VKHUTEMAS Desenho de Uma Revolucao

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VKHUTEMAS

DESENHO DE CELSO LIMA


UMA REVOLUÇÃO NEIDE JALLAGEAS
DESENHO DE

VKHUTEMAS
CELSO LIMA
UMA REVOLUÇÃO NEIDE JALLAGEAS

kinoruss vkhutemas
IN MEMORIAM SELIM OMÁROVITCH
KHAN-MAGOMIÉDOV,
O PIONEIRO
PARTE 1 PARTE 2
REVOLUÇÕES E PEDAGOGIAS FACULDADES

10 INTRODUÇÃO 18 CONTEXTO HISTÓRICO, 114 DEPARTAMENTO DE 177 Sobre a principal tarefa do


ARTÍSTICO E REVOLUCIONÁRIO EXPERIÊNCIA E PREPARAÇÃO construtivismo na arquitetura
(IPO)
A revolução das vanguardas 179 Resolução do protesto realizado
Ensinamentos propedêuticos no debate do Vkhutein
Arautos do futuro
Cores: Liubov Popova e 182 FACULDADE DE TRABALHO
Um império sob pressão
Aleksandr Vesnin EM MADEIRA E METAL
Esboçando a revolução
Construção gráfica: Faculdade de Trabalho em Madeira
Entre o tema e a forma, a ideologia Aleksandr Ródtchenko
Faculdade de Trabalho em Metal
Vindourianos Espaço: os Obmas de Nikolai Ladóvski
Faculdade de Trabalho em Madeira
por Vladímir Maiakóvski
Volume: Anton Lavínski, Aleksei e Metal
58 SVOMAS: ATELIÊS LIVRES Bábitchev e Boris Koroliov
Aleksandr Ródtchenko: novas
DE ARTES
Ateliê de Iliá Gólossov e perspectivas na construção do mundo
Educação e revolução Konstantin Miélnikov
Anton Lavínski: um artista construtor
Uma ação pedagógica inédita 138 FACULDADE DE ARQUITETURA
Desenho técnico
Disciplinas e programas Uma arquitetura revolucionária por Aleksandr Ródtchenko
Ateliê de Pintura A Faculdade de Arquitetura nos 216 FACULDADE DE CERÂMICA
Vkhutemas e no Vkhutein
Ateliê de Escultura A agitação dos pratos, xícaras
Programas e tigelas imperiais
Ateliê de Arquitetura
Ocupação espacial como construção O ensino revolucionário de
As mulheres e a revolução
social uma arte tradicional
por Celso Lima
O arquiteto que criou um clube para Pratos como documento
80 VKHUTEMAS | VKHUTEIN
os trabalhadores
Vladímir Tátlin: arte, tecnologia e
A pedagogia do design na antítese
Lídia Komarova: uma pioneira invenção (também em cerâmica)
da arte
Liubov Zaliêsskaia: a paisagem O Suprematismo no café, almoço
Diferenciais de uma nova pedagogia
socialista e jantar
Dez anos de orientações ideológicas
Aleksandr Vesnin: arquitetura e teatro 242 FACULDADE TÊXTIL
distintas
Konstantin Miélnikov: desafios A Faculdade Têxtil nos Vkhutemas
Uma noite com Lênin e
espaciais
Krúpskaia nos Vkhutemas A Faculdade Têxtil no Vkhutein
por Neide Jallageas Uma sonata para o sono
Varvara Stepánova: o Construtivismo
Gueórgui Krútikov: uma cidade flutuante na roupa e na estampa
Ivan Leonídov: potência da construção Liubov Popova: arte e design
revolucionários
Arkhitektons: a arquitetura como
problema
PARTE 3
IRRADIAÇÕES

Liudmila Maiakóvskaia: um Esculpindo o Realismo Socialista 378 BAUHAUS 422 Arquitetura da vanguarda
laboratório da cor soviético soviética
Artesania e indústria
Roupas (1920-1926) Monumento à Terceira por Selim Khan-Magomiédov (excerto)
Fundação da Bauhaus
por Celso Lima Internacional 426 CRONOLOGIA
por Nikolai Púnin Vkhutemas e Bauhaus: ação
O vestuário dos dias de hoje – 447 REFERÊNCIAS
356 CERTIFICAÇÃO DE dos estudantes
roupa de trabalho BIBLIOGRÁFICAS
por Varvara Stepánova ENCERRAMENTO DOS Uma arquitetura internacional
VHUTEMAS-VKHUTEIN 458 ÍNDICE REMISSIVO
286 FACULDADE POLIGRÁFICA Hannes Meyer na URSS
Resolução de 1932
Das artes gráficas à poligráfica Os que ficam
364 NOTAS BIOGRÁFICAS DOS por Celso Lima
A constituição de um laboratório
PRINCIPAIS MESTRES
gráfico em ebulição 410 LE CORBUSIER
Composição e construção Purismo e Cinco Pontos
Exposição poligráfica de 1927 Le Corbusier na URSS
Gustav Klútsis: um O Construtivismo no Ocidente
fotomontador em ação por Aleksei Gan
Vassíli Kandínski: um mestre
da Rússia para o mundo
Fotomontagem
por Liubov Popova
312 FACULDADE DE PINTURA
Entre o cavalete e o monumento
Departamentos
Por uma estética modernista,
renascentista ou realista (!?)
Para agitar as massas
Lázar Lissítski: o extravasamento
da pintura no espaço
Aleksandra Ekster: pintura
na era da máquina
A perspectiva inversa
por Pável Floriênski (excerto)
340 FACULDADE DE ESCULTURA
Um ensino conservador
Deve-se enfatizar

11
INTRODUÇÃO
a diferença
entre instrução e
educação. Instrução
é a transmissão de
conhecimento pronto
pelo professor a seu
aluno. A educação
é um processo
criativo. Por toda a
vida, a personalidade
do indivíduo “se
educa”, amplia-
se, é enriquecida,
se fortalece e se
aperfeiçoa.
Anatóli Lunatchárski1
10
O nome Vkhutemas anuncia uma das mais radicais revoluções ar- propostas inovadoras do conjunto dos artistas então denomina-

13
tísticas e pedagógicas já ocorridas, com resultados visíveis até dos massivamente como “futuristas” ou “esquerdistas”.
hoje na arte, no design, na arquitetura e nos museus e galerias
Compreender tanto a criação quanto a extinção dos Vkhutemas-
de arte do mundo todo. A experiência teve origem na ampla re-
Vkhutein requer que tomemos contato com seu notável conjunto
forma do ensino ocorrida na Rússia pós-revolucionária. Tal rees-
de pedagogias em suas múltiplas dimensões: histórica, política,
truturação foi implementada pelo Comissariado do Povo para a
filosófica e cultural. Isso porque os mestres e mestras que com-
Educação (conhecido pelo acrônimo russo Narkompros), órgão
puseram o corpo docente em todo o seu percurso eram muito va-
criado pelo governo bolchevique imediatamente após a Revolução 1. “Proclamação do Comissário
riados em relação às suas ideias e posicionamentos frente aos
de 1917 e chefiado por Anatóli Lunatchárski, nomeado por Lênin. do Povo para a Educação” de 29
desdobramentos pós-Revolução. Os frequentes embates reper-
de outubro de 1917 (citado em
O escopo do Narkompros ultrapassava as atribuições usuais de KRUPSKAYA, 2017, p. 267). cutiram no funcionamento das faculdades, definiram os rumos do
um Ministério de Estado burguês, pois ele foi concebido como um desenvolvimento da escola e concorreram para sua extinção.
agente de mudanças sociais. Nesse sentido, objetivava-se que a Ateliê de Aleksandr Ródtchenko,
Neste livro, a dimensão histórica dos movimentos artísticos arti-
educação tivesse como tarefa principal substituir os métodos aca- da esquerda para a direita: Bíkov,
Lavínski, Stepánova (no primeiro culados com os movimentos sociais e políticos a partir do século
dêmicos elitistas para ampliar o seu foco e passar a atender a mi- plano), Aleksandr Vesnin, Olga XVIII é colocada em relevo, num esforço de clarificar as raízes de
lhares de estudantes do campo, das fábricas e dos quartéis: um (mãe de Ródtchenko), Popova e
uma tradição de luta dos artistas pela emancipação social. O es-
projeto ambicioso e que suscitou todo tipo de questionamentos e Sóbolev
tudo não pretende ser exaustivo ou esgotar a riqueza desse gran-
fortes embates.
de experimento. Trata-se, antes, de um trabalho introdutório ao as-
Até aquele momento, não havia no mundo nenhum modelo pe- sunto em território brasileiro, que busca atentar-se às dimensões
dagógico que atendesse objetivos de tal envergadura. Contudo, política, filosófica e cultural do fenômeno em questão. Tais dimen-
era isso que o líder da nascente União Soviética tinha em mente sões são assinaladas como pontos de referência, de modo a de-
para os cidadãos, de modo que, após a Revolução, tem início um monstrar suas interconexões com as pedagogias na arte, design e
conjunto de reformas que atingiu as desgastadas instituições e arquitetura e possibilitar reflexões sobre os treze anos de existên-
as velhas pedagogias em todos os níveis de ensino. É quando cia dessa experiência pedagógica.
emergem experimentações radicais, que têm nos Vkhutemas uma
Leitoras e leitores poderão se guiar pelo sumário detalhado divi-
iniciativa ímpar para o ensino superior das artes e das técnicas.
dido em três partes. A primeira delas, Revoluções e Pedagogias,
A reorganização institucional do ensino de artes e técnicas em abarca o contexto histórico e artístico revolucionário a partir da
Moscou, sob o comando de Lunatchárski, compreendeu três Rússia tsarista, desde o nascimento da Academia Imperial de
fases com nomenclaturas e estruturas distintas: a primeira teve Artes em São Petersburgo até as reformas educacionais revolu-
início em 1918, logo após a Revolução, e resultou na dissolução cionárias que culminaram na criação dos Vkhutemas-Vkhutein.
de duas instituições imperiais – a Academia de Arte Industrial
A segunda parte (Faculdades) apresenta a constituição e fun-
Strôganov e a Academia Imperial de Artes –, substituídas pelos
cionamento de cada uma das faculdades, descreve as opções
Svomas (Ateliês Livres de Arte). Na segunda fase da reorganiza-
metodológicas, as tensões entre correntes conservadoras e de
ção, iniciada em 1920, estes ateliês independentes e de espírito
vanguarda, além de apresentar os membros mais destacados do
livre foram consolidados em uma instituição de nível superior de
corpo docente, bem como as confluências e divergências entre
nome Vkhutemas (Ateliês Superiores de Arte e Técnica). A tercei-
projetos e objetivos revolucionários que definiram tanto a produ-
ra e última reforma, ocorrida em 1927, transformou os Vkhutemas
ção quanto os rumos de cada uma das áreas.
em uma instituição de caráter eminentemente técnico, o Vkhutein
(Instituto Superior de Arte e Técnica), extinto em 1930. Sem perder de vista os acontecimentos históricos e os emba-
tes estéticos que atravessaram o desenvolvimento de cada uma
A criação dos Vkhutemas objetivou formar uma variedade de pro-
das faculdades descritas nos oito primeiros capítulos da segunda
fissionais, entre artistas e arquitetos, oriundos da classe proletária,
parte, orientamos nosso relato por uma perspectiva que conside-
para desenvolver uma nova cultura artística capaz de se integrar
ra a história como sendo feita por pessoas, por figuras de carne
à crescente produção industrial e ao desenvolvimento econômico
e osso que tornaram realidade muitas das transformações descri-
e político do país. Essa tarefa audaciosa e desafiadora dentro de
tas. A história dos Vkhutemas é mais do que um fenômeno social
um regime recém-instaurado e ainda em processo de maturação
que se desenvolveu autonomamente: é a história de homens e mu-
colocou em xeque os cânones sobre a linguagem da arte, do de-
lheres que pretenderam revolucionar a arte e a vida. Ainda como
senho de objetos e da arquitetura, inclusive no interior do próprio
forma de resgatar muitos desses nomes pouco conhecidos atual-
Partido Comunista, que não raro mobilizou forças contrárias às
mente, apresentamos um capítulo com notas biográficas dos prin-
cipais mestres que atuaram na escola.
12
A terceira parte (Irradiações) apresenta dois exemplos ligados pedagógica dos Vkhutemas foi completamente suprimida de suas

