A Civilidade Na Persia Aos Olhos
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A Civilidade na Pérsia aos olhos dos
Portugueses de Quinhentos*
1
Resumo/Abstract:
Pretende-se, neste estudo, recolher os vestígios de “civilidade” (conforme a caracterizou
Norbert Elias na sua obra O processo civilizacional) na Pérsia do século XVI. Partindo dos
relatos das embaixadas portugueses às terras do Xeque Ismael, observaram-se vários costumes
e ritos, diferentes e novos aos olhos dos portugueses. A Expansão Portuguesa possibilitou o
contacto com novas sociedades e novas culturas, abrindo novos horizontes para o processo
civilizacional europeu. Este estudo pretende ser, em última análise, uma reflexão, através
das fontes, acerca da visão portuguesa do Oriente.
This study envisages to collect the signs of “civility” (as Norbert Elias called it) in 16th
century Persia. Based on the reports of the Portuguese missions to the land of Sheik Ismael,
several customs and rituals – different and new in the Portuguese eyes – were observed. The
Portuguese Expansion fostered the contact with new societies and cultures, hereby opening up
the European civilisational process to new horizons. This study aims ultimately at providing
– through its sources - a reflection of Portuguese views on the East.
Palavras chave/Keywords:
Expansão Portuguesa; Pérsia; Oriente; Civilidade.
Portuguese Expansion; Persia; East; Civilisation.
*
Este estudo corresponde, na sua essência, ao trabalho realizado no seminário «A Civili
dade nos Costumes aos Olhos dos Portugueses de Quinhentos», da licenciatura em História,
orientado pelo Professor Doutor João Marinho dos Santos. Agradecemos a ajuda e o apoio
dado pela Ana Rita Rocha, Joel Sabino, Ricardo Alexandre Rodrigues e da D. Conceição
França do Instituto de História da Expansão Ultramarina da FLUC, na preparação desta versão.
1
RESENDE, Garcia de – «Miscelânea» in Crónica de D. João II e miscelânea. Lisboa:
Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1991, p. 338.
2
Veja-se SANTOS, João Marinho dos – As economias do Índico aquando da chegada
dos portugueses. Revista Portuguesa de História. 27 (1992) 203-214.
3
Como adiante veremos, seguimos este conceito tal como foi estudado e interpretado
por Nobert Elias (1897-1990) na sua obra Über den Prozess der Zivilisation (O processo
civilizacional).
4
Tendo em conta a disparidade relativa aos nomes persas e portugueses para pessoas,
lugares e títulos, optámos por seguir a denominação proveniente das fontes portuguesas.
Em todo o caso, os títulos de Xeque, Xá, Sufi cognominam sempre o monarca do Império Persa.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 171
5
Cf. António Dias FARINHA – Os portugueses no Golfo Pérsico, 1507-1538:
contribuição documental e crítica para a sua história. Mare Liberum, 3, 1991; João Manuel
de Almeida Teles e CUNHA – Economia de um império: economia política do Estado da
Índia em torno do Mar Arábico e Golfo Pérsico: elementos conjunturais: 1595-1635, FCSH-
-UNL: Policopiada (diss. Mestrado), 1995.
6
Veja-se, como exemplo, FERRONHA, António Luís (coord.) – O confronto do olhar:
o encontro dos povos na época das navegações portuguesas séculos XV e XVI: Portugal,
África, Ásia, América, Lisboa: Caminho, 1991.
7
Cf. COSTA, Helder Santos – Da Pérsia moderna ao Irão Pahlavi. Lisboa: U.T.L./
/I.S.C.S.P./Centro de Estudos Islâmicos, 2005, p. 29-38.
172 Roger Lee Pessoa de Jesus
8
Veja-se a recente obra de Dejanirah COUTO e Rui Manuel LOUREIRO – Ormuz –
1507 e 1622. Conquista e perda. Lisboa: Tribuna da História, 2007.
9
Para todas estas questões veja-se GODINHO, Vitorino Magalhães – Os descobrimentos
e a economia mundial. Lisboa: Editorial Presença, 2ª ed., 1987, vol. III, p.111-112, 122-126;
BACQUÉ-GRAMMONT, Jean-Louis – L’apogée de l’Empire ottoman: les événements
(1512-1606) in MANTRAN, Robert (dir.) – Histoire de l’Empire Ottoman, Paris: Fayard,
1989, p.139-158.
