário16

No início do ano letivo de 2011, as crianças dos 1° anos da EMEB Emerson Cruz Ma-
chado realizaram uma atividade diagnóstica elaborada pela Diretoria de Educação,
através da qual os professores mapearam os conhecimentos de seus alunos para, a partir
desses levantamentos, elaborem seus planos de ação. Diante dessa avaliação, as profes-
soras dos 1° anos analisaram que os alunos necessitavam de intervenções quanto ao uso
do calendário em relação à leitura de informações (dia da semana e dia) de forma que
pudessem consultá-lo com propriedade.

Sendo assim, pensamos no que poderia ser feito para que os nossos alunos
pudessem aprender a fazer uso do calendário. Levamos a discussão para a nossa
assessora pedagógica, que sugeriu o trabalho com calendário através de ativida-
de permanente, visto que essa modalidade tem como objetivo criar hábitos nas
crianças, considerando a gradação do trabalho para cada fase/ano, como também
deu algumas sugestões orientada pelas formações realizadas pela Diretoria de
Educação e coordenadas pela assessora externa de matemática, como: calendário
ampliado, preenchimento das datas no caderno, legenda dos códigos combinados
com os alunos, marcação de datas etc.

O grupo de professores em reunião de HTPC definiu que a atividade seria


desenvolvida ao longo do ano e deveria ocorrer diariamente, tendo início com a
confecção de um calendário para marcações da rotina vivenciada na escola. No
início de cada mês a professora teria que levar para sala de aula um cartaz com as
divisões do calendário (semana e dia) e coletivamente preencher com os alunos,
tendo como base o calendário convencional. Após o preenchimento do calendário
coletivo, foi elaborada uma legenda para os acontecimentos do mês como: dias em
que não houve aula, aulas de informática, arte e educação física, dias de parque,
finais de semana, aniversariantes do mês e outros eventos que pudessem ocorrer.
Elaborada a legenda, cada aluno preenche o seu próprio calendário e cola no ca-
derno, fazendo o acompanhamento diário juntamente com o coletivo: falando so-
bre que dia é hoje, e que dia será amanhã, em que dia da semana estamos ou em
que mês e ano estamos. Com esse trabalho as crianças aprendem a fazer uso do
16. Professora Tatiana Rocha da Silva Portugal, do 1º. ano E, da EMEB Emerson Cruz Machado.

49
calendário, identificando os dias da semana, mês e ano explorando o calendário e
também antecipando, recordando e descrevendo oralmente sequências de aconte-
cimentos referentes ao período de um dia.

Aprendi que, através das atividades diárias de uso do calendário, podemos


ensinar e contextualizá-lo de forma que o aluno possa reconhecer o mesmo como
um instrumento para consulta de tempo e espaço. Essa experiência que tive esse
ano com o calendário foi muito satisfatória, pois observei que os meus alunos
aprenderam a consultar o calendário, além de criarem estratégias, tais como ver
quantos dias faltam para o passeio ou para algum evento, verificar o calendário para
a construção da rotina ou do cabeçalho e até mesmo para verificar a atividade do
dia como: parque, aula de especialista ou dia do brinquedo.

É importante poder dizer que os meus alunos aprenderam a fazer o uso do


calendário. Acredito que essa experiência poder ser retomada em outras situações,
diante das necessidades das novas turmas.

50 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

9
Vitrine de Livros17
Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros. Sem li-
vros, sem leitura, os nossos filhos serão incapazes de escrever - inclu-
sive a sua própria história.
BILL GATES

Garantir o acesso à leitura em qualquer momento da vida de qualquer pessoa é


uma questão política e um direito de todo cidadão. Partindo deste pressuposto, a
escola, enquanto instituição social responsável por ensinar a ler, ganha relevância
crucial e o investimento na educação, deixando de ser uma escolha, passa a ser
uma necessidade que interfere diretamente na qualidade de vida da população de
qualquer país. Portanto, ressaltar a importância do trabalho com leitura para as
crianças desde cedo na Educação Infantil se faz extremamente necessária, se o que
pretendemos enquanto educadores é formar sujeitos que possam fazer uso das vá-
rias práticas de leitura desenvolvidas na escola.

Foi refletindo sobre esta tarefa do professor na escola que a assessora pedagógica
da EMEB Emerson Cruz Machado trouxe como estudo em HTPC, no ano de 2009, o
Projeto Clube de Leitura, que faz parte do Projeto Estudar pra Valer, que é desenvolvido
na rede de Cajamar pelas escolas de Ensino Fundamental do 2º ao 5º ano.

Fizemos a leitura e o estudo do projeto e planejamos as situações ali pro-


postas (ler e ouvir, baú do tesouro, vale a pena ler, vitrine de livros e recontando
histórias). Socializamos com o grupo as situações e levantamos quais aprendiza-
gens cada uma delas ajudaria nossos alunos se desenvolverem. Feito este estudo,
a assessora pedagógica colocou como sendo fundamental que estas atividades
do Clube de Leitura fizessem parte do planejamento das professoras e fossem
incorporadas ao plano de ação.

Coloquei as propostas em meu planejamento, mas a Vitrine de Livros foi


a que mais me chamou atenção, pois o principal objetivo era despertar o gosto
pela leitura e o uso de critérios para a escolha de livros.

17. Relato de experiência da Professora Beatriz Mattos de Morais Cunha, 1º ano do Ensino Fundamental 2011,
EMEB Emerson Cruz Machado.

51
Na primeira vez em que realizei a Vitrine de Livros com os alunos, organi-
zei os livros de literatura infantil e gibis do acervo da escola no pátio em forma
de vitrine, um ao lado do outro, para que pudessem ser visualizados todos os
portadores ali expostos. Convidei os alunos a lerem. Cada um deveria escolher
o que mais lhe chamasse atenção e eles poderiam trocar de livros sempre que
quisessem, sem a obrigação de ler o livro ou gibi até o fim, pois o meu objetivo
era desenvolver o gosto pela leitura e os critérios de escolha.

Como era uma atividade permanente (aproximadamente 30 minutos, uma


vez por semana), a cada semana eu pedia ao ajudante do dia que organizasse os
livros no pátio para que os amigos da sala pudessem pegar para ler.

Em determinados momentos eu leio também um livro de minha escolha para


que seja despertado o interesse do aluno e que ele possa me ter como um modelo
de leitor. E em outros momentos acompanho a leitura feita pelas crianças ou mes-
mo leio para eles e eles leem para mim.

Terminado o tempo estabelecido, os alunos voltam para a sala de aula e eu os


convido a falarem sobre como foi a escolha do livro, porque escolheram determi-
nado livro, o que lhes chamou atenção, se gostariam de contar para os amigos ou
mesmo sugerir que os amigos escolham aquele livro.

Este é um momento onde o aluno fica livre para falar se tiver vontade, pois o maior
objetivo desta atividade é proporcionar o contato com os livros despertando o gosto
pela leitura de forma prazerosa, sem ter que ler porque algo lhe será cobrado. Ele pode ler
algumas palavras, olhar as imagens, ler o livro até o meio, ler sozinho ou com os amigos.
É um momento para apreciar os livros e perceber que ler é bom.

Gostei bastante do trabalho com a Vitrine de Livros, pois os alunos puderam


manusear os livros, fazer antecipações e verificações de leitura, usar critérios para
escolha, enriquecer o seu vocabulário, ampliar o mundo de ideias e conhecimentos
desenvolvendo a linguagem e o pensamento e, o mais importante, foi despertado
o gosto e interesse pela leitura. Até porque, em se tratando de uma atividade per-
manente que tem como objetivo criar hábitos e, neste caso, o de ler mesmo que
de forma não convencional, despertando o gosto pela leitura. Os resultados com
o decorrer do ano foram observados levando em consideração a participação dos
alunos nas vitrines e mesmo durante as intervenções para que os momentos acon-
tecessem; o esforço para começar a ler, a autonomia quando conseguiam decodifi-
car o que estava escrito, recontar e expor suas opiniões. Esse processo foi bastante
gratificante e pretendo dar continuidade nos próximos anos.

52 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Para que uma criança obtenha o interesse pela leitura, é necessário


que ela entenda que a leitura não é uma obrigação e sim uma satis-
fação. O interesse pela leitura começa antes mesmo de seu ingresso
em uma escola, pois a criança tem uma curiosidade natural por tudo
que a cerca. A leitura deve ser vista como uma atividade prazerosa
e não algo que lhe seja doloroso.

Eu, enquanto professora, pude observar a cada dia o interesse maior dos alu-
nos durante os momentos de leitura, a cobrança dos alunos para que os momentos
acontecessem, o interesse com que manuseavam os livros, os comentários entre os
colegas sobre determinado livro. Pude aprender a grande importância de incenti-
vá-los a esse mundo da leitura.

COMO INCENTIVAR A LEITURA NAS CRIANÇAS

1. Para começar, é necessário que a criança veja, sempre que possível, um


adulto com um livro na mão. As crianças sentirão mais interesse por ler
um livro se vêem que este hábito está presente ao seu redor. As crianças
gostam de copiar. É sua forma de aprender. Se eles notam que você gosta
de ler e que tratam os livros com cuidado e respeito, elas provavelmente
farão o mesmo.
2. É necessário estar convencido de que a leitura deve ser empregada
como uma forma a mais de diversão e não como uma obrigação. Os livros
não devem ser introduzidos no cotidiano da criança só quando ela está
aprendendo a ler ou somente quando entra na escola. O contato com os
livros deve começar bem antes. Eu diria que antes mesmo de começar a
engatinhar.

53
10
Conscientização da Importância
da Preservação da Natureza e
de uma Alimentação Saudável18

O Projeto Horta nasceu da necessidade de sensibilizar e conscientizar as crianças de que


a vida depende do ambiente e o ambiente depende de cada cidadão deste planeta. Ou-
tros objetivos também pautaram as ações do projeto: despertar o interesse das crianças
para o cultivo de horta e conhecimento do processo de germinação. E proporcionar mo-
mentos que ajudem na conscientização da importância de estar saboreando um alimen-
to saudável e nutritivo.

O planejamento do projeto foi elaborado de modo que os alunos acompanhessem


todas as etapas do cultivo, participando diretamente de cada uma delas.

O desenvolvimento teve início com uma roda de conversa na sala, com le-
vantamento dos conhecimentos prévios: a professora mostrou hortaliças e ques-
tionou o grupo se eles conheciam, alguns disseram o nome da hortaliça e ou-
tros não conheciam ou disseram outros nomes; na sequência foi feita uma
visita ao espaço da horta reconhecendo o espaço em que seria feito o plantio;
nessa etapa ainda foi retomada a roda de conversa e abordadas questões como ‘O que é
uma horta?’, ‘Para que Serve?’, ‘O que se pode plantar nela?’, ‘O que as crianças gostam?’;
foram apresentados fotos de hortaliças e os instrumentos que foram utilizados para
construir os canteiros e afofar a terra para a semeadura; como manusear a enxada, a pá,
o ancinho, os regadores, a mangueira, as sementes, as mudas e desmanchar os terrões.

Uma vez garantido que as crianças estavam apropriadas do espaço e do pro-


cesso a ser vivido, deu-se continuidade com a apresentação das sementes es-
colhidas pelos alunos: alface, almeirão, rúcula, algumas flores na beira do can-
teiro. Foram explicadas as características e o valor nutricional das hortaliças
e para que servem as vitaminas contidas nelas. Lembrando que são crianças
de 03 anos, curiosas, que ouvem e perguntam sobre o assunto. Dessa forma as crianças
estudam as ciências na prática. A vivência deste projeto é uma experiência muito rica
para os alunos e alunas, instiga a curiosidade e introduz as noções de ciências naturais
desde a Educação Infantil.
18 Autoria? EMEB Profª Franceli de Fátima Missé Nascimento.

54 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Ver a alface nascer, crescer e depois comê-la possibilita às crianças uma noção
bem diferente daquela que elas vivenciam ao acompanhar a mãe ao supermercado
e depois degustar. Nessa ela tem participação ativa, tem autoria e isso a motiva ain-
da mais para a degustação de alimentos sem a presença de agrotóxicos.

Enquanto profissional da educação também aprendo com as crianças, estu-


do com os alunos e aprendemos juntos. Hortas escolares são instrumentos que,
dependendo do encaminhamento dado pelo educador, podem abordar diferentes
conteúdos de forma significativa, contextualizar e promover experiências que res-
gatam valores.

A interação entre professora, alunos, funcionários e comunidade é um traba-


lho que perpassa toda a proposta, etapas previstas na elaboração do Planejamento
Anual realizada no início do ano letivo, além de promover uma formação para há-
bitos saudáveis, aprendemos a cuidar bem da natureza e resgatamos valores como
a solidariedade, importante para o trabalho em grupo.

“Tudo o que existe e vive precisa ser cuidado para continuar a existir e a
viver: Uma planta, um animal, uma criança, um idoso, o planeta Terra”
(Leonardo Boff).

De acordo com o filósofo Leonardo Boff, o cuidado é uma “essência do huma-


no” e se apresenta como uma possibilidade numa nova relação entre o ser humano
e a natureza. Neste trabalho, esta essência está sempre presente, pois, na horta,
temos que cuidar das plantas, da terra, dos animais, da água, do ar e de tudo que
nela aparece. Explorando o Projeto Horta, a criança aprende a plantar e cuidar de
uma planta. Para uma criança de 3 anos é uma responsabilidade enorme, a criança
se sente feliz e útil, pois ela aprende a preservar o meio ambiente cuidando daquela
planta, acompanhando o seu crescimento e também degustando, o que favorece a
criação de hábitos saudáveis de alimentação.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


Gadotti, Moacir. Boniteza de um sonho - ensinar e aprender com sentido. Editora Instituto
Paulo Freire.

Brasil, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Curricular Nacional Para Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF,1998.

SITE
(http://www.hortaviva.com.br/EMPRESA/portfolio_cst/0002/programa.htm). Fevereiro 2012.

55
11
Construindo o livro
a partir do conto "Branca
de Neve e os sete anões"21

COMO NASCEU O PROJETO?


A partir do hábito diário de leitura incluído nas atividades permanentes do tra-
balho pedagógico realizado com a Fase II. Os alunos matriculados tem idades entre 1
ano e meio e 2 anos e meio; residentes em chácaras ou sítios, a uma distancia razoável
da escola o que ocasiona a necessidade do transporte escolar. Os alunos são nascidos na
sua maioria no próprio Município de Cajamar e frequentam os mesmos locais para lazer.

Nós professoras oferecemos vários gêneros de leitura, dentre eles os contos.


O Trabalho é feito a partir da construção do Plano de Ação após observação da
necessidade da sala, o Plano possui embasamento no Referencial Curricular Na-
cional para Educação Infantil.

Ao observarmos o encanto, a curiosidade e criatividade das crianças com a lei-


tura dos contos, numa de nossas rodas de leitura eu elaborei a rotina da semana com
a leitura do Conto Branca de Neve e os Sete Anões. Organizei e realizei a leitura do
livro pausadamente nos dia da semana, focando o antes, durante e após a leitura. A
rotina é construída a partir do Plano de Ação e esse trabalho com os contos está in-
cluído na proposta com a leitura, como prática de letramento, e tem como objetivo
auxiliar e direcionar as crianças para uma aprendizagem com qualidade e prazer.

A ideia de construir o livro surgiu pelo encantamento das crianças a cada pá-
gina lida: era como mágica, as crianças ficavam eufóricas, a curiosidade aumenta-
va, todas as meninas diziam ser a Branca de Neve, daí surgiram muitos anões e tam-
bém príncipes em nossa sala. Todos, meninas e meninos ficaram envolvidos nes
se trabalho. Já trabalhamos outros contos em sala como: Chapeuzinho Vermelho, Os
três porquinhos, entre outros, porém esse conto da Branca de Neve se destacou.

Ferreiro (1989, p. 98), cita que “não existe idade para aprender a ler e que a
leitura e a escrita constituem um processo que começa cedo”. Neste sentido, a autora

56 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

afirma que as crianças iniciam sua aprendizagem do sistema de escrita muito cedo,
nos mais variados contextos e acrescenta que a criança trabalha cognitivamente
(isto é, procura compreender) desde muito cedo informações das mais variadas
procedências: os próprios textos nos respectivos contextos em que aparecem (em-
balagens, cartazes de rua, tv, peças de vestuário, assim como livros e periódicos);
informação específica destinada às crianças (alguém lê uma historia para elas, diz-
-lhes que esta ou aquela forma é uma letra ou um número, escreve seu nome para
elas, etc.); informação obtida através de sua participação em atos sociais dos quais
fazem parte o ler e escrever.

Assim, sugeri para as crianças, a confecção do Livro sendo os personagens as pró-


prias crianças, e, todos se envolveram na elaboração do livro do começo ao fim.

Desde os primeiros anos de vida as crianças já estão expostas como espec-


tadoras ao letramento, pois as crianças são curiosas, querem saber, já vêm para a
escola com uma carga de conhecimentos prévios, de hipóteses sobre a leitura e
escrita quepercebem no mundo. Deste modo, cabe a nós como profissionais da
educação saber realizar esta complexa tarefa, uma vez que as especificidades nesta
faixa etária são complexas. No caso das crianças da comunidade rural, geralmente
é na escola que vivem essa experiência.

COMO FOI EXECUTADO?


Em roda, com as crianças sentadas e acomodadas no tapete no chão; realizamos uma
conversa sobre os personagens da nossa história. Nesse momento as crianças escolhiam
qual personagem queriam ser.

A professora trouxe figuras dos personagens e com as fotos dos rotos das crian-
ças que tínhamos em sala, colamos no personagem escolhido. Nessa atividade todas as
crianças se envolveram, porém as crianças ficam livres para participarem das diversas
atividades oferecidas no nosso dia-a-dia.

A professora colou os personagens com cola quente, em seguida anotou a história


no portador, sendo também a escriba.

As crianças iam contando a história a sua maneira, ao mesmo tempo em que


a professora fazia questionamentos para instigar a curiosidade e a atividade das
crianças. Houve muito envolvimento das crianças nesse processo de construção,
cada uma com seu relato.

A cada página elaborada as crianças foram ilustrando com pinturas a dedo, for-
mando árvores, flores, borboletas, animais etc...
57
Terminada a história juntamos as páginas e a professora levou para encadernar
deixando folhas livres no fim do livro para socializar com os pais e permitir que deixas-
sem seus depoimentos.

As crianças observaram as coisas conhecidas e desconhecidas, conhece-


ram os personagens, comentaram, perceberam detalhes e vivenciaram a história
instigadas pela sua imaginação e curiosidade. Expandiram as possibilidades ima-
ginativas. Acredito que a Educação Infantil deva atender as crianças em todas as
dimensões de sua personalidade sejam elas emocionais, afetivas, sociais, físicas ou
intelectuais. É preciso considerar as especificidades da faixa etária e proporcionar
um ambiente estimulante, rico em desafios, no qual a criança possa desenvolver
habilidades de leitura, todas as suas potencialidades e ampliar seu universo cultural
por meio do aprendizado da leitura e da escrita.

A escola pode e deve alimentar esse saudável apetite de faz de conta infantil.
E nós professores usarmos de nossa criatividade para oferecer diferentes contextos
e oportunidades de ampliar a fantasia. Assim, construímos nosso livro juntos a
partir da criatividade de cada um. Conclui que a leitura dos contos servem de en-
cantamento e aguçam a imaginação dos pequenos.

Tivemos um retorno maravilhoso dessa experiência, as crianças ficam felizes


com a leitura do livro, cuidam do livro e adoram levar para casa para os pais e familiares,
assim como podemos observar na socialização com as crianças dos relatos de depoi-
mentos escritos pelos pais. Esse livro também vai ficar como acervo para nossa escola.

Paulo Freire afirma que o educador humilde percebe que educar é deixar-se
educar pelo educando e sua realidade. A rotina com a leitura proporciona estabili-
dade e segurança, ao ouvir e falar a aprendizagem.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


Lerner, Delia. Ler e escrever na escola - o real, o possível e o necessário. Porto Alegre (RS):
Editora Artmed; 2002.

FERREIRO, Emilia. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 1989.

Pátio Educação Infantil,ano I,nº1,abril/julho,2003.Revista,pag.29.


Fotos das crianças devidamente autorizadas pelos responsáveis.

58 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

12
Família na escola:
angústia ou prazer?19
Aproximar os pais da escola é, sem duvida, uma das principais saí-
das para enfrentar os desafios que estamos expostos na área edu-
cacional. Essa aproximação tem como principal objetivo beneficiar
o aluno, a família, o professor e a escola.
(GALUZZI, 2004, p. 15)20

No mundo contemporâneo, a família e a escola desempenham papéis pri-


mordiais à formação, desenvolvimento e educação de crianças e adolescentes. Nos
últimos 50 anos muito se falou dos direitos destes: internacionalmente, a Declara-
ção Internacional dos Direitos das Crianças, de 1958 e 1989, da ONU; no Brasil, o
Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, entre outros que também trataram
sobre o assunto. Estes documentos são marcos na história que garantem tanto a
defesa como a promoção dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes,
cuja responsabilidade maior é da família, do Estado e da sociedade. No entanto,
a realidade ainda está longe de refletir o proposto nos textos legais. Via de regra a
família é a grande responsabilizada pelas mais diferentes questões que atingem as
crianças e adolescentes, tais como drogas, violência, maus tratos, abusos, agressões
verbais, bullyng, entre outros.

Nas ultimas décadas, a visão de família sofreu algumas mudanças. A ideia de


família composta de pai, mãe e filhos já não é mais a mesma e exige da escola uma
mudança de paradigma.

Segundo o RCN (p.75):

Visões mais atualizadas sobre a instituição família propõe que se rejei-


te a ideia que exista um único modelo. Enfoques teóricos mais recen-
tes procuram entender a família como uma criação humana mutável,
sujeita a determinações culturais e históricas que se constitui tanto
em espaço de solidariedade, afeto e segurança, como em campo de
conflito, lutas e disputa.
Sendo assim é preciso que a escola constitua um novo conceito de família,
___________
19. Texto produzido por Rosenilde Mota Lisboa (Diretora da EMEB Bairro do Gato Preto) e Camila Claro de Oliveira
(Assessora Pedagógica da EMEB Bairro do Gato Preto).
20. GALLUZZI, C. S. Propostas para Reunião de Pais. São Paulo: Edicon, 2004.

59
que admita essa diversidade em constante mudança e recupere a responsabilidade
de ambas que é o de cuidar, educar, levando as crianças e adolescentes à autono-
mia social, moral e emocional. Para que isso ocorra, a escola precisa favorecer a
participação da família dentro da perspectiva da gestão democrática, favorecendo
a tomada decisões conjunta e de forma participativa.

A escola é junto com a família, a instituição social que maiores reper-


cussões têm para a criança. Tanto nos fins explícitos que persegue ex-
pressos no currículo acadêmico, como em outros não planejados [...].
(CUBERO, 1995, p. 253)

Em 2007, com meu ingresso nesta unidade escolar passei observar e acom-
panhar todos os preparativos para a reunião de pais como a definição das datas,
elaboração de convocação, mapeamento das expectativas, dúvidas etc. O compor-
tamento dos pais perante a escola também foi minuciosamente observado. Os pais
não acreditavam na escola, apareciam somente para reclamar e até mesmo brigar
com professores, funcionários e direção. Nesse sentido, presenciei algumas mães
que, após deixar seus filhos na escola, se escondiam atrás das árvores e ficavam ob-
servando para certificar de que havia olhares de adultos sobre seus filhos. Quando
chegava o dia da reunião, dificilmente era um momento tranquilo, uma vez que
sempre havia comentários dos professores de que a presença não era a esperada
e que os pais que precisariam comparecer não estavam presentes. Durante as reu-
niões também havia momentos desconfortáveis, como pais reclamando a todo o
momento da organização da escola, que era ruim etc. Enfim, era pai insatisfeito de
lá e escola insatisfeita de cá! Ambos desconhecendo seu papel como nos mostra o
relato21 abaixo:

Olá, é com muita alegria e satisfação que venho por meio deste compar-
tilhar com todas as pessoas que vierem a ler essas entrelinhas o grande
amadurecimento pedagógico e visual que a escola EMEB BAIRRO DO
GATO PRETO obteve durante os anos letivos de 2005 até o presente ano
de 2011. Na verdade faz algum tempo que me socializo com essa uni-
dade escolar, desde o ano de 2006, quando tive a oportunidade de ma-
tricular meu filho, na época com 03 anos de idade na Fase IV. Quando,
então, passei a ter mais contato com a equipe escolar, fazendo parte,
então, da APM (Associação de Pais e Mestres). Nesse mesmo período,
pude perceber quantas dificuldades essa unidade escolar vinha obten-
do. Era troca de professores quase todo o ano letivo. Reuniões de pais,
se na sala eram 20 alunos, apareciam somente no máximo seis (pais).

Eu ficava indignada, pois muitas eram as críticas que se ouviam da pe-


___________
21. Mãe de dois educandos matriculados na escola: um educando da 4.ª série e uma educanda da Fase V. Sempre
presente na escola, acompanha o trabalho realizado nesta unidade desde 2005. Deste processo, sentiu a
necessidade de desenvolver um relato que mostrasse o progresso vivido nesta escola.

60 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

quena escola do Gato Preto. A equipe escolar trabalhava para mudar a


imagem de nossa escola, mas a cada dia que se tentava eram pais cada
vez mais descontentes e desesperançosos com as tentativas em vão da
equipe escolar. Presenciei até mesmo pais bem alterados no portão e em
sala aula. Era ônibus escolar que não tinha! Eu mesma cheguei a pagar um
transporte particular para transportar meu filho até a escola.
Mas, enfim, mais um ano letivo estava terminando e parecia que os
esforços da equipe escolar tinham sido em vão. Já no fim desse mesmo
ano os pais receberam um bilhete comunicando que a equipe escolar
iria trocar a direção. E que seria para o bem de nossa unidade escolar,
na verdade eu mesma não acreditava que nossa unidade escolar pode-
ria melhorar com tantas trocas que poderiam e iriam ocorrer no novo
ano que se iniciava. Pois bem, chegamos ao ano de 2007.
Ainda me lembro da primeira reunião de pais: quando a professora
anunciou que a nova diretora iria se apresentar dali alguns instantes,
ouvi uma voz que dizia: ‘Bom dia, pais, me chamo Rose e fui agracia-
da a fazer parte dessa equipe escolar, irei fazer tudo que estiver em
meu alcance para obtermos grandes resultados em nossa unidade es-
colar. Conto com vocês, pois acredito que será uma grande experiên-
cia para nós todos. Me ponho à disposição de vocês’. Olha, na verdade
eu esperava entrar na sala uma pessoa bem mais velha, mais áspera.
Quando olhei para a Rose, pensei comigo: como ela é novinha, meu
Deus. Será? Pois todas as outras pessoas que já haviam passado por
ali não tiveram um resultado satisfatório, será que ela conseguiria??
Pois bem, fui convocada para a primeira reunião da APM. Como era bo-
nito ver o entusiasmo e os projetos que aquela mulher com seu jeito
simples e cativante foi nos oferecendo. Ela era bem astuta, pois chega
de mansinho e quando nos damos conta, pronto, estamos envolvidos
nos projetos escolares de nossos filhos. Foi lindo pode ver e sentir as
mudanças que essa mulher batalhadora fez nessa unidade escolar. É
como se fosse uma criança no ventre da mãe que a cada dia se traça
um pequeno traço. Em um dia se traçava um alegre bom dia, no outro
um lindo convite gentil para os pais, as nossas crianças sendo tratadas
como crianças com capacidades acima de suas próprias expectativas,
uma grande reforma de encher nossos olhos foi feita na nossa escola.
Projetos que saíram do papel e passaram a fazer parte do dia a dia de
nossas crianças.
Os pais passaram a ser mais presentes na vida escolar de seus filhos.
Ela conseguiu trazer para nossa unidade escolar um brilho de esperan-
ça, nos ensinou a ser perseverantes, nos ensinou que nunca devemos
desistir de lutar. Grandes foram as dificuldades que você enfrentou,
mas maiores ainda foram suas conquistas.
É com muita satisfação que eu, como mãe, venho por meio dessas en-
trelinhas lhe agradecer, senhora diretora, por seu empenho e dedica-
ção a essa unidade escolar.

Diante dessas questões entrei num tremendo conflito e refleti: como realizar
61
uma gestão mais democrática? Abrir os portões para a comunidade é suficiente?
Promover a flexibilização de um currículo que valoriza a participação significa só
abrir tais portões? Como mexer na prática de professores que possuem crenças
cristalizadas sobre a presença dos pais na escola? Eis a questão!

Construir uma gestão democrática exige tempo, planejamento e dá mais trabalho


do que simplesmente agir de forma diretiva. Contudo, os ganhos são enormes! Há o
consenso de que, para gerar um ambiente no qual todos atuem para alcançar o objetivo
comum de garantir a aprendizagem, o diretor precisa desenvolver algumas competên-
cias que são simples na definição, mas complexas na execução, como saber ouvir e levar
em considerações ideias, opiniões e posicionamentos divergentes. Criar esse ambiente
democrático que une participação e ação, é um dos principais desafios da educação
contemporânea e um dos caminhos necessários na busca pela qualidade do ensino.

Partindo desse pressuposto, foram realizados muitos estudos e discussões sobre o


tema da participação dos pais e algumas ações foram estabelecidas, tais como:

a- planejar a reunião de pais em grupo, com a participação dos professores e


da direção, permitindo momentos de reflexão, o amadurecimento do gru-
po por meio de ouvir, falar, aceitar divergências, buscar soluções, assumir
erros e acertos;
b- organizar um ambiente aconchegante, excluindo as fileiras, de modo a fa-
vorecer a interação dos pais;
c- realizar sempre um acolhimento por meio de dinâmica ou leitura de um
texto;
d- elaborar pautas para todas as reuniões, pois é uma referência de padrão
de organização da escola. Nessas pautas o objetivo principal é a discussão
sobre a aprendizagem dos alunos que se explicita nos projetos realizados
ao longo do ano letivo de acordo com a série ou ano do filho. É uma ação
que visa a participação significativa diante da compreensão dos processos
de ensino e aprendizagem;
e- ter a lista de presença, visto que esta ação não ocorria, para analisar de for-
ma qualitativa apontando: qual reunião tem maior participação de pais?
Por quê? Será que o horário está sendo adequado?;
f- preparar em cada reunião um lanchinho especial, pois essa organização si-
naliza aos pais que antes da sua chegada houve intenção e responsabilidade
em recepcioná-los, acolhê-los e afagá-los;
g- elaborar um convite, enfatizando a importância da presença dos pais na
reunião, aspecto este que rompe com o paradigma da obrigação pela par-
ticipação entremeada ao recebimento de uma convocação fria e sem vida
que contraria todo e qualquer movimento na escola que prima pela singu-

62 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

laridade dos alunos;


h- socializar experiências, encorajar o grupo diante das estratégias encontra-
das por alguns professores e pais;
i- socializar experiências, encorajar o grupo diante das estratégias encontra-
das por alguns professores e pais;
j- avaliar o trabalho refletindo: tudo transcorreu bem? Se isso aconteceu, óti-
mo! Se algo não foi bem, rever os pontos fortes e fracos.

Os pais também fazem suas avaliações sobre o encontro, pois para a escola é um
instrumento de levantamento de dados relevantes sobre o trabalho de toda equipe es-
colar, da organização do espaço, das aprendizagens de seus filhos como nos mostra o
trecho a seguir:

Primeiramente gostaria de agradecer por tudo. A minha filha foi além do


que esperava, nas produções, no desempenho e em tudo. E isso vem do
trabalho do professor, pois o professor é o seu espelho. Com certeza o mé-
rito é todo seu, Adriana! Parabéns pelo trabalho, obrigada pelo carinho,
dedicação, paciência [...]. Parabéns também à equipe do Gato Preto.22

Os retornos por parte das famílias nos animaram a continuar inovando e bus-
cando novos desafios. Os alunos começaram a responder de forma satisfatória ao
perceberem que a escola e a família estabeleceram um vínculo de confiança.

Atualmente estamos no processo de reorientação curricular e sabemos que dentro


de um currículo crítico a participação de pais não se restringe apenas às “reuniões
de pais”. Assim sendo, no início de 2011, durante uma avaliação do projeto políti-
co pedagógico, refletimos sobre quais as ações desenvolvidas até o momento que
estavam boas e quais poderiam ser acrescentadas para avivar ainda mais essa par-
ticipação. Foi a partir disso que surgiu a ideia do projeto Pai Nota 10. Esse projeto
tem como objetivo principal trazer o pai para o dia a dia da escola, para aqueles
momentos mais simples do cotidiano.

A ideia deu certo! Ao longo do projeto os pais que antes reclamavam das
ações da escola, começaram a participar mais ativamente das atividades/eventos
da escola, demonstrando prazer e entusiasmo em colaborar. Percebíamos que par-
ticipar fazia sentido para os pais, pois reconheciam que as ações contribuíam para a
aprendizagem dos alunos. Exemplos: mães confeccionam roupas para as apresen-
tações, tocar violão, fazer receitas etc.

___________
22. Mãe de dois educandos matriculados na escola: um educando da 4.ª série e uma educanda da Fase V. Sempre
presente na escola, acompanha o trabalho realizado nesta unidade desde 2005. Deste processo, sentiu a
necessidade de desenvolver um relato que mostrasse o progresso vivido nesta escola.

63
Segue abaixo o relato de um familiar explicitando um exemplo de parceria:

Nasci no bairro do Gato Preto. Éramos sete irmãos, todos estudaram


na escola do bairro, que na época era chamada Grupo Escolar João
Abdalla. Eu, em particular, comecei a estudar em 1963, fui reprovado
no primeiro ano, completei o quarto ano em 1968. Os anos foram pas-
sando, me tornei adulto, me casei, tivemos dois filhos: um hoje com
31 anos e outro com 23. Os dois, assim como minha esposa, também
estudaram na escola do bairro. Lembro–me até do nome da minha
primeira professora, dona Maria José, que vinha de longe para nos
ensinar. Quando meus filhos completaram o primário achei que teria
acabado meu vínculo com a escola. Estava enganado, muita coisa co-
meçou a acontecer. Comprei uma Kombi e comecei a fazer transporte
escolar (eu e minha esposa). Levávamos para escola do município e
principalmente no Gato Preto. Nesse período meu filho mais velho
já estava casado e tinha uma filha, que já estava na escola do bairro
desde o jardim, até hoje terminando a 4ª série. Só que nada dura para
sempre, o meu trabalho no transporte escolar veio a acabar. Pensei
que estava acabada minha relação com a escola, mas estava apenas
começando. Minha esposa passou no concurso de merendeira e foi
trabalhar na escola do bairro (a mesma que nós dois, nossos filhos e
neta estudaram). E com isso passei a contribuir com alguns trabalhos
na escola. Na festa junina fiz churrasco, no dia das crianças fiz algo-
dão doce, arrumava carteira, cadeira, fazia prateleira, tentava estar
sempre presente. Minha esposa, depois de dois anos trabalhando,
veio a falecer, mas meu vínculo com a escola continuou. Continuei
colaborando sempre com alegria, porque essa escola faz parte da
minha vida. Sinto muito orgulho de poder ser útil. Hoje também sou
coordenador da fanfarra. Já fiz três desfiles, dá muito trabalho, mas a
recompensa vem com o magnífico desfile que nossas crianças fazem
no 7 de Setembro. Nossa diretora que me pediu pra fazer um banco
tipo lápis que ela viu na revista e não é que fiz!? Esse foi o trabalho
mais recente que terminei! No entanto, tenho certeza que vou fazer
muito mais por essa escola, através desse trabalho, dessa convivên-
cia com as crianças, com professores, com a administração e fun-
cionários. Aprendi a amar o próximo, a respeitar e muitas vezes me
tornar uma criança também. Sou feliz em saber que faço um pouco,
mas que faz a diferença pra escola, para as crianças. Pra mim é grati-
ficante ver o sorriso das crianças quando faço alguma coisa pra elas,
principalmente da minha neta. Agradeço a Deus por isso!

