Apostila Estrutura Da Administração Pública
Apostila Estrutura Da Administração Pública
Apostila Estrutura Da Administração Pública
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Sumário
INTRODUÇÃO 3
A Escola Managerial 8
Patrimonialismo e burocracia 18
Crise e reforma 24
Reforma neoliberal 28
CONCLUSÃO 34
REFERENCIAS 37
1
FACUMINAS
2
INTRODUÇÃO
3
imprensa e, finalmente, da opinião pública. De repente, a reforma passava a ser vista
como necessidade crucial, não apenas interna, mas exigida também pelos
investidores estrangeiros e pelas agências financeiras multilaterais. Depois de
amplamente debatida, a emenda constitucional da reforma administrativa foi remetida
ao Congresso Nacional em agosto de 1995.
4
A Administração Pública no século XXI: Evolução
teórico-prática
5
A resistência à mudança na Administração Pública
Tomando como reais alguns dos fatores sugeridos por Kanter e colegas, e se
tivermos em atenção que os processos de mudança na Administração Pública tendem
a aparecer de forma planeada , algumas vezes na sua vertente incremental, e outras
de forma mais abrangente e radical, importa considerar a possibilidade de uma aposta
em novas competências comportamentais para os funcionários, desde que articulada
com as mudanças em curso, poder ser importante para a restituição da confiança e
da auto- -estima dos mesmos, que não devem sentir-se excluídos num quadro
organizacional que apresenta novos contornos, ainda que parcialmente indefinidos.
Se existir uma exclusão generalizada dos funcionários num processo de mudança,
6
este pode-se tornar contra producente e mesmo perigoso para a sobrevivência das
organizações públicas.
Com efeito, para que possa ser efetiva a participação de todos os fatores
organizacionais públicos, terá que estar alicerçada numa partilha de novos símbolos,
novos códigos de linguagem e fundamentalmente de novas atitudes e
comportamentos. Num processo deste tipo, motivação e comunicação são elementos
nucleares.
7
A Escola Managerial
8
E da delegação das competências como forma de o poder político se
permitir afastar das preocupações da gestão corrente e da
implementação das políticas.
9
O New Public Management
Foi desta forma que surgiu o supra referido paradigma managerial de gestão
pública orientado para uma cultura baseada no desempenho e num sector público
menos centralizado (OCDE, 1995). Este novo paradigma poderia ser caracterizado
por um redimensionamento da importância atribuída ao desempenho, ao controlo e à
responsabilização, um desenvolvimento da competição, uma optimização do
aproveitamento das tecnologias de informação, assim como uma aposta na qualidade
e uma desagregação das tradicionais unidades de trabalho. O mesmo seria falar do
New Public Management (NPM).
10
resultados enquanto indicador fundamental dos desempenhos (Osborne & Gaebler,
1992).
11
entre estes fatores, a gestão pública deve ser capaz de os gerir, não devendo impor
unilateralmente a sua vontade.
12
diversos fatores, dos seus comportamentos e das suas expectativas, de forma a que
se possam servir todos sem arbítrios. Nesta abordagem as competências
comportamentais de quem trabalha na Administração e consequentemente contribui
para o seu desenvolvimento e desempenho são fundamentais.
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A reforma do Estado como questão central
Podemos encontrar muitas razões para o crescente interesse de que tem sido
alvo a reforma do Estado nos anos 90. A razão básica está, provavelmente, no fato
de que houve a percepção generalizada de que o ajuste estrutural não era suficiente
para que houvesse a retomada do crescimento. Desde meados dos anos 80, os
países altamente endividados têm-se dedicado a promover o ajuste fiscal, a liberalizar
o comércio, a privatizar, a desregulamentar. Os resultados foram positivos, na medida
que se superaram os aspectos agudos da crise: a balança de pagamentos voltou a
um relativo controle, por toda a parte caíram as taxas de inflação, os países
recuperaram pelo menos alguma credibilidade. Mas não se retomou o crescimento.
