Burille
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Mestranda em História pela UFPR. Professora/PDE-2008 - História, da Rede Pública Estadual do
Paraná/Cascavel.
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Professor-Doutor Orientador do Mestrado em História, da UFPR.
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Para além dessa abordagem, dar-se-á destaque ao “forjar identitário” de
aspiração homogeneadora, que se percebe no interior dos dois momentos em relação ao
movimento de criação do Estado do Iguaçu, que demonstra que um grupo de políticos
se colocou no papel de liderar no convencimento da população de toda uma extensa
região, que englobava parte dos dois Estados, Paraná e Santa Catarina, com o objetivo
de criar um novo núcleo federativo. Para isso, organizaram a candidatura de um
representante para defender sua causa no Congresso Nacional, para deputado federal,
em 1990, o líder Edi Siliprandi, e assim conseguir colocar em prática seus ideais e
realizar o objetivo almejado.
O movimento separatista surgiu no início da década de 1960 e, em 21 de abril
de 1968, foi criada a Sociedade Para o Desenvolvimento e Emancipação do Iguaçu
(SODEI), em Pato Branco, Sudoeste do Paraná. A entidade nasce com o objetivo claro
de lutar por uma nova unidade federativa no sul do país, mesmo que isso levasse muito
tempo.
Em Francisco Beltrão, cidade também da região Sudoeste, os políticos e
população se posicionaram contra a criação do Estado do Iguaçu desde o início. Alguns
líderes separatistas afirmavam que era porque a cidade não foi incluída como capital e
porque a sua população tinha uma grande rivalidade com Pato Branco e isso impedia
que eles apoiassem o movimento.
As autoridades de Francisco Beltrão, inclusive, lideraram a criação da
Associação dos Municípios dos Sudoeste do Paraná (AMSOP), em 1968, como reação
ao movimento separatista.
A AMSOP desempenhou papel importante na unidade do Sudoeste, em clara
rivalidade com os separatistas. Os prefeitos da região se uniram contra o movimento
liderado por Edi Siliprandi.
Por outro lado, o movimento separatista acabou interrompido pela instituição do
Ato Institucional nº. 05, de 1968, quando o Governo Militar proibiu reuniões e
manifestações populares.
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origem, o Rio Grande do Sul, desenvolvendo aqui uma cultura diferente das demais
regiões do Estado. Porque demarcar a região seria fundamental para os imigrantes, uma
vez que sua nova espacialidade marca a sua nova trajetória de vida.
Até porque a região é compreendida como um agrupamento de Estados ou
Nação, próximos pelas suas características econômicas, políticas ou culturais
e geográficas. De maneira geral, a região é uma divisão territorial, um espaço
de civilização, um espaço vivido (ENCICLOPÉDIA EINAUDI, VOL. 08,
1986).
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meios de comunicação, sendo o principal deles o rádio, para alertar todos os brasileiros
e convocá-los a participar efetivamente a fim de evitar isso.
As necessidades econômicas daquele momento, aliados à idéia de um futuro
melhor, proporcionaram o engajamento das pessoas que acreditaram em um Brasil
novo, mesmo em um regime autoritário, o Estado Novo.
Entretanto, alguns autores afirmam que a criação do TFI por Getúlio Vargas foi
para atender interesses dos empresários e das colonizadoras gaúchas, uma vez que no
Rio Grande do Sul as terras já estavam ocupadas até o seu limite. Para isso, era preciso
tirar o controle do Estado da parte oeste e sudoeste do Paraná. O excedente populacional
gaúcho deveria ser deslocado para ocupar essas regiões que encontravam-se
despovoadas ainda.
A presença brasileira no oeste e sudoeste paranaense era tímida até a década de
1920, o que impedia o efetivo povoamento da região. O domínio argentino era evidente,
através da produção do mate e da extração da madeira e trazendo produtos para os
moradores locais consumirem. Segundo Wachowicz, a população do sudoeste do
Paraná na primeira década do século XX era em torno de três mil habitantes. Em 1920,
essa população havia dobrado, entre outros motivos, por causa da chegada de muitos
foragidos da justiça de todas as regiões sul, de posseiros refugiados da Revolução
Federalista, do Contestado, além de argentinos e paraguaios que adentravam a região
em busca de erva mate.(WACHOWICZ, 1985, 68-69)
Porém, essa região era habitada pelos nativos e caboclos antes da década de
1940, mas de forma extensiva, com uma economia de subsistência, predominando a
exploração de erva-mate e a criação de suínos. Já a partir de 1940, se deu de forma
intensiva, com a ocupação da região sendo substituída pelos imigrantes gaúchos e
catarinenses, descendentes de europeus.
