Representações Sociais Da Doença Renal Crônica e

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 168

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

Larissa Papaleo Koelzer

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA DOENÇA RENAL CRÔNICA E


DA HEMODIÁLISE E SUA RELAÇÃO COM A QUALIDADE DE
VIDA

Área de Concentração:

Saúde e Desenvolvimento Psicológico

Linha de Pesquisa:

Representações e práticas relativas à saúde

Florianópolis, 2015
Larissa Papaleo Koelzer

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA DOENÇA RENAL CRÔNICA


E DA HEMODIÁLISE E SUA RELAÇÃO COM A QUALIDADE
DE VIDA

Dissertação apresentada como


requisito parcial à obtenção do grau de
mestre em Psicologia. Programa de
Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Federal de Santa
Catarina.
Orientadora: Profª Drª Andréa Barbará
da Silva Bousfield

Florianópolis
2015
“Deixo minha visão ao homem que jamais viu o amanhecer nos braços
da mulher amada. Deixo meu coração à mulher que vive exclusivamente
para fazer o coração de seu filho feliz. Deixo meus rins às pessoas que
tiveram seus sonhos interrompidos, mas que ainda os cultivam. Deixo
meu pulmão ao adolescente que quer gritar ao mundo mais uma vez ‘eu
te amo'. Deixo meu fígado para aqueles que não tinham esperança na
recuperação. Deixo ossos, pele, cada tecido meu, à criança que ainda
não descobriu o que é viver por inteiro. Deixo a você o meu exemplo.
Deixo à minha família o desejo de ser um doador. Deixo para a vida,
enfim, um recado: nós vencemos”.

Autor desconhecido
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela vida, pelas tantas preces atendidas, pela sabedoria
e discernimento que me levaram a fazer as escolhas certas ao longo do
caminho.
À minha mãe, Tânia, que soube criar cinco filhas mostrando que o
caminho do bem é o que leva mais longe. E que sempre primou pela
nossa educação, custasse o que custasse.
Às minhas irmãs, Tizziana, Maureen, Andrezza e Mirelle, mulheres
fortes e inteligentes que sempre foram e sempre serão meus maiores
exemplos, aquelas de quem procurei sempre seguir os passos.
À minha querida orientadora, professora Andréa, a quem devo grande
parte da minha felicidade. Mestre que admiro muito e que desde minha
graduação acompanha meus passos, mostrando que é possível ir mais
longe. Agradeço pelo exemplo de profissionalismo e competência e por
transmitir serenidade nos momentos difíceis com amorosidade,
equilíbrio e sutileza.
À minha amiga Mariana, com quem já dividi muitos momentos
importantes da vida e tenho certeza que continuarei dividindo. Agradeço
de coração pela companhia gostosa de sempre, pelas orientações quando
precisei, pelas risadas que aliviam o peso do cotidiano e pelo ombro
amigo nos momentos difíceis.
Aos colegas de trabalho na Prefeitura de Palhoça, em especial Fernanda,
Greici e Andresa. Obrigada por fazer parte do meu dia-a-dia, pela
companhia nessa trajetória e por me ouvir falar tanto deste trabalho.
Obrigada pelo bom humor de sempre, a companhia leve e as palavras de
incentivo.
Aos colegas do LACCOS, especialmente à Larissa, que me ajudou e
orientou nas análises desta dissertação. Agradeço a todos pela
colaboração, pelas orientações e pela leveza no dia-a-dia.
Aos professores da graduação e do mestrado em Psicologia da UFSC,
obrigada pela disponibilidade. Mestres que, com competência e carinho
muito colaboraram para meu crescimento acadêmico.
Aos diretores e toda equipe dos centros de hemodiálise onde coletei os
dados desta pesquisa. Obrigada pelo voto de confiança, por acreditar no
meu trabalho e permitir que eu o desenvolvesse.
Por fim, meu agradecimento aos sujeitos que participaram deste estudo,
a quem devo toda a elaboração e construção desta dissertação. Obrigada
pela confiança, por me permitir conhecer suas histórias, seus
sofrimentos e anseios.
Koelzer, Larissa Papaleo (2015). Representações sociais da doença
renal crônica e da hemodiálise e sua relação com a qualidade de
vida. Dissertação de Mestrado em Psicologia, Programa de Pós-
Graduação em Psicologia. Universidade Federal de Santa Catarina.
Florianópolis (SC).

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi verificar a relação entre as representações


sociais da doença renal crônica e da hemodiálise e a qualidade de vida
em saúde dos pacientes que realizam hemodiálise. Para tanto, buscou-se
descrever a representação social desses temas para então averiguar as
possíveis relações entre eles. Participaram deste estudo 25 pessoas que
realizam hemodiálise, 12 do sexo feminino e 13 do sexo masculino.
Foram considerados critérios de inclusão dos participantes: idade
superior a 18 anos, estar no programa de hemodiálise há pelo menos seis
meses, estar clinicamente estável, ter capacidade de compreensão
adequada para responder a entrevista e aceitar participar da pesquisa.
Como critério de exclusão de participantes foi utilizado o histórico de
realização de transplante renal. Como instrumento para coleta de dados
foi empregada a técnica da entrevista. Foram apresentadas questões
abertas no início da entrevista com três temas indutores: doença renal
crônica, hemodiálise e qualidade de vida. Em seguida foi aplicado um
instrumento para avaliar a qualidade de vida, o WHOQOL - Bref. Por
fim, apresentadas questões de caracterização da amostra: sexo, idade,
escolaridade, renda e local de domicílio. Para a análise do material
textual obtido por meio das entrevistas foi realizada uma análise lexical
e uma classificação hierárquica descendente de segmentos de texto, com
auxílio do software IRAMUTEQ, e uma análise de conteúdo do tipo
temático-categorial. O instrumento WHOQOL – Bref não possui uma
classificação numérica quanto à qualidade de vida, e sim uma escala
analógica de 0 a 100, sendo o critério utilizado a comparação: quanto
maior o escore, maior é a qualidade de vida, e quanto menor o escore,
menor será qualidade de vida. A análise final do instrumento foi
efetuada através da utilização do software estatístico Statistical Package
for the Social Sciences - pacote estatístico para as ciências sociais
(SPSS), aplicando a sintaxe específica do instrumento. Dos dados
obtidos neste estudo pode-se concluir que houve uma avaliação
predominantemente positiva da maioria dos domínios que compõem o
instrumento. Portanto, com relação à qualidade vida, a maioria dos
participantes apresentou-se satisfeita. Quanto ao significado da doença
renal crônica, foi atribuído por alguns entrevistados como negativa,
sendo esse muito atrelado ao significado do tratamento, uma vez que a
hemodiálise é considerada um tratamento difícil e que causa
dependência. Nesse estudo observou-se que a hemodiálise está,
principalmente, ligada a concepção de sofrimento. A necessidade do
tratamento é percebida por muitos como uma dependência. A partir das
entrevistas observou-se que a dependência acontece porque os pacientes
sentem resultados favoráveis do tratamento e têm medo do prognóstico
caso o abandonem. A hemodiálise representa a possibilidade de viver
mais tempo e o alívio dos sintomas da doença para muitos pacientes.
Há, também, a concepção da hemodiálise como salvação, um aspecto
ligado a religiosidade. Nesse sentido, a hemodiálise é considerada como
“algo de Deus” ou “uma graça”, sendo aceita como a única forma de
sobrevivência. Porém, nesse estudo emergiram também aspectos
negativos relacionados ao tratamento. As dificuldades apontadas pelos
entrevistados dizem respeito principalmente às limitações quanto à
alimentação e ingestão de líquidos, dificuldades em realizar diversas
atividades, trabalhar e em fazer algumas mudanças necessárias na rotina.
Concluiu-se que as representações dos pacientes sobre a doença renal
crônica e sobre o tratamento têm aspectos que estão relacionados e,
portanto, se compartilham. Os principais temas que se compartilham
dizem respeito às limitações impostas pelo tratamento, e que são
decorrências da doença, bem como a rotina que se estabelece devido à
necessidade de fazer hemodiálise. Considera-se, portanto, que a
representação do tratamento está atrelada à concepção da doença,
constituindo uma parte dessa última. A representação social do
tratamento como algo que proporciona alívio dos sintomas da doença e
expectativa de prolongamento da vida tem relação com o incremento da
qualidade de vida dos participantes, que nesse estudo pode ser
considerada boa.

Palavras-chave: Representações sociais; doença renal crônica;


hemodiálise; qualidade de vida.
Koelzer, Larissa Papaleo (2015). Representações sociais da doença
renal crônica e da hemodiálise e sua relação com a qualidade de
vida. Dissertação de Mestrado em Psicologia, Programa de Pós-
Graduação em Psicologia. Universidade Federal de Santa Catarina.
Florianópolis (SC).

ABSTRACT

The aim of this research was to verify the relation between chronic
kidney disease and hemodialysis social representations and the quality
of life in health of patients on hemodialysis. For this, this study tried to
identify the social representation of these themes and then investigate
the possible relationships between them. The study included 25 people
on hemodialysis, 12 female and 13 male. The criteria to participate in
this study was: age over 18 years, being in hemodialysis for at least six
months to be clinically stable, have the capacity to understanding the
interview and accept participate. The exclusion criteria of participants
was the historical of renal transplantation. The data were collected
through a semi-structured interview realized during the hemodialysis
session. The interview was about three inductors topics: chronic kidney
disease, hemodialysis and quality of life. Then instrument that was used
to measure the quality of life was the WHOQOL - Bref. And the
questions about the sample characterization were the following: gender,
age, education, income and place of domicile. For the analysis of textual
material obtained through the interviews was used a lexical analysis was
performed and a downward hierarchical classification of text segments,
with the aid of IRAMUTEQ software, and a content analysis of the
thematic-categorical type. The WHOQOL - Bref not have a numerical
rating on the quality of life, but an analog scale of 0 to 100, with the
criteria used to compare: the higher the score, the higher the quality of
life, and the lower the score , the lower quality of life. The final analysis
of the instrument was performed using the statistical software Statistical
Package for Social Sciences - statistical package for social sciences
(SPSS) by applying the syntax specifies. The analysis of data obtained
from the application of the WHOQOL - Bref allowed concluded that
there was a predominantly positive assessment of most of the areas that
make up the instrument. Therefore, with respect to quality of life, most
participants were satisfied. Some respondents attributed a negative
meaning to chronic kidney disease, the meaning is very tied to the
meaning of the treatment, since hemodialysis is considered a difficult
treatment. In this study we observed that hemodialysis is mainly linked
to the suffering. Each patient assigned meanings to the disease and
treatment based on their own experiences. The need for treatment is
perceived by many as a dependency. From the interviews it was noticed
that the dependence is due to the favorable feelings that the patients feel
when the treatment was successful and are afraid the prognosis without
hemodialysis. Hemodialysis is the possibility to live longer and the
relief of symptoms of the disease for many patients. There is also the
concept of hemodialysis like a salvation, an aspect linked to religiosity.
In this sense, hemodialysis is considered as "something of God" or a
"grace" and due of this the treatment was accepted as the only way of
survival. However, in this study emerged also negative aspects related to
treatment. The difficulties mentioned by the interviewers relate mainly
to the limitations on the food and fluid intake, difficulties in performing
various activities, work and make some necessary changes in routine.
We conclude that the representations of patients on chronic kidney
disease and treatment have aspects that are related and therefore are
shared. The main themes that are shared concern limitations imposed by
the treatment, and which are consequences of the disease and the routine
is established due to the need of hemodialysis. It is considered,
therefore, that the representation of the treatment is related to the design
of the disease, constituting a part of the latter. The social representation
of treatment as something that provides relief from the symptoms of the
disease and prolonging life expectancy is related to the increase in the
quality of life of participants, which in this study can be considered
good.

Keywords: Social representation; chronic kidney disease; hemodialysis;


quality of life.
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Distribuição das respostas do domínio 70


físico

Tabela 2 - Distribuição das respostas do domínio 74


psicológico

Tabela 3 - Distribuição das respostas do domínio 77


relações sociais

Tabela 4 - Distribuição das respostas do domínio 78


meio ambiente

Tabela 5 - Distribuição das médias dos domínios do 82


WHOQOL-Bref

Tabela 6 - Explicitação da categorização temática 97


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Domínios e facetas do WHOQOL – Bref 63

Figura 2 - Dendograma da classificação hierárquica 83


descendente do corpus Doença renal
crônica

Figura 3 - Dendograma da classificação hierárquica 88


descendente do corpus Hemodiálise

Figura 4 - Dendograma da análise temática do corpus 94


SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................. 11
ABSTRACT ......................................................................................... 13
LISTA DE TABELAS ......................................................................... 15
LISTA DE FIGURAS ......................................................................... 17
1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 21
2 OBJETIVOS ..................................................................................... 27
2.1 OBJETIVO GERAL ......................................................................... 27
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS .............................................................. 27
3 REVISÃO DE LITERATURA........................................................ 28
3.1 DOENÇA RENAL CRÔNICA ............................................................ 29
3.2 HEMODIÁLISE .............................................................................. 34
3.3 QUALIDADE DE VIDA ................................................................... 39
4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA................................................... 44
4.1 TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ...................................... 45
4.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E SAÚDE ............................................ 53
5 MÉTODO.......................................................................................... 61
5.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA ................................................. 61
5.2 PARTICIPANTES............................................................................ 61
5.3 INSTRUMENTOS PARA COLETA DE DADOS .................................... 61
5.4 PROCEDIMENTO PARA COLETA DE DADOS ................................... 64
5.5 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DOS DADOS .................................. 65
6 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS...................................... 69
6.1 CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ...................................... 69
6.2 RESULTADOS SOBRE A QUALIDADE DE VIDA POR MEIO DO
WHOQOL – BREF............................................................................. 69
6.2.1 Domínio físico ...................................................................... 70
6.2.2 Domínio psicológico ............................................................ 73
6.2.3 Domínio relações sociais ..................................................... 76
6.2.4 Domínio meio-ambiente ....................................................... 78
6.3 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA DOENÇA RENAL CRÔNICA ............ 83
6.4 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA HEMODIÁLISE .............................. 87
6.5 ANÁLISE COM DIVISÃO TEMÁTICA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
DA DOENÇA E DO TRATAMENTO ........................................................ 93
6.6 ANÁLISE COM DIVISÃO TEMÁTICA DA QUESTÃO ACERCA DA QV 97
6.6.1 Categoria trabalho............................................................... 99
6.6.2 Categoria atividades diárias ................................................ 99
6.6.3 Categoria cuidados ............................................................ 100
6.6.5 Categoria lazer .................................................................. 103
6.6.6 Categoria consequências físicas ........................................ 104
6.6.7 Categoria alimentação....................................................... 105
7 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .............................................. 107
7.1 CONTEXTO DA AMOSTRA ........................................................... 107
7.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA DOENÇA RENAL CRÔNICA .......... 109
7.3 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA HEMODIÁLISE ............................ 117
7.4 QUALIDADE DE VIDA ................................................................. 120
7.5 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA DOENÇA, DO TRATAMENTO E A
QUALIDADE DE VIDA ........................................................................ 124

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................ 129


REFERÊNCIAS ................................................................................ 134
APÊNDICES ...................................................................................... 155
APÊNDICE A ................................................................................. 155
APÊNDICE B ................................................................................. 159
ANEXOS ............................................................................................ 167
21

1 INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas em diversos países, inclusive no Brasil,


ocorreram intensas transformações demográficas e epidemiológicas,
resultando na queda da fecundidade e redução da mortalidade infantil e
de mortes por doenças infecciosas com aumento da expectativa de vida
e do número de idosos na população total. Tais fatos somados às
modificações nos hábitos alimentares, sedentarismo e ao grande
consumo de tabaco e álcool, resultaram no crescimento de doenças
crônicas na população, que já é considerado um grave problema de
Saúde Pública (Lessa, 1998).
Doença crônica é considerada uma condição que afeta, por mais
de três meses, as atividades diárias de uma pessoa e que pode causar
hospitalização pelo período mínimo de um mês por ano. De modo geral,
são doenças que provocam alterações patológicas irreversíveis e
apresentam um longo período de latência e curso assintomático
prolongado.
São consideradas as principais doenças crônicas: doenças
cardiovasculares, doenças respiratórias crônicas, diabetes, câncer
(Schmidt et al., 2011) entre outras, como a insuficiência ou doença renal
crônica (Barbosa et al., 2006). Muitas dessas doenças estão ligadas ao
envelhecimento da sociedade, tabagismo, sedentarismo, consumo de
álcool, relação sexual desprotegida, dieta inadequada, além da
predisposição genética (Veras, 2011). Portanto, são fatores de risco
comuns e modificáveis, como dieta, sedentarismo e tabagismo que estão
na base das causas das principais doenças crônicas e explicam a maioria
das mortes decorrentes dessas doenças em homens e mulheres de todas
as idades (OMS, 2005).
Dentre as doenças crônicas destaca-se a doença renal crônica
(DRC)1, que emerge como um problema de saúde pública devido ao
crescimento do número de casos em todo o mundo e ao alto custo dos
tratamentos (Moreira, Fernandes, Monte, & Martins, 2008). Trata-se de
uma doença cujo tratamento é longo e para a qual ainda não foi

1
A doença renal crônica (DRC) anteriormente era chamada insuficiência renal
crônica (IRC), definida como a perda da função dos rins de forma progressiva e
irreversível. O termo DRC é mais abrangente, pois considera todos os pacientes
com alguma lesão renal, independente da taxa de filtração glomerular
(Warnock, 1997). Por isso, neste estudo será adotado o termo DRC.
22

descoberta uma cura. Essa patologia consiste em lesão renal e perda


progressiva e irreversível da função renal, em sua fase mais avançada os
rins não mais conseguem garantir a homeostase do corpo, ou seja, a
normalidade do meio interno. Uma vez que o sistema renal é
fundamental para a manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico e
metabólico do organismo (Flores & Thomé, 2004), a doença, quando
não controlada e tratada de forma inadequada pode levar a óbito, por
isso a exigência de um tratamento rigoroso (Fortes, 2000).
Os principais grupos de risco para o desenvolvimento da doença
são portadores de hipertensão arterial, de diabetes mellitus ou que
possuem história familiar da doença. Outros fatores são as
glomerulopatias, doença renal policística, doenças autoimunes,
infecções sistêmicas, infecções urinárias de repetição, litíase urinária,
uropatias obstrutivas e neoplasias (Brasil, 2006).
Inicialmente, após diagnóstico da DRC, o paciente realiza o
tratamento conservador, cujo objetivo é conservar as funções
remanescentes dos rins com a utilização de medicações e restrições
alimentares. Quando os tratamentos iniciais (não dialíticos) já não forem
eficazes, sendo detectada encefalopatia urêmica (disfunção cerebral),
pericardite (inflamação do pericárdio), acidose (elevada acidez do
sangue), insuficiência cardíaca ou concentração muito elevada de
potássio no sangue (hiperpotassemia), passa-se a considerar tratamentos
de substituição, como a diálise e o transplante de rim (Riella, 2010).
Estima-se que 40 indivíduos necessitam de terapia de
substituição renal por 100.000 habitantes no país (Brasil, 2004). De
acordo com o Censo de Diálise da Sociedade Brasileira de Nefrologia
(2013) referente ao ano de 2013 o total estimado de pacientes em
tratamento dialítico naquele ano era de 100.397, incluindo a hemodiálise
tradicional e os demais tipos de diálise. Desse total, 84% realizavam o
tratamento através do SUS (Sistema Único de Saúde) e 16% por outros
convênios. Estima-se que só em 2013 na região sul houve 5.249 novos
pacientes em diálise. A taxa de mortalidade anual foi de 17,9% em 2013
e o número estimado de óbitos em pacientes em diálise foi de 17.944 em
todo o Brasil.
Ainda de acordo com esse Censo, 62,6% dos pacientes em
diálise no país encontravam-se na faixa etária de 19 a 64 anos e 26,7%
na faixa de 65 a 80 anos. Quanto a sorologia positiva para Hepatite B, C
e HIV, estima-se que 1,4% dos pacientes apresentavam sorologia
positiva para hepatite B, 4,2% para hepatite C e 0,7% para HIV.
23

Por diálise entende-se o processo de extração dos produtos


residuais e do excesso de água do corpo. Os métodos de diálise
compreendem a hemodiálise e a diálise peritoneal. Na diálise peritoneal,
segundo Sorkin e Blake (2003), é infundido no interior da cavidade
abdominal um líquido composto de uma mistura especial de glicose e
sais responsável por retirar as substâncias tóxicas dos tecidos. Devido à
necessidade de repetidas punções abdominal para sua realização, na
década de 1960, a diálise peritoneal foi substituída pela hemodiálise
(Toporovski, 1990).
A hemodiálise é a extração do sangue do corpo, bombeando-o
para o interior de um aparelho que filtra as substâncias tóxicas,
devolvendo à pessoa o sangue purificado (Berkow & Beers, 2004). Essa
é a terapia de substituição renal mais utilizada, estima-se que ela é
realizada por 90% dos portadores de doença renal crônica (Ajzen &
Schor, 2005).
A frequência com que é realizada a diálise depende do nível da
função renal remanescente. Geralmente, o procedimento é realizado três
vezes por semana com duração de três a quatro horas por sessão. Sendo
assim, os pacientes em hemodiálise passam, em média, 40 horas
mensais ligados a uma máquina e monitorados por profissionais da
saúde. Devido à retirada rápida de liquido e eletrólitos do espaço
extracelular algumas complicações podem acontecer durante a
hemodiálise, dentre as mais frequentes estão: hipotensão, náuseas,
vômitos, taquicardia, vertigem e câimbras que geralmente ocorrem no
final da sessão (Smeltzer & Bare, 2002).
Um indivíduo inserido em um programa de diálise eficaz pode
manter uma dieta razoável, uma contagem de eritrócitos aceitável,
pressão arterial normal e não desenvolver qualquer lesão nervosa
(Riella, 2010). Porém, a disfunção renal somada à obrigatoriedade de
dependência da máquina de hemodiálise e dos profissionais envolvidos
no processo desestabiliza a vida do indivíduo (Trentini, Corradi, Araldi,
& Tigrinho, 2004).
Dessa maneira, além das limitações impostas pela doença renal
crônica os pacientes sofrem com um tratamento que, por vezes,
inviabiliza o desenvolvimento profissional, a interação social, atividades
de lazer e esportivas, entre outras (Nunes & Lautert, 2009). O stress
decorrente desse tipo de tratamento apresenta como consequências
frequentes a depressão e a negação da doença pelo paciente, refletindo
sua dificuldade em lidar com a nova condição de vida (Brasil, 2004).
Há ainda um custo social muito grande, referente a encargos
previdenciários, afastamentos precoces do mercado de trabalho, uma
24

vez que a maioria dos pacientes em tratamento dialítico integra a


população economicamente ativa do país. Portanto, são muito
importantes as repercussões psicológicas, sociais e de restrição da
qualidade de vida decorrentes da hemodiálise (Brasil, 2004).
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS) (1997) qualidade
de vida é a percepção que o indivíduo possui de sua vida, considerando
o contexto cultural e de valores em que ele vive e em relação aos seus
objetivos, expectativas, padrões e preocupações. É um conceito amplo
que é afetado de forma complexa pela saúde física da pessoa, seu estado
psicológico, nível de independência, relações sociais, crenças pessoais e
fatores ambientais.
Tem crescido, nas últimas décadas, o número de estudos e
pesquisas sobre o conceito de qualidade de vida devido aos avanços
tecnológicos na medicina e sistemas de saúde (Campolina & Ciconelli,
2006). A QV engloba diversos aspectos da vida humana, é considerada
um conceito multidimensional e que difere entre um autor e outro. Vale
ressaltar que a QV de um indivíduo somente pode ser avaliada por ele
mesmo (Santos & Pontes, 2007; Rezende & Porto, 2009).
Qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) é o termo que
vem sendo utilizado com o objetivo de focalizar aspectos da qualidade
de vida que são influenciados pelas doenças e/ou tratamentos (Birmelé,
Gall, Sautenet, Aguerre, & Camus, 2012). A avaliação da QVRS de
pessoas que vivem com doenças crônicas vem sendo estudada na área da
saúde e é um relevante indicador de saúde e bem-estar desses pacientes,
especialmente em situação de doenças crônicas nas quais a vida é
mantida por meio da tecnologia, como no caso dos pacientes submetidos
à hemodiálise (Liem, Bosch, Arends, Heijenbrok-Kal, & Hunink, 2007;
Lima, Fuzii, Pinho, Melo, & Hashimoto, 2010). A partir do
conhecimento de fatores que incidem de forma negativa na QVRS é
possível planejar intervenções que levem a um maior bem-estar dessa
população.
Por isso, a avaliação da qualidade de vida tornou-se muito
importante, especialmente para condições crônicas como a doença renal,
uma vez que as complicações do tratamento afetam a capacidade dos
pacientes para diversas funções e limitam seu estilo de vida.
Compreender como a doença afeta a vida cotidiana pode ajudar
pacientes e profissionais da saúde na tomada de decisões sobre as
modalidades de tratamento (Cagney et al., 2000). Portanto, as
informações acerca da qualidade de vida de indivíduos doentes
25

evidenciam o impacto que tem uma doença e um tratamento nas suas


vidas.
Estudar a qualidade de vida em relação à saúde constitui
atualmente um conceito fundamental para a atenção integral do paciente
com doença crônica. Isso porque as mudanças nas relações sociais,
familiares, laborais e no aspecto físico, decorrentes do tratamento de
hemodiálise, estão estreitamente relacionadas com o aparecimento de
transtornos emocionais nesses pacientes (Álvarez-Ude, Fernández-
Reyes, Vázquez, Mon, Sánchez, & Rebollo, 2001).
A condição de doente crônico, como o caso dos doentes renais
crônicos, faz com que os indivíduos modifiquem e construam maneiras
de representar e explicar a situação. Os aspectos ligados à doença, como
o físico, o psicológico, a qualidade de vida, interagem na formação de
sua representação. Essas representações são também derivadas dos
pensamentos e explicações que veiculam na sociedade e são elas que
guiarão as ações do indivíduo no que diz respeito à doença, como a
maneira de lidar com o tratamento, por exemplo.
Nesse sentido, as representações sociais (RS) - conjunto de
conceitos, afirmações e explicações originadas no dia a dia, durante a
comunicação e cooperação entre os indivíduos e grupos (Moscovici,
2003) - permitem a apreensão dos processos e mecanismos por meio dos
quais os indivíduos constroem o conhecimento acerca da doença,
auxiliando na compreensão das estratégias de enfrentamento à condição
crônica. Portanto, é de grande relevância a realização de pesquisas
visando melhorar a compreensão das representações sociais da DRC e
sua relação com a qualidade de vida.
Contudo, foram encontradas poucas pesquisas relacionando a
QV às representações sociais dos pacientes hemodialisados sobre o
tratamento e a doença no levantamento bibliográfico realizado pela
pesquisadora. Essa compreensão é imprescindível, pois resulta em
contribuições para o subsídio de uma estruturação adequada do sistema
de saúde no que se refere a prestar uma assistência integral aos pacientes
renais crônicos em hemodiálise. A relevância científica deste estudo,
portanto, está em contribuir para o avanço nos estudos relacionados a
esse tema, contribuindo para o incremento do conhecimento científico já
existente. A partir dessas considerações sobre o tema emerge a seguinte
pergunta de pesquisa: Qual a relação das representações sociais da
doença renal crônica e da hemodiálise com a qualidade de vida dos
pacientes submetidos a esse tratamento?
26
27

2 OBJETIVOS

2.1 Objetivo Geral

 Identificar a relação entre as representações sociais da doença


renal crônica e da hemodiálise e a qualidade de vida em saúde
de pacientes hemodialisados.

2.2 Objetivos Específicos

 Identificar as representações sociais dos participantes sobre a


doença renal crônica.
 Identificar as representações sociais dos participantes sobre a
hemodiálise.
 Investigar a qualidade de vida em saúde dos participantes.
 Caracterizar a relação entre as representações sociais da doença
renal crônica e da hemodiálise com a qualidade de vida em
saúde.
28
29

3 REVISÃO DE LITERATURA

3.1 Doença renal crônica

Muitas das doenças crônicas estão ligadas ao envelhecimento da


sociedade, bem como a estilos de vida, tabagismo, sedentarismo,
consumo de álcool, relações sexuais desprotegidas, dieta inadequada,
além da predisposição genética (Veras, 2011). Portanto, fatores de risco
comuns e modificáveis, como dieta, sedentarismo e tabagismo, estão na
base das causas das principais doenças crônicas e explicam a maioria
das mortes decorrentes dessas doenças em homens e mulheres de todas
as idades (OMS, 2005).
Outros fatores que contribuem para a ocorrência de doenças
crônicas são a dificuldade de acesso a serviços de saúde de qualidade,
incluindo prevenção clínica, serviços de diagnóstico e medicamentos
essenciais. Essas doenças podem ser basicamente prevenidas e
detectadas precocemente por meio de mudanças nos hábitos alimentares
e adoção de estilo de vida saudável, triagem de fatores de risco ou
manifestações precoce de doenças, tratamento de lesões precursoras ou
tratamento precoce da doença e intervenções farmacológicas (Brasil,
2008).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (2011) as doenças
crônicas têm em comum o fato de persistirem por longo período e
necessitarem de cuidados permanentes. Elas são a maior causa de morte
no mundo, o que é preocupante e constitui sério desafio para os atuais
sistemas de saúde no que se refere à eficiência e efetividade em suprir as
demandas iminentes. Além disso, as doenças crônicas resultam em
sérias consequências econômicas e sociais e ameaçam os recursos da
saúde em cada país.
A vida do paciente também sofre repercussões da doença
crônica, implicando transformações relacionadas ao autoconceito,
resultando em mudanças que requerem energia para aceitação e
adaptação a nova vida. Na esfera psicológica podem ocorrer alguns
impactos, com a emergência de emoções negativas, como ansiedade e
depressão. Existem vários fatores determinantes na adaptação a doença
crônica, como características da personalidade, mecanismos de
enfrentamento utilizados, autoconceito e auto-imagem, experiência
prévia com a doença e relacionamento com os profissionais da saúde
(Nobre, Pierin, & Mion Jr., 2001).
30

Insuficiência renal crônica (IRC) ou doença renal crônica


(DRC) é o nome dado a uma disfunção renal, onde os rins não são mais
capazes de exercer as suas funções. A doença renal crônica é uma
doença que afeta os rins, ocasionando a diminuição progressiva de seu
funcionamento. Em situação normal, ele filtra o sangue e elimina os
produtos finais do metabolismo proteico, preservando solutos
específicos, proteínas (principalmente albumina) e componentes
celulares (Bastos & Kirsztajn, 2011). Dessa forma, a diminuição
progressiva da função renal implica em comprometimento de todos os
outros órgãos. Quando não controlada e tratada de forma adequada pode
levar a ocorrência de óbito, por isso a exigência de um tratamento
rigoroso (Fortes, 2000).
O risco de desenvolver a doença é considerado médio para
crianças com menos de cinco anos, adultos com mais de sessenta anos,
mulheres grávidas e indivíduos que apresentam enfermidades
sistêmicas, infecções urinárias de repetição, litíase urinária repetida ou
uropatia (Romão Júnior, 2004). Embora alguns fatores étnicos raciais
afetem a prevalência de algumas doenças que acarretam o colapso renal,
como a virulência e a hipertensão em homens negros e a incidência de
diabetes entre judeus, em geral, a prevalência do colapso renal no
mundo e no Brasil persiste nos mesmos índices (Romão Júnior, 2003).
Os doentes apresentam, na maioria das vezes, evolução
progressiva, insidiosa e assintomática até o momento em que a doença
atinge seu estágio avançado, dificultando o diagnóstico precoce que
poderia resultar na redução do sofrimento dos pacientes e dos custos
financeiros associados à doença. Esse curso frequentemente
assintomático da DRC resulta na busca de cuidados médicos por parte
do paciente quando já apresenta uma ou mais complicações da doença
e/ou comorbidades (Romão Júnior, 2004). O encaminhamento tardio
dos pacientes para o especialista está associado a pior condição clínica,
maior custo do tratamento inicial, maior morbidade das intercorrências e
mortalidade aumentada (Brasil, 2004).
Em um estudo McLaughlin, Manns, Culleton, Donaldson e
Taub (2001) concluíram que doentes renais crônicos que iniciam a
terapia renal substitutiva (TRS) tardiamente têm aumentado a
morbidade, mortalidade e custos de saúde. Já o encaminhamento
precoce resultou em redução de custos e melhoria da sobrevida do
paciente, além de menos tempo de internamento hospitalar. Esses
achados enfatizam a importância do diagnóstico precoce, que pode ser
facilitado pelo encaminhamento ao médico nefrologista por outros
31

profissionais de saúde, especialmente cardiologistas, endocrinologistas,


clínicos gerais, urologistas e geriatras, que lidam frequentemente com
pacientes em risco de desenvolver a doença.
O diagnóstico da doença renal crônica pode ser realizado com
exames de sangue e de urina. O sangue torna-se moderadamente ácido
(acidose) e apresenta acúmulo de ureia e creatinina, produtos
metabólicos de excreção que normalmente são filtrados pelos rins. A
concentração de cálcio e de vitamina D diminui e a de fosfato aumenta;
a concentração de potássio no sangue é normal ou apenas ligeiramente
aumentada, podendo tornar-se perigosamente alta. O volume de urina
tende a permanecer estável independente da quantidade de líquidos
consumidos e, em geral, o indivíduo apresenta anemia moderada
(Berkow & Beers, 2004).
Nos pacientes com DRC o estágio da doença deve ser
determinado com base no nível de função renal. Geralmente a função
renal é determinada por exames laboratoriais que avaliam a taxa de
filtração glomerular (FG), definida como o volume plasmático de uma
substância que pode ser completamente filtrada pelos rins em
determinada unidade de tempo. O nível da FG varia com a idade, sexo, e
massa muscular. A FG diminui com a idade. Uma taxa de FG menor que
60mL/min/1,73m² representa diminuição de cerca de 50% da função
renal (Bastos, Bregman, & Kirsztajn, 2010).
Alguns fatores de risco estão relacionados com declínio na taxa
de filtração glomerular com rápida evolução, são eles: controle
glicêmico ineficiente, hipertensão arterial, maior proteinúria (perda
excessiva de proteínas através da urina), hipoalbuminemia (diminuição
dos teores de albumina no sangue), dislipidemia (níveis elevados ou
anormais de lipídios e/ou lipoproteínas no sangue) e tabagismo (Brasil,
2006). Para efeitos clínicos, didáticos e conceituais a DRC é dividida
em seis estágios funcionais, de acordo com Romão Júnior (2004), são
eles:
 Fase de função renal normal sem lesão renal: importante do
ponto de vista epidemiológico, pois inclui os chamados
grupos de risco (hipertensos, diabéticos, parentes de
hipertensos, diabéticos e portadores de DRC, etc.), que ainda
não desenvolveram lesão renal.

 Fase de lesão com função renal normal: corresponde às fases


iniciais de lesão renal com filtração glomerular preservada,
32

ou seja, o ritmo de filtração glomerular está acima de 90


ml/min/1,73m2.

 Fase de insuficiência renal funcional ou leve: ocorre no


início da perda de função dos rins, quando os níveis de ureia
e creatinina plasmáticos ainda são normais, não há sinais ou
sintomas clínicos importantes de insuficiência renal e
somente métodos acurados de avaliação da função do rim
(métodos de depuração, por exemplo) irão detectar estas
anormalidades. Os rins conseguem manter razoável controle
do meio interno. Compreende a um ritmo de filtração
glomerular entre 60 e 89 ml/min/1,73m2.

 Fase de insuficiência renal laboratorial ou moderada: nesta


fase, ainda que os sinais e sintomas da uremia possam estar
presentes de maneira discreta, o paciente mantém-se
clinicamente bem. Na maioria das vezes, apresenta somente
sinais e sintomas ligados à causa básica (lupus, hipertensão
arterial, diabetes mellitus, infecções urinárias, etc.).
Avaliação laboratorial simples já nos mostra, quase sempre,
níveis elevados de ureia e de creatinina plasmáticos.
Corresponde a uma faixa de ritmo de filtração glomerular
compreendido entre 30 e 59 ml/min/1,73m2.

 Fase de insuficiência renal clínica ou severa: o paciente já se


ressente de disfunção renal. Apresenta sinais e sintomas
marcados de uremia. Dentre estes a anemia, a hipertensão
arterial, o edema, a fraqueza, o mal-estar e os sintomas
digestivos são os mais precoces e comuns. Corresponde à
faixa de ritmo de filtração glomerular entre 15 a 29
ml/min/1,73m2.

