2022 Rela Lulianesantos (TCC)

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UNIVERSIDADE DA INTEGRAÇÃO INTERNACIONAL

DA LUSOFONIA AFRO-BRASILEIRA
INSTITUTO DE HUMANIDADES E LETRAS DOS MALÊS
LICENCIATURA EM HISTÓRIA

LULIANE SOUSA DOS SANTOS

RELATÓRIO DE PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA - EXPOSIÇÃO


VIRTUAL E RODA DE CONVERSA: AS REDES DE HILÁRIA BATISTA DE
ALMEIDA - TIA CIATA (1854-1924) ENTRE BAHIA E RIO DE JANEIRO

SÃO FRANCISCO DO CONDE


2022
LULIANE SOUSA DOS SANTOS

RELATÓRIO DE PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA - EXPOSIÇÃO


VIRTUAL E RODA DE CONVERSA: AS REDES DE HILÁRIA BATISTA DE
ALMEIDA - TIA CIATA (1854-1924) ENTRE BAHIA E RIO DE JANEIRO

Relatório de Projeto de Intervenção Pedagógica


apresentado à Universidade da Integração Internacional da
Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB, como requisito para
obtenção do título de Licenciada em História.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Lia Dias Laranjeira.

SÃO FRANCISCO DO CONDE


2022
LULIANE SOUSA DOS SANTOS

RELATÓRIO DE PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA - EXPOSIÇÃO


VIRTUAL E RODA DE CONVERSA: AS REDES DE HILÁRIA BATISTA DE
ALMEIDA - TIA CIATA (1854-1924) ENTRE BAHIA E RIO DE JANEIRO

Relatório de Projeto de Intervenção Pedagógica apresentado a Universidade da Integração


Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB, como requisito para obtenção do título
da Licenciatura em História.

Data de aprovação: 15/02/2022.

BANCA EXAMINADORA

Orientadora: Profa. Dra. Lia Dias Laranjeira


Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira - UNILAB

Examinadora: Prof.ª Dr.ª Joana D’Arc de Sousa Lima


Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira - UNILAB

Examinadora: Prof.ª Dr.ª Maria Cláudia Cardoso Ferreira


Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira - UNILAB
AGRADECIMENTOS

Agradeço à UNILAB e a seu corpo docente que me muniu de ferramentas teóricas e


metodológicas essenciais para a construção desse e de outros projetos acadêmicos e de vida, a
partir do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades e da licenciatura em História.
Um agradecimento especial à minha primeira orientadora, a professora Cristina Teodoro
Trinidad, seu nome vai estar registrado por onde eu passar, pois não é fácil encontrar uma pró
que segure na mão ou afirme que teremos que “seguir mesmo que seja necessário um empurrão
para sair rodando feito uma bola ladeira a baixo”. Agradeço à professora Lia Laranjeira por
confiar e entrar nessa aventura, pois parir um projeto é algo muito íntimo. Agradeço também
ao Djumbai-Grupo de Pesquisa em Artes e Patrimônio Cultural Africanos e Afrodiaspóricos,
onde tive a oportunidade de compartilhar e discutir coletivamente meu estudo. As trocas no
grupo contribuíram significativamente nas análises, apontando possíveis caminhos para o
desenvolvimento do trabalho. Agradeço também aos professores e professoras participantes da
Intervenção por terem abraçado minha produção, sem a participação de vocês, esse trabalho
não teria saído.
À professora Maria Claudia Cardoso que me alertou na seguinte afirmação “a mulher
precisa falar se quiser ocupar um espaço de poder”. À minha companheira Ana Carolina, que
segura minha mão e me acompanha com muito amor e cuidado na estrada da vida, rumo aos
projetos. À Zete, minha mãe que não aprendeu a assinalar o próprio nome, mas me matriculou
da creche-escola ao ensino fundamental com a ideia de que era preciso estudar para “ser gente”.
À minha irmã Lú quem eu tanto amo que migrou para o sudeste em busca de melhoria
de vida, exerce a função de cozinheira e que deixou aqui na Bahia corações apertados de
saudade. À minha vó Edna “em memória”, que me inspirou com sua história de vida. À minha
Tia Luza e à minha tia Iraildes que seguem me dando oportunidade de conhecer um pouco mais
das nossas histórias.
Enfim, a todas e todos que direta e indiretamente fizeram parte desse processo.
RESUMO

Esse trabalho tem como objetivo apresentar e debater a intervenção pedagógica, intitulada “As
redes de Hilária Batista de Almeida - Tia Ciata (1854-1924) entre Bahia e Rio de Janeiro”,
realizada a partir de pesquisa e elaboração de exposição virtual homônima. A intervenção foi
planejada para ser executada no contexto da educação básica no município de Santo Amaro-
BA e centrada na apresentação e discussão em torno dos laços afetivos, religiosos e
consanguíneos de Hilária Batista de Almeida, mais conhecida como Tia Ciata, nascida no
Município de Santo Amaro-BA. Nascida e criada entre o século XIX e início do XX, sua
trajetória de vida na Bahia e no Rio de Janeiro contribui para (re)pensar a história das mulheres
negras no Brasil, tendo como mote específico o Recôncavo Baiano e, particularmente, o
município de Santo Amaro-BA. A investigação se debruçou nesta personagem, nos espaços de
memória relacionados a Tia Ciata, que compõem o cenário do Brasil escravocrata e do pós-
abolição, a partir de suas lutas, resistências e política do cotidiano, no âmbito da religião, do
trabalho e das artes. O presente estudo foi realizado com base em fontes iconográficas, jornais
impressos e bibliografias sobre Hilária Batista de Almeida. A pesquisa resultou na produção de
uma exposição virtual pensada para ser utilizada no ensino básico de Santo Amaro-BA. Nesse
sentido, durante a Intervenção Pedagógica, a exposição virtual foi apresentada e discutida em
roda de conversa com professores do município, no intuito de se construir futuras propostas
pedagógicas a partir dela. De forma geral, a Intervenção apontou novos caminhos para a
construção de materiais didáticos e atividades pedagógicas, com foco na educação patrimonial
atrelada à lei 10.639/03, e a partir de espaços de memória e de narrativas históricas sobre a vida
de mulheres negras em linguagem escrita e visual.

Palavras-chave: Ciata, Tia, 1854-1924 - Biografia. Fotografia - Exposição. Mulheres -


Identidade. Negras - Brasil.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 7
2 ETAPAS DO PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA 10
2.1 DEFINIÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO 10
2.2 DISCUSSÃO TEÓRICA 14
2.2.1 De Santo Amaro da Purificação para o Rio de Janeiro 16
2.2.2 Hilária Batista de Almeida – Tia Ciata 17
2.3 INSTITUIÇÕES DE ENSINO DOS PROFESSORES PARTICIPANTES 20
DA INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA
2.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 22
2.5 OBJETIVOS 23
2.5.1 Objetivos específicos 23
2.6 IMPACTOS ESPERADOS 23
3 RELATO SOBRE A EXPOSIÇÃO VIRTUAL E A RODA DE 24
CONVERSA “AS REDES DE HILÁRIA BATISTA DE ALMEIDA -
TIA CIATA (1854-1924) ENTRE BAHIA E RIO DE JANEIRO”
4 ANÁLISE DA EXECUÇÃO E DIFICULDADES ENCONTRADAS 34
5 RESULTADOS OBTIDOS 34
5.1 DESDOBRAMENTOS DA EXPOSIÇÃO VIRTUAL E RODA DE 35
CONVERSA “AS REDES DE HILÁRIA BATISTA DE ALMEIDA -TIA
CIATA (1854-1924), ENTRE BAHIA E RIO DE JANEIRO”
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 38
Referências 40
Apêndices 43
7

1 INTRODUÇÃO

A história se faz com os documentos escritos, sem


dúvida, quando eles existem. Mas ela pode ser feita, ela
deve ser feita com tudo o que a engenhosidade do
historiador lhe permitir utilizar.
(Lucien Febvre, 1974)

Este relatório tem como objetivo narrar e examinar o desenvolvimento do projeto de


intervenção pedagógica, intitulado “As redes de Hilária Batista de Almeida - Tia Ciata (1854-
1924) entre Bahia e Rio de Janeiro”, que aconteceu no dia 03 de fevereiro do ano de 2022 com
início às 19h00 e terminou às 21h00, via plataforma do Google Meet. A presente Intervenção
aponta possibilidades de interação entre o campo da pesquisa acadêmica e do Ensino na
Educação Básica. A presente ação teve como objetivo narrar a história de vida de Hilária Batista
de Almeida a partir das relações estabelecidas por laços afetivos, religiosos e consanguíneos, e
criar uma exposição virtual sobre a história de Tia Ciata, com destaque para suas atuações e
contribuições no seio de sua família extensa na Bahia e no Rio de Janeiro (CASTILHO, 2008;
FREIRE, 2012; REIS, 2007).
A pesquisa e a ação de intervenção também se propôs a entender o lugar ocupado por
Tia Ciata, na constituição da memória da cidade de Santo Amaro da Purificação – BA e da sua
identidade negra por meio dos seus espaços de memória e no currículo do município. Sabendo
que Tia Ciata nasceu em Santo Amaro, a intervenção pedagógica abordou a questão da memória
de Tia Ciata não apenas no seu lugar de destino, quando migra para o Rio de Janeiro, mas
também, constituída no seu lugar de origem.
A intervenção parte da premissa que Hilária Batista de Almeida é um referência
fundamental na história da emancipação da mulher negra e livre no período da escravidão e do
pós-abolição, levando em consideração sua experiência e protagonismo no âmbito do
candomblé, do samba e das negociações políticas. As atividades propostas na intervenção, a
saber uma Exposição virtual, uma Roda de conversa e a Elaboração coletiva de um roteiro
pedagógico para o trabalho de mediação de professores do Ensino Fundamental 2 e Ensino
Médio na Exposição Virtual, intitulada “As redes de Hilária Batista de Almeida - Tia Ciata
(1854-1924) entre Bahia e Rio de Janeiro”. Pensar os lugares de memórias e o patrimônio
cultural negros, ligados à realidade de alunos e professores da educação básica, são
desdobramentos de um pesquisa, fundamentada na história do povo negro, em particular do
8

município de Santo Amaro, e suas contribuições a partir dos seus processos de resistência e da
sua política do cotidiano, no âmbito das estruturas e relações familiares consanguíneas e
afetivas (GEBARA, 2011; MARTINS, 2013).
Para a pesquisa, a exposição e, consequentemente, na intervenção, trouxe o tema da
família negra por ela representar o locus das atividades expressivas de Tia Ciata ligadas aos
campos da religião, da música e das festas. Os estudos sobre família negra, além de dialogarem
com a presente intervenção pedagógica, são relevantes também por nos sinalizar um
silenciamento ainda presente na produção acadêmica e na educação sobre o tema,
especialmente, levando em consideração sua diversidade estrutural.
A perspectiva desta intervenção é pautada nos gritos (orais e escritos) a nível mundial
que ecoam a necessidade de nós, mulheres negras, construirmos ações políticas para garantir
nossos direitos humanos, mas a partir dos nossos próprios olhares e indo ao encontro do que a
intelectual e ativista Angela Davis afirma: “Quando uma mulher negra se movimenta, toda a
estrutura social se movimenta com ela” (DAVIS, 2017)1. Partindo da premissa de que
compomos a base de uma pirâmide social e temos ainda poucas produções de mulheres negras
sobre mulheres negras, esse projeto visa desentalar e responder a crítica muito bem vinda de
Conceição Evaristo (2016)2 sobre nossa escrita: “A escrita das mulheres, a nossa história, a
história das mulheres negras e das classes populares, não está escrita, e se está, está escrita sob
a ótica das classes dominantes. A nossa escrita está engasgada” (EVARISTO, 2016).
Essa abordagem exige que nós, cada vez mais, nos aproxime das teorias da
interseccionalidade para pensar a discriminação de raça articulada à questão de gênero e os seus
resultantes epistemicídios, tal como nos inspira Lélia Gonzalez (1983), Beatriz Nascimento
(1989) e Sueli Carneiro (2005, 2003), intelectuais negras engajadas na luta antirracista e
antissexista. Segundo Kimberle Crenshaw (2002, p. 8), criadora da noção de
interseccionalidade,

A intersecionalidade pode servir de ponte entre diversas instituições e eventos e entre


questões de gênero e de raça nos discursos acerca dos direitos humanos – uma vez
que parte do projeto da intersecionalidade visa incluir questões raciais nos debates
sobre gênero e direitos humanos e incluir questões de gênero nos debates sobre raça
e direitos humanos.

