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A inteligência artificial nas relações pós-humanas: Possibilidades


e conflitos no filme ELA (2013)

Artificial intelligence in post-human relationships: Possibilities


and conflicts in the film HER (2013)

Gustavo Santos ALMEIDA1


Jean Paul D’ANTONY2

Resumo: O presente artigo pretende problematizar questões referentes às possibilidades


conceituais em torno do pós-humanismo a partir do filme Ela (Her), de 2013. O exame
de tal questão nos apresentará, como pretendemos demonstrar, as marcas sociais e de
identificação mais problemáticas dos sujeitos atuais, em como suas questões mais
urgentes. Para realizarmos tal percurso, partimos de reflexões e conceituações sobre o
ciborgue e o pós-humanismo para, por meio de reflexões propostas por teóricos do pós-
humanismo, tais como Dona Haraway, tentarmos identificar como os conceitos
propostos servem para delinear as problemáticas citadas anteriormente tanto no filme
quanto na sociedade atual.
Palavras-chave: ciborgue, pós-humano, identidade

ABSTRACT: This paper intends to problematize issues concerning the conceptual


possibilities surrounding posthumanism from the 2013 film Ela (Her). The examination
of such question will present us, as we intend to demonstrate, the most problematic
social and identification marks of the current subjects, as well as their most urgent
issues. To accomplish such a course, we start from reflections and conceptualizations
about the cyborg and posthumanism to, through reflections proposed by posthumanism
theorists, such as Dona Haraway, try to identify how the proposed concepts serve to
delineate the problems previously mentioned both in the film and in today's society.
Keywords: cyborg, posthumanism, identity

Ao passar dos anos, o homem construiu elos cada vez mais essenciais com as
máquinas e, em 1760, no início da Revolução Industrial, abandonou o nível artesanal da
produção e passou a desenvolve-la, em larga escala, com o auxílio do maquinismo.

1
Bolsista do PIBIC/COPES (2021) - Projeto desenvolvido com bolsa de iniciação científica sob a orientação do
Professor Dr. Jean Paul d’Antony, com o seguinte Plano de Trabalho do bolsista “A inteligência artificial nas relações
pós- humanas: Possibilidades e conflitos no filme ELA (2013).
2
Professor Doutor da UFS, lotado no DLI - Departamento de Letras de Itabaiana, coordenador do NUPELC - CNPq e
do Projeto de Pesquisa PIBIC/COPES (2021): ENTRE O HUMANO E O PÓS HUMANO: IDENTIDADES QUE SE
DESMANCHAM NO AR?

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Após esse período, avanços diversos no ramo da tecnologia foram concretizados mas,
somente na Belle Époque, o desenvolvimento tecnológico, científico e econômico foram
mais sentidos pela população das grandes cidades.
Atualmente, temos uma relação de intimidade tecnológica tão intensa que, do
amanhecer ao anoitecer, dependemos de recursos responsáveis por facilitar a realização
de tarefas simples, até aqueles capazes de substituir órgãos. Essa dependência trouxe
questionamentos acerca de até que ponto abandonamos nosso aspecto orgânico e
passamos a nos maquinizar. Para Donna Haraway (1985), estamos na era ciborgue, em
que a busca pela alta performance do corpo é requerida similarmente à das máquinas e,
portanto, somos impedidos de saber qual lugar ocupamos na linha tênue entre máquina
e ser humano.
A era do ciborgue é aqui e agora, onde quer que haja um carro, um
telefone ou um gravador de vídeo. Ser um ciborgue não tem a ver com
quantos bits de silício temos sob nossa pele ou com quantas próteses
nosso corpo contém. Tem a ver com o fato de Donna Haraway ir à
academia de ginástica, observar uma prateleira de alimentos
energéticos para bodybuilding, olhar as máquinas para malhação e
dar-se conta de que ela está em um lugar que não existiria sem a ideia
do corpo como uma máquina de alta performance (TADEU, 2009, p.
23).