 Fase terminal de insuficiência renal crônica (IRC): como o


próprio nome indica, corresponde à faixa de função renal na
qual os rins perderam o controle do meio interno, tornando-
se este bastante alterado para ser incompatível com a vida.
Nesta fase, o paciente encontra-se intensamente sintomático.
Suas opções terapêuticas são os métodos de depuração
artificial do sangue (diálise peritoneal ou hemodiálise) ou o
33

transplante renal. Compreende a um ritmo de filtração


glomerular inferior a 15 ml/min/1,73m2.

As condições que ocasionam a diminuição da função renal


devem ser corrigidas o mais rápido possível. Essas ações incluem a
correção dos desequilíbrios de sódio, de água e ácido-básicos, a
remoção de substâncias tóxicas dos rins, o tratamento da insuficiência
cardíaca, da hipertensão arterial, das infecções, da concentração elevada
de potássio no sangue (hipercalemia) ou de cálcio (hipercalcemia) e de
qualquer obstrução do fluxo urinário (Bastista & Santos, 2003).
Durante o curso da insuficiência renal, as alterações da sede
normalmente determinam a quantidade de água consumida.
Eventualmente o consumo de água é restringido com a finalidade de
impedir a excessiva diminuição da concentração de sódio no sangue. O
consumo de sal (sódio) é limitado quando há acumulação de líquidos
nos tecidos (edema) ou hipertensão arterial. Os alimentos ricos em
potássio devem ser evitados, pois a alta concentração dessa substância
no sangue aumenta o risco de arritmias e de parada cardíaca (Berkow &
Beers, 2004).
Batista e Santos (2003) referem que dar atenção especial à dieta
auxilia no controle da acidose e das concentrações elevadas de potássio
e de fosfato no sangue. Uma dieta pobre em proteínas (0,4 a 0,8 g por
quilo de peso corpóreo ideal) pode retardar a velocidade da progressão
da doença a uma fase terminal, quando passa a ser
necessária a instituição de um tratamento de substituição dos rins ou a
realização de um transplante.
Além das restrições dietéticas quando a insuficiência renal
causa disfunção cerebral, inflamação do pericárdio, acidez elevada do
sangue, insuficiência cardíaca ou uma concentração muito elevada de
potássio no sangue não responsiva a outros tratamentos, é necessário
iniciar o tratamento de diálise. A diálise é um processo de remoção de
produtos da degradação metabólica e do excesso de água do organismo.
Existem dois métodos de diálise: a hemodiálise e a diálise peritoneal
(Riella, 2010).
Dentre os métodos terapêuticos existentes para o tratamento da
doença renal crônica, o mais adequado e com menor custo operacional é
o transplante renal, porém, a dificuldade de obtenção de rins para sua
viabilização e o reduzido número de centros transplantadores capazes de
realizá-lo, faz com que grande parte dos doentes se submeta ao
34

tratamento dialítico para a manutenção da vida. A hemodiálise é o


tratamento mais utilizado, estima-se que 90% dos portadores de doença
renal crônica realizam hemodiálise como terapia de substituição renal
(Ajzen & Ascor, 2005). Cada tratamento possui suas peculiaridades e a
escolha do método dialítico é feita inicialmente por indicação médica, a
partir da avaliação das condições clínicas do paciente (Romão Júnior et
al., 2003).

3.2 Hemodiálise

Na hemodiálise, o sangue é removido do corpo e bombeado até


um aparelho que retira as substâncias tóxicas do organismo e, em
seguida, devolve o sangue purificado ao indivíduo (Romão Júnior &
Abensur, 1997). Na diálise peritoneal, é realizada a infusão no interior
da cavidade abdominal de um líquido contendo uma mistura especial de
glicose e sais que retira as substâncias tóxicas dos tecidos. Em seguida,
o líquido é retirado da cavidade abdominal e descartado (Sorkin &
Blake, 2003).
Não há, na literatura médica, um momento estipulado para
iniciar a hemodiálise, é o julgamento clínico que o define para cada
caso. Porém, há indicações para que seja prescrita nos casos em que o
pacientes apresentarem uma taxa de filtração glomerular (TFG) inferior
a 15 ml/min/1,73m2 (Rocco & Moossavi, 2011) ou os fatores descritos
anteriormente. Alguns requisitos devem ser observados antes do início
da hemodiálise, como a obtenção de uma via de acesso à circulação
sanguínea, utilização de equipamentos específicos manuseados por
profissionais especializados e uma adequada infraestrutura. Para facilitar
o acesso à corrente sanguínea é efetuada cirurgicamente uma ligação
artificial entre uma artéria e uma veia (fístula arteriovenosa), assim
garante-se que as punções com as agulhas de hemodiálise possam
ocorrer sem complicações (Berkow & Beers, 2004).
O acesso por meio da fístula arteriovenosa é considerado o mais
seguro e duradouro, porém necessita de tempo para maturação e em
alguns casos é um procedimento difícil, principalmente em pacientes
com veias de pequeno calibre ou profundas, em pacientes com múltiplas
punções venosas em decorrência de lesão vascular e em paciente idosos
(Smeltzer & Bare, 2002). As punções repetidas, com o tempo, acarretam
o desenvolvimento de aneurismas, caracterizados pela dilatação dos
vasos. Além disso, podem acontecer sérios hematomas devido ao erro
35

da punção (Mendes & Shiratori, 2002), pois são usadas agulhas


extremamente calibrosas nas sessões de hemodiálise.
A frequência com que é realizada a diálise depende do nível da
função renal remanescente. Geralmente, o procedimento é realizado três
vezes por semana com duração de três a quatro horas por sessão (Barros,
1999). Sendo assim, os pacientes em hemodiálise passam, em média, 40
horas mensais ligados a uma máquina e monitorados por profissionais
da saúde. Devido à retirada rápida de líquido e eletrólitos do espaço
extracelular algumas complicações podem acontecer durante a
hemodiálise, dentre as mais frequentes estão: hipotensão, náuseas,
vômitos, taquicardia, vertigem e câimbras que geralmente ocorrem no
final da sessão (Smeltzer & Bare, 2002). Não há previsão do tempo em
que o paciente permanecerá em tratamento, sendo que a alta pode
ocorrer pela troca de modalidade, por exemplo, da hemodiálise para a
diálise peritoneal ou pela realização de transplante renal.
Além da dependência da máquina e da equipe de saúde, o
tratamento exige que o paciente se submeta a um horário rígido,
restrição alimentar e do consumo de água. Devido ao tratamento o corpo
passa a possuir cicatrizes decorrentes das fístulas, cateteres, exames e
cirurgias, a pele fica pálida e seca e manchas hemorrágicas e múltiplas
podem surgir. Os medicamentos podem provocar acúmulo de líquidos,
resultando em inchaço, também a anorexia, a presença de toxinas
urêmicas, distúrbios gastrointestinais e alterações metabólicas podem
contribuir na alteração do corpo desse paciente (Daugirdas, Blake, &
Ing, 2003). Quintana e Muller (2006) salientam que essas novas
características corporais significam para os pacientes provas visíveis que
são portadores da DRC, o que os diferencia dos demais.
Conforme Pilger, Rampari, Waidman e Carreira (2010), o
tratamento hemodialítico e a progressão da doença renal crônica
acarretam prejuízos e limitações no que se refere à saúde mental, física,
interação social e bem-estar dos pacientes. Isso porque o paciente deve
adequar sua rotina ao horário da hemodiálise, independentemente do dia
da semana, feriados ou comemorações festivas, sendo muitas vezes
necessário deixar de fazer viagens e alterando sua vida como um todo.
Um fator que interfere no tratamento da doença é a adesão,
considerada o grau em que o comportamento do paciente concorda com
as prescrições médicas referentes a dietas, medicações, frequência às
consultas e outras orientações. A adesão é fundamental para o sucesso
da terapia, porém, aderir não significa apenas obedecer às prescrições
médicas, e sim entender, concordar e segui-las; um processo pelo qual
36

médico e paciente são corresponsáveis (Nobre, Pierin, & Mion Jr,


2001).
Frequentemente a não adesão ao tratamento acarreta
consequências negativas, como desorganizar ou negativar os possíveis
benefícios do processo terapêutico, intensificar ou prolongar os sintomas
da doença, comprometer a avaliação médica no que se refere à qualidade
de um tratamento ou à resposta do paciente a ele, provocar angústia e
danos ao paciente, desperdício de medicamentos, entre outros. A má
comunicação entre a equipe de saúde e o paciente, má organização do
serviço de saúde, custo e dificuldade de acesso aos medicamentos, o tipo
do tratamento e aspectos sociais e culturais que influenciam na
compreensão e aceitação das informações recebidas podem ser
consideradas razões para o não cumprimento das prescrições médicas
(Marin, Luiza, Osório-de-Castro, & Machado-dos-Santos, 2003).
Uma proporção significativa de pacientes que realizam
hemodiálise apresenta dificuldade em aderir às prescrições terapêuticas,
que compreendem controle de peso interdialítico (entre uma sessão de
hemodiálise e outra), restrições dietéticas e hídricas, além de tratamento
medicamentoso para controlar os sintomas causados pelas doenças
associadas à DRC (Maldaner, Beuter, Brondani, Budó, & Pauletto,
2008). É importante salientar que a adesão ao tratamento da DRC
favorece, ao paciente, uma sessão de hemodiálise com menor risco de
intercorrências, além da manutenção e incremento do bem-estar físico,
psicológico e social.
Considerando os elevados indicadores de morbidade e
mortalidade por complicações evitáveis decorrentes da DRC, a adesão
ao tratamento é um tema discutido e estudado por alguns autores
(Camargo-Borges & Japur, 2008; Maldaner, Beuter, Brondani, Budó, &
Pauletto, 2008; Moreira, Fernandes, Monte, & Martins, 2008; Kim,
2009; Madeiro, Machado, Bonfim, Braqueais, & Lima, 2010; Bel,
2013).
A questão da adesão ao tratamento é complexa, pois é
influenciada por diversos fatores relacionados ao paciente, à doença, ao
tratamento, ao relacionamento com os profissionais de saúde e com a
própria instituição. As pesquisas acerca dos determinantes da adesão são
importantes para o desenvolvimento de estratégias para seu incremento
(Nobre, Pierin, & Mion Jr., 2001). Maldaner, Beuter, Brondani, Budó e
Pauletto (2008) identificaram nove fatores que, associados entre si,
influenciam a adesão ao tratamento de doenças crônicas, são eles:
confiança na equipe, redes de apoio, aceitação da doença, nível de
37

escolaridade, efeitos colaterais, complexidade do esquema terapêutico,


falta de acesso a medicamentos, tratamento longo e ausência de
sintomas.
Estudo de Moreira, Fernandes, Monte e Martins (2008) acerca
da adesão ao tratamento farmacológico da doença renal crônica apontou
a falta de acesso aos medicamentos como a principal causa de baixo
índice de adesão naquela amostra, seguido de esquecimento e ocorrência
de reações desagradáveis. É importante ressaltar que a baixa adesão está
frequentemente relacionada com falhas do tratamento. Dessa maneira, é
necessário elaborar e padronizar estratégias para que a adesão ao
tratamento aumente, caso contrário, os investimentos em pesquisas,
tecnologias e desenvolvimento de novos medicamentos poderão ser
perdidos (Teixeira & Silva, 2008).
A relação do médico com o paciente é de extrema importância
no processo de adesão ao tratamento e pode ser considerada a base de
sustentação para sua efetividade. Oliveira e Gomes (2004) estudaram a
comunicação médico-paciente e a adesão ao tratamento em adolescentes
portadores de doenças crônicas e concluíram que a qualidade da
comunicação está relacionada com a qualidade da adesão desses
sujeitos, portanto, a comunicação efetiva entre médico e paciente
favorece a adesão ao tratamento. Nessa perspectiva, de acordo com
Nobre, Pierin e Mion Jr. (2001) as mudanças de hábitos de vida e
culturais exigidas pelos tratamentos de doenças crônicas demandam
determinação não só do paciente, mas também da equipe de saúde.
Ainda que a adesão ao tratamento seja um aspecto
relevante intrínseco a hemodiálise, o foco desse estudo é o significado
desse tratamento para os pacientes. Embora a adesão à hemodiálise não
seja, portanto, objeto de investigação dessa pesquisa, é um assunto que
permeia estudos acerca de tratamentos, principalmente aqueles que se
referem a alguma doença crônica, seja Aids, diabetes, hipertensão ou
doença renal, por exemplo.
Embora não existam resultados conclusivos da influência dos
fatores emocionais na morbidade e mortalidade dos pacientes renais
crônicos, estudos indicam que a depressão está associada com maior
risco de mortalidade (Kellerman, Christensen, Baldwin, & Lawton,
2010), pois resulta na diminuição da imunidade, negligência com os
cuidados pessoais, baixa adesão aos tratamentos e dietas e maior
probabilidade de abuso e dependência de álcool e drogas (Zimermann,
Carvalho, & Mari, 2004).
Um estudo produzido no Brasil por Almeida e Meleiro (2000)
indica prevalência de 5 a 22% de depressão na doença renal crônica, e
38

aponta que a maioria dos pacientes desenvolveu esse quadro quando já


apresentava a doença, mas ainda não havia iniciado o tratamento, ou
seja, após receber o diagnóstico. Esses resultados apontam para a
importância da assistência psicológica no período entre o diagnóstico e
o início do tratamento dialítico (Bastos & Kirsztajn, 2011).
A depressão está ligada ainda a mortalidade por suicídio,
predominantemente no sexo masculino, estudos revelam uma taxa de 10
a 400 vezes maior de suicídio na população com doença renal crônica
em relação à população geral (Almeida & Meleiro, 2000). Martiny,
Silva, Neto e Nardi (2011) realizaram estudo sobre os fatores associados
ao risco de suicídio em pacientes em hemodiálise, entre os achados a
religião aparece como fator de proteção, pois na amostra estudada o
risco de suicídio foi aproximadamente oito vezes maior entre aqueles
que se declararam sem religião. No entanto, observou-se que, se, por um
lado, o paciente religioso apresentou menor risco, este efeito foi anulado
pelo fator depressão que, quando controlado nesta população específica,
reduziu efetivamente o risco de suicídio.
Outro estudo sobre a avaliação da depressão, ideação suicida e
estratégias de enfrentamento em hemodialisados na Turquia,
corroborando com a pesquisa supracitada, concluiu que pacientes em
hemodiálise frequentemente apresentam depressão. Foi constatado,
ainda, que a ideação suicida aumentou com o avanço da idade e da
gravidade da depressão. Portanto, considera-se necessário que pacientes
em diálise estejam regularmente sob avaliação psiquiátrica (Keskin &
Engin, 2011).
Bastos et al. (2004) sugerem três ações principais para a
solução dos problemas relativos à DRC, são elas: diagnóstico precoce,
encaminhamento imediato para acompanhamento especializado e
identificação e correção das principais complicações e comorbidades,
bem como preparo do paciente e seus familiares para a terapia de
substituição renal. O sucesso do tratamento dos pacientes renais
crônicos em terapia de substituição renal, como a hemodiálise, depende
da qualidade do controle clínico ao longo da evolução da doença.
Infelizmente constata-se que, mesmo nos melhores sistemas de saúde do
mundo, a doença renal crônica é subdiagnosticada e tratada
inadequadamente, ainda que venha crescendo o número de alternativas
terapêuticas para redução da velocidade de perda funcional, das
complicações e das comorbidades da DRC.
O prolongamento da vida do paciente em decorrência da
utilização de novas técnicas de tratamento também não significa
39

melhora na qualidade de vida deles. A hemodiálise é necessária e


indispensável, porém não é suficiente para se obter qualidade de vida
satisfatória (Trentini, Corradi, Raposo, & Camila, 2004). A DRC
acarreta mudanças no estilo de vida dos pacientes (Cagney et al., 2000)
e o tratamento dialítico ocasiona limitações físicas, sexuais,
psicológicas, familiares e sociais, que podem afetar a qualidade de vida.
As mudanças atingem também os familiares, que necessitam ajustar a
rotina diária às necessidades de apoio ao familiar doente renal crônico
em tratamento. É comum que os pacientes em hemodiálise expressem
sentimentos negativos, por exemplo, medo do prognóstico, da
incapacidade, da dependência econômica e da alteração da autoimagem
(Silva, Silveira, Fernandes, Lunardi, & Backes, 2011).
Numa fase inicial é a dimensão biológica que sofre os
transtornos mais consideráveis, ameaçando os sistemas cardiovascular,
gastrintestinal, epitelial, muscular e esquelético (Parfrey, Vasavour,
Henry, Bullock, & Gault, 1988). Devido à deteriorização músculo-
esquelética esses pacientes geralmente apresentam envelhecimento
precoce, além de descoloração da pele, emagrecimento e edema
(Trentini, Corradi, Raposo, & Camila, 2004). Dentre as mudanças na
rotina de vida dos sujeitos, pode-se citar: restrições alimentares e
hídricas, incapacidade ou limitação das atividades profissionais, físicas e
de lazer (Silva, Silveira, Fernandes, Lunardi, & Backes, 2011).
Diante disso, é foco desse estudo investigar qual o significado
da doença renal crônica e da hemodiálise para as pessoas que vivem sob
esta condição e são submetidas a esse tratamento, a partir da fala desses
pacientes. De acordo com o conhecimento dos conceitos que permeiam
o cotidiano destes indivíduos, acredita-se ser possível refletir sobre as
implicações das RS da doença e da hemodiálise nesse tratamento
médico.

3.3 Qualidade de vida

A Organização Mundial de Saúde (OMS) define como


qualidade de vida (QV) a percepção do indivíduo sobre sua posição na
vida, dentro do contexto dos sistemas de cultura e valores no qual se
encontra inserido e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões
e preocupações. É um conceito amplo, influenciado de forma complexa
pela saúde física da pessoa, estado psicológico, nível de independência,
relações sociais, crenças pessoais e sua relação com características
marcantes do ambiente (OMS, 1997). A partir dessa concepção, pode-
se considerar que o conceito de QV evoluiu do cuidado pessoal com a
40

saúde e boa forma física para a preocupação com higiene e saúde


pública, incluindo os direitos humanos, o acesso a bens materiais e,
finalmente, numa preocupação com a vida cotidiana e social dos
indivíduos, incluindo a sua saúde (Fuhrer, 2000).
Foi no início da década de 90 que parece ter se consolidado um
consenso entre os estudiosos da área quanto aos aspectos da
subjetividade e multidimensionalidade inerentes a QV. No que se refere
à subjetividade, trata-se de considerar a percepção da pessoa sobre o seu
estado de saúde e sobre aspectos não-médicos da vida. Ou seja, a
avaliação do indivíduo sobre sua situação pessoal em cada uma das
dimensões relacionadas à qualidade de vida. Quanto à
multidimensionalidade está relacionada ao reconhecimento de que o
construto é composto por diferentes dimensões. Pesquisas científicas
têm buscado identificar essas dimensões, em estudos empíricos, usando
metodologias qualitativas (Bowling, 1995) e quantitativas (WHOQOL-
Group,1998; Smith, Avis, & Assmann, 1999). Portanto, o conceito de
QV é multidimensional, possui componentes objetivos e subjetivos
passíveis de avaliação.
Os fatores que influenciam a QV têm sido agrupados em bem-
estar físico, capacidade funcional, bem-estar psicológico, bem-estar
espiritual e capacidade financeira. O domínio físico está relacionado
basicamente com os sintomas ou tratamento de uma doença (Haan,
Aaronson, Limburg, Hewer, & van Crevel, 1993). A capacidade
funcional está relacionada com o auto-cuidado, a mobilidade, o nível de
atividade física e a capacidade de estabelecer relações familiares ou no
trabalho. O domínio psicológico diz respeito ao estado emocional, à
capacidade cognitiva, à percepção de saúde, de bem-estar, de satisfação
com a vida. A função social compreende a avaliação quantitativa e
qualitativa de aspectos sociais e sua interação (Ribeiro, 1994.).
O termo qualidade de vida utilizado na literatura médica parece
não ter um único significado. Conceitos como “estado de saúde”,
“estado funcional”, “condições de saúde”, “funcionamento social” e
“qualidade de vida” têm sido usados como sinônimos (Patrick &
Bergner, 1990; Guyatt, Feeny, & Patrick, 1993). De acordo com
Bullinger, Anderson, Cella e Aaronson (1993) o termo “qualidade de
vida” é mais geral, compreende uma variedade de condições que podem
afetar a percepção do indivíduo, seus sentimentos e comportamentos
relacionados com seu funcionamento diário, abrangendo, mas não se
limitando, a condição de saúde e as intervenções médicas.
41

Anteriormente aos anos 90, na avaliação de terapias médicas os


principais fatores observados eram a melhora nos resultados clínicos, a
cura e a sobrevivência dos pacientes. No entanto, o esforço mundial para
conter o aumento dos custos com cuidados de saúde e o advento de
melhores resultados em tratamentos médicos sublinharam a importância
de considerar aspectos do paciente, como relacionados com a QV
(Litwin, 2006).
Nesse sentido, também os objetivos da atenção à saúde
passaram a se relacionar mais com melhoria da vida dos pacientes do
que simplesmente com a “cura” da doença (Bowling & Brazier, 1995;
Ebrahim, 1995). Para Kawakame e Miydahira (2005) a QV vem sendo
considerada uma meta para a medicina e a área da saúde devido a essa
mudança no objetivo principal do sistema de saúde, do controle e cura
das doenças para a melhoria da QV das pessoas.
Podem-se identificar duas tendências quanto à conceituação do
termo QV na área de saúde, QV como um conceito mais genérico e
qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS), em inglês, health-
related quality of life. O termo QV é mais amplo, aparentemente
influenciado por estudos sociológicos, sem relação com disfunções ou
agravos (Seidl & Zannon, 2004). Já o termo QVRS está relacionado
mais diretamente às enfermidades ou intervenções em saúde (Seidl &
Zannon, 2004) e por isso será focalizado nesse estudo.
A QVRS pode ser definida como os aspectos da experiência
subjetiva relacionada com a saúde, das doenças, incapacidades e
limitações, como se fosse a diferença entre as expectativas de saúde e a
experiência dela (Rapley, 2003). A QVRS é principalmente aplicada às
doenças crônicas, nas quais os objetivos dos tratamentos compreende a
melhoria na qualidade de vida dos pacientes, apesar da doença, dos
sintomas, limitações e incapacidade (Bech, 1993). De acordo com
Leplège e Hunt (1997) o conceito de QVRS fundamenta-se na
perspectiva de que o doente crônico, ao lidar com a doença, pode fazer
adaptações na sua vida em vista da preservação do bem-estar. Assim,
uma pessoa em tratamento de uma doença crônica poderia avaliar seu
bem-estar como bom, apesar das limitações.
A avaliação da QVRS busca compreender como as
complicações de doenças e tratamentos afetam a vida dos pacientes
(Ribeiro, 1994). Por isso, a QVRS é uma das principais variáveis
comumente estudadas em pesquisas no campo de tratamentos médicos.
É importante ressaltar que as interpretações contemporâneas da QVRS
são baseadas na definição de saúde da Organização Mundial da Saúde
42

como um estado de completo bem-estar mental, física e social, e não


meramente a ausência de doença (Litwin, 2006).
Durante as duas últimas décadas, o interesse em estudar os
resultados centrados no paciente levou ao desenvolvimento de um
conjunto de métodos rigorosos para a medição da QVRS. No âmbito da
saúde coletiva e das políticas públicas para a saúde, por exemplo, houve
um crescente interesse pela avaliação da QVRS. Essas informações são
indicadores para avaliação da eficácia, eficiência e impacto de
determinados tratamentos e permitem a comparação entre
procedimentos para o controle de problemas de saúde (Kaplan, 1995).
A avaliação da QVRS é feita por meio da opinião do sujeito
avaliado e não segundo os preceitos do avaliador. Dessa maneira, o
indivíduo é incentivado a ter um papel central na tomada de decisões
que dizem respeito a sua saúde. Assim, a opinião que cada pessoa tem
do seu estado de saúde é fundamental, sendo este um indicador
recomendado pela OMS para a avaliação do estado de saúde das
populações (WHOQOL Group, 1998).
Quer se utilize indicadores objetivos quer utilize indicadores subjetivos,
a avaliação da QV e da QVRS requer rigor na operacionalização e uma
metodologia rigorosa para quantificar a realidade. É possível distinguir
duas grandes categorias de medidas: as gerais/globais e as específicas.
Os instrumentos gerais devem avaliar a função física e ocupacional, a
função psicológica, interação social e sintomas somáticos, com o
objetivo de serem aplicados na população em geral. Já os instrumentos
específicos devem ser adaptados a uma determinada doença ou
tratamento, portanto não têm a finalidade de serem aplicados em
qualquer sujeito (Schipper, Chinch, & Powell, 1990). Como exemplo de
instrumentos genéricos tem-se o World Health Organization Qualityof
Life (WHOQOL-100 ou WHOQOL-BREF), o qual será utilizado nesse
estudo.
Uma mensuração válida e confiável da QVRS é um dado que
pode ajudar pacientes e profissionais na tomada de decisões sobre as
modalidades de tratamento e é também um componente importante para
o avanço no desenvolvimento do tratamento de doenças (Patrick &
Erickon, 1993). Além disso, medidas do estado de saúde da população
podem ser usadas para a análise e formulação de políticas e para fins de
comparações normativas com outras áreas geográficas (Patrick &
Bergner, 1990).
Diversas pesquisas científicas foram realizadas no Brasil e em
outros países com o objetivo de avaliar a qualidade de vida de pacientes
43

submetidos à hemodiálise (Cruz, Andrade, Urrutia, Draibe, Nogueira-


Martins, & Sesso, 2011; Ferreira & Silva Filho, 2011; Silva, Araujo,
Perez, & Souza, 2011; Grincenkov, Fernandes, Chaoubah, Bastos,
Qureshi, Pécoits-Filho, Divino Filho, & Bastos, 2011; Birmelé, Gall,
Sautenet, Aguerre & Camus, 2012; Guerra-Guerrero, Sanhueza-
Alvarado & Cáceres-Espina, 2012; Abraham, Venu, Ramachandran,
Chandran, & Raman, 2012; Cavalcante et al., 2013).
Essas pesquisas indicaram que, no geral, a percepção de QV de
pacientes em hemodiálise é baixa, remetendo ao processo de tratamento
e suas implicações na vida dos indivíduos. Diante do exposto, pode-se
considerar que a avaliação da QV resulta em informações úteis que
instrumentalizam as equipes de saúde, familiares e pacientes. É,
portanto, de grande interesse que sejam incrementadas pesquisas
voltadas à avaliação da QV desses pacientes e que essa avaliação possa
auxiliar na compreensão do significado da doença e do tratamento para
pacientes renais crônicos.
44
45

4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

4.1 Teoria das representações sociais

A publicação da obra “La Psycanalyse: Son image et son


public” em 1961 por Moscovici apresentou o conceito de
Representações Sociais (RS), relatando um estudo sobre as opiniões,
atitudes e estereótipos a respeito da psicanálise presentes na sociedade
francesa da época (Farr, 1995; Vala, 2006). O estudo de Moscovici
baseou-se numa análise documental e em amostras da população
parisiense divididas em seis grupos: representativa, classe média, liberal,
operária, estudantil e alunos de escolas técnicas. Foi aplicado um
questionário em 2.265 sujeitos e analisados 1.640 artigos relativos à
psicanálise, publicados em 230 jornais e revistas (Farr, 1986). A partir
desse estudo de Moscovici tiveram início uma série de pesquisas,
investigações, debates e críticas sobre a teoria e o fenômeno das RS no
cenário científico (Doise, 1985; Abric, 1993/1996; Vergès, Tyszka, &
Vergès, 1994; Rouquette, 1995; Jodelet, 2001; Flament, 2001).
Segundo Palmonari e Cerrato (2011), nas duas décadas que
sucederam a Segunda Guerra Mundial, a Psicologia Social teve uma
importante expansão com aumento na quantidade e variedade de
pesquisas e o desenvolvimento de novas teorias. Nesse cenário surgiu a
Teoria das Representações Sociais (TRS), que se constituiu numa
importante crítica à natureza individualizante que predominava nas
pesquisas em psicologia social na América do Norte. Moscovici propôs,
com as RS, uma nova epistemologia, baseada na psicologia social
europeia (Farr, 1995).
A psicologia social europeia é considerada uma forma
sociológica de psicologia social, que reflete a relação entre individual e
coletivo, buscando uma superação desta dicotomia, sem reduzir as
explicações da psicologia social a uma delas (Bernardes, 2001). Sendo
assim, a TRS surge como orientação alternativa à corrente cognitivista
da psicologia social, oferecendo outros caminhos para o estudo dos
fenômenos sociais e psicossociais. As RS um fenômeno que,
historicamente, já foi de interesse da história, da antropologia, da
sociologia e outras ciências humanas (Jodelet, 2001).
Moscovici criou o conceito de RS baseando-se no conceito de
representações coletivas de Durkheim. De acordo com Palmonari e
Cerrato (2011) as RS para Moscovici diferem das representações
coletivas estudadas por Durkheim, pois para o primeiro elas possuem
um caráter dinâmico, não são apenas uma herança coletiva que é
46

transmitida de maneira determinista e estática como acreditava


Durkheim, numa visão pouco mutável de sociedade.
Moscovici utilizou a expressão “representação social” no lugar
de “representação coletiva”, utilizada por Durkheim, a fim de indicar
um fenômeno, enquanto que o termo original indicava um conceito.
Para Moscovici o indivíduo é ativo e autônomo no processo de
construção da sociedade, sendo também criado por ela (Moscovici,
2012). As RS não são mero reflexo da realidade introduzida
passivamente no sujeito, mas uma significativa reorganização na qual
estão estruturados o pensar e o agir (Moscovici, 2012; Jodelet, 2001; Sá,
1996). O contexto social e ideológico, o lugar ocupado pelo indivíduo
no grupo, sua história, os determinantes sociais, sistemas e valores
influenciam essa organização significante chamada representação social.
A construção das RS e suas funções, relacionadas com a
comunicação, formação de identidade e orientação de comportamentos,
apontam para um aspecto importante das RS, que é o fato delas surgirem
a partir de um incômodo, de uma tensão entre o conhecimento que se
tinha até acontecer uma situação na qual o indivíduo se depara com algo
que não conhecia, e sobre o qual precisa ter conhecimento. Então
aparece a necessidade de reorganizar o conhecimento que já se tem ou
compreender a situação atual baseando-se no conteúdo já conhecido. De
acordo com Moscovici (1978, 2003), essa tensão e esse desequilíbrio
precisam ser diminuídos, pois a ameaça de perder os marcos referenciais
que propiciam o sentido de continuidade é insuportável. Para tanto, o
conteúdo novo, estranho para o indivíduo, necessita se deslocar para o
interior de um conteúdo já conhecido, de maneira que o não familiar se
torne familiar.
De acordo com Moscovici (2003), as RS são um conjunto de
conceitos, afirmações e explicações originadas no dia a dia, durante a
comunicação e cooperação entre os indivíduos e grupos. As RS são
importantes no cotidiano social, pois são construídas em decorrência da
busca de saber como se comportar, como dominar o meio, identificar e
resolver problemas. Além disso, nos guiam no modo de definir e nomear
os diferentes aspectos da realidade e de interpretar esses aspectos, tomar
decisões e se posicionar frente a eles (Jodelet, 2001).
Vala (2006) afirma que as RS são partilhadas por um conjunto
de indivíduos e produzidas coletivamente, portanto, são produtos da
interação e dos fenômenos de comunicação no interior de um grupo
social, é isso que confere o atributo social a uma representação.
Moscovici (2012) afirma que as RS possuem uma posição mista,
47

ficando na encruzilhada de uma série de conceitos sociológicos e


psicológicos. Sendo assim, procura compreender os fenômenos que são
simultaneamente psicológicos e sociais, como as comunicações de
massas, as influências sociais e os conhecimentos socialmente
elaborados e compartilhados.
Segundo um critério quantitativo uma representação é social na
medida em que é partilhada por um grupo de indivíduos, porém esse
critério é insuficiente para conceituar as RS, uma vez que não leva em
conta o seu modo de produção. Utilizando um critério genético pode-se
compreender que uma representação é social no sentido em que é um
produto da interação humana e dos fenômenos de comunicação no
interior de um grupo. Um terceiro e decisivo critério, o da
funcionalidade, afirma que as RS são teorias sociais práticas, um saber
prático que organiza as relações simbólicas entre atores sociais (Vala,
2006).
Moscovici (2003) ressalta a importância da ação comunicativa
entre os grupos, considerando as RS como um modo específico de
compreender e de se comunicar. Dessa maneira, as RS seriam
estruturadas pela relação entre sujeito e objeto, a partir da ação
discursiva que se dá por meio da linguagem. É importante ressaltar que
toda representação implica em algo que é representado e alguém que
representa (Sá, 1998).
As RS se diferenciam do conhecimento científico, pois este
corresponde aos universos reificados e as representações sociais
correspondem aos universos consensuais. No universo consensual o
indivíduo pode se portar como “pensador amador”, opinar, verbalizar
teorias, pontos de vista, o que acontece em diversos lugares de trocas,
seja nas ruas, nos bares, nas praças, nos clubes ou cinemas, locais onde
surgem as representações sociais. É, portanto, no universo consensual
que o indivíduo busca se sentir confortável, aceito, reconhecido e
protegido das discordâncias, pois nele as pessoas compartilham
livremente conhecimentos de assuntos sobre os quais não são
especialistas.
Já no universo reificado, que se ancora e materializa no espaço
científico, há um sistema de papéis, uma hierarquia e uma linguagem
específica. A qualificação do indivíduo é importante na garantia da sua
participação nesse universo, pois o conhecimento veiculado nele diz
respeito ao conhecimento científico, especializado (Moscovici, 1981).
Palmonari e Cerrato (2011) salientam que as RS evidenciam os
processos em que a teoria científica é incorporada aos universos
consensuais, ou seja, os processos que movimentam o conhecimento do
48

universo reificado ao universo consensual. No entanto, ainda que as RS


se diferenciem do conhecimento científico, pois são baseadas em
conhecimentos do senso comum, elas são tidas como objeto de estudo
tão legítimo quanto o científico pela sua importância na vida social
(Jodelet, 2001).
Para um melhor entendimento de como funcionam os universos
consensual e reificado, é necessário identificar os mecanismos de
estruturação ou criação de uma representação social como objeto
compartilhado por determinado grupo. Os dois processos que
constituem o universo consensual são a ancoragem e a objetivação,
importantes para tornar um fenômeno uma representação social, ou seja,
um conhecimento que é transformado e partilhado pelo senso comum
(Moscovici, 1985).
De acordo com Moscovici (1985) ancorar significa classificar.
A ancoragem possibilita que algo desconhecido seja incorporado ao
sistema cognitivo e associado a algo já conhecido. É, portanto, o
processo de classificar, nomear, transformar algo não familiar em
familiar e incluí-lo em nosso sistema de categorias. É reduzir as ideias
novas e estranhas em categorias conhecidas e imagens comuns,
colocando-as num contexto familiar. Assim, quando encontramos um
objeto desconhecido, o primeiro passo é classificá-lo com uma palavra
que pertença à nossa linguagem. Sendo assim, segundo Vala (2006),
uma RS constitui-se de um código de interpretação no qual o não
familiar, o desconhecido, o imprevisto é ancorado. Ainda de acordo
com esse autor, ancorar significa reduzir o novo ao velho e reelaborar o
velho tornando-o novo.
No processo de classificação, a categorização ocupa importante
espaço, pois significa escolher um dos esquemas guardados na memória,
conceituações já conhecidas, para estabelecer uma relação positiva ou
negativa (Moscovici, 2003). A familiarização, utilizando a classificação
e a categorização, ocorrerá, também, por meio da generalização ou
particularização. Ao generalizar, a característica do novo objeto ou ideia
é igualada a todos que estão naquela categoria, ocorrendo um
distanciamento maior do novo objeto ou ideia em decorrência de uma
visão mais geral.
A objetivação permite compreender como as palavras e
conceitos se transformam em coisas, em uma realidade exterior ao
indivíduo (Vala, 2006). É, portanto, o processo de tornar algo abstrato
em concreto, transferir algo que está na mente para o plano físico, a fim
de tornar visível uma realidade, possibilitando tornar algo novo em
49

conhecido. Segundo Moscovici (1981) é uma maneira de saturar o


conhecimento da realidade, sendo que após tê-lo percebido em um
universo intelectual, ele aparece como algo concreto e tangível. Nas
palavras de Moscovici:

Objetivação satura o conceito desconhecido de realidade,


transformando-o em um bloco de construção da própria
realidade. Tendo primeiramente percebido em um
universo puramente intelectual e remoto, ele emerge
frente a nossos olhos, em carne e osso e de forma
tangível. (Moscovici, 1985 p.26)

Assim como na ancoragem, a objetivação depende de


operações necessárias para acontecer, de acordo com Vala (2006) são as
seguintes: construção seletiva, esquematização e naturalização. A
primeira, construção seletiva, parte do pressuposto de que as
informações, crenças e ideias acerca do objeto da representação passam
por um processo de seleção e descontextualização, fundamentado em
normas e valores. A segunda etapa, esquematização, é a organização dos
elementos em noções que constituem relações padronizadas e
estruturadas de conhecimento que irão formar a representação social. A
naturalização, por fim, diz respeito à materialização dos conceitos
retidos no esquema figurativo, a percepção do grupo é vista como
realidade e materialidade. Dessa maneira, as imagens deixam de ser
elementos do pensamento e passam a ser elementos da realidade. Elas
passam a ser os objetos, sendo o que significam.
Em geral, pode-se considerar que a TRS apresenta três
abordagens diferentes e complementares: a abordagem dimensional, a
estrutural e a dinâmica. A abordagem dimensional foi postulada por
Moscovici (2012) e indica que as representações são formadas
articulando três componentes ou dimensões:
1- Informação: organização dos conhecimentos que um grupo
possui sobre um objeto social a partir de sua qualidade e
quantidade, sendo que esse conhecimento pode ser
proveniente de diversas fontes.
2- Atitude: relaciona-se a uma orientação em relação ao objeto
da RS, uma predisposição para determinado
comportamento, diz respeito ao posicionamento favorável
ou desfavorável frente a um objeto social.
50

3- Campo ou Imagem: refere-se ao conteúdo concreto e


limitado de um aspecto determinado do objeto da
representação.

