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DÍZIMO HOJE ?

Sim e Não!

Lucinda Ribeiro Alves


www.buscandoluz.org
Copyright © 2014 Lucinda Ribeiro Alves

All rights reserved.

ISBN-13:978-1499680683

ISBN-10:1499680686
Porque o amor ao dinheiro é raiz de todos os males;
e nessa cobiça alguns se desviaram da fé,
e se traspassaram a si mesmos com muitas dores.
I Timóteo 6:10
Prefácio
Este livro é o resultado de uma busca nas
Escrituras acerca de temas como dízimo, ofertas,
primícias e o dinheiro dentro da igreja. O título parece
estranho: “Dízimo hoje? Sim e não!”. O Senhor ensinou:
“Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; não, não; pois o que
passa daí, vem do Maligno.” (Mateus 5:37). Então porquê
dizer “Sim e Não” simultaneamente? Porque contribuir
para o Reino de Deus é sempre bom, porém quando se
faz por coação, medo ou outras razões erradas, aquilo
que é bom torna-se mau. Dar, em si mesmo, nunca será
mau, mas nem todo o meio é justificado pelo seu fim.
Um dia enquanto adorava de olhos fechados
durante um culto, foi interrompida por alguém que me
pediu dez euros. Faltava uma semana para o fim do mês
e a pessoa estava desesperada. Foi como se algo me
abanasse por dentro! Coincidiu que essa semana foi um
tempo passado com familiares na província, onde com
tempo e calma comecei a ler a Bíblia de forma mais
atenta acerca da questão do dinheiro na Igreja.
Durante essa semana, proporcionou-se, sem ter
planeado ver pela primeira vez o filme “Luther”, ou
“Lutero”, como é conhecido em português. Era
impressionante o que acontecia naquela altura entre o
clero! Sob a capa de abençoar a Igreja, sufocavam-se
financeiramente todos os povos cristãos com a promessa
de bênção espiritual. O choque foi perceber que a Igreja
dos nossos dias não está assim tão diferente.
Não sou obcecada pela Reforma como vejo alguns
serem. Foram feitas conquistas, mas se pensam que tudo
foi alcançado naquela altura, já estagnaram
espiritualmente. Não podemos seguir o Espírito ficando
presos aos reformadores, por mais que os possamos
admirar. A Igreja de Cristo crescerá e será limpa até ao
regresso do seu Noivo.
Já lá vão mais de vinte anos desde a minha
conversão. Não foi uma conversão a um grupo, foi uma
conversão ao único Senhor, por isso posso falar sem
compromissos para com qualquer grupo. No entanto,
respeito os grupos e as lideranças e nunca me isolei como
dona da verdade.
Quanto a ofertas de dinheiro para a igreja, posso
dizer que praticamente durante toda a minha vida cristã
entreguei dinheiro na igreja e fi-lo voluntariamente.
Nuns tempos achava que era um mandamento, noutros
fazia-o apenas porque amava a Deus e queria contribuir
para a sua obra. Sendo assim, este livro não pretende ser
uma fuga de contribuir. É apenas a resposta ao borbulhar
dentro de mim de algo que creio ser Deus a impulsionar.
Comungo com os outros crentes, mas nunca fui
contaminada pela religião que cega e atrofia de modo
que só vemos a doutrina do nosso agrupamento
religioso. Digo isto no bom sentido, sem amargura
alguma, pois amo os homens e sempre estarei disposta a
aprender com todos e a apoiar aqueles que precisarem.
As lideranças existem para cumprir o seu papel.
Desde que isso não fira a nossa consciência e naquilo que
não contraria as Escrituras, Deus pede a nossa sujeição
aos líderes humanos, quer seculares, quer da Igreja. O
orgulho é o ativador do veneno da ignorância e da
estagnação. Quero amar os homens e não me isolar
nunca, mas quero temer e amar a Deus acima de tudo e
todos.
Nestes últimos dias, o seu Espírito continua ativo
e no processo transformador da Noiva. Deixemos que
nos limpe e aperfeiçoe oferecendo um coração manso e
recetivo à mudança corretiva, pois ela é sinal do seu
amor por nós. Aquele que resiste à mudança, Deus já
nada pode fazer por ele, pois recusa-se a crescer. Esses
nunca poderão chegar à “estatura varonil de Jesus Cristo”
(Efésios 4:13), o alvo de Deus para todo o que se diz
cristão.
As pessoas são sempre o foco de Deus e não
apenas para sua salvação, mas para restauração, consolo
e aconchego, principalmente dos mais carenciados e dos
que mais sofrem. Não é por acaso que a Bíblia sempre
enfatizou a ajuda aos órfãos, às viúvas e o socorro a
todos os oprimidos.
A Igreja de Deus não é chamada apenas para
pregar salvação, antes faz parte da sua chamada prover
abrigo para o cansado, socorro ao aflito e ajuda ao
necessitado, especialmente ao que partilha da fé. Este foi
o Evangelho pregado pelo Filho de Deus quando andou
sobre a terra e que os primeiros Apóstolos nos deixaram.
Índice

Introdução 1
A Oferta de Abel 5
Os Holocaustos de Noé 13
O Dízimo de Abraão 21
A Prosperidade de Isaque 31
O Dízimo de Jacob 33
As Primícias na Lei 37
O Dízimo para os Levitas 43
O Dízimo em Malaquias 49
O Messias e o Dinheiro 65
O Dinheiro em Atos 85
O Dinheiro nas Epistolas 93
Uma questão de consciência 121
Conclusão 129
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 1

Introdução
Nunca li um estudo exclusivamente baseado nas
Escrituras, e principalmente um estudo
descomprometido, sobre dinheiro. Há centenas, senão
milhares, de livros sobre a área financeira no contexto
cristão, mas não me satisfazem.
Não estou interessada em fórmulas para atingir
riqueza, com todo o respeito por quem tem a intenção de
utilizar o dinheiro para bons propósitos. Mas, eu não me
enquadro nesse grupo, não estou mesmo interessada em
ser rica materialmente. Estou interessada em ter uma
vida espiritualmente rica e quanto à área material, quero
apenas não dever nada a ninguém, a não ser o amor
(Romanos 13:8) e ter uma vida digna diante deste
mundo, de modo a honrar o meu Senhor. Nada mais!
De acordo com o fluir da compaixão de Deus
quero ser sempre sensível à necessidade do outro e estar
disponível para dar de mim. Não são os que mais têm
que mais ajudam. Quanto mais temos, mais queremos
ter. Isso não significa necessariamente que vamos ajudar
mais pessoas.
Nos livros sobre finanças ou prosperidade, nunca
consegui encontrar explicações sobre a diferença entre
primícias e dízimos, ou uma explicação séria de
mudanças geradas com a Vinda do nosso Messias.
Mudou alguma coisa na forma como oferecemos o nosso
dinheiro a Deus? Se houve mudança, então o que mudou
2 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

e onde está o respaldo bíblico em todo o seu contexto? O


que dizer aos crentes que estão com problemas nessa
área? Será que a Bíblia tem uma fórmula para resolver os
problemas financeiros dos homens?
Vamos desprogramar a nossa mente com o que foi
gravado pela voz dos homens, mesmo os bons e bem-
intencionados. Só assim estaremos prontos a receber em
nós o que está escrito na Palavra, em toda a sua pureza.
Não podemos crescer se formos teimosos, dizendo que
creremos da mesma forma até morrer… A Palavra é
como água limpa que nos lava, purifica e esclarece.
Quem ousará nestes dias lavar-se nela, sem interesses
pessoais?
Antes de mais, que fique claro, que não tenho
nada contra a prática do dízimo. Acredito que todos
podem dar abundantemente, mas dentro dos princípios
bíblicos. Porém, fico tão triste quando vejo abusarem do
povo de Deus, esvaziando-lhe a carteira em troca de
promessas que Deus não fez desse modo! Bem dizia o
Apóstolo: “O amor ao dinheiro é a raiz de todos os males” (I
Timóteo 6:10).
Fico muito triste também quando vejo os crentes
darem dinheiro apenas para obter benefício próprio.
Nenhuma destas coisas é Evangelho. Também não é
Evangelho não se ter uma solução para os problemas
financeiros graves dos cristãos. Deus tem uma solução e
não é suportar o sofrimento até à morte!
Onde está a solução de Deus? Está certamente na
sua Palavra, se formos capazes de nos libertar dos fardos
das tradições que temos carregado sobre nós.
Lembremos que a nossa doutrina não é a Palavra de
Deus, mas a interpretação humana desta. Sendo assim
deve ser constantemente revista.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 3

Quando escrevo estas palavras estou na posição


do leitor. Tive apenas um vislumbre que algo não está
certo e um entendimento de que a Bíblia não está de
acordo com muito do que vejo à minha volta. Contudo,
estou também diminuindo-me a uma criança para que
possa aprender com as Escrituras sem intervenção do
meu conhecimento adquirido.
O meu desejo é iniciar uma viagem desde o
Princípio, o Génesis, até ao fim, Apocalipse, para
compreender o que apenas Deus diz. Venha viajar
comigo de coração aberto ou feche estas páginas agora.
4 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 5

A Oferta de Abel
A primeira vez na Bíblia em que aparece uma
referência a Ofertas está em Génesis:

Ao cabo de dias trouxe Caim do fruto da terra uma


oferta ao Senhor. Abel também trouxe dos
primogénitos das suas ovelhas, e da sua gordura.
Ora, atentou o Senhor para Abel e para a sua oferta,
mas para Caim e para a sua oferta não atentou. Pelo
que irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe o
semblante. Então o Senhor perguntou a Caim: Por
que te iraste? E por que está descaído o teu
semblante? Porventura se procederes bem, não se há-
de levantar o teu semblante? E se não procederes
bem, o pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo;
mas sobre ele tu deves dominar. (Génesis 4:3-7)

Pela fé Abel ofereceu a Deus mais excelente sacrifício


que Caim, pelo qual alcançou testemunho de que era
justo, dando Deus testemunho das suas oferendas, e
por meio dela depois de morto, ainda fala. (Hebreus
11:4)

Segundo as Escrituras, havia algo na oferta de Abel


mais excelente que na oferta de Caim. O que significa
que Abel trouxe primogénitos do rebanho? Na verdade,
ele imolou cordeiros, pois diz: “trouxe também da sua
gordura”. Ora a gordura do cordeiro só é retirada depois
6 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

de estar morto. Seria assim na lei levítica dada


posteriormente por intermédio de Moisés: o cordeiro era
oferecido e também a sua gordura (Êxodo 29:13; Levítico
1:8-12).
Abel ofereceu cordeiros em sacrifício, enquanto
Caim ofereceu uma oferta do fruto da terra que
cultivava. Note-se que Abel era pastor e Caim era
agricultor. Dizer que Deus se agradou do sacrifício de
Abel, por ser um sacrifício de cordeiros, talvez não seja
completamente correto. Ambos trouxeram ofertas do
fruto do seu trabalho.
O que havia de especial na oferta de Abel? O autor
de Hebreus refere este episódio dizendo: “Pela fé Abel
ofereceu a Deus mais excelente sacrifício que Caim, pelo qual
alcançou testemunho de que era justo”. O sacrifício de Abel
foi oferecido “pela fé” e em justiça. O que significa isto?
Tanto Caim como Abel levaram ofertas, como
certamente Adão seu pai lhes tinha ensinado. Como
saberiam que deveriam trazer ofertas e sacrifícios se não
lhes tivesse sido dito? No entanto, está escrito que Abel
trouxe pela fé mais excelente sacrifício.
Parece que mais do que o conteúdo da oferta em si
mesma, havia algo na atitude do ofertante que
determinou a aceitação divina descrito como: “pela fé” e
“era justo”. O que é esta fé que levou à aceitação aqui
descrita? Ora, o versículo de Hebreus, que citamos, está
inserido num capítulo onde é definida a fé que aqui se
atribui a Abel:

Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se


esperam, e a prova das coisas que não se veem.
Porque por ela os antigos alcançaram bom
testemunho. Pela fé entendemos que os mundos
foram criados pela palavra de Deus; de modo que o
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 7

visível não foi feito daquilo que se vê. Pela fé Abel


ofereceu a Deus mais excelente sacrifício que Caim,
pelo qual alcançou testemunho de que era justo,
dando Deus testemunho das suas oferendas, e por
meio dela depois de morto, ainda fala. Pela fé
Enoque foi trasladado para não ver a morte; e não foi
achado, porque Deus o trasladara; pois antes da sua
trasladação alcançou testemunho de que agradara a
Deus. Ora, sem fé é impossível agradar a Deus;
porque é necessário que aquele que se aproxima de
Deus creia que ele existe, e que é galardoador dos
que o buscam. (Hebreus 11:1-6)

Eis aqui um mistério, Abel tinha “o firme fundamento


das coisas que se esperam e a prova daquilo que não se vê”.
Algo na atitude do seu coração, designado como fé,
agradou a Deus: “sem fé é impossível agradar a Deus”.
Certamente a oferta de Caim foi feita sem esta fé, sem a
qual é impossível agradar a Deus. Será que Caim fez
uma oferta, apenas porque assim foi ensinado e não por
amor ao Criador que lhe abençoara a terra com fruto?
Segundo Hebreus 11:6, fé é crer que Deus galardoa,
ou presenteia, aquele que o busca. Se não houver busca
não há galardão, logo a fé bíblica começa com uma busca
de Deus, baseada no entendimento das coisas espirituais
que não se veem. Não pode haver fé sem busca de
Deus. O que é isto de buscar Deus? Estará Deus perdido
para que o procuremos? Não está perdido, mas de certa
forma oculta-se num Lugar Santíssimo reservado àqueles
que ousam buscar e têm fome espiritual.
O autor de Hebreus, em 10:19, diz-nos: “Tendo pois,
irmãos, ousadia para entrarmos no santíssimo lugar, pelo
sangue de Jesus.” Podemos entrar, mas precisamos de
ousadia, precisamos ter fome suficiente para buscar e
8 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

ousar entrar. O Espírito de Deus dentro dos seus filhos


produz essa fome e essa ousadia. Precisamos apenas de
seguir o Espírito. O problema é que muitos filhos de
Deus escolhem seguir a sua ‘carne’ em vez de serem
guiados pelo Espírito.
Quando o homem se deixa guiar pelo Espírito, não
só pode entrar no Lugar Santíssimo, como pode viver ali.
Isto é o que significa o início do Salmo 91: “aquele que
habita no lugar secreto do Altíssimo, à sombra do Omnipotente
descansará”. De seguida, este salmo continua com uma
lista de bênçãos extraordinárias, que muitos acham não
aplicáveis aos crentes de hoje. Em parte é verdade, pois
este salmo aplica-se apenas ao crente que vive no
Esconderijo do Altíssimo, não aos restantes.
Só aquele que habita nesse lugar pode reivindicar a
promessa de “nenhum mal me sucederá, nem praga alguma
chegará à minha casa” (Salmo 91:10). Este salmo é
atribuído a Moisés. Repare nas pragas descritas… Moisés
sabia o que era ser protegido de toda a praga, mas sabia-
o porque experimentara o que era permanecer no Lugar
Santíssimo, mesmo antes de haver um Tabernáculo. Ele
esteve por diversas vezes no monte, dias seguidos a sós
com Deus.
Hoje, os homens acham muito ter de permanecer
pelo menos uma hora por dia diante de Deus, buscando-
o! Como poderão os homens de hoje experimentar o
poder de Deus, se não desejam a sua presença como
água no deserto?
O texto acima diz: “sem fé é impossível agradar a Deus;
porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus…”.
Tudo começa com aproximar-nos de Deus. Esta é a fé
que justificou a tantos na lista de Hebreus 11. O galardão
só vem àquele que o busca, mas buscar a Deus não é
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 9

participar de um culto semanal, quer seja católico,


evangélico ou qualquer outro.
Tudo começa quando fechamos a porta do nosso
quarto (Mateus 6:6) e escondidos do mundo nos
aproximamos Dele. O quarto referido poderá não ser
um quarto com porta e paredes, mas é sem dúvida um
lugar escondido dos olhos dos homens. Pode ser um
monte, um quarto em casa, um lugar isolado no campo,
uma pequena varanda ou mesmo um WC, onde se pode
ficar a sós. Tudo serve para o faminto de Deus.
Buscando se encontra, como está escrito: “pedi, e
dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei e abrir-se-vos-á”
(Mateus 7:7). Alguém poderá dizer: “busquei, mas não
achei”. Jeremias profetiza em nome de Deus: “Buscar-me-
eis, e me achareis, quando me buscardes de todo o vosso
coração”(Jeremias 29:13).
Não é só tirar tempo, é também a qualidade da
busca que vai determinar o fim desta. Lembremos o que
o próprio Deus disse a Salomão, em II Crónicas 7:14: “se o
meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e orar, e
buscar a minha face, e se desviar dos seus maus caminhos,
então eu ouvirei do céu, e perdoarei os seus pecados, e sararei a
sua terra”. Tudo começa com tirar tempo em oculto, mas
implica também uma atitude humilde de querer. David
recebeu muito de Deus, mas buscou muito também. Ele
clamou:

Como o cervo anseia pelas correntes das águas,


assim a minha alma anseia por ti, ó Deus! A minha
alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando
entrarei e verei a face de Deus? (Salmo 42:1-2)

Lavo as minhas mãos na inocência; e assim, ó


Senhor, me acerco do teu altar, para fazer ouvir a
10 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

voz de louvor, e contar todas as tuas maravilhas.


Senhor, eu amo o recinto da tua casa e o lugar onde
permanece a tua glória. (Salmo 26:6-8)

Isto é o começo da fé que permite dizer: “mil cairão


ao meu lado, dez mil à minha direita, mas eu não serei
atingido” (Salmo 91:7).
Não parece que Caim tivesse essa atitude quando
ofereceu o que tinha a Deus. Creio, que mais importante
do que aquilo que foi oferecido, foi a forma como foi
dado, isto é, a atitude de coração com que foi dado. Deus
exorta Caim: “Porventura se procederes bem, não se há-de
levantar o teu semblante? E se não procederes bem, o pecado
jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo; mas sobre ele tu deves
dominar”. Deus diz a Caim que proceda bem... Poderá
significar que algo na sua vida estava fora do “proceder
bem” segundo Deus.
É dito de Abel que “alcançou testemunho de que era
justo”. Deus não aceita ofertas daquele que vive em
pecado, pois o que Deus deseja, em primeiro lugar, é o
coração do homem. Quais os pecados de Caim? Não
sabemos. Contudo, algo nele fez com que Deus o
exortasse a proceder bem. Mesmo depois da oferta
rejeitada, Deus diz a Caim para corrigir a sua vida.
Se procedermos bem, teremos ânimo em todas as
circunstâncias, mesmo naquelas que nos desagradam,
como quando Deus recompensa alguém mais que a nós.
Por vezes a recompensa de Deus ao nosso irmão poderá
ser um ensino para seguirmos e imitarmos aquele que é
recompensado, em vez de o invejarmos. A revolta de
Caim foi tal que matou a Abel! Foi tal a sua inveja e a sua
ira que cometeu o ato atroz de matar o seu próprio
irmão.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 11

Todos procuramos o reconhecimento do nosso


trabalho e esforço, quer seja do nosso trabalho secular,
quer seja do nosso trabalho no reino de Deus, se é que
podemos fazer essa distinção. Contudo, nem sempre
obtemos resultados de acordo com as nossas expetativas.
Por vezes, vemos alguém próximo ser exaltado e receber
bênçãos espirituais e materiais. É tempo de refletir e não
de reagir com amargura. Será que tenho de ouvir o que
Deus disse a Caim?
A nossa principal preocupação deve ser: estou eu a
agir bem? Se sim, não importa o sucesso aparente ou real
dos outros. Se não estou a agir bem, devo dominar sobre
o pecado tal como Caim foi exortado. Os pecados a
dominar poderão ser revolta, ira, amargura, inveja,
cobiça, ódio. Variam consoante a pessoa. Poderá ser o
mais perigoso e subtil dos pecados: não buscar a Deus.
“Pela fé Abel ofereceu a Deus mais excelente sacrifício
que Caim”, aproximando-se de Deus, crendo que Ele é
premiador daquele que o busca, mas sem exigir ser
recompensado, pois o maior galardão para o apaixonado
de Deus é a sua presença. Não há ouro, nem cargos, nem
sucesso maior que este. O adorador de Deus fica
satisfeito apenas de o adorar e nada mais pede. Os
“Cains” deste mundo não conseguem compreender isto.
Ele olhou para Abel e não perguntou o que fazer para
agradar a Deus.
Os homens comparam as ofertas exteriores
visíveis, mas Deus olha para a oferta do coração. Será
que Deus precisa do nosso dinheiro e dos nossos bens?
Precisará Deus de construir ricos templos e grandes
catedrais? Não! Ele quer o coração dos homens. Abel
morreu por proceder bem segundo Deus. Poderemos
perder a vida ou muitas outras coisas, se procedermos
12 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

bem e buscarmos mais a Deus que os tesouros desta


terra.
Os ricos, segundo os homens, são sempre mais
valorizados, mas teremos a recompensa do lugar secreto,
a exaltação secreta, longe dos altos cargos eclesiásticos,
mas próximos do trono de Deus. Deus procura pela terra
esses insignificantes aos olhos humanos que o adoram
em espírito e em verdade (João 4:23). A esses, Deus
recebe como excelente sacrifício, como o de Abel.
Com Abel surge pela primeira vez uma evidência
do princípio das Primícias. Abel ofereceu os
primogénitos do rebanho. Eram os primeiros “frutos” do
seu trabalho, os primeiros cordeiros nascidos de cada
ovelha. Nada nos é indicado que nesta altura houvesse
algum mandamento nesse sentido, apenas que Abel o fez
e Deus se agradou. Porém, poderia ter recebido
instrução de seu pai, Adão.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 13

Os Holocaustos de Noé
Depois de Abel, só volta a ser descrito algo
semelhante a uma oferta, após o dilúvio. A justiça de
Deus caiu sobre a terra e só restou Noé, a sua família e os
animais que protegera na arca de madeira. Isto é o que
nos conta a Bíblia. Há diversas interpretações sobre o
dilúvio, mas a lição mais importante a extrair é que
devemos ter temor de Deus, pois Ele tem poder sobre a
criação para lhe determinar um fim. O Criador tem
autoridade para determinar um tempo limitado à
criação. Deus é Senhor para ser adorado e para julgar as
criaturas que trouxe à existência. Para que não se
extinguissem as espécies animais, Deus ordena a Noé:

De todos os animais limpos levarás contigo sete e


sete, o macho e sua fêmea; mas dos animais que não
são limpos, dois, o macho e sua fêmea; também das
aves do céu sete e sete, macho e fêmea, para se
conservar em vida sua espécie sobre a face de toda a
terra. (Génesis 7:2-3)

É interessante a diferenciação entre animal limpo e


os que não são limpos, muitos antes da Lei de Moisés.
Dos limpos, Noé levaria sete casais e dos não limpos
levaria apenas um casal. Porque levaria um número
superior de animais limpos? Porque seriam utilizados
14 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

para outro fim que não a reprodução posterior ao


dilúvio.
Depois do período do dilúvio, Deus fala novamente
aos homens que restaram:

Todos os animais que estão contigo, de toda a carne,


tanto aves como gado e todo réptil que se arrasta
sobre a terra, trá-los para fora contigo; para que se
reproduzam abundantemente na terra, frutifiquem e
se multipliquem sobre a terra. Então saiu Noé, e com
ele seus filhos, sua mulher e as mulheres de seus
filhos; todo animal, todo réptil e toda ave, tudo o que
se move sobre a terra, segundo as suas famílias, saiu
da arca. Edificou Noé um altar ao Senhor; e tomou de
todo animal limpo e de toda ave limpa, e ofereceu
holocaustos sobre o altar. Sentiu o Senhor o suave
cheiro e disse em seu coração: Não tornarei mais a
amaldiçoar a terra por causa do homem; porque a
imaginação do coração do homem é má desde a sua
meninice; nem tornarei mais a ferir todo vivente,
como acabo de fazer. (Génesis 8:17-21)

Nesta altura, dá-se um episódio que interessa ao


nosso estudo. Noé edifica um altar, sacrificando um
exemplar de todo o ser vivo limpo. Aqui estão animais
limpos que foram levados a mais na arca. Destinavam-se
a um sacrifício ao Senhor. Noé ofereceu sacrifícios em
grande quantidade. Deus agradou-se e prometeu não
voltar a destruir a terra por causa do homem. Não
prometeu que não destruiria o homem caso o merecesse,
mas que não amaldiçoaria a terra por causa do homem.
O capítulo 9 de Génesis inicia de forma muito
interessante:
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 15

