Camila Candello Notaro Luxacao de Patela em Caes

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia


FMVZ USP

Luxação de Patela em Cães: Osteotomia Corretiva – Relato de


Caso

São Paulo
2021
Camila Candello Notaro

Luxação de Patela em Cães: Osteotomia Corretiva – Relato de


Caso

Trabalho de Conclusão de Residência em Área Profissional da Saúde


Modalidade Multiprofissional: Clínicas Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais
Área: Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais
Orientador: Prof. Dr. André Luis do Vale De Zoppa
Coorientadora: M.V. MSc Viviane Sanchez Galeazzi

São Paulo
2021

2
Camila Candello Notaro

Luxação de Patela em Cães: Osteotomia Corretiva – Relato de


Caso

Trabalho de Conclusão de Residência em Área Profissional da Saúde


Modalidade Multiprofissional: Clínicas Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais

Aprovado em: ___/___/___

_____________________________________
Prof. Dr. André Luis do Vale De Zoppa

____________________________________
M.V. MSc Viviane Sanchez Galeazzi

_____________________________________
M.V. PhD Ayne Murata Hayashi

São Paulo
2021

3
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por ter me guiado para a escolha dessa


profissão e durante toda essa jornada.
Agradeço a minha mãe, Roseli Candello Notaro, ao meu pai, Edson José
Notaro, a minha irmã, Aline Candello Notaro, a minha avó, Catharina Letícia Fanti
Notaro, ao meu avô, Alecio Notaro, a minha tia, Denise Maria Notaro, e ao meu
primo, Enzo Notaro, que sempre foram minha base, me apoiaram em todas as
minhas decisões e não mediram esforços para me dar as condições para chegar
até aqui. Agradeço ao meu namorado, Felipe Sillos, que sempre esteve ao meu
lado, me apoiando e me incentivando em todos os momentos.
Agradeço a todos do Hospital Veterinário da Faculdade de Medicina
Veterinária e Zootecnia da USP, funcionários, professores, pós-graduandos,
veterinários contratados, enfermeiros, que foram de suma importância para
minha formação, não somente profissional, mas também como pessoa.
Agradeço em especial a todos os residentes, meus R1s, R2s, R3s, e
principalmente aos residentes da minha turma, por dividirem esse tempo de
alegrias, tristezas, frustrações e de muito aprendizado. A residência não seria a
mesma sem cada um de vocês.
Por último, mas não menos importante, agradeço a todos os animais e
seus tutores, que confiaram em mim e que me permitiram aprender com cada
um deles.
Este caminho não seria o mesmo sem a participação de cada um de
vocês. Muito obrigada!

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RESUMO

A luxação de patela é uma das afecções ortopédicas mais comuns em


cães, sendo a luxação medial de maior incidência quando comparada a lateral.
Sugere-se uma base hereditária para a doença, resultando em um mau
alinhamento do mecanismo extensor do joelho. O tratamento pode ser
conservativo ou cirúrgico, onde geralmente são feitas associações de diferentes
técnicas cirúrgicas, com o objetivo de fazer com que a patela permaneça no
sulco troclear durante toda a amplitude de movimento.
No presente trabalho realizou-se revisão bibliográfica sobre luxação de
patela em cães e um relato de caso de um cão com luxação medial de patela
grau 3, que foi corrigida por meio da combinação de técnicas cirúrgicas:
osteotomia femoral lateral distal em cunha de fechamento, trocleoplastia e 4Ts
(Tibial Tuberosity Transposition Tool).

Palavras-chave: Ortopedia, luxação de patela, osteotomia, deformidade, cães.

5
ABSTRACT

Patellar luxation is one of the most common orthopedic disorders in dogs,


with the medial luxation having a higher incidence when compared to the lateral
one. A hereditary basis for the disease is suggested, resulting in poor alignment
of the knee extensor mechanism. Treatment can be conservative or surgical,
where associations of different surgical techniques are usually made, with the
aim of making the patella remain in the trochlear groove throughout the range of
motion.
In the present work, a bibliographic review on patellar luxation in dogs and
a case report of a dog with medial grade 3 patellar luxation was performed, which
was corrected through the combination of surgical techniques: distal lateral
femoral osteotomy in closing wedge, trocleoplasty and 4Ts (Tibial Tuberosity
Transposition Tool).

Keywords: Orthopedics, patelar luxation, osteotomy, deformity, dogs.

6
SUMÁRIO

1. Introdução .................................................................................................. 12

2. Anatomia do Joelho ................................................................................... 13

3. Luxação de Patela ..................................................................................... 18

3.1 Definição .................................................................................................... 18

3.2 Luxação Medial de Patela .......................................................................... 19

3.2.1 Diagnóstico.............................................................................................. 22

3.2.2 Diagnóstico Diferencial ............................................................................ 32

3.2.3 Tratamento .............................................................................................. 32

3.3 Luxação Medial de Patela Traumática ....................................................... 34

3.3.1 Sinais Clínicos ......................................................................................... 34

3.3.2 Tratamento .............................................................................................. 34

3.4 Luxação Lateral em Jovens de Raças Grandes e Gigantes....................... 35

3.4.1 Sinais Clínicos ......................................................................................... 35

3.4.2 Tratamento .............................................................................................. 36

4. Técnicas Cirúrgicas para Correção da Luxação de Patela ........................ 36

4.1 Desmotomia e Capsulectomia Parcial .................................................... 36

4.2 Liberação do Quadríceps ....................................................................... 37

4.3 Sobreposição do Retináculo Lateral ou Medial ...................................... 37

4.4 Sobreposição da Fáscia Lata ................................................................. 38

4.5 Sutura Anti-rotacional Patelar e Tibial .................................................... 39

4.6 Trocleoplastia ......................................................................................... 41

4.6.1 Condroplastia Troclear ............................................................................ 42

4.6.2 Sulcoplastia de Ressecção em Cunha .................................................... 43

4.6.3 Ressecção do Bloco Troclear.................................................................. 43

4.6.4 Sulcoplastia Troclear ............................................................................... 44

4.7 Transposição da Tuberosidade Tibial ........................................................ 45

7
5. Osteotomia Corretiva Associada a Deformidades Femorais ..................... 47

6. Osteotomia Corretiva Associada a Deformidades Tibiais .......................... 48

7. Cuidados Pós-operatórios ......................................................................... 51

8. Prognóstico ................................................................................................ 52

9. Relato de Caso .......................................................................................... 52

9.1 Planejamento Cirúrgico .............................................................................. 53

9.2 Técnica Cirúrgica: Osteotomia femoral lateral distal em cunha de fechamento


......................................................................................................................... 57

9.3 Técnica Cirúrgica: 4T (Tibial Transposition Tiberosity Tool)....................... 60

9.4 Evolução do caso ....................................................................................... 62

10. Discussão ............................................................................................... 66

11. Conclusão .............................................................................................. 68

12. Referências ........................................................................................... 69

8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Representação esquemática da articulação do joelho do cão (aspecto
caudolateral). Fonte: König & Liebich, 2002. .................................................... 15
Figura 2 - Estruturas de tecido mole e esqueléticas normais associadas ao
mecanismo extensor do quadríceps. Fonte: Fossum, 2006. ............................ 17
Figura 3 - Representação esquemática dos músculos e esqueleto do membro
pélvico do cão (aspecto lateral). Fonte: König & Liebich, 2002. ....................... 17
Figura 4 - Representação esquemática dos músculos e esqueleto do membro
pélvico do cão (aspecto medial). Fonte: König & Liebich, 2002. ...................... 18
Figura 5 - Anormalidades esqueléticas com luxação patelar medial congênita
grave. ............................................................................................................... 20
Figura 6 - Posição da tíbia em relação ao fêmur e formato da tróclea femoral nos
graus 1 a 4 da luxação medial da patela. A seção femoral na região do sulco
troclear é mostrada em contorno escuro e a seção tibial proximal é sombreada.
Nota-se rotação progressiva medial da tíbia e deformidade da crista troclear
medial. Fonte: Piermattei et al., 2016. .............................................................. 22
Figura 7 - Para luxar a patela medialmente, o joelho é estendido e a extremidade
do membro rotacionado medialmente enquanto se empurra a patela em direção
medial. Fonte: Piermattei et al., 2016 ............................................................... 24
Figura 8 - Para luxar a patela lateralmente, o joelho deve estar parcialmente
flexionado e a extremidade do membro deve ser rotacionada lateralmente
enquanto se puxa a patela em sentido lateral (Piermattei et al., 2016). ........... 24
Figura 9 - Determinação do aLDFA e CORA. Fonte: Tobias et al., 2017. ........ 27
Figura 10 - Valores médios dos ângulos articulares do fêmur no plano frontal
relatados na literatura. Fonte: Petazzoni, 2008. ............................................... 28
Figura 11 - Medida da torção femoral e ângulo de anteversão do colo femoral.
Fonte: Petazzoni, 2008. ................................................................................... 29
Figura 12 - Graus de torção femoral interna e externa. Fonte: Petazzoni, 2008.
......................................................................................................................... 30
Figura 13 - Torção tibial interna e externa. Fonte: Petazzoni, 2011. ................ 31
Figura 14 - Torção tibial interna e externa. Fonte: Petazzoni, 2008. ................ 31
Figura 15 - Rotação tibial externa e interna. Fonte: Petazzoni, 2011. .............. 31
Figura 16 - A. Filhote de cão Great dane com valgo genuíno. Observar os quadris
largos, joelhos estreitos e jarretes, com os dedos apontando para fora. B. Fêmur

9
e tíbia de um Dinamarquês mostrando angulação em valgo e torção dos côndilos
femorais. Fonte:Piermattei et al., 2016. ............................................................ 35
Figura 17 - Técnica cirúrgica de desmotomia medial. Fonte: Piermattei et al.,
2016. ................................................................................................................ 37
Figura 18 - Técnica cirúrgica de sobreposição do retináculo lateral. Fonte:
Piermattei et al., 2016. ..................................................................................... 38
Figura 19 - Técnica cirúrgica de sobreposição da fáscia lata. Fonte: Piermattei et
al., 2016). ......................................................................................................... 39
Figura 20 - Técnica cirúrgica de sutura anti-rotacional patelar e tibial. Fonte:
Piermattei et al., 2016. ..................................................................................... 41
Figura 21 - Técnica cirúrgica de condroplastia troclear. Fonte: Piermattei et
al.,2016. ........................................................................................................... 42
Figura 22 - Técnica cirúrgica sulcoplastia de ressecção em cunha. Fonte:
Piermattei et al., 2016. ..................................................................................... 43
Figura 23 - Técnica cirúrgica de ressecção do bloco troclear. Fonte: Piermattei
et al., 2016........................................................................................................ 44
Figura 24 - Técnica cirúrgica de sulcoplastia troclear. Fonte: Piermattei et al.,
2016. ................................................................................................................ 45
Figura 25 - Técnica cirúrgica de transposição da tuberosidade tibial. Fonte:
Piermattei et al., 2016. ..................................................................................... 46
Figura 26 - JIG. Fonte: disponível em
http://synthes.vo.llnwd.net/o16/LLNWMB8/US%20Mobile/Synthes%20North%2
0America/Product%20Support%20Materials/Technique%20Guides/SUTGMiniT
PLOJ10959B.pdf .............................................................................................. 48
Figura 27 - técnica de osteotomia parcial para luxação medial de patela. Fonte:
Petazzoni, 2015................................................................................................ 49
Figura 28 - Dispositivo TTTT. Fonte: Petazzoni, 2015. .................................... 50
Figura 29 - Colocação do dispositivo TTTT. Fonte: Petazzoni, 2015. .............. 51
Figura 30 - Colocação do pino (seta) para manutenção da crista e tuberosidade
tibial. Fonte: Petazzoni, 2015. .......................................................................... 51
Figura 31 - Radiografia pré-operatória, projeção craniocaudal do fêmur
esquerdo. Fonte: cedida por Eloy Curuci. ........................................................ 53
Figura 32 - Radiografia pré-operatória, projeção mediolateral do fêmur esquerdo.
Fonte: cedida por Eloy Curuci. ......................................................................... 54