Em 2012 realizaremos uma nova avaliação do projeto político pedagógico e,


nos encaminhamentos, sabemos que devemos ter um olhar mais crítico para esse
documento, pensando em algumas questões, tais como:
_________
23. Avô de educanda matriculada na escola, na 4.ª série, que relatou sua história de vida com relação a esta escola.

64 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

• Como inserir os pais nos processos existentes no universo escolar, tais


como acompanhar a aprendizagem dos alunos, zelar pelo uso significativo
do tempo pedagógico na escola e participar da gestão democrática da ins-
tituição escolar?
• Quais ações serão desencadeadas para que a participação seja ainda mais
efetiva?

Todas essas ações nos possibilitaram enxergar que a participação da família de


forma efetiva e significativa requer planejamento, organização, definição de obje-
tivos, de ações pontuais e, principalmente, ACREDITAR. A visão dos pais sobre a
escola melhorou, pois notam a aprendizagem dos filhos, chegam à escola “desarma-
dos” diante dos problemas a serem enfrentados, se posicionam durante as reuniões
de pais, registram suas impressões sobre a escola, vão atrás dos seus direitos para
que seus filhos tenham acesso a um ensino de qualidade, leem e conhecem mais
os seus direitos em termos de legislação. Os professores perceberam que, para ga-
rantir essa nova visão dos pais, foram necessárias mudanças na prática pedagógica.

Sabemos que ainda há muito trabalho a ser realizado em relação à participa-


ção da comunidade na escola, mas o primeiro passo já foi realizado. Acreditamos
nesse processo!

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


ALTHUON, Beate G., ESSLE, Corinna H.; STOEBER, Isa S. Reunião de Pais - sofrimento ou prazer?
São Paulo, Casa do Psicólogo, 1996.

BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.

GALLUZZI, Carmen Silvia Penha. Propostas para Reunião de Pais - estratégias e relatos de
casos. São Paulo, Edicon, 2004.

HEIDRICH, Gustavo. Rumo a democracia. São Paulo, Revista Nova Escola.

PASSONE, Eric F. Família ou Famílias?

65
13
Interação social entre as crianças
e o trabalho pedagógico25
Acreditando que a criança é um ser social desde o seu nascimento, e que a intera-
ção com o outro proporciona a aprendizagem e consequentemente amplia seus olha-
res para o mundo, o trabalho na EMEB Prof. Marcelo Antonio Ricomini Pascoal, que
atende crianças de 1 a 3 anos em período integral, foca o desenvolvimento social na
relação com o outro, sendo esta concepção parte integrante da rotina e do planejamen-
to semanal dos professores.

No início desse processo, as crianças da Fase I e da Fase II resistiam em se agru-


par com as crianças da Fase III ; sempre recorriam ao seu “porto seguro”, ou seja, às
professoras e monitoras, até porque elas não tinham oportunidades de se encontrar por
conta dos horários diferentes de rotinas (refeições e parque) fato que dificultava a cria-
ção de vínculos entre elas. A observação realizada sobre esse trabalho permitiu refletir
sobre como as crianças reagiam com os outros alunos das outras salas.

Uma vez que o objetivo dessa proposta era socializar os trabalhos pedagógicos
realizados em sala de aula para todas as crianças da nossa escola, com alguns segmentos
como monitores, estagiários, funcionários administrativos e gestores, os professores da
Fase III se reuniram em horário de HTPC para planejar ações que viabilizassem a cons-
trução de vínculos afetivos entre todos.

As ações planejadas estavam voltadas às áreas do conhecimento: movimento –


cambalhotas e rolamentos, bolas de vários tamanhos para quicar e jogar; arte – música
e danças do folclore brasileiro (Escravos de Jó, Imitação do Saci-Pererê, Bumba meu
Boi); brincadeiras – Amarelinha, Boca do Palhaço, Brincadeiras de Rodas; natureza e
sociedade – ensaio e organização para o desfile (interno) 07 de Setembro; Matemáti-
ca – circuitos e culinária (bolo de fubá, beijinhos, torta de abobrinha, brigadeiro etc.);
língua oral e escrita – leitura e contação de diferentes contos de fadas (Chapeuzinho
Vermelho, Os três Porquinhos, João e Maria, Patinho Feio). A escolha desses títulos
partiu das preferências das crianças. O espaço onde as apresentações ocorreram foi no
parque interno.

66 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

O dia da semana escolhido foi sexta-feira, pois tínhamos como critério que
nós, gestoras, estivéssemos na escola sem precisar nos ausentar por conta de com-
promisso de alguma reunião ou formação. Assim podíamos participar ativamente
destes momentos.

Nos planejamentos dessas socializações cada professora da Fase III escolhia


uma atividade (das já descritas acima) que tinha sido trabalhada em sala de aula
e levava para ser apresentada para todo o grupo. De acordo com essas opções, as
apresentações ora eram feitas pelos adultos, ora vivenciada pelas crianças.

Com o decorrer do trabalho, as professoras observaram um interesse maior


das crianças nas apresentações dos Contos de Fadas, até porque eram realizadas de
diferentes formas: teatro de fantoches e de sombras, contação com objetos, bem
como a dramatização dos contos pelos adultos.

Avaliando esse trabalho é perceptível o erro de não termos coletado com as


crianças suas opiniões, evidenciando seus desejos nas escolhas das apresentações.
A participação das crianças ganharia significado e mais vida.

A capacidade de realizar escolhas amplia-se conforme o desenvolvimen-


to dos recursos individuais e mediante a prática de tomada de decisões.
Isso vale tanto para os materiais a serem usados como para as ativida-
des a serem realizadas19

As apresentações foram realizadas pelos adultos (professores, monitores e es-


tagiários) por que eles também queriam oferecer oportunidades às crianças para
interagir com todos da escola. Sendo assim, pudemos observar que as crianças
aproximaram-se mais uma das outras e de todos os adultos da escola.

O desenvolvimento da capacidade de se relacionar depende, entre ou-


tras coisas, de oportunidades de interação com crianças da mesma ida-
de ou de idades diferentes em situações diversas20

Apesar de não termos o registro escrito de todo esse trabalho, avaliamos que,
diante das mudanças de comportamento das crianças, da maneira pela qual elas
reagiam e teciam comentários nos momentos das apresentações, acreditamos que
essa proposta atingiu o objetivo que havíamos planejado, sendo assim esse traba-
lho terá continuidade no ano de 2012.

19. BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil.
Formação Social e Pessoal. MEC, pág.39, 1998.
20. BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
Formação Social e Pessoal. MEC, pág.32, 1998.

67
14
Interação e participação:
sinônimo de sucesso30
Uma prática bem sucedida é aquela em que se percebe o envolvimento, a mo-
tivação das pessoas e os bons resultados durante e depois do processo.
Considerando isto, nós da equipe gestora da EMEB Prof.ª Maria Elce Martins
Bertelle, destacamos um projeto de Educação Física desenvolvido no contraturno,
no ano de 2011.

O foco inicial deste projeto foi trabalhar os fundamentos do futsal, bem como
todos os aspectos inerentes ao trabalho esportivo e em equipe. Visava oferecer uma
iniciação esportiva que favorecesse o desenvolvimento de habilidades básicas e a
aquisição e o aperfeiçoamento dos fundamentos da modalidade.

Este trabalho teve como objetivo a integração entre alunos e o desenvolvi-


mento de atitudes sociais como respeitar regras, trabalhar em equipe, cooperar,
competir, entre outras.

O trabalho foi desenvolvido com uma turma de 22 alunos do 2° ao 5° ano


.Houve divulgação e abertura de inscrições aos interessados, sendo proposto o tra-
balho todas as terças, quartas e quintas-feiras das 15:00h às 17:00h, devido ao ho-
rário disponível do professor no contraturno, e teve a duração de dois semestres.

Durante a atividade, citamos como exemplos os fundamentos que foram tra-


balhados: condução, chutes, passes (todos os tipos), dribles e fintas, recepção, des-
locamento, jogos e finalização.

No decorrer do projeto os alunos tinham acesso a materiais de consulta refe-


rentes às regras debatidas.

Por ser um projeto de contraturno, a professora do período regular relatou


que a participação tão efetiva dos alunos influenciou o desejo de continuar desen-
volvendo as atividades com suas turmas.

Através deste trabalho foi possível perceber o interesse dos alunos pelo esporte e

68 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

entender que às vezes o futsal não se manifesta por falta de incentivo, pois quando o
projeto foi elaborado, o objetivo era a integração aluno-escola no período inverso ao das
aulas regulares e também a participação dos pais no decorrer do projeto.

A intenção do Projeto “Futebol de Salão” foi ocupar os alunos com atividades


educativas, esportivas, de formação, estimulando as crianças a manter uma intera-
ção efetiva que contribuísse para o seu desenvolvimento integral.

Devemos destacar ainda que a participação de um de nossos alunos com defi-


ciência possibilitou perceber o quanto a atuação do professor foi fundamental para
a garantia da inclusão dessa crianças nas atividades. Quem não conhecia o aluno,
em nenhum momento diria que se tratava de uma criança com alguma deficiência.
Isso para nós foi muito significativo e deverá ser sempre objeto de exemplo para os
demais professores da escola.

Para os alunos os resultados do projeto foram satisfatórios, pois os mesmos


adquiriram noção de responsabilidade através do esporte, o desenvolvimento pes-
soal, o gosto, a ampliação dos vínculos sociais, a diversão.

Quanto aos pais, a princípio não houve convite formal para que participas-
sem do projeto, no entanto eles foram se aproximando da escola nos momentos
do projeto por iniciativa própria. A partir daí, juntamente com a supervisão, nós,
gestores, sugerimos ao professor que convidasse os pais a participar e assistir aos
jogos. Gradativamente foram inseridos no projeto, de modo que no encerramento
puderam interagir com seus filhos, além de confraternizarem com todos os envol-
vidos. Com a participação e o envolvimento eles perceberam o quanto era im-
portante e significativo, visto que estava relacionado com a formação de caráter e
interferindo positivamente no comportamento de seus filhos. A satisfação dos pais
com os resultados foi verbalizada, por eles, no dia do encerramento.

Para nós, incentivar, acompanhar e vivenciar esta experiência proporcionou


muitas reflexões e aprendizagens. Uma delas é que a participação não deve ser exi-
gida e sim conquistada, através de ações que façam sentido para as pessoas envol-
vidas. Essa tarefa não é fácil, nem simples, mas deve ser promovida por nós a partir
de bons exemplos de práticas como esta aqui relatada.

69
15
O Projeto Expressão Corporal
e a sua dinâmica de trabalho21

A expressão corporal na escola [...] entra para promover a aprendiza-


gem, o bem-estar, a educação pelo movimento e a modificação do com-
portamento, fazendo com que a criança perceba, sinta, conheça e mani-
feste seu próprio estilo, ou seja, uma manifestação pessoal.
(AMARAL, 2004, p.28)22

O projeto atendia crianças entre 6 e 11 anos, matriculadas na EMEB Maria Gon-


çalves de Freitas Gonçalves, situada no município de Cajamar. O bairro é simples, com
pouca infraestrutura, não havendo muitas opções de entretenimento, cultura, arte e es-
porte. A escola para esses alunos era a única opção de lazer. Por isso, além do horário de
aula normal, eles frequentavam a escola no período de contraturno.

A proposta foi idealizada em 2007, na ocasião da criação do documento de implan-


tação das disciplinas específicas de Arte e de Educação Física no Ensino Fundamental
na rede de Cajamar, na prespectiva dos professores complementarem a carga horária.
O Projeto Expressão Corporal é inovador por pelo menos três motivos. Primeiro
tem a questão dos ‘dois olhares’: a Dança, na escola, podendo ser ensinada pelo profis-
sional de Educação Física ou pelo de Arte. O projeto só aconteceu porque teve esses
dois olhares. O segundo motivo foi que não se ensinava passos coreografados prontos,
mas os alunos eram seus próprios coreógrafos, uma vez que se aproveitavam seus mo-
vimentos espontâneos, gerando desta forma autonomia de criar movimentos indepen-
dentes. Terceiro, foi levada aos alunos a mensagem de que “todo corpo dança”, de que
não há corpos ou etnias ideais para cada estilo de dança, tampouco há o gênero ideal,
como também não há idade para dançar, não sendo limitados pela questão social: não
vão dançar apenas nos estilos que já conhecem na comunidade, mas podem conhecer e
vivenciar coisas novas.

Os alunos tiveram a oportunidade de vivenciar coreografias de diferentes gêneros


musicais como: Alegria, do Cirque Du Soleil; Bataucada, do grupo Olodum; Primave-
21. O Projeto Expressão Corporal é um projeto de contraturno ministrado pelas professoras Daniela Culpanni Paz,
de Arte, e Priscila Marques de Oliveira Ângelo, de Educação Física, da EMEB Maria Gonçalves de Freitas Gonçalves.
22. AMARAL, Jader Denicol. Jogos Cooperativos e Expressão Corporal. In:___. Jogos Cooperativos. São Paulo:
Phorte, 2004. cap. III, p. 27-37.

70 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

ra, de Vivaldi; O Trenzinho do Caipira, do grupo brasileiro Uaktei; Baião de Seis, dos
Barbatuques, entre outros. Ainda puderam participar da escolha das músicas, tendo seu
repertório enriquecido nos momentos em que viam, ao vivo ou por meio de vídeos e fo-
tografias, apresentações de grupos de danças conceituados, espetáculos circenses e suas
próprias criações coreográficas.

Em 26 de maio de 2010 aconteceu o I Festival do Projeto Expressão Corporal, na


Sala Glória, Centro das Artes, em Jundiaí. Naquela noite o grupo apresentou 12 coreo-
grafias para uma plateia de cerca de 300 pessoas. Foi estendido o convite aos professores,
gestores e funcionários da escola para que compreendessem o verdadeiro sentido que
este projeto teve para as crianças, uma vez que a cada coreografia concebida experimen-
tou-se a integração que o projeto promovia. Para a maioria dos professores este Festival
foi a oportunidade de se sentir parte dele e de sentir o projeto como parte importante de
sua rotina pedagógica.

O desenvolvimento de todo o projeto foi registrado por meio de fotografias e fil-


magens, bem como registros produzidos pelos alunos explicitando suas experiências e
expectativas.

RESULTADOS ALCANÇADOS PELO PROJETO


Os alunos, que no início desta proposta eram bastante tímidos e pouco sabiam
sobre essa modalidade, avançaram muito em vários aspectos: criatividade na elabora-
ção das coreografias, organização espacial e temporal, consciência corporal, desinibição,
memória, postura durante as apresentações e responsabilidade, tendo esta um nítido re-
flexo em sala de aula.

O crescimento do grupo, de 6 para 120 crianças, atestou a credibilidade e o suces-


so do projeto perante os alunos e a comunidade. Os resultados deste trabalho também
chegaram a outros lugares: pessoas de fora do município notaram o seu valor e como
reconhecimento da excelente qualidade do trabalho das crianças fizeram convites para o
grupo fazer parte de uma apresentação no Festival de Ginástica no Ginásio de Esportes
Dr. Nicolino de Lucca (Bolão) em Jundiaí, como também em outros eventos: Prosa Pe-
dagógica, apresentação na EMEB Distrito do Polvilho e eventos na Natura.

Enfim, o desenvolvimento do Projeto Expressão Corporal garantiu que nossos alu-


nos vivenciassem situações nas quais pudessem expor suas ideias e movimentos, aceitas-
sem a sugestão e a opinião do próximo, memorizassem as sequências e as executassem
com concentração, conseguindo interpretar o que a coreografia pedia, adequando o mo-
vimento à contagem da música, garantindo assim a evolução do desenvolvimento mo-
tor, afetivo e cognitivo de cada um deles. Hoje, o projeto de contraturno não acontece
mais devido a uma nova organização da Diretoria de Educação.
71
16
A hora e a vez da edição23

Não é a gramática abstrata, mas a vida em comum que nos deu uma
língua comum. Ensinar a língua é ampliar a experiência do aluno com
a nossa.
LOMBARDO RADICE

No início do 2º semestre de 2011, o grupo de professores das 4ª séries da EMEB


Prof.ª Maria de Lourdes Mattar reuniu-se para analisar o mapeamento cujo foco
principal era a produção dos alunos. Chegamos à conclusão que a principal dificul-
dade era a coerência e a coesão. Tendo isso em vista, a supervisora que acompanha
esta escola propôs um acompanhamento sistematizado, que seria parte de um es-
tudo, visando ampliar este trabalho em toda a rede.

Mediante a dificuldade diagnosticada, fui convidada pela gestão da escola


para ser o “par adiantado” desse estudo. Dessa forma, a supervisora e a assistente
pedagógica de comunicação compareceram à escola, no dia 08 de agosto, com o
objetivo de orientar-me na elaboração e planejamento de uma sequência didática
com o foco na edição de textos, que seria socializada no HTPC do dia 22 de agosto.
Ressalto ainda que, nesse mesmo dia, a assistente pedagógica realizou no primeiro
momento da reunião um estudo de revisão e edição, onde vivenciamos uma práti-
ca de edição de textos, a partir de um resumo do artigo de divulgação científica “O
sono dos bichos: hora de dormir”, de um aluno de 8ª série de nossa rede.

Na primeira visita em minha sala, fui acompanhada pelo assistente de direção,


pela supervisora e pela assistente pedagógica de comunicação. Nesse momento,
fizemos a edição da lenda A Sedução da Iara, que consta no Projeto Estudar pra Va-
ler – Módulo III – Mitos e Lendas. Porém, antes de iniciar a aula, selecionei dentre
os textos produzidos pelos alunos um que realmente representasse uma dificul-
dade que a maioria da classe tinha (coerência e coesão, principalmente). Depois
de ler, reler e pensar muito sobre o texto, fiz uma análise prévia, verificando ante-
cipadamente os problemas, planejando as perguntas que poderiam ser feitas para
levar aos alunos a aperfeiçoá-lo. Antes de pedir que lêssemos juntos, afixei o texto
na lousa, com a ortografia e pontuação já corrigidas por mim. Resolvi discutir com
a classe se estava completo, se faltavam partes da lenda, se melhorar alguma coisa.
23. Autoria? EMEB Profª Maria de Lourdes Mattar

72 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Propus questões à classe em função dos aspectos a serem corrigidos ou reestrutu-


rados, de acordo com o gênero trabalhado. Dando sequência, reescrevemos o texto
na lousa, incorporando as alterações.

Percebi que os alunos participaram de maneira ativa e pertinente aos questio-


namentos levantados, fazendo uso a todo o momento da negociação de sentidos,
onde foram utilizadas, ao mesmo tempo, as quatro operações do processo de edi-
ção de textos: acréscimo (colocar novas palavras, expressões ou mesmo frases);
substituição (trocar termos por outros pertinentes); supressão (eliminar palavras,
expressões ou frases que não façam sentido naquele contexto) e inversão (poder
inverter palavras, frases ou mesmo parágrafos para que o texto tenha mais sentido).
A classe participou intensamente do processo. Além de trabalhar a leitura, a escrita
e a oralidade, foram desenvolvidos também conceitos atitudinais (os alunos opi-
navam sobre o texto, respeitavam a vez de o colega falar, respeitavam as opiniões
divergentes em relação ao acréscimo ou supressão de alguma palavra ou parágrafo,
na tentativa de aperfeiçoar o texto).

Na segunda etapa desse processo, parti da leitura do texto informativo Patri-


mônio Ameaçado – O Solar do Unhão e de um pôster, onde havia a imagem de
um casarão antigo na Bahia. Após a leitura, pedi a produção de um conto, onde eles
poderiam usar informações do texto e da imagem. Enquanto escreviam, circulei
pela sala, observando suas produções. Notei que a maioria dos alunos estava crian-
do contos de horror sobre o casarão antigo, creio que influenciados pela atmosfera
tenebrosa que a imagem passava.

Com os textos em mãos, selecionei um que tivesse muitos problemas dis-


cursivos. Pedi a autorização da autora, informando para ela que gostaria de fazer
um trabalho de edição coletiva com a classe. Fiz uma análise prévia, verificando
antecipadamente os problemas. Planejei algumas perguntas que poderiam levar os
alunos a aperfeiçoá-lo: no texto foi apresentado o cenário, o tempo ou a época em
que aconteceram os fatos? O conflito está claro? Que palavras, expressões ou ideias
se repetem? Faz falta? Podem ser substituídas?

Dando continuidade ao estudo com foco na edição de textos, recebi nova-


mente a visita da supervisora e da assistente pedagógica, agora acompanhada pela
diretora da escola. Iniciei a aula discutindo oralmente sobre o que precisava ser
melhorado no texto para que outras pessoas pudessem entendê-lo (lacunas de in-
formações). Organizei as duplas e distribui as cópias de texto, já corrigidos por
mim em seu aspecto notacional. Circulei pela sala, fazendo intervenções (aspectos
discursivos, principalmente). Abri para o grupo, analisando as modificações re-
alizadas pelas duplas. Discutimos no coletivo. Nesse momento, percebemos que

73
durante as edições as duplas criaram novos textos. Como surgiram histórias muito
interessantes, resolvi aproveitá-las.

Na terceira etapa desse processo, socializei as produções elaboradas na aula


anterior, durante as rodas de leitura. Expliquei que, como haviam surgido várias
versões para uma mesma história, faríamos a escrita da versão da turma, a partir
da organização feita anteriormente. Discuti com a classe sobre o que precisava ser
melhorado, retomando as quatro operações (acréscimo, substituição, supressão e
inversão), explicando que cada grupo ficaria responsável pela reescrita de uma par-
te do texto.

Para organizar a reescrita, dois grupos ficaram responsáveis pelo início (per-
sonagens, cenário), dois pelo desenvolvimento (clímax) e dois pelo desfecho (en-
cerramento). Nesse momento deixei claro que o autor da 1ª versão deveria ser con-
sultado, para manter a ideia inicial.

Em seguida, coloquei na lousa todas as partes do texto elaboradas pelos gru-


pos e revisadas. Avaliamos as modificações realizadas e reescrevemos coletivamen-
te a versão da turma, agora aprovada pela aluna, autora da 1ª versão do texto. Parte
da revisão e edição (repetições de palavras, concordância, eixos de coesão que não
ficaram adequados) aconteceu durante o processo de escrita dos alunos. Para en-
cerrar só fizemos alguns ajustes necessários. Este trabalho foi articulado ao EPV
– Módulo Introdutório .

Com isso, partimos pra quarta etapa. Diante das análises dos textos produ-
zidos pelos alunos, percebi que apesar de todo esse contato com o gênero conto,
faltava ainda para a maioria da classe apropriar-se das características discursivas
do mesmo. Para isso, resolvi criar uma ponte entre o trabalho que já estava sendo
feito, de edição de textos, com a sequência de leitura do gênero conto Quem conta
um conto, aumenta um ponto, que estava desenvolvendo com a turma, dando assim
continuidade ao trabalho.

Comecei conversando com a sala sobre o significado da palavra “conto”, ano-


tando as hipóteses na lousa. Após isso esclareci que conto (do latim contare =
falar) é uma narrativa breve de um fato real ou fantasioso, desenrola-se com pou-
cas personagens, tem espaço e tempo restritos, privilegia o diálogo e possui uma
linguagem objetiva, buscando assim confrontar com as hipóteses levantadas por
eles. Organizei os alunos em círculo e lancei algumas perguntas, visando mapear
o que eles já sabiam sobre contos: Quais contos costumavam ouvir quando eram
pequenos? De quais ainda se lembravam para recontar aos colegas? Havia algum
conto marcante? Qual era o nome do autor? Quais eram as personagens princi-

74 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

pais? Havia conflito?

Selecionei alguns contos para a leitura: O Voador, dos Irmãos Grimm; Bicho de
Palha, de Luís da Câmara Cascudo, e o Diamante, de Luís Fernando Veríssimo. Expli-
quei a proposta: conhecer bastante as histórias para depois reescrevê-las. Lemos e
discutimos como é feita a descrição de cada uma das personagens, do ambiente.

Dando continuidade ao trabalho, recebemos uma nova visita da assistente


pedagógica, acompanhada pelo assistente de direção da escola. Organizei a reescri-
ta coletiva do conto Uma Pedra no Caminho, conto do folclore alemão recontado
por Tatiana Belinky e ilustrado por Walter Ono24, para desenvolver um modelo dos
procedimentos escritores (o planejamento do texto, a leitura do que já foi escrito
para organizar o que ainda faltava escrever, o cuidado com as repetições de pala-
vras, a importância de produzir um texto coeso e coerente para que seja compre-
ensível para o leitor). Terminada a reescrita, revisamos o texto coletivamente.

Durante a reescrita, ressaltei o uso dos marcadores temporais, como também


dos organizadores textuais dentro do contexto da produção. O momento foi muito
rico e produtivo. Os alunos colocaram em jogo as aprendizagens adquiridas desde o
início desse trabalho (as quatro operações da edição de texto). Tive também o cuida-
do de realizar parte da edição da reescrita durante o processo de produção.

Ao concluir essa etapa, propus a reescrita em dupla do conto A Moura Torta,


de Luís Câmara Cascudo. Enquanto os alunos trabalhavam, circulei pela sala e fiz
intervenções como “O que já escreveram, o que falta ainda?”. Anotei alguns aspec-
tos que deveriam ser retomados durante as revisões. Solicitei revisões em duplas,
para organizar a 2ª versão. Nesse momento a minha intenção era fazê-los revisar os
próprios textos. Notei que ainda sentiam dificuldades nas produções, pois ainda
apresentavam pouca articulação na hora de usar os conectivos. Produzi um cartaz
com alguns organizadores textuais e elementos de coesão já utilizados pela classe
e, à medida que descobríamos outros novos durante apreciações textuais, acres-
centávamos ao cartaz, criando assim um modelo estável que poderiam fazer uso
para as suas produções.

Dando continuidade ao trabalho, pedi que reescrevessem outro conto. Du-


rante a reescrita, circulei orientando e fazendo algumas intervenções. Percebi que
alguns alunos recorriam ao cartaz, na busca de dar sentido aos seus textos.

No quadro, realizei a revisão coletiva do texto de um aluno, já revisado em


seu aspecto notacional. Nesse processo, enfatizei os problemas discursivos do tex-
24. BELINKY, Tatiana. Uma Pedra no Caminho. Revista Nova Escola/ago.1995.

75
to, como precária caracterização das personagens ou passagens mal explicadas. Mi-
nha proposta era que, na medida do possível, todos os alunos passassem por esse
processo de expor seus textos para análise do grupo, buscando aprimorá-los, sem
perder o sentido.

Dando sequência, pedi que trocassem os textos entre si e os revisassem. Meu


objetivo nesse momento era explicitar os problemas percebidos pelos leitores, mas
não pelos autores. Transcrevi na lousa trechos dos textos revisados para que eles
propusessem mudanças, justificando-as e decidindo se deveriam ser feitas ou não.

A criança se coloca como ‘um outro’ em relação ao texto que está escre-
vendo ou já escreveu, e é como leitora que vai se dar conta de que algo
está faltando para que o texto faça sentido.
MAYRINKI-SABINSON (1997, P.150)

A avaliação se deu através da observação e adequação dos textos produzidos


pelos alunos em relação à função comunicativa, à forma e aos aspectos textuais.
Também analisei a qualidade e a propriedade dos comentários nas atividades de
produção e de revisão de textos e o uso de comportamentos escritores (como pla-
nejar e decidir que aspectos serão tratados no texto). Foi um processo contínuo,
onde fui acompanhando as tentativas, as dúvidas e os progressos dos alunos.

Fazer todo esse trabalho foi muito bom, pois muitas crianças já se apropria-
ram de algumas questões discutidas quanto aos aspectos discursivos (coesão, co-
erência, vocabulário, desenvolvimento do tema) e estão fazendo uso desse conhe-
cimento no momento em que produzem seus próprios textos. Isso não quer dizer
que não fazia revisões regularmente, mas agora faço de uma forma mais focada,
com objetivos mais claros e precisos, garantindo na rotina semanal revisões e/ou
edições textuais articuladas ao EPV.

O grupo de estudo formado por supervisores, assistentes pedagógicos de


comunicação, professores e gestores fortaleceu isso ainda mais, garantindo na roti-
na semanal ou quinzenal atividades de revisão/edição textual, aproximando plane-
jamento e prática. Foram priorizados os HTPIs (horário de trabalho pedagógico
individual), horários de especialistas para estudo e os HTPCs (horário de trabalho
pedagógico coletivo) para socialização das práticas em sala de aula, focando avan-
ços, dificuldades e os ajustes necessários.

Com tudo isso, conclui que, para que haja aprendizagem, o professor pre-
cisa realmente estudar, se preparar, diminuindo assim sua ansiedade. Tem que ter
segurança e comprometimento. A competência de revisar/editar textos tem de ser
construída com as crianças, sendo muito importante o planejamento cuidadoso da
76 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

atividade, focando um aspecto de cada vez. Só assim poderão ser feitas as interven-
ções adequadas e necessárias. Essa conclusão se deu diante dos acompanhamen-
tos sistemáticos que tive em sala de aula, dos momentos de planejamentos com o
grupo gestor, supervisão e assistente pedagógico, bem como os resultados obtidos
com a minha turma no desenvolvimento desse trabalho.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


CASCUDO, Luís da Câmara. Contos Tradicionais do Brasil. Belo Horizonte/São Paulo: Itatiaia/
EDUSP, 1986.

CENPEC. Estudar pra Valer!, São Paulo, 2005.

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO. Referencial de Expectativa para o


Desenvolvimento da Competência Leitora e Escritora no Ciclo II do Ensino Fundamental.
São Paulo: SME/DOT 2006.

77
17
Flauta Doce na Sala de Aula25

A Escola Municipal de Educação Básica Prof ª Maria de Lourdes Mattar, localizada


na Cidade de Cajamar, no Distrito Polvilho, bairro do Parque Maria Aparecida, é
uma unidade escolar composta de alunos do Ciclo I, Ciclo II e Educação de Jovens
e Adultos. O perfil socioeconômico é bem diversificado, constitui-se de trabalha-
dores, sendo que boa parte dos alunos do Ciclo I dependem de programas da bol-
sa-escola e de ajuda para a aquisição de materiais escolares. A escola atende alunos
portadores de necessidades especiais, com adequação da estrutura física em boas
condições, assim como os móveis nela contidos.

Tendo em vista as reflexões da Reorientação Curricular na rede municipal


de Cajamar, no que se refere aos eixos norteadores que perpassam a educação
básica, salientamos os eixos Diversidade Cultural, Justiça e Cidadania, Qualida-
de de Vida e Saúde Integral, que acreditamos abranger o desenvolvimento do
projeto de Flauta.

O presente projeto tem como objetivo trabalhar a flauta doce como ele-
mento musicalizador no Projeto Vida Ativa, assim como a elaboração de um
repertório didático com partituras cifradas e tablaturas direcionadas para as
crianças acompanharem as canções. Desencadeou-se ao perceber que um gru-
po de crianças se organizava para brincar com músicas através de paródias, ges-
tos rítmicos e dinâmicos. Então propus a inserção de um instrumento acessível
para aprendizagem e para a brincadeira. Por sua vez, houve interesse despertado
na escola através das apresentações do Projeto Vida Ativa, mantido pela Pre-
feitura Municipal de Cajamar. Cabe ressaltar que eu já havia atuado no Projeto
Vida Ativa como voluntário, convidado pela colega professora Marta Brandolini
que me entusiasmou e, na ocasião, isso me proporcionou conhecer mais sobre
o encontro de saberes oriundos de diferentes contextos; num espaço propício
para promover a troca de conhecimento. Iniciei no ano de 2011 com a turma do
3º ano, pela procura e interesse desses alunos. Com o transcorrer de algumas
aulas, percebi o quanto os alunos se motivaram e demonstraram felicidade em
tocar uma pequena melodia, mesmo que envolvendo apenas algumas notas mu-
sicais. O instrumento escolhido já era conhecido pelas crianças, pois eles sabiam
25. Relato de experiência do professor Marcelo Aparecido da Silva, 3º ano “A” do Ensino Fundamental 2011, EMEB.
“Profª Maria de Lourdes Mattar”

78 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

que encontrariam a flauta doce na famosa loja de “hum real e noventa e nove
centavos”, com baixo custo, fácil de transportar, um som suave com simples digi-
tação, seguindo uma lógica de facilidade para a execução de uma canção. Dessa
forma pôde-se adequar a execução do instrumento ao nível de aprendizagem do
aluno, pois as notas musicais permitem brincar com as palavras em “pedaços”,
bem como com frases e sílabas, além das resgatar canções de memória relacio-
nando som e grafia.

Pretende-se com este projeto propagar na escola a musicalização, como ensi-


na-nos Violeta Gainza (p.101),

(...) o objetivo específico da educação musical é musicalizar, ou seja, tor-


nar o indivíduo sensível e receptivo ao fenômeno sonoro, promovendo
nele, ao mesmo tempo, respostas de índole musical. Com isso, a música
traria para o homem várias modificações internas ligadas à comunica-
ção e rompendo barreiras de todos os tipos, sejam de expressão ou até
mesmo a nível psicofísico.

Através do ensino da flauta doce, estende-se a musicalização; aproveitando


o conhecimento prévio musical e de repertório que a criança carrega consigo são
utilizadas canções como Havia uma Barata na Careca da Vovó; Trem de Ferro;
Cai, Cai Balão; Brilha, Brilha Estrelinha; Escravos de Jó, dentre outras canções
populares. Essas músicas têm notas de digitação com pouco grau de dificuldade,
cujas melodias são atraentes e de fácil assimilação.

Cabe ressaltar que no primeiro momento não é oferecida a partitura para a


criança, mas sim as letras das músicas com a figura da flauta já com a posição de
poucas notas musicais. O ensino da flauta está ligado à educação musical, em que
os conteúdos trabalhados, mesmo com pouca variação de notas, são elementos
que formam a música, tais como melodia, ritmo e harmonia.

A partir do repertório que as crianças conhecem e gostam, supracitado, pro-


ponho a música popular Trem de Ferro, em que o ritmo parece com um trem em
movimento, sendo necessário utilizar apenas uma mão, uma vez que as notas musi-
cais têm pouca variação, favorecendo a execução do instrumento e a assimilação das
notas, ou seja, dos orifícios fechados no instrumento, de maneira fácil e divertida.

Segundo Violeta Gainza (Estudos de Piscopedagogia Musical, p.49), “tocar


um instrumento é decodificar a música, é entender a linguagem musical, para
que seja capaz de relatar, de alguma maneira, o que acontece a nível melódico,
harmônico ou rítmico”.

79
Nessas primeiras experiências com as crianças na sala de aula, observei que
tocar e cantar em alguns momentos diferenciaram as aulas; com um som agradável
produzido pela flauta, que eleva a empolgação, o entusiasmo coletivo foi pautado
na solidariedade e no respeito. Esse momento é vivenciado pelo respeito demons-
trado no momento de colaboração com o outro, pois as crianças se ajudam, con-
versam entre si, opinam na execução de uma canção, demonstram ser solidários
quando encontram dificuldades.

As músicas executadas na sala de aula foram adaptadas à flauta na in-


tenção de impulsionar e ampliar o repertório dos alunos. Segue o repertório das
músicas adaptadas e gradativamente executadas pelos alunos do 3º ano. Explicito
em linhas gerais a escolha das músicas:

1. Trem de Ferro – Favorecer o conhecimento e a precisão de tapar os


orifícios da flauta e perceber notas executadas com a mão esquerda;
2. Si – Lá – Sol – Ré - Zoltan kodály – Ampliar a agilidade e o conhecimento
de mais notas músicas;
3. Cai, Cai Balão – Ampliar o repertório e adquirir habilidade com a mão
direita;
4. Ode à Alegria - Bethoveen – Novos desafios com novas notas musicais,
exigindo agilidade das mãos adquirida com as canções anteriores,
bem como a base para tocar a música;
5. Noite Feliz – Término do ano letivo – canção natalina, executada na
flauta em acompanhamento do coral, com possibilidade de inserir
outros instrumentos (violão e percussão).

