Islam No Recife (Territorialidade e Educação Não Formal)

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Islam no Recife:

Territorialidade e educação não formal dos centros islâmicos


E entre os Seus sinais está a criação dos céus e da terra, as
variedades dos vossos idiomas e das vossas cores. Em verdade,
nisto há sinais para os que refletem
َ‫ض ِل ِۚٓۦٓه إِنَّ فِي َٰذَ ِلكَ ََلٓ َٰ َيتٖ ِلقَ ۡو ٖم يَ ۡس َمعُون‬
ۡ َ‫َو ِم ۡن َءا َٰيَتِ ِۦه َمنَا ُمكُم بِٱلَّ ۡي ِل َوٱلنَّه َِار َو ۡٱبتِغَا ٓ ُؤكُم ِمن ف‬
(Alcorão Sagrado 30:22)
Neide Carolina Andrade Piornedo1
Daniel Vater de Almeida2
Resumo: No Recife há multiterritorialidades religiosas, inclusive, a islâmica.
Compreender a complexidade dessa territorialidade islâmica possibilita superar os
preconceitos de crenças, sistema de pensamentos e os entraves culturais de diferentes
povos e etnias. A partir do conceito de Território, espacializado pela cultura e da educação
que, é um instrumento potencializador de transformação social, este artigo busca
contribuir sob à luz teórica dos conceitos de territorialidade e educação não formal, a
contribuição educativa dos Centros Islâmicos e sua presença materializada e ciberespacial
no Recife.
Palavras-chave: Islam; Educação não formal; Territorialidade; Identidade
:‫ملخص‬
.‫يوجد في رسيفي تعدادت إقليمة دينية تشمل اإلسالمية‬
‫ نظام األفكار و العوائق الحضارية‬،‫فهم تعقيد هذه اإلقليمية اإلسالمية يفسح المجال للتغلب على التحيز ضد المعتقدات‬
‫الناس و العرقيات من مفهوم اإلقليم الخاص بالحضارة و التعليم الذي يشكل أداة محفزة للتحويل اإلجتماعي‬. ‫لمختلف‬.
‫هذه المقالة تهدف للمساهمة تحت الضوء‬
‫ المساهمة التعليمية للمراكز اإلسالمية و حضورها المادي و عبر‬،‫النظري للمفاهيم اإلقليمية و التعليم الغير الرسمي‬
‫الفضاء اإللكتروني‬
.‫في ريسيفي‬.
‫كلمات مفتاحيه‬: ‫إسالم ;تعليم غير رسمي ;إقليمية ;هوية‬

Introdução

O Islam é a religião que mais cresce no mundo. Por ser uma religião de caráter
universalista, acaba por propiciar todos os dias, encontros multiculturais que nos levam a
pensar que há outras possibilidades de existir no planeta. Conhecer a religião islâmica
deve ser do interesse da educação, pois, já nascemos num mundo marcado pela diferença

1
Graduanda do Curso de Pedagogia no Centro de Educação da UFPE. E-mail:
[email protected]
2
Doutor em Geografia. Professor do Centro de Educação da UFPE. E-mail: [email protected]
2

e quanto mais estreitamos nosso olhar sobre o outro, mais intolerantes nos tornamos. O
ser humano está em constante devir e as suas experiências com a pluralidade acabam
ganhando um contorno ético político que é umas das tarefas formativas do ser humano e
do exercício democrático de conviver com o outro.

A “cultura islâmica” que nos é apresentada através do discurso dominante é


completamente antagônica ao verdadeiro significado da religião e da identidade
religiosa daqueles que professam o Islam. Os muçulmanos dentro dessa narrativa
hegemônica que é carregada de orientalismo e de “verdades inquestionáveis” fomentadas
por artigos, imagens na mídia, cinema e livros sensacionalistas, resultam em uma
compreensão errônea da religião e a uma aversão a tudo que tange o Islam, transformando
os muçulmanos em subalternos religiosos. A palavra Islam é uma palavra em árabe ‫إسالم‬
e deriva da raiz verbal aslama ‫أسلم‬, que significa submissão a Deus ‫( هللا‬Allah). Portanto,
todo indivíduo que segue o Islam está entregue voluntariamente a vontade de Deus, é da
palavra Islam que surge o termo “muslim” que em português significa “muçulmano”,
aqueles que adoram o Deus único e acreditam nos seus profetas, nos anjos e nos livros
sagrados.

Explicar literalmente o significado da religião é vital para superar as dissonâncias acerca


da religião que popularmente é confundida com o conceito de Islamismo, o sufixo ismo
não caracteriza a religião, o sufixo refere-se as ações de cunho político praticados por
movimentos e partidos que se instrumentalizam de uma leitura singular do Alcorão 3 com
a finalidade de fundamentar sua ideologia política. É extremamente importante frisar que
entre os muçulmanos não é comum o conceito de Islamismo e Islamitas, o termo sequer
existe no Alcorão. Por essa razão, muitos grupos islamitas são criticados inclusive pelos
próprios muçulmanos, e por esse mesmo motivo temos o interesse em discorrer utilizando
o termo Islam, que designa o verdadeiro nome da religião que não está ligada
exclusivamente a um único povo. A partir disso, pretendemos desmistificar, nos
ancorando na geografia cultural e na perspectiva da educação não formal que pode ser
inserida para analisar e legitimar a territorialidade islâmica de caráter formativo no
Recife. Portanto, considerando a delimitação do objeto em identificar os centros islâmicos
como exemplos de instituições que produzem educação não formal, e não apenas espaços

3
A palavra “Alcorão” vem do árabe ‫( القرآن‬Al-Qur’na) que, em português, significa “a recitação”. As
palavras contidas nele são sagradas para os muçulmanos, sendo as principais orientações relacionadas à
moral e à fé da religião islâmica. Disponível em: https://iqaraislam.com/alcorao-livro-sagrado-do-
islamismo
3

já implantados de pertencimento religioso. O objetivo geral consiste em compreender a


educação não formal difundida pelo centro C-Islam- Centro Cultural Islâmico Imam
Sadeq e o Centro Islâmico do Recife como afirmação da territorialidade islâmica na
cidade. Sendo os objetivos específicos: Conhecer como se deu a formação dos centros
islâmicos ao longo do espaço-tempo no Recife; Compreender estas instituições islâmicas
como espaços de produção de educação não-formal; Identificar a localização/situação
geográfica do CIR Centro Islâmico do Recife como testemunho materializado na
Paisagem, que configura a principal territorialidade islâmica física nesta cidade.

Considerações teórico-metodológicas sobre o estudo do Islam e da territorialidade


islâmica no Recife acerca das ações educativas produzidas pelos Centros

A mensagem do Islam foi revelada no ano 609 da Era Cristã ao Profeta Muhammad (não
Maomé, como é popularmente conhecido no ocidente). A primeira revelação ocorreu em
Jabal al-Nour, ou “Montanha da Luz’’, localizada hoje em território da Arábia Saudita. A
mensagem do Profeta convidava toda humanidade a abraçar um Deus único, acreditar nos
anjos, nos seus mensageiros, nos seus livros, no dia do juízo final e na predestinação.
Esses são os pilares da fé islâmica que transcendem qualquer etnia ou geografia desde o
fim das revelações sagradas que terminaram em 632. Portanto, a essência universalista
do Islam interpela indivíduos do mundo inteiro que coexistem em diversos grupos sociais
e tradições culturais que, acabam por fazer o mundo muçulmano ser bastante heterogêneo
e amplo.