O pressuposto neoliberal que estava por trás das reformas - o pressuposto de que o
ideal era um Estado mínimo, ao qual caberia apenas garantir os direitos de
propriedade, deixando ao mercado a total coordenação da economia - provou ser
irrealista. Em primeiro lugar porque, apesar do predomínio ideológico alcançado pelo
credo neoconservador, em país algum - desenvolvido ou em desenvolvimento - este
Estado mínimo tem legitimidade política. Não há sequer apoio político para um Estado
que apenas acrescente às suas funções as de prover a educação, dar atenção à
saúde e às políticas sociais compensatórias: os cidadãos continuam a exigir mais do
Estado.
14
Em segundo lugar, porque rapidamente se percebeu que a idéia de que as
falhas do Estado eram necessariamente piores que as falhas do mercado não
passava de dogmatismo. As limitações da intervenção estatal são evidentes, mas o
papel estratégico que as políticas públicas desempenham no capitalismo
contemporâneo é tão grande que é irrealista propor que sejam substituídas pela
coordenação do mercado, nos termos sugeridos pelo pensamento neoliberal. Como
Przeworski (1996a: 119) observa, “a visão (neoliberal) de que, na ausência de suas
tradicionais ‘falhas’, os mercados seriam eficientes, parece estar morta, ou no mínimo
moribunda”.
Por outro lado, tornou-se cada vez mais claro que a causa básica da grande
crise dos anos 80 - uma crise que só os países de Leste e do Sudeste asiático
conseguiram evitar - é uma crise do Estado: uma crise fiscal do Estado, uma crise do
modo de intervenção estatal e uma crise da forma burocrática pela qual o Estado é
administrado. Ora, se a proposta de um Estado mínimo não é realista, e se o fator
básico que subjaz à crise econômica é a crise do Estado, a conclusão só pode ser
uma: a solução não é provocar o definhamento do Estado, mas o reconstruir, reformá-
lo.
15
Há uma explicação simples: os cidadãos estão-se tornando cada vez mais
conscientes de que a administração pública burocrática não corresponde às
demandas que a sociedade civil apresenta aos Governos, no capitalismo
contemporâneo. Os cidadãos exigem do Estado muito mais do que o Estado pode
fornecer. E a causa imediata da lacuna que assim se cria não é apenas fiscal, como
observou O’Connor (1973), nem apenas política, como Huntington (1968) destacou 2
: é também administrativa. Os recursos econômicos e políticos são escassos por
definição, mas se pode superar parcialmente a limitação com o uso eficiente pelo
Estado, quando não se pode contar com o mercado, i.e., quando a alocação de
recursos pelo mercado não é solução factível, dado seu caráter distorcido ou dada
sua incompletude. Neste caso, a função de uma administração pública eficiente passa
a ter valor estratégico, ao reduzir a lacuna que separa a demanda social e a satisfação
desta demanda.
Há porém uma razão mais ampla para o interesse que a reforma do Estado, e
particularmente da administração pública, tem despertado: a importância sempre
crescente que se tem dado à proteção do patrimônio público (res publica) contra as
ameaças de “privatização” ou, em outras palavras, contra atividades de rent-seeking.
A proteção do Estado, na medida que este inclui a res publica, corresponde a direitos
básicos que, finalmente, no último quartel deste século, começaram a ser definidos -
direitos que podem ser chamados “os direitos públicos”. No século XVIII, os filósofos
iluministas e as Cortes Britânicas definiram os direitos civis que, no século seguinte,
foram introduzidos pelos políticos liberais (na acepção européia) nas Constituições
de todos os países civilizados. No século XIX, os socialistas definiram os direitos
sociais que, na primeira metade do século XX, foram introduzidos nas Constituições
de todos os países pelos partidos social democratas.
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No século XVIII, historicamente, compreendeu-se a importância de proteger o
indivíduo contra um Estado oligárquico e, no século XIX, a importância de proteger
os pobres e os fracos contra os ricos e poderosos, mas a importância de proteger o
patrimônio público só passou a ser dominante na segunda metade do século XX. Não
por acaso, quase simultaneamente um cientista político social-democrata brasileiro
(Martins, 1978) escreveu pela primeira vez sobre a “privatização do Estado”, e uma
economista norte-americana conservadora (Krueger, 1974) definiu rent-seeking.