15
à experiência revolucionária dos Vkhutemas. No primeiro ca- publicações.
pítulo, são descritos os intercâmbios e trocas entre Vkhutemas É preciso mencionar ainda que, embora possam ser encontrados
e Bauhaus. O segundo capítulo aborda o trabalho do arquiteto textos de diversas procedências e pontos de vista, majoritaria-
suíço Le Corbusier, mestre que realizou projetos em forte conexão mente em língua estrangeira, que citam e discutem esparsamen-
com os Vkhutemas. te os Vkhutemas, o estudo mais completo e denso sobre a escola
Para apoiar leitoras e leitores na compreensão de uma história continua sendo o do pesquisador russo Selim Khan-Magomiédov,
que ainda é pouco conhecida em nosso país, incluímos uma cro- um autor que se debruçou durante muitos anos sobre cerca de 2. Todas as citações foram
nologia com os eventos mais destacados, relacionando história 150 arquivos dispersos e constitui a matriz de nossos estudos. traduzidas pelos autores, exceto
social e política com história da arte, do design e da arquitetura A esta referência obrigatória, acrescentamos ampla bibliografia quando indicado.
em solo russo e soviético. Além disso, são apresentados alguns e notas coletadas ao longo de anos de pesquisa, aprofundada
textos complementares, a maioria deles fontes russas inéditas em a partir da nossa curadoria da mostra Vkhutemas: o futuro em
português, que trazem à tona vozes que se intercalam à linha nar- construção, 1918-2018 que percorreu, no Brasil, três unidades do
rativa, seja na forma de documentos históricos, de textos assina- Sesc São Paulo entre 2018 e 2019.
dos por protagonistas do período ou ainda digressões dos auto- Ao finalizar esta introdução, inspiramo-nos na obra inaugural
res que sintetizam alguns aspectos dignos de nota. de Sheila Fitzpatrick, pesquisadora que, em meados do sécu-
Ao pensar na construção deste livro, na estruturação de cada lo XX, realizou minuciosa investigação dos arquivos históricos
parte, estivemos atentos para um aspecto fundamental: lidamos sobre a constituição do Narkompros, concentrando-se na figu-
com um período em que a montagem – seja no cinema, na lite- ra sensível e generosa de seu Comissário, Anatóli Lunatchárski.
ratura ou na fotografia – foi a palavra de ordem e o procedimento Para Fitzpatrick (1970, p. 12), “[...] seria difícil ler os primeiros
norteador da produção artística. Com isso em mente, buscamos documentos do Narkompros sem notar a emoção que sentiam
construir o livro enquanto objeto estético e cognitivo, de modo os membros fundadores do Comissariado, em um mundo que
que o fio condutor de nosso texto seja poroso aos acréscimos de se buscava transformar para melhor”. A pesquisadora acrescen-
vozes individuais e coletivas que ecoam alguns dos elementos e ta: “Espero que meu relato conserve um pouco desta sensação”
circunstâncias narrados. (FITZPATRICK, 1970, p. 12).2
Esta obra, ainda que introdutória, pretende dar um passo para a Esta pesquisa nos colocou em contato com numerosos documen-
realização da urgente tarefa de resgatar essa experiência invisível, tos pouco examinados, que trazem à tona não apenas dados his-
mas de fundamental importância para a compreensão da história tóricos e conceitos, mas vidas inteiras dedicadas ao sonho de um
da arte, do design e da arquitetura contemporâneos, bem como mundo melhor, muitas das quais seriam solapadas na deriva da
do ensino destes saberes. Cientes deste fato fundador, buscamos revolução. E, assim como Fitzpatrick, nós também esperamos que
também estimular outras iniciativas de pesquisa que ampliem e nosso livro inspire em leitoras e leitores o sonho de um futuro que
aprofundem essa experiência iniciada há cem anos. continua em construção.
Ainda nesta introdução são oportunas algumas notas prelimina-
res. Comecemos pelo fato de que o nascimento dos Vkhutemas
está indelevelmente vinculado à emergência de muitos movimen-
tos artísticos, uma verdadeira proliferação de “-ismos”: Futurismo,
Suprematismo, Construtivismo, Produtivismo, Racionalismo,
Funcionalismo, Realismo, Cèzannismo, dentre outros. As variadas
correntes às quais se vinculavam artistas, designers e arquitetos
são amiúde tomadas como um todo indistinto, genericamente de-
nominado no Ocidente de vanguardas russas (ou, algumas vezes,
vanguardas soviéticas). Na Rússia Soviética, por sua vez, tais mo-
vimentos eram rotulados como “futuristas”. Essas nomenclaturas
serão discutidas já no capítulo “Contexto histórico e artístico re-
volucionário”. A escassez de informações sobre as atividades des-
ses grupos no Ocidente foi inicialmente compensada pelos tra-
balhos de Alfred Barr, nos Estados Unidos, e de Vittorio De Feo
e Camilla Gray na Europa. Não obstante, a notável experiência
14
16

PARTE 1
REVOLUÇÕES E PEDAGOGIAS

17
Ride, ridentes! Derride,

19
ARTÍSTICO E REVOLUCIONÁRIO
CONTEXTO HISTÓRICO
derridentes!
Risonhai aos risos,
rimentes risandai!
Derride sorrimente!
Risos sobrerrisos –
risadas de sorrideiros
risores!
Hílare esrir risos de
sobrerridores riseiros!
Sorrisonhos risonhos
sorride, ridiculai,
risando, risantes,
hilariando, riando, ride,
ridentes!
Derride, derridentes!