10
Figura 33 - Planejamento cirúrgico osteotomia femoral lateral distal em cunha de
fechamento. Fonte: cedida por Eloy Curuci...................................................... 55
Figura 34 - Radiografia pré-operatória, presença de torção tibial externa de 10
graus. Fonte: cedida por Eloy Curuci, comparando com estudo de Petazzoni,
2008. ................................................................................................................ 56
Figura 35 - Técnica de osteotomia parcial para luxação medial de patela. Fonte:
Petazzoni, 2015................................................................................................ 57
Figura 36 - Planejamento 4T. Fonte: cedida por Eloy Curuci. .......................... 57
Figura 37 - Tróclea rasa (seta). Fonte: cedida por Eloy Curuci. ....................... 58
Figura 38 - Trocleoplastia de ressecção em bloco (seta). Fonte: cedida por Eloy
Curuci. .............................................................................................................. 58
Figura 39 - Colocação do jig (seta) no fêmur. Fonte: cedida por Eloy Curuci. . 59
Figura 40 - Realização da osteotomia (seta) somente na cortical cis. Fonte:
cedida por Eloy Curuci. .................................................................................... 59
Figura 41 - Compressão dos fragmentos (seta) utilizando pinça de redução
ponta-ponta. Fonte: cedida por Eloy Curuci. .................................................... 60
Figura 42 - Colocação da placa (seta) no fêmur. Fonte: cedida por Eloy Curuci.
......................................................................................................................... 60
Figura 43 - Colocação de distrator ósseo (seta) na tíbia. Fonte: cedida por Eloy
Curuci. .............................................................................................................. 61
Figura 44 - Colocação de pino liso (seta) para manter a posição da tuberosidade
tibial. Fonte: cedida por Eloy Curuci. ................................................................ 62
Figura 45 - Radiografia pós operatório imediato, com aLDFA. Fonte: cedida por
Eloy Curuci. ...................................................................................................... 63
Figura 46 - Radiografia 30 dias pós-operatório, projeção mediolateral. Fonte:
cedida por Eloy Curuci. .................................................................................... 64
Figura 47 - Radiografia 30 dias pós-operatório, projeção craniocaudal. Fonte:
cedida por Eloy Curuci. .................................................................................... 64
Figura 48 - Radiografia 60 dias pós-operatório, projeção mediolateral. Fonte:
cedida por Eloy Curuci. .................................................................................... 65
Figura 49 - Radiografia 60 dias pós-operatório, projeção craniocaudal. Fonte:
cedida por Eloy Curuci. .................................................................................... 65

11
1. Introdução
A luxação de patela é um dos distúrbios ortopédicos mais comuns em cães,
podendo resultar no desenvolvimento de doenças articulares degenerativas, dor
e claudicação. Resulta de múltiplas anormalidades anatômicas dos membros
pélvicos, sendo a luxação traumática menos comum (Alam, et al., 2007).
A patogênese da doença foi amplamente revisada, porém ainda não está
clara. No entanto, sugere-se uma base hereditária da doença, devido à
predisposição racial e alta prevalência de casos bilaterais na ausência de trauma
(Alam, et al., 2007).
Os distúrbios mais comuns associados à luxação de patela incluem:
anormalidade na articulação coxofemoral, torção e angulação femoral, displasia
epifisária femoral, desvio da crista tibial, atrofia ou deslocamento medial dos
músculos do quadríceps femoral, patela alta, sulco troclear raso, instabilidade
rotacional da articulação do joelho ou deformidade da tíbia (Fossum, 2006; Alam,
et al., 2007).
A luxação de patela ocorre com maior frequência em cães de pequeno porte,
porém também é diagnosticada em cães de grande porte. A luxação de patela
lateral é incomum e tem maior frequência em cães de grande porte. Porém, a
luxação patelar medial é reconhecida em cães de todos os tamanhos (Alam, et
al., 2007).
A luxação medial é uma afecção que ocorre especialmente em cães de raças
toy e miniaturas como Poodle, Yorkshire Terrier, Chihuahua, Pomerânia,
Pequinês, Boston Terrier, Bulldog Francês, Lhasa Apso, Cavalier King Charles
Spaniel, Bichon, Pug, West Highland White Terrier, Jack Russell Terrier e Shit-
tzu (Hayes, et al., 1994; Di Dona, 2018). Já a luxação patelar lateral ocorre com
maior frequência em cães de raças grandes, como o São Bernardo, Malamute e
Setter Irlandês (Hulse, 1981; Alam, et al., 2007).
A maioria dos casos é observada em cães com menos de três anos de idade.
A incidência de luxação patelar medial é maior em comparação com luxação
patelar lateral (Alam, et al., 2007). L’Eplatennier (2002), afirmou ser de 75% ou
mais os casos relacionados à luxação patelar medial e menos de 25%, a lateral.
Segundo Roush (1993), na luxação de patela medial, as fêmeas são mais
afetadas que os machos e 50% tem envolvimento bilateral. Segundo Priester,

12
(1972) e Alam, et al. (2007), o risco de fêmeas apresentarem a luxação patelar
é uma vez e meia ou mais que em machos.
Cães castrados apresentam cerca de 3 vezes mais chances de desenvolver
luxação patelar (Di Dona, et al., 2018). Membros pélvicos direito e esquerdo
foram encontrados quase igualmente afetados com luxação de patela (Alam, et
al., 2007).
Ruptura simultânea do ligamento cruzado cranial está presente em 15% a
20% dos joelhos de cães de meia-idade e idosos com luxação patelar crônica
(Piermattei et al., 2016).
As luxações de patela grau I e II foram as mais observadas entre todos os
tamanhos de raça (Alam, et al., 2007). No estudo de Hayes, et al., (1994), as
luxações de graus II e III foram as mais comumente observadas em todas as
categorias, raças ou portes. Segundo esses autores, é possível que cães com
graus I e eventualmente II nunca tenham sido trazidos para avaliação ou mesmo
a luxação não tenha sido detectada devido às discretas manifestações clínicas.
De acordo com Denny & Butterworth (2000), o tratamento conservativo é
indicado nos casos em que a instabilidade não está associada a qualquer
manifestação clínica ou se a claudicação é infrequente.
Diversas técnicas cirúrgicas foram descritas para estabilização da articulação
femorotibiopatelar, dentre elas: incisão e liberação medial/lateral do retináculo e
cápsula articular, imbricação medial/lateral, modificação do sulco troclear
femoral, transposição da tuberosidade tibial e osteotomia corretiva femoral e/ou
tibial (Alam, et al., 2007). A escolha da técnica depende da gravidade da lesão,
ou mesmo da preferência do cirurgião (Hayes, et al., 1994; Read, 1999).
Geralmente são realizadas combinações de técnicas para se obter melhores
resultados (Hayes, et al., 1994; Alam, et al., 2007). Independente das técnicas,
o objetivo é conseguir que a patela se posicione adequadamente no sulco
troclear e, assim, permaneça durante toda a amplitude do movimento (Read,
1999).

2. Anatomia do Joelho
A articulação do joelho (Figura 1) é do tipo composta, incongruente e em
dobradiça. Ela compreende as articulações femorotibial (entre o fêmur e a tíbia)
e femoropatelar (entre o fêmur e a patela) (König, 2002).

13
A articulação femorotibial se forma entre os côndilos do fêmur e a
extremidade proximal da tíbia. As incongruências das superfícies articulares são
corrigidas pelos meniscos articulares, que são fibrocartilagens semilunares com
uma margem periférica espessa e convexa, e uma margem central delgada e
côncava. A mobilidade dos meniscos permite um grau limitado de movimento
rotacional à articulação (König, 2002).
Os ligamentos da articulação femorotibial são: ligamentos dos meniscos e
das articulações femorotibiais. Os ligamentos dos meniscos compreendem:
ligamentos tibiais craniais dos meniscos (se estendem desde a parte cranial de
cada menisco até a área intercondilar cranial medial e lateral da tíbia); ligamentos
tibiais caudais dos meniscos (o ligamento lateral se prolonga desde o ângulo
caudal do menisco lateral até a incisura poplítea da tíbia. O ligamento medial se
prolonga desde o ângulo caudal do menisco medial até a área intercondilar da
tíbia); ligamento meniscofemoral (passa do ângulo caudal do menisco lateral
para o interior do côndilo femoral medial); ligamento transverso do joelho
(conecta os ângulos craniais dos dois meniscos) (König, 2002).
Os ligamentos femorotibiais compreendem: ligamentos colaterais lateral
(emerge do epicôndilo lateral do fêmur e termina com um ramo no côndilo lateral
da tíbia e com um ramo mais forte na cabeça da fíbula) e medial (se prolonga
entre o epicôndilo medial do fêmur e uma área rugosa distal à margem do côndilo
medial da tíbia, ele se funde com a cápsula articular e o menisco medial);
ligamentos cruzados do joelho cranial e caudal ( se situam na fossa intercondilar
do fêmur entre as duas bolsas sinoviais das articulações femorotibiais. O
ligamento cruzado cranial emerge da área intercondilar do côndilo femoral
lateral, seguindo craniodistalmente e se insere na área intercondilar central da
tíbia. O ligamento cruzado caudal se fixa à área intercondilar do côndilo femoral
medial, se orienta caudodistalmente e termina na incisura poplítea da tíbia);
ligamento poplíteo oblíquo (são filamentos fibrosos embutidos na cápsula
articular seguindo uma orientação lateroproximal a mediodistal). As cavidades
das articulações femorotibiais também incluem os ossos sesamóides (König,
2002).
A articulação femoropatelar é formada pela face articular da patela e do
fêmur, sendo classificada como uma articulação em deslize (troclear). Os
ligamentos desta articulação são: retináculos patelares (filamentos de tecido

14
conjuntivo destacados da fáscia regional entre o tendão do músculo quadríceps,
a patela, os côndilos femorais e a tróclea da tíbia); ligamentos femoropatelares
laterais e mediais (faixas de fibras soltas parcialmente unidas aos retináculos
sobrejacentes); ligamento patelar (une a patela à tuberosidade da tíbia) (König,
2002).

Figura 1 - Representação esquemática da articulação do joelho do cão (aspecto


caudolateral). Fonte: König & Liebich, 2002.

A patela é um osso sesamóide e está envolta pelo tendão do músculo


quadríceps. Sua superfície articular interna com a tróclea é lisa e curvada. Se
apresenta como um componente essencial do mecanismo funcional do aparelho
extensor, mantendo uma tensão uniforme durante a extensão do joelho e agindo
como um sustentáculo, em um braço de alavanca, aumentando o benefício
mecânico do grupo muscular do quadríceps (Fossum, 2006).
A tuberosidade da tíbia está localizada cranial e distal aos côndilos tibiais.
Sua localização e proeminência são importantes para o benefício mecânico do
mecanismo extensor (Fossum, 2006).
O grupo muscular do quadríceps, a patela, o sulco troclear, o ligamento
patelar e a tuberosidade da tíbia compõem o mecanismo extensor da articulação
do joelho (Figura 2). Se houver mau alinhamento de uma ou mais dessas
estruturas pode ocorrer a luxação da patela (Fossum, 2006).

15
O grupo muscular do quadríceps é formado pelos músculos reto femoral,
vasto lateral, vasto intermédio e vasto medial (Fossum, 2006) (Figuras 3 e 4). O
músculo vasto lateral origina-se craniolateralmente, na extremidade proximal do
fêmur, inserindo-se no tendão do músculo reto femoral e na superfície cranial da
patela. O músculo vasto medial começa craniomedialmente na superfície medial
do fêmur, e os seus tendões de inserção unem-se proximalmente à patela e no
tendão do músculo reto femoral (König, 2002).
Os músculos vasto medial e vasto lateral são fixados à patela pela
fibrocartilagem parapatelar medial e lateral, que por sua vez percorre as bordas
da tróclea femoral e, junto aos retináculos medial e lateral, suplementa a
estabilidade patelar. Os retináculos medial e lateral são grupos de fibras de
colágeno, que partem da fabela e se misturam às fibrocartilagens parapatelares
medial e lateral, respectivamente (Fossum, 2006).
O músculo reto femoral origina-se em duas depressões, dorsais ao
acetábulo, situando-se entre o músculo vasto lateral e medial, na superfície
cranial da coxa e insere-se como ligamento patelar intermédio na tuberosidade
da tíbia (König, 2002). O músculo quadríceps é inervado pelo nervo femoral
(Dyce, 2010). Sobre o músculo quadríceps estão localizados os músculos tensor
da fáscia lata e sartório (ambos extensores da articulação do joelho), a fáscia
lata e a fáscia medial da coxa (König, 2002).
O grupo muscular do quadríceps estende a articulação do joelho, além de
auxiliar na sua estabilização. Este músculo converge na patela, como o tendão
patelar, e então continua distalmente, como o ligamento patelar reto (Fossum,
2006).
O músculo poplíteo encontra-se no aspecto caudal da articulação do
joelho (Dyce, 2010). Origina-se na fossa poplítea do côndilo lateral do fêmur
(König, 2002). Suas fibras musculares dirigem-se para a margem medial da tíbia,
inserindo-se na linha do poplíteo (König, 2002). É um músculo flexor do joelho e
permite a pronação do membro e é inervado pelo nervo tibial (Dyce, 2010).

