Seminário 1
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Seminário 1
Nota Técnica
NEMEA- Núcleo de Estudos em Modelagem Econômica
e Ambiental Aplicada do Cedeplar-UFMG
Belo Horizonte, 20 maio 2020
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Professora no Departamento de Ciências Econômicas | NEMEA | Cedeplar-UFMG
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Professor no Departamento de Ciências Econômicas | NEMEA | Cedeplar-UFMG
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Professora no Departamento de Ciências Econômicas | NEMEA | Cedeplar-UFMG
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Doutorando em Economia no Cedeplar-UFMG
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Doutorando em Economia no Cedeplar-UFMG
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adicionais de US$ 500 por criança aos cidadãos com renda anual de até US$ 75 mil. O
indivíduo que possui rendimento anual superior a US$ 99 mil receberá um auxílio
proporcionalmente menor. O pagamento deste auxílio será parcela única e isento de
impostos. Este programa de renda mínima universal temporária faz parte do pacote de
estímulos à economia de US$ 2,3 trilhões (cerca de 11% do PIB dos EUA). No Japão, o
governo anunciou que pagaria 100.000 ienes (aproximadamente US$ 930) a cada
residente. Todos cidadãos seriam beneficiados independentemente da nacionalidade e do
nível da sua renda.
Na América Latina, medidas relacionadas à manutenção da renda também foram
adotadas. A Argentina criou um programa emergencial de renda familiar (uma parcela
única de 10 mil pesos), contemplando os indivíduos desempregados e trabalhadores
informais para beneficiar cerca de 3,6 milhões de pessoas. No Chile, o governo anunciou
a criação de um fundo de US$ 2 bilhões para distribuir mais recursos e criar mais
empregos nos setores de baixa renda. A estimativa é de que beneficie 2,6 milhões de
trabalhadores no setor informal com o programa emergencial. Na Colômbia, o Ministério
das Finanças anunciou um programa de transferências de renda direta para 3 milhões de
famílias (160.000 pesos colombiano para cada família) que não fazem parte dos
programas regulares de auxílio de renda familiar. No Peru, o governo fornecerá um
subsídio de PEN 760 (US$ 224,2) para famílias em situações de pobreza ou extrema
pobreza nas áreas rurais.
No Brasil, a medida de auxílio de renda emergencial para trabalhadores mais
vulneráveis aos efeitos da pandemia foi aprovada pelo Congresso Nacional, e inclui entre
os elegíveis ao benefício os trabalhadores informais, autônomos, trabalhadores
temporários, microempreendedores individuais, além de beneficiários dos programas de
transferência de renda, como o Bolsa Família. O benefício de R$600 está definido por
três meses, podendo ser prorrogado.
Algumas estimativas divulgadas por pesquisadores da área de economia social,
como Komatsu e Menezes Filho (2020), Souza et al. (2020) e Casalechi (2020) estimaram
o impacto do programa, em geral uma análise de projeção dos potenciais beneficiados,
do custo e do montante que o benefício pode chegar, em alguns casos mensurando o
impacto direto das transferências na renda das famílias. Entretanto, carece de análise o
impacto dessa medida na economia brasileira, em termos agregados e setoriais, captando,
além dos impactos diretos proporcionados, os impactos indiretos no consumo, no
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emprego e na atividade econômica. Estes indicadores de impacto ajudariam a estimar o
efeito que a política terá em comparação com a queda de atividade econômica que já se
observa na economia brasileira e se projeta em 2020.
Uma dificuldade na análise dessa medida é seu caráter temporário e a correta
identificação dos grupos familiares que se beneficiariam. Esta última é importante para
se projetar os efeitos de expansão de consumo e de produção que o benefício pode gerar
na economia. Dado o montante de recursos e a amplitude de efeitos que gera, podemos
considerar que análises em equilíbrio geral são as mais adequadas, pois consideram
explicitamente a relação entre diferentes mercados, os perfis de consumo de grupos de
famílias e a geração e apropriação da renda.