O imaginário ocidental tende a não compreender que a prática e a vivência no Islam, é


plural e multifacetada, indo além da divisão política 4 entre sunitas (cerca de 90% dos
muçulmanos) e xiitas (10%). Sendo comum associar o Islam aos árabes do Oriente Médio,
pelo simples fato da religião ter se originado na península arábica, mas os árabes não
representam a maioria demográfica do Islam.

A região com maior número de muçulmanos é o subcontinente indiano, onde


cerca de 400 milhões de fiéis se distribuem pelo Paquistão, por Bangladesh,
pela Índia e pelo Sri Lanka. O país com a maior população muçulmana é a
Indonésia, onde cerca de 90% de seus 200 milhões de habitantes segue o Islam.
Além disso, no correr do século XX, importantes comunidades muçulmanas
constituíram-se em boa parte dos países europeus e americanos. Existem entre
5 e 6 milhões nos EUA, 4 e 5 milhões na França, 3 milhões na Alemanha, 1,6
milhão, 1 milhão na Espanha e 700.000 na Holanda. Na América do Sul
existem comunidades muçulmanas expressivas. No Brasil cerca de 1 milhão,

4
As diferenças entre Sunitas e xiitas, que explicam boa parte dos conflitos no Oriente Médio.
Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-51068470
4

na Argentina 750.000 e 1 milhão e no Suriname, 20% da população. (PINTO,


2010, p. 23-24)

Por isso, conceber a religião islâmica de forma estática e monolítica é incongruente. O


contexto cultural, a localidade e as práticas recebem forte influência do lugar. No que
tange ao Brasil, a presença islâmica se inicia a partir do tráfico dos escravos Malês,
muçulmanos que, em 1835, realizaram em Salvador/BA o mais sério levante de escravos
urbanos das Américas, evento que ficou conhecido como a Revolta dos Malês. Após as
violentas repressões (penas de morte, açoites e deportações), o Islam passou a ser visto
como uma ameaça, e quase desapareceu do País, só voltando a crescer novamente a partir
da chegada dos imigrantes sírio-libaneses em meados da década de 20 da pretérita
centúria. Esse movimento imigratório em questão tem início em 1880, período em que a
Grande Síria encontrava-se dominada pelo Império Otomano. Fatores demográficos,
políticos, econômicos e culturais causaram o movimento de emigração (CASTRO, 2007,
p.22). Esses imigrantes acabaram sendo rotulados de turcos, porque chegavam ao Brasil
com o passaporte turco-otomano. A partir desse movimento imigratório os muçulmanos
foram se expandindo em solo brasileiro, principalmente em São Paulo/SP. Atualmente
existem cerca de 50 mesquitas e mais de 80 centros islâmicos espalhados pelo território
brasileiro, inclusive, cemitérios islâmicos etc. E, naturalmente, escolas islâmicas formais
que estão presentes em São Paulo/SP, uma libanesa em Foz do Iguaçu de orientação
islâmica, e a de Curitiba/PR, sendo ela a pioneira no Brasil. Segundo Samira Adel Osman
(2019, p. 13-14).

Evidencia-se também importância da escola e da educação para a manutenção


da comunidade segregada em si mesma e a necessidade da existência de
espaços educacionais muçulmanos com esta finalidade. A fundação de escolas
islâmicas é recente e numericamente pouco expressiva, atendendo apenas
pequena parte da comunidade que esteja mais próxima a ela ou que os pais
aceitem um deslocamento maior para que seus filhos atendam à instituição.

De acordo com os argumentos supracitados, as escolas confessionais possuem presença


massiva em todo território do Recife. Podemos encontrar várias escolas formais católicas,
protestantes e até mesmo judaicas na cidade. Perpassa no território do Recife o ensino
formal pela ótica das grandes religiões monoteístas de base Abraâmica, exceto a islâmica.
Entretanto, a ausência de uma escola formal islâmica no Recife não quer dizer que não
exista uma territorialidade islâmica que se preocupa com a educação e formação humana
dos indivíduos.

A ausência de uma escola islâmica formal no Recife, exige dos/as educadores/as, um


redirecionamento do olhar para essa territorialidade a partir dos centros islâmicos, que
5

não são apenas uma manifestação da religiosidade presente no Recife. Constituem,


outrossim, espaços pedagógicos não formais de educação, abertos para muçulmanos e
não muçulmanos. É nessa abertura socioespacial e dialógica que os centros e os/as
educadores/as podem auxiliar os indivíduos a desconstruírem o imaginário social
estigmatizado acerca do Islam, formando sujeitos críticos e capazes de respeitar a
diversidade religiosa e reconhecer as diferenças presentes na cidade.

Atualmente muçulmanos de ambos os centros islâmicos do Recife estão em via de


construir um ensino religioso voltado para crianças e adolescentes da comunidade
muçulmana, chamado “Educadores Muçulmanos do Nordeste”, devido a quantidade
“expressiva” de educadores muçulmanos no Estado, existe a necessidade de fomentar
projetos educacionais para as crianças e jovens dos Centros. Tal iniciativa carece de mais
investigações. Por ora, a identidade territorial islâmica presente no Recife já vem
produzindo educação na modalidade não formal. Esse elemento educativo é basilar na
formação do muçulmano/a e do seu processo de territorialização que tem por
característica a apropriação do território no sentido simbólico-cultural:

O território envolve sempre, ao mesmo tempo [...], uma dimensão simbólica,


cultural por meio de uma identidade territorial atribuída pelos grupos sociais,
como forma de controle simbólico sobre o espaço onde vivem (sendo também,
portanto, uma forma de apropriação, e uma dimensão mais concreta, de caráter
político-disciplinar: apropriação e ordenação do espaço como forma de
domínio e disciplinarização dos indivíduos. (HAESBAERT, 1997, p.42)

No entanto, os muçulmanos no Brasil representam uma minoria religiosa, e os


modelos narrativos adotados para apresentar as mazelas perpetradas no Oriente Médio e
alguns episódios terroristas ocorridos no Ocidente, praticados por radicais que se
instrumentalizam de uma leitura deformada do Islam, tendem a somar à ideia de uma
forma de periculosidade natural ou inata aos muçulmanos, levando a uma aversão moral
a simplesmente qualquer veiculação da imagem desses indivíduos na sociedade. Desde o
episódio do “11 de setembro”, nos EUA, os discursos caricatos e excludentes se
acentuaram, corroborando ainda mais na Islamofobia:

A islamofobia pode ser definida como o preconceito e a hostilidade irracional


contra o Islam e os muçulmanos, que são vistos como inimigos inconciliáveis
do Ocidente. Não se trata propriamente de um medo do Islam ou de uma crítica
embasada aos seus princípios religiosos, mas da disseminação de uma visão
propositalmente deturpada da religião, com a promoção da discriminação
contra seus seguidores. (CARVALHO, 2017, p.75)

Dito isto, o processo de discriminação se dá pelo desconhecimento da identidade desse


grupo, a identidade, tal como a cultura, não são produções acabadas e imutáveis, e sim,
6

objeto de uma incessante construção (SILVA, 2001). Sendo a alteridade, um processo


inseparável dessas ressignificações. Por isso, essa concepção de identidade é
fundamentalmente histórica, nós somos o que nos tornamos, o que significa que podemos
também nos tornar, agora e no futuro, outra coisa. (SILVA, 2001, p.26). E não há chance
de um diálogo viável se ele não encontrar um terreno fértil que seja cultivado por todos.
(pensando na relação muçulmanos/as e não muçulmanos/as).