Abençoou Deus a Noé e a seus filhos, e disse-lhes:


Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra. Terão
medo e pavor de vós todo animal da terra, toda ave
do céu, tudo o que se move sobre a terra e todos os
peixes do mar; nas vossas mãos são entregues. Tudo
quanto se move e vive vos servirá de mantimento,
bem como a erva verde; tudo vos tenho dado. A
carne, porém, com sua vida, isto é, com seu sangue,
não comereis. Certamente requererei o vosso sangue,
o sangue das vossas vidas; de todo animal o
requererei; como também do homem, sim, da mão
do irmão de cada um requererei a vida do homem.
Quem derramar sangue de homem, pelo homem terá
o seu sangue derramado; porque Deus fez o homem
à sua imagem. (Génesis 9:1)

Existem grandes semelhanças com o que Deus disse


depois de criar Adão. Vejamos o que difere da criação
inicial e desta renovação da humanidade pelo dilúvio:

E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem,


conforme a nossa semelhança; domine ele sobre os
peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais
domésticos, e sobre toda a terra, e sobre todo réptil
que se arrasta sobre a terra. Criou, pois, Deus o
homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou;
homem e mulher os criou. Então Deus os abençoou e
lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos; enchei a terra
e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as
aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam
sobre a terra. Disse-lhes mais: Eis que vos tenho dado
todas as ervas que produzem semente, as quais se
acham sobre a face de toda a terra, bem como todas
as árvores em que há fruto que dê semente; ser-vos-
ão para mantimento. E a todos os animais da terra, a
todas as aves do céu e a todo ser vivente que se
16 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

arrasta sobre a terra, tenho dado todas as ervas


verdes como mantimento. E assim foi. E viu Deus
tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. E foi a
tarde e a manhã, o dia sexto. (Génesis 1:26-31)

Tal como a Adão, Deus abençoou a Noé e sua


família e disse: “frutificai e multiplicai-vos, e enchei a
terra…”. De seguida disse-lhes para governarem sobre
todos os seres vivos e estabelece o tipo de alimentação
que devem seguir. A Adão e Eva, com seus
descendentes, fora-lhes indicado que se alimentassem
apenas de vegetais, mas depois do dilúvio Deus amplia
aquilo que o homem pode comer: “tudo quanto se move e
vive vos servirá de mantimento, bem como a erva verde”. Qual
terá sido a razão da mudança? Aparentemente deve-se à
escassez de alimentos posterior ao dilúvio, o que
significa que a alimentação ideal seria a inicial. De todas
as vezes que Deus fala de comida, esta é a mais
permissiva. Uma coisa apenas é proibida: o sangue dos
animais, ou animais que não sejam sangrados.
O sangue é comparado à vida. A vida pertence a
Deus. Curioso é o que se segue no texto, quando fala do
sangue do homem. Caim assassinara seu irmão e,
quando Deus o repreende, faz a seguinte afirmação: “a
voz do sangue de teu irmão está clamando a mim desde a
terra”. Caim acaba por receber um castigo pequeno
relativamente ao seu ato. Apenas é desterrado e
separado da sua família. No entanto, depois do dilúvio,
Deus dá um mandamento muito mais rigoroso: “quem
derramar sangue de homem, pelo homem terá o seu sangue
derramado”. Caim não foi penalizado da forma como
merecia porque não existia um mandamento para o
assassínio, mas depois do dilúvio os homens não se
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 17

poderiam justificar de que não tinham sido avisados da


gravidade de matar o seu semelhante.
Finalmente, é realizado um pacto. Deus é um Deus
de pactos ou alianças. Ele fizera um pacto com Adão,
embora no início de Génesis não seja descrito de forma
explícita. Um pacto implica promessas e/ou
mandamentos. No caso de Adão, o Senhor disse pela
boca do profeta Oseias: “eles, porém, como Adão,
transgrediram o pacto; nisso eles se portaram aleivosamente
contra mim” (Oseias 6:7). Adão é referido como
transgressor de um pacto.
Deus fez um pacto no Éden. Se lermos atentamente
os dois primeiros capítulos de Génesis, são dados
diversos mandamentos e são feitas promessas também,
algumas implícitas. O homem deveria guardar o jardim,
deveria multiplicar-se e encher a terra, e não poderia
comer da Árvore da Ciência do Bem e do Mal. Deus o
abençoaria e estaria com a humanidade, sem necessidade
de separação alguma. Seria uma harmonia perfeita entre
o físico e o espiritual.
Vejamos o pacto com a descendência de Noé:

Mas vós frutificai, e multiplicai-vos; povoai


abundantemente a terra, e multiplicai-vos nela. Disse
também Deus a Noé, e a seus filhos com ele: Eis que
eu estabeleço o meu pacto convosco e com a vossa
descendência depois de vós, e com todo ser vivente
que convosco está: com as aves, com o gado e com
todo animal da terra; com todos os que saíram da
arca, sim, com todo animal da terra. Sim, estabeleço o
meu pacto convosco; não será mais destruída toda a
carne pelas águas do dilúvio; e não haverá mais
dilúvio, para destruir a terra. E disse Deus: Este é o
sinal do pacto que firmo entre mim e vós e todo ser
18 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

vivente que está convosco, por gerações perpétuas: O


meu arco tenho posto nas nuvens, e ele será por sinal
de haver um pacto entre mim e a terra. E acontecerá
que, quando eu trouxer nuvens sobre a terra, e
aparecer o arco nas nuvens, então me lembrarei do
meu pacto, que está entre mim e vós e todo ser
vivente de toda a carne; e as águas não se tornarão
mais em dilúvio para destruir toda a carne. O arco
estará nas nuvens, e olharei para ele a fim de me
lembrar do pacto perpétuo entre Deus e todo ser
vivente de toda a carne que está sobre a terra.
(Génesis 9:7-16)

Mais que um novo pacto, é uma renovação do


pacto feito com Adão. Deus promete não voltar a
destruir a terra com um dilúvio. O homem deverá
multiplicar-se e encher a terra. Note-se que não há uma
promessa da terra nunca ser destruída, mas apenas de
não ser destruída por um dilúvio.
Curiosamente, nem no Éden, nem no fim do dilúvio
temos instruções divinas acerca de ofertas ao Senhor.
Terá Deus ordenado a Noé que sacrificasse o sétimo
casal limpo que entrara na arca como primícias ao
Senhor? Terá Deus ensinado Adão, depois deste ter
pecado, a fazer ofertas e sacrifícios? O texto bíblico nada
diz, contudo Abel e Caim sabiam que deviam fazer
ofertas e Noé sacrificou animais por cada espécie
considerada limpa.
Até aqui, a Bíblia não dá mandamento escrito
acerca de ofertas, primícias ou dízimos. Tudo o que
podemos fazer é imaginar se existiu alguma instrução
nesse sentido, pois temos o exemplo de homens justos
como Abel e Noé.
Enoque, do qual se diz que não passou pela morte,
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 19

sendo levado para Deus em vida, não realizou ofertas


que tenham ficado registadas. Se houve alguém justo foi
Enoque, o sétimo depois de Adão. Porém, pouco é dito
sobre ele nas Escrituras, tal como as conhecemos
(Génesis 5:18-24; Judas 1:14).
Podemos meditar no significado da expressão
“andou com Deus” e imaginar o que significará! Andar
com alguém não existe se não nos relacionarmos com
quem “andamos”. Faz-me lembrar da expressão de
Paulo: “se vivemos pelo Espírito, andemos também pelo
Espírito” (Gálatas 5:25). Isto é superior a qualquer tipo de
oferta ou sacrifício!
20 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 21

O Dízimo de Abraão
A primeira vez que a Bíblia refere o termo “dízimo”
é no episódio após a vitória de Abraão sobre os reis que
tinham tomado cativo a seu sobrinho Ló. Abraão não só
resgatou a Ló, como as restantes pessoas e bens que
tinham sido tomados.

Ora, Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e


vinho; pois era sacerdote do Deus Altíssimo; e
abençoou a Abrão, dizendo: bendito seja Abrão pelo
Deus Altíssimo, o Criador dos céus e da terra! E
bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus
inimigos nas tuas mãos! E Abrão deu-lhe o dízimo
de tudo. Então o rei de Sodoma disse a Abrão: Dá-
me a mim as pessoas; e os bens toma-os para ti.
Abrão, porém, respondeu ao rei de Sodoma:
Levanto minha mão ao Senhor, o Deus Altíssimo, o
Criador dos céus e da terra, jurando que não
tomarei coisa alguma de tudo o que é teu, nem um
fio, nem uma correia de sapato, para que não digas:
Eu enriqueci a Abrão; salvo tão somente o que os
mancebos comeram, e a parte que toca aos homens
Aner, Escol e Manre, que foram comigo; que estes
tomem a sua parte. (Génesis 14:18)

Note-se a sequência dos acontecimentos. Os reis,


envolvidos na guerra, reinavam sobre cidades e
pequenas regiões. O rei de Jerusalém, embora não fizesse
22 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

parte do conflito, surge como sacerdote de Deus, além da


sua função de monarca.
É um facto muito interessante, tendo em conta que
os sacerdotes de Deus surgem muito mais tarde no
sacerdócio levítico. As explicações mais populares,
acerca do sacerdote misterioso Melquisedeque, são de
que era Sem, o filho de Noé, ou o próprio Filho de Deus
antes da encarnação, numa das suas teofanias.
Avaliando apenas o que o texto diz, parece que o
rei de Jerusalém era alguém conhecido de Abraão e dos
outros reis. É identificado como o rei da cidade vizinha,
tal como o eram os demais reis das outras cidades
próximas. Este rei tinha algo que os outros não tinham:
era sacerdote do Deus Altíssimo.
Lembremo-nos que Abraão pertencia à
descendência de Sem e o Deus Altíssimo era conhecido
por eles, transmitido de geração em geração desde Noé.
Porém, o culto ao Deus verdadeiro estava também
misturado com a cultura religiosa dos povos pagãos da
época. Apesar disso, este rei da cidade de Salém,
chamada Jebus e depois Jerusalém, era sacerdote do
Deus Altíssimo.
Outro sacerdote anterior à linhagem levítica foi
Jetro, o sogro de Moisés (Êxodo 3:1). Também este era
sacerdote de Deus, ao ponto de aconselhar o seu genro
Moisés por diversas vezes. Poucos notam que Jetro vivia
na região de Midiã e que Midiã foi descendente de
Abraão, filho da segunda mulher que tomou depois da
morte de Sara, chamada Quetura (Génesis 25:1-4). Jetro
descendente de Abraão tornou-se sacerdote de Deus na
área onde vivia. Foi no monte próximo dessa região que
Moisés encontrou Deus na sarça que não se consumia
pelo fogo.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 23

Pouco sabemos acerca de como Jetro exercia o seu


sacerdócio, e pouco sabemos também acerca de
Melquisedeque. Estes sacerdotes não tinham uma Lei
escrita para os orientar no sacerdócio, como tinham os
sacerdotes segundo a ordem levítica posterior. No
entanto, o Messias é intitulado “sacerdote segundo a ordem
de Melquisedeque”:

Jurou o Senhor, e não se arrependerá: Tu és sacerdote


para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.
(Salmo 110:4)

Sendo por Deus chamado sumo-sacerdote, segundo


a ordem de Melquisedeque. Sobre isso temos muito
que dizer, mas de difícil interpretação, porquanto vos
tornastes tardios em ouvir. (Hebreus 5:10-11)

Aonde Jesus, como precursor, entrou por nós, feito


sacerdote para sempre, segundo a ordem de
Melquisedeque. (Hebreus 6:20)

Porque este Melquisedeque, rei de Salém, sacerdote


do Deus Altíssimo, que saiu ao encontro de Abraão
quando este regressava da matança dos reis, e o
abençoou, a quem também Abraão separou o dízimo
de tudo (sendo primeiramente, por interpretação do
seu nome, rei de justiça, e depois também rei de
Salém, que é rei de paz; sem pai, sem mãe, sem
genealogia, não tendo princípio de dias nem fim de
vida, mas feito semelhante ao Filho de Deus),
permanece sacerdote para sempre. Considerai, pois,
quão grande era este, a quem até o patriarca Abraão
deu o dízimo dentre os melhores despojos. E os que
dentre os filhos de Levi recebem o sacerdócio têm
ordem, segundo a lei, de tomar os dízimos do povo,
24 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

isto é, de seus irmãos, ainda que estes também


tenham saído dos lombos de Abraão; mas aquele
cuja genealogia não é contada entre eles, tomou
dízimos de Abraão, e abençoou ao que tinha as
promessas. Ora, sem contradição alguma, o menor é
abençoado pelo maior. E aqui certamente recebem
dízimos homens que morrem; ali, porém, os recebe
aquele de quem se testifica que vive. E, por assim
dizer, por meio de Abraão, até Levi, que recebe
dízimos, pagou dízimos, porquanto ele estava ainda
nos lombos de seu pai quando Melquisedeque saiu
ao encontro deste. (Hebreus 7:1-10)

O autor de Hebreus, que muitos identificam como


Paulo, considera que este Melquisedeque era alguém
superior a Abraão, por isso este lhe entregou o seu
dízimo. Comparando o sacerdócio levítico dos
descendentes de Arão com Melquisedeque, o autor
afirma: “aqui certamente recebem dízimos homens que
morrem; ali, porém, os recebe aquele de quem se testifica que
vive”. É esta frase que conduz à defesa de que
Melquisedeque era uma manifestação do Filho de Deus
antes da sua encarnação. Hebreus compara os sacerdotes
levíticos, que são homens que morrem, com
Melquisedeque, “de quem se testifica que vive”. É
realmente um argumento muito forte!
O autor exorta os destinatários da Carta a
crescerem e de seguida fala deste Melquisedeque, como
sendo um assunto para crentes com maturidade. Não
especularemos além do que diz o texto, mas ficamos com
uma certeza, este Melquisedeque era parte de uma
linhagem de sacerdotes, retomada depois da
interrupção do sacerdócio levítico. Este sacerdócio
segundo a ordem de Melquisedeque adquiriu um novo
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 25

sumo-sacerdote, o mais excelente, o Filho de Deus


ressurreto. Este novo sumo-sacerdócio é descrito no livro
de Hebreus:

Mas este com juramento daquele que lhe disse: Jurou


o Senhor, e não se arrependerá: Tu és sacerdote para
sempre), de tanto melhor pacto Jesus foi feito fiador.
E, na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em
grande número, porque pela morte foram impedidos
de permanecer, mas este, porque permanece para
sempre, tem o seu sacerdócio perpétuo. Portanto,
pode também salvar perfeitamente os que por ele se
chegam a Deus, porquanto vive sempre para
interceder por eles. Porque nos convinha tal sumo-
sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos
pecadores, e feito mais sublime que os céus; que não
necessita, como os sumos-sacerdotes, de oferecer
cada dia sacrifícios, primeiramente por seus próprios
pecados, e depois pelos do povo; porque isto fez ele,
uma vez por todas, quando se ofereceu a si mesmo.
Porque a lei constitui sumos-sacerdotes a homens que
têm fraquezas, mas a palavra do juramento, que veio
depois da lei, constitui ao Filho, para sempre
aperfeiçoado. (Hebreus 7:21-28)

O Filho de Deus tornou-se sacerdote para sempre,


segundo a ordem de Melquisedeque. Podemos concluir
que esta ordem recebe dízimos. Contudo há muitas
diferenças na forma como este sacerdócio recebe
dízimos.
Primeiramente, Abraão oferece voluntariamente ao
sacerdote de Deus. Não lhe foi imposto que oferecesse
nada, logo também não lhe foi imposta a percentagem a
entregar. Teve tudo origem no seu coração! Outra
diferença do dízimo levítico foi que a oferta não se
26 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

destinava ao funcionamento de um templo, pois não


existia semelhante coisa na época. A terceira diferença
importante é que não era uma oferta periódica ou
exaustiva, ou seja, Abraão não oferecia continuamente o
dízimo de todos os bens. Fê-lo apenas naquela ocasião
especial como forma de agradecer a Deus a vitória tão
importante.
Resumindo, foi um ato voluntário, desinteressado
e único, expressando devoção e gratidão. A oferta de
dízimos no sacerdócio levítico é obrigatória por
mandamento, tem recompensas prometidas pelo ato e é
aplicada a toda a renda obtida continuamente. Existem
mais diferenças, mas estas são as principais.

SACERDÓCIOS / DÍZIMO
Levítico Ordem de Melquisedeque
mandamento voluntário
periódico variável
percentagem imposta sem imposição
para templo e levitas para sacerdote
maldição pela omissão não há maldição

Antes deste episódio, existem relatos de diversas


aparições divinas a Abraão. Ele ouvia e via Deus falando
de forma muito próxima. Abraão tinha por hábito erguer
altares de adoração, onde invocava o nome do Senhor.

Apareceu, porém, o Senhor a Abrão, e disse: À tua


semente darei esta terra. Abrão, pois, edificou ali um
altar ao Senhor, que lhe aparecera. Então passou dali
para o monte ao oriente de Betel, e armou a sua
tenda, ficando-lhe Betel ao ocidente, e Ai ao oriente;
também ali edificou um altar ao Senhor, e invocou o
nome do Senhor. (Génesis 12:7-8)
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 27

Nas suas jornadas subiu do Negebe para Betel, até o


lugar onde outrora estivera a sua tenda, entre Betel e
Ai, até o lugar do altar, que dantes ali fizera; e ali
invocou Abrão o nome do Senhor. (Génesis 13:34)

Abraão plantou uma tamargueira em Beer-Seba, e


invocou ali o nome do Senhor, o Deus eterno.
(Génesis 21:33)

Não são relatadas outras ofertas materiais. Abraão


apenas invoca o nome de Deus em adoração. Essa é, no
entanto, a oferta superior a todas as ofertas. Só em casos
excecionais, Abraão sacrificou animais, como quando
Deus o provou para imolar o seu filho e quando Deus fez
aliança com ele:

Nisso levantou Abraão os olhos e olhou, e eis atrás de


si um carneiro embaraçado pelos chifres no mato; e
foi Abraão, tomou o carneiro e o ofereceu em
holocausto em lugar de seu filho. (Génesis 22:13)

Respondeu-lhe: Toma-me uma novilha de três anos,


uma cabra de três anos, um carneiro de três anos,
uma rola e um pombinho. Ele, pois, lhe trouxe todos
estes animais, partiu-os pelo meio, e pôs cada parte
deles em frente da outra; mas as aves não partiu. E as
aves de rapina desciam sobre os cadáveres; Abrão,
porém, as enxotava. Ora, ao pôr do sol, caiu um
profundo sono sobre Abrão; e eis que lhe
sobrevieram grande pavor e densas trevas. Então
disse o Senhor a Abrão: Sabe com certeza que a tua
descendência será peregrina em terra alheia, e será
reduzida à escravidão, e será afligida por
quatrocentos anos; sabe também que eu julgarei a
nação a qual ela tem de servir; e depois sairá com
28 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

muitos bens. Tu, porém, irás em paz para teus pais;


em boa velhice serás sepultado. Na quarta geração,
porém, voltarão para cá; porque a medida da
iniquidade dos amorreus não está ainda cheia.
Quando o sol já estava posto, e era escuro, eis um
fogo fumegante e uma tocha de fogo, que passaram
por entre aquelas metades. Naquele mesmo dia fez o
Senhor um pacto com Abrão, dizendo: À tua
descendência tenho dado esta terra, desde o rio do
Egito até o grande rio Eufrates; e o queneu, o
quenizeu, o cadmoneu, o heteu, o perizeu, os refains,
o amorreu, o cananeu, o girgaseu e o
jebuseu.(Génesis 15:9-21)

A regra na vida de Abraão era adorar o Senhor,


invocando o seu nome. Exceto no encontro com
Melquisedeque, nunca é relatada oferta material alguma,
do tipo que entregou a Melquisedeque. Porém, Abraão
foi um dos homens mais prósperos da Bíblia. Este era um
homem de grande proximidade com Deus, falando com
Deus como quem fala com seu amigo (Isaías 41:8; Tiago
2:23). Havia um relacionamento afetuoso entre Deus e
Abraão, por isso Abraão podia interceder perante Deus
da forma como o fazia (Génesis 18:23-33).
A riqueza material de Abraão era consequência do
relacionamento e não de algo material que ele desse.
Muitos homens ímpios eram ricos também. A riqueza
material em geral não pode ser considerada apenas
reflexo da bênção divina. Por vezes, os homens bíblicos
passaram necessidades e dificuldades materiais e isso
nada tem a ver com a sua fidelidade a Deus.
É a provisão das necessidades, que Deus assegura
aos seus servos e não riqueza. Quando a fome assolava a
terra, Deus deixava-os peregrinar em terra estranha ou
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 29

milagrosamente lhes dava sustento.


A riqueza do ímpio, ou ausência desta, coexistirá
com a riqueza do justo ou ausência desta, até ao final dos
tempos. Existirão sempre justos pobres materialmente e
justos ricos materialmente, assim como ímpios ricos e
ímpios pobres.
30 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 31

A Prosperidade de Isaque
Isaque teve na sua juventude uma experiência
inesquecível… Seu Pai Abraão quase o imolou em
sacrifício! O que terá ficado dessa experiência? Quando a
sua vida parecia estar no fim, Deus interveio e proveu
um cordeiro para seu substituto.
As Escrituras dizem-nos que ele saía ao campo a
meditar (Génesis 24:63). Gostava de saber o que pensava
este homem acerca da sua vida e especialmente acerca de
Deus. Certamente, Abraão contou-lhe como fora fruto da
promessa divina… Depois, Deus quase toma a sua vida
num sacrifício semelhante ao que faziam os pagãos aos
seus deuses!
Isaque, o filho da promessa, era também o herdeiro
da promessa. Ele foi um homem muito próspero, tal
como o seu pai Abraão. Prosperava visivelmente diante
de todos:

Isaque semeou naquela terra, e no mesmo ano colheu


o cêntuplo; e o Senhor o abençoou. E engrandeceu-se
o homem; e foi-se enriquecendo até que se tornou
mui poderoso; e tinha possessões de rebanhos e de
gado, e muita gente de serviço; de modo que os
filisteus o invejavam. (Génesis 26:12-14)

Por vezes, acontece que Deus, devido a um seu


propósito, traz uma bênção material especial sobre
32 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

alguém. Foi assim com Isaque, filho de Abraão. Isto não


significa que estes homens sejam menos fiéis em
momentos da sua vida com mais dificuldades.
Tal como seu pai, Isaque erguia altares de adoração.
Da mesma forma, Deus revelou-se a ele:

E apareceu-lhe o Senhor na mesma noite e disse: Eu


sou o Deus de Abraão, teu pai; não temas, porque eu
sou contigo, e te abençoarei e multiplicarei a tua
descendência por amor do meu servo Abraão. Isaque,
pois, edificou ali um altar e invocou o nome do
Senhor; então armou ali a sua tenda, e os seus servos
cavaram um poço. (Génesis 26:24-25)

Não é referido mais acerca de Isaque, mas temos a


perceção de que seguiu a Deus durante a sua vida,
apesar de não ter a mesma intimidade com o Senhor que
teve Abraão.
Nada é dito acerca de ofertas materiais ou
sacrifícios, apesar da sua grande abundância material.
Isaque herdou o mais importante: a adoração a Deus. A
sua prosperidade poderia vir da bênção de Deus sobre o
seu pai, mas creio que acima de tudo, a bênção divina o
acompanhava porque aprendera a relacionar-se com o
Criador, adorando-o.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 33

O Dízimo de Jacob
Depois do dízimo ofertado por Abraão ao sacerdote
misterioso, surge a promessa de outra oferta dizimista
voluntária. Tendo enganado a seu pai e a seu irmão,
surripiando a bênção destinada a Esaú, Jacob é enviado a
Harã. Deveria procurar uma noiva da mesma família de
Abraão e de Rebeca, esposa de Isaque e sua mãe.
Sozinho, durante o caminho, Jacob teve o primeiro
encontro com Deus:

Partiu, pois, Jacó de Beer-Seba e se foi em direção a


Harã; e chegou a um lugar onde passou a noite,
porque o sol já se havia posto; e, tomando uma das
pedras do lugar e pondo-a debaixo da cabeça, deitou-
se ali para dormir. Então sonhou: estava posta sobre a
terra uma escada, cujo topo chegava ao céu; e eis que
os anjos de Deus subiam e desciam por ela; por cima
dela estava o Senhor, que disse: Eu sou o Senhor, o
Deus de Abraão teu pai, e o Deus de Isaque; esta
terra em que estás deitado, eu a darei a ti e à tua
descendência; e a tua descendência será como o pó da
terra; dilatar-te-ás para o ocidente, para o oriente,
para o norte e para o sul; por meio de ti e da tua
descendência serão benditas todas as famílias da
terra. Eis que estou contigo, e te guardarei por onde
quer que fores, e te farei tornar a esta terra; pois não
te deixarei até que haja cumprido aquilo de que te
tenho falado. Ao acordar Jacó do seu sono, disse:
34 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Realmente o Senhor está neste lugar; e eu não o sabia.