Novas identidades
A busca pelo corpo performático estimula modificações incumbidas de nos
tornar melhores, de modo que, constantes mudanças e conciliações entre corpo e
tecnologia acarretam em questionamentos relativos ao efeito desse fenômeno sob
gêneros. A legitimidade dos ideais do feminismo radical, por exemplo, tem sido
continuamente rebatida no cenário atual considerando-se que a vertente pós-humana,
uma vez vinculada à tecnologia, consolida ampliações acerca de gênero. Isso porque,
com a teoria Queer da filósofa Judith Butler, as premissas limitadas acerca de masculino
e feminino foram dissipadas e, assim, os debates sobre a temática foram ampliados, a
exemplo das assertivas atuais que compreendem o gênero como construção social em
vez de mero fator biológico.
Observamos que nos próprios movimentos sociais e de gênero, acaba havendo
uma própria diferenciação das pessoas que ocupa esses espaços, ocorrendo assim uma

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segregação e construindo identidades frustradas dentro do próprio grupo conforme


Haraway exemplifica:
Por exemplo, uma chicana ou uma mulher estadunidense negra não
pode falar como uma mulher (em geral) ou como uma pessoa negra ou
como um chicano. Assim, ela está no degrau mais baixo de uma
hierarquia de identidades negativas, excluída até mesmo daquelas
categorias oprimidas privilegiadas constituídas por “mulheres e
negros”, categorias que reivindicam o feito de terem realizado
importantes revoluções. A categoria “mulher” nega todas as mulheres
não brancas; a categoria “negro” nega todas as pessoas não negras,
bem como todas as mulheres negras (TADEU, 2009, p. 48).

Porém, um mundo de ciborgues acaba sendo visto por Haraway, como um lugar
em que todos se mantêm em harmonia que, independentemente da visão e opinião
plural dos seres, conseguem conviver com suas diferenças, avisto disso, com o avanço
da tecnologia, ver-se cada vez menos esses conflitos e segregações dentro de
movimentos sociais.
Por conta dessa visão utópica de Donna (1985), surgiu o grupo de artistas
feministas intitulado VNS Matrix nos anos 90, que foram responsáveis pelo lançamento
do primeiro Manifesto Ciberfeminista, que propunha uma aliança entre as mulheres e as
máquinas, objetivando a arte como resistência através do seu corpo. Não seu corpo
físico, e sim, textualmente virtual; questionando e radicalizando a imagem da mulher no
ciberespaço.

Nós somos a boceta moderna. Anti-razão positiva; ilimitada, liberada,


implacável. Vemos a arte com nossa boceta; fazemos arte com nossa
boceta. Nós acreditamos em desfrute loucura santidade e poesia. Nós
somos o vírus da desordem do novo mundo, rompendo o simbólico
por dentro. Sabotadoras do mainframe do grande pai. O clitóris é uma
linha direta para a matriz. VNS MATRIX: exterminadoras dos
códigos morais. Mercenárias do lodo; caindo de boca no altar da
degradação. Sondando o templo visceral, nós falamos línguas.
Infiltrando; destruindo; disseminando, corrompendo o discurso. Nós
somos a boceta futura (VNS, MATRIX, 1991).

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Figura 1:

Assim entendido, essa vertente do feminismo pós-humana, com influência de


Donna Haraway (1985), traz consigo essa visão bastante utópica, em que todos possuem
vozes na qual tem como objetivo a quebra de estereótipo masculino e feminismo e, com
isso, são criadas identidades frustradas; deixando para trás aquele passado radical que
segregava as pessoas e ao mesmo tempo tinha finalidade de abolir o gênero no intuito
de acabar com o patriarcado.
Nesse sentido, quando nos remetemos ao filme Ela (Her), lançado em 2013,
encontramos, num futuro pós-humanista, a relação de Theodore com o seu sistema
operacional chamado Samantha, com a qual o personagem desenvolve um amor e uma
dependência emocional em momento difícil. A tecnologia apresentada do longa
metragem nos faz refletir sobre a linha tênue entre o homem e máquina e como isso
pode afetar os nossos sentimentos, podendo causar angústia, sofrimento e amor no qual
estamos sempre sujeitos. E ao mesmo tempo, problematizar questões ligadas ao conflito
identitário e existencial do pós-humanismo.
Essa tecnologia presente no filme e, ao mesmo tempo, na nossa vida, acaba
sendo um reflexo da nossa sociedade. Por esse motivo, ela não pode ser considerada
neutra, como bem salienta o autor: “[...] Não existe nada mais que seja simplesmente
“puro” em qualquer dos lados da linha de “divisão”: a ciência, a tecnologia, a natureza
pura; o puramente social, o puramente político, o puramente cultural [...]” (TADEU,

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2009, p. 11). Inclusive, na própria obra cinematográfica, quando o personagem


Theodore tem o primeiro contato com o sistema operacional Samantha, ele pergunta
sobre o seu funcionamento e ela deixa claro que apesar de ser autônoma, foi baseada nas
personalidades dos seus programadores.