Ambos se referiam ao mesmo problema: percebiam que era necessário proteger a
res pública contra a ganância de indivíduos e grupos poderosos. Se no século XVIII
foram definidos os direitos civis, e no século XIX os direitos sociais, passava agora a
ser necessário definir um terceiro tipo de direitos, também básicos, - os direitos
públicos: os direitos de que gozam todos os cidadãos, de que público o que de fato é
público. Ou, em outras palavras, o direito de que a propriedade do Estado seja
pública, isto é, de todos e para todos, não-apropriada por uns poucos.
17
Patrimonialismo e burocracia
18
proteção ao meio ambiente. Agora, em vez de três ou quatro ministros, era preciso
ter 15 ou 20. Em vez de uma carga de impostos que representava 10% do PIB, os
impostos representam agora de 30 a 60% do PIB. Ao invés da velha administração
pública burocrática, uma nova forma de administração, que tomou emprestados os
imensos avanços pelos quais passaram, durante o século XX, as empresas de
administração de negócios, sem contudo perder a característica específica que a faz
ser administração pública: uma administração que não visa ao lucro, mas à satisfação
do interesse público.
19
desenvolvimentista, o excedente da economia foi dividido entre os capitalistas e os
burocratas que, além dos mecanismos de mercado, usaram o controle político do
Estado para enriquecimento próprio. Se, nos países desenvolvidos, a res pública não
foi bem protegida pela administração burocrática, dada sua ineficiência em
administrar o Estado de Bem-estar social, nos países em desenvolvimento, a res
pública foi ainda menos protegida porque, nestes países, os burocratas não se
dedicaram apenas à construção do Estado, mas, também, a substituir parcialmente a
burguesia no processo de acumulação de capital, e na apropriação do excedente
econômico.
20
A reforma da administração pública que o Governo Fernando Henrique
Cardoso está propondo desde 1995 poderá ser conhecida no futuro como a segunda
reforma administrativa do Brasil. Ou a terceira, se considerarmos que a reforma de
1967 merece esse nome, apesar de ter sido afinal revertida. A primeira reforma foi a
burocrática, de 1936. A reforma de 1967 foi um ensaio de descentralização e de
desburocratização. A atual reforma está apoiada na proposta de administração
pública gerencial, como uma resposta à grande crise do Estado dos anos 80 e à
globalização da economia — dois fenômenos que estão impondo, em todo o mundo,
a redefinição das funções do Estado e da sua burocracia.
21
A administração pública burocrática foi adotada para substituir a administração
patrimonialista, que definiu as monarquias absolutas, na qual o patrimônio público e
o privado eram confundidos. Nesse tipo de administração, o Estado era entendido
como propriedade do rei. O nepotismo e o empreguismo, senão a corrupção, eram a
norma. Esse tipo de administração revelar-se-á incompatível com o capitalismo
industrial e as democracias parlamentares, que surgem no século XIX. É essencial
para o capitalismo a clara separação entre o Estado e o mercado; a democracia só
pode existir quando a sociedade civil, formada por cidadãos, distingue-se do Estado
ao mesmo tempo que o controla. Tornou-se assim necessário desenvolver um tipo de
administração que partisse não apenas da clara distinção entre o público e o privado,
mas também da separação entre o político e o administrador público. Surge assim a
administração burocrática moderna, racional-legal.
Este fato não era grave enquanto prevalecia um Estado pequeno, cuja única
função era garantir a propriedade e os contratos. No Estado liberal só eram
necessários quatro ministérios — o da Justiça, responsável pela polícia, o da Defesa,
incluindo o Exército e a Marinha, o da Fazenda e o das Relações Exteriores. Nesse
tipo de Estado, o serviço público mais importante era o da administração da justiça,
que o Poder Judiciário realizava. O problema da eficiência não era, na verdade,
essencial. No momento, entretanto, que o Estado se transformou no grande Estado
social e econômico do século XX, assumindo um número crescente de serviços
sociais — a educação, a saúde, a cultura, a previdência e a assistência social, a
pesquisa científica — e de papéis econômicos — regulação do sistema econômico
interno e das relações econômicas internacionais, estabilidade da moeda e do
sistema financeiro, provisão de serviços públicos e de infraestrutura — , o problema
da eficiência tornou-se essencial. Por outro lado, a expansão do Estado respondia
22
não só às pressões da sociedade, mas também às estratégias de crescimento da
própria burocracia. A necessidade de uma administração pública gerencial, portanto,
decorre de problemas não só de crescimento e da decorrente diferenciação de
estruturas e complexidade crescente da pauta de problemas a serem enfrentados,
mas também de legitimação da burocracia perante as demandas da cidadania.