E temeu, e disse: Quão terrível é este lugar! Este não é
outro lugar senão a casa de Deus; e esta é a porta dos
céus. Jacó levantou-se de manhã cedo, tomou a pedra
que pusera debaixo da cabeça, e a pôs como coluna; e
derramou-lhe azeite em cima. E chamou aquele lugar
Betel; porém o nome da cidade antes era Luz. Fez
também Jacó um voto, dizendo: Se Deus for comigo
e me guardar neste caminho que vou seguindo, e me
der pão para comer e vestes para vestir, de modo que
eu volte em paz à casa de meu pai, e se o Senhor for o
meu Deus, então esta pedra que tenho posto como
coluna será casa de Deus; e de tudo quanto me deres,
certamente te darei o dízimo. (Génesis 28-10-22)

Deus apareceu em sonhos a Jacob e falou com ele.


Aparentemente Jacob não conhecia Deus pessoalmente.
As suas atitudes eram cheias de engano e egoísmo. Em
Betel, Deus inicia o processo transformador de Jacob,
estando ele de mãos vazias, longe das riquezas do pai,
que cobiçara a ponto de separar a família. Jacob quisera
tudo para si e agora iniciava o caminho de aprender que
o seu ‘tudo’ deveria vir de Deus e não através de roubar
e enganar.
Este é o dia em que faz um voto e pede ao Deus de
Abraão e Isaque que se torne o seu Deus. O voto
consistia na promessa de entregar o dízimo de tudo o
que possuísse, se Deus se tornasse o seu Deus,
protegendo-o e fazendo-o voltar à casa de seu pai.
Mais tarde na Lei de Moisés, existiriam regras para
quem desejasse fazer um voto. O próprio casamento é
chamado de voto conjugal (Números 5:20). O nazireado
era considerado um voto especial e consistia, entre
outras coisas, em não cortar o cabelo, nem beber bebidas
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 35

alcoólicas (Números 6:2-5). O voto podia consistir


também numa oferta (Números 15:3). Em Atos, Paulo
rapou a cabeça (Atos 18:18) e são referidos também
outros membros da igreja em Jerusalém fazendo voto
(Atos 21:23).
O voto nada mais é que uma promessa em oração
de fazer algo, normalmente com um propósito
determinado. Um voto tem por base uma oração e na
sua prática é um tipo de jejum em sentido amplo, mas
além de poder ser a abstenção de algo, pode incluir uma
determinada prática também. Pode ser por exemplo a
promessa de apoiar um determinado missionário.
Quando a promessa é feita diante de Deus, ele a
toma como voto e exige que seja cumprida assim como
está escrito em Deuteronómio 23:21-22 e Números 30:2.
Deus não pede a ninguém para fazer votos, no entanto
se alguém os fizer, deve cumpri-los.
No contexto do nosso tema, Jacob fez o voto de dar
o dízimo de tudo, mas de forma condicional. Ele não
prometeu desinteressadamente. Dá-lo-ia apenas se
tivesse consciência de que Deus era com ele,
abençoando-o como o fizera com Abraão e com seu pai.
Este é um dízimo muito diferente de todas as
referências a dízimo na Bíblia. No caso de Abraão foi um
ato de gratidão, voluntário e desinteressado. Não foi
totalmente negativa a atitude de Jacob, embora possa
parecer de mero interesse pessoal. Ele não conhecia Deus
de forma próxima, mas tinha conhecimento de que era o
Deus verdadeiro e que abençoara os seus antepassados.
Ele sabia que se queria ser protegido e abençoado
deveria dirigir-se à pessoa certa. Por outro lado, a
iniciativa de o chamar foi do próprio Senhor ao aparecer-
lhe no sonho.
36 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Não devemos de modo algum imitar esta forma de


ofertar, sejam dízimos ou qualquer outro tipo de oferta.
Se alguém decide dar a Deus, deve fazê-lo sem
condições. Jacob iria aprender isso com o tempo e
compreenderia que Deus não precisa dos nossos bens,
mas quer acima de tudo o nosso coração.
Jacob ficou longe da sua terra, durante vinte anos e
depois voltou. Regressou com mulheres, filhos e bens em
abundância. Não era mais o mesmo homem! Já nada
desejou daquilo que pertencera a seu pai, como antes
fizera… Aprendera que apenas Deus lhe bastava e que
Deus era com ele de forma muito superior à troca de
favores.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 37

As Primícias na Lei
Segundo o Senhor ensinou, em Mateus 22:36-40, a
Lei de Moisés tem como mandamentos principais e
maiores: 1º ) “amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu
coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças”
(Deuteronómio 6:5) e 2º ) “não te vingarás nem guardarás
ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo
como a ti mesmo” (Levítico 19:18). De seguida, os
mandamentos mais importantes são os contidos nas
Tábuas da Aliança, escritas pelo dedo de Deus no Sinai,
conhecidos por Dez Mandamentos ou Dez Palavras.
Estes mandamentos enunciam de forma prática
como, no entender de Deus, o podemos amar e como
amar o próximo. É curioso que nenhum dos Dez
mandamentos se refere a dar a Deus bens materiais.
Depois destes, a Lei de Moisés integra muitos
outros mandamentos que pormenorizam ainda mais a
forma como o povo de Deus devia obedecer-lhe. Muitos
são princípios universais que ainda hoje nos ajudam a
amar a Deus e a amar o próximo. Outros, contudo, não
se aplicam quer por razões culturais, quer pela mudança
de sumo-sacerdote, ou por outras diversas razões.
Restringindo-nos ao nosso tema, vejamos o que
podemos retirar da Lei de Moisés que seja relevante para
o nosso estudo. Começando pelo período que antecedeu
a entrega da Lei, o princípio da entrega das primícias
38 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

surge logo quando a saída do Egipto estava sendo


preparada:

Santifica-me todo primogénito, todo o que abrir a


madre de sua mãe entre os filhos de Israel, assim de
homens como de animais; porque meu é. (Êxodo
13:2)

Também quando o Senhor te houver introduzido na


terra dos cananeus, como jurou a ti e a teus pais,
quando te houver dado, separarás para o Senhor
tudo o que abrir a madre, até mesmo todo
primogénito dos teus animais; os machos serão do
Senhor. Mas todo primogénito de jumenta resgatarás
com um cordeiro; e, se o não quiseres resgatar,
quebrar-lhe-ás a cerviz; e todo primogénito do
homem entre teus filhos resgatarás. (Êxodo 13:11-13)

À primeira vista, estes textos parecem não estar


relacionados com primícias ou ofertas, mas têm tudo a
ver. Estes quatro versículos fazem-nos lembrar a oferta
de Abel, pois este ofereceu também os primogénitos do
seu rebanho. Deus manda que lhe seja oferecido todo o
primogénito dos animais, ou seja, a primeira cria de cada
animal. Quanto aos homens, Deus não pediria da mesma
forma, mas pede o resgate do primogénito. Isto significa,
que embora o primogénito não fosse sacrificado, seria
oferecida uma oferta no seu lugar.
O princípio da entrega dos primogénitos tem uma
importância extrema, pois é uma figura da entrega do
Filho de Deus. Ele foi chamado de “Primogénito” depois
da ressurreição:

Porque os que dantes conheceu, também os


predestinou para serem conformes à imagem de seu
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 39

Filho, a fim de que ele seja o primogénito entre


muitos irmãos; (Romanos 8:29)

Também ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o


princípio, o primogénito dentre os mortos, para que
em tudo tenha a preeminência. (Colossenses 1:18)

E outra vez, ao introduzir no mundo o primogénito,


diz: E todos os anjos de Deus o adorem. (Hebreus
1:6)

E da parte de Jesus Cristo, que é a fiel testemunha, o


primogénito dos mortos e o Príncipe dos reis da
terra. Àquele que nos ama, e pelo seu sangue nos
libertou dos nossos pecados. (Apocalipse 1:5)

O Filho de Deus Unigénito, ou seja, o único Filho de


Deus, tornou-se um primogénito. Depois da ressurreição,
cada homem que nele crer e nascer de novo, torna-se
também filho de Deus. Intitula-se “primogénito dos
mortos”, porque Cristo foi o precursor dos homens no
Lugar Santíssimo, onde Deus habita (I Coríntios 15:22).
Ele foi o primeiro entre os homens a ressuscitar com um
corpo glorificado e eterno, pois todos os homens que
morreram estão ainda despidos do seu corpo. Listo
algumas passagens onde baseio estas afirmações:

Porque, na verdade, nós, os que estamos neste


tabernáculo, gememos oprimidos, porque não
queremos ser despidos, mas sim revestidos, para que
o mortal seja absorvido pela vida. (II Coríntios 5:4)

E, assim como trouxemos a imagem do terreno,


traremos também a imagem do celestial. Mas digo
isto, irmãos, que carne e sangue não podem herdar o
40 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

reino de Deus; nem a corrupção herda a


incorrupção. Eis aqui vos digo um mistério: Nem
todos dormiremos mas todos seremos
transformados, num momento, num abrir e fechar de
olhos, ao som da última trombeta; porque a trombeta
soará, e os mortos serão ressuscitados
incorruptíveis, e nós seremos transformados.
Porque é necessário que isto que é corruptível se
revista da incorruptibilidade e que isto que é mortal
se revista da imortalidade. (I Coríntios 15:49-53)

Tendo pois, irmãos, ousadia para entrarmos no


santíssimo lugar, pelo sangue de Jesus, pelo caminho
que ele nos inaugurou, caminho novo e vivo, através
do véu, isto é, da sua carne, e tendo um grande
sacerdote sobre a casa de Deus, cheguemo-nos com
verdadeiro coração, em inteira certeza de fé; tendo o
coração purificado da má consciência, e o corpo
lavado com água limpa. (Hebreus 10:19-22)

Porque também Cristo morreu uma só vez pelos


pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a
Deus; sendo, na verdade, morto na carne, mas
vivificado no espírito; no qual também foi, e pregou
aos espíritos em prisão; os quais noutro tempo foram
rebeldes, quando a longanimidade de Deus esperava,
nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca; na
qual poucas, isto é, oito almas se salvaram através da
água, que também agora, por uma verdadeira figura-
o batismo, vos salva, o qual não é o despojamento da
imundícia da carne, mas a indagação de uma boa
consciência para com Deus, pela ressurreição de Jesus
Cristo, que está à destra de Deus, tendo subido ao
céu; havendo-se-lhe sujeitado os anjos, e as
autoridades, e as potestades. (I Pedro 3:18-22)
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 41

Vejamos agora um paralelo. Assim como Cristo é


chamado de “primogénito dos mortos”, também é chamado
de “primícias dos que dormem”:

Mas na realidade Cristo foi ressuscitado dentre os


mortos, sendo ele as primícias dos que dormem. (I
Coríntios 15:20)

Cada um, porém, na sua ordem: Cristo as primícias,


depois os que são de Cristo, na sua vinda. (I
Coríntios 15:23)

As primícias são os primeiros frutos de cada


colheita anual. Em sentido mais lato, as primícias podem
ser a primeira renda, o primeiro lucro, o melhor inicial
de cada proveito. As primícias não são um ato contínuo
de todos os rendimentos periódicos. São apenas, como a
palavra significa, “os primeiros frutos”.
A Festa das Primícias foi ordenada na Lei, como
uma das festas principais. Consistia na entrega dos
primeiros frutos, sete semanas após o sacrifício da
Páscoa. A oferta era anual e era um mandamento:

Também guardarás a festa da sega, a das primícias


do teu trabalho, que houveres semeado no campo;
igualmente guardarás a festa da colheita à saída do
ano, quando tiveres colhido do campo os frutos do
teu trabalho. (Êxodo 23:16)

As primícias dos primeiros frutos da tua terra trarás


à casa do Senhor teu Deus. Não cozerás o cabrito no
leite de sua mãe. (Êxodo 23:19)

A passagem paralela é Êxodo 34:22-26. Esta é a festa


que ficou conhecida por Pentecostes, com origem no
42 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

termo grego para “cinquenta”, pois ocorria cerca de


cinquenta dias depois da Páscoa. Na Festa das Primícias
que se seguiu à ressurreição, os crentes receberam as
primícias do Espírito (Romanos 8:23).
Outros textos que referem primícias são1: Levítico
2:12,14; 23:10,17,20; Números 15:20-21; 18:12; 28:26;
Deuteronómio 18:4; 21:17; 26:2,10; II Reis 4:42; II Crónicas
31:5; Neemias 10:35,37; 12:44; 13:21; Salmos 78:51, 105:36;
Provérbios 3:9; Jeremias 2:3; Ezequiel 20:40; 44:30; 48:14.
Além da oferta das primícias, a Lei estipulava uma
grande lista de ofertas com diversos fins. Não
analisaremos todos esses tipos de ofertas, pois faziam
parte do complexo serviço do Sacerdócio Levítico. Uma
leitura dos últimos quatro livros do Pentateuco será
completamente esclarecedora para quem se interesse
pelo assunto.
Importa distinguir que primícias não são dízimos.
A diferença é que as primícias não implicavam dez por
cento. Era uma oferta que não impunha uma quantidade
determinada. Eram o melhor, o princípio, o começo da
riqueza em cada ano. Servia para honrar a Deus, o dador
da vida, a origem do sustento e prosperidade. Segundo o
mandamento divino, as primícias eram entregues
anualmente, mas o dízimo era dado continuamente, em
cada rendimento usufruído, segundo as leis do
sacerdócio levítico.

http://www.biblestudytools.com/search/?q=firstfruits+&s=References&rc
=LEX&rc2=LEX+HEB
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 43

O Dízimo para os Levitas


Além do ato voluntário de gratidão de Abraão e do
voto de Jacob, a Bíblia só fala em dízimos no contexto
do Sacerdócio Levítico. Mesmo no Evangelho de
Mateus, quando Cristo se refere ao dízimo na conversa
com os fariseus (Mateus 23:23), é no contexto do
sacerdócio levítico, pois o Templo só foi destruído no
ano 70.
O Messias veio debaixo da Lei (Gálatas 4:4), nunca
a infringindo, antes ensinando o seu real sentido e
propósito. Trataremos deste ponto num capítulo
específico. Vejamos o mandamento:

Também todos os dízimos da terra, quer dos cereais,


quer do fruto das árvores, pertencem ao senhor;
santos são ao Senhor. Se alguém quiser remir uma
parte dos seus dízimos, acrescentar-lhe-á a quinta
parte. Quanto a todo dízimo do gado e do rebanho,
de tudo o que passar debaixo da vara, esse dízimo
será santo ao Senhor. (Levítico 27:30-32)

O dízimo tinha como objetivo sustentar a tribo de


Levi que era dedicada totalmente ao Tabernáculo e
posteriormente ao Templo. Os levitas, dos quais faziam
parte os sacerdotes, não tinham terra própria, como as
restantes tribos. Eles habitavam em cidades reservadas
por todo o Israel e eram chamados periodicamente a
44 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

cumprir o seu serviço no Templo.

Eis que aos filhos de Levi tenho dado todos os


dízimos em Israel por herança, pelo serviço que
prestam, o serviço da tenda da revelação. Porque os
dízimos que os filhos de Israel oferecerem ao Senhor
em oferta alçada, eu os tenho dado por herança aos
levitas; porquanto eu lhes disse que nenhuma
herança teriam entre os filhos de Israel. Também
falarás aos levitas, e lhes dirás: Quando dos filhos de
Israel receberdes os dízimos, que deles vos tenho
dado por herança, então desses dízimos fareis ao
Senhor uma oferta alçada, o dízimo dos dízimos.
Assim fareis ao Senhor uma oferta alçada de todos os
vossos dízimos, que receberdes dos filhos de Israel; e
desses dízimos dareis a oferta alçada do Senhor a
Arão, o sacerdote. Portanto lhes dirás: Quando
fizerdes oferta alçada do melhor dos dízimos, será ela
computada aos levitas, como a novidade da eira e
como a novidade do lagar. (Números 18.21-31)

Os dízimos deveriam ser entregues exclusivamente


em Jerusalém, assim como os primogénitos e as restantes
ofertas. Algo muito curioso era que os dízimos eram
também para aquele que os oferecia. A pessoa trazia o
dízimo e comia aquilo que trazia diante de Deus.
Simplesmente, Deus requeria que fossem partilhados
com os levitas.
Quem vinha entregar o dízimo deveria comê-lo
perante o Senhor e partilhar dele com a tribo de Levi. Se
fossem sacrifícios de animais, havia também uma parte
que poderia ser comida e outra queimada. É interessante
que os levitas deviam oferecer o dízimo do dízimo a
Deus e ao sumo-sacerdote Arão. O dízimo devia sempre
ser trazido a Jerusalém:
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 45

A esse lugar trareis os vossos holocaustos e


sacrifícios, e os vossos dízimos e a oferta alçada da
vossa mão, e os vossos votos e ofertas voluntárias, e
os primogénitos das vossas vacas e ovelhas;
(Deuteronómio 12:6)

Então haverá um lugar que o Senhor vosso Deus


escolherá para ali fazer habitar o seu nome; a esse
lugar trareis tudo o que eu vos ordeno: os vossos
holocaustos e sacrifícios, os vossos dízimos, a oferta
alçada da vossa mão, e tudo o que de melhor
oferecerdes ao Senhor em cumprimento dos votos
que fizerdes. (Deuteronómio 12:11)

Dentro das tuas portas não poderás comer o dízimo


do teu grão, do teu mosto e do teu azeite, nem os
primogénitos das tuas vacas e das tuas ovelhas, nem
qualquer das tuas ofertas votivas, nem as tuas ofertas
voluntárias, nem a oferta alçada da tua mão;
(Deuteronómio 12:17)

O dízimo era uma forma de reconhecer que era


Deus quem fazia provisão na vida do ofertante, como
está escrito: “para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus
por todos os dias” (Deuteronómio 14:23). Existem ainda
instruções acerca de quem morava distante de Jerusalém.
Essas pessoas deviam vender o seu dízimo e depois
quando chegassem compravam, com todo o dinheiro,
tudo aquilo que os fizesse alegrar na presença de Deus.

Certamente darás os dízimos de todo o produto da


tua semente que cada ano se recolher do campo. E,
perante o Senhor teu Deus, no lugar que escolher
46 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

para ali fazer habitar o seu nome, comerás os


dízimos do teu grão, do teu mosto e do teu azeite, e
os primogénitos das tuas vacas e das tuas ovelhas;
para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus por
todos os dias. Mas se o caminho te for tão comprido
que não possas levar os dízimos, por estar longe de
ti o lugar que Senhor teu Deus escolher para ali por
o seu nome, quando o Senhor teu Deus te tiver
abençoado; então vende-os, ata o dinheiro na tua
mão e vai ao lugar que o Senhor teu Deus escolher.
E aquele dinheiro darás por tudo o que desejares,
por bois, por ovelhas, por vinho, por bebida forte, e
por tudo o que te pedir a tua alma; comerás ali
perante o Senhor teu Deus, e te regozijarás, tu e a tua
casa. Mas não desampararás o levita que está dentro
das tuas portas, pois não tem parte nem herança
contigo. Ao fim de cada terceiro ano levarás todos os
dízimos da tua colheita do mesmo ano, e os
depositarás dentro das tuas portas. Então virá o
levita (pois nem parte nem herança tem contigo), o
peregrino, o órfão, e a viúva, que estão dentro das
tuas portas, e comerão, e fartar-se-ão; para que o
Senhor teu Deus te abençoe em toda obra que as tuas
mãos fizerem. (Deuteronómio 14:22-29)

Quando acabares de separar todos os dízimos da tua


colheita do terceiro ano, que é o ano dos dízimos, dá-
los-ás ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva,
para que comam dentro das tuas portas, e se fartem.
(Deuteronómio 26:12)

No terceiro ano, o dízimo seria integralmente para


os levitas e também para outros necessitados. Os anos
eram divididos em semanas de anos, sendo o sétimo um
ano de pousio para as terras. Neste ciclo, o terceiro ano
seria destinado exclusivamente para os levitas e
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 47

necessitados. Parece que nesse ano o ofertante não


comeria do seu dízimo. Este seria integralmente para
dar, mas não apenas aos levitas. Destinava-se também a
todos os mais carenciados.
O dízimo era bem diferente daquilo que podemos
imaginar se não estudarmos as Escrituras e é distinto das
primícias: “os filhos de Israel trouxeram em abundância as
primícias de trigo, mosto, azeite, mel e todo produto do campo;
também trouxeram em abundância o dízimo de tudo” (II
Crónicas 31:5). Outras referências sobre o dízimo são: I
Samuel 8:15; II Crónicas 31:5; Neemias 10:37,38; 12:44;
13:5,12.
Que princípios podemos reter? O dízimo tinha
como propósito abençoar o próprio ofertante fazendo-o
alegrar-se perante Deus. Uma parte seria para os levitas,
mas não na totalidade. Além disso, essa parte não seria
ainda apenas para levitas, mas também para órfãos,
viúvas e outros necessitados do povo.
O dízimo destinava-se a ser partilhado entre o povo
e os levitas. Deus alegra-se com este equilíbrio: a
prosperidade do povo por um lado e o suprimento
material dos que o servem por outro. Desequilibrar a
balança traz problemas, pois um dos lados ficará
penalizado e a vontade perfeita de Deus não será
alcançada.
O dízimo fora do contexto levítico só existe como
oferta voluntária. Ele estava ligado à tribo dos levitas.
Não podemos dizer que os levitas de hoje são os que
abdicam de trabalhos seculares para servirem a Deus e
exigir que os crentes lhes entreguem os seus dízimos.
Isso pode acontecer, mas como ato voluntário e não
como obrigação de mandamento como acontecia na Lei
levítica.
48 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 49

O Dízimo em Malaquias
Malaquias 3:10 é dos textos mais pregados e
conhecidos de toda a Bíblia. É urgente que se leia
atentamente o seu contexto, pois poucos se dão ao
trabalho de ler todo o livro bíblico em que se integra:

Roubará o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e


dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas
ofertas alçadas. Vós sois amaldiçoados com a
maldição; porque a mim me roubais, sim, vós, esta
nação toda. Trazei todos os dízimos à casa do
tesouro, para que haja mantimento na minha casa, e
depois fazei prova de mim, diz o Senhor dos
exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e não
derramar sobre vós tal bênção, que dela vos advenha
a maior abastança. Também por amor de vós
reprovarei o devorador, e ele não destruirá os frutos
da vossa terra; nem a vossa vide no campo lançará o
seu fruto antes do tempo, diz o Senhor dos exércitos.
(Malaquias 3:8-11)

Estes versículos são apenas os mais próximos do


versículo 10, mas não os podemos compreender se não
tivermos conhecido o que estudámos nos capítulos
anteriores e se não estudarmos o Livro de Malaquias na
sua totalidade. Assim, antes de analisarmos Malaquias
3:10, iniciemos pelo começo do livro deste profeta.
Deus começa dizendo que Israel não reconhece o
50 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

seu amor, não o honra, nem o teme. O povo tornara-se


descuidado e desleixado na forma como ofertava a Deus.
Continuavam a praticar o mandamento, mas não
ofereciam da forma como Deus ordenara. Eles
ofereciam a Deus animais doentes e com defeito:

Mas vós o profanais, quando dizeis: A mesa do


Senhor é profana, e o seu produto, isto é, a sua
comida, é desprezível. Dizeis também: Eis aqui, que
canseira! E o lançastes ao desprezo, diz o Senhor dos
exércitos; e tendes trazido o que foi roubado, e o
coxo e o doente; assim trazeis a oferta. Aceitaria eu
isso de vossa mão? Diz o Senhor. Mas seja maldito o
enganador que, tendo animal macho no seu rebanho,
o vota, e sacrifica ao Senhor o que tem mácula;
porque eu sou grande Rei, diz o Senhor dos exércitos,
e o meu nome é temível entre as nações. (Malaquias
1:12-14)