Plano 1 Plano 2

Plano 3 Plano 4

Plano 5 Plano 6

Plano 7 Plano 8

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Por conta dessa influência sofrida por Samantha, ela vem com um ideal de
evolução e mudança constante – como propôs, Heráclito de Éfeso (540- 570 A.C)
quando disse que o homem não se banha duas vezes no mesmo rio. Portando, ela está
em constante evolução e cada vez autônoma, como salienta Haraway:

Diferentemente das esperanças do monstro de Frankenstein, o


ciborgue não espera que seu pai vá salvá-lo por meio da restauração
do Paraíso, isto é, por meio da fabricação de um parceiro
heterossexual, por meio de sua complementação em um todo, uma
cidade e um cosmo acabados. O ciborgue não sonha com uma
comunidade baseada no modelo da família orgânica mesmo que, desta
vez, sem o projeto edípico. (TADEU, 2000, p. 39).

Logo, Samantha não depende de Theodore para nada, ela é a representação


virtual da “boceta moderna”, a representação simbólica dessas relações ciborguizadas;
enquanto isso o Theodore, representante da comunidade masculina (humana), começa a
desenvolver uma dependência emocional pela IA. De certa forma, isso acontece porque
o personagem está passando por um momento conturbado em sua vida, por estar em um
processo de divórcio e, de início, o sistema operacional acaba sendo alguém que o ouve
e aparentemente o compreende. O que ocorre é um princípio de projeção3, o que não
limita a semântica dessa ciberrelação. Em relação a nossa dependência à tecnologia em
tudo que fazemos, constitui uma existência simbiótica, como bem nos mostra Francisco
Rudiguer: “Nos tempos modernos, encarnada no homem, mas sobretudo na máquina, a
técnica acabou se tornando o signo mais aparente de nossa relação com o mundo e a
força a partir da qual procura se articular toda a nossa existência.” (RUDIGER, 2008,
p.162).
No mundo em que a realidade física e a realidade virtual coexistem
sinestesicamente, o papel do corpo feminino virtual, nesse cenário de cruzamentos,
simboliza a ideologia do Manifesto Ciberfeminista. No entanto, o personagem Theodore,
representante das convenções patriarcais, enxerga a Samantha como uma “mulher ideal”.

3
Ver: FREUD, S. Além do princípio do prazer. In: edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas
Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. XVIII, 1985. LAPLANCHE, J. & PONTALIS, J.
B. Vocabulário da Psicanálise. Tradução de Pedro Tamen. São Paulo: Martins Fontes. 9º ed. 1986.

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Ela deixa a vida dele muito mais fácil, pelo fato dela o ouvir, o compreender, e ao
mesmo tempo, resolver boa parte dos seus problemas. Ideia muito comum em nossa
sociedade sobre o que se espera de uma esposa/namorada.
A conexão dos dois personagens é muito intensa e nos apresenta uma linha tênue
entre a tecnologia e o ser humano, dentro das construções sócio-afetivas e de uma
reeducação sentimental, uma vez que “para Haraway, as realidades da vida moderna
implicam uma relação tão íntima entre as pessoas e a tecnologia que não é mais possível
dizer onde nós acabamos e onde as máquinas começam” (KUNZRU, 2000, p. 22). Logo,
da mesma forma que os personagens, estamos tão conectados e entrelaçados a essa
convivência que não é possível saber onde começa e onde termina essa nossa relação
com as máquinas.
Por conta de tantas modificações, acaba ficando o questionamento do que seria
caracterizado a imagem do homem e do ciborgue, conforme Tadeu:

Aquilo que caracteriza a máquina nos faz questionar aquilo que


caracteriza o humano: a matéria de que somos feitos. A imagem do
ciborgue nos estimula a repensar a subjetividade humana; sua
realidade nos obriga a deslocá-la [...] (TADEU, 2000, p. 13).