Diante do repertório planejado, observou-se que as crianças estavam dispostas


e confiantes, pois as notas musicais não se diferenciavam, possibilitando a execução
de outras músicas. Abre-se o leque do repertório musical, pois as crianças começam
a executar outras músicas, tais como: Vinícius de Moraes, A Casa; Roberto Carlos,
Como é Grande o Meu Amor por Você; Canção natalina, Noite Feliz; Luiz Gonzaga,
Asa Branca; Música árabe, Cobrinha; Música indígena, Chuva; Bethoveen, em Ode
à Alegria; e musicas infantis, como Alecrim, A Canoa Virou, Escravos de Jó. Todas in-
seridas em momentos estratégicos, preparadas e refletidas no que se refere também
ao que a criança já tinha de bagagem musical ou ao discurso musical do aluno, como
é ressaltado pelo músico e educador inglês Keith Swanwick:

(...) Cada aluno traz consigo um domínio de compreensão musical


quando chega a nossas instituições educacionais. Não os introduzi-
mos na música; eles são bem familiarizados com ela, embora não a te-

80 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

nham submetido aos métodos de análise que pensamos ser importan-


tes para seu desenvolvimento e da autonomia do aluno (...)
(2003, p.66 e 67).

Percebi que as crianças são estimuladas por músicas que fazem parte do seu dia
a dia e dos padrões musicais de sua cultura, ou seja, é possível ampliar o repertório
da criança apresentando-lhe outros universos sonoros. Isso favorece o atendimento
de casos de alunos com baixa autoestima, alunos não alfabetizados que conseguem
executar na flauta as músicas, ainda que desprovidos da leitura e da escrita.

Gainza (1988) afirma que as atividades musicais na escola podem ter objeti-
vos profiláticos, nos seguintes aspectos:

Físico: oferecendo atividades capazes de promover o alívio de tensões


relacionadas à instabilidade emocional e fadiga;

Psíquico: promovendo processos de expressão, comunicação e descarga


emocional através do estímulo musical e sonoro;

Mental: proporcionando situações que possam contribuir para


estimular e desenvolver o sentido da ordem, harmonia, organização e
compreensão.

Para que o trabalho de musicalização funcionasse bem, utilizamos flautas de quali-


dade, com uma durabilidade de longo prazo. O instrumento não apresenta perigo à saú-
de da criança, pois é realizada a limpeza cuidadosa e constante da flauta, o que favorece a
limpeza e a qualidade do som. O zelo pela Flauta é ensinado no início do manuseio, bem
como a consciência dos cuidados com o transcorrer da aprendizagem.

O planejamento das aulas é essencial para obter um resultado com êxito, tais como
explorar as propriedades do som ou de outros conteúdos permeados pelas modalidades
organizativas. Outra questão importante foi articular na rotina a musicalização. Utilizei
do período com os especialistas para o preparo das atividades; assim como fiz uma par-
ceria com eles para a subtração de alunos por um momento da aula corrente para os
ensaios, para atender aos alunos com muitas dificuldades e os não alfabetizados.

Para a elaboração das atividades relacionadas à música foi necessária a parceria


com os especialistas de Arte e de Educação Física, no que tange a conceder um tem-
po, tanto para o ensaio, como para as apresentações aos colegas da escola de outras
turmas, para, enfim, fazermos a apresentação final à comunidade escolar e à comu-
nidade do bairro. Também utilizei os momentos em que os especialistas assumiam a
81
sala para pesquisar conceitos teóricos e materiais que favorecessem a progressão da
aprendizagem dos alunos. Reservei na rotina semanal um período para que ocorres-
se, uma vez por semana, o estudo da musicalização pela flauta doce.

A música aparece como um dos componentes da disciplina Arte e acredita-


-se também na importância fundamental da atuação do Pedagogo-professor uni-
docente (professor das séries iniciais que sozinho leciona todas as matérias) na
construção do conhecimento musical pelos educandos.

A proposta deste trabalho é que o professor unidocente realize a musicali-


zação como ferramenta em sala de aula e também ofereça o suporte necessário
aos professores especialistas através do desenvolvimento de trabalhos colabora-
tivos e interdisciplinares, oportunizando o acesso às crianças da rede de Caja-
mar, despertando o gosto e o prazer de vivenciar o mundo musical.

Segundo Murray Schaffer, o ser humano tem que “limpar” seus ouvidos,
criar paisagens sonoras com os sons do ambiente. O papel do professor unido-
cente é mostrar os caminhos e as ferramentas para explorar essas paisagens sono-
ras na vida do educando. Para tanto, o profissional deve ater-se à busca de biblio-
grafia e materiais que facilitem o processo de tornar o aluno sensível e receptivo
ao fenômeno sonoro.

Tendo em vista a sanção em 18.08.2008 da lei 11.769, que torna a músi-


ca componente curricular obrigatório, cabe a reflexão ao professor unidocente,
pois se ele não compreende o valor sociocultural e a importância da música na
escola para a criança, não haverá contribuição para a valorização desta disciplina.

Atualmente na Escola Prof ª Maria de Lourdes Mattar percebe-se um movi-


mento de crianças portando flauta, entoando canções na escola, já sendo requi-
sitados para tocar “aquela”, o que fazem com muito gosto e empolgação. Acredito
que é possível a propagação da humilde proposta de musicalização pela flauta
na rede municipal, porque é uma proposta viável economicamente e de grande
aceitação pelas crianças. Algumas crianças algum dia já tiveram acesso à flauta,
mas não conseguiram entoar uma canção, por falta de conhecimento, ausência
de incentivo, de mediação ou da presença de um espaço para a expressão do fe-
nômeno musical.

82 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


GAINZA, Violeta Hemsy. Estudos de Psicopedagogia Musical. Summus Editorial – São Paulo:
Summus, 1988.

SCHAFFER, Murray. O Ouvido Pensante. São Paulo: UNESP, 2003.

SWANWICK, Keith. Ensinando Música Musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e Cristina


Tourinho. São Paulo: Moderna, 2003.

DOCUMENTOS
PREFEITURA MUNICIPAL DE CAJAMAR. Material de Apoio do Projeto Estudar pra Valer.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO. Referencial Curricular Nacional para a


Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.

INTERNET
http://educarparacrescer.abril.com.br/politica-publica/musica-escolas-432857.shtml
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/lei/L11769.htm
http://www.portaledumusicalcp2.mus.br/Aprenda/aprendaflauta/flauta.htm

83
18
Escola: espaço de sentidos
e possibilidades38

A escola não pode tudo, mas pode mais. Pode acolher as diferenças.
É possível fazer uma pedagogia que não tenha medo da estranheza,
do diferente, do outro. A aprendizagem é destoante e heterogênea.
Aprendemos coisas diferentes daquelas que nos ensinam, em tempos
distintos, (...) mas a aprendizagem ocorre, sempre. Precisamos de uma
pedagogia que seja uma nova forma de se relacionar com o conheci-
mento, com os alunos, com seus pais, com a comunidade, com os fra-
cassos (com o fim deles) e que produza outros tipos humanos, menos
dóceis e disciplinados .
(ABRAMOWICZ, 1997).

Esse relato pretende apresentar boas práticas de ensino dos professores que atuam
na Escola Municipal de Educação Básica Professora Odir Garcia de Araújo, loca-
lizada no Município de Cajamar. Oferecemos à comunidade do Jardim Adelaide
e arredores o Ensino Fundamental do 2º ano ao 9º anos, Educação de Jovens e
Adultos e Atendimento Educacional de Especializado para alunos surdos.

Para tanto contamos com um espaço físico significativo, sala com computa-
dores, sala de multimídia com data show, sala de jogos, sala de recursos multifun-
cional, salas de aulas, 48 funcionários que trabalham ativamente de maneira cola-
borativa e imprescindível.

Toda essa infraestrutura para atender aos 880 alunos que estudam, relacio-
nando-se com o conhecimento e inter-relacionando-se com a diversidade humana
que existe no espaço escolar, desafiando o trabalho pedagógico da equipe escolar
que tem como premissa respeitar os objetivos pedagógicos de cada área, as expec-
tativas de aprendizagem existentes e metas traçadas que permeiam o fazer de cada
professor, pensadas a fim de propiciar condições de aprendizagem que não exclu-
am aluno algum.

Vale ressaltar que cada elemento citado acima é considerado como consti-
tuinte do processo de ensino e aprendizagem, pensado por professores que bus-

84 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

cam dar respostas às necessidades educacionais especiais, valorizando as diversas


formas de aprender, compreender o mundo e dar significado a ele.

O espaço da sala de aula é cenário de possibilidades: lidar com as dúvidas,


enfrentar e superar os conflitos, conquistar o saber e o conhecimento. Falar de ex-
periências bem sucedidas nas práticas educacionais é entrar num terreno da com-
plexidade. É preciso ficar alerta para não entrar no discurso da lamentação que em
alguns momentos está presente no discurso docente, mas Alves (1994, p. 8) convi-
da: “Muito se tem falado sobre o sofrimento dos professores. Eu, que ando sempre
na direção oposta, e acredito que a verdade se encontra no avesso das coisas, quero
falar sobre o contrário: a alegria de ser professor”.

Essas amostras de relatos de nossa escola revelam a alegria desses profissionais


em serem professores e faz indagar sobre quantos ocultam ou não revelam suas boas
práticas, quantos não querem mudar, quantos têm medo do novo, quantos não se
arriscam, quantos não inventam ou reinventam. No entanto, algo já está transfor-
mando, pelo menos em nossa realidade local, a partir do compartilhar de relatos de
três professores que, na sua simplicidade peculiar, publicam a sua grandeza enquanto
profissionais promovendo a aprendizagem com sentidos e significados.

Experimentam no processo de construção da sua prática momentos de pro-


blematizações, estudos e ampliação das informações pelo tema estudado. Têm ou-
tro desafio pedagógico: que os alunos estabeleçam relações para o aprendido e o
contextualizem em seu cotidiano para o seu crescimento humano e desenvolvi-
mento da sua cidadania.

O relato do professor de História, por exemplo, evidencia esse trabalho na


sala de aula de forma contextualizada, levando em conta a ampliação cultural, de-
marcando um território que envolve a importância do eixo norteador do currículo
Educação e Cultura. Nesse contexto, ele desenvolveu uma sequência didática com
alunos da 5ª série sobre o tema Mitologia Grega e, dentre as diversas etapas, contem-
plou pesquisas sobre personagens da época, apresentação aos alunos dos resultados
dessas pesquisas na sala de multimídia e, além disso, em outra etapa foi possível exi-
bir o filme O Ladrão de Raios, de Percy Jackson, que aborda alguns mitos da Grécia
Antiga como os de Zeus, Poseidon, Medusa, Musas, Hades, Fúria e Sátiros.

Foi entregue aos alunos papel fechado (sorteio) com o nome do perso-
nagem da Mitologia que seria pesquisado. Nestes papéis continha o
nome de um deus, herói, monstro ou rei da Grécia Antiga. Foi proposta
aos alunos uma pesquisa sobre o personagem para apresentação para
a classe e uma imagem sobre o tema pesquisado. Os trabalhos foram
apresentados na sala de vídeo. (Trecho extraído do registro escrito fei-

85
to pelo Professor Ricardo Júlio em novembro de 2011).

Tal prática provocou nos alunos um envolvimento e um despertar para o co-


nhecimento e interesse na área de história, compreendendo que isso se aprende na
sala de aula, mas também através de pesquisas e em outras fontes, como o filme. Uma
ação pedagógica considerada comum pelo professor revela uma forma de abordar
conteúdos curriculares no cotidiano escolar com intencionalidades planejadas e car-
regadas de sentidos para os alunos. Podemos afirmar que a diferença diante do envol-
vimento dos alunos e as aprendizagens conquistadas se devem à intencionalidade,
como pontuado acima, mas articulada a esta se encontra o fazer do professor que
consegue transitar na linha tênue do informar, problematizar e confrontar diferentes
ideias, opiniões e argumentações. É essa prática tão óbvia, mas que precisa ser dita,
discutida, tematizada e divulgada que faz toda diferença em sala de aula.

Não basta solicitar uma pesquisa, é preciso dar lente aos alunos, é necessário
orientar o ato de pesquisar; não basta assistir um filme, é essencial contextualizar,
é singular promover debates e sistematizar aprendizagens; não basta apresentar
trabalhos e pesquisas, é primordial que o professor problematize as apresentações,
ajude os alunos a refletirem. Essa é a diferença na prática deste professor!

A professora do 3º ano socializa sua atuação ao trabalhar resoluções de pro-


blemas com seus alunos:

Os alunos têm o momento para resolver as questões, caso tenham dú-


vidas, estas são discutidas e resolvidas da melhor maneira possível,
nunca dando respostas prontas. Após esse momento socializamos
diferentes resoluções, momento este em que o mais importante é o
como se faz do que a resposta em si. Nessa troca de estratégias e de
ideias os alunos têm a oportunidade de ampliar as suas formas de so-
lucionar os problemas (Trecho extraído do registro escrito feito pela
Professora Roseni em novembro de 2011).

A contribuição da professora sobre a sua prática, ao contrário do que possa pa-


recer, não se coloca na direção do simplismo, mas sim do quanto é preciso insistir no
processo de reflexão e não duvidar do quanto o aluno é capaz de aprender, respeitan-
do o percurso de aprendizagem que cada um deles fez durante essa proposta. Discutir
diferentes estratégias com os alunos para chegar à mesma resposta de uma situação-
-problema, socializar as possibilidades, argumentar sobre a mais viável ou não, registrar,
trocar informações, concordar e discordar, quantas aprendizagens estão em jogo.

Tradicionalmente enfrentamos um grande problema em sala de aula: todos


os alunos devem chegar à mesma resposta e da mesma maneira. Encontrar uma
professora que se lança ao desafio de mudar após encontros de formação, após
86 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

reflexões sobre sua prática, preocupações com a não aprendizagem dos alunos é
romper paradigmas e se abrir a uma nova forma de ensinar, para que de fato seus
alunos possam aprender. É direito de todos ter acesso a um ensino de melhor qua-
lidade, mais desafiador e inovador, aspecto este que vem ao encontro de mais um
eixo norteador do currículo, “Justiça e Cidadania”. Participar de formações e con-
verter a informação dada em conhecimento próprio a ponto de transformar o seu
fazer é dar condições para uma melhor educação e dignidade do pequeno cidadão.

Além disso, não se cansar de esperar pelo tempo de aprendizagem desse alu-
no e nem considerar que todos aprendem juntos e ao mesmo tempo, sem descon-
siderar que também é preciso dosar os diferentes ritmos com a necessidade de
aprendizagem é uma virtude docente nos tempos atuais. Assim como a prática do
professor Ricardo, a Professora Roseni também tem clareza do limite entre pro-
blematizar, informar, respeitar o ritmo, mas agir para que de fato a aprendizagem
possa acontecer. São ações óbvias e bem feitas que tornam uma prática exitosa,
visto que os professores acreditam no que fazem.

Outra prática interessante é a da professora de matemática que apostou no


trabalho de figuras geométricas tridimensionais para os alunos da 5ª série, propor-
cionando momentos de aprendizagem por meio de vivências como construir, ma-
nusear e explorar. Só neste recorte notamos uma concepção que rompe os aspectos
tradicionais da área. Os alunos não estão fazendo contas, álgebras, trigonometria,
mas estão construindo sentidos e significados nas vivências e não na mecanização
de atividades desprovidas de contextos. Imaginem o que não significa para alunos
de 5.ª série poder construir, explorar e manusear?

Para tanto, em sua sequência didática planejou situações que possibilitaram


identificar e quantificar as faces, as arestas e vértices, assim como reconhecer e uti-
lizar as planificações. Tais situações foram propostas para serem realizadas em gru-
pos a fim de que as aprendizagens ocorressem na interação com o outro e com o
objeto, no caso, as figuras geométricas.
Em trecho do seu relato a professora comenta que:

Essa foi uma proposta trabalhada durante duas semanas, mas muito sig-
nificativa, pois os alunos desenvolveram conceitos importantes, obser-
vando e manipulando desde as planificações até a construção do objeto
de estudo. (...) Foi proposto aos alunos que verificassem em suas casas
objetos com as características dos sólidos e que eles comparassem ou
observassem as características dos objetos, desenvolvendo um raciocí-
nio espacial por meio de materiais concretos (Trecho extraído do registro
escrito feito pela Professora Silvana em novembro de 2011)

87
Mais uma vez a pesquisa, a troca entre os alunos, a interação, o planejamento
intencional do professor, a linha tênue entre informar e problematizar, respeitar o
ritmo sem perder de vista que é preciso avançar foi determinante nesta prática exito-
sa. Esta oportunidade foi, sem dúvida, valiosíssima para os alunos, pois por meio de
desafios e manipulação de materiais concretos foram trabalhados diversos objetivos
didáticos da área de matemática e, sobretudo no que consta à aprendizagem que,
mais uma vez, transcendeu o lápis, o papel e a lousa e foi permeada por pesquisa,
experimentação e vivência, ações essas sempre presentes no trabalho realizado pela
professora, assim como a estratégia de aprendizagem em grupo, que favorece a troca
de saberes e possibilita o aprender com o outro, enriquecendo essa proposta.

Espera-se que essas amostras possam colaborar para uma maior valorização do tra-
balho docente, assim como provoquem reflexões, assim como Eduardo Galeano convida:

Ela está no horizonte...


Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe
Jamais a alcançarei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso: para caminhar.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


ABRAMOWICZ, Anete; MOLL, Jaqueline (orgs.). Para Além do Fracasso Escolar. Campinas,
SP: Papiros, 1997.

ALVES, R. A Alegria de Ensinar. 4ª ed. São Paulo: Ars Poética, 1994.

BARRETO, Vera. Paulo Freire para Educadores. São Paulo: Arte & Ciência, 1998.

FREIRE. Paulo. Pedagogia: diálogo e conflito. São Paulo: Editora Cortez.

88 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

19
Sarau na Escola26

O trabalho de leitura com o gênero poema começou assim que iniciei minhas ati-
vidades nesta unidade escolar em 2008. Aonde vou levo na bagagem do meu ser o
gosto pelo poético e diante da possibilidade que sempre há de trabalhar no ambien-
te escolar – independente da disciplina – esse gênero, não hesitei em experimentá-
-lo com os alunos. Sempre enxerguei os textos poéticos enquanto um convite para
o despertar da sensibilidade e sentimento humanos. Aquele que se depara com um
poema dificilmente o vê com indiferença, desde que esteja minimamente prepara-
do para apreciá-lo. O que eu vislumbrava naquele momento era a possibilidade de
mostrar aos alunos uma nova forma de se relacionar com o mundo da poesia, que-
brando paradigmas rígidos e diria até mesmo desmotivantes acerca dessa situação.
Escreve Ligia Chiappini (1997, p. 151):

Para o aluno fica a impressão de que se lê textos para fazer exercícios gra-
maticais, que não mantém nenhuma ligação com a emoção estética que
sentem ao ouvir ou ler um poema, ou ao copiá-lo no seu diário.

Queria que tomassem contato com a potencialidade expressiva, sentimental e


imaginária do texto. Iniciei, então, o trabalho por uma pedagogia da reflexão, ou seja,
o primeiro alvo de mudanças não foi os alunos, mas eu mesmo. No momento em
que selecionava os poemas e lia para eles, procurava fazê-lo de forma que pudessem
perceber as variantes daquela leitura. No entanto, não demonstravam ser esse um
gênero pelo qual se mobilizariam de forma mais concreta. Optei mesmo assim pela
insistência e acreditava que a indiferença era justamente em função da falta de conta-
to constante e da forma como anteriormente haviam se relacionado com esse tipo de
texto. As leituras continuaram e eu procurava enfatizar as características do gênero
me distanciando inclusive da figura de professor e me colocando como um simples
leitor que, naquele momento, lia por prazer e se deixava contagiar pela leitura. Acerca des-
sa postura do professor em momentos de leitura, escreve Délia Lerner (2002, p. 95):

Para que a instituição escolar cumpra com sua missão de comunicar a leitura
como prática social, parece imprescindível uma vez mais atenuar a linha divisória
que separa as funções dos participantes na situação didática. Realmente, para co-
municar às crianças os comportamentos que são típicos do leitor, é necessário que
o professor os encarne na sala de aula, que proporcione a oportunidade a seus alu-
26. Prof. Roberto de Arruda Rodrigues. Licenciado em História. Pós-graduando em Ética, Cidadania e Valores na
Escola. EMEB República do Panamá.
89
nos de participar em atos de leitura que ele mesmo está realizando, que trave com
eles uma relação “de leitor para leitor”.

Após algum tempo comecei a incentivá-los a me substituírem na leitura, mas


deixava claro que deveriam se esforçar para ler “diferente”, não como liam um livro,
jornal ou revista, era preciso incorporar o poema. É claro que se apresentavam
aqueles que normalmente participavam de outras atividades. Porém, paulatina-
mente, aumentava o número dos que se ofereciam para ir à frente fazer a leitura, já
era possível notar uma certa familiaridade e um gosto maior pelo gênero.

Comecei então a declamar com o objetivo de despertar neles o interesse por


essa prática. O primeiro poema que declamei foi No Meio do Caminho, de Carlos
Drummond de Andrade (1987, p. 196):

No meio do caminho tinha uma pedra


tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento


na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

A escolha se deu em função da própria história do mesmo, que ao ser escrito


foi marginalizado, havia em mim a certeza de que achariam o poema “estranho”,
entretanto era o que eu precisava para mostrar a eles, que o autor do poema foi
ridicularizado ao escrevê-lo, mas que com o passar do tempo o mesmo foi tradu-
zido para 17 línguas. Depois dessa informação, o olhar dos alunos se modificou
e partimos para a interpretação. Mostraram-se impulsivos e sem a concentração
necessária para tal atividade. Imediatamente a isso uma situação engraçada – mas
proveitosa – foi que pelos corredores, pátio e até mesmo extra-escola, pude ouvir
diversas vezes dos alunos a expressão ‘no meio do caminho tinha uma pedra’ ao
fazerem referência aos colegas em tom de brincadeira.

Para prosseguirmos era necessária a ampliação do acesso aos textos e por ter-
mos poucos livros de poemas à disposição, alguns alunos traziam livros e também
passamos a utilizar a sala de informática para pesquisa e leitura de poemas. Duran-
te esse momento percebi na escola uma circulação maior não somente de livros,
mas de outros portadores contendo o gênero. Muitas vezes me pediam para ver o

90 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

que eu achava de poemas escritos em seus cadernos e diários. Tive a certeza de que
alguns tinham tomado gosto pelo gênero ao ver que haviam memorizado poemas
a fim de declamarem para a sala.

Convidei os alunos a realizarem um Sarau, eles não sabiam o que era e os es-
clarecimentos foram feitos. Ao responderem positivamente, mesmo com o receio
de algo novo, iniciamos os trabalhos de escolha de poemas, memorização e en-
saios. Para diminuir a ansiedade de enfrentar o público eles se apresentavam para
as outras salas.

A realização do primeiro Sarau ocorreu em 2009 e foi a coroação dos esforços


desenvolvidos durante o processo. A intenção de marcar a sua realização para o sá-
bado e não em dia de aula foi a de perceber realmente o quanto estavam envolvidos
e contagiados pelo projeto, já que não tinham nenhuma obrigação de compare-
cer. Outra grata surpresa foi a forte presença da comunidade. Fiquei meio perdi-
do diante da situação! Não esperava tanta gente! Naquele primeiro momento só
contava com a ajuda de alguns alunos na organização. Tivemos por parte da escola
a presença de uma pessoa, a vice-diretora, e também da supervisora da escola. Te-
nho para mim que a grande presença dos pais e comunidade foi de certa forma em
função de que os alunos levavam para casa a realização de algumas atividades e ao
perceberem o envolvimento dos filhos quiseram participar do resultado. Diante
disso era nítida a apreensão entre os alunos – queriam ser motivo de orgulho - a at-
mosfera era de emoção, os aplausos se misturavam ao nervosismo. Acerca daquele
momento vejamos alguns depoimentos:

A sensação que eu tive foi de medo, nunca tinha feito algo parecido. Ima-
gina o frio na barriga que eu senti na hora! Mas foi muito bom, eles gosta-
ram de todo o sarau, das apresentações.
(EDUCANDA 8ª B)

Bom, no sarau eu senti muita vergonha, mas depois eu me acostumei com


todo mundo e também eu achei muito legal e espero que tenha mais.
(EDUCANDO 6ª A)

Eu senti muita emoção, fiquei com vergonha. Eu ia fazer maior o poe-


ma, mas o Daniel não quis e fizemos o da foca, as outras pessoas apre-
sentaram mais.
(EDUCANDO 5ª A)

Bom, como sempre o nervosismo reinou, mas também como sempre o


gostinho de ter feito algo maravilhoso apareceu quando eu terminei de
declamar. Como o esperado, foi perfeito.
(DANIELE SAMPAIO 7ª C)

91
Mesmo admirado e contagiado por tudo aquilo, não consegui me distanciar
do olhar de professor e perceber como aqueles alunos que antes mal falavam em
sala, não liam diante dos colegas, que no primeiro momento não se interessaram
pelo gênero, estavam ali em meio a umas duzentas pessoas! O momento merecia
comemoração!

A repercussão foi ótima e diante disso era possível pensar na realização de


outros saraus. No entanto, algo me inquietava muito! O que fazer para conseguir
que mais alunos participassem? Sempre refletia acerca de formas para envolver
um número maior deles. Então, pensei, já que no primeiro sarau as apresentações
foram somente de declamações, uma saída seria proporcionar oportunidades
para outros gêneros. Ainda que fugissem da proposta inicial, teriam como fun-
ção pedagógica uma maior participação dos alunos. Nesse sentido quero deixar
registrada a importância da flexibilidade em qualquer projeto, exemplificando-a
com a introdução nas apresentações dos saraus de música, teatro e funk. Abrir
essa possibilidade fez com que o projeto se aproximasse da realidade de alguns
alunos e dessa forma participassem, já que tocavam violão, faziam teatro ou can-
tavam funk. Fui entendendo durante o processo que era necessário valorizar a
diversidade cultural e promover o encontro das diversas “tribos”. Que surpresa!
Alunos que em geral eram desinteressados e indiferentes em sala de aula se mos-
traram criativos, produtivos, empenhados e responsáveis quando resolveram
participar fazendo o que sabiam e gostavam. A propósito dessa postura escreve
Ulisses F. Araújo (2002, p. 46):

Um dos grandes problemas enfrentados pela educação brasileira, nos


dias de hoje, é a inadequação dos conteúdos trabalhados nas diversas
disciplinas da grade curricular. Uma visão mais crítica mostra que, de
maneira geral, eles estão dissociados da realidade e do cotidiano dos
alunos e das alunas. Isso, além de provocar a falta de interesse, é uma
das fontes para o grande problema de indisciplina e violência que hoje
assola as escolas.

Uma vez conseguido que os alunos gostassem do gênero, agora era preci-
so implementar a leitura interpretativa. Para tanto, comecei a fazer uso de meu
acervo levando cerca de 25 livros de poemas para as salas com o objetivo de que
em duplas escolhessem um poema e fizessem a leitura seguida de interpretação.
Utilizei o trabalho em duplas para que os mais tímidos se fortalecessem com a
presença do colega.

O produto final (SARAU) que realizamos em média duas vezes ao ano é


fruto da soma de esforços desenvolvidos dentro e fora da sala de aula. É o pro-

92 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

tagonismo juvenil presente na escola! Ao fazer uma análise dos resultados obti-
dos sinto-me felicitado! Não imaginava que os alunos participantes fossem tão
longe – não que os descreditasse -, mas um primeiro diagnóstico revelava serem
tímidos, sem expressão corporal, desinteressados por poemas e não se sentiam
a vontade ao falar de sentimentos. Expor-se em público, então, nem se fala! In-
felizmente muitos ainda não se envolveram no projeto a ponto de participar e se
descobrirem possuidores de tais habilidades, mas em sua maioria são ouvintes e
apreciadores dos SARAUS.

RESULTADOS ESPERADOS E OBTIDOS


Em relação aos resultados, é importante registrar que sempre buscamos de-
senvolver conjuntamente nos educandos os conteúdos conceituais, atitudinais e
procedimentais. Dessa forma, ao analisarmos os resultados obtidos no projeto, po-
demos fazê-lo por meio de duas situações – os que já eram desejados e aqueles que
foram acontecendo durante o processo.

Naturalmente ao planejarmos de forma pedagógica a execução de determina-


do trabalho que envolva diversas etapas sempre temos de forma mais clara alguns
objetivos, no entanto, é com o decorrer dos acontecimentos que realmente o pro-
jeto vai ‘tomando cara’. Os erros e acertos servem como sinalizadores para mudan-
ças e permanências do que foi planejado.

Ao analisar os resultados obtidos com o trabalho em questão é possível co-


memorar a obtenção de vários objetivos desejados no momento da construção do
mesmo. As situações de leitura do gênero permitem constatar hoje uma melhora
na timidez, o que somado a outros fatores trouxe um salto qualitativo em oralida-
de. O respeito ao colega e ao gênero durante a leitura e ainda a prática constante
desses momentos permitiu a contemplação do que era uma das principais expecta-
tivas, ou seja, a de que os alunos se familiarizassem com as características de leitura
do gênero. Outro alcance digno de nota durante o processo foi a postura interpre-
tativa diante dos textos.

RESULTADOS SURGIDOS NO DURANTE


No que diz respeito aos resultados inesperados, podemos citar fatos como a
cobrança de atividades a partir do gênero e o envolvimento de alunos a partir de
outros gêneros (música principalmente) que não estavam dentro das expectativas.
Quanto à presença da comunidade, autonomia e colaboração dos alunos na orga-
nização dos saraus, apesar de serem resultados esperados inicialmente, prefiro co-
locá-los nessa condição em função de ocorrerem com intensidade surpreendente.

93
Some-se a isso o olhar positivo dos envolvidos em relação à escola e à participação
no SARAU de alunos que não são mais da rede.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


CHIAPPINI, L. (Org.). Aprender e Ensinar com Textos. Volume 2. São Paulo: Cortez, 1997, 151 p.

LERNER, D. Ler e Escrever na Escola: o real, o possível e o necessário. 1ª ed. (Reimpressão


2008). São Paulo: Artmed, 2002, 95 p.

DRUMMOND, Carlos. Antologia Poética. 22ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1987,196 p.

ARAÚJO, F. A Construção de Escolas Democráticas: histórias sobre complexidade, mudanças


e resistências. São Paulo, 2002, 46p.

94 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

20
Descobrindo e reconstruindo
história através da literatura 39
O homem lê desde sempre; lê todos os significantes que estão dispo-
níveis...

Somos leitores em tempo integral. Vivemos numa sociedade que exige a leitura.
Estamos diariamente lendo imagens, fotografias, letreiros, jornais, placas de rua,
sinais de trânsito, cartões, livros, rótulos, notas fiscais, documentos e outros. Não
lemos todos esses gêneros da mesma maneira. Há leituras para estudar e adquirir
conhecimento, prazer ou para obter informações. Utilizamos a leitura em vários
locais e com diversas finalidades.

Segundo Isabel Solé (1998), as estratégias de leitura são ferramentas ne-


cessárias para o desenvolvimento da leitura proficiente. Sua utilização possibilita
desenvolver as habilidades e competências indispensáveis para a compreensão e
interpretação de forma autônoma de diversos gêneros de textos.

Para aprender as estratégias, o educando deve integrá-las a uma atividade de


leitura significativa. A leitura é um processo interno, mas precisa ser ensinado. A
escola tem a missão fundamental de ensinar e aprender a ler. É importante a escola
propiciar as condições para que isso ocorra. Os alunos precisam vivenciar o com-
portamento leitor do educador: como lê, como faz para elaborar uma interpretação.
Assistir a um processo de leitura que lhes possibilite ver as estratégias de compre-
ensão do texto em uma situação significativa e funcional. É função da escola instru-
mentalizar os alunos através da leitura para que consigam estabelecer relações de
anterioridade, simultaneidade e posterioridade no mundo contemporâneo.

Um dos múltiplos desafios a ser enfrentado pela escola é o de fazer com


que os alunos aprendam a ler corretamente. Isto é lógico, pois a aquisição
da leitura é imprescindível para agir com autonomia nas sociedades letra-
das, e ela provoca uma desvantagem profunda nas pessoas que não conse-
guiram realizar essa aprendizagem.
(SÓLE, 1998, p.32)

A leitura segundo a autora é um processo interno, porém deve ser ensinado,


95
deve garantir que o leitor compreenda os diversos tipos de textos que se propõe
a ler. Para tanto, as estratégias utilizadas para compreensão e interpretação consti-
tuem em prever, verificar e construir esse processo. Quando estas são encontradas,
a informação do texto integra-se aos conhecimentos do leitor e a compreensão
acontece. Não é suficiente, embora necessário que os alunos assistam ao processo
de formação do leitor proficiente, o qual o educador lhes mostra como se constroi
suas previsões, como as verifica, em que indicadores se baseia para fazer isso. Os
alunos devem selecionar suas próprias marcas e indicadores, formular hipóteses,
verificá-las, construir interpretações, imporem o seu ritmo e devem utilizar as es-
tratégias que estão aprendendo e perceberem que isso é necessário para obter cer-
tos objetivos. É o momento da leitura independente, pelo prazer de ler, nesse caso
o aluno deve poder utilizar as estratégias já trabalhadas em sala de aula.

Se isso não acontecer o leitor, nosso aluno, jovem adolescente, olha o texto
como símbolos gráficos, revira-os, nada encontra a não ser palavras e frases iso-
ladas. A leitura só é possível se o aluno com sua memória, habilidades e compe-
tências bem desenvolvida na escola, conseguir reconstituir o texto a partir das
próprias experiências, dando-lhe significado. Ler é mais do que decodificar as pa-
lavras. Através da leitura pode-se atribuir significados críticos às diversas formas de
pensamentos, idéias e textos que circulam no cotidiano, assim estabelecer relações
entre diferentes saberes, povos e culturas.

Os livros não são feitos para acreditarmos neles, mas para serem sub-
metidos às investigações. Diante de um livro não devemos nos pergun-
tar o que diz, mas o que quer dizer.”
(ECO, 1986)

Não importa os gêneros, as modalidades de leitura, o que realmente faz a di-


ferença é como essa acontecerá em sala de aula sabendo-se que influencia e de-
terminam nossa vida, como nos faz sentir, ver e construir a realidade, a leitura do
mundo. As situações mais motivadoras de leitura são aquelas que o aluno lê para
sentir prazer, resolver dúvidas, problemas ou adquirir informação estabelecendo
uma relação com o seu contexto histórico ou de outro que esteja próximo. Nes-
se momento se sente coautor do texto, constrói, desconstrói e se posiciona como
sujeito ativo daquela leitura. O papel do professor na situação é de selecionar os
textos, mediar,tecer, articular as falas para que todos possam apropriar e compar-
tilhar do texto.

Para que o aluno atinja o nível adequado de leitura, durante a escolarização,


deve-lhe ser proposto o ensino de estratégias de leitura antes, durante e depois
para uma compreensão e interpretação que lhe auxilie a ser um leitor competente.

96 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

De acordo com Solé, constituem as estratégias de leitura de compreensão lei-


tora antes, durante e depois:

ANTES DA LEITURA:

• antecipação do tema ou ideia principal a partir de elementos paratextuais,


como título, subtítulo, observações de imagens, grafia, capa, contra capa;
• levantamento dos conhecimentos prévios sobre o assunto;
• expectativas em função do suporte;
• expectativa em função da formatação do gênero;
• expectativa em função do autor ou instituição responsável pela publicação.