Para este trabalho utilizamos um modelo de equilíbrio geral computável (EGC)
para o Brasil com dinâmica recursiva e periodicidade trimestral. Este modelo é uma
adaptação do modelo BRIGHT, apresentado em Freire (2016). O modelo utilizado neste
trabalho está especialmente capacitado para questões relacionadas a transferências,
tributação, e geração, apropriação e distribuição da renda na economia brasileira, como
em Freire (2016). Além disso, traz modificações como a adaptação da teoria e banco de
dados a uma abordagem trimestral, como usado em outros artigos que analisam impactos
de epidemias (Arndt, 2001; Dixon et al., 2010; e Geard et al., 2016). O modelo BRIGHT
combina dados do Sistema de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) com as informações da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).
O modelo possui blocos de equações que determinam as relações de demanda e
oferta, de acordo com hipóteses de otimização e condições de equilíbrio de mercado.
Além disso, vários agregados nacionais, como emprego, PIB, balança comercial e índices
de preços, estão em equações específicas. Além disso, o modelo é dinâmico e recursivo,
cujas oscilações no investimento e capital acompanham mecanismos de acumulação e
conexões intersetoriais com mecanismos deterministas pré-estabelecidos relacionadas à
depreciação e taxas de retorno. O mercado de trabalho também se ajusta de forma
defasada dado o desvio entre emprego efetivo e emprego tendencial, definido a partir de
um cenário demográfico de longo prazo.
Uma característica distinta do modelo para o tema deste trabalho é a especificação
dos dispêndios familiares, tanto do consumo das famílias como demais despesas por 11
grupos, em termos de classes de renda. Além disso, o modelo também identifica as rendas
de capital, do trabalho e de transferências (tanto do Governo como demais setores
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institucionais) recebidas por cada grupo familiar. Para a renda do trabalho, essa
identificação por grupo familiar é setorial. Assim, modificações nas fontes de renda e na
estrutura produtiva geram modificações na distribuição de renda entre as classes. As 11
classes de renda do modelo podem se visualizadas na Tabela 1.
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Federal (CadÚnico) 2018 e dos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) Contínua 2018 (MDS, 2020a; IBGE, 2019).
A escolha das bases e a estratégia de estimativa estão diretamente relacionados
aos critérios divulgados pelo governo federal para elegibilidade ao auxílio (MDS, 2020b).
O indivíduo deve atender a todos os pré-requisitos:
i. Ser maior de 18 anos
ii. Não ter emprego formal (não pode ter carteira assinada
iii. Não ter benefício previdenciário ou assistencial, exceto Bolsa Família
iv. Renda familiar de ½ até três Salários Mínimos
v. Não ter recebido acima de R$ 28.559,70
O uso dos microdados do CadÚnico como fonte primária de dados está baseado
no fato de tratar-se da principal base de referência do governo de estimativa e coleta das
informações dos indivíduos elegíveis ao benefício. Segundo estimativas de Souza et al.
(2020), cerca de 82% dos indivíduos que receberão o auxílio estão cadastrados no
CadÚnico.
Entretanto, há trabalhadores informais e outros indivíduos que, embora atendam
os critérios de elegibilidade do benefício, não estão cadastrados nessa base. Diante disso,
a PNAD Contínua que avalia, sobretudo, características sociais, demográficas e de
emprego, foi utilizada para estimar essa porção residual de indivíduos elegíveis ao auxílio
emergencial que não são capturados no CadÚnico.
O CadÚnico, enquanto principal instrumento do Estado brasileiro para
identificação, seleção e caracterização da população para programas sociais, apresenta
em sua totalidade indivíduos que, de alguma maneira, são assistidos por benefícios do
Estado. Nesse sentido, a estratégia adotada para evitar dupla contagem nos dados obtidos
nas duas bases foi aplicar um filtro adicional nas estimativas obtidas da PNAD Contínua,
desconsiderando os indivíduos que recebem qualquer forma de benefício assistencial do
Estado, inclusive o Bolsa Família. A hipótese adotada é que esses indivíduos já estariam
representados nos microdados do CadÚnico.