No capítulo 2, Deus dirige-se diretamente aos


sacerdotes e enumera os seus pecados: “fizeram tropeçar a
muitos na lei” (v8), “fizeram aceção de pessoas na lei” (v9),
“casaram com a filha de deus estranho” (v11). Estas
repreensões significam que os sacerdotes, em vez de
ensinarem o povo a cumprir a Lei de Deus, contribuíam
para a sua transgressão. Por outro lado, pecavam não
agindo de igual forma para com todos.
Enquanto isentavam uns de praticar determinados
mandamentos, impunham-nos a outros. São ainda
acusados de casar com mulheres descrentes, fora de
Israel. Não é claro se os próprios sacerdotes o faziam, ou
se apenas permitiam ao povo. Tendo em conta aquilo
que Deus fala posteriormente no texto de Malaquias, é
possível que o fizessem também. De seguida, o Senhor
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 51

responde às queixas de ofertantes. Eles queixavam-se de


que Deus não aceitava as ofertas e sacrifícios:

Todavia perguntais: Porquê? Porque o Senhor tem


sido testemunha entre ti e a mulher da tua
mocidade, para com a qual procedeste deslealmente
sendo ela a tua companheira e a mulher da tua
aliança. E não fez ele somente um, ainda que lhe
sobejava espírito? E por que somente um? Não é que
buscava descendência piedosa? Portanto guardai-vos
em vosso espírito, e que ninguém seja infiel para
com a mulher da sua mocidade. Pois eu detesto o
divórcio, diz o Senhor Deus de Israel, e aquele que
cobre de violência o seu vestido; portanto cuidai de
vós mesmos, diz o Senhor dos exércitos; e não sejais
infiéis. Tendes enfadado ao Senhor com vossas
palavras; e ainda dizeis: Em que o havemos
enfadado? Nisto que dizeis: Qualquer que faz o mal
passa por bom aos olhos do Senhor, e desses é que
ele se agrada; ou: Onde está o Deus do juízo?
(Malaquias 2:14-)

A razão principal (apesar de muitos outros


pecados) de Deus não aceitar as ofertas era porque
repudiavam as suas mulheres, ou seja, o divórcio.
Muito paciente e sabiamente, o Senhor lembra a
criação do homem e de como criou apenas uma mulher
para Adão, enquanto podia ter criado mais, por isso o
homem deve ser fiel a uma única mulher, a mulher com
quem casou na sua mocidade. O mesmo se pode dizer
da mulher para com o seu marido.
Deus é muito forte na sua linguagem: “eu detesto o
divórcio, diz o Senhor Deus de Israel, e aquele que cobre de
violência o seu vestido”. O divórcio tornara-se algo comum
e sem razões válidas. Havia adultério constante e
52 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

desrespeito completo pelo casamento. Deus permitira


que Moisés regulasse o divórcio (Deuteronómio 24:1-4),
por causa da fraqueza humana. Assim, se os sacerdotes
respeitassem as regras estabelecidas, não estariam em
pecado. Embora o divórcio não seja o plano perfeito de
Deus, devido a muitas situações neste mundo decaído,
esse ultimo recurso existe em casos considerados na Lei
de Deus.
O texto dá a entender que havia infidelidade e
consequente divórcio de forma geral, sem regras ou
respeito algum. O Senhor sente-se “enfadado” com as
orações, ofertas e sacrifícios das pessoas que praticam
estas coisas. Os sacerdotes não só o faziam, como
desculpavam quem o fazia, dizendo que Deus não se
importava.
No capítulo 3, é prometido um Mensageiro
especial, chamado de Anjo do Pacto. Este prometido é o
Messias que purificará a Israel dos seus pecados “até que
tragam ao Senhor ofertas em justiça” (Malaquias 3:3).
A razão de Deus não destruir o povo, apesar do seu
pecado, são as promessas feitas aos antepassados. Deus
não volta atrás nas suas promessas, ainda que as possa
adiar devido ao pecado:

Pois eu, o Senhor, não mudo; por isso vós, ó filhos de


Jacó, não sois consumidos. Desde os dias de vossos
pais vos desviastes dos meus estatutos, e não os
guardastes. Tornai vós para mim, e eu tornarei para
vós diz o Senhor dos exércitos. Mas vós dizeis: Em
que havemos de tornar? (Malaquias 3:6-7)

Deus está sempre disposto a perdoar, desde que


haja arrependimento. No entanto, o povo não reconhece
o seu pecado. Continuam a achar que não fazem mal
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 53

algum, por não terem deixado de trazer ofertas. O ritual


prosseguia e havia uma adoração aparente. Porém, Deus
vê o coração e não aceita adoração em pecado
deliberado. Segue-se a conhecida passagem:

Roubará o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e


dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas
ofertas alçadas. Vós sois amaldiçoados com a
maldição; porque a mim me roubais, sim, vós, esta
nação toda. Trazei todos os dízimos à casa do
tesouro, para que haja mantimento na minha casa, e
depois fazei prova de mim, diz o Senhor dos
exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e não
derramar sobre vós tal bênção, que dela vos advenha
a maior abastança. Também por amor de vós
reprovarei o devorador, e ele não destruirá os frutos
da vossa terra; nem a vossa vide no campo lançará o
seu fruto antes do tempo, diz o Senhor dos exércitos.
(Malaquias 3:8-11)

De forma muito agressiva, Deus continua a


repreender, chamando-os de ladrões, pois roubam ao
próprio Deus. O Senhor fala das ofertas e dízimos como
algo que lhe pertence, mesmo que as ofertas sejam
comidas, dadas aos levitas ou sacrificadas. Ainda assim,
é uma oferta agradável a Deus, se for uma oferta
excelente, pura e o melhor, dada com o coração limpo.
O contexto destes versículos é o funcionamento do
Sacerdócio Levítico com as suas leis e ofertas específicas.
Estes dízimos representavam aquilo que a tribo de Levi
deveria receber por não ter terra e por estar ao serviço do
Templo. Pegar nestes poucos versículos e dizer que hoje
quem não der o dízimo será amaldiçoado por estar a
roubar a Deus é completamente descabido. Apenas será
54 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

válido para quem defenda que o Sacerdócio Levítico


permanece hoje. Nesse caso é compreensível. Porém, isso
implica sacrifícios de sangue, ofertas muito complexas e
um sem fim de rituais…
Ainda há outra posição acerca do dízimo. Uma
parte dos líderes cristãos prega que, embora não
estejamos debaixo da lei e a lei tenha sido abolida, alguns
princípios mantêm-se. É o caso do dízimo. Utilizam
Malaquias 3:10 para ensinar sobre dízimos retirando os
versículos do contexto, mas fazem-no sem ter consciência
disso. O dízimo, nos nossos dias, é mais uma tradição
entre os cristãos do que algo baseado numa exegese dos
textos bíblicos.
Uma forma mais ou menos aceitável de colocar o
dízimo como mandamento hoje seria dizer que é um
mandamento da Lei de Moisés, além do Sacerdócio
Levítico e que por isso permanece. Nesse caso a pessoa
está a defender que a Lei permanece até hoje e terá de
explicar porque não pratica cada um dos restantes
mandamentos. Será fácil em relação a muitos deles, mas
não tão fácil em relação a outros. É um argumento
válido, mas tem de ser justificado. De qualquer modo,
mesmo que o mandamento permanecesse, nessa linha de
pensamento, não seria válida a ameaça de maldição.
Por mais que forcemos, não podemos encontrar a
obrigação do dízimo separadamente dos levitas.
Podemos ler sobre o dízimo sendo ofertado
voluntariamente por gratidão e amor, mas não como
mandamento cuja infração conduz a maldição. Se for
mandamento, a transgressão do mandamento é pecado,
mas não há evidências de ser um mandamento
posterior aos levitas.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 55

Está escrito que Cristo nos resgatou da maldição da


Lei (Gálatas 3:13) e que através de Cristo já fomos
abençoados com todas as bênçãos espirituais (Efésios
1:3). Como seremos amaldiçoados, se é Cristo quem nos
justificou, abençoou e redimiu? Como estaremos a
roubar a Deus, não dando dízimos a uma tribo que não
está a servir, nem num templo que foi destruído no ano
70 d.e.c.?
Deus habitará ainda em templos feitos por mãos
humanas? Estará a lei levítica em vigor? Então porque se
aterroriza e intimida os crentes fazendo-os dar dízimos
por medo, quando se deveria exortá-los a darem
dízimos e outras ofertas por amor? Tantos se afastam de
Deus por não verem as promessas feitas dos púlpitos
concretizadas…
O dízimo não é uma magia cristã, era um
mandamento dado com um propósito que pode ser
praticado hoje, mas voluntariamente como forma de
adoração e gratidão. Não há maldição alguma para
aquele que não entregar dízimos numa igreja cristã. Ai
daqueles que amaldiçoam o povo de Deus e fazem
afastar os homens de Cristo por causa de dinheiro.
Grande será o seu juízo!
Vejamos o que nos ensina o autor de Hebreus sobre
a mudança de sacerdócio:

Moisés, na verdade, foi fiel em toda a casa de Deus,


como servo, para testemunho das coisas que se
haviam de anunciar; mas Cristo o é como Filho
sobre a casa de Deus; a qual casa somos nós, se tão-
somente conservarmos firmes até o fim a nossa
confiança e a glória da esperança. (Hebreus 3:5-6)
56 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

O autor de Hebreus começa por introduzir o


assunto da forma mais esclarecedora possível: a casa
onde Deus habita somos nós. Deus não habita mais
num templo feito de pedra, habita naqueles que têm o
seu Espírito. Deus deixou de habitar no Templo em
Jerusalém. Mesmo que o terceiro templo seja
reconstruído, Deus não estará mais em Jerusalém do que
está em Portugal.
Deus não habita nas casas que albergam as grandes
denominações cristãs, nem nas casas de oração onde
semanalmente se realizam cultos, por mais luxuosas que
estas possam ser. Depois de cada culto, quando as salas
ficam vazias, Deus parte também com o último crente.
Onde estiver um filho de Deus, aí estará Deus. Pode
ser uma cabana, uma casa pobre ou um palácio. Deus
não se impressiona com a aparência exterior. Cada crente
torna-se o sacerdote do seu próprio templo. Pelo menos
deveria sê-lo. Cada filho de Deus é chamado para ser um
adorador e um sacerdote, conduzindo os homens a Deus.
Cada crente é um templo verdadeiro, um templo vivo.
Graças a Deus que Deus nos deu um melhor
Sacerdócio, com leis diferentes do Sacerdócio Levítico
(Hebreus 7:12). Cristo é o novo sumo-sacerdote, do
mesmo tipo que Melquisedeque o era:

De sorte que, se a perfeição fosse pelo sacerdócio


levítico (pois sob este o povo recebeu a lei), que
necessidade havia ainda de que outro sacerdote se
levantasse, segundo a ordem de Melquisedeque, e
que não fosse contado segundo a ordem de Arão?
Pois, mudando-se o sacerdócio, necessariamente se
faz também mudança da lei. Porque aquele, de quem
estas coisas se dizem, pertence a outra tribo, da qual
ninguém ainda serviu ao altar, ser manifesto que
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 57

nosso Senhor procedeu de Judá, tribo da qual Moisés


nada falou acerca de sacerdotes. E ainda muito mais
manifesto é isto, se à semelhança de Melquisedeque
se levanta outro sacerdote, que não foi feito conforme
a lei de um mandamento carnal, mas segundo o
poder duma vida indissolúvel. Porque dele assim se
testifica: Tu és sacerdote para sempre, segundo a
ordem de Melquisedeque. (Hebreus 7:11-17)

O Sacerdócio Levítico era um sacerdócio


imperfeito. Os sacrifícios tinham de ser repetidos
constantemente, porque afetavam apenas a vida no
mundo natural. Nenhum sacrifício pôde trazer a
salvação do espírito. Se alguém fizesse muitos sacrifícios
não poderia redimir-se para a eternidade. Morreria e se
fosse justo iria para o Seio de Abraão e ficaria
aguardando com os outros justos pela vinda do Messias.
Os sacrifícios eram apenas para que a pessoa não
morresse fisicamente pelos seus pecados como o merecia,
no momento em que pecava. Serviam para que não
caísse sobre os homens o castigo pelos seus pecados, em
vida. Não afetavam a vida depois da morte. Esta era a
imperfeição do Sacerdócio Levítico.
Cristo tornou-se o nosso Sumo-sacerdote,
ministrando no verdadeiro tabernáculo celestial diante
do Pai. Na terra, Deus tem muitos templos, que
constituem um grande templo: o seu Povo. As Escrituras
são claras: “mudando-se o sacerdócio, necessariamente se faz
também mudança da lei”. As leis que regulavam as
ofertas, dízimos e sacrifícios foram mudadas. Mais à
frente, estudaremos o que mudou na Nova Aliança.
Deixo aqui apenas uma ressalva: o facto do
Sacerdócio Levítico com as suas leis ter sofrido
mudança não significa que tudo na Lei de Moisés foi
58 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

abolido. Facilmente encontramos mandamentos que não


foram abolidos. Continuamos a não poder roubar, matar,
adulterar, etc. Esses mandamentos são preceitos da Lei,
mas continuam em vigor para sempre.
Uma das inovações da Lei foi a proibição de
casamentos entre familiares próximos. Antes, havia
casamentos até entre irmãos, como por exemplo Abraão
e Sara, que eram meio irmãos (Génesis 20:12). Quem
poderá questionar que essa proibição da Lei se mantém?
Não devemos ser extremistas para nenhum dos
lados. Sejamos sábios e façamos como Paulo ensinou a
Timóteo: “a lei é boa, se alguém dela usar legitimamente” (I
Timóteo 1:8). Ser extremista em rejeitar totalmente a Lei
pode ser tão negativo como pretender cumpri-la à risca
com todos os mandamentos e preceitos, como se
vivêssemos no tempo de Moisés. Há mudanças, mas há
também aquilo que permanece.
As discussões acerca do que permanece da Lei
podem tornar-se pouco produtivas. Naqueles, que
defendem o cumprir rigoroso da Lei, tenho observado
muito adultério, falta de amor, egoísmo e outros
pecados, mas não mais que nos que defendem que a Lei
foi totalmente abolida. No fim, importa aquele que
pratica a Lei e não aquele que a defende e ensina. Deus
olha para os corações e para aquele que é humilde e
deseja amá-lo com todo o seu ser.
Há pessoas que não conhecem quase nada da Bíblia
e vivem uma vida santa, cheia de amor, porque têm a Lei
escrita no coração. Há pessoas que querem seguir todos
os preceitos da Lei e acabam por se trair a si mesmas,
caindo naquilo que nenhum crente verdadeiro cairia. Por
tudo isto, digo que há apenas um Juiz e que cada um
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 59

deve andar seguindo as Escrituras e a sua consciência


com coração puro.
Se alguém quer praticar a Lei, comece como o
Senhor ensinou: iniciando por amar a Deus acima de
tudo e ao próximo como a si mesmo. Depois, então pode
passar aos Dez mandamentos e a seguir aos restantes.
Quem não tiver pecado, atire a primeira pedra, disse o
sábio Mestre (João 8:7). Deus seja misericordioso com
todos, pois no fim Apocalipse avisa:

Mas, quanto aos medrosos, e aos incrédulos, e aos


abomináveis, e aos homicidas, e aos adúlteros, e aos
feiticeiros, e aos idólatras, e a todos os mentirosos, a
sua parte será no lago ardente de fogo e enxofre, que
é a segunda morte. (Apocalipse 21:8)

Ainda é tempo de nos arrependermos, pois o


Espírito continua a chamar-nos à santificação. Deus
chama a todos os que creem nele, os que querem praticar
toda a Lei e os que não a querem praticar, porque acham
que em Cristo não precisam de Lei. Todos somos
chamados ao arrependimento e todos são chamados a
viver em santidade.
Muitos têm de se arrepender do que pregaram,
coagindo multidões a dar todo o seu dinheiro para que a
instituição que lideram cresça e se enriqueça. Tudo é
sempre feito em nome do Evangelho e com o intuito,
sincero ou não, de produzir conversões. Há apenas um
pormenor de suma importância: quem converte os
corações é Deus e não o dinheiro.
Temos de ter algum equilíbrio. É necessário ter
lugares para a Igreja se reunir e alguns recursos
materiais. Porém, não tanto como estamos habituados. A
60 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Igreja atual está demasiado dependente de dinheiro.


Deus não precisa de grandes templos, aviões, associações
para isto e para aquilo. O Espírito move-se através de
pessoas simples, pelo seu poder. Onde está o poder? Isso
sim é uma pergunta urgente! Há demasiado dinheiro e
pouco poder…
Meditemos ainda em alguns pormenores do texto
de suma importância. O versículo 10 exorta: “trazei todos
os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na
minha casa…”. O objetivo do dízimo era o mantimento na
casa de Deus, mas uma casa não come. Claro que precisa
de dinheiro para a sua manutenção, mas o mantimento
era sobretudo para os sacerdotes e levitas, embora
também para a casa de pedra.
O versículo continua: “e depois fazei prova de mim, diz
o Senhor dos exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e
não derramar sobre vós tal bênção, que dela vos advenha a
maior abastança”. Deus diz que podem fazer prova dele,
pois abençoará aquele que der o dízimo de forma que o
ofertante ficará mais próspero que antes de ter dado. É
fantástica esta promessa! Mas, o que significa hoje? Posso
pegar nesta promessa e aplicá-la a mim? Posso requerer
de Deus prosperidade pelo facto de entregar dízimos?
O que Cristo veio fazer à terra? Ele veio redimir-
nos, permitindo que nos tornemos filhos de Deus, co-
herdeiros com ele de todas as coisas. Efésios 1 é uma
oração do apóstolo Paulo, pedindo a Deus que os efésios
consigam entender que são o Corpo do próprio Cristo na
terra e que já herdaram todas as coisas. Chega mesmo a
dizer que o Filho partilha o poder da ressurreição com a
sua Igreja e que esta está em autoridade, acima de todo
o principado, poder e potestade (Efésios 1:22). Isto é
poderoso!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 61

Enquanto a igreja mendiga bênçãos, Paulo clama a


Deus que ela tenha revelação acerca da sua posição.
Tudo é por causa de Cristo! Será que precisamos fazer
uma prova com Deus, dando dízimos para que ele nos
abra as janelas do céu? Estão ainda fechadas as janelas do
céu? Se estão fechadas para um filho de Deus, algo não
está bem…
Queridos e amados filhos de Deus, vocês estão
redimidos e as janelas foram abertas por Cristo! Dê o
dízimo e abençoe, mas não pense que Deus o abençoará
mais por isso… Ele já fez tudo, apenas porque o ama,
não porque damos dinheiro. Já foi tudo aberto no
Calvário, tão aberto que não pode ser mais aberto! Já
fomos tão abençoados, que não há nada que possamos
fazer mais para darmos uma ajuda a Deus em nos fazer
mais abençoados. Podemos apenas usufruir daquilo que
Cristo já conquistou ou não usufruir nada.
Algo não está bem com o crente que não anseia dar
aos outros, quer de si mesmo, quer dos seus bens. A
natureza de Cristo é dar, logo se Cristo está em nós,
naturalmente somos dadores.
Note ainda algo de extrema importância. O
versículo 11 continua a dar a consequência da oferta do
dízimo para os homens não nascidos de novo do Antigo
Pacto: “também por amor de vós reprovarei o devorador, e ele
não destruirá os frutos da vossa terra; nem a vossa vide no
campo lançará o seu fruto antes do tempo…”. Isto faz-me
sofrer, cada vez que o ouço pregar de forma deturpada…
Os crentes são ensinados de forma a esperarem que
Deus repreenda Satanás, por darem dízimos!
Os crentes antes da redenção, não tinham o Espírito
de Deus habitando de forma residente. Apenas sobre
algumas pessoas especiais. O Espírito vinha, falava,
62 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

manifestava-se e depois ausentava-se novamente. Deus


habitava em templos feitos por mãos humanas, não de
forma permanente em homens. Mas, depois da
ressurreição o véu do templo figuradamente liberou o
Espírito, que no Pentecostes veio habitar nos homens
convertidos e redimidos. Foi a estes que Deus deu toda a
autoridade que citamos, referida em Efésios 1.
Os crentes esperam que Deus repreenda o diabo
no seu lugar, quando toda a autoridade lhes foi dada?
Muito estranho! Não quererá Deus que exerçamos a
nossa autoridade sobre o inimigo, se ele nos está
oprimindo a nós ou a outros? Somos nós quem tem de
repreender Satanás de nos roubar.
O nosso exemplo não são os crentes da Antiga
Aliança! O nosso exemplo é Cristo e Cristo nunca
ficaria à espera que o Pai repreendesse o devorador no
seu lugar. O crente antes da redenção não tinha
autoridade sobre o diabo. A única forma, era esperar que
Deus o repreendesse. Ficarão os crentes que já foram
redimidos, paralisados, não usufruindo da autoridade
que Deus já lhes deu, não usufruindo do suprimento e
bênção que Deus já lhes deu?
Os primeiros discípulos tiveram dificuldade em
aprender a lição e Cristo os repreendia por falta de fé
(Mateus 17:19-21). Ficar à espera que seja Deus a
repreender o diabo é um tipo de humildade que não
exalta a Deus, nem é da vontade de Deus. O Senhor dizia
aos discípulos: “Ainda não tendes fé? Homens de pequena
fé!”.
Cristo deixou a sua autoridade à Igreja para que
esta aja em seu Nome e não para imitar o povo da Antiga
Aliança. Não precisamos de fazer nada para abrir o céu,
pois foi Cristo quem fez tudo. Só duas coisas podem
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 63

fechar-nos o céu: o nosso pecado ou a nossa


passividade em usar a autoridade que Ele nos deu.
Podemos e devemos, mais do que nunca, ofertar
dízimos e todo o tipo de ofertas. Há muita necessidade e
devemos contribuir para que a riqueza material seja
distribuída pelos irmãos mais carenciados, assim como
para cooperarmos na expansão do Evangelho. Contudo,
Deus já nos abençoou e já nos deu autoridade. Não
pode ser amaldiçoado quem já foi abençoado e está
hierarquicamente à direita do Pai com Cristo (Efésios
2:6).
64 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 65

O Messias e o Dinheiro
Cristo encarnou “debaixo da lei levítica”. O templo
estava em funcionamento e ele sujeitou-se às leis do
Sacerdócio Levítico (Mateus 8:4). Contudo, o período do
seu ministério de ensino revolucionou o entendimento
da Lei.
O Messias não infringiu nunca a Lei, seja ela
mosaica ou levítica. Ele ensinou o verdadeiro significado
de cada mandamento, ao ponto de chocar os fariseus na
interpretação que eles tinham feito. Os fariseus tinham
errado tanto na sua interpretação, por não conhecerem o
coração do Pai. A distância do verdadeiro propósito e
espírito da Lei era tal que chegavam a julgar que Cristo a
transgredia. Porém, onde viam transgressão, havia
apenas interpretação correta. Ele explicou o propósito
dos mandamentos em vez de acrescentar mais
dificuldades em cumpri-los.
Através das palavras do Messias, os mandamentos
não pareciam pesados, mas cheios do amor e proteção do
Pai. O período do seu ministério foi de transição, pois o
seu ensino preparou os corações dos homens para a
mudança que aconteceria depois da sua morte e
ressurreição. Grandes mudanças ocorreriam, devido à
mudança de Sacerdócio.
Utilizando os Evangelhos, especialmente o de
Mateus, vejamos o que o Senhor ensinou relativamente a
ofertas e dinheiro:
66 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Portanto, se estiveres apresentando a tua oferta no


altar, e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma
coisa contra ti, deixa ali diante do altar a tua oferta, e
vai conciliar-te primeiro com teu irmão, e depois vem
apresentar a tua oferta. (Mateus 5:23-24)