O que caracteriza o ser humano, será que pelo fato dele ser feito apenas de carne
e ossos, como um puramente biológico? O que significa esse puramente biológico?
Nesse sentido, o lado biológico não seria um empecilho, visto que o corpo acaba sendo
afetado pela tecnologia, a ponto da máquina fazer parte dos nossos membros, como
próteses, marca-passos eletrônicos, entre outros, para que possamos sobreviver, ter uma
melhor qualidade de vida e coexistir física e subjetivamente com a tecnologia, como
percebe-se que, no filme, Samantha acha uma semelhança entre ela e Theodore.

Plano 1 Plano 2

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Plano 3 Plano 4

Plano 5 Plano 6

Pelo fato de sermos matéria, também estamos em constante transformação,


como máquinas, por isso que, conforme se posiciona a Haraway, “a verdade é que
estamos construindo a nós próprios, exatamente da mesma forma que construímos
circuitos integrados ou sistemas políticos – e isso traz algumas responsabilidades”
(HARAWAY, 2009, p.24). Essa construção vai desde procedimentos médicos que
fazemos dentro de nós, até mesmo como falado anteriormente em próteses mecânicas,
marca-passo entre outras coisas. Isto posto, podemos concluir que somos ciborgues,
seres híbridos de máquina e organismo e, com isso, possuímos um poder de ação
transformadora consciente impressionante; sendo capaz de fazer modificações em nosso
corpo a hora que quisermos e da forma que queremos, como Haraway deixa claro em:

No final do século XX, neste nosso tempo, um tempo mítico, somos


todas quimeras, híbridos – teóricos e fabricados – de máquina e
organismo; somos, em suma, ciborgues. O ciborgue é nossa ontologia;
ele determina nossa política. O ciborgue é uma imagem condensada
tanto da imaginação quanto da realidade material: esses dois centros,
conjugados, estruturam qualquer possibilidade de transformação
histórica (HARAWAY, 2009, p. 37).

Seguindo por esse pensamento, perceber-se que, por conta da Primeira Guerra,
os homens foram ao front de batalha e com isso a mão de obra diminui bastante; por

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outro lado a mulher deixou de ter aquela imagem de mãe/esposa, para assumir um papel
de protagonista no mercado de trabalho, ocupando espaços que não lhe pertenciam.
Esse marco foi importante para o avanço dos direitos das mulheres, porém, nos
dias atuais encontramos outro cenário com a tecnologia cada vez mais íntima em nossa
vida, o trabalho vem com uma proposta de ser cada vez mais flexível e, isso, acaba
sendo colocado como algo bom, mas na realidade só vai deixando o trabalhador
sobrecarregado, conforme mostra Judy Wajcman:

O crescimento dos níveis de desemprego nas sociedades de


capitalismo avançado tem incitado uma visão mais pessimista do
impacto da tecnologia sobre o trabalho. Em contraste com o cenário
“pós-industrial”, estes comentadores e comentadoras acreditam que a
automação está associada com empregos degradados, sem
especialização e desvalorizados; trabalho estressante e perigoso,
monitoramento de empregados/as por parte de empregadores/as; e
aumento da velocidade do trabalho, fazendo com que os/as
trabalhadores/as ganhem menos para trabalhar mais. Visto que as
habilidades dos/as trabalhadores/as são construídas de acordo com a
tecnologia, aqueles/as agraciados/as que conseguem manter o
emprego são relegados/as à posição de maquinistas. (WAJCMAN,
1998, p. 205).

Não obstante, o efeito que a tecnologia causa no mercado de trabalho, não afeta
de maneira igual homens e mulheres; visto que, um dos primeiros locais a serem
afetados são os escritórios que são predominados pelo gênero feminino. Por esse fator, a
mulher tende a ficar cada vez mais sobrecarregada e, com isso, surgem problemas em
sua saúde por ficar horas em frente as telas dos computadores em esforços repetitivos.
Como bem exemplifica Wajcman:

Muitos surveys sobre usuários/as têm relatado sintomas físicos e


fisiológicos, como problemas de visão, tendinites, lesão por esforços
repetitivos, dores no peito, tensão, dores de cabeça, náusea e tontura,
problemas digestivos e depressão. Isto se dá particularmente com
aquelas que se sujeitaram ao trabalho de monitoramento
computadorizado, o que sugere que a intensidade do trabalho é a causa
principal dessas doenças relacionadas ao stress (WAJCMAN, 1998, p.
209).