16
Figura 2 - Estruturas de tecido mole e esqueléticas normais associadas ao mecanismo
extensor do quadríceps. Fonte: Fossum, 2006.

Figura 3 - Representação esquemática dos músculos e esqueleto do membro pélvico


do cão (aspecto lateral). Fonte: König & Liebich, 2002.

17
Figura 4 - Representação esquemática dos músculos e esqueleto do membro pélvico
do cão (aspecto medial). Fonte: König & Liebich, 2002.

3. Luxação de Patela

3.1 Definição

Luxação é o deslocamento repentino ou duradouro, parcial ou completo de


um ou mais ossos de uma articulação. Acontece quando uma força atua direta
ou indiretamente numa articulação, deslocando o osso para uma posição
anormal (Piermattei et al., 2016).
A luxação de patela consiste na perda da relação anatômica normal entre o
sulco troclear do fêmur e a patela. Ocorre um desvio anormal desta em relação
à tróclea a partir do plano da linha média, podendo causar claudicação. Há casos
de subluxação patelar, onde a patela move-se na crista da tróclea e se
reposiciona durante a flexão, podendo ou não causar claudicação. A luxação
pode ser medial, lateral ou com menor frequência em ambas as direções
(Piermattei et al., 2016).

18
3.2 Luxação Medial de Patela

A luxação medial de patela representa de 75 a 80% dos casos em todas as


raças, sendo bilateral em 20 a 25% das vezes. Nos últimos anos, houve aumento
importante da afecção em raças grandes e gigantes, principalmente nos Akita,
Labrador, Husky, Malamute, São Bernardo e Setter Irlandês (Hulse, 1981; Alam,
et al., 2007; Piermattei et al., 2016).
Em cães de raça pequena, 98% das luxações de patela são mediais,
sendo que apenas 2% correspondem a luxações laterais. O quociente
fêmea:macho dos animais afetados é de 1,5:1. A luxação medial bilateral de
patela é comum, ocorrendo em 50 a 65% dos casos (Kowaleski, 2012).
A causa da luxação patelar é multifatorial. O mecanismo extensor do
joelho composto pelo quadríceps, tendão patelar, patela, ligamento patelar e
tuberosidade tibial devem estar numa linha reta do fêmur proximal até metade
do jarrete. O desalinhamento contribui para luxação patelar (Piermattei et al.,
2016).
Grande parte das luxações são denominadas congênitas, pois ocorrem
no início da vida e não estão associadas ao trauma. No momento do nascimento,
as deformidades anatômicas que serão responsáveis pela luxação de patela já
estão presentes. Uma dessas deformidades é a coxa vara (diminuição do ângulo
de inclinação do colo do fêmur) e uma diminuição na anteversão do colo do fêmur
(retroversão relativa), que estão associadas ao risco de luxação patelar medial
(Piermattei et al., 2016). No entanto, Bound et. al., (2009) relataram que a coxa
valga, não a coxa vara, é um fator de risco significativo para luxação medial da
patela em raças pequenas, mas não em raças grandes.
Diversas alterações anatômicas podem estar presentes no paciente com
luxação medial de patela (Figura 5), incluindo coxa vara, genu varo (postura de
pernas arqueadas com joelhos separados de forma anormal), varos distal do
fêmur (fêmur distal arqueia em direção à linha média), torção externa do fêmur
distal, sulco troclear raso/plano, varos ou valgos da tíbia proximal (tíbia arqueia
em direção à linha média ou distante da linha média respectivamente), torção
tibial interna e deslocamento medial do tubérculo tibial (Kowaleski, 2012).
Estas alterações anatômicas causam um deslocamento medial dos
músculos extensores dos membros pélvicos, principalmente do grupo

19
quadríceps, resultando em cargas anormais na fise distal do fêmur, fato que
retarda o crescimento do lado medial e provoca varos distal do fêmur e rotação
interna da tíbia (Kowaleski, 2012).
Em cães afetados, também se observaram alterações na conformação da
tíbia, porém são consideradas compensatórias. No início do desenvolvimento, a
falta de pressão direta da patela no sulco troclear leva a uma hipoplasia da
tróclea, gerando um sulco raso ou ausente, fator que contribui para a luxação
patelar (Pirmattei et al., 2016).

Figura 5 - Anormalidades esqueléticas com luxação patelar medial congênita grave.


A - Membro posterior esquerdo sem alterações, vista cranial. Observar que o quadríceps
está centralizado com o fêmur e a linha tracejada através do fêmur proximal e da tíbia
distal também atravessa a patela.
B – Deformidades típicas da luxação patelar medial. Observar a posição do quadríceps
e da patela. A linha tracejada do fêmur proximal à tíbia distal fica medial à articulação
do joelho.
A seta reta representa o mecanismo extensor corrigido após a rotação do tubérculo e a
linha do movimento patelar. O retângulo pontilhado representa a localização e o ângulo
da tróclea recém criada, para que a patela se movimente de forma adequada.
1.Coxa vara; 2. terço distal do fêmur curvado medialmente (genu varum); 3. sulco
troclear raso com crista medial pouco desenvolvida ou ausente; 4.côndilo medial
hipoplásico; articulação inclinada; 5. torção medial do tubérculo tibial, associada à
rotação medial de toda a tíbia; 6. curvatura medial da tíbia proximal; 7. rotação interna
do pé apesar da torção lateral da tíbia distal. Fonte: Piermattei et al., 2016.

20
A ruptura do ligamento cruzado cranial concomitante ocorre em 15 a 20%
dos casos crônicos de luxação de patela em cães de meia idade e idosos. Nesta
situação, o mecanismo do quadríceps não é eficaz na estabilização da
articulação, além da rotação interna da tíbia proximal, aumentando o estresse
sobre o ligamento cruzado (Piermattei et al., 2016). Além disso, deformidades
angulares e rotacionais na parte distal do fêmur e proximal da tíbia também são
hipóteses para um estresse anormal nos ligamentos colaterais e cruzado cranial.
Essas tensões associadas ao processo normal de envelhecimento
(degenerativo) podem explicar a relação entre ruptura do ligamento cruzado
cranial e luxação de patela. Não se observou relação entre os graus de luxação
patelar e ruptura do ligamento cruzado cranial (Alam, et al., 2007).
A classificação do grau de luxação e deformidade corporal (Figura 6) é
utilizada para diagnóstico e decisão da técnica cirúrgica. A classificação a seguir
foi elaborada por Putnam e adaptada por Singleton (Piermattei et al., 2016).
- Grau 1: a luxação patelar é intermitente. A patela é luxada manualmente
de forma fácil na extensão total da articulação do joelho, mas retorna à tróclea
quando é solta. Não há crepitação aparente. Quando a patela é reduzida, o
desvio da tuberosidade tibial da linha média é mínimo e a extensão-flexão do
joelho é uma linha reta, sem abdução do jarrete.
- Grau 2: A luxação ocorre com mais frequência do que no grau 1. Os
sinais de claudicação são intermitentes e leves. A patela é luxada de forma fácil,
principalmente quando a extremidade distal do membro é girada (internamente
para luxação medial e externamente para luxação lateral) enquanto a patela é
empurrada. A redução é feita com manobras opostas. A tuberosidade da tíbia
proximal pode estar girada em até 30 graus com luxações mediais e menos com
luxações laterais. Com a patela luxada medialmente, o jarrete é levemente
abduzido com os dedos apontando medialmente. Com a patela luxada
lateralmente, o jarrete pode ser aduzido com os dedos apontando lateralmente.
Grande parte dos animais com esse grau de luxação vive bem por muitos anos,
porém a constante luxação da patela sobre o bordo medial da tróclea pode
causar erosão da superfície articular da patela e da área proximal do bordo
medial. Isso resulta em crepitação aparente quando a patela é luxada de forma
manual. Esse desconforto pode levar o cão, durante a deambulação, a transferir
seu peso para os membros anteriores.

21
- Grau 3: A patela está permanentemente luxada, mas pode ser
temporariamente reposicionada com manipulação digital. Há torção da tíbia e
desvio da crista tibial entre 30 e 60 graus do plano crânio/caudal. Embora a
luxação não seja intermitente, muitos animais usam o membro com o joelho
semiflexionado. A extensão-flexão da articulação causa abdução e adução do
jarrete. A tróclea é rasa ou até mesmo achatada.
- Grau 4: a tíbia é torcida medialmente, e a crista tibial pode mostrar um
desvio adicional, resultando em 60 a 90 graus no plano crânio/caudal. A patela
é permanentemente luxada (ectópica) e não pode ser reposicionada. Ela se
localiza logo acima do côndilo medial (se a luxação for medial), e um espaço
pode ser palpado entre o ligamento patelar e a extremidade distal do fêmur. O
animal pode se mover com os membros parcialmente flexionados. A tróclea é
superficial, ausente ou convexa. Geralmente é torcida, necessitando de
condroplastia em um ângulo diferente do da região troclear original, a fim de
seguir verticalmente após a transposição do tubérculo (Piermattei et al., 2016).

Figura 6 - Posição da tíbia em relação ao fêmur e formato da tróclea femoral nos graus
1 a 4 da luxação medial da patela. A seção femoral na região do sulco troclear é
mostrada em contorno escuro e a seção tibial proximal é sombreada. Nota-se rotação
progressiva medial da tíbia e deformidade da crista troclear medial. Fonte: Piermattei et
al., 2016.

3.2.1 Diagnóstico

O diagnóstico pode ser feito através do histórico do animal. Grande parte


dos animais acometidos apresenta claudicação intermitente, com sustentação
22
do peso. Os tutores podem relatar que o cão flexiona a perna por alguns passos
de forma ocasional. Cães com luxação patelar grau 4 apresentam claudicação
grave e anormalidades na marcha (Fossum, 2006).
Pode-se identificar quatro classes de pacientes com luxação de patela:
1) Recém-nascidos e filhotes mostram sinais clínicos anormais de
sustentação dos membros pélvicos e função desde o início do caminhar.
Normalmente são luxações graus 3 e 4.
2) Animais jovens e maduros com luxações grau 2 e 3 geralmente exibiram
marcha anormal ou intermitentemente anormal durante toda a vida, mas
são trazidos ao médico veterinário quando os sintomas pioram.
3) Animais mais velhos com luxações grau 1 e 2 podem apresentar sinais
repentinos de claudicação devido a outras causas (por exemplo, ruptura
do ligamento cruzado cranial), como resultado de trauma menor ou piora
da dor devido à doença articular degenerativa.
4) Cães assintomáticos (Piermattei et al., 2016).
O grau de claudicação varia entre os animais, podendo ser intermitente ou
contínuo, geralmente leve a moderado. Cães com luxação lateral tendem a ter
maior problema de deambulação quando comparados à cães com luxação
medial. O tutor pode observar o cão esticar o membro para trás, numa tentativa
de redução da patela. Relutância em pular também pode ser vista (Piermattei et
al., 2016).
Ganho de peso, erosão da cartilagem articular, luxação patelar permanente,
ruptura do ligamento cruzado e luxação coxofemoral podem piorar os sinais
clínicos (Piermattei et al., 2016).
Para realizar o exame físico do membro, colocar o animal em decúbito lateral.
A localização da patela em animais pequenos ou em membros com severa
deformidade inicia-se na tuberosidade da tíbia, palpando proximalmente ao
longo do ligamento patelar (Piermattei et al., 2016).
Uma vez localizada, deve-se isolar a patela entre o polegar e o dedo indicador
de uma mão, enquanto a outra mão, segurando na tíbia, levanta o membro e
realiza movimentos de flexão, extensão, rotação interna e externa. De forma
simultânea, deve-se aplicar pressão manual sobre a patela em direção medial
(Figura 7) e lateral (Figura 8), permitindo identificar a direção e o grau de luxação
patelar (Kowaleski, 2012).

23
Durante o exame físico analisar os seguintes aspectos: instabilidade em
ambas direções, presença de crepitação, grau de rotação da tuberosidade da
tíbia, torção ou angulação do membro, incapacidade de reduzir a patela,
localização da patela no interior da tróclea, incapacidade de estender o membro
num ângulo normal (casos de contratura severa em filhotes), presença ou
ausência do movimento de gaveta (Piermattei et al., 2016).