A colonização no Sul do Brasil, organizada, planejada, subsidiada e dirigida
pelo governo central, das provincias ou dos estados e dos municipios, estabeleceu os
europeus, os colonos em pequenas propriedades rurais, que foram sendo cultivadas e
exploradas, com mão-de-obra familiar, de forma diversificada.
As pessoas que vieram para essa região e receberam terras gratuitas da
CANGO, a maioria era originária do Rio Grande do Sul e Santa Catarina e estavam
sendo expulsas de lá em função do excesso populacional. Isso por que:
A forte pressão demográfica dos ítalo-gaúchos promoveu o avanço de um processo de ocupação
territorial que se estendeu por todo o norte do estado do Rio Grande do Sul, chegando a meados
do século XX, ao sul e oeste catarinense, ao Paraná e, até mesmo, ultrapassando as fronteiras
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nacionais (VANINI, 2003, p. 106).
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A Revolta dos Posseiros de 1957 foi um movimento vitorioso dos camponeses
posseiros. E isso só foi possível porque as camadas mais pobres, os posseiros, se
uniram contra as atrocidades dos jagunços contratados pelas colonizadoras e as de
cima, os políticos e os capitalistas, se dividiram. Além disso, os comerciantes e os
políticos locais, com seus interesses específicos, e que dependiam dos posseiros para
sobreviver, se aliaram a eles contra a espoliação do grande capital, representado pelas
companhias.
A Revolta dos Posseiros em 1957, de acordo com Bonamigo:
Constituiu-se numa luta para permanecer e viver na terra, assim como muitas
outras na história da formação social brasileira... E, ao contrário da
compreensão que identifica o campo como um lugar de atraso, permeado por
crendices e ilusões, o espaço do campo tem demonstrado, ao longo dos
tempos, ser um espaço de luta, de conquistas, de constituição de movimento
sociais potencializadores de perspectivas de vida e de trabalho.
(BONAMIGO, 2007, 159)
Porém, da vitória até a legalização das terras do Sudoeste, levaram ainda alguns
anos de incertezas, percorreu-se um longo caminho nas negociações com o governo
federal, só resolvido em 1962, quando foi criado o GETSOP (Grupo Executivo para as
Terras do Sudoeste do Paraná), para legalizar aquelas terras.
É nesse contexto da demora em solucionar rapidamente a questão das terras do
Sudoeste de forma definitiva que surgiu entre algumas lideranças dessa região a ideia
de recuperar o Território do Iguaçu, mas agora em forma de Estado.
Mas as idéias separatistas estavam sendo discutidas, predominantemente na
área urbana pelos políticos e comerciantes locais, sendo excluída dessa discussão a
maioria da população, que era rural.
De acordo com os líderes do movimento separatista, a área proposta para o
Estado do Iguaçu continuava basicamente a mesma do antigo Território Federal do
Iguaçu - criado no ano de 1943, pelo presidente Getúlio Vargas e que teve vida curta,
pois foi extinto em 1946. Com isso, eles pretendiam destacar outras questões históricas
da região que a tornava diferente das outras do Estado, quais sejam, a Questão de
Palmas (ou Missões), a Guerra do Contestado e também a Revolta dos Posseiros.
Assim, o novo Estado teria o “poder simbólico” de resolver todos os problemas sócio-
econômicos da região (ORTIZ, 2005).
Na busca de uma justificativa para a necessidade de os sujeitos construírem sua
história e se identificarem com ela, transportamos o tema para a realidade local, para
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refletir sobre a necessidade de uma identidade específica para o Sudoeste do Paraná e os
interesses por trás desse movimento.
A busca identitária para o Paraná começou a existir nos anos de 1920, quando
surgiu o movimento “paranista”, liderado por artistas, escritores e historiadores como
Romário Martins, em torno da construção de uma identidade específica, na divulgação
sua história e “inventando” tradições, acreditando no progresso, no desenvolvimento
social e na modernidade. Porém a idéia paranista ficou mais centralizada na região
próxima e na capital do Estado (BALHS, 2007).