O altar referido era no contexto do templo. Não se


refere ao altar numa igreja cristã atual. A passagem fala
de ofertas estipuladas na levítica. Quando o Senhor
proferiu estas palavras, o sistema de ofertas e sacrifícios
estava em plena atividade. O templo funcionava com os
seus levitas e sacerdotes, de acordo com as regras
estabelecidas por Moisés, acrescidas de muitas
interpretações e deturpações dos fariseus.
Podemos, no entanto, retirar princípios, que são
válidos para a atualidade, na Igreja de Deus. A oferta,
qualquer uma, não tem valor para Deus, se houver
pecado contra um irmão. Assim, as ofertas de dinheiro,
mesmo para Evangelismo, não devem prejudicar os
irmãos, pois Deus não pretende salvar homens,
provocando sofrimento aos seus filhos, exceto naquele
sacrifício que é voluntário e por amor.
Que diremos de líderes que extorquem
financeiramente os seus fiéis, chegando a pedir quatro
ofertas no mesmo culto? Que diremos dos que ameaçam
com maldição aqueles que não são dizimistas ou dos que
se recusam a orar por aqueles que não lhes entregam os
seus dízimos? Há campanhas especiais de oração por
aqueles que entregam dízimos, há tratamento diferente
para com aqueles que têm mais recursos materiais, há
honras para aqueles que mais têm. Não se choque, há
isto e muito pior!
Uma irmã que luta neste momento para sobreviver
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 67

materialmente, por não ter família, partilhava comigo


que por não dar dízimos, não tem o mesmo apoio em
oração que outros crentes dizimistas. Por esses são feitas
campanhas e jejuns, e ela sente-se excluída e
desamparada pela liderança da sua congregação. Que
apoio tem este comportamento na Bíblia? Nenhum!
Cristo exortou a deixar a oferta e a reconciliar-se
com o irmão. O bem-estar dos seus filhos, o amor ao
irmão está acima de qualquer oferta. Para Deus é mais
importante estar reconciliado com todos que dar ofertas.
Podemos ter essa certeza! Contudo, as nossas
contribuições financeiras têm muita importância
também. Neste mundo, elas são necessárias, desde que
não tomem o lugar de Deus e não sejam o centro da vida
da Igreja. Acerca de dar dinheiro a necessitados, ensinou:

Quando, pois, deres esmola, não faças tocar trombeta


diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas
e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em
verdade vos digo que já receberam a sua recompensa.
Mas, quando tu deres esmola, não saiba a tua mão
esquerda o que faz a direita; para que a tua esmola
fique em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te
recompensará. (Mateus 6:2-4)

O Senhor não está a falar de ofertas para o templo


ou para qualquer tipo de clero, mas de ajudar quem tem
necessidade. Aquele que se gaba de dar muito dinheiro,
já perdeu o seu galardão e aquele que dá de coração em
oculto, será recompensado pelo Pai. Segue-se uma
instrução muito bela, tremendamente profunda e sábia.
Abramos o coração e a mente para compreendê-la:
68 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Não ajunteis para vós tesouros na terra; onde a traça


e a ferrugem os consomem, e onde os ladrões minam
e roubam; mas ajuntai para vós tesouros no céu,
onde nem a traça nem a ferrugem os consumem, e
onde os ladrões não minam nem roubam. Porque
onde estiver o teu tesouro, aí estará também o teu
coração. A candeia do corpo são os olhos; de sorte
que, se os teus olhos forem bons, todo teu corpo terá
luz; se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo
será tenebroso. Se, portanto, a luz que em ti há são
trevas, quão grandes são tais trevas! Ninguém pode
servir a dois senhores; porque ou há-de odiar a um e
amar o outro, ou há-de dedicar-se a um e desprezar o
outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.
(Mateus 6:19-24)

Podemos dissertar sobre o que é juntar tesouros no


céu, mas a passagem é clara em exortar que não se
juntem tesouros na terra. Penso que o texto significa que
o nosso dinheiro deve ser investido em propósitos santos
e de valor eterno, não apenas acumulado para nosso
benefício pessoal. Onde investimos o nosso dinheiro, aí
está o nosso coração. Este é um teste fantástico que
podemos fazer a nós mesmos e aos outros. É fácil saber
onde está o nosso coração: basta ver onde gastamos o
nosso dinheiro.
Não precisamos ser coagidos a dar dízimos, se o
nosso coração está no lugar certo. Se o nosso coração está
nas coisas espirituais e não nas naturais, se o nosso
coração busca primeiro agradar a Deus e servi-lo, não
precisamos de ser atemorizados com “não roubar a
Deus”, nem com promessas de repreensão do inimigo
por Deus.
O crente, que ama a Deus acima de tudo, dará o seu
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 69

dinheiro, o seu tempo, a sua força ao Senhor e ao seu


Reino. Depois de se dar, ainda achará que deu tão
pouco, em comparação com aquilo que recebeu do Pai!
O crente que dá coagido ou por medo, mais cedo ou
mais tarde vai sentir-se frustrado e arrependido de o ter
feito. É uma questão de tempo… Devemos ocupar-nos
em trabalhar no coração das pessoas e elas alcançarão
maturidade para entregarem a sua vida espiritual e
material.
No seguimento do ensinamento sobre ajuntar
tesouros, o Senhor fez uma advertência: “se os teus olhos
forem bons, todo teu corpo terá luz”. Porque intercalou
Cristo esta figura dos olhos e da candeia, quando estava
a falar de dinheiro? Aquilo que tenta o homem a juntar
dinheiro para si é a sedução das coisas deste mundo, as
suas riquezas, o seu conforto, os seus prazeres, as suas
atrações.
Somos seduzidos acima de tudo pelo que vemos.
Os publicitários sabem disso e bombardeiam-nos com
anúncios de televisão, de outdoors, de folhetos e revistas.
Quando os olhos estão envolvidos, a sedução produz
maiores efeitos. O Senhor avisa-nos e ensina-nos que se
permitirmos que os nossos olhos sejam expostos à
sedução, será muito difícil o coração não ceder ao amor a
este mundo e consequentemente ao amor ao dinheiro.
Somos atraídos com carros, aparelhos de todo o tipo,
casas luxuosas e modernas, viagens a locais paradisíacos,
com sensualidade, com ambição desmedida e desejos
desnecessários de status e aparência.
Não podemos amar a Deus e amar as coisas deste
mundo. Não podemos servir a Deus e viver ajuntando
riquezas para nós mesmos, porque o avanço do Reino
precisa do envolvimento de cada um de nós. Sim, o
70 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

nosso dinheiro é importante para o Reino, mas como


consequência de termos dado o nosso coração.
Atenção para que não sejamos enganados com a
ideia de que é o dinheiro que permite a salvação dos
homens. É o poder de Deus nos seus filhos e a operação
do Espírito que alcança o ímpio. É a nossa vida rendida a
Deus que serve de exemplo e nos permite pelo poder do
Espírito alcançar outros. Deus cuidará de nós durante o
processo de atingir outros:

Por isso vos digo: Não estejais ansiosos quanto à


vossa vida, pelo que haveis de comer, ou pelo que
haveis de beber; nem, quanto ao vosso corpo, pelo
que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o
alimento, e o corpo mais do que o vestuário? Olhai
para as aves do céu, que não semeiam, nem ceifam,
nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as
alimenta. Não valeis vós muito mais do que elas?
Ora, qual de vós, por mais ansioso que esteja, pode
acrescentar um côvado à sua estatura? E pelo que
haveis de vestir, por que andais ansiosos? Olhai para
os lírios do campo, como crescem; não trabalham
nem fiam; contudo vos digo que nem mesmo
Salomão em toda a sua glória se vestiu como um
deles. Pois, se Deus assim veste a erva do campo, que
hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais
a vós, homens de pouca fé? Portanto, não vos
inquieteis, dizendo: Que havemos de comer? ou: Que
havemos de beber? ou: Com que nos havemos de
vestir? (Pois a todas estas coisas os gentios
procuram.) Porque vosso Pai celestial sabe que
precisais de tudo isso. Mas buscai primeiro o seu
reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão
acrescentadas. Não vos inquieteis, pois, pelo dia de
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 71

amanhã; porque o dia de amanhã cuidará de si


mesmo. Basta a cada dia o seu mal. (Mateus 6:25-34)

As aves têm o que comer, sem que precisem de


acumular. Não se refere a não trabalhar, mas a acumular
riqueza. As flores do campo são extremamente belas de
forma que o dinheiro não pode adquirir esse tipo de
beleza. Se Deus cuidar de nós, podemos não ser muito
ricos, mas teremos aquilo que necessitamos, sentir-nos-
emos belos e satisfeitos, porque só Deus nos enche e faz
sentir plenos e realizados.
Não há nada, absolutamente nada, que possa
substituir a satisfação da sua Presença. Se o buscarmos
em primeiro lugar, se aprendermos a desfrutar da sua
paz e a ouvir a voz doce e suave do seu Espírito, os
prazeres deste mundo não terão valor. O Messias enviou,
a certa altura, os doze:

Não vos provereis de ouro, nem de prata, nem de


cobre, em vossos cintos; nem de alforje para o
caminho, nem de duas túnicas, nem de alparcas, nem
de bordão; porque digno é o trabalhador do seu
alimento. Em qualquer cidade ou aldeia em que
entrardes, procurai saber quem nela é digno, e
hospedai-vos aí até que vos retireis. (Mateus 10:9-11)

Os discípulos foram enviados sem levar comida ou


dinheiro, para que aprendessem a depender de Deus.
Não quer dizer que todo o que prega o Evangelho não
precisa trabalhar. Não podemos interpretar de uma
forma que não foi o propósito do texto.
Naquele caso específico, eles partiram sem levar
bens materiais. Por outro lado, na sua missão não
recebiam mais que o necessário para viverem. Não
72 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

pregavam em troca de dízimos ou riquezas para


acumularem. Eles estavam a aprender que devemos
viver um dia de cada vez e em cada dia devemos
depender da provisão do Pai.
Para aqueles que deveriam receber os seus
enviados, Cristo disse: “aquele que der até mesmo um copo
de água fresca a um destes pequeninos, na qualidade de
discípulo, em verdade vos digo que de modo algum perderá a
sua recompensa” (Mateus 10:42). Há uma recompensa
para aquele que supre a necessidade de um discípulo,
quando este está a fazer aquilo para o qual foi chamado,
pregando o Evangelho, tenha ou não um título. Não
somos exortados a enriquecer aqueles que pregam o
Evangelho, mas a suprir as suas necessidades. De igual
forma cada crente é chamado a pregar o Evangelho e a
confiar na provisão divina.
Certa vez o Senhor foi interpelado acerca do
pagamento de impostos:

Tendo eles chegado a Cafarnaum, aproximaram-se de


Pedro os que cobravam as didracmas, e lhe
perguntaram: O vosso mestre não paga as
didracmas? Disse ele: Sim. Ao entrar Pedro em casa,
Jesus se lhe antecipou, perguntando: Que te parece,
Simão? De quem cobram os reis da terra imposto ou
tributo? Dos seus filhos, ou dos alheios? Quando ele
respondeu: Dos alheios, disse-lhe Jesus: Logo, são
isentos os filhos. Mas, para que não os
escandalizemos, vai ao mar, lança o anzol, tira o
primeiro peixe que subir e, abrindo-lhe a boca,
encontrarás um estáter; toma-o, e dá-lho por mim e
por ti. (Mateus 17:24)
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 73

O imposto citado era para o templo. Destinava-se a


financiar o funcionamento do culto a Deus. Os
mensageiros dos sacerdotes iam recolhendo este
imposto. Para explicar a sua posição, Cristo faz uma
comparação deste imposto do templo com os impostos
seculares dos reis.
O sentido da passagem é que os filhos de Deus não
estão sujeitos a impostos, mesmo sendo para o culto.
Porém, o Senhor, que tantas vezes criticou o pecado dos
fariseus e da religião instituída, não considerou que
deveria confrontá-los nesta questão. Parece que a achou
de menor importância, valorizando mais o evitar
escandaliza-los. Entendemos que não é o dar o
problema, mas a imposição de dar.
É muitíssimo interessante e profunda esta
passagem, mas não é fácil perceber tudo aquilo que o
Mestre estava a procurar ensinar ao afirmar: “os filhos são
isentos de impostos”. Nenhum pai cobra impostos dos seus
filhos. Como o Pai celestial cobrará impostos dos seus
filhos? Esta questão prende-se com o conceito de templo.
Aqui não está explícito, mas aproximava-se o
tempo em que o templo seria o próprio homem e o
conceito de culto a Deus, ganharia uma dimensão mais
interior que exterior. O sistema de ofertas do Sacerdócio
Levítico continuaria a funcionar até o templo ser
destruído no ano 70. O período do ministério de Cristo,
foi a altura de preparar os corações para uma nova era, a
era dos filhos de Deus, onde não há mais impostos, mas
apenas total e integral doação do coração, da vida, dos
bens, do tempo, de tudo. Quem será capaz de entender a
extraordinária profundidade disto?
Deus não nos cobra impostos, não nos amaldiçoa,
não repreende o diabo em nosso lugar, não fechou as
74 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

janelas do céu… Deus prepara-nos para nos fazer


crescer até à maturidade do seu Filho, Deus nos
chamou para nos entregarmos completamente.
Quando lemos a continuação no capítulo seguinte
de Mateus, vem o ensino acerca de termos de nos tornar
como crianças para herdarmos o Reino. É mesmo isso!
Devemos ser como crianças, entregarmos tudo, sermos
filhos dependentes e usufruir da sua mesa, a mesa do
Pai!
Segue-se outro texto bastante conhecido:

E eis que se aproximou dele um jovem, e lhe disse:


Mestre, que bem farei para conseguir a vida eterna?
Respondeu-lhe ele: Por que me perguntas sobre o que
é bom? Um só é bom; mas se é que queres entrar na
vida, guarda os mandamentos. Perguntou-lhe ele:
Quais? Respondeu Jesus: Não matarás; não
adulterarás; não furtarás; não dirás falso testemunho;
honra a teu pai e a tua mãe; e amarás o teu próximo
como a ti mesmo. Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho
guardado; que me falta ainda? Disse-lhe Jesus: Se
queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-
o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem,
segue-me. Mas o jovem, ouvindo essa palavra,
retirou-se triste; porque possuía muitos bens.
(Mateus 19:16-22)

Um jovem muito rico, que praticava os


mandamentos da Lei, chegou à conclusão que devia
haver mais do que aquilo que conhecia, pois Cristo
parecia diferente e chamou-lhe a atenção. Em resposta à
sua interpelação, o Senhor apresentou-lhe o caminho
para a perfeição.
Se perguntássemos a uma multidão de crentes,
integrando pastores, lideres e músicos, se queriam
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 75

alcançar a perfeição, toda a multidão se levantaria e diria


que sim e quereriam ouvir qual a forma de a atingir. O
Mestre mostrou o caminho: “vende tudo o que tens e dá-o
aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, segue-me”.
Tenho a certeza que, na atualidade, muitos desses
cristãos, que queriam inicialmente a perfeição,
mudariam de ideias quando soubessem o que era
necessário: dar todo o dinheiro a quem tem
necessidades, ajuntando riqueza no céu em vez de o
fazer na terra!
Muitos dirão: isto foi apenas para aquele jovem que
amava o dinheiro! Não! Isto é para todos os que querem
enriquecer e ajuntar tesouros neste mundo!
Estamos habituados a pensar que não tem mal ter
riquezas, que Deus nos quer prósperos, que os bens
materiais são bênção de Deus. É altura de
questionarmos… Se o meu irmão não tem o que comer,
é indiferente a Deus que eu junte dinheiro, que compre
tudo do melhor, que tenha carros e casas luxuosas?
Cada um responda à luz das Escrituras e da sua
consciência se ela não estiver cauterizada pelo amor ao
dinheiro.
A minha prosperidade deixa de agradar a Deus,
quando implica o sofrimento do meu irmão!
Biblicamente, parece-me que a prosperidade individual
tem sempre a intenção divina de abençoar terceiros. Em
Lucas está escrito: “todo aquele dentre vós que não renuncia
a tudo quanto possui, não pode ser meu discípulo” (Lucas
14.33). Esta é uma afirmação muito forte, mas é uma
forma de resumir os ensinamentos sobre dinheiro nos
Evangelhos.
Juntar tesouros no céu é, segundo a Bíblia, dar a
quem tem necessidade. Isto é ser à imagem do Filho e
76 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

andar como ele andou. Este é o verdadeiro Evangelho.


Vejamos como explicou isto aos seus discípulos:

Disse então Jesus aos seus discípulos: Em verdade


vos digo que um rico dificilmente entrará no reino
dos céus. E outra vez vos digo que é mais fácil um
camelo passar pelo fundo duma agulha, do que
entrar um rico no reino de Deus. Quando os seus
discípulos ouviram isso, ficaram grandemente
maravilhados, e perguntaram: Quem pode, então, ser
salvo? Jesus, fixando neles o olhar, respondeu: Aos
homens é isso impossível, mas a Deus tudo é
possível. Então Pedro, tomando a palavra, disse-lhe:
Eis que nós deixamos tudo, e te seguimos; que
recompensa, pois, teremos nós? Ao que lhe disse
Jesus: Em verdade vos digo a vós que me seguistes,
que na regeneração, quando o Filho do homem se
assentar no trono da sua glória, sentar-vos-eis
também vós sobre doze tronos, para julgar as doze
tribos de Israel. E todo o que tiver deixado casas, ou
irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou filhos, ou
terras, por amor do meu nome, receberá cem vezes
tanto, e herdará a vida eterna. Entretanto, muitos que
são primeiros serão últimos; e muitos que são últimos
serão primeiros. (Mateus 19.23-30)

O Buraco da Agulha é uma porta em Jerusalém. Os


camelos, ao tentarem passar por essa porta, têm de se
baixar e entram com grande dificuldade. É assim para o
rico poder entrar no Reino: tem de se baixar, tem de tirar
a carga em excesso, tem de se humilhar e deixar aquilo
que não tem valor para poder entrar. É difícil, mas não
impossível.
O Senhor comentou acerca da viúva pobre: “esta
pobre viúva deu mais do que todos; porque todos
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 77

aqueles deram daquilo que lhes sobrava; mas esta, da


sua pobreza, deu tudo o que tinha para o seu sustento”
(Lucas 21:4). O problema dos ricos em geral é que não
conseguem dar mais do que as sobras. Quanto temos a
aprender com esta viúva… Contudo, muitos usam este
exemplo da viúva para fazerem com que os crentes deem
tudo o que têm aos líderes da igreja. A viúva não foi
influenciada por um pregador, simplesmente fluiu
segundo o seu coração no amor a Deus. Ela não deu
dinheiro simplesmente, ela deu-se.
A viúva, na perspetiva divina, deu mais que todos
os que davam grandes quantias. Segundo a teoria de
alguns, ela deverá ter enriquecido materialmente
muitíssimo… Pois, se deu muito, terá recebido muito! Se
não foi assim, algo nessa doutrina precisa de ajustes!
Aquele que deixar tudo para seguir o Senhor, não
sentirá a falta daquilo que deu. Mas, não para se tornar
rico ou para servir-se de Deus. Não é para enriquecer
materialmente, porque aquele que se entregou, dá aquilo
que recebe, novamente. Dar e receber é um modo de
vida, uma atitude do coração. Quem vive desta forma,
não pensa acumular riquezas, mas em ser canal da
riqueza de Deus para os necessitados. Uma criança
entende isto facilmente.
Uma das passagens que atrai muito os que querem
enriquecer é:

Assim como quereis que os homens vos façam, do


mesmo modo lhes fazei vós também. Se amardes aos
que vos amam, que mérito há nisso? Pois também os
pecadores amam aos que os amam. E se fizerdes bem
aos que vos fazem bem, que mérito há nisso?
Também os pecadores fazem o mesmo. E se
emprestardes àqueles de quem esperais receber, que
78 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

mérito há nisso? Também os pecadores emprestam


aos pecadores, para receberem outro tanto. Amai,
porém a vossos inimigos, fazei bem e emprestai,
nunca desanimando; e grande será a vossa
recompensa, e sereis filhos do Altíssimo; porque ele é
benigno até para com os integrantes e maus. Sede
misericordiosos, como também vosso Pai é
misericordioso. Não julgueis, e não sereis julgados;
não condeneis, e não sereis condenados; perdoai, e
sereis perdoados. Dai, e ser-vos-á dado; boa medida,
recalcada, sacudida e transbordando vos deitarão no
regaço; porque com a mesma medida com que medis,
vos medirão a vós. (Lucas 6:31-38)

Algo que se aprende, quando se estuda exegese


bíblica, é a não tirar um texto do seu contexto. “Dai e ser-
vos-á dado” foi dito no contexto de amarmos e fazermos
bem a quem nos faz mal, de emprestarmos a quem não
nos irá devolver, ou seja, darmos sem esperar receber de
volta.
A passagem exorta-nos a esperar a recompensa que
vem de Deus e a desejarmos apenas sermos mais
parecidos com o Pai. Ao dar-mos devemos ter como alvo
ser misericordiosos como o Pai o é. Não devemos
condenar, mas perdoar. É ao falar de amar, ser
misericordioso, que é dito: “dai e ser-vos-á dado”.
A passagem não fala de dinheiro e não diz em lugar
algum que se alguém der dinheiro, irá receber uma
grande abundância de dinheiro. A ideia da passagem é
precisamente inversa a essa ideia, pois exorta a que se
espere apenas a recompensa divina de crescermos no
carater do Pai. Somos exortados a dar sem esperar
receber em troca… O contexto é amor e a recompensa é
espiritual. Isto não isenta que Deus supra as nossas
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 79

necessidades, e uma das maneiras de o fazer é usando


quem mais tem para abençoar quem tem menos.
Um dos acontecimentos mais marcantes do
ministério de Cristo é a expulsão dos vendedores:

Então Jesus entrou no templo, expulsou todos os que


ali vendiam e compravam, e derribou as mesas dos
cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas; e
disse-lhes: Está escrito: A minha casa será chamada
casa de oração; vós, porém, a fazeis covil de
salteadores. E chegaram-se a ele no templo cegos e
coxos, e ele os curou. Vendo, porém, os principais
sacerdotes e os escribas as maravilhas que ele fizera, e
os meninos que clamavam no templo: Hosana ao
Filho de Davi, indignaram-se. (Mateus 21:12-15)

No templo estavam vendedores de animais para


serem sacrificados. Existiam também cambistas que
trocavam moeda. Muitos tinham balanças alteradas para
enganar. O templo deveria ser lugar de oração e
santidade, lugar para restaurar os necessitados, lugar de
louvor. Quando os vendedores foram expulsos, apenas
as crianças entenderam. Os adultos tinham o coração
cheio de amor pelo dinheiro e pelas riquezas do mundo.
O mercantilismo evangélico tem tomado lugar
também em alguns lugares. Alguns têm enriquecido à
custa da música, do ensino das Escrituras e da promessa
de milagres. O meio evangélico, que criticou no passado
as romarias pagãs e o culto a santos católicos, assemelha-
se agora a estes quando abusa dos pedidos de dinheiro a
pessoas simples e necessitadas. A desculpa do dinheiro
ser necessário para expandir o Evangelho, tem sido
acompanhada de ganância e enriquecimento pessoal
em alguns círculos.
80 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Numa segunda vez, o Mestre foi questionado sobre


impostos para com o estado. Os fariseus pretendiam
encontrar algo ilícito no seu discurso para o acusarem:

Diz-nos, pois, que te parece? É lícito pagar tributo a


César, ou não? Jesus, porém, percebendo a sua
malícia, respondeu: Por que me experimentais,
hipócritas? Mostrai-me a moeda do tributo. E eles lhe
apresentaram um denário. Perguntou-lhes ele: De
quem é esta imagem e inscrição? Responderam: De
César. Então lhes disse: Dai, pois, a César o que é de
César, e a Deus o que é de Deus. Ao ouvirem isso,
ficaram admirados; e, deixando-o, se retiraram.
(Mateus 22:17-22)

O Império Romano estava a governar Israel. Todas


as províncias conquistadas deviam pagar impostos a
César. Os fariseus pretendiam que Cristo dissesse algo
que despoletasse uma transgressão contra os romanos, a
fim de que as autoridades romanas o prendessem. A
resposta foi acima de todas as expetativas: “Dai a César o
que é de César, e a Deus o que é de Deus”.
A pergunta feita pelo Senhor é determinante para
compreendermos a passagem: “de quem é a imagem e
inscrição”? Na moeda, estava a inscrição de César, logo o
dinheiro pertencia-lhe. A Deus pertence aquilo que
tiver a sua imagem também. Onde está a imagem de
Deus? O homem é a imagem de Deus!
Deus não está minimamente interessado no
dinheiro dos homens, mas a forma como os homens dão
o seu dinheiro revela tudo sobre seu coração. Enquanto
estivermos neste mundo, teremos de pagar os impostos
dos homens. Mas, a Deus devemos dar tudo, começando
pela nossa vida, e também o nosso dinheiro.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 81

Chegamos ao último texto em Mateus que fala


sobre o nosso assunto:

Ai de vós, guias cegos! Que dizeis: Quem jurar pelo


ouro do santuário, esse fica obrigado ao que jurou.
Insensatos e cegos! Pois qual é o maior: o ouro, ou o
santuário que santifica o ouro? E: Quem jurar pelo
altar, isso nada é; mas quem jurar pela oferta que está
sobre o altar, esse fica obrigado ao que jurou. Cegos!
Pois qual é maior: a oferta, ou o altar que santifica a
oferta? Portanto, quem jurar pelo altar jura por ele e
por tudo quanto sobre ele está; e quem jurar pelo
santuário jura por ele e por aquele que nele habita; e
quem jurar pelo céu jura pelo trono de Deus e por
aquele que nele está assentado. Ai de vós, escribas e
fariseus, hipócritas! Porque dais o dízimo da
hortelã, do endro e do cominho, e tendes omitido o
que há de mais importante na lei, a saber, a justiça, a
misericórdia e a fé; estas coisas, porém, devíeis fazer,
sem omitir aquelas. Guias cegos! Que coais um
mosquito, e engolis um camelo. (Mateus 23:16-24)

Os fariseus, nas suas muitas interpretações da Lei,


estabeleceram que quem jurasse pelo templo não tinha
de cumprir o juramento, mas deveria jurar pelo ouro do
templo e então ficavam obrigados a cumprir. Significa
que valorizavam mais o ouro que o próprio templo. E
hoje? Valorizamos mais as pessoas, ou a sua riqueza? Do
mesmo modo, valorizavam mais a oferta que o altar.
Como é hoje? Valorizamos mais as ofertas, ou as
pessoas? Valorizamos mais o altar dentro do edifício da
igreja ou o lugar onde Deus habita, os altares dentro do
coração de cada crente? Valorizamos mais a vida
espiritual ou aquilo que podemos obter das pessoas? A
preocupação da liderança é tornar maior e mais luxuoso
82 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

o edifício da igreja ou apoiar as vidas que ali se reúnem?


