CP - 05 - Pericardiocentese
CP - 05 - Pericardiocentese
CP - 05 - Pericardiocentese
PERICARDIOCENTESE
INDICAÇÕES
CONTRAINDICAÇÕES RELATIVAS:
MATERIAL
TÉCNICA
EXAME DE IMAGEM
DRENAGEM CIRÚRGICA
COMPLICAÇÕES
ANÁLISE COMPLEMENTAR LÍQUIDO PERICÁRDICO NAS PRINCIPAIS CONDIÇÕES
PERICARDIOCENTESE
Video_01_Cpmed_Extensivo_Apostila_05
INDICAÇÕES
➤ Fins diagnósticos:
■ Tamponamento pericárdico;
■ Sintomáticos.
CONTRAINDICAÇÕES
RELATIVAS:
➤ Coagulopatias;
Entenda...
Na dissecção aórtica aguda, associada ao derrame pericárdico, a pericardiocentese pode estender a dissecção devido a uma rápida descompressão do saco pericárdico.
Já na hipertensão pulmonar grave, o derrame pericárdico pode impedir a dilatação do ventrículo direito, o que pode ser fundamental para o suporte da função
ventricular. O esvaziamento pericárdico pode piorar subitamente a clínica do seu paciente.
ATENÇÃO
Os pacientes que se apresentam com tamponamento cardíaco são pacientes críticos, potencialmente fatais, a exemplo dos pacientes vítimas de trauma. Não deixar de
monitorar esses pacientes continuamente (monitorização cardíaca, saturação periférica de O2) e manter via aérea segura e suporte ventilatório, caso necessário,
mesmo antes da pericardiocentese. Deve-se ter cuidado, pois uma hipotensão provocada (ex.: sedação para IOT, pressão positiva nas vias aéreas) pode provocar uma
descompensação e PCR (caracteristicamente em AESP).
MATERIAL
➤ Kit estéril para antissepsia com gaze, cuba e pinça própria (ex.: Foerster, Cheron);
➤ Anestésico local (lidocaína a 2%), agulha 22G e seringa 5–10 ml para anestesia;
➤ Fio-guia flexível;
Entenda...
A simples aspiração de líquido pericárdico promove alívio do tamponamento pericárdico, entretanto, a inserção de um dreno pericárdico é sempre preferida. Existem
drenos pericárdicos disponíveis no mercado, no entanto, um simples cateter pigtail ou um cateter venoso central mono ou duplo lúmen podem substituí-lo.
ATENÇÃO
➤ Posicionar o paciente:
■ Se paciente acordado, posicioná-lo em posição ereta ou semirreclinado a 30–45 graus, aproximando, assim, o saco pericárdico da parede torácica.
➤ Sedação:
➤ Colocar máscara, gorro e realizar a degermação e antissepsia das mãos e antebraços com material apropriado (escova contendo povidine degermante, por exemplo),
secando-as com compressas estéreis (geralmente disponíveis no kit junto ao capote). Vista o capote e calce as luvas estéreis, tomando o cuidado de não contaminá-las.
➤ Prenda a gaze estéril na ponta da pinça própria (Foerster ou Cheron) e realize a degermação do sítio de punção, com um degermante (três gazes), e posteriormente a
antissepsia, utilizando o antisséptico tópico/alcoólico (mais três gazes). As nossas duas principais opções são o povidine alcoólico e tópico, e o clorexidine alcoólico e
tópico.
➤ Anestesiar o local de punção, inicialmente, com um botão anestésico, e, posteriormente, avançar profundamente, sempre aspirando antes de infundir o anestésico, até
o pericárdio.
➤ Aspirar continuamente até a entrada no espaço pericárdico, percebida pela presença de líquido pericárdico (ex.: sangue, pus) na seringa.
Figura 1. A imagem acima ilustra os diferentes locais de acesso da pericardiocentese de urgência, sinalizados por pontos azuis.
Acesso subesternal;
Acesso apical.
Os dois primeiros são os acessos recomendados para a pericardiocentese às cegas, enquanto o último apenas deve ser realizado guiado por imagem. O acesso mais
utilizado e mais seguro, portanto, o mais recomendado, é o subesternal (também chamado subxifoide).
➤ A agulha deve ser inserida 1 cm abaixo do apêndice xifoide, entre este e o rebordo costal esquerdo. Se houver dificuldade em progressão através da pele, deve ser
realizada, primeiro, uma pequena incisão com bisturi;
➤ Após ultrapassar o rebordo costal, a agulha deve ser inclinada a um ângulo de 15–30 graus com a pele e direcionada ao ombro esquerdo do paciente;
➤ Progredir a agulha, sempre aspirando, lentamente, até perceber na seringa a aspiração de líquido pericárdico. Pare imediatamente a progressão da agulha neste
momento.