Velimir Khlébnikov1
18
O criador do termo foi o famoso artista e crítico Aleksandr Benois. Na

21
primavera de 1910, em uma resenha da exposição da União dos
A REVOLUÇÃO DAS VANGUARDAS Artistas Russos, ele dividiu todos os pintores que dela participavam
em vanguarda, centro e retaguarda (derrière-garde). Tendo acres-
centado a si e a seus amigos do Mir Iskússtva [Mundo da Arte] no
centro, ele ironicamente chamou de vanguarda os vários jovens mos-
covitas liderados por Mikhail Lariónov, que, em sua opinião, haviam
ido longe demais no caminho de destruir as normas aceitas na arte
Desde o final dos anos 1980, quando o chefe de estado soviético (VAKAR, 2005. p. 13).
1. “Encantação pelo riso”, de 3. Aleksandr Nikoláievitch
Mikhail Gorbatchóv (1931-) implementou as políticas da Glásnost Velimir Khlébnikov, em Augusto Diante dessas considerações iniciais, ao tratar do conjunto de artistas, Benois nasceu em São
(transparência) e Perestróika (reconstrução), que culminariam na dis- de Campos, Haroldo de Campos, professores e mestres que integram este segmento da arte na Rússia Petersburgo, em 1870, e
solução da União Soviética, em 1991, teóricos ocidentais da história Boris Schnaiderman, Poesia tido como “de esquerda”, utilizaremos a nomenclatura vanguardas notabilizou-se por sua grande
da arte russa e soviética questionam o uso da nomenclatura “van- Russa Moderna, São Paulo, erudição e potência criativa.
Perspectiva, 2001, p. 119. Ao russas, distinguindo, dentre elas, as que são adjetivadas como sovié- Atuou como historiador e
guarda” para nomear os heterogêneos agrupamentos de artistas contrário da datação registrada ticas, ou seja, aquelas que se manifestam a partir da Revolução de crítico de arte, além de ter sido
russos e soviéticos das três primeiras décadas do século XX. Jean- usualmente no Brasil, como sendo Outubro de 1917, e abarcam a arte, o design e a arquitetura. artista de múltiplas habilidades.
Claude Marcadé, por exemplo, afirma que essa categoria raramente 1910, este poema foi escrito entre Dedicou-se à pintura e ao
foi utilizada no período em que os artistas viveram e trabalharam; na 1908 e 1909 (MAIAKÓVSKI, Outro termo comumente aplicado aos agrupamentos de artistas rus- design gráfico e cenográfico,
Rússia, eles eram conhecidos como “artistas de esquerda”, ainda 1922, p. 304). sos e soviéticos é “utopia”. David Walsh, editor de arte do jornal nor- atividade na qual se distinguiu
te-americano Bulletin, destacou em 1993 questões históricas e inte- em toda a Europa. Além disso,
que essa posição não implicasse obrigatoriamente uma conotação foi o ideólogo e coordenador
2. Camilla Gray-Prokofieva lectuais, observadas por ocasião da extensa e diversificada mostra
política e, sim, acentuasse a diferença entre a concepção que ti- (1936-1971), historiadora de arte da associação (e revista) Mir
nham de arte em relação aos artistas tradicionais (MARCADÉ, 1995, de obras artísticas e de design, The Great Utopia: The Russian and Iskússtva [Mundo da Arte],
britânica. Seu livro The Great
p. 5-6). Susan Buck-Morss, por outro lado, esclarece que a expres- Experiment: Russian Art 1863- Soviet Avant-Garde, 1915-1932, exibida de 25 de setembro a 3 de fundada em 1898 e extinta em
são “vanguardas russas” (“Russian avant-garde”) passou a ser apli- 1922, publicado em 1964, foi a janeiro de 1992, no Museu Guggenheim, em Nova York. Walsh argu- 1927. Benois morreu em Paris
primeira obra de fôlego sobre menta que a exposição trouxe duas faces inequívocas, a artística e a em 1960.
cada sistematicamente após ter sido utilizada no Ocidente no início
arte russa e soviética publicada política, considerando inclusive o momento de sua realização: exata-
da década de 1960, quando a primeira obra sobre o trabalho desses fora da Rússia. Em 1963, quando 4. Walsh cita Natalia Adaskina,
artistas, The Great Experiment: Russian Art 1863-1922, foi publica- mente quando da derrocada da União Soviética (1991) e sua ampla
realizava pesquisas para seu “The Place of Vkhutemas”, in:
da por Camilla Gray,2 na Inglaterra. Ao incluir os russos sob a cate- livro em Moscou, conheceu Oleg divulgação no mundo todo, denotando o esforço conjunto e oportuno The Russian and Soviet Avant-
goria das “vanguardas”, a autora pretendeu aproximar os artistas do Prokófiev, filho do compositor do Ocidente e da Rússia para colocar em descrédito ou à margem a Garde (1915-1932), Nova
arrojado modernismo europeu aos russos da mesma época (BUCK- Serguei Prokófiev. Eles se Revolução de 1917, que teria sido irrelevante para a produção criativa York, Guggenheim Museum,
casaram em 1968, o que das vanguardas soviéticas e para as atividades dos artistas soviéti- 1992, p. 284.
MORSS, 2002, p. 303). John Bowlt, por sua vez, enfatiza a singula- provocou desconfiança por
ridade e a diversidade do fenômeno russo, tanto no que diz respeito cos impulsionadas pela formação de um Estado operário revolucio-
parte do governo britânico. A Aleksandra Ekster em frente às
à multiplicidade de correntes artísticas quanto às distintas formas de historiadora foi alvo de suspeitas nário (WALSH, 2010).
pinturas de Nadiêjda Udaltsova
arte, preferindo conceituar as vanguardas russas como um conjunto de espionagem a favor da União Walsh busca refutar os dois principais argumentos expostos no pre- na exposição “A Loja”, Moscou,
de múltiplos autores e obras em um contexto que propiciou transfor- Soviética. Em 1969, o casal 1916
se mudou para Moscou com a fácio do catálogo:
mações em todos os campos da arte russa nos anos de 1910 e 1920 filha pequena, mas o casamento (1) que a própria noção de arte que contribui para a mudança da rea-
(BOWLT, 1993). britânico foi contestado pelas lidade (ou a própria noção de mudar a realidade de uma forma pro-
A discussão sobre a procedência do nome, longe de ser desimpor- autoridades soviéticas, o que
forçou ambos a residirem em
gressiva em tudo) era utópica, e (2) que não havia conexão entre a
Revolução e a explosão de energia criativa ocorrida nas décadas de
tante, demonstra, inclusive, a necessidade de se pesquisar em fon- endereços separados. Em março
1910 e 1920 (WALSH, 2010).
tes russas. Segundo a pesquisadora sênior da Galeria Tretiakóv, Irina de 1970, casam-se novamente,
Vakar, coube a Aleksandr Benois3 dar o nome de vanguarda à irreve- dessa vez em Moscou, o que O crítico argumenta que as próprias obras expostas no Guggenheim
rente e inusitada arte russa nascida no início do século XX: não impediu que Camilla fosse documentavam a magnitude das pesquisas e projetos concebidos
considerada pela KGB suspeita
[...] diferentemente da França, onde as invenções na arte seguiram de espionar para os britânicos. O em várias esferas da atividade humana. Adicionadas a esta produção
em um ritmo histórico moderado, a Rússia experimentou uma situa- casal se muda para Sotchi, onde, magnífica e inalienáveis a ela, evidenciavam-se as contribuições prá-
ção de explosão na arte por volta de 1910. Os jovens rebeldes rom- em 17 de dezembro de 1971, a ticas da Revolução no campo da arte, que incluíram, entre outras coi-
peram os laços com a tradição, rejeitaram o conhecimento recebido historiadora, grávida do segundo sas, o estabelecimento dos Svomas (Ateliês Livres de Arte) no outo-
dos professores, sentindo que os fundamentos inabaláveis da arte filho, morre inesperadamente, aos
tradicional não eram mais capazes de expressar uma compreensão 35 anos, de suposta inflamação
no de 1918. Walsh cita ainda que “segundo uma historiadora da arte
do mundo em mutação. A coragem imprudente e o ardor beligerante hepática (Nicolete Gray, “20 russa, isso significava que ‘pela primeira vez em sua história, o ensi-
dos inovadores russos forçaram os contemporâneos a batizar esse de dezembro de 1972”, The no da arte na Rússia baseava-se nos princípios de liberdade e de-
fenômeno como uma vanguarda artística. Independent, p. 21; John Stuart, mocracia’”.4 A seguir menciona a criação do Departamento de Artes
Obituário, “Design”, Wayback Visuais (IZO, segundo sigla russa) do Narkompros, a organização da
Machine Archive, 1972).
20
Sociedade de Jovens Artistas (Obmokhu, conforme acrônimo russo)