O processo identitário “paranista” se intensificou em 1950, com as
transformações, a aceleração do processo imigratório no interior do Estado, de ocupação
de várias regiões por imigrantes de diversos lugares do Estado e de outros. No Sudoeste
do Estado, esse sentimento toma grandes proporções com a Revolta dos Posseiros do
Sudoeste, onde toda uma população revoltada expulsou os representantes do grande
capital, que desejavam tomar suas terras, através das empresas colonizadoras
particulares e na atuação violenta dos seus jagunços.
O movimento separatista só retornou com a democracia, em meados dos anos
1980 e se intensificou no início dos anos de 1990, com outros personagens e outros
objetivos, porém com o mesmo líder principal, Edi Siliprandi. Os movimentos
representaram dois momentos que têm ligação entre si, na medida em que tinham como
objetivo primordial a criação de um novo Estado no Sul – o Estado do Iguaçu. Porém,
os dois movimentos se diferem, pois ocorreram em momentos políticos diferentes. Na
década de 1990, a situação econômica, social e política era outra, completamente
diferente do final da década de 1960.
Esse movimento separatista agregou interesses políticos de inúmeros grupos,
mas não chegou à população de imediato e nem agradou a maioria dela. Apesar da
insatisfação popular em relação ao abandono da região, tanto pelo governo federal
quanto estadual, as pesquisas demonstram que a população não apoiou de imediato e
totalmente o projeto, mesmo com grande presença de caravanas da região em Brasília,
levadas pelos líderes do movimento Pró-Estado do Iguaçu, na época da votação da Lei
141/91, de autoria do deputado federal paranaense Edi Siliprandi.
Porque estavam no lado oposto dos governantes e sem receber a devida atenção
por parte dessas autoridades, seu grupo político, com grandes interesses econômicos na
região, já que eram proprietários de grandes áreas de terras e grandes comerciantes,
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resolveram incentivar o sentimento de uma identidade específica da região, através do
movimento separatista, para conseguir realizar seus objetivos, conseguindo importantes
cargos nas esferas estaduais e municipais.
Houve uma evidente organização do grupo separatista, composto por políticos
da região sudoeste e oeste paranaense. O gaúcho agora radicado em Cascavel, oeste do
Paraná, Edi Siliprandi foi eleito deputado federal em 1989 e, em 28 de novembro de
1991, deu entrada na Câmara Federal o projeto que propunha a realização de plebiscito
para a criação do Estado do Iguaçu. Até a sua votação, os políticos aliados da região
fizeram campanha em todo o Paraná para conseguir apoio. Mas o projeto foi rejeitado
por 117 votos contra, 90 a favor e 13 abstenções, em 31 de março de 1993, depois de ter
sido retirado da pauta no ano anterior, pelo próprio deputado Edi Siliprandi. Com essa
derrota, os envolvidos na questão da criação do novo estado acreditavam que muitos
deputados que votaram “não” ao PDL-141/91, o fizeram apenas por obrigação. Mas
depois de anos de luta tidas como inglórias, não conseguindo convencer com sua
proposta separatista, o movimento arrefeceu.
A imprensa regional teve papel importante e se dividiu em relação ao tema. Na
Gazeta do Sudoeste, de Pato Branco, um ano antes do Projeto de Lei 141/91 ser votado
em Brasília, o vereador daquela cidade, Nereu Faustino Ceni já discutia a preocupação
sobre o mesmo. Pedia ao deputado federal Edi Siliprandi informações sobre o referido
projeto, já que a criação do Estado do Iguaçu era:
“... uma bandeira que atrai e causa contrariedade junto ao povo sudoestino, especialmente a
nós, pato-branquenses”. Para Ceni, caso venha a ser aprovado “o Estado do Iguaçu causará
inúmeras alterações na vida do nosso povo, sendo dever da Câmara estar bem informada sobre
as quantas anda o referido projeto de lei junto a instancia decisória da questão (GAZETA DO
SUDOESTE, 24-11-91, p.6)”.
Para o jornal, era natural a região reivindicar o Estado do Iguaçu, já que também
afirmava o total apoio da população em todas as cidades do Sudoeste e Oeste do Paraná.