1
Palestra “Atravessando o tempo e construindo o futuro da luta contra o racismo”, realizada na Universidade
Federal do Recôncavo Baiano, na cidade de Cachoeira-BA, em 2017, sob organização do grupo feminista Odara
– Instituto da Mulher Negra.
2
Fala da escritora no documentário e web série “Empoderadas”, direção de Issis Valenzuela e Renata Martins,
2016.
9

Assim, na elaboração da exposição virtual e na intervenção, levei em consideração o


encontro das identidades acentuando as de gênero e racial sem considerar uma hierarquia ou
separação entre elas. Conhecer a história de vida de Tia Ciata tem me permitido romper com a
ideia de que a política é um espaço de hegemonia branca e tem me aproximado da noção da
política fruto das relações cotidianas das mulheres negras, no âmbito de diferentes frentes de
sociabilidade, como no trabalho, na religião, nas festas e produção artística, que denomino aqui
como política do cotidiano3. Nesse sentido, para a criação da exposição debrucei-me sobre as
vivências de Tia Ciata nos terreiros de candomblé da Bahia e do Rio de Janeiro, na Irmandade
da Boa Morte (Cachoeira), nas experiências migratórias, vividas entre Santo Amaro, Salvador
e Rio de Janeiro, no seu trabalho como quituteira, e no seu engajamento no universo da música
e das festas. Ainda na Bahia, há relatos de que Tia Ciata não só frequentava, mas pertencia a
esta irmandade e ao Candomblé da Casa Branca do Engenho Velho –BA. Como afirma Brito
(2020),

Dentre as “mulheres de partido alto” está Hilária Batista de Almeida (1854-1924),


mais conhecida como Tia Ciata. Nascida em Santo Amaro da Purificação, cidade
vizinha a Cachoeira, Tia Ciata era filha de Oxum, integrante da Irmandade da Boa
Morte e foi iniciada no Terreiro da Casa Branca. Aos 22 anos, ela foi para o Rio de
Janeiro, onde se tornou Iakekerê do terreiro do pai de santo (sacerdote) João Alabá de
Omulu (BRITO, 2020, p. 175).

Uma das informações mais difundidas sobre Tia Ciata é que em sua casa na região da
Praça Onze, no centro do Rio de Janeiro, se reuniram com regularidade diversos sambistas para
tocar e compor, como Donga, Pixinguinha, João da Baiana, Heitor dos Prazeres, dentre outros.
(THEODORO, 2009; SILVA, 2014; RAPOSO et.al., 2014; MOURA, 1995).
No presente projeto de intervenção pedagógica, a temática da mulher negra é pontuada
de forma diversa, na exposição e na roda de conversa as categorias “mulher”, “mãe pequena”,
“irmã”, “tia”, são pensadas para pensar no protagonismo feminino exercido por Hilária a partir
de diferentes redes de sociabilidade. Apoio-me na ideia de pensar o protagonismo da mesma
para evidenciar outras histórias, rostos, nomes e, sobretudo, novas mulheres a partir da escrita
e da fotografia.
Hoje, Santo Amaro é um município brasileiro do Estado da Bahia com uma população
estimada em 60.131 habitantes. Desse número total, 51.665 declararam-se pardas e pretas,
portanto, quase a totalidade da população do município (IBGE, 2010). A trajetória de Hilária

3
Com esse termo me refiro aqui às trocas e às redes de sociabilidade ocorridas através de apoio mútuo construídas
na comunidade negra entre o século XIX e XX, para além da estrutura familiar patriarcal, como a rede em torno
da Tia Ciata que amparava os imigrantes baianos no Rio de Janeiro.
10

Batista Batista de Almeida, Tia Ciata, representa uma das experiências, dentre inúmeras, de
migrações de baianas e baianos para o sudeste, ainda no século XIX. É importante tratar desse
assunto considerando o deslocamento de Tia Ciata para Salvador e posteriormente para a cidade
do Rio de Janeiro, onde chega em 1876. Podemos sugerir, com base na literatura, que a
motivação para sua migração esteve fundamentada na fuga da perseguição religiosa e na
possibilidade de melhoria das condições de vida (CORREA, 2018; THEODORO, 2009;
SILVA, 2014; RAPOSO et al., 2020; MOURA, 1995).
A escolha por uma intervenção pedagógica em espaço virtual ocorreu em decorrência
da pandemia provocada pelo COVID-19 que demandou o distanciamento social. Já o formato
da ação como roda de conversa foi escolhida por ser uma prática presente nas culturas africanas,
afro-brasileiras e indígenas e por permitir a horizontalidade, propiciando uma maior
possibilidade de participação e de trocas entre o grupo. O público alvo da intervenção eram
professoras e professores que atuam no ensino fundamental 2 e no ensino médio de escolas de
Santo Amaro-BA. A intervenção aconteceu no dia 03 de fevereiro de 2022, às 19:00 horas, por
meio da plataforma do Google Meet.

2 ETAPAS DO PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

Para realização do presente TCC, foi necessário passar pelas seguintes etapas:

2.1 DEFINIÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO

Conheci a Tia Ciata na procura por personagens negras importantes do Recôncavo para
realização de uma pesquisa no âmbito da componente Tópicos em História da Bahia e do
Recôncavo Baiano do curso de História da Unilab. Em uma turma com mais de trinta alunos e
alunas, todas/os estavam centradas/os em contar uma história a partir de lugares, monumentos
e personagens masculinos. Eu achei importante trazer para o centro do presente estudo a
referência de uma mulher que se tornou uma das figuras mais conhecidas, sobretudo, na
comunidade negra e artística do Rio de Janeiro pelo seu poder religioso, mas também agregador
e de inestimável contribuição comunitária na passagem da escravatura para o pós-abolição. Na
presente intervenção, a noção de comunidade se faz presente em razão do papel de liderança
das "tias baianas", que se revelaram capazes de reunir, através de “centros” e “terreiros”,
espaços muito importantes para disseminção do conhecimento cultural e intelectual negro e
11

baiano no Rio de Janeiro e que também eram referências obrigatórias para os baianos recém-
chegados ao Rio (VELLOSO, 1990; BRITO, 2020).
Na Introdução do livro Ensinando a transgredir, a educação como prática da Liberdade
(2013), bell hooks, escritora e educadora afro-americana, afirma: “O campo acadêmico de
escrever sobre a pedagogia crítica e/ou a pedagogia feminista continua sendo antes de tudo um
discurso feito e ouvido por homens e mulheres brancos.” (p. 20). A partir da exposição virtual
e da intervenção pedagógica, pretendi também elaborar uma escrita que chegasse aos espaços
de convívio e de ensino, por isso o recorte racial e de gênero. Neste trabalho tenho a intenção
de contribuir com uma pedagogia crítica e feminista, contrariando a tendência exposta por bell
hooks.
Nesse sentido, inspiro-me nesta autora para pensar a educação como prática de
transgressão e de liberdade, somando minha voz ao apelo coletivo mencionado por ela:

(...) somo minha voz ao apelo coletivo pela renovação e pelo rejuvenescimento de
nossas práticas de ensino. Pedindo a todos que abram a cabeça e o coração para
conhecer o que está além das fronteiras do aceitável, para pensar e repensar, para criar
novas visões, célebro um ensino que permita as transgressões — um movimento
contra as fronteiras e para além delas. É esse movimento que transforma a educação
na prática da liberdade. (p. 23-24).

Além da crítica às narrativas históricas centradas nos grandes feitos e em personagens


quase imortais pertencentes às elites brancas, em sua maioria homens cisgênero, me inspirei
também nos espaços de educação não formal, como museus e centros culturais, no sentido de
reafirmar a importância de outros espaços que também educam. Na monografia intitulada “A
APRENDIZAGEM DE HISTÓRIA EM OUTROS ESPAÇOS EDUCATIVOS:
NARRATIVAS SOBRE A ESCRAVIDÃO E O PÓS-ABOLIÇÃO ENTRE OS
PARTICIPANTES DO NEGO FUGIDO EM SANTO AMARO, BA”, Joice Lorena (2019),
afirma que “As comunidades, as pessoas e os grupos populares tem outra relação com a escrita
que não a de dependência, basta perguntar ao Mestre João do Boi onde ele escreve as chulas
dele e o mesmo dirá que estão todas guardadas na cabeça, então essas histórias estão grafadas
em formas de cantigas, de danças, de lendas, ditados, comidas.( ALVES, 2019, p.40). Ao
apontar esses outros lugares educativos, que não são os espaços escolares como a sala de aula,
e sim nas ruas como espaços que possibilita vivenciar o processo de ensino e aprendizagem.
Para isso, ela “tratou de aspectos da aprendizagem histórica, no âmbito do patrimônio cultural,
a partir da análise do Nego Fugido, que é uma teatralização das relações sociais do período da
12

escravidão, que acontece todos os domingos do mês de julho pelas ruas de Acupe, distrito de
Santo Amaro - BA” (ALVES, 2019, p. 57).
Neste sentindo, para além de atender a uma demanda de produção de material didático
que conversa com o contexto do isolamento social, a exposição em formato virtual também
permite a circulação do material criado por diferentes ambientes públicos e espaços
educacionais. Sendo assim, o período pandêmico acabou exigindo que pesquisadoras(es) e
professoras(es) fossem capazes de alcançar lugares, pessoas e universos múltiplos, os(as)
chamados(as) “Intelectuais Mediadores(as)”, que são apontados(as) como “aqueles(as) que
constroem projetos, individuais ou coletivos, visando conscientemente criar produtos culturais
capazes de alcançar públicos diferenciados, o que, no nosso caso concreto, inclui o público
acadêmico, mas pode e deve ultrapassá-lo” (GOMES et al, 2021, p. 2). Em vista disso, elaborei
com a colaboração da minha orientadora, uma proposta de Intervenção Pedagógica que incluía
a criação de uma exposição virtual, produzida a partir de pesquisa prévia, mediada por mim em
um encontro com professores(as) do município de Santo Amaro.
Mudei-me para a cidade de Santo Amaro em 2018 com o desejo de terminar um projeto
de pesquisa intitulado: “Família negra, Laços afetivos e educação escolar na cidade de Simões
Filho-Ba”, defendido como TCC no Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades (Unilab).
Simões Filho é a cidade onde eu fui criada, ela fica entre Salvador, cidade de meu nascimento
e Santo Amaro. Durante minha trajetória na Licenciatura em História mudei meu foco de
pesquisa para a compreensão da história de vida e do patrimônio histórico cultural a partir de
uma educação não-formal, sem deixar de contemplar a formação das famílias negras e os laços
afetivos cultivados nesses espaços. Já não estava interessada em realizar a pesquisa no ambiente
escolar. Porém, sei da importância de pensar o contexto escolar, a formação das famílias negras
e os laços afetivos cultivados nesses espaços e o interesse pela educação se manteve e sustenta
o presente trabalho. Aproximei-me da noção de educação não-formal a partir da importância
do seu sentido, acreditando que ela tem uma contribuição significativa no aspecto social e de
formação dos sujeitos e está presente no âmbito das famílias e dos espaços de sociabilidade,
como os terreiros de candomblé e nas irmandades.
A proximidade com a perspectiva de gênero já estava presente na formação como
Bacharela em Humanidades e foi acentuada com a minha participação na componente
Pensamento Feminista Negro, Intelectualidade e Escritas de si: Saberes Transgressores no
Ensino e Aprendizagem, do curso de História da Unilab. Pensando a importância da história de
novos sujeitos e da necessidade de um lugar de fala que coincide com uma maior proximidade
da história familiar, também produzi um novo projeto de pesquisa como proposta para o
13

trabalho de conclusão do curso de História intitulado: “O Fumo Baiano no mundo Atlântico:


Mulher e resistência negra no Recôncavo do século XIX”, projeto timidamente iniciado e não
continuado.
Tive acesso à história de Tia Ciata por meio de pesquisas para uma atividade avaliativa
da componente Tópicos em História da Bahia e do Recôncavo Baiano. Neste trabalho,
produzimos um inventário intitulado: “Memórias de Tia Ciata – Hilária Batista de Almeida
(1854-1924)”. Nele abordamos em grupo sua contribuição material e imaterial muito centrada
na experiência de vida em solo carioca. Esse trabalho foi apresentado na II Semana de História
da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), lugar
onde tive acesso a componentes curriculares desenvolvidos por profissionais transgressoras/es
e extremamente comprometidas/os com uma educação para promoção da liberdade. Assim,
inspirada em outra componente do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades, Educação e
Relações Étnico Raciais, passei a refletir sobre a educação para as relações raciais a partir das
artes africanas e afro-brasileiras. E me aproximando do que afirma Conceição Evaristo (2016)
sobre a potencialidade da arte em humanizar, escolhi essa abordagem para o presente trabalho.
Meu corpo, minha identidade racial e de gênero e minhas próprias vivências me
aproximaram de diversos eventos que me impulsionaram a realizar essa intervenção com
enfoque na História das mulheres. Nasci rodeada de mulheres negras, donas de casa e na minha
família tive pouca referência de mulheres alfabetizadas. Só por volta dos 20 anos que comecei
a me perguntar: “De onde vem tanta força para criar filhos, sobrinhos, afilhados e vizinhos?”.
Tudo isso, muitas vezes, sem apoio de uma figura paterna.
Estudando na UNILAB, tive a oportunidade de visitar a UFRB e participar como ouvinte
de uma mesa em que a professora Isabel Reis, apresentou a sua pesquisa sobre Família negra
na Bahia (1850-1888). Foi ali que percebi que a minha estrutura familiar não era desestruturada,
a estrutura social, econômica, política e escolar que não estava preparada para acolher a minha
família. Me formei no Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades (UNILAB) e a temática
de família negra e laços afetivos já estava presente na minha escrita. Novos eventos de incentivo
foram surgindo, entre eles o IV Festival das Culturas e a VI Semana da África, realizados na
UNILAB em 2019, onde acompanhei uma palestra sobre empoderamento feminino. O
“Encontro de Mulheres de mãos dadas na luta contra a violência”, e o Seminário “Vamos
precisar de todo mundo: Poder representação e Vivências”, ambos de 2018, também me
impulsionaram a seguir com a temática.
Inicialmente, eu já sabia a personagem que eu iria investigar, mas a minha inquietação
estava em torno do silêncio e da ausência. A essa altura eu já tinha tido contato com a
14

personagem da Hilária, Tia Ciata, como personagem simbólico para História do Samba da
Bahia para o Rio de Janeiro. Na disciplina de Estágio Supervisionado III, desenvolvido na Casa
do Samba – ASSEBA, acreditava que iria me aprofundar nesse tema. A Casa do Samba consiste
em uma antiga mansão do século XIX, reconhecida como Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional pelo IPHAN. Sua ocupação pela ASSEBA se deu em 2007 e teve como objetivo a
criação de um centro de referência, pesquisa, treinamento, transmissão e vivência de uma das
manifestações culturais mais importantes da região e do Brasil que é o samba de roda, tombado
como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade pela UNESCO em 2005. Porém, a Casa do
Samba não possui um/a educador/a ou uma rotina de visitas acompanhada e requer do público
visitante uma autonomia na aquisição de conhecimento. É um espaço ligado à educação que
também pode promover silenciamentos, e, ao mesmo tempo, uma aprendizagem significativa
para a comunidade. Pensar esses espaços em dialógo com o ambiente escolar, possibilita que o
estudante seja incentivado e provocado a buscar respostas, a visitar lugares, a conversar sobre
o seu lugar de origem e suas próprias histórias, a localizar vestigios, fontes e fotos, a
desenvolver uma attitude historiadora. Um dos silenciamentos observados na Casa do Samba
diz respeito à memória da Tia Ciata. Sendo assim, perguntei: Quais os sentidos em torno deste
silenciamento? É um apagamento dado pelo correr do tempo e por falta de informações sobre
sua história na Bahia ou por um embate político regional? Qual a importância da memória ou
de investigar a presença de Tia Ciata nesse espaço, nessa cidade? Como essa memória aparece
no currículo do município?

2.2 DISCUSSÃO TEÓRICA

A partir dessas indagações, considero necessário ressaltar aqui o posicionamento do


antropólogo haitiano Michel Rolph Trouillot em seu livro intitulado Silenciando o Passado:
Poder e a produção da História (2016), no qual o autor aborda as relações de poder atreladas à
história e traz um amplo debate sobre as formas de silêncio. Sobre o mesmo, Trouillot afirma:
“Silêncios são inerentes à história, porque qualquer evento específico entra para a história sem
algumas de suas partes constitutivas. Alguma coisa sempre é deixada de fora, enquanto alguma
outra coisa é registrada.” (p. 86). O autor destaca também os sinais de silenciamento e a
necessidade de rastrear o poder: “Na história, o poder começa na fonte. (...) a história começa
com corpos e artefatos: cérebros vivos, fósseis, textos, edifícios.” (p. 61). E é nessa perspectiva
que o presente trabalho caminha, em identificar e localizar essas materialidades e fontes que
são também orais, com o objetivo de sistematizar a trajetória de Tia Ciata, especialmente, pela
15

Bahia. Assim, procuro respostas a essas lacunas, motivadoras para elaboração do presente
estudo.
Para aprofundar no tema foi preciso partir da leitura biográfica da Hilária Batista de
Almeida (1854-1924). As leituras me levaram a pensar uma bibliografia que dialogasse com o
tema. Então me debrucei em ler um pouco mais sobre o Recôncavo Baiano, sobre Santo Amaro
no século XIX, sobre o conceito de lugar de memória e sobre os/as negros/as na fotografia.
Algumas referências sobre família negras foram bagagem dos estudos para elaboração do
Trabalho de Conclusão do Curso de Bacharel em Humanidades. Destaco aqui os principais
trabalhos que contribuíram na elaboração da exposição.
É importante ressaltar que a história da Tia Ciata também ocupa lugar no que Maurice
Halbwachs (2013) nomeou como “memória coletiva”. As memórias sobre Tia Ciata se
entrelaçam com as lembranças de um grupo de pessoas pertencentes à comunidade negra,
baiana e carioca, que seguem sendo transmitidas de geração a geração. No entanto, pelos
estudos até agora realizados, a história de Tia Ciata está pouco presente na memória pública da
cidade de Santo Amaro, e até mesmo no espaço de memória destinado à preservação do Samba
na Bahia, especificamente, na Casa do Samba, Associação de Sambadores e Sambadeiras do
Estado da Bahia – ASSEBA, localizada no centro de Santo Amaro.
A seguir, apresento brevemente a cidade de Santo Amaro da Purificação e o Recôncavo
Baiano, para então abordar algumas categorias relevantes para a pesquisa, como migração,
diáspora e diáspora baiana. Artículo tais conceitos no intuito de entendê-los a partir da relação
com a comunidade negra na Bahia oitocentista, na qual são notadas as estruturas das famílias
negras. Famílias essas marcadas pela presença de laços de parentescos simbólicos, rituais e ou
espirituais. A necessidade de pensar a família negra nesse trabalho se dá também porque durante
a discussão sobre um ideal de nação, a família negra foi colocada em oposição à família
patriarcal e pensada no contexto da miscigenação e do embranquecimento, enquanto
desestruturadas e estruturadas, respectivamente. Muitas vezes as famílias negras são nomeadas
como famílias extensas, estabelecidas por redes de apoios, onde agentes oriundos da família
biológica ou não podem fazer parte desde que participem do circuito de trocas de dinheiro,
comida, cuidados, religião etc, estabelecendo laços de solidariedade e consideração
(CASTILHO, 2008).
Considerei importante pensar a trajetória e os laços familiares de Tia Ciata de forma
ampliada. Tanto a história da família religiosa quanto a história da família consanguínea de Tia
Ciata que permaneceu na Bahia, provavelmente, na cidade de Salvador e no Recôncavo Baiano
foram levadas em consideração no presente estudo. Essas últimas informações, no entanto, não
16

foram identificadas em minha investigação. A pesquisa pretendeu trazer à tona a memória de


Tia Ciata não apenas no seu lugar de destino, quando migra para o Rio de Janeiro, mas também,
constituída no seu lugar de origem (CASTILHO, 2008; FREIRE, 2012; REIS, 2007).
Considerando que Tia Ciata viveu em um período emblemático na história do Brasil que
perpassa o período do Império e da República, foi necessário levar em consideração as
transformações sociais, culturais, políticas e econômicas do seu próprio período. Essas
mudanças influenciaram fortemente na construção de possibilidades de emancipação da mulher
e da população negra que migra da Bahia no Brasil Império para cidade do Rio de Janeiro.
Nascida em Santo Amaro da Purificação – BA, Hilária migrou para o Rio de Janeiro e ali viveu
até o pós abolição, tendo falecido em 1924.

2.2.1 De Santo Amaro da Purificação para o Rio de Janeiro

A Vila de Santo Amaro da Purificação foi fundada pelos portugueses em 1557, fruto
das expedições comandadas por Mem de Sá, terceiro governador do Brasil, comprometido com
a consolidação do empreendimento colonial (MACHADO, 2014). Hoje, Santo Amaro é um
município brasileiro do Estado da Bahia com uma população estimada em 60.131 habitantes.
Desse número total, 51.665 declararam-se pardas e pretas, portanto quase a totalidade da
população do município (IBGE, 2010). O município também compõe a região que conhecemos
como Recôncavo Baiano, definido como região que integra a “Baía de Todos os Santos”
(CAROSO et al., 2011). De acordo com Ana Rita Machado (2014), o Recôncavo Baiano é uma
das regiões mais importantes do país, ou seja, ele é caracterizado pelas singularidades
socioculturais das populações, sobretudo dos povos afrodescendentes. O processos culturais do
Recôncavo foram marcados pela lógica dos processos históricos da colonização e da
escravidão. Quando abordamos o samba de roda no presente trabalho, estamos pensando em
festas e sociabilidades que aconteciam também neste contexto e na configuração de espaços de
expressão e difusão de um ethos cultural e religioso afrodiaspórico. As vivências que envolviam
tanto o samba quanto a religiosidade de matriz africana são consideradas aqui como práticas
também de resistência.
O Recôncavo Baiano foi palco de importantes episódios de resistência escrava, como
bem abordado por João José Reis, no artigo “Recôncavo Rebelde: Revoltas Escravas nos
Engenhos Baianos” (1992). Essa região também é considerada historicamente como o berço da
tradição do samba de roda. De acordo com Eloisa Domenici (2017), A maioria dos estudos
sobre o samba de roda focaliza sua ocorrência no Recôncavo Baiano, até mesmo devido ao fato
17

de que aquela região é considerada historicamente o epicentro dessa tradição, o que pode fazer
parecer que ela não ocorre em outras regiões do Estado, o que não é verdade. (p. 225). Nesse
sentido, Eloisa Domenici alerta para a presença do samba de roda em outras regiões do Estado,
especificamente no litoral Norte.
Com a experiência de migração dos baianos para o sudeste, ainda no século XIX, há um
deslocamento dessa tradição do samba para o Rio de Janeiro. É importante tratar desse assunto
considerando o deslocamento de Tia Ciata para Salvador e posteriormente para a cidade do Rio
de Janeiro, onde chega em 1876. Podemos sugerir, com base na literatura, que a motivação para
sua migração esteve fundamentada na fuga da perseguição religiosa e na possibilidade de
melhoria das condições de vida (CORREA, 2018; THEODORO, 2009; SILVA, 2014;
RAPOSO et al., 2020; MOURA, 1995). Roberto Moura, em seu livro “Tia Ciata e a pequena
África no Rio de Janeiro” (1995), se debruça a pensar a história da Tia Ciata atrelada à história
do grupo baiano, formado por baianos livres, em movimento de ocupação da área urbana do
Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX, A população negra do Rio de Janeiro só
voltaria a crescer já na segunda metade do século XIX com a decadência do café no vale do
Paraíba e com as chegadas sistemáticas dos baianos que vêm tentar a vida no Rio de Janeiro
(MOURA, 1995, p. 44). Na perspectiva do autor, esse movimento gera uma nova “síntese da
cultura negra no Rio de Janeiro” (MOURA, 1995, p. 44). Esses negros e negras baiano/as livres
ou não eram muitas vezes líderes religiosos do candomblé, membros de irmandades ou de
grupos festeiros que traziam da Bahia uma imensa bagagem cultural que influenciaria e deixaria
marcas na comunidade carioca. Sampaio (2009) ao discorrer a respeito do movimento
migratório da região norte e nordeste para o sudeste, ressalta que entre 1850 e 1888, um número
expressivo de trabalhadores se moviam da região Norte e Nordeste rumo ao sudeste e esse
deslocamento deu lugar a consequências demográficas, sociais e culturais que influenciaram a
sociedade brasileira.