Figura 7 - Para luxar a patela medialmente, o joelho é estendido e a extremidade do


membro rotacionado medialmente enquanto se empurra a patela em direção medial.
Fonte: Piermattei et al., 2016

Figura 8 - Para luxar a patela lateralmente, o joelho deve estar parcialmente flexionado
e a extremidade do membro deve ser rotacionada lateralmente enquanto se puxa a
patela em sentido lateral (Piermattei et al., 2016).

O diagnóstico por imagem também se faz importante. Nos casos de


luxação grau 3 e 4, as radiografias craniocaudais e mediolaterais mostram um
deslocamento medial da patela. Nas luxações grau 1 e 2, a patela pode estar
localizada tanto no sulco troclear como deslocada medialmente. Além disso,
estudos radiográficos completos do membro podem demonstrar deformidades
varas ou valgas e torção de tíbia e fêmur. Nos casos em que há necessidade de
osteotomia e correção de ossos longos é indicado realizar incidências especiais

24
(coronal ou axial a 30 graus do fêmur) e até mesmo tomografia computadorizada,
para melhor avaliação do grau de deformidade (Fossum, 2006).
A maioria dos cirurgiões concordam que, quando coexiste com a luxação de
patela, o varos femoral excessivo deve ser corrigido. Para quantificar a
deformidade do varo femoral é necessária uma visão craniocaudal bem
posicionada do fêmur e da tíbia proximal. Frequentemente, a deformidade
femoral pode ser identificada na vista lateral pela presença do sinal duplo do
côndilo (aparência distinta dos côndilos femorais individuais que não estão
sobrepostos). Se um côndilo femoral é projetado cranial ao outro pode indicar
uma deformidade torcional femoral. Se um côndilo femoral é projetado distal ao
outro pode indicar uma deformidade angular (varo ou valgo) femoral. A
identificação da fossa extensora presente no côndilo femoral lateral permite
diferenciar o côndilo femoral lateral do medial, permitindo assim identificar o tipo
de deformidade (Tobias & Johnston, 2017).
Numa imagem bem posicionada, as fabelas aparecem bissecadas pelos
córtices femorais, as paredes verticais do entalhe intercondilar são linhas
paralelas distintas e o trocânter menor é apenas parcialmente visível. Em um
fêmur normal, a magnitude do varo femoral é determinada pela medição do
ângulo anatômico femoral distal lateral (aLDFA) na interseção do eixo anatômico
femoral e na linha de referência da articulação distal do fêmur, utilizando o
método radiográfico descrito por Tomlinson, (2007), ou método por tomografia
computadorizada descrito por Dudley et al., (2006), ou o método tomográfico
computadorizado com reconstrução volumétrica tridimensional descrita por
Kowaleski (2006), sendo este último o método mais acurado e preciso. Em um
fêmur com varo femoral patológico, a deformidade é determinada no centro de
angulação de rotação (CORA), localizado na interseção dos eixos anatômicos
do fêmur (Tobias & Johnston, 2017).
No método radiográfico, o comprimento total do fêmur é determinado e o
centro do fêmur em 33% e 50% do seu comprimento é identificado. Uma linha é
desenhada conectando esses dois pontos. Este é o eixo anatômico do fêmur. A
linha de referência da articulação distal é uma linha que liga o aspecto mais distal
dos côndilos medial e lateral do fêmur. O aLDFA é medido na interseção do eixo
anatômico e na linha de referência da articulação distal. A comparação do aLDFA
versus um intervalo de referência específico da raça indicará se está presente

25
um varo femoral significativo. Se houver uma deformidade significativa do varo
femoral, a localização e magnitude da deformidade devem ser determinadas, o
que é feito da seguinte forma: medir o comprimento total do fêmur e identificar o
centro do fêmur em 33% e 50% do seu comprimento, desenhar uma linha
conectando esses dois pontos para determinar o eixo anatômico femoral
proximal. Neste caso, a linha não é desenhada para o nível da articulação.
Desenhar a linha de referência da articulação distal, definir o aLDFA para o valor
específico da raça e desenhar o eixo anatômico distal de forma que a linha se
estenda ao longo do aspecto lateral do entalhe intercondilar. O CORA está
localizado na interseção dos eixos anatômicos proximal e distal, e sua magnitude
pode ser medida nesse local (Figura 9). Se um valor normal específico da raça
(Figura 10) não estiver disponível, o fêmur normal oposto poderá ser medido
como referência (Tobias & Johnston, 2017). Se o membro contralateral também
se encontrar afetado o recomendado é realizar a osteotomia corretiva se o
aLDFA for superior a 100° (Kowaleski, 2012). Segundo Palmer, (2012), a
osteotomia corretiva do fêmur é recomendada quando a luxação de patela é
acompanhada de um ângulo de varos femoral >12° (aLDFA >102°). Em alguns
casos, a torção femoral externa (ângulo de anteversão reduzido) é a única
deformidade femoral identificável, sendo necessária a correção da torção
(Tobias & Johnston, 2017).

26
Figura 9 - Determinação do aLDFA e CORA. Fonte: Tobias et al., 2017.

27
Figura 10 - Valores médios dos ângulos articulares do fêmur no plano frontal relatados
na literatura. Fonte: Petazzoni, 2008.

A torção femoral pode ser quantificada a partir da vista axial do fêmur,


obtido da seguinte forma: o paciente deve ser posicionado em decúbito dorsal e
a articulação do quadril flexionada de modo que o feixe radiográfico seja
direcionado para o centro da diáfise femoral. O ângulo de torção femoral (ângulo
de anteversão) é determinado pela interseção do eixo transcondilar e de um eixo
através do centro da cabeça e pescoço do fêmur, como mostra a Figura 11. O
intervalo para o ângulo de anteversão é bastante amplo e varia entre os estudos.
O ângulo médio de anteversão relatado em um estudo foi de 27 graus (variação
de 12 a 40 graus). No caso de luxação medial da patela, se o ângulo de torção
femoral do paciente for menor ou igual a 27 graus, os autores consideram a
correção durante a osteotomia corretiva. Se for superior a 27 graus, a correção
não será realizada, pois pode exacerbar a luxação patelar medial (Tobias &
Johnston, 2017).

28
Figura 11 - Medida da torção femoral e ângulo de anteversão do colo femoral. Fonte:
Petazzoni, 2008.

Uma projeção radiográfica ventro-dorsal padrão da pelve ou vista crânio-


caudal do fêmur pode ser usada para estimar a presença e a gravidade da torção
femoral. É fundamental que o fêmur esteja paralelo à mesa de raio-x e ao
aspecto proximal do fêmur em posição cranio-caudal reta, perpendicular ao feixe
de raio-x. A torção do fêmur é avaliada comparando o aspecto distal do fêmur
com o aspecto proximal. A Figura 12 demonstra o fêmur proximal em perfeito
alinhamento crânio-caudal com o fêmur distal rotacionado em incrementos de 5
graus, externa e internamente. É importante notar crescente grau de assimetria
entre os côndilos correspondente ao crescente grau de rotação. O sentido de
rotação pode ser determinado pela discrepância de tamanho dos côndilos. Na
torção externa, o côndilo lateral é menor, enquanto na torção interna, o côndilo
medial é menor. Além disso, com o aumento da torção, parece haver uma
curvatura caudal do aspecto distal do fêmur, que é uma alteração radiográfica
posicional, que não deve ser confundida com uma deformidade angular. A
direção da torção é referida de proximal a distal e é denominada na posição da
porção distal do membro (Petazzoni, 2008).

29
Figura 12 - Graus de torção femoral interna e externa. Fonte: Petazzoni, 2008.

Modificações no fêmur distal nos planos frontal e transversal, na região


proximal da tíbia nos planos transversal e frontal e qualquer modificação na
relação entre o fêmur e a tíbia (rotação da tíbia em relação ao fêmur) e
combinações dessas variações, podem causar subluxação ou luxação da porção
distal do fêmur em relação à patela ou da patela em relação ao fêmur distal.
Sempre que a tíbia é responsável pela luxação, ocorre uma deformidade do
plano transversal (torção tibial interna ou externa – Figuras 13 e 14) ou uma
rotação da tíbia (rotação interna ou externa – Figura 15) em relação ao fêmur.
Valgos tibial proximal excessivo ou varos tibial proximal excessivo por si só não
causam luxação patelar, pois não afetam a posição da tuberosidade da tíbia no
plano frontal ou transversal. Portanto, a luxação patelar medial, quando há
alterações exclusivamente na tíbia, ocorre somente por dois motivos: rotação
interna da tíbia em relação ao fêmur ou torção externa da tíbia. Já a luxação
lateral só pode ocorrer por dois motivos: rotação externa da tíbia em relação ao
fêmur ou torção tibial interna. Deve ser realizada uma projeção caudo-cranial e
uma médio-lateral para avaliação da tíbia (Petazzoni, 2011). A torção da tíbia é
avaliada comparando o aspecto proximal da tíbia com seu aspecto distal. A tíbia
distal está em uma posição cranio-caudal reta quando o córtex medial do
calcâneo corta o meio da cóclea (Petazzoni 2008).

30
Figura 13 - Torção tibial interna e externa. Fonte: Petazzoni, 2011.

Figura 14 - Torção tibial interna e externa. Fonte: Petazzoni, 2008.

Figura 15 - Rotação tibial externa e interna. Fonte: Petazzoni, 2011.

31
3.2.2 Diagnóstico Diferencial

Como diagnóstico diferencial para luxação de patela pode-se citar:


luxação coxofemoral e ruptura do ligamento cruzado cranial. Luxação
coxofemoral ou ostectomia de cabeça e colo femoral levam à encurtamento do
membro, causando lassidão do mecanismo do quadríceps, possibilitando a
luxação de patela em alguns casos (Fossum, 2006).

3.2.3 Tratamento

Há duas opções de tratamento para luxação patelar medial: conservadora


ou cirúrgica. A escolha está baseada no histórico clínico, achados físicos,
frequência das luxações e idade do paciente. Em pacientes idosos e
assintomáticos a cirurgia não se justifica. Porém, em animais jovens ou com
claudicação a cirurgia trará benefício (Fossum, 2006).
A luxação patelar assintomática é diagnosticada durante exame físico de
rotina. Nesse caso, a cirurgia imediata não é recomendada, mas sim aconselhar
o tutor a observar sinais sutis, como esticar o membro para trás, relutância em
pular e se exercitar de forma intensa. Nesses casos, há boa resposta cirúrgica
mesmo que tardia e com consequente ruptura do ligamento cruzado. Há duas
exceções desta conduta no caso de cães assintomáticos: em filhotes jovens com
luxação patelar, é aconselhado realizar cirurgia precoce (3 a 4 meses), antes
que ocorra contratura muscular irreparável. E em cães de raça média e grandes,
recomenda-se cirurgia precoce, antes de erosão e deformidade da tróclea. Após
a ocorrência dessas mudanças as escolhas cirúrgicas são mais restritas e o
prognóstico mais reservado (Piermattei et al., 2016).
As técnicas de artroplastia para estabilização da luxação de patela se
dividem em duas classes: reconstrução de tecidos moles e reconstrução óssea.
Para escolha do melhor procedimento ou combinação destes é necessário
experiência e julgamento. Um princípio fundamental é a correção de
deformidades esqueléticas, como desvio da tuberosidade da tíbia e sulco
troclear raso, através de técnicas de reconstrução óssea. Uma das causas mais
frequentes de falha é corrigir essas deformidades esqueléticas utilizando
somente reconstrução de tecidos moles (Piermattei et al., 2016).