Dica
➤ Se nenhum fluido é aspirado, a agulha deve ser prontamente retirada e posteriormente redirecionada em uma trajetória mais posterior (geralmente a introdução de
uma agulha de 5 cm é suficiente, porém, algumas vezes — ex.: em pacientes mais obesos — pode ser necessário introduzi-la em até 10 cm);
➤ Se após a segunda tentativa nenhum fluido é aspirado, retirar a agulha e redirecioná-la 15 graus para a direita do paciente. Se, mais uma vez, falhar, proceder da
mesma forma, tentando sistemáticas aspirações, até a agulha apontar para o ombro direito do paciente.
2. ACESSO PARAESTERNAL
➤ A agulha deve ser inserida perpendicularmente à pele, sobre a borda cefálica da 5ª ou 6ª costela, imediatamente ao lado da borda esternal esquerda;
➤ Progredir a agulha, sempre aspirando, lentamente, até perceber na seringa a aspiração de líquido pericárdico;
➤ Se há imagem para guiar o procedimento, uma alternativa é proceder da mesma forma, porém na borda paraesternal direita.
Figura 2.
Figura 3.
Figura 4.
3. ACESSO APICAL
➤ A agulha deve ser introduzida lateralmente ao acesso paraesternal esquerdo, na altura do 5º, 6º ou 7º espaço intercostal esquerdo;
➤ Avançar a agulha sobre a borda cefálica da costela, direcionando-a para o ombro direito do paciente.
Figura 5.
Dica
Uma técnica utilizada por alguns médicos é acoplar um eletrodo à agulha de pericardiocentese, visando monitorização eletrocardiográfica contínua (em derivação
precordial) durante a punção. Desta forma, a agulha de pericardiocentese torna-se um "eletrodo em movimento". O objetivo é observar se há o contato da agulha com o
epicárdio, a fim de prevenir uma punção cardíaca. O contato da agulha com o epicárdio provoca imediata alteração eletrocardiográfica: supra ST ou elevação do
segmento PR, se contato com ventrículo ou átrio, respectivamente. Essa técnica pode ser descartada em um procedimento de urgência, se há a preocupação com
arritmias que possam surgir decorrentes desta técnica, ou se há a disponibilidade do exame de imagem para guiar o procedimento. Por ser uma técnica arriscada, tem
sido abandonada, sendo apenas a monitorização eletrocardiográfica contínua utilizada como acompanhamento da pericardiocentese.
Dica
A presença de uma pulsação na agulha indica que ela está em contato com o epicárdio. Neste caso, retirá-la imediatamente!
➤ Esvaziar lentamente o saco pericárdico através da aspiração, lembrando que, na pericardiocentese de urgência, 20 ml são suficientes para o alívio do tamponamento
pericárdico. Não esqueça de coletar material para análise diagnóstica!
➤ Se DRENAGEM necessária, como proceder?
■ Se há objetivo de manter a drenagem do saco pericárdico após a punção do mesmo, a técnica de Seldinger é a preferida, com a inserção de um cateter no espaço
pericárdico;
■ Antes da inserção do dreno, aspirar com a seringa o suficiente para certificar-se de que o derrame pericárdico é livre;
■ Não aspirar todo o derrame (máximo 1.000 ml), pois isso dificultará a progressão do fio-guia;
■ Retirar o fio-guia;
■ Manter o dreno conectado a um sistema de drenagem fechado (cerca de 24–48h são necessárias normalmente);
■ Não utilizar sistemas de drenagem contínua ou vácuo, pois pode piorar a hemodinâmica do paciente.
Video_02_Cpmed_Extensivo_Apostila_05
Dica
EXAME DE IMAGEM
➤ Avalie o volume e distribuição do derrame pericárdico pelo menos nas seguintes janelas: subcostal, paraesternal e apical;
➤ Selecione o melhor acesso (maior acumulação de líquido, maior proximidade da parede torácica, distância de órgãos adjacentes);
➤ Selecione um alvo a ser puncionado no líquido pericárdico (comumente a 2–4 cm da pele) com uma distância segura de pelo menos 1 cm do epicárdio;
➤ A agulha pode ser inserida paralelamente ao transdutor, ou, se possível, acoplada ao mesmo.