23
em 1919 e, inclusive, a constituição dos Vkhutemas, em 1920, dentre
outras iniciativas culturais de grande porte.
Ainda para refutar a hipótese de “utopia”, Walsh demonstra a extensa
contribuição dos artistas soviéticos no campo da teoria e da estéti-
ca por meio da qual oferecem um entendimento da realidade material.
Ou seja, as realizações no campo da produção das obras, do ensi-
no revolucionário da arte e do design e do corpus teórico levantadas 5. Anatóli Vassílievitch
concomitantemente seriam argumentos suficientes para pôr abaixo a Lunatchárski (1875-1933)
nasceu em 1875 em Poltava, na
ideia de “utopia”. Ucrânia. Atuou como dramaturgo,
Em relação à desconexão entre Revolução e produção artística, tradutor, crítico de arte, além
de ter sido participante ativo
Walsh aponta a superficialidade intelectual, senão desonestidade das revoluções de 1905 e
desse entendimeno, e enumera dois argumentos em resposta: o pri- 1917. Foi um marxista, porém
meiro é que, apesar das mais variadas predileções e temperamentos, não orientado para facções, o
os artistas abraçaram a causa da revolução social e do comunismo; que provocou desconfiança
o segundo consiste em que houve uma complexa relação entre esfe- dos bolcheviques. Teve vários
desentendimentos com Lênin
ra cultural e política no curso da história com reverberações no âm- que, no entanto, reconhecia
bito internacional: suas múltiplas qualidades, tanto
A Revolução Russa não foi meramente um produto do aumento es- que o nomeou para o cargo
pontâneo da classe trabalhadora, sobre o qual foram enxertados de Comissariado do Povo
alguns slogans bolcheviques. O trabalho dos futuristas, suprema- para a Educação logo após a
tistas e construtivistas russos também não surgiu simplesmente por- Revolução de Outubro de 1917.
que esses artistas tiveram a oportunidade de ver algumas telas de Lunatchárski ocupou o posto
Picasso, Braque, Matisse e outros. até 1929, em meio a crescentes
adversidades por parte dos
A própria Revolução de Outubro foi produto de uma luta internacio- bolcheviques. Buscando
nal pelos mais altos princípios e ideais, que ocorreu ao longo de dé- vencer os entraves burocráticos
cadas, incluindo uma luta nas frentes cultural e estética. Por outro para a implantação do grande
lado, a transformação das formas artísticas nas primeiras décadas projeto pedagógico soviético
do século seria inconcebível sem o desafio intelectual e prático lan- ao lado de Nadiêjda Krúpskaia,
çado à sociedade capitalista pelo socialismo e pela classe trabalha- Lunatchárski deu continuidade
dora. O fato de a própria revolução ter impulsionado a experimen- às suas atividades intelectuais e
tação artística é um problema raramente debatido (WALSH, 2010). criativas. Foi apoiador de artistas
de todos os campos. Em 1933,
Na mesma linha, ao comentar os documentos concernentes à formu- foi nomeado embaixador na
lação da política e funcionamento do Narkompros, Fitzpatrick (1970, Espanha, cargo que não chega
p. 125) cita o “fervor revolucionário” dos artistas futuristas, além de a assumir. Morre a caminho, na
França, de uma possível angina
afirmar que “A primeira conversão em grupo para a ala bolchevique no peito. Suas cinzas foram
foi a dos futuristas, que anteriormente havia constituído a ala esquer- depositadas nas muralhas do
da da União das Artes” (FITZPATRICK, 1970, p. 126). Em 1919, ao Krêmlin, em Moscou.
escrever sobre a evolução do Futurismo como arte proletária, Anatóli
Lunatchárki5 afirma: Lázar Lissítski, “Bata nos
brancos com a cunha vermelha”,
O dinamismo e os métodos do trabalho criativo coletivo, tão carac-
1920
terísticos da arte futurista, evidentemente têm alguma relação com o
que o proletariado pode criar no campo artístico. Se não podemos
falar do Futurismo, em conjunto, como arte proletária, podemos falar
de artistas individuais de convicção futurista como artistas próximos
ao proletariado. E estamos vendo que esta arte jovem está conquis-
tando seu lugar como ideologia artística do proletariado (citado em
FITZPATRICK, 1970, p. 154).
A seguir, Fitzpatrick (1970, p. 155) ressalta: “Mas, a principal razão
para Lunatchárski patrocinar os futuristas é que este foi o primeiro
22
grupo artístico que ofereceu sua cooperação ao Narkompros e que

25
simpatizava com a Revolução”.
Em outra obra, dessa vez sobre a história da Revolução Russa, a pes-
quisadora aponta e ironiza os posicionamentos díspares frente aos
anos vermelhos e seus antecedentes, afirmando que “Não há nada
como uma revolução para provocar controvérsias ideológicas entre
seus intérpretes” (FITZPATRICK, 2017, p. 14). Contudo, ainda que a
ideologia paute as interpretações, há de se considerar que, nos últi- Cartaz do Teatro Futurista, São
mos dois séculos, houve na Rússia ao menos três revoluções: a de Petersburgo, 1913
1905, a de fevereiro de 1917 e a de outubro do mesmo ano. E mesmo
antes da culminância revolucionária, artistas de diversos campos se
posicionaram ao lado dos camponeses, do proletariado, dos estu-
dantes. Já em meados do século XIX, em plena autocracia tsaris-
ta, manifestavam-se publicamente, e não apenas por meio de suas
obras, engrossando a movimentação para quebrar os paradigmas
políticos do Império Russo.
Ainda hoje este estreito vínculo nem sempre é colocado em relevo,
mesmo entre os historiadores: talvez, a explicação para isso este-
ja no fato de que, no Ocidente, a história russa e soviética (e não
apenas a história da arte russa e soviética), “só se tornou um assun-
to de grande interesse depois da Segunda Guerra Mundial, princi-
palmente em um contexto de Guerra Fria, para ‘conhecer o inimigo’”
(FITZPATRICK, 2017, p. 15), e mais:
Antes da década de 1970, poucos historiadores ocidentais ousaram
se aprofundar no estudo da história soviética, incluindo a Revolução
Russa, em parte porque o tema estava muito carregado politicamen-
te, e em parte porque os arquivos e fontes primárias eram de difícil
acesso (FITZPATRICK, 2017, p. 15).
Podemos afirmar que o mesmo se aplica ao estudo das vanguar-
das russas e soviéticas do início do século XX: o acesso gradati-
vo aos documentos e bibliografia russas demonstram a necessida-
de de aprofundamento e revisão da complexidade desse fenômeno
artístico, ao menos a partir de meados do século XIX. Isso apenas
para destacar os antecedentes e a rede de relações que se forma-
ram em afinidade ou tensão com tendências diversas, inclusive inter-
nacionais. Embora os projetos artísticos que desabrocharam a partir
de 1917 não tenham sido consequência natural de seus antepassa-
dos, compreender o pretérito imediato pode estimular reflexões crí-
ticas às controvérsias interpretativas do que aqui denominamos arte
revolucionária.
Fitzpatrick também aponta para o necessário deslocamento de ponto
de vista quando se trata de dar nome a eventos que, embora tenham
ocorrido na Rússia, têm implicações mundiais. Não raro, a perspecti-
va russa é desconsiderada por historiadores ocidentais, uma proble-
mática que se acentua, segundo Fitzpatrick, diante das dificuldades
dos russos em relação a sua própria história revolucionária:
Até nomear a Revolução ficou complicado [para os russos do sé-
culo XXI]. A expressão “Revolução Russa” nunca foi usada na
24
Para o historiador dos

81
VKHUTEMAS | VKHUTEIN
primeiros anos do
Narkompros, a questão de
maior interesse está nas lutas
para traduzir as ideias para
a prática, encontrar formas
institucionais adequadas
em meio a uma situação
revolucionária. Neste sentido,
a história dos primeiros
tempos do Narkompros
representa um exemplo
dos problemas do Estado
revolucionário. Mas isto
não é tudo. Lunatchárski
acreditava que o comunismo
significava, sobretudo, a
educação do povo.
Sheila Fitzpatrick1
80
desse período passou a ser “Abaixo o Classicismo!” (KHAN-

83
AS MULHERES E
MAGOMEDOV, 1990, p. 43).
A PEDAGOGIA DO DESIGN Segundo as diretrizes bolcheviques para a educação e a cultu-
NA ANTÍTESE DA ARTE ra, a iniciativa de criação e manutenção de organizações educa-

Os Vkhutemas foram a mais importante iniciativa pedagógi-


A REVOLUÇÃO
cionais para a arte e técnica foi continuamente norteada por uma
agenda política oficial. A primeira grande reformulação do ensino
de artes e técnicas ocorrida em 1918, logo após a Revolução de
1. Sheila Fitzpatrick, Lunacharski Outubro de 1917, extinguiu as escolas imperiais de arte e de técni-

