2 - Resumo Proteínas

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PROTEÍNAS

1 - Aminoácidos
As proteínas são as macromoléculas mais abundantes nas células, apresentando uma
variedade quase infinita de estruturas e funções. Nesse sentido, as proteínas realizam uma
série de funções essenciais para o corpo humano, como funções hormonais, catálise (através
das enzimas), transporte, contração, função imunológica, funções estruturais etc.
Para compreender as proteínas, é imprescindível entender sobre os blocos construtores
dessa macromolécula, os aminoácidos. As proteínas são formadas a partir de um conjunto
de 20 aminoácidos, cada aminoácidos possui uma cadeia lateral com propriedades químicas
distintas. Para a geração de uma determinada proteína, os aminoácidos ligam-se
covalentemente através das ligações peptídicas, permitindo a formação de diversas
proteínas com funções e estruturas distintas por meio das combinações diferentes dos
mesmos 20 aminoácidos.
As proteínas são polímeros formados por resíduos de aminoácidos através de ligações
covalentes. Os 20 aminoácidos possuem características em comum. Esses aminoácidos
possuem um carbono alfa ligado a um grupo carboxila, um hidrogênio, um grupo amina e um
grupo R (também chamado de cadeia lateral) que difere entre cada aminoácido. Cada grupo
R possui propriedades diferentes em estrutura, tamanho, carga elétrica e solubilidade em
água.

Estrutura em comum dos 20 aminoácidos

O carbono alfa dos aminoácidos (exceto na glicina em que R=H) é um centro quiral, ou seja,
o carbono está ligado a 4 grupos químicos distintos. Sendo assim, esses quatro grupos
podem formar 2 arranjos espaciais únicos. Sendo assim, cada aminoácidos (menos a glicina)
possui um esteroisômero distinto. Esses isômeros possuem estruturas distintas, sendo
chamados de D ou L. Essa denominação evita ambiguidades na denominação da estrutura
de determinado aminoácido.

Exemplo de configuração D e L na Alanina

Os resíduos de aminoácidos que formam as proteínas são exclusivamente estereoisômeros


L. Os resíduos de D-aminoácidos são exceção na natureza. Somente os L-aminoácidos são
reconhecidos pelos sistemas vivos. Por isso, as células são capazes de sintetizar
especificamente os estereoisômeros L.
Os aminoácidos podem ser divididos em grupos de acordo com as propriedades dos seus
grupos R. Essa classificação divide os 20 aminoácidos em cinco grupos, considerando suas
propriedades e estruturas: grupo R apolar (alifático), grupo R aromático, grupo R carregado
positivamente, grupo R carregado negativamente e grupo R polar não carregado.

