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DO PROFESSOR
Resumo:
Neste texto objetivamos discutir a contribuição da música na organização da memória, da percepção e do
pensamento em crianças pequenas na Educação Infantil. Estudos nesta área têm evidenciado que o período pré-
escolar corresponde aos anos nos quais ocorrem mudanças muito importantes nas funções psicológicas
superiores da criança; nesta reflexão, pautamo-nos na possibilidade de que a educação musical poderia contribuir
para promover esse desenvolvimento por meio do planejamento e organização do ensino e na apropriação de
conceitos musicais. Buscamos, para tanto, respaldo teórico na perspectiva Histórico-Cultural e nos seus
principais autores, dentre eles Vigotski, Leontiev e Luria, que preconizam serem as interelações entre os sujeitos
imprescindíveis para a formação integral das crianças. Sob esta perspectiva, ao observarmos o desenvolvimento
das crianças da Educação Infantil, e seu interesse nas atividades desenvolvidas, ocorreram os seguintes
questionamentos: Por que ensinar música? Como a linguagem musical como elemento cultural, pode contribuir
para o desenvolvimento da memória, da percepção e do pensamento dessas crianças? Qual o professor habilitado
para trabalhar essa disciplina na escola pública? Segundo pesquisas organizadas pelas autoras, é na escola
particular que pode ser encontrado com maior frequencia o especialista em educação musical. Sabemos da
carência de professores para atuar na escola pública, uma vez que a maior parte dos alunos formados em música
não leciona nesse tipo de instituição. A evasão se justifica por uma série de problemas. Entre eles, salários
desestimulantes, dificuldades impostas pela prática diária e falta de estrutura física adequada para as aulas de
música. Portanto, a obrigatoriedade do ensino musical nas escolas públicas implementada pela Lei 11.769/08, é
um tema que merece ser discutido, em especial, pela pós-graduação por meio de pesquisas e formação de
professores, uma vez que a mesma não estabelece quem deve ser o profissional qualificado para trabalhar nessa
área, e desse modo precisa ser adequada localmente nos Conselhos Estaduais e Municipais. Para que o ensino
musical se torne efetivo, temos que ocupar os espaços escolares com práticas musicais significativas que
priorizem o desenvolvimento integral das crianças por ele afetadas.
Introdução
que segundo o seu posicionamento afirma ver nos especialistas, um profissional que “não tem
domínio” sobre a disciplina dos alunos atrapalhando o andamento de suas aulas. São essas as
questões que de forma breve discutiremos nesse ensaio.
Nesse sentido, podemos pensar que a música, como elemento mediador, contribui
para o desenvolvimento da comunicação verbal ao permitir a auto-expressão da criança, de
forma espontânea e natural, constituindo-se em uma forma de linguagem.
Luria (1991) afirma que, a formação da atividade consciente, esse sistema de códigos
e significados, a linguagem, “[...] é o veículo mais importante do pensamento, que assegura a
transição do sensorial ao racional na representação do mundo” (LURIA, 1991, p.81).
A linguagem guarda em si, e, portanto, permite comunicar aos outros, o
conhecimento, os valores, os sentimentos e o modo de pensar dos homens de diferentes
culturas e épocas distintas. Por essa razão, ela faz a mediação entre o individual e o social, em
um processo em que ambos se modificam.
Com base nos estudos da perspectiva Histórico-Cultural entendemos a música como
uma forma de linguagem, produto da cultura, que se constitui nas interações sociais e não
como um dado a priori, mas sim, por meio das apropriações de elementos musicais
produzidos por gerações antecedentes. Portanto, deve ser usada na escola da infância como
forma de desenvolvimento da linguagem verbal, e não como algo ornamental, a ser utilizado
em eventos, datas comemorativas, ou ainda como complemento no ensino de outras
disciplinas.
Ao mesmo tempo esse instrumento psicológico, a linguagem musical, também
permite o desenvolvimento de outras funções primordiais para o ensino como memória, a
percepção e o pensamento.
Sokolov (1969) explica que sem a fixação dos fatos por meio da memória, o ser
humano não poderia acumular experiências, para utilizá-las em outras atividades, não
reconheceria os objetos em sua volta, nem poderia representá-los, nem pensar sobre eles
quando não estão presentes, portanto, não poderia orientar-se no meio que o rodeia. Sem fixá-
los na memória não seria possível nenhum ensino, nenhum desenvolvimento intelectual e nem
prático. Em outras palavras, o homem é homem por forjar-se em um ambiente social, cultural,
fundamentalmente histórico.
Foi possível observar em nossa pesquisa que a música ajuda a desenvolver a
capacidade de concentração imediata, de persistência e de dar resposta à constante variedade
de estímulos; e assim, facilita a aprendizagem ao manter em atividade os neurônios cerebrais.
A criança memoriza um repertório de canções e conta consequentemente com um
“arquivo”, informações referentes a desenhos melódicos e rítmicos que utiliza com frequência
nas canções que canta e inventa, já que desde antes do seu nascimento tem contato com o
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mundo sonoro e musical, e mesmo antes de falar podemos ver o bebê cantar, gorjear e
experimentar sons vocais diversificados.
A linguagem musical estimula também a memória verbal e escrita, visto que uma
canção pode ser o relatório de uma leitura, e as notas ensejam o mesmo significado das
palavras. Amplia seu repertório de palavras e a sua visão de mundo, não com repetições
monótonas, mas com conhecimentos que fazem parte de sua vida e por meio da apropriação
de bens culturais produzidos socialmente. Sokolov (1969) deixa claro que memorizamos
melhor o que tem significado importante para a nossa vida, e também aquilo que está
associado aos nossos interesses e necessidades.