Os países em que essa revolução foi mais profunda foram o Reino Unido, a
Nova Zelândia e a Austrália. Nos Estados Unidos essa revolução irá ocorrer
principalmente a nível dos municípios e condados — revolução que o livro de
OSBORNE & G a e b l e r, Reinventando o Governo (1992) descreverá de forma tão
expressiva. E a administração pública gerencial que está surgindo, inspirada nos
avanços realizados pela administração de empresas.
23
Crise e reforma
No Brasil a percepção da natureza da crise e, em seguida, da necessidade
imperiosa de reformar o Estado ocorreu de forma acidentada e contraditória, em meio
ao desenrolar da própria crise. Entre 1979 e 1994 o Brasil viveu um período de
estagnação da renda per capita e de alta inflação sem precedentes. Em 1994,
finalmente, estabilizaram-se os preços através do Plano Real, criando-se as
condições para a retomada do crescimento. A causa fundamental dessa crise
econômica foi a crise do Estado — uma crise que ainda não está plenamente
superada, apesar de todas as reformas já realizadas. Crise que se desencadeou em
1979, com o segundo choque do petróleo. Crise que se caracteriza pela perda de
capacidade do Estado de coordenar o sistema econômico de forma complementar ao
mercado. Crise que se define como uma crise fiscal, como uma crise do modo de
intervenção do Estado, como uma crise da forma burocrática pela qual o Estado é
administrado, e, em um primeiro momento, também como uma crise política.
A crise política teve três momentos: primeiro, a crise do regime militar — uma
crise de legitimidade; segundo, a tentativa populista de voltar aos anos 50 — uma
crise de adaptação ao regime democrático; e, finalmente, a crise que levou ao
impeachment de Fernando Collor de Mello — uma crise moral. A crise fiscal ou
financeira caracterizou-se pela perda do crédito público e por poupança pública
negativa. A crise do modo de intervenção, acelerada pelo processo de globalização
da economia mundial, caracterizou-se pelo esgotamento do modelo protecionista de
substituição de importações, que foi bem-sucedido em promover a industrialização
nos anos de 30 a 50, mas que deixou de o ser a partir dos anos 60; transpareceu na
falta de competitividade de uma parte ponderável das empresas brasileiras;
expressou-se no fracasso em se criar no Brasil um Estado do Bem-Estar que se
aproximasse dos moldes socialdemocratas europeus. Por fim, a crise da forma
burocrática de administrar o Estado emergiu com toda a força depois de 1988, antes
mesmo que a própria administração pública burocrática pudesse ser plenamente
instaurada no país.
24
abertura de concursos públicos para a alta administração, preferiu o caminho mais
curto do recrutamento de administradores através das empresas estatais.5 Esta
estratégia oportunista do regime militar, que resolveu adotar o caminho mais fácil da
contratação de altos administradores através das empresas, inviabilizou a construção
no país de uma burocracia civil forte, nos moldes que a reforma de 1936 propunha. A
crise agravou-se, entretanto, a partir da Constituição de 1988, quando se salta para
o extremo oposto e a administração pública brasileira passa a sofrer do mal oposto:
o enrijecimento burocrático extremo. As consequências da sobrevivência do
patrimonialismo e do enrijecimento burocrático, muitas vezes perversamente
misturados, serão o alto custo e a baixa qualidade da administração pública brasileira.
25
Algumas características básicas definem a administração pública gerencial. É
orientada para o cidadão e para a obtenção de resultados; pressupõe que os políticos
e os funcionários públicos são merecedores de um grau limitado de confiança; como
estratégia, serve-se da descentralização e do incentivo à criatividade e à inovação; o
instrumento mediante o qual se faz o controle sobre os gestores públicos é o contrato
de gestão.
A administração pública gerencial, por sua vez, assume que se deve combater
o nepotismo e a corrupção, mas que, para isto, não são necessários procedimentos
rígidos. Podem ter sido necessários quando dominavam os valores patrimonialistas;
mas não o são agora, quando se rejeita universalmente que se confundam os
patrimônios público e privado. Por outro lado, emergiram novas modalidades de
apropriação da res publica pelo setor privado, que não podem ser evitadas pelo
recurso aos métodos burocráticos. O rent-seeking é quase sempre um modo mais
sutil e sofisticado de privatizar o Estado e exige que se usem novas contra estratégias.