A imagem ilustra a estrutura dos 20 aminoácidos comuns e seus respectivos grupos

Além disso, para facilitar o estudo dos aminoácidos, foi atribuído uma abreviação de três
letras e um símbolo de uma letra para cada aminoácido. A tabela a seguir mostra as
abreviações e os símbolos de cada aminoácido, além disso, a tabela também mostra a
variedade de propriedade químicas de cada um dos 20 aminoácidos.
Essa tabela, além de mostrar a siglas e símbolos referentes a cada aminoácido, mostra
algumas propriedades importantes dos aminoácidos. O M se refere a massa molar de cada
aminoácido. O pK é um valor que define se o grupo químico estará protonado ou
desprotonado, quando o pH ultrapassa o valor de pK significa que o determinado grupo
químico estará desprotonado. O valor de pK1 se refere ao grupo carboxila ligado ao carbono
alfa, o pK2 ao grupo amina ligado ao carbono alfa e o pKr se refere ao grupo R dos
aminoácidos capazes de doar prótons. Já o pI é o ponto isoelétrico, isto é, o pH no qual o
aminoácido possui carga líquida igual a zero. O índice hidropático mede o quão polar um
aminoácido é, quanto menor o número mais polar é o aminoácido.
Além dos 20 aminoácidos comuns, algumas proteínas podem possuir resíduos aminoácidos
resultantes de modificações. Entre os aminoácidos não convencionais, há a 4-hidroxiprolina
(derivado da prolina) e a 5-hidroxilisina (derivado da lisina). Esses dois aminoácidos incomuns
compõem a proteína mais abundante no corpo humano, o colágeno.
Sobre os aminoácidos, é importante ressaltar que eles não são unicamente blocos
construtores de proteínas, cada aminoácido pode possuir várias funções que vão além da
síntese proteica. Um exemplo comum é a tirosina que pode ser usada para a síntese de
dopamina, adrenalina, noradrenalina, hormônios da tireoide, etc. O triptofano é outro
exemplo, pois esse pode ser usado para sintetizar os neurotransmissores serotonina e
melatonina. Outro exemplo importante é a creatina, que pode ser sintetizada pelo corpo
através dos aminoácidos glicina, arginina e metionina. Além disso, alguns aminoácidos
podem ser utilizados para a produção glicose, corpos cetônicos e ATP, processos que serão
abordados em outro conteúdo. Esses exemplos são importantes para mostrar que os
aminoácidos são moléculas complexas que possuem funções que vão além da síntese
proteica.
2 - Proteínas
Os peptídeos, assim como as proteínas, são formados por ligações covalentes (ligação
peptídica) entre os aminoácidos. A reação que leva a formação desses polímeros é uma
reação de desidratação. Quando dois aminoácidos são unidos covalentemente há a formação
de um dipeptídeo, quando três se unem há um tripeptídeo, e assim por diante. Quando alguns
aminoácidos são unidos há a formação de um oligopeptídeo. Quando vários se unem há um
polipeptídeo. Já as proteínas podem ter milhares de resíduos de aminoácidos. Muitas das
vezes os termos peptídeo e proteína podem se referir ao mesmo polímero, porém o termo
peptídeo geralmente se refere a pequenos compostos, enquanto proteínas se referem a
grandes polímeros. Os polímeros formados por aminoácidos possuem duas extremidades
terminais, sendo uma delas a aminoterminal (ou N-terminal) e a outra carboxiterminal (ou C-
terminal). Essas extremidades são os grupos amina e carboxila que não sofreram ligação
peptídica.

A imagem ilustra a formação de uma ligação peptídica e mostra as extremidades C-terminal e N-terminal

Como calcular a massa molecular e a carga líquida de um peptídeo?

A imagem mostra um peptídeo formado pelos aminoácidos cisteína, histidina, isoleucina,


glutamato e triptofano, respectivamente. Para calcular a massa molecular desse peptídeo é
necessário somar a massa molecular de cada um dos aminoácidos e diminuir o resultado
pela massa molecular de uma água para cada ligação peptídica: 121 + 155 + 131 + 147 +
165 – (18 x 4) = 647 g/mol.
Sobre a carga líquida, é necessário considerar o pK dos grupos químicos que podem doar
prótons e o pH do meio (suponha que pH=8), nesse caso os grupos que podem doar são: o
grupo amina da cisteína (pK2=8,18), o grupo R da cisteína (pKr=10,28), o grupo R da histidina
(pKr=6), o grupo R do glutamato (pKr=4,25) e o grupo carboxila do triptofano (pK1=1,83).
Após considerar esses valores e compará-los com o pH do meio, vemos que o grupo amino
da cisteína possui uma carga positiva, que o grupo R do glutamato possui uma carga negativa
e o grupo carboxila do triptofano possui uma carga negativa. Fazendo as contas temos: +1 -
1 -1 = -1. Sendo assim, o peptídeo possui carga líquida igual a -1 em pH 8.
Muitas proteínas possuem grupos químicos diferentes de aminoácidos ligados
permanentemente. Essas proteínas são chamadas de proteínas conjugadas, enquanto o
grupo químico diferente dos aminoácidos é chamado de grupo prostético, esse grupo pode
ser um carboidrato, um lipídeo, um metal etc. Esses grupos químicos presentes nas proteínas
conjugados são adicionados na proteína no processo pós-traducional, ou seja, após a síntese
da proteína. Um exemplo claro de uma proteína conjugada é a hemoglobina, que possui o
grupamento heme como grupo prostético.
2.1 - Estrutura das proteínas
Como dito anteriormente, as proteínas possuem uma complexidade estrutural bem diversa.
Nesse sentido, quatro níveis de estrutura de proteínas são definidos. Sendo eles:
• Estrutura primária: É definido como a sequência de todas as ligações covalentes
que ocorrem entre os resíduos de aminoácidos em uma cadeia polipeptídica. Vale
ressaltar que as ligações covalentes são as ligações peptídicas e as ligações
dissulfeto (essas ligações ocorrem entre dois grupos R da cisteína);
• Estrutura secundária: São arranjos particularmente estáveis de resíduos de
aminoácidos dando origem a padrões estruturais comuns. As duas estruturas
secundárias mais recorrentes são a alfa-hélice e a beta-pregueada. Essas estruturas
serão mais abordadas posteriormente;
• Estrutura terciária: Engloba todos os aspectos de enovelamento tridimensional de
um polipeptídeo;
• Estrutura quaternária: Ocorre quando duas ou mais subunidades terciárias se unem
de forma não covalente. Essas subunidades podem ser diferentes ou iguais entre si.