Nos jornais de Francisco Beltrão, não houve grandes manifestações. Algumas
reportagens onde colocavam ora contra ora a favor da votação da Lei 141/91 na Câmara
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dos Deputados e sobre a derrota da mesma. Percebe-se que a imprensa de Francisco
Beltrão não se decidia a apoiar abertamente, mas nos meses imediatamente anterior à
votação provocava sobre a não participação mais efetiva da maior cidade do Sudoeste
do Paraná.
Na Gazeta do Povo, edição do dia 28 de março de 1993, numa matéria sem
assinatura, intitulada “Meta seria uma nova nação”, o Instituto Histórico e Geográfico
de Santa Catarina adverte:
Ao analisar o projeto de separação intentado pelo deputado Edi Siliprandi (...) em estudo
realizado com a participação dos principais historiadores catarinenses, a entidade analisou a
formação histórica do território meridional do Brasil, para negar qualquer legitimidade a uma
eventual separação da “Região do Iguaçu” (...) os separatistas que querem criar um novo
estado, e os separatistas que querem criar uma nova nação, são gêmeos, professam a mesma
ideologia – anunciando uma nova terra de promissão – e desejam a ruptura da unidade
nacional. (GAZETA DO POVO, 28-03-93)
Esse era outro argumento daqueles que eram contra a divisão do Paraná. O então
deputado estadual Aníbal Khury, presidente da Assembléia Estadual do Paraná, liderava
o movimento “Paraná Indivisível”, que produziu e espalhou cartazes, livretos, anúncios
e uma grande cobertura na imprensa. Esse movimento argumentava que a criação de um
novo Estado no Sul seria a porta de entrada para deflagrar outro movimento ainda mais
temeroso para o Brasil, a criação de uma nova Nação, que uniria os estados do Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e parte do Mato Grosso do Sul. Para Khury,
“mexendo em fronteiras centenárias (...), significa instilar o veneno do separatismo,
hoje presente perigosamente, em muitas discussões na Região Sul” (LALA,1993, 133).
A pesquisa baseou-se em bibliografia referente aos movimentos “separatistas”
que ocorreram na região Sudoeste do Paraná, na problematização das noções
historiográficas e memorialísticas regionais que afirmam a existência de uma identidade
própria da região. Baseou-se também na produção e organização de algumas fontes
documentais, jornalísticas e também orais, numa perspectiva crítica de contraposição de
diferentes memórias sobre o processo dos movimentos “separatistas” que ocorreram no
Sudoeste do Paraná entre essas décadas. Para além dessa discussão, procurou-se
evidenciar as relações existentes entre as memórias dominantes ligadas aos movimentos
e o conjunto da experiência social dos demais moradores. Houve também a preocupação
na identificação da participação popular no movimento, a partir das memórias
produzidas pelos sujeitos não protagonistas de algumas cidades da região Sudoeste.
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Uma das estratégias para desenvolver a pesquisa tem sido a História Oral, que
“expressa a consciência da historicidade da experiência pessoal e do papel do indivíduo
na história da sociedade...” (PORTELLI, 2001, 14).
Ela se justifica para produzir outro olhar, uma “outra história” para além da oficial, no
estudo das memórias, na construção de identidades e do “outro”, na formação de uma
consciência coletiva e não para substituir ou preencher lacunas históricas na falta
documental. Para Laverdi,
Pensar a produção da memória como processo, além de permitir uma
compreensão ampliada do fazer histórico dos sujeitos no tecido da paisagem
social, reveste o olhar de novas perspectivas críticas em relação aos tons
memorialistas alimentadas pela historiografia. Assim, é preciso dizer que a
opção pelas narrativas orais (...) não se constituiu, evidentemente, numa
pretensão neutra e simplificadora do processo social (LAVERDI, 2005,
70-71).
Assim, Laverdi afirma que a História Oral não é uma opção neutra, mas tem
intenções claras e objetivas de mostrar um outro lado da história, a não-oficial, numa
perspectiva mais crítica, construindo uma trama histórica mais comprometida com a
realidade.
Através da História Oral, a testemunha relembra os processos, pode nos dar
uma descrição diferenciada, viva e não apenas a memória coletiva privilegiada dentro
de um mito ou uma ideologia, que serve ao poder que a transmite e a difunde. É outra
visão do mesmo acontecimento histórico, mas que também podem ocorrer desvios,
preconceitos e até falta da verdade.