CELSO LIMA
ca de ensino superior do período pós-revolucionário soviético. y la organización soviética de la ca e levaram à criação dos Svomas, conforme descrito no capítu-
Distinguem-se por terem sido criados como uma instituição espe- educación y de las artes (1917-
lo anterior. A segunda ocorreu em 1920, com o desdobramento e
cial que propunha métodos de interação criativa entre mestres e 1921), México, Madri, Buenos
Aires, Siglo Veintiuno Editores, ampliação da ideia inicial dos Ateliês Livres em Ateliês Superiores,
estudantes de vários campos da arte. Ademais, buscavam integrar
1970, p. 14. os Vkhutemas (1920-1927), como uma instituição de ensino supe-
de forma produtiva os campos da arte e da técnica, como indica o
rior que reuniu inicialmente oito faculdades. Também foi por meio
próprio nome: Ateliês Superiores de Arte e Técnica.2 2. A palavra russa master- de uma agenda política oficial que se deu a terceira reformulação,
Conforme exposto nos capítulos anteriores, a história das extraor- skaia, presente tanto no nome que alterou substancialmente o caráter dos Vkhutemas, transfor-
dos Svomas (acrônimo de
dinárias e numerosas experimentações no campo artístico é inse- Gossudárstvennie Svobódnie
mando-os numa instituição de ensino técnico, o Instituto Superior
parável do percurso do Comissariado do Povo para a Educação Masterskíe) quanto em Estatal de Artes e Técnicas –Vkhutein (1927-1930), bem como
(Narkompros) e dos encaminhamentos políticos sucedidos de 1917 Vkhutemas (acrônimo de Víchie sua posterior extinção.
até 1932, ano em que o governo soviético estabeleceu uma diretriz Khudôjestvenno-Tekhnítcheskie
Masterskíe), tem sido vertida Por outro lado, evidencia-se que o percurso dessas organizações
oficial para as artes e sufocou qualquer manifestação discordante.
como “ateliê” ou “oficina”. Optou- educacionais foi marcado por intensos embates no campo teórico,
A estrutura institucional dos Vkhutemas em Moscou foi resultado se por “ateliê” pelo caráter abran- técnico e mesmo na arena pública, na definição dos conceitos e
da segunda reforma da educação artística após a Revolução de gente do termo, que se adequa metodologias que embasariam a construção do que poderia vir a
ao sentido inventivo e experimen-
1917, com a fusão dos Primeiros e dos Segundos Svomas. Após tal da produção mista de artes e
ser a cultura proletária.
a organização dos Svomas, mostrou-se necessário redefinir, rees- técnicas sob supervisão de um Ainda que se equiparassem a outras iniciativas pedagógicas de
truturar e desenvolver as experiências acumuladas com os primei- mestre ou mestra.
ensino superior existentes em outros países, como, mais notada-
ros ateliês dirigidos ao ensino das artes e das técnicas.
Alunos com estandarte da
mente, a Bauhaus, os Vkhutemas, por serem fundados em princí-
Da abertura até o encerramento, na escola se formaram 1398 Comuna Vkhutemas, Moscou, pios marxistas e revolucionários, tiveram um protagonismo singu-
pessoas, principalmente nas Faculdades de Arquitetura, Pintura 1923 lar, fundado numa percepção material da vida e, por isso, desde o
e Poligráfica. Em 1930, quando as faculdades foram extintas, início objetivou-se que o aprendizado levasse a uma transforma-
inicia-se uma nova reforma geral do ensino superior na União ção social efetiva. Assim, uma vez colocada em funcionamento, a
Soviética. Em 1929, Anatóli Lunatchárski e Nadiêjda Krúpskaia, escola alcançou um incomparável dinamismo que, por ser total-
que revolucionaram as diretrizes do ensino e da cultura como um mente inusitado, tanto no campo artístico quanto na perspectiva
todo no país, deixam o Narkompros. São outros tempos. Após do processo revolucionário, impulsionou mudanças e interações
o encerramento dessa grande experiência revolucionária, as fa- na criação estética cujo alcance, ainda hoje, é de difícil apreen-
culdades migraram para universidades especializadas correspon- são. Suas irradiações se expandiram para além do território e do
dentes, estabelecendo as bases para a atividade dos Institutos tempo soviético e ultrapassaram o campo exclusivo da arte, trans-
de Arquitetura de Moscou, Poligráfico de Moscou, de Belas Artes formando os processos e resultados daquilo que até então se co-
Proletárias, Têxtil e de Engenharia Florestal. Contudo, como vere- nhecia sobre o ensino da arte e da técnica no mundo. Métodos e
mos, não se tratou apenas de uma migração, mas, sim, da elimi- conceitos sobre a pedagogia e criação de arte, design e arquitetu-
nação de uma história em construção ou, melhor dizendo, da his- ra foram ampliados; conceitos como “arte como mercadoria”, “ob-
tória de uma pedagogia fundada em rico e diverso diálogo entre jeto ornamental” foram colocados em xeque.
diferentes tendências de vanguarda, como o Construtivismo, o
Mestres e estudantes se vinculavam às mais diversas orientações,
Suprematismo, o Racionalismo etc.
progressistas ou conservadoras, sendo que a pauta comum con-
Antes de discutir seu fim, ocupemo-nos de seu nascimento. sistia na experimentação artística para alcançar os objetivos nor-
Segundo Khan-Magomiédov, a criação dos Vkhutemas surge, teadores da constituição da escola. A decisão do Conselho dos
também, por reivindicação dos estudantes para a substituição de Comissários do Povo sobre a sua formação, em 25 de dezembro
procedimentos considerados subjetivos, implementados nos ate- de 1920, não deixava dúvidas sobre a finalidade dos Vkhutemas:
liês individuais por métodos ditos objetivos. A palavra de ordem “uma instituição educacional superior técnica e industrial com o
82
objetivo de preparar artistas e mestres altamente qualificados

85
para a indústria, bem como instrutores e gestores para o ensi-
no profissional” (Decreto do Conselho dos Comissários do Povo.
Sobre os Ateliês Superiores de Arte e Técnica de Moscou, 1920).3
Embora as obras produzidas nos Vkhutemas, ou altamente ins-
piradas pelas dinâmicas da escola, tenham grande apelo esté-
tico — e daí pesquisadores como Khan-Magomiédov, Natalia
Adáskina e Jean-Claude Marcadé terem aprofundado o estudo 3. “Sobránie uzakónenii
das obras e procedimentos de mestres e alunos considerando i rasporiajénii pravítelstva
za 1920 g”. Statia no. 522.
suas indiscutíveis contribuições para arte, design e arquitetura, Dekrét Soviéta Naródnikh
os Vkhutemas, no conjunto de seu projeto pedagógico, estive- Komissárov. O Moskóvskikh
ram inexoravelmente implicados no processo revolucionário e no Víschikh Gosudárstvennikh-
contexto soviético do período. Tekhnítcheskie Masterskíkh.
[Coleção de leis e decretos do
Se é verdade, como afirma Khan-Magomiédov, que o “estilo mo- governo para 1920, nº 98, de 19
derno não surgiu como resultado de uma transformação parcial de dezembro de 1920. Artigo nº
dos sistemas estilísticos-artísticos de composição anteriores”, 522. Decreto do Conselho dos
Comissários do Povo. Sobre
como costumava acontecer no passado, e que foi “necessário os Ateliês Superiores de Arte e
um colapso radical dos meios e métodos tradicionais de evolu- Técnica de Moscou].
ção por séculos (geralmente servindo a vários estilos ‘históricos’)
de expressão artística” (KHAN-MAGOMIÉDOV, 1995, p. 7), não 4. Sobre a produção de
é menos verdade que, com o advento da Revolução, o estilo fu- sentido e a natureza social
turista, ou de esquerda, não apenas confrontou estilos históricos, da enunciação ver Valentin
Volóchinov, Marxismo e filosofia
mas radicalizou em um enfrentamento aguerrido contra os artis- da linguagem: problemas
tas de direita, os quais em nenhum momento cederam terreno. fundamentais do método
Ao contrário: a luta encarniçada entre estas duas posições, fu- sociológico na ciência da
turistas e realistas, ou como nomeara Benois, vanguarda e reta- linguagem, São Paulo, Editora
guarda, não conheceu trégua e só se encerrou com a liquidação 34, 2017. Sobre arte como
texto e linguagem artística, ver
da própria instituição. Nesta disputa de linguagens, Vkhutemas e Yuri M. Lotman, Estructura del
Vkhutein sucumbiram sob o peso da retaguarda, do estilo realis- texto artístico, Madri, Ediciones
ta, desta vez apropriado pelo poder do Soviete Supremo sob a Istmo, 1982.
denominação de Realismo Socialista.
Aleksei Gan no jardim da datcha
Nesse sentido, aqui interessa avançar com ferramentas de análise da família Vesnin
que permitam abarcar a relação da escola com sua própria histó-
ria e seu destino trágico, considerando que o processo artístico é
um dispositivo construtor de discurso e, portanto, carrega consi-
go sua natureza comunicativa e a emergência de sentidos quando
em interação social.4
Em linhas gerais, na dinâmica dos Vkhutemas se interconectam po-
sicionamentos e confrontos sócio-políticos que resultaram em pro-
cedimentos estéticos motivados pela transformação de um mundo,
senão construção de um novo mundo. Por meio dos métodos pe-
dagógicos elaborados a partir do esforço de cada mestre e mestra,
com suas habilidades e motivação para tornar a arte um instrumen-
tal para a vida cotidiana de uma nova sociedade, com suas pesqui-
sas constantes e um nível de experimentação jamais alcançado, é
possível observar o poder transformador da linguagem para a ela-
boração de discursos imagéticos e teóricos de complexidades di-
versas e de objetivos totalmente distintos: a esquerda buscou levar
84
112

PARTE 2
FACULDADES

113
Nossa escola tem por

115
E PREPARAÇÃO (IPO)
DEPARTAMEMTO DE EXPERIÊNCIA
missão a formação de
trabalhadores ativos dentro
do segmento artístico.
Liubov Popova1
114
117
ENSINAMENTOS PROPEDÊUTICOS

Com a reorganização dos Svomas como cursos superiores nos 1. Liubov Popova citada em
Vkhutemas, todos os seus programas são revistos, analisados Selim Khan-Magomedov,
e submetidos à aprovação pelo Conselho Científico do Instituto VHUTEMAS. Moscou 1920 –
de Cultura Artística (Inkhuk) já em dezembro de 1920, que tam- 1930, Paris, Editions du Regard,
bém organiza uma exposição com trabalhos dos Ateliês Livres de 1990, p. 265.
pintura, escultura e arquitetura. Essa mostra divergia de qualquer
outra exibição de arte e design, já que todos os trabalhos traziam Alunos dos Vkhutemas na aula
soluções técnicas e abordagens científicas aos problemas apre- da disciplina Volume, estudo
sentados durante os cursos, divididos em sete categorias: proble- para identificação de massa e
peso. 1925
mas com cores; problemas de volumes; problemas espaciais; pro-
blemas de construção; problemas de fabricação; problemas com Mostra de trabalhos dos alunos
materiais; e, por fim, problemas com formas, estes apresentadas da disciplina Espaço do IPO,
em três subcategorias: linha, superfície e volume. Vkhutemas, 1926