ATENÇÃO
A aspiração de fluido nem sempre significa líquido pericárdico, uma vez que líquido pleural ou peritoneal podem ser aspirados se há acidentes de punção durante o
procedimento. Da mesma forma, a aspiração de líquido hemorrágico nem sempre indica derrame pericárdico, pois pode significar hemopericárdio ou acidente de
punção, com lesão cardíaca ou coronariana. A melhora hemodinâmica com a aspiração do líquido é o dado mais consistente de sucesso da pericardiocentese no
tamponamento cardíaco. Além disso, o exame de imagem pode facilitar, revelando a diminuição do derrame pericárdico com a aspiração. Por último, temos uma dica
para utilizar "à beira do leito": ao aspirar o conteúdo sanguinolento, despreze em um recipiente vazio. A coagulação será bem menos efetiva com o sangue pericárdico
do que o sangue retirado de dentro do ventrículo!
Figura 6. Ecocardiograma revelando derrame pericárdico com colapso diastólico de AD e AE à esquerda e, à direita, de VD, consistente com tamponamento cardíaco. LV = ventrículo
esquerdo; LA = átrio esquerdo; RV = ventrículo direito; RA = átrio direito.
Figura 7. Ecocardiograma mostrando colapso diastólico de VD e de AD, respectivamente, compatível com tamponamento cardíaco.
ATENÇÃO / MEMORIZE
Esta é uma certeza que é difícil de ter apenas pelo exame de imagem. Neste caso, é preciso realizar infusão de solução salina contrastada com bolhas de ar (9 ml de
solução salina + 1 ml de ar — agitar!) rapidamente através da agulha. Observar, através do exame de imagem, se o contraste está no espaço pericárdico. Se o contraste
some rapidamente ou aparece como um "turbilhão" intracardíaco, significa que houve perfuração do miocárdio.
DRENAGEM CIRÚRGICA
➤ Se a drenagem não é possível por agulha ou cateter, deve ser realizada drenagem cirúrgica através de uma incisão subcostal;
➤ Se há chance de recidiva do derrame (ex.: malignidade), deve ser realizada pericardiectomia e criada uma janela pleuropericárdica ou peritoneopericárdica;
➤ Se drenagem inadequada ou reacumulação de derrame pericárdico, a despeito de um dreno funcionante, há indicação de drenagem cirúrgica;
➤ Hemopericárdio traumático;
➤ Coagulopatias.
ATENÇÃO
A drenagem deve ser acompanhada com ecocardiogramas seriados, que avaliam se há o correto esvaziamento do saco pericárdico e se há reacumulação de derrame
pericárdico.
COMPLICAÇÕES
➤ Pneumotórax;
➤ Embolia gasosa;
ANÁLISE COMPLEMENTAR
As indicações diagnósticas da pericardiocentese são restritas, com o procedimento sendo feito apenas quando há suspeita de derrame pericárdico infectado ou se não for
possível determinar a etiologia de um derrame pericárdico por outros meios.
O líquido pericárdico, neste contexto, deve ser enviado para análise: bioquímica, citológica, bacteriológica, análise imunológica. E, se é realizada biópsia do pericárdio, esta
deve ser enviada para análise histopatológica.
A principal indicação terapêutica é a pericardiocentese de urgência realizada no tamponamento cardíaco com choque hemodinâmico.
Diversas condições de derrame pericárdico podem levar ao tamponamento pericárdico, a depender, principalmente, do volume do derrame, sua velocidade de instalação e
da capacidade fisiológica do paciente. As duas clássicas causas a serem citadas e que diferem em sua fisiopatologia são: trauma (ex.: após cirurgia cardíaca ou acidente
automobilístico) e tuberculose.
No tamponamento cardíaco traumático, devido à acumulação rápida de líquido hemorrágico no saco pericárdico, não há distensão do pericárdio, nem ativação dos
mecanismos compensatórios, levando à rápida instabilidade hemodinâmica. Já no tamponamento cardíaco tuberculoso, devido ao caráter insidioso da patologia
inflamatória, há lenta acumulação de líquido no espaço pericárdico. Com isso, são ativados os mecanismos compensatórios e há distensão do pericárdio, podendo haver
acumulação de até dois litros de derrame pericárdico até a descompensação.
Figura 8. Curvas ilustram a sobrecarga do pericárdio (pressão-volume) de acordo com a velocidade de acúmulo da efusão pericárdica, desencadeando o tamponamento pericárdico
crítico/agudo.
Observe que existe um limiar de distensão do pericárdio que determina o fenômeno chamado "última gota", isto é: um pequeno incremento no derrame determina o tamponamento
cardíaco, da mesma forma que um pequeno decremento na drenagem determina a rápida descompressão do mesmo. Ideal para paracentese.