32
Dentre as técnicas cirúrgicas indicadas para correção da luxação de
patela temos: transposição da tuberosidade da tíbia, liberação das estruturas de
contenção mediais, reforço das estruturas de contenção laterais,
aprofundamento do sulco troclear, osteotomia femoral, osteotomia tibial, suturas
antirrotacionais e transposição da origem do reto femoral. Normalmente é
necessária combinação de técnicas para se atingir a estabilidade intraoperatória
da patela. Vale ressaltar que a anormalidade primária é biomecânica, no qual a
patela não está alinhada com o sulco troclear. Portanto, cirurgias onde é
realizado somente o aprofundamento do sulco troclear, liberação da cápsula e
da fáscia e imbricação tendem ao insucesso, pois não é feito realinhamento
permanente da patela e sulco troclear (Fossum, 2006).
Em grande parte dos animais, deve-se aprofundar o sulco troclear através
da ressecção da margem troclear ou em bloco. Pode ser necessária a liberação
do retináculo medial a fim de estabilizar a patela no sulco troclear aprofundado.
A transposição da crista da tíbia deve ser feita para realinhar as forças
mecânicas do mecanismo extensor do joelho. Após a estabilização da patela, o
retináculo lateral deve ser reforçado através de suturas, e a imbricação da
cápsula articular fibrosa, pela inserção de enxerto de fáscia lata da fabela para
a fibrocartilagem parapatelar, ou pela excisão do retináculo excedente (Fossum,
2006).
Em pacientes com graves deformidades esqueléticas deve-se realizar
osteotomia do fêmur. As deformidades mais comumente observadas são
arqueamento varo do fêmur distal e torção medial da tíbia proximal. O objetivo
desta cirurgia é realinhar a articulação do joelho em plano frontal, onde o eixo
transversal dos côndilos femorais é perpendicular ao eixo longitudinal da diáfise
femoral. Outras técnicas, como aprofundamento do sulco troclear, liberação das
estruturas de contenção mediais, transposição da crista da tíbia e reforço das
estruturas de contenção laterais, são necessárias para sucesso cirúrgico
(Fossum, 2006).

33
3.3 Luxação Medial de Patela Traumática

A luxação traumática de patela ocorre ocasionalmente quando é diferido


um golpe sobre as estruturas retinaculares. O mais comum é o trauma acontecer
na face lateral da articulação do joelho provocando luxação medial de patela
(Harasen, 2006).
É uma lesão rara e todas as raças estão sujeitas, porém é mais comum
em gatos. Fatores como pequenas alterações esqueléticas e instabilidade
patelar leve podem predispor ao problema. A luxação traumática de quadril e
fraturas de tíbia em cães jovens podem vir acompanhada de luxação patelar. Há
casos iatrogênicos, como complicação após falha no fechamento adequado da
fáscia lata durante reparo de fratura em fêmur distal (Piermattei et al., 2016).
Segundo Bitar, (2011), a luxação aguda da patela representa 2% a 3%
das lesões do joelho, sendo a segunda causa mais comum de hemartrose
traumática do joelho.

3.3.1 Sinais Clínicos

Os sinais clínicos se assemelham à luxação grau 1, com adição de sinais


de inflamação aguda. O animal apresenta dor intensa, sendo necessária
anestesia ou sedação para palpação. O membro se apresenta em flexão e
rotacionado internamente. É evidente a presença de efusão articular e aumento
de volume dos tecidos moles adjacentes. É indicado realizar exame radiográfico
a fim de observar presença de luxação de quadril, fratura da patela e avulsão ou
ruptura do ligamento patelar (Piermattei et al., 2016).

3.3.2 Tratamento

Se após a redução a patela estiver estável, é indicado realizar


imobilização fechada utilizando bandagem. Se a patela se mostrar instável ou se
a luxação repete após a imobilização, deve-se realizar tratamento cirúrgico,
sendo as técnicas de sobreposição da fáscia lata e sutura patelar lateral as mais
indicadas (Piermattei et al., 2016).

34
3.4 Luxação Lateral em Jovens de Raças Grandes e Gigantes

A luxação lateral da patela acomete normalmente cães de raças grandes


e gigantes, mas pode acometer, de forma ocasional, raças pequenas.
Componentes da displasia de quadril, como coxa valga (aumento do ângulo de
inclinação do colo do fêmur) e aumento da anteversão do colo do fêmur, estão
relacionados à luxação lateral de patela, por causarem rotação interna do fêmur
com torção lateral e deformidade em valgo do fêmur distal, deslocando o
mecanismo do quadríceps e patela lateralmente. Por isso, ocorre carga anormal
no côndilo femoral durante o desenvolvimento, levando a crescimento retardado
ao longo do aspecto lateral do côndilo femoral enquanto o aspecto medial cresce
normalmente (Figura 16). O resultado é valgo femoral distal e hipoplasia condilar
lateral (Piermattei et al., 2016).

Figura 16 - A. Filhote de cão Great dane com valgo genuíno. Observar os quadris largos,
joelhos estreitos e jarretes, com os dedos apontando para fora. B. Fêmur e tíbia de um
Dinamarquês mostrando angulação em valgo e torção dos côndilos femorais.
Fonte:Piermattei et al., 2016.

3.4.1 Sinais Clínicos

Os animais são afetados ao completarem 5 a 6 meses de idade, sendo o


envolvimento bilateral o mais comum. O sinal mais notável é uma postura de

35
“bater os joelhos”. Normalmente é possível reduzir a patela e pode haver
frouxidão do ligamento colateral medial. É frequente encontrar os tecidos
retinaculares mediais da articulação do joelho espessados, e muitas vezes a
extremidade distal do membro está rotacionada lateralmente (Piermattei et al.,
2016).

3.4.2 Tratamento

Se houver luxação lateral da patela sem deformidade acentuada do fêmur as


seguintes técnicas podem ser utilizadas: trocleoplastia, transposição do
tubérculo tibial, sobreposição do retináculo medial, incisão periosteal e desgaste
para estimular crescimento no aspecto lateral (côncavo) da placa fisária. Se o
membro apresentar acentuada deformidade em valgo do fêmur é indicado
osteotomia corretiva do fêmur (Piermattei et al., 2016).

4. Técnicas Cirúrgicas para Correção da Luxação de Patela

4.1 Desmotomia e Capsulectomia Parcial

São procedimentos utilizados em combinação com demais técnicas. A


desmotomia é a liberação simples do retináculo lateral ou medial no lado em que
a patela é luxada. Normalmente, a patela desliza proximal e distalmente, de
forma paralela à tróclea. Com a contratura da cápsula articular, a patela segue
de forma oblíqua a esse plano. A desmotomia elimina esse movimento oblíquo.
A incisão inicia-se no platô tibial e continua de forma proximal através das duas
camadas da cápsula articular e dos tecidos retinaculares proximais, o suficiente
para aliviar a tensão por toda a patela (Figura 17). Normalmente essa incisão é
deixada aberta para que a tensão não se desenvolva novamente. A sinóvia será
responsável por selar a articulação e impedir o extravasamento do liquido
sinovial (Piermattei et al., 2016).

36
Figura 17 - Técnica cirúrgica de desmotomia medial. Fonte: Piermattei et al., 2016.

Capsulectomia parcial é a remoção de um pedaço elíptico da cápsula articular


e retináculo no lado oposto à direção da luxação patelar. A sutura das bordas
resulta em imbricação ou aperto da cápsula articular (Piermattei et al., 2016).

4.2 Liberação do Quadríceps

Em luxações graus 3 e 4 o desalinhamento observado no quadríceps leva a


deslocamento da patela após a redução da luxação. Por isso, nessas situações,
o músculo quadríceps deve ser dissecado livremente até o nível médio-femoral.
São feitas incisões parapatelares bilaterais através da cápsula articular e do
retináculo, continuando proximalmente ao longo das bordas dos grupos
musculares do quadríceps. Lateralmente, é feita a separação entre os músculos
vasto lateral e bíceps. Medialmente, é feito entre o vasto medial e sartório caudal.
Todo o quadríceps é elevado a partir do fêmur, liberando a inserção da cápsula
articular proximal à tróclea. As incisões realizadas nas fáscias superficiais são
suturadas após reconstrução (Piermattei et al., 2016).

4.3 Sobreposição do Retináculo Lateral ou Medial

Esse procedimento pode ser utilizado no lado lateral para luxação medial ou
no lado medial para luxação lateral. A fáscia retinacular e a cápsula articular são
incisadas de 3 a 5 mm, paralelas à patela, se estendendo pela tíbia proximal de
1 a 2 cm acima da patela. Uma incisão na fáscia lata continua até o nível médio

37
do fêmur. Utilizando fio de sutura não absorvível 2-0 ou 3-0 e padrão U
horizontal, a borda cortada da fáscia anexada à patela é suturada sob a fáscia
mais lateral. As camadas superficiais da fáscia e da cápsula são suturadas à
fáscia que permanece ligada à patela. Realiza-se sutura contínua em todo o
comprimento da incisão da fáscia (Figura 18). Essa técnica pode ser combinada
com técnicas de sutura antirotacional da patela e da tíbia. Procedimento
semelhante é realizado no lado medial nos casos de luxação lateral. A incisão
fascial é feita entre a parte ventral caudal do músculo sartório e do músculo vasto
medial e a parte ventral cranial do músculo sartório (Piermattei et al., 2016).

Figura 18 - Técnica cirúrgica de sobreposição do retináculo lateral. Fonte: Piermattei et


al., 2016.

4.4 Sobreposição da Fáscia Lata

Essa técnica é aplicável apenas em luxações mediais e, quando utilizada de


forma isolada, é indicada somente em casos de luxação patelar grau 1. Pode ser
combinada com suturas antirotacionais patelares e tibiais. Os tecidos
subcutâneos são afastados para expor o retináculo lateral e a fáscia lata no ponto
médio do fêmur. A fáscia lata é incisada em sua junção com o músculo bíceps
femoral desde o nível da patela proximalmente o mais afastado possível. Distal
à patela, a incisão é paralela ao ligamento patelar sobre o tendão extensor digital

38
longo. A fáscia lata proximal à patela é elevada cranialmente e sem corte do
músculo vasto lateral subjacente até a aponeurose entre os músculos vasto
lateral e reto femoral. Suturas não absorvíveis de tamanho 2-0 e 3-0 são feitas
entre a borda cranial do músculo bíceps e a aponeurose exposta. A primeira
sutura é feita no tendão patelar na extremidade proximal da patela, com mais
três ou quatro suturas posicionadas proximalmente. Se a patela ainda continuar
luxando, mais uma ou duas suturas devem ser posicionadas próximo à patela
para apertar mais o músculo bíceps. Suturas distais são posicionadas no
ligamento patelar. A fáscia lata craniana é puxada caudalmente sobre a
superfície do músculo bíceps e suturada no lugar com padrão simples e Lembert
(Figura 19) (Piermattei et al., 2016).

Figura 19 - Técnica cirúrgica de sobreposição da fáscia lata. Fonte: Piermattei et al.,


2016).

4.5 Sutura Anti-rotacional Patelar e Tibial

Essa técnica cria um ligamento patelar lateral sintético ao ancorar a fabela


lateral em direção à patela com sutura não absorvível. Pode-se evitar também a
rotação tibial medial utilizando outra sutura, que passa da fabela lateral para o
tubérculo tibial ou ligamento patelar distal. As duas suturas também podem ser
combinadas. Para luxações laterais de patela, suturas ao redor da fabela medial
são colocadas de forma semelhante. Essa técnica é frequentemente usada em

39
conjunto com a trocleoplastia em cães idosos com luxação grau 2 e pode ser
utilizada como tratamento primário em neonatos a partir de 5 dias (Piermattei et
al., 2016).
A fabela é o centro do arco de rotação da patela. Dessa forma, a sutura
permanece relativamente tensa durante a flexão e a extensão do joelho.
Ajustando o ponto de inserção no ligamento patelar distal ou tubérculo tibial, o
cirurgião pode ajustar a tensão da sutura no grau de flexão, em que existe maior
rotação medial. Em muitos casos, principalmente em cães, cuja luxação
apareceu em idade avançada, o tubérculo tibial não é verdadeiramente
deslocado ou girado em relação ao restante da tíbia e membro (graus 1 e 2).
Nesta situação, o cirurgião irá notar que quando a patela luxa medialmente toda
a tíbia gira internamente. Esse fenômeno é notável nas luxações laterais, quando
a tíbia gira externamente. A prevenção da rotação tibial irá reduzir a tendência
da patela luxar. Há grandes chances dessas suturas se romperem ou soltarem,
porém o tecido fibroso formado ao redor da sutura, além do realinhamento dos
tecidos moles, será capaz de manter a nova posição da tíbia ou patela
(Piermattei et al., 2016).
A fáscia lata é incisada ao longo da borda cranial do bíceps para permitir sua
retração caudal. Um fio de sutura 2-0 a 0 para raças pequenas, 0 a 2 para raças
grandes é passado numa agulha de sutura uterina de Martin. A agulha passa ao
redor da fabela na direção distal para proximal ou cranial para caudal com mais
facilidade, sendo fixada ao redor da patela numa semi bolsa através do tendão
do quadríceps de lateral para medial, na extremidade proximal da patela. A
sutura é então passada distalmente ao longo da borda medial da patela e
lateralmente ao longo da extremidade distal da patela (Figura 20) (Piermattei et
al., 2016).
A sutura anti rotacional da tíbia é colocada ao redor da fabela medial ou
lateral. A sutura pode ser fixada ao ligamento patelar distal ou através de um
orifício na tuberosidade da tíbia. O membro é posicionado em vários graus de
flexão para encontrar o ângulo de rotação tibial máxima. Então, o material de
sutura é cerrado com força suficiente para impedir a rotação da tíbia. Além disso,
pode-se combinar com técnicas de sobreposição retinacular lateral ou medial ou
sobreposição da fáscia lata (Piermattei et al., 2016).