Uma das características dos Svomas era a ausência de pré-requi-


sitos para o ingresso de alunos e alunas em seus diversos ateliês,
já que o objetivo maior era democratizar o ensino para as classes
trabalhadoras, proletários e camponeses. Independentemente
de valores relacionados a seus talentos naturais e conhecimen-
tos empíricos sobre os mais diversos ofícios, o grau de instrução
desses alunos compreendia em geral o nível primário. Foi cria-
da, então, um núcleo de preparação teórica e treinamento téc-
nico com um ano de duração em ambos os Svomas. Ao final do
primeiro ano, contudo, esses cursos preparatórios não apresen-
taram resultados significativos (KHAN-MAGOMEDOV, 1990,
p. 257 e 259). Como os ateliês tinham autonomia plena para ado-
ção de programas pedagógicos e eram dirigidos por artistas de
diferentes tendências, foi possível observar a excelência dos pro-
fissionais eleitos como mestres e mestras para pintura, escultura
e arquitetura que ensinaram dentro dos Svomas.
Os ateliês com maior diversidade nas propostas dos docentes
eram os que integravam o departamento de pintura. Ali, artistas
como Piotr Kontchalóvski, Aleksandr Kuprin, Aristarkh Lentúlov,
Iliá Machkov, Aleksandr Osmiórkin, Vassíli Rojdiéstvenski e Robert
Falk dirigiam ateliês de maneira conservadora, conforme as tradi-
ções imperiais de pintura, apesar das inovações e novas diretrizes
para o ensino público propostas pela Revolução. Os programas
traziam grandes influências dos professores sobre os estudantes,
não deixando margem para gestos de criatividade mais autoral
e laboratorial dos aprendizes em relação à pintura e ao dese-
nho. Já os ateliês em que ensinavam os professores oriundos
das vanguardas artísticas (de movimentos como Suprematismo,
Cubofuturismo e Objetismo) e que traziam novas tendências de
116
ensino – como Vassíli Kandínski, Kazimír Maliévitch, Vladímir Tátlin,

119
Nikolai Pevsner e Aleksei Morgunov –, abriram novas possibilida-
des criativas para os estudantes, com descobertas técnicas e
novas propostas para a realização artística.
Apesar das divergências, todos os docentes percebiam graus de
dificuldade semelhantes para a transmissão de conhecimentos e
descobertas aos estudantes. O problema foi resolvido com a ins-
talação de novos métodos pedagógicos comuns que agregassem 2. A oposição entre os arquitetos
disciplinas propedêuticas, de formação básica, que habilitariam da esquerda, fundadores de
grupos como a União dos
os estudantes a progredirem para cursos superiores e especiali- Arquitetos Contemporâneos
zantes. Ao final dos cursos básicos, teriam adquirido conhecimen- (OSA) e a Associação dos
tos sobre a realidade artística, histórica e a demanda de sua época Novos Arquitetos (Asnova), e
por novas tendências (KHAN-MAGOMEDOV, 1990, p. 49 e 50). os neoclassicistas chegou a tal
ponto de hostilidade que, em abril
Nos ateliês de arquitetura dos Svomas dirigidos por represen- de 1919, Lunatchárski decidiu
tantes da corrente neoclássica, impõe-se um choque entre do- dividir o segmento de arquitetura
centes inovadores e tradicionalistas. Descobertas experimentais num departamento independente,
comandado por Joltóvski (KHAN-
para o ensino realizadas por arquitetos como Nikolai Ladóvski e MAGOMIÉDOV, 1996).
Aleksandr Vesnin são rejeitadas por serem desconhecidas e inu-
suais. Diante dessa situação, um impasse se coloca aos estudantes, 3. Departamento de Experiência
ainda expostos a programas de ensino de linguagens tradicio- e Preparação, em russo:
nalistas, os quais serão rejeitados nos Vkhutemas por serem Ispitátelno-Podgotovítelnoe
considerados oriundos de concepções pequeno-burguesas Otdeliénie (IPO).
e anti-revolucionárias, em favor de novos programas propostos
4. Os métodos psicoanalíticos
pelos mestres e mestras construtivistas e racionalistas.2 serão detalhados no item sobre
Nos anos de 1921 e 1922, contudo, docentes conservadores e mo- “Espaço: os Obmas de Nikolai
Ladóvski” deste capítulo.
dernistas ainda dividem as salas das faculdades dos recém-forma-
dos Vkhutemas e apresentam seus programas de formação básica e
especializantes. A partir de 1922, as disciplinas propedêuticas serão I. Volodko e I. Iozéfovitch,
reunidas num departamento à parte, denominado Departamento de exercício de produção sobre
dinâmica, ritmo, distribuições
Experiência e Preparação (IPO),3 onde todos os alunos recebem, por e proporções em eixo vertical,
um ano, uma formação geral, teórica e artística, que possibilitasse sobre projeto para edifício do
seu posterior ingresso nas faculdades escolhidas. Soviete Supremo da Economia
Nacional em Moscou. Fachadas
Esse planejamento do Narkompros para a formação em nível e axonometria realizados nos
superior prevê um engajamento absoluto dos novos profissio- Obmas, 1924-1925
nais na nova ordem política, cultural e econômica soviéticas. Nos
Vkhutemas, as experiências em formação propedêutica são um
tanto distintas de outras escolas superiores, dada a diversidade
de pensamento e linguagens propostas pelos novos mestres e
mestras oriundos das cenas revolucionárias das artes, e também
por uma certa autonomia da escola, uma herança dos Svomas
como espaços educacionais laboratoriais.
No caso da Faculdade de Arquitetura, por exemplo, o IPO é
composto por dois núcleos: os Ateliês Unidos (Obmas), dirigidos
por Nikolai Ladóvski e Vladímir Krínski, e o ateliê de Iliá Gólossov
e Konstantin Miélnikov. A partir de 1923, os métodos psicoana-
líticos4 de Ladóvski serão unificados e eleitos como programas
únicos a serem administrados.
118
As disciplinas propedêuticas ministradas aos alunos da Faculdade

121
de Escultura se integravam aos programas especializantes, com
uma atuação conjunta dos mestres, que apresentavam as noções
de formação básica em exercícios e trabalhos de ateliês no desen-
volvimento técnico e artístico dos alunos já envolvidos na criação
de projetos. Seus mestres eram Boris Koroliov, Anton Lavínski e
Aleksei Bábitchev.
Na Faculdade de Pintura, são criados ateliês dedicados aos V. Lavrov, exercício de
programas propedêuticos divididos em cinco núcleos: cor, forma, produção sobre dinâmica, ritmo,
distribuições e proporções em
construção, fabricação e materiais. Muitos mestres atuaram dentro eixo vertical, sobre projeto para
do método objetivo de ensino, apresentado ao Instituto de Cultura edifício do Soviete Supremo da
Artística (Inkhuk) por Ródtchenko, Popova, Udaltsova e Vesnin, Economia Nacional em Moscou.
o qual consistia numa abordagem técnica e científica da pintura, Fachadas e axonometria
transformando-a numa atividade laboratorial. Tratava-se de uma realizados nos Obmas,
1924-1925
proposta que atendia às demandas dos construtivistas, e que en-
frentou grandes resistências por parte dos mestres conservado-
res da instituição. No entanto, a partir de 1922, graças ao sucesso
junto aos estudantes e também aos resultados obtidos, o método
objetivo determina as disciplinas que constituem o IPO, agora um
departamento de ensino independente das faculdades, caracte-
rizado por um ensino interdisciplinar propedêutico, que promove
uma nova integração entre todas as faculdades dos Vkhutemas
na primeira metade da década de 1920. O IPO era composto de
quatro núcleos disciplinares: Cores, Espaço, Volume e Desenho.
Atendiam a turmas de alunos de todas as faculdades, mas eram
direcionados para uma formação propedêutica determinada pelas
necessidades técnicas e criativas de cada segmento.
No início de 1922, a grade e carga horária semanal para disciplinas
artísticas e científicas do IPO era a seguinte:
Segundas-feiras: Cores, com os mestres Liubov Popova e
Aleksandr Vesnin, com carga horária de três horas, e parti-
cipação das turmas das Faculdades de Pintura, Poligráfica,
Têxtil e de Cerâmica.
Terças e Quintas-feiras: Desenho, com os mestres Aleksandr
Ródtchenko, Viktor Kisseliov e Ivan Efímov, com carga horária de
três horas diárias, para as turmas das faculdades de Pintura, Têxtil,
Poligráfica e Cerâmica.
Quartas-feiras: Espaço, com os mestres Nikolai Ladóvski, Nikolai
Dokutcháiev e Vladímir Krínski, com carga horária de três horas e
participação das turmas das Faculdades de Trabalho em Madeira,
de Trabalho em Metal, de Arquitetura e de Escultura.
Sábados: Volume, com o mestre Anton Lavínski, com carga horária de
quatro horas e participação das turmas das Faculdades de Trabalho
em Madeira, de Trabalho em Metal, de Arquitetura e de Escultura
(KHAN-MAGOMEDOV,1990, p. 260).
Os alunos também realizavam estudos e trabalhos das disciplinas
propedêuticas em ateliês com aulas práticas, como construção
120
Os projetos encomendados