Os critérios utilizados para a definição do número máximo de cotas de R$ 600,00
por unidade familiar dentre as famílias elegíveis, relacionados à composição familiar,
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como o número de membros e o sexo do chefe da família, podem ser estimados em ambas
as bases sem a necessidade de adoção de hipóteses adicionais.
As famílias elegíveis ao auxílio e que já são beneficiadas pelo Programa Bolsa
Família recebem, automaticamente, o benefício de maior valor entre o programa e o
auxílio emergencial. Logo, a estimativa de despesa total com a política de auxílio
emergencial deve incluir a dedução do valor total de pagamentos do Bolsa Família que
se enquadram nessa condição.
A Tabela 2 apresenta os principais dados estimados do programa de renda
emergencial com base nos critérios descritos anteriormente para um período de três
meses. As faixas I, II e III reúnem os indivíduos com renda familiar total de até um salário
mínimo, entre um e dois salários mínimos e entre dois e três salários mínimos,
respectivamente.
O número de elegíveis se refere aos indivíduos que, de fato, atendem todos os
critérios para receber 1 ou 2 cotas do auxílio emergencial, levando em consideração o
número máximo de 2 indivíduos elegíveis por unidade familiar e 2 cotas para mulheres
chefes de famílias monoparentais. Já o número de beneficiados se refere ao total de
pessoas que pertencem às famílias com ao menos um indivíduo elegível para o auxílio.
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Cadastro Único 2018 e PNAD 2018.
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As estimativas são compatíveis com os números de 50,5 milhões de indivíduos elegíveis e 97 milhões de
benefíciados divulgados pelo Dataprev, empresa responsável pela validação das solicitações de auxílio
emergencial (DATAPREV, 2020).
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A partir destes números avaliamos dois cenários da adoção de programas de renda
básica na economia brasileira. No primeiro, analisamos os efeitos da política de “Renda
básica emergencial” (RBE) de R$ 600,00, por 3 meses, conforme aprovado pelo
Congresso Nacional. No segundo, simulamos um cenário alternativo, no qual o benefício
é estendido até dezembro de 2020. Chamamos este cenário de “Renda básica estendida”
(RBS), que possibilita avaliar os impactos econômicos, a cada trimestre, da manutenção
do benefício até o fim do ano. Este cenário possibilita discutir a necessidade de se ampliar
o programa de renda básica emergencial em termos do período do auxílio, para
manutenção da renda para a parcela da população mais vulnerável, dada a crise
econômica proveniente da pandemia do COVID-19. O Quadro 1 traz um resumo
esquemático dos pressupostos de cada um dos cenários simulados no modelo BRIGHT.
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Segundo os mecanismos de causalidade do modelo nas simulações, a transferência
do auxílio para as classes beneficiadas tem como efeito direto o aumento da renda e do
consumo. A pressuposição é que este aumento da renda se converte totalmente em
consumo, hipótese consistente com a elevada elasticidade renda-consumo das classes de
menor renda, e que são as elegíveis para receber o benefício.
O aumento do consumo de bens e serviços pelas famílias gera uma série de efeitos
na economia, capturados pelo modelo. O primeiro deles é estimular a produção dos
setores, principalmente daqueles que detêm maior participação no consumo das famílias
que receberam o benefício. A expansão da atividade produtiva requer mais insumos,
intermediários e primários, impactando a renda dos fatores, trabalho e capital, e outros
setores indiretamente, exercendo rebatimentos sobre a própria estrutura distributiva.
Ainda, tem impactos sobre o nível de atividade, consumo das famílias, investimento e
emprego. O estimulo à atividade econômica eleva a arrecadação de impostos.
Os resultados que apresentamos são desvios em relação ao cenário base. Tanto
RBE como a RBS apresentam efeitos imediatos no trimestre em que se efetivam, e
posteriormente devido aos efeitos que desencadeiam na economia. Quando essa renda é
retirada da economia resta um efeito permanente devido aos impactos que foram
acumulados ao longo do tempo em que estiveram vigentes.