2.2.2 Hilária Batista de Almeida – Tia Ciata

Quatro anos após a promulgação da Lei brasileira nomeada Eusébio de Queirós em


1850, que supostamente colocava fim ao tráfico negreiro no Brasil, especificamente em 1854,
nasce no Recôncavo Baiano, na cidade de Santo Amaro da Purificação – Hilária Batista de
Almeida, a Tia Ciata. Aos 17 anos de idade, Ciata vivenciou o processo que promulgação da
Lei do Ventre Livre (1871) que concedia liberdade para os filhos de escravos nascidos. Nesse
momento Ciata ainda estava na Bahia, pois só aos 22 anos ela chega ao Rio de Janeiro. Quanto
18

tempo Ciata teria passado em Salvador? Quais as relações foram estabelecidas na cidade? Qual
foi a rota realizada até o Rio de Janeiro? Essas são algumas lacunas na história de vida de Tia
Ciata que a pesquisa pretende se debruçar. Segundo (RAPOSO et al., 2020),

Em 1876, com apenas vinte e dois anos, chegou ao Rio de Janeiro, indo morar na rua
General Câmara” (MMV, p. 28). Esse movimento de viagem/fuga remete à diáspora
africana, cuja referência é a viagem forçada imposta aos negros, iniciada no período
da escravidão, a qual inevitavelmente trouxe a necessidade de novos contatos e a
reelaboração de costumes e comportamentos. É importante ressaltar que o episódio
narrado está relacionado a fatos históricos, sendo um deles a data da viagem e a idade
da personagem coincidindo com dados da biografia de Tia Ciata (p. 301).

Já no Rio de Janeiro, Tia Ciata experienciou o processo de promulgação da Lei dos


Sexagenários (1885), que cedia liberdade para os escravos maiores de 60 anos. Esta lei
acompanhou os marcos mais importantes para a comunidade negra e brasileira, incluindo aqui
a Lei Áurea, promulgada no ano de 1888 - que deveria abolir a escravatura. Durante esse
período, Hilária se tornou uma das baianas mais conhecidas que compunha o grupo das Tias
famosas no meio da população negra do Rio de Janeiro. Tia Ciata tornou-se referência como
quituteira, cozinheira, mãe de santo, responsável pelo aluguel de roupas de baiana para o teatro
e bailes à fantasia, e pela sua casa, também terreiro, onde o povo do samba se reunia, e onde
ela, inclusive, tocava prato e faca, e o cavaquinho. Com o rendimento dos quitutes e do aluguel
de roupas, Tia Ciata criou seus filhos. Com o seu poder de cura (chegando a grandes figuras de
poder), negociou a liberação das atividades religiosas e festivas de matrizes africanas em sua
casa, naquela altura proibidas pelo Estado (GOMES, 2021; SANTOS et al., 2020; ROCHA,
2015). É importante ressaltar que a história da Tia Ciata também ocupa lugar no que Maurice
Halbwachs (2013) nomeou como “memória coletiva”. As memórias sobre Tia Ciata se
entrelaçam com as lembranças de um grupo de pessoas pertencentes à comunidade negra,
baiana e carioca, que seguem sendo transmitidas de geração a geração. No entanto, pelos
estudos até agora realizados, a história de Tia Ciata não encontra-se presente na memória
pública da cidade de Santo Amaro, nem mesmo no espaço de memória destinado ao samba e
que integra a presente investigação (SILVA, 2014, p. 247).
Segundo a literatura, Tia Ciata era uma praticante do candomblé e feita no santo o que
lhe rendiam, muitas das vezes, a fama de “feiticeira” (GOMES, 2013; ALMEIDA; 2020). Há
relatos de que Hilária também teria pertencido à irmandade católica de negros chamada de Boa
Morte, ainda presente no Recôncavo Baiano, na cidade de Cachoeira – BA, localizada a
aproximadamente 35 km de sua cidade natal. Hoje a Irmandade da Boa Morte é mais conhecida
pelos cortejos em celebração à Nossa Senhora da Boa Morte, que acontece anualmente no mês
19

de agosto e envolve a realização de missas e de samba de roda, podendo ser considerada uma
devoção sincrética do candomblé com o catolicismo. Nesta cidade, há relatos de que Tia Ciata
não só frequentava, mas pertencia a esta irmandade, como afirma Brito (2020),

Dentre as “mulheres de partido alto” está Hilária Batista de Almeida (1854-1924),


mais conhecida como Tia Ciata. Nascida em Santo Amaro da Purificação, cidade
vizinha a Cachoeira, Tia Ciata era filha de Oxum, integrante da Irmandade da Boa
Morte e foi iniciada no Terreiro da Casa Branca. Aos 22 anos, ela foi para o Rio de
Janeiro, onde se tornou Iakekerê do terreiro do pai de santo (sacerdote) João Alabá de
Omulu (BRITO, 2020, p. 175).

Segundo Machado (2013), as irmandades religiosas atuavam através de laços de


solidariedade dentro da comunidade negra e seus integrantes assumiam um papel de liderança.
A linguagem da fotografia ocupa um lugar privilegiado na pesquisa e na exposição
virtual. É importante apontar que no século XIX, as fotografias estavam restritas a uma elite
comercial e política. Apesar disso, é possível localizar um número expressivo de fotografias da
população africana e afrodescendente escravizados, forros e libertos, que viviam no Brasil, no
período escravocrata e no pós-abolição (KOUTSOUKOS, 2010). Diante da impotência
estrutural das instituições de ensino em acolher as mentes e os corpos negros, essa intervenção
aponta possibilidades de diálogo voltadas para o ensino de história local, partindo do
pressuposto que “o conhecimento da história local é indispensável para a construção da história
nacional” (SILVA, 1999, p. 383).
Para além disso, permite que professores e professoras realizem suas aulas com
materiais que extrapolem os livros didáticos, a partir da autoria do seu planejamento que
dialogará com os conteúdos de seu domínio e mais próximos dos conhecimentos prévio dos(as)
estudante.
A Intervenção Pedagógica também apontou possibilidades de diálogo voltados para o
ensino numa perspectiva interdisciplinar, visando atender as demandas da educação do
município de Santo Amaro, referenciadas na lei 10.639/2003 e alterada pela 11.645/2008, Lei
de Diretrizes e Bases da Educação que inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a
obrigatoriedade da presença da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Africana”.
20

2.3 INSTITUIÇÕES DE ENSINO DOS PROFESSORES PARTICIPANTES DA


INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

O Projeto de Intervenção Pedagógica foi pensado inicialmente para ser realizado na


Casa do Samba, levando em conta o perfil da instituição e minha experiência neste espaço,
mencionado anteriormente. No entanto, em abril de 2020, parte de sua estrutura cedeu e o
acesso ficou restrito. Com o advento da pandemia de COVID -19 precisei adaptar meu Projeto
de Intervenção para que pudesse ser realizado em ambiente virtual. Os encontros de orientação
também passaram a ser virtuais. Logo no início da pandemia, em abril de 2020, tive a
oportunidade de apresentar o meu projeto no Djumbai-Grupo de Pesquisa em Artes e
Patrimônio Cultural Africanos e Afrodiaspóricos, coordenado pelas professoras Lia Laranjeira,
Joana D’Arc de Sousa Lima e Sandra Salles. Nesse processo de adaptações do projeto,
considerando o contexto de isolamento, cheguei a um consenso com minha orientadora sobre a
construção de uma exposição virtual e uma intervenção pedagógica a partir da mesma, a ser
realizada com professores e professoras do município de Santo Amaro. A exposição seria
pensada no sentido de sistematizar e divulgar a investigação sobre Tia Ciata, mas também como
meio de ações pedagógicas a serem realizadas por professoras e professores com suas
respectivas turmas. Sendo assim, a partir da mediação da minha orientadora com o apoio do
Conselho Municipal de Educação de Santo Amaro, elaborei e encaminhei um ofício
devidamente numerado e endereçado à coordenação do Centro Educacional Municipal Edvaldo
Machado Boaventura (CEMEMB) com Ensino fundamental 2 e Ensino médio, foco da Ação
de intervenção pedagógica, considerando meu campo de atuação enquanto professora de
História.
A Coordenadora se mostrou acessível, porém apontou que os professores estavam
retornando de férias no mesmo dia em que a Ação de intervenção pedagógica estava marcada.
Ampliamos o público com o objetivo de alcançar um número maior de participantes. Então,
criei um formulário do Google com informações sobre o evento, divulguei nas redes sociais,
assim como entrei em contato com alguns professores e professoras do município pedindo para
que divulgassem com colegas da rede pública e privada de Ensino. No formulário de inscrição,
solicitei que informassem o nome, o contato de email e whatsapp, a escola, o município e a
série que o participante lecionava, a raça, o gênero, a idade e o local de nascimento.
Como resultado, tive 25 inscrições para a Ação de intervenção pedagógica de diferentes
instituições do Município de Santo Amaro, sendo que um dos inscritos também lecionava no
município vizinho de Saubara. Dentre os/as inscritos/as, 80% foram pessoas negras, seguido
21

por 16% de pessoas pardas e 4% de pessoas brancas, com idades entre 26 e 58 anos, nascidas
em Santo Amaro, Salvador e São Félix, município da região do Recôncavo Baiano.
A atividade contou com a presença de 13 participantes, em sua grande maioria, mulheres
(85%). Dentre os participantes, duas eram estudantes da Unilab, uma estudante do IFBA, um
era educador social e nove eram professoras/es da educação básica, sendo uma delas também
estudante da Unilab. Três professores participantes atuavam na Educação Infantil, três atuavam
no Ensino Médio, três atuavam no Ensino Fundamental 2. Os componentes curriculares
lecionados por essas e esses professores do Ensino Fundamental 2 e Ensino Médio eram:
Matemática, Artes, História e Língua Portuguesa. Seguem abaixo as escolas representadas na
Intervenção a partir de seus professores:

1. Centro Estadual de Educação Profissional Em Turismo do Leste Baiano - CEEP.


Está localizado na Avenida Paulino de Andrade, s/n Centro, Santo Amaro - BA. O
CEEP oferece um curso Técnico Integrado com o 1º ano ao 4º ano do Ensino Médio.
Há também um Curso Técnico Integrado na Modalidade EJA, voltado à Educação
Profissional de jovens e adultos do Nível Médio.

2. Escola Cooperativa Educacional de Santo Amaro-COOPESA. Fica localizada no


endereço: Praça Frei Bento, 59 - Centro, Santo Amaro - BA. A COOPESA é uma
escola da rede privada de ensino do município. A instituição atua tanto na educação
infantil quanto no Fundamental I, Fundamental II e Ensino Médio.