A imagem mostra de forma simplificada cada um dos níveis estruturais proteicos

É importante entender que nem toda proteína precisa alcançar uma estrutura quaternária
para realizar sua função. Muitas proteínas chegam a sua conformação biologicamente ativa
na estrutura terciária. A insulina é um exemplo de proteína que realiza sua função na estrutura
terciária.
A primeira proteína que teve sua estrutura primária decifrada foi a insulina, que é um
hormônio produzido pelo pâncreas que possui diversas funções no metabolismo. Essa
descoberta foi extremamente importante para o tratamento da diabetes melitus do tipo 1
(doença causada pela não funcionamento das células produtoras de insulina). O tratamento
realizado acontecia através do uso da insulina de porcos em humanos. A insulina proveniente
dos suínos é extremamente parecida com a insulina humana, mas não igual. Nesse sentido,
havia alguns poucos casos de rejeição. Atualmente a insulina é produzida por bactérias
transgênicas com genes humanos, assim não há casos de rejeição, pois a insulina é a
humana.
Entrando nas estruturas proteicas secundárias, uma das conformações mais comuns na
estrutura secundária é a alfa-hélice. Essa estrutura é caracterizada pelo esqueleto
polipeptídeo enrolado em torno de um eixo imaginário. A alfa-hélice possui algumas
características importantes: ligações de hidrogênio intracadeia (estabilizam a hélice), cerca
de 3,6 aminoácidos por volta da hélice, hélice sempre voltada para a direita, não possuem
nem glicina (grupo R muito flexível) nem prolina (grupo R muito rígida) e os radicais R podem
favorecer ou desfavorecer a estabilização da alfa-hélice. As ligações de hidrogênio
acontecem entre o primeiro e o quarto aminoácido.
Vale ressaltar que os grupos R também podem influenciar na estabilidade da estrutura da
alfa-hélice, um exemplo disso pode ocorrer entre dos aminoácidos glutamato (pKr=4,25),
imagine que esses dois aminoácidos estejam próximos na estrutura e que o pH esteja em 8,
nesse caso os grupos R dos glutamatos estariam desprotonados com uma carga negativa,
gerando uma repulsão entre essas carga e consequentemente uma desestabilização da
estrutura alfa-hélice.

A imagem ilustra a estrutura alfa-hélice

Outra estrutura secundária comum é a beta-pregueada, essa conformação consiste no


esqueleto polipeptídico disposto em formato de zigue-zague. As ligações de hidrogênio
intercadeia também são importantes para a estabilização da estrutura, essas ligações
ocorrem entre segmentos adjacentes da cadeia polipeptídica. Nessa estrutura é comum a
formação de ligações de hidrogênio entre aminoácidos bem distantes.
A imagem ilustra a estrutura beta-pregueada

Sobre as estruturas terciárias, elas englobam o arranjo tridimensional total de todos os


resíduos de aminoácidos de uma proteína. A diferença para a estrutura secundária é que a
secundária se refere ao arranjo espacial comum dos resíduos dos aminoácidos adjacentes
em um polipeptídeo, já a estrutura terciária inclui aspectos de maior alcance da sequência de
aminoácidos.
As principais forças que atuam na estabilização de uma estrutura terciária são as ligações
dissulfeto (ligação covalente que ocorre entre dois enxofres presentes no grupo R de
cisteínas) e interações fracas (ligação de hidrogênio, interações hidrofóbicas, iônicas e de
van der Waals –dipolo-dipolo). Entretanto, as forças que predominam na estabilização das
proteínas são as forças fracas, pois são mais numerosas, mesmo que as ligações dissulfeto
sejam mais fortes. Também é importante entender que a estrutura proteica não é estática,
diversas proteínas possuem mudanças conformacionais que são extremamente importantes
para a função final.