Os primeiros impactos de interesse são aqueles exercidos sobre a renda das
famílias, considerando os efeitos diretos (via transferência de renda) e indiretos (via
atividade econômica) da RBE, em relação a um cenário em que esse tipo de política não
fosse adotado. A Tabela 3 exibe o que chamamos de impacto imediato da política, nos
dois cenários. No cenário da RBE, o impacto imediato é aquele acumulado ao final do
segundo trimestre de 2020, já que as transferências durariam apenas 3 meses. No segundo
cenário (RBS), em que se considera que as transferências seriam mantidas até o 4º
trimestre de 2020, o impacto imediato é aquele observado no último trimestre do ano de
2020.
Naturalmente, nos dois cenários, os impactos imediatos das transferências seguem
a sua distribuição, com a família de classe mais baixa, H1, obtendo o maior desvio
positivo na renda ao final do período, com ganho de quase 45% na renda total dessa classe
em relação ao cenário sem a política. O mais interessante, no entanto, é observar que as
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famílias que se encontram nas classes H47 e superiores na estrutura distributiva, também
são beneficiadas com impacto positivo na renda, embora não recebam o benefício. Este
efeito advém dos impactos indiretos que as transferências geram na economia, ao
estimular o consumo das classes H1, H2 e H3, que, por sua vez, exerce uma série de
efeitos indiretos na economia (produção, emprego, investimento, salários, renda do
capital, renda apropriada pelas famílias).
A classe com maior impacto indireto na renda em relação a um cenário sem a
política é H11. O maior efeito em H11 decorre da própria estrutura distributiva. Esta
classe, embora menos representativa em termos da população, detém a maior parte da
renda gerada no processo produtivo. Freire (2016) aponta que, para cada 1 real de
aumento na produção para atender a uma expansão de mesma magnitude na demanda
final da economia, R$ 0,23 é gerado para a classe H11, enquanto apenas R$ 0,03 é gerado
para as classes H1 e H2 conjuntamente. Este é um resultado importante: a RBE mitiga o
impacto da crise da pandemia de Covid19 nas famílias mais vulneráveis, gerando desvio
de quase 45% na renda total da classe mais pobre em relação a um cenário que a política
não fosse adotada, mas também mitiga o impacto da crise nas classes mais altas, via efeito
indireto, embora o impacto seja relativamente menor. Uma transferência de renda
focalizada nas classes mais pobres gera renda também para as classes mais altas, via
impacto na atividade econômica. Na RBE o impacto imediato se limita a 3 meses.
Estendendo o benefício (RBS), esse impacto seria sentido por 3 trimestres.
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As transferências são alocadas nas classes H1, H2 e H3, dada a restrição de que a renda familiar do
beneficiário não pode ultrapassar 3 salários mínimos.
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Tabela 3: Impacto imediato da Renda Básica Emergencial sobre a renda real das famílias,
por 11 classes de renda, (desvio % acumulado em relação ao cenário base)
RBE RBS
Famílias
2020_2 2020_2 2020_3 2020_4
H1 44,6 44,6 44,3 44,2
H2 11,2 11,2 11,1 11,0
H3 5,5 5,5 5,5 5,5
H4 0,2 0,2 0,2 0,3
H5 0,3 0,3 0,4 0,4
H6 0,3 0,3 0,4 0,5
H7 0,5 0,5 0,6 0,7
H8 0,5 0,5 0,6 0,7
H9 0,6 0,6 0,7 0,7
H10 0,6 0,6 0,7 0,7
H11 0,8 0,8 0,9 0,9
Fonte: Elaboração própria com base nos resultados do modelo BRIGHT
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dados os efeitos da crise, a RBE por três meses mitigaria esse impacto em 0,44%. Caso o
benefício seja mantido até o final do ano, o desvio na taxa de crescimento ao final de 2020
seria de 0,55%. Em termos do impacto permanente, assegurar o benefício até o fim de
2020, gera um impacto cinco vezes maior ao final de 2021 do que a manutenção por 3
meses.