É desperdiçado dinheiro com coisas supérfluas, quando
há necessidades na casa dos crentes?
Os escribas e fariseus davam o dízimo de tudo, até
das ervas aromáticas usadas na cozinha, mas não
compreendiam o que Deus considerava importante: a
justiça, a misericórdia e a fé. O Senhor não disse para não
darem dízimos, pois a Lei estava em vigor. Ele sempre
cumpriu a Lei e exortou ao seu cumprimento. Os levitas
funcionavam no templo no seu serviço normal e era
regulado pela Lei que o Pai estabelecera.
Cristo mostrou que dar o dízimo não era o mais
importante, mas outras coisas que até pertenciam à Lei,
como tantas vezes repetiu, direta e indiretamente: o
amor a Deus e ao próximo.
Lucas registou uma história curiosa. Não sabemos
se era uma parábola ou relato de algo que aconteceu:

Dois homens subiram ao templo para orar; um


fariseu, e o outro publicano. O fariseu, de pé, assim
orava consigo mesmo: ó Deus, graças te dou que não
sou como os demais homens, roubadores, injustos,
adúlteros, nem ainda com este publicano. Jejuo duas
vezes na semana, e dou o dízimo de tudo quanto
ganho. Mas o publicano, estando em pé de longe,
nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas no
peito, dizendo: ó Deus, sê propício a mim, o pecador!
Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e
não aquele; porque todo o que a si mesmo se exaltar
será humilhado; mas o que a si mesmo se humilhar
será exaltado. (Lucas 18:10-14)

No período levítico, com tantos mandamentos


obrigatórios, ainda assim, Deus justificou aquele que se
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 83

humilhou em vez daquele que cumpria todos os


mandamentos, mas se considerava justo a si mesmo. Dá
que pensar… Todos os crentes procuram a bênção de
Deus. Se pudessem entender o coração de Deus! Se os
líderes das igrejas pudessem entender que não lideram
empresas, mas pessoas que são o verdadeiro tesouro!
As pessoas fazem o que ouvem dos púlpitos.
Poucos conferem nas Escrituras e se dedicam a meditar
no que ouvem. A responsabilidade está sobre os
pregadores. Todos devemos ter temor naquilo que
pregamos, ensinamos ou escrevemos. É uma grande
responsabilidade!
84 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 85

O Dinheiro em Atos

Vimos nos capítulos anteriores que Cristo é o nosso


Sumo-sacerdote e que existem novas leis para regular
esse novo sacerdócio. Houve mudanças! Não se deu uma
total quebra, antes é uma continuação, um crescimento…
Devemos receber cuidadosamente o que Atos e as
Epistolas têm para nos ensinar, pois os Evangelhos não
foram escritos debaixo da Nova Aliança.
O Senhor ensinou princípios universais, não
estamos a desconsiderar os Evangelhos. Antes pelo
contrário, se Paulo ou outro autor dissessem algo
contrário a um ensinamento do Senhor, não o
deveríamos aceitar. No entanto, é um facto que o
ensinamento de Atos e Epístolas é de extrema
importância para o povo de Deus nascido de novo.
Depois do derramar do Espírito na festa de
Pentecostes, a Igreja cresceu tremendamente:

Todos os que criam estavam unidos e tinham tudo


em comum. E vendiam suas propriedades e bens e os
repartiam por todos, segundo a necessidade de cada
um. E, perseverando unânimes todos os dias no
templo, e partindo o pão em casa, comiam com
alegria e singeleza de coração, louvando a Deus, e
caindo na graça de todo o povo. E cada dia
acrescentava-lhes o Senhor os que iam sendo salvos.
(Atos 2:44-47)
86 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Confesso que fico triste quando comparo a igreja


atual com estas primeiras conversões. Sonho com o dia
em que líderes cortem com a corrente atual das coisas.
Sonho com líderes nos púlpitos dizendo: “é tempo de
sermos como Deus nos chamou para ser, é tempo de
reconstruirmos vidas e não templos de pedra, é tempo de
cuidarmos uns dos outros e não da aparência e riqueza
pessoal…”.
Sonho com o dia em que o dinheiro dado na igreja
será para repartir com quem tem mais necessidade, não
para um homem administrar como entende e fazer
crescer a denominação com instalações mais chamativas
e conteúdo mais luxuoso. Sonho acordada com ricos a
dar de si e pobres a dar de si, como um só, sem
exigências de valores percentuais, mas entregando tudo,
para que todos sejam um.
Antes de iniciar este estudo, enquanto adorava na
igreja onde congregava, fui interrompida por uma
pessoa. Ela pediu-me apenas dez euros até ao início do
mês seguinte. Infelizmente estava no fim do mês e
excecionalmente não tinha dinheiro na minha conta
bancária, o que também não precisava pois o resto do
mês ia passá-lo com os meus pais, numa semana de
férias. Tive de lhe dizer que não tinha, mas para se
dirigir a uma diaconisa que talvez a pudesse ajudar.
Fiquei consternada com a situação! Sei que muitos
acham errado o que ela fez, por me ter abordado
pedindo dinheiro… Eu fiquei muito triste por não ter
podido dar-lhe. Foi nesse dia que comecei a rever tudo o
que tinha aprendido sobre esta área. Foi este pedido que
me fez escrever este estudo.
Ouço em todas as igrejas pedirem-se ofertas para
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 87

melhorar o som, fazer obras, para abençoar missões… E


estas pessoas que estão entre nós com necessidade? Qual
a nossa responsabilidade individual e coletiva para com
elas?
Os primeiros convertidos, depois da ressurreição,
sabiam que o dinheiro apenas tem o valor de suprir as
necessidades do homem, enquanto ele tem de estar na
terra. Podemos enganar os homens, aparentando ser
muito zelosos porque entregamos os nossos dízimos,
mas Deus vê como utilizamos o dinheiro com que
ficamos. Ele sabe o que temos na conta bancária, sabe o
dinheiro que gastamos naquilo que não é pão e nos
deleites sem valor algum, enquanto muitos irmãos
sofrem privações terríveis. Que valor tem dar o dízimo,
se não nos preocuparmos com aquele que tem
necessidades?

Da multidão dos que criam, era um só o coração e


uma só a alma, e ninguém dizia que coisa alguma das
que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes
eram comuns. Com grande poder os apóstolos
davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e
em todos eles havia abundante graça. Pois não havia
entre eles necessitado algum; porque todos os que
possuíam terras ou casas, vendendo-as, traziam o
preço do que vendiam e o depositavam aos pés dos
apóstolos. E se repartia a qualquer um que tivesse
necessidade. Então José, cognominado pelos
apóstolos Barnabé (que quer dizer, filho de
consolação), levita, natural de Chipre, possuindo um
campo, vendeu-o, trouxe o preço e o depositou aos
pés dos apóstolos. (Atos 4:32-37)
88 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Os apóstolos encarregavam-se de distribuir a


riqueza de forma que ninguém tivesse necessidades. Não
usavam o dinheiro para enriquecerem, comprando
aquilo que é mais vistoso, para mostrarem que têm
muita fé. Não usavam o dinheiro para construírem um
grande templo, com os equipamentos mais modernos da
época.
Todos gostamos de conforto, contudo se o meu
irmão vai para casa e mal tem o que comer, se os seus
filhos não podem ter assistência médica, se
experimentam necessidades diversas, como poderei
pensar sequer em grandes templos, mesmo que a razão
dada seja “a expansão do reino de Deus”?
Fico consternada com a forma como a igreja pensa
atualmente! Como ficar indiferente? Os homens julgam
apenas segundo a aparência, mas Deus vê tudo o que
não se vê. Podemos enganar os homens, podemos
enganar-nos a nós mesmos, mas jamais enganaremos a
Deus. É tempo de sondarmos os nossos corações, de
termos temor e de nos arrependermos. Lembremos o que
aconteceu a Ananias e Safira:

Mas um certo homem chamado Ananias, com Safira,


sua mulher, vendeu uma propriedade, e reteve parte
do preço, sabendo-o também sua mulher; e levando a
outra parte, a depositou aos pés dos apóstolos. Disse
então Pedro: Ananias, por que encheu Satanás o teu
coração, para que mentisses ao Espírito Santo e
retivesses parte do preço do terreno? Enquanto o
possuías, não era teu? E vendido, não estava o preço
em teu poder? Como, pois, formaste este desígnio em
teu coração? Não mentiste aos homens, mas a Deus.
E Ananias, ouvindo estas palavras, caiu e expirou. E
grande temor veio sobre todos os que souberam
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 89

disto. Levantando-se os moços, cobriram-no e,


transportando-o para fora, o sepultaram. Depois de
um intervalo de cerca de três horas, entrou também
sua mulher, não sabendo o que havia acontecido. E
perguntou-lhe Pedro: Diz-me: Vendestes por tanto
aquele terreno? E ela respondeu: Sim, por tanto.
Então Pedro lhe disse: Por que é que combinastes
entre vós provar o Espírito do Senhor? Eis aí à porta
os pés dos que sepultaram o teu marido, e te levarão
também a ti. Imediatamente ela caiu aos pés dele e
expirou. E entrando os moços, acharam-na morta e,
levando-a para fora, sepultaram-na ao lado do
marido. Sobreveio grande temor a toda a igreja e a
todos os que ouviram estas coisas. (Atos 5:1-11)

O pecado de Ananias e sua mulher não foi reter


parte do dinheiro, mas foi mentir acerca do assunto. Eles
eram livres para dar apenas uma parte ou mesmo não
dar nada. Precisamos crescer no temor a Deus e não usar
de mentiras neste assunto do dinheiro na Igreja.
O dinheiro ofertado não pertence a homem algum,
mesmo ao supremo líder de uma denominação. O
dinheiro pertence à igreja, para seu suprimento em
primeiro lugar.
Pedro respondeu a quem lhe ofereceu dinheiro em
troca de poder: “vá tua prata contigo à perdição, pois
cuidaste adquirir com dinheiro o dom de Deus” (Atos 8:20).
Ninguém será melhor líder diante de Deus por ter um
grande edifício ou grandes carros. O poder de Deus não
pode ser adquirido com dinheiro. Posições e cargos não
deveriam ser ganhos com dinheiro.
Num tempo avançado do seu ministério, Paulo
exorta a liderança na igreja de Éfeso:
90 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Cuidai pois de vós mesmos e de todo o rebanho sobre


o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para
apascentardes a igreja de Deus, que ele adquiriu com
seu próprio sangue. Eu sei que depois da minha
partida entrarão no meio de vós lobos cruéis que
não pouparão rebanho, e que dentre vós mesmos se
levantarão homens, falando coisas perversas para
atrair os discípulos após si. Portanto vigiai,
lembrando-vos de que por três anos não cessei noite e
dia de admoestar com lágrimas a cada um de vós.
Agora pois, vos encomendo a Deus e à palavra da
sua graça, àquele que é poderoso para vos edificar e
dar herança entre todos os que são santificados. De
ninguém cobicei prata, nem ouro, nem vestes. Vós
mesmos sabeis que estas mãos proveram as minhas
necessidades e as dos que estavam comigo. Em tudo
vos dei o exemplo de que assim trabalhando, é
necessário socorrer os enfermos, recordando as
palavras do Senhor Jesus, porquanto ele mesmo
disse: Coisa mais bem-aventurada é dar do que
receber. Havendo dito isto, pôs-se de joelhos, e orou
com todos eles. (Atos 20.28-36)

Este homem era extraordinário! Ele dava o


exemplo, trabalhando sempre que era necessário. Podia
perfeitamente receber um salário sem necessidade de ter
um trabalho secular. Seria muito fácil. Bastaria falar
sobre o assunto e muitos dos que foram curados e salvos
se prontificariam a sustentá-lo. Porém, Paulo não queria
apenas ensinar com palavras, ele queria ser um
exemplo para os restantes líderes. Além de se sustentar,
ainda sustentava aqueles que o acompanhavam no
trabalho missionário.
Deus precisa mais que os líderes treinem os
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 91

irmãos a fazer a obra de Deus do que eles trabalhem a


tempo inteiro nela. Deus não procura perfeição
segundo os olhos humanos, mas o envolvimento
imperfeito de todos os seus filhos. Os líderes foram
chamados para treinar o povo de Deus, não para fazer o
trabalho por ele, com a desculpa que não há mais
ninguém. Se há pessoas nas cadeiras ouvindo as
pregações, então essas são as pessoas que vão fazer o
trabalho. Veja o Espírito nelas e não as suas
incapacidades!
Não me interpretem mal… Há lugar para os que
recebem da igreja, há lugar para o exercício da liderança,
há lugar para estes terem a sua proeminência.
Simplesmente, há prioridades, e não estão sendo
consideradas as prioridades certas.
Enquanto o templo não foi destruído, continuava-se
a dar ofertas no templo. Paulo afirma depois de ser
preso: “vários anos depois vim trazer à minha nação esmolas e
ofertas” (Atos 24:17), referindo-se ao que fazia no templo
quando o encontraram.
Depois da ressurreição, o templo não foi
abandonado, mas tornou-se um lugar para orar e ofertar
a Deus. Não era o centro da vida espiritual, era um
auxiliar, pois havia a consciência de que o verdadeiro
templo era agora o homem nascido de novo.
Aproximava-se o tempo em que o templo seria destruído
e aqueles que ainda se apegavam ao material, teriam de
o deixar.
92 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 93

O Dinheiro nas Epístolas


Neste capítulo iremos listar todas as passagens que
instruem acerca de dinheiro na vida do crente nascido de
novo e sua liderança. Devemos estar muito atentos à
instrução dada pelas Epístolas. Nelas está contido o
ensinamento específico para cada crente da Nova
Aliança.

PAGAMENTOS DE IMPOSTOS:

Seguindo o ensino do Senhor, Paulo também


exortou no sentido de pagarmos os nossos impostos:

Toda alma esteja sujeita às autoridades superiores;


porque não há autoridade que não venha de Deus; e
as que existem foram ordenadas por Deus. Por isso
quem resiste à autoridade resiste à ordenação de
Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a
condenação. Porque os magistrados não são motivo
de temor para os que fazem o bem, mas para os que
fazem o mal. Queres tu, pois, não temer a
autoridade? Faz o bem, e terás louvor dela;
porquanto ela é ministro de Deus para teu bem. Mas,
se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada;
porque é ministro de Deus, e vingador em ira contra
aquele que pratica o mal. Pelo que é necessário que
lhe estejais sujeitos, não somente por causa da ira,
mas também por causa da consciência. Por esta razão
também pagais tributo; porque são ministros de
94 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Deus, para atenderem a isso mesmo. Dai a cada um o


que lhe é devido: a quem tributo, tributo; a quem
imposto, imposto; a quem temor, temor; a quem
honra, honra. (Romanos 13:1-7)

As autoridades seculares existem como bênção de


Deus para a sociedade, para que haja paz e alguma
justiça social. Este texto não significa que cada homem
específico foi colocado por Deus em autoridade. Muitos
homens sobem ao poder usando esquemas e através de
corrupção. Não foi Deus que os colocou. Isto é válido
para as autoridades seculares e também para as
autoridades na igreja. Contudo, a existência de
autoridades é algo que vem de Deus.
É ao cargo e não à pessoa que nos sujeitamos.
Quando alguém passa a ocupar um lugar de autoridade,
devemos respeitar essa pessoa, não pela pessoa em si ou
por qualquer coisa errada que possa fazer, mas por ser
uma autoridade. É o cargo que devemos honrar, não os
erros da pessoa que está no cargo.
Paulo diz-nos que devemos pagar os nossos
impostos, com temor, como honrando a Deus. É errado
um cristão não pagar os seus impostos, seja um
particular ou alguém que possui uma empresa. Fugir aos
impostos é o mesmo que roubar. Não convém que os
cristãos façam tal.

SALÁRIO DO QUE SERVE A DEUS:

É bíblico, pessoas trabalharem a tempo inteiro,


pregando o Evangelho e cuidando da vida espiritual dos
crentes, recebendo um salário da igreja que abençoam:
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 95

Ou será que só eu e Barnabé não temos direito de


deixar de trabalhar? Quem jamais vai à guerra à sua
própria custa? Quem planta uma vinha e não come
do seu fruto? Ou quem apascenta um rebanho e não
se alimenta do leite do rebanho? Porventura digo eu
isto como homem? Ou não diz a lei também o
mesmo? Pois na lei de Moisés está escrito: Não atarás
a boca do boi quando debulha. Porventura está Deus
cuidando dos bois? Ou não o diz certamente por nós?
Com efeito, é por amor de nós que está escrito;
porque o que lavra deve debulhar com esperança de
participar do fruto. Se nós semeamos para vós as
coisas espirituais, será muito que de vós colhamos
as materiais? Se outros participam deste direito sobre
vós, por que não nós com mais justiça? Mas nós
nunca usamos deste direito; antes suportamos tudo,
para não pormos impedimento algum ao evangelho
de Cristo. Não sabeis vós que os que administram o
que é sagrado comem do que é do templo? E que os
que servem ao altar, participam do altar? Assim
ordenou também o Senhor aos que anunciam o
evangelho, que vivam do evangelho. (I Coríntios
9:6-14)

Paulo e Barnabé eram missionários que pregavam


por todo o mundo conhecido, abrindo igrejas. Eles
dedicavam as suas vidas a semear na vida espiritual dos
homens. Paulo ensina que aquele que prega o Evangelho
deve ser suportado materialmente. Apesar disso, o
apóstolo afirma que nunca usufruiu desse direito, para
não servir de tropeço a alguém que por esse motivo não
se convertesse ou se enfraquecesse na fé.
O que podemos aprender do exemplo de Paulo?
Que realmente quem dedica todo o tempo ao
96 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Evangelho é justo que seja remunerado. Mas, não tem


de o ser obrigatoriamente. Existem casos em que é
benéfico que não aconteça.
Podemos perguntar-nos: o que é trabalhar a tempo
inteiro no ministério? Cada crente é chamado para o
ministério de ser embaixador de Cristo. Cada crente deve
encarnar a Cristo neste mundo e vivê-lo a tempo inteiro.
Porém, não podem todos receber salário das igrejas.
Quando faz sentido que alguém receba da igreja? São
questões em que devemos pensar.
Infelizmente, a profissionalização do trabalho
pastoral tem distorcido o verdadeiro ministério do
pastor. Ser pastor não é ser o líder principal de uma
congregação, com uma remuneração desta. Ser pastor é
um dom, como outros dons ministeriais2.
A congregação pode ter uma ou várias pessoas a
receberem ordenado, mas não tem de ser um pastor.
Pode ser um missionário no exterior, por exemplo. Um
missionário em outro país pode ter dificuldade em
encontrar trabalho lá. A igreja pode sustentar tal pessoa.
A liderança pode trabalhar secularmente, total ou
parcialmente. Na verdade, não há regras. Até poderá ser
uma bênção a liderança ter um trabalho secular, pois
poderá ser um incentivo para ativar os ministérios dos
restantes crentes. Tudo depende se a congregação é ativa
ou passiva.
Conheci uma denominação, em que a liderança era
composta por um grupo de anciãos, com as suas
respetivas profissões. Todos os anciãos tinham o mesmo
nível hierárquico. Eles tinham reuniões mensais, para
tomarem decisões e uma escala, para pregação e outros

2Assunto aprofundado no livro da autora: “O sucesso do fracasso


ou o fracasso do sucesso?”.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 97

trabalhos necessários à vida da congregação. Não havia


um líder supremo, todos os anciãos se consideravam
servos do Senhor. Essa igreja funciona, há mais de um
século, desta forma.
O facto de existirem destes casos, não significa
obrigatoriedade de ser sempre assim. É uma questão de
opção das igrejas. Devemos olhar para o ensino bíblico
e procurar implantar o melhor sistema para cada caso,
sem ficarmos presos a tradições. Pode ser muito
benéfico ter uma ou várias pessoas remuneradas, desde
que isso não sirva de atrofio ao desenvolvimento dos
dons do corpo de Cristo, nem seja uma sobrecarga
financeira para os irmãos.
Devemos ter consciência que as Escrituras
neotestamentárias não impõem um padrão obrigatório.
Não devemos permitir que os nossos irmãos passem
necessidades materiais, quer se dediquem à pregação
do Evangelho a tempo inteiro, ou quer tenham um
trabalho secular, quer sejam líderes ou meros
assistentes de cultos.
Paulo agradeceu aos filipenses por estes terem sido
sensíveis às suas necessidades materiais, dando-lhes
implicitamente os parabéns:

Ora, muito me regozijo no Senhor por terdes


finalmente renovado o vosso cuidado para comigo;
do qual na verdade andáveis lembrados, mas vos
faltava oportunidade. Não digo isto por causa de
necessidade, porque já aprendi a contentar-me com
as circunstâncias em que me encontre. Sei passar
falta, e sei também ter abundância; em toda maneira e
em todas as coisas estou experimentado, tanto em ter
fartura, como em passar fome; tanto em ter
abundância, como em padecer necessidade. Posso
98 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

todas as coisas naquele que me fortalece. Todavia


fizestes bem em tomar parte na minha aflição.
Também vós sabeis, ó filipenses, que, no princípio do
evangelho, quando parti da Macedónia, nenhuma
igreja comunicou comigo no sentido de dar e de
receber, senão vós somente; porque estando eu ainda
em Tessalónica, não uma só vez, mas duas,
mandastes suprir-me as necessidades. (Filipenses
4:10-16)

Este apóstolo, um dos homens mais extraordinários


da história do cristianismo, passou fome e padeceu
necessidades. Ele poderia ter recebido o maior salário
entre os cristãos de todos os tempos, tendo em conta o
número de igrejas que fundou.
Ele poderia ter pedido dízimos de todas elas e ser
riquíssimo, usando o dinheiro para viajar na pregação e
ensino da Palavra. Assim todos veriam a sua grande fé e
a unção poderosa sobre o seu ministério! Contudo, ele
disse que passou necessidades e que sabia viver assim. A
razão de felicitar os ofertantes não era por receber ofertas
destes, mas pelo facto de estes terem aprendido a dar:

Não que procure dádivas, mas procuro o fruto que


cresça para a vossa conta. Mas tenho tudo; tenho-o
até em abundância; cheio estou, depois que recebi de
Epafrodito o que da vossa parte me foi enviado,
como cheiro suave, como sacrifício aceitável e
aprazível a Deus. Meu Deus suprirá todas as vossas
necessidades segundo as suas riquezas na glória em
Cristo Jesus. (Filipenses 4:17-19)