A imagem mostra a estrutura de uma proteína terciária qualquer, nessas representações é comum mostrar a
estrutura beta-pregueada como uma seta e a alfa-hélice como uma hélice.
A imagem mostra as interações que atuam na estabilização da estrutura terciária das proteínas

Em meio aquoso, os aminoácidos com grupos R hidrofóbicos tendem a formar um núcleo


empacotado, com isso, esses grupos químicos ficam longe da água, aumentando a
estabilidade.
Já as estruturas quaternárias englobam proteínas com mais de uma cadeia polipeptídica.
Cada cadeia polipeptídica pode ser igual ou diferente das outras, sendo chamadas de
subunidades. As cadeias polipeptídicas diferentes são derivadas de diferentes genes. Uma
proteína quaternária muito importante é a hemoglobina, que possui um total de 4
subunidades, 2 subunidades alfa e 2 subunidades beta. A hemoglobina também é uma
proteína conjugada, possuindo quatro grupos prostéticos heme, cada hemoglobina sendo
responsável por carregar 4 oxigênios e garantir o suprimento de oxigênio dos tecidos. A
hemoglobina está presente de forma abundante nas células sanguíneas vermelhas
(hemácias).
Conhecendo os níveis estruturais comuns, pode-se dividir as proteínas em dois grandes
grupos: proteínas fibrosas (cadeias polipeptídicas arranjadas em longos filamentos) e
proteínas globulares (cadeias polipeptídicas dobradas em formato esférico ou globular).
A maioria das proteínas fibrosas possuem funções estruturais, enquanto as enzimas e
proteínas reguladoras possuem predominância da estrutura globular. Uma característica
marcante das proteínas fibrosas é a baixa solubilidade em água.
Colágeno é uma família de proteínas extracelulares, e é um exemplo claro de proteína
fibrosa. O colágeno possui uma estrutura única: a hélice do colágeno, essa hélice possui
algumas características especiais: hélice voltada para a esquerda, hélice mais compacta,
presença de glicina e prolina abundante, além da 4-hidroxiprolina e 5-hidroxilisina. Todas
essas características destoam da alfa-hélice.
A formação do tropocolágeno (tríplice hélice do colágeno) é um processo complexo que exige
uma série de etapas. O primeiro processo ocorre na fase pós-traducional, em que os
aminoácidos prolina e lisina sofrem hidroxilação, sendo convertidos em hidroxi-prolina e
hidroxi-lisina, respectivamente. Esse processo é mediado pelas enzimas prolil hidroxilase e
lisil hidroxilase. Essa etapa permite que esses aminoácidos interajam entre si, formando
ligações de hidrogênio que estabilizam a hélice do colágeno (outras interações também
ajudam). Após todo esse processo ocorre a exocitose do tropocolágeno, a enzima
prócolágeno-peptidase catalisa a clivagem das extremidades do tropocolágeno, tornando-o
mais compacto. Por fim, interações químicas entre o tropocolágeno permitem a formação das
fibras de colágeno.
A imagem ilustra o tropocolágeno (tripla-hélice do colágeno)

Ainda sobre o colágeno, essa família de proteínas possui grande influência no escorbuto
(doença causada por deficiência da vitamina C). O ácido ascórbico (vitamina C) é uma
molécula orgânica que ajuda as enzimas prolil hidroxilase e lisil hidroxilase no processo de
catálise. Como visto anteriormente, esses dois aminoácidos incomuns (hidroxi-prolina e
hidroxi-lisina) participam da estrutura do colágeno, sendo assim, a falta de vitamina C causa
um prejuízo na função das duas enzimas citadas e consequentemente uma deficiência na
produção do colágeno. Essa produção deficiente do colágeno acarreta diversos sintomas
clínicos, como pequenas hemorragias, dificuldade de cicatrização, sangramentos na gengiva,
etc.