A administração gerencial; a descentralização; a delegação de autoridade e de
responsabilidade ao gestor público; o rígido controle sobre o desempenho, aferido
mediante indicadores acordados e definidos por contrato, além de serem modos muito
26
mais eficientes para gerir o Estado, são recursos muito mais efetivos na luta contra
as novas modalidades de privatização do Estado.
A burocracia moderna surgiu no século XIX, quando ainda era preciso afirmar
o poder do Estado em oposição a poderes feudais ou regionais. O Estado Nacional
nasceu na Europa, nas monarquias absolutas, nas quais a burocracia patrimonialista
desempenhava um papel central. As burocracias capitalistas modernas são uma
evolução da burocracia patrimonialista, que se auto diferenciaram ao fazer uma
distinção clara entre patrimônio público e patrimônio privado, mas que, ainda assim,
mantiveram-se bem próximas da matriz inicial em tudo quanto dissesse respeito à
afirmação do poder do Estado. Esta é a razão pela qual as burocracias tendem a ser
auto-referentes. Além de promover seus próprios interesses, interessam-se,
primariamente, em afirmar o poder do Estado - o “poder extrovertido” - sobre os
cidadãos. Observe-se que o Estado-nação, ou país, inclui o Estado e a sociedade
civil. O Estado é a única entidade à qual compete o poder extroverso — o poder de
impor leis e impostos à sociedade civil, ou seja, a um grupo organizado de cidadãos,
que não é parte integrante direta do Estado mas que, simultaneamente, é objeto do
poder do Estado e fonte da legitimidade do Governo.
Assim, o serviço público já não precisa ser auto-referente, mas se orientar pela
ideia de “serviço ao cidadão”. Afinal, o “serviço público” é público, é um serviço ao
público, ao cidadão.
27
pelo menos um certo grau de confiança. Confiança limitada, permanentemente
controlada por resultados, mas ainda assim suficiente para permitir a delegação; para
que o gestor público possa ter liberdade de escolher os meios mais apropriados ao
cumprimento das metas prefixadas. Na administração burocrática esta confiança não
existe. E é impensável pela lógica neoconservadora ou neoliberal, dada, nos dois
casos, a visão radicalmente pessimista que têm da natureza humana. Sem algum
grau de confiança, contudo, é impossível se obter a cooperação e, embora a
administração seja um modo de controle, é também um modo de cooperação. O
pessimismo radical dos neoliberais é funcional para avalizar a conclusão a que
chegam quanto à necessidade do Estado mínimo, mas não faz sentido algum quando
o Estado mínimo é visto como construção mental irrealista, ante a realidade do Estado
moderno que tem de ser eficiente e tem de ser gerido de forma efetiva e eficiente.
Reforma neoliberal
O enfoque gerencial sobre a administração pública emergiu com vigor na Grã-
Bretanha e nos EUA depois de Governos conservadores terem assumido o poder em
1979 (Governo Thatcher) e em 1980 (Governo Reagan), o que levou alguns analistas
a verem, neste enfoque, uma visão intrinsecamente conservadora. Na verdade, só na
Grã-Bretanha o gerencialismo foi aplicado ao serviço público imediatamente após a
posse do novo Governo, e levou a uma reforma administrativa profunda e bem-
sucedida. Uma série de programas - o das Unidades de Eficiência, com relatórios de
pesquisa e avaliação; o Próximo Passo, com as agências autônomas; e o Direitos do
Cidadão - contribuíram para tornar o serviço público na Grã-Bretanha mais flexível,
descentralizado, eficiente e orientado para o cidadão. O serviço público britânico
tradicional passou por uma transformação profunda, perdeu os traços burocráticos e
adquiriu características gerenciais. A melhor análise da experiência britânica que
conheço foi escrita por um sociólogo da Universidade de Warwick, contratado por
sindicatos Britânicos. Fairbrother (1994) escreveu uma análise crítica moderada. Ver