10
Sobre Ormuz, veja-se o estudo de Jean AUBIN – «Le royaume d’Ormuz au début
du XVIe siècle» in Le latin et l’astrolabe: recherché sur le Portugal de la Renaissance, son
expansion en Asie et les relations internationales, vol. II. Lisboa/Paris: CNCDP/FCG, 2000;
para uma sólida visão sobre o Golfo Pérsico, leia-se Willem FLOOR – The Persian Gulf: a
political and economic history of five port cities, 1500-1730. Washington: Mage Publishers,
2006
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 173
11
GODINHO, Vitorino Magalhães – Os descobrimentos e a economia…, cit., p. 124.
Sobre a descrição destas cidades e das vias de Bassorá e da Pérsia, veja-se o estudo de
SANTOS, João Marinho dos - Os portugueses em viagem: representações quinhentistas de
cidades e vilas. Lisboa: GGTMECDP, 1996, p. 148-172.
12
Cf. COUTO, Dejanirah e LOUREIRO, Rui Manuel – Ormuz…, cit., p. 33-45.
13
ALBUQUERQUE, Brás de – Comentários do grande Afonso de Albuquerque, capitam
geral que foy das Indias orientaes, em tempo do muito poderoso Rey dom Manuel, o primeiro
deste nome. Em Lisboa: por João de Barreira impressor del Rey, 1576, Parte I, cap. XL,
fl. 97.
174 Roger Lee Pessoa de Jesus
esta via comercial); o Preste João atacaria pelo Sul, Carlos V e D. Manuel
pressionariam através do Mediterrâneo (e no caso português, até avançando
pelo Norte de África); e por fim, o Xeque Ismael investiria sobre o Sultão
pelo Este14. As cartas de Albuquerque, enviadas ao Xá da Pérsia, propõem
esta mesma estratégia: «[…] e porque eu tenho sabido que elle he vosso
imiguo e vos faz guerra, vos mando esta nova, e vos offereço contra elle
minha pessoa e armada del Rei nosso senhor pera ho ajudar a destruyr e ser
contra elle cada vez que me pera isso requererdes; […] e querendo o vós
destruir per terra, podereis ter del Rei nosso senhor grande ajuda d armada
per mar, e creo que com mui pouco trabalho senhoreareis seu Reino e cidade
do cayro e toda a sua terra e senhorio»15.
Após a conquista de Ormuz, três embaixadas portuguesas foram enviadas
ao Xeque.
A primeira remonta a 1510, tendo como representante português junto do
Xá, Rui Gomes de Carvalhosa. Levando um extenso regimento, não chegou
a sair de Ormuz, pois foi envenenado por ordem de Cojeatar, governador
da ilha16 (tendo em conta a reduzida comitiva, não existia ninguém para o
substituir nas suas funções).
Sucumbindo a tal ataque, a embaixada desfez-se e ter-se-ia de esperar
até 1513 para outro enviado ser eleito por Albuquerque. Desta vez, o
governador enviou Miguel Ferreira como embaixador17 e João Ferreira
como sota-embaixador, evitando assim que o acidente de 1510 se repetisse18.
Recebido pelo Xeque com grande entusiasmo, Miguel Ferreira observou
Cf. o estudo de THOMAZ, Luís Filipe – L’idée impériale manuéline in AUBIN, Jean
14
19
O relato completo desta embaixada encontra-se na Biblioteca da Ajuda (Lisboa) –
Códice 50-V-21, fl. 137v a 155r, dado a conhecer por SMITH, Ronald Bishop – The first
age of the Portuguese embassies, navigations and peregrinations in Persia (1507-1524).
Maryland: Decatur Press, 1970, p. 39-56. Duas cópias incompletas podem ser encontradas
nas CAA, I, p. 391-394; II, p. 233-250. Encontramo-nos actualmente a preparar a publicação
da cópia completa presente na Biblioteca da Ajuda.
176 Roger Lee Pessoa de Jesus
são, de forma cada vez mais diferenciada, deslocadas para trás dos
bastidores da vida social e envoltas em sentimentos de vergonha, como a
regulamentação de toda a vida pulsional e afectiva se torna cada vez mais
abrangente, uniforme e estável, graças a um constante autocontrolo»24.