Talvez seja esse um dos fatores no qual parte escritoras e pessoas ligadas ao
movimento feminista radical, terem uma linha de pensamento pessimista e até ante-
tecnológica pois, na visão de muitas delas, a tecnologia tende a beneficiar a classe

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dominante, servindo à manutenção do patriarcado, uma vez que, empregos ligados à


alta-tecnologia, como a programação, tendem, por maioria, serem compostas por
homens brancos.
Todavia, nem sempre foi assim. Inicialmente a participação das mulheres no
ambiente de TI foi muito maior; porque na década de 90, a tecnologia era ligada a
processamento de dados, organização de arquivos, que estava muito relacionado ao
“trabalho de mulher” como secretária e, com o passar dos anos, esse estereótipo foi
sendo relacionado ao um lócus masculino e, aos poucos, sendo um ambiente hostil para
mulheres.
Camila Achutti, entende que a presença masculina nesse ambiente gera um
desconforto as mulheres pelo fator da presença de assédios, tanto por parte da turma,
quanto dos professores, por isso ela acredita que as empresas deveriam encarar essa
problemática para que assim o mercado mude, com políticas de inclusão e diversidade,
exatamente como fez o CEO da Salesforce, que incluiu o mínimo 30% de mulheres em
reuniões na empresa.

Figura 2: Turma de Ciências da Computação em 1971.

Ao mesmo tempo que a tecnologia prejudica a mulher em relação ao mercado de


trabalho, ela também afeta pessoas negras socialmente, com o que chamamos de
racismo algoritmo, que são uma série de agressões que essas pessoas sofrem ao terem
contato com a tecnologia, como o Google Fotos que rotulou duas pessoas negras como

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“gorilas”, e também pelo fato de que carros automáticos tem mais chances de atropelar
pessoas negras, pois foram treinados para identificar pessoas brancas.
Portanto, diferentemente do que Chaplin fez no filme “Tempos Modernos” –
que trata do impacto das maquinas em nossas vidas – , outro viés que nos chama a
atenção no cenário da pós humanidade e que, de certo, desenvolveremos nas próximas
pesquisas, é o efeito que se causa na tecnologia com a influência de homens brancos em
altos cargos nos setores tecnológicos, com a exclusão das mulheres, sobrando a elas
apenas cargos de secretariado e deixando elas sobrecarregadas – mas também pessoas
negras que acabam sendo vítimas de algoritmos racistas, e como isso tudo contribui
para a manutenção do patriarcado no ambiente tecnológico.

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REFERÊNCIAS

FREUD, S. Além do princípio do prazer. In: edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. XVIII, 1985.
LAPLANCHE, J. & PONTALIS, J. B. Vocabulário da Psicanálise. Tradução de Pedro
Tamen. São Paulo: Martins Fontes. 9º ed. 1986.
HARAWAY, Donna; KUNZRU, Hari; TADEU, Tomaz. Antropologia do Ciborgue: As
vertentes do pós-humano. Edt. Autêntica, 2009. 2 edição.
RUDIGER, Francisco. Cibercultura e pós humanismo. Porto alegre. Edipucs. 2008. 1
edição.
WAJCAMN, Judy. GERENCIAMENTO como um homem: mulheres e homens na
gestão corporativa. Edt. Polity Press, 1998. 1 edição.
GAZIRE, Marina. CIBERFEMINISMO: Novos discursos do feminino nas redes
eletrônicas. 2009. Dissertação (MESTRADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA) -
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2009.
POR QUE as mulheres ainda são minoria na TI?. Canal Tech, 8 mar. 2015. Disponível
em: canaltech.com.br/carreira/Por-que-as-mulheres-ainda-sao-minoria-na-TI
WOMAN Art House: VNS Matrix. Plataforma de arte contemporâneo, 1 jan. 2021.
Disponível em: https://www.plataformadeartecontemporaneo.com/pac/woman-art-
house-vns-matrix/.

REFERÊNCIA DE ILUSTRAÇÃO
The Guardian, 1 jul. 2015. Disponível em:
https://www.theguardian.com/technology/2015/jul/01/google-sorry-racist-auto-tag-
photo-app.

REFERÊNCIA FÍLMICA
Jonze, S. (Diretor). (2013). Her [DVD]. Burbank, CA: Warner Bros.

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