também Tomkins, 1987; Pyper & Robins (orgs.), 1995; Nunberg, 1995 e Plowden,
1994. Pollitt (1990) é uma abordagem radicalmente crítica.
28
EUA, Osborne e Gaebler (1992) - que cunharam a expressão reinventing government
(reinventar o governo) –, em um livro que teve grande influência nos estudos sobre o
tema, descrevem as reformas administrativas que aconteciam desde o início da
década dos 70 e que, contudo, não se originaram no governo federal mas nas
administrações municipais e estaduais. Foi em 1992 que se estabeleceu a meta de
reformar a administração pública federal norte-americana por critérios gerenciais,
quando um político democrata - o Presidente Clinton - transformou a idéia de
“reinventar o governo” em programa de governo: a National Performance Review
(Revisão do Desempenho Nacional). Para uma avaliação deste programa, ver Kettl,
1994; Kettl & Diiulio, 1994 e 1995. Nos artigos Kettl & Diiulio (1995) os autores
comparam o programa de reinvenção do governo de Clinton e Gore com o “Contrato
com a América” republicano, que chamam de programa de “arrasamento do Estado”:
um programa gerencial realmente neoconservador.
29
incluído o Brasil, país em que a reforma administrativa é formalmente orientada para
substituir a administração pública burocrática por uma administração pública
gerencial. Este fato quase sempre desperta reações fortes nos servidores públicos,
além de levar a acusações de neoliberalismo. Como disse certa vez um indignado
funcionário público britânico “mais eficiente, na verdade, quer dizer mais barato”.
O maior risco a que se expõe este tipo de reforma é ser vista como hostil ao
funcionalismo público e, assim, não conseguir obter a cooperação do corpo de
servidores. Na Grã-Bretanha, um dos países onde a reforma mais avançou, este foi -
e continua a ser - o mais grave problema que o governo enfrenta. A reforma foi
possível por duas razões: porque, ao final da década dos 70, a cúpula do
funcionalismo percebia claramente a urgente necessidade de uma reforma, e porque
Margaret Thatcher estava visceralmente decidida a reduzir os custos da
administração pública. Foi possível, assim, uma espécie de coalizão entre governo e
os escalões superiores do funcionalismo. Mas foi uma coalizão frágil, dada a evidente
má vontade de Thatcher e seus aliados em relação aos servidores. Como Plowden
observa, “a própria primeira ministra repetidamente deixava clara a sua opinião de
que uma pessoa que tivesse talento e espírito empreendedor já teria trocado o serviço
público pela iniciativa privada e estaria ganhando dinheiro” (Plowden, 1994: 10).
30
constante da produtividade, e a orientação para o consumidor. Abrucio (1996), em um
panorama da administração pública gerencial, compara este “gerencialismo puro”,
pelo qual designa a “nova administração pública”, com a abordagem adotada por
Pollitt “orientada para o serviço público” e que visa a ser uma alternativa gerencial ao
modelo britânico. Na verdade, este modo de ver é apenas uma tentativa de dar
atualidade ao velho modelo burocrático, não é uma alternativa gerencial. A ideia de
opor a orientação para o consumidor (gerencialismo puro) à orientação para o cidadão
(gerencialismo reformado) não faz sentido algum. Um dos programas cruciais de
reforma que está sendo implementado pelo Governo britânico é o citizen chart. O
cidadão também é um consumidor. Qualquer administração pública gerencial tem de
considerar o indivíduo, em termos econômicos, como consumidor (ou usuário) e, em
termos políticos, como cidadão. A ideia de opor uma orientação para o consumidor,
que seria conservadora, a uma orientação para o usuário, que seria social-democrata,
faz um pouco mais de sentido, se definirmos o consumidor como um indivíduo que
paga pelos serviços que obtém do Estado, enquanto o usuário é financiado pelo
Estado.
31
Atividades exclusivas são aquelas que envolvem o poder de Estado. São as
atividades que garantem diretamente que as leis e as políticas públicas sejam
cumpridas e financiadas. Integram este setor as forças armadas, a polícia, a agência
arrecadadora de impostos - as tradicionais funções do Estado - e também as agências
reguladoras, as agências de financiamento, fomento e controle dos serviços sociais
e da seguridade social. As atividades exclusivas, portanto, não devem ser
identificadas com o Estado liberal clássico, para o qual bastam a polícia e as forças
armadas.