DURANTE A LEITURA:

• confirmação, rejeição ou retificação das antecipações ou expectativas cridas


antes da leitura;
• localização ou construção do tema ou da ideia principal;
• esclarecimento de palavras desconhecidas a partir de inferência ou consul-
tado dicionário;
• formulação de hipóteses, conclusões implícitas no texto com base em outras
leituras e experiências de vida.

DEPOIS DA LEITURA:

• construção da síntese semântica do texto;


• utilização do registro escrito para melhor compreensão;
• troca de impressões a respeito do texto lido, relação com o cotidiano;
• relação de informações para tirar conclusões;
• avaliação crítica do texto.

Conheci o livro Estratégias de Leitura da autora Isabel Solé, durante o curso


de graduação da disciplina de História na faculdade e posteriormente no curso de
capacitação de História oferecido pela D.E. de Cajamar. Enquanto coordenadora
da EMEB República do Panamá, a qual comporta dois segmentos, fundamental I
e II e tem como uma das metas formar alunos leitores proficientes. Desenvolvi em
HTPC juntamente com os professores de todas as disciplinas de conhecimento,
um trabalho de estudo a cerca das estratégias de leitura apresentadas pela Isabel
Solé, esse durou cerca de dois meses de estudos nos HTPCs.

97
Assim, pós-estudo e observações de práticas em sala de aula como coorde-
nadora e pensando nas estratégias do antes, durante e depois da leitura, do ler e
escrever compromisso de todas as áreas e tendo também como diagnóstico os
resultados da avaliação do SARESP, decidi desenvolver uma sequência didática
de leitura na área de História nas 4ª séries A e C, onde puséssemos em prática as
estratégias e que meus alunos construíssem as suas.

Nosso tema para trabalhar em História era “A industrialização no Brasil no


século XIX”. Esse século na história tem a forte presença dos imigrantes como
mão de obra nas fábricas, e na formação do povo brasileiro.

Busquei leituras que complementassem na elaboração meu plano de ação


de História. Encontrei o livro A Menina que fez a América, fiz a leitura percebi
que vinha ao encontro do trabalho já iniciado na elaboração do plano de ação.
Escolhi esse livro porque estabelece correlação com diferentes acontecimentos,
em diferentes locais e tempos, possibilita ao aluno incorporar a história passada
da humanidade em seu repertório de vida e na construção de sua identidade
social.

Assim, objetivando enriquecer as discussões na disciplina de História so-


bre a industrialização e imigração brasileira no século XIX, refletir os conceitos
de mudanças e permanências, articular, correlacionar entre diferentes aconteci-
mentos, diferentes locais e tempo, possibilitando incorporar a história passada
da imigração em seu repertório de vida e na construção de identidade social,
pensei em trabalhar com um livro paradidático com os alunos, de moda a favore-
cer, corroborar tais expectativas.

Considerando o texto literário A Menina que Fez a América e A Menina


que descobriu o Brasil da autora Ilka Brunhilde Laurito, como um relato histó-
rico de uma época que possibilita ao aluno um aprendizado com as várias infor-
mações sobre local, tempo, sujeito, cultura e objetos, se questionado, mediado,
construindo-se e ensinando-se os procedimentos de uma leitura ativa, colocam
os alunos diante de determinadas questões que revelam sua identidade e histo-
ricidade.

Apresentei a proposta de trabalho com o livro paradidático para os alunos e


posteriormente aos pais, no inicio do ano letivo em reunião, mais precisamente
em março. Nesse momento expliquei-lhes a importância da leitura no mundo
letrado de hoje e como estaríamos trabalhando a leitura em sala de aula e que
inclusive haveria momentos da participação deles. Pois em tempo já previsto
eles teriam que fazer a leitura para seus filhos em casa e os mesmos para eles,

98 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

deveriam questioná-los quanto a relação das aulas de história. Reagiram bem à


proposta: “acho interessante, pois na minha época li vários livros da coleção Vaga-
-lume”, “que bom que não vão ficar só no livro didático”. Combinamos dar início à
compra dos livros. Sugeri que os livros pudessem ser usados e que a compra po-
deria ser feita através de sebos, inclusive pela Internet, na estante virtual. Mostrei
o meu, o qual paguei R$11,00. Ficaram impressionados quando citei a diferença
de preço do livro novo R$23,00 à R$27,00 e usado por até R$15,00. Decidiram
que comprariam através do sebo virtual. Então na semana seguinte iniciamos a
compra dos livros.

O processo da compra do livro didático se deu através de sebos pela estante


virtual. Em parceria com as professoras de informática demos inicio a compra. Ini-
cio da aprendizagem: os alunos ficaram extasiados ao descobrirem tantos títulos
de livros por um valor acessível, não conheciam a estante virtual: “livro de R$4,00”,
“Contos de enganar a morte do Ricardo Azevedo por R$11,00” “gibis do batmam”.
Visitamos vários sites, sebos, fizemos leituras de muitas sinopses. Comecei a ex-
plorar a geografia, vários livros eram comprados em outros estados, buscavam no
atlas , no Google a localização, relacionavam à sua naturalidade e ou à dos pais
e conhecidos. Um momento significativo e com muitas aprendizagens, que não
estava previsto, isso nos levou também a consultarmos o atlas geográfico. Houve
comentários dos alunos de passeios que fizeram com os pais de alguns lugares que
chegavam os livros principalmente regiões Norte e Nordeste e as cidades próxi-
mas, trouxeram fotos da família na cidade passeio.

Foram lidas outras bibliografias durante esse processo, porque à medida que
líamos formávamos a linha do tempo, que também estava no planejamento do pla-
no de ação. Iniciei a linha do tempo a partir do século XV (1400) com a leitura do
livro” Medo e Vitória nos Mares” de Janaína Amado. “A História dos Escravos”, de au-
toria Isabel Lustosa, “1808 Juvenil” de Laurentino Gomes, “Memória e Sociedade”
de Ecléia Bossi que traz relatos de memórias de muitos imigrantes, “Histórias de
Avô e Avó” de Arthur Nestrosvki também trazem relatos de memórias e “Serafina e
a criança que trabalha” de Jô Rezende. Líamos em capítulos, alguns trechos de rela-
tos Com a chegada dos livros iniciamos os procedimentos de leitura em capítulos
combinamos de ler nas aulas da disciplina de história relacionando ao conteúdo
trabalhado; A Industrialização no século XIX no Brasil, substituição da mão de
obra escrava e a chegada dos imigrantes. Houve momentos que a professora lia,
outros os alunos. À medida que líamos o capítulo, grifávamos o que estava presen-
te nas aulas de história: estabelecíamos relação de antes e depois do século XIX,
situações semelhantes do cotidiano europeu, situação dos escravos africanos antes
e pós a chegada da mão de obra branca, e hoje como está essa situação? Debates,
leituras de imagens, pesquisas, seminários e filmes e quando terminávamos o capí-

99
tulo procurávamos identificar o tema, ideia principal. Ao iniciarmos um capítulo
fazíamos a problematização, o mapeamento das hipóteses. Nesse momento anota-
va na lousa as falas dos alunos para posterior confirmação ou retificação. Muitas ve-
zes terminávamos essa etapa na outra aula, isso era bom porque estavam aguçados
para o próximo encontro com a leitura, já preparados para opinar. Desenvolvíamos
o resumo a cada três capítulos, esse tinha que passar por planejamento, rascunho
e socialização para a sala e mural da escola. Iniciei o primeiro no coletivo, ocorreu
tudo muito bem íamos formando o texto resumindo juntos, ilustramos as cenas e
fizemos a exposição. Nos próximos três capítulos resolvi por á prova se tinham en-
tendido o procedimento discutido para resumos escritos de textos; uma catástrofe,
poucos fizeram e nenhum havia compreendido bem o esquema para resumir; mais
pareciam cópias e na verdade eram. Conforme passava entre as carteiras percebia
as cópias e percebi também que deveria ter me posicionado como aluna para ser
escriba, mediadora naquele primeiro momento de produção de resumo. Interferi
demais finalizando o texto de acordo com as minhas expectativas. Solicitei que
quatro alunos lessem para a sala os resumos feitos por eles; a sala percebeu que
estavam como no livro, eles mesmos perceberam que não eram resumos.

Na aula seguinte retomamos os capítulos solicitados para resumo. Retomei o


primeiro passo para um bom resumo: qual é o tema e buscar a ideia principal do
texto, nesse momento começaram a dizer: “é mesmo; não vi a ideia principal” “nem
reparei no tema”“ fui só copiando”. Vi que para os alunos pós a leitura é fácil dizer do
que se trata o texto, porém a dificuldade está em identificar o que pode ser considera-
do relevante importante para compor um resumo e qual o assunto tratado.

Fizemos no coletivo o planejamento para o resumo: planejar, rascunhar, revi-


sar e editar, a partir disso em duplas partiram para a escrita. Só conseguimos finali-
zar essa segunda vez de produção de resumos na outra aula. Fiz a revisão individual
com o aluno de alguns textos e foram colocados no mural da escola juntamente
com as ilustrações. Nos demais textos fui intervindo no momento de produção
em relação à ortografia, pontuação e paragrafação. Havia na sala dois alunos não
alfabetizados; quando a leitura era individual eu lia para eles na minha mesa ou
fazia agrupamentos de modo que um aluno lesse e possibilitasse também, a sua
aprendizagem. Os alunos não alfabetizados e com dificuldades de aprendizagem
participavam nas atividades de oralidade dando a sua opinião, compreensão e na
escrita descrevendo cenário, objetos, nomes dos sujeitos, cidade, ilustração da sua
própria compreensão.

Fizemos sínteses, resumos e organogramas no coletivo, duplas e individuais, e


algumas ilustrações de situações como das brincadeiras das crianças da Itália, esta-
mos ensaiando a dramatização de alguns capítulos para fechamento do ano letivo.
O envolvimento foi de grande parte da sala e dos pais também porque alguns me
100 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

escreviam e diziam que o filho não leu o capítulo conforme combinado em sala,
outros comentavam que o filho não para de falar da menina calabresa Fortunatella,
que o filho já havia lido todo o livro.

Embora a proposta fosse de leitura por capítulos, muitos alunos já o tinham lido
todo o livro sozinhos ou em companhia dos seus pais, conforme relato do mesmo em
reunião bimestral,” sempre está lendo o livro”,” me pergunta coisas que não sei res-
ponder sobre o livro”, alguns emprestaram ao irmão, primo e houve também alunos
que sempre quando íamos fazer a leitura diziam ter esquecido o livro em casa.

Eu mandava bilhetinhos aos pais ressaltando a importância da leitura e o es-


quecimento do livro pelo seu filho dois dias antes de retomarmos a leitura. Então,
apareciam com o livro porém, sem as marcas exploradas das aulas anteriores, isso
dificultava o trabalho, porque sempre retomávamos brevemente o que foi discuti-
do nos capítulos anteriores, buscando através das marcas e o aluno não as tinha,
depois copiava do colega.

Em leitura há também o caderno de texto. Esse é portador de vários textos que


são trazidos pelos alunos e ou pelo professor, considerado como atividade perma-
nente. Cada aluno tem seu caderno personalizado e com textos xerocados e colados.
Inclui-se uma diversidade de gêneros: narrativos, poéticos, científicos, HQs, piadas,
músicas e jornalísticos. Alguns desses textos têm marcas combinadas entre a turma,
para identificar o tema, a localizar a ideia principal, a resposta, o conflito criar legen-
da, palavras desconhecidas, outros foram só comentados como no caso das crônicas
e piadas. A proposta com esse caderno é que venha ser utilizado nas posteriores série
do ensino fundamenta II. No ensino fundamental I já é utilizado, pois os alunos leem
para outras turmas levam para casa e leem para os pais e vice e versa.

Ressalto que essas bibliografias, textos mesmo com uma diversidade de gêne-
ros, por si só, sem planejamento, sem intervenção de nada servem se não ensinar-
mos aos nossos alunos a lerem cada um com sua significância , a construírem suas
ferramentas que possibilitam, complementam o acesso ao conhecimento.

É necessário planejar, definir os objetivos a serem atingidos em cada momen-


to de leitura para que venham a ser desenvolvidas as habilidades e competências
leitora e escritora dos nossos alunos, é um trabalho de formiguinha, que aos pou-
cos vai formando o leitor proficiente.

101
R f r nci s BIBLIOGR FIC s
ECO, Umberto. O nome da rosa. Rio de Janeiro: Record. 1986.

Ler e escrever: compromisso de todas as áreas. Organizado por Iara Conceição Bittencourt,
Jussara Vieira Souza, Neiva Otero, Paulo C. Guedes, Renita Klusener. Ed. UFRGS, 2006.

Secretaria Municipal de Educação. Referencial de expectativas para o desenvolvimento


da competência leitora e escritora do ciclo II. Caderno de orientação didática de
História. São Paulo, 2006.

SOLÉ, Isabel. Estratégia de leitura. 6 ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.

102 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

21
Arte, espaço e a criança27
INTRODUÇÃO
Percebemos diversas concepções equivocadas com relação às propostas de artes:
a organização do material e do espaço, o tempo para a realização da proposta, a
comanda apresentada, as aprendizagens das crianças e o destino das produções.

Assumimos, então, a necessidade de estudar sobre arte na Educação Infantil, a


importância da exploração de diversos materiais: tinta, água, areia, terra, argila, lápis,
pincéis, melecas, papéis de diversas cores e tamanhos, tecido, papelão, parede de azule-
jo, chão etc.

A PROPOSTA
Passamos por algumas etapas nesse processo:

• Apresentação da proposta de estudo em HTPC;


• Disponibilização do material para estudo;
• Organização dos grupos para apresentação do seminário a partir do 1º ca-
pítulo do livro Desenvolvimento da Capacidade Criadora;
• Levantamento de novas propostas, relacionando teoria e prática;
• Filmagem das propostas de arte para reflexão do grupo;
• Avaliação do trabalho.

Salientamos que nossos encontros tiveram três momentos que merecem ser
apontados: recusa, encantamento e reflexão.

No início, o grupo apresentou resistência em relação à proposta. Ti-


vemos algumas discussões durante o estudo, organização e apresen-
tação do seminário. Mas concluíram que o estudo foi necessário e
extremamente produtivo: “Um momento de descontração e de refle-
xão para nós”
(NILZABETE, PROFESSORA QUE REDIGIU A SÍNTESE DE UM DOS EN-
CONTROS - 25/04).

27. Texto elaborado por Ana Carla Paiva, Maria Cristina O. M. Camargo, Silvana de Campos. Equipe Gestora da EMEB
Parque do Paraíso.

103
AS CRIANÇAS E A EXPLORAÇÃO
Sabemos, não é de hoje, que a criança se desenvolve pela a interação com o
meio, pela experiência com diversos materiais, pela exploração dos espaços. E segun-
do o Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil (1998, vol. 1, p. 21-22):

As crianças constroem o conhecimento a partir das interações que es-


tabelecem com as outras pessoas e com o meio em que vivem. As inte-
rações que ocorrem dentro dos espaços são de grande influência no
desenvolvimento e aprendizagem da criança. O educador não deve ser
visto como figura central do processo de ensino-aprendizagem, mas
os espaços devem ser organizados de forma a desafiar a criança nos
campos: cognitivo, social e motor, oportunizando a criança de andar,
subir, descer e pular, através de várias tentativas, assim a criança esta-
rá aprendendo a controlar o próprio corpo, um ambiente que estimule
os sentidos das crianças, que permita a elas receber estimulação do
ambiente externo (...).

Desde o nascimento, a criança precisa de espaços que ofereçam liberdade e


exploração de movimentos e que, acima de tudo, possibilitem uma socialização
com o mundo e com as pessoas que a rodeiam. Numa perspectiva de desenvolvi-
mento e aprendizagem da criança no contexto da Educação Infantil, o espaço físi-
co torna-se um elemento fundamental e indispensável e deve proporcionar condi-
ções para que se possa utilizá-lo e explorá-lo.

Lowenfeld e W. L. Brittain dão ênfase ao processo: “O importante é o processo


da criança – o seu pensamento, os seus sentimentos, as suas percepções, em suma, as suas
reações ao seu ambiente”.

Outro aspecto relevante que precisa estar presente na prática do professor é ou-
vir e observar como as crianças se relacionam “com” e “nos” diferentes ambientes, de
modo que percebam suas necessidades e interesses demonstrados com o intuito de
realizar as modificações necessárias nestas propostas. Diante disso, temos professo-
res que já olham para as ações das crianças no espaço da escola tendo em vista a bus-
ca por estas respostas: quais são seus interesses, o que lhes provocam a curiosidade e
quais são suas necessidades. Infelizmente este olhar ainda não é de todos.

Acreditamos que o elemento norteador do trabalho dos professores que se


lançam ao desafio de modificar uma prática ou inovar seu fazer acontece quando
ele avalia sua prática, o que deu certo, o que precisa ser aprimorado para uma pró-
xima vez. Percebemos que as professoras que alteram seu modo de dar aula tendo o
hábito de refletir criticamente sobre suas ações, frente a este olhar, buscam melho-

104 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

rar e aprimorar o seu trabalho. Nesse ínterim alguns questionamentos emergem,


tais como: Difícil? Não dá pra fazer isso com os meus alunos! Como eu vou dar
conta de tudo sozinha? Mas as propostas aparecem e as crianças são convidadas:

Tocar e investigar é o único meio


da criança compreender o mundo
ANNA MARIE HOLM (2007)

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Arte é ver, sentir, cheirar, provar...
(V.LOWENFELD E W. L. BRITTAIN, P. 17, 1970)

Assim, notamos que o grupo de professores desta unidade reconhece a im-


portância do espaço, de sua organização, exploração e planejamento, entretanto,
isto não é tão explicitado na prática de todos, pois algumas professoras ainda estão
restritas ao espaço da sala de aula. Formações e discussões já foram feitas, mas ve-
mos que o tempo de informação é um e o converter em conhecimento e prática a
informação recebida é outro.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Infantil. Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília, DF: MEC, 1998.

LOWENFELD, Viktor; BRITTAIN, W. Lambert. Desenvolvimento da Capacidade Criadora. São


Paulo: Mestre Jou.

HOLM, Anna Marie. Baby-Art: os primeiros passos com a arte. São Paulo: Museu da Arte
Moderna, 2007.

105
22
A Leitura nos diferentes
âmbitos da escola 40
Ler é um hábito social. Não nascemos leitores; nos tornamos leitores por
convívio e por contato. Por isso, a oferta da leitura literária pelos pais e
professores, de forma amorosa, é fundamental para que a prática se tor-
ne agradável e contribua para o letramento das crianças, preparando-as
para momentos futuros em que a leitura, em seus múltipos suportes e
funções, vai demandar esforço e nem sempre será um prazer.28

Enquanto gestoras da EMEB Profª Vera de Almeida Santos, sempre procuramos prio-
rizar um trabalho que realmente garanta a qualidade na aprendizagem de nossos alunos
e pensamos em formas para inserir a família na vida escolar das crianças. Sabemos que
a não participação dos pais na vida escolar de seus filhos ocorre na maioria das vezes
pelo fato da incompatibilidade dos horários de trabalho, uma vez que a maioria dos pais
da nossa escola trabalham em empresas privadas. Justificamos estas informações com o
diagnóstico realizado para o PPP da escola.

Acreditamos que participar não se restringe apenas à presença dos pais na es-
cola, sendo assim procuramos formas de inseri-los num contexto onde possam con-
tribuir com ideias, sugestões, decisões, recados em agenda, conversas informais,
reuniões individuais, fortalecendo o vínculo família-escola. Pensando na valoriza-
ção da participação dos pais na escola como um bem para o aluno, fazendo-os par-
ceiros e colaboradores nas atividades desenvolvidas dentro da mesma e cientes de
que a formação leitora é um processo longo, que deve iniciar na primeira infância, de-
cidimos promover ações de leitura tentando sensibilizar os diversos segmentos da

escola e comunidade local em relação à leitura, conforme Kátia Lomba Brakling (2008)29:

Se a finalidade do trabalho com a leitura na escola é aprender a partici-


par das práticas sociais de leitura que acontecem em todos os espaços,
mesmo externos à escola, então, deve-se trazer para a sala de aula, as
práticas de leitura relevantes para a efetiva participação cidadã. À se-
melhança do que já se disse, ler é importante na escola porque é impor-
tante fora dela, e não ao contrário.
28. Christine Fontelles, Diretora de Educação e Cultura do Instituto Ecofuturo.
29. BRAKLING. Leitura do mundo, leitura da palavra, leitura proficiente: Qual é a coisa que esse nome chama?
Revista Aprender Juntos, Edição SM, 2008.

106 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Desta forma, destacamos alguns objetivos que permeiam esse nosso trabalho:

• Incentivar e orientar a leitura, visando o desenvolvimento do gosto pela


mesma;
• Fomentar uma cultura de valorização da leitura na escola e na comunidade;
• Fortalecer uma parceria entre escola e comunidade;
• Acompanhar e apoiar o trabalho dos professores e aprendizagem dos alunos
nesse sentido.

A partir destes, direcionamos algumas ações para fortalecer este trabalho


contando também com a parceria dos pais, visto que sentimos a necessidade de
ampliação e aprimoramento do trabalho com a leitura, iniciado a partir da forma-
ção Entre na Roda (2007), ocorrida na Diretoria de Educação e que teve como
finalidade a importância do planejamento da leitura, a escolha do livro e texto de
qualidade, a diversidade do gênero e portador textual e estratégias de leitura. A am-
pliação deste trabalho foi realizada em HTPCs (Horário de Trabalho Pedagógico
Coletivo) com estudo, discussões e tematizações de práticas envolvendo a leitura.
Já com os pais esta sensibilização ocorreu nas reuniões, para as quais foram plane-
jados momentos de leitura.

Na escola (...) a leitura é antes de mais nada um objeto de ensino. Para que se
transforme num objeto de aprendizagem, é necessário que tenha sentido do ponto
de vista do aluno, o que significa – entre outras coisas – que deve cumprir uma
função para a realização de um propósito que ele conhece e valoriza30

A avaliação desta proposta foi positiva mediante a reação dos pais, bem como
a participação dos mesmos neste processo.

AÇÕES DESENVOLVIDAS NO PROJETO INSTITUCIONAL


Leitura diária realizada pelo professor

Na rede municipal de Cajamar o trabalho desenvolvido é baseado nas modalida-


des organizativas (Projetos, Sequências Didáticas, Atividades Permanentes e de
Sistematização). Sendo assim, esta ação é uma prática desenvolvida dentro das ati-
vidades permanentes.

30. LERNER, Delia. É possível ler na escola? Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Edição de
2002.
107
Leitura espontânea realizada pelos alunos

Os professores entendem que a leitura espontânea, pessoal e selecionada pela


criança é de fundamental importância para a formação do hábito de bons leitores.
Desta forma, proporcionam abertura para que as crianças leiam livros de seus inte-
resses. Este é um momento de suma importância para o aluno e que os professores
priorizam como sendo o ponto de partida para desenvolver o gosto pela leitura.

A rotina desta ação acontece em dois momentos: enquanto atividade permanente,


sendo que o professor reserva um horário na semana a fim de que os alunos pos-
sam fazer suas próprias escolhas (uso do baú de livros ou cantinho da leitura). O
outro momento acontece nas situações de atividade de passagem, momento este
em que o aluno, após terminar uma atividade proposta pelo professor, tem a auto-
nomia de escolher um livro para ler.

Empréstimo de livro para que os pais realizem a leitura em casa para


o aluno

Na primeira reunião (de pais) do ano, os professores socializam com os pais esta
ação explicando os objetivos da mesma e orientando-os para que isso aconteça
de forma efetiva com todos os alunos. Na rotina semanal do professor esta ação é
realizada semanalmente, geralmente às sextas-feiras o aluno leva o livro para a casa
para que os pais ou um adulto leia para ele. Junto com o referido livro é enviado um
roteiro com orientações para a realização da leitura pelos pais.

Avaliamos que este é um dia de muita ansiedade e espera pelos alunos, uma
vez que esta ação acabou tendo duas vertentes: uma já esperada que é a leitura en-
quanto objeto de aprendizagem e a outra que é o livro, enquanto vínculo afetivo
entre a escola e a família.

Diário onde os pais registram espontaneamente depoimento de


como foi a experiência ao realizar a leitura em casa para o filho

Este diario é enviado juntamente com o livro para que os pais possam relatar a ex-
periência de leitura realizada com os filhos em casa. Como foi, qual a expectativa
para este momento por ambas as partes e tudo mais que os pais julgarem necessá-
rio registrar. Segue abaixo parte de um relato dado por uma mãe sobre a experiên-
cia de ler para o filho:

(...) Acho muito importante este projeto de leitura, pois estimula e in-
centiva a leitura dos pequenos desde cedo, sem contar que fortalece o

108 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

vínculo e também o diálogo entre pais e filhos. É um momento muito


prazeroso diante da agitada rotina de todos os dias, é muito bom po-
der compartilhar e acompanhar mais de perto o crescimento do desen-
volvimento intelectual deles. Parabéns, ótima iniciativa (Célia, mamãe
da aluna Sabrina – Fase IV).

Participação dos funcionários e gestores na contação de histórias

No momento de reunião do trio gestor com os funcionários, realizamos a sociali-


zação do Projeto Institucional a fim de que pudessem ter conhecimento das ações
que seriam realizadas na escola no que se refere ao trabalho com a leitura e, com
isso, da participação deles neste processo.

O professor e os alunos, elaboram um convite para que o funcionário ou o ges-


tor vá até a sala contar uma história. O mesmo escolhe uma história e agenda um dia
para a contação. Este momento é significativo e serve como incentivo aos alunos,
pois eles percebem que todos possuem esse hábito e prazer em realizar a leitura.

Participação dos pais realizando leitura em sala de aula

Na primeira reunião de pais, nós, gestoras da UE, socializamos o Projeto Parceiros


da Leitura, deixando claro para eles que esta ação é uma das formas de fortalecer
a parceria escola-comunidade. As professoras realizam agendamento com os pais
com uma semana de antecedência, conforme a disponibilidade de tempo que os
mesmos possuem. Antes da realização da leitura, os pais mostram o livro para a
professora da sala para que a mesma tenha conhecimento e realizam os combina-
dos necessários para que tudo dê certo no dia da leitura. No dia combinado os pais
vão para a sala de aula realizar a leitura aos alunos.

Realizamos o registro desses momentos através de fotos e filmagens com de-


poimentos dos pais participantes. Segue abaixo um relato de uma mãe que partici-
pou desse momento:

“(...) Foi uma experiência muito somativa, tanto como mãe, quanto
profissional, pois é encantador prender a atenção das crianças, sentir
o entusiasmo deles e a curiosidade para saberem o que se segue em
cada página. Me senti orgulhosa com o desenvolvimento escolar do
meu filho e espero poder participar ativamente do cotidiano e ativida-
des realizadas na escola
(ROSELI, MAMÃE DO ALUNO BRENO – FASE V).

109
Empréstimo de livros para os funcionários e comunidade

Reservamos um espaço na escola com diferentes gêneros e portadores textuais


para que os pais sintam-se à vontade para realizar o empréstimo de livros e a leitura
enquanto aguardam o atendimento. Os funcionários também podem realizar a lei-
tura em seu horário de almoço, bem como há empréstimo dos mesmos.

Percebemos que, de todas as ações realizadas, esta ainda necessita de um inves-


timento maior, uma vez que, principalmente na questão do empréstimo de livros,
ainda a adesão é bem pequena. Temos planejado em nossas ações para este ano rea-
vivar este foco do projeto, através de reuniões de sensibilização sobre o mesmo.

Podemos avaliar que tais ações têm como resultado a intensificação do incenti-
vo à leitura e a integração dos diversos setores da escola, mas que ainda, como todo
projeto, necessita de replanejamentos específicos, tais como a compra de novos títu-
los para diferentes faixas etárias e o fortalecendo do projeto de maneira mais signifi-
cativa, principalmente nos empréstimos de livros aos funcionários e pais.

110 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

23
O processo de alfabetização: ações que
fizeram a diferença 43
O mundo é do tamanho do conhecimento que temos dele. Alargar o
conhecimento, para fazer o mundo crescer, e apurar seu sabor, é tarefa
de seres humanos. É tarefa, por excelência, de educadores.31

No primeiro conselho de classe de 2011, diante do diagnóstico inicial e do 1º bi-


mestre, ficou constatado um grande número de alunos ainda não alfabetizados.
Após termos realizado uma análise e comparação aprofundada dos dados, vimos
que teríamos que unir forças para ampliarmos os conhecimentos dos nossos edu-
candos e alcançarmos a meta: todos os alunos alfabetizados, salvo os casos pato-
lógicos, até o final do ano letivo. Sendo assim, toda a análise realizada causou um
certo incômodo e desconforto na equipe de professores, gestores, supervisor e
assistente pedagógico de alfabetização, todos presentes nesse conselho de classe.
Percebemos que, apesar de tudo o que havíamos feito, trabalho diversificado, recu-
peração contínua, jogos, entre outros, ainda tínhamos muitos problemas a serem
resolvidos, indicando um longo trabalho pela frente.

Quando estudamos os dados do mapeamento do sistema de escrita inicial, vi-


mos que tínhamos quinhentos e quarenta e um alunos matriculados no ensino fun-
damental, sendo trezentos e oitenta e cinco alfabetizados e cento e cinqüenta de seis
não alfabetizados. Dos alunos não alfabetizados tínhamos noventa e quatro alunos
que relacionavam som e grafia, e sessenta e um alunos que não relacionavam som
e grafia. Sessenta e oito alunos não conheciam todas as letras e trinta e sete escre-
viam somente o primeiro nome. Os dados mostravam metas que já deveriam ser
superadas nos anos anteriores de escolaridade, como, por exemplo, a escrita do
nome completo, o reconhecimento de letras e o relacionar som e grafia. Nessa aná-
lise levamos em conta que nem todos os nossos alunos frequentaram o primeiro
ano do ensino fundamental ou sequer a Educação Infantil, bem como houve troca
constante de professores nos anos anteriores, por isso tínhamos que focar os maio-
res esforços nos 2° e 3° anos.

31. RIOS, Terezinha Azeredo. Compreender e ensinar. Por uma docência da melhor qualidade. Cortez Editora. 3ª
edição, p.24.

111
Logo vimos um desafio ainda maior na nossa escola, pois temos sete salas
para as quais os professores estão designados para outras funções na educação, e
todos os anos recebemos na maioria das vezes professores novos que não são da
rede de ensino de Cajamar, muitas vezes chegam sem entender a concepção da
rede, passam pela formação continuada sobre o trabalho diversificado, recupera-
ção contínua, jogos, dentre outros, e logo vão embora, deixando muitas vezes o
trabalho realizado pela metade, não criando vínculos fortalecidos com os alunos
e causando lentidão no processo de aprendizagem. Por isso, era necessário inves-
tir nos acompanhamentos pedagógicos pontuais nos anos iniciais, nas formações
continuadas para toda a equipe escolar e investir no fortalecimento do grupo do-
cente, onde os professores “novos” pudessem contar com o auxílio também dos
colegas, ou seja, vendo os mesmos como pares avançados. Esses acompanhamen-
tos pedagógicos e formações eram uma meta não só para a equipe gestora, que já
realizava esse processo, mas sim tratava-se de apoio mais intensificado das assisten-
tes pedagógicas de alfabetização e da supervisão.

Logo no início do primeiro bimestre vimos os dados mudarem significativa-


mente, ou seja, conseguimos que mais trinta e dois alunos avançassem no reconhe-
cimento de todas as letras do alfabeto, ficando trinta e seis crianças para o próximo
bimestre. Quanto à escrita de nome completo, vinte e dois avançaram nesse pro-
cesso, deixando apenas quinze para os próximos bimestres, como podemos ver no
mapeamento a seguir do 1° bimestre.

112 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Estabeleceu-se então uma parceria ainda mais intensificada entre todos os en-
volvidos no processo de ensino e aprendizagem: professores, estagiárias, gestores,
supervisão, APs de alfabetização, iniciando um processo de reflexão diante dessa
situação: Que atividades deveríamos sistematizar ainda mais? Que ações, enquan-
to grupo, poderíamos estabelecer? Como? Quais as salas que seriam foco de for-
mações e acompanhamentos?

Foi nesse momento do conselho que decidimos de forma coletiva que todos
se envolveriam no processo de alfabetização valorizando a diversidade existente na
sala de aula, pois,

Ensinar a todos significa aprender a lidar com a diversidade. Sabemos que


essa diversidade pressupõe diferenças individuais, sociais, culturais, étnicas, físi-
cas, de gênero, de interesse, de aprendizagem etc. E, na escola, muitas vezes estão
relacionadas: por exemplo, diferenças de aprendizagem podem estar associadas a
diferenças sociais e culturais.32

Descreveremos as ações que estabelecemos e conseguimos sistematizar:

RECUPERAÇÃO CONTÍNUA DIÁRIA DE TRINTA MINUTOS, realizada pelo professor da


sala com o apoio das estagiárias, planejando e executando atividades e atuações di-
versificadas, como: jogos industrializados e confeccionados pelas professoras, ativi-
dades de escrita como cruzadinhas e caça-palavras, bingo de letras e palavras, entre
outras atividades. Levando em consideração o nível de aprendizagem dos alunos e
sempre pensando nos pares avançados para fazer os agrupamentos produtivos.

Todo esse processo foi monitorado, tanto pelos registros nas rotinas semanais,
como também por meio das visitas em sala de aula, realizadas pela gestão esco-
lar, supervisão e assistentes pedagógicos de alfabetização;

CRONOGRAMA PARA AS ESTAGIÁRIAS ajudarem as professoras nesse processo,


ficando com os alunos com rendimento satisfatório, propondo atividades de sis-
tematização planejadas na rotina semanal, enquanto o professor da sala traba-
lhava com os alunos não alfabetizados com atividades diversificadas;

FORMAÇÕES EXTERNAS DOS SEGUNDOS E TERCEIROS ANOS, com as APs de alfa-


betização, com propostas pontuais no trabalho com jogos e atuação diversifica-
da, com foco no processo de alfabetização. Após essas formações os professores
planejavam suas aulas levando em conta o que foi discutido nesses encontros,
objetivando a melhor qualidade;

32. Módulo Introdutório do Estudar pra Valer! p.2

113
FORMAÇÕES INTERNAS NOS HTPCS com tematização da prática dos professores,
garantindo a troca de experiências, discussões e reflexões. Relatos orais e filma-
gens de algumas atividades sobre o trabalho diversificado e atuação diversificada
fizeram a equipe escolar refletir sobre as práticas em sala de aula;

OS PROFESSORES ESPECIALISTAS DE ARTE E EDUCAÇÃO FÍSICA do período da ma-


nhã focaram a alfabetização no projeto contraturno, fazendo uso das ativida-
des diversificadas (jogos e atividades que contemplavam o nível de aprendiza-
gem dos alunos não alfabetizados);

PROJETO DE RECUPERAÇÃO PARALELA, que aconteceu nos dois períodos por um bi-
mestre (segundo bimestre), sendo trabalhadas as propostas discutidas nos HTPCs.
No entanto, no terceiro e quarto bimestres tive a recuperação paralela somente no
período da manhã, pois não tínhamos professores disponíveis na rede para o perí-
odo da tarde, por isso todos os alunos desse período participaram da recuperação
contínua em sala de aula. Em síntese, como nos diz Solé (2004, p. 53),

(...) o desenvolvimento afeta todas as capacidades humanas e todas


devem ser levadas em conta durante a elaboração de um projeto edu-
cativo, principalmente se nesse projeto educativo o professor busca
intervir na formação cidadã dos estudantes.

Diante de todas as ações realizadas e já descritas nesse relato, concluímos que a


escola teve um grande avanço no número de alunos alfabetizados, conforme com-
prova o mapeamento referente ao quarto bimestre.