40
Figura 20 - Técnica cirúrgica de sutura anti-rotacional patelar e tibial. Fonte: Piermattei
et al., 2016.

4.6 Trocleoplastia

Técnica que aprofunda uma tróclea rasa, ausente ou convexa. Há várias


técnicas descritas, com diferentes graus de lesão na cartilagem articular. A
ruptura da cartilagem articular deve ser limitada, principalmente em cães maiores
(Piermattei et al., 2016).
Cães e gatos de pequeno porte aceitam muito bem esses procedimentos,
embora o retorno à função total possa demorar um pouco. Trócleas planas ou
convexas geralmente acompanham um fêmur distal torcido. Com a luxação
medial, a área da crista medial é torcida caudalmente, causando falha adicional
na altura da crista. A região do sulco troclear é oblíqua ao mecanismo extensor.
Todas essas alterações, na maioria dos casos, podem ser superadas pela
trocleoplastia, porém, principalmente em cães de raças grandes e gigantes pode

41
ser necessário osteotomia angular para obter aumento da crista medial a fim de
alcançar a estabilidade patelar (Piermattei et al., 2016).
Para avaliar se a profundidade troclear é suficiente, a patela deve ser
reduzida, devendo haver um “travamento”, especialmente no nível da tróclea em
que a luxação ocorreu. Se não for esse o caso, é realizado um aprofundamento
mais agressivo (Piermattei et al., 2016).

4.6.1 Condroplastia Troclear

Essa técnica é utilizada apenas em filhotes de até 10 meses de idade. À


medida que o animal amadurece, a cartilagem se torna mais fina e aderida ao
osso subcondral, dificultando a dissecção do retalho. Um retalho de cartilagem
é elevado a partir do sulco, o osso subcondral é removido por baixo e o retalho
pressionado de volta no sulco mais profundo (Figura 21). O processo pode ser
repetido caso o sulco não fique profundo o suficiente. Isso resulta em uma tróclea
mais profunda, com manutenção da cartilagem articular no sulco e com
fibrocartilagem ou tecido fibroso nas lacunas incisionais (Piermattei et al., 2016).

Figura 21 - Técnica cirúrgica de condroplastia troclear. Fonte: Piermattei et al.,2016.

42
4.6.2 Sulcoplastia de Ressecção em Cunha

Essa técnica aumenta a profundidade do sulco troclear, contendo a patela


e mantendo a integridade da articulação patelofemoral (Fossum, 2006).
Esse método é utilizado em animais maduros. Uma cunha em formato de V,
incluindo o sulco, é removida da tróclea com uma serra. O defeito resultante na
tróclea é ampliado por outro corte de serra, em uma borda para remover um
segundo fragmento de osso. Quando a cunha óssea original é substituída, ela é
recuada para o defeito, criando um novo sulco composto de cartilagem hialina
(Figura 22). Os lados do defeito ficam alinhados com fibrocartilagem (Piermattei
et al., 2016).

Figura 22 - Técnica cirúrgica sulcoplastia de ressecção em cunha. Fonte: Piermattei et


al., 2016.

4.6.3 Ressecção do Bloco Troclear

Diferente da sulcoplastia de ressecção em cunha, os lados do fragmento são


removidos de forma paralela, permitindo maior aprofundamento proximal da
tróclea. São feitas duas incisões paralelas na cartilagem e no osso ao longo da
parte mais larga das cristais trocleares do topo da tróclea até quase a origem do
ligamento cruzado caudal. Um osteótomo largo é usado para fazer o corte acima
da origem do ligamento cruzado caudal, conectando os cortes feitos
anteriormente, de forma inclinada em direção ao aspecto proximal da tróclea. O

43
bloco é removido e então o osso trabecular é removido do fêmur para formar um
recesso para o bloco, que é pressionado de volta à área rebaixada do fêmur
(Figura 23) (Piermattei et al., 2016).

Figura 23 - Técnica cirúrgica de ressecção do bloco troclear. Fonte: Piermattei et al.,


2016.

4.6.4 Sulcoplastia Troclear

A cartilagem articular é removida até o nível do osso subcondral, utilizando


técnica de curetagem, criando um sulco suficiente para impedir a luxação de
patela (Figura 24). A fibroplasia resultará em um sulco revestido com
fibrocartilagem, um substituto aceitável da cartilagem hialina, em áreas que não
suportam peso. A largura desse novo sulco deve acomodar a largura da patela,
o que pode ser conseguido ao raspar a superfície convexa de forma
perpendicular utilizando osteótomo ou grosa (Piermattei et al., 2016).

44
Figura 24 - Técnica cirúrgica de sulcoplastia troclear. Fonte: Piermattei et al., 2016.

4.7 Transposição da Tuberosidade Tibial

Quando há desvio da tuberosidade tibial, a realocação para uma posição


mais cranial auxilia na estabilidade patelar. É feita incisão medial na pele para
luxações laterais ou mediais, seguida de artrotomia lateral ou medial, para
luxações mediais e laterais respectivamente, com ou sem capsulectomia. É feita
uma incisão no periósteo medialmente ao longo da tuberosidade e crista da tíbia.
O osteótomo a ser utilizado para realizar a osteotomia da tuberosidade deve ser
tão largo quanto a tuberosidade, a fim de evitar sua divisão. O osso é cortado
começando de 3 a 4mm proximal à inserção do ligamento patelar, evitando a
torção do osteótomo (manter o lado plano paralelo ao tendão patelar). A fixação
do tibial cranial não é destacada da face lateral da tuberosidade e da crista, para
preservação do suprimento sanguíneo. O periósteo e a fáscia distal à osteotomia
da tuberosidade são incisados, permitindo que toda a tuberosidade se mova
lateral e distalmente. Depois da crista da tuberosidade ser solta medial e
distalmente, é deslocada lateralmente enquanto o músculo tibial cranial é
dissecado da face lateral da tíbia. Os tecidos moles não são removidos da face
lateral da crista da tuberosidade osteotomizada. Um entalhe triangular é feito 5
a 8mm distal da extremidade proximal da osteotomia. Em cães grandes com

45
patela alta, o entalhe deve ser movido mais distalmente (1 a 1,5 cm) para puxar
a patela distalmente para um sulco troclear mais competente e profundo. Se a
tuberosidade é extremamente desviada, esse entalhe é colocado mais caudal e
lateral na tíbia (Piermattei et al., 2016).
Para realocar a tuberosidade, o joelho é hiperextendido para relaxar o
mecanismo extensor, e a parte superior da tuberosidade é colocada no entalhe
e mantida firmemente, enquanto perfura com fios de Kischner de 9 a 16mm,
dependendo do tamanho do animal. O fio é conduzido através da parte mais
espessa da tuberosidade em direção proximal e caudomedial. O fio deve
envolver o córtex tibial oposto para evitar migração e não deve penetrar nas
superfícies articulares. A tuberosidade agora foi transposta distalmente
(apertando assim o ligamento patelar), de modo que o lado plano da
tuberosidade fique nivelado com o lado da tíbia. O realinhamento é verificado e,
se satisfatório, o fio é cortado de 2 a 3 mm a partir da tuberosidade. Dois fios
devem ser colocados em todos os cães (um proximal e outro distal), como mostra
a Figura 25 (Piermattei et al., 2016).
A síntese se inicia suturando a fáscia externa do tibial cranial até a região do
periósteo no aspecto medial da tíbia. A articulação lateral é suturada e a patela
é verificada quanto à estabilidade. Se ainda estiver instável, o sulco precisa ser
aprofundado ou a tuberosidade mais rotacionada (Piermattei et al., 2016).

Figura 25 - Técnica cirúrgica de transposição da tuberosidade tibial. Fonte: Piermattei


et al., 2016.

46
5. Osteotomia Corretiva Associada a Deformidades Femorais

Diversas técnicas para osteotomia corretiva da extremidade distal do


fêmur foram descritas, dentre elas ostectomia em cunha de fechamento lateral,
osteotomia em cunha de abertura medial, osteotomia detorsional para tratar a
torção femoral isolada e osteotomia radial. A fixação por placa é o método de
fixação preferido. A cunha de fechamento lateral é biomecanicamente mais
estável quando comparada à cunha de abertura, e o acesso ao eixo femoral pelo
aspecto lateral fornece ampla exposição (Tobias & Johnston, 2017).
É realizada uma abordagem lateral da articulação do fêmur e do joelho,
com elevação cuidadosa da cápsula articular do côndilo femoral lateral na área
de aplicação da placa óssea. Um jig de osteotomia de nivelamento do platô tibial
(TPLO) (Figura 26) ou semelhante deve ser aplicado no aspecto cranial do
fêmur, com o pino distal imediatamente proximal à cartilagem do sulco troclear e
também com o pino proximal no espaço da placa óssea, para facilitar o
alinhamento e a redução dos segmentos femorais após a osteotomia. Se não
houver torção femoral, os pinos do jig são colocados paralelos ao plano sagital
do fêmur. Se houver uma anormalidade torcional do fêmur, os pinos do jig são
aplicados aproximadamente paralelos ao plano sagital do fêmur proximal. A
estrutura do jig é colocada medialmente. A osteotomia femoral é planejada para
garantir que o segmento femoral seja grande o suficiente para acomodar pelo
menos três parafusos da placa sem interferir na articulação do joelho ou na
patela. Podem ser usadas placas de compressão dinâmica com contato limitado,
placa de compressão bloqueada ou placa de osteotomia femoral distal com
formato anatômico. As linhas de osteotomia propostas são marcadas no osso
com uma serra oscilante (Tobias & Johnston, 2017).
Quando o fêmur é isolado pela elevação dos músculos adjacentes, uma gaze
umedecida com solução salina é colocada entre os músculos e a haste femoral,
as ostectomias são concluídas e os segmentos femorais proximal e distal são
reduzidos. A correção da torsão é realizada dobrando o pino distal do jig com um
alicate. O ângulo pode ser medido com um goniômetro para confirmar que a
correção foi realizada de forma adequada. Fios de Kirschner são colocados
temporariamente para manter a redução. Um grampo ósseo Verbrugge ou pinça
de redução pontiaguda aplicada aos pinos do jig podem ser usados para

47
comprimir a osteotomia, ou fio de cerclagem colocado em figura de oito ao redor
dos pinos do jig e apertado com uma torção para criar compressão. A placa é
colocada na parte lateral do fêmur, garantindo que não interfira com a função
articular ou patelar. Os parafusos distais podem ser angulados caudalmente no
fêmur para que não interfiram em nenhuma trocleoplastia. Em muitos casos é
preferível colocar o penúltimo parafuso como monocortical, deixando o último
orifício aberto até execução da trocleoplastia. Em seguida, é substituído por
parafuso bicortical e o parafuso restante é colocado (Tobias & Johnston, 2017).

Figura 26 - JIG. Fonte: disponível em


http://synthes.vo.llnwd.net/o16/LLNWMB8/US%20Mobile/Synthes%20North%20Americ
a/Product%20Support%20Materials/Technique%20Guides/SUTGMiniTPLOJ10959B.p
df

6. Osteotomia Corretiva Associada a Deformidades Tibiais

A correção da deformidade complexa tibial incluindo eTPA (ângulo de platô


tibial excessivo), varos tibial proximal e valgos tibial proximal com ou sem torção
tibial e/ou medialização da tuberosidade da tíbia é melhor com uma TPLO e
ostectomia proximal da tíbia. A ostectomia pode ser uma cunha fechada medial
para corrigir valgos, uma cunha fechada lateral para corrigir varos, uma cunha
fechada cranial para corrigir eTPA, ou uma cunha fechada cuneiforme para
corrigir ambos, eTPA e deformidade angular. A torção tibial pode ser corrigida
na osteotomia da tíbia proximal. A fixação é a mesma que para uma TPLO com
osteotomia proximal da tíbia (Tobias & Johnston, 2017).