Uma melhor coexistência, ativa, se baseia no conhecimento do “outro” e num


exame de quais de seus elementos identitários são compatíveis com nossos
próprios e quais nos são alheios. Este processo de conhecimento e integração
transforma o “outro” de estrangeiro tolerado em sócio e parceiro. Uma maneira
de iniciar tal processo de aprendizagem e aproximação é o diálogo interfés – e
inclua a possibilidade de honesta crítica mútua. Tentativas nesta direção já
foram feitas. Na sociedade pós-cristã atual, a responsabilidade caberia não
apenas às igrejas, mas a todos no geral. (Demant, 2018, p. 353)

É nesse olhar macro, ratificando a importância de todos, que a política da diferença


também promove uma noção de solidariedade em grupo contra o individualismo do
humanismo liberal, que tende por desconsiderar as subjetividades que constituem os
sujeitos socialmente oprimidos. Essa perspectiva dialógica é um dos elementos que
marcam a territorialidade islâmica no Recife, a partir dos centros que desempenham um
papel crucial para a base material da existência comum, fornecendo ao menos uma parte
dos recursos indispensáveis à existência de cada um.

A territorialidade islâmica no Recife possui caráter bastante educativo. Para o Islam a


educação é considerada um dos principais deveres, é dever de todo/a muçulmano/a buscar
conhecimento, é um elemento de suma importância na formação humana de todo fiel, e
os centros islâmicos são fundamentais nessa formação que não se encarrega apenas de
dar suporte ao conhecimento religioso, oferecendo também o ensino da língua árabe, que
é o caso especificamente do C-Islam- Centro Cultural Islâmico Imam Sadeq. Embora
ambos se mantenham abertos a todos os indivíduos que queiram conhecer e estudar o
Islam, caracterizando-se assim, em um espaço de educação não formal de caráter
religioso e democrático.

Na educação não formal, os espaços educativos localizam-se em territórios que


acompanham as trajetórias de vida dos grupos e indivíduos, fora das escolas, em locais
informais, locais onde há processos interativos intencionais. (GOHN, 2006, p.26). Traço
constitutivo dos centros islâmicos do Recife que, tem como intento o diálogo com todos
os indivíduos, sem distinção, assim também como uma formação democrática, e a
formação religiosa dos fiéis.
7

Em função do objetivo de investigar se existe territorialidade islâmica e educação não


formal a partir dos centros de islâmicos no Recife, desenvolvemos um trabalho de campo
com o CIR- Centro Islâmico do Recife, a fim de analisar e observar as relações de
interação tecidas no Centro Islâmico com a comunidade muçulmana que frequenta o
espaço, procurando compreender a territorialidade e a educação não formal islâmica a
partir do seu interior, tal preceitua o paradigma interpretativo ou compreensivo,
analisando os dados coletados pautados nos preceitos de análise de conteúdo (Bardin,
1977; Franco, 2003). Devido à crise sanitária provocada pelo Coronavírus, que já perdura
há mais de um ano em todo o planeta, o ensino da língua árabe está temporariamente
suspenso no CIR- Centro Islâmico do Recife. O ensino ocorria nas manhãs dos sábados
e era ministrado pelo professor Chuaib, filho de libaneses, o ex-professor de língua árabe
do centro afirmou5 que, “...mesmo que as pessoas não aprendam a falar, priorizamos a
leitura e a memorização dos versículos do Alcorão, pois nas orações são recitados esses
versículos...”. Embora não tenham uma previsão para o retorno das aulas de língua árabe,
o Centro permanece ativo com o ensino religioso remoto e semipresencial desde o início
da pandemia, portanto, um dos objetos desta investigação desta pesquisa.

Entretanto, como o C-Islam- Centro Cultural Islâmico Imam Sadeq se encontra ativo
apenas como entidade virtual, a entrevista foi realizada de forma remota apenas com o
coordenador do centro. Demos ênfase na valorização do ensino da língua árabe realizada
por este Centro através de parcerias que será apresentada no respectivo tópico acerca deste
Centro. Este trabalho se configura em uma pesquisa qualitativa, porque “não se preocupa
com representatividade numérica, mas, sim, com o aprofundamento da compreensão de
um grupo social, de uma organização, etc.” (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p.31).
Desse modo, não é nosso objetivo, dados estatísticos exaustivos ou quantificação
excessiva acerca do objeto abordado. Pretendemos valorizar aportes teóricos que
legitimem a territorialidade islâmica e seu intento formativo no Recife. Além de valorizar
elementos fenomenológicos que, outra vez, configuram essa territorialidade muçulmana,
tais como entrevistas, depoimentos, relatos etc., onde a oralidade e expressão das pessoas,
constitui método científico. A classificação como pesquisa qualitativa demanda a resposta
de questões voltadas para as relações tecidas nos Centros Islâmicos e os indivíduos que
fazem parte ou não do seu interior, e isto não pode ser reduzido a processos e fenômenos

5
Trecho retirado da matéria “Embaixada da paz na Rua da Glória”. Disponível em:
https://curiosamente.diariodepernambuco.com.br/project/embaixada-da-paz-na-rua-da-gloria/
8

mensuráveis quantitativamente (MINAYO, 2003, p.28). Conforme Gil (2002, p. 41),


articularei metodologicamente os procedimentos da seguinte maneira: “[...] (a)
levantamento bibliográfico; (b) entrevistas com pessoas que tem experiências com o
problema pesquisado; e (c) análise de exemplos [de falas, ideias, expressões] que
estimulem o entendimento do objeto da pesquisa. O instrumento de coleta de dados foi a
entrevista semiestruturada. De acordo com Manzini (2004, p. 02).

[...] a entrevista semi-estruturada [sic] está focalizada em um assunto sobre o


qual confeccionamos um roteiro com perguntas principais, complementadas
por outras questões inerentes às circunstâncias momentâneas à entrevista. Para
o autor, esse tipo de entrevista pode fazer emergir informações de forma mais
livre e as respostas não estão condicionadas a uma padronização de
alternativas.

Os sujeitos dessa pesquisa foram o coordenador Eduardo Santana do C-Islam- Centro


Cultural Islâmico Imam Sadeq, tem 50 anos e está à frente deste cargo desde sua fundação
em 2015; Alberto Bret, tem 57 anos, é funcionário e membro do conselho executivo do
CIR- Centro Islâmico do Recife; Ibrahim Vanus, tem 35 anos e é professor de ensino
religioso virtual deste mesmo centro.

Quanto aos/às alunos/as e fiéis que possuem experiências práticas com o problema
pesquisado, optou-se por valorizar as narrativas das mulheres, ou seja, as alunas mais
presentes deste Centro, devido ao maior contato com as fiéis muçulmanas no trabalho de
campo e de forma remota, e também por preservar o nome das alunas entrevistadas.
Foram um total de cinco mulheres que puderam fazer parte desta pesquisa. A aluna A1
tem 35 anos, muçulmana há 8 meses e mora em São Lourenço da Mata-PE; a Aluna A2
tem 39 anos, muçulmana há 2 anos e mora em Limoeiro-PE; a aluna A3 tem 39 anos, está
conhecendo o Islam, é casada com um imigrante muçulmano da República dos Camarões
e mora no Ibura-Recife; a orientadora Najdaty Andrade tem 52 anos, muçulmana há 7
anos e mora no Recife, orienta as mulheres no modo presencial; e Dulce Rodrigues da
Rocha tem 51 anos, muçulmana há 8 anos e mora atualmente em Canhotinho- PE, mas
sempre está envolvida com as atividades do Centro Islâmico do Recife, e também orienta
de forma remota, juntamente com Najdaty Andrade as mulheres que chegam na
comunidade islâmica.