3. Centro Educacional Teodoro Sampaio. É uma instituição da Rede Estadual,


localizada na Av. Ferreira Bandeira, 352- Centro, Santo Amaro-Bahia. Atua com
do 1º ao 3º ano do Ensino Médio. A instituição também atua no segmento de
Educação para Jovens e Adultos.

4. Centro Educacional Municipal Edvaldo Machado Boaventura (CEMEMB). Está


sediado na Avenida Presidente Vargas, sem número, Santo Amaro-BA. A
instituição atua com turmas do ensino Fundamental 2.

5. Centro Educacional Municipal Professora Ana Judite de Araujo Melo


(CEMPAJAM), localizada na Rua Nova, na cidade de Santo Amaro-BA. A escola
22

fica localizada no distrito de São Braz. Tem apenas 04 salas, atua com turmas do
ensino Fundamental 2 e de EJA - Ensino Fundamental, anos iniciais.

2.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Com o projeto já adaptado para o contexto da pandemia, aprofundei a pesquisa


bibliográfica sobre Tia Ciata, assim como acessei novos trabalhos acadêmicos voltados para o
tema. Juntamente com essa pesquisa e escrita de textos que entraram na exposição, localizei
endereços, telefones e redes sociais dos espaços de sociabilidades de Tia Ciata tanto na Bahia
quanto no Rio de Janeiro. Nessa pesquisa, acabei me aproximando de algumas instituições
relacionadas à sua trajetória e a espaços de pesquisa, acessados de forma virtual (V) e presencial
(P).
Cito aqui os mais importantes para a pesquisa e que estão representados na exposição
virtual: a Igreja da Barroquinha (V), a Casa Branca do Engenho Velho (V), a Casa Estrela (V),
a atual sede da Irmandade da Boa Morte (P), a Casa da Tia Ciata no Rio de Janeiro, onde
funciona a Organização dos Remanescentes da Tia Cia-ORTC (V), o Acervo do Instituto
Moreira Salles (V), o Acervo da Associação Nacional das Baianas de Acarajé (V), a Biblioteca
Nacional Digital (V), a Secretaria Municipal de Cultura (P), o Centro Referencial de
Documentação de Santo Amaro (P), a casa da minha avó Edna Santos da Silva (V), a casa da
minha tia-avó Iraildes Silva Campos (V) e a casa da prima da minha mãe Maria Luzinete da
Silva Silva (V).
Tive acesso também a lugares de memória e outros espaços relacionados à Tia Ciata no
Rio de Janeiro de forma virtual, como o Cais do Valongo e a Pequena África, a Praça Onze, os
bairros da Gamboa e da Saúde, a Pedra do Sal, a Casa-Grande de Mesquita e a Escola Municipal
Tia Ciata. Em Santo Amaro fiz uma visita à exposição “Homenagem à dignidade das matriarcas
santamarense, à Proclamação da República e ao Dia da Consciência Negra” na Praça do Rosário
em Santo Amaro-Ba.
Os espaços mencionados acima foram de fundamental importância para a coleta e
seleção de imagens que entraram na exposição virtual. Diante de uma grande quantidade de
imagens e informações sistematizadas a partir da pesquisa bibliográfica, realizei a seleção das
imagens e a montagem da exposição com o apoio da minha orientadora. Com a exposição
finalizada, entrei em contato com o CEMEMB e ampliei a divulgação da Intervenção
Pedagógica com o apoio de outros professores de Santo Amaro-BA, conforme mencionado
anteriormente.
23

A Intervenção foi realizada em formato virtual, via plataforma do Google Meet, e


gravada com o meu aparelho de celular para auxiliar na descrição e análise da atividade
realizada. Após a atividade, disponibilizei um formulário eletrônico com questões relacionadas
à atividade, a ser apresentado mais adiante, e dei continuidade à escrita do presente relatório.

2.5 OBJETIVOS

A Intervenção Pedagógica teve como objetivo geral:

Criar uma uma visita mediada na Exposição Virtual “AS REDES DE HILÁRIA
BATISTA DE ALMEIDA - TIA CIATA (1854-1924) ENTRE BAHIA E RIO DE JANEIRO”,
dando destaque para suas atuações e contribuições no seio de sua família extensa na Bahia e no
Rio de Janeiro e debatê-la em uma roda de conversa com professoras(es) do Município de Santo
Amaro-BA, cidade de origem da Hilária Batista de Almeida, Tia Ciata (1854-1924).

2.5.1 Objetivos específicos

1. Evidenciar as redes de sociabilidade e a família extensa de Hilária Batista de


Almeida enquanto espaços fundamentais para a sua atuação nos campos da religião
e da música.

2. Divulgar a história de Hilária Batista de Almeida para professores da rede básica


de ensino do município de Santo Amaro a partir da sistematização da pesquisa em
exposição virtual.

3. Contribuir com a produção de material didático e ações pedagógicas voltados para


a história local, história das mulheres negras do município de Santo Amaro-BA e
educação patrimonial no âmbito da Lei 10.639, tendo como base a trajetória e as
contribuições de Tia Ciata e de outras Tias baianas na diáspora.

2.6 IMPACTOS ESPERADOS

Com o desenvolvimento da presente Intervenção Pedagógica, espera-se construir


futuras propostas pedagógicas para serem executadas no contexto da educação básica no
24

município de Santo Amaro-BA, centradas nos laços afetivos, religiosos e consanguíneos de


Hilária Batista de Almeida, a partir de sua trajetória de vida entre Bahia e Rio de Janeiro.
Espera-se também que haja um impacto em torno da presença de Tia Ciata na
constituição da memória da cidade de Santo Amaro da Purificação-BA, nos seus espaços de
memória e no currículo do município. Além disso, almeja-se ampliar a divulgação e acesso à
exposição virtual sobre a história de Tia Ciata, provocando desdobramentos não apenas em
forma de atividades pedagógicas, mas também na construção de materiais didáticos.
Em médio prazo, há uma expectativa que eu amplie o diálogo com as escolas da rede
básica de ensino do município de Santo Amaro, no sentido de contribuir com a construção de
roteiros pedagógicos a serem utilizados na exposição, com a realização de rodas de conversa e
cursos de formação em torno dos temas trabalhados na exposição. Também pretendo co-criar
uma intervenção artística em um espaço público da cidade de Santo Amaro, tendo como tema
o legado de Tia Ciata, com a participação de professores/as e estudantes envolvidos nas
atividades citadas.

3 RELATO SOBRE A EXPOSIÇÃO VIRTUAL E A RODA DE CONVERSA “AS


REDES DE HILÁRIA BATISTA DE ALMEIDA - TIA CIATA (1854-1924) ENTRE
BAHIA E RIO DE JANEIRO”

A exposição Virtual e a Roda de conversa aconteceu dia 03 de fevereiro de 2022, às


19:00 horas e terminou às 21:00. A sala virtual foi aberta por minha orientadora, profa. Lia
Laranjeira, às 19:00 horas. Combinamos um número mínimo de 06 pessoas para prosseguir
com a intervenção. Entrei, conversamos um pouco, falei da minha ansiedade e insegurança, ela
me encorajou dizendo “eu confio em você”, e eu já estava lá.
Iniciei a roda de conversa me apresentando, com meu nome, origem e formação
acadêmica: bacharela em Humanidades pela Unilab do campus de São Francisco do Conde-
BA, graduanda em Licenciatura de História pela Unilab e estudante de Especialização em
Ensino de Sociologia pela UFMS. Em seguida, iniciamos uma rodada com a breve apresentação
de cada participante: nome, escola, série, componentes curriculares que lecionam etc. A seguir
apresento um breve perfil dos participantes da roda de conversa:
Célia é professora do Centro Estadual de Educação Profissional-CEEP em Turismo do
Leste baiano. Leciona língua portuguesa e metodologia do trabalho científico, e é licenciada
25

em Letras Vernáculas, com especialização em gramática e produção textual e especialização


em metodologia da educação profissional.
Evanise é professora, graduada em Pedagogia e pós-graduada em Gestão e coordenação.
É professora da Escola Cooperativa Educacional de Santo Amaro-COOPESA nas turmas de
anos iniciais. Informou que gostava e se interessava muito pelos cursos de educação especial e
cultura de Santo Amaro.
Márcia é professora do Centro Educacional Teodoro Sampaio, é graduada em Teatro
pela UFBA, atua na escola no ensino de artes e linguagens artísticas e participa de vários
projetos culturais e artísticos da escola. Comentou que se interessou bastante pelo assunto logo
que viu a divulgação da roda de conversa: “A história de Tia Ciata é extremamente bonita,
motivante e fiquei extremamente curiosa para saber mais e mais e por isso que estou aqui”.
Maria da Purificação é professora dos anos iniciais da Escola Cooperativa Educacional
de Santo Amaro-COOPESA, graduada em Pedagogia e em Estudos da África, na Faculdade
Brasileira do Recôncavo. Comentou no momento da apresentação:

A história da Tia Ciata é maravilhosa, inspiradora para toda mulher negra, né? Para
todo povo negro. Então assim, a gente poder conhecer mais a historia dela, pra gente
poder tá passando essas mulheres e homens negros como inspiração para os jovens de
hoje porque a mídia não deixa isso tão aberto assim, tantas pessoas que inspiram, mas
só que tem tanta mulher negra, tanto homem negro inspirador que é escondido,
camuflado e a gente precisa conhecer. A história para que a gente possa divulgar
também e essas mulheres e esses homens negros lutadores que eles possam ser
também inspiração, para outras outras mulheres e para outros homens que a gente
possa estar sempre internalizando que nosso povo é riquissimo e que se deixarem a
gente vai longe.

Ubiraci é escritor, coordenador pedagógico da coleção História da Cultura Afro-


brasileira, também é guia turístico e colunista da agência de notícias das favelas. Além disso, é
bibliotecário documentalista, especialista em Cultura Afro-Brasileira e militante da área da
alimentação. Ubiraci relatou que escreveu um projeto sobre as netas do mestre Bimba e que o
projeto desenvolvido menciona Tia Ciata e apontou que esse talvez fosse o seu maior interesse
em participar da roda.
Ana Cláudia é professora de Artes do Colégio Edivaldo Machado Boaventura desde
2003. É formada em Letras pela Universidade Federal da Paraíba-UFPB. A professora informou
que achou muito interessante a divulgação da roda de conversa sobre a história da Tia Ciata, e
que embora já tivesse ouvido falar sobre a mesma, desconhecia sua trajetória.
Tamiles é professora na educação infantil na Escola Cooperativa Educacional de Santo
Amaro - COOPESA, graduada em Biologia e estudante de Pedagogia na Unilab.
26