Esse mesmo autor sugere que a atenção e a percepção são funções fundamentais, que
se encontram na base do desenvolvimento das demais capacidades de modo que o raciocínio,
a memória e a imaginação, não se estabelecem e não operam sem essa participação efetiva. A
percepção é uma capacidade intelectiva extremamente importante à educação, uma vez que,
em menor e maior grau, está imbricada em todas as atividades escolares. Essa função está
presente em quase todos os animais, assim como nos bebês e é de natureza reflexológica, ou
seja, movida por necessidades instintivas. Enquanto que nos animais se mantêm inalterada, no
homem, sofre modificações substantivas. Como afirma Vigotski (1996) é por meio da
aprendizagem do conhecimento contido em instrumentos físicos e simbólicos que as formas
cognoscitivas e de sentimento se estabelecem. Pela mediação, pela via da linguagem, o caráter
instintivo da percepção vai sendo substituído pelo caráter social, e ganha uma nova identidade
e uma nova dimensão humana. Dessa forma, a aquisição da linguagem humaniza a percepção
como explica Sokolov (1969),
da audição, ou seja, detalhar e tomar consciência do fato sonoro. Como por exemplo, quando
trabalhamos nas aulas de musicalização com os diversos tipos de sons - sons do entorno, sons
da natureza, sons dos animais, sons do corpo, sons dos instrumentos musicais e da produção
musical da cultura humana - estamos propiciando as crianças à oportunidade de ouvir, não
apenas como um processo fisiológico, mas sim como um processo contínuo de interpretação
de dados com vistas à integração entre a ação e a recepção sonora (BRITO, 2003). Graças a
essas atividades a criança estabelece a comunicação, que transcende o simples contato
sensorial com o mundo circundante: a percepção lhe permite a compreensão.
Enfim, como percebemos nesse estudo, a criança ao se apropriar da linguagem, fica
apta a organizar sua percepção e memória, e é capaz de tirar conclusões a partir das suas
próprias observações e fazer deduções e assim conquistar todas as potencialidades do
pensamento. Ao nomear algo, ela estará analisando e passando a usar palavras para designar e
resolver problemas relacionados ao seu mundo, por intermédio de experiências de todo o
gênero humano, e não só por sua experiência pessoal.
Com base na concepção de que o desenvolvimento da linguagem oral e escrita bem
como da musical é resultado do processo de educação, e, por acreditarmos que a música é um
dos meios mais adequados para essa mediação é que propomos esse ensino. O estudo foi
realizado em uma escola municipal de Educação Infantil no centro-oeste do Paraná, em
turmas de musicalização dos níveis I, II e III. Investigamos em especial, o desenvolvimento
de funções psíquicas em crianças de zero a cinco anos submetidas as ensino da musicalização
em duas aulas semanais de cinquenta minutos.
O trabalho relatado nesse artigo resulta de observações, registros, vídeos e análise
das reações às atividades musicais dos alunos, nos primeiros meses do ano de 2009.
Os procedimentos utilizados durante as aulas foram planejados e organizados com
vistas a propiciar aprendizagem e desenvolvimento, já que esse nível de educação não deve
ser entendido como uma pré-educação, mas como uma educação em si, com seus objetivos,
conteúdos e métodos próprios, de forma que as crianças possam se apropriar da herança
cultural deixada pela humanidade, desenvolvendo suas funções psíquicas. É também nesse
período, segundo Ilari (2003), que novos aprendizados vão reorganizar e reforçar as conexões
entre as células do cérebro humano. Novas conexões e sinapses são formadas à medida que
novos conhecimentos são adquiridos.
Com o intuito de analisar os efeitos da musicalização no desenvolvimento das
crianças, foram estabelecidos objetivos para cada procedimento visando à aquisição dos
conceitos musicais de intensidade: sons fortes ou fracos; de duração: sons longos e curtos; e
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de andamento: sons rápidos e lentos. Para a consecução dos objetivos propostos, planejamos
aulas com estratégias bastante diversificadas: utilização de instrumentos de percussão, jogos
musicais de imitação e criação, histórias sonorizadas, canções folclóricas, entre outras.
Procuramos também, com base na perspectiva Histórico-Cultural (VIGOTSKI, 1986;
LEONTIEV,1988) direcionar o tipo de atividade a ser proposto em cada idade, bem como as
ênfases musicais a serem trabalhadas, com a finalidade de atingir os resultados propostos.
Os dados obtidos são indicativos de que a linguagem musical é um instrumento
psicológico excelente para o desenvolvimento de funções psíquicas de crianças nesse nível de
ensino. Podemos perceber que além da aprendizagem de conceitos musicais houve a
ampliação do vocabulário das crianças, maior participação nas aulas trazendo as suas próprias
experiências sonoras como contribuição e também a alegria com a participação em jogos e
brincadeiras infantis do nosso folclore esquecidos por seus educadores.
Considerações finais
Referências bibliográficas
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB Lei n.9394/96. Brasília.
DF: MEC/SEF, 1996.
BRASIL, Referencial curricular nacional para a educação infantil. v. 3 Brasília MEC/SEF
1998.
LURIA, A. R. Curso de psicologia geral. Trad. Paulo Bezerra. v. 2 São Paulo: Civilização
Brasileira,1991.
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PENA, M. Não basta tocar? Discutindo a formação do educador musical. Anais... Revista da
ABEM. Porto Alegre, n.16, p.49-26, mar.2007.