A abordagem dinâmica busca explicar como as RS interferem


na vida cotidiana das pessoas, considerando os elementos afetivos,
mentais e sociais que integram cognição, linguagem e comunicação
(Jodelet, 2001). Essa é a abordagem que será utilizada nesse estudo, a
qual um exemplo de utilização é o estudo de Jodelet (2001) sobre as
representações sociais da loucura.
Por fim, a abordagem estrutural, que teve início na Escola do
Midi (Aix-en-Provence) com Abric, apresenta a Teoria do Núcleo
Central que foi complementada por Flament (2001). Para Abric (2003),
as RS constituem um sistema de interpretação da realidade, baseada em
um conjunto de crenças, informações, opiniões e atitudes frente a um
objeto social. Para essa abordagem os elementos que formam uma RS
são divididos em elementos pertencentes a um núcleo central e
elementos periféricos.
O núcleo central de uma RS é composto por elementos
normativos (padrões sociais e ideologias provenientes do sistema de
valores dos indivíduos) e funcionais (características descritivas e
condutas sociais). Ele possui três funções essenciais: função geradora,
que atribui significado à representação; função organizadora, que atribui
organização interna à RS e função estabilizadora, que confere
estabilidade à representação. Os elementos normativos e funcionais
permitem que o núcleo central desempenhe um papel avaliativo e
pragmático (Abric, 2003).
Segundo Abric (2003) o núcleo central é o responsável pela
consistência, permanência e pelo significado de uma representação. Ele
é resistente à mudança que os elementos periféricos e é estável. Por isso,
qualquer modificação do núcleo central provoca também uma
modificação na representação. Para que uma representação seja
diferente de outra elas devem se organizar em torno de dois núcleos
diferentes. Elas podem até apresentar conteúdo semelhante, porém se a
organização do conteúdo for diferente em cada uma, então as
representações também serão.
O sistema periférico, por sua vez, constitui os elementos que se
organizam ao redor do núcleo central, é a parte mais acessível e viva de
uma representação e suas funções resumem-se em: concretização,
regulação, prescrição de comportamentos, proteção no núcleo e
51

personalização (Abric, 2003; Campos & Rouquette, 2003). São os


elementos do sistema periférico que ajustam a representação a seu
contexto, à realidade concreta e às práticas sociais de um determinado
grupo. De acordo com Flament (2001, p. 179), o sistema periférico
“funciona como o para-choque de um automóvel: protege em caso de
necessidade, as partes essenciais do veículo, mas ele pode ser
amassado”.
Isso significa que o sistema periférico de uma representação
serve como uma espécie de escudo no embate entre uma realidade que
questiona a representação e um núcleo não maleável, absorvendo os
desacordos com a realidade e assegurando a estabilidade da
representação (Flament, 2001). Dessa forma, o núcleo central
permanece estável, coerente e rígido, enquanto o sistema periférico
suporta a heterogeneidade do grupo, é flexível, tolera possíveis
contradições, permitindo uma adaptação à realidade concreta (Sá, 1996).
Determinados elementos de uma representação, inclusive os
elementos centrais, podem ser ativados em um contexto e ficar ocultos,
ou desativados, em outro. Os elementos desativados são chamados de
zona muda das representações sociais, na qual se encontrariam as
representações sociais menos acessíveis devido às pressões sociais e ao
efeito de desejabilidade social. Ela faz parte da consciência dos
indivíduos, mas não pode ser verbalizada, pois o indivíduo ou grupo não
quer expressá-las publicamente (Abric, 2003).
Para Abric (2005) a existência da zona muda está relacionada
com alguns processos como o de gestão de impressões, que consiste
causar uma impressão positiva de si nas outras pessoas. Para tanto, o
indivíduo expressará apenas opiniões, atitudes e crenças adequadas às
normas sociais, evitando comportamento que fuja à norma social. Outro
processo resulta das pressões normativas, uma tentativa de conformar as
pessoas ao discurso politicamente correto, mantendo-as em acordo com
seu grupo de pertença e de referência, portanto a desejabilidade social é
outro fator relacionado com a existência da zona muda (Abric, 2003).
Abric (2003) destaca quatro funções essenciais das RS: função
de saber prático, que possibilita explicar a realidade a partir do senso
comum; função de identificação, que permite a manutenção da coesão
grupal a partir da definição da identidade do grupo; função de
orientação, que conduz as práticas e os comportamentos dentro de um
contexto social; função de justificativa e avaliação, que explica e
justifica as condutas. As funções da RS estão estreitamente relacionadas
com o comportamento, sendo enunciadoras de ações desejáveis. É por
meio dessas funções que as RS podem guiar comportamentos, embora
52

existam comportamentos não representacionais, que por não estarem


ancorados em representações, não são orientados por elas.
A teoria das representações sociais, uma vez que considera o
social e o psicológico como um processo dinâmico, torna-se instrumento
da Psicologia Social, permitindo a compreensão da formação do
pensamento social e antecipação de condutas humanas. As RS, enquanto
objeto de estudo da Psicologia Social, possibilitam a articulação do
social com o psicológico, tornando-se ferramenta de compreensão e
transformação da realidade (Alexandre, 2004). A TRS possibilita
apreender os processos e mecanismos por meio dos quais os indivíduos
constroem, em seu cotidiano, o conhecimento sobre objetos e fatos
sociais, auxiliando também a compreender as estratégias utilizadas pelas
pessoas em determinadas situações, por exemplo, na doença crônica,
foco desse estudo.
A TRS considera a presença de fatores intra-subjetivos, sociais,
culturais e históricos na elaboração de determinada representação. No
caso da doença crônica, as representações podem, por sua vez,
influenciar comportamentos frente a essa condição, mantendo ou
desconstruindo as concepções sócio-culturais. Por isso, estudar as RS da
doença crônica para pessoas que vivem com uma dessas enfermidades
oferece dados para ampliar a compreensão do efeito psicológico dessas
doenças.
Valorizando a vivência e o conhecimento dos sujeitos que
passam por essa experiência, pode-se acessar as construções sociais e
pessoais envolvidas numa doença.
Do mesmo modo, apreender o significado da doença para o doente
permite identificar os elementos compartilhados que contribuem para a
construção da representação dessa experiência, e possibilita avaliar
criticamente as condições de vida e de cuidados dessas pessoas.
Com a ampliação da compreensão de fenômeno é possível
abordá-lo de forma mais apropriada, nesse caso, resultando em um
benefício para as pessoas que vivem com essas doenças, pois podem
passar a receber tratamento e informações mais adequados. Para as
equipes de saúde, conhecer melhor o significado da doença para os
pacientes traz condições de elaborar abordagens mais efetivas no
tratamento e acompanhamento ao paciente.
Porém, apesar da importância dessas investigações, pode-se
observar uma carência no que diz respeito às pesquisas sobre a doença
renal crônica utilizando a perspectiva da Psicologia Social.
Considerando as contribuições da TRS, estudos com esse enfoque
53

podem contribuir com os avanços nessa importante área. Pesquisas


enfatizando a construção das RS acrescentarão dados, não apenas ao que
se entende por doença, mas podem contribuir com a composição dos
diversos elementos individuais e coletivos que permeiam as
representações acerca da doença crônica, nesse caso a DRC.
Considera-se, portanto, importante investigar os elementos que
compõem as RS das doenças crônicas para os pacientes, os afetos
envolvidos no convívio diário com uma dessas doenças que não tem
previsão de término, o que se compartilha sobre as doenças que não têm
cura e quais são os aspectos característicos desse fenômeno que
ultrapassam a dimensão científica.
Essas questões não foram ainda suficientemente respondidas no
que concerne às doenças crônicas e suas representações. A compreensão
do significado dessa doença e do tratamento para pessoas que a vivem é
uma forma de contribuir para, em última análise, considerar os pacientes
enquanto conhecedores de seu adoecimento e possibilitar outra
perspectiva além da médica na construção das representações do
fenômeno.

4.2 Representações sociais e saúde

Representações sociais de diversos aspectos da vida diária são


construídas a partir de comunicações interindividuais e práticas
cotidianas, com auxílio das comunicações interindividuais (Augoustinos
& Walker, 1995). A construção de representações, portanto, engloba
também o fenômeno da saúde e doença, pois a saúde é uma preocupação
de diferentes ciências humanas e sociais e um ponto articulador entre o
indivíduo e a sociedade (Jodelet, 2006).
Para Herzlich (2005) é preciso que o indivíduo dê sentido e
significaodo à sua doença, como uma forma de fazer com que ela deixe
de ser um fenômeno do acaso. Um sentido frequentemente atribuído é o
de desordem, uma imposição do meio externo. Gomes, Mendonça e
Pontes (2002) analisaram a relação entre RS e a experiência da doença e
destacaram que é necessário contextualizar temporalmente e
historicamente os discursos e afirmam que os estudos interpretativos não
devem focalizar as representações em si, mas investigar como os
processos sociais, psicológicos e fisiológicos relacionam-se na produção
de formas e trajetórias distintas de doença. Dessa maneira, as pesquisas
desse tipo não descreveriam simplesmente as doenças, mas sim, a
54

experiência de enfermidade, considerando as trajetórias e os significados


envolvidos na construção do adoecimento.
O conhecimento dos doentes sobre a doença depende, em parte,
do saber especializado dos médicos. Contudo, tal fato não coloca em
questão a existência, e mesmo a autonomia, das representações
elaboradas pelos doentes, pois não é possível reduzi-las à pura
reprodução de um saber. Também não se pode reduzir o funcionamento
das representações ao princípio objetivo da distância que separa os
leigos e médicos, detentores do saber dominante (Herzlich, 2005).
De acordo com Joffe (2002) a contribuição fundamental das RS
para o campo da psicologia da saúde é o incremento da habilidade de
compreender como os leigos constroem significados para a saúde e a
doença e como esses significados evoluem. Para tanto, descobrir como
as informações são filtradas por cada “membrana” individual de atitudes
e crenças é um interesse fundamental. A TRS, focada nos grupos, nas
compreensões simbólicas e nas comunicações relacionadas à saúde,
fornece ferramentas válidas para mostrar como as forças sócio-cultural e
histórica têm impacto nos pensamentos e ações individuais relacionadas
à saúde.
Os conhecimentos provenientes da experiência subjetiva do
adoecimento relacionam-se com a realidade vivida. Compreender o
processo de adoecimento não se dá apenas por meio dos enunciados, das
narrativas dos sujeitos que vivem essa experiência, pois essas falas
devem ser consideradas um recorte da realidade, que possibilita articular
o representado e o vivido. Com uma releitura das narrativas dos sujeitos
é possível chegar às práticas sociais cotidianas, e articulando a
experiência da doença e o contexto em que se dá essa produção
simbólica, é possível pensar em subsídios para as políticas e ações em
saúde no sentido de abarcar e atender os sujeitos para as quais elas são
direcionadas (Gomes, Mendonça, & Pontes, 2002).
Cardoso e Gomes (2000), ao discutir a produção de estudos
com o referencial das RS no campo da história relacionada à área da
saúde, consideram que as RS ocupam uma posição periférica neste tipo
de pesquisa. Segundo Apostolidis (2006) as pesquisas centradas na
análise das relaçoes entre o contexto social e a saúde representam um
campo recente de investigação. No entanto, a questão da doença vem se
destacando nas obras relacionadas com as RS e permitindo o
entendimento da relação entre o biológico e o social.
Do ponto de vista operacional, dois conceitos permitem analisar
o pensamento comum de uma doença: o significado e o filtro
55

(Apostolidis, 1994). A noção de significado refere-se ao sentido


atribuído a um item específico, tanto a nível individual quanto social. A
noção de filtro consiste em ancorar as informações e significados sobre
o objeto, possui uma finalidade prática de controle da situação, de guiar
a ação e a expressão (Apostolidis, 2006). Contudo, Herzlich (2005)
considera que não pode haver ligação direta entre uma RS e uma
conduta individual específica, visto que representações diferentes
podem gerar condutas semelhantes do mesmo modo que uma
representação partilhada pode gerar comportamentos muito diferentes.
Sendo assim, Herzlich (2005) considera que a compreensão das
condutas humanas deve levar em conta outras variáveis além das
representações. Abric (2003) e Rouquette (1998) também afirmam que a
relação entre RS e comportamento é complexa devido às inúmeras
variáveis que atuam na determinação das ações humanas. E Campos
(2003) considera que determinar uma relação recíproca entre RS e
comportamento não favorece a compreensão de situações específicas e
particulares.
Moscovici (2012) indica que as RS constituem a ação,
modelando o contexto no qual o comportamento se insere. Vala (2004)
diferencia os comportamentos representacionais e os comportamentos
situacionais quando se refere à existência de diversos tipos de ações, as
quais poderiam ser explicadas pelas RS dos indivíduos. As
características dos comportamentos representacionais seriam
determinadas mais por fatores pré-situacionais do que pela situação em
si. Já os comportamentos situacionais seriam determinados em maior
proporção por características do contexto do que por RS, sendo assim,
as RS teriam menos importância na previsão do comportamento.
Wagner (1994) refuta a distinção entre representação e
comportamento, pois considera o próprio comportamento componente
da RS, não existindo esta separação. Já Rouquette (1998) refere não
haver determinação direta entre representação e prática social. Para esse
autor, a representação exerce uma coerção variável sobre a prática
social, o que implica uma ação remodelada por meio dos conteúdos de
uma representação. De acordo com Campos (2003) outra possibilidade é
uma relação circular, ou seja, uma interação mútua. Sendo assim, torna-
se mais difícil definir a relação causal e, por consequência, demarcar a
influência de uma na outra.
Para Herzlich (2005) a doença é um fenômeno que ultrapassa a
medicina moderna, e sua representação não é apenas esforço de
formulação mais ou menos coerente de um saber, mas também
interpretação e questão de sentido. A doença, por tratar-se de um evento
56

que ameaça ou modifica, às vezes irremediavelmente, a vida, a inserção


social e o equilíbrio coletivo, gera a necessidade de uma interpretação
complexa e contínua da sociedade inteira. De acordo com Adam e
Herzlich (2001) as pessoas têm diversas representações sobre seu
adoecer e essas representações são independentes do saber médico.
Sendo assim, vivenciar uma doença é também uma forma de conhecer-
se, pois é uma situação na qual o indivíduo aprende a se superar a fim de
enfrentar a doença.
Segundo Jodelet (1998) as RS possibilitam compreender a
organização da vivência corporal e das relações dos sujeitos com a
saúde. As RS também possibilitam compreender a eficácia de
campanhas educativas de promoção da saúde, de prevenção de doenças
e de adesão aos tratamentos. O campo da saúde contempla diversos
tipos de doenças, por isso pode-se realizar investigações muito variadas
com o referencial das RS. Assim, além das doenças físicas, é possível
estudar também as enfermidades psíquicas e o que está envolvido neste
tipo de adoecimento.
Nesse sentido, Jodelet estudou as RS da loucura em 1985 na sua
tese de doutorado. A obra, publicada em 1989 e intitulada “Folies et
réprésentations sociales” (Loucuras e representações sociais) revela
mais do que uma teoria e possíveis resultados de uma pesquisa bem
conduzida, ressalta a grande importância em atentar ao pensamento do
senso comum. É uma obra de importância fundamental no estudo das
RS, sobretudo no campo da saúde.
A pesquisa, já disponivel em versão traduzida para o português
(Jodelet, 2005), foi realizada por meio de entrevistas com os habitantes
de uma comunidade na qual os doentes mentais moravam nas casas de
famílias locais como pensionistas. A autora identificou, com a análise
profunda do conteúdo das entrevistas, práticas de discriminação
perpetradas pelos moradores do vilarejo em relação aos pacientes.
Considerados estranhos e imprevisíveis, os doentes mentais eram
sutilmente excluídos e marginalizados pelos outros moradores do local.
Uma RS do louco como ameaça provocava um distanciamento entre
eles e os demais moradores.
Desde então, estudos utilizando a perspectiva das RS vem sendo
realizados com as mais diversas doenças, como câncer, aids, diabetes,
hipertensão, entre outros. Vieira e Queiroz (2006) investigaram as RS
do câncer em mulheres a partir da concepção de pacientes portadoras da
doença e profissionais de enfermagem. O estudo indicou que algumas
representações são compartilhadas por esses dois grupos acerca do
57

tratamento do câncer em mulheres, como a insuficiência das


informações e os cuidados especiais, incluindo os psicológicos, que a
doença requer. Apontou também que a construção da doença não se
limita aos aspectos biológicos, dando destaque a construção
representacional da doença que não se baseia exclusivamente no
conhecimento científico, mas tem uma contribuiçao decisiva da
experiência subjetiva.
Torres e Camargo (2008) investigaram a RS da aids e da terapia
anti-retroviral (TARV) para pacientes soropositivos aderentes ao
tratamento. Os resultados desse estudo indicaram que a RS da aids para
as pessoas que vivem com HIV (vírus da imunodeficiência adquirida)
assume o conteúdo de doença crônica, incurável e ligada à morte. A
representação social do tratamento foi caracterizado como mais
abrangente que a TARV, constituindo-se na alimentação adequada,
controle da carga viral e células CD4, comparecimento às consultas e
uso contínuo da medicação anti-retroviral.
Além disso, os participantes apontaram como principais
dificuldades do tratamento: efeitos colaterais, rotina dos remédios
(horários e quantidade), problemas de relacionamento com familiares,
amigos, comunidade e principalmente com o companheiro ou
companheira. Nas RS das pessoas que vivem com HIV/Aids sobre a
doença e o tratamento, apesar de referenciadas no senso comum, foram
encontrados muitos aspectos do conhecimento científico, o que se
justifica devido a funcionalidade desse conhecimento para o grupo
(Torres & Camargo, 2008).
Almeida, Paz e Silva (2013) investigaram as RS do portador de
hipertensão sobre a doença e encontraram a representação da
hipertensão arterial como doença do medo, do risco de vida, que traz
sequelas e limitação à vida. A vivência do diagnóstico de hipertensão
arterial faz com que o indivíduo dê um novo significado à doença, não
mais baseando-se apenas em informações, e sim na experiência concreta
dos sintomas, sinais e agravos da doença. Outra representação da
hipertensão arterial é a de uma doença que requer cuidados e mudança
de estilo ou hábitos de vida.
De acordo com Almeida, Paz e Silva (2013) os participantes
dessa pesquisa, apesar de saberem que a não adesão ao tratamento
poderá agravar a doença, se sentem confortáveis e seguros para conviver
com ela. O motivo de buscar o tratamento para os portadores de
hipertensão arterial não é o que sentem, e sim uma obediência às
orientações de profissionais sobre a importância de manter a doença sob
controle.
58

Quintana e Muller (2006) estudaram as RS da insuficiência


renal crônica e do trasplante renal para os pacientes portadores da
doença. Segundo os autores os participantes evidenciaram que o
diagnóstico é tido como uma confirmação da perda de controle sobre a
vida. Tal sentimento de desamparo e impotência tenta ser revertido por
meio do transplante. Com relação a hemodiálise os pacientes referem
certo sentimento de independência da doença durante o tempo entre uma
sessão de diálise e outra, porém, quando estão “ligados” à máquina
aparecem com intensidade as limitações que a doença provoca, como a
dependência do aparelho. Algumas pessoas referem também sentir certo
estranhamento e nojo ao estarem “ligados” à máquina durante a diálise
vendo seu sangue sair e entrar no corpo.
Os pacientes vivenciam a insuficiência renal crônica como uma
ruptura com a vida que tinham. São considerados fatos marcantes a
constituição da fístula arteriovenosa para viabilizar a hemodiálise e a
introdução do cateter para a realização da diálise peritoneal, pois
representam a inserção no mundo dos doentes renais crônicos. As
marcas deixadas no corpo em decorrência da doença e do tratamento são
vistas como o atestado de que são portadores de DRC (Quintana &
Muller, 2006).
A religião é considerada pelos pacientes uma forma de apoio no
enfretamento das mudanças decorrentes da doença, de modo que
procuram atribuir significados à doença e ao tratamento por meio da
crença num ser superior. Além da fé, os pacientes que realizam
hemodiálise encontram na equipe de enfermagem e nos colegas que
estão na mesma situação um suporte afetivo. Com relação ao
transplante, ele é considerado uma forma de cura e de retorno à vida
“normal” tida até então.
Quintana e Muller (2006) evidenciaram que o processo de
escolha do doador envolve aspectos médicos, psicológicos e familiares.
Os pacientes têm preferência por receber um rim de um doador cadáver
do que de um doador vivo, apesar dessa opção ser considerada mais
benéfica, a fim de preservar a saúde de seus familiares.
Ramos, Queiroz e Jorge (2008) realizaram uma pesquisa sobre
as RS elaboradas por adolescentes em situação de DRC. O estudo
revelou diversas significações da doença e do tratamento, tidos,
principalmente, como algo difícil, que ocasiona mudanças nos hábitos e
estilo de vida e que requer muita dedicação do doente e da sua família.
Os resultados destacaram a importância da família no apoio ao doente
59

renal crônico, bem como da equipe de saúde no acolhimento,


estabelecimento de vínculo e confiança na interação com os pacientes.
Esse estudo aponta também que as demandas de cuidado dos
adolescentes portadores da DRC são pricipalmente relacionadas aos
aspectos psicoafetivos, pois requerem uma relação de interação, carinho,
apoio e proteção, sendo que a comunicação exerce um papel
fundamental na troca de informações, responsável pela criação das RS.
Por meio das experiências vivenciadas que o adolescente nessa situação
confere significados ao adoecimento e interage com as outras pessoas e
com seu grupo de pertença. As diversas significações dadas à doença
permitem conviver com essa situação e amenizar os conflitos internos e
externos (Ramos, Queiroz, & Jorge, 2008).
Pilger, Rampari, Waidman e Carreira (2010) pesquisaram o
significado da hemodiálise para o idoso a partir do conteúdo da fala
desses pacientes, dando oportunidade para que eles falassem de si, do
significadodo tratamento e seus impactos na vida. A pesquisa mostrou
que a hemodiálise causa impacto na vida desses idosos, o cotidiano,
devido a algumas limitações sociais que impõe, envolvendo o trabalho,
a alimentação, hábitos culturais e o convívio social e familiar. Do
mesmo modo, o estudo revelou que esse tratamento também afeta o
estado mental, pois causa diversos sentimentos e frustrações que devem
ser acompanhas por profissionais de saúde capacitados a reconhecer as
particularidades e singularidade de cada idoso e como cada um vivencia
o adoecimento.
O significado da hemodiálise para os idosos apresentou-se de
forma ambígua, uma vez que representou a vida e a morte. O tratamento
significou a esperança de manter-se vivo e, ao mesmo tempo, sua
ausência foi considerada sinônimo de morte. A representação da
hemodiálise como condição para a sobrevivência foi decorrente da
percepção dos idosos de que ela é necessária para manter a vida, pois
apesar de ser dolorosa, essa terapêutica preserva e desenvolve funções
que são vitais para o organismo (Pilger, Rampari, Waidman, & Carreira,
2010).
Esse estudo mostrou que a hemodiálise tem também um
significado de bem-estar para os idosos, representando uma melhora na
sua qualidade de vida, pois permite a realização de atividades da vida
diária que antes do tratamento não eram mais possíveis. Os autores
afirmam que a compreensão dos significados da hemodiálise e suas
consequências fisiológicas e psicológicas para os pacientes idosos, pode
ser um suporte à equipe de saúde no encorajamento do idoso para
enfrentar a doença e as difíceis adaptações ao tratamento hemodilítio.
60

Além disso, é uma maneira de estimular esses pacientes a buscar uma


ressignificação da doença e do tratamento a partir de uma percepção que
vislumbre uma vida com qualidade e bem-estar (Pilger, Rampari,
Waidman, & Carreira, 2010).
Analisando os resutados desses estudos pode-se observar a
presença de elementos comuns nas representações de diferentes
doenças, o que pode apontar para a existência de componentes que
permanecem na experiência de adoecer, ainda que em diagnósticos
distintos. Contudo, mesmo que contenham determinados elementos
similares, os diferentes diagnósticos têm também diferentes
representações, possibilitando identificar aspectos específicos de cada
doença, bem como elementos comuns a experiência de adoecer.
Sabe-se que uma RS é formada com o objetivo de dar um
sentido para algo que é novo e estranho. A doença quase sempre
constitue-se uma ameaça à vida dos indivíduos. Dando um sentido a ela,
ou seja, representando, o indivíduo torna a doença algo mais próximo,
familiar e mais compreensível em seu universo social. Ao propor um
estudo das RS e do impacto da DRC e da hemodiálise na qualidade de
vida daqueles que convivem com essa situação procura-se entender a
tradução que os pacientes fazem de sua doença, da informação médica,
do impacto destes conteúdos na condução do tratamento. É importante
entender o que influencia as ações dos pacientes submetidos a esse
tratamento, e para isso é preciso investigar quais representações são
inerentes às suas condutas.
61

5 MÉTODO

5.1 Caracterização da pesquisa

Este estudo é de abordagem qualitativa, de natureza


exploratória, descritiva, com corte transversal. Trata-se de um
delineamento do tipo estudo de casos, que coletou informações sobre o
objeto a que se refere em um só momento, e descrevendo como se
manifesta o fenômeno de interesse na amostra (Sampieri, Colado, &
Lucio, 2006). Desta forma, procurou-se identificar-se, dentre os
participantes, as representações sociais da doença renal crônica e da
hemodiálise, bem como investigar a qualidade de vida desses pacientes.

5.2 Participantes

Participaram deste estudo 25 pacientes que realizam


hemodiálise, 12 do sexo feminino e 13 do sexo masculino. Foram
considerados critérios de inclusão dos participantes: idade superior a 18
anos, estar no programa de hemodiálise há pelo menos seis meses, estar
clinicamente estável (condição avaliada pelo enfermeiro responsável),
ter capacidade de compreensão adequada para responder a entrevista e
aceitar participar da pesquisa. Como critério de exclusão de
participantes foi utilizado o histórico de realização de transplante renal.
O acesso aos participantes se deu por meio do contato com duas
unidades que oferecem hemodiálise na cidade de Florianópolis. Após
autorização dos diretores solicitou-se aos enfermeiros responsáveis de
cada unidade que fosse feita uma prévia filtragem dos casos que
atendiam aos critérios de inclusão da pesquisa.
Durante as sessões de hemodiálise o enfermeiro responsável
apresentou a pesquisadora aos pacientes, na ocasião foi explicado o
objetivo da entrevista e feito o convite para que participassem.

5.3 Instrumentos para coleta de dados

Como instrumento para coleta de dados foi empregada a técnica


da entrevista, apoiando-se nas técnicas clássicas da entrevista em
profundidade (Flick, 2007). Foram apresentadas questões abertas no
início da entrevista com três temas indutores: doença renal crônica,
hemodiálise e qualidade de vida. Em seguida foi aplicado um
instrumento para avaliar a qualidade de vida, o WHOQOL - Bref (Fleck
62

et al., 2000). Por fim, apresentadas questões de caracterização da


amostra: sexo, idade, escolaridade, renda e local de domicílio. Assim
evitou-se mobilizar emocionalmente o participante no momento final e
que as respostas sofressem influência do efeito de contexto, ou seja, que
o participante se identificasse com uma variável específica no início da
entrevista.
O WHOQOL-Bref ou WHOQOL-abreviado é uma versão
abreviada do instrumento universal WHOQOL-100, composto por 100
questões, criado pela OMS para avaliar a QV. O WHOQOL – Bref foi
validado no Brasil pelo Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que verificou serem
satisfatórias as características psicométricas e a perspectiva transcultural
do instrumento para o contexto brasileiro (Fleck et al., 2000; Zimpel &
Fleck, 2007).
O WHOQOL - Bref é composto por 26 questões com cinco
alternativas cada. Dessas questões, duas são gerais, e 24 cobrem quatro
domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente. Cada
domínio apresenta facetas diferentes.
63

Domínio 1 – Domínio Físico Domínio 2 – Domínio Psicológico

Dor e desconforto Sentimentos positivos


Energia e fadiga Pensar, aprender, memória e
Sono e repouso concentração
Mobilidade Auto-estima
Atividades da vida cotidiana Imagem corporal e aparência
Dependência de medicação ou Sentimentos negativos
de tratamentos Espiritualidade/religião/crenças
Capacidade de trabalho pessoais

Domínio 3 – Relações sociais Domínio 4 – Domínio Meio


Ambiente
Relações pessoais Segurança física e proteção
Suporte (apoio) social Ambiente no lar
Atividade sexual Recursos financeiros
Cuidados de saúde e sociais:
disponibilidade e qualidade
Oportunidades de adquirir novas
informações e habilidades
Participação em, e oportunidades de
recreação/lazer
Ambiente físico: poluição, ruído,
trânsito, clima
transporte

Figura 1. Domínios e facetas do WHOQOL – Bref (Fleck et al.,


2000).
O conceito de QV adotado na criação do WHOQOL e pela
OMS é de ampla abrangência, interrelaciona os aspectos do meio
ambiente com aspectos físicos, psicológicos, de relacionamento e
crenças pessoais. Assim, a avaliação da QV assume uma natureza
subjetiva, imersa no contexto cultural, social e ambiental. Há três
aspectos fundamentais relacionados ao conceito definido pela OMS:
subjetividade, multidimensionalidade e presença de dimensões positivas
e negativas (Fleck, 2008). Dessa forma, tem-se que a QV é produto da
interação de diversos aspectos independentes da vida.
Optou-se por utilizar esse instrumento devido ao fato de ele
contemplar as questões necessárias para a avaliação da QV de pessoas
64

que realizam algum tratamento médico, como a hemodiálise, levando


em conta o caráter subjetivo da avaliação desses pacientes. Dessa forma,
questões acerca de sintomas e efeitos da doença e do tratamento
puderam ser avaliadas.
O instrumento WHOQOL – Bref não possui uma classificação
numérica quanto à qualidade de vida, e sim uma escala analógica de 0 a
100, sendo o critério utilizado a comparação: quanto maior o escore,
maior é a qualidade de vida, e quanto menor o escore, menor será
qualidade de vida. A análise final do instrumento foi efetuada através da
utilização do software estatístico Statistical Package for the Social
Sciences - pacote estatístico para as ciências sociais (SPSS), aplicando a
sintaxe específica do instrumento.
As questões foram pontuadas de forma individual em uma
escala Likert, sendo que 1 indicava percepções baixas e negativas e 5
percepções altas e positivas. Portanto, os escores dos domínios e das
facetas apresentavam um sentido crescentemente positivo, de forma que
pontuações mais positivas ou mais altas denotavam melhor QV.
Algumas facetas, no entanto, não foram formuladas no mesmo sentido
que as demais, são elas: dor e desconforto, dependência de medicação
ou de tratamentos e sentimento negativos. Por isso, elas foram
recodificadas ou invertidas, para que assim como nas demais,
pontuações mais altas nessas facetas denotassem melhor QV.
Todos os resultados são descritos em média, tanto nos domínios
quanto nas facetas. A classificação nominal dos resultados segue o
seguinte: de 1 a 2,9 – necessita melhorar; de 3 a 3,9 – regular; de 4 a 4,9
– boa e 5 – muito boa. O objetivo da utilização desse instrumento no
presente estudo é utilizar seus itens para uma caracterização dos
participantes e compreensão das variáveis que permeiam a qualidade de
vida. Dessa forma, a aplicação do instrumento não visa uma análise
psicométrica, pois o número de participantes da amostra não é adequado
para tal objetivo.

5.4 Procedimento para coleta de dados

O presente estudo obteve aprovação do Comitê de Ética em


Pesquisa (CEP) da Universidade Federal de Santa Catarina (Anexo A)
sob o parecer nº. 717.504 e Certificado de Apresentação para
Apreciação Ética (CAAE) nº. 23525913.1.0000.0121, permitindo assim
o início da coleta de dados que foi desenvolvida no período de
julho/2014 a setembro/2014.
65

Para a realização das entrevistas foi realizado contato prévio


com os serviços de hemodiálise participantes da pesquisa. Foi realizado
um estudo-piloto para adequar a entrevista à amostra, alguns termos
foram substituídos visando maior clareza nas questões.
Os participantes foram contatados nos serviços de hemodiálise
com intermediação e indicação do enfermeiro responsável. Os pacientes
foram informados sobre os objetivos da pesquisa e confidencialidade
dos dados. Foi esclarecido também que a participação era voluntária e
não possuía ligação com o serviço de saúde, de modo que o paciente
poderia em qualquer momento desistir de participar da pesquisa sem
nenhum prejuízo em relação ao seu tratamento.
Após concordarem em participar do estudo, por meio da
assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) foi
realizada a entrevista, a qual foi gravada com prévia autorização do
participante. Durante a mesma foi aplicado pela pesquisadora o
instrumento de medida da qualidade de vida (WHOQOL- Bref).
A entrevista aconteceu durante a sessão hemodialítica, sendo
que foi dada a opção de realizá-la em uma sala individual, porém todos
os participantes optaram que acontecesse durante a hemodiálise. A
sessão tinha duração de três a quatro horas e o tempo utilizado para
responder às questões foi de 40 minutos a uma hora. Durante esse
período a pesquisadora sentava ao lado do paciente com o questionário
para assinalar suas respostas e o gravador para gravar suas falas. Não
houve nenhuma intercorrência durante as entrevistas. Ao final, foi
realizada uma desensibililização com o participante por meio de uma
questão acerca da opinião e da experiência em participar da pesquisa.
No momento da coleta de dados a pesquisadora tomou as
devidas precauções para evitar riscos ao paciente, realizando todos os
procedimentos indispensáveis a assepsia, no ambiente da hemodiálise.
Adicionado a isso, em todas as ocasiões foi utilizado jaleco.