Assim, pretendemos abordar a problemática da civilidade, captada
pessoalmente ou ouvida ou lida no Oriente pelos portugueses. No entanto,
não nos esqueçamos que esta visão focava o “outro”, o “diferente”, que se
distinguia pelos seus usos e costumes, pois estes não se identificavam com
os conhecidos no “Ocidente”. Aliás, e seguindo as linhas da antropologia
cultural, é necessário conhecer o princípio do relativismo cultural, ou seja,
que «[…] os juízos de valor baseiam-se na experiência, e esta é interpretada
por cada indivíduo em termos da sua própria endoculturação»25, sem esquecer
que «[…] a posição relativista não significa, de forma alguma, que todos os
sistemas de valores, todos os conceitos, de bem e de mal, assentem sobre
areias tão movediças que não haja necessidade de uma moral, de formas
de comportamento estabelecidas e aceitas, de códigos éticos»26. Na maior
parte dos casos, estes hábitos diferentes «[…] não podem ser entendidos
como algo de “negativo”, como “falta de civilização” ou de “saber” (como
facilmente temos tendência a julgar), mas como algo que correspondia às
necessidades daquelas pessoas e se lhes afigurava razoável e necessário
exactamente na forma que revestia»27.
24
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 620.
25
LIMA, Augusto Mesquitela [et al] – Introdução à antropologia cultural. Lisboa:
Editorial Presença, 1980, 2ª ed., p. 61. Sobre este tema, veja-se também Enciclopédia Einaudi,
dir. Ruggiero ROMANO, vol. 38: Sociedade-Civilização, Lisboa: IN-CM, 1999, entradas
«Aculturação» e «Selvagem/bárbaro/civilizado» da autoria de Ignacy Sachs
26
LIMA, Augusto Mesquitela Lima [et al] – Introdução à antropologia…, cit., p. 62.
27
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., pp-162-163.
178 Roger Lee Pessoa de Jesus
que «[…] nunqua risse de cousa que visse, […] e que de cousa boa nem má
que visse se espantasse, nem se pusesse a olhar, […] e do que lhe pergun
tassem se era boa qualquer cousa que lhe perguntassem, dissesse que si;
[…] e que nom cospisse estando fallando com homens que o visitassem»28.
Tanto este regimento, como o da embaixada seguinte apresentam muitos
outros aspectos que não cabem aqui discutir, como a obrigação de procurarem
alguma presença cristã nos locais pelos quais passariam, ou a obrigação
de demonstrarem serem impiedosos (de forma a vincar o carácter impla-
cável português).
30
CAA, II, p. 238.
31
TENREIRO, António – «Itinerário de António Tenrreyro…» in Itinerários da Índia a
Portugal por Terra, rev. e pref. António Baião, Coimbra: Imprensa da Universidade, 1923,
p. 35-36. Esta obra será referida, doravante, apenas como Itinerário.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 179
32
Cf. ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 188; e REVEL, Jacques – Les usages de
la civilité in ARIÈS, Philippe e DUBY, Georges (dir.) – Histoire de la vie privée: 3. De la
Renaissance aux Lumières. Paris: Seuil, 1999, p. 167-208.
33
MATTHEE, Rudi – The pursuit of pleasure. Drugs and stimulants in Iranian history,
1500-1900.Washington: Mage Publishers, 2005, p. 37-38.
34
Alcorão. Mem-Martins: SporPress, 2002, Sura V: 90-91 ; veja-se na mesma obra,
Sura II: 218.
35
MATTHEE, Rudi – The pursuit…, cit., p.- 49-50.
36
Cf. MATTHEE, Rudi – The pursuit…, cit., p. 50.
37
ARNAUT, Salvador Dias - A arte de comer em Portugal na Idade Média in O “Livro
de Cozinha” da Infanta D. Maria de Portugal. Coimbra: Por ordem da Universidade, 1967,
p. LII. Veja-se também as páginas LXII a LIV.
180 Roger Lee Pessoa de Jesus
40
ARNAUT, Salvador Dias – A arte de comer…, cit., p. LI.
41
D. Duarte, Leal Conselheiro. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1999,
c. C, p. 367.