Para a realização das situações de interação, recorremos às entrevistas semiestruturadas,


que foram realizadas com a comunidade muçulmana envolvida. Ao considerarmos o
objeto da pesquisa, o roteiro construído buscou contemplar as especificidades dos sujeitos
9

envolvidos no processo investigativo. Buscamos, por meio de questões abertas, mediar


situações de interação no sentido de tecer um diálogo crítico, e, ao mesmo tempo,
subsidiar nossa análise de dados apresentada a seguir por dois tópicos, cada um referente
as singularidades de cada Centro Islâmico presente no Recife. Sendo o primeiro, o Centro
Islâmico do Recife (CIR), e o segundo, o C-Islam- Centro Cultural Islâmico Imam Sadeq.

(O Centro Islâmico do Recife) ‫المركز اإلسالم في ريسيفي‬

A comunidade sunita do Recife foi a primeira a ser institucionalizada na capital. O centro


islâmico do Recife foi fundando inicialmente em 1993, com a denominação de Centro
Cultural Islâmico do Recife. Apenas em 1997, depois de ser reestruturado recebeu a atual
denominação (CIR), o mesmo foi fundado por alguns imigrantes estrangeiros
(majoritariamente africanos) e de muçulmanos revertidos residentes na cidade. Está
localizado na R. da Glória, 353 - Boa Vista, Recife – PE e constitui uma marca vital da
territorialidade islâmica manifestada na paisagem da cidade.

Fonte: Recorte feito do Google Maps e do acervo pessoal da autora. 09/07/2021.

De acordo com Salgueiro (2001) tem se acentuando cada vez mais dentro da geografia
cultural a paisagem ser um território visto, sentido e elaborado pela mente. Centrando no
indivíduo, nas suas práticas, nas suas representações que elabora do mundo exterior, as
quais modelam, por sua vez, o comportamento. É a partir da sua faixada em árabe (língua
semítica para os povos islâmicos) que o centro torna a paisagem uma das matrizes da
cultura islâmica espacializada na cidade. Desenvolvendo laços afetivos e de identidade
cultural que são tecidos através da territorialização e da educação não formal realizada
por este Centro. Esse processo de territorialização, tem a ver com experiências culturais
e identitariamente importantes para a afirmação da territorialidade dos indivíduos.
10

Segundo Claval, na medida em que a lembrança das ações coletivas fundem-se aos
caprichos da topografia, às arquiteturas admiráveis ou aos monumentos criados para
sustentar a memória de todos, o espaço torna-se território. (2007, p.14). É importante
frisar que o Território sempre é múltiplo e complexo, funcional e simbólico. Território,
assim, em qualquer acepção, expressa ação de poder do homem em sua espacialidade
mais imediata, não apenas ao tradicional “poder político” governamental. Ele diz respeito
ao poder no sentido concreto, de dominação, quanto ao poder no sentido mais simbólico,
de apropriação (HAESBAERT, 2004). Ambas as visões, funcional e simbólica, possuem
entre si uma forte relação, exercendo “domínio” sobre o espaço tanto para realizar
“funções” quanto para produzir “significados”. Embora seja comum associar o conceito
de Território as relações de poder que se desdobram no seu sentindo mais funcional, o
poder também é inerente a concepção simbólica de Território e precisa ser levado em
consideração. Sendo essa perspectiva territorial simbólica concebida para compreender a
territorialidade islâmica no Recife.

Ainda no que tange as informações e a cultural organizacional do Centro Islâmico do


Recife, Alberto Bret, membro do conselho executivo afirma que “Temos um mix de
origens em nossa comunidade, pessoas vindas das mais diversas partes do planeta, muitas
não se estabelecem aqui e seguem outro rumo, outras casam formão família e se
estabelecem. Atualmente estamos associados a FAMBRAS 6 que contribui com uma
pequena parcela de nossas despesas. A intensificação da utilização das redes sociais pelas
pessoas de modo geral tem feito aumentar lenta e gradativamente o número de revertidos
numa razão proporcional entre homens e mulheres. Não trabalhamos com estatísticas e
dados numéricos, mas a grosso modo podemos dizer que cerca de quarenta e cinco por
cento de nossa população é de brasileiros. Nossa instituição está sempre aberta a pessoas
que queiram conhecer nossa religião, não temos nada restrito desde que sigam os
parâmetros exigidos pela prática religiosa e temos um bom relacionamento com outras
religiões e com as pessoas da nossa cidade, como também dentro do Estado.”

O centro islâmico do Recife possui um Sheik o qual permanece a serviço da comunidade.


Embora o Sheik Mabrouk El Sawy Said, formado pela Faculdade de Shari’ah e Kanum,
Universidade Al Azhar- Egito, esteja temporariamente afastado por razões de saúde,
muitos muçulmanos/as puderam contar com sua presença e seus ensinamentos.

6
Federação das associações muçulmanas do Brasil. Disponível em: https://www.fambras.org.br/
11

O Centro recebia visitas de estudantes de escolas, universidades, jornalistas e instituições


diversas com certa regularidade. Após a pandemia, esse contato com outros segmentos
da sociedade ficaram restritas, mas não deixa de sinalizar que a receptividade
socioespacial encontrada no Centro Islâmico do Recife, acaba por fazer uma ponte
educativa com indivíduos que não performam o Islam, possibilitado a prática de um
caminho pedagógico já apontado pela educação não formal, que contribui profundamente
para a formação humana de todos/as:

[...] articular a educação, em seu sentido mais amplo, com os processos de


formação dos indivíduos como cidadãos, ou articular a escola com a
comunidade educativa de um território é um sonho, uma utopia, mas também
uma urgência e uma demanda da sociedade atual [...] (GOHN, 2006, p. 36)

É necessário explicitar que o sunismo é a orientação religiosa deste Centro Islâmico. Essa
perspectiva tem sua gênese a partir de uma situação de dúvida após o falecimento do
Profeta Muhammad, uma parte majoritária da comunidade muçulmana defendia que o
poder político, ou seja, a liderança da comunidade caberia a própria Ummah 7 e não
especificamente a linhagem profética, como acreditam os xiitas. Então, Abu Bakr um dos
primeiros revertidos e conselheiro do Profeta saiu vitorioso e foi o escolhido. Essa cisão
ainda permanece predominantemente no mundo muçulmano. Conforme Yassin (2007,
p.85).

Considerados como a ortodoxia do Islam, os sunitas seguem não só o Qur’an,


mas também os hábitos, ditos e costumes do profeta, ou simplesmente, a
Sunna, termo que originou a referência sunitas. Para os sunitas, a revelação da
Mensagem Sagrada ocorreu uma única vez e não poderá ser alterada ou
contextualizada, o Qur’an não comporta modificações dos humanos, uma vez
que foi determinado por Allah.

Para os sunitas, essa ‘suna’ permite interpretar e adaptar o Alcorão às situações de todas
as épocas (SAMUEL, 1997, p. 263). Esses dois elementos que estruturam a cosmovisão
sunita são explanados em ambas as aulas ofertadas pelo CIR. Segundo Ibrahim Vanus,
professor de religião das aulas mistas, estão sendo realizadas há aproximadamente dois
anos, via online por causa da pandemia provocada pelo novo coronavírus, ocorrendo
todas as quintas e domingos às 20h, pelo aplicativo do Google Meet, com duração
aproximadamente de 40 a 60 minutos. A turma tem uma média de 20 pessoas e a maioria
é muçulmana, mas existem aquelas que estão conhecendo a religião. Nas quintas-feiras
as aulas são voltadas para a leitura do Alcorão e nos domingos algum tema sobre a

7
Ummah é a transliteração do árabe ‫ أمة هللا‬que em português significa Nação islâmica
12

religião. “Atualmente estamos estudando os hadiths (relatos do Profeta Muhammad)”,


afirma, Ibrahim Vanus.