O custo do RBE está sendo estimado por especialistas em 2% do PIB para os três
meses8. Anualizando-se esse benefício, o custo seria em torno 8%. Nossos resultados
mostram que parte desse custo seria mitigado com o impacto da política no PIB (i.e., ao
mitigar parte do efeito da crise na atividade econômica): 0,44% para 3 meses, e 0,55%
caso a renda seja assegurada até o fim do ano de 2020.
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https://portalibre.fgv.br/navegacao-superior/noticias/coronavirus-13.htm
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Figura 2: Impacto da Renda Básica Emergencial sobre o Consumo das Famílias (desvio
% acumulado em relação ao cenário base)
12
Figura 4: Impacto da Renda Básica Emergencial sobre o Emprego (desvio % acumulado
em relação ao cenário base)
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potencial impacto recessivo que tem sido projetado para o corrente ano, notadamente no
cenário em que o auxílio é estendido.
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Tabela 5: Impactos setoriais do Cenário de Renda Básica Estendida (variação % acumulada
em relação ao cenário base)
2º trimestre 4º trimestre 4º trimestre
Setores mais beneficiados
de 2020 de 2020 de 2021
Eletrodomésticos 2,75 2,80 1,01
Perfumaria, higiene e limpeza 2,04 2,08 0,80
Artefatos de couro e calçados 1,89 1,98 0,84
Saúde mercantil 1,42 1,48 0,73
Artigos do vestuário e acessórios 1,30 1,32 0,52
Outros serviços 1,20 1,24 0,65
Alimentos e bebidas 1,13 1,10 0,30
Produtos farmacêuticos 1,08 1,08 0,47
Aparelhos/instrumentos médico-hospitalar 1,06 1,48 1,02
Educação mercantil 1,06 1,11 0,93
Comércio 1,05 1,25 0,63
Pecuária e pesca 0,96 1,03 0,32
Móveis e produtos das indústrias diversas 0,94 1,09 0,55
Material eletrônico e eq. de comunicações 0,85 1,39 0,90
Máquinas para escritório e eq. de informática 0,84 1,64 1,15
Serviços de manutenção e reparação 0,76 0,81 0,42
Construção 0,73 1,58 1,10
Eletricidade e serviços públicos 0,69 0,74 0,42
Produtos do fumo 0,64 0,58 -0,05
Cimento 0,57 1,21 0,85
Automóveis, camionetas e utilitários 0,41 0,69 0,75
Jornais, revistas, discos 0,35 0,36 0,26
Intermediação financeira e seguros 0,32 0,37 0,29
Serviços de alojamento e alimentação 0,29 0,26 0,16
Tintas, vernizes, esmaltes e lacas 0,24 0,61 0,53
Serviços de informação 0,18 0,18 0,16
Outros produtos de minerais não-metálicos 0,14 0,63 0,56
Agricultura, silvicultura, exploração florestal 0,14 0,12 -0,03
Máquinas e equipamentos 0,08 0,70 0,61
Serviços imobiliários e aluguel 0,06 0,10 0,15
Fonte: Elaboração própria com base nos resultados do modelo BRIGHT
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custo fiscal líquido, que desconta do custo da política o impacto gerado na arrecadação
de receita tributária pelo Governo. Modelos de equilíbrio geral computável como o
BRIGHT possibilitam captar esses efeitos. A Tabela 6 exibe os impactos da Renda básica
emergencial na arrecadação de impostos.
A Renda básica emergencial por 3 meses geraria, ao fim do ano de 2021,
considerando seus desdobramentos na economia, um desvio de 0,9% na arrecadação
nominal do Governo Geral (União, Estados e Municípios). Com a retirada do benefício,
o impacto permanente na arrecadação se dilui ao longo do tempo, tornando a trajetória da
arrecadação com a política mais próxima da trajetória da arrecadação sem a política.