5.5 Procedimentos de análise dos dados

Para a análise dos dados obtidos por meio da aplicação do


instrumento WHOQOL-Bref foi utilizada a sintaxe para o software
SPSS indicada pelos autores. Esse instrumento contém 26 perguntas, das
quais 24 são distribuídas em quatro domínios: físico, psicológico,
relações sociais e meio-ambiente. Além desses quatro domínios conta
ainda com duas questões gerais, as quais uma refere-se à percepção da
qualidade de vida e outra à satisfação com a saúde.
66

Os dados foram analisados com auxílio do programa estatístico


SPSS 17. As análises estatísticas realizadas incluíram análises
descritivas de média e desvio padrão, além da análise inferencial de
comparação entre os domínios e variáveis de caracterização, para
verificar se apresentavam relação estatisticamente significativa. A partir
dos valores obtidos para cada uma das vinte e quatro facetas que
compõem os quatro domínios foram obtidas as médias das respostas, o
que possibilitou verificar quais facetas foram avaliadas positivamente e
quais foram negativamente.
O instrumento WHOQHOL-Bref não propõe que se utilize o
escore global de qualidade de vida. Por isso, os escores de avaliação são
calculados para cada um dos quatro domínios. O valor mínimo dos
escores de cada domínio é zero e o valor máximo 100. Os escores dos
domínios apresentavam um sentido crescentemente positivo, de forma
que quanto mais alto o escore, melhor a qualidade de vida naquele
domínio.
Para a análise do material textual obtido por meio das
entrevistas foram realizadas análises lexicais e classificação hierárquica
descendente de segmentos de textos, com auxílio do software
IRAMUTEQ, e uma análise com divisão temática (Bardin, 2000; Bauer,
2002; Vala, 2003).
O IRAMUTEQ, desenvolvido por Pierre Ratinaud (Ratinaud &
Marchand, 2012) emprega uma análise de classificação hierárquica
descendente e permite uma análise lexicográfica do material textual,
oferecendo contextos (classes lexicais) que são caracterizados pelo seu
vocabulário e pelos segmentos de textos que compartilham este
vocabulário.
Em outras palavras, o software relaciona os dados quantitativos
textuais de uma quantidade de respostas, ou de entrevistas, com o seu
contexto de localização no texto, seleciona os trechos mais
significativos e as palavras utilizadas com mais frequência para
responder às questões (Camargo & Justo, 2013). Esse processo auxilia
na identificação do conteúdo das representações sociais da doença renal
crônica e da hemodiálise.
A base para realizar uma análise utilizando o IRAMUTEQ é um
arquivo único, no qual devem estar indicadas as chamadas unidades de
contexto iniciais, ou textos (Ratinaud & Marchand, 2012). Os textos são
definidos pelo pesquisador e dependem da natureza da pesquisa. O
corpus de análise é composto de um conjunto de unidades de contexto
iniciais (textos) e deve constituir-se num conjunto textual centrado num
67

tema, pois os dados devem mostrar certa coerência para garantir uma
lógica quantificável. O material textual deve, portanto, ser
monotemático.
No corpus, os textos devem ser separados por linhas de
comando, chamadas “linhas de asteriscos”, que devem ser construídas
de acordo com um modelo padrão para que possam ser reconhecidas
pelo programa. Essa linha informa o número de identificação do
produtor da resposta e algumas variáveis, a serem definidas pelo
pesquisador, importantes para o delineamento da análise (Camargo &
Justo, 2013).
Apesar dos textos serem definidas pelo pesquisador, nem
sempre a divisão do corpus em segmentos de texto (STs) é também
definida por ele, pois numa análise padrão (chamada standard) o próprio
programa divide o material em STs após reconhecer as indicações dos
textos. Porém, o pesquisador pode configurar a divisão dos STs.
Quando o material apresentar grande quantidade de respostas curtas a
uma pergunta aberta de um questionário, é aconselhável que cada ST
seja definido enquanto texto, ou seja, enquanto a resposta dada à questão
(Camargo & Justo, 2013). Esse procedimento é chamado parametragem.
Segundo Camargo & Justo (2013), a CHD ocorre em quatro
etapas:

Etapa A: leitura do texto e criação do dicionário de formas reduzidas;


Etapa B: realização do cálculo das matrizes de dados e classificação dos
STs, aplicando o método de classificação hierárquica descendente
(CHD);
Etapa C: descrição das classes, apresentando o dendograma da
classificação hierárquica descendente com as relações entre as classes de
maneira ilustrada e;
Etapa D: fornece cálculos complementares com base nas classes de STs
escolhidos.

O método da Classificação Hierárquica Descendente (CHD)


proposto por Reinert (1990) e utilizado inicialmente pelo software
ALCESTE classifica os segmentos de texto em função de seus
vocabulários, e o conjunto deles é repartido com base na frequência das
formas reduzidas (palavras já lematizadas). Esta análise visa obter
classes de segmentos de texto que, ao mesmo tempo, apresentam
vocabulário semelhante entre si, e vocabulário diferente dos segmentos
de texto das outras classes (Camargo & Justo, 2013).
68

Para a análise do pesquisador, os STs apresentam o contexto no


qual a palavra foi enunciada, dois critérios são utilizados para considerar
as palavras analisadas, uma vez que nem todas entram no dendograma
das classes: a frequência média de ocorrência das palavras no corpus e o
valor do qui-quadrado de associação à classe. O primeiro critério
determina que a frequência da palavra seja maior ou igual que a
frequência média de ocorrência das palavras no corpus e no segundo
critério consideram-se as palavras cujo qui-quadrado for maior ou igual
a 3,84 (Reinert, 1990).
Foram realizadas 3 análises: a do corpus “Doença renal
crônica”, a do corpus “Hemodiálise”, e a que incluiu esses dois corpus
com divisão temática. O primeiro corpus analisado foi o intitulado
“Doença renal crônica”, o qual se refere ao material textual originado da
questão “Qual o significado da doença renal crônica para você?”. O
segundo corpus, hemodiálise, originado da questão “O que você pensa
do tratamento que você tem feito, a hemodiálise?”.
A análise de conteúdo com divisão temática possibilitou tratar o
material textual originado da questão “O que você entende por
qualidade de vida?”. Essa técnica pressupõe algumas etapas, definidas
por Bardin (2000) como: pré-análise; exploração do material ou
codificação; tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

5.6 Aspectos éticos

O início da coleta de dados foi condicionado à aprovação do


projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética para Pesquisa com Seres
Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, além da
aprovação da direção dos locais onde as entrevistas foram realizadas.
Ademais, todos os procedimentos da pesquisa foram realizados
baseando-se nos determinantes instituídos pela resolução 196/1996 e
466/2012 do Conselho Nacional de Saúde – CNS, portanto com o
consentimento dos participantes por meio do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido - TCLE, conhecimento da natureza e objetivo do
trabalho, sigilo e anonimato referente às informações obtidas, devolutiva
dos resultados da pesquisa aos locais de coleta e garantia da
possibilidade de desistência por parte do participante a qualquer
momento do estudo sem qualquer interferência no seu tratamento de
saúde.
69

6 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

6.1 Caracterização dos participantes

Participaram do estudo 25 pessoas que estavam realizando


tratamento da doença renal crônica por meio da hemodiálise. Do total de
participantes 12 eram do sexo masculino e 13 do sexo feminino. As
idades variaram entre 43 e 82 anos, sendo que a média de idade foi 61
anos e meio e o desvio padrão de 11 anos e 7 meses.
Quanto ao estado civil dos participantes, 2 eram solteiros, 16
casados, 4 separados e 3 viúvos. Dos participantes 22 afirmaram ter
filhos enquanto 3 afirmaram não ter filhos. No que se refere a
escolaridade dos participantes, 1 apresentou ensino fundamental
incompleto, 9 ensino fundamental completo, 5 ensino médio
incompleto, 7 ensino médio completo, 1 ensino superior incompleto e 2
ensino superior completo.
A renda familiar variou de 1 a 10 salários mínimos, sendo que
13 participantes apresentaram renda de até 2 salários mínimos e 12
participantes apresentaram renda acima de 3 salários mínimos. Quanto à
profissão 18 participantes são aposentados, os demais relataram ter
diferentes profissões.
No que diz respeito ao tempo de tratamento, esse variou entre 6
meses e 13 anos, sendo que 6 participantes relataram estar realizando
hemodiálise há até 1 ano, 10 deles relataram estar de 1 a 3 anos, 5 de 3 a
6 anos e 4 estão há mais de 7 anos realizando hemodiálise. Das doenças
que acometem os participantes, além da renal crônica, as mais comuns
foram a diabetes (3 participantes) e as doenças cardíacas (4
participantes). Ainda, 19 afirmaram não realizar outro tratamento além
da hemodiálise, enquanto 6 afirmaram realizar também outro
tratamento. Aqueles que realizam outro tratamento citaram o tratamento
antirretroviral, tratamento da diabetes, do lúpus e das doenças cardíacas.

6.2 Resultados sobre a qualidade de vida por meio do WHOQOL –


Bref

Os dados apresentados neste tópico têm o intuito de caracterizar


os participantes e alimentar uma posterior discussão no que diz respeito
à percepção da QV, por meio dos resultados da análise dos dados
obtidos com a aplicação do WHOQOL - Bref. Assim, serão descritos os
resultados relacionados a cada um dos quatro domínios que compõe o
70

instrumento: domínio físico, domínio psicológico, domínio relações


sociais e domínio meio ambiente. Cada um dos domínios foi relacionado
com as variáveis sexo, tempo tratamento e idade, cujos resultados serão
apresentados a seguir.
Os participantes, na sua maioria, consideraram sua QV como
sendo boa (13), enquanto alguns a consideraram nem ruim nem boa (7)
e outros avaliaram como ruim (5). Com relação a satisfação com a saúde
a maioria dos sujeitos consideraram-se satisfeitos (12), alguns
insatisfeitos (7) e menos ainda nem satisfeitos nem insatisfeitos (6).
Portanto, pode-se observar que houve nas duas questões gerais,
que se propunham a avaliar a percepção de QV e a satisfação com a
saúde, um padrão de respostas mais positivas, visto que a maioria dos
participantes relatou uma percepção de QV boa e satisfação com a
saúde. A seguir, considerando que a análise é realizada pelos seus
domínios específicos, serão descritos cada um deles e suas relações com
algumas variáveis de caracterização.

6.2.1 Domínio físico

O primeiro domínio a ser descrito é o domínio físico, o qual é


composto por 7 facetas, cada uma correspondente a uma pergunta.
Nesse domínio 16 participantes obtiveram como resultado “regular”,
sendo que desses 6 são homens e 10 mulheres, e 9 “necessita melhorar”,
sendo desses 6 homens e 3 mulheres. A tabela 1, de distribuição das
respostas no primeiro domínio, apresenta cada faceta desse domínio,
representada pela pergunta referente, e a distribuição das respostas dos
participantes para cada uma.

Tabela 1
Distribuição das respostas do domínio físico

Domínio Físico Nada Muito Mais ou Bastante Extremamente


pouco menos

Q 3- Em que
medida
você acha que
sua dor
5 7 9 4 0
impede você de
fazer o que você
precisa?
71

Nada Muito Mais ou Bastante Extremamente


pouco menos
Q 4- O quanto
você
precisa de algum
tratamento
0 2 3 10 10
médico para
levar sua vida
diária?
Nada Muito Muito Médio Completament
Pouco e
Q10- Você tem
energia 0 5 5 14 1
suficiente para o
seu dia a dia?
Muito Ruim Nem Bom Muito bom
ruim ruim
nem
bom
Q15- Quão bem
você é 3 2 7 10 3
capaz de se
locomover?
Muito Insatisfeit Nem Satisfeito Muito
insatisfeito o satisfeito satisfeito
Nem
insatisfe
ito
Q16 - Quão
satisfeito 0 5 2 17 1
você está com
seu sono?

Q17 - Quão
satisfeito
você está com
sua
capacidade de
desempenhar 3 4 6 10 2
suas
atividades do seu
dia a
dia?
72

Q 18 - Quão
satisfeito
você está com
sua 6 7 7 5 0
capacidade para
o
trabalho?

A primeira faceta se propõe a investigar a dor e o desconforto,


ou seja, a presença do sintoma dor como resposta fisiológica da doença,
que pode resultar em desconforto e interferir na QV. Houve a
necessidade de inversão dessa faceta por ser considerada negativa.
Pode-se observar que as respostas dos sujeitos concentraram-se em
“mais ou menos”, na sua maioria, e “muito pouco”. Observa-se,
portanto, que para a maioria dos participantes a dor física interfere
muito pouco ou mediamente na QV desses sujeitos.
A segunda faceta está relacionada com a energia e fadiga,
investigando a disponibilidade de energia para o dia a dia. Nesse
quesito, a maioria dos participantes respondeu “médio”, essa
distribuição das respostas reflete que a maioria dos participantes dessa
pesquisa referiu que não possui energia suficiente para as atividades
diárias, o que pode estar prejudicando a sua percepção de QV.
A terceira faceta pretende investigar o grau de satisfação com o
sono, nela houve uma concentração da maioria das respostas numa
avaliação positiva, pois a maioria dos participantes relatou estar
satisfeito com sono.
A quarta faceta se refere à mobilidade, mais precisamente à
capacidade de se locomover dos participantes. Essa faceta obteve
predominância positiva, visto que 10 participantes avaliaram sua
mobilidade como boa e 7 como nem ruim nem boa. Observa-se,
portanto, que há no grupo investigado um padrão de comportamento
independente.
A quinta faceta refere-se às atividades da vida cotidiana, a
maioria dos participantes relatou estar satisfeita com a capacidade de
realizar atividades do dia a dia. Essa é outra faceta que, de acordo com
seu resultado positivo para a maioria dos participantes, pode estar
relacionada com uma predisposição positiva para a QV dessa amostra.
A sexta faceta desse domínio se propõe a investigar a
dependência de medicação ou de tratamentos, demandando para isso
inverte-la por se tratar de uma faceta negativa. As respostas dos
participantes se concentraram entre “bastante” e “extremamente”.
73

Observa-se, portanto, que o grupo estudado apresentou uma percepção


de dependência do tratamento bastante alta, o que pode estar relacionada
com uma percepção de QV mais baixa.
A sétima e última faceta desse domínio se refere à capacidade
para o trabalho. A preponderância de uma avaliação negativa nessa
faceta indica a interferência do tratamento na questão laboral, o que
acaba afetando negativamente a QV dos pacientes submetidos e ele.
Das sete facetas avaliadas no domínio psicológico tiveram
avaliação positiva a dependência do tratamento, a locomoção, o sono e a
capacidade de realizar atividades diárias. Já as facetas: dor, energia, e
capacidade para o trabalho; tiveram avaliação negativa para a maioria do
grupo estudado. Pode-se observar, portanto, que as queixas com relação
à diminuição da energia e da capacidade para o trabalho são prováveis
consequências do tratamento hemodialítico que influenciam a percepção
de QV desses sujeitos.
Ao relacionar os resultados obtidos no domínio físico e a
variável sexo não se obteve associação [x² = 1,96; gl = 1; p = 0,16; NS].
Também não se obteve associação relacionando os resultados do
domínio físico com a variável tempo de tratamento [x²= 16,0; gl= 12; p=
0,18; NS]. Foram relacionados também os resultados desse domínio
com a variável idade e igualmente não resultou em associação [x²=
17,76; gl = 18; p= 0,47; NS].
Ressalta-se que, apesar de não ter havido associação entre o
domínio físico e o sexo, para os homens a distribuição dos resultados foi
igualitária, visto que dos 12 homens participantes 6 obtiveram resultado
“necessita melhorar” e 6 “regular”. Já para as mulheres houve uma
concentração mais positiva dos resultados, pois das 13 participantes para
10 foi “regular” e para 3 “necessita melhorar”. Portanto, pode-se
observar uma tendência mais positiva das mulheres com relação ao
domínio físico.

6.2.2 Domínio psicológico

O segundo domínio a ser descrito é o domínio psicológico, que


é composto por 6 facetas. Nesse domínio 6 participantes apresentaram
resultado “boa”, sendo 3 homens e 3 mulheres, 1 “necessita melhorar”,
sendo uma mulher e 18 “regular”, sendo 9 homens e 9 mulheres. A
tabela de distribuição das facetas do segundo domínio apresenta cada
faceta desse domínio, representada pela pergunta referente, e a
distribuição das respostas dos participantes para cada uma.
74

Tabela 2
Distribuição das respostas do domínio psicológico

Domínio Muito Mais ou


Nada Bastante Extremamente
Psicológico pouco menos

Q5- O 0 6 6 12 1
quanto você
aproveita a
vida?

Q6 - Em que
medida você
acha que sua
0 1 3 17 4
vida tem
sentido?

Q7- O
quanto você
0 1 6 17 1
consegue se
concentrar?
Muito
Nada Médio Muito Completamente
pouco

Q11- Você é 1 0 8 9 7
capaz de
aceitar sua
aparência
física?
Nem
Muito
Insatis- satisfeito
Insa- Satisfeito Muito satisfeito
feito Nem
tisfeito
insatisfeito

Q19 - Quão 2 2 2 15 4
satisfeito
você está
consigo
mesmo?

Muito
Algumas Frequen-
Nunca frequen Sempre
vezes temente
temente
75

Q 26- Com
que 5 15 3 0 2
frequência
tem
sentimentos
negativos?

A primeira faceta se propõe a investigar o quanto os


participantes aproveitam suas vidas. Pode-se constatar que houve uma
concentração da percepção dos participantes de que aproveitam bastante
a vida, uma tendência positiva com relação aos sentimentos positivos
frente à vida. É possível dizer que à medida que se aproveita mais a vida
mais qualidade é agregada a ela.
A segunda faceta está relacionada com a capacidade de se
concentrar, o que influencia no pensamento, aprendizagem, memória e
percepção. Mantendo o padrão considerado mais positivo na avaliação
da QV, a maioria dos participantes relatou ter bastante capacidade de se
concentrar.
Quanto à avaliação da autoestima, terceira faceta do domínio
em questão, observa-se que o padrão positivo manteve-se novamente.
Destaca-se que a maioria dos sujeitos entrevistados apontara que
estavam satisfeitos consigo mesmos.
A quarta faceta está relacionada à imagem corporal e aparência,
ela procurou investigar a capacidade dos entrevistados em aceitar sua
aparência física. Nessa faceta não houve concentração significativa das
respostas, pois elas se distribuíram quase igualmente entre médio, muito
e completamente. No entanto, pode-se dizer que nessa faceta também se
percebe uma tendência a respostas positivas.
Quanto à frequência de sentimentos negativos, quinta faceta
desse domínio, houve a necessidade de recodificá-la ou inverte-la. As
respostas concentraram-se em “algumas vezes”, ou seja, houve
predominância de uma avaliação intermediária dos participantes em
relação à frequência com que experimentam sentimentos negativos.
Considerando que quanto maior é a frequência de sentimentos negativos
menor é a QV, pode-se dizer que houve na amostra um padrão mais
negativo da faceta. Assim, a frequência de sentimentos negativos nessa
amostra é baixa, o que reflete em uma melhor QV.
A última faceta avaliada pelo domínio psicológico abordou a
espiritualidade, religião e crenas pessoais, investigando a atribuição de
76

sentido para a vida. As respostas revelaram que os participantes


atribuíram bastante sentido às suas vidas.
Ao relacionar os resultados obtidos no domínio psicológico e a
variável sexo não se obteve associação [x² = 0,96; gl = 2; p = 0,61; NS].
Também não se obteve associação ao relacionar os resultados obtidos no
domínio psicológico e a variável tempo de tratamento [x² = 4,53; gl = 6;
p = 0,60; NS]. Foram relacionados os resultados nesse domínio com a
variável idade, porém não houve associação [x²= 7,38; gl= 4; p= 0,11;
NS].
Pode-se considerar, a partir dos dados obtidos no domínio
psicológico, que houve uma predominância de aspectos positivos nesse
domínio. Esses aspectos positivos estão relacionados com a boa
autoestima apresentada pelo grupo, com a forma positiva com que se
relacionam com seu corpo e autoimagem, além da boa capacidade de se
concentrar e baixa frequência de sentimentos negativos.

6.2.3 Domínio relações sociais

O Domínio Relações sociais é composto por 3 facetas, nele 11


participantes obtiveram resultado “boa”, sendo 6 homens e 5 mulheres,
7 “muito boa”, sendo 2 homens e 5 mulheres, 2 “necessita melhorar”,
sendo 2 mulheres e 5 “regular”, sendo 4 homens e 1 mulher. A tabela de
distribuição das respostas do terceiro domínio apresenta cada faceta
desse domínio, representada pela pergunta referente, e a distribuição das
respostas dos participantes para cada uma.
Cabe ressaltar que nesse domínio a faceta relacionada à
atividade sexual foi retirada, pois devido às condições da aplicação do
instrumento as respostas poderiam se apresentar enviesadas, além de
causar constrangimento aos participantes. Portanto, serão apresentadas
duas facetas que compõem esse domínio.
77

Tabela 3
Distribuição das respostas do domínio relações sociais.

Nem
Domínio
Muito satisfeito Muito
Relações Insatisfeito Satisfeito
insatisfeito nem satisfeito
Sociais
insatisfeito

Q 20 - Quão
satisfeito
você está
com suas 0 2 2 10 11
relações
pessoais?

Q 21- Quão
satisfeito
você está
com apoio
1 2 3 11 8
que
recebe dos
amigos?

No domínio relações sociais a primeira faceta avaliada pretende


investigar o nível de satisfação dos participantes com suas relações
pessoais. Constatou-se que os entrevistados mostraram-se muito
satisfeitos com tais relações.
Para agregar conteúdo à faceta anterior a outra faceta a ser
avaliada nesse domínio procurou investigar a satisfação referente ao
apoio dos amigos. Novamente os participantes relataram estar satisfeitos
com esse apoio.
Pode-se dizer que, a respeito do nível de satisfação com as
relações pessoais e com o apoio dos amigos, quanto maior for essa
satisfação maior será a QV. Constata-se, portanto, que o grupo estudado
apresenta-se satisfeito com suas relações pessoais e de amizade, o que
influencia positivamente sua QV.
Ao relacionar o domínio relações sociais com a variável sexo
não se obteve associação [x²= 5,14; gl = 3; p = 0,16; NS]. Também não
se obteve associação ao relacionar o domínio relações sociais com a
variável tempo de tratamento [x²= 12,79; gl = 9; p = 0,17; NS]. O
cruzamento dos resultados obtidos no domínio relações sociais com a
78

variável idade também não apresentou associação [x²= 7,28; gl= 6; p=


0,29; NS].

6.2.4 Domínio meio-ambiente

O domínio meio-ambiente é composto por 8 facetas, pois trata-


se de um domínio bastante abrangente, é o maior domínio em número de
questões do questionário. Nele 3 participantes obtiveram resultado
“boa”, sendo elas mulheres, 4 “necessita melhorar”, sendo 2 homens e 2
mulheres e 18 “regular”, sendo 10 homens e 8 mulheres. A tabela de
distribuição do quarto domínio apresenta cada faceta desse domínio,
representada pela pergunta referente, e a distribuição das respostas dos
participantes para cada uma.

Tabela 4
Distribuição das respostas do domínio meio ambiente

Domínio
Meio Muito Mais ou
Nada Bastante Extremamente
Ambiente pouco menos

Q 8 - Quão 0 3 8 13 1
seguro você
se sente
com sua
vida diária?

Q 9 - Quão 0 0 5 19 1
saudável é
seu
ambiente
físico?

Nada Muito Médio Muito Completa-


pouco mente

Q 12- 0 8 15 0 2
Você tem
dinheiro
79

suficiente
para
satisfazer
suas
necessidad
es?

Q 13- 0 3 5 14 3
Quão
disponível
para você
estão as
informaçõe
s que
precisa no
seu dia a
dia?

Q 14- Em 8 7 5 3 2
que medida
tem
oportunida
de de
lazer?

Nem
Muito Insatisfeito satisfeito Satisfeito Muito
insatisfeito nem satisfeito
insatisfeito

Q 23- 1 1 1 16 6
Quão
satisfeito
você está
com as
condições
do local
onde
mora?

Q 24- 1 6 3 14 1
Quão
satisfeito
você está
com o
80

acesso aos
serviços de
saúde?

Q 25- 0 0 3 20 2
Quão
satisfeito
você
está com o
seu meio
de
transporte?

A primeira faceta investigou o quão seguro os participantes


desse estudo sentiam-se na sua vida diária e concluiu que a maioria
deles apresenta-se bastante seguros com sua vida diária, o que está
relacionado com a capacidade de realizar atividades sem ajuda de outras
pessoas.
A segunda faceta investigou o quão saudável era o ambiente
físico (clima, barulho, poluição, dentre outros) em que os entrevistados
viviam. A maioria referiu viver em um ambiente bastante saudável.
Mantém-se, assim, a inclinação positiva também nesse domínio.
A terceira faceta avaliada diz respeito à questão financeira e
procurava investigar se os participantes possuíam dinheiro suficiente
para satisfazer suas necessidades. Nessa faceta houve predominância de
um posicionamento negativo e intermediário nas respostas. Esses
resultados encontrados podem refletir a baixa escolaridade da amostra
estudada, o que impacta na empregabilidade. Além disso, a hemodiálise
é outro fator que impacta na empregabilidade dos pacientes.
Quanto a disponibilidade de informações, quarta faceta desse
domínio, houve novamente o predomínio de respostas positivas, sendo
que a maioria dos participantes relatou que as informações
apresentavam-se muito disponíveis.
A quinta faceta avaliou as oportunidades de lazer dos
entrevistados, nessa faceta encontrou-se uma tendência negativa nas
respostas, uma vez que a maioria referiu que não têm oportunidades de
lazer. Para os participantes, apesar de residirem numa cidade litorânea
onde a oferta de atividades de lazer é bastante farta, as oportunidades de
lazer não são suficientes para satisfazer suas necessidades.
81

A sexta faceta desse domínio diz respeito às condições do local


onde moram os entrevistados. Eles mostraram-se, em sua maioria,
satisfeitos ou muito satisfeitos com tais condições.
No que diz respeito à satisfação com o acesso aos serviços de
saúde, a sétima faceta a ser investigada, houve também uma tendência
positiva nas respostas. A maioria dos participantes referiu estar
satisfeita.
Por fim, a última faceta do domínio meio-ambiente, avaliou a
satisfação dos participantes com o meio de transporte que utilizam. O
resultado, sendo que a maioria das respostas foi positiva, mostrou que os
participantes referiram estar muito satisfeitos com o meio de transporte
do qual dependem.
O domínio meio-ambiente apresentou, no geral, respostas
positivas em quase todas as facetas. As facetas nas quais houve uma
tendência às respostas negativas foram aquelas que estavam
relacionadas à questão financeira e de lazer. Esse dado é bastante
significativo considerando-se que se trata de uma amostra de pacientes
de hemodiálise e que as respostas a essas questões podem ser reflexo do
tratamento a que estão submetidos.
Ao relacionar os resultados do domínio meio ambiente com a
variável sexo não se obteve associação [x²= 3,18; gl= 2; p= 0,20; NS].
Também não se obteve associação ao relacionar os resultados do
domínio meio-ambiente com a variável tempo de tratamento [x²= 4,95;
gl= 6; p= 0,55; NS]. O cruzamento dos resultados obtidos no domínio
meio-ambiente com a variável idade também não apresentou associação
[x²= 0,40; gl= 4; p= 0,98; NS].
Deve-se ressaltar que, de acordo com a distribuição dos
resultados, os resultados para o domínio meio ambiente foram
considerados regulares para todas as faixas de tempo de tratamento.
Sendo que, entre aqueles que fazem hemodiálise há mais de 7 anos,
nenhum apresentou como resultado “boa” ou “necessita melhorar”.
Diante da exposição dos dados obtidos com a aplicação do
instrumento WHOQOL – Bref pode-se concluir que houve uma
avaliação predominantemente positiva da maioria dos domínios que
compõem o questionário. Portanto, os participantes desse estudo
apresentam-se otimistas e satisfeitos, apesar de alguns aspectos
negativos como: baixa capacidade para o trabalho, dependência do
tratamento, presença de sentimentos negativos com alguma frequência,
entre outros. Além disso, pode-se observar que dispõem de uma rede de
apoio importante, consideram-se independentes, em sua maioria, apesar
das necessidades impostas pelo tratamento e sua dinâmica.
82

Pode-se dizer também que os participantes apresentam


capacidade de lidar com as dificuldades, pois apesar de referirem
condições financeiras insuficientes para suas necessidades, relataram
sentir-se seguros e satisfeitos com as condições que lhes são oferecidas.
O grupo estudado, portanto, apresentou um perfil de pessoas com boa
autoestima e resiliência, o que influencia também na sua percepção de
QV.
A Tabela 5 mostra as médias dos escores obtidos em cada um
dos domínios.

Tabela 5
Distribuição das médias dos escores nos domínios do WHOQOL-Bref.

Domínio Média Desvio Mínimo Máximo


padrão
Físico 47,71 13,23 14,29 67,86
Psicológico 65,66 11,67 29,17 87,50
Relações sociais 76,5 22,04 25 100
Meio ambiente 60,87 11,41 43,75 90,63

Pode-se perceber que a média mais elevada dos quatro


domínios que compõe o WHOQOL-Bref foi atribuída ao domínio
relações social, que avaliou a percepção dos participantes no que diz
respeito aos seus relacionamentos pessoais, apoio e inclusão social. Em
seguida, obteve a segunda média mais elevada o domínio psicológico. Já
os domínios meio ambiente e, em especial, o domínio físico, obtiveram
as menores médias.
A análise das médias dos domínios do WHOQOL-Bref
demonstrou a importância dos fatores sociais e psicológicos, uma vez
que esses domínios obtiveram as maiores médias. Isso leva a crer que se
trata de uma amostra que apresenta: boa autoestima, satisfação consigo
mesmos; além de contar com o apoio advindo das relações sociais.
As médias mais baixas, designadas aos domínios meio ambiente
e físico, demonstram que as consequências físicas do tratamento têm
repercussões na vida em geral, influenciando as questões de lazer,
trabalho, financeiras, culminando na diminuição da QV.
83

6.3 Representações sociais da doença renal crônica

Neste momento serão descritos os resultados das análises de


dados textuais originados na questão 1: “Qual o significado da doença
renal crônica para você?”.
O conteúdo resultante da análise realizada pelo software
IRAMUTEQ empregada no primeiro corpus chamado “Doença renal
crônica” encontrou 317 segmentos de texto sendo 276 (87,07%)
analisáveis e considerados na classificação hierárquica descendente
(CHD). Os segmentos de texto foram compostos por 1.476 palavras que
ocorreram 10.918 em uma média no corpus de 7,39 vezes cada uma.
Foram consideradas as variáveis: sexo, idade, tempo de
tratamento e a resposta à questão do WHOQOL que dizia respeito à
satisfação com a saúde. A CHD dividiu o corpus em 6 classes sendo que
em um primeiro momento houve a subdivisão em dois. A primeira
partição separou a classe 6 das demais, a segunda partição dividiu as
classes 3,2 e 5 das classes 1 e 4. Em seguida, na terceira partição houve
a separação das classes 5 e 3 da classe 2. A classe 1 se diferenciou da
classe 4, na quarta partição. Por fim, a classe 3 se diferenciou da classe
2, resultando no dendograma apresentado na Figura 2.

Figura 2. Dendograma da classificação hierárquica descendente do


corpus Doença renal crônica.
84

A seguir as classes serão descritas seguindo a ordem de partição


e de proporção que representam em relação ao corpus total:

A primeira classe de conteúdos a ser analisada é a classe 6:


“Aspectos médicos”, com 13,5% dos STs. Essa classe trata dos aspectos
médicos e da preparação para o começo do tratamento hemodialítico,
que geralmente ocorre logo após a descoberta da doença renal crônica.
Os principais elementos que compõem essa classe são: cirurgia, ficar,
fístula, braço. Os participantes relataram cuidados com a fístula
arteriovenosa e falaram sobre a cirurgia de construção dela,
procedimento que antecede o início da hemodiálise.
É importante ressaltar que a construção das fístulas
arteriovenosas é feita por meio de cirurgias de pequeno porte,
extremamente delicadas, nas quais uma veia superficial é suturada em
uma artéria. Isso acontece para permitir que o sangue arterial, que tem
alta pressão, passe para a veia superficial, aumentando-a de volume e
possibilitando um maior fluxo sanguíneo, o que permite a realização da
hemodiálise.
Alguns trechos que exemplificam essa classe:

Eu não chego perto do fogão porque eu tenho medo do calor


no braço. Então eu dependo que alguém faça para mim. Não
gosto de chegar perto do fogo, uma água quente pode
borbulhar e me atingir o braço. (Homem, 58 anos, aposentado,
faz hemodiálise há 3 anos).

Mas agora, depois da hemodiálise, não dá. A gente não pode


estar mexendo muito essa fístula se não estraga tudo, tem que
fazer de novo essa cirurgia, então não dá. (Mulher, 49 anos,
aposentada, faz hemodiálise há 3 anos).

A classe 3 foi a mais representativa do corpus com 20% dos


segmentos de texto classificados. Denominada “Descoberta” ela se
refere a descoberta da doença renal crônica e seus principais elementos
são: médico, rim, dizer, exame. O conteúdo dessa classe se refere,
principalmente, ao diagnóstico da doença renal crônica. Os participantes
relataram a experiência da descoberta da doença e como se deu o
diagnóstico. Alguns trechos selecionados ilustram essa classe:

Fiz uns três ou quatro exames, levei para ela ver, ela viu e
disse que eu tinha que procurar um especialista o quanto antes
85

que eu estava com problema de rim. (Homem, 82 anos,


aposentado, faz hemodiálise há 3 anos).

Começou com a ureia muito alta e foi indo. Os exames deram


muito alto tudo, potássio, o fósforo, tudo alto. Aí ela descobriu
que eu estava com problema nos rim e ela me disse que eu
estava com oito por cento funcionando. (Mulher, 63 anos,
costureira, faz hemodiálise há 3 anos).

A classe 2 com 16,7% dos STs foi denominada “Começo do


tratamento”. Os conteúdos se organizaram principalmente em torno dos
elementos: ano, hemodiálise, doença, começar. Nessa classe há um
enfoque ao início do tratamento da doença renal crônica, a hemodiálise,
e a dificuldade encontrada nesse período. Trata-se também nessa classe
da aceitação da doença e do tratamento e sobre a impossibilidade de
parar de realizá-lo. Algumas falas exemplificam esse contexto:
No começo foi muito chocante, fiquei muito deprimida, chorava
muito. Eu entrava () chorando e saia chorando. Eu acho difícil,
é uma doença que tu gasta muito tempo da tua vida com ela
vindo aqui. (Mulher, 63 anos, costureira, faz hemodiálise há 3
anos).

Foi uma surpresa, eu não sabia que eu estava com essa doença
e quando eu fui ver ela já estava muito agravada. Quando eu
soube fiquei meio assim, mas não me assustei muito não,
porque a gente tem que aceitar. (Mulher, 50 anos, aposentada,
faz hemodiálise há 6 meses).

A próxima classe é a 5: “Antes do tratamento”, com 18,8% dos


STs, a qual também foi produzida principalmente por pessoas que se
declararam bastante satisfeitas com a sua saúde. Os elementos que se
destacam nessa classe são: sentir, inchado, pedra. Está classe está
relacionada à descoberta da doença renal crônico e ao início da
hemodiálise. Os pacientes relatam que antes de iniciar o tratamento
apresentavam como sintomas da doença inchaço nas pernas, ganho de
peso, dificuldade para andar e alguns tinham histórico de pedra nos rins.
Alguns excertos retratam isso:

Eu estava tão inchado antes de fazer hemodiálise, minhas


pernas pareciam que iam explodir. Eu estava bem mal mesmo,
86

eu sinto um peso nas minhas pernas, parece que tem chumbo


nelas, muito pesadas. (Mulher, 45 anos, auxiliar de serviços
gerais, faz hemodiálise há 6 anos).

Fiquei uns quatro, cinco meses em cima de uma cama sem


andar, não fazia nada, tinham que vir me dar comida. Nem
comer eu queria, ficava na cama o dia inteiro dormindo.
(Mulher, 52 anos, aposentada, faz hemodiálise há 6 anos).

A classe 4 representa 17% dos STs classificados, recebeu o


nome “Vida normal” e foi produzida principalmente por pessoas que se
declararam bastante satisfeitas com a sua saúde. Para os participantes a
doença renal crônica já se tornou algo normal, que faz parte da vida e
que requer alguns cuidados. Exemplos dessa classe são os excertos que
seguem:

Hoje para mim já é uma rotina. Faço a hemodiálise e levo


minha vida normal, dirijo, quinze minutos depois eu estou
dirigindo. Levo minha vida normal. (Mulher, 56 anos, técnica
administrativa, faz hemodiálise há 1 ano).

Para falar a verdade agora já estou normal. Já me acostumei.


No começo não, no começo foi ruim, mas agora já estou
acostumada. (Mulher, 49 anos, aposentada, faz hemodiálise há
3 anos).

A classe 1 chamada “Dependência” possui 14,1% dos STs e


seus principais elementos são, entre outros: coisa, só, dia, máquina.
Nesse sentido, a doença renal crônica é relacionada com o tratamento, a
hemodiálise, que é considerada algo que gera dependência, pois parte do
dia dos pacientes é gasto com ela. Além disso, essa classe está
relacionada ao sentimento de dependência, não só do tratamento, mas à
família e ajuda dos demais para atividades do dia-a-dia. Os segmentos
de texto a seguir exemplificam esse contexto:

Para mim ser renal crônico é uma prisão porque não pode
fazer tudo que quer, fica um dependente. Eu dependo de
alguém para fazer as coisas para mim na cozinha. (Homem, 58
anos, aposentado, faz hemodiálise há 3 anos).
87

Tem um ano agora que eu já estou dependente da máquina.