Ao perguntar sobre a necessidade da continuação do ensino religioso apesar da conjuntura


da crise sanitária que estamos vivenciando. O professor nos conta que “o Profeta
Muhammad (saws8) disse: Buscai o conhecimento do berço à sepultura. Ao adquirir
conhecimento, o fiel aumenta a fé e fica mais firme na religião.” A partir disso, podemos
elencar algumas características que constituem a educação não formal, segundo Garcia
(2009, p.76):

são específicas da educação não-formal, como a flexibilidade de tempo e


conteúdos; o fato de não estar ligada, necessariamente a uma certificação; ser
uma área não-escolar; ter envolvimento com a comunidade; ter uma ligação
mais prática com o cotidiano; não estar vinculada ao sistema legislativo
escolar; possibilitar uma participação voluntária e a-temporal e a perspectiva
de favorecer a transformação, tanto pessoal como coletiva e social.

Esse mesmo modelo educacional é encontrado e inserido para analisar o ensino religioso
realizado por mulheres e para as mulheres no Centro Islâmico do Recife, que também tem
por objetivo aprimorar o conhecimento acerca do Islam e também discutir as
especificidades da mulher muçulmana. A partir de agora focaremos nossas análises para
as experiências das mulheres entrevistadas acerca dos estudos realizado pelas mesmas,
assim como alguns desafios e entraves que perpassam a identidade das mulheres
muçulmanas em questão.

Esse grupo de estudos realizado pelas mulheres é o único que se encontra no formato
semipresencial, sendo realizado sempre que possível, dependendo da disponibilidade das
fiéis e das interessadas em estarem presentes no Centro islâmico do Recife nas sextas-
feiras. Para o Islam, as sextas-feiras são consideradas os dias mais especiais para adoração
a Deus, a oração (salat) ‫ صالح‬em congregação é feita ao meio dia (Dhuhr9), apesar de não

8
É recomendado a todo muçulmano/a quando mencionar o profeta Muhammad que fale “salah allahu aleihi
wa salam” é a transliteração do árabe ‫ صلى هللا عليه وسلم‬que em português significa “que a paz e as bençãos
de Deus estejam com ele.”

9
É a segunda oração obrigatória do dia. A (salat) ‫ صالح‬é o nome dado as orações diárias que todo
muçulmano/a deve realizar. São divididas ao longo do dia e o horário de cada uma precisa ser respeitado
para que sejam consideradas válidas. São elas: ‫ الفجر‬Fajr – Deve ser feita durante a alvorada, pelo menos
15 minutos antes do sol nascer. ‫ الظهر‬Dhuhr – Oração que deve ser feita quando o sol atinge o ponto mais
alto no céu. Pode ser feita até o período próximo da próxima oração. ‫ العرص‬Asr – Prece para ser feita durante
a tarde. Pode ser feita até antes do início do pôr do sol. ‫ المغرب‬Maghrib – Oração que deve ser feita num
período anterior ao total pôr do sol. ‫ العشاء‬Ishaa – Prece para ser feita durante o anoitecer, após o sol se pôr
completamente. Pode ser feita até o momento do início do Fajr. Disponível em: https://iqaraislam.com/salat
13

ser obrigatório para as mulheres, muitas optam por estarem presentes nesses dias e
aproveitam para aperfeiçoar o estudo religioso com as mais antigas na religião.

Nem todas as alunas residem na cidade do Recife, mas se deslocam de outros municípios
para estarem em congregação e elevarem os seus conhecimentos, é o caso da aluna A1
que mora em São Lourenço da Mata- PE e da aluna A2 que mora Limoeiro-PE e da
orientadora Dulce Rodrigues da Rocha que reside em Canhotinho-PE.

Fonte: Acervo pessoal da autora. 09/07/2021

Em espaços de processos sociais que se dão coletivamente, se é gerado a


participação de todos, onde não há interferência de estruturas formais de ensino, mas sim
no campo de ensino não-formais, onde pode ser dado em vários âmbitos e lugares, a ideia
é gerar aprendizagem e conhecimento e o local não tem tanta importância para que isso
aconteça. Lugares de educação não formais, favorecem a aprendizagem de várias
maneiras para quem recebe, pois há uma pluralidade de histórias e saberes de quem dela
participa, onde o espaço para voz é mais amplo favorecendo novas visões de vida para
todos os envolvidos.

A orientadora do grupo, Najdaty Andrade, salienta que “Às vezes as pessoas dizem assim
‘Ah, mas já faz não sei quanto tempo que já estou estudando o Islam, estou vindo no
Centro para aprender mais, mas já estou estudando’ Mas, esse ‘já estou estudando’ é com
quem? E como? Você está estudando pela internet? Na internet, hoje, muitas pessoas
podem estar ensinando direitinho e muitas não. Os antigos aprendem a religião com os
sábios, que aprenderam com outros sábios que aprenderam com o Profeta, e assim vem
esse método até hoje, aprendemos com os sábios e vamos ensinando a quem vai
chegando”. A flexibilidade das aulas, dos encontros e da sua duração não quer dizer que
não exista um método e um intento educativo dentro do modelo não formal de ensino
praticado pelo grupo de estudo das mulheres. tal como pontua Garcia:
14

Seja ou não o termo “educação não formal” viável em longo prazo, ele é útil
agora para assinalar alternativas ao formal, aos empreendimentos educacionais
institucionalizados. Usar tal termo é uma atitude honesta, ainda que
insuficiente, de distinção dentro das principais forças educativas de uma
sociedade. “educação não formal” é uma descrição pela negação, e desse modo
diz menos que a “educação formal”. (É como definir um carro dizendo que ele
não é um cavalo, não é um avião, não é um barco, etc.) Frequentemente, “não
formal” tem sido compreendido pelos leigos como sendo sem forma ou sem
estrutura discernível, sem organização ou sem propósitos. “Formal”, por outro
lado, implica procedimento, propósito, forma e ordem. Contudo, muitos tipos
de educação – além da escola formal – em comunidade, em casa, na igreja, na
indústria e outras instituições sociais similares e organizações comerciais têm
forma. (1974, p. 9,apud GARCIA, 2009, p. 50)

Apesar de muitas pessoas conhecerem a religião através das mídias, amigos ou até mesmo
pelo marido que é o caso da aluna A3 e que tem frequentado o ensino presencial nas
sextas, é um consenso que o ensino produzido no Centro e sua receptividade une as fiéis,
alimentando a busca pelo aperfeiçoamento da religião e do pertencimento identitário.

Depoimento da aluna A3: “conheci o Islam através do meu marido e posso dizer que fui
muito bem recebida no Centro, não está sendo fácil, mas posso te dizer que estou me
encontrando com Deus.”

Depoimento da aluna A1: “a princípio fiz uma busca rápida no Google para saber o
endereço do Centro e em seguida achei em redes sociais, Facebook, Instagram. Quando
cheguei no Centro todos me receberam muito bem, me senti em casa, no meu lar. Desde
janeiro frequento o Centro e sempre que posso estou com meus irmãos e irmãs.”

Depoimento da aluna A2: “eu conheci o centro islâmico através de uma amiga aqui da
minha cidade que também é muçulmana, casada com um egípcio. Ela me levou ao Centro
pela primeira vez, foi ano passado só não lembro bem a data, lá fui bem recebida pelas
irmãs e pelos irmãos. Ganhei o alcorão, alguns livros e até então frequento o Centro
quando posso.”