Arnaldo é professor efetivo de Matemática, na escola Ana Judith, localizada no distrito de São
Braz, no município de Santo Amaro. Ele trabalha com grupos culturais, como samba de roda,
marujada, rancho, dentre outras. Afirmou que de todas as manifestações, o samba é o que mais
lhe tocava. Ele comentou que toca e canta nos grupos de samba de roda. Afirmou que para ele,
falar de Tia Ciata é falar da história do samba, e por esse motivo não queria perder essa
atividade. Também apontou que estava ali para ouvir e aprender um pouco mais e trocar ideias.
Agradeci pelas apresentações e afirmei que a roda de conversa seria exatamente isso,
uma troca e por esse motivo o formato pensado foi uma rodada de conversa e não apenas uma
apresentação de uma exposição virtual. Também apontei que nunca tinha ouvido falar dos
ranchos aqui na Bahia. Informei que na exposição abordava esse assunto a partir da diáspora
baiana no Rio de janeiro e que iríamos conversar sobre o mesmo a partir da experiência de
migração. Relatei que a presente exposição também estabelecia um diálogo entre o campo
acadêmico e a educação básica de ensino de Santo Amaro e expliquei que esse era o motivo da
seleção do público participante, mas que todos(as) eram bem vindos(as).
Dei sequência à apresentação e debate da exposição a partir do compartilhamento de
tela. Após uma breve introdução sobre meu trabalho de pesquisa, Arnaldo fez a leitura da
citação que abre a exposição: “É preciso imagem para recuperar a identidade, tem que tornar-
se visível, porque o rosto de um é o reflexo do outro. O corpo de um é o reflexo do outro e em
cada um reflexo de todos os corpos”. Beatriz do Nascimento, Documentário “Ôrí", 1989.
Informei que Beatriz do Nascimento foi uma historiadora muito importante, que seus estudos
se debruçavam sobre a temática da comunidade negra e que ela trouxe a sua percepção sobre a
imagem do povo negro e da importância da imagem na tentativa de recuperação de uma
identidade, o que dialogava diretamente com a exposição. Falei também que a escolha da
citação aponta para a importância da leitura de imagem a partir do corpo individual relacionada
a uma contextualização do coletivo, da sociedade. A ideia de que esse corpo individual também
faz parte de um coletivo e é por esse caminho que penso, pesquiso e narro a trajetória de Tia
Ciata e as redes que ela foi construindo ao longo da vida.
Além de abordar os conteúdos relacionados a cada página da exposição, fizemos a
leitura de todas as imagens expostas de forma coletiva e com a minha mediação. Algumas das
questões feitas por mim durante a visita mediada: Por que selecionei essa máquina do século
XIX? Segui informando que pensar o objeto no seu tempo possibilita adentrar no século XIX,
pensando também o meio para a produção de parte das fotografias apresentadas na exposição.
Na primeira parte da Exposição abordei o contexto de origem de Tia Ciata no Recôncavo
Rebelde, trazendo o mapa, que é uma representação do Recôncavo no séc. XIX e destaquei a
27

afirmação de Ubiraci sobre Salvador como parte do Recôncavo. Segui com uma narrativa a
partir dos estudos do João José Reis, da presença de revoltas escravas e da produção agrícola,
sobretudo de cana de açúcar e de tabaco na região.
A partir da imagem do cartão postal com a paisagem de Santo Amaro de 1904, enviado
para a França, conversamos sobre a comunicação por correspondência nos séculos XIX e XX,
e de como Santo Amaro era retratada. Sobre as referências a figuras importantes do município
citadas na exposição, perguntei se os participantes acrescentariam outros nomes e quais seriam.
Citaram o engenheiro Teodoro Sampaio, a professora Zilda Paim, o músico Roberto Mendes,
o compositor Márcio Valverde, o mestre de capoeira Sidney e o capoeirista Besouro Mangangá.
As imagens das paisagens de Santo Amaro também motivaram uma discussão sobre as
transformações na cidade e a importância do Rio Subaé, a presença da navegação a vapor assim
como a epidemia de cólera entre 1855-1856, que dizimou metade da população.
Partindo para a temática de Tia Ciata pela Bahia, falei sobre o tema da família negra e
dos espaços de sociabilidade, estabelecendo um diálogo com o trabalho de Isabel Reis sobre a
família negra na Bahia oitocentista. Apontei que muitas vezes a família negra é tida como
desestruturada por não seguir o modelo patriarcal-nuclear, pai, mãe e filho. Isabel traz a
importância dessas famílias, mas também aborda famílias negras no plural formada por laços
de sociabilidade, afetividade para além dos laços de consanguinidade. Foi a partir dessa
perspectiva que abordei a trajetória da Tia Ciata para além do lugar que ela nasceu.
Mencionei também o trabalho de Moura (1995) sobre a história de vida de Tia Ciata.
Ele afirma que a Tia Ciata fez parte de um terreiro chamado Casa Branca do Engenho Velho,
ainda na Bahia, que motivou minha pesquisa sobre o terreiro e a seleção de algumas imagens.
Apresentei fotografia do Século XIX, da igreja da Barroquinha, falei da reforma, citei seu ano
de fundação e informei que hoje é um espaço cultural. Informei que a igreja sediou a Irmandade
do Martírio e a Irmandade da Boa Morte (1820), e que a transferência da irmandade para
Cachoeira se deu na virada do séc. XIX para o séc. XX. Narrei que ao redor tinha um terreiro
conhecido como: Terreiro da Barroquinha que deu origem a três outras casas de candomblé
localizadas em Salvador e que um desses terreiros era a casa Branca do Engenho Velho, o
mesmo que a Tia Ciata foi iniciada quando ainda estava na Bahia. Trouxe a fotografia do
Terreiro Ilê Axé Nassô Oká, a Casa Branca do Engenho Velho, e fiz uma ligação com as
revoltas africanas, sobretudo com a Revolta dos Malês (1835), onde uma série de eventos
impulsionaram os rebeldes, um deles foi o leilão de um mestre africano, assim como a presença
de nagôs islamizados na Bahia. Continuei apontando que nas revoltas os africanos se
direcionaram para tomar o Recôncavo, pois precisavam ter o apoio dos numerosos
28

trabalhadores rurais concentrados nos engenhos da região. Informei que foi nesse contexto que
Isabel Reis (2007) traçou seus estudos sobre a estrutura familiar negra que foram estabelecidas
para além dos laços de sangue, apontando também a relação de apadrinhamento e de família de
santo.
Falando do tema da família de santo, iniciei uma exposição sobre as perseguições aos
terreiros de candomblé, apontando os jornais e o posicionamento da imprensa. Perguntei o que
os participantes podiam observar em relação à população negra nos recortes de jornais,
apontando a presença do candomblé, dos conceitos de ignorância, a noção de religiosidade, a
cultura africana ou afro-brasileira, a feitiçaria. Após a leitura, perguntei sobre as motivações
para aquele tipo de conteúdo etc.
Seguimos para o tema da Irmandade da Boa Morte, transferida para Cachoeira. Apontei
que é uma irmandade de mulheres e apresentei a fotografia de Aristides Alves que retrata o
cortejo da Festa da Boa Morte (1984). Segui narrando que a Tia Ciata ainda na Bahia fez parte
dessa irmandade e que com a transferência da mesma de Salvador para a cidade de Cachoeira
- BA, se instalou na Casa Estrela e depois mudou para uma sede maior localizada na rua Treze
de Maio. A casa ficou conhecida no séc. XIX pela sua forte movimentação de africanos. Na
sequência fizemos a leitura da fotografia de Adenor Gondim. Perguntei como podemos
perceber a expressão das mulheres da fotografia? O que vocês perceberam na foto? Vocês
trabalhariam com essa fotografia? Quais temáticas vocês usariam para trabalhar? Alguém
respondeu que pôde perceber vários aspectos, citando a beleza da mulher negra mais velha, a
estética, e a resistência. Outra participante apontou que a imagem passava a força da mulher
negra que conquistou um espaço.
Para pensar a Tia Ciata na fotografia, expus a fotografia de duas negras baianas
apontadas como sendo a Tia Ciata e a Tia Josefa. Perguntei qual ligação poderíamos fazer entre
a imagem apresentada e a irmandade, o que essas mulheres da fotografia têm em comum com
a Irmandade da Boa Morte? Partindo para outra fotografia que está presente no Acervo da Casa
da Tia Ciata, reconhecida por sua neta Lili e pela sua bisneta Gracy, como sendo a real
fotografia da Tia Ciata. Solicitei que fizéssemo a leitura de imagem juntos(as) e perguntei se
alguém conhecia os tecidos da roupa dela e como identificaríamos na fotografia o campo
religioso da mulher retratada. Apontei que a fotografia da Tia Ciata foge de um padrão de
fotografias de mulheres negras no seculo XIX, pois em sua maioria, as mulheres aparecem as
amas fotografadas junto às famílias brancas. Assim, temos muitas representações do corpo
negro a partir da amamentação do corpo branco e dos cuidados com corpos brancos. Outras
perguntas foram feitas, como: Essa é uma fotografia do dia-a-dia ou foi tirada em um estúdio
29

fotográfico? Quem a fotografou? Coloquei que a fotografia apresentada foi tirada por Rodolpho
Lindemann, e que a foto não aponta o nome da Tia Ciata. Na época, a maioria dessas fotografias
era registrada com a assinatura do fotógrafo e as mulheres eram identificadas como crioula ou
negra de tal lugar, como “negras da Bahia”. Na fotografia tirada por Ferrez, intitulada “Negra
da Bahia”, mencionei que a mulher da fotografia às vezes é apontada como sendo a Tia Ciata,
em outros momentos é apontada como sendo Aqualtune, porém a fotografia é do século XIX e
Aqualtune viveu em 1665. Perguntei quem seria aquela mulher e por que ela aparece sem nome.
Segui apresentando a temática da “Diáspora baiana no Rio de janeiro" e abordei a
religião de matriz africana presente na Pequena África a partir de Moura (1995). Exibi a
fotografia da Praça Onze em 1920 e a imagem do Cais do Valongo. Informei que o mesmo cais
foi transformado no Cais da Imperatriz, como mencionado na legenda da fotografia e os
sentidos dessas transformações. Apontei que no Cais existia um comércio de escravizados e
que o mesmo foi soterrado em 1843. Que deveríamos pensar a Pequena África como um
território de sociabilidade dos baianos que migraram para o Rio de Janeiro. Para pensar mais
sobre essa região da zona portuária do Rio, fiz a exibição da foto que retrata a lavagem
simbólica em homenagem aos ancestrais que ali desembarcaram, no séc. XIX. Em seguida,
apresentei a imagem do livro de Moura (1995), onde o mesmo utiliza na capa uma arte
produzida por Heitor dos Prazeres, um cantor, compositor e pintor que nasceu no Rio de Janeiro,
no seio da comunidade baiana. Apontei que as artes de Heitor dos Prazeres são elementos que
podem ser trabalhados em sala de aula, por narrar as festividades, a música, os modos de vida
e a cultura negra no Rio de Janeiro.
Partindo para a temática “Entre Família, Trabalho e Samba”, informei que esses
aspectos levaram a Tia Ciata a ficar conhecida no Rio de Janeiro, pela relação de trabalho como
quituteira e da sua vivência no samba, e na relação com sua família ampliada. A Tia Ciata vivia
em uma comunidade permeada de mulheres negras e estas eram conhecidas como as Tias.
Levantei o debate sobre o protagonismo da Tia Ciata como “porta de entrada” para trazer à tona
as histórias de outras mulheres ligadas ao grupo baiano na diáspora carioca. Mulheres que saem
da região do Recôncavo e vão para o Rio de Janeiro, como Iá Davina, Davina Maria Pereira
(Salvador 1880, Nova Iguaçu- RJ, 1964), que também integrou o terreiro da Casa Grande de
Mesquita. Essas são algumas das mulheres que compõem comunidades de terreiros no Rio de
Janeiro na virada do século XIX, porém existem muitas outras. Em seguida, apresentei a
fotografia de sambistas do Rio de Janeiro em 1920 e na leitura de imagem, perguntei se alguém
notava a presença das mulheres com instrumentos ligados ao universo do samba e perguntei se
30

conseguiam identificar os instrumentos. Arnaldo abriu o microfone e citou o banjo, o