Dependente eu digo porque, querendo ou não, a gente depende
disso se não a gente morre. Então, nossa vida depende disso.
(Mulher, 61 anos, aposentada, faz hemodiálise há 1 ano).

Nesse contexto, o passar do tempo torna o tratamento uma


rotina, e então a hemodiálise passa a fazer parte da vida dos pacientes,
tornando-a algo normal. Também os cuidados que o tratamento requer,
como não pegar peso, resultam em algumas perdas, deixar de trabalhar é
uma delas, presente no contexto da classe 4. Assim, os pacientes
relatam com pesar a impossibilidade de realizar essas atividades.

Analisando o dendograma do corpus “Doença renal crônica” é


possível identificar que seu conteúdo foi bastante permeado pela questão
do tratamento, pois em diversas classes há referência à hemodiálise,
suas dificuldades, o início desse tratamento e os cuidados que requer.

6.4 Representações sociais da hemodiálise

A seguir serão descritos os resultados das análises de dados


textuais originados na questão número 2: “O que você pensa do
tratamento que você tem feito, a hemodiálise?”
Para essa análise foram consideradas as variáveis: sexo, idade,
tempo de tratamento e a questão do WHOQOL que dizia respeito à
percepção de necessidade de um tratamento médico para levar a vida
adiante. O corpus foi denominado “Hemodiálise” e engloba o conteúdo
originado na questão sobre o que os participantes pensam da
hemodiálise. Por meio da análise lexical o software identificou 244
segmentos de texto (STs), sendo 221 (90,5%) considerados na CHD.
Foram identificadas 1.274 palavras, que ocorreram 8.250 vezes, com
média de ocorrência de 6,47.
O corpus foi dividido em 7 classes distintas obtendo 6
partições. Na primeira, houve a divisão em dois subcorpus.
Posteriormente, a classe 2 se diferenciou das classes 3,4 e 7.Em seguida,
a classe 1 se separou da classe 6 e da 5. Então, as classes 6 e 5 se
diferenciaram. Por fim, se diferenciaram as classes 4 e 3. Essas partições
resultaram no dendograma apresentado na Figura 3.
88

Figura 3. Dendograma da classificação hierárquica descendente do


corpus Hemodiálise.

A seguir as classes serão descritas seguindo a ordem de partição


e de proporção que representam em relação ao corpus total:

A classe 2, chamada “Aceitação e limitações”, representa


17,6% do corpus e tem como principais elementos: Deus, querer,
trabalhar. Nessa classe está presente a ideia de que o tratamento não
pode ser interrompido, o paciente não pode pará-lo, a não ser pela
realização de transplante renal. Por isso, os participantes relataram
também nessa classe algumas limitações que a hemodiálise implica,
como parar de trabalhar, arrumar a casa, por exemplo. Também há
referência a palavra Deus, alguns agradecem a Deus pela existência do
tratamento e outros pedem que Ele os livre dele. Há, ainda, referência ao
transplante renal, alguns participantes relatam desejo de realizá-lo
enquanto outros relatam medo de fazê-lo. Algumas falas exemplificam o
exposto:

Não posso erguer peso, fazer muito esforço, caminhar muito


longe, essas coisas. É uma doença chata, pode ser que talvez
surja um transplante para mim, dai eu paro de vir aqui. Eu
venho duas vezes por semana e com o transplante não
89

precisaria mais vir. (Homem, 58 anos, aposentado, faz


hemodiálise há 8 meses).

Ainda bem que tem a máquina que dá uma ajuda, dá uma força
para a gente. Ajuda para a gente ficar mais viva, a gente vai
levando assim, como Deus quer. Não quero entrar na fila para
fazer transplante, não entrei. (Mulher, 70 anos, aposentada, faz
hemodiálise há 2 anos e seis meses).

A classe 7, que representa 18,5% dos STs do corpus, recebeu o


nome “Sofrimento”. Essa classe tem como elementos principais: gente,
ficar, vida, bom. O conteúdo dessa classe está principalmente
relacionado com a percepção dos pacientes de que a hemodiálise
melhora suas condições de saúde, além de ser uma obrigação. Porém,
esse é um tratamento doloroso que provoca limitações e impactos na
vida social. Observa-se, nessa classe, que essas modificações são
sinônimos de martírio e sofrimento.

Eu não gosto porque tira muito da nossa liberdade. Eu não


posso trabalhar, eu não posso fazer muito esforço. Fora que eu
tenho que estar aqui sempre, na segunda-feira, quarta-feira e
sexta-feira. (Mulher, 58 anos, aposentada, faz hemodiálise há 6
anos).

Para mim é um sacrifício. Um sacrifício e uma obrigação,


apesar de trazer consequências boas para a saúde, é muito
chato viu. É chato porque você tem que vir aqui, tem que estar
sempre no hospital, não é fácil. (Mulher, 63 anos, costureira,
faz hemodiálise há 3 anos).

A classe 3 está relacionada com o significado da hemodiálise


como sendo a vida para alguns participantes. Essa classe foi denominada
“Vida” e, com 13,6% dos STs se organiza em torno dos elementos:
estar, hemodiálise, ano, saber, viver. O conteúdo dessa classe se refere
ao significado da hemodiálise como um tratamento que permite viver,
que permite o prolongamento da vida dos pacientes. Nesse sentido, o
tratamento hemodialítico representou a esperança de manter-se vivo. A
hemodiálise como condição de sobrevivência está relacionada com a
percepção de que ela é necessária para a manutenção da vida, e que,
apesar dos aspectos desagradáveis, desenvolve funções vitais para o
organismo. Alguns excertos selecionados ilustram essa situação:
90

É uma questão de me deixar viva. Tem gente que tem câncer,


um monte de coisas, mas a gente tem que saber viver. São
restrições que você tem na vida que tem que aceitar numa boa.
(Mulher, 52 anos, aposentada, faz hemodiálise há 13 anos).

Cuido com peso para não pegar muito, para não esforçar
muito o braço, caminho devagar e é isso. Não pode deixar a
peteca cair, como dizem. Se tem que fazer hemodiálise, vamos
fazer, eu quero viver muito ainda e é por isso que estou aqui.
(Mulher, 63 anos, costureira, faz hemodiálise há 3 anos)
Entretanto, o significado da hemodiálise foi ambíguo, uma vez
que ao mesmo tempo em que significa vida, esperança de viver mais
tempo, observou-se também que a ausência do tratamento é sinônimo de
morte. Isso pode ser verificado nos trechos a seguir:

Significa continuar vivendo porque essa doença se você não


cuidar do sangue você acaba se complicando. Se eu parar de
fazer isso eu morro. (Homem, 81 anos, aposentado, faz
hemodiálise há 6 anos).

Eu sei que é uma coisa necessária para mim, é o que está me


mantendo vivo. Na verdade, a hemodiálise no nosso caso de
insuficiência renal é essencial. Se não tiver hemodiálise a gente
vai acabar morrendo. (Homem, 43 anos, gerente de
almoxarifado, faz hemodiálise há 1 ano e seis meses).

A classe 4 foi chamada “Melhora da saúde” e representa


10,9% dos STs do corpus. O conteúdo dessa classe foi produzido
principalmente por participantes com até 55 anos de idade. As palavras
que se destacam nessa classe são: hemodiálise, sentir, depois, começar,
dor. Os conteúdos classificados dizem respeito à visão do tratamento
como algo que trouxe melhoras à saúde dos pacientes. Os excertos a
seguir são exemplos dessa classe:

Eu estou me sentindo bem melhor depois que comecei com a


hemodiálise. Melhorou bastante, andava sempre com dor,
sempre com uma canseira, um monte de doenças chatas.
Comecei a fazer a hemodiálise e melhorou bastante minha
saúde. (Homem, 58 anos, aposentado, faz hemodiálise há 8
meses)
91

Eu faço há um ano e meio e de lá para cá já perdi 27 quilos só


de inchaço. Só me trouxe benefícios, pelo menos para minha
saúde, agora me sinto melhor. Consigo viver melhor sem
aquele excesso todo de peso. (Homem, 43 anos, gerente de
almoxarifado, faz hemodiálise há 1 ano e seis meses).

A classe 1, chamada “Dificuldades”, representa 13,1% dos STs


do corpus e apresenta como elementos principais: coisa, alguma, casa,
sair. Nessa classe os participantes se referem às dificuldades que a
hemodiálise acaba ocasionando nas atividades do dia-a-dia que eles
costumavam realizar. Limpar a casa, sair, pegar peso, comer, são
exemplos de atividades da vida diária que tiveram mudanças
influenciadas pelo processo de tratamento dialítico. Alguns trechos
exemplificam esse contexto:

O que tu estava acostumado, uma coisa mais gorda, uma


carne, não pode. Uma cerveja não pode. Sem graça isso, que
graça vai ter uma comida sem sal, porque também tem que
cortar o sal. As pessoas da tua casa querem comer comida com
sal, comida com gosto. Teus amigos, tu sai, vão querer beber
um álcool, dançar, essas coisas tu já não vai poder. (Homem,
58 anos, aposentado, faz hemodiálise há 3 anos).

Vai em uma festa já não pode tomar nada, nem refrigerante,


nem água não pode tomar muito, tem que cuidar. Foi uma
mudança bem radical. Eu não consigo fazer mais o que gosto,
não consigo nem trabalhar agora, não consigo mais. (Homem,
58 anos, aposentado, faz hemodiálise há 8 meses).

A classe 5, chamada “Rotina”, representa 10,9% dos STs do


corpus. Os principais elementos dessa classe são: só, sexta-feira,
semana. Nessa classe os participantes se referem ao cotidiano do
tratamento, à rotina da hemodiálise, que se incorpora no dia-a-dia deles.
Os pacientes relatam que o fato de ter que estar na hemodiálise duas ou
três vezes por semana acaba atrapalhando seus compromissos e
atividades, o que é visto como algo negativo.

Três vezes por semana eu tenho que estar aqui de manhã,


segunda-feira, quarta-feira e sexta-feira. E se tu deixar de vir
quem é prejudicado é você. Então esse é o lado negativo, tem
92

que vir e não interessa se estiver chovendo ou tem sol.


(Homem, 57 anos, gerente operacional, faz hemodiálise há 11
anos).

Mas você acostuma. Acostuma, não que passe a gostar, isso


não. A hemodiálise me deixa bastante preso, muitas coisas eu
não posso fazer por causa disso, porque tenho que estar aqui
toda semana todo esse tempo. (Mulher, 63 anos, costureira, faz
hemodiálise há 3 anos).

A classe 6, que representa 15,9% dos STs do corpus foi


denominada “Aspectos ruins” pois está relacionada com os aspectos
negativos expostos pelos participantes. Os principais elementos da
classe são: dia, todo, semana, vez, vir. Observa-se que o fato da
hemodiálise ser um tratamento semanal, que é realizado de duas a três
vezes por semana, é um dos principais aspectos negativos na opinião
dos participantes dessa pesquisa. A periodicidade do tratamento faz com
que o cotidiano dos pacientes passe a ser permeado por procedimentos,
rotinas e orientações médicas e de outros profissionais de saúde. Isso
pode ser observado nos excertos a seguir:

É uma chatice só ter que vir para cá duas vezes por semana.
Tem dias que eu falto, venho num dia e não venho no outro,
fico uma semana sem vir. (Mulher, 52 anos, aposentada, faz
hemodiálise há 6 anos).

E aqui eu passo a tarde toda, então é muito tempo que a gente


perde fazendo hemodiálise. Eu tenho que organizar tudo
pensando que nesses três dias eu estarei aqui e não vou poder
fazer mais nada além disso. (Mulher, 58 anos, aposentada, faz
hemodiálise há 6 anos).

A hemodiálise, portanto, foi pensada como uma modalidade de


tratamento que aprisiona e limita as ações dos pacientes, uma vez que
compromete o convívio social, a liberdade para viajar, passear, trabalhar
e arrumar a casa.
93

6.5 Análise com divisão temática das representações sociais da


doença e do tratamento

Foi realizada uma análise com divisão temática com o objetivo


de verificar as relações entre o conteúdo dos dois temas pesquisados.
Para a análise temática foi considerada como temática 1 a questão da
doença renal crônica e como temática 2 a questão sobre a hemodiálise.
O conteúdo resultante da análise realizada pelo software IRAMUTEQ
no corpus encontrou 561 segmentos de texto sendo 442 (78,79%)
analisáveis e considerados na classificação hierárquica descendente
(CHD). Os segmentos de texto foram compostos por 2.027 palavras que
ocorreram 19.169 em uma média no corpus de 9,4 vezes cada.
A CHD dividiu o corpus em 4 classes, sendo que em um
primeiro momento houve a subdivisão em dois subcorpus, um com a
classe 1 e outro com as classes 2,3 e 4. No segundo momentos a classe
4 foi separada das classes 2 e 3. A terceira partição separou as classes 3
e 2. Essas partições resultaram no dendograma apresentado na Figura 4.
94

Figura 4. Dendograma da análise temática do corpus.

A seguir as classes serão descritas seguindo a ordem de partição


e de proporção que representam em relação ao corpus total:

A classe 1, que representa 20.81% dos STs está relacionada à


temática da doença renal. Os principais elementos dessa classe são:
dizer, dar, médico, rim, doença. O conteúdo dessa classe está
relacionado com o momento da descoberta da doença quando o
diagnóstico é dado pelo médico. Os seguimentos de texto exemplificam
essa classe:
95

E assim a gente vai continuando, vai levando, fazer o que.


Agora no mais está tudo bem. Eu descobri a doença renal
crônica quando eu estava tratando a pressão alta aqui no
hospital mesmo com o médico (Mulher, 70 anos, aposentada,
faz hemodiálise há 2 anos e seis meses).

Descobri essa doença por causa disso tudo que me deu. Fui no
médico e ele disse que eu tinha que começar a fazer
hemodiálise sem escapatória. Mas ela é uma doença silenciosa,
ela é quietinha, daqui a pouco ela aparece. (Homem, 57 anos,
gerente operacional, faz hemodiálise há 11 anos).

A classe 4 representa 29,19% dos STs classificados e apresenta


o conteúdo compartilhado entre as temáticas doença renal e
hemodiálise. Nessa classe os elementos principais são: casa, dia, chegar,
sair, pegar. O conteúdo dela apresenta a ideia de que a doença e o
tratamento trazem restrições para a vida cotidiana dos pacientes, suas
relações pessoais, atividades laborais e alimentação. Isso é observado
nas falas a seguir, características dessa classe:

Agora não posso fazer mais nada, nem lavar roupa, nem fazer
faxina, nem mais nada. Até tenho que pagar para fazerem na
minha casa e nem me aposentei ainda nem nada, não estou na
perícia nem nada. (Mulher, 62 anos, aposentada, faz
hemodiálise há 3 anos).

Eu não tenho mais certas liberdades, não posso pegar o carro


e ir para onde eu quiser, ir para cima e para baixo. Se eu
resolver viajar não posso fazer isso, não posso comer carne.
(Homem, 58 anos, aposentado, faz hemodiálise há 8 meses).

A classe 3 representa 23.98% dos STs classificadas e está


relacionada a temática da hemodiálise. Apresenta como principais
elementos: ficar, hemodiálise, vez, ver, gente. As falas dos participantes
presentes nessa classe mostram que a hemodiálise passa a fazer parte do
cotidiano dos pacientes, eles também relatam que muito do seu tempo é
agora despendido no tratamento e que ele é visto como algo que não
pode faltar. Alguns seguimentos de texto exemplificam esse contexto:
96

Mas como tem que vir aqui três vezes por semana acaba
dependente dessa máquina porque o rim não trabalha mais.
Para mim é terrível ficar dependente de uma máquina para
caminhar, para ir para algum lugar, para poder levar a vida.
(Homem, 58 anos, aposentado, faz hemodiálise há 8 meses).

Ela te tranca muito e você sabendo viver leva ela tranquilo. É


que eu faço três vezes por semana, se eu quiser viajar, que nem
eu estou querendo ir em Aparecida, já passa dos dois dia fora
então e não dá para ir.(Homem, 57 anos, gerente operacional,
faz hemodiálise há 11 anos).

A classe 2 possui 26.02% dos STs, está relacionada com a


temática da hemodiálise e foi produzida principalmente por pessoas que
se consideram bastante satisfeitas com sua saúde. Os principais
elementos dessa classe são: hemodiálise, gente, vida, ano. É possível
observar, por meio das falas dos participantes, que essa classe está
relacionada com a ideia de que a hemodiálise significa o prolongamento
da vida, oferece melhora na saúde, e por isso é considerada um
tratamento bom. Isso pode ser observado nos segmentos de texto
característicos da classe:

Para mim a hemodiálise é uma coisa boa porque me trouxe


saúde. É ruim estar aqui parado três horas, mas para mim foi a
melhor coisa que pode existir. Se não fosse a hemodiálise eu já
tinha ido embora, tinha morrido. (Homem, 82 anos,
aposentado, faz hemodiálise há 3 anos).

Foi bom a hemodiálise porque eu sentia muito cansaço, eu


parei de sentir, melhorou bastante a minha saúde. Eu comecei
a aceitar, mas é difícil, eu estou entrando na fila do
transplante, estou fazendo todos os exames. (Mulher, 63 anos,
costureira, faz hemodiálise há 3 anos).

Por meio da análise do dendograma resultante da análise com


divisão temática, no qual uma temática representava a doença renal
crônica e a outra a hemodiálise, pode-se inferir que a doença possui
conteúdos que dizem respeito apenas a hemodiálise, conteúdos esses
presentes na classe 1. Essa classe apresenta os aspectos médicos da
doença e também sua descoberta por parte dos pacientes. Nela os
pacientes relatam como descobriram o diagnóstico e os sintomas da
97

doença, sendo que não mencionam ainda o tratamento, por isso esse
conteúdo é relacionado apenas ao tema doença.

Porém, há também conteúdos compartilhados entre as duas


temáticas, tanto relacionados à doença renal crônica quanto a
hemodiálise, que são representados na classe 4. O conteúdo
compartilhado entre as duas temáticas está relacionado com a rotina que
se estabelece com o início do tratamento. Como o tratamento deve-se à
presença da doença, pode-se relacionar os dois, pois por estar doente é
preciso realizar o tratamento.

Já o tema hemodiálise apresenta conteúdos particulares, que


estão relacionados apenas a esse tema, porém divididos nas classes 2 e
3. A classe 2 apresenta conteúdos que expressam o significado do
tratamento, como se o tratamento significasse a saúde, a vida e por isso
ele é visto como algo bom. Na classe 3 os conteúdos estão relacionados
a aspectos do cotidiano do tratamento, como o tempo despendido e o
sentimento de que o tempo na máquina de hemodiálise demora a passar,
tornando-a algo chato.

6.6 Análise com divisão temática da questão acerca da QV

As respostas fornecidas pelos participantes à questão: “O que


você entende por Qualidade de Vida?” foram analisadas segundo o
modelo da análise com divisão temática, proposto por Bardin (1977). A
partir dessa análise foi possível categorizar as falas dos participantes.
Tal como pode ser observado na Tabela 6.

Tabela 6
Explicitação da Categorização Temática

Categorias Definições Temas

Trabalho Temas que envolvem Trabalho, serviço,


aspectos da questão do emprego, aposentar,
trabalho encostar

Atividades diárias Temas relacionados às Faxina, limpar, lavar,


limitações na realização esfregar, estender,
de atividades do dia-a-dia carregar, pegar, peso,
arredar, compras,
98

subir, descer

Cuidados Temas que apontam os Remédios, diabetes,


diversos cuidados que imunidade, fístula,
passam a ser tomados doenças, cateter,
após iniciar o tratamento pressão

Dependência e Temas que abordam a Tratamento, máquina,


apoio percepção de hemodiálise, família,
dependência em esposa, esposo,
determinados aspectos e filhos, amigos,
apoio vizinhos, ajuda

Lazer Temas que tratam da Festa, viajar, alegria,


questão do lazer sair, atividade física,
correr, bicicleta,
caminhada

Consequências Temas que relatam as Dor, cansaço,


físicas consequência físicas fraqueza, urina,
percebidas pelos ardência, inchaço,
pacientes moleza, dor de
cabeça, debilitado

Alimentação Temas que tratam da Comer, sal, água,


questão da alimentação e carne, bebida,
suas restrições churrasco, cerveja,
caipirinha, líquido,
frutas, refrigerante,
amendoim, doce,
dieta, açúcar

Diversos temas foram identificados no conteúdo das falas dos


participantes e foram reveladas diferentes concepções envolvidas nessa
questão. Essas categorias revelam os principais aspectos da qualidade de
vida que, na percepção dos participantes desse estudo, sofrem as
consequências da hemodiálise. Optou-se por apresentar, primeiramente,
a categorização, suas definições e os temas relacionados, para
posteriormente, respaldar a análise com os discursos de origem visando
contextualizar os temas emergentes.
99

6.6.1 Categoria trabalho

A partir da pergunta sobre o entendimento dos participantes


acerca da QV, foi possível detectar os diversos aspectos da qualidade de
vida que sofrem influência do tratamento. Um desses aspectos é o
trabalho, portanto, essa categoria trata da influência da hemodiálise
sobre a capacidade de trabalhar dos pacientes e teve frequência de 55
vezes nas falas dos participantes.
A maioria deles relata que, após iniciar o tratamento, foi preciso
deixar de trabalhar. Isso porque o tratamento exige que o paciente adote
uma rotina, despendendo dois ou três dias para a realização do mesmo,
impossibilitando de manter-se no mercado de trabalho. O fato de não
poder mais trabalhar impacta no aspecto financeiro, pois a remuneração
pelo trabalho que antes era realizado pode deixar de contribuir para as
despesas do paciente e sua família. Alguns trechos de falas podem
ilustrar essa situação:

Mudou um monte sim, eu não posso mais trabalhar, tive que


pedir aposentadoria, então eu acabo ganhando menos
dinheiro. (Mulher,58 anos, aposentada, faz hemodiálise há seis
anos)

Eu sou um cara que começou a trabalhar muito novo,


acostumado a acordar cedo e trabalhar, toda a vida fiz isso, só
trabalho pesado, não media esforço. Hoje em dia não posso
fazer nada, não posso pegar nada. (Homem, 58 anos,
aposentado, faz hemodiálise há três anos)

Portanto, pode-se observar que há importantes implicações


econômicas decorrentes da hemodiálise. Ela influencia, de modo
marcante e decisivo, o aspecto laboral da vida dos pacientes e está
associada à redução das horas de trabalho, a menores taxas de salário, à
aposentadoria precoce, à saída antecipada do mercado de trabalho e a
programas de transferência de renda, bem como à dificuldade em
encontrar emprego. Por tudo isso, a família do indivíduo em
hemodiálise também acaba sendo afetada.

6.6.2 Categoria atividades diárias

Outro aspecto que interfere na qualidade de vida e recebe


grande influência do tratamento e suas consequências é a realização das
100

atividades diárias. Nelas inclui-se caminhar, limpar e cuidar da casa,


carregar peso, fazer compras, entre outras.
Os pacientes relatam que, por consequência do tratamento,
sentem-se impossibilitados de realizar diversas atividades do cotidiano,
como realizavam anteriormente. Caminhar passa a ser uma atividade
dificultosa, assim como limpar a casa, que muitas vezes passa a ser
designada a terceiros.
Por causa da localização da fístula ou do cateter os pacientes
também não podem carregar objetos pesados, o que passa a dificultar
várias atividades do dia-a-dia, como carregar compras, segurar os filhos
ou netos no colo e pegar objetos do chão ou de lugares altos. Essa
categoria esteve presente 32 vezes no discurso dos participantes.
Algumas falas exemplificam essa situação:

Não posso pegar alguma coisa no chão, não posso pegar um


balde pesado, não posso carregar muita compra. (Homem, 58
anos, aposentado, faz hemodiálise há três anos)

Nisso interfere, subir e descer, carregar peso, me atrapalha.


Então tu tens que se conformar, eu peço pra minha nora
comprar o que eu preciso do centro pra mim, ela vai lá e me
traz. (Mulher, 67 anos, aposentada, faz hemodiálise há quatro
meses).

É possível observar relação entre essa categoria, que versa sobre


as dificuldades para realizar tarefas do cotidiano, e a categoria
anteriormente citada que trazia a questão do trabalho. Uma vez que os
pacientes relatam dificuldades em tarefas do dia-a-dia que,
anteriormente, eram realizadas sem maiores complicações, observa-se
que essa dificuldade reflete também na capacidade de trabalhar.

6.6.3 Categoria cuidados

A hemodiálise é um tratamento que requer dos pacientes


diversos cuidados, como a administração de doses de diversos tipos de
medicamentos, além dos cuidados com a fístula ou o cateter. Os
entrevistados relataram que o cateter ou a fístula precisam de cuidados
específicos, pois pode acontecer de ter que trocá-lo, o que é feito por
meio de uma dolorosa cirurgia. Por isso, deve-se ter cuidado ao realizar
movimentos com o braço no qual se localiza a fístula.
101

Além disso, os pacientes relataram preocupar-se em dormir bem


e não pegar outras doenças, pois ambos podem atrapalhar o bom
andamento da hemodiálise. Há, ainda, a preocupação daqueles que
fazem concomitantemente a hemodiálise outros tratamentos médicos,
como diabetes e controle da hipertensão. A categoria cuidados obteve
frequência de 11 vezes nas falas dos participantes. Pode-se constatar
isso por meio de alguns trechos:

Eu tenho que cuidar com o cateter, tenho tanto cuidado com


esse cateter porque eu já botei dois, e de repente ele saiu, mas
graças a Deus não saiu sangue. Vim pra cá, eles tiraram tudo
direito, depois tive que fazer esse. Mas agora tenho cuidado
com esse aqui, antes eu estendia a roupa bem no alto, essas
coisas assim, agora tenho cuidado quando faço alguma coisa
assim. Dá um medo porque, olha, a gente sofre pra fazer a
cirurgia. Tem anestesia, mas a anestesia quase não pega, a
gente sente aquela dor toda. (Mulher, 62 anos, aposentada, faz
hemodiálise há três anos)

São muitos remédios pra tomar, é pressão, é tanta coisa. Mas


eu acredito que o tempo faz acostumar, e aí a rotina muda, não
é que piora, mas muda. (Mulher, 63 anos, costureira, faz
hemodiálise há três anos)

Os participantes relataram, portanto, preocupar-se mais com a


saúde do que se preocupavam quando não estavam fazendo hemodiálise.
Além disso, alguns cuidados específicos foram acrescentados às suas
vidas devido ao tratamento, como o movimento do braço, por exemplo.

6.6.4 Categoria dependência e apoio

O tratamento hemodialítico é visto pelos pacientes, com o


passar dos anos, como algo necessário, indispensável para sobreviver e
evitar complicações de saúde. Muitas vezes, devido à necessidade e a
obrigatoriedade de serem submetidos a ele, os pacientes passam a
enxergar o tratamento, bem como a máquina dialisadora, como uma
dependência.

Outro fator que é visto como dependência é o fato de que,


devido ao esgotamento físico resultante do tratamento, muitos pacientes
necessitam de ajuda, seja dos familiares, de amigos ou vizinhos, para as
102

mais diversas atividades. Seja para cozinhar, levar e buscar da sessão de


hemodiálise, fazer compras, carregar peso, dirigir, entre outras. Essa
dependência é compreendida como algo incômodo para os pacientes,
que gostariam de poder realizar essas atividades por conta própria.
A questão do apoio também envolve a família, os amigos,
vizinhos, pois a ajuda nessas diversas atividades reflete na percepção de
apoio dos pacientes, que vêem nessas pessoas alguém com quem podem
contar, principalmente na questão da ida e volta da sessão hemodialítica.
Aqueles que não têm esse suporte relatam essa situação com pesar, pois
precisam chamar um táxi, pegar ônibus ou mesmo ir caminhando para a
casa após a sessão de hemodiálise, um momento crítico no qual podem
ocorrer reações indesejadas. Os temas relacionados a essa categoria
estiveram presentes 43 vezes nas falas dos participantes. Algumas delas
exemplificam esse contexto:

Eu olho as coisas por fazer e tenho que esperar alguém que me


ajude, e esse adiamento das coisas é angustiante pra mim, eu
quero agora não é daqui a pouco. Queria fazer na hora que eu
estou com vontade, porque eu sempre fui muito ativo. Mas tem
que esperar dois dias, três dias, isso me dá uma ansiedade,
uma agonia. Eu nunca dependi de ninguém pra nada, sempre
fiz as coisas sozinho. Então às vezes eu tenho que sair pra
aliviar, arrumar outra coisa pra me distrair pra eu não ver
aqui ali por fazer. Se não a gente pira porque a gente não
consegue fazer, tem que esperar. (Homem, 58 anos,
aposentado, faz hemodiálise há três anos).

Minha família, filhos e filhas me ajudam muito também. Minha


filha vem me buscar depois da hemodiálise, sempre ela e minha
neta vêm me buscar, não se incomodam de fazer isso por mim.
Porque eu não tenho como ir embora sozinho daqui, não que
eu saia sempre ruim, não é isso, mas é que pode ser que
aconteça de se sentir mal, então o ideal é sair daqui
acompanhado, quem puder, melhor, pra não correr nenhum
risco. (Homem, 82 anos, aposentado, faz hemodiálise há três
anos).

Os pacientes relatam cerca ambiguidade de sentimentos com


relação à família, principalmente. Ao mesmo tempo em que alguns
veem na família uma grande fonte de apoio para superação da doença e
103

do tratamento, pelo auxílio que recebem em questões do dia-a-dia da


doença, também não gostam de se sentir dependentes de outras pessoas
para pequenas coisas, como ir até o local da hemodiálise, fazer compra,
limpar a casa, entre outras.
O apoio de amigos, familiares e o suporte das relações sociais
podem ser benéficos como estratégias de enfrentamento. O suporte
social, portanto, e aquele proveniente da família, pode se constituir
como amparo emocional para encarar as consequências negativas
decorrentes do processo evolutivo da doença e do tratamento.

6.6.5 Categoria lazer

A necessidade de realizar a hemodiálise de duas a três vezes por


semana, com duração de três a quatro horas cada sessão, além das
consequências físicas do tratamento, influenciam nas oportunidades de
realizar atividades de lazer. Os pacientes relatam, com frequência, a
impossibilidade de viajar devido à periodicidade do tratamento e a
dificuldade em realizá-lo em outra cidade.
Eles relatam, com pesar, a impossibilidade de ausentar-se por
mais de dois dias da cidade devido à necessidade de retornar para
realizar a sessão de hemodiálise. Ademais, o cansaço e a fraqueza
relatados com frequência pelos pacientes também impossibilitam a
realização de atividades de lazer, como correr, caminhar, nadar, pedalar,
entre outras. Os temas referentes a essa categoria apareceram 35 vezes
durante as entrevistas.
As restrições alimentares a que os pacientes devem se
submeter, segundo eles, fazem com que os convites para atividades de
lazer, tais como festas ou churrascos, passem a ser cada vez mais raros.
Os próprios pacientes relatam não se sentir a vontade nessas situações,
pois as restrições envolvem bebidas alcoólicas, refrigerante e,
principalmente, água e sal, como podemos observar nas seguintes falas:

Se eu vou viajar já não posso viajar no dia que faço


hemodiálise. Eu gostava muito de viajar, agora se eu for no
sábado, tenho que voltar no sábado mesmo, por causa da
hemodiálise, segunda eu tenho que estar aqui. Também minha
filha quer que eu viaje com ela, eu até posso fazer hemodiálise
em outro lugar, se eu estiver em outra cidade, eu tenho esse
direito. Mas eu tenho que levar um documento assinado pelo
104

médico, tenho que procurar o médico, procurar a hemodiálise


lá onde eu estiver. Tenho que levar uma autorização daqui, já é
uma tranqueira. (Homem, 82 anos, aposentado, faz
hemodiálise há três anos)

No aspecto social mudou totalmente. São poucos amigos que


sobraram, não são mais aqueles amigos de antes da
hemodiálise. São poucos que frequentam lá em casa, poucos
convivem. Pararam os convites pra festas, os convites pra sair.
Eu gostava de todo final de semana de dançar, gostava de uma
festinha, agora não posso mais. Não vou sair daqui pra um
baile ficar tomando água mineral. Não vai numa noitada
porque tem que ficar tomando água mineral e ainda que tome,
não pode tomar muito, uma garrafinha e olhe lá. Não tem mais
uma vida social como você tinha, como você quer. (Homem, 58
anos, aposentado, faz hemodiálise há oito meses)

Os participantes relataram, com ênfase, que houve mudanças na


vida social, principalmente com a redução da frequência de passeios e
atividades de lazer. Essas mudanças são decorrentes tanto da
regularidade dos horários de medicação e do tratamento e suas
particularidades, como também da diminuição da renda.

6.6.6 Categoria consequências físicas

A hemodiálise é um tratamento de provoca diversas alterações


físicas. Os pacientes relatam, com frequência, dores, cansaço, fraqueza,
falta de energia, entre outras. Essas alterações, percebidas de tal maneira
pelos pacientes, são impeditivos de diversas atividades, desde tarefas
simples do dia-a-dia, até atividades físicas, trabalho, e lazer.
Devido ao mau funcionamento dos rins na doença renal crônica,
as substâncias tóxicas presentes no sangue começam a se acumular no
organismo, o que provoca inchaço. Muitos pacientes relatam sentir-se
incomodados com o inchaço, que deve diminuir com o passar do tempo
do tratamento. Esse tema esteve presente 32 vezes nas falas dos
participantes. São exemplos desse aspecto:

Tenho muito pouca energia, a energia está enfraquecendo


muito, cada vez que passa a gente vai ficando mais fraco, até
por causa da idade. E muda tudo né, tens que estar toda
105

semana aqui, e esses pés inchados, meus pés estão bem


inchados, tem horas que parece que a gente tem chumbo nas
pernas. (Mulher, 45 anos, auxiliar de serviços gerais, faz
hemodiálise há seis anos)

Principalmente o dia seguinte que a gente faz hemodiálise dá


muita moleza no corpo, cansaço, cansaço nas pernas, dor de
cabeça. Mas passando esse dia volta tudo ao normal. Volta, sai
aquela fraqueza, moleza, isso. Mas daí no outro dia já tem que
estar aqui de novo, tá vendo, é muito ruim isso, a gente está
sempre nessa, vem aqui, passa um dia, volta aqui. (Homem, 79
anos, faz hemodiálise há 8 anos).

É possível relacionar essa categoria, que trata da questão das


consequências físicas da doença e do tratamento, com as anteriormente
citadas. Uma vez que o indivíduo se sente prejudicado em sua saúde,
apresentando os sintomas físicos por eles citados, possivelmente sentirá
prejuízos nos demais aspectos, como capacidade de trabalhar, de manter
uma vida social ativa, de praticar atividades de lazer, entre outras.