48
A técnica de 4Ts (Tibial Tuberosity Transposition Tool) recomenda que a
osteotomia da crista tibial seja apenas parcial, portanto o osso e periósteo da
extremidade distal da crista tibial ficarão íntegros. A crista tibial sofre uma rotação
no plano frontal e depois é fixada com um pino na sua nova posição. Esta técnica
melhora significativamente a estabilidade da crista e reduz o tempo cirúrgico
(Petazzoni, 2015).
Essa técnica só é indicada nos casos em que a torção interna ou externa da
tuberosidade tibial seja de, no máximo, 20º. Nos casos em que o ângulo de
torção tibial seja superior a 20º é indicado realizar osteotomia da tíbia proximal
como técnica cirúrgica corretiva (Petazzoni, 2015).
A técnica é realizada da seguinte forma: o paciente é posicionado em
decúbito dorsal. Realiza-se incisão cutânea craniomedial, iniciando-se ao nível
da patela e terminando ao nível da porção mais distal da crista tibial. O periósteo
é incidido ao longo da face medial da tuberosidade e crista tibial. Utiliza-se serra
oscilante fina para a osteotomia da tuberosidade e crista tibiais. No caso de
transposição medial da tuberosidade tibial, a osteotomia no córtex lateral vai
estender-se por 80% do comprimento total da crista tibial, numa orientação
proximal para distal. Do lado medial, a cortical é osteotomizada apenas em cerca
de 60% do comprimento total da crista tibial. No plano sagital, a crista tibial
osteotomizada deverá manter uma largura de cerca de 30% da largura total da
tíbia, como mostra a Figura 27 (Petazzoni, 2015).

Figura 27 - técnica de osteotomia parcial para luxação medial de patela. Fonte:


Petazzoni, 2015.

Em seguida, o dispositivo TTTT deve ser colocado. Ele é composto por uma
barra rosqueada, uma bucha deslizante, uma pá central, duas rótulas e duas
porcas, como mostra a Figura 28 (Petazzoni, 2015).
49
Figura 28 - Dispositivo TTTT. Fonte: Petazzoni, 2015.

Primeiramente, deve-se introduzir dois pinos convergentes no plano sagital


da tíbia proximal (direção cranial para caudal). Os pinos podem ser roscados ou
lisos e devem ser introduzidos ao mesmo nível da tuberosidade tibial, lateral e
medialmente a esta. O ângulo composto pelos dois pinos no plano transverso
deve ser aproximadamente 70°. A orientação dos pinos deverá ser crânio-caudal
e próximo-distal, mantendo no plano sagital uma inclinação semelhante à
inclinação do platô tibial. Em seguida, uma barra roscada horizontal é conectada
e segura os dois pinos através de duas rótulas. A barra roscada deve ficar
paralela ao plano frontal da osteotomia, como mostra a Figura 29. Após ajustar
o comprimento e ângulo da pá central deslizante, a porca deve ser girada de
forma a empurrar a peça sulcada central. A velocidade de giro da porca deve ser
de uma volta por minuto (0.7mm por minuto). Para avaliar o correto alinhamento
patelar, deve-se efetuar flexão e extensão do joelho, como também rotação
interna e externa da tíbia (Petazzoni, 2015).

50
Figura 29 - Colocação do dispositivo TTTT. Fonte: Petazzoni, 2015.

Logo após, deve-se introduzir um pino (liso ou roscado) entre o bordo


interno da cortical da tíbia osteotomizada e o bordo externo da cortical da
tuberosidade tibial (Figura 30). O pino será responsável por manter a crista e
tuberosidade tibial no seu novo sítio até que se complete a cicatrização óssea.
A extremidade caudal do pino deve tocar na cortical caudal da tíbia, mas não
deve perfurá-la completamente. O dispositivo é então retirado. Por fim, o pino
deve ser cortado caudal à superfície cranial da tuberosidade tibial, a fim de evitar
que a sua extremidade sobressaia em relação à tuberosidade e cause lesão em
tecidos moles (Petazzoni, 2015).

Figura 30 - Colocação do pino (seta) para manutenção da crista e tuberosidade tibial.


Fonte: Petazzoni, 2015.

7. Cuidados Pós-operatórios

Geralmente é colocada uma bandagem acolchoada macia por alguns dias


para reduzir o inchaço, diminuir a dor e prevenir o autotrauma da incisão. A
atividade deve ser restrita por 6 a 8 semanas. Inicialmente os exercícios devem
51
ser limitados a caminhadas curtas e lentas com guia; exercícios de reabilitação
física, incluindo amplitude de movimento, exercícios de força, postura e
flexibilidade podem acelerar a recuperação e prevenir a perda da massa
muscular. Radiografias devem ser realizadas em 6 a 8 semanas para avaliar a
consolidação óssea (Di Donna, et al., 2018).
Uma vez consolidada, o animal pode então retornar gradualmente à atividade
normal. Analgesia pós-operatória é geralmente fornecida usando AINEs;
opióides são usados somente quando necessário (Di Donna, et al., 2018).

8. Prognóstico

Segundo Arthurs, (2006), a recidiva da luxação patelar e problemas


relacionados com o implante são as complicações mais frequentes. Fratura da
tuberosidade da tíbia, fratura da tíbia/fíbula e artrite séptica foram recentemente
relatados como potenciais complicações.
Foi relatado recidiva da luxação posterior à cirurgia em até 50% dos casos,
sendo que a maior parte é de luxações grau I, que não afetam a função clínica.
A maior parte desses pacientes com luxação recidivante apresenta uma nova
luxação apenas nas avaliações físicas, utilizando força manual para deslocar a
patela. A correlação da nova luxação com o método ou os métodos de correção
cirúrgica não foi relatada (Fossum, 2006).
Segundo Di Donna, (2018), a luxação grau II em cães da raça Pomerânia
teve um bom resultado com uma taxa de sucesso de 100% após cirurgia; cães
com luxação grau III apresentaram recidiva da luxação patelar em cerca de 11%
dos casos; enquanto cães com luxação grau IV apresentaram recidiva da
luxação patelar em 36% dos cães submetidos à cirurgia, por conta dos variados
graus de deformidades esqueléticas.

9. Relato de Caso

No dia 19 de agosto de 2020, durante realização de estágio na Clínica


Veterinária Dr. Eloy Curuci & Equipe, foi realizada cirurgia para correção de
luxação de patela. O animal era da espécie canina, raça Spitz Alemão, com peso
52
de 8,25 kg e 2 anos de idade. Apresentava histórico de claudicação leve do
membro pélvico esquerdo, intermitente, com início há 1 mês. Ao exame
ortopédico, constituído de anamnese, avaliação da locomoção, exame físico
geral e exame ortopédico, foi diagnosticado com luxação de patela medial grau
3, ou seja, a patela estava permanentemente luxada, porém ainda era possível
reposicioná-la manualmente de forma temporária. O animal não apresentava dor
à manipulação. Os testes de compressão tibial e de gaveta foram negativos,
portanto não havia ruptura de ligamento cruzado cranial concomitante. Como
exames pré-anestésicos foram solicitados: hemograma, função renal, função
hepática, eletrocardiograma, ecocardiograma, tempo de coagulação e pesquisa
de hemoparasitas. Todos os exames estavam dentro da normalidade, sendo o
animal apto à intervenção cirúrgica.

9.1 Planejamento Cirúrgico

Após sedação do animal, foi realizado exame radiográfico para


planejamento cirúrgico. Radiografias craniocaudal (Figura 31) e mediolateral
(Figura 32) do fêmur foram obtidas para identificar varus femoral distal e torção
femoral respectivamente.

Figura 31 - Radiografia pré-operatória, projeção craniocaudal do fêmur esquerdo. Fonte:


cedida por Eloy Curuci.

53
Figura 32 - Radiografia pré-operatória, projeção mediolateral do fêmur esquerdo. Fonte:
cedida por Eloy Curuci.

Identificou-se presença de varus femoral e a técnica cirúrgica escolhida


para correção foi osteotomia femoral lateral distal em cunha de fechamento.
Portanto, foi calculado o CORA do paciente da seguinte forma: mensurou-se o
comprimento total do fêmur e identificou-se o centro do fêmur em 33% e 50% do
seu comprimento, desenhou-se uma linha conectando esses dois pontos para
determinar o eixo anatômico femoral proximal. Neste caso, a linha não é
desenhada para o nível da articulação. Desenhada a linha de referência da
articulação distal, definido o aLDFA para o valor específico da raça (nesse caso
de 95°, de acordo com Petazzoni 2008) e desenhado o eixo anatômico distal de
forma que a linha se estenda ao longo do aspecto lateral do entalhe intercondilar.
O CORA está localizado na interseção dos eixos anatômicos proximal e distal, e
sua magnitude pode ser medida nesse local. No caso, o CORA foi de 6,3º. Em
seguida, traçou-se uma linha paralela à linha de referência da articulação distal
no local do CORA, e transferido o ângulo encontrado (no caso, de 6,3º). Após
isso, foi mensurado em milímetros o tamanho da cunha a ser retirada na face
lateral do fêmur (Figura 33).

54
Figura 33 - Planejamento cirúrgico osteotomia femoral lateral distal em cunha de
fechamento. Fonte: cedida por Eloy Curuci.

Realizou-se exame radiográfico craniocaudal e mediolateral da tíbia


conforme descrito por Petazzoni, (2015), onde o córtex medial do osso calcâneo
deve sobrepor o centro da clóclea tibial e a extremidade distal da tíbia deve ser
elevada, formando ângulo de 90º com o feixe de radiação. Foi estimado torção
tibial externa em 10 graus, de acordo com estudo de Petazzoni, (2008), como
mostra a Figura 34.

55
Figura 34 - Radiografia pré-operatória, presença de torção tibial externa de 10 graus.
Fonte: cedida por Eloy Curuci, comparando com estudo de Petazzoni, 2008.

Para correção da torção tibial a técnica escolhida foi 4Ts (Tibial Tuberosity
Transposition Tool). O planejamento foi realizado da seguinte forma, como
mostram as Figuras 35 e 36: uma marcação foi realizada em 80% do
comprimento da crista no aspecto medial e a 60% no aspecto lateral, para as
luxações mediais de patela. A osteotomia é realizada mais caudalmente em
relação à técnica tradicional, correspondendo a 30% do diâmetro da tíbia
proximal (Petazzoni, 2015).

56
Figura 35 - Técnica de osteotomia parcial para luxação medial de patela. Fonte:
Petazzoni, 2015.

Figura 36 - Planejamento 4T. Fonte: cedida por Eloy Curuci.

9.2 Técnica Cirúrgica: Osteotomia femoral lateral distal em cunha de


fechamento

57
O paciente foi posicionado em decúbito dorsal e realizada antissepsia do
membro. Foi realizada abordagem cirúrgica lateral para articulação do joelho e
fêmur distal. Ao analisar a tróclea (Figura 37) notou-se que a patela não era
recoberta em 40 a 50% e, por isso, optou-se por realizar trocleoplastia de
ressecção em bloco, conforme técnica já descrita anteriormente, como mostra a
Figura 38.

Figura 37 - Tróclea rasa (seta). Fonte: cedida por Eloy Curuci.

Figura 38 - Trocleoplastia de ressecção em bloco (seta). Fonte: cedida por Eloy Curuci.

Em seguida, foi colocado um jig no aspecto cranial do fêmur, sendo o pino


distal imediatamente proximal à cartilagem do sulco troclear e o pino proximal
entre o trocânter maior e a cabeça femoral. Esses pinos foram colocados
paralelos ao plano sagital do fêmur e a estrutura do jig foi colocada medialmente,
como mostra a Figura 39.

58
Figura 39 - Colocação do jig (seta) no fêmur. Fonte: cedida por Eloy Curuci.

Em seguida, utilizando serra oscilante, as linhas de osteotomias foram


marcadas no osso, de acordo com o planejamento cirúrgico prévio. As
ostectomias foram realizadas. No presente caso, a espessura da lâmina era o
tamanho da cunha a ser removida. Dessa forma, foi possível realizar osteotomia
somente na cortical cis, não sendo necessária osteotomia na cortical trans
(segunda cortical), como mostra a Figura 40. Os segmentos femorais proximal e
distal foram reduzidos. Além dos pinos do jig, foi utilizada pinça de redução
ponta-ponta para comprimir os fragmentos (Figura 41).