A imagem ilustra a ação das enzimas prolil e lisil hidroxilase e também mostra a ação da vitamina C (ácido
ascórbico) na reação. A vitamina C ajuda na passagem do fe3+ para fe2+, que é necessário para a reação.

Moléculas orgânicas que ajudam na atividade de determinada enzima são chamados de


coenzima, já íons que ajudam no processo de catálise são chamados de cofator. Nesse
sentido, o exemplo anterior mostra o ácido ascórbico como coenzima e o ferro como cofator.
A primeira proteína que teve a sua estrutura terciária definida foi a mioglobina, ela é uma
proteína conjugada presente nos músculos, principalmente nas fibras do tipo 1. A mioglobina
possui algumas características que também podem ser vistas em outras proteína globulares,
como a presença de aminoácidos de cadeia lateral hidrofóbica no interior e aminoácidos de
cadeia lateral hidrofílica no exterior, outra característica é a presença de estruturas
secundárias não definidas em regiões com presença de lisina e prolina. Seu grupo prostético
é a protoporfirina de ferro 2+, também conhecido como grupo heme, presente também na
hemoglobina. Sua função reside no estoque de oxigênio, enquanto a função da hemoglobina
é o transporte do oxigênio. O elemento químico que efetivamente liga-se ao oxigênio é o ferro
presente no grupo heme. Para a função de ambas as proteínas é extremamente importante
a existência de uma região interna com aminoácidos de cadeia lateral hidrofóbica. Essa
região é evita que a água entre em contato com o ferro, pois se isso acontecer o ferro passa
de Fe2+ para Fe3+, impossibilitando a ligação com o oxigênio.
O grupo heme da mioglobina possui uma maior afinidade ao oxigênio quando comparado ao
grupo heme da hemoglobina, isso acontece devido ao fato de que toda a estrutura proteica
influencia na afinidade do grupo heme com o oxigênio. Essa diferença é importante para a
passagem do oxigênio da hemoglobina para a mioglobina, isso também mostra o porquê de
a hemoglobina transportar o oxigênio e a mioglobina estocar.

Estrutura da protoporfirina de ferro 2+, presente como grupo prostético da mioglobina e da hemoglobina

A rabdomiólise é uma lesão muscular grave, que acontece com o esmagamento muscular
ou com a prática de exercícios extremamente intensos. Nesse tipo de lesão muscular a
mioglobina acaba extravasando para o sangue e chegando aos rins. O problema é que a
mioglobina é tóxica para esse órgão, podendo causar até mesmo falência renal. A mioglobina
também pode ser filtrada e ser eliminada na urina, causando a chamada mioglobinúria, dando
uma cor amarronzada à urina.

Urina com mioglobinúria (direita) comparada a urina normal (esquerda)