114 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

E o mais importante de todo esse processo foi o fortalecimento do grupo e


a disponibilidade em refletir sobre as experiências pedagógicas, além do envolvi-
mento na questão da alfabetização de todos os alunos da nossa unidade escolar.
Embora não tenhamos alcançado as metas estabelecidas, foi possível registrar um
grande avanço dos nossos alunos, uma vez que a equipe escolar fez a diferença na
vida desses educandos.

115
24
O Brasil no Planeta Terra33
Desde o segundo semestre de 2009 atuando como assessora pedagógica da EMEB
Eva Rosa de Oliveira Santos (antiga EMEB Bairro do Paraíso), venho desenvol-
vendo um trabalho visando ampliar a qualidade docente e melhorar a qualidade
do ensino-aprendizagem dos alunos. Em 2011, diante das conversas e do resultado
abaixo do esperado no mapeamento da área de Geografia, elaborei e desenvolvi
um projeto a fim de propor um trabalho diferenciado, onde os alunos pudessem
aprender de forma contextualizada e descontraída, onde fosse possível apresentar
aos professores o quanto é possível trabalhar esta área do conhecimento, aparen-
temente difícil de dominar, segundo relato dos mesmos, apoiando-se nas metas e
expectativas da rede e envolvendo as outras disciplinas, sendo:

EXPECTATIVAS DE GEOGRAFIA
• Utilizar a linguagem cartográfica para representar e interpretar informações;
• Saber indicar direção, distância e proporção;
• Construir conjuntos, atitudes que os possibilitem conhecer a organização, o
espaço geográfico e suas transformações;
• Analisar interações entre sociedade e natureza na organização do espaço
histórico e geográfico, envolvendo a cidade e o campo;
• Localizar-se, utilizando pontos de referência e direções.

EXPECTATIVAS DE HISTÓRIA
• Construir linhas do tempo para organizar cronologicamente os assuntos es-
tudados;
• Produzir textos de opinião baseados em argumentos;
• Conhecer a origem, a evolução das indústrias no Brasil (séculos XIX e XX).

O PROJETO DESENVOLVIDO TEVE AS SEGUINTES ETAPAS:


• Imagem projetada - “crianças observando”;
• Conhecendo o Brasil através de Danilo Caymmi;
33. Autoria

116 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

• Estados divididos e jogo de “dominó”;


• Conhecendo as regiões brasileiras;
• Pequeno retrato das grandes regiões;
• Contando os estados e as regiões;
• Notícias do Brasil com Milton Nascimento;
• Medindo distâncias entre os estados;
• Região Sudeste;
• Obra O Operário, de Tarsila do Amaral;
• As indústrias em Cajamar;
• Região Sul;
• A chegada de novos moradores “Os Imigrantes”;
• Região Nordeste;
• Seca no Nordeste e transposição do rio São Francisco;
• Região Centro-Oeste;
• Parque do Xingu;
• Região Norte;
• Produto final.

Diante das expectativas das áreas e das etapas que selecionei, surgiram-me dúvidas como:
Onde aplicar determinado conteúdo? Há uma ordem coerente para aplicar o mesmo?

A didática e os trabalhos planejados e desenvolvidos pelos alunos devem apre-


sentar uma graduação em seu conhecimento, porém como conseguir tal graduação
numa área em que achamos que é difícil trabalhar? Diante da dificuldade em sequen-
ciar o conteúdo didático, contatei a AP de Geografia, explanando meus objetivos, e
julgo ser esta a melhor decisão por mim tomada, pois somente ela e nosso assessor
externo, conhecedores da área, poderiam subsidiar-me de forma clara e objetiva.

O atributo principal era sequenciar atividades diferenciadas contribuindo


com os professores para que a área de Geografia não se tornasse maçante e para
que aos alunos as atividades tivessem significado e fosse efetiva a aprendizagem.

Todo o trabalho foi desenvolvido através de pesquisas em livros didáticos que


a escola recebe no início do ano. Reuni materiais diversos como: livros didáticos,
jogos, jornais, DVDs.

Segundo os PCNs de Geografia, p. 33,

Ao pretender o estudo das paisagens, territórios, lugares e regiões, a


Geografia tem buscado um trabalho interdisciplinar, lançando mão de
outras fontes de informação. Mesmo na escola, a relação da Geografia
com a Literatura, por exemplo, tem sido redescoberta, proporcionando

117
um trabalho que provoca interesse e curiosidade sobre a leitura desse
espaço. É possível aprender Geografia desde os primeiros ciclos do En-
sino Fundamental, mediante a leitura de autores brasileiros consagra-
dos (Jorge Amado, Érico Veríssimo, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa,
entre outros), cujas obras retratam diferentes paisagens do Brasil, em
seus aspectos sociais, culturais e naturais. Também as produções mu-
sicais, a fotografia e até mesmo o cinema são fontes que podem ser
utilizadas por professores e alunos para obter informações, comparar,
perguntar e inspirar-se para interpretar as paisagens e construir co-
nhecimentos sobre o espaço geográfico.

Trabalhei com músicas de Danilo Caymmi e de Milton Nascimento, onde


os alunos notaram que estavam aprendendo Geografia através das estratégias de
leitura desenvolvidas pela rede.

Desenvolvi jogos de memórias e quebra-cabeças de imagens, como está rela-


tado nos PCNs de Geografia, p. 33,

A Geografia trabalha com imagens, recorre a diferentes linguagens na


busca de informações e como forma de expressar suas interpretações,
hipóteses e conceitos. Pede uma cartografia conceitual, apoiada em
fusão de múltiplos tempos e em linguagem específica, que faça da lo-
calização e da espacialização uma referência da leitura das paisagens e
seus movimentos. Na escola, fotos comuns, fotos aéreas, filmes, gravu-
ras e vídeos também podem ser utilizados como fontes de informação e
de leitura do espaço e da paisagem. É preciso que o professor analise as
imagens na sua totalidade e procure contextualizá-las em seu processo
de produção: por quem foram feitas, quando, com que finalidade etc., e
tomar esses dados como referência na leitura de informações mais par-
ticularizadas, ensinando aos alunos que as imagens são produtos do
trabalho humano, localizáveis no tempo e no espaço, cujos significados
podem ser encontrados de forma explícita ou implícita.

O projeto é apresentado através de um projetor e, com aulas expositivas uti-


lizando mapas, jogos, músicas e quebra-cabeça, durante o desenvolvimento do
projeto decidi ministrar as aulas, porque queria acompanhar o processo e ver se
acontecia o desenvolvimento da aprendizagem nos alunos.

Segundo os PCNs de Geografia, p. 30,

É imprescindível o convívio do professor com o aluno em sala de aula,


no momento em que pretender desenvolver algum pensamento críti-
co da realidade por meio da Geografia. É fundamental que a vivência
do aluno seja valorizada e que ele possa perceber que a Geografia faz
parte do seu cotidiano, trazendo para o interior da sala de aula, com

118 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

a ajuda do professor, a sua experiência. Para tanto, o estudo da socie-


dade e da natureza deve ser realizado de forma interativa. No ensino,
professores e alunos poderão procurar entender que tanto a sociedade
como a natureza constituem os fundamentos com os quais paisagem,
território, lugar e região são construídos.

O projeto teve início no dia 18-08-2011. Iniciei a aula explicando para as crian-
ças que iríamos trocar experiências até o mês de dezembro e que nos encontraríamos
uma vez por semana. Expliquei o projeto na íntegra para eles e ressaltei que durante
o mesmo iria precisar muito deles com trocas de experiências, com críticas se não es-
tivessem gostando para que, juntos e na medida do possível, fizéssemos adaptações,
com participação ativa e com atividades que deveriam ser realizadas em casa.

Uma etapa marcante foi quando trabalhei com a música de Danilo Cayammi. Neste
dia a assessora do Aprender e Aprender esteve presente. A mesma não faz parte do grupo
da escola, porém tem uma experiência fantástica, podendo contribuir para que o projeto
tivesse seus objetivos alcançados. A atividade foi desenvolvida com a seguinte música:

Brasil, sei lá Tatuí, tamanduá


Eu não vi na terra inteira Maracajá
O que nessa terra dá Suçuarana e guará
E o que é que dá? Pirarucu, tucunaré, cará
Gabiroba, gameleira, Da dança do Quarup ao Boi Bumbá
Guariroba, gravatá Dá Sanhaço, tie-sangue, tangará
Tambatajá, ouricuri e juremá Dá curió e sabiá
Xingu, Jarí, Madeira e Juruá E dá vontade de cantar
Do Boto cor-de-rosa ao Boitatá E o que é que dá?
Dá Goiaba, cajá-maga e cambucá Ouricuri e juremá
Caju, pitanga e guaraná E o que é que dá?
E dá vontade cantar Caju, pitanga e guaraná
Brasil, sei lá E o que é que dá?
Ou o meu coração se engana Suçuarana e guará
Ou uma terra igual não há E o que é que dá?
E o que é que dá? Dá curió e sabiá
Tatu-bola, taturana E o que é que dá?
Dá é vontade de cantar

Pesquisei na internet imagens de plantas, animais e frutas que apareciam na letra


da música. Antes de iniciar a aula, coloquei todas as imagens debaixo das cadeiras, arru-
mei o data show, preparei a sala, dividi as crianças em grupo e iniciei a aula explicando a

119
eles que hoje iriam aprender sobre o Brasil através da música de Danilo Caymmi.

Ao iniciar ia questionando as crianças se elas conheciam o que Danilo citava


como: gabiroba, gameleira, guariroba, gravatá, tambatajá, ouricuri, jurema, Xin-
gu, Jarí, Madeira, Juruá, Tatuí, tamanduá, maracajá , suçuarana, guará, pirarucu,
tucunaré e cará. Conforme questionava os alunos, eles diziam que não conheciam
ou diziam respostas erradas como: suçuarana eles disseram que era cobra. Disse a
eles que deveriam pegar embaixo das cadeiras uma imagem e que iríamos fazer a
separação por espécie. A aula não foi melhor porque a tecnologia resolveu não fun-
cionar, ou seja, o data show não ligava, o som da televisão não saía, mesmo com as
dificuldades enfrentadas devido ao não funcionamento da tecnologia, as crianças
realmente se mostraram muito participativas e interadas sobre o tema.

Durante as etapas, tivemos uma que foi marcante: “Seca no nordeste e transpo-
sição do rio São Francisco”. Tivemos a honra de ter a presença do assessor externo
explicando sobre a transposição do rio São Francisco, realizando com os alunos uma
experiência, usando como recurso garrafas PET, para explicar o que e como aconte-
ceria a transposição do rio São Francisco. As crianças participaram da aula oralmente.
Durante as etapas desenvolvidas os alunos apresentaram uma participação
ativa e significativa. A cada término da aula, questionávamos o que eles haviam
aprendido e retomávamos as etapas anteriores, construímos linhas do tempo, as-
sistimos DVDs com histórias das regiões brasileiras, construímos cartazes, pinta-
mos o mapa do Brasil no chão da escola, construímos linha do tempo, jogamos
dominó com as capitais brasileiras, todas estas etapas estavam previstas para que a
aprendizagem acontecesse de forma agradável.

120 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

25
O Pote Vazio
e a Cadeira do Dentista34
No início do segundo semestre do ano de 2011, a gestão, mais a supervisora da
escola EMEB Eva Rosa de Oliveira Santos, onde trabalho, me convidaram a de-
senvolver um trabalho na área de Língua Portuguesa envolvendo as estratégias de
leitura, devido ao baixo rendimento dos alunos, tanto na avaliação interna como
externa. O trabalho foi desenvolvido em parceria com a assessora pedagógica, a
supervisora, a A.P de comunicação e eu, “a professora da sala”.

Nossa tarefa consistia em planejar sequências didáticas de leitura, desenvolvê-


-las na minha sala regente, 5º ano C, bem como analisar a prática para replanejá-la.
Com isso em mãos, nos encontros de HTPC eu socializava as sequências didáti-
cas de leitura desenvolvidas com o grupo de professores, deixando-as à disposição
para quem quisesse aplicar, pois esta previsto em nosso Projeto Político Pedagógi-
co desenvolver estratégias de leitura quinzenal, levando em consideração não só a
realização da leitura, mas também a interpretação do que foi lido.

Com a primeira sequência feita, utilizamos uma crônica de Carlos Eduardo No-
vaes, intitulada A Cadeira do Dentista. As crianças vivenciaram a leitura da imagem da
capa do livro, sugerindo possibilidades que poderiam estar contidas no texto que iriam
trabalhar e se surpreenderam ao confrontar suas hipóteses com o conteúdo do texto ori-
ginal, fazendo com que, durante as atividades propostas, os alunos buscassem informa-
ções implícitas e explícitas. Isso reforçou ainda mais nossos objetivos perante as dificul-
dades já detectadas nos diagnósticos.

Também o texto possuía vocabulário diferente daquele de costume dos alunos,


visto que eles possuem um vocabulário restrito, com palavras e expressões do cotidia-
no. Aproveitando isso, uma das etapas era localizar as palavras desconhecidas e, dentro

do contexto, buscar os significados para melhor compreender a leitura.

Para a segunda sequência didática utilizei o livro O Pote Vazio, porque no momen-
to da escolha lembrei-me de uma formação da qual participei, do Projeto Estudar pra
Valer, um dos projetos pertencentes à rede de ensino do Município de Cajamar para a
34 autoria

121
área de Língua Portuguesa. Uma das formações ocorreu no centro de São Paulo, com
várias tendas com diferentes oficinas. Participei da oficina Contadores de História, onde
vivenciei o conto chinês A Semente da Verdade. A contadora tirou do baú uma blusa,
representando a vestimenta chinesa, e foi contando. Em dado momento, ela entregou
uma semente para cada participante. Lembro-me de que a semente era uma semente de
pêssego torrada. Utilizando somente estes recursos, foi tão significado e prazeroso que
ficou marcado em minha memória.
Ao escolher este livro relembrei de tudo que passei e socializei com a equipe gesto-
ra. Elas ficaram fascinadas e propuseram-me fazer o mesmo trabalho na escola.

A princípio seria uma dramatização simples, porém as ideias não paravam de surgir
e, a cada etapa, a empolgação crescia. Começamos a colocar adereços e o que deveria ser
um baú apenas acabou se transformando em três baús improvisados. Ficou completíssi-
ma a encenação, tendo vários recursos visuais.

Data marcada, sala preparada, transformada num verdadeiro palco teatral, iniciei a
aula explicando aos alunos que iríamos fazer uma viagem inesquecível. Enquanto falava
fui me caracterizando com o vestuário chinês, notei que neste momento as crianças já
começaram a notar que realmente teríamos um momento diferente. Conforme eu nar-
rava os fatos ia buscando os recursos visuais no baú.

A satisfação no rosto de cada criança me encantava. Elas faziam parte da história,


pois, ao planejar as etapas, foi prevista a participação ativa das crianças: distribuir vasos
de plantas entre as crianças, imaginando que são os habitantes do reino, que deveriam
se apresentar ao imperador para a escolha do novo sucessor: cuidar dos vasos e ser o im-
perador. Lembro-me bem de um aluno que escolhi para ser o personagem principal, no
caso dessa história o imperador, e no decorrer da cena eu ia questionando, ele respondia
exatamente como se fosse o personagem da história. No final eu o vesti como imperador.

A aceitação do corpo docente foi ótima quando socializei a prática nos HTPCs.
Despertamos nas professoras o desejo de realizar também em suas salas. E, o que foi
mais marcante para mim, é que todas as professoras me convidaram para fazer a dramati-
zação em suas salas, devido à empolgação ao fazer a encenação, vivenciada nos HPTCs.
Posso dizer que o trabalho não foi fácil, exigiu muita dedicação, mas os objetivos,
que eram que os alunos pegassem um texto e soubessem fazer a interpretação e compre-
ensão na leitura foram alcançados, pois é perceptível o avanço na aprendizagem desses
alunos. Além de uma melhora na autoestima e autonomia deles.

O resultado foi tão positivo que os gestores relataram que eu não poderia de deixar
de apresentar esta sequência de leitura na prosa pedagógica. Confesso que fiquei um
pouco receosa, pois nunca passei por uma experiência assim, pensando no número de

122 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

professores que poderiam ver a minha socialização. No dia da prosa o resultado também
foi positivo.

O trabalho em equipe foi importante para a conquista dos objetivos almejados:


quando um grupo se esforça a fim de um propósito, tudo se torna mais fácil e o resultado
só pode ser positivo.

123
26
Projeto “Entre na Roda”35
Inicialmente emociono-me ao relembrar o trabalho realizado com os alunos da EJA na
EMEB Bairro do Paraíso, Polvilho, Cajamar, o qual acrescentou muito conhecimento
para a minha prática pedagógica. Foi meu primeiro contato com a modalidade EJA,
com muitos desafios.

No 2º semestre de 2005, o Projeto Entre na Roda, resultado da parceria entre a


Fundação Volkswagen e o CENPEC, foi desenvolvido na EMEB Bairro do Paraíso,
tendo como educadoras uma supervisora da Diretoria de Educação e a assessora peda-
gógica da unidade escolar, com a parceria ainda de dois professores da EJA.

Inicialmente o projeto foi divulgado aos professores e comunidade, encaminhan-


do pelos alunos da escola a ficha de inscrição para adesão dos participantes.

O projeto foi desenvolvido no 2º semestre de 2005, em 09 encontros quinzenais,


com a participação dos professores da unidade escolar, alunos da EJA, secretárias da
escola, pais de alunos e comunidade. Na verdade, a elaboração desse grupo favoreceu
a parceria entre comunidade, professores e alunos da EJA. Contamos também com a
integração entre EMEB Bairro do Paraíso (Ciclo I) e EMEB Distrito do Polvilho (Edu-
cação Infantil), uma profissional contadora de histórias e um pai de aluno.

Os encontros foram organizados propiciando momentos de sensibilização de


leituras e oficinas temáticas contemplando os seguintes gêneros textuais: causos, len-
das, fábulas, histórias maravilhosas, conto, novela, romance, poesia, texto jornalístico e
divulgação científica. Esse projeto mediou o contato dos alunos com os mais diferen-
tes gêneros discursivos, favorecendo o gosto pela leitura, ampliando a compreensão
de mundo, oferecendo propostas de incentivo e orientação à leitura possibilitando a
formação de leitores.

Durante o desenvolvimento das oficinas com os diferentes gêneros textuais, o grupo


realizou atividades diversas como: confecção de cenários, dramatizações, contação de
histórias, organização dos espaços, roda de empréstimos, rodas de apreciação, debates,
momentos de avaliações dos encontros, notícias do projeto, memórias de leitura, ga-
rantindo assim que cada participante contribuísse de acordo com suas habilidades.

35 Maria de Lourdes de Moura Santos (Assistente Pedagógica de Alfabetização).

124 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Na primeira roda de leitura realizada com o grupo, trouxemos o texto A Noi-


te Assombrada, de Sonia Junqueira, onde organizamos o espaço previamente com
a colcha de retalhos, um baú no centro da roda, velas acesas e não poderia faltar a
luz apagada. Essa leitura foi realizada pela professora e todos ouviram atentamen-
te. Após a leitura abriu-se um espaço para comentários, focando a importância do
trabalho com os contos de tradição oral. Outras leituras também foram realizadas,
como a apresentação da oficina do texto O Auto da Compadecida, de Adriano
Suassuna, onde os alunos revelaram suas identidades nordestinas incorporando os
personagens, pois os alunos, por serem em sua maioria nordestinos, investiram no
sotaque, confeccionaram chapéus, charutos, arregaçaram as barras das calças. Ou-
tras encenações contemplaram os textos O Pássaro Lapão, de Pedro Bandeira, Um
Apólogo, de Machado de Assis, e A Aranha, de Orígenes Lessa. Ao final realizamos
a roda de empréstimos de livros, onde observamos muito entusiasmo e autonomia
dos alunos ao folhear os livros, explicitando assim o desejo pela leitura.

Uma das práticas muito significativa realizada com os alunos da EJA priori-
zou o gênero poema, com a proposta dos textos Estatutos do Homem, de Thiago
de Melo, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU), ressaltando a
questão dos direitos humanos. Iniciamos a conversa questionando os alunos se
já ouviram falar da declaração, poucos alunos tinham conhecimento a respeito.
Explicou-se então que cada artigo simboliza o acordo internacional, onde há ga-
rantido o direito de uma vida digna e feliz. Ressaltou-se que as pessoas têm direito
à cidadania, conhecer seus direitos e exigir que sejam exercidos a todo momento.
Questionamos os alunos se esses direitos são respeitados integralmente. Os alunos
ficaram atentos durante a leitura com a forma com que o poeta retrata os direitos,
realizando analogias com suas vivências.

Após a leitura, foi aberto espaço para os comentários da proposta realizada,


questionando o que os participantes acharam da leitura, que artigo chamou mais
atenção, que diferenças percebiam entre o Estatuto do Homem e os artigos da De-
claração. Alguns alunos releram o poema e a declaração. Finalizou-se a proposta
concluindo que os direitos nem sempre são respeitados, ou seja, o fato das leis
estarem escritas não garante o seu cumprimento na sociedade.

Finalizamos o projeto com a presença da formadora do CENPEC, sendo


contemplados com a roda de leitura com a contadora de histórias e a declamação
de um acróstico elaborado pelo pai do aluno que participou do projeto.

Acredito que o Projeto Entre na Roda fortaleceu a identidade do grupo, estrei-


tando cada vez mais os vínculos entre escola e comunidade, garantindo assim o su-
cesso dos alunos ao longo da trajetória escolar, além de ampliar a compreensão do

125
mundo. Não basta somente realizar leituras com os alunos, mas é preciso seduzi-los
para o prazer de ler. Afinal, para se tornar verdadeiramente leitor é preciso gostar de
ler e infelizmente a escola ainda não tem seduzido os alunos para a leitura.

Em fevereiro de 2006, em parceria com outra professora, traçamos algumas


ações para contemplar o trabalho com a EJA. Realizamos como atividade inicial e
diagnóstica a proposta com a seguinte consigna “O que os alunos esperam da es-
cola no ano letivo?”. Nesse momento dinamizamos essa prática com os alunos em
rodas de conversa e atividades de escrita. A fala que mais me tocou é a necessidade
de ler e escrever dos alunos: “Quem não sabe ler e escrever vive numa escuridão”.
Mediante a proposta realizada, sobressaiu-se também a necessidade de ler a Bíblia,
de preencher um currículo, fazer cálculos...

Após o término da formação, em 2006, iniciamos a proposta das rodas de leitura


com os alunos da EJA, momentos em que as pessoas se reuniam para ler e comentar
o que leram. Nessas rodas os leitores desenvolvem atividades de escuta e leitura de
diferentes gêneros textuais, seguidos de observações e comentários dos participantes
sobre o autor, sobre o material lido e suas relações com outras obras conhecidas.

A proposta inicial de leitura com os alunos da EJA contemplou um espaço or-


ganizado no chão da sala de aula com uma colcha de retalhos contendo diferentes
gêneros literários. Os alunos foram convidados a adentrar na sala, se acomodar e
a participar da roda. Os alunos manusearam os livros sentados no chão e teceram
comentários sobre o porquê da escolha.

Outra proposta evidenciada foi a oficina de poemas, contemplada pela decla-


mação de poemas do livro “101 Poemas” de Sergio Caparelli.

O gênero crônica também merece destaque, ressaltando sua importância por


partir de acontecimentos do cotidiano, abrindo perspectivas para repensar ques-
tões humanas. Iniciamos o encontro questionando os alunos sobre o tema central,
“a felicidade”. Através dos textos A Arte de Ser Feliz, de Cecília Meirelles, e A Arte
de Ser Infeliz, de Paulo Mendes Campos, a apresentação se deu num único encon-
tro, onde os alunos foram recepcionados com a música Felicidade, de Tom Jobim
e Vinicius de Moraes. Inicialmente foi lida a biografia dos autores e em seguida eles
foram questionados sobre se conheciam ou se já leram ou ouviram algo sobre Ce-
cília Meirelles. Em seguida os alunos foram questionados sobre a felicidade, tema
central da crônica. Para eles o que é felicidade? Ela existe? É possível ser plena-
mente feliz? Será que concordam com a ideia expressa certa vez por um poeta de
que “a felicidade nunca está onde pomos”? Várias conclusões foram expostas nesse
momento a respeito do assunto e em seguida foi realizada a leitura do texto. Após

126 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

a leitura, os alunos relataram sobre o que acharam, explicitando a visão da autora


sobre a felicidade.

Dando prosseguimento, iniciei a leitura do texto de Paulo Mendes Campos,


dinamizando algumas informações sobre o autor e solicitando que atentassem
para as colocações realizadas pelo autor, tendo como foco os aspectos que torna
uma pessoa infeliz.

Através da leitura dos dois textos, revelaram-se diferentes concepções dos


alunos em relação à felicidade e algumas ideias foram repensadas várias vezes. Cer-
tamente não há receita para felicidade e isso favoreceu aos alunos a atribuição de
novos sentidos ao que já conheciam.

Outra proposta dinamizada com os alunos foi a sequência de atividades en-


volvendo as obras de João Guimarães Rosa, Campo Geral e Grande Sertão Vere-
das. A professora da EJA dinamizou com os alunos a leitura da biografia do autor e
a leitura de alguns capítulos das obras. No dia 17 de setembro, o grupo de alunos
visitou o Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, em uma exposição dos 50
anos da obra Grande Sertão Veredas. Nessa visita os alunos apreciaram a exposi-
ção sobre o autor, participando de sessões de leitura dirigida, acesso pelo acervo a
diferentes gêneros textuais, do histórico da Língua Portuguesa até os dias de hoje
e foram encantados pela era digital.

Dando continuidade, outros momentos foram muito significativos e prazero-


sos como: oficinas com contadores de histórias, com o pai de um aluno que escre-
via poesias; os alunos da EJA realizaram no período diurno práticas de leitura em
sala de aula e com os pais nas reuniões bimestrais; roda de empréstimos de livros;
organização de livros em espaços acolhedores (cesta literária e rodas de aprecia-
ção) e leituras realizadas durante o recreio.

Durante o momento de avaliação das práticas realizadas com os alunos, algu-


mas falas merecem destaque como: “Como esses encontros têm me feito refletir,
não gostaria que terminasse o curso” (aluna) ou “Matei minha vontade! Hoje es-
tou realizado!” (pai poeta).

Vale ressaltar que a Diretoria de Educação contribuiu muito para o Projeto


Entre na Roda disponibilizando para a unidade escolar acervos contendo diferen-
tes gêneros textuais, favorecendo a adequação de estratégias diferenciadas para
despertar o gosto pela leitura.

Finalizo o relato concluindo que cresci muito através do trabalho realizado

127
na EJA com o olhar nas passagens que a vida me proporcionou, contribuindo para
minha trajetória profissional. Continuo a procurar e descobrir as jóias no tempo,
inclusive as do presente, como ouvir novas e velhas histórias.
Agradeço muito o empenho dos professores que participaram do projeto e
que foram parceiros constantes, sempre auxiliando e respeitando os diferentes rit-
mos de aprendizagens dos alunos da EJA.

Não poderia deixar de parabenizar a supervisora que me acompanhou nesse


processo, parceira atuante que sempre acreditou que é possível fazer a diferença na
vida dos alunos e, sobretudo, que o acesso à educação e à cultura é condição para
o efetivo exercício da cidadania.

128 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

27
Estudo, reflexão, ação:
ingredientes imprescindéveis para
boa formação do profissional 48
A EMEB Vinícius Couto Silva foi inaugurada em Junho de 2008 no bairro do Polvi-
lho36, na cidade de Cajamar, com o objetivo de atender um número maior de crian-
ças de Educação Infantil, compreendendo desde crianças de um ano e dois meses à
crianças de seis anos de idade, fase esta ainda denominada Fase VI37.

Neste início, a instituição contava apenas com a figura do Diretor de escola.


Após um tempo, a escola recebeu também um Assistente de direção. Em parceria,
trabalhamos com as questões burocráticas e pedagógicas até 2009, quando rece-
bemos a figura do Assessor Pedagógico, que passou a desenvolver o trabalho com
os professores.

Partindo do interesse em ajudar de forma mais efetiva o Assessor Pedagógico


em suas funções, visando à aprendizagem dos alunos, busquei uma formação que
atendesse a esta demanda.

Ao fim dessa formação, em 2011, surgiu a necessidade de pontuar e organizar


as tarefas e objetivos da função de cada componente do trio gestor, a partir de reu-
niões semanais com estudo pré-determinado, de acordo com um diagnóstico do
que era necessário avançar naquele momento, com as questões pedagógicas que
permeavam o cotidiano escolar.

Dessa forma, o processo de mudança do pensamento da equipe gestora foi


partindo dos estudos e debates periódicos, os quais surgiram das experiências de
cunho pedagógico vividas desde 2008 até o presente momento.

36. Neste momento havia uma grande demanda de crianças desta faixa etária que ainda não havia sido atendidas
pelo município, por contar com um grande aumento da população, devido às condições empregatícias oferecidas
nesta região e a localização privilegiada que a mesma possui.
37. No ano de 2009 o município implantou o primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos, atendendo as
crianças desta faixa etária adequando-se à Deliberação CEE nº 73/2008, implementando as mudanças no ensino e
transformando a fase VI em 1ºano, com todas as adequações necessárias.

129
Formar uma gestão com um olhar mais apurado às necessidades dos alunos
era a mola propulsora para ampliar os estudos, discussões e debates, transforman-
do essa iniciativa em um projeto para sistematizar os acertos e ganhos obtidos com
esses momentos, o que, até então, não tinha uma pauta definida e era permeado
pela leitura de textos que traziam temas relacionados às nossas dificuldades no
acompanhamento do trabalho dos professores em sala de aula e questões de con-
cepções referentes à atuação do assessor pedagógico.

O maior anseio no início era a atuação significativa no âmbito pedagógico, de


forma a ampliar o trabalho em sala de aula, sendo o seu papel o de co-responsável
pela aprendizagem das crianças.

A necessidade de se estabelecer um horário no qual pudéssemos estudar e


discutir sobre os processos oriundos do dia-a-dia da escola foi, então, inclusa na
rotina da Instituição.

Esses encontros periódicos entre o trio gestor possibilitaram o avanço em


questões profissionais quanto à resolução de problemas cotidianos simples, am-
pliando o olhar e atribuindo sentido à necessidade da gestão em acrescentar à roti-
na momentos de reunião, o que foi também compartilhado com os funcionários e
professores, tornando o projeto e seu conteúdo conhecido por estes.

Incorporados a esse momento de estudo, acrescentamos a escrita de sínteses,


o estabelecimento da rotina de cada gestor, em acordo com os demais, os combi-
nados entre os membros da gestão, dentre outros.

Nasce, então, a provocação para divulgar as práticas bem sucedidas nas escolas
com o evento “Prosa Pedagógica”38, difundido pela Diretoria de Educação de Caja-
mar, o que se torna um desafio. Engajadas no entusiasmo de contribuir com os de-
mais profissionais da rede, a gestão encara o desafio como uma meta a ser alcançada.

Durante a exposição oral do projeto “Desvendando os segredos de uma boa


gestão”, uma grande surpresa: os depoimentos, questões e o público em grande
número soaram como pontos positivos em nossa prática.

A partir dos comentários dos profissionais presentes e de avaliações escritas,

obtivemos indicadores de que, mesmo sendo difícil reservar alguns momentos na


rotina do trio gestor para o estudo, análise das demandas e planejamento, essa ação
faz a diferença na unidade escolar. Sendo assim, a exposição oral foi um momento
38. Evento proposto pela Diretoria de Educação do município, onde os profissionais tem a oportunidade de expor
e compartilhar seu trabalho com a rede. Esse evento ocorre todos os anos, no segundo semestre, envolvendo
todos os profissionais da educação.
130 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

reflexivo, causando incômodo nos participantes, no sentido de pensar o que é pos-


sível alcançar na escola, partindo da formação continuada entre os gestores.

O projeto não poderia ficar somente entre os gestores da unidade ou entre os


participantes da oficina na “Prosa Pedagógica”. Então, momentos de exposição oral
na escola são pensados. Em um HTPC39 com os professores, e em outro momento
com os monitores educacionais, compartilham-se suas intenções e ações.

Os professores e monitores se sentem à vontade para falar sobre como enxer-


gam o projeto, a partir da explanação dos conteúdos trabalhados durante as reuni-
ões entre o trio gestor, relatando que, dessa forma, a escola ganha mais qualidade
na aprendizagem dos alunos, pois os profissionais responsáveis por ela têm dis-
cutido estratégias e planos de trabalho para sanar as situações problemáticas que
encontram-se na unidade escolar. Apesar de saberem sobre as reuniões semanais
realizadas pela gestão, puderam conhecer e se apropriar de todo o teor delas, visu-
alizando, assim, os aspectos conquistados em questões democráticas, burocráticas,
pedagógicas, das relações humanas e o fortalecimento da gestão.

Ações de compartilhamento do projeto e suas idéias ainda ganham dimensão


em futuros momentos a serem realizados com os diversos segmentos da escola e,
talvez, com os membros de toda a comunidade escolar, pois cremos que a partici-
pação responsável do gestor proporciona crescimento no grupo.

AVALIAÇÃO
A avaliação ocorre ao longo das reuniões, a partir dos pareceres (os quais serão
registrados nas sínteses dos encontros) expressos pelo trio durante estas, obser-
vação das práticas, no incentivo e qualificação dos profissionais oriundos do co-
tidiano escolar, impressões, registros orais e escritos, filmagem de depoimentos e
relatos dos envolvidos no projeto, tais como gestores e supervisão escolar.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


PERRENOUD, P.; O que é competência. Disponível em:< http://revistaescola.abril.com.br/
gestao-escolar>Acesso em: 03 nov. 2010.

MACEDO, L.; Competências e habilidades: Elementos para uma reflexão pedagógica. In:
SEMINÁRIO ENEM, 1999, São Paulo.

39. Horário de trabalho pedagógico coletivo.

131
FREIRE, M.; Escola, grupo e democracia. Paixão de aprender, Porto Alegre, pg.30-37, 1992.
ARRUDA, L.; O desafio da convivência grupal no local de trabalho. Espaço Pedagógico,São
Paulo, 2004.

SAMPAIO, J.R.; “A Dinâmica de grupos” de Bion e as organizações do trabalho. Psicol. USP,


São Paulo, v 13,n.2, 2002.

CORSI, E.;ORTIZ, C. Rotina da equipe gestora. Disponível em: <http:avisala.org.br> nov. 2010.

CORSI, E.;ORTIZ, C. Síntese sobre a rotina do diretor. Disponível em: <http:avisala.org.br> 4


Out. 2010.

Textos retirados do site: http://revistaescola.abril.com.br/gestao-escolar/

132 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

28
O projeto “movimento,
rolamentos e cambalhotas”40
O movimento é uma importante dimensão do desenvolvimento e da
cultura humana. As crianças se movimentam desde que nascem, adqui-
rindo cada vez maior controle sobre seu próprio corpo e se apropriando
cada vez mais das possibilidades de interação com o mundo.41

A unidade escolar E.M.E.B. Aline Cristina Santos de Paula atende 320 crianças de 1 a
7 anos divididas em 11 salas de Educação Infantil, sendo 6 salas com crianças de 1 a 3
anos, 5 salas com crianças de 4 e 5 anos e 4 salas do Ensino Fundamental (6 a 7 anos).

O projeto “Movimento, Rolamento e Cambalhotas” é uma proposta da rede, e


surgiu da necessidade do trabalho com o movimento na Educação Infantil a partir do
ano 2010. Nessa época, a assessora externa da área do Movimento, em parceria com
a supervisão de ensino, selecionou algumas escolas para um acompanhamento direto
relacionado ao movimento. A EMEB Aline Cristina Santos de Paula foi uma das escolas
acompanhadas.