139
FACULDADE DE ARQUITETURA
pela escola aos alunos, a
título de exercício, têm
íntima relação com a prática
construtiva em uso, com os
programas arquitetônicos
de diversas comunas e
instituições nacionais. Com
isso, estabeleceu-se uma
fonte que possibilita ao
encarregado pela construção
criar continuamente novas
ideias. Assim, a escola,
muitas vezes acusada de
“utopismo”, se transforma em
pioneira da construção.
El Lissítski1
138
141
UMA ARQUITETURA
REVOLUCIONÁRIA

Espaço, massa, ritmo. Somados a esses elementos de formação 1. “Escolas de Arquitetura”,1929,


do projeto arquitetônico, os ideais revolucionários de 1917 trazem in: El Lissitzky, Rússia: a
um novo requisito para a moradia e o espaço público: o coletivo. reconstrução da arquitetura
A proposta comunal de vida do projeto socialista soviético impunha na União Soviética, Tradução
um incontornável desafio à arquitetura que pretendia erguer as es- Renata Dias Mundt, Estação
Liberdade, São Paulo, 2019,
truturas dessa nova sociedade. Na Faculdade de Arquitetura dos p.77 e 78.
Vkhutemas, o Construtivismo se impôs às velhas tradições com um
novo pensamento funcional, material e de projeto. Para isso, foram Nikolai Ladóvski com alunos da
instituídas novas pedagogias e propedêuticas, as grandes respon- Faculdade de Arquitetura, c. 1920
sáveis pelas propostas revolucionárias que surgiram então.
Para a revolução da cultura do morar eram necessárias mudanças
que superassem os cânones da nobreza e da burguesia. A educa-
ção e formação de novos valores sociais exigia inovações no de-
senho e no uso espacial para o projeto da nova moradia. Assim, a
arquitetura, aliada às novas tecnologias, se tornou uma das gran-
des ferramentas transformadoras para a nova construção social.
Técnica, cálculo e réguas matemáticas projetam uma utilização
econômica, elementar e eficiente do espaço. A geometria dissolve
as massas para a harmonia funcional das estruturas de uma nova
forma de morar e de conviver – um grande maquinário social da
era moderna, como afirmou Lázar Lissítski (LISSITZKY-KUPPERS,
1977, p. 28), um dos mestres da revolução na arquitetura. O arqui-
teto francês Le Corbusier se apaixonou pela geometria e engre-
nagens em movimento: “A máquina é cálculo [...] A geometria é a
expressão gráfica do cálculo [...] a geometria é a nossa grande e
apaixonada criação, [é] o espírito da perfeição posto em evidência
esse novo requisito é privilegiado por praticamente todas as pro- Projeto de diplomação “Cidade
pela perfeição geométrica” (LE CORBUSIER citado em DE FEO, Nova”, perspectiva axonométrica,
postas arquitetônicas da escola, seja em edifícios residenciais,
2005, p. 40). Valentin Semiónovitch Popov,
institucionais ou de utilidade pública. 1928, supervisor Nikolai
E pela primeira vez na história do design, um número maior de Ladóvski
Muitos mestres e alunos se destacaram com perspectivas inusitadas
mulheres foi aceito numa escola de arquitetura, alunas que se tor-
para o projeto arquitetônico, privilegiando propostas condensadoras
nariam profissionais brilhantes como Lídia Komarova e Rachel
sociais e construtoras de um novo espaço público urbano pelas pre-
Smoliênskaia dividiam salas e corredores com mestres e colegas de
missas dos movimentos construtivistas e racionalistas soviéticos,
ambos os sexos, uma vez que o fim da distinção de gênero no ensino,
matriz da arquitetura moderna no século XX e cujas linhas hoje in-
no trabalho e na vida era uma das grandes propostas da revolução.
tegram a paisagem de praticamente todas as cidades do mundo.
Num país que possuía, então, um expressivo déficit social, a
Neste livro, apresentaremos algumas dessas mulheres e homens
moradia era um dos principais problemas para os revolucioná-
que participaram ativamente da reconstrução urbana da União
rios no poder. Segundo Lênin, “complexos residenciais comunais
Soviética desde o surgimento das novas linguagens para o proje-
devem substituir as casas burguesas, agora expropriadas e con-
to arquitetônico, no início dos anos 1920, com propostas de reno-
vertidas em moradias para os trabalhadores, mas desconfortáveis
vação que buscaram atender às demandas revolucionárias de um
e estranhas aos novos anseios igualitários de convívio” (citado
novo morar, coletivo e comunal.
em KÓLESSOV, 1999, p. 73). Convívio coletivo e compartilhado:
140
143
A FACULDADE DE ARQUITETURA
NOS VKHUTEMAS E NO VKHUTEIN

A Faculdade de Arquitetura dos Vkhutemas foi criada no processo, 2. Konstantín Miélnikov (1890-
ocorrido em outubro de 1920, de reorganização dos Primeiros 1974) se apresenta inicialmente
e Segundos Svomas em cursos superiores de formação profis- como um professor com
sional. Os Svomas, que tinham caráter laboratorial e apresenta- programas conservadores, mas,
ram programas tanto de mestres tradicionalistas (como Aleksei a partir de 1923, integra o grupo
dos arquitetos construtivistas
Schússev, Ivan Rílski, Leonid Vesnin e Serguei Tchernichiov, entre influenciado por Gólossov.
outros) quanto de arquitetos vanguardistas (como Nikolai Ladóvski,
Nikolai Dokutcháiev e Vladímir Krínski) foram convertidos em fa-
culdades para formação de profissionais responsáveis pelo novo
projeto arquitetônico soviético.
Essa divisão do corpo docente estabelecida dentro dos ateliês
influenciou a constituição da Faculdade de Arquitetura, aberta em
janeiro de 1921, dividida em: Primeiro Departamento, composto por
programas dos mestres tradicionalistas; e Segundo Departamento,
com os mestres da esquerda, oriundos da recém-fundada Obmas,
e seus programas que pretendiam modernizar o ensino da arquite-
tura, inclusive com a introdução de disciplinas propedêuticas inédi-
tas e importantes. Tal divisão se mantém até 1926.
Dois arquitetos, no entanto, se recusam a se filiar a esses depar-
tamentos: os construtivistas Iliá Gólossov e Konstantín Miélnikov.2
Em 1922, foram convidados a integrar o Segundo Departamento,
mas se negam a fazê-lo, e, em novembro desse mesmo ano, seus
ateliês constituem o Terceiro Departamento, que funcionará por
apenas dois anos, tendo suas atividades encerradas em 1924.
Isso provocou a saída de Miélnikov, que retornaria apenas em
1927, quando atuou como professor do Vkhutein até fechamen-
to da instituição em 1930 (KHAN-MAGOMEDOV, 1990, p. 565).
Os grupos de professores representavam tendências rivais
dentro da faculdade: orientações conservadoras, defendidas por
professores oriundos das antigas escolas imperiais, e moder-
nizantes, com destaque para os racionalistas, comandados por
Nikolai Ladóvski; e as construtivistas, lideradas por Aleksandr
Vesnin. Em 1923, as duas vertentes vanguardistas convergem
em programas e objetivos fundando o Departamento Principal,
o qual agregava disciplinas propedêuticas criadas por mestres
construtivistas e racionalistas, neutralizando a ação dos pro- Alunos na exposição de seus
fessores tradicionalistas, que, com isso, se retiraram da escola. projetos escolares, 1923
Com a saída da ala conservadora em 1926, tanto construtivistas
quanto racionalistas entendem que não existe mais sentido para
a divisão, subsistindo apenas o Departamento Principal (KHAN-
MAGOMEDOV, 1990, p. 505-6).
142
Contudo, a aproximação dos membros da Asnova com os cons-

145
trutivistas não se deu sem choques. Em 1923, numa edição da
LEF, o grupo construtivista da Faculdade de Arquitetura publica
um texto em que se afirma:
[...] nenhum dos ateliês dos Vkhutemas se encontra num impasse
tão desesperador quanto o dos arquitetos unidos da esquer-
da, que surgiram como um protesto legítimo contra a arquitetura
antiga. É preciso que transitem para a construção real [...] É ne-
cessária uma guinada séria em direção à arquitetura industrial, Lázar Lissítski, capa do catálogo
com adequação dos estudos de ângulos, volumes e espaço Arquitetura dos Vkhutemas:
1920-1927, Moscou, 1927
(ARQUITETURA do Vkhutemas, 1923, p. 29).
Em fevereiro de 1924, Nikolai Ladóvski escreve para Lázar Lissítski,
que se encontrava no estrangeiro:
Precisamos reverter a opinião pública influenciada por Schússev e
Joltóvski para o nosso lado [...] Uma das tarefas da Asnova é con-
quistar a juventude proletária da rabfak e dos Vkhutemas. Aqui,
nossa arma ideológica deve ser extremamente precisa, afiada e
clara (citado em KHAZANOVA, 1970, p. 122).
A partir de 1924, os dois grupos convergem e formulam a grade
curricular da escola entre as correntes construtivista e racionalista.
Em 1925, o conjunto de propedêuticas para Volume e Espaço, de
Ladóvski, recebe um prêmio na Exposição Internacional de Artes
Decorativas e Industriais Modernas de Paris.
Com o movimento construtivista alinhado com os métodos racio-
nalistas, as novas pedagogias passam a formar profissionais de
arquitutera engajados no pensamento e no projeto de estruturas
transformadoras do novo convívio social, atendendo a demandas
de coletivização das ações cotidianas e de construção comunal.
Em 1926, o arquiteto Moissei Guínzburg afirma:
As condições sociais de nosso tempo são tais que apenas levan-
tam secundariamente as questões do desenvolvimento artístico
individual da arquitetura, chamam nossa atenção principalmente
para o problema de novos tipos racionais de arquitetura e, incluin-
do o arquiteto na cadeia geral de produção do país, destroem o
isolamento que existia antes entre os diferentes tipos de arquite-
tura e engenharia. Obviamente, o complexo desenvolvimento de
nossa vida é tal que, mais do que nunca, obriga o arquiteto a se
especializar em um ou outro campo, mas, ao mesmo tempo, todos
os arquitetos modernos têm uma crença firme na singularidade
de sua atividade criativa: alguns estão ocupados criando um tipo
de moradia nova, outros, instalações públicas e ainda outros, uma
nova fábrica ou instalação. E precisamente porque as estruturas
de uma fábrica e um caráter de engenharia nunca estavam estrei-
tamente ligados às rígidas tradições do passado artístico, elas se
mostraram, de acordo com os princípios de sua criação, muito
mais responsivas às necessidades do momento, mais adequa-
das para servir a uma nova vida. Assim, em nossa opinião, a linha
entre uma estrutura civil ou de engenharia não foi apenas apagada
[...]. O arquiteto estabelece em seu trabalho o caminho do princi-
pal para o secundário, do esqueleto ao casco. Somente o pensa-
mento arquitetônico funcional estabelece rigidamente a organi-
zação espacial como ponto de partida do trabalho, indica o local
para onde a ação principal deve ser dirigida. Assim, verifica-se
144
Que meio mais potente