O líquido pericárdico, em condições normais, tem cerca de 10–50 ml de volume, com características de transudato, de coloração amarelo-clara e límpido.
Infeccioso
Viral: coxsackievirus, echovirus, adenovirus, EBV, CMV, influenza, varicela, rubéola, HIV, hepatite B, caxumba, parvovirus B19, vírus vacinal (vacina para catapora).
Bacteriano: Staphylococcus, Streptococcus, Pneumococcus, Mycoplasma, Haemophilus, Neisseria (gonorrhoeae ou meningitidis), Chlamydia (psittaci ou trachomatis),
Legionella, tuberculose, Salmonella, doença de Lyme (Borrelia burgdorferi).
Pós-radiação
Neoplásico
Paraneoplásico.
Cardiogênico
Pericardite precoce associada a infarto; síndrome de Dressler; miocardite; dissecção aórtica aguda.
Traumático
Autoimune
Doença reumática: LES, artrite reumatoide, vasculite, esclerodermia, doença mista do tecido conjuntivo.
Outras: granulomatose de Wegener, poliarterite nodosa, sarcoidose, DII (Crohn e RCU), doença de Whipple, arterite de células gigantes, doença de Behçet, febre
reumática.
Drogas
Metabólico
➤ Pericardite purulenta.
Geralmente, a contagem proteica é elevada com glicose baixa, < 35 mg/dl. A contagem de leucócitos também é elevada, variando de 6.000–240.000/microl. O líquido
deve ser submetido imediatamente a Gram e BAAR, com posteriores culturas para germes comuns, BK e fungos.
■ Disseminação hematogênica;
➤ Pericardite tuberculosa.
Geralmente, alta contagem de proteína e leucócitos em contagem aumentada, variando, em geral, de 700–54.000/ml. Porém, estes achados são inespecíficos. Apenas
40–60% têm BAAR positivo, sendo a cultura positiva em uma percentagem maior. Vale lembrar que, apesar de baixa sensibilidade, a especificidade da cultura é de 100%.
Entretanto, o melhor exame a ser solicitado no líquido é o PCR para BK. O ADA (cutoff 40 U/L) no líquido também deve sempre ser solicitado, pois tem sensibilidade e
especificidade acima de 90%, tendo seus níveis correlação com a chance de evolução para pericardite constritiva.
➤ Pericardite quilosa.
O quilopericárdio pode ser primário (idiopático) ou secundário (mais comum). A aparência do líquido pericárdico é leitoso e opaco, com a contagem de triglicerídios > 500
mg/dl. A razão colesterol/triglicerídeos é < 1, as culturas são todas negativas e a célula predominante a análise citológica é o linfócito.
Figura 10. Aparência do líquido pericárdico na pericardite quilosa.
➤ Pericardite neoplásica.
Geralmente o líquido é hemorrágico, sem história de trauma, e deve ser enviado à análise citológica. A sensibilidade da citologia (positiva para malignidade) varia de 60–
90%, sendo esta menor nos casos de mesotelioma ou linfoma.
Lembrar que a citologia negativa não exclui a possibilidade de neoplasia, logo, a biópsia deve ser sempre aventada. A biópsia pericárdica às cegas tem sensibilidade de
50–60%; enquanto a guiada por pericardioscopia, > 90%.
Figura 11. Derrame pericárdico e pleural neoplásicos metastáticos devido a um câncer de mama.
Figura 12. Mesotelioma de pericárdio. Observe o espessamento do pericárdio (seta branca).
➤ Pericardite traumática.
Dica
Para diferenciar efusões hemorrágicas verdadeiras de acidente de punção, pode-se dosar o hematócrito que, neste último, estará igual ao do sangue periférico. E,
também, no acidente de punção, o sangue coagula, ao contrário da efusão hemorrágica verdadeira, em que o sangue não coagula pelo consumo dos fatores de
coagulação!
Figura 13. Pericárdio calcificado como sequela de um hemopericárdio traumático, sendo uma das causas de pericardite constritiva.
➤ Pericardite autoimune.
As principais patologias a serem comentadas que podem estar associadas a derrame pericárdico, são: LES e Artrite Reumatoide (AR). As principais características a
serem citadas na análise do líquido pericárdico nessas condições são:
■ LES: títulos elevados de FAN, presença das células LE, complemento baixo e possibilidade da presença dos mesmos autoanticorpos séricos. Glicose normal, proteínas
variáveis, predomínio de mononucleares.