6.6.7 Categoria alimentação

Um dos principais aspectos que sofrem alterações por conta da


hemodiálise é a alimentação. Segundo os entrevistados, esse é um dos
fatores que influenciam na qualidade de vida deles por diversos motivos,
pode-se constatar isso devido a presença desse assunto em quase todas
as entrevistas. A dieta que deve ser seguida pelo paciente renal crônico é
baseada em restrições, tais como de líquidos, potássio, sal, fósforo, entre
outros.
A restrição de líquidos passa a ser um empecilho para a vida
social dos pacientes. Eles relatam que nos eventos sociais são
consumidas bebidas que, mesmo as não alcoólicas, devem ser evitadas
na sua dieta. A diminuição do consumo de sal também é um assunto
relevante na fala dos pacientes, alguns relatam que precisam cozinhar
sua comida separada da comida dos demais familiares. São fatos que
influenciam na qualidade de vida dessas pessoas, pois se percebe que a
vida social e o prazer de alimentar-se são permeados por preocupações e
desejos que não podem ser realizados. Os temas relacionados a
alimentação permearam a maioria das entrevistas, com frequência de 61
vezes. São exemplos desse contexto:
106

O que eu noto às vezes é que eu gosto de comer certas coisas e


eu sou privada por causa do potássio, por exemplo, agora meu
potássio está alto. Então eu quero chegar em casa e chupar
duas bergamotas, laranja, banana eu adoro, eu tenho que ver e
saber que não posso comer. E quando eu quero comer eu
procuro comer no dia que venho para a hemodiálise. Eu acho
que assar a banana ou botar no micro-ondas não é a mesma
coisa que comer a banana crua, então eu procuro comer no dia
que venho pra hemodiálise. (Mulher, 52 anos, aposentada, faz
hemodiálise há treze anos)

Modificou bastante, comecei a modificar já na alimentação e


as atividades. Não pode comer o que quer, beber o que quer,
quantidade, churrasco, aquele aroma, aquele barulho na
brasa, tomando uma gelada. A alimentação da gente fica muito
restrita. (Homem, 58 anos, aposentado, faz hemodiálise há três
anos)

É possível observar, portanto, que a doença renal crônica e o


tratamento hemodialítico requerem mudanças, às vezes radicais, no
cotidiano do paciente. A obrigação de frequentar os centros de diálise,
as restrições hídricas e alimentares, além das alterações da jornada de
trabalho e da vida social; consequentemente fazem com que o paciente
passe a conviver com perdas que vão muito além da função renal, e tudo
isso pode gerar instabilidade emocional e diminuição na qualidade de
vida.
107

7 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Esta pesquisa teve como objetivo verificar a relação entre


representações sociais da doença renal crônica e da hemodiálise com a
qualidade de vida dos pacientes que realizam esse tratamento. Com base
nos resultados encontrados e apresentados anteriormente, bem como nos
pressupostos teóricos envolvidos, a discussão dos resultados será
organizada de acordo com os objetivos da pesquisa.
Para tanto, em primeiro lugar será discutido o contexto social da
amostra estudada e, em seguida, as representações sociais da doença
renal crônica e da hemodiálise. Após serão discutidos os conteúdos
acerca da qualidade de vida. Por fim, será discutida a relação entre as
representações sociais da doença renal crônica e da hemodiálise com a
qualidade de vida.
Deve-se considerar o caráter exploratório dessa pesquisa, uma
vez que não se buscou uma representatividade dos sujeitos, de modo que
não é objetivo desse trabalho a generalização dos dados obtidos. O
ponto mais representativo desse estudo, portanto, pode ser considerado o
de compreender uma lacuna presente na literatura, uma vez que busca
relacionar três temas que geralmente são estudados em separado.

7.1 Contexto da amostra

A pesquisa das representações sociais de determinado objeto


social só tem relevância quando o grupo investigado possui a
representação do objeto que se está analisando. Portanto, é
imprescindível que haja uma aproximação dos sujeitos com o objeto,
pois é o sujeito que possui o discurso e o comportamento a ser
analisado.
A amostra do presente estudo foi constituída por pacientes
renais crônicos submetidos à hemodiálise. A composição dela teve a
intenção de pareamento entre os sexos, o que foi obtido com êxito,
apesar de pesquisas anteriores demonstrarem que os homens apresentam
maior resistência a participar de pesquisas relacionadas à saúde devido
ao fato deles buscarem menos os serviços de saúde que as mulheres
(Figueiredo, 2005; Pinheiro, Viacava, Travassos, & Brito, 2002). Nesse
estudo, entretanto, houve a participação satisfatória tanto de homens
quanto de mulheres.
A média de idade da amostra, de 61 anos e meio com desvio
padrão de 11 anos e 7 meses, está dentro da faixa de maior prevalência
108

da doença no país, que é dos 19 aos 64 anos. Esses dados também foram
encontrados em pesquisas anteriores com pacientes em tratamento
hemodialítico no Brasil e em outros países (Russo et al., 2010; Rambod
& Rafii, 2010; Birmelé, Gall, Sautenet, Aguerre, & Camus, 2012; Nunes
& Lobo, 2012; Veerappan, Arvind, & Ilayabharthi, 2012).
Cabe ressaltar que a idade é um fator que influencia fortemente
na questão da mortalidade, no andamento do tratamento e nas
possibilidades de realização do transplante renal. Terra (2007) salienta
que o avanço da idade tem relação com o aumento da frequência de
problemas e complicações decorrentes da condição crônica.
A maioria dos participantes relatou ser casado, condição
semelhante foi encontrada em outros estudos com essa população, como
o de Zambonato, Thomé e Gonçalves (2008), no qual 65% dos
participantes relataram ser casados. Quanto à escolaridade
predominaram ensino fundamental completo e ensino médio completo.
Esse dado corrobora a pesquisa de Loureiro et al. (2011), na qual 90%
dos pacientes de hemodiálise estudados possuíam ensino fundamental
completo.
A renda familiar foi de, na maioria dos casos, de 2 a 3 salários
mínimos. No que diz respeito ao tempo de tratamento a maioria referiu
estar fazendo hemodiálise de 1 a 3 anos. Quanto às comorbidades, as
relatadas com maior frequência foram diabetes e doenças cardíacas.
Esses dados corroboram os encontrados em outros estudos realizados
com população de pacientes da hemodiálise (Souza, Cintra & Gallani,
2005; Barbosa, Júnior, & Bastos, 2007; Arenas et al., 2009; Cavalcante
et al., 2013).
A maioria dos participantes desse estudo relataram ter um(a)
companheiro(a) e filhos. Morin (2005) afirma que o contexto familiar,
bem como as amizades, acompanha o indivíduo na vivência da doença
crônica e possui um papel chave na continuidade do tratamento.
Portanto, o fato da maioria dos pacientes relatar ter convívio com a
família pode se caracterizar um fator protetor em relação ao tratamento.
Kimmel (2000) aponta que o suporte social está relacionado
com o aumento da sobrevida em pacientes que realizam hemodiálise.
Porém, o contexto familiar também pode reagir negativamente quanto às
mudanças decorrentes do tratamento, o que pode gerar conflitos entre a
família devido à necessidade de mudanças de hábitos, principalmente os
alimentares.
Sabe-se que as refeições são uma prática social partilhada no
grupo familiar, por isso, mudar os alimentos e a forma de preparo deles
109

pode gerar atitudes contrárias às mudanças necessárias ao paciente em


tratamento (Santos & Araújo, 2011). Isso pode ser percebido na fala de
alguns participantes que relatam, por exemplo, a necessidade de
cozinhar a própria comida separada da dos demais.
No que se refere à questão de trabalho, a maioria dos
participantes relatou estar aposentado, alguns inclusive de forma
precoce. Essa condição, também encontrada em outro estudo (Patat et
al., 2012) muitas vezes é decorrente das condições de saúde. Baptista e
Carvalho (2011) afirmam que os benefícios de ter um emprego ou
manter uma ocupação, ainda que informalmente, contribuem para o
aumento da autoestima, sentimento de identidade e contribuição para a
sociedade.
Por isso, a condição de aposentado em decorrência da doença
pode estar relacionada a uma diminuição da percepção de qualidade de
vida desses sujeitos. É provável que a periodicidade da hemodiálise,
aliada à duração das sessões e às limitações físicas e emocionais
decorrentes da doença impossibilitem os pacientes de permanecerem
ativos no mercado de trabalho.

7.2 Representações sociais da doença renal crônica

A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu saúde como


um completo estado de bem-estar físico, mental e social e não
meramente a ausência de doença (WHO, 1946). Essa definição, porém,
é frequentemente alvo de críticas, considerado um conceito utópico, pois
remete a um estado inatingível. Uma vez que as pessoas não
permanecem constantes num estado de bem-estar, esse conceito seria
insuficiente para medir o nível de saúde da população. Além disso, o
conceito de saúde da OMS baseia-se numa percepção subjetiva, de bem-
estar, portanto carece de objetividade. A saúde seria, dessa forma, um
estado singular, que não pode ser definido e generalizado num conceito
científico (Caponi, 2003).
O binômio saúde/doença, na perspectiva das representações
sociais, deve ser estudado enquanto processo dinâmico, histórico e
social. Isso porque as ações e/ou omissões e o cuidado com a saúde
estão relacionados com modelos, valores culturais e crenças e não são
apenas escolhas individuais, mas são socialmente compartilhados.
A questão da doença teve destaque em diversos trabalhos no
campo da teoria das representações sociais, várias contribuições
empíricas (Joffe, 1999; Flick, 1991; Herzlich, 1969; Jodelet, 2005;
Morin, 1996) demonstraram a relevância dessa abordagem na análise e
110

compreensão da dinâmica psicossocial em jogo na construção da


concepção de doença (Apostolidis, 2006).
A identificação das representações sociais na área da saúde e
seus problemas, pode ser um facilitador na implementação de programas
de saúde. Além disso, é uma forma de conhecer as necessidades e
interpretações dos pacientes em relação a sua doença ou sua condição de
saúde (Nascimento-Schulze, 1994).
Com base nos conteúdos obtidos das análises do corpus
“Doença Renal Crônica” verifica-se que as ideias associadas à doença
estão relacionadas a aspectos concretos, bem como ao cotidiano da
vivência da doença e do tratamento. Em suas falas, os participantes
mencionaram as mudanças físicas e o seu impacto na trajetória de suas
vidas, em especial a dependência da hemodiálise. Tais discursos são
representativos das alterações físicas perceptíveis aos pacientes e dos
desconfortos decorrentes delas.
Em estudo realizado por Ramos, Queiroz, Jorge e Santos (2008)
os autores identificaram que, para a amostra estudada, as mudanças
físicas e as alterações decorrentes delas resultam na necessidade de
reestruturação e adaptação a esta nova realidade. Por isso, no presente
estudo, com frequência os participantes relataram como eram suas vidas
antes do diagnóstico da doença renal crônica e do início do tratamento
hemodialítico. Eles se referem a essa questão citando os sintomas físicos
que sentiam e como eles interferiam no seu cotidiano. A condição de
doente renal crônico, portanto, em um primeiro momento traz
modificações às atividades cotidianas, aproximação dos pacientes da
percepção de morte iminente e limitações físicas (Menossi, Zorzo, &
Lima, 2012).
A descoberta da doença geralmente acontece por meio de
diagnóstico médico e exames, quando já há presença de algum sintoma,
então procura-se atendimento de saúde. A maioria das pessoas descobre
o problema na fase em que já estão presentes algumas complicações, as
quais já acarretam algumas restrições (Dyniewicz, Zanella, & Kobus,
2004).
O momento do diagnóstico constitui um rompimento com a
vida que até então o paciente levava. De acordo com Thome (2011)
conscientizar-se da condição de sua doença, e das alterações que dela
podem decorrer, faz com que o paciente mude sua forma de ser e de
pensar. Ainda na concepção dessa autora, assumir-se como doente
crônico carrega um forte significado negativo, que inclui perdas e
ameaça iminente de morte.
111

Penna (1992) considera o momento do diagnóstico da doença


renal crônica uma situação ansiogênica, uma vez que é associada pelos
pacientes a um mau prognóstico e à iminência da morte. Na fala dos
sujeitos entrevistados, pode-se observar que o diagnóstico foi
vivenciado como a determinação da perda do controle sobre a vida. O
sentimento de desamparo e impotência que os sujeitos experimentam no
momento do diagnóstico pode ser revertida pela retomada do controle
ao menos sobre a sua morte, quando tomam conhecimento da
hemodiálise.
Apesar de a morte ser um fenômeno da vida, natural e
inevitável, a questão da finitude da vida desencadeia temores nos
indivíduos e dificuldade no seu enfretamento. De acordo com Sousa et
al. (2012) nas doenças crônicas, como é o caso da DRC, é considerada
uma situação de medo constante, principalmente quando está
relacionado com o risco de ocorrerem desajustes psicológicos,
complicações ou desconfortos em decorrência da doença e do
tratamento.
A doença renal crônica resulta, ao longo do tempo, em uma
sequência de perdas que culmina na fragilização do corpo, repleto de
cicatrizes decorrentes das fístulas, cateteres, exames e cirurgias. Por
mais que o paciente queira negar a doença, as marcas estão inscritas no
corpo, atestando o pertencimento a um grupo específico. As perdas
corporais requerem um processo de luto, elas equivalem à perda de um
objeto de amor, de um corpo saudável, e resultam em privação ao nível
do funcionamento orgânico e baixa autoestima (Borges, 1998; Diniz,
Filho, & Lima, 2002).
A imagem corporal pode ser compreendida como a
representação mental que o indivíduo tem do seu corpo. Em pesquisa
sobre a representação social de pacientes estomatizados em decorrência
de câncer intestinal, identificou-se que o significado do tratamento é
carregado de imagens negativas, pois além dos efeitos colaterais da
quimioterapia e da radioterapia no corpo, há as ressecções cirúrgicas e
amputações (Cascais, Martini & Almeida, 2008).
No presente estudo observou-se nos depoimentos que essas
alterações corporais significativas repercutem na autoestima e na vida
cotidiana dos pacientes. Os entrevistados relataram, por vezes, sentir-se
incomodados com a modificação na aparência corporal devido a
presença do cateter para acesso vascular ou da fístula arteriovenosa.
Esses achados corroboram com uma pesquisa realizada na qual os
pacientes relataram mudanças corporais, enfatizando o impacto e o
incômodo que sofrem devido a fístula arteriovenosa, que deforma o
112

braço e facilmente é vista pelos demais (Ramos, Queiroz, Jorge, &


Santos, 2008).
É possível observar que a fistula é um dos principais aspectos
que gera insatisfação nos doentes renais. Alguns relataram incômodo
quando questionados sobre as marcas que possuem no corpo por pessoas
que desconhecem a doença e o tratamento. Nesse sentido, foi realizado
um levantamento sobre a qualidade de vida de doentes renais crônicos e
constatou-se que, embora mais da metade pudesse ser considerada com
a autoestima preservada, as referências às marcas no corpo foram
frequentes (Oliveira et al., 2008).
Em um estudo de Borges e Martins (2001) 5 pacientes renais
crônicos de uma clínica de hemodiálise de São Paulo foram
entrevistados e relataram várias perdas ocasionadas indiretamente pela
doença, como perdas físicas e interacionais, perda da visão, da
capacidade de realizar algumas atividades, afastamento dos amigos, etc.
Além disso, houve o relato de perdas não diretamente relacionadas ao
tratamento dialítico, porém consideradas significativas para o paciente
pelo seu caráter definitivo, como o fato de ter que comparecer às sessões
de diálise semanalmente, tomar uma grande quantidade de
medicamentos, adequar-se a uma dieta rígida, restrições de atividades e
mudanças de hábitos de vida.
Em relação aos medicamentos verifica-se que, no campo das
doenças crônicas não transmissíveis, em geral os pacientes preferem
adotar mais as práticas de controle medicamentosas do que as não
medicamentosas (Stuhler & Camargo 2012). Isso acontece devido,
principalmente, às dificuldades em mudar os hábitos alimentares,
consumo de álcool e sedentarismo, hábitos há muito tempo adquiridos e
que proporcionam satisfação. Para a hemodiálise, a abstinência alcoólica
é um pré-requisito, devido a elevação da pressão arterial decorrente da
ingestão, o que torna a aderência ao tratamento mais difícil (Gonçalves,
Manfro, Veronese, & Saitovitch, 1999).
No presente estudo os participantes atribuíram um significado
negativo à doença renal crônica, e esse significado está muito atrelado
ao significado do tratamento, uma vez que a hemodiálise é considerada
um tratamento difícil e que causa dependência. Os aspectos médicos
presentes nas falas dos pacientes ilustram que eles atentam às
explicações e recomendações médicas e passam o conhecimento
adquirido adiante quando têm essa oportunidade. Isso também
demonstra interesse por parte dos pacientes em conhecer as causas da
sua doença, bem como os demais aspectos da mesma. De acordo com
113

Abric (2003), uma questão importante para a caracterização de uma


representação social é a fonte de informação sobre os objetos
representacionais.

Por isso, a interação estabelecida entre os profissionais de saúde


e a população precisa acontecer de forma adequada. Com frequência os
profissionais necessitam de práticas adequadas às reais demandas dos
grupos atendidos, pois o desconhecimento das variáveis psicossociais
envolvidas nas atitudes e práticas relacionadas ao tratamento resulta em
dificuldades na comunicação e no compartilhamento do conteúdo entre
os grupos (Costa e Silva & Moura, 2011).
Leite (2003) afirma que a literatura mostra que a utilização, por
parte dos profissionais de saúde, de uma linguagem mais popularizada e
acessível aos pacientes demonstra respeito às suas crenças, e resulta em
maior credibilidade nas orientações médicas por parte dos pacientes.
Portanto, é importante que haja adequação da comunicação entre
profissionais de saúde e pacientes, uma vez que no processo de
interação se dá a adoção de modelos cognitivos, determinação de tarefas
e criação de representações, garantindo uma linguagem e uma
organização social específica (Bousfield & Camargo, 2011).
A relação médico-paciente abrange também a compreensão da
pessoa do paciente e o sentido que ele atribui à sua enfermidade. A
escuta do paciente é importante para que o profissional compreenda o
paciente como uma pessoa, diferente das demais, que tem o seu próprio
modo de vida, modo diferente de adoecer e de conviver com as pessoas
(Perestrello, 1996).
Balint (1988) estudou a relação médico-paciente, e indicou as
diversas situações que podem impedir uma real compreensão do ser
doente. Por meio de estudos em grupo, com exame de casos clínicos,
relatou situações como a de encaminhamentos precoces a outros
profissionais, que impedem que haja um contato mais prolongado e mais
profundo com os pacientes e seus problemas psicológicos, diluindo a
relação.
De acordo com Balint (1988) o foco do atendimento médico
voltado apenas para o órgão afetado impede que o profissional da saúde
perceba situações psicossociais conflitantes que podem estar
contribuindo ou causando este processo. É preciso que os profissionais,
respeitando a individualidade de cada um principalmente no momento
da doença, busquem compreender as respostas dos pacientes às
diferentes situações vividas ao longo do seu ciclo de vida. Para tanto, é
114

necessário que o profissional desenvolva empatia com o paciente,


estabelecendo uma relação de ajuda permeada pela confiança.
O paciente, por sua vez, costuma apresentar momentos de
regressão durante sua doença, revivendo ansiedades, fantasias e
expectativas típicas da época de infância. Mello Filho (1994) pontuou
que na relação do paciente com o profissional de saúde, por ser uma
interação humana, muitas vezes são reutilizados mecanismos mentais
dos primeiros estágios do desenvolvimento, tais como introjeção e
projeção.
No caso da hemodiálise há algumas especificidades, e é
importante que os profissionais dessa área compreendam que a tensão
decorrente do tratamento é bastante particular. O fato é que os pacientes
precisam conciliar sua realidade de vida anterior com a atual, que conta
com diversas mudanças. Dessa forma, a manutenção de um equilíbrio
físico-emocional é mais difícil para esses pacientes, sendo de grande
importância que haja um reforço da confiança do paciente na equipe de
profissionais, o que é atingido com um relacionamento emocional
positivo (Colle, 2001).
O profissional de enfermagem é um componente importante da
equipe de atendimento ao doente renal crônico em hemodiálise, pois é
com este profissional que o paciente passa a maior parte do tempo e
pode estabelecer uma relação mais próxima. Por isso, o enfermeiro tem
a relevante função de dar motivação e apoio na vivência da enfermidade
e do tratamento, criando condições para redução da tensão e auxiliando
o paciente na adaptação ao processo da doença (Saes, 1999). Silva,
Vieira, Koschnik, Azevedo e Souza (2002) afirmam que o apoio dos
profissionais de saúde para as pessoas que vivenciam a doença renal
propicia uma melhoria na sua qualidade de vida.
Um tratamento prolongado e de contato pessoal frequente,
como é o caso da hemodiálise, acaba construindo vínculos afetivos entre
os profissionais de saúde e os pacientes e os pacientes entre si. No
entanto, esse vínculo pode dificultar a vivência de momentos de perda,
por isso deve haver apoio psicológico especializado também para os
profissionais de saúde que prestam assistência a esses pacientes.
Os participantes deste estudo relataram boa relação com a
equipe responsável por seus cuidados, sendo que o principal ator dessa
relação é o enfermeiro. Ele participa mais ativamente e com mais
frequência do cotidiano do paciente e acompanha de perto as reações do
paciente na sessão de hemodiálise, apresentando-se pronto e disposto a
intervir quando for necessário. Essa condição passa confiança e
115

credibilidade aos pacientes, que se referem a esses profissionais de


forma, muitas vezes, carinhosa e familiar. São também estes
profissionais que contribuem para a atribuição de significado ao
tratamento, pois são os responsáveis por orientar e conversar com mais
frequência com os pacientes.
De acordo com Bittencourt (2003) o enfermeiro tem a
possibilidade de amenizar, diminuir e humanizar os impactos da
hemodiálise para o paciente e sua família, buscando ser eficiente no
cuidado profissional e na passagem de conhecimento para o indivíduo
sobre a doença. Conhecer o significado que o paciente atribui à doença e
ao tratamento permite que o profissional compreenda as reais
necessidades do indivíduo e forneça um atendimento diferenciado que
considere os aspectos biopsicossociais (Bittencourt, 2003).
Em um estudo realizado com 138 doentes renais
crônicos na cidade de Fortaleza,
Ramos, Queiroz, Jorge e Santos (2008) encontraram que as percepções
sobre o significado de ser um doente renal crônico se referem a tristeza,
fragilidade, sensação de invalidez, medo e revolta perante o sofrimento
resultante da doença e do tratamento.
A construção do significado da doença e de ser um doente renal
crônico é um processo gradual, cada paciente tem para si uma
representação do que é ser um doente, e ela parece estar em constante
transformação, podendo em alguns momentos ser mais ou menos
doloroso, a depender principalmente da condição de saúde no momento.
Portanto, pode-se observar que aqueles que estão em uma condição de
saúde mais estável relatam viver uma vida normal, apesar das limitações
e consequências do tratamento, apresentam alta autoestima, preservam a
realização de atividades diárias e de lazer, e alguns conseguem inclusive
continuar trabalhando.
Pesquisa realizada por Roso (2012) identificou que doentes
renais crônicos continuavam realizando cuidados com seu corpo, casa e
outras atividades cotidianas. Isso demonstra que contavam com
determinado grau de autonomia, em consequência, elevando sua
qualidade de vida. Para essas pessoas, a possibilidade de desempenhar
atividades do dia a dia sem depender de ajuda é uma forma de sentir-se
útil e fugir do tédio, o que contribui e beneficia sua situação de saúde.
Esses sujeitos demonstraram estar satisfeitos com a manutenção das
condições físicas e psíquicas estáveis.
Rey (2006) comenta que, de forma progressiva, são percebidos
novos sentidos subjetivos nos doentes que conseguem passar pelo
impacto inicial do diagnóstico de forma positiva. Isso permite que novas
116

representações sejam produzidas, diferentes das representações


dominantes, nesse caso negativas em relação à doença. Nesse estudo,
portanto, pode-se identificar que há entre alguns pacientes uma
representação de normalidade, expressando que o sujeito percebe outras
formas de viver que não em função da sua condição de saúde.

Segundo Frankl (1990) é necessário que pessoas com algum


tipo de incapacidade aceitem sua condição de saúde, buscando encontrar
sentido nas situações adversas e de sofrimento. Isso é importante para
que a pessoa possa superá-las da melhor forma possível. Janoff-Bulman
e Frantz (1997) apontaram que adaptar-se positivamente a situações de
adversidades envolve uma busca de sentido para os eventos traumáticos
e de achar benefícios decorrentes dessa experiência.
Segundo Freire e Resende (2001) o sentido da vida possibilita
que o indivíduo mantenha sua saúde mental e sua integridade mesmo
que esteja vivenciando condições adversas. Isso representa,
principalmente para pessoas que vivem situações de sofrimento, uma
perspectiva de promoção de bem-estar, enfrentamento e adaptação que
viabiliza continuidade de crescimento pessoal mesmo quando
vivenciado perdas e declínio físico.
O significado da doença se modifica e depende das
consequências físicas, psicológicas e mudanças de vida decorrentes
dela, que são vivenciadas de forma diferente para cada um. Pode-se
concluir que a doença não é vista pelos pacientes como dissociada de
seu tratamento, no caso a hemodiálise. Por isso, ao falar da doença os
pacientes se referem também ao tratamento.
Diferentemente da aids e outras doenças, as quais pode-se
identificar representações sociais a respeito, a DRC não é tão difundida,
prevenida e divulgada na mídia e demais instrumentos de comunicação.
Sendo assim, o assunto ainda permanece consideravelmente
desconhecido pela sociedade, e isso prejudica a criação de uma
representação social do assunto da população em geral e pode afetar as
pessoas que são acometidas pela DRC com informações, crenças e
atitudes que prejudiquem o tratamento.
Além disso, deve-se considerar também o fato de que são
recentes as ações do governo com o intuito de informar a população
sobre a DRC e a hemodiálise, sendo que é mais comum a divulgação de
conhecimento sobre transplante e doação de órgãos. As ações de
prevenção da doença estão relacionadas com as campanhas sobre
hábitos saudáveis, que pretendem atingir a população e prevenir doenças
117

associadas ao estilo de vida, como diabetes, hipertensão e renal crônica,


entre outras.

7.3 Representações sociais da hemodiálise

A hemodiálise, é um fenômeno que envolve diferentes


contextos e recebe diversos significados. Ao identificar as
representações sociais desse fenômeno objetiva-se acessar o
conhecimento sobre esse objeto presente no senso-comum para que se
possa compreender seu significado para as pessoas que vivem com essa
condição. Conhecer isso possibilita criar novas formas de prevenção à
doença e o desenvolvimento de ações de educação em saúde voltadas
para a população.
As representações sociais guiam a forma como os grupos
interpretam e comunicam a realidade (Jodelet, 2001). Portanto, no que
se refere a ações no campo da saúde, notadamente no que se relaciona
com as doenças crônicas, as representações sociais apresentam mapas de
significados relevantes para a visibilidade das relações estabelecidas
com o fenômeno social da doença e seu tratamento.
Nesse estudo observou-se que a hemodiálise está,
principalmente, ligada a concepção de sofrimento. Pode-se dizer que o
tratamento interfere na percepção de qualidade de vida dos indivíduos
de forma negativa, sobretudo porque influencia a situação de trabalho,
função física e emocional. Cada paciente atribui significado à doença e
ao tratamento baseando-se nas experiências próprias.
Para Jodelet (2006) a noção de experiência é definida como a
forma como as pessoas se sentem frente a uma situação e como elas a
enfrentam. Em situações de doenças, a experiência é marcada pela
dificuldade e sofrimento por várias razões, como debilidades do estado
físico e mental, modo de lidar com suas demandas e seu sofrimento e de
suas famílias, a exposição repetida a morte e luto, a vida profissional,
familiar e social, entre outras.
A necessidade do tratamento é percebida, por muitos pacientes,
como uma dependência. A partir das entrevistas percebeu-se que a
dependência acontece porque os pacientes sentem resultados favoráveis
do tratamento e têm medo do prognóstico caso o abandonem. Portanto,
essa dependência medicamentosa e do tratamento contribui para
melhorar a qualidade de vida das pessoas com doença renal crônica,
pois esse sentimento favorece a adesão à hemodiálise.
118

Coutinho et al. (2010) afirmam que essa percepção interfere nos


planos de futuro, uma vez que o tratamento requer gasto de tempo, traz
sentimento de desânimo, cansaço e fadiga. A rotina do paciente de
hemodiálise se restringe a consultas médicas, sessões de hemodiálise e
afastamento de atividades que requeiram esforços (Bezerra, 2011). Isso
pode ser percebido na fala dos entrevistados nesse estudo, que relatam
que sua rotina é construída em função da hemodiálise e que para realizar
muitas atividades dependem da ajuda de outras pessoas.
Os pacientes pesquisados relataram que a hemodiálise significa,
para alguns, a possibilidade de viver durante mais tempo. Em outros
estudos, como o de Araújo, Pereira e Santos (2009), foi comum os
pacientes pesquisados relatarem que a hemodiálise é a única alternativa
para manutenção da vida. Assim, pode-se dizer que para esses pacientes
fazer hemodiálise é aumentar a possibilidade de prolongamento da vida
e evitar a morte.
Madeiro et al. (2010), em uma pesquisa com pessoas que
realizam hemodiálise, obteve resultados contraditórios, ao passo que as
pessoas apresentam dificuldade em realizar o tratamento hemodialítico,
também buscam meios para suportá-lo, pois o consideram essencial para
suas vidas. Contudo, a maioria dos pacientes submetidos ao tratamento
hemodialítico não estão adaptadas a ele, principalmente por requerer
muitas privações, então eles realizam o tratamento tendo em vista o
benefício de possibilitar-lhes maior sobrevida.
Há também a concepção da hemodiálise como salvação ligada a
religiosidade. Nesse sentido, a hemodiálise é considerada por alguns
como “algo de Deus” ou “uma graça”, e é aceita por ser considerada a
única forma de sobrevivência. Portanto, esse aspecto está relacionado à
aceitação do tratamento, visto que devido a sua obrigatoriedade os
pacientes sentem-se conformados com ele.
Essa concepção também facilita a aceitação da dependência de
uma máquina para viver. A fé é considerada fonte de esperança e
conforto, fortalecendo o bem-estar dos pacientes (Quintana & Muller,
2006). Ela também possibilita maior facilidade na adaptação à nova
realidade. Em outras situações de doenças crônicas também pode-se
observar a crença em um ser superior, como o caso de portadores de
leucemia que atribuem o conforto e fortalecimento durante o tratamento
a uma fé que impulsiona a continuidade da vida (Coutinho & Trindade,
2006).
Dentre os fatores positivos em relação ao tratamento estão
aqueles expressos nos relatos de melhora da saúde e alívio dos sintomas
119

da doença após seu início. Os participantes referiram sentir que a


hemodiálise foi boa para a sua saúde, pois depois do início do
tratamento sentiram mais disposição e alívio dos sintomas da doença,
como inchaço, sobrepeso, dores, entre outros.
A hemodiálise representa a possibilidade de viver mais tempo e
o alívio dos sintomas da doença para muitos pacientes, porém, nesse
estudo emergiram também aspectos negativos relacionados ao
tratamento. As dificuldades apontadas pelos entrevistados dizem
respeito principalmente às questões do dia a dia, dificuldades em
realizar atividades e em fazer algumas mudanças necessárias na rotina.
Apresentaram também dificuldades em mudanças dos hábitos
alimentares devido às restrições que o tratamento requer. Há aqueles que
relataram desgosto em frequentar espaços como hospital, clínicas e
consultórios médicos com relevante frequência.
A complexidade do regime terapêutico imposto pela
hemodiálise, que inclui mudanças no estilo de vida e, na maioria das
vezes, diversos medicamentos, acaba exigindo disciplina das pessoas
que vivem com a doença renal crônica. O tratamento da doença renal
crônica requer inicialmente dieta especial e/ou uso de medicamentos,
mas com a progressão da doença, passa a afetar consideravelmente a
rotina do paciente. Isso porque o tratamento exige restrições líquidas e
alimentares, além de uso contínuo de medicamentos diversos e
consequente prejuízo no rendimento físico e na capacidade laboral.
Desta forma, o paciente vivencia uma brusca mudança em seu
estilo de vida, passando a conviver com limitações, com a possibilidade
da morte em decorrência da doença e com tratamentos dolorosos. Como
consequência disso, os pacientes por vezes acabam tornando-se
desanimados, cansados e dependentes da ajuda de familiares ou amigos.
A doença renal crônica e a hemodiálise podem ser consideradas
importantes fatores estressores para os pacientes e podem, portanto, ter
grande impacto na qualidade de vida.
Corroborando os achados encontrados na presente pesquisa, o
estudo de Ramos, Queiroz, Jorge e Santos (2008) relata que, em
decorrência das limitações provocadas pela doença, os pacientes renais
crônicos modificam suas atividades e rotinas. Além disso, precisam
disponibilizar tempo para realizar o tratamento três vezes na semana e
por isso alguns deixam de trabalhar. A hemodiálise, portanto, significa
uma ruptura na dinâmica de vida, exigindo adaptação a hábitos e
comportamentos diferentes, o que muitas vezes requer sacrifícios e
renúncias, e que pode culminar em transtornos e estresse ao paciente.
120

Portanto, pode-se considerar que o tratamento é uma parte, mais


específica, da significação da doença, que é o fenômeno mais geral. Por
isso, essas duas concepções possuem temas em comum, sendo que as
duas estão subordinadas à concepção de doença.