2.2 - Enovelamento e mudanças conformacionais de proteínas
As proteínas recém-sintetizadas se apresentam na estrutura primária, sendo assim, para que
essas proteínas atinjam sua função é importante o processo enovelamento. Esse ocorre de
forma espontânea com algumas proteínas, ou seja, a sequência de aminoácidos gera
determinadas interações que levam à estrutura biologicamente ativa da proteína. Entretanto,
nem todas as proteínas atingem sua estrutura final de forma espontânea, essas proteínas
necessitam das chamadas chaperonas, que são proteínas que interagem com polipeptídios
parcialmente dobrados, facilitando os mecanismos de enovelamento correto.
As conformações proteicas mais comuns são aquelas termodinamicamente mais estáveis,
isto é, aquelas com o menor ΔG (energia livre de Gibbs). Isso significa que as principais
conformações são aquelas que possuem uma menor energia livre.
Sabendo que a estrutura tridimensional de uma proteína é extremamente importante para a
sua função, é fácil entender como a perda dessa estrutura pode afetar o funcionamento dessa
determinada proteína. A perda da estrutura tridimensional de uma proteína que causa a perda
da função é chamada de desnaturação. Entretanto, vale ressaltar que o estado desnaturado
não necessariamente corresponde ao desdobramento completo da proteína, isto é, uma
perda parcial da estrutura proteica já pode prejudicar sua função.
Uma das principais causas da desnaturação proteica é o calor, que possui efeito sobre as
ligações fracas, causando a desestabilidade da estrutura proteica. É importante entender que
cada proteína possui uma faixa de temperatura, algumas resistindo mais ao aumento de
temperatura e outras menos. Um dos fatores que define o quanto uma determinada proteína
será resistente ao calor é a quantidade de ligações dissulfeto presente nesse polímero.
Outra causa importante da desnaturação proteica é a mudança de pH, isso acontece devido
à mudança da carga dos aminoácidos que compõem a proteína, causando a repulsão de
determinadas partes da proteína e consequentemente uma possível desnaturação.
A estrutura tridimensional de várias proteínas foi abordada até o momento, porém a
ilustração da estrutura dessas proteínas através de imagens dá a falsa ilusão que as
proteínas possuem uma estrutura final estática. Quando na verdade as proteínas são
moléculas dinâmicas que realizam interações com ligantes, essas interações induzem
mudanças conformacionais na estrutura proteica. Essas mudanças conformacionais são
importantes para o funcionamento de várias proteínas e mostram que as proteínas não são
estruturas estáticas.
Esse tipo de mudança conformacional pode ser visto na hemoglobina, essa proteína possui
duas conformações: o estado T (tenso) e o estado R (relaxado). A hemoglobina fica no estado
T quando não está ligada ao oxigênio, mas quando o oxigênio se liga à hemoglobina há uma
mudança conformacional que converte a hemoglobina ao estado R, esse estado possui uma
maior afinidade ao oxigênio. Nesse sentido, a cada ligação com o oxigênio a próxima ligação
será mais fácil, até que os quatro grupos heme estejam ligados ao oxigênio.
O processo que ocorre entre a hemoglobina e o oxigênio é chamado de cooperatividade
positiva, em que o oxigênio facilita a ligação com os próximos oxigênios. Também existe o
processo de cooperatividade negativa, um exemplo acontece entre o monóxido de carbono
(CO) e a hemoglobina, quando o monóxido de carbono se liga na hemoglobina ela causa
uma mudança conformacional na hemoglobina que dificulta a interação da hemoglobina com
o oxigênio dos pulmões. Esse processo só é possível porque o monóxido de carbono possui
uma maior afinidade com a hemoglobina do que o oxigênio.
Ambos os processos (cooperatividade positiva e negativa) entram na definição de
alosterismo. O alosterismo está relacionado com a interação entre uma proteína e um
ligante, quando o ligante favorece a atividade da proteína ele é chamado de ativador
alostérico (Ex: oxigênio e hemoglobina), quando ele dificulta é chamado de inibidor alostérico
(Ex: monóxido de carbono e hemoglobina)
A interação entre o oxigênio com a hemoglobina também é regulada pelo 2,3-BPG (2,3-
bifosfoglicerato), esse composto atua se ligando nas subunidades beta e diminuindo a
afinidade entre a hemoglobina e o oxigênio. Esse processo é importante para o
desenvolvimento fetal, o feto tem que captar o oxigênio presente no sangue da mãe, sendo
assim, a hemoglobina fetal tem que possuir uma maior afinidade pelo oxigênio. Para isso, o
feto sintetiza subunidades gama em vez de subunidade beta. A subunidade gama não sofre
regulação do 2,3-BPG, fazendo a hemoglobina fetal possuir mais afinidade pelo oxigênio.
A anemia falciforme é uma doença hereditária causada por uma alteração na sequência de
aminoácidos que compõem a hemoglobina. Essa doença mostra a importância da sequência
de aminoácidos para a determinação da estrutura secundária, terciária e quaternária das
proteínas. Essa condição é causada pela substituição do aminoácido glutamato pela valina
na posição 6 da subunidade beta da hemoglobina. A substituição desse aminoácido causa
uma agregação entre as hemoglobinas que atrapalham a sua atividade. Essa agregação
ocorre devido às interações hidrofóbicas que a valina causa. Essas hemácias defeituosas
ficam no formato de foice e passam a ser chamadas de drepanócitos. Já a drepanocitose
ocorre quando há um grande número de drepanócitos no paciente.
Essas hemácias na forma de foice tornam-se quebradiças, caracterizando a anemia. Além
disso, os drepanócitos perdem a habilidade de atravessar pequenos vasos sanguíneos,
podendo acarretar o entupimento de vasos sanguíneos, ocorrência de dores pelo corpo e em
casos graves a falência múltipla de órgãos.

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