Quando perguntado o porquê é importante toda muçulmana estudar o Islam, Dulce


Rodrigues da Rocha, uma das orientadoras e responsável por acolher de forma remota as
novatas e as interessadas no Islam, nos conta que, “é através do estudo que adquirimos o
conhecimento e sabemos os nossos direitos e deveres, bem como seguir uma boa conduta,
buscar conhecimento é também um mandamento dentro do Islam.” Dentro da ótica
islâmica, o Islam educa o indivíduo abrangendo todas as suas necessidades e fazendo-o
preocupar-se com todos os âmbitos da sua vida (MAZLOUM, 2002, p. 01)
15

As demais fiéis têm a mesma percepção sobre a importância da educação espiritual no


Islam. A aluna A1 conta que “é muito importante sim toda muçulmana estudar o Islam,
pois através dos estudos conhecemos mais o criador e o que ele quer de nós, encontramos
paz na alma e sabedoria para viver melhor consigo mesma e em sociedade.”

A orientadora Najdaty Andrade diz que “é um comando, ser muçulmana significa adquirir
conhecimento sobre tudo o que é bom, e ainda existe a questão de que tem assuntos
delicados quando se fala por exemplo da menstruação da mulher, o período do pós parto,
a questão do namoro, do sexo. Para uma mulher é mais interessante ela ouvir de outra
mulher esses ensinamentos, você não vai está falando de sexo, de período pós parto, de
menstruação com um homem. Então, essa importância de as mulheres estarem ensinando
as outras e esse desejo que as outras aprendam e repassem esses conhecimentos para as
que vão chegando, é o que fazemos no grupo e tentando sempre discutir nas sextas-feiras
e de forma remota. Essa é a metodologia do Islam, você aprende, você ensina, porque
conhecimento jamais pode ser guardado dentro do Islam, jamais! Tudo que você aprende
tem que ser passado para frente, porém tem que ter bases sólidas, essas bases são o
Alcorão e a Suna do Profeta, você tendo essas bases solidificadas em você, você pode
passar para qualquer pessoa.”

O Alcorão e a Suna são basilares no sistema de educação espiritual do islam. Um sistema


que não é isolado das demais necessidades educacionais do ser humano, mas, sim,
interligado com a educação ética e moral, mental e intelectual e com todas as formas de
educação. (MAZLOUM, 2007, p. 68).

A aluna A2 traz em suas falas um ponto interessante sobre a estigmatização da identidade


da mulher muçulmana e a importância do ato de estudar, inclusive como mecanismo de
defesa e empoderamento. “Pra mim a importância do estudo islâmico é pra você ter o
conhecimento e a base de como você vai reagir diante das pessoas futuramente e
socialmente, é fundamental para o nosso aprendizado. Eu já fui atacada verbalmente na
rua por algumas pessoas de mulher bomba, terrorista, ela veio das arábias, algumas coisas
desagradáveis. Mas que com a fé em Allah superamos esses pequenos detalhes. Eu só
tenho a agradecer a Deus pelas bençãos do Islam.” Todas as mulheres do grupo, exceto a
aluna A3 que ainda não fez a shahada10, utilizam o véu islâmico (hijab). Esse código de

10
É o primeiro pilar do Islam, o testemunho de fé. A shahada ‫ الشهادة‬é expressa através da frase em
pronúncia árabe ‫ أشهد أن ال إله إال هللا و أشهد أن محمدا رسول هللا‬a transliteração é ashhadu an la illaha illa llah, wa
16

vestimenta que denota a identidade religiosa dessas mulheres, costuma ser


incompreendido e deslegitimado pela sociedade. Todas as entrevistadas em questão
relataram alguma situação de islamofobia por usar o hijab.

É comum associarem as mulheres brasileiras a nacionalidade de países árabes ou


majoritariamente islâmicos, como também conceberem elas como indivíduos sem
autonomia, que precisam ser salvas ou até mesmo indivíduos violentos. A exemplo de
Dulce Rodrigues Rocha que nos conta que “uma vez no estacionamento, um homem disse
que eu e meu esposo éramos assassinos. E outra vez eu fui chamada de terrorista em
Alagoas por um homem.”

Após o atentado terrorista ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001,


o islã tornou-se foco de atenção da mídia quanto da comunidade intelectual,
mas é possível constatar o crescimento da religião neste período,
principalmente em relação às mulheres revertidas, que se contrapõem à
insígnia de que o uso do hijab redundaria na submissão do seu corpo [...]
(FERREIRA, 2013, p. 185)

Saber enfrentar situações de preconceitos como esses mencionados, é também um dos


pontos do ensino religioso abordado no grupo de estudo das mulheres. Najdaty afirma
que: “Então! Quando eu me proponho a estar dentro do centro islâmico, falando para
outras mulheres essa importância do estudo, do conhecimento é para não serem
enganadas. Quando me sento com aquelas meninas e começamos a conversar e eu começo
a explicar, e elas começam a entender essa importância, elas deixam de ser enganadas por
outras pessoas que gostam de deturpar, ou mesmo destruir o Islam. Aprendem a não ser
ridicularizadas, pessoas que gostam de zombar da religião, quando você tem o
conhecimento não é que eles vão deixar de zombar, mas você sabe como falar, como
rebater, como explicar e sabe até como desprezar, porque até isso o Islam ensina, um
desprezo que você mostra a importância de Allah na sua vida em detrimento daquele
xingamento e daquela agressão.” Por fim, segundo essa perspectiva de ensino islâmico
empreendida no Centro, que se preocupa tanto com o corpo, mente e a alma, está em
consonância com o que Mazloum (2007, p.68) concebe como educação religiosa do
indivíduo muçulmano/a:

O sistema de educação espiritual no islã, da maneira que aprendemos e


conhecemos, é a base da educação geral representada em todas as suas formas,
seja ela intelectual, ética, política, econômica, social ou física. Tendo uma alma
educada e pura, o homem estará apto a ser um indivíduo educado em todos os
outros sentidos. Do contrário, sua educação nos outros meios, que não o

ashhadu anna Muhammadan rassulu llah, que em português significa “Não há divindade além de Allah e
Muhammad é o servo e mensageiro de Allah”. Disponível em: https://iqaraislam.com/shahada
17

espiritual, será uma educação falha ou incompleta. Tendo uma educação


espiritual débil, sua educação será débil, pois a alma é base da educação e a
partir dela o indivíduo bem a utiliza nas demais áreas.

A intenção desta discussão foi valorizar a investigação acerca da territorialidade islâmica


sunita e do ensino religioso produzido pelo Centro Islâmico do Recife que se ancora na
modalidade de educação não formal, a fim de possibilitar a todas as mulheres
interessadas, um conjunto de fatores que favorece sua formação religiosa e seu
pertencimento identitário e territorial.

(O C-Islam Imam Sadeq) ‫مركز اإلمام الصديق اإلسالمي‬


Enquanto a comunidade ainda se encontra sem um espaço físico no Recife, ou seja, sem
um endereço fixo ou logradouro na cidade, e está ativa apenas como entidade virtual, não
significa ausência de territorialidade islâmica e educação não formal.

O C-Islam Imam Sadeq, é um centro islâmico de orientação xiita duocécima11, vertente


majoritária do Xiismo12. Vale ressaltar que xiitas e sunitas compartilham o mesmo
Alcorão e seguem amplamente a mesma xaria13 ‫( الشريعة‬DEMANT, 2018, p. 220). O que
difere um do outro é, a priori, a compreensão de liderança que se deu após a morte do
Profeta Muhammad que acabou por gerar um desacordo na unidade da Ummah14. Para o
xiismo, a sucessão deveria ser por linhagem sanguínea. Dessa forma, Ali ibn Abu Talib,
primo e genro do Profeta Muhammad seria o verdadeiro herdeiro do Profeta para assumir
a liderança política e orientação espiritual da comunidade muçulmana.