7.4 Qualidade de vida

A percepção de qualidade de vida depende da interpretação


emocional de cada indivíduo sobre os fatos e eventos a que é e que foi
exposto ao longo da vida. Portanto, está intimamente relacionada à
percepção subjetiva dos acontecimentos e condições de vida. A
interpretação da avaliação global da qualidade de vida é uma questão
complexa, pois resultados semelhantes podem ser explicados devido a
diferentes fatores (Fleck et al., 1999).
Cada indivíduo tem sua maneira de operacionalizar a avaliação,
e a avaliação de um mesmo indivíduo pode mudar com o passar do
tempo, com a mudança de prioridades ao longo da vida e com as
circunstâncias vividas. A percepção da qualidade de vida pelo indivíduo
pode variar entre dois extremos, muito boa ou muito ruim, de acordo
com a forma como vivencia as diferentes etapas do ciclo vital (Fleck et
al, 1999).
As representações sobre qualidade de vida são complexas,
portanto, a análise dos dados foi realizada a partir da leitura atenta e
posterior categorização dos conteúdos das falas dos participantes na
tentativa de apreender os elementos estruturantes do discurso de cada
sujeito (Weber, 1991) para então sintetizar a representação de qualidade
de vida por eles formulada.
Notou-se neste estudo que, no contexto geral, a qualidade de
vida foi avaliada de forma positiva pelos participantes, levando-se em
conta a dinamicidade e complexidade do fenômeno estudado. Estudos
anteriores apontaram um rebaixamento do nível de qualidade de vida
entre os doentes renais crônicos (Castro, Caiuby, Draibe, & Canziani,
2003, Santos & Pontes, 2007; Nunes & Lobo, 2012). Isso porque a
presença de uma doença crônica geralmente é associada à piora da
qualidade de vida (Ciconelli, Ferraz & Santos, 1998; Valderrábano,
Jofre & López-Gómez, 2001; Moreno, López-Gómes, Sanz-Guajardo,
Jofre, & Valderrábano, 1996).
A saúde, embora possa estar relacionada à percepção de
satisfação quanto a qualidade de vida, não teve a ênfase que era
esperada nas entrevistas, enquanto elemento potencializador da QV.
121

Contudo, os problemas de saúde apresentados pelos pacientes


apareceram como limitadores da qualidade de vida, principalmente
quando expunham as dores, desconfortos, cirurgias e outras
intervenções a que haviam se submetido ao longo do tratamento.
Estudo de Nunes e Freire (2006), que avaliou a qualidade de
vida de cirurgiões dentistas, obteve resultado semelhante a esse, pois foi
observado um contraste das informações sobre a auto-avaliação do
estado de saúde e relatos de doenças. Os dentistas avaliaram sua saúde
satisfatoriamente, apesar de relatarem diversos problemas de saúde. A
autora crê que esse contraste pode ser indicativo de que os problemas de
saúde não estejam impedindo a maioria desses profissionais de exercer
suas atividades diárias.
Os pacientes em tratamento hemodialítico, no entanto,
apresentam uma qualidade de vida prejudicada por diversos fatores,
como capacidade cardiorrespiratória limitada e capacidade física
diminuída, o que pode acarretar prejuízos no desempenho de atividades
de lazer, trabalho e convívio social. Principalmente para pessoas jovens,
que estão na fase produtiva da vida e quando há maior frequência de
compromissos sociais, alguns relacionados a formação profissional e de
trabalho (Medeiros & Meyer, 2001; Cunha et al., 2009; Trentini,
Corradi, Araudi, & Tigrinho, 2004).
De acordo com Alarcon (2004) a saúde física é o aspecto da
qualidade de vida afetado de forma mais evidente no caso dos doentes
renais crônicos, por estar em contínua interação com demais aspectos,
como trabalho, estudo, espiritualidade, lazer, sexualidade e afetividade.
Portanto, os prejuízos na saúde física, de modo geral, modificam esses
aspectos, de maneira diferente em cada individuo devido as
particularidades de cada um.
Alguns autores ainda compararam a percepção qualidade de
vida de pacientes renais crônicos com a da população em geral e
encontraram redução na percepção dos primeiros (Mendes et al., 2011;
Birmelé, Le Gall, Sautenet, Aguerre, & Camus, 2012). Apesar da
inconsistência observada na literatura em relação ao efeito do tratamento
dialítico na qualidade de vida dos pacientes a ele submetidos, a maioria
dos participantes relatou uma percepção de qualidade de vida boa e
satisfação com a saúde, o que pode ser constatado a partir da escala de
QV utilizada. Essa característica, portanto, pode ser considerada uma
peculiaridade da amostra estudada.
Com relação ao instrumento de avaliação da qualidade de vida,
o WHOQOL – Bref, a amostra estudada apresentou uma tendência
positiva com relação ao domínio físico. Porém em outros estudos a
122

dimensão da qualidade de vida com pontuação mais baixa foi a referente


à limitação por aspectos físicos (Chang et al., 2002; Barbosa, Bastos &
Andrade Júnior, 2007; Lanza, Chaves, Garcia & Brandão, 2008; Mortari
et al., 2010; Santos, 2005; Zhang, Cheng, Zhu, Sun, & Wang, 2007).
Importante ressaltar ainda que, em comparação com os homens,
as mulheres apresentaram predomínio de percepção positiva em relação
ao domínio físico. Porém, a literatura sugere que, no curso das doenças
crônicas, as mulheres são mais afetadas na qualidade de vida que os
homens (Cowling et al., 2004; Hallert, Sandlund & Booqvist, 2003;
Lindquist et al., 2003; Norris et al., 2004). Braga et al. (2011) apontam
que as mulheres tendem a ter um declínio na QV devido a fatores além
dos clínicos, como a responsabilidade pela casa e pelos filhos, o que as
torna mais propensas a stress físico e mental.
Os participantes relataram diminuição da energia e da
capacidade para o trabalho, demonstrando que esses são fatores que
influenciam a percepção de qualidade de vida. Queixas sobre o
desempenho nas atividades diárias e de trabalho, sensação de desânimo
e falta de energia são sintomas que são frequentemente relatados por
pacientes renais crônicos. Pode-se concluir que a situação de
desemprego no país, somada às restrições impostas pela dinâmica do
tratamento, resulta na dificuldade de acesso a emprego para esses
pacientes, que em média três vezes por semana necessitam realizar a
terapia (Silva, Araujo, Perez & Souza, 2011). E após a sessão de
hemodiálise necessitam ainda de cerca de duas horas para se recuperar
dos sintomas atribuídos imediatamente ao tratamento (Carreira &
Marcon, 2003).
A presença de sintomas físicos da doença e do tratamento se
associam à dificuldade de encontrar ou manter-se no emprego, inclusive
os desempenhados de maneira informal. Portanto, a rotina do
tratamento, associada aos sintomas físicos e a condição de desemprego
contribui para a atribuição de carga negativa à doença renal,
principalmente nos casos em que o paciente é o principal provedor da
família ou o chefe do lar. Assim, o sentimento de frustração devido à
doença e à dificuldade de manter o emprego pode ser associado ao
impacto da hemodiálise na vida dos pacientes (Van Manen et al., 2003).
Mas o significado do trabalho vai além do ganho financeiro,
para as pessoas em tratamento hemodialítico ter um emprego representa
algo mais importante do que o dinheiro recebido (Bohlke et al., 2008;
Cavalcante et al., 2013). O trabalho, como uma atividade própria do ser
humano enquanto ser social possui papel fundamental na vida das
123

pessoas. O fato de não poder mais trabalhar tem refletido nos


sentimentos de improdutividade e inutilidade relatados pelos pacientes
entrevistados.
A perda da independência econômica acarreta alterações na
dinâmica familiar e social, inversão de papéis e redução de gastos com
lazer, alimentação, educação, o que prejudica a QV da pessoa e sua
família. Por isso, quando se instaura uma condição incapacitante surgem
transtornos emocionais, com destaque para a depressão (Miranda, 1999).
O fato de não poder mais trabalhar tem refletido nos
sentimentos de improdutividade e inutilidade relatados pelos pacientes
entrevistados. Alguns também relacionaram o fato de não poder
trabalhar com a dificuldade financeira que vivenciam atualmente. Essa
dificuldade faz com que se tornem mais dependentes financeiramente de
outras pessoas.
Com relação ao domínio psicológico, apesar de ser comum que
os pacientes da hemodiálise expressem sentimentos negativos, como
medo do prognóstico, da incapacidade, da dependência econômica e da
alteração da autoimagem (Silva, Silveira, Fernandes, Lunardi, &
Backes), a amostra estudada apresentou baixa frequência desses
sentimentos. Além, disso, constatou-se no grupo boa percepção de
autoestima, autoimagem e relacionamento com seu próprio corpo.
A boa autoestima pode contribuir para o processo de mudanças
e transformações que a hemodiálise impõe. A autoestima é considerada
um aspecto essencial para criação e manutenção da saúde, qualidade e
esperança de vida. Alguns estudos apontam que a baixa autoestima pode
ser encontrada com maior frequência entre os indivíduos solteiros. A
maioria dos participantes entrevistados relataram ser casados e residir
com os familiares, fato que pode contribuir para o enfretamento da
doença e o tratamento, repercutindo na autoestima do paciente (Belasco
& Sesso, 2002; Kusumota, Marques, Hass, & Rodrigues, 2008).
O domínio relações sociais, por estar relacionado à inclusão e
exclusão social, supostamente deveria apresentar uma tendência de
baixas avaliações da QV, porém o grupo também mostrou-se satisfeito
nesse aspecto. Isso indica que as boas relações sociais contribuíram na
forma de percepção da QV dos pacientes. Portanto, como demonstra a
literatura, o apoio familiar e social parece decisivo para uma avaliação
positiva dos pacientes sobre sua qualidade de vida.
A família, principalmente, contribui para o enfrentamento da
doença e seu tratamento, fazendo com que o paciente sinta-se protegido,
seguro e amado (Silveira, Fernandes, Lunardi, & Backes, 2011). Em
estudo organizado pelo grupo WHOQOL (2003) no momento da
124

revelação do diagnóstico o apoio familiar e de amigos teve impacto


positivo na QV de pessoas que viviam com HIV/Aids.
Em estudo de Bertolin, Pace, Kusumota e Haas (2011) sobre os
modos de enfrentamento e as variáveis sociodemográficas de pessoas
em hemodiálise, identificou-se que as pessoas que referiram ter um
companheiro obtiveram melhores resultados nos aspectos confronto,
afastamento e suporte social que as pessoas que referiram não ter
companheiro. Ainda nesse estudo, as pessoas que referiram ter algum
apoio no tratamento, seja do companheiro, filhos ou outro familiar,
tiveram maiores escores que as pessoas que não tinham apoio em quase
todos os fatores.
De acordo com Andrade e Vaitsman (2002) a pobreza nas
relações sociais é considerada um fator de risco à saúde quando
comparada a outros fatores que são, comprovadamente, nocivos à saúde.
A condição de enfermo, por si mesma, expõe os indivíduos a limitações,
impedimentos e situações que mudam suas relações, com o trabalho,
com familiares, amigos e parceiros, interferindo também na própria
identidade, no sentido da vida e na capacidade de resolver problemas.
Sendo assim, o apoio social constitui elemento que favorece o processo
de ganho de autonomia e maior controle sobre suas vidas.
No que se refere ao domínio meio-ambiente, no geral, as
respostas foram positivas em quase todas as facetas, exceto nas que
estavam relacionadas à questão financeira e de lazer. Como exposto
anteriormente, a dinâmica do tratamento muitas vezes interfere na
questão empregatícia dos pacientes, levando a condições de vida mais
restritas devido à impossibilidade de trabalhar. As atividades de lazer,
por sua vez, são prejudicadas e sofrem interferência de diversos outros
fatores, como a questão financeira, a rotina de tratamento, debilidade
física e restrições alimentares.

7.5 As representações sociais da doença, do tratamento e a


qualidade de vida

Herzlich (1991) analisou a problemática das RS utilizadas no


campo da doença e demonstrou que a doença é um fenômeno que
ultrapassa a medicina moderna, e que a representação não é somente o
esforço de formular coerentemente um saber, mas é uma interpretação e
uma questão de sentido.
Os resultados obtidos nas análises das entrevistas permitem
apontar que há conteúdos de RS que não divergem de um tema para o
125

outro. Assim, a proximidade e a relação que há entre a doença e seu


tratamento fazem com que haja conteúdos compartilhados entre ambas.
Os conteúdos compartilhados dizem respeito, principalmente, as
limitações impostas pelo tratamento e sua rotina.
Os participantes deste estudo, quando questionados sobre o
significado da doença renal crônica, tenderam a mencionar em suas
respostas, ainda que não houvesse sido perguntado, as restrições e
limitações da hemodiálise. Esse é o principal conteúdo compartilhado
entre os dois temas e pode ser decorrente da lógica que, se o tratamento
é decorrência da doença, então as limitações intrínsecas a ele também
decorrem dela.
Acredita-se que não haja representações hegemônicas ou
coletivas, que se cristalizam no imaginário social, sobre os temas
investigados. O universo pesquisado abrangeu somente pessoas que
convivem com a doença e que realizam o tratamento, porém caso
fossem investigadas as representações sociais desses temas para a
população saudável e leiga, provavelmente os conteúdos seriam
diferentes.
De acordo com Herzlich (2005) o saber dos doentes depende,
ao menos em parte, do saber dos médicos. Entretanto, esse fato não
coloca em xeque a existência, ou a autonomia das representações, uma
vez que não se pode restringi-las à pura reprodução de um saber. Além
disso, é também impossível reduzir o funcionamento das representações
ao princípio objetivo da distância entre leigos e médicos, que detém o
saber dominante.
Embora a doença esteja, de fato, nas mãos da medicina, ela
ainda é um fenômeno que a ultrapassa. O sentido que se dá a ela não se
reduz à informação médica, ou o diagnóstico. Sob uma visão mais geral,
a história da medicina mostra que as relações entre o saber médico e as
concepções do senso comum podem estabelecer-se nos dois sentidos,
sem que haja uma dependência em um único sentido, mas com uma
inter-relação entre o pensamento erudito e o pensamento de senso
comum (Herzlich, 2005).
Pode-se afirmar que a representação social do adoecimento está
alicerçada, de acordo com as manifestações dos participantes, na
constatação da finitude da vida e ruptura da normalidade. A
aproximação com a morte é o sentimento que perpassa a experiência do
diagnóstico e é fonte de inseguranças e receios, introduzindo uma nova
realidade aos pacientes. Dessa maneira, aos poucos o significado de ser
um doente renal crônico começa a se estabelecer. A experiência da
doença depende de como os indivíduos situam-se perante ela ou
126

assumem a situação, atribuindo-lhe significados. As respostas aos


problemas criados pela doença são socialmente constituídas e remetem a
um mundo compartilhado de práticas, crenças e valores (Gomes,
Mendonça, & Pontes, 2002).
Já a representação social da hemodiálise está sedimentada na
concepção de prolongamento da vida por meio da realização do
tratamento. Nesta pesquisa, identificou-se que o medo é um sentimento
inevitável diante da condição de estar doente, e sendo essa uma doença
crônica, a iminência da morte é real. A hemodiálise é considerada
também um tratamento complexo, que exige mudanças relevantes na
vida e nos hábitos do paciente, pois requer diversas restrições em
diferentes esferas da vida. Essa característica restritiva do tratamento,
somada a frequência com que deve ser realizado, é a principal
responsável pelos sentimentos negativos expressos pelos pacientes em
relação a ele.
Com relação à percepção da qualidade de vida, obtida por meio
da análise de conteúdo das falas dos participantes, observa-se que os
fatores decorrentes do tratamento foram os mais frequentemente
relatados como responsáveis pela diminuição na qualidade de vida.
Aspectos nos quais o tratamento tem interferência, como trabalho,
cuidados, atividades diárias, lazer, alimentação, foram considerados na
questão da qualidade de vida, e embora a expectativa fosse de que os
pacientes declarassem insatisfação com sua qualidade de vida, o
resultado obtido foi o contrário. Para os participantes, a representação de
qualidade de vida é atrelada à possibilidade de exercer normalmente
atividades da vida diária, divertir-se e relacionar-se com qualidade.
O que se pode extrair da relação das RS da doença e do
tratamento com a qualidade de vida é que a percepção de um nível de
qualidade de vida bom por parte dos pacientes contribui para o
enfrentamento da doença e do tratamento e está relacionado com a ideia
de que o tratamento significa a vida.
Foi possível encontrar conteúdos negativos, tanto na
representação da doença quanto do tratamento, bem como nos
conteúdos compartilhados entre ambos. Contudo, ainda com
conhecimento dos aspectos negativos os sujeitos atribuíram boa
qualidade de vida. É importante ressaltar que os sujeitos também
relataram sentir que sua vida faz sentido, essa atribuição de sentido à
própria vida faz com que sejam buscadas formas criativas e saudáveis de
lidar com a situação de saúde.
127

Refletindo sobre a percepção da qualidade de vida pode-se


concluir que os participantes mostraram-se consciente de sua situação
atual considerando que ela deverá persistir pelo resto de suas vidas e que
é necessário adaptar-se ao processo de mudança dos hábitos para
alcançar um maior bem estar físico.
As RS apresentadas pelos participantes, ainda que referenciadas
no senso comum, apresentaram muitos aspectos do conhecimento
científico ou reificado, devido a funcionalidade desse conhecimento
para o grupo e sua familiaridade. Abric (2000) propõe que quanto mais
funcional a RS para o grupo, maior é a aproximação do grupo com o
objeto representado.
Acrescenta-se, ainda, que os aspetos científicos da doença têm
uma relação positiva com as funções física e emocional, portanto,
quanto maior conhecimento obtiverem e melhor lidarem com as
particularidades da sua condição de saúde, melhores resultados reportam
nos aspectos físicos e emocionais. Ou seja, quanto mais conhecem sobre
a doença e o tratamento, maior a capacidade dos sujeitos de aceitar e
lidar de forma positiva com eles. Estudos mostram que o tempo de
tratamento está relacionado com a probabilidade de elaborar respostas
mais conformistas perante a cronicidade da doença, apesar de não
representar uma garantia efetiva de preservação da QV (Braga et al.,
2011).
Estudo qualitativo de Silva et al. (2002) apontou que a maioria
dos hemodialisados aceitava sua condição de saúde, tendo incorporado a
doença e o tratamento ao dia a dia e reconhecendo a possibilidade de um
viver harmônico com a sua condição de saúde. Segundo Cassileth et
al.(2002) e Breetvelt e Dam (1991) a percepção de melhora no nível de
qualidade de vida ao longo do tempo, para pacientes de doenças
crônicas em geral, pode estar relacionada à adaptação psicológica que
ocorre, a utilização de estratégias racionais para o enfrentamento da
doença e ao valor atribuído a vida.
Geralmente, com o passar do tempo, os doentes renais crônicos
passam a ter uma melhor compreensão e aceitação da necessidade do
tratamento, adaptando-se a máquina, diminuindo o mal estar e as
instabilidades corporais. Com o tempo também passam a compreender
que a máquina de diálise é a responsável pela sobrevivência, e
expressam gratidão por existirem tecnologias capazes de suprir a falta
que faz o rim.
Os pacientes relataram vivenciar um contexto de proximidade
da morte, sendo que a hemodiálise lhes trouxe vida, a possibilidade de
voltarem a caminhar e realizar outras atividades. A doença renal crônica
128

é tida como uma doença que maltrata, cujo tratamento é responsável por
uma melhora na saúde e possibilidade de sobreviver.
A hemodiálise é reconhecida como a possibilidade de estar vivo
e poder redescobrir o valor da vida, ainda que exija diversas restrições.
Portanto, pode-se apontar que os participantes, por atribuírem um
sentido à vida, à doença e ao tratamento, bem como em sua maioria
estar há bastante tempo na hemodiálise, apresentam uma boa percepção
de qualidade de vida.
129

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento deste trabalho possibilitou conhecer a


realidade de duas unidades de hemodiálise, seus pacientes e equipe de
saúde. Bem como permitiu tomar conhecimento dos desafios
enfrentados e da realidade da vida de pessoas que vivem com a doença
renal crônica e são submetidas à hemodiálise. Evidenciou-se que a
doença renal crônica é um importante problema de saúde que está
crescendo continuamente devido, principalmente, ao envelhecimento da
população e do considerável número de pacientes com hipertensão e
diabetes.
A realização desta pesquisa possibilitou também observar que a
doença muitas vezes é silenciosa e passa despercebida pelos pacientes,
sendo descoberta no período crítico, quando já há sintomas e
comprometimento dos rins. A falta de informação sobre a doença e
sobre as diferentes formas de tratamento, principalmente quanto à
realização do transplante, devem também ser aspectos levados em
consideração.
Portanto, identificou-se que há necessidade de uma equipe
disciplinar especializada no atendimento de pessoas com doenças
crônicas, como a doença renal, para facilitar o acesso a informação,
orientar e realizar ações que auxiliem na melhoria dos serviços
prestados à essa população.
O objetivo da pesquisa foi verificar a relação entre as
representações sociais da doença renal crônica e da hemodiálise e a
qualidade de vida em saúde desses pacientes. Dessa forma, buscou-se
descrever a representação social desses temas para então averiguar as
possíveis relações entre eles. Concluiu-se que as representações dos
pacientes sobre a doença renal crônica e sobre o tratamento têm aspectos
que estão relacionados e, portanto, se compartilham. Considera-se que a
representação do tratamento está atrelada à concepção da doença,
constituindo uma parte dessa última.
Diversos são os sentimentos relacionados à hemodiálise, como
frustração, medo e negação frente a necessidade do tratamento,
principalmente no período inicial. Foi possível observar que, com o
passar do tempo, esses sentimentos se modificam de acordo com o
modo de enfrentamento de cada paciente e com o conhecimento que vai
sendo adquirido sobre a doença e a hemodiálise.
A hemodiálise, por se tratar de um tratamento restritivo, impõe
diversas mudanças na vida dos pacientes. Os participantes relataram
130

mudanças nos hábitos alimentares, da quantidade de líquido ingerido,


restrições e limitações nas atividades de trabalho, físicas e de lazer.
Entretanto, embora essas restrições reflitam na qualidade de vida, os
pacientes que contam com o apoio da família, dos amigos e dos
profissionais de saúde, conseguem enfrentar com maior resiliência essas
limitações e se readaptar a nova vida, considerando o tratamento como
decisivo para a sua qualidade de vida. Conclui-se, portanto, que aceitar
o tratamento e as adaptações necessárias contribuem para uma vida com
mais qualidade.
A qualidade de vida da amostra estudada foi considerada boa, e
pode-se indicar que esse fato deve-se ao modo de enfrentamento da
doença e a aceitação do tratamento por parte dos pacientes. Também
pode ter influência na percepção positiva da qualidade de vida dos
participantes o fato de, ao menos a maioria deles, conviver com a
família e ter boa relação com a equipe de saúde da unidade de
hemodiálise e com os demais pacientes. Diante disso, salienta-se que a
equipe de saúde esteja atenta as necessidades dos pacientes e sua
família, para que por meio do diálogo, auxiliem no enfrentamento de
dificuldades que podem surgir durante o tratamento.
Analisando os resultados da interseção das representações
sociais e o construto de qualidade de vida pode-se afirmar que o grupo
estudado apresentou nível satisfatório de QV, tendendo para aspectos
positivos e de ressignificação da doença. Os conteúdos representacionais
identificados revelaram uma mudança no modo de pensar os hábitos de
vida, uma adaptação a nova situação de saúde, apoiando-se nas relações
familiares e demais fontes de apoio importantes para o grupo. Para os
entrevistado o significado de qualidade de vida está relacionado à
questões referentes às relações interpessoais, principalmente com a
família e amigos, além de ressaltar a importância da boa relação com a
equipe de saúde.
Devido a importância da equipe de saúde nesse contexto e como
são esses profissionais que lidam diariamente com o paciente
conhecendo o padrão dos seus sintomas, é importante que eles
compreendam como o doente interpreta sua doença. O trabalho dos
profissionais de saúde na educação em saúde pode ser, para os pacientes
em tratamento, fator motivador e responsável por uma maior adesão.
Pode-se perceber também que o tratamento proporciona aos
pacientes uma melhora dos sintomas apresentados em decorrência da
doença, o que pode contribuir para a retomada, ainda que não
totalmente, de algumas atividades simples do cotidiano. Por isso, os
131

pacientes costumam expressar que consideram a hemodiálise como algo


bom em suas vidas. Essa concepção facilita a aceitação do tratamento,
muitas vezes difícil, e contribui diretamente na melhora da qualidade de
vida.
A relação que se estabelece entre as representações sociais da
doença renal crônica, as representações sociais da hemodiálise e
qualidade de vida dos pacientes em hemodiálise, é pautada na
concepção deste ser um tratamento que proporciona alívio dos sintomas,
representado como a vida, como uma graça divina, apesar do sofrimento
que provoca. A representação social da doença renal crônica, por sua
vez, tem aspectos compartilhados com o tratamento, pois não há
tratamento sem que haja doença, e essa representação está relacionada
com as limitações com as quais os pacientes convivem e a rotina que se
estabelece devido à doença e ao tratamento.
A partir do momento em que esse tratamento passa a ser
considerado algo que proporciona melhora na saúde, alívio dos sintomas
da doença e esperança de prolongamento da vida, consequentemente há
um incremento na qualidade de vida dos pacientes. Portanto, as
representações sociais da doença e do tratamento guardam uma relação
positiva com a qualidade de vida.
A presente pesquisa, entretanto, apresenta algumas limitações.
Como foi realizada com uma amostra pequena, os resultados obtidos
não podem ser generalizados para toda a população de pacientes em
hemodiálise. A pretensão deste trabalho, no âmbito acadêmico-
científico, foi de colaborar com outras pesquisas na reflexão sobre a QV
de pacientes em hemodiálise para a melhoria da assistência prestada a
essa população. Assim, sugere-se que outros estudos de cunho
qualitativo e quantitativo sejam desenvolvidos sobre essa temática.
Estudos longitudinais podem contribuir para o surgimento de novas
questões e constatações.
Além disso, as entrevistas foram realizadas durante a sessão de
hemodiálise, devido à maior conveniência tanto para a pesquisadora
quanto para os entrevistados. Porém, acredita-se que o ideal seria que
fossem realizadas em outro momento e em outro local, no qual não
houvesse barulho, circulação de pessoas e possíveis interferências. Não
houve qualquer situação crítica durante as entrevistas, porém sabe-se
que poderiam ter ocorrido reações, típicas de ocorrerem na sessão
hemodialítica, que poderiam ter interferido na entrevista.
As unidades de hemodiálise que participaram da pesquisa foram
essenciais na obtenção dos dados, pois facilitaram o acesso aos
pacientes e a confiança deles na pesquisadora. Também os profissionais,
132

além da pesquisadora, esclareceram os participantes de que a pesquisa


não possuía qualquer relação com a unidade e com o tratamento
oferecido, de modo que teriam a discricionariedade para participar ou
não, sem qualquer prejuízo.
Alguns aspectos não foram concordantes entre os achados
teóricos de outras pesquisas, principalmente no que diz respeito aos
domínios do WHOQOL-Bref. Na dimensão física, apesar de estar entre
as que obtiveram menores escores, foi considerada satisfatória para o
grupo. Identificou-se que o grupo contava com boas condições gerais de
saúde e com alguns reflexos da hemodiálise na qualidade de vida,
principalmente nos aspectos de energia para o trabalho e demais
atividades.
No domínio psicológico houve também uma avaliação positiva,
e isso indica que se trata de pessoas com alta autoestima, pensamentos
positivos, baixa frequência de sentimentos negativos, e que se
condisseram satisfeitos com eles próprios. Esses resultados positivos
refletem na ressignificação da doença e contribui para uma melhor
qualidade de vida.
O domínio relações sociais apresentou avaliação positiva
novamente abordando os aspectos relacionados com as relações
familiares, amigos e equipe de saúde. Essa é outra dimensão que
contribui para o perfil positivo da qualidade de vida nessas pessoas. Já o
domínio meio ambiente a avaliação regular preponderante no grupo
revela que a disponibilidade de recursos foi considerada insuficiente
pela maioria dos participantes, e da dificuldade de obter esses recursos
provém as dificuldades práticas mais importantes dessa população.
Apesar dos avanços obtidos com o tempo, a hemodiálise ainda é
um tratamento que apresenta grande interferência na vida dos pacientes
que dependem desse tratamento para sobreviver. Ainda que com
melhores prognósticos, a doença renal crônica, determinada pela
falência dos rins, é uma doença irreversível.
A realização desta pesquisa possibilitou um novo olhar para a
equipe de saúde, em especial enfermeiros, pois eles se mostraram
calorosos e empenhados ao cumprir as rotinas da unidade e interessados
em fazer parte dessa fase da vida dos pacientes. Muitos deles conhecem
não só o paciente, mas também sua família, estabelecendo por vezes
uma relação de proximidade e confiança. O clima da unidade de
tratamento, embora não tenha sido mencionado anteriormente, acredita-
se ser um fator muito importante no incremento da qualidade de vida
desses pacientes.
133

Por fim, a realização deste estudo possibilitou também à


pesquisadora uma percepção diferenciada da doença renal crônica, da
hemodiálise e dos pacientes. Estudar esses temas foi muito interessante
e acarretou reflexões pessoais, além da aprendizagem científica e
profissional. Estudar como a doença é percebida e representada
oportuniza a compreensão de comportamentos e sentimentos de quem
vive com ela e que eles são compostos de múltiplos determinantes,
biológicos, psicológicos e socioestruturais.
134
135

REFERÊNCIAS

Abraham, S., Venu, A., Ramachandran, A., Chandran, P.M, & Raman,
S. (2012). Assessment of Quality of Life in Patients on Hemodialysis
and the Impact of Counseling. Saudi J. Kidney Dis. Transpl., 23(5), 953-
957.

Abric, J.C. (1993). Central system, perifheral system: their functions


and roles in the dynamics of social representations. Papers on Social
Representations, 2, 75-78.

Abric, J.-C. (1996). Specific processes of social representations. Papers


on Social Representations, 5, 77-80.

Abric, J.-C. (2003). Abordagem estrutural das representações sociais:


desenvolvimentos recentes. In P. H. F. Campos & M. C. S. Loureiro
(Orgs). Representações sociais e práticas educativas. (pp. 37-57).
Goiânia: Ed. da UCG.

Adam, P. & Herzlich, C. (2001). Sociologia da doença e da medicina.


Bauru: Edusc.

Ajzen, H. & Schor, N. (2005). Guias de medicina ambulatorial e


hospitalar de nefrologia. São Paulo: Manole.

Alarcon, A. (2004). La personalidad del paciente y el apoyo psicosocial.


In A. Alarcon (Ed.), Aspectos psicosociales del paciente renal (pp. 31-
46). Bogotá: Clinica Marly.

Alexandre, M. (2004). Representação Social: uma genealogia do


conceito. Comum, 10(23), 122 -138.

Almeida, A.M. & Meleiro, A.M.A.S. (2000). Depressão e insuficiência


renal crônica, uma revisão. Jornal Brasileiro de Nefrologia, 22(1), 21-
29.
136

Almeida, G.B.S., Paz, E.P.A., & Silva, G.A. (2013). Representações


Sociais de portadores de hipertensão arterial sobre a doença: o discurso
do sujeito coletivo. Revista Mineira de Enfermagem, 17(1), 46-53.

Álvarez-Ude, F., Fernández-Reyes, M.J., Vázquez, A., Mon, C.,


Sánchez, R., & Rebollo, P. (2001). Síntomas físicos y transtornos
emocionales en pacientes en programa de hemodiálisis periódicas.
Nefrología, XXI (2), 191- 199.

Andrade, G. R. B. & Vaitsman, J. (2002). Apoio Social e redes:


conectando solidariedade e
saúde. Ciências e Saúde Coletiva, 7(4), 925-934.

Apostolidis, T. (2006). Representations Sociales et Triangulation: Une


Application en Psychologie Sociale de la Santé. Psicologia: Teoria e
Pesquisa, 22 (2), 211-226.

Araujo, E.S., Pereira, L.L., Anjos, M.F. (2009). Autonomia do paciente


com doença renal
crônica em tratamento hemodialítico: a aceitação como fator decisório.
Acta Paul Enferm., 22(Especial-Nefrologia), 509-514.

Arruda, A (2002). Novos significados da saúde e as representações


sociais. Cadernos
de Saúde Coletiva. 10(2), 215-227.

Balbi, A.L., Gabriel, D.P., Barsante, R.C., Caramori, J.T., Martin, L.C.,
& Barreti, P. (2005). Mortalidade e prognóstico específico em pacientes
com insuficiência renal aguda. Rev. Assoc. Med. Bras., 51(6), 318-22.

Balint, M. (1988). O médico: seu paciente e a doença. 2a ed. Rio de


Janeiro: Atheneu.

Barbosa, D.A., Gunji, C.K., Bittencourt, A.R.C., Belasco, A.G.S.,


Diccini, S., Vattimo, F., & Vianne, L.A.C. (2006). Co-morbidade e
mortalidade de pacientes em início de diálise. Acta Paul. Enferm., 19
(3), 304-9.
137

Barbosa, L.M.M., Bastos, K., Andrade Júnior, M.P. (2007). Preditores


de qualidade de vida em pacientes com doença renal crônica em
hemodiálise. J Bras Nefrol., 29, 222-229.

Bardin, L. (2000). Análise de conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70.

Bastos, M. G., Bregman, R., & Kirsztajn, G. M. (2010). Doença renal


crônica: frequente e grave, mas também prevenível e tratável. Rev.
Assoc. Med. Bras, 56(2), 248-53.

Bastos, M. G. & Kirsztajn, G. M. (2011). Chronic kidney disease:


importance of early diagnosis, immediate referral and structured
interdisciplinary approach to improve outcomes in patients not yet on
dialysis. J. Bras. Nefrol., 33(1), 74-87.

Batista, P.B.P. & Santos, O.F.P. (2003). Prognóstico da insuficiência


renal. In N. Schor (Org.), Insuficiência Renal Aguda: fisiopatologia,
clínica e tratamento. (pp. 333-344). São Paulo: Sarvier.

Bauer, M. & Gaskell, G. (2002). Pesquisa Qualitativa com Texto,


Imagem e Som: Um Manual Prático. Petrópolis: Vozes.

Bech, P. (1993). Quality of life measurements in chronic disorders.


Psychotherapy and
Psychosomatic, 59, 1-10.

Belasco, A.G., & Sesso, R. (2002). Burden and quality of life of


caregivers for hemodialysis
patients. Am J Kidney Dis. 39,4, 805- 812.

Berkow, R. & Beers, M. (2004). Manual Merck de informação médica:


saúde para a família. Nascimento, F.G. (Trad). Campinas: Merck Sharp
& Dohme Farmacêutica.

Bertolin, D. C., Pace, A. E., Kusumota, L., & Haas, V. (2011).


Associação entre os modos de enfrentamento e as variáveis
sociodemográficas de pessoas em hemodiálise crônica. Rev. Esc Enferm
USP, 45(5), 1070-1076.
138

Bezerra, J.A.B. (2011). Doença renal crônica e fatores associados em


hipertensos. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós- Graduação em
Saúde Pública. Universidade Estadual da Paraíba.

Birmelé, B., Gall, A.L., Sautenet, B., Aguerre, C., & Camus, V. (2012).
Clinical, sociodemographic, and psychological correlates of health-
related quality of life in chronic hemodialysis patients. Psychosomatics,
53, 30–37.

Bittencourt, Z.Z.L.C. (2003). Qualidade de vida e representações sociais


em portadores de patologias crônicas: estudo de um grupo de renais
crônicos transplantados. Tese de Doutorado. Universidade Estadual de
Campinas, Campinas.

Bohlke, M., Leite, D., Scaglioni, S., Kitamura, C., Andrade, M., & Ost
Von-Gysel, M. (2008).
Predictors of quality of life among patients on dialysis in southern
Brazil. São Paulo
Med J, 126(5), 252-256.

Bousfield, A. B., & Camargo, B. V. (2011). Divulgação do


conhecimento científico sobre aids e representações sociais. Acta
Colombiana de Psicologia, 14, 31-45.

Bowling, A. (1995). What things are important in people’s lives? A


survey of the public’s judgements to inform scales of health related
quality of life. Soc. Sci. Med., 41, 1447-1462.

Bowling, A. & Brazier, J. (1995). Quality of life in social science and


medicine. Soc. Sci. Med., 41(10), 1337–1348.

Braga, S.F.M., Peixoto, S.V., Gomes, I.C., Acúrcio, F.A., Andrade,


E.I.G., Cherchiglia, M.L. (2011). Fatores associados com a qualidade de
vida relacionada à saúde de idosos em hemodiálise. Revista Saúde
Pública, 45(6), 1127-1136.

Brasil. Ministério da Saúde. (2004). Política Nacional de Atenção ao


Portador de Doença Renal. Secretaria de Atenção a Saúde.
Departamento de Atenção Especializada.
139

Brasil. Ministério da Saúde. (2006). Cadernos de Atenção Básica.


Brasília: Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde.
Departamento de Atenção Básica.

Brasil. Ministério da Saúde. (2008). Diretrizes e recomendações para o


cuidado integral de DCNT, Vigilância, prevenção e assistência. Série
Pacto pela Saúde.

Breetvelt, I.S., & Dam, F.S. (1991). Underreporting by cancer patients:


the case of response-shift. Soc Sci Med., 32, 981- 987.

Bullinger, M., Anderson, R., Cella, D., & Aaronson, N. (1993).


Developing and evaluating cross-cultural instruments from minimum
requirements to optimal models. Quality of Life Research, 2(6), 451-
459.

Cagney, K. A., Wu, W. A., Fink, N. E., Jenckes, M. W., Meyer, K.B.,
Bass, E.B., & Powe, N.R. (2000). Formal literature review of quality-of-
life instruments used in end-stage renal disease. American Journal of
Kidney Diseases, 36 (2), 327-336.

Camargo, B. V. (2005). ALCESTE: Um programa informático de


análise quantitativa
de dados textuais. In A. S. P.Moreira, B. V. Camargo, J. C. Jesuíno, &
S. Nóbrega
(Eds.) Perspectivas teórico-metodológicas em representações sociais
(pp. 511-539).
João Pessoa: Editora da UFPB.

Camargo, B.V. & Justo, A.M. (2013). IRAMUTEQ: Um Software


Gratuito para Análise de Dados Textuais. Temas em Psicologia, 21(2),
513-518.

Camargo-Borges C. & Japur, M. (2008). Sobre a (não) adesão ao


tratamento: ampliando sentidos do autocuidado. Texto Contexto
Enferm., 17(1): 64-71.

Campolina, A.G. & Ciconelli, R.M. (2006). Qualidade de vida e


medidas de utilidade:
140

parâmetros clínicos para as tomadas de decisão em saúde. Rev. Panam.


Salud Publica, 19(2), 128-136.

Campos, P.H.F. & Rouquette, M. L. (2003). Abordagem estrutural e


componente afetivo das representações sociais. Psicologia: Reflexão e
Crítica, 16(3), 435-445.

Cardoso, M. H. C. & Gomes, R. (2000). Representações sociais e


história: referenciais teórico-metodológicos para o campo da saúde
coletiva. Cadernos de Saúde Pública, 16(2), 499-506.

Carreira, L., Marcon, S.S. (2003). Cotidiano e trabalho: concepções de


indivíduos portadores de insuficiência renal crônica e seus familiares.
Rev Latino-Am Enfermagem, 11, 823-831.

Cascais, A.F.M., Martini, J.G, & Almeida, P.J.S. (2008).


Representações sociais da
pessoa estomizada sobre o câncer. Rev. enferm., 16(4), 495-500.

Cassileth, B.R., et al. (2002). Psychosocial status in chronic illness. N


Engl J Med., 347, 281- 283.

Cavalcante, M.C.V., et al. (2013). Fatores associados à qualidade de


vida de adultos em hemodiálise em uma cidade do nordeste do Brasil. J.
Bras. Nefrol., 35(2), 79-86.

Chow, F.F.F.Y.F., Briganti, E.M., Kerr, P.G., Chadban, S.J., Zimmet,


P.Z., & Atkins,
R.C. (2003). Health-related quality of life in Australian adults with renal
insufficiency: a population-based study. Am J Kidney Dis., 41, 596- 604.

Ciconelli, R.M., Ferraz, M.B., Santos, W. (1998). Tradução para a


língua portuguesa e validação do questionário genérico de avaliação de
qualidade de vida SF-36 (Brasil SF-36). Rev Bras Reumatol, 39,143 -
150.

Colle, R.O. (2001). Atendimento psicológico no setor de diálise.


Boletim Paulistano de Psicossomática, 2, 10.
141

Costa e Silva, M. E. D. da & Moura, E. B. M. (2011) Representações


sociais de profissionais de saúde sobre hipertensão arterial:
contribuições para a enfermagem. Escola Anna Nery (impr.), 15(1), 75-
82.