Segundo o apóstolo, a oferta que lhe fizeram era


como um sacrifício aceitável a Deus, pois estava
necessitado e eles tiveram maturidade suficiente para
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 99

saberem agir nessa situação. A oferta mostrava, tal como


um fruto na sua árvore, que eles estavam a crescer
espiritualmente. Como o Senhor ensinou e vimos atrás, o
que faziam com o seu dinheiro, mostrava onde estava o
seu coração.
Paulo relatou aos tessalonicenses algo mais acerca
do seu procedimento pessoal face ao dinheiro:

Mandamo-vos, irmãos, em nome do Senhor Jesus


Cristo, que vos aparteis de todo irmão que anda
desordenadamente, e não segundo a tradição que de
nós recebestes. Porque vós mesmos sabeis como
deveis imitar-nos, pois que não nos portamos
desordenadamente entre vós, nem comemos de
graça o pão de ninguém, antes com labor e fadiga
trabalhávamos noite e dia para não sermos pesados
a nenhum de vós. Não porque não tivéssemos direito,
mas para vos dar nós mesmos exemplo, para nos
imitardes. Porque, quando ainda estávamos
convosco, isto vos mandamos: se alguém não quer
trabalhar, também não coma. Porquanto ouvimos
que alguns entre vós andam desordenadamente, não
trabalhando, antes intrometendo-se na vida alheia; a
esses tais, porém, ordenamos e exortamos por nosso
Senhor Jesus Cristo que, trabalhando
sossegadamente, comam o seu próprio pão. Vós,
porém, irmãos, não vos canseis de fazer o bem. Mas,
se alguém não obedecer à nossa palavra por esta
carta, notai-o e não tenhais relações com ele, para que
se envergonhe; todavia não o considereis como
inimigo, mas admoestai-o como irmão. (II
Tessalonicenses 3.6-15)

Paulo está a repreender aqueles que não querem


trabalhar. Pela passagem percebemos que existiam
100 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

pessoas que não queriam ter um trabalho “secular” para


se sustentarem a si mesmos. Ele usou uma expressão que
se tornou popular: “quem não trabalha, não coma”.
A razão principal pela qual o apóstolo agia era
para servir de exemplo. Para isso, estava disposto a
renunciar a salários e também disposto a renunciar a ser
sustentado pelos crentes.
Pelas Cartas de Paulo percebemos uma
preocupação acerca da Igreja de Cristo como um todo e
não apenas de uma cidade ou grupo. Devia haver maior
partilha e unidade na área financeira, entre
denominações, pois não somos apenas irmãos quando
pertencemos à mesma denominação. Os cristãos das
outras denominações não são primos, são irmãos.
Precisamos preocupar-nos com as necessidades além das
nossas paredes denominacionais.
Paulo sempre se refere às igrejas como sendo
lideradas por anciãos e não por uma liderança singular:

Os anciãos que governam bem sejam tidos por


dignos de duplicada honra, especialmente os que
labutam na pregação e no ensino. Porque diz a
Escritura: Não atarás a boca ao boi quando debulha.
E: Digno é o trabalhador do seu salário. Não aceites
acusação contra um ancião, senão com duas ou três
testemunhas. Aos que vivem no pecado, repreende-
os na presença de todos, para que também os outros
tenham temor. (I Timóteo 5:17-20)

Os anciãos que desempenham bem o seu serviço,


devem ser reconhecidos e honrados financeiramente com
dupla honra. Além disso, a Escritura afirma que o ancião
não é intocável por ser líder. Se andar em pecado há
formas bíblicas de ser exposto, mas devemos ter cuidado
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 101

para não levantar um falso testemunho sem base para


isso. A Bíblia indica-nos que para o ancião deve haver
uma repreensão pública quando este vive em pecado,
para que todos, ao terem conhecimento, não sejam
influenciados por este.

RECOLHA DE OFERTAS:

Apesar do Sacerdócio Levítico ter sido substituído


pelo Sacerdócio de Cristo, continuam a existir ofertas,
mas de tipo diferente, baseadas em leis diferentes:

De sorte que, se a perfeição fosse pelo sacerdócio


levítico (pois sob este o povo recebeu a lei), que
necessidade havia ainda de que outro sacerdote se
levantasse, segundo a ordem de Melquisedeque, e
que não fosse contado segundo a ordem de Arão?
Pois, mudando-se o sacerdócio, necessariamente se
faz também mudança da lei. Porque aquele, de quem
estas coisas se dizem, pertence a outra tribo, da qual
ninguém ainda serviu ao altar, visto ser manifesto
que nosso Senhor procedeu de Judá, tribo da qual
Moisés nada falou acerca de sacerdotes. E ainda
muito mais manifesto é isto, se à semelhança de
Melquisedeque se levanta outro sacerdote, que não
foi feito conforme a lei de um mandamento carnal,
mas segundo o poder duma vida indissolúvel.
Porque dele assim se testifica: Tu és sacerdote para
sempre, segundo a ordem de Melquisedeque. Pois,
com efeito, o mandamento anterior é ab-rogado por
causa da sua fraqueza e inutilidade (pois a lei
nenhuma coisa aperfeiçoou), e desta sorte é
introduzida uma melhor esperança, pela qual nos
aproximamos de Deus. (Hebreus 7:11-19)
102 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

As leis que regulavam o sacerdócio anterior foram


mudadas: “mudando-se o sacerdócio, necessariamente se faz
também mudança da lei”. Apenas esses mandamentos que
regulavam o sacerdócio foram substituídos. As leis
foram mudadas e as novas leis podem ser encontradas
nos ensinamentos dados pelos autores
neotestamentários, inspirados pelo Espírito.
Cristo preparou os corações para a mudança, nos
Evangelhos. Ele veio sob a Lei, mas a plenitude da Graça
veio por Ele. Não que Deus não tivesse graça antes! A
graça de Deus faz parte Dele, mas Cristo é manifestação
plena da graça do Pai ao homem.
O Senhor não veio abolir toda a Lei de Deus, mas
apenas veio substituir as leis do antigo sacerdócio.
Mandamentos como “não roubar”, “não adulterar”, “não
matar” permanecerão para sempre, porque não têm nada
a ver com leis de sacerdócio.
Nas Epístolas encontramos os ensinamentos sobre
ofertas na igreja. Vejamos as passagens onde são
referidas ofertas:

Mas agora vou a Jerusalém para ministrar aos santos.


Porque pareceu bem à Macedónia e à Acaia levantar
uma oferta fraternal para os pobres dentre os santos
que estão em Jerusalém. Isto pois lhes pareceu bem,
como devedores que são para com eles. Porque, se os
gentios foram participantes das bênçãos espirituais
dos judeus, devem também servir a estes com as
materiais. Tendo, pois, concluído isto, e havendo-lhes
consignado este fruto, de lá, passando por vós, irei à
Espanha. (Romanos 15.25-28)

Ora, quanto à coleta para os santos fazei vós também


o mesmo que ordenei às igrejas da Galileia. No
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 103

primeiro dia da semana cada um de vós ponha de


parte o que puder, conforme tiver prosperado,
guardando-o, para que se não façam coletas quando
eu chegar. E, quando tiver chegado, mandarei os que
por carta aprovardes para levar a vossa dádiva a
Jerusalém; mas, se valer a pena que eu também vá,
irão comigo. (I Coríntios 16:1-4)

O ensino paulino integrava o assunto de ofertas e,


segundo ele, as ofertas destinavam-se a apoiar as
necessidades dos irmãos das diversas regiões, não
apenas da própria congregação. Estas passagens são
utilizadas para falar de ofertas para sustento dos
ministérios locais, mas elas não falam desse assunto. As
ofertas referidas destinam-se a irmãos pobres de outras
congregações distantes.
Um princípio importante era que cada um colocava
de parte “segundo o que tinha prosperado”. O valor das
ofertas era decidido pelo próprio dador. Os que tinham
muito deveriam dar muito, os que tinham pouco davam
pouco. Havia uma preocupação pelos cristãos em geral e
pelas suas necessidades. Não se ofertava apenas para o
grupo local a que se pertencia. As ofertas são chamadas
de “ministração a favor dos santos”:

Pois quanto à ministração que se faz a favor dos


santos, não necessito escrever-vos; porque bem sei a
vossa prontidão, pela qual me glorio de vós perante
os macedónios, dizendo que a Acaia está pronta
desde o ano passado; e o vosso zelo tem estimulado
muitos. Mas enviei estes irmãos, a fim de que neste
particular não se torne vão o nosso louvor a vosso
respeito; para que, como eu dizia, estejais
preparados, a fim de, se acaso alguns macedónios
forem comigo, e vos acharem desapercebidos, não
104 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

sermos nós envergonhados (para não dizermos vós)


nesta confiança. Portanto, julguei necessário exortar
estes irmãos que fossem adiante ter convosco, e
preparassem de antemão a vossa beneficência, já há
tempos prometida, para que a mesma esteja pronta
como beneficência e não como por extorsão. (II
Coríntios 9:1-5)

As ofertas devem ser dadas voluntariamente como


ato de bondade e não extorquidas de forma
manipuladora e com promessas de enriquecimento.
Os crentes precisam exercitar-se na compaixão.
Quanto ao resto, se forem ensinados a buscar a Deus no
Espírito, certamente as suas necessidades serão
supridas.
Por vezes pode ser necessário repreender o inimigo,
pois este pode atacar esta área material. Em Malaquias
não estaria escrito que Deus repreendia se não fosse algo
comum. Na Nova Aliança, sabemos que Deus deseja que
cresçamos e exerçamos autoridade sobre as trevas. Cristo
exortava os discípulos tantas vezes a não serem tímidos e
a ousarem imitá-lo em fé.
Aqueles que não têm maturidade para tal devem
ser supridos por aqueles que são abastados, atos que
devem ser incentivados e supervisionados pela
liderança. Segue-se um texto muito citado:

Mas digo isto: Aquele que semeia pouco, pouco


também ceifará; e aquele que semeia em abundância,
em abundância também ceifará, Cada um contribua
segundo propôs no seu coração; não com tristeza,
nem por constrangimento; porque Deus ama ao que
dá com alegria. E Deus é poderoso para fazer
abundar em vós toda a graça, a fim de que, tendo
sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 105

toda boa obra; conforme está escrito: Espalhou, deu


aos pobres; a sua justiça permanece para sempre.
Ora, aquele que dá a semente ao que semeia, e pão
para comer, também dará e multiplicará a vossa
sementeira, e aumentará os frutos da vossa justiça,
enquanto em tudo enriqueceis para toda a
liberalidade, a qual por nós reverte em ações de
graças a Deus. Porque a ministração deste serviço
não só supre as necessidades dos santos, mas
também transborda em muitas ações de graças a
Deus; visto como, na prova desta ministração, eles
glorificam a Deus pela submissão que confessais
quanto ao evangelho de Cristo, e pela liberalidade da
vossa contribuição para eles, e para todos; enquanto
eles, pela oração por vós, demonstram o ardente afeto
que vos têm, por causa da superabundante graça de
Deus que há em vós. (II Coríntios 9:6-14)

Em primeiro lugar a passagem não fala em dar


ofertas para o funcionamento da igreja local. Pode
também ser aplicado, mas não é o que diz diretamente.
Ela fala especificamente em dar aos pobres e aos irmãos
em necessidade. É neste contexto que fala em semear
dinheiro.
Tem sido feito um abuso extremo do “semear e
colher dinheiro” na Igreja, como se fosse uma magia.
Será que o texto promete que ao darmos dinheiro aos
outros teremos mais dinheiro ou servirá para resolver
problemas?
Paulo é muito claro ao afirmar que aquele que dá
deve fazê-lo com alegria e sem constrangimento. Parece-
me muito diferente da atitude de dar com o propósito de
enriquecer ou de resolver problemas.
Pelo facto de sermos filhos de Deus temos
106 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

confiança de que Deus supre as nossas necessidades e


nos alegramos nisso. O Senhor já disse no Evangelho de
Mateus que cuida das aves, logo muito mais cuidará de
nós. Somos filhos e temos acesso à mesa do Pai.
Mesmo que os crentes não dessem, Deus já supriria
a sua necessidade material, pois se cuida das aves muito
mais dos seus filhos. O texto pretende transmitir outra
coisa: aquele que conhece Deus, está grato e pode com
alegria dar o que Deus lhe deu, porque não lhe fará falta.
A passagem não fala num negócio com Deus, não é
um investimento financeiro, não é uma troca com Deus.
Deus já fez tudo, dando o seu Filho! Contudo, o coração
do filho de Deus deve aprender a ser como o seu Pai e
dar de si, amando o próximo.
Quando alguém passa necessidades, a Bíblia ensina
que os restantes irmãos devem ajudar a pessoa com os
seus bens materiais. Não é a pessoa que tem de dar mais
dinheiro para produzir um milagre e resolver o seu
problema. O milagre está em fazer aquele que tem
dinheiro ser capaz de dar mais valor ao irmão que à sua
riqueza.
Paulo não disse aos cristãos em necessidade para
“semearem” no seu ministério, que é uma “boa terra” e
assim “prosperarem”… Não! Paulo exorta os que têm, a
partilhar com os que não têm, chamando a isso de
semear.
Vejamos agora a “colheita” referida. Paulo usa
diversas expressões para a consequência deste “semear”:

a) Abundar em vós toda a graça;


b) Tendo sempre em tudo, toda a suficiência,
abundeis em toda a boa obra;
c) Deu aos pobres
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 107

d) A sua justiça dura para sempre


e) Multiplicará a vossa sementeira e aumentará os
frutos da vossa justiça;
f) Em tudo enriqueceis para toda a liberalidade.

Aquele cujo coração é misericordioso com as


necessidades dos irmãos, Deus providenciará maior
graça, para que este possa ajudar outros. Deus nunca
promete enriquecimento pessoal para usufruto dos
prazeres deste mundo, mas antes para ‘toda a
liberalidade’, ou seja, para canalizar para outros. Leia-se
atentamente o texto e certamente não há base para
procurar ter mais dinheiro através de dar dinheiro.
O suprimento e suficiência de Deus já está em nós,
através de Cristo, mas Deus promete fazer abundar a sua
graça, naquele que se dá abundantemente aos outros.
Este experimentará uma graça muito abundante porque
ao dar o que Deus lhe deu, como provisão pessoal, Deus
usará de abundante graça, para que nada lhe falte.
Isto é muito diferente do “negócio” financeiro que é
pregado em muitos grupos cristãos. Não acredito que a
maioria o faça para enriquecer à custa dos crentes. As
passagens têm sido muito distorcidas no último século e
a repetição faz com que aquilo que é repetido, não seja
questionado. Cheguei a ensinar também as mesmas
coisas, quando era jovem de vinte anos e liderava um
grupo familiar. O meu coração era sincero, mas
acreditava naquilo, porque era o que tinha ouvido, e
nunca ousara questionar ou confrontar com as
Escrituras.
Não há nada que nos possa abençoar mais que o
sacrifício de Cristo, mas a nossa disposição a crescer em
amor vai fazer-nos experimentar mais da sua
108 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

abundância. Esta abundância consiste em duas coisas:


“multiplicação da sementeira” e “aumento os frutos da vossa
justiça”.
Se alguém não está disposto a continuar a dar
aquilo que Deus trouxer à sua mão, então não está de
acordo com o texto bíblico:

A multiplicação da sementeira
é uma promessa de mais semente!
O fruto prometido é fruto de justiça,
não dinheiro.
O dinheiro que virá serão novas sementes
e não frutos!

Durante muitos anos ouvi pregar que se semeasse


dinheiro na igreja, colheria dinheiro e que quanto mais
semeasse mais colheria. Assim, os meus bens materiais
seriam o reflexo da minha fé e da minha sementeira.
Parece semelhante, mas é muito diferente do que diz a
Bíblia.
O objetivo bíblico de dar não é para Deus me
abençoar. O objetivo bíblico de dar é para os que têm
necessidades serem abençoados e para que tenhamos o
grande privilégio de sermos canais da bênção divina.
Colheremos frutos de justiça, ou seja, uma recompensa
espiritual e não material. Em tudo isto, Deus continuará
a suprir as necessidades do crente e a dar-lhe ‘mais
semente’. Aquele que dá o que tem ao necessitado, Deus
promete que terá o suficiente.
Claramente, não há lugar para enriquecimento
pessoal! Se alguém está a sofrer e com problemas
financeiros, Deus exorta aqueles que têm abundância a
apoiar em oração e materialmente este irmão com
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 109

necessidade. O texto bíblico atrás não tem resposta para


enriquecimento, mas para darmos do que temos a quem
tem falta.
Deus é bom e não tem prazer no sofrimento dos
seus filhos. O suprimento material das necessidades é
agradável a Deus, mas não um enriquecimento egoísta.
Num quadro resumo lembremos o que diz a passagem:

SEMEAR COLHER
abundância de dinheiro abundância de graça
com alegria Deus ama
Sem constrangimento Toda a suficiência
Não com tristeza Justiça permanece
Abundância de boas obras Sementeira multiplicada
Dar aos pobres Aumenta os frutos de justiça
Aos irmãos em necessidade Enriquecer para liberalidade
Ações de graças
Orações e afeto
Superabundante graça

As duas expressões “sementeira multiplicada” e


“enriquecer para liberalidade” são equivalentes. Significa
que Deus proverá mais semente ou que Deus dará mais
meios àquele que deseja abençoar. Sempre existiram e
existirão ricos e pobres, tanto crentes como descrentes. A
diferença deverá estar em que aquele que é cristão deve
amar os irmãos e partilhar a sua abundância.
Vejamos o que mais diz a Bíblia sobre o “semear”.
O princípio de semear e colher é o mistério dos mistérios.
O Senhor ensinou sobre ele:

E ele lhes disse: A vós é confiado o mistério do


reino de Deus, mas aos de fora tudo se lhes diz
por parábolas; para que vendo, vejam, e não
percebam; e ouvindo, ouçam, e não entendam;
110 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

para que não se convertam e sejam perdoados.


Disse-lhes ainda: Não percebeis esta parábola?
como pois entendereis todas as parábolas? O
semeador semeia a palavra. (Marcos 4:11-14)

A parábola do semeador é apresentada como a


parábola de todas as parábolas. A semente é a Palavra. A
Palavra de Deus e as nossas próprias palavras em geral
são sementes. Podem ser sementes de vida ou sementes
de morte, na nossa vida e na dos outros. Além das
palavras, também as nossas ações são sementes.
Para colher, basta semear. Muitas vezes colhemos o
que não desejamos, mas esquecemos que semeamos
muita coisa que não devíamos ter semeado, com as
nossas palavras e as nossas ações.
Vemos que o mistério referido de semear a Palavra
produz fruto no coração do homem. O homem pode usar
esta ‘arma’ como entende, que ela produzirá. Também
não é uma magia, mas há um poder criativo nas palavras
proferidas.
Não é o nosso tema, mas o apóstolo Tiago, no
capítulo três da sua Epístola, desenvolve o assunto.
Cuidado com a forma como usamos este poder! Aquele
que tiver pouca maturidade poderá usá-lo apenas para
proveito próprio. O sábio usá-lo-á para fazer avançar o
Reino de Deus e abençoar outros.
Ouvi muitas vezes, que a semente produz segundo
a sua espécie. Vezes sem conta ouvi pregar: “se quer
colher dinheiro, tem de semear dinheiro” e “se quer
colher batatas não deve semear cebolas”! Assim, a quem
tivesse problemas financeiros era aconselhado dar tudo o
que tinha…
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 111

A parábola do semeador, antes de mais é uma


parábola! Uma parábola deve ser interpretada como tal.
Há um sentido central que esta parábola pretende
transmitir e não pode pegar-se nela e adaptar-se à nossa
maneira de pensar. Neste caso específico, Cristo explica o
seu sentido: devemos ouvir a palavra semeada em nós e
recebê-la para que esta produza em nós fruto. Não está a
falar de nada mais que a Palavra semeada no nosso
coração.
As palavras não produzem segundo a sua espécie,
senão produziriam apenas mais palavras. Elas
produzem segundo o seu significado, precisando ser
regadas com fé… O dinheiro também não produz
dinheiro necessariamente. A semente é a Palavra, mas a
Palavra pode produzir tudo o resto! Pela Palavra Deus
criou o mundo!
Voltando ao texto anterior (II Coríntios 9:6-14), Paulo
diz que aquilo que é semeado são boas obras e o fruto é
espiritual. O texto bíblico não diz que iremos ficar
ricos. Não significa que se der cem euros irei colher mais
dinheiro.
Creio que Deus prospera o homem que tem o
coração aberto para abençoar outros. Muitos prosperam
também porque enganam e manipulam. A prosperidade
nem sempre é sinal de bênção divina.
Deus deseja o bem dos seus filhos, é um Pai bom.
No entanto, nem sempre é bom para o crente ter muito
dinheiro acima daquilo que necessita. Pode até afastá-lo
de Deus e dos seus princípios. Não está na moda este
discurso, nem é agradável à carne, mas muitos cristãos
amam o dinheiro e vivem debaixo de uma capa de falso
sucesso.
Olhando para os pais da fé, vemos que é possível
112 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

viver em integridade e ser próspero materialmente, mas


nem todos são capazes. Deste modo, a forma mais bíblica
de ofertar é por amor e com alegria de poder contribuir
para a salvação e suprimento de outros. Apenas é
prometido um galardão espiritual.
Se temos problemas financeiros, sondemos a nossa
vida, pois poderemos não estar a seguir a direção do
Espírito ou haver um ataque satânico que temos
autoridade para repelir. Porém, devemos estar dispostos
a dizer como Paulo: sei ter falta e sei ter em abundância.
Nisto tudo, devemos crer que Deus é bom e nos ama,
logo devemos amar os irmãos e exercer compaixão em
todo o tempo.
Estamos neste mundo e acabamos por sofrer algo
das suas crises e sistema. No meio disto, Deus cuidará de
nós e procurará guiar-nos para nos livrar de muitos
males. Precisamos mais que tudo ouvi-lo e obedecer-lhe
nas decisões que tomamos no dia-a-dia. Ao obedecer-
lhe, conduzir-nos-á a “pastos verdejantes” e “águas
tranquilas”.
O texto de II Coríntios 9 coloca ao critério de cada
crente a forma como este deve contribuir. Cada um deve
agir de acordo com o propósito do seu coração. É preciso
ouvir o Espírito e obedecer-lhe, mas é algo individual,
não deve haver coação de nenhum tipo.
O propósito bíblico para a riqueza é a liberalidade,
ou seja, o propósito de receber deve ser dar a quem tem
necessidade. A liderança também é destino, mas não é o
único. É um erro grave e uma tradição antibíblica, a
liderança decidir usar as ofertas para engrandecimento
da denominação em vez do suprimento das
necessidades dos santos, quer dos seus congregados,
quer dos irmãos em necessidade de outras
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 113

congregações. Estes também são irmãos, não primos!