cavaquinho, o violão, o pandeiro, além da sanfona.
Relatei que geralmente apontam a ligação de Tia Ciata com o samba, mas sempre como
a mulher, mãe de Santo que cedeu a casa, a que fazia os quitutes e pouca referência dela como
instrumentista. Mencionei a entrevista do Roda Viva, na qual a cantora e compositora de samba
Teresa Cristina aponta o silêncio da mulher como instrumentista, citando a Tia Ciata como
referência de mulher compositora e instrumentista. Neste momento, citei que Mário de Andrade
(1893-1945), em Macunaíma (1928), descreve a Tia Ciata como compositora e afirma que ela
passava os dias tocando violão e inventando melodias maxixadas e que muitos sambas
registrados teriam sua autoria.
Para pensar o trabalho das mulheres negras no século XIX, exibi duas fotografias que
retratam quituteiras: uma tirada em estúdio e outra em uma rua do Rio de Janeiro. Apontei que
essas mulheres conhecidas como quituteiras ou quitandeiras, eram também reconhecidas como
ganhadeiras e compunham um grupo de mulheres escravizadas, forras e livres que trabalhavam
com preparação de comidas, venda ou atividade de ganho nos centro urbanos. Fizemos a leitura
de uma fotografia de uma baiana de acarajé em atividade de venda na rua no início do século
XX.
Segui para uma breve apresentação da ligação de Tia Ciata com a fundação dos ranchos,
apresentando a fotografia do rancho o “Macaco é Outro”, fundado no endereço da cada da Tia
Ciata, e o rancho “ Rosa branca”, dois ranchos que a família de Tia Ciata saía no Rio de Janeiro.
Pontuei que os nomes dos ranchos também apresentam uma crítica social, uma forma de
responder às leituras sociais que existiam, como por exemplo “Macaco é Outro”. A organização
dos ranchos que também eram associações tinham suas saídas possibilitadas a partir de ações
coletivas que giravam em torno da costura, da confecção dos bordados, das roupas, dos
ornamentos e instrumentos de percussão.
Segui exibindo a fotografia das “pastoras” para abordar a participação das mulheres
negras no coro das marchas dos ranchos, tema presente nos estudos do professor da Unilab,
Eric Nepomuceno. Essa importância da participação das Tias baianas nos ranchos e futuras
escolas de samba, deu origem à obrigatória “Ala das baianas” nas escolas de samba durante o
Carnaval do Rio de Janeiro e de outros lugares do Brasil. Exibi a fotografia do Carnaval no Rio
entre 1900 e 1930, que está no acervo da Biblioteca Digital Nacional, informando que é
necessário refazer as leituras dos corpos, das vestimentas das pessoas presentes no Carnaval do
Rio e nas fotografias dos Ranchos e na introdução da participação negra e baiana no Carnaval
e no cotidiano da Pequena África. Apontei também o trecho presente no livro de Moura (1995),
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onde Tia Carmem menciona a experiência da chegada dos baianos e baianas ao Rio de Janeiro
à procura de melhoria de vida ou em fuga da perseguição religiosa. Em seu relato, a Tia Carmem
traz outros nomes, outras irmãs da Bahia, tanto da Boa Morte quanto da Casa Branca do
Engenho Velho.
Relatei que no Rio de Janeiro, a Tia Ciata se torna Yakeré, cargo equivalente à mãe
pequena do terreiro fundado pelo sacerdote João Alabá, frequentado também por Tia Carmem
do Ximbuca, (1878- 1988). Neste momento mostrei a foto da tia Carmem, informei o ano da
fotografia, o nome do fotógrafo, informei que a fotografia e o relato da Tia Carmem estão no
livro de Moura (1995) e mencionei que ela é considerada a última irmã da Tia Ciata, falecida
no século XX. Já partindo para a família consanguínea da Tia Ciata, apresentei a fotografia do
seu neto, Bucy Moreira, um famoso compositor, instrumentista e cantor, assim como apresentei
a fotografia da Dona Lili, Licínia da Costa Jumbeba, neta da Tia Ciata. Também exibi a
fotografia da sua bisneta Gracy Moreira, que lidera um movimento de preservação da memória
da Tia Ciata através da Casa da Tia Ciata, sede da Organização dos Remanescentes da Tia
Ciata.
Partindo para pensar o legado das Tias Baianas, mencionei os espaços que reconhecem
e homenageam as trajetórias e contribuições dessas mulheres, sobretudo Tia Ciata. Apresentei
imagens de praças, ruas, escola, pesquisas, documentário, jornal e diversas obras artísticas que
fazem referência a Hilária Batista de Almeida. Lemos e discutimos nesse momento um trecho
do samba enredo da Império Serrano de 1983 que homenageia Tia Ciata. Mostrei também a
fotografia de uma exposição recente com banner na Praça do Rosário, citada anteriormente, e
que exibe uma imagem de Tia Ciata, e perguntei se alguém a tinha visitado. Com a resposta
positiva de todos, perguntei o que conseguiram identificar na exposição e como aparecia a
identificação das mulheres retratadas. Mencionei que Tia Ciata, Nissinha e Dona Canô tem seus
nomes citados, mas muitas outras mulheres estão identificadas apenas com o nome do abrigo
que patrocinou a exposição. Elas tem história? Elas tem nome?
Solicitei que a gente pensasse em como trabalhar a exposição em sala de aula, assim
como as trajetórias de mulheres negras para além de um protagonismo reconhecido em
memórias públicas e a partir do que chamamos dos sujeitos(as) comuns. Esse tema foi
conectado com a imagem e o texto que abordam as minhas inspirações de pesquisas e de projeto
e apresentam minha avó, minha tia avó, e sua neta mais velha, mencionadas anteriormente.
Após a visita mediada, propus que conversássemos um pouco mais sobre como esse
material poderia ser trabalhado em sala de aula de forma interdisciplinar, considerando os
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diversos componentes curriculares trabalhados pelos participantes e abri também para questões
e comentários.
Ubiraci disse que ficou curioso com a trajetória da Tia Carmem do Ximbuca, que saiu
de Salvador, especificamente de Amaralina e apontou a importância da sua história. Narrou que
fez um trabalho resgatando a história deste bairro de Salvador. Falou que segundo a história
oral, o bairro se chamava Fazenda Alagoas, onde morava um homem chamado Amaral casado
com dona Lina. O casal migrou para Recife e em homenagem aos mesmos, fizeram a junção
dos seus nomes, resultando em Amaralina.
Se mostrou curioso em saber como aconteciam os deslocamentos de Salvador para o
Rio, perguntando qual o meio de transporte era utilizado? Em relação ao samba, citou que o
mesmo só teve reconhecimento a partir do registro feito por Donga e pediu que falasse mais
sobre esses temas. Segui apontando que a discussão era muito boa e que de fato existe um
embate político entre o Rio e a Bahia em torno da origem do samba, e que o suposto primeiro
samba registrado “Pelo Telefone”, ele foi criado na casa da Tia Ciata, e que o Donga aparece
como compositor. Após o primeiro registro, ele tenta mudar o endereço de origem que registrou
anteriormente e ficam os dois vestígios lá. Citei que existe um trabalho chamado “A
malandragem do Donga” devido a sua centralidade individual como compositor desta música
que ganhou a fama equivocada de primeiro samba. Para falar sobre os meios de transportes,
solicitei que fizéssemos uma reflexão sobre as imagens apresentadas e que lembrássemos das
conversas, pois falamos muito de cais, de rio, de navegação a vapor, notamos a presença de
embarcações e também citei as ferrovias.
A professora Marcia seguiu apontando que é interessante trabalhar a temática da rede
de apoio que se cria para além da biografia de Tia Ciata, principalmente agora na pandemia
COVID -19, que nos mostrou possibilidades de unir e ampliar as nossas redes de apoio a partir
da coletividade. Mencionou que a partir da exposição pode trabalhar a história do samba, a
história dos negros, das personalidades santamarenses, a participação feminina na história do
Brasil e na sua formação cultural, variando a abordagem a depender da série. A professora
apontou que a exposição é uma resposta, um alento para nosso tempo. Tamiles parabenizou a
exposição virtual e apontou que utilizaria o samba como gênero musical e textual para trabalhar
o conteúdo de interpretação de texto, a temática da discrimação racial, o respeito à diversidade,
e abordaria o samba na sala de aula como uma questão histórica para trabalhar a
representatividade negra.
Outra professora apontou que pode ser trabalhado a temática da igualdade de gênero,
desigualdade e feminismo. Ela ressaltou a crítica que se faz às mulheres feministas, na qual o
33

movimento feminista seria uma tentativa da mulher ser igual ao homem. Apontou que com a
visita à exposição, percebeu que outra temática que pode ser trabalhada, é a capoeira que
também tem histórico de criminalização e que os conteúdos podem ser apontados como formas
de resistência e de luta. A mesma professora também afirmou que a história da Tia Ciata pode
ser pensada como abertura de portas, já que ela ganhou notoriedade e também acolheu outras
mulheres baianas nessa experiência migratória do século XIX. Apontou que o tema tem muito
a ver com a atualidade e encerrou a fala parabenizando e agradecendo o convite para participar
da roda.
Eva comentou que o projeto é muito importante para valorização da nossa cultura,
informou que Santo Amaro tem várias personalidades que podem ser inseridas no ensino de
história a partir de diversos aspectos. Ela mencionou que os estudantes precisam conhecer esses
personagens e afirma ter trabalhado com muitos jovens que não conhece e nunca ouviu falar da
Tia Ciata. Assim, destacou que precisamos mostrar, trazer para a sala de aula e para as rodas de
conversa mais temas como esse. Parabenizou a exposição e o encontro e afirmou ter sido “um
evento maravilhoso”.
Ubiraci pontuou outros eventos históricos que achava importante para trabalhar o
conteúdo da exposição e citou a Independência do Haiti (1804) e sua influência a nível mundial,
o 02 de Julho que marca a Independência da Bahia (1823), assim como citou o ano de 1896,
em que a Etiópia vence a Itália, pontuando o nome do cantor Edson Gomes como transmissor
desse conhecimento a partir da música. Ele mencionou também que os temas da exposição
podem suscitar discussões sobre Eugenia e racismo científico, apontando os nomes de Nina
Rodrigues, Lombroso e Monteiro Lobato. O mesmo seguiu afirmando a importância de pensar
a trajetória da Tia Ciata e das outras Tias que aparecem na narrativa.
Outra participante abriu o microfone e apontou que a intolerância religiosa presente na
história da Tia Ciata poderia ser trabalhada em sala de aula. Seguiu perguntando por que as
mulheres não tinham seus nomes identificados nas fotografias. Respondi que outro dia ouvi
uma fala que dizia assim: “Vou dizer meu nome e o sobrenome porque senão os racistas vão lá
e nomeiam”. Falei que os fotógrafos do século XIX estavam inseridos em um contexto de
racismo científico e que as fotografias são de mulheres negras, mulheres religiosas, africanas
ou crioulas, escravizadas, libertas e forras. Os fotógrafos assinavam as fotografias como obras
de artes, transformavam em souvenir - cartões postais, vendiam e ganhavam dinheiro e não lhe
importava quem era a mulher negra fotografada. Ela era tida como exótica, era a imagem que
ele tinha para vender. Afirmei que notei a presença do racismo e dos estereótipos construídos a
partir da fotografia. Perguntei mais uma vez: Isso é reflexo de quê? Respondi que essa pergunta
34

é para pensarmos juntas (os), e que teremos essa discussão ao longo do tempo e não temos
como fugir dela. Agradeci pelas contribuições de todos(as) participantes. Informei sobre o envio
do formulário a respeito da Exposição Virtual e da Roda de Conversa a todos(as) participantes
e ressaltei que o seu preenchimento contribuiria com o relatório do Projeto de Intervenção
Pedagógica, defendido no dia 15 de fevereiro. O encontro foi finalizado às 21 horas.

4 ANÁLISE DA EXECUÇÃO E DIFICULDADES ENCONTRADAS

As principais dificuldades, na execução do projeto foram a falta de equipamento como


computador que correspondesse à demanda para criar um projeto artístico atrelado à exposição
virtual, com programas específicos, assim como uma internet de qualidade. Outra dificuldade
foi em relação ao tempo, pois estourei o período previsto de permanência no curso e o meu
auxílio PAES foi cancelado. Então tive que conseguir um emprego e todo o projeto foi pensado,
planejado e executado em uma realidade na qual tinha que me dedicar 8 horas por dia a trabalhos
administrativos via regime CLT. Infelizmente, não pude optar em continuar me dedicando
integralmente à rotina estudantil, porque a fome e as contas com certeza iriam chegar. Apesar
de estar “empregada”, o salário não é o suficiente para aquisição de materiais tecnológicos de
qualidade, e minha internet continua sendo compartilhada, então durante a própria roda de
conversa tive problemas com a conexão de internet. Outra dificuldade apontada foi na tentativa
de execução do projeto de intervenção com foco em apenas uma instituição de ensino em um
período de retorno de férias. Então tive que ampliar os espaços e sujeitos (as) da Intervenção e
dessa forma o trabalho acabou alcançando mais espaços.
O Formulário do Google, assim como a criação de uma lista transmissão do Whatsapp
apresentaram falhas técnicas e por esse motivo eu tive que entrar em contato com os(as)
inscritos(as) uma segunda vez de forma individual.