Coutinho, B.B. & Trindade, Z.A. (2006). As representações sociais de


saúde no tratamento da leucemia e linfoma. PSIC - Revista de
Psicologia da Vetor Editora, 7(1), 9-18.

Coutinho, N. P.S., Vasconcelos, G. M., Lopes M.L.H., Wadie, W. C.A.,


& Tavares, M.C.H. (2010). Qualidade de vida de pacientes renais
crônicos em hemodiálise. Revista de Pesquisa em Saúde, 11(1), 13-17.

Cowling,T., Jennings,L.W., Goldstein,R.M., Sanchez,E.Q., Chinnakotla,


S., Klintmalm, G.B., & Levy, M.F. (2004). Liver transplantation and
healthrelated quality of life: scoring differences between men and
women. Liver Transplantation, 10(1), 88-96.

Cozby, P.C. (2003). Métodos de pesquisa em ciência do


comportamento. São Paulo: Atlas.

Crovador, L. F., Oliveira-Cardoso, E. A., Mastropietro, A. P., & dos


Santos, M. A. (2013). Qualidade de Vida Relacionada à Saúde de
Pacientes com Esclerose múltipla antes do Transplante de Células-
Tronco Hematopoéticas. Psicologia: Reflexão e crítica, 26(1), 58-66.

Cruz, M.C., Andrade, C., Urrutia, M., Draibe, S., Nogueira-Martins,


L.A., & Sesso, R.C.C. (2011). Quality of life in patients with chronic
kidney disease. Clinics, 66(6), 991-995.

Daugirdas, J.T., Blake, P.G., & Ing, T.S. (2003). Manual de diálise. 3ª
ed. São Paulo: Medsi.

Diniz, J.S.S., Filho, J.B.M. & Lima, A.M.C. (2002). Insuficiência renal
crônica – A trajetória de uma prática. In B.W. Romano (Org.) A prática
da psicologia nos hospitais (pp.77 – 92). São Paulo: Pioneira.

Doise, W. (1985). Les représentations sociales: définition d’unconcept.


Connexions, 45, 243-253.
142

Duarte, P.S., Ciconelli, R.M., & Sesso, R. (2005). Cultural adaptation


and validation of the “Kidney Disease and Quality of Life - Short Form
(KDQOL-SF)” in Brazil. J. Med. Biol. Res, 38(2), 261-70.

Dyniewicz, A. M., Zanella, E., & Kobus, L. S. G. (2004). Narrativa de


uma cliente com insuficiência renal crônica: a história oral como
estratégia de pesquisa. Revista Eletrônica de Enfermagem, 6(2), 199-
212.

Ebrahim, S. (1995).Clinical and public health perspectives and


applications of health related quality of life measurement. Soc. Sci.
Med., 41(10), 1383–1394.

Farr, R. M. (1995). Representações Sociais: a teoria e sua história. In P.


Guareschi & S. Jovchelovitch (Orgs). Textos em Representações Sociais
(pp. 30-59). Petrópolis: Vozes.

Ferreira, R.C. & Silva Filho, C.R. (2011). A qualidade de vida dos
pacientes renais crônicos em hemodiálise na região de Marília, São
Paulo. Jornal Brasileiro de Nefrologia, 33(2), 129- 135.

Flament, C. (2001). Estrutura e dinâmica das representações sociais. In


D. Jodelet (Org.). As representações sociais (pp. 173-186). Rio de
Janeiro: UERJ.

Fleck, M.P.A., et al. (1999). Desenvolvimento da versão em português


do instrumento de avaliação de qualidade de vida da OMS (WHOQOL-
100). Rev Bras Psiquiatr., 21(1), 19-28.

Fleck, M. P. A., Louzada, S., Xavier, M., Chachamovich, E., Vieira, G.,
Santos, L., & Pinzon, V. (2000). Aplicação da versão em português do
instrumento de avaliação de qualidade de vida “WHOQOL – bref”. Rev.
Saúde Pública, 34(2), 178-183.

Fleck, M. P. A. (2008). A avaliação da qualidade de vida: um guia para


profissionais da saúde. Porto Alegre: Artmed.

Flick, U. (2007). Uma introdução à Pesquisa Qualitativa (2ª ed.). São


Paulo: Bookman.
143

Flores, R.V. & Thomé, E.G.R. (2004). Percepções do paciente em lista


de espera para o transplante renal. Revista Brasileira de
Enfermagem,57(6), 687-690.

Frankl, V. E. (1990). A questão do sentido em psicoterapia. Campinas:


Papirus.

Fortes, V.L.F. (2000). Cotidiano da pessoa em tratamento dialítico


domiciliar: modos criativos de cuidar-se. Dissertação de Mestrado,
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil.

Fuhrer, M. J. (2000). Subjectifying quality of life as a medical


rehabilitation outcome. Disability and Rehabilitation, 22 (11), 481-489.

Ghiglione, R & Matalon, B. (1993). O inquérito: teoria e prática.


Oeiras: Celta Editora.

Gomes, R., Mendonça, E. A., & Pontes, M. P. (2002). As representações


sociais e a experiência da doença. Cadernos de Saúde Pública, 18(5),
1207-1214.

Gonçalves, L.F.S., Manfro, R.C., Veronese, F.V., & Saitovitch, D.


(1999). Aspectos clínicos, rotinas e complicações. In: Barros E, Manfro
R, Thomé F, Gonçalves LF, cols. Nefrologia: rotina, diagnóstico e
tratamento. 2a ed. Porto Alegre: Artmed, pp. 475-97.

Guerra-Guerrero, V., Sanhueza-Alvarado, O., & Cáceres-Espina, M.


(2012). Qualidade de vida de pessoas em hemodiálise crônica: relação
com variáveis sociodemográficas, médico-clínicas e de laboratório. Rev.
Latino-Am. Enfermagem, 20(5), 0-9.

Guyatt, G.H., Feeny, D.H., & Patrick, D.L. (1993). Measuring health-
related quality of life. Annals of Internal Medicine, 118, 622-629.

Haan, R., Aaronson, N. K., Limburg, M., Langton Hewer, R. L., & Van
Crevel, H. (1993). Measuring quality of life in stroke. Stroke, 24, 320-
327.
144

Hallert, C., Sandlund, O., Broqvist, M. (2003). Perceptions of health-


related quality of life of men and women living with coeliac disease.
Scandinavian Journal of Caring Sciences, 17(3), 301-307.

Herzlich, C. (2005). A problemática da representação social e sua


utilidade no campo da doença. Physis: Revista de Saúde Coletiva,
15(Suplemento), 57-70.

Janoff-Bulman, R. & Frantz, C.M. (1997). The impact of trauma on


meaning: From meaningless world to meaningful life. In M.J. Power &
C. Brewin (Eds.), The transformation of meaning in psychological
therapies: Integrating theory and practice. (pp. 91-106). Hoboken, NJ:
Wiley & Sons.

Jodelet, D. (1998). Representações do Contágio e a Aids. In D. Jodelet


& M. Madeira
(Orgs.) Aids e Representações Sociais: a busca de sentidos (pp. 17-45).
Natal: EDUFRN.

Jodelet, D. (2001) Representações sociais: um domínio em expansão.In


D. Jodelet (Org.). As representações sociais (pp. 17-44). Rio de Janeiro:
UDUERJ.

Jodelet, D. (2005). Loucuras e representações sociais. Petrópolis:


Vozes.

Joffe, H. (2002). Social representations and health psychology. Social


Science Information, 41(4), 559-580.

Kaplan, R.M. (1995). Quality of life, resource allocation, and the U.S.
Health-care crisis. In Dimsdale, J.E. & Baum, A. (Eds.) Quality of life
in behavioral medicine research. (pp. 3-30). New Jersey: Lawrence
Erlbaum Associates.

Kawakame, P.M.G. & Miyadahira, A.M.K. (2005). Qualidade de vida


de estudantes de graduação em enfermagem. Revista da Escola de
Enfermagem da USP, 39(2), 164-172.
145

Keskin, G. & Engin, E. (2011). The evaluation of depression, suicidal


ideation and coping strategies in hemodialysis patients with renal
failure. Journal of Clinical Nursing, 20, 2721–2732.

Kim, Y. (2009). Relationship between Illness Perceptions, Treatment


Adherence and Clinical Outcomes in Maintenance Hemodialysis
Patients. (2009). Doctor Dissertation, University of California, Los
Angeles, United States of America.

Kimmel, P.L., Peterson, R.A., Weihs, K.L., Simmens, S.J., Alleyne, S.,
Cruz, I., & Veis, J.H. (2000). Multiple measurements of depression
predict mortality in a longitudinal study of chronic hemodialysis
outpatients. Kidney Int., 57 (5), 2093-2098.

Lanza, A.H.B., Chaves, A.P.A., Garcia, R.C.P., & Brandão, J.A.G.


(2008). Perfil biopsicossocial de pacientes renais crônicos em
tratamento hemodialítico. Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde,
33(3), 141-145.

Leplége, A. & Hunt, S. (1997). The problem of quality of life in


medicine. Journal of the American Medical Association, 278.

Lessa, I. (1998). O adulto brasileiro e as doenças da modernidade. Rio


de Janeiro: Hucitec-ABRASCO.

Liem, Y.S., Bosch, L.J., Arends, L.R., Heijenbrok-Kal, M.H., &


Hunink, M.G.M. (2007). Quality of life assessed with the medical
outcomes study short form 36-item health survey of patients on renal
replacement therapy: a systematic review and meta-analysis. Value in
health, 10(5), 390-397.

Lima, A.F.C., Fuzii, S.M.O., Pinho, N.A., Melo, A.C.T., & Hashimoto,
T.H.F. (2010). Processo de enfermagem na prática de hemodiálise: a
experiência das enfermeiras de um Hospital Universitário. Revista
Referência, II (12), 39-45.

Lima, A.M.C., Mendonça, J.B., & Diniz, J.S.S. (1994). Insuficiência


Renal Crônica: a trajetória de uma prática. In Romano, B.W. (Org). A
prática da psicologia nos hospitais. (pp. 78 -92). São Paulo: Pioneira.
146

Lindquist, R. et al. (2003). Comparison of health-related quality-of-life


outcomes of men and women after coronary artery bypass surgery
through 1 year: findings from the POST CABG Biobehavioral Study.
American Heart Journal, 146 (6),1038-1044.

Litwin, M. (2006). Health-Related Quality of Life. In D.F, Penson &


J.T. Wei (Eds.), Clinical Research Methods for Surgeons (pp. 237-251).
New Jersey: Humana Press.

Madeiro, A.C., Machado, P.D.L.C., Bonfim, I.M., Braqueais, A.R., &


Lima, F.E.T. (2010). Adesão de portadores de insuficiência renal
crônica ao tratamento de hemodiálise. Acta Paul. Enferm., 23(4), 546-
51.

Maldaner, C.R., Beuter, M., Brondani, C.M., Budó, M.L.D., & Pauletto,
M.R. (2008). Fatores que influenciam a adesão ao tratamento na doença
crônica: o doente em terapia hemodialítica. Rev. Gaúcha Enferm., 29(4),
647-53.

Marin, N., Luiza, V. L., Osório-de-Castro, C. G. S., & Machado-dos-


Santos, S. (2003). Assistência Farmacêutica para gerentes municipais
de saúde. Rio de Janeiro: OPAS/OMS.

Martiny, C., Silva, A.C.O., Neto, J.P.S., & Nardi, A.E. (2011). Factors
associated with risk of suicide in patients with hemodialysis.
Comprehensive Psychiatry, 52, 465–468.

McLaughlin, K., Manns, B., Culleton, B., Donaldson, C., & Taub, K.
(2001).An economic evaluation of early versus late referral of patients
with progressive renal insufficiency. J. Kidney Dis., 38(5), 1122- 1128.

Medeiros, R.H., Meyer, F. (2001). Impacto da insuficiência renal


crônica no perfil físico
do individuo em hemodiálise. Revista Perfil, 5, 41- 48.

Mello, Filho J. (1994). Concepção psicossomática: visão atual. 7a ed.


Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro.
147

Mendes, A.C. & Shiratori, K. (2002). As percepções dos pacientes de


transplante renal. Nursing – Revista Técnica de Enfermagem, 5(44), 45-
51.

Mendes, S., Viana, S., Gomes, I., De Assis, F., Gurgel, E., & Leal, M.
(2011). Factors associated with health-related quality of life in elderly
patients on hemodialysis. Rev Saúde Pública, 45(6), 1127-1136.

Mingard, G., Cornalba, L., Cortinovis, E., Ruggiata, R., Mosconi, P., &
Apolone, G. (1999). Health-related quality of life in dialysis patients. A
report from an Italian study using the SF-36 health survey. Nephrol Dial
Transplant, 14, 1503- 1510.

Miranda, C.R. (1999). Introdução à Saúde do trabalhador. 1ª ed. São


Paulo: Atheneu.

Moreira, L. B., Fernandes, P.F.C.B.C., Monte, F. S., & Martins, A.M.C.


(2008). Adesão ao Tratamento Farmacológico em Pacientes com
Doença Renal Crônica. J. Bras. Nefrol., 30(2), 113- 119.

Moreno, F., López-Gomez, J.M., Sanz-Guajardo, D., Jofre, R.,


Valderrábano, F. (1996). Quality of life in dialysis patients. A Spanish
multicenter study. Nephrol Dial Transplant, 11, 25– 29.

Moscovici, S. (2012). A psicanálise, sua imagem e seu público.


Petrópolis: Vozes.

Moscovici, S. (2003). O fenômeno das representações sociais. In S.


Moscovici, Representações Sociais: Investigações em Psicologia Social
(pp. 7-109). Petrópolis: Vozes.

Nobre, F., Pierin, A. M. G., & Mion Jr., D. (2001). Adesão ao


tratamento: o grande desafio da hipertensão. São Paulo: Lemos
Editorial.

Nunes, M.F., & Freire, M.C.M. (2006). Qualidade de vida de cirurgiões-


dentistas que atuam em um serviço público. Rev Saúde Pública, 40(6),
1019-26.
148

Nunes, F.S. & Lautert, L. (2009). A enfermagem na hemodiálise longa


noturna. In E.G.R. Thomé & L. Lautert (Orgs). Enfermagem em Diálise
(pp. 19- 29). Brasília: ABEn.

Nunes, C. & Lobo, A. (2012). Estudo das dimensões da qualidade de


vida nos pacientes hemodialisados. Revista de Enfermagem Referência,
8, 39-45.

Oliveira, V.Z. & Gomes, W.B. (2004). Comunicação médico-paciente e


adesão ao tratamento em adolescentes portadores de doenças orgânicas
crônicas. Estudos de Psicologia, 9(3), 459-469.

Oliveira, T.F.M., Santos, N. O., Lobo, R.C.M.M., Pinto, K. O., Barboza,


S. A., Lucia, M C. S. (2008). Perfil sociodemográfico, eventos de vida e
características afetivas de pacientes com insuficiência renal crônica em
tratamento por hemodiálise e diálise peritoneal: um estudo descritivo.
Psicólogo inFormação, 12, 9-32.

Organização Mundial da Saúde (OMS). (2005). Prevenção de doenças


crônicas: um investimento vital. Brasília: Organização Mundial da
Saúde.

Organização Mundial da Saúde (OMS). (1997). WHOQOL: Measuring


quality of life. WHO/MSA/MNH/PSF/97.4

Organização Mundial da Saúde (OMS). (2011). Noncommunicable


Diseases Country Profiles.

Palmonari, A. & Cerrato, J. (2011). Representações sociais e psicologia


social. In A. M. O. Almeida; M. F. S. Santos & Z. A. Trindade (Orgs.),
Teoria das Representações Sociais: 50 anos (pp. 305-334). Brasília:
Technopolitik.

Parfrey P.,Vasavour, H., Henry, S., Bullock, M., & Gault, M. (1988).
Clinical features and severity of non-specific symptoms in dialysis
patients. Nefron., 50, 121-128.

Patrick, D.L. & Bergner, M. (1990). Measurement of health status in the


1990s. Annu. Rev. Public Health., 11, 165-183.
149

Patrick, D.L. & Erickson, P. (1993). Health Status and Health Policy.
Quality of life in health care and resource allocation. New York:
Oxford.

Penna, T.L.M. (1992). Psicoterapia breve em hospitais gerais. In J. M.


Filho (Cols.). Psicossomática hoje. Porto Alegre: Artmed.

Perestrello, D. (1996). A medicina da pessoa. 4a ed. São Paulo:


Atheneu.

Pilger, C., Rampari, E.C., Waidman, M.A.P., & Carreira, L. (2010).


Hemodiálise: seu significado e impacto para a vida do idoso. Escola
Anna Nery Revista de Enfermagem, 4(4), 677-683.

Quintana, A. M. & Muller, A. C. (2006). Da Saúde à Doença:


representações sociais sobre a insuficiência renal crônica e o transplante
renal. Psicologia Argumento, 34(44), 73 – 80.

Ramos, I.C., Queiroz, M.V.O., & Jorge, M.S.B. (2008). Cuidado em


situação de Doença Renal Crônica: representações sociais elaboradas
por adolescentes. Rev. Bras. Enferm., 61(2), 193-200.

Rapley, M. (2003). Quality of life research: A critical introduction.


Great Britain: SAGE Publications.

Ratinaud, P. & Marchand, P. (2012). Application de la méthode


ALCESTE à de “gros” corpus et stabilité des “mondes lexicaux” :
analyse du “Cable Gate” avec IraMuTeQ. Em: Actes des 11eme
Journées internationales d’Analyse statistique des Données Textuelles
(835–844). Presented at the 11eme Journées internationales d’Analyse
statistique des Données Textuelles. JADT 2012, Liège.

Rezende, R.C. & Porto, I.S. (2009). Cuidado de enfermagem para


clientela em hemodiálise: suas dimensões instrumentais e expressivas.
Rev. Eletr. Enf., 11(2), 266-74.

Rey, F. L. G. (2006). As representações sociais como produção


subjetiva: seu impacto na hipertensão e no câncer. Psicologia: teoria e
prática, 8 (2), 69-85.
150

Ribeiro, J. P. (1994). Adaptação do “Self-Perception Profile for College


Students” à
população Portuguesa: Sua utilização no contexto da psicologia da
saúde. Avaliação Psicológica: Formas e Contextos, 2, 129-38.

Riella, M. C. (2010). Princípios de nefrologia e distúrbios


hidroeletrolíticos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.

Rocco, M.V. & Moossavi, S. (2011). Hemodiálise. In E.V. Lerma, J.S.


Berns & A. R. Nissenson (Eds.), Nefrologia e Hipertensão: Diagnóstico
e Tratamento (437-443). Porto Alegre: Artmed.

Romão Júnior, E. (2004). Doença Renal Crônica: Definição,


Epidemiologia e Classificação. Jornal Brasileiro de Nefrologia, 26(3),
1-3.

Romão Júnior, E. & Abensur, H. (1997). Tratamento por hemodiálise.


In N. Schor (Org). Insuficiência Renal Aguda: fisiopatologia, clínica e
tratamento (pp. 297-306). São Paulo: Sarvier.

Romão Júnior, E. , Olinto, S.W.L., Canziani, M.E., Praxedes, J.N.,


Santello, J.L., & Moreira, J.C.M. (2003). Censo SBN 2002: informações
epidemiológicas das unidades de diálise do Brasil. Jornal Brasileiro de
Nefrologia, 25, 188-199.

Roso, C.C. (2012). O cuidado de si de pessoas com insuficiência renal


crônica em tratamento conservador. Dissertação (mestrado). Programa
de Pós Graduação em enfermagem, Universidade Federal de Santa
Maria, RS.

Rouquette, M.L. (1995). Remarques sur le statut ontologique des


représentations sociales. Papers on Social Representations, 4, 79-83.

Rouquette, M. L. (1998). Representações sociais e práticas sociais. In A.


S. P. Moreira & D. C. Oliveira. (Eds.), Estudos interdisciplinares de
representação social (pp. 39-46). Goiânia: AB.

Sá, C. P. (1996). Núcleo central das representações sociais. Petrópolis:


Vozes.
151

Saes, S.C. (1999). Alterações comportamentais em renais crônicos.


Nursing, 2(12),17-9.

Sampieri, R.H., Collado, C.F., & Lucio, P.B. (2006). Metodologia de


Pesquisa. 3ª Ed. SP: McGraw-Hill.

Santos, P.R. & Pontes, L.R.S.K. (2007). Mudança do nível de qualidade


de vida em portadores de insuficiência renal crônica terminal durante
seguimento de 12 meses. Rev. Ass. Med. Bras., 53(4), 329-34.

Sesso, R.C.C., Lopes, A.A., Thomé, F.S., Lugon, J.R., Watanabe, Y.W.,
& Santos, D.R. (2012). Diálise Crônica no Brasil - Relatório do Censo
Brasileiro de Diálise, 2011. J. Bras. Nefrol., 34(3), 272-277.

Seidl, E. M. F. & Zannon, C. M. C. (2004). Qualidade de vida e saúde:


aspectos conceituais e metodológicos. Cadernos de Saúde Pública, 20,
580-588.

Schipper, H., Chinch, J., & Powell, V. (1990). Definitions and


conceptual issues. In B. Spilker (Org.), Quality of life assessments in
clinical trials (pp. 11-24). New York: Raven Press.

Schmidt, M. I., Duncan, B. B., Silva, G. A., Menezes, A. M., Monteiro,


C. A., Barreto, S. M., Chor, D., & Menezes, P.R. (2011). Chronic non-
communicable diseases in Brazil: burden and current challenges. The
Lancet, 377, 1949-1961.

Silva, R.C. (1998) A falsa dicotomia qualitativo – quantitativo:


Paradigmas que informam nossas práticas de pesquisas. In Romanelli,
G. & Biasoli-Alves, Z.M.M. (Orgs) Diálogos metodológicos sobre
prática de pesquisa. (pp. 159-174) Ribeirão Preto: Legis Summa.

Silva, D.M.G.V., Vieira, R.M., Koschnik, Z., Azevedo, M., & Souza,
S.S. (2002). Qualidade de vida de pessoas com insuficiência renal
crônica em tratamento hemodialítico. Rev Bras Enfermagem, 55, 562-
567.

Silva, G. E., Araujo, M.A.N., Perez, F., & Souza, J.C. (2011). Qualidade
de vida do paciente renal crônico em tratamento hemodialítico em
Dourados – MS. Psicólogo inFormação, 15, 99-110.
152

Silva, A.S., Silveira, R.S., Fernandes, G.F.M., Lunardi, V.L., & Backes,
V.M.S. (2011). Percepções e mudanças na qualidade de vida de
pacientes submetidos à hemodiálise. Rev. Bras. Enferm., 64(5), 839-844.

Smeltzer, S.C. & Bare, B.G. (2002). Tratado de enfermagem médico-


cirúrgica. 9ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.

Sociedade Brasileira de Nefrologia (2013). Censo de diálise SBN 2013.


Disponível em: http://sbn.org.br/pdf/censo_2013_publico_leigo.pdf.

Sorkin, M.I. & Blake, P. (2003). Sistemas para diálise Peritoneal. In J.T.
Daugirdas, P.G. Blake, & T.S. Ing (Orgs). Manual de Diálise (pp. 304-
317). Rio de Janeiro: Medsi.

Sousa, M.L.X.F., Silva, K.L., Nóbrega, M.M.L., & Collet, N. (2012).


Déficits de autocuidado em crianças e adolescentes com doença renal
crônica. Texto Contexto Enfermagem, 21(1), 95-102.

Stuhler, G. D., & Camargo, B. V. (2012). Representações sociais do


diabetes de pessoas que vivem com essa condição crônica. Tempus:
Actas de Saúde Coletiva 6, 67 - 81.

Teixeira, M. G. & Silva, G.A. (2008). A representação do portador do


vírus da imunodeficiência humana sobre o tratamento com os anti-
retrovirais. Rev. esc. enferm. USP, 42(4), 729-736.

Toporovski, J. (1990). Manual de Nefrologia. Sociedade Brasileira de


Pediatria.

Torres, T.L. & Camargo, B.V. (2008). Representações sociais da Aids e


da Terapia Anti-retroviral para pessoas vivendo com HIV. Psicologia:
Teoria e Prática, 10(1), 64-78.

Trentini, M., Corradi, M.E., Araldi, M.A.R., & Tigrinho, F.C. (2004).
Qualidade de vida de pessoas dependentes de hemodiálise considerando
alguns aspectos físicos, sociais e emocionais. Texto & Contexto Enferm.,
13(1), 74-82.
153

Vala, J. A Análise de Conteúdo. In: A.S. Silva; J. M. Pinto (Orgs.).


Metodologia das Ciências Sociais. 12 ed. Porto: Edições Afrontamento,
2003. p. 101-128.

Vala, J. (2004). Representações sociais – para uma psicologia social do


pensamento social. In J. Vala & M. B. Monteiro. Psicologia Social. 2a
ed. (353-384). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Vala, J. & Monteiro, B. (2006). Psicologia social. Lisboa: Fundação


Calouste Gulbenkian.

Valderrábano, F., Jofre, R., López-Gómez, J.M. (2001). Quality of life


in end-stage renal disease patients. Am J Kidney Dis, 38, 443-464 .

Van Manen et al. (2003). Psychosocial factors and quality of life in


young hemodialysis patients with low comorbidity. J Nephrol, 16, 886-
894.

Veras, R. P. (2011). Estratégias para o enfrentamento das doenças


crônicas: um modelo em que todos ganham. Rev. Bras. Geriatr.
Gerontol., 14(4), 779-786.

Vergès, P., Tyszka, T., & Vergès, P. (1994). Noyau central, saillance et
proprieties structurales. Papers on Social Representations, 3, 3-12.

Wagner, W. (1994). Descrição, explicação e método na pesquisa das


representações sociais. In P. Guareschi & S. Jovchelovitch (Orgs.).
Textos em representações sociais. (149-186). Petrópolis: Vozes.

Warnock, D.G. (1997). Insuficiência renal crônica. In J.C. Bennett & F.


Plum. Cecil - Tratado de medicina interna (pp. 614-622). 20 ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan.

Weber, S. (1991). O público, o privado e a qualidade da educação


pública. Cadernos CEDES, 25, 27-44.

WHOQOL-Group (1994). Development of the WHOQOL: Rationale


and Current Status. International Journal of Mental Health, 23 (3), 24-
56.
154

WHOQOL-Group (1998). Development of World Health Organization


WHOQOL-Bref Quality of Life Assessment. Psychological Medicine,
28, 551-558.

Zhang, A., Cheng, L., Zhu, N., Sun, L., & Wang, T. (2007). Comparison
of quality of life and causes of hospitalization between hemodialysis and
peritoneal dialysis patients in China. Health Qual Life Outcomes, 5(49).

Zimmermann, P.R., Carvalho, J.O., & Mari, J.J. (2004). Impacto da


depressão e outros fatores psicossociais no prognóstico de pacientes
renais crônicos. Revista de Psiquiatria do RS, 26(3), 312-31.

Zimpel, R. & Fleck, M. P. A. (2008). Qualidade de vida em pacientes


com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In
M. P. A. Fleck (Org.) A avaliação da qualidade de vida: guia para
profissionais da saúde. (pp. 157 – 167). Porto Alegre: Artmed.
155

APÊNDICES

APÊNDICE A

Universidade Federal de Santa Catarina


Centro de Filosofia e Ciências Humanas
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)

Meu nome é Larissa Papaleo Koelzer, sou aluna de Mestrado do


programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de
Santa Catarina e estou realizando a pesquisa intitulada: “Representações
sociais da doença renal crônica e da hemodiálise e sua relação com a
qualidade de vida”. O objetivo da pesquisa é identificar a relação entre o
significado da doença renal crônica e da hemodiálise e a qualidade de
vida de pacientes hemodialisados.

Gostaria de solicitar sua participação, que se dará em forma de


entrevista, pois sua opinião é muito importante para este estudo. Sua
participação é voluntária e anônima, isto é, você não será identificado
em nenhum momento e suas respostas individuais nunca serão
divulgadas, apenas eu terei acesso a elas. Como algumas questões estão
relacionadas com a intimidade e vida diária pode haver algum
desconforto com a participação. Caso haja necessidade de atendimento
você será encaminhado ao setor de Psicologia do hospital.

Quero também lembrar que este estudo não possui nenhuma


relação com o serviço de saúde e não interfere de maneira alguma na
condução dos serviços prestados pela equipe de saúde. Você pode
desistir da participação a qualquer momento sem nenhum prejuízo. Caso
você aceite participar, solicito a permissão para que possa utilizar os
dados respondidos por você, sendo que apenas eu terei acesso direto às
informações que você der. Este TCLE será assinado e rubricado em
duas vias, sendo que uma ficará com você.

Este estudo está de acordo com a Resolução 466/2012 e teve


aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de
Santa Catarina – UFSC, cujo endereço é:
156

CEPSH (Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos)

Universidade Federal de Santa Catarina

Pró-Reitoria de Pesquisa/Contatos: (48) 3721-9206/


[email protected]

Campus Universitário Reitor João David Ferreira Lima

Trindade - Florianópolis - Santa Catarina - Brasil CEP: 88040-900

Localização: Biblioteca Universitária Central - Setor de Periódicos


(térreo), atrás dos arquivos deslizantes.

Caso tenha alguma dúvida em relação ao estudo ou desistir de


participar, você poderá entrar em contato com as seguintes
pesquisadoras:

Larissa Papaleo Koelzer - Mestranda

Telefone: (48) 9943-3397

e-mail: [email protected]

Endereço: Rua Alba Dias Cunha, 147 apto 606 bloco 1

Trindade - Florianópolis - Santa Catarina - Brasil

Profª Dra. Andréa Barbará S. Bousfield - Orientadora

Telefone: (48) 3721-9067

e-mail: [email protected]

Endereço: Centro de Filosofia e Ciências Humanas - CFH

Universidade Federal de Santa Catarina

Bloco C - Sala 1B - 2° piso

Campus Universitário Reitor João David Ferreira Lima

Trindade - Florianópolis - Santa Catarina - Brasil


157

Eu,________________________________________________declaro
que fui informado(a) da pesquisa “Representações sociais da doença
renal crônica e da hemodiálise e sua relação com a qualidade de vida”, e
estando ciente da mesma, autorizo a utilização dos meus dados para
análise.

Florianópolis, ________ de __________________________ de 2014.

Assinatura do Participante Documento de Identidade do


Participante
158
159

APÊNDICE B

Questionário

Sou aluna do Mestrado em Psicologia da Universidade Federal


de Santa Catarina e estou desenvolvendo a seguinte pesquisa:
“Representações sociais da doença renal crônica e da hemodiálise e sua
relação com a qualidade de vida”. O objetivo é identificar a relação
entre o significado da doença renal crônica e da hemodiálise e a
qualidade de vida de pacientes hemodialisados.

Gostaria de solicitar sua participação pois sua opinião é muito


importante para esse estudo. Sua participação é voluntária e anônima,
isto é, você não será identificado(a) em nenhum momento. Algumas
perguntas são íntimas, mas igualmente importantes para o estudo. Não
há resposta certa ou errada, tudo o que você achar que deve ser dito
sobre o assunto é importante para mim. Fique a vontade para dizer o que
pensa.

Antes de começarmos, eu tenho aqui o TCLE – Termo de


consentimento que por questões éticas deve ser preenchido por você,
nos autorizando a utilizar as suas respostas apenas e exclusivamente
para fins de pesquisa.

Agora vamos começar.

1) Qual o significado da doença renal crônica para você?


Caso o participante não fale sobre o diagnóstico, sugestões de
questões:
- Como você recebeu o diagnóstico? Quanto tempo faz?
- Como era sua vida antes do diagnóstico da doença renal crônica?

2) O que você pensa do tratamento que você tem feito, a


hemodiálise?
Caso o participante não fale sobre o significado do tratamento e as
interferências (dificuldades e facilidades). Sugestões de questões:
- O que significa o tratamento para você?
160

- Você acredita que existem aspectos que interferem no seu


tratamento? Aspectos positivos? Aspectos negativos?
- Você percebeu mudanças na sua vida após o início da
hemodiálise?

3) O que você entende por Qualidade de Vida?


- Você acredita que a doença tem interferido ou interferiu em algum
momento na sua qualidade de vida?
- Em que aspectos houve interferência?

Instrumento – Qualidade de Vida (WHOQOL – Bref)

Nº do entrevistado: _____

Este questionário é sobre como você se sente a respeito de sua qualidade


de vida, saúde e outras áreas de sua vida. Por favor, responda a todas as
questões. Se você não tem certeza sobre que resposta dar em uma
questão, escolha entre as alternativas a que lhe parece mais apropriada.

1) Como você avaliaria sua qualidade de vida?

Muito Ruim Nem ruim nem boa Boa Muito


ruim boa
1 2 3 4 5

2) Quão satisfeito (a) você está com a sua saúde?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

As questões seguintes são sobre o quanto você tem sentido algumas


coisas nas últimas duas semanas.
161

3) Em que medida você acha que sua dor (física) impede de fazer o que
você precisa?

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

4) O quanto você precisa de algum tratamento médico para levar sua


vida diária?

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

5) Quanto você aproveita a vida?

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

6)Em que medida você acha que sua vida tem sentido?

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

7) Quanto você consegue se concentrar?

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

8) Quão seguro você se sente em sua vida diária?

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

9)Quão saudável é o seu ambiente físico? (clima, barulho, poluição,


atrativos)
162

Nada Muito pouco Mais ou menos Bastante Extremamente


1 2 3 4 5

As questões seguintes perguntam sobre quão completamente você te


sentido ou é capaz de fazer certas coisas nas duas últimas semanas.

10) Você tem energia suficiente para seu dia-a-dia?

Nada Muito pouco Médio Muito Completamente


1 2 3 4 5

11) Você é capaz de aceitar sua aparência física?

Nada Muito pouco Médio Muito Completamente


1 2 3 4 5

12) Você tem dinheiro suficiente para satisfazer suas necessidades?

Nada Muito pouco Médio Muito Completamente


1 2 3 4 5

13) Quão disponível para você estão as informações que precisa no seu
dia-a-dia?

Nada Muito pouco Médio Muito Completamente


1 2 3 4 5

14) Em que medida você tem oportunidade de fazer atividades de lazer?

Nada Muito pouco Médio Muito Completamente


1 2 3 4 5
163

As questões seguintes perguntam sobre quão bem ou satisfeito você se


sentiu a respeito de vários aspectos da sua vida nas duas últimas
semanas.

15) Quão bem você é capaz de se locomover?

Muito ruim Ruim Nem ruim nem bom Bom Muito bom
1 2 3 4 5

16) Quão satisfeito(a) voce está com o seu sono?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

17) Quão satisfeito(a) está com sua capacidade de desempenhar as


atividades do seu dia-a-dia?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

18) Quão satisfeito(a) você está com sua capacidade para o trabalho?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

19) Quão satisfeito(a) você está consigo mesmo?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5
164

20) Quão satisfeito(a) está com sua relações pessoais? (amigos,


parentes, conhecidos, colegas)

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

21) Quão satisfeito(a) está com o apoio que recebe dos seus amigos?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

23) Quão satisfeito(a) está com as condições do local onde mora?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

24) Quão satisfeito(a) está com o seu acesso aos serviços de saúde?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

25) Quão satisfeito(a) está com o seu meio de transporte?

Muito Insatisfeito Nem satisfeito Satisfeito Muito


insatisfeito nem insatisfeito satisfeito
1 2 3 4 5

As questões seguintes referem-se à frequência com que você sentiu ou


experimentou certas coisas nas últimas duas semanas.
165

26) Com que frequência você tem sentimentos negativos, tais como mau
humor, desespero, ansiedade, depressão?

Nunca Algumas Frequentemente Muito Sempre


vezes frequentemente
1 2 3 4 5

Questionário sociodemográfico

Já estamos chegando ao final, agora quero conhecer um pouco


mais sobre você.

1) Possui alguma outra doença?

2) Faz algum outro tratamento?

3) Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino

4) Idade: _________

5) Profissão: ______________________

6) Estado civil: ____________________

7) Filhos:  Sim  Não

8) Nível de estudo:
Não estudou 
Ensino fundamental incompleto 
Ensino fundamental completo 
Ensino médio incompleto 
Ensino médio completo 
Ensino superior incompleto 
Ensino superior completo 

9) Renda familiar: ____________ salário (s) mínimo (s)


166

10) Por fim, o que você achou de participar dessa pesquisa?

11) Gostaria de dizer mais alguma coisa? Tem alguma sugestão


para essa pesquisa? (p. ex. outras questões.)

Obrigada pela participação!


167

ANEXOS
168

Você também pode gostar