Serviços não-exclusivos são todos aqueles que o Estado provê, mas que,
como não envolvem o exercício do poder extroverso do Estado, podem ser também
oferecidos pelo setor privado e pelo setor público não-estatal (“não-governamental”).
Este setor compreende os serviços de educação, de saúde, culturais e de pesquisa
científica.
32
A questão da propriedade é essencial. No núcleo estratégico e nas atividades
exclusivas do Estado, a propriedade será, por definição, estatal. Ao contrário, na
produção de bens e serviços há hoje consenso cada vez maior de que a propriedade
deva ser privada, particularmente nos casos em que o mercado possa controlar as
empresas comerciais. Para os casos de monopólio natural, a situação ainda não é
clara, mas, mesmo nestes casos, com uma agência reguladora eficaz e
independente, a propriedade privada parece ser mais adequada.
33
socialdemocratas (ou democratas liberais, na acepção norte-americana) defendem a
terceira alternativa. Há inconsistência entre a primeira alternativa e a administração
pública gerencial; a administração pública gerencial tem dificuldades em conviver com
a segunda alternativa, e é perfeitamente coerente com a terceira. Aqui, o Estado não
é visto como produtor - como prega o burocratismo -, nem como simples regulador
que garanta os contratos e os direitos de propriedade -, como reza o “credo” neoliberal
-, mas, além disto, como “financiador” (ou “subsidiador”) dos serviços não-exclusivos”.
O subsídio pode ser dado diretamente à organização pública não-estatal, mediante
dotação orçamentária - no Brasil temos chamado este tipo de instituição de
“organizações sociais” - ou, por uma mudança mais radical, pode ser dado
diretamente ao cidadão sob a forma de vouchers. E poderão continuar a ser
financiados pelo Estado, se a sociedade entender que estas atividades não devam
ficar submetidas apenas à coordenação pelo mercado.
CONCLUSÃO
34
Depois da grande crise dos anos 80, na década dos 90 está sendo construído
um novo Estado. Este novo Estado será o resultado de profundas reformas. Estas
reformas habilitarão o Estado a desempenhar as funções que o mercado não é capaz
de desempenhar. O objetivo é construir um Estado que responda às necessidades de
seus cidadãos. Um Estado democrático no qual seja possível aos políticos pedir
contas por desempenho aos burocratas e estes sejam obrigados por lei a lhes prestar
contas; e onde os eleitores possam pedir prestação de contas por desempenho aos
políticos e estes sejam obrigados por lei a lhes prestar contas. Para isto, são
movimentos essenciais a reforma política, que dê maior legitimidade aos governos, o
ajuste fiscal, a privatização, a desregulamentação - que reduz o “tamanho” do Estado
-, e uma reforma administrativa que ofereça os meios para se obter uma boa
governança. Neste trabalho, descrevi as características desta última reforma - a
reforma do aparelho do Estado - uma reforma que trabalhará para que se estabeleça,
no setor público, uma administração pública gerencial.
35
age nos nossos dias como um dos principais determinantes na formação desse
comportamento. Hoje importa à gestão saber motivar na incerteza.
36
REFERENCIAS
CIÊNCIA.
37
DIVRY, C., DEBUISSON, & TORRE, A. (1998). COMPÉTENCES ET FORMES
38
BRESSER PEREIRA, LUIZ C ARLOS (1988) "ECONOMIC REFORMS AND THE
CYCLES OF THE STATE". WORLD DEVELOPMENT 21(8), AUGUST 1993. UMA PRIMEIRA
VERSÃO DESTE ARTIGO FOI APRESENTADA NO SEMINÁRIOR "DEMOCRATIZING THE
DILULIO JR., JOHN J. (1995) FINE PRINT: THE CONTRACT WITH AMERICA,
DEVOLUTION, AND THE ADMINISTRATIVE REALITIES OF AMERICAN FEDERALISM .
W ASHINGTON: THE B ROOKINGS INSTITUTION, CENTER FOR PUBLIC M ANAGEMENT ,
MARÇO DE 1995.
PUBLIC MANAGEMENT .
39
A N D R A D E , R. & L. J A C O U D , ORGS. (1993) ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO
DO PODER EXECUTIVO — VOLUME 2. BRASÍLIA: ESCOLA N ACIONAL DC ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA — ENAP
40