5 RESULTADOS OBTIDOS

Como resultado para além do contato com os professores do município que atuam tanto
no segmento do ensino direto na sala de aula, estabeleci contato com professores coordenadores
que trabalham com implementação de projetos nas escolas. Dessa forma, vislumbrei a
continuidade de diálogos interdisciplinares em um caminho para descolonização na transmissão
35

do conhecimento com diferentes escolas do município. Como resultado, tivemos a participação


de 05 instituições escolares mencionadas anteriormente. As instituições atuam no campo da
educação formal, atendendo a níveis diversos, a saber Educação infantil, Fundamental I,
Fundamental II, Ensino médio regular, Ensino médio técnico e Educação de Jovens e Adultos
(EJA).
Os(as) professores(as) presentes na Intervenção participaram ativamente tanto no
momento da visita guiada quanto no momento da conversa mais direta, sem a exibição das
imagens. Tanto na Intervenção quanto no formulário preenchido após o encontro, foram
evidenciadas diferentes formas de trabalho com a exposição e diferentes abordagens a serem
realizadas a partir da mesma.
Seguem abaixo as perguntas apresentadas no formulário:

I) Após a visita à exposição virtual “As redes de Hilária Batista de Almeida -Tia Ciata
(1854-1924), entre Bahia e Rio de Janeiro” e participação na roda de conversa, o que
chamou mais a sua atenção e-ou despertou mais seu interesse?
II) Você já trabalhou com alguma temática relacionada a esta Exposição? De que forma?
III) Você utilizaria essa Exposição em uma atividade pedagógica? Se a resposta for sim,
de que forma? Caso sua resposta seja negativa, justifique.
IV) Pensando em uma aula de campo sobre o povo negro de Santo Amaro - BA (ou de
outro Município), em quais lugares você levaria seus alunos para uma visita? Quais
assuntos seriam trabalhados?

5.1 DESDOBRAMENTOS DA EXPOSIÇÃO VIRTUAL E RODA DE CONVERSA “AS


REDES DE HILÁRIA BATISTA DE ALMEIDA -TIA CIATA (1854-1924), ENTRE BAHIA
E RIO DE JANEIRO”

I - Após a visita a exposição virtual “As redes de Hilária Batista de Almeida -Tia Ciata (1854-
1924), entre Bahia e Rio de Janeiro” e participação na roda de conversa, o que chamou mais a
sua atenção e-ou despertou mais seu interesse?

RESPOSTAS: a) Didática na exposição e domínio sobre a temática proposta. Narrativa


direcionada aos (as) protagonistas da história, levando em conta o tempo e espaço (cronograma
dos fatos).Acervo fotográfico que comprova os acontecimentos expostos. Participação ativa dos
convidados na plataforma virtual de ensino e aprendizado. b) A possibilidade de expandir esse
36

conhecimento para muitos e muitos alunos . Ano passado trabalhei Tia Ciata no ensino remoto
e ver essa difusão através da academia é divino. c) O que mais me chamou atenção a dedicação
de tia Ciata pelo samba e como ela lutou pela cultura brasileira. d) Conhecer um pouco mais a
história de Tia Ciata e as fotografias antigas de Santo Amaro. e) Todo o legado de força,
coragem e luta de tia Ciata. Uma mulher a frente de seu tempo. f) A representatividade de Tia
Ciata para o povo negro e para as mulheres em especial. g) O enfoque dado: as redes de
solidariedade entre as mulheres negras do período. h) Pela história de força, resiliência, coragem
e o destaque.

II) Você já trabalhou com alguma temática relacionada a esta Exposição? De que forma?

RESPOSTAS: a) Não b) Sim. A partir de ilustrações do século XIX de nosso município,


estudamos a origem de Santo Amaro, a história do samba, a importância da cana de açúcar,
suas histórias e personalidades santamarenses de destaque no cenário nacional. c) Sim, ensino
remoto. Utilizei imagens de várias mulheres pretas, guerreiras, desbravadoras e concluí o
planejamento na aula seguinte expondo sobre a História das Baianas do acarajé. d) Tive
oportunidade em produzir um projeto para um grupo carnavalesco no Nordeste de Amaralina,
em Salvador que pode ser conferido no blog que segue:
https://blococheiodecharme.blogspot.com/ e) Sim. Santo Amaro e a sua participação nas
atividades agrícolas na época da colonização. f) Ainda não, já trabalhei com vários temas, mas
não relacionado a esta exposição.
g) As manifestações culturais.

III - Você utilizaria essa Exposição em uma atividade pedagógica? Se a resposta for sim, de
que forma? Caso sua resposta seja negativa, justifique.

RESPOSTAS: a) Sim, com toda certeza aprofundaria a temática com os alunos objetivando o
reconhecimento e a necessidade de valorizarem as mulheres pretas da sua região também e em
especial do seu lar. b) Utilizaria sim ,por ser um tema riquíssimo que trabalha a cultura
Brasileira e vários temas que faz parte da cultura da nossa região e que se expandiu por todo o
Brasil. c) Sim. Apresentando a importância do povo negro na formação de nosso país em
diversos aspectos, principalmente na cultura. A resistência do povo negro e sua força. d) Sim.
Através de projetos nas escolas. Destacando os feitos de negros que se sobressaíram através de
sua resiliência e luta no meio de uma sociedade desigual. e) Sim. Uso de fotografias, músicas,
37

vestimentas, contação de história, visita a museus, bibliotecas temáticas e outros


(transdidáticos). f) Sim. Utilizaria para mostrar a história de Tia Ciata e sua rede de
solidariedade, e um pouco da história da mulher negra no Brasil. g) Sim! Seria possível destacar
a luta pela igualdade se gênero, a discriminação cultural. h) Sim. O papel social da mulher,
valorização da cultura africana.

IV) Pensando em uma aula de campo sobre o povo negro de Santo Amaro - BA (ou de outro
Município), em quais lugares você levaria seus alunos para uma visita? Quais assuntos seriam
trabalhados?

RESPOSTAS: a) Trabalho de campo nas redondezas locais primeiramente , que é a comunidade


da Entrada da Pedra . Visitação a casa do samba , entrevistas e coleta de dados com o
coordenador do maculelê da casa do samba , apelidado Seu Primeiro . Pesquisa histórica ,
artística e cultural sobre o povo de São Braz, Acupe .Visitação às comunidades quilombolas,
visitação a casa de câmara e cadeia de Santo Amaro, demonstrando como os pretos eram
tratados nas cadeiras. Visitação ao Arquivo público de Santo Amaro. Ao Memorial Casa José
Silveira , mostrando na prática, como funcionava uma casa que tinha escravos , local onde
ficavam , etc. b) Ao marco inicial de nosso município, às margens do Rio Subaé na entrada da
cidade, na feira Livre para discutir a importância de Santo Amaro no século XIX, o papel do
negro nesse contexto, com destaque à atuação das mulheres negras nesse período. c) Levaria
para a casa do samba de Santo Amaro a história do mercado de Santo Amaro com entrevista
com as pessoas nativas que trabalham a vários anos na localidade com fotos e depoimentos e
logo após uma exposição de todo material pesquisado. d) Visita guiada no próprio bairro (Santa
Cruz, Salvador) para conhecer a história; ao terreiro para desmistificar o olhar equivocado sobre
as religiões de matriz africana. Levaria ainda a uma roda de capoeira e samba. e) Casa do
samba,antiga residência de negros que tiveram seus feitos. A temática seria voltada sobre
igualdade racial. f) Na casa do samba! A importância do samba e sua contribuição na vida do
povo negro. g) Na casa do samba. A cultura deixando pelos nossos antepassados negros. h)
Distrito de São Brás - Samba chula. Distrito de Acupe-Negro fugido.
38

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As narrativas apresentadas são resultados de uma pesquisa que articula o Ensino de


História em meio virtual, essa possibilidade responde diretamente a inquietações e às
necessidades do tempo presente. Sendo assim, a pesquisa, a intervenção pedagógica e este
trabalho de conclusão de curso apresenta possibilidades de trabalho com a História regional e
local no ensino interdisciplinar na Rede básica de educação. Cada ponto trabalhado na
exposição é resultado de discussões presentes nos espaços educacionais e políticos que
atualmente frequento, a saber, sala de aula, simpósios, grupos e projetos de pesquisa. As
temáticas abordadas aqui, portanto, não são frutos de estudos isolados e tem como proposta
montar estratégias de ensino voltados para a Lei 10.639 a partir da relação entre pesquisa
acadêmica e o campo do ensino, pois um não caminha sem o outro.
A produção da exposição “As Redes de Hilária Batista de Almeida (1854 – 1924) entre
a Bahia e o Rio de Janeiro”, se fez necessária tendo em vista as necessidades colocadas
atualmente e pelos próprios professores. A temática dialoga com demandas interdisciplinares
tão requeridas no ensino básico atualmente e com as abordagens de aplicação da lei 10.639/03
alterada pela 11.645/08. Esse projeto trouxe o sentido de resistência, na medida em que as
histórias e os sujeitos abordados são muitas das vezes silenciados, e excluídos dos meios
midiáticos, curriculares, do patrimônio cultural local e desconhecidos (as) pela própria
comunidade negra. O projeto aplicado contribui tanto para a disseminação, conhecimento e
conservação do patrimônio cultural público, local, regional, nacional e coletivo relacionados à
memória do povo negro.
Os caminhos apresentados aqui apontaram possibilidades de diálogos entre a escola e a
acadêmia, entre instituições de ensino formais e não formais, e se mostrou potencializadora na
constituição de uma memória coletiva. A partir das coletas das fontes, foi possível verificar os
vestígios de Tia Ciata e de outras mulheres negras, sobretudo através das fotografias, que
revelam suas contribuições em diferentes campos de atuação. Assim como re-pensar as
estruturas das famílias negras, desmistificar o lugar da mulher negra na cozinha fechada e ao
mesmo tempo valorizar o seu lugar na música na virada do século XIX. A pesquisa também
evidenciou o processo de migração de inúmeros baianos que foram para Rio de Janeiro e que
deram origem a o grupo das “tias baianas”. Por meios digitais, foi possível localizar outras Tias
baianas, identificar lugares de memória e patrimônios culturais imateriais e materiais tanto no
estado da Bahia quanto do Rio e compreender como funcionavam as relações na sociedade
39

oitocentista, assim como desenvolver a análise sobre os usos das fotografias no período
mencionado.
A título de conclusão, espero que este trabalho contribua com o desenvolvimento de
discussões para formação humana e cidadã, onde as narrativas e memórias de pessoas negras
possam servir de inspiração para construção de outras narrativas e que possibilitem acesso a
histórias e memória de novos (as) sujeitos (as). Para isso, foi preciso ir além e a partir de uma
exposição, criar um diálogo com temáticas importantes para a minha comunidade, para minha
família consanguínea, extensa, ampliada, local e regional. O trabalho apresentado possui
diversos desdobramentos para preencher os anseios de uma educação a partir das
subjetividades, da diversidade, do respeito às diferenças e das memórias individuais e coletivas.
O presente trabalho expressa também o meu desejo de estarmos juntos produzindo conteúdos a
partir de pesquisa e compartilhando no formato presencial ou virtual, escrito ou visual.
40

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43

Apêndices
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1. Gráfico de Local de Nascimento dos(as) incritos(as) na Exposição virtual e Roda de


conversa: “As redes de Hilária Batista de Almeida -Tia Ciata (1854-1924), entre Bahia
e Rio de Janeiro”

2. Gráfico com a identificação dos componentes que os professores(as) incritos(as)


lecionam
45

3. Gráfico com porcentagem do sexo dos(as) incritos(as)

4. Gráfico referente à autoidentificação racial dos(as) incritos(as)


46

5. Gráfico referente à idade dos(as) incritos(as)

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