Assim que a proposta da formadora chegou até mim, em HTPC, fiquei super ten-
sa, senti muita insegurança para executar a sequência por achar que os alunos iriam se
machucar devido à faixa etária (dois anos), mas, lendo o livro proposto42, descobri que
nessa fase do desenvolvimento os alunos estão ativamente envolvidos na exploração e
na experimentação das capacidades motoras de seus corpos.

Depois de planejar, fui para a sala e iniciei a atividade com uma roda de conversa
com os alunos perguntando para eles se já haviam virado cambalhota sobre o colchão.
Algumas crianças responderam que sim, mas, na verdade, nem sabiam o que era. Ob-
servei que uma única aluna sabia do que eu estava falando, porque ela respondeu que já
tinha virado cambalhota na cama da mamãe e logo foi dizendo:

Primeiro, subi na cama da mamãe, ajoelhei, coloquei a cabeça no colchão


e virei.

40. Relato elaborado pela professora Ana Paula de Moraes Brabo, da EMEB Aline Cristina Santos de Paula.
41. Autoria
42. Filgueiras Isabel Porto , “Psicomotricidade” – IESDE Brasil S.A 2010.

133
Após ouvir a aluna, expliquei como seria desenvolvida a atividade, fiz a exposição
virando uma cambalhota para os alunos observarem e fui explicando cada etapa. Em
seguida, fiz alguns combinados com eles. Pedi para que ficassem sentados aguardando
a sua vez que eu iria chamar um por um para que pudessem vivenciar a cambalhota e
assim que terminassem deveriam voltar ao seu lugar. Os demais alunos deveriam nesse
momento observar como fazer. As crianças ficaram super ansiosas para realizar a ativi-
dade proposta. Durante a atividade, elas batiam palmas, gritavam para o amigo – ‘Muito
bem!’, ‘Parabéns!’. No término da atividade, perguntei se eles gostaram. Todos respon-
deram que sim e que queriam fazer novamente. Combinei que em outro momento irí-
amos fazê-la.

Ao realizar esta atividade, pude observar que a maioria das crianças precisa real-
mente de momentos diversificados para alcançar o desenvolvimento proposto por nós
professores. Observei que, durante o desenvolvimento da sequência, os alunos, na hora
de dormir, ficavam tentando virar cambalhotas sobre o colchão; no pátio da escola e no
parque, ou seja, houve um despertar por parte das crianças na exploração dos movimen-
tos do corpo, criando desafios, ajustando suas habilidades para a realização da atividade.

Concluí que a proposta foi super interessante. O medo e a insegurança que tive no
primeiro momento foram amenizados. É notório que, após o estudo, leitura de textos,
o trabalho com a atividade ficou mais claro e eu me senti mais segura para elaborar e
desenvolver a sequência didática de cambalhota, com foco no movimento. Aprendi que
é possível realizar tais movimentos com segurança desde que seja bem planejado, pen-
sando sempre nas possibilidades das crianças e em sua faixa etária.

No meu ponto de vista, a proposta trazida para o eixo do movimento abriu para
nós, professores, novas possibilidades de propormos atividades que realmente auxiliem
no desenvolvimento dos pequenos, pois a criança, sozinha, não conseguirá desenvolver
todas as técnicas necessárias para ter um crescimento saudável e completo se não tiver a
ajuda de um professor que, por sua vez, deve estar sempre atento às etapas do desenvol-
vimento de cada criança, colocando-se como facilitador da aprendizagem.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Referencial curricular nacional para educação infantil. Vol.2 . Brasília: MEC/SEF, 1998.

Porto, Filgueiras Isabel. Psicomotricidade. IESDE Brasil S.A. 2010.

134 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

29
Com asas ao amanhecer43
Se é praticando que se aprende a nadar.
Se é praticando que se aprende a trabalhar,
É praticando também que se aprende a ler e escrever
Vamos praticar para aprender
E aprender para praticar melhor
Vamos ler
Povo
Saúde
Metabala
Rádio”
(PAULO FREIRE. A IMPORTÂNCIA DO ATO DE LER)

Na E.M.E.B. Professor Antonio Carlos Carvalho foi elaborado o projeto “Re-


cuperação Contínua: Alfabetizar pra Valer” que veio para atender às dificuldades
apontadas na análise das informações do mapeamento de Avaliação Diagnóstica
Inicial, o qual apresentou 12% dos alunos não alfabetizados. Este projeto foi des-
tinado aos alunos do Ensino Fundamental, do 2° ano à 4ª série, que apresentavam
dificuldades de aprendizagem não superadas no cotidiano e que necessitavam de
um trabalho mais direcionado na sala de aula.

Na 4ª série D, a professora verificou que haviam alunos não alfabetizados e, des-


ta forma, decidiu colocar em prática esse projeto para alcançar as metas definidas no
início do ano letivo no Projeto Político Pedagógico desta Unidade Escolar, sendo
96% a curto prazo, 98% a médio prazo e 100% a longo prazo. O projeto aconteceu
durante todos os dias da semana, com a duração mínima de trinta minutos.

A professora propôs ações através de intervenções pontuais, com atividades


significativas e diversificadas, realizava agrupamentos produtivos dentro das ativi-
dades propostas, leitura de diferentes gêneros textuais voltados para a alfabetização,
tais como, bilhetes, parlendas, cantigas, listas, cartazes, anúncios, receitas, cartas
etc.; jogos de alfabetização, oferecia livros e outros materiais escritos e incentivava
a ler, realizava comentários de livros ou trechos lidos, realizavam produções coleti-
vas de textos, bilhetes, parlendas, cantigas, cartas (carta do leitor), convites, propa-
gandas, relatos e o trabalho com o dicionário, que despertou o interesse no aluno,
43. Texto elaborado por Aline Cristina Pardal Bachareli, Ivonete Batista e Luciana Ribeiro Teixeira Oliveira, Equipe
Gestora da EMEB Antônio Carlos Carvalho.

135
pois a professora , em vez de utilizar-se de atividades mecânicas, como cópias ou
ditados para aprimorar a ortografia dos alunos, considerou de suma importância
ensiná-los a consultar essa grande lista de palavras, dando-lhes autonomia no uso
desse portador.
Para que realmente ocorra avanços, é preciso que todas as crianças e
jovens, além de estarem na escola, aprendam. Ensinar a todos signifi-
ca aprender a lidar com a diversidade. Sabemos que essa diversidade
pressupõe diferenças individuais, sociais, culturais, étnicas, físicas,
de gênero, de interesse, de aprendizagem etc... é preciso que a escola
trabalhe numa perspectiva de respeito à diversidade, entendida como
identidade de pessoas e grupos. No entanto, é necessário também
ultrapassar a diversidade naquilo que ela tem de entrave ao sucesso
escolar. É nessa direção que procuramos caminhar... o trabalho diver-
sificado tem por objetivo atender às diferenças de aprendizagem dos
alunos. Geralmente, entende-se por trabalho diversificado aquele em
que o(a) professor(a) oferece diferentes atividades a diferentes crian-
ças ou grupos de crianças. Nossa proposta amplia esse conceito. Para
atender à heterogeneidade da classe, propomos um trabalho diversi-
ficado que se constitui de duas formas inter-relacionadas, mas especí-
ficas de ação: a atuação diversificada do(a) professor(a) no desenvol-
vimento de uma mesma atividade por todas as crianças e a oferta de
atividades diversificadas para diferentes alunos ou grupos.
(PROJETO ESTUDAR PRA VALER! LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTO NOS
ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL - MÓDULO INTRODUTÓRIO,
2005, P 72 E 73.)

O aluno R. está na 4ª série e foi alfabetizado no 3° bimestre deste ano, atra-


vés deste projeto. O aluno é deficiente intelectual e frequenta a sala do AEE – Aten-
dimento Educacional Especializado que, com relação a esta deficiência, tem como
objetivo apoiar o seu desenvolvimento e estimular o funcionamento intelectual
no meio escolar, desenvolver habilidades intelectuais para superação das dificulda-
des de atenção e concentração, desenvolver a capacidade de resolver as situações
cotidianas, organizar e planejar o pensamento, motivar a melhoria das relações e
interações sociais, pensar na sua ação e na consciência dos atos que são utilizados
em uma situação de resolução de problemas.

Devido ao R. apresentar muitas dificuldades na aprendizagem, realizar apenas


algumas atividades propostas e apresentar dificuldades de atenção e concentração,
os períodos de aprendizagem foram necessariamente muito curtos, pois com fre-
quência mudava de comportamento, tornando-se agressivo quando contrariado.

Para começar o trabalho, primeiramente, foi realizado um vínculo afetivo.

136 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Aprender, necessitam-se dois personagens (ensinante e aprendente)


e um vínculo que se estabelece entre ambos. (...) Não aprendemos de
qualquer um, aprendemos dauele a quem outorgamos confiança e di-
reito de ensinar”
(FERNÁNDEZ, 1991, p. 47 e 52).
A professora teve que conquistá-lo, dando-lhe muita atenção, carinho, va-
lorizando todas as coisas que realizava e oferecendo limites quando se fazia ne-
cessário, a fim de se aproximar e ganhar confiança para, dessa forma, acontecer a
relação professor e aluno e, assim, iniciar o trabalho com o projeto “Recuperação
Contínua: Alfabetizar pra Valer.

Vygotsky (1994), ao destacar a importância das interações sociais, traz a ideia


da mediação e da internalização como aspectos fundamentais para a aprendizagem,
defendendo que a construção do conhecimento ocorre a partir de um intenso pro-
cesso de interação entre as pessoas. Portanto, é a partir de sua inserção na cultu-
ra que a criança, através da interação social com as pessoas que a rodeiam, vai se
desenvolvendo. Apropriando-se das práticas culturalmente estabelecidas, ela vai
evoluindo das formas elementares de pensamento para formas mais abstratas, que
a ajudarão a conhecer e controlar a realidade. Nesse sentido, Vygotsky destaca a
importância do outro não só no processo de construção do conhecimento, mas
também de constituição do próprio sujeito e de suas formas de agir.

Segundo o autor, o processo de internalização envolve uma série de transfor-


mações que colocam em relação o social e o individual. Afirma que:

...todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas ve-


zes: primeiro, no nível social, e, depois no nível individual; primeiro
entre pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (in-
trapsicológica). (p. 75).

Com o trabalho pontual da professora através das atividades e atuação diver-


sificada citadas no início deste relato, o aluno conseguiu adquirir a base alfabética
e integrar-se ao grupo. O seu maior interesse foi o prazer pela leitura e, assim que
a adquiriu, percorria a escola com um dicionário sempre em mãos para ler a todo
o momento. Na sala, adorava pegar livros e ficar deitado debaixo da mesa da pro-
fessora, demonstrando motivação e interesse pelas atividades propostas, mesmo
tendo muitas habilidades para serem conquistadas.

Como professores, recebemos crianças com características peculiares,


com dificuldades específicas ou com problemas em sua aprendizagem,
e precisamos encontrar elementos em comum e focos de interesse que
permitam o desenvolvimento de todo o grupo em sala de aula, inclu-

137
sive daquela criança com dificuldades.... Descobrimos, a duras penas,
que a inclusão apenas apresenta um momento do processo e que ela
se tornará efetiva quando a nossa criança deficiente puder senti-se
mais integrada ao grupo ao qual pertence. (p.167)

O aluno evidenciou em seus comentários tanto a forma de se falar como o conteúdo


propriamente dito, demonstrando a relação entre o prazer em aprender, o interesse em
fazer e a atuação do outro:

O que eu mais gostei de aprender este ano foi de ler. Eu gosto de ler
livros, revistas da CHC sobre as histórias do REX. Gosto de matemáti-
ca, também gosto de fazer continhas estou fazendo certinho.” Qual a
diferença que o aprender a ler e a escrever fez na sua vida? – “Agora
posso ler a lousa o que a professora escreve, leio as placas na rua e
também consigo escrever, sei contar, faço continhas e uso quando vou
no mercado para comprar as coisas e o dicionário para conhecer as pa-
lavras.” Eu tô gostando de escrever mais agora porque a professora tá
me ensinando. Ela me ajudou a ficar melhor.

O comentário do aluno evidencia que a qualidade da interação professor-aluno traz


um sentido afetivo para o objeto de conhecimento e influencia a aprendizagem do aluno.

Ler e escrever são tarefas da escola, questões para todas as áreas, uma
vez que são habilidades indispensáveis para a formação de um estu-
dante, que é responsabilidade da escola. Ensinar é dar condições ao
aluno para que ele se aproprie do conhecimento historicamente cons-
truído e se insira nessa construção como produtor de conhecimento.
Ensinar é ensinar a ler para que o aluno se torne capaz dessa apropria-
ção, pois o conhecimento acumulado está escrito em livros, revistas,
jornais, relatórios, arquivos. Ensinar é ensinar a escrever porque a re-
flexão sobre a produção de conhecimento se expressa por escrito. (Ler
e escrever – Compromisso de todas as áreas- p.15)

Percebemos, com esta experiência, que a importância do ato de ler e escrever


deve ser acolhida como um trabalho que nos faz refletir sobre nossa própria prática
pedagógica e nossa maneira de olhar a realidade que vivemos, tentando cada vez
mais melhorar a condição do nosso aluno e a visão do mundo em que vive.

O professor deve ensinar. É preciso fazê-lo. Só que ensinar não é trans-


mitir conhecimento. Para que o ato de ensinar se constitua com tal, é
preciso que o ato de aprender seja precedido do, ou concomitante ao
ato de aprender o conteúdo ou o objeto cognoscível, com que o educan-
do se torna produtor também do conhecimento que lhe foi ensinado.
(FREIRE, 1993, p.188).

138 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


FERNANDÉZ, A. (1991) A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas.

MÓDULO INTRODUTÓRIO- Orientações para o professor- Estudar pra valer! (2005)

PERRENOUD, Philippe,THURLER, Monica Gatther, MACEDO Lino de, MACHADO, Nilson José,
ALLESSANDRINI,Cristina Dias – As Competências para ensinar no século XXI – A formação
dos professores e o desafio da avaliação –pág 167

NEVES, Iara Conceição Bitencourt, SOUZA, Jusamara Vieira, SCHAFFER, Neiva Otero, GUEDES,
Paulo Coimbra, KLUSENER< Renite – Ler e escrever – Compromisso de todas as áreas- pág 15

SMOLKA, A. L. B. & GÓES, M. C. (orgs.) (1995) A


linguagem e o outro no espaço escolar:
Vygotsky e a construção do conhecimento. São
Paulo: Editora Papirus.

VYGOTSKY, L. S. (1994) A formação Social da


Mente. São Paulo: Martins Fontes.

FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler - em


três artigos que se completam. São Paulo: Cortez
Editora & Autores Associados, 1991. (Coleção
Polêmicas do Nosso Tempo, v 4) - 80 páginas.

______. Pedagogia da Autonomia: saberes


necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.

139
30
Quando ensino, aprendo
e quando aprendo, ensino 56
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres
se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo bus-
cando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque
indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando intervenho,
intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não
conheço e comunicar ou anunciar a novidade.
(PAULO FREIRE. PEDAGOGIA DA AUTONOMIA: SABERES NECESSÁRIOS
À PRÁTICA EDUCATIVA– 1996)

A E.M.E.B. Thays de Almeida Alves atende aproximadamente trezentas e noventa


crianças de um a seis anos, em período integral e parcial. Tem um grupo de educa-
dores efetivos, que trabalham na unidade há mais de três anos e que, assim como
as crianças, trazem uma diversidade de conhecimentos e experiências. A escola
desenvolve um trabalho com as crianças de 01 a 03 anos focado nos conjuntos de
experiências, sendo eles: conhecimento de si e do outro, diferentes linguagens do
universo cultural e exploração do mundo físico e social. Com as crianças de 04 a
06 anos, o trabalho está pautado nas modalidades organizativas, ou seja, através de
projetos, seqüências didáticas e atividades permanentes. Um dos projetos desen-
volvidos é o “Olhos voltados para o mundo”, que consideramos uma experiência
exitosa na unidade.

O projeto “Olhos voltados para o mundo” foi proposto há alguns anos pelo Ins-
tituto Avisa Lá, o qual realizava assessoria na rede municipal de Cajamar. Em 2010,
este trabalho foi resgatado pela Educação Infantil através dos assessores pedagó-
gicos das unidades escolares junto com os assistentes pedagógicos da Diretoria de
Educação, que analisaram e discutiram o projeto, avaliando que seria interessan-
te trazê-lo novamente à rede, por se tratar de um trabalho apropriado à Educação
Infantil. O projeto oferece a possibilidade de muitos olhares para o mundo: o da
leitura, o da arte e o da ciência, integrando-os numa perspectiva lúdica do conhe-
cimento. Integra espaços para brincar com espaços de aprendizagem. A criança,
ao precisar confeccionar cenários para a brincadeira que correspondam aos ce-
nários reais estudados, além de ter seu faz-de-conta alimentado, com a produção
de outros contextos para a sua realização, terá a possibilidade de, na repetição e

140 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

usufruto da brincadeira, entrar em contato com o que estuda formalmen-


te, numa perspectiva informal, lúdica e alinhada ao modo de ser e aprender.
Integrar aspectos não formais com formais é uma saída para promover espaços
educativos de qualidade.
Para colocá-lo em prática na unidade, realizamos formações nos horários de
Trabalho Pedagógico Coletivo, visando a que os professores se apropriassem da
riqueza de possibilidades que o projeto proporciona e que compreendessem sua
estrutura para o planejamento e execução. Inicialmente, os docentes escolheram
os países para trabalhar de acordo com seus conhecimentos de mundo, mas, ao es-
crever o projeto e com as intervenções da gestão, foram percebendo a importância
da pesquisa para a articulação das etapas. Sem conhecer a fundo os aspectos gerais
e culturais do país a ser estudado, não é possível planejar e articular as etapas, sele-
cionar o material que será utilizado com os alunos, assim como projetar a constru-
ção do produto final. Diante desta proposta de trabalho, o professor precisa ser um
pesquisador para planejar.

Fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No meu entender, o


que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou
de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente
a indagação, a busca, a pesquisa. O que se precisa é que, em sua formação perma-
nente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador. 44

Todo conhecimento precisa ser aprimorado, alimentado, avaliado, repen-


sado, para se transformar em novas aprendizagens, que visem a diferentes cami-
nhos e soluções, que criem e recriem possibilidades. Assim, é tarefa do educador
buscar novos conhecimentos, sendo a pesquisa uma constante em sua prática.
Quando o professor se torna um pesquisador, busca aprender para ensinar. O
seu trabalho, a sua prática se qualifica, o seu planejamento tem intencionalidade
e sua ação torna-se consistente e fundamentada.

Com o desenvolvimento do projeto, os professores perceberam o quanto a pes-


quisa e a seleção adequada do material contribuem para o bom desenvolvimento do
trabalho e, consequentemente, os alunos aprendem de forma intencional e orientada
pelo professor. Nestes últimos anos, quando os professores planejaram novamente
o projeto, a questão da pesquisa se fez mais presente. Consideramos este movimen-
to uma conquista, pois, despertar no professor a necessidade de pesquisar para pla-
nejar melhor, contribuiu para que o planejamento de outros trabalhos, e o próprio
plano de ação, ficasse mais elaborado e articulado. Portanto, o desenvolvimento
desse trabalho trouxe bons resultados para a prática docente e, consequentemente,
uma melhora na qualidade do ensino.
44 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Paz e Terra, 1996.

141
Com o projeto, as crianças aprendem a manifestar suas opiniões, idéias e
pensamentos em rodas de conversa sobre o assunto estudado; a falar sobre o
que aprenderam, estabelecendo relações entre os modos de ser, viver e traba-
lhar de outras culturas e a sua própria; a participar de situações de leitura com
o propósito de saber mais sobre o assunto estudado, tendo acesso, por meio do
professor, a diversos tipos de textos, desde a literatura até os textos informativos,
jornais, revistas, etc.; e a incorporar alguns elementos de diferentes culturas em
suas brincadeiras. Um exemplo bem simples, porém elucidativo, foi o trabalho
realizado por uma fase V sobre o Japão, em que o produto final era brincar de
casinha japonesa. Para tal, as crianças estudaram a cultura e outros aspectos do
país, criaram cenários e utensílios, relacionaram “jeitos” da cultura japonesa e
brasileira, passando por um rico processo de aquisição de conhecimentos para
brincar com propriedade.

Todo este trabalho foi apresentado aos pais através de uma exposição inte-
rativa, em que as crianças e a professora mostraram o que aprenderam através
dos registros do desenvolvimento do trabalho, dos cenários construídos, da or-
ganização dos objetos e da brincadeira.

Consideramos o desenvolvimento deste trabalho uma experiência exitosa


para os alunos e professores, pois percebemos que, quanto mais pesquisamos,
quanto mais nos apropriamos de um conhecimento, mais significativo se torna
o trabalho, para alunos e professores, que descobrem que ainda é preciso saber
mais, porque ensinar e aprender exige pesquisa.

142 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

31
Projeto “leitura”45
Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os
livros só mudam as pessoas.
(MÁRIO QUINTANA)

A EMEB “Professora Lucy Apparecida Bertoncini“ atende crianças e ado-


lescentes de 8 a 14 anos. Durante o ano letivo de 2006, observamos que alguns
alunos eram resistentes nas situações didáticas que envolviam a leitura. Os diag-
nósticos realizados pelos professores e as avaliações externas, também apon-
tavam inúmeras dificuldades na compreensão dos textos pelos alunos. Diante
disso, sentimos a necessidade de criar um projeto a fim de organizar o tempo
didático, garantindo assim, situações em que os alunos leiam por prazer e, como
dizia Mario Quintana, através dos livros, mudar pessoas. Sendo assim, pensando
na educação do século 21, onde a formação do indivíduo deve ser de forma au-
tônoma, criativa e curiosa, iniciou-se nessa unidade escolar, no ano de 2007, o
Projeto de Leitura com livros paradidáticos.

Ler é a habilidade. Ensinar os alunos a compreender o sentido dos textos


que leem é o resultado mais poderoso que um professor pode obter. Se os
seus alunos puderem ler bem, eles podem fazer qualquer coisa.
(AULA NOTA 10, DOUG LEMOV)

Inicialmente fizemos, aos professores, a proposta que consiste na leitura de


um ou mais livros por semestre. Os professores toparam e logo iniciamos a orga-
nização do Projeto. As professoras de Língua Portuguesa orientaram no levanta-
mento de títulos interessantes e os professores das outras áreas também iam parti-
cipando desse processo.

Levamos a proposta e os títulos para os alunos que logo se animaram com a


ideia e, com eles, selecionamos alguns gêneros, de acordo com cada série, ficando
assim definido: 3ºs anos - gêneros diferenciados (cartas, bilhetes, fábulas e con-
tos); 4ºs e 5ºs anos e 5ªs e 6ªs séries - textos de aventura; 7ªs séries – Ficção; e, 8ªs
séries - clássicos da literatura.

45

143
Vale ressaltar que os alunos tiveram a liberdade e autonomia para apreciar outros
gêneros trocando os livros entre eles, não deixando de ler o que foi combinado no grupo.

Pautado nessa necessidade e na importância que a leitura tem para o desen-


volvimento dos discentes, incorporamos o estudo nos horários de HTPC (Horá-
rio de Trabalho Pedagógico Coletivo) sobre a importância da leitura. Nesses en-
contros foi possível refletir, com os professores, as ações voltadas para essa prática.

Para viabilizar o desenvolvimento desse projeto, a assessora pedagógica con-


tatou com editoras solicitou orçamentos para a compra dos livros, pensando na
facilidade, no acesso e praticidade em estar adquirindo-os na própria escola e con-
seguindo ainda, um desconto de 30% no valor de capa dos mesmos, através da
APM (Associação de Pais e Mestres) consultada anteriormente.

Após explicar o projeto aos pais, iniciamos a busca pelos livros. No início o
número de alunos comprando os títulos sugeridos foi desanimador, mas não desis-
timos. Incentivamos o empréstimo e os professores também, os estimulava através
de rodas de discussão, aguçando a curiosidade de todos.

Hoje o projeto tomou força e o interesse dos alunos é muito maior. Ainda
temos alunos que não adquirem livros, por isso continuamos com o incentivo ao
empréstimo.

Quanto à compreensão e reflexão dos alunos, observamos que o mapeamen-


to realizado bimestralmente, mostra resultados melhores. Portanto, acreditamos
que esse é o caminho certo!

Temos a seguir o relato de algumas professoras sobre o processo, elaboração


e execução da proposta de trabalho, bem como as necessidades e a aprendizagens
conquistadas por todos, discentes e docentes:

“A leitura do livro por capítulos proporciona a experiência de ler por


prazer, já que a história não pode ser esgotada imediatamente. O fato
de dar continuidade leva o aluno a recordar o que já foi lido e desperta
a curiosidade.”
(PROFESSORA DO 5º ANO A)

“A prática com variedade de títulos propõe a leitura gradual, respei-


tando o gosto e o prazer de cada leitor.”
(PROFESSORA DAS 7ªS E 8ªS SÉRIES)

“Legal, me fez conhecer muitas histórias. Viajar sem sair do lugar!”


(EDUCANDA)

144 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

“Conheci um pouco da literatura brasileira, linguagem antiga e outras


culturas.”
(EDUCANDA)

“Conheci clássicos estrangeiros e nacionais.”


(EDUCANDO)
“Eu já gostava de ler, mas ampliei meu repertório. Muito legal poder
escolher os títulos.”
(EDUCANDA)

“Aumentou minha capacidade leitora, melhorei na reflexão e ampliei


meu vocabulário.”
(EDUCANDA)

RELATO DE EXPERIÊNCIA DA PROFESSORA DANIELLE


CRISTINA DE OLIVEIRA BRUSSOLO
Quando cheguei na EMEB “Lucy Apparecida Bertoncini” no ano de 2009, o
projeto de leitura já estava em andamento e logo a assessora pedagógica e as pro-
fessoras de Língua Portuguesa me deixaram a par do mesmo socializando livros e
atividades que trabalhavam com seus alunos referentes à leitura da coleção.

Logo me identifiquei com o projeto, por acreditar que a leitura abre muitas
portas, também por acreditar que o desenvolvimento da leitura é o principal ca-
minho para se chegar ao conhecimento. A leitura, dentre inumeráveis benefícios,
apresenta lugares nunca visitados, é sempre desafiadora, abre caminhos, amplia os
horizontes, desenvolve a fluência, a eloquência, melhora a escrita, enfim, a leitura
é primordial na formação de um cidadão informado, crítico e autônomo.

De início escolhemos a coleção “Salve-se quem puder” para os 6ºs anos, o


qual eu leciono, por ser uma coleção que desafia o leitor, pois sua estrutura é re-
pleta de enigmas a serem desvendados, provoca curiosidade, é de fácil leitura, mas
também, traz vocabulários complexos, dependendo do tema abordado, o que per-
mite aos educadores trabalhar o uso do dicionário com seus alunos.

Cada título escolhido leva o aluno a conhecer um pouco mais sobre outras
culturas. É também bastante ilustrativo, o que garante que esses novos leitores, que
ainda estão tomando gosto pela prática de ler, não sejam desmotivados.
A nossa ação para adesão deste projeto começa logo no início do ano, quando
informamos os pais através de avisos sobre como funciona o projeto, qual o papel
da família no incentivo à leitura, qual o valor que a equipe dá à leitura e por que, a
145
lista de títulos que a família pode estar adquirindo e dicas de onde podem ser en-
contrados. Solicitamos a leitura de um título por bimestre, para os pais de alunos
que só conseguem adquirir um título; instruímo-los a trocar com outros colegas
nos bimestres subsequentes.

A maioria dos pais realmente abraçou essa causa, pois entenderam a impor-
tância do incentivo à leitura, ainda mais nessa faixa etária, que a autonomia está em
desenvolvimento. Alguns relataram que estipularam um horário para que lessem
em casa, até mesmo outros títulos do projeto e além dele.

O projeto apresenta etapas como: roda de apreciação com foco no livro (qual
parte o aluno está lendo, quais descobertas foi possível obter até o momento, em
qual momento se viram mais presos à leitura, comentários sobre quais partes não
gostaram muito e por que), troca de experiências em grupo com integrantes que op-
taram pelo mesmo título e leitura compartilhada. Durante o desenvolvimento das
etapas do projeto, percebi os alunos mais envolvidos, conversando sobre os títulos,
melhorando a compreensão de textos nas aulas, lendo mais e com melhor fluência.

A curiosidade desperta o interesse em responder prontamente às questões


sobre o livro, os pais comentam que leem com seus filhos, favorecendo a relação
afetiva de família que lê unida e, também, o desejo manifestado, muitas vezes, pe-
los alunos em ter a coletânea inteira. Por todo o exposto, acreditamos que essa ex-
periência tem sido muito positiva à minha prática cotidiana e, principalmente, tem
refletido na aprendizagem dos alunos, o que é o meu principal objetivo.

O mais importante legado de qualquer escola não é o diploma, mas sim


ter ensinado seus egressos a aprender a aprender, a ter método para
solução de problemas e a pensar de forma independente.
EDUCAÇÃO MITO E FICÇÃO – LUIZ GUILHERME BROM E TÂNIA AGUIAR.

146 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

32
Família e escola formam uma equipe no
processo pedagógico 58
Tudo o que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem
em torno da escola, e dentro da escola, no sentido de participarem,
de tomarem um pouco o destino da escola na mão, também. Tudo o
que a gente puder fazer nesse sentido é pouco ainda, considerando o
trabalho imenso que se põe diante de nós, que é o de assumir esse país
democraticamente.
(PAULO FREIRE)

Atualmente, pensar em educação de qualidade é pensar que a família esteja pre-


sente na vida escolar do aluno, ou seja, é preciso uma interação entre escola e família no
que se refere à participação na vida educacional. Nesse sentido, a escola não pode viver
sem a família e a família não pode viver sem a escola, pois é esse trabalho conjunto que
contribuirá com a formação integral dos educandos, objetivando o desenvolvimento
do bem-estar e da aprendizagem de todos.

A partir dessa perspectiva, a EMEB São Benedito desenvolveu o Projeto Ins-


titucional Participação, cujo principal objetivo é promover situações em que a
comunidade e pais se envolvam com a escola também na dimensão pedagógica,
buscando a compreensão mútua do que venha a ser o desenvolvimento da criança.

Uma das ações promovidas por essa escola foi a elaboração de um jornal escolar, o
qual tem por objetivo: divulgar as ações desenvolvidas dentro e fora do espaço escolar;
esclarecer a comunidade sobre a proposta político-pedagógica da escola; socializar os tra-
balhos desenvolvidos pelos professores e alunos; favorecer com que as famílias se sintam
parte integrante do processo de desenvolvimento das crianças.

O jornal é também uma fonte primária de informação, espelha muitos


valores e se torna assim um instrumento importante para o leitor se si-
tuar e se inserir na vida social e profissional. Como apresenta um con-
junto dos mais variados conteúdos, preenche plenamente seu papel
de comunicação.
(FARIA, 2009, P.11)

Em reunião com professores e gestão escolar, foi discutido e avaliado que a


147
participação da comunidade era vista como dificuldade e pensando numa ação efe-
tiva que garantisse essa participação significativa da família na escola, decidimos
por desenvolver um trabalho de integração desde a educação infantil até o 5º ano
do ensino fundamental. Decidimos elaborar um jornal, pois pensamos que este
portador contribui como ponte entre currículo escolar e a realidade do dia-a-dia:
os conceitos curriculares podem ser aplicados nas situações cotidianas e retratados
no jornal como possibilidade de promover atividades de aproximação do leitor de
Jornal; intercâmbio de experiências dos estudantes, além de servir como veículo
de comunicação que contribuiria para a compreensão da proposta pedagógica da
escola e incentivaria a participação da comunidade.

Atendendo a proposta, a equipe escolar propôs um trabalho de integração


com a família, garantindo a participação dos pais, através de diálogo, pesquisa, en-
trevistas, oficinas, brincadeiras, passeios, socialização de experiências, diferentes
culturas e valores. A partir disso, os pais puderam contribuir efetivamente no de-
senvolvimento e na ampliação dos conhecimentos de seus filhos, além de conhe-
cer e vivenciar a proposta pedagógica da unidade escolar.

O jornal escolar teve sua primeira edição publicada e divulgada no encerra-


mento dos projetos da escola ao final do ano letivo de 2011, contou com uma par-
ticipação constante e direta de toda a equipe escolar, a qual envolveu a gestão, os
professores, funcionários, alunos, pais e comunidade.

Durante as etapas desse projeto, foram desenvolvidas, em sala de aula, pro-


postas de trabalhos as quais os professores propuseram atividades que resultaram
na sugestão do nome e logotipo para o jornal e, também, o desenvolvimento de
propostas de atividades que envolvessem a participação dos pais. Dentre elas, te-
mos a contação de histórias pelos pais, oficinas de artesanato trabalhadas no proje-
to “De olhos voltados para o mundo”, projeto desenvolvido na área de Natureza e
Sociedade na educação infantil e 1º ano do ensino fundamental, da rede municipal
de Cajamar, brincadeiras passadas de pais para filhos nos momentos de recreação,
entrevista com os pais e o preparo de receitas.

Com todas essas experiências, que integraram a participação e o envolvimen-


to das famílias, buscamos melhorar o relacionamento entre comunidade e escola.
O que de fato acreditamos é que este envolvimento, escola-família, contribuirá sig-
nificativamente para uma educação bem sucedida.

Dentro desse projeto propusemos também, a eleição para a escolha do nome


do jornal, aberto à comunidade e com a participação dos alunos, o qual deu a opor-
tunidade a eles e à comunidade, de exercer a cidadania dentro da escola, ação que

148 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

fez com que todos se sentissem parte desse trabalho.

A gestão democrática da educação é hoje, um valor consagrado no


Brasil e no mundo, embora ainda não totalmente compreendido e in-
corporado à prática social global e à prática educacional brasileira e
mundial. É indubitável sua importância como um recurso de participa-
ção humana e de formação para a cidadania. É indubitável sua neces-
sidade para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. É
indubitável sua importância como fonte de humanização.
(FERREIRA, 2000, p.167)

De acordo com o documento de Reorientação Curricular de Cajamar (2011),


pensar numa gestão democrática de ensino significa dizer que os espaços, as rela-
ções, os tempos, as organizações escolares, devam ser gestadas de forma participati-
va, rompendo definitivamente com a hierarquia de cargos, de mandos e desmandos,
de falta de diálogo, o que acaba gerando um grau imenso de impessoalidade tanto
nas relações internas como nas externas. Os sujeitos – ora formados pelo coletivo
escolar, ora formados com a participação de pessoas da comunidade - devem partici-
par de todos os momentos e processos de decisão e de conflitos que acontecem nas
escolas, seja nos aspectos financeiro, administrativo ou no aspecto pedagógico.

Sabemos que, muitas vezes, a causa da abstenção dos pais na vida escolar dos
filhos passa pelos seus horários de trabalho inflexíveis e, acompanhar o percurso
escolar do aluno, torna-se bastante difícil. A estas circunstâncias, para ratificarmos
o diagnóstico e para concretizarmos o trabalho desenvolvido, realizamos visitas à
casa dos alunos com o intuito de identificarmos, junto ao ambiente familiar, as ra-
ízes das dificuldades de aprendizagem do aluno, buscar maior parceria dos pais no
processo de ensino e aprendizagem dos alunos, esclarecer os pais sobre a metodo-
logia de ensino adotada pela escola, suas características e suas atividades, compre-
ender melhor as condições de vida da família e ajustar a metodologia educacional
a essa realidade.

Depois dessa ação, diretamente ligada à família, a equipe escolar refletiu so-
bre a necessidade de repensarmos e construir uma proposta curricular que de fato
atue de maneira mais significativa e integrada. Mas, para isso, precisamos efetivar
ações capazes de desenvolver saberes, garantir aprendizagens que favoreçam com
que as pessoas se tornem mais comprometidas com as próprias escolhas e com o
desenvolvimento de suas comunidades e de seu país. Além disso, é preciso cons-
truir consensos que garantam o bem comum, este entendido como um projeto
coletivo, que cuide do desenvolvimento e da aprendizagem de cada um e de todas
as pessoas envolvidas.