ATENDER A NECESSIDADES:

O amor ao dinheiro é a raiz de todos os males, disse


Paulo a Timóteo:

Se alguém ensina alguma doutrina diversa, e não se


conforma com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus
Cristo, e com a doutrina que é segundo a piedade, é
soberbo, e nada sabe, mas delira acerca de questões e
contendas de palavras, das quais nascem invejas,
porfias, injúrias, suspeitas maliciosas, disputas de
homens corruptos de entendimento, e privados da
verdade, cuidando que a piedade é fonte de lucro; e,
de fato, é grande fonte de lucro a piedade com o
contentamento. Porque nada trouxe para este
mundo, e nada podemos daqui levar; tendo, porém,
alimento e vestuário, estaremos com isso contentes.
Mas os que querem tornar-se ricos caem em tentação
e em laço, e em muitas concupiscências loucas e
nocivas, as quais submergem os homens na ruína e
na perdição. Porque o amor ao dinheiro é raiz de
todos os males; e nessa cobiça alguns se desviaram
da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas
dores. Mas tu, ó homem de Deus, foge destas coisas,
e segue a justiça, a piedade, a fé, o amor, a constância,
a mansidão. Peleja a boa peleja da fé, apodera-te da
vida eterna, para a qual foste chamado, tendo já feito
boa confissão diante de muitas testemunhas. (I
Timóteo 6:3-12)

A piedade não é fonte de lucro. Fazer o bem, dar


aos outros, investir dinheiro por amor e com alegria na
114 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

ajuda a necessitados e na pregação do Evangelho não é


fonte de lucro. Mesmo aquilo a que chamamos “semear”
dinheiro, não é fonte de lucro num sentido material. Isso
é laço e desvia o crente do seu propósito de ser canal,
para outro objetivo de ele mesmo ser o destino da
bênção.
A grande bênção é ter o privilégio de ser um canal
do amor de Deus para os outros. Deveríamos estar
agradecidos por termos alimento, vestuário e outras
necessidades básicas supridas (I Timóteo 6:8).
Paulo avisa-nos do perigo da cobiça. O crente não
deve ambicionar as coisas deste mundo, os seus deleites
e riquezas. Quase parece loucura hoje dizer: “tendo,
porém, alimento e vestuário, estaremos com isso contentes”.
Qual é o cristão desprendido deste mundo ao ponto de
ser capaz de falar assim? O homem de Deus deve fugir
do amor ao dinheiro com todas as suas forças, pois a
sua cobiça desvia a muitos.
Não estou a defender a necessidade de pobreza,
nem a fazer um elogio à miséria. Antes pelo contrário!
Apenas temos de enfatizar que a Bíblia nos dá como
primeira forma de combater a pobreza na Igreja: o que
é mais rico deve dar ao que tem menos! Não emprestar,
mas dar!
Quantos líderes iniciaram o ministério com o
coração puro, sem ambições, apenas querendo servir
Deus e depois com o decorrer do tempo, começaram a
ver outras igrejas a crescer, os seus líderes com carros e
casas luxuosos… O seu coração foi-se endurecendo e
começaram a desejar ter também uma grande empresa
religiosa… As ofertas e a pressão para os crentes darem
começou a aumentar, para a instituição crescer e
prosperar.
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 115

Recentemente, uma irmã que ama realmente o


Senhor manifestava a sua tristeza acerca daquilo que via
acontecer na igreja onde congrega. Ela partilhava que se
enfatizava o desejo de terem um grande edifício para a
congregação, mas via simultaneamente que pessoas
novas, depois de visitarem algumas vezes a igreja, não
eram depois procuradas e acompanhadas. Qual o
propósito da Igreja de Cristo? É ter um grande edifício
ou é converter o coração de homens a Cristo?
É a verdadeira Casa de Deus, os seus filhos, que
deve prosperar, começando pelo espírito e depois na sua
vida em geral, crescendo para abençoar:

Se um irmão ou uma irmã estiverem nus e tiverem


falta de mantimento quotidiano, e algum de vós lhes
disser: Ide em paz, aquentai-vos e fartai-vos; e não
lhes derdes as coisas necessárias para o corpo, que
proveito há nisso? Assim também a fé, se não tiver
obras, é morta em si mesma. (Tiago 2:15-17)

A maior parte das pregações que tenho ouvido


acerca de finanças, diz às pessoas: “ide em paz e fartai-os”.
É certo ensinar a pescar, mas não é certo dizer que se
deve “ensinar a pescar em vez dar o peixe”, porque o que
fará alguém que não consegue aprender a pescar? Temos
de ser realistas: há pessoas nas igrejas que nunca
conseguem crescer… Por causa disso deixam-se morrer à
fome? Em primeiro lugar temos de dar o peixe e depois
pacientemente ensinar a pescar, como o faríamos aos
nossos filhos, com amor e sacrifício.
116 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

EXORTAÇÃO AOS RICOS:

De acordo com as Escrituras, aqueles que são ricos


materialmente deveriam contribuir para ajudar os que
têm menos que eles. As riquezas nada valem, senão para
abençoar outros. Aquele que possui riquezas deve ter
um grande temor de Deus e pedir a ajuda do Espírito
para gerir responsavelmente a sua riqueza, pois o juízo
de Deus estará sobre o rico fraudulento:

E agora, vós ricos, chorai e pranteai, por causa das


desgraças que vos sobrevirão. As vossas riquezas
estão apodrecidas, e as vossas vestes estão roídas pela
traça. O vosso ouro e a vossa prata estão
enferrujados; e a sua ferrugem dará testemunho
contra vós, e devorará as vossas carnes como fogo.
Entesourastes para os últimos dias. Eis que o salário
que fraudulentamente retivestes aos trabalhadores
que ceifaram os vossos campos clama, e os clamores
dos ceifeiros têm chegado aos ouvidos do Senhor dos
exércitos. Deliciosamente vivestes sobre a terra, e vos
deleitastes; cevastes os vossos corações no dia da
matança. Condenastes e matastes o justo; ele não vos
resiste. (Tiago 5:1-5)

Aquele que tem riquezas neste mundo deve ter


consciência de que não é superior ao que é pobre. Um
pastor, com uma pequena igreja de pessoas pobres, não é
inferior a um que tenha uma grande e rica instituição,
acrescido de um dos títulos pomposos da moda. Deus
não olha para o exterior. Os ricos deste mundo devem
enriquecer espiritualmente, fazendo boas obras:
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 117

Manda aos ricos deste mundo que não sejam altivos,


nem ponham a sua esperança na incerteza das
riquezas, mas em Deus, que nos concede
abundantemente todas as coisas para delas
gozarmos; que pratiquem o bem, que se enriqueçam
de boas obras, que sejam liberais e generosos,
entesourando para si mesmos um bom fundamento
para o futuro, para que possam alcançar a verdadeira
vida. (I Timóteo 6:17-19)

ACEÇÃO DE PESSOAS:

Uma das grandes tentações na igreja é tratarmos as


pessoas de forma diferente por terem mais dinheiro ou
terem um cargo superior, com um determinado título.
Um líder não é um crente mais importante, é alguém que
serve mais. Um irmão com dinheiro, que dá muitos
dízimos e ofertas não deve ter um tratamento especial.
A base da fé cristã é sermos irmãos e que o maior
deve tornar-se o menor. Quem quer ser grande, torne-se
servo, ensinou o Mestre dos mestres (Marcos 10:44;
Lucas 9:48). Fazer aceção de pessoas, ou seja, fazer
distinção de pessoas pela sua riqueza ou poder é pecado:

Meus irmãos, não tenhais a fé em nosso Senhor Jesus


Cristo, Senhor da glória, em aceção de pessoas.
Porque, se entrar na vossa reunião algum homem
com anel de ouro no dedo e com traje esplêndido, e
entrar também algum pobre com traje sórdido. e
atentardes para o que vem com traje esplêndido e lhe
disserdes: Senta-te aqui num lugar de honra; e
disserdes ao pobre: Fica em pé, ou senta-te abaixo do
escabelo dos meus pés, não fazeis, porventura,
distinção entre vós mesmos e não vos tornais juízes
movidos de maus pensamentos? Ouvi, meus amados
118 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

irmãos. Não escolheu Deus os que são pobres quanto


ao mundo para fazê-los ricos na fé e herdeiros do
reino que prometeu aos que o amam? Mas vós
desonrastes o pobre. Porventura não são os ricos os
que vos oprimem e os que vos arrastam aos
tribunais? Não blasfemam eles o bom nome pelo qual
sois chamados? Todavia, se estais cumprindo a lei
real segundo a escritura: Amarás ao teu próximo
como a ti mesmo, fazeis bem. Mas se fazeis aceção de
pessoas, cometeis pecado, sendo por isso
condenados pela lei como transgressores.
(Tiago 2:1-9)

Aquele que não ama a todos por igual não está a


viver segundo Cristo ensinou. Ele nos chama a andar
como ele andou: buscando primeiro o seu Reino. Não
somos deste mundo, como viveremos para este mundo?
Este mundo nada tem para nos dar. O mundo jaz no
maligno e será destruído com o seu mal.
Levantemo-nos como homens novos e vivificados
pelo Espírito. Há mais do que aquilo que temos vivido!
Há riquezas inescrutáveis que não podem ser medidas
com o ouro deste mundo. A verdadeira riqueza é Cristo.
Nele estão escondidos os verdadeiros tesouros:

Para que os seus corações sejam animados, estando


unidos em amor, e enriquecidos da plenitude do
entendimento para o pleno conhecimento do mistério
de Deus-Cristo, no qual estão escondidos todos os
tesouros da sabedoria e da ciência.
(Colossenses 2:2-3)

Gosto tanto destes versículos! A sabedoria e a


ciência de Cristo é um tesouro incomparável! Quem o
desejará tanto que dê tudo o que tem para o alcançar? O
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 119

Reino de Deus é como um tesouro incalculável e é como


uma pérola sem preço, pela qual vendemos tudo para a
adquirir, fazendo-nos verdadeiramente ricos:

O reino dos céus é semelhante a um tesouro


escondido no campo, que um homem, ao descobri-lo,
esconde; então, movido de gozo, vai, vende tudo
quanto tem, e compra aquele campo. Outrossim, o
reino dos céus é semelhante a um negociante que
buscava boas pérolas; e encontrando uma pérola de
grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha, e a
comprou. (Mateus 13:44-46)
120 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 121

Uma questão de consciência


Lembro-me de algumas afirmações de crentes, que
devemos ter em conta, antes de terminarmos o nosso
estudo. Tenho ouvido diversos cristãos testemunharem
de que a partir do momento em que começaram a dar o
dízimo numa igreja, a sua vida financeira mudou para
melhor. Por outro lado, fui abordada diversas vezes por
outros questionando-me se estariam a ser amaldiçoados
por não conseguirem dar o dízimo em situações graves
na sua vida. Como analisar e responder a estas questões?
Em primeiro lugar, não quero que nada do que
escrevi possa desencorajar aqueles que habitualmente
dão dízimos ou valores superiores nas suas
congregações. Aquele que dá, se o fazia por medo,
continue a dar por amor. Se dá, não deixe de dar,
contudo entenda que aquilo que pode resolver
problemas é o sangue do nosso Senhor, que ele já
derramou por si! Busque dele, siga o seu conselho, ouça
a sua Voz, use a autoridade que lhe foi delegada!
Quanto a ser abençoado por dar o dízimo, não
quero questionar as afirmações de ninguém. No entanto,
para sermos honestos, devemos reconhecer que também
há muitas mais pessoas que sempre deram o seu dízimo
e isso nunca fez alguma diferença notória nas suas
finanças. Continuaram com os seus problemas, os que os
tinham, ou sem eles se não os tinham. Há ainda aqueles
que foram exortados a dar o seu dízimo e até muito mais,
122 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

em situações de crise, como forma de a ultrapassarem e


isso conduziu a uma situação caótica, chegando a
afastar-se de Deus e da igreja.
Quantos homens se escandalizaram com a Igreja de
Deus por causa de promessas de resolução de problemas
financeiros se eles dessem o seu dízimo! A Igreja está
fechada em si mesma e recusa-se a ouvir a estes, porque
os considera desviados! Infelizmente, com muito boas
intenções a Igreja de Deus tem falhado em ensinar às
pessoas que é Cristo a solução total e não meia solução
para os seus problemas!
Há crentes que dão dízimos com problemas e
crentes que não dão dízimos com problemas. Há crentes
que dão dízimos sem problemas e crentes que não dão
dízimos sem problemas. Os problemas acontecem a
todos! A diferença devia ser que os crentes deveriam ser
ajudados pelos seus irmãos!
A maior parte dos milagres financeiros ou de
situações de bênçãos notoriamente sobrenaturais,
vieram após a obediência ao Espírito, numa orientação
de dar. Muito mais, que simplesmente devido a dar
dízimos, tenho ouvido testemunhos de casos em que
Deus orientou alguém a dar a outro uma quantia
específica, que acabou por não fazer falta devido a um
recebimento igual ou superior. Claro que também houve
casos em que Deus simplesmente mandou dar, sem
consequências materiais aparentes. Não importa qual o
assunto, se Deus manda, devemos obedecer, quer
recebamos ou não algo em troca. A nossa motivação
deve ser sermos canal de bênção divina para o próximo e
não estarmos sempre procurando proveito pessoal.
Todas as indicações bíblicas, do Novo Testamento,
são para darmos de coração, desinteressadamente, com
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 123

alegria por podermos contribuir para o Reino. Não existe


nenhuma passagem no Novo Testamento que prometa
que, se alguém der dízimos ou ofertas, terá os seus
problemas resolvidos ou irá enriquecer. O que existe
são muitas promessas de que Deus está com os seus
filhos e já os abençoou com todas as riquezas deste e do
outro mundo.
Os problemas que os crentes possam ter não se
devem ao facto de terem mais ou menos bênção de Deus,
ou de serem mais ou menos fiéis, mas por não saberem
viver de acordo com aquilo que são em Cristo e não
saberem como lutar contra o inimigo, que sempre tenta
oprimir e destruir os homens.
Mesmo que se creia e invoque a lei de semear e
colher, é preciso dar de coração, sem querer negociar
com Deus. Contudo, tenho bastantes dúvidas na sua
aplicabilidade na área financeira da forma excessiva e
enfática como tenho ouvido ensinar. Nem sempre o
benefício obtido por dar ou semear dinheiro será
também financeiro. Não devemos ter essa expetativa, de
que sempre que dermos dinheiro iremos receber também
dinheiro.
Existem crentes que testemunham bênção
financeira desde que começaram a dar e outros que não,
acabando por se desinteressar de contribuir. Isso é
errado! Devemos contribuir para o avanço do Reino, de
coração, como dando a Deus, não para obtermos
riquezas materiais.
Penso, muito sinceramente, que tudo depende
daquilo que o cristão crê. Se ele crê que, ao dar muito
dinheiro, isso irá trazer melhoria nas suas finanças, é isso
que irá acontecer. Se ele crer que, dando dízimos, tudo
ficará melhor, acabará por encontrar algo melhor que
124 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

atribuirá a ter dado o dízimo. Mais que tudo, penso ser


uma questão de fé, pois, mesmo aqueles que não dão
dízimos, mas creem que a bênção de Deus está sobre
eles, sentem nas suas vidas a bênção de Deus na área
financeira.
Creio que temos de ter em conta a consciência.
Muitos filhos de Deus ouviram toda a sua vida que se
não derem o dízimo estarão debaixo de maldição. Estes,
se não dão, ficam com a sua consciência ferida. Ora, as
Escrituras dizem-nos acerca da nossa consciência:

Mas aquele que tem dúvidas, se come está


condenado, porque o que faz não provém da fé; e
tudo o que não provém da fé é pecado. (Romanos
14:23)

Ora, pecando assim contra os irmãos, e ferindo-lhes


a consciência quando fraca, pecais contra Cristo. (I
Coríntios 8:12)

Não aconselho a ninguém que deixe de dar o seu


dízimo, se já o entrega habitualmente. O dízimo é um
excelente princípio para se contribuir, trabalha o nosso
egoísmo natural e ajuda-nos a crescer pensando nos
outros. Além disso, muitas das igrejas, como as
conhecemos, dependem mensalmente dos valores fixos
dos dízimos. É da nossa responsabilidade que elas
funcionem bem. É verdade que muito há que rever no
seu funcionamento, mas isso começa com oração pelos
líderes e é algo que o Espírito deve fazer, não a nossa
força. Não deixe de dar também por causa da sua
consciência. Aquilo, que não é por fé, é pecado.
Cada um deve buscar de Deus o que fazer com o
seu dinheiro e nunca deixar de apoiar financeiramente a
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 125

sua congregação. Garanto-lhe que Deus nunca lhe irá


dizer para não dar, a não ser em casos de corrupção
extrema que Deus revele. Que maravilhoso seria não
existirem casos desses, mas existem! Isso, porém, não é
impedimento para dar, pois há muitos missionários e
ministérios para os quais podemos contribuir.
Se não pode, por algum motivo, entregar um
dízimo periodicamente, não se sinta amaldiçoado ou
inferiorizado. Deus ama os seus filhos e deseja suprir
as suas necessidades, ajudando-o no seu trabalho ou no
seu negócio, mesmo aos que não dão dízimos. Deus é
Pai, e acima de tudo quer o seu bem.
Posso contar um testemunho… Houve um período
que não tinha dinheiro para dizimar, pois mal tinha para
as necessidades básicas. Nessa altura, não dava dízimos,
obviamente. Contudo, entristecia-me não poder
contribuir para o Reino de Deus e por isso propus no
meu coração dar um pequeno valor mensalmente. Era
realmente pouco, mas dava-o sempre e orava para que o
valor pudesse ir aumentando. Fazia-o exclusivamente
por amor e não com alguma intenção de negociar. Sabia
que o meu Pai estava a trabalhar a meu favor e eu
precisava mais que qualquer coisa ouvir a sua voz para
corrigir a direção do meu caminho ao lugar onde o
suprimento estaria.
Por vezes tomámos decisões erradas, não ouvindo
Deus, e isso leva-nos a situações difíceis. A solução é
encontrar o caminho de volta. Ouvir Deus é difícil! Exige
retiro e aquietação dos sentidos. Muitos, mesmo líderes,
preferem pedir conselhos a amigos e pessoas chegadas
em vez de retirar-se para escutar o Espírito, pois dá mais
trabalho e leva mais tempo. No entanto, o Senhor
continua a dizer-nos: “Aquietai-vos e sabei que eu sou
126 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

Deus!”.
Tem problemas? Busque a Deus! O Mestre ensinou-
nos: “buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça e todas
estas coisas vos serão acrescentadas…” (Mateus 6:33). Tire
tempo para adorar a Deus e orar em línguas, caso creia
nelas, senão fique com Deus, estudando e orando, mas
ficando em silêncio também. Deus sempre fala, mas nós
não escutamos muitas vezes!
Em muitos casos poderá ter de passar por uma
guerra espiritual contra o diabo que se habituou a
controlar a sua vida material. Não desista! Peça apoio em
oração, caso necessário. Deus quer que tenha o
necessário para viver condignamente nesta terra, como
as ovelhas do pastor do Salmo 23. Se o Senhor for o
nosso pastor, ele vai conduzir-nos a águas tranquilas e
pastos verdejantes. Repare que é condicional: se o
Senhor for o nosso pastor. Precisamos deixar-nos
conduzir…
Se está bem financeiramente e crê que isso se deve à
sua fidelidade em dar o dízimo, continue a fazê-lo.
Afinal está a contribuir para o Reino. Sugiro que dê mais
ainda! Talvez ainda lhe sobre muito, depois de dar o
dízimo, e possa partilhar com irmãos que têm
dificuldades. Há mesmo muitas necessidades entre o
povo de Deus, porque grande parte dos crentes pensa
apenas em si mesmo e, depois de dar o seu dízimo na
igreja, pensa que não tem mais obrigações.
Se está desesperado, proponha hoje no seu coração,
não desistir até se levantar em vitória! Deus está consigo!
Estamos sentados com Cristo, acima de toda a hoste
satânica. Podemos repreender o inimigo, podemos
desatar as nossas finanças e os nossos negócios de toda
a influência maligna. Não precisa esperar que Deus o
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 127

faça, pois Cristo já não anda na terra a repreender


demónios. Quando voltou para o Pai disse que isso agora
era tarefa nossa. Não volte ao tempo antes da redenção
em que o homem não tinha autoridade e tinha de ficar à
espera que Deus o fizesse.
Consagre a sua vida, arrependa-se do que tiver de
se arrepender e determine nunca desistir. Não se sujeite
à escravidão depois do que o Senhor fez por si. Poderá
não ser fácil, mas se conseguir persistir, irá vencer de
certeza.
Se ficar de braços cruzados, não espere que Deus
venha do céu fazer o trabalho que lhe compete a si. Ele já
fez tudo o que tinha de fazer, agora é a nossa vez de,
debaixo da direção do Espírito e no seu poder,
desfazermos as obras de Satanás e vivermos a sua vida
abundante.
128 O Dízimo Hoje? Sim e Não!
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 129

Conclusão
Creio que há uma urgência no coração de Deus em
trazer pureza à sua igreja. Se o Senhor estivesse aqui
fisicamente, expulsaria muitos vendilhões dos templos
de pedra… Ele está em Espírito, e o seu Espírito clama
aos que pensam em dinheiro, pregam dinheiro e pedem
dinheiro: “revejam a vossa doutrina, sondem os vossos
corações, arrependam-se dos vossos atos”.
Ouçam as palavras do sábio: “não me dês nem a
pobreza nem a riqueza: dá-me só o pão que me é necessário;
para que eu de farto não te negue, e diga: Quem é o Senhor?
ou, empobrecendo, não venha a furtar, e profane o nome de
Deus.” (Provérbios 30:8-9). Foi por este “pão de cada dia”
que o Mestre nos ensinou a orar!
Honro aqueles que andam em sinceridade, mesmo
os que erram em sinceridade… Porém, é tempo de
sermos como Cristo: esse é o nosso alvo. O Senhor não
precisava de grandes aparatos para pregar o Evangelho.
O seu aparato era o poder do Espírito. É o poder de
Deus, pela oração, pelo arrependimento, que trás
conversão. Não é necessário dinheiro para que haja
conversão, isso é uma idolatria! Claro que usamos
também dinheiro como complemento, mas não é a causa.
Em lugares de pobreza extrema, onde não há dinheiro, o
Evangelho continua a ter poder.
Não é necessário criarmos um sem fim de
mecanismos e truques para convencer as pessoas e assim
130 O Dízimo Hoje? Sim e Não!

haver conversões. O próprio Messias foi o nosso exemplo


e as suas palavras são a nossa inspiração. O papel da
igreja é, em primeiro lugar, trazer salvação e depois o
crescimento e proteção dos crentes.
Chega de ouvir “dá, dá”! O sábio chama a isso de
filhas da sanguessuga! (Provérbios 30:15). A Igreja não
pode ser sanguessuga, mas tem de ser a comunidade
onde o centro é a partilha de dons e de bens entre todos
os irmãos.
A Igreja não precisa de ser grande em número,
apenas porque “sim”, para mostrar aos homens. A Igreja
deve ser grande espiritualmente, ser amor e
misericórdia, ser compaixão, primeiro com os de dentro
e depois com os de fora. O serviço social é bom, mas não
é por isso que mais pessoas se vão converter. A
conversão é uma operação do Espírito, não das nossas
boas obras.
Se a igreja tem pessoas necessitadas, não deverá
isso ser prioridade? Quem dá a comida dos filhos aos
estranhos? Se os irmãos próximos estão com
necessidade, vamos usar o dinheiro das ofertas em
cuidar o templo de pedra e comprar mais conteúdo para
ele? Vamos usar o dinheiro para ‘atrair’ descrentes, se no
culto, se senta ao nosso lado alguém que não tem
dinheiro para comer o resto do mês? A César o que é de
César, mas a Deus o que é de Deus e aos irmãos o que é
dos irmãos!
O dinheiro tem o seu papel, mas deve ser tratado
com cuidado, pois alguns têm caído na sua cobiça e nem
se aperceberam disso. Sei que não é com intenção
errada que muitos agem, mas apenas segundo a
tradição que lhes foi transmitida. Esta é a hora do
Espírito falar acima da tradição e de praticarmos a
O Dízimo Hoje? Sim e Não! 131

Bíblia sem a acrescentar. Depois de tudo o que


estudamos, coloca-se a questão: “como pregar acerca de
dízimos e ofertas?”.
O dízimo é bíblico, mas o dízimo não é uma
imposição bíblica para o filho de Deus. O dízimo é um
bom princípio bíblico para suprir as necessidades da
igreja e com igreja, refiro-me a pessoas, não a casas ou
apenas instituições. Há lugar para homens a receber
salário da igreja e para tudo o que é conforto, mas não há
lugar para esconder ou ignorar pobreza e necessidades
de irmãos.
É tempo de dizer a verdade: ninguém será
amaldiçoado, pois já fomos abençoados! Quem pregar
maldição sobre os fiéis, está a trazer condenação sobre os
abençoados de Deus. O povo de Deus é bendito, não
maldito! A maldição é consequência do pecado e quem
vive dando de coração não está a pecar, mesmo que dê
pouco.
Dízimo hoje? Sim, se dado de coração, com alegria,
para que supra necessidades da instituição, mas também
das pessoas e reconhecendo que Cristo já fez toda a obra
necessária para sermos abençoados; Não, baseado no
medo de ser amaldiçoado, não baseado em coação
humana, não baseado na manipulação, não para
enriquecer homens, não baseado numa lei levítica que já
não está em vigor!
Cristo morreu e ressuscitou para dar vida e vida
com abundância. Vivamos a sua vida e demos-lhe a
nossa, com tudo o que temos. Aquilo que trás honra a
Deus é o bem-estar de todos os seus filhos. Honremos a
Deus com o que somos e o que temos!
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