Se a Renda básica fosse estendida até o fim do ano de 2020, o desvio acumulado
na arrecadação seria de 5% ao final de 2021. Em termos monetários, o impacto
permanente da RBE seria de R$ 22,3 bilhões para o período de 3 meses, e de R$ 128
bilhões caso a política fosse entendida para 3 trimestres. Estender o período da renda
básica geraria um efeito permanente 5,7 vezes maior na arrecadação. Logicamente, esse
efeito não é suficiente para acomodar custo do programa, mas indica que o custo líquido
deste é menor que o desembolso do programa, seja por 3 meses ou até o final do ano.
A comparação correta entre a receita gerada pela RBE com o custo do benefício
para as contas públicas, se dá pela contraposição entre a estimativa do que seria gasto
com a política com a projeção do impacto permanente na receita. Isso porque, como o
benefício não é perene, ao paralisar as transferências, a receita passa a se aproximar da
sua trajetória tendencial (sem a política). Portanto, precisamos avaliar o impacto líquido
no acumulado, ao final do período de simulação. O custo da RBE por três meses estimado
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neste estudo é de R$ 94,4 bilhões9. A manutenção do benefício até o fim de 2020 geraria
um custo 3 vezes maior (R$ 283,3 bilhões), mantidos constante o número de famílias. O
efeito permanente nominal na arrecadação de impostos que estimamos está em torno de
R$ 22 bilhões para 3 meses de RBE e de R$ 128 bilhões para 3 trimestres. Assim, 3 meses
de benefício geraria um montante de receita de impostos que cobre 24% do seu custo,
enquanto a manutenção dos benefícios até o fim de 2020 produziria uma compensação de
45% do seu custo. Vale destacar que esta é uma comparação nominal entre o custo da
política com a receita gerada. Naturalmente, existem variações inflacionárias que atuam
tanto do lado da despesa quanto da receita. No entanto, dadas as projeções bastante
modestas para inflação para os próximos períodos, este efeito tende a ser pequeno.
O impacto mais proeminente tanto nas variáveis econômicas como investimento,
emprego, atividade setorial e PIB, bem como na receita de impostos, gerado pelo cenário
com renda básica estendida, realça a manutenção de efeitos mais perenes associados à
acumulação de capital e ao mercado de trabalho que o período mais estendido de
benefícios gera. Tanto a acumulação de capital, quanto o ajustamento do mercado de
trabalho, apresentam respostas defasadas, de modo que o período mais estendido da
política permite ajustamentos de maior magnitude. Em outras palavras, um período mais
estendido de manutenção da renda de famílias informais e vulneráveis traz um espaço de
tempo maior para o ajustamento dos produtores, principalmente quanto às decisões do
investimento e sua consolidação, que levam mais tempo para serem concretizadas. Tornar
o programa de renda emergencial mais longo pode ter um papel de melhorar as
expectativas quanto à recuperação da economia na pandemia, tanto do lado do consumo
das famílias como do investimento das empresas.
A avaliação se as medidas de renda básica emergencial são suficientes para o
impacto da crise da COVID-19 requer estudo específico dos impactos da crise
propriamente dita. O foco da renda básica está na atenuação da queda de renda de grupos
familiares mais pobres e vulneráveis, mas também pode ter um papel na diminuição dos
efeitos da pandemia em toda a economia.
Os dados observados até o momento (abril de 2020) mostram que a retração de
consumo, investimento e comércio externo se disseminaram em toda a economia.
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Novamente, este custo foi estimado a partir do cruazamento das base do CadUnico e PNAD, com dados
de 2019. Portanto, retratam a situação das famílias no ano de 2019. Assim, não capta novos entrantes a
partir dos efeitos da crise. Exemplo: pessoas que antes da crise estavam empregadas e perdem o emprego
a partir dos impactos da Pandemia.
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Segundo dados do IBGE para os 3 primeiros meses do ano, a retração do setor de serviços
foi de -0,1%, mas com grandes variações em Serviços Prestados às Famílias (-10,1%). A
indústria de transformação caiu -1,1%, a indústria extrativa -5,8%, e alguns segmentos
foram ainda mais afetados (veículos automotores, -9%; outros equipamentos de
transporte, exceto veículos automotores -11,9%, vestuário -10,9%). Algumas projeções
de queda da atividade econômica estimam um impacto de -5% a -10% em 2020.