Figura 40 - Realização da osteotomia (seta) somente na cortical cis. Fonte: cedida por
Eloy Curuci.

59
Figura 41 - Compressão dos fragmentos (seta) utilizando pinça de redução ponta-ponta.
Fonte: cedida por Eloy Curuci.

A placa foi posicionada na parte lateral do fêmur, com o cuidado de não


interferir na função articular ou patelar. Foi utilizada placa reta bloqueada Fixin,
sistema 1.7mm, com 6 furos, como mostra a Figura 42.

Figura 42 - Colocação da placa (seta) no fêmur. Fonte: cedida por Eloy Curuci.

9.3 Técnica Cirúrgica: 4T (Tibial Transposition Tiberosity Tool)

O acesso é realizado na face medial da articulação do joelho, se


estendendo até a região média proximal da tíbia. As marcações correspondendo
a 80% e 60% do comprimento da crista tibial, a 30% do diâmetro da tíbia proximal
são feitas utilizando bisturi elétrico.
O deslocamento gradual da tuberosidade é obtido através da utilização de
distrator ósseo, que permite a lateralização da tuberosidade tibial, mantendo o
fragmento na posição até a observação do trajeto neutro da patela no sulco
troclear. Esse dispositivo é confeccionado com barra conectora rosqueada,

60
bucha sulcada, chapa deslizante, duas porcas e dois pinos (lisos ou
rosqueados), fixados craniocaudalmente e proximodistalmente nos aspectos
medial e lateral da tuberosidade tibial e dispostos de forma convergente. O
ângulo de inserção dos pinos corresponde ao ângulo de inclinação do platô tibial,
em relação ao plano sagital e o ângulo entre os pinos, no plano transversal é de
aproximadamente 70º, como mostra a Figura 43. A osteotomia é realizada de
acordo com as marcações previamente feitas. A porca é girada e a chapa
desloca lateralmente a tuberosidade tibial, à velocidade de uma volta por minuto
(0,7mm). É recomendado um quarto de volta a cada 15 segundos (Petazzoni,
2015).

Figura 43 - Colocação de distrator ósseo (seta) na tíbia. Fonte: cedida por Eloy Curuci.

A tuberosidade tibial é mantida na posição através da inserção de um pino


liso ou rosqueado entre a tuberosidade e o córtex medial da tíbia osteotomizada
(Figura 44), prevenindo o retorno da tuberosidade tibial à sua posição original,
uma vez que o osso apresenta memória elástica. O diâmetro do pino será a
distância entre o córtex media da tíbia osteotomizada e a borda medial da
tuberosidade tibial, na altura da inserção do tendão patelar (Petazzoni, 2015).

61
Figura 44 - Colocação de pino liso (seta) para manter a posição da tuberosidade tibial.
Fonte: cedida por Eloy Curuci.

Em seguida foi realizado sobreposição do retináculo lateral, conforme


técnica descrita anteriormente. Os músculos foram suturados com fio absorvível
em padrão simples contínuo, assim como o tecido subcutâneo. A síntese da pele
foi realizada com fio não absorvível em padrão simples separado.
O curativo da ferida cirúrgica foi feito com spray de Rifampicina e coberto
com película protetora transparente. Em seguida, foi realizado penso de Robert
Jones e colocada bermuda ortopédica.

9.4 Evolução do caso

Foi realizado exame radiográfico imediatamente após o procedimento


cirúrgico e calculado novamente o aLDFA, cuja medida foi de 95.5º (Figura 45),
portanto dentro dos valores de referência.

62
Figura 45 - Radiografia pós operatório imediato, com aLDFA. Fonte: cedida por Eloy
Curuci.

Cinco dias após o procedimento cirúrgico o paciente iniciou fisioterapia


passiva, para melhor consolidação óssea, através do uso de aparelhos como o
laser, o ultrassom pulsado e campos elétrico e eletromagnético (todos de baixa
intensidade), uma vez que estes são capazes de estimular a osteogênese,
acelerar a consolidação de fraturas e aumentar a massa óssea.
Após 30 dias, foi realizado novo exame radiográfico (Figuras 46 e 47) para
avaliar o processo de cicatrização e posicionamento dos implantes. Neste exame
observou-se quebra da cortical trans (que não havia sido osteotomizada), com
formação de calo ósseo exuberante. Como causa dessa quebra podemos citar:
repouso não adequado no período pós-operatório ou sobrecarga do implante,
uma vez que o animal apresentava peso de 8,25kg, onde seria indicado
colocação de implante no sistema 2.0 ou 2.4mm. Porém, o osso permitiu a
colocação do implante somente no sistema 1.7mm, o que levou a sua
sobrecarga, culminando com a quebra da cortical trans e formação de calo
ósseo.
Com relação aos implantes não havia soltura de parafusos e não houve
migração do pino colocado na tíbia na técnica de 4Ts. Clinicamente o animal não
apresentava claudicação e ao exame ortopédico não havia luxação de patela.

63
Figura 46 - Radiografia 30 dias pós-operatório, projeção mediolateral. Fonte: cedida por
Eloy Curuci.

Figura 47 - Radiografia 30 dias pós-operatório, projeção craniocaudal. Fonte: cedida por


Eloy Curuci.

64
Após 60 dias de pós-operatório foi realizado novo exame
radiográfico (Figuras 48 e 49). Nesse exame, pode-se observar consolidação
óssea completa do fêmur. Não houve soltura de implantes nem migração do pino
colocado na tíbia na técnica de 4Ts. Clinicamente o animal não apresentava
claudicação e ao exame ortopédico não havia luxação de patela.

Figura 48 - Radiografia 60 dias pós-operatório, projeção mediolateral. Fonte: cedida por


Eloy Curuci.

Figura 49 - Radiografia 60 dias pós-operatório, projeção craniocaudal. Fonte: cedida por


Eloy Curuci.

65
10. Discussão

Em 2017, Brower et al., realizaram estudo retrospectivo com 55 cães e 66


joelhos que apresentavam luxação medial de patela devido a varos femoral (11
cães apresentavam luxação de patela bilateral). Como técnica cirúrgica de
escolha foi realizada osteotomia femoral lateral distal em cunha de fechamento.
Como resultado do estudo obtiveram redução precisa do aLDFA, união óssea
confiável e excelente satisfação do cliente, além de taxa de recidiva da luxação
patelar igual a zero, destacando a probabilidade de que o varos femoral
excessivo é um fator significativo na fisiopatologia da luxação patelar medial em
cães. Após correção cirúrgica, o aLDFA mensurado estava dentro dos valores
de referência, demonstrando que essa técnica é um método preciso para
correção do varos femoral distal (Brower, 2017).
No presente caso, o aLDFA após a correção cirúrgica foi de 95.5º, portanto
também dentro dos valores de referência e indo de encontro aos resultados
obtidos no estudo de Brower. Além disso, não houve recidiva da luxação de
patela, também indo de encontro aos resultados obtidos no estudo.
Nesse mesmo estudo, somente quatro casos tiveram complicações pós-
operatórias: infecção (taxa de 3,9%, semelhante ao que é relatado para outros
procedimentos cirúrgicos ortopédicos), falha de implante num cão gigante e
claudicação persistente, resolvida após remoção do implante. Essa taxa de
complicação se assemelha a um estudo realizado por Hans et al., (2016), em
que a realização da osteotomia corretiva foi a única variável associada à
ocorrência de complicações maiores.
Uma complicação obtida no caso, que não foi citada pelos autores, foi a
sobrecarga do implante, que ocorreu por conta do sobrepeso do animal, uma vez
que o fêmur permitiu somente a colocação de um implante no sistema 1,7mm,
porém com seu peso de 8.25kg o indicado seria o sistema 2.0mm ou 2.4mm. Por
isso, houve sobrecarga no implante, o que levou à instabilidade no foco de
fratura, quebra da cortical trans e formação de calo ósseo exuberante. Mesmo
com tal complicação, após 60 dias de pós-operatório já havia cicatrização óssea
completa. Algo que poderia ter sido feito para evitar esta complicação seria
associar uma segunda placa na face medial no fêmur, deixando a fratura mais
estável com divisão da carga entre os dois implantes.

66
Quando a causa da luxação de patela é o desvio da tuberosidade tibial, sua
transposição leva ao realinhamento do mecanismo extensor do joelho.
Atualmente, dois métodos são propostos para transposição da tuberosidade
tibial: osteotomia completa da tuberosidade tibial em relação ao plano frontal,
permitindo o deslocamento lateral/medial e proximal/distal da tuberosidade tibial;
e osteotomia parcial, quando o osso e periósteo distais permanecem intactos,
melhorando a estabilidade do fragmento osteotomizado, reduzindo tempo
cirúrgico, além de não necessitar de aplicação de banda de tensão. Essa técnica
só é indicada nos casos em que a torção interna ou externa da tuberosidade
tibial seja de, no máximo, 20º. Nos casos em que o ângulo de torção tibial seja
superior a 20º é indicado realizar osteotomia da tíbia proximal como técnica
cirúrgica corretiva (Petazzoni, 2015).
No presente caso, pelo fato de a tíbia apresentar torção externa de 10º foi
possível utilizar a técnica de osteotomia da tuberosidade tibial. Optou-se pela
técnica de osteotomia parcial da tuberosidade tibial (4Ts), por conta das
vantagens desta técnica em relação a osteotomia total, citadas anteriormente
por Petazzoni (2015): maior estabilidade do fragmento osteotomizado, menor
tempo cirúrgico e menor colocação de implantes.
Em 2015, Petazzoni realizou estudo retrospectivo, avaliando as respostas
clínica e radiográfica a curto prazo da técnica TTTT® em 19 cães com luxação
patelar medial graus 1 e 2, uni ou bilateral. Não foram incluídos cães que
apresentavam torção do fêmur distal, além da torção tibial proximal. Como
resultado do estudo observou-se claudicação menos evidente após duas
semanas de pós-operatório e recuperação funcional do membro completa em
todos os pacientes após oito semanas. Não foi observada recidiva da luxação
patelar. Com oito semanas de pós-operatório foi observada consolidação
completa da região osteotomizada em todos os cães, através de avaliação
radiográfica.
Já a técnica de osteotomia total da tuberosidade tibial apresenta maiores
taxas de complicações, como mostra o estudo retrospectivo de Stanke et al.
2014, em que foi avaliado os fatores de risco para desenvolvimento de
complicações após transposição da tuberosidade tibial em 113 cães com
luxação medial de patela. As complicações observadas foram: 18.2% com
irritação de tecidos moles, 12.4% com reluxação patelar, 1.5% com infecção de

67
tecidos moles. Foi realizado raio X pós operatório em 65 joelhos, dos quais:
24.6% tinham migração do implante e 13.8% tinham falha do implante. Através
de telefone ou email, entraram em contato com os tutores de 35 pacientes, que
relataram: 91.4% não tiveram complicações pós cirúrgicas, 5.7% apresentaram
claudicação menos severa do que antes da cirurgia e 2.9% necessitaram
remover o implante em outro hospital.
Avaliando os resultados encontrados por Petazzoni, 2015 e Stanke et.al.,
(2014), podemos notar que a osteotomia parcial apresentava vantagens e menor
taxa de complicações quando comparada a osteotomia total da tuberosidade da
tíbia. No presente caso, obtivemos consolidação total com 60 dias de pós-
operatório, não houve recidiva da luxação patelar e não houve migração do
implante. Uma desvantagem da técnica de 4Ts é a curva de aprendizado maior,
pois inicialmente aprender a usar o distrator ósseo pode aumentar o tempo
cirúrgico.

11. Conclusão

A luxação de patela é uma das principais causas de claudicação dos


membros pélvicos em cães, sendo mais prevalente em raças de pequeno
porte. É classificada em quatro graus, e seu tratamento pode ser conservativo
ou cirúrgico. Existem diversas técnicas cirúrgicas para sua correção, e a
combinação destas fornecem opções adequadas para qualquer tipo de causa
da luxação patelar.
No presente relato de caso, a técnica de osteotomia femoral lateral distal
em cunha de fechamento se mostrou eficaz, normalizando o valor do aLDFA
e sem recidiva da luxação patelar, apesar da complicação de quebra da
cortical trans com formação de calo ósseo exuberante.
A técnica de 4Ts se mostrou uma nova opção à transposição da
tuberosidade tibial, com menor taxa de complicações. Por ser uma técnica
recente, ainda são necessários novos estudos, principalmente com avaliação
a longo prazo do uso desta técnica.

68
12. Referências

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