[...], a maioria dos xiitas são os seguidores dos Dozes Imames, ou seja, os
Xiitas Duodécimos, que são os companheiros e aliados do Imam Ali Bem Abi
Taleb (A.S), os quais levantaram a bandeira da oposição em assuntos do
Califado e das fontes teológicas islâmicas após o falecimento do nobre Profeta
(S.A.A.S), e isso foi para assegurar a tradição dos direitos dos familiares do

11
O xiismo duodécimo acredita em doze imames na linha sucessória do Profeta Muhammad, porém o 12ª
imame estaria oculto por Allah (Deus), e irá retornar. A linhagem começaria com o Imam Ali e se encerraria
com o Imam al-Mahdi, que está em estado de ocultação. (SOUZA,2016)
12
O xiismo não pode ser concebido de forma monolítica e homogênea, ao longo da história islâmica foram
surgindo diferentes compreensões de xiismos. Por isso, é importante especificar de qual xiismo está sendo
a discussão para não uniformizar os fiéis em uma única ramificação. (SOUZA, 2016)

13
Xaria ou shariah em árabe ‫ الشريعة‬não é um código de lei, impresso e limitado em volumes. É a ideia de
uma lei de Deus. Como outros conceitos legais amplos como o “direito americano” ou o “direito
internacional”, a shariah é um todo unificado que contém dentro dele uma enorme diversidade. Assim
como a lei americana se manifesta como leis de trânsito radicalmente diferentes ou códigos de zoneamento
em diferentes estados ou localidades, também a aplicação da shariah variou muito ao longo dos séculos,
enquanto ainda permanece uma tradição legal coerente. Disponível em: https://iqaraislam.com/afinal-o-
que-e-essa-lei-islamica-shariah

14
Ver a nota 7
18

Mensageiro de Deus (S.A.A.S), pertencentes aos Ahlul Bait, e por causa disso
se separaram da maioria das pessoas. (AL-TABATABAÍ, 2008, p.61)

Essa identidade xiita duodécima levaria a uma concepção distinta da história em si: os
pertencentes à “Nobre Linhagem” sofreriam as injustiças de um mundo em decadência
moral a ponto de serem martirizados, sendo o martírio e o lamento deles, elementos
centrais da identidade xiita (SOUZA, 2016, p. 168). Ademais, a característica de
afastamento também constitui parte do ethos xiita, que foi sendo desencadeado ao longo
do tempo, devido as estigmatizações que sofreram. Entretanto, isso não faz dos xiitas,
fiéis intolerantes e desprovidos de considerações pelos demais muçulmanos. Sendo
necessário, portanto, frisar que desde a Revolução Iraniana de 1978, o xiismo duodécimo,
religião oficial do Irã, tem sido vinculado ao imaginário social, principalmente ocidental,
como sinônimo de radicalismo, devido também aos ataques contra o Saddam Hussein 15 e
às ações do Hezbollah16 , tornado comum uma associação orientalista aos xiitas. Tal
comparação é totalmente equivocada, a saber, adjetivar uma/a xiita de radical é um ato
islamofóbico e não cabe a ninguém generalizar os fiéis por causa de uma minoria
específica que não age de acordo com os preceitos religiosos.

No que tange a origem e as atividades realizadas pelo C-Islam Imam Sadeq o mesmo só
foi inaugurado em 2015 ficando ativo até meados de 2019, Eduardo Santana, coordenador
deste Centro islâmico de orientação Xiita no Recife, afirma que a primeira instituição
desta orientação no Estado de Pernambuco foi o C-Islam – Centro Cultural Islâmico Ali
Akbar, fundado em 30 de maio de 2005, em ato público que envolveu membros da
comunidade muçulmana de Pernambuco e convidados não-muçulmanos, na presença do
Sheikh Hossein Khaliloo, clérigo titular do Centro do Imam Al´Mahdi de Diálogo no
Brasil, importante e referencial entidade para os muçulmanos xiitas no Brasil. No início,
a entidade se sustentava financeiramente com “as próprias pernas”, ou seja, com doações
de pessoas físicas locais e de fora de Pernambuco.

Mas, nos finais de 2018, decidiu-se pela unificação dos centros islâmicos de escolas xiitas
pernambucanos num só, num único espaço físico, o C-Islam – Centro Cultural Islâmico

15
Presidente do Iraque (1979-2003) sunita secular, na época apoiado pelos EUA. Em 22/9/1980 deu início
a uma guerra contra o Irã que durou 8 anos. A guerra envolveu aspectos políticos, religiosos e sectários.
16
Conhecido como um partido político libanês de orientação xiita duodécima, e também pela violência de
seu braço armado e suas ações contra Israel.
19

Ali Akbar, entidade islâmica xiita histórica, com sede na cidade de Belo Jardim, agreste
de Pernambuco.

Fonte:https://www.facebook.com/CCIISOlinda/photos/a.387620648099124/387621524765703

Entre 2015 e 2019 – período no qual o C-Islam Imam Sadeq enquanto espaço físico ficou
aberto no logradouro Avenida Fagundes Varela, nº 1.040 – Loja: 11 (Galeria Olinda
Antiga) – Jardim Atlântico – Olinda (PE) – Era composto em sua maioria de
muçulmanos/as brasileiros/as revertidos, sendo todos/as, no caso dos/as xiitas,
anteriormente seguidores de escolas de jurisprudência islâmica sunitas.

A maior parte dos/as frequentadores/as, durante o período no qual se manteve aberto o


espaço físico, foram homens, mas havia mulheres muçulmanas e não-muçulmanas.
Também havia alguns muçulmanos árabes, comerciantes em geral. Embora não tivessem
vivência frequente no tocante às ações e atividades gerais da entidade. No geral, os
frequentadores muçulmanos somavam por volta de 15 pessoas, mas também havia
pessoas que simplesmente buscavam o espaço para meditar, dialogar e descansar.
Costumava ser um local de congregação para muçulmanos e não-muçulmanos. Durante
o Ramadan tendo, inclusive, ficado conhecido pelas atividades sociais e humanitárias que
desenvolveu junto à comunidade local.

O espaço também era frequentado por estudantes e professores/as de todas as


modalidades de ensino. Pela sua relação próxima com o Fórum Diálogos, o C-Islam Imam
Sadeq sempre recebia turmas inteiras de estudantes de ciências humanas e sociais
matriculados em universidades públicas e privadas do Recife e Olinda. A abertura
20

socioespacial, dialógica e educativa, indubitavelmente, é uma de suas marcas até hoje,


embora seja de forma virtual (ciberespaço).

Como dito anteriormente, o C-Islam Imam Sadeq do Recife permanece ativo atualmente
como entidade virtual, mas isso não o impede de manifestar sua territorialidade Islâmica.
Inclusive, com uma forte presença feminina que busca informações sobre o Islam e sobre
a cultura muçulmana. Aliás, à guisa de exemplificação, é muito comum em centros
islâmicos e mesquitas do Brasil, após o evento do “11 de setembro” (atentados de
11/9/2001 nos EUA) e da exibição da novela “O Clone”, exibida no mesmo ano pela Rede
Globo de Televisão, muitas mulheres foram movidas pela curiosidade acerca dos
elementos “culturais” e “religiosos” que a novela apresentava. (FERREIRA, 2015).