Portanto, nossa escola vem buscando meios de trazer a comunidade para,


149
dentro dela, sabermos que há muito que se fazer ainda, mas os primeiros passos
estão sendo dados. Esperamos que com esse trabalho a família se envolva mais
com a aprendizagem de seus filhos, sejam mais próximos para buscar informações
e participem efetivamente da gestão escolar.

1ª edição 2011.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública. São Paulo, Editora Ática, 2001.

COSTA, Silvia. Jornal na Educação: considerações pedagógicas e operacionais, 2ª ed., Santos,


Editora Gráfica, 1997.

150 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

33
Experimentando com
os materiais não estruturados 58
Sabemos que a primeira fase da Educação Infantil está marcada por um período
em que as crianças estão se desenvolvendo rapidamente a partir das experiências
que são possibilitadas a elas.

A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca,
a cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase
nada nos acontece. Dir-se-ia que tudo o que se passa está organizado
para que nada aconteça.
(BENJAMIM. 1991:111)

As crianças com idade de 1 a 3 anos estão super interessadas em objetos que


suscitam várias possibilidades de brincadeira como as tampas das panelas, cestinhas,
pedaços de madeira, caixa de sapatos e outros objetos que fazem parte do nosso co-
tidiano. Nessa faixa etária,

(...) os objetos que as rodeiam começam a ser para elas uma oportuni-
dade de movimentos que não tem muito a ver com a sua estrutura. Ela
os atira ao chão, observando o seu desaparecimento. Tendo aprendido
a agarrá-los, desloca-os com força, como para exercitar os olhos a en-
contrá-los em cada nova posição. Se eles tem partes que se entrecho-
cam, ela não para de reproduzir o som percebido, agitando-os de novo.
(WALLON, 1994:148)

Pensando na importância de oferecer estes objetos, os quais chamamos de


material não estruturado, algumas professoras e monitores buscaram montar cai-
xas com materiais que favorecem muitas explorações como: conduíte, canos, ces-
tinhas, bolinhas, carretel, pneus, objetos com diferentes formatos e texturas; todos
esses possibilitam uma exploração flexível e criadora promovendo um brincar de
mais qualidade.

A equipe vem descobrindo nessa diversidade, uma imensidão de aprendiza-


gens relacionadas à autonomia, criação, investigação, sensações e construções e de
experiências em um momento em que as crianças estão fazendo muitas conexões.

151
A caixa com os materiais não estruturados deve ser sempre modificada, sempre eli-
minando e acrescentando um novo objeto, para que haja uma novidade. Percebe-se que
a organização do espaço com a disposição planejada dos materiais, favorece com que as
crianças brinquem com materiais, sem precisar da intervenção direta do adulto, o qual
passa atuar como facilitador da interação das crianças com o objeto.

Quando as crianças estão manipulando os objetos muitas vezes nos sentimos


como se não estivéssemos desempenhando nenhum papel; assim o professor vai se per-
guntando: como não intervir na brincadeira? Que ação tenho durante essa brincadeira
sem ser o centro da atividade? Mas crianças não precisam de alguém que fique falando o
tempo todo, dirigindo as atividades; precisam de uma pessoa e uma companhia que dê
segurança e que faça boas escolhas e um planejamento que venha ao encontro com as
necessidades do grupo.

É principalmente no ato de planejar que entra a ação do professor: a forma de dis-


por os objetos; na escolha que realiza ao selecionar os quais irá oferecer, pensando an-
tecipadamente nos movimentos e pesquisando o que cada material pode proporcionar
para as crianças; estabelecendo várias possibilidades de desafios, sempre atento, para
que possa registrar as ações das crianças frente aos materiais.

Para que possamos evidenciar ainda mais como as crianças se relacionam com
estes objetos procuramos sempre filmar as crianças nestas atividades de exploração, e
assim saber como está sendo para cada um este momento, visto que conforme o de-
senvolvimento existe uma investigação diferente da criança. Ao analisarmos os vídeos
muitas são as reações que percebemos nas crianças: algumas ficam um tempo muito
significativo envolvidas com um mesmo material; outras necessitam trocar várias vezes
de objeto, experimentando todos; algumas crianças vão sentindo as sensações que os
objetos produzem no corpo; as crianças maiores começam criar enredos de brincadeiras
através dos objetos. Enfim inúmeras são as possibilidades que estes objetos trazem.

Ao longo destas experimentações, percebemos que as crianças ao explorar um


determinado material, vão fazendo movimentos repetidos, pois percebe que determi-
nado movimento gerou uma reação, então passa a repeti-los intencionalmente. Wallon
(1994:27) denomina esta ação-reação, como atividade circular e que a criança fica mui-
to tempo neste movimento, como forma de ajustar cada vez mais seus gestos, tornando-
-os cada vez mais habilidosos. Esta motivação investigadora da criança, faz com que ela,
além de enriquecer seus movimentos cada vez mais, possa também ir construindo o co-
nhecimento de si própria.

Conforme vão amadurecendo em suas conquistas, os objetos passam a serem pro-


dutos na construção do jogo simbólico, podem virar mesinhas, carrinhos, barcos, rou-

152 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

pas, aviões, em que a criança passa a fazer uma exploração objetiva diante dos objetos,
trazendo e construindo a realidade em que vivem através da brincadeira.

Por acreditar que esta atividade é uma das mais completas para a faixa etária com
a qual trabalhamos, estamos investindo nesta proposta com os professores, visto que
alguns já identificam e outros necessitam das intervenções, no sentido de acreditar nesta
atividade e para que este trabalho possa fluir com mais qualidade, assim formações nos
HTPCs, trocas de experiências e filmagens das crianças nestas atividades, estão sendo
vivenciadas aqui na nossa escola, para que este trabalho seja ainda mais efetivo.

Assim acreditamos que a equipe como um todo já avançou muito no conhecimen-


to da necessidade desta atividade na rotina dos alunos, para as nossas crianças, temos
certeza de que atuamos junto a uma equipe que está sempre aberta para as novas apren-
dizagens e assim estamos conseguindo este trabalho mais focado com relação aos mate-
riais não estruturados.

É importante considerar ainda que, logo que iniciamos o trabalho nesta escola,
EMEB “Marcus Vinicius”, recém-inaugurada, iniciou-se com um grupo de professores
com pouca experiência na educação infantil, principalmente com a faixa etária de 1 a 3
anos, que junto à gestão da escola acreditou ser necessário, aprimorar conhecimentos
e investir em formações direcionadas a esta faixa etária, aprofundando nossos conhe-
cimentos, com relação à organização dos tempos e da rotina na escola, toda esta busca
trouxe muitas reflexões e embasamento, para o nosso trabalho, a possibilidade deste tra-
balho com materiais não estruturados, foi uma delas, que foi sendo reafirmada, eviden-
ciando o quanto é necessária para o desenvolvimento de trabalho com esta faixa etária.

Destaco também que a equipe de trabalho desta escola, tanto os professores como
os monitores educacionais, estão sempre buscando novas aprendizagens e possibilida-
des de trabalho, procurando, trazer sempre o melhor para nossos alunos, acreditamos
que é nesta busca constante de aprimoramento, que se fortalece o trabalho, as conquis-
tas e a prática em busca de uma escola de qualidade, nos quais todos os envolvidos (alu-
nos, professores, funcionário e pais) estejam satisfeitos com os resultados obtidos.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


BENJAMIM, Walter. Para uma crítica de La Violencia y otros ensaios. Madrid: Taurus. 1991. p.111.

MAHONEY, Abigail Alvarenga; ALMEIDA, Laurinda Ramalho, (org.) Psicologia Educação Henry
Wallon. São Paulo: Loyola. 2000. p.32.

Revista Brasileira de Educação (Jan/Fev/Mar/Abr 2002). Nº 19

153
34
34 - Faz de conta
na educação infantil 58

No início da minha vida docente não conseguia “ver” a importância do brincar e


sinceramente achava uma perda de tempo, tempo este que poderia ser utilizado
para alfabetizar. Um dia estava pesquisando brincadeiras e me deparei com um tex-
to de Norma Lucia Neris de Queiroz46 que levantava as seguintes questões: Como e
por que as crianças brincam? Qual o significado desta atividade em cada cultura?

Estas questões da temática da brincadeira me levaram a refletir sobre minha


prática e analisar o conceito da atividade de brincar e quanto conhecimento essas
atividades podem trazer para nossos alunos.

Hoje, depois de muitos questionamentos e sabendo que em grande parte das


sociedades contemporâneas a infância é marcada pelo brincar - que faz parte de
práticas culturais típicas, mesmo que esteja muito reduzido face à demanda do tra-
balho infantil que ainda se insere no cotidiano dos segmentos sociais de baixa ren-
da -, percebo que a brincadeira permite à criança vivenciar o lúdico e descobrir-se
a si mesma, apreender a realidade, tornando-se capaz de desenvolver seu potencial
criativo. Posso afirmar que o brincar é essencial ao desenvolvimento infantil e con-
cordo com a importância dada no Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil (1998)47, onde a brincadeira está colocada como um dos princípios fun-
damentais, defendida como um direito, uma forma particular de expressão, pensa-
mento, interação e comunicação entre as crianças.

Assim, a brincadeira é cada vez mais entendida como atividade que, além de
promover o desenvolvimento global das crianças, onde podem aprendem a ser, fa-
zer, viver e conviver em comunidade, também incentiva a interação entre os pares, a
resolução construtiva de conflitos, uma vez que juntas decidem com o que brincar,
como brincar, a função de cada uma nessa brincadeira. Através da conversa resolvem
seus conflitos e, caso não consigam nesse momento, o professor pode intervir, mas
46. Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília (2006), Mestre em Educação pela Universidade de Brasília
(1994), Gaduada em Pedagogia (1986) e Graduada em Letras (1992), ambas pela Universidade de Brasília. Texto
retirado da internet “Brincadeira e Desenvolvimento Infantil: um olhar sociocultural construtivista”.
47. Brasil, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. Volume 1: Introdução; Volume 2: Formação Pessoal e
Social; Volume 3: Conhecimento de Mundo.

154 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

deixando que as crianças se resolvam. Elas passam a pensar sobre suas ações nas brin-
cadeiras, sobre o que falam e sentem, não só para que os outros possam compreendê-
-las, mas também para que continuem participando das brincadeiras.

A teoria do desenvolvimento cognitivo, como destaca Wallon48, é essencial-


mente emocional e afirma que gradualmente a criança vai constituindo-se em um
ser sócio-cognitivo, uma criança contextualizada, como uma realidade viva e total
no conjunto de seus comportamentos, suas condições de existência. Essas teorias
mostram a importância do faz de conta como comunicação integrada, ou seja, o
faz de conta é uma atividade complexa e constituinte do sujeito. Através dele as
crianças buscam superar contradições, motivadas pela possibilidade de lidar com
o acaso, com a regra e a ficção, e pelo desejo de expressar uma visão própria do
real, embora por ele marcada. Na linguagem criada no jogo simbólico, dentro de
uma atmosfera “como se fosse assim ou assado”, a criança recombina elementos
perceptuais, cognitivos e emocionais, cria novos papéis para si e reorganiza cenas
ambientais, criando espaço para a fantasia. Piaget (1978), face ao desenvolvimen-
to do pensamento infantil, afirma que a brincadeira de faz de conta:

(...) está intimamente ligada ao símbolo, uma vez que por meio dele, a
criança representa ações, pessoas ou objetos, pois estes trazem como
temática para essa brincadeira o seu cotidiano (contexto familiar e es-
colar) de uma forma diferente de brincar com assuntos fictícios, con-
tos de fadas ou personagens de televisão (p.76).

Neste sentido, ele diz que o pensamento da criança pequena não é suficientemen-
te preciso e maleável para comunicar um conjunto de ideias, então o símbolo assume a
função de mediador, dando oportunidade à criança de expressar seu pensamento.

Após essas considerações, vamos falar sobre a prática em sala de aula, onde
deve ser oportunizado às crianças muitos momentos de brincar: planejados, pen-
sados sobre o que as crianças vão aprender, em que contexto social elas poderão
utilizar tais aprendizados, afinal, é através do brincar que a criança constrói sua
experiência de se relacionar com o mundo de maneira ativa. Em uma brincadeira

qualquer, ela pode optar por brincar ou não, o que é característica importante da
brincadeira, pois oportuniza o desenvolvimento da autonomia, criatividade e res-
ponsabilidade quanto a suas próprias ações.

A partir das observações sobre a importância do brincar nas reuniões de


48 Henri Wallon. Uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Isabel Galvão. Ed. Vozes, 1995.

155
HTPC na escola, e nos encontros na Diretoria de Educação de Cajamar, resolve-
mos (professoras, gestão, alunos e pais) confeccionar novos kits, com diferentes
desafios, kits de faz de conta como: cabeleireiro, médico, escritório, matemático,
fantasias, casinha, pizzaria, jogos de montar, dentro outros, com o combinado de
serem utilizados todos os dias, por mais ou menos 30 minutos, criando ambientes
planejados às vezes na sala de aula, às vezes em outras salas, fazendo rodízio, no
pátio, no parque. Queríamos inovar, queríamos um kit com o qual os alunos pu-
dessem realmente explorar sem muitas intervenções, usando sua criatividade, e foi
durante uma troca de experiência de professoras em uma formação sobre Wallon
que vimos, através de um vídeo, alunos de 03 a 06 anos brincando com um kit
de materiais não estruturados. No mesmo momento nos olhamos (professores da
escola), mostrando o interesse em confeccionar. A cada imagem mais ideias sur-
giam sobre diferentes materiais para compor esse kit. Sentamos, discutimos o que
poderia ser comprado e o que poderia ser confeccionado com sucata e todo dia
uma professora trazia uma nova ideia para ampliar e diversificar esse kit. Assim foi
“nascendo” nosso kit, que pode ser comparado com o conhecimento, nunca está
completo, sempre é possível buscar mais.

Durante a observação da brincadeira levantamos pontos positivos a respei-


to do interesse das crianças, da exploração, da criação e dos questionamentos: ‘O
que é isso, uma bola?’ (se referindo a um suporte de lavar sutiãs); ‘Professora, olha
como ficou as caixas’ (mostrando uma classificação por tamanho); ‘Agora, Prô, vou
separar por cor, posso usar todos os materiais, que legal! Vou montar um robô’.

Quanto aos pontos negativos, seria muito interessante que as crianças passassem a
participar da confecção de alguns materiais, mas ainda podemos fazer isso e nós vamos.

É fundamental que o professor mostre aos alunos que o faz de conta implica
em negociação. Para brincar com outra criança sobre um mesmo tema, a criança
precisa de um acordo quanto aos significados implícitos nos papéis e ações, caso
contrário a brincadeira não ocorrerá em grupo. Sendo assim, as transformações re-
alizadas sobre os objetos precisam ser acompanhadas pelos parceiros e, para fazer
parte da brincadeira, deve haver a aceitação dos papéis e/ou formas de negociação.
Cabe ao professor também, como adulto mais experiente, estimular brincadeiras,
ordenar o espaço interno e externo da escola, facilitar a disposição dos brinquedos,
mobiliário e os demais elementos da sala de aula. Outras formas de intervenção
podem ser propostas visando incitar as crianças a desenvolverem brincadeira nesta
ou naquela direção, mas só como incitações, nunca obrigação, deixando-as toma-
rem a decisão de se engajarem na atividade.

O professor pode brincar com as crianças, principalmente se elas o convidarem,


solicitando sua participação ou intervenção. Mas deve procurar ter o máximo de cui-
156 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

dado respeitando sua brincadeira e ritmo. Sem dúvida, esta forma de intervenção é
delicada, por ser difícil o adulto participar da brincadeira sem destruí-la, é preciso
muita sensibilidade, habilidade e um bom nível de observação para participar de for-
ma positiva. Para isso o planejamento do brincar é fundamental, pois a partir dele o
professor poderá direcionar o seu olhar em relação às propostas e aos objetivos, ante-
cipando algumas possibilidades de ações das crianças e também de intervenções suas.

A chave desta intervenção é a observação das brincadeiras das crianças, pois


é necessário respeitá-las: conhecê-las, sua cultura, como e com quê brincam, quan-
do seria interessante o adulto participar. Melhor, porém, é que se aproveite este
momento para observar seus alunos, para conhecê-los melhor.

Para finalizar, é importante ressaltar que o momento que nós, educadores da


rede de Cajamar, estamos vivendo é o da “construção” do nosso currículo. No início
das discussões eu pensava: com tanta coisa para fazer, por que não pegam pronto de
outra cidade? Hoje, contudo, quando estou começando a entender o que é currículo,
tenho certeza de que ele deve ter a nossa “cara” e não ser feito com materiais alheios à
rede, pois esses não consideram a formação dos professores e nem os conhecimentos
anteriores dos alunos, muito menos a diversidade étnica e social locais.

Também não deve ser entendido esse momento como a mudança de tudo o
que fazemos, mas a mudança do que pode ser melhorado, sempre apostando numa
coisa chamada ‘diálogo’. Essa palavra está desgastada, por ser muita falada, mas
pouco usada, principalmente na educação. Ela vem do grego dialogos, que quer
dizer “entendimento por meio da conversa”. Essa é uma expressão muito bonita. É
saber ouvir o outro, para elaborar algo coletivo, em comum. Isso não é brincadeira.
Numa sala com mais de 30 alunos, o diálogo é um processo que pode se tornar
muito trabalhoso, mas que também é fantástico quando bem sucedido. A criação
das condições necessárias para que o diálogo aconteça é fundamental. O ambiente
escolar tem de cultuar isso e o aluno tem de ser visto como um participante impor-
tante do processo de ensino e aprendizagem.

157
35
Ler tem um porquê
A problemática apresentada pela formação do leitor, longe de ser espe-
cífica de determinadas séries, é comum a toda a instituição escolar. O
desafio de dar sentido à leitura tem, então, uma dimensão institucio-
nal e, se essa dimensão é assumida, se a instituição como tal se encarre-
ga da análise do problema, se seus integrantes em conjunto elaboram e
levam à prática projetos direcionados a enfrentá-lo, começa a se tornar
possível encurtar a distância entre os propósitos e a realidade.49

A formação do leitor em suas possibilidades, caminhos e processos se encontram in-


trinsecamente relacionada aos propósitos sociais, históricos e culturais que permeiam
ideários e concepções do grupo-escola.

Diante disso, gestores e professores da EMEB Ester Catarine Lozano acreditam


que, mais do que direito da criança, tanto o acesso a leitura e escrita como sua aprendi-
zagem em contextos significativos nos quais tais procedimentos se fazem necessários, é
responsabilidade efetiva da escola promover situações e experiências que promovam a
ampliação do uso das práticas sociais de leitura e escrita, para que sejam capazes de ler
e se comunicar e para responder eficazmente por escrito ou oralmente as situações que
façam sentido na sua vida cotidiana.

Precisamos ter cuidado para que a escola não se preocupe apenas com a conquis-
ta do código e com o decifrar palavras, mas que se preocupe, principalmente, com que
os alunos façam da leitura um prazer, que conheçam e façam deste conhecimento um
sentido para a vida. Sabemos que as crianças, desde o nascimento, desenvolvem-se nas
interações com as pessoas de seu convívio social, entrando em contato com seus valores,
crenças e costumes.
Neste processo e, partindo da premissa de que o grau de letramento da criança
depende das experiências compartilhadas com adultos, é preciso que se invista no pen-
samento de que ler se ensina e que se ensina com bons modelos e boas práticas. São as
relações da criança com o objeto-livro, da criança com outra criança e/ou adulto que se
fazem presentes no ato de ler que trarão grandes contribuições à formação do leitor.

Nessa perspectiva, se ensina quando se prepara o ambiente para que as crianças


possam se perceber enquanto leitores, e para que percebam que é possível que a leitura
e a escrita façam parte de sua vida. Para isso são possibilitados momentos e práticas de
leitura tais como:
49 Delia Lerner,2002,p97.

158 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

BAÚ LITERÁRIO: Este Baú de Livros com gêneros diversos circula nas salas de
aula uma vez por semana, conforme cronograma pré-estabelecido pela gestão.
O acervo é renovado bimestralmente com o mesmo critério: da diversificação e
dos gêneros e portadores. A cada renovação os livros são apresentados aos alu-
nos para que apreciem e possam reconhecê-los no momento da escolha. Estes
momentos de leitura acontecem para o professor, uma vez por semana após ob-
servar o interesse dos alunos por algum livro ou em situações onde é proposto
que os alunos leiam os livros, mesmo que de forma não convencional para que
antecipem significados de um texto escrito a partir de imagens e ilustrações que
acompanham, após recontam aos colegas e professora.

BIBLIOTECA VOLANTE: São livros do acervo da escola emprestados e levados


para casa onde as crianças e os pais possam apreciar diferentes gêneros. Uma
vez por semana, na sexta-feira, dia combinado entre professores, pais e Gestão,
é enviado um livro/gibi/revistas/jornais e CDs escolhidos e selecionado pelo
professor ou pelo aluno numa, “sacolinha” de TNT, confeccionada para este fim
e com o logotipo da escola a ser lido em casa pelos alunos e pais, o controle dos
livros feito pelo professor através de uma carteirinha confeccionada pela esco-
la. A socialização da leitura se dá ás segundas-feiras na roda do reconto. Os pais
são orientados pelos professores através de bilhetes e ou em reunião de Pais
sobre o trabalho a ser desenvolvido para que efetivamente aconteça a parceria
família/escola que imprescindível. Há também combinados entre o professor e
alunos para realização, organização e manutenção dos livros, revistas e gibis
e combinados com assinatura de em Termo de Responsabilidade pelos pais. O
acervo é renovado a cada trimestre diversificando assim, os suportes e gêneros.
Desde o ano passado foi acrescentado, junto aos livros, revistas gibis e jornais,
CDs de cantigas e canções trabalhadas em Sequência Didática para que, junto
com os pais, os alunos aprendam e ouçam as cantigas e canções trabalhadas em
sala de aula possibilitando o reaprendizado das brincadeiras de roda e músicas
da cultura infantil.

CANTINHO DE LEITURA: Espaço organizado pelo professor num canto da sala de


aula com tapete, almofadas, estante, livros, revistas, gibis e jornais onde é per-
mitida a livre circulação dos e, assim, seja garantido o acesso a estes materiais,
visualizando-os e manuseando-os nos momentos de “Cantos” e Atividade de
Passagem onde os alunos, ao terminarem uma atividade antes dos demais cole-
gas, buscam, neste cantinho, uma oportunidade a mais para ler.

PASTA DE LEITURA: Os textos vivenciados em sala de aula se estendem até a casa


dos alunos onde pesquisam e leem para os pais, mesmo que não o façam de for-
ma convencional. O acervo de textos é organizado para que se favoreça aos alu-

159
nos recorrer posteriormente para lembrar algo que precisam pesquisar, estudar
e até mesmo se divertir, podendo conter nesta pasta

PASTA DE LEITURA: Os textos vivenciados em sala de aula se estendem até a casa


dos alunos onde pesquisam e leem para os pais mesmo que não o façam de for-
ma convencional. O acervo de textos é organizado para que favoreça aos alunos
recorrerem posteriormente para lembrar algo que precisam pesquisar, estudar
e até mesmo se divertir, podendo conter nesta pasta: lista com nome dos alu-
nos da sala, nome dos alunos e data de aniversário, tabela numérica, alfabeto,
textos conhecidos pelos alunos (parlenda, quadrinhas, poemas, músicas, adivi-
nhas, Tirinhas de histórias em quadrinhos, listas de histórias conhecidas, mate-
riais escolares que devem conter nos estojos, cardápio da semana, etc.). Os tex-
tos selecionados pelo professor com diversos gêneros são compartilhados com
a família a cada 15 dias onde os pais são orientados em como auxiliar os filhos
em casa, esta orientação também é compartilhada com os alunos e anexada à
pasta de leitura.

RODA DE HISTÓRIA: A leitura do professor é de particular importância na primei-


ra etapa da escolaridade, quando as crianças ainda não leem eficazmente por si
mesmas. Durante esse período, o professor cria muitas e variadas situações nas
quais lê diferentes tipos de texto”. As leituras, nesse precioso momento, acon-
tecem de forma atraente, convidativa e de várias maneiras: na sala de aula, pá-
tio, quadra ou em um cantinho aconchegante do espaço externo planejado pelo
professor. Quando os alunos não estão sentados em tapetes, usam as almofadas
trazidas por eles, de casa. O contato do aluno com diferentes gêneros e portado-
res possibilitando o acesso a um mundo encantado. As histórias são lidas em voz
alta, geralmente pelo professor, sempre se utilizando de estratégias de leitura
ou por pais ou, ainda, funcionários que são convidados ou se prontificam em
fazer a leitura.

É muito importante o encontro dos pais e alunos ante a possibilidade de re-


alizarem práticas de leitura de diversos portadores textuais em ambientes diferen-
ciados. A aproximação dos leitores e ouvintes nesses momentos, a vivência com os
diferentes interlocutores, além de aproximar os envolvidos, amplia a possibilidade
de ambos terem um repertório mais rico e elaborado, favorecendo a conquista des-
ses na construção da cultura, além de se tornarem usuários da linguagem escrita.

160 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

LEITURA FEITA PELOS PRÓPRIOS ALUNOS (PSEUDO-LEITURA E RECONTOS): Este mo-


mento se dá uma vez por semana, com livros do Cantinho da Leitura ou livros do
Baú Literário. Os livros, e mais este momento planejado pelo professor, são reve-
lados ante a importância de se oferecer livros de qualidade para que os alunos,
mesmo aqueles que não leem convencionalmente, possam fazer a própria leitura
utilizando-se dos procedimentos básicos de leitor, lendo a partir da capa, virando
páginas, observando as ilustrações, um conjunto de letras, comentando sobre elas.

HISTÓRIA POR CAPITULO: A professora se utiliza deste recurso de contar algumas


histórias por capítulos, para aguçar a curiosidade e retomar o que já foi lido para
que as crianças busquem na memória, os capítulos contados anteriormente, mo-
tivando a imaginação para os que se seguirem, confrontando posteriormente suas
ideias e imaginação com o texto real.

RECONTANDO HISTÓRIAS: Em roda, com os alunos confortavelmente instalados em


sala ou em outro espaço da escola, é lido histórias. Após a leitura o professor mostra
partes do livro para que as crianças se apoiem nas ilustrações e recontem a história.
Algumas vezes são utilizados objetos (fantoches, imagens no data-show ou imagem
do próprio livro para favorecer o “reconto”).

PROJETO TRILHAS: Este projeto acontece tanto nas fases IV e V como nos primeiros
anos do Ensino Fundamental com gêneros: História de Animais, Histórias Clássicas,
História com engano, História com acumulação, História com Cartas a serem apro-
fundadas. “Este projeto é uma iniciativa do Programa Crer para Ver, da Natura Cos-
méticos, que envolve um conjunto de materiais elaborados para instrumentalizar e
apoiar o trabalho docente no campo da leitura, escrita e oralidade, com crianças de
4 a 6 anos, com o objetivo de inseri-las no mundo letrado”. Desenvolver as compe-
tências linguísticas (oral e escrita), conversar sobre as histórias, falar de seus pon-
tos de vista compartilhar dúvidas e descobertas são possibilidades que as crianças
conquistam como leitoras antes mesmo de saberem ler, fazendo da leitura fonte de
conhecimento, ampliando seu universo cultural.

RODAS LITERÁRIAS: Bimestralmente, nos Conselhos de Classe, é realizado com todos


os funcionários, leituras de livros trazidos por eles a serem emprestados e empresta-
rem para ler e comentar até a próxima reunião do Conselho de Classe. Nessas Rodas
há a presença de alguns pais e ou familiares. A troca de livros não acontece só nas
Rodas Literárias, quando podem, indicam ou emprestam o livro escolhido e lido. Essa
Roda gira numa constante. É gratificante perceber que na maior parte do tempo, os
adultos da escola estão com livros e ou outros portadores nas mãos, lendo e comen-
tando sobre o lido, indicando a outros funcionários e pais os títulos lidos.

161
As práticas de leituras destacadas pela EMEB Ester Catarine Lozano são si-
tuações de leitura planejadas para que se efetive o ler para aprender, para signifi-
car e encantar de forma a atender as necessidades de cada aluno, nos momentos
de leitura feita por eles mesmos com o objetivo de melhorar sua fluência, lendo
em todas as áreas, emprestando livros, recontando, indicando leituras e rodas de
conversa para falar sobre a leitura, é mágico este encontro, esta descoberta de dife-
rentes portadores e leitores. São planejados também pelos gestores, espaços com
livros, revistas e jornais para manuseio, possibilitando descobertas aos que circu-
lam pelos espaços da escola.

Temos como meta, que o ato de ler na escola seja luz refletida para irradiar o
hábito da leitura para a vida de todos os envolvidos. Estamos dando os primeiros
passos na direção desta tão valiosa conquista, a de formar leitores.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


Trilhas para ler e escrever textos - CEDUC

Caderno de Orientações-Histórias com Repetição,

162 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

36
Brincar é preciso! 50
Sabemos que as crianças são mestres em transformar objetos, que exploram, en-
cantam-se, divertem-se e dão vida a objetos sem utilidade, transformando-os em
brinquedos inventivos. Segundo Adriana Klisys “quando a criança tem à disposição
uma variedade de materiais, a capacidade de inventar é valorizada”, portanto cabe a
nós, educadores, criar oportunidades para que os pequenos possam inventar, ima-
ginar e criar seus próprios brinquedos. Diante desta premissa, resolvemos organi-
zar o “kit de objetos não estruturados”.

A E.M.E.B. Ester Catarine Lozano tem como objetivo primordial propiciar


o desenvolvimento integral dos educandos por meio do lúdico, atrelado ao Edu-
car/Cuidar/Brincar, e propiciando a eles um ambiente organizado, aconchegante
e acolhedor. Os educadores, cada um com seu grupo, procuram acolher, respeitar,
orientar e estimular a todos para que se desenvolvam. A escola atende a crianças
de 04 a 06 anos e este relato irá focar como elas agem diante de uma proposta de
brincadeira inusitada. A mesma proposta foi trabalhada com crianças da fase IV
(04 anos), com crianças da fase V (05 anos) e crianças do 1º ano (06 anos), com o
intuito de observar e refletir sobre suas ações.

Com o apoio das gestoras, montamos um kit com sucatas industriais, mate-
riais que permitem diferentes utilizações e classificados, segundo Leontiev, como
materiais de “largo alcance”, por oferecerem a possibilidade de mobilizar as mais
variadas ações, durante as quais as crianças podem atribuir diversos significados,
ao contrário dos brinquedos industrializados como bonecas e panelinhas. Orga-
nizamos o kit com objetos de utilidades domésticas, como: varais de vários tipos,
prendedores de roupa, tecidos coloridos, cestas, porta-sutiã, tampinhas de garra-
fa pet, pratos, colher de pau, potes plásticos (com e sem tampa), caixas encapa-
das com papéis coloridos (vários tamanhos), carretéis de papelão, canos de PVC,
conduítes, lã, tapete de EVA (alfabeto), tambores encapados, caixotes de madeira,
pneu, etc.

Nós, professoras e gestoras, pensamos, refletimos e organizamos o espaço para


que a brincadeira pudesse acontecer, para que os objetos se tornassem brinquedos, pois,
segundo Gisela Wajskop “nenhum brinquedo é brinquedo em si, ele se faz brinquedo através
do uso e exploração feitos pelas crianças em uma situação de brincadeira, sendo utilizados
50. Relato elaborado por

163
livremente para dar vida aos enredos por elas inventados”. Para esclarecer melhor essa situa-
ção, pensemos em uma criança brincando com um pote e uma colher de pau. Esses ob-
jetos no armário de uma casa são apenas utensílios domésticos para cozinhar. O que os
torna brinquedos nas mãos das crianças é o seu uso e transformação, ou seja, um mesmo
brinquedo pode ser em um momento uma bateria, em outro, um instrumento de um
grupo de pagode, e, em outro, um tambor dos africanos. Neste caso, as crianças em
ritmo africano, tocavam e cantavam, relacionando com a Cultura Africana estudada pelo
grupo no 1º semestre. As crianças são capazes de modificar o significado dos objetos
durante a brincadeira e transformá-los em inúmeras “coisas” porque possuem gestos
imaginários. Por isso mesmo elas devem ter sua criatividade incentivada e motivada per-
manentemente.

O mundo aventureiro do brincar exige imaginação, exploração, invenção,


descobertas e transformação, e é possível aproveitar esse potencial infantil na esco-
la, possibilitando as pequenas situações, em que possam representar ou expressar
seus sentimentos, preocupações ou interesses, constituindo um canal de interação
social com os adultos ou com outras crianças, além da interação com a sua pró-
pria cultura, com a diversidade social e cultural, visto que, através do contato, da
manipulação e do uso dos brinquedos pelas crianças, há uma aprendizagem mul-
tidisciplinar das formas de ser e pensar da sociedade. Segundo Gisela Wajskop, “ao
utilizar determinados brinquedos, como bonecas, carrinhos, naves espaciais, etc., através
das imagens que eles transmitem, as crianças aprendem sobre determinadas formas de
se relacionar das pessoas e de conhecimentos já conquistados pela humanidade”.

As gestoras se incumbiram de filmar e fotografar esse momento mágico tanto


para os pequenos como para nós, adultos envolvidos, pois nos colocamos no papel
de crianças ao escolher os objetos e materiais, pensando nas possíveis ações destas.
Assim, como relembramos a nossa própria infância e como poderíamos ser mais
“criativas” hoje em dia, caso essa proposta tivesse sido trabalhada conosco... Á profes-
sora, coube o papel de organizadora do ambiente, acolhedora e estimuladora, tendo
como foco observar, incentivar e problematizar as situações de aprendizagens.

Quando as crianças se depararam com os materiais organizados na sala fica-


ram ao mesmo tempo surpresas e encantadas com o visual colorido e com tantos
objetos, e algumas levaram um tempo para compreender que era para brincar e
explorar tudo aquilo. Acredito que, a princípio, esperavam encontrar um kit de faz-
-de-conta, como os que já estão habituados: pizzaria, reis e rainhas, hospital, salão
de beleza, circo, entre outros, em que os materiais que os compõem “instigam” o
que deve ser feito, como, por exemplo, a pizza deve ser colocada no forno para as-
sar, ou vestir a capa de príncipe e cavalgar no cavalo e/ou lutar com a espada, lavar
e secar o cabelo da cliente, etc.

164 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Ao observar a reação das crianças, procurei inseri-las na brincadeira, mostrando


aquelas que já tinham incorporado o sentido desta: explorar, criar e descobrir possi-
bilidades. E, ao passo em que iam interagindo com o espaço, com os objetos e com
os colegas, o prazer em descobrir a novidade tomou conta do ambiente e as crianças
criaram novas relações com aqueles objetos, transformando-os, recriando-os. Elas
tocavam para conhecer a plasticidade do material oferecido, e, então, descobriam di-
ferentes formas de uso, como, por exemplo, um cano de PVC sendo utilizado como
taco para “jogar sinuca” ou sendo utilizado como um instrumento musical.