42
Itinerário, p. 19.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 181
43
Primor e Honra da Vida Soldadesca no Estado da Índia. Em Lisboa: Por Jorge
Rodrigues, 1630, IIª Parte, c. X, fl.61v; para uma edição actualizada veja-se Laura Monteiro
PEREIRA (introd., elucidário e glossário) - Primor e honra da vida soldadesca no Estado
da Índia. Ericeira: Mar das Letras Editora, 2003.
44
Cerca de 0,75 L.
45
CAA, II, p. 238.
46
CAA, II, p. 238.
47
CAA, II, p. 239.
182 Roger Lee Pessoa de Jesus
Itinerário, p. 18.
48
Itinerário, p. 19.
49
50
Itinerário, p. 19.
51
Esta tenda seria uma segunda residência do Xeque, um autêntico palácio montável
em qualquer parte. Tenreiro informa-nos que «as mezas que estavão pera as ilhargas no
campo tomarião de espaço a cada parte dous tiros de bésta» (Itinerário, p. 35), ou seja,
cerca de 400m.
52
Itinerário, p. 35.
53
Itinerário, p. 38.
54
Itinerário, p. 38.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 183
Não foi em vão que João de Barros afirmou, acerca do Xeque Ismael,
que «[…] este principe […] éra terror da Pérsia»57. São várias as fontes que
demonstram a crueza e o ímpeto do monarca persa. O seu próprio império
era composto por uma sociedade guerreira, habituada às lides do campo de
batalha. No fundo, e tal como Norbert Elias afirmava para o mundo medieval
ocidental, «a alegria em torturar e matar outros era grande e era uma alegria
socialmente permitida. Em certa medida, a organização social até impelia
nesse sentido, tornando necessário ou fazendo parecer conveniente esse
tipo de comportamento»58. Além do mais, não existia um poder central que
55
Itinerário, p. 36.
56
Cf. MATTHEE, Rudi – The pursuit…, cit., p. 50.
57
BARROS, João de – Ásia de João de Barros dos feitos que os portugueses fizeram
no descobrimento e conquista dos mares e terras do oriente. Lisboa: por Germão Galharde,
1553, Segunda Década, Livro Décimo, c. IV, fl. 134v.
58
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 323.
184 Roger Lee Pessoa de Jesus
59
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 333.
60
Biblioteca da Ajuda (Lisboa) – Códice 50-V-21, fl. 140v.
61
Itinerário, p. 21.
62
Lendas da Índia, p. 411.
63
ALBUQUERQUE, Brás de – Comentários…, cit., Parte IV, c. XIX, p. 471.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 185
64
Cf. COELHO, Maria Helena da Cruz e RILEY, Carlos Guilherme – Sobre a caça
medieval. Estudos Medievais. 9 (1988) 221-267.
65
COUTO, Dejanirah e LOUREIRO, Rui Manuel – Ormuz…, cit., p. 47.
66
Lendas da Índia, p. 416.
67
CAA, II, p. 241.
186 Roger Lee Pessoa de Jesus
e asi partia outras através»68. Farto de tal, deu então ordens para os seus
homens avançarem, gabando-se posteriormente, ao nosso embaixador,
de num Inverno ter morto em Sau, vinte mil animais, e noutro Inverno,
52 mil69 em Espão70.
Nesta mesma linha, encontramos a existência de um “alcoram”, entre
Carma e Caixão, um monumento feito de «[…] cabeças de veados e carneiros
e bodes bravos e doutros muytos alymarias que hy [o Xeque] matou hum
inverno»71, uma espécie de pequena torre, simbolizando o poder e a violência
do monarca. Posteriormente, António Tenreiro dará conta destes mesmos
“alcoram”, mas chamando-lhes “curichéo” («[…] todo feito de cabeças,
e cáveiras de veados assim como parede»72), e até de outros, edificados «[…]
de todas as cabeças das alimárias, que alli matavão»73.
Mantendo-nos na descrição de António Tenreiro, nesse mesmo capítulo
o autor caracteriza as caçadas do Xeque. Divergindo dos relatos anteriores,
este afirma que eram feitas junto a serras, de forma a ter apenas que cercar
três lados, visto que os animais não conseguiam subir mais. O modo de
operação não diferia: entrar e matar.