Todavia, essa territorialidade tem como sua base socioespacial, a internet. Em termos
práticos, o ciberespaço se concretiza territorialmente com qualidades transfronteiriças de
operação e circulação de dados (ISRAEL, 2020, p.72). Mas o ciberespaço não está
apartado do espaço geográfico. Ainda, segundo Israel, a mesma pontua que:

A despeito do persistente imaginário que proclama o espaço virtual como


despregado do espaço geográfico, a internet, base material do ciberespaço, não
é uma entidade a-espacial, nem um mundo paralelo. A internet é um constructo
técnico complexo e multifacetado, que se desenvolve não apenas sobre, mas
com o espaço geográfico [...] (ISRAEL, 2020, p.71)

É fato que o capitalismo mudou e continua a fazer mudanças profundas na estrutura social
e espacial existente. Por isso, não é de se espantar que o advento da internet nos
possibilitou pensar os conceitos geográficos por essas novas dinâmicas territoriais
globalizadas. Em particular, o próprio conceito de território dentro dessa configuração.

o ciberespaço reúne elementos que permitem identificar diversos tipos de


ações territoriais, processos de territorialização, bem como territórios em que
esferas de poder são permanentemente disputadas. As disputas em torno dos
territórios do ciberespaço são efetuadas em diversas frentes: econômicas, via
disputas comerciais entre portais de comunicação, indexadores e buscadores
de conteúdos, redes sociais, dentre outros; políticas e ideológicas, como nos
casos dos ataques hackers a governos e/ou corporações ou mesmo nas
situações de cerceamento da liberdade de expressão por Estados e/ou
conglomerados produtivos via bloqueio da internet; culturais, quando dos
territórios em rede criados para divulgação de criações artísticas de certas
tendências específicas, ou pensados para a catequização de indivíduos para
certas práticas religiosas ou até mesmo para a afirmação de certas identidades
– nacionais, étnicas, raciais, dentre outras. (SILVA, 2013, p.20)

Devido sua territorialidade ser construída ciberespacialmente, suas atividades também


configuram-se nos mesmos moldes. O que impôs novas formas de ensinar e aprender,
então, a educação não formal é produzida de forma remota, estando funcionando
21

plenamente. O ensino da língua árabe que é uma marca da educação não formal do Centro
xiita é desenvolvida dessa forma, tendo como seu suporte à internet.

A educação não formal é tecida de meios e formas variadas e cada vez mais temos vistos
o ensino e aprendizagem centrados em suportes tecnológicos, nas “telas”. Naturalmente
o centro articulou as atividades didático-pedagógicas para o desenvolvimento do processo
ensino-aprendizagem à distância. E a internet não vai de encontro a essência da educação
não formal, que também tem como uma de suas características, as aprendizagens
adquiridas a partir das experiências das ações coletivas. Isto porque a internet, hoje, é
também uma ferramenta que possibilita tais experiências. Ao utilizar a internet, o/a
aluno/a “aumenta suas conexões linguísticas, geográficas e interpessoais através da
interação com inúmeros textos, imagens, pesquisas, conectando-se com os mais
longínquos espaços, culturas, idades e personalidades” (WISSMAN, 2002, p. 5)

Eduardo Santana, o coordenador do o C-Islam Imam Sadeq, nos afirma que o C-Islam
oferta cursos de árabe, alfabetização e conversação básica, a interessados, mantendo on
line plataformas em parceria com demais entidades muçulmanas presentes no território
brasileiro, a saber: Carangola/MG (Centro Cultural Beneficente Islâmico Imam
Hassan/Poeta Muçulmano), Simões Filho/BA (Fundação Al´Habu).

“Há, hoje, cursando as aulas de idioma árabe protagonizadas pelo C-Islam Imam Sadeq,
decorrente dos convênios citados, por volta de 60 alunos/as, homens e mulheres, todos/as
maiores de 18 anos. Também, há alunos/as matriculados/as em cursos individualizados,
que também têm cursado o estudo de árabe em aulas remotas”. Sendo assim, o C-Islam
Imam Sadeq evidencia que apesar de operar totalmente no ciberespaço, sua
territorialidade e educação não formal são manifestadas cotidianamente, e vem suprindo
as necessidades dos fiéis, além de promover o conhecimento cultural e religioso,
oportunizado através do acesso virtual.

Apesar de existir um projeto em andamento que busca solidificar um espaço físico para
o C-Islam Imam Sadeq, o mesmo enquanto entidade virtual é bastante relevante para
evidenciar a territorialidade islâmica. Como também é o idealizador e um dos grandes
incentivadores do projeto “Educadores Muçulmanos do Nordeste” que está sendo
pavimentado com muçulmano/as de ambas as vertentes religiosas que atuam na
Educação, desse modo, o C-Islam Imam Sadeq vem promovendo educação não formal e
produzindo territorialidade, objetos desta investigação.
22

Considerações finais
Em função do diálogo teórico e de nossas interações comunicativas com a comunidade
muçulmana em questão, podemos considerar que existe territorialidade islâmica no
Recife tanto física quanto ciberespacial. Nos dois Centros pesquisados foi possível
constatar que ambos têm por intento assegurar a educação dos fiéis, além de estarem
abertos para todos/as que queiram tecer o exercício democrático e da coexistência. A
exemplo das instituições educacionais que costumam visitar o Centro Islâmico do Recife
(CIR), estimulando a formação de cidadãos/ãs críticos/as e conhecedores/as da
diversidade religiosa presente na cidade, em especial, a islâmica.

No desenvolvimento desta pesquisa, interagimos com vários indivíduos e obtivemos


respostas diversificadas. Consideramos, esta, uma experiência relevante, porque apesar
dos entraves da crise sanitária provocada pelo novo coronavírus, nos proporcionou o
envolvimento com coordenadores, professor e alunas muçulmanas, em suma, com a
comunidade tanto presencial quanto de forma remotas. Assim, podemos ouvir sobre as
experiências, como também os anseios, os preconceitos sofridos por parte das
muçulmanas e as inquietações das alunas. No decorrer da pesquisa tivemos a
oportunidade de contemplar as mais variadas experiências de vida, com indivíduos que
por motivos distintos tiveram suas trajetórias religiosas atravessadas pela educação não
formal produzida no Centro islâmico do Recife.

Percebe-se que é preciso compreender o outro, deixar de enxergar apenas os véus ou a


poeira causada pelas bombas, é preciso olhar além dos discursos de ódio (COSTA, 2016,
p.97) e legitimar a identidade muçulmana que pode somar para o fim do etnocentrismo e
da intolerância. O Islam é a religião de mais de 1 bilhão de pessoas no mundo todo, e essa
relação pautada no estranhamento por parte daqueles que desconhecem suas práticas
religiosas, acaba por se tornar um dever de todos os profissionais envolvidos com a
educação visando construir debates sobre tolerância, respeito e empatia.

Foi possível concluir desse processo, que as ações educativas promovidas pelos Centros
são essenciais para a formação e aperfeiçoamento do ethos muçulmano de todos/as que
compõe os centros islâmicos, sendo essa busca pelo conhecimento, uma obrigatoriedade
de todo fiel. Ademais, os Centros também sinalizam a importância da emergência de
diálogos emancipatórios e plurais que impliquem noções de responsabilidade e
23

participação de todos/as na desconstrução de preconceitos sobre o Islam e os


muçulmanos/as.

Referências

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Centro Islâmico do Brasil, 2008. (Coleção Nossa Mensagem II)
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70, 1977.
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expressão gera opressão. Disponível em: http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/24031.
Acesso em: 31 de março de 2021.
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Carlos, São Carlos, 2007.
CLAVAL, Paul. A geografia cultural. tradução de Luíz Fugazzola Pimenta e
Margareth de Castro Afeche Pimenta. 3. ed. – Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2007.
DEMANT, Peter. O mundo muçulmano. 3. ed., 4ª reimpressão. – São Paulo:
Contexto, 2018.
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FERREIRA, Francirosy Campos Barbosa. Telenovela e Islã: dos estereótipos à
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