Utilizando os dados de perdas de atividade econômica no primeiro trimestre de
2020 divulgados pelo IBGE, efetuamos uma simulação que avalia seus efeitos na
economia. Os resultados (Figura 5) apontam que os resultados setoriais negativos
observados no primeiro trimestre gerariam desvio no trimestre de -1,1% no PIB, -1,0%
no consumo das famílias, -1,8% no investimento, -1,8% nas exportações, -0,8% nas
importações e -0,1% no emprego.
Na ausência de políticas de apoio por parte do poder público, essas perdas se
acumulariam ao longo do ano de 2020, chegando a um desvio de -1,4% no PIB, 1,2% no
Consumo das famílias, 4,0% no Investimento e 0,6% no emprego no último trimestre de
2020 (apenas em função da retração observada no primeiro trimestre de 2020).
Naturalmente, a extensão da crise da pandemia pelos semestres subsequentes a este
primeiro de 2020, que já está sendo observada, acentuaria os impactos negativos. Os
resultados projetados para a RBE por três meses nos permitem sugerir uma mitigação de
0,44% no PIB, de 2,15% no consumo das famílias, de 0,8% no investimento e de 0,6%
no emprego, no impacto imediato da crise, ao final do seu período de vigência. A
manutenção do benefício até o fim de 2020 amplifica esta mitigação por um fator maior
que o aumento do custo da política, como mostraram os resultados.
Face a esses números e aos resultados obtidos nas simulações da renda
emergencial, nos parece que, apesar do alívio temporário importante às classes de renda
mais afetadas, essas medidas representarão um efeito insuficiente para os impactos que
já se mostram na economia. A medida de 3 meses é claramente insuficiente dado o
acúmulo de impactos negativos que têm sido observados e a morosidade que se espera da
recuperação econômica, face a característica sanitária dessa crise. Ainda que ocorra a
flexibilização das medidas de isolamento, nos próximos meses, incertezas sobre vacinas
e tratamentos seguros estimularão medidas de precaução por parte das famílias, de modo
que a retração do consumo, em especial de serviços específicos como comércio,
alimentação fora de casa, eventos culturais e outros, tende a se manter ou, pelo menos,
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apresentar recuperação muito lenta, como tem sido observado em outros países que já
adotaram a flexibilização.
-2,00
-3,00
-4,00
-5,00
-6,00
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diante da pandemia de Covid19 e seus impactos, que tendem a se prolongar, é evitar
quedas ainda mais proeminentes na atividade econômica e maior deterioração das contas
públicas.
Portanto, consideramos que existem evidências econômicas a favor da
manutenção do benefício de renda ao longo do ano de 2020, mesmo implicando aumento
do endividamento no ano corrente, ou mesmo que seja financiado por emissão de moeda.
Nos anos seguintes à crise pode-se passar a discutir, por exemplo, uma reforma tributária
que permita o financiamento/manutenção desse tipo de Renda básica, mas com
mecanismos e regras mais adequados ao público alvo. Os impactos negativos dessa crise
tendem a se perenizar em aumento da pobreza e desigualdade, caso não consolidemos
uma estrutura de proteção social adequada. Temos uma estrutura tributária bastante
desigual e com espaço para a formulação de políticas redistributivas. A tributação de
dividendos distribuídos na pessoa física e/ou a criação de uma faixa mais elevada no IRPF
para as super rendas são exemplos de fontes tributárias para a consolidação de um sistema
de proteção social para os mais vulneráveis. O estudo de alternativas de desenho e dos
impactos desse financiamento é o próximo passo desse trabalho. Proteger os mais
vulneráveis é, além de moralmente correto, bom para a economia.
Referências
20
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) Contínua - 2018. Disponível em: <
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/multidominio/condicoes-de-vida-desigualdade-e-
pobreza/17270-pnad-continua.html>. Acesso em: abril, 2020.
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