A História Oral, através das entrevistas, faz o sujeito propagar sentimentos,
idéias, valores que fazem parte da identidade de determinadas classes ou grupos. O
historiador precisa saber interpretar tanto as lembranças quanto os esquecimentos, de
como eles fazem parte do cotidiano das pessoas, dos traços muitas vezes determinantes
que marcaram uma população de determinada região ou espaço no tempo. Pois que a
memória age com liberdade, mas ela é determinada pelo presente, quando escolhe os
acontecimentos no tempo e no espaço, se relacionando de maneira simples e
representadas pelos significados presentes na vida social.
Quando pensamos numa cultura em uma região de migrantes, como é o caso do
Sudoeste do Paraná, precisamos levar em conta que eles, ao se estabelecerem no novo
lugar, perdem o contato com a sua paisagem natal. Muitas de suas raízes se perdem. O
migrante se depara com uma nova realidade, se separa do resto da sociedade por muito
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tempo. Muitas vezes, é nesse vazio, nessa desorganização que a memória de um grupo
dominante se projeta e se impõe como predominante e coletiva.
A memória dos atores entrevistados demonstra que tinham pouco
conhecimento sobre os movimentos de separação ocorridos no Sudoeste do Paraná.
É verdade que encontramos pessoas com uma memória muito presente tanto do
primeiro movimento, em 1968 quanto do último, ocorrido no início da década de 1990.
Principalmente, quando da votação da Lei nº. 141/91, do projeto do deputado
paranaense Edi Siliprandi, eleito com a bandeira do separatismo pela região Oeste do
Paraná.
Porém, é verdade também que a maioria das pessoas afirmou que não havia
participação popular, que o povo ficou sabendo “apenas por ouvir dizer”, que o povo
não foi consultado, que era um assunto discutido predominantemente entre os políticos.
No processo de efetivação das entrevistas, houve grande dificuldade nas
lembranças de muitos entrevistados. A memória social é mais organizada, porém em
relação à lembrança individual, as pessoas teem dificuldade em encontrar muita coisa
relevante que tenha vivido naquele passado. A memória se faz na individualidade, mas é
na socialização que ela se efetiva, se cristaliza e, portanto, encontramos muitas
confusões temporais nas entrevistas individuais. Talvez porque o movimento ocorreu
em dois momentos diferentes, em décadas diferentes, alguns entrevistados confundiram
os dois movimentos.
Em muitas entrevistas, podemos perceber como justificativa a de que o Paraná
era muito grande, que a região era muito distante da capital e isso ficou gravado na
memória das pessoas. Em conversas informais com muitos entrevistados e suas
famílias, isso é muito recorrente.
Entretanto, se compararmos com outros Estados brasileiros, percebemos que
essa é uma região em que essa justificativa não faz sentido. Na região setentrional, os
Estados tem dimensões até três vezes maiores, e nem por isso se organizou movimentos
separatistas dessa dimensão.
Nas entrevistas realizadas com as pessoas que residiam e ainda residem na zona
rural, fica evidente o distanciamento total do movimento separatista, mais uma vez se
certificando que o movimento separatista estava mais centrado na zona urbana. Porém, a
característica de pequenas propriedades da região Sudoeste e grande parte do Oeste do
Paraná e Oeste de Santa Catarina evidencia que foi um erro do movimento, o que pode
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ter contribuído para a sua fragilidade. A zona rural tem uma força econômica muito
grande ainda hoje nessas regiões.
Na escolha da metodologia da História Oral, de acordo com Laverdi, “é preciso
atentar para os sentidos políticos implícitos, por sua vez contidos na riqueza dos
processos de transformações dos próprios sujeitos, afirmados muitas vezes na projeção
de seus papeis protagonistas na constituição de seus espaços sociais” 3.
Para além dessa possibilidade, o caminho escolhido foi na tentativa de
estabelecer um diálogo com outras memórias sobre as “tramas da separação”, na criação
de um novo Estado no Sul, com território pertencente aos Estados do Paraná e Santa
Catarina, pelo olhar daqueles que estiveram ausentes dos papeis protagonistas, mas que
nem por isso, teem sua participação desvalorizada.
Na construção da dissertação, realizamos as entrevistas com moradores de
algumas cidades do Sudoeste do Paraná, na faixa etária de 40 anos ou mais, de ambos
os sexos, que tenham trajetórias e experiências significativas, de diferentes profissões
ou atividades econômicas e políticas. Esta perspectiva leva em consideração o esforço
de compreensão qualitativa e não quantitativa dos mesmos.
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