A insegurança presente ao longo da estrada não escapou aos olhos
portugueses. Na viagem da segunda embaixada encontramos uma comitiva
de sessenta frecheiros à procura do enviado persa, visto que este era esperado
por parentes de alguns ladrões que tinha mandado enforcar, de forma a
vingarem-se74. O escrito da embaixada de Balthazar Pessoa apresenta vários
casos, como por exemplo a existência de «[…] fortalezas, castellos roqueiros,
e cisternas de agoa chovediça. Servem estas fortalezas, e castellos pera
se acolherem os moradores a ellas, quando sentem ladrões que os vem a
roubar»75, ou o facto de que «[…] em muitos passos deste caminho tivemos
68
CAA, II, p. 241.
69
A leitura deste número nas CAA encontra-se mal feita – são 52 mil e não apenas 7 mil,
conforme se pode ler no manuscrito da Biblioteca da Ajuda (Lisboa) – Códice 20-V-21,
fl. 147v.
70
Cf. CAA, II, p. 241.
71
Biblioteca da Ajuda (Lisboa) – Códice 50-V-21, fl. 141r.
72
Itinerário, p. 22.
73
Itinerário, p. 23.
74
CAA, II, 235.
75
Itinerário, p. 12.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 187
76
Itinerário, p. 20.
77
BARROS, João de – Ásia…, Segunda Década, Livro Terceiro, c. IV, fl. 37v.
78
Apud SANTOS, João Marinho dos – A guerra e as guerras na expansão portuguesa
(séculos XV e XVI). Lisboa: GTMECDP, 1998, p. 273.
79
Cf. SANTOS, João Marinho dos – A guerra e as guerras…, cit., p. 269-274.
80
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 230.
188 Roger Lee Pessoa de Jesus
85
Gil Simões, na embaixada de Fernão Gomes de Lemos, afirmaria que «[…] o xeque
Ismael nella faz seu continuo estar, por ser ali grande muito farta» - CAA, II, p. 249.
86
Lendas da Índia, p. 411.
87
CAA, II, p. 244.
190 Roger Lee Pessoa de Jesus
Conclusão
Que conclusões retirar desta breve abordagem às terras do Xá? Que civi-
lidade existia na Pérsia aos olhos dos portugueses? Tentámos esboçar tal
realidade nas páginas anteriores, recorrendo aos mais diversos exemplos
encontrados em textos da época.
Alguns indícios de civilidade (como era entendida na Europa) podem
aí ser encontrados, mas não em tão larga escala como no Ocidente. Este é
um processo que pressupõe uma «[…] alteração do comportamento e da
sensibilidade humana numa direcção muito definida»91, onde «[…] cada
indivíduo é forçado a ponderar melhor o efeito das suas acções ou das acções
de outros sobre toda uma série de elos da cadeia social»92.
Portugal viu e ouviu as formas de pensar, de sentir e de agir do outro,
tentando compreendê-las e enquadrá-las. Os textos que nos chegaram
demonstram bem estas ideias, de interpretar o que parecia estranho,
e de integrar estas novidades «nos parâmetros culturais ocidentais»,
88
Biblioteca da Ajuda (Lisboa) – Códice 50-V-21, fl. 141v.
89
Itinerário, p. 34-40.
90
Itinerário, p. 40.
91
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 619.
92
ELIAS, Norbert – O processo…, cit., p. 626.
A Civilidade na Pérsia aos olhos dos Portugueses de Quinhentos 191
93
LOUREIRO, Rui – O encontro de Portugal com a Ásia …, cit., p. 165.
94
PIRES, Tomé – A suma oriental de Tomé Pires in CORTESÃO, Armando (ed.) – A suma
oriental de Tomé Pires e o livro de Francisco Rodrigues. Coimbra: por ordem da Univer-
sidade, 1978, p. 151.
95
Biblioteca da Ajuda (Lisboa) – Códice 50-V-21, fl.142r e 143v.
96
BARBOSA, Duarte – Livro do Oriente de Duarte Barbosa in Além-Mar. Códice
Casanatense 1889 com o Livro do Oriente de Duarte Barbosa. Lisboa: Bertrand, 1984,
p. 54.
97
Itinerário, p. 30.
192 Roger Lee Pessoa de Jesus