Percebemos que algumas crianças ainda estão na fase da exploração, ou seja,


do pensamento prático-ação; e outras na fase do faz-de-conta, do pensamento
simbólico. Segundo Wallon, “Nesse processo de experimentação, de investigação, a
criança vai estabelecendo relações entre seus movimentos e sensações; e em cadeia cir-
cular, como acontece com a exploração e manipulação de objetos, procura reproduzir
os gestos na tentativa de obter as impressões por ela previstas” 51. No grupo, havia
crianças com movimentos mais expansivos, em pé, circulando pelo espaço e outras
com movimentos mais calmos, sentadas no chão. E isso ocorreu nas duas fases ob-
servadas (IV e V), evidenciando que o desenvolvimento vai e volta, pois há confli-
tos pelo meio do caminho, que desorganizam e que acarretam mudanças também.
As crianças se empenham em suas explorações, observam os colegas, fazem igual,
reinventam, comparam e discutem as melhores possibilidades e sentem-se produ-
tivas. E é esse o nosso objetivo, o de propiciar situações onde possam criar seu pró-
prio brinquedo, reaproveitando e recriando a partir de objetos e sucatas, através
de uma experiência transformadora, pela qual a criança passe a se enxergar como
produtora de cultura e não somente como consumidora de brinquedos culturais
industrializados, como: fogãozinho e panelinhas, bonecos (super-heróis), video-
game, entre outros. Estes fazem parte do universo infantil e são muito bem aceitos
pelas crianças, mas acreditamos que elas possuem criatividade para construir seus
próprios brinquedos, com ou sem ajuda do adulto e outros pares mais experientes,
como as crianças indígenas, por exemplo.

Vale lembrar que a brincadeira deve ser observada pelo professor, pois sa-
bemos que podem ocorrer conflitos, como disputa pelos materiais, pelo próprio
espaço e que estes devem ser mediados através das relações entre as crianças;

devemos ajudá-las a organizar o ambiente, oferecer outros materiais que possam


ganhar enredos e acrescentar personagens e acessórios que venham a complemen-
tar a brincadeira, incrementando sua construção lúdica. Contudo, sem interferir
muito para não limitar sua iniciativa e autonomia para criar. É fundamental po-
tencializar a brincadeira oferecendo subsídios para que ela se torne cada vez mais
51. Mahoney, Abigail Alvarenga; Laurinda Ramalho de (org.), Henri Wallon, Psicologia e Educação-Pág. 36-Edicões
Loyola.

165
uma proposta interessante e desafiadora para as crianças. É preciso garantir espaço
para revisitar o que foi construído e possibilitar a interação entre crianças de idades
diferentes, ou seja, trabalhar com pares mais experientes, pois, segundo Vygotsky,
elas aprendem através da interação e de modelos. Propiciando momentos assim,
estaremos viabilizando a troca de saberes e de idéias, o trabalho em parceria e, aci-
ma de tudo, a observação das ações umas das outras, o que gera o aprendizado. É
muito interessante observar como os maiores adoram “ensinar” os menores... Eles
orientam como devem usar os objetos, “usam-nos” como personagens da própria
brincadeira, transformando-os em filhinhos, alunos, etc. É uma troca muito rica!

Sabemos que ‘BRINCAR É PRECISO!’ e, portanto, estamos dispostas a es-


tudar mais sobre os materiais de largo alcance e nos dedicarmos a proporcionar es-
paços diferenciados com certa frequência na rotina dos pequenos, para alimentar
a brincadeira no dia-a-dia e valorizar a criação destes.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


Klisys, Adriana. Revista Avisa Lá para Formação de professores de educação infantil e
séries iniciais do Ensino Fundamental, nº 17, Jan/2004.

Mahoney, Abigail Alvarenga; Laurinda Ramalho de (org.), Henri Wallon, Psicologia e Educação-
Edições Loyola. Local e data

Vygotsky, Leontiev., Luria. Linguagem, desenvolvimento e Aprendizagem. Cap.VII. Os


princípios da Brincadeira Pré-escolar. Ed. Ícone. Local e data

WAISKOP, Gisela. O Brinquedo como objeto cultural. Revista Pátio-Educação Infantil. Ano V,
Nº 15, Nov.2007 / Fev.2008.

166 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

37
Olhando, sentindo e conversando com os
espaços da escola64
Buscando uma perspectiva de sucesso para o desenvolvimento e apren-
dizagem do educando no contexto da educação infantil o espaço físico
torna-se um elemento indispensável a ser observado. A organização
deste espaço deve ser pensada tendo como principio oferecer um lugar
acolhedor e prazeroso para a criança, isto é, um lugar onde as crianças
possam brincar, criar e recriar suas brincadeiras sentindo-se assim esti-
muladas e independentes.52

O termo espaço tem diversas concepções, sendo que da sua definição e sentido
ocupam-se diversas áreas: filosofia, sociologia, arquitetura, pedagogia, etc. De
maneira geral o termo espaço é conceituado como uma “extensão indefinida,
meio sem limites que contém todas as extensões finitas, parte dessa extensão que
ocupa cada corpo”. Muitas vezes os adultos abstraem o espaço como um volume,
uma caixa que até se poderia encher. No entanto, é necessário compreendê-lo
enquanto um espaço onde a vida acontece e se desenvolve num conjunto com-
pleto. Para as crianças, o espaço se constitui no que os adultos chamam em espa-
ço equipado, com tudo o que o compõe: os móveis, as cores, odores, objetos, as
sensações, e principalmente o próprio corpo, o qual favorece ações e descobertas
diversas. (FORMEIRO, 1998)

O objetivo deste relato é apontar caminhos para os profissionais da área


refletirem e compreenderem que todo espaço remete a um significado, cercado
de elementos que podem ser ou não condicionantes de determinadas ações, rela-
ções. Assim, além de pensar na organização do espaço, ou seja, sua estruturação,
precisamos pensar em ressignificá-lo, ou seja, fazer com que este ganhe sentido
para todos que por ele circulam, vivem, estabelecem relações.

Como podemos avançar neste caminho? Primeiramente é necessário ob-


servar a escola de uma forma diferente, mais atenta, superando o olhar rápido,
simplista. Assim poderemos exercitar o ouvir, ver e sentir os espaços da esco-
la, sendo que esses não falam como nós, utilizando palavras; falam através dos
52. HORN, Maria das Graças de Souza. Sabores, crês, sons, aromas. A organização dos espaços da Educação
Infantil.2004, p.28

167
cheiros que ali circulam, falam com a forma que os objetos são neles inseridos,
dispostos, falam através da maneira como circulamos e nos relacionamos nele.

Pode-se dizer então que olhar diferentemente o espaço da escola é colocar


em prática uma leitura mais sensível e crítica, que veja os detalhes, as relações
e reações daqueles que por ele passam ou vivem. Mas onde e como podemos
declarar a intencionalidade desta ação?

É no Projeto Político Pedagógico da escola, o qual possui metas e objetivos


a serem alcançados, que revelamos e explicitamos nossas propostas e projetos.
Para viabilizar este caminho são necessárias algumas condições básicas, entre
elas destaca-se a organização dos diferentes espaços da escola, considerando-o
como fundamental para a concretização do projeto educativo e da concepção de
educação que se pretende desenvolver. Assim, o espaço é um dos elementos cur-
riculares propiciadores do desenvolvimento e aprendizado da criança, espera-se
então, que este se concretize enquanto Projeto Institucional da Escola, sendo
sempre pensado e repensado por todos da comunidade escolar.

Em qualquer que seja a abordagem de ensino, o espaço será um elemento


que evidenciará os objetivos pretendidos pela escola, ou seja, o espaço irá mostrar
a cara da proposta pedagógica. Numa escola tradicional será possível notar uma
organização gerenciada para a passividade das crianças, propiciando uma longa
espera da ordem do adulto diante do que pode e do que não pode ser feito, provo-
cando a contenção do movimento e da interação entre elas. Entrando numa escola
e observando a maneira como está organizada pode-se perceber qual á a proposta
pedagógica, como a professora planeja e encaminha as atividades, como conce-
bem a criança na sua forma de ser, sentir e pensar. (OLIVEIRA,1992).

“O espaço é luz, através da qual é possível vê-lo, conhecê-lo, explorá-lo, recordá-lo,


ou ao contrário, é possível impedir o indivíduo de todas essas vivências.”, (FORMOZI-
NHO, 1998). Portanto, o espaço pode convidar ou não as pessoas a participarem
dele: o desafio constante é manter esta participação e este olhar coletivo sobre o
espaço vivo e envolvente.

Assim, se defendemos a escola como lugar privilegiado da infância em nossa socie-


dade, precisamos repensar a construção, organização e ocupação dos edifícios escolares,
para que possamos permitir que seus usuários se apropriem e vivenciem o espaço e as
práticas ali desenvolvidas de modo a transformá-lo em um lugar cheio de sentido, que
desperte o gosto pelo saber e que permita ás crianças vivenciarem sua infância junta-
mente com seus pares.

168 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

É claro que a busca pela superação do modelo escolar atual não é simples, pois esta
é fruto de uma tradição secular e encontra-se enraizado dentro de cada um de nós. Serão
necessárias mudanças profundas, tanto na concepção de infância quanto no modelo de
sociedade atual, já que os traços burocráticos, hierárquicos e de relações de poder pró-
prios da escola; são também o reflexo das relações que se estabelecem nesta sociedade.
Contudo, é importante acreditarmos que tais mudanças podem partir de microestrutu-
ras como a escola.

Finalmente, para que a criança se aproprie da escola, transformando este tem-


po e espaço também em lugar da infância, é necessário que à ela seja permitido
deixar suas marcas, seja através de uma pintura na parede, um desenho no chão ou
participando da discussão, definição e organização destes espaços, enfim, dando-
-lhe oportunidades de opinar e discutir suas ideias e desejos.

Assim, uma escola construída e organizada com as crianças precisa respeitá-


-las enquanto sujeitos de direitos, garantindo no seu interior direitos básicos como:
direito à educação, ao brincar, à cultura, à saúde e à higiene, à uma boa alimenta-
ção, à segurança, ao contato com a natureza, à espaços amplos por onde possa se
movimentar, ao desenvolvimento da criatividade e da imaginação, ao respeito à in-
dividualidade e desenvolvimento da sua identidade, enfim, o direito à uma infância
cheia de sentidos.

Na EMEB Ester Catarine Lozano, desde 2004 estamos nos desafiando a pen-
sar em como construir juntos, um ambiente mais seguro, saudável e que eduque
a todos que por ali passam, tendo como princípio que para nos sentirmos bem
precisamos estar num local que seja pensado em diferentes formas de cuidados,
proporcionando maneiras agradáveis de sentir, viver, interagir, aprender.

Para isto, a ação realizada foi a construção do Projeto Institucional “Ambiente


Seguro e Saudável na Escola: Como podemos construí-lo?”, este, desde 2004, vem
compondo o Projeto Político Pedagógico da Escola.

Buscamos sempre que necessário rever este projeto, realizando diagnósticos


sobre como era e como está o espaço hoje, partindo de fotos, desenhos e outros
registros escritos. Todos participam deste momento, funcionários, professores,
alunos e pais, sendo que as observações, ideias e sugestões colhidas são dialogadas
nas Reuniões do Conselho de Escola e Associação de Pais e Mestres, bem como,
expostas em murais da escola.

Algo fundamental a ser destacado é o papel da Gestão Escolar, as ações desses

169
refletem no funcionamento de cada um dos espaços de aprendizagem da escola.
Costumamos dizer que a escola tem a cara da sua Gestão, e isto é real, pois os
espaços são ou não são materializados por decisões que estes tomam diariamente.

Segundo Terezinha Rios (2011):

O diretor nem sempre é visto ou está fisicamente presente, mas seu


trabalho é percebido por toda a parte, conferindo à escola uma feição
especial. Quanto mais for uma presença firme, mais a escola terá possi-
bilidade de fazer um trabalho de boa qualidade.

Portanto, nós gestores precisamos estar conscientes do nosso papel, sendo


que não basta solicitar construções de novos espaços ou reformar os antigos, pre-
cisamos sim ressignificar sempre os espaços já existentes, mantê-los vivos, tendo
para isto o envolvimento da comunidade escolar: Como é o ambiente da nossa
escola? Como poderia ficar melhor? Como podemos construir e manter um am-
biente esteticamente agradável, bonito e educativo? O que poderia melhorar nos
diferentes espaços da escola: recepção, corredor, banheiros, refeitório e parque?

Abordarei adiante nossos passos nesta viajem desde 2004 até 2011, no que se
refere ao nosso pensar, fazer e ressignificar os espaços desta escola.

ÁREA EXTERNA: MUROS, PORTÕES E A NATUREZA


DA ESCOLA
Como estão as áreas externas de sua escola?
Antes de pensar nos projetos, que tal passear pela escola para observar
como estão as suas áreas externas? Observe as condições dessas áreas,
observe se tem lixo ou entulho acumulado ou se estão tomadas pelo mato.
É possível montar um jardim na escola? E uma horta? Convide os professo-
res e funcionários para fazer essa avaliação com você. Ouça a opinião de
pais e alunos. Assim, vocês terão mais de uma opinião sobre o assunto.53

Respeitar o público desde o portão mostra o tipo de relação que a equipe esta-
belece com a comunidade. Assim, buscamos na entrada da nossa escola favorecer um
acolhimento inicial com um toldo que protege da chuva e do sol para aqueles que nos
visitam ou participam do nosso cotidiano. Outra conquista também foi a instalação de
um porteiro eletrônico, temos como meta a instalação de câmera que favorecerá maior
segurança, visualizando os que necessitam entrar na Unidade Escolar.

Outra conquista foi a rampa de acesso aos deficientes, favorecendo a locomoção


53 Livro do Diretor. Escolas espaços e Pessoas – Ideias práticas para aprimorar a escola – CEDAC, p.90.

170 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

dos que dela necessitam.

O verde é majestoso, encantador e se impõe no olhar não apenas dos que ultrapas-
sam os portões, mas dos que pela Avenida passam, há uma transparência para aqueles
que querem olhar. Procuramos sempre renovar e cuidar do nosso jardim, com dificulda-
des devido ao tamanho da área verde que temos. Mas não é impossível, solicitamos aju-
da dos pais para complementar o serviço oferecido pela Prefeitura, compramos mudas
de plantas, enfeite para jardim e tudo vai ficando com outro aspecto, bonito, agradável de
olhar e prático de cuidar.

Pretendemos também buscar parceria com escultores da região para expormos


na entrada e jardim da escola esculturas diversas em madeira, garrafas pets. Buscaremos
com isto além de valorizar o artista, construir um espaço de apreciação e conhecimento
dos pais e alunos que diariamente circulam pela escola.

A fachada da escola revela a identidade da mesma, os muros e as placas


são elementos visuais que comunicam a identidade da Instituição.54

No momento nosso muro está sem marcas, com pouca identidade, mas em outra
época ele registrava um trabalho feito com as crianças e um grafiteiro sobre o Brincar.
Era lindo!!! Mas, em outro momento que a escola foi pintada, num piscar de olhos e sem
a orientação adequada os pintores, passaram tinta por cima do que estava registrado.

Nossa meta agora é resgatar esses trabalhos que valorizam a produção de nossos
alunos nos muros externos e internos da escola, de forma que nossa história possa ser
também contada neste suporte, falando sobre o que estudamos, do que gostamos e do
que acreditamos precisar melhorar.

Outra conquista, foi a sinalização de trânsito na rua da escola, com placas e

faixas de pedestres, para uma organização com maior segurança dos alunos, familiares e
comunidade em geral. Para alcançarmos esta conquista foi necessária uma solicitação ao
Setor responsável (DEMUTRAN), o qual se dispôs para o que fosse necessário.

O nosso portão vem servindo também como mural, mas não estamos muito satis-
feitos com ele, pois os cartazes e informes ficam amarrados com barbante, as vezes mo-
lham. Precisamos ter outras ideias em como melhor aproveitar este espaço, pensando
nas questões estéticas para uma boa visualização de todos.

Temos também um mural no corredor externo, por onde todos passam, sen-
do um canal para comunicação, tendo os informes a vista para os pais, com avisos,
54. LOPES, Noemia. Diretor Presente em toda escola - Revista Nova Escola Gestão Escolar- out/nov ,2011.

171
convites, dias de reuniões, prestações de contas das verbas recebidas pela escola.

A identificação da escola numa fachada ou num totem é muito importante


para que a comunidade e visitantes se localizem e conheçam a escola pela sua iden-
tidade, seu nome. Neste sentido precisamos pensar em mudanças, pois nossa iden-
tificação fica em um portão não utilizado pela maioria das pessoas.

A horta cedeu espaço para sala de informática em 2009. Mas, esta é viva em
nossa memória e em nosso Projeto Institucional: temos planos de reativá-la, até
por que temos muitas histórias de trabalho com a comunidade; vários protagonis-
tas que por ela passaram deixaram marcas, saberes e conhecimentos sobre como
construir e manter uma horta. Além disto, o aprendizado pelos alunos sempre é
grandioso, além de plantar, cuidar e colher favorecia também o foco na alimenta-
ção saudável e reaproveitamento dos alimentos.

RECEPÇÃO
Como podemos receber as pessoas que entram em nosso espaço? O oferece-
mos para que já comecem a conhecer um pouco da nossa identidade? Conhe-
cer um pouco do que temos, do que somos, do que valorizamos?

Primeiramente é importante que as pessoas tenham um espaço de recepção,


para que possam ser melhores recebidas, acolhidas.

Nosso espaço de recepção vem sendo planejado de forma acolhedora e fun-


cional. Temos um mural com informações básicas sobre a escola, fotos da equipe e
horário de trabalho da mesma, objetivos e metas da escola.

Há também um cantinho da leitura com jornais, revistas, gibis e livros in-


fantis para que os visitantes não fiquem ociosos, caso tenham que aguardar. Há
também quadros de artistas que dividem espaço da parede com um mural para
produções em destaque dos alunos, semanalmente são expostos desenhos ou
curiosidades dos projetos por eles desenvolvidos.

Instalamos um orelhão público, pois observamos a necessidade de comuni-


cação em algumas situações dos pais e funcionários da escola.

Neste espaço de recepção também é oportuno ser apresentada informações


sobre a história da escola e ano de construção, oferecer materiais para leitura en-
quanto aguardam o atendimento, pensando tanto em gêneros para adultos, como
também para as crianças.
172 - RELATOS DA PRÁTICA
RELATOS DA PRÁTICA

Corredores que favorecem encontros


Quais encontros podemos propiciar em nossos corredores? Quem irá se en-
contrar? Com o que ou com quem iremos nos encontrar?

Olhe o corredor da sua escola. Algumas tem corredores bastante gene-


rosos; outras, nem tanto. Repare se , nos horários de ``pico``, em que
os alunos saem das salas de aula, ``sobra`` algum espaço neles. Ob-
serve se os alunos portadores de deficiência conseguem circular com
autonomia pelos corredores, se eles são amplos o suficiente e se estão
sinalizados de forma adequada para os alunos com deficiência visual.
Note, por exemplo, se o local existem vasos ou lixeiras que atrapalham
a circulação. Quando os corredores são muito apertados, não é acon-
selhável colocar vasos e lixeiras no piso. Pode ficar muito bonito, mas,
com certeza, vão causar acidentes e prejudicarão o tráfego de pesso-
as. E, provavelmente, serão danificados, não por atos de vandalismos,
mas por estarem atrapalhando o uso do corredor.55

Considero o corredor da nossa escola um espaço vivo, como se fosse um ál-


bum que vai contando a cada dia, a cada semana as visitas feitas pelos alunos em
pesquisas sobre os projetos, as explorações de diferentes meios, suportes e instru-
mentos em Arte. Mas houve época que o corredor era um tanto que ``vazio``,
quase nada existia, nada contava. Para mudar esta cara combinamos estabelecer
um cronograma para expor as produções contribuindo para que o mesmo fosse
composto semanalmente com nossos fazeres. Deu certo! Atualmente tomaram
tanto gosto por expor neste espaço que solicitaram até um varal para cada sala,
transgredindo o cronograma semanal pela vontade de expor em outros dias.

Fomos aprendendo em como expor, pensando em não danificar as produções


dos alunos com fitas, construir legendas com a proposta e quem produziu. Apren-
demos também a apreciar as produções de outras salas. Não apenas os alunos, mas
também os pais, já fazem essas apreciações autonomamente.

Este e outros espaços para expor as produções dos alunos é um ato de valori-
zação dessas construções, não pretendemos na escola apenas reproduzir o que fora
dela já convivem, ou seja, desenhos da mídia. Pretendemos sim partir de uma va-
lorização das produções pessoais, dividindo espaços com obras de arte de artistas
diversos, principalmente da nossa região.

As portas das salas de aula também precisam ser identificadas com nome das
turmas, e do professor, facilitando a comunicação interna.
55 Livro do Diretor. Escolas espaços e Pessoas – Idéias práticas para aprimorar a escola – CEDAC, p.34.

173
No momento nosso objetivo é alimentar o olhar do grupo com outras for-
mas de expor, indo além da parede, fazendo uso de outras formas para expor,
móbiles, instalações, marcações e sinalizações no chão. Para planejarmos e re-
alizarmos estas possibilidades pretendemos realizar visitações culturais com os
funcionários, em experiências anteriores essas ampliaram nosso olhar diante do
que pretendíamos realizar.

O espaço do corredor também é composto por sons das crianças, dos adul-
tos, da sirene/sinal dos intervalos para lanches; entrada e saída dos alunos. Pen-
samos em melhor harmonizá-lo com músicas ambientes, trazendo sons variados
para o ambiente: pássaros cantando; cachoeira, chuva, músicas infantis e popu-
lares de qualidade.

Assim, a vida do nosso corredor poderá favorecer diferentes encontros para


aqueles que por ele passarem.

Sala dos professores


Tal como a sala de aula a sala dos professores também é um lugar de convívio
e identidade. Como quem parece a sala dos professores da escola? Com que é
composta? Quem a forma ou transforma?

Pensando por este ângulo não importa se a sala é grande, pequena, não im-
porta se os móveis são novos em folha, se o mural é de cortiça, imantado ou apenas
um varal. Hoje entendemos que o que realmente importa é que a sala seja um es-
paço acolhedor, onde os professores tenham intimidade. Um espaço que ao longo
do ano vai sendo composto, transformado com a participação de todos.

Assim, podemos pensar que tal como a salas de aula, a sala dos professores
pode ou não explicitar o processo de aprendizagem que estamos vivendo, traba-
lhos produzidos pelos professores, pesquisas, notícias. É uma sala na qual cada
professor que passa por ela se identifica com o que se tem para ver, ler, aprender...

Muito semelhante a sala de aula mesmo, um espaço utilizado, além de limpo,


agradável, iluminado e bonito, sendo principalmente educativo.

Nossa sala dos professores foi sendo modificada com o passar do tempo, via-
bilizamos melhor os espaços tirando as mesas dos computadores e colocando ban-
cadas de granito para os mesmos, além de mais bonito ficou mais funcional. Há
computadores funcionando e impressoras para uso profissional.

174 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Os murais não podem faltar! Recentemente os nossos foram organizados,


pois era um amontoado de informações, as quais confundia o leitor. Hoje ele é
organizado por temáticas: Informes; Cronogramas, calendários, fotos com nossos
momentos, calendário de funcionários aniversariantes. No entanto, ele precisa de
constante monitoramento para que a organização persista.

Ter cortina é algo fundamental para proteção contra a claridade, mas é im-
portante que essas estejam conservadas, pois cortinas faltando parte, desbotadas,
sujas, não favorecem um ambiente esteticamente agradável.

Um filtro com água normal e gelada é deixado à vontade para uso dos profes-
sores e visitantes que necessitam.

Cestas com revistas destinadas ao professor ou aos alunos são dispostas. Além
disto, sempre que chega um novo exemplar é exposto na mesa para conhecimento.

Temos como objetivo organizar um mural para expor os novos títulos de li-
vros adquiridos para os professores, bem como construir uma estante para expor
de forma mais visível os jornais e revistas. Muitos passos a dar pela frente!

BIBLIOTECA
Você gosta de viajar?

Para aqueles que gostam, o espaço para viagens em nossa escola pode ser en-
contrado no acervo de livros que estão a disposição dos alunos, professores e re-
centemente aos pais.

Temos um grande acervo de livros infantis e de pesquisa em diferentes Áreas


e os destinados aos professores e funcionários, pais, os quais estão catalogados para
uma melhor organização e controle. Não temos um espaço destinado unicamente à
biblioteca, mas nem por isto a leitura deixa de ser viva e vivida por todos da escola.

Viabilizamos o contato dos alunos e funcionários com os livros através do can-


tinho da leitura organizado em cada sala de aula e pátio da escola; do baú literário que
circula pelas salas semanalmente com diversos gêneros e também com a biblioteca
volante, através da qual os alunos escolhem livros que gostariam de ler em casa.

Pretendemos organizar na sala de informática estantes abertas para expor


pelo menos parte de nosso acervo, para que os mesmos fiquem mais ao acesso e
visualização dos alunos. Além disto, um espaço para colocarmos o acervo em foco,
podendo ser uma mesa com as obras recém chegadas, uma bibliografia de um de-
175
terminado autor ou seleção especial sobre um tema específico.

Temos vivenciado já há alguns anos um espaço de leitura com os funcioná-


rios, no qual paramos 1hora, uma vez ao mês, para leitura com todos. Nesses mo-
mentos as vezes levo um determinado gênero, outras vezes o funcionário se dispõe
em levar e ler para o grupo.

A troca literária ocorre a cada dois meses, no Conselho de Classe. Neste ocu-
pamos 1hora para trocarmos experiências leitoras, realizarmos indicações literá-
rias, etc.. Vem dando muito certo, pois os funcionários tomaram mais gosto pela
leitura e é possível observá-los no cotidiano lendo pelos espaços da escola. A no-
vidade neste ano foi inserir pais representantes no Conselho de Classe, os quais
também participaram como leitores nestas rodas.

Refeitório e pátio
A palavra ``refeição`` - Re- feição - não nos remete ao pensamento
de que depois de comemos, ficamos com uma nova... feição? Diga-
mos... bem mais felizes? E que um refeitório é um lugar onde muitas
pessoas comem, re-fazem as suas feições, e ficam bem dispostas e
alegres? Re-feitas?56

Nosso refeitório nem sempre foi como é hoje, parece que a vida veio morar neste
local. Antes ele era cinzento, sem nada para ver além de paredes e mesas com ban-
cos compridos.

O Self Service existe na escola antes de 2004, mas deste ano em diante a
equipe foi dando vida a existência deste. Incorporamos com auxílio do Setor de
Alimentação Escolar pratos e xícaras de vidro, garfos, facas e guardanapo, além
de fazer funcionar periodicamente o balcão térmico, o qual antes não era tão uti-
lizado por termos apenas uma merendeira.

Não como num passe de mágica, mas com muito trabalho, este espaço foi
sendo composto com nossa cara, nosso jeito de estar e se relacionar com o local.
Inicialmente tivemos uma reforma do piso, forro e pintura das paredes; em seguida
pensamos numa nova disposição das mesas, para que favorecesse melhor circula-
ção dos alunos no sistema self service (balcão térmico).
As cortinas, os quadros, o mural foi vestindo o espaço, o qual hoje considero
56. Livro do Diretor. Escolas espaços e Pessoas – Ideias práticas para aprimorar a escola – CEDAC, p.69

176 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

estar quase pronto para uma festa de acolhimento, digo quase, pois nada é acabado
por completo quando se trata de compor espaços ele se renova ou não se renova
com o passar das pessoas por ele.

Nosso refeitório também é um espaço do recreio dirigido, assim há cartazes


com combinados dos monitores com os alunos; há painéis dos alunos aniversa-
riantes do mês, rotina das brincadeiras realizadas ao término a alimentação.

Há também um sofá, onde não só as crianças, mas também funcionários e


pais gostam muito de ficar; estamos reorganizando este espaço para que o canti-
nho da leitura fique mais próximo deste espaço, colocando um tapete, algo que
antes tínhamos e tiramos com o passar do tempo.

O Cantinho da higiene foi montado com espelho, papel higiênico e sabonete


líquido para que os alunos possam recorrer durante as refeições e as brincadeiras.

Nosso pátio recebeu recentemente mais um personagem da nossa história,


um casal de periquitos; um deles veio voando e por aqui ficou. O outro foi doação
de uma funcionária. Resumindo, temos um casal, que para nossa felicidade já está
até botando ovinhos.

Os peixes também habitam este espaço num pequeno aquário, ele é o mimo
das crianças e das visitas, seres vivos que encantam e dividem o espaço da escola
conosco.

Como os corredores, o pátio da nossa escola também é um espaço de


circulação, assim sempre estamos expondo fotos com legendas dos even-
tos realizados pela escola: festas; passeios; oficinas de artesanato; palestras;
reuniões,etc..

BANHEIROS QUE EDUCAM


Que tal ouvir a avaliação dos alunos sobre as condições dos banhei-
ros? Junto com os professores e outros funcionários, organize uma
enquete, que poderá ser feita por escrito ou por desenhos, Faça um
sorteio para selecionar dois alunos de cada classe (de preferência
uma menina e um menino) e tenha uma amostra do que a garotada
está pensando, quais as suas críticas e o que mudariam.57

Este é um dos espaços que precisamos avançar com nossa forma de olhar e fazer o
ressignificar, pois até então não demos a completa atenção ao mesmo.
57. Livro do Diretor. Escolas espaços e Pessoas – Ideias práticas para aprimorar a escola – CEDAC, p.61

177
Sabemos o que fazer e como fazer, assim, deixaremos relatado aqui quais são
as mudanças pretendidas:

• Instalar pequenos vasos de flores, folhagens;


• Portas inferiores para resgate de crianças presas (já realizado);
• Colocação de suporte para papel higiênico (já realizado);
• Instalação de cestos de lixo com pedal e tampa;
• Instalação de espelhos nos lavatórios (já realizado);
• Realização de decoração na moldura dos espelhos;
• Manter os materiais de limpeza fora do acesso dos alunos (já realizado);
• Instalação de saboneteiras e suporte para papel da higienização das mãos;
• Altura da pia e dos espelhos acessíveis as crianças (já realizado);
• Vasos sanitários adequados a Educação Infantil;
• Banheiro adequado ao acesso de deficiente físico;
• Nas paredes e ou portas colocar fotos ou imagens para leitura;
• Trabalhar nos azulejos com desenhos realizados pelos alunos.

PARQUE
Eis aqui um dos espaços que mais nos encanta. O que há nele que causa tanta excelência,
exuberância. Venha viver momentos nele e a resposta será por você encontrada.

Eis aqui mais um espaço para superação do que é, ou melhor, do que está.
Nosso parque é um espaço que teve algumas modificações, entre elas a instala-
ção de bancos em madeira e outros azulejados, uma torneira para possibilidades
de brincadeiras com água no tanque de areia, amarelinhas pintadas no chão pelos
pais, árvores que foram plantadas pelos alunos e professores, já podemos ver flores
de ipê amarelo aparecendo naquelas que a muda por nós foi vista e plantada, além
de pinheiros, cezarinas e Murtas. Nossa história também está nas plantas existen-
tes no espaço.

Porém, nosso fazer é bem inicial, precisamos buscar superar o que está apre-
sentado. Transgredir acredito ser a palavra desejada, criando novas possibilidades
de interação dos alunos com o corpo e com os objetos inseridos no espaço, indo
além dos comuns escorregadores, trepa-trepa, gira-gira. Criar situações mais inu-
sitadas, nas quais os próprios alunos sejam convidados a realizar suas construções
lúdicas, pesquisando e experimentando sucatas com segurança, realizando uma
arquitetura e engenharia infantil com monitoramento.

178 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

Assim, a utilização de materiais não estruturados para criação dos alunos po-
derá vir compor este espaço, tal como palete, carretel, pneus, conduite, cones, os
quais irão viabilizar outras interações e mediações que transgridem aquelas já tão
bem por nós conhecidas.

Para isto, a brincadeira para nós gestores precisará voltar a ser motivo de for-
mação, para que juntos possamos construir novas competências, tendo outros
olhos para o brincar no parque, sabendo intervir nos seus múltiplos aspectos, in-
corporando práticas educativas que considerem o saber das crianças e sua liber-
dade de criação sem contudo, esquecer de alimentar o fazer delas com novas in-
formações, conhecimentos, possibilidades, indo além dos brinquedos industriais
postos por alguém naquele espaço.

Estamos nos organizando para construção de espaços com lousas em azulejos


para que os alunos possam desenhar, expressar suas criações, deixando marcas e
seus diferentes estilos. Este é mais um desafio que já dissemos sim em vencer!

Enfim, a organização do espaço físico é determinante no desenvolvimento e


aprendizado de todo ser humano.

Os critérios de organização apontados trazem uma reflexão sobre o como é ne-


cessário pensar o espaço de uma instituição escolar para todas as modalidades de
ensino, focando um olhar criterioso, que não prive as crianças, jovens de seus direitos
primordiais, sendo acolhidos num espaço seguro, aconchegante, adequado a quan-
tidade de crianças, equipado com materiais e brinquedos propiciadores de uma ex-
ploração que gere aprendizado, e principalmente convivendo com adultos que visem
cotidianamente a forma de pensar, agir, se desenvolver e de aprender das crianças.

Assim, a organização dos espaços é fundamental para o desenvolvimento in-


tegral da criança, desenvolvendo suas potencialidades e propondo novas habilida-
des sejam elas: motoras, cognitivas ou afetivas. A criança que vive em um ambiente
construído para ela e por ela vivencia emoções que a farão expressar sua maneira
de pensar, bem como a maneira como vivem e sua relação com o mundo.

O papel do adulto no espaço é o de um parceiro mais experiente que promo-


ve as interações, que planeja e organiza atividades com o objetivo de através das
relações no espaço oferece a busca do desenvolvimento integral de todas as poten-
cialidades da criança. O educador deve ter a sua proposta voltada para o bem estar
do educando, buscando sempre melhorar a sua prática elaborando sempre novas
alternativas de construir o conhecimento de um grupo como um todo, facilitando
as interações, promovendo e construindo espaços adequados para as crianças.

179
Muitas são as propostas apresentadas por vários autores, mas que só serão
praticadas o dia em que o gestor, o educador e funcionários da escola tomarem
consciência da importância de oferecer espaços ricos de informações, interações
e sensações na vida das crianças, passando a reconhecer a importância das trocas
que ocorrem nos espaços oferecidos como fator essencial em nossa vida.

R f r nci s BIBLIOGR FIC s


ABRAMOVICH, F. Quem educa quem? São Paulo: Summus, 1985. Abramowicz e Wayskop (1995)
(pág 131).

ASSIS, R. O trabalho pedagógico. In Kramer, S. (org). Com a pré escola nas mãos. São Paulo.
Ática, 1998.

BRASIL, Referencial Curricular Para a Educação Infantil. Vol. 1. Brasília: MEC/SEI, 1998, p.28.

CARVALHO, M. I. C. de; RUBIANO, M. R. B. (1996) Organização do espaço em instituições


escolares.

FORMOZINHO, J. O. Contextualização do modelo curricular HIGH/ SCOPE no âmbito do


“Projeto Infância”. In Zabalza, M. A. (org). Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre:
Artmed, 199

FORNEIRO, L.I. A organização dos Espaços na Educação Infantil, In Zabalza, M. A (org).


Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 1998. pág. 231, 236, 237.

HORN, Maria da Graça de Souza. Sabores, cores, sons, aromas. A organização dos espaços na
educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004.

Livro do Diretor. Escolas espaços e Pessoas.- Idéias práticas para aprimorar a escola-
CEDAC,2002

LOPES, Noemia. Diretor Presente em toda a Escola. Revista Nova Escola Gestão Escolar-
out/Nov/2011.

OLIVEIRA, de M. O. et alli, Creches: Crianças faz de conta & Cia. Petrópolis, Rio de Janeiro:
Vozes,1992.

Revista Avisa lá. Construções Lúdicas. Ano V – no 17 - janeiro/2004

RIOS, Terezinha. O espaço físico da escola é um espaço pedagógico.http://revistaescola.


abril.com.br/gestao-escolar/diretor/espaço-fisico-escola-pedagogico

180 - RELATOS DA PRÁTICA


RELATOS DA PRÁTICA

181
182 - RELATOS DA PRÁTICA

Você também pode gostar