217
FACULDADE DE CERÂMICA
poderia ter havido
para experimentos na
criação de uma estética
nova e revolucionária,
adequada para atender
às necessidades e
sonhos dos povos
de uma República
Socialista Federativa
Soviética Russa do que
pratos que antes eram
destinados às mesas
dos tsares?
Emma Crichton-Miller1
216
219
A AGITAÇÃO DOS PRATOS, XÍCARAS
E TIGELAS IMPERIAIS

O ano de 1917 ainda não havia terminado quando Anatóli 1. Emma Crichton-Miller, “The 4. O nome foi uma homenagem
Lunatchárski observou o quanto a cerâmica poderia ser um tale of Russia’s revolutionary a um dos maiores cientistas
precioso meio de comunicação na nascente União Soviética. ceramics”, RA Magazine, London, russos, Mikhail Vassílievitch
Royal Academy, Spring 2017 Lomonóssov (1711-1765)
Vale recordar que há cem anos não havia redes sociais e sequer issue. Disponível em: <https:// que, dentre múltiplos saberes
a possibilidade de enviar e-mails, — o uso da internet ocorreria www.royalacademy.org.uk/article/ sobre física, química, geografia,
somente nos anos 1990, após o surgimento dos computadores magazine-the-tale-of-russias- história, astronomia e filologia
pessoais —, e o sistema de telefonia móvel no início do século revolutionary-ceramics> Acesso e atribuições como professor
em: 16.05.2020. e conselheiro do Império, foi
XX era apenas objeto de ficção científica; a televisão, por sua vez, também responsável pela fábrica
só chegaria à casa dos telespectadores após a Grande Guerra 2. A expressão Grande Guerra de porcelanas, em 1762.
Patriótica,2 ou seja, em meados do século passado. Patriótica foi ouvida pela primeira
vez em 22 de junho de 1941, Jovem ceramista na Fábrica
Assim, os suportes para a propaganda revolucionária, conhecida na voz do locutor preferido de Imperial de Porcelana de
como agitprop (cf. capítulo sobre a Faculdade de Pintura), incluíam Stálin, Iuri Boríssovitch Levitan Petrogrado
todas as possibilidades midiáticas então existentes: cartazes, (1914-1983), em transmissão
livros, trens, barcos, vitrines de lojas, praças públicas, paredes in- pela agência de notícias Tass Serguei Tchekhónin, prato com
ternas e externas, além do rádio e, também, a mais nova das artes para anunciar a entrada da a inscrição “A tarefa da ciência é
União Soviética na Segunda servir às pessoas”, 1918
desse período: o cinema. Para trabalhar com esses suportes, Guerra Mundial: “Atenção, aqui
foram convocados muitos artistas, da vanguarda e da retaguarda, fala Moscou. Transmitimos uma
os quais não mediram esforços para fazer valer suas ideias diante importante mensagem do governo.
da urgência e abrangência da causa: comunicar a ideologia bol- Cidadãos e cidadãs da União
chevique. Nesse contexto, a cerâmica aparece como valioso meio Soviética! Hoje, às 4 horas da
manhã, sem qualquer declaração
comunicacional, uma possibilidade vislumbrada por Lunatchárski de guerra, as forças armadas
desde o início, quando, ainda em Petrogrado, os bolcheviques alemãs atacaram as fronteiras da
assumiram a direção da Fábrica Imperial de Porcelana (IFZ, na União Soviética. A Grande Guerra
sigla russa), fundada em 1744 pela tsarina Isabel (1709-1762).3 Patriótica do povo soviético contra
Em 1918, o nome da fábrica foi alterado para Fábrica Estatal de os invasores alemães-fascistas
[nazistas] começou. Nossa causa
Porcelana (GFZ, na sigla russa) e, em 1925, próximo à comemo- é justa, o inimigo será derrotado. A
ração do bicentenário da Academia Russa de Ciências, foi reno- vitória será nossa!” Disponível em:
meada como Fábrica de Porcelana de Leningrado Lomonóssov4 <https://tass.ru/spec/june22nd>
(LFZ, conforme a sigla russa). Acesso em 10.05.2020. E assim
foi, até que o Exército Vermelho
Em 1917, a Primeira Grande Guerra ainda estava em curso. Os rendeu os nazistas na capital
operários da IFZ, a exemplo dos trabalhadores de outras fábricas, alemã, em 9 de maio de 1945,
estavam na frente de batalha e seus postos na decoração das lou- data celebrada na Rússia e ex-
repúblicas soviéticas aliadas até os
ças brancas estavam vagos. Consequentemente, havia um gran- dias de hoje como Dia da Vitória.
de estoque de pratos e outras peças de serviço de jantar e café
que não haviam recebido a pintura decorativa final. Lunatchárski 3. Para saber mais sobre a
não tardou a observar o estado em que se encontrava a fábrica, história da porcelana na Rússia
com grande parte do maquinário e instalações paralisadas, aguar- e seu desenvolvimento no
dando mão de obra especializada. O Comissário do Povo para a período soviético, consultar Nina
Lobanov-Rostovsky, Revolutionary
Educação notou o potencial de agitação das louças que se asse- Ceramics: Soviet Porcelain, 1917-
melhavam a folhas em branco. Uma vez decoradas, essas peças 1927, London, Studio Vista;
seriam conhecidas como agitfarfor (acrônimo russo para aguitat- Cassell; New York, Rizzoli, 1990.
siônni farfor, ou seja, porcelana de agitação) e levariam consigo,
218
céleres, as mensagens da Revolução para todos os cantos da uma instituição de ensino superior fosse criada e, ainda, que

221
5. Cf.: Galeria Liérmontov “A
União Soviética. Além de subordinar a fábrica de porcelanas ao lendária fábrica de porcelana abrigasse em seu campus uma Faculdade de Cerâmica, o que
Narkompros, Lunatchárski instalou o escritório do comissariado russa (LFZ)”. Disponível em: de fato ocorreu com apoio integral de Lunatchárski.
dentro da fábrica, onde também criou um laboratório de cerâmica https://lermontovgallery.ru/
“em escala republicana”5 para experimentações e desenvolvimen- spravochnik-antikvariata/
legendarnyy-russkiy-farfor-ifz/.
to de novas tecnologias para a indústria soviética. Esse processo Acesso em: 11.05.2020.
implicou um investimento substancial em ciência e pesquisa para
expandir o conhecimento sobre os silicatos.6 6. Os silicatos são compostos 8. Causa estranhamento que,
químicos (de silício e oxigênio após as duas alterações do
Para o nascente projeto de comunicação por meio da cerâmica, mais algum outro mineral nome da Fábrica de Porcelanas,
Lunatchárski nomeou como diretor artístico Serguei Tchekhónin,7 em diferentes combinações) apontadas no início deste capí-
designer gráfico e ilustrador que, além de realizar notáveis ca- presentes na constituição tulo, passados cem anos, a co-
ricaturas para revistas satíricas pré-revolucionárias, também das rochas. São importantes leção de porcelanas do período
era um experimentado ceramista. Tchekhónin começou imedia- para a produção de cerâmica, soviético seja referida na Rússia
refratários, fibra de vidro e peças atual como pertencente às co-
tamente a inscrever uma série de slogans e aforismos nas lou- de isolamento térmico, como leções do Museu da Fábrica
ças, tais como: “A mente não pode tolerar a escravidão”, “Quem fusíveis, disjuntores, termostatos, Imperial de Porcelana.
não está conosco está contra nós”, “A tarefa da ciência é servir utilizadas na tecnologia de
às pessoas”. As frases eram citações das mais diversas fontes, iluminação e na engenharia 9. “Coleções do Museu da
desde o Manifesto Comunista e discursos de Lênin a textos de elétrica e eletrônica. Fábrica Imperial de Porcelana.
Ovídio, Cícero e, ainda, Dostoiévski e Tolstói. Ao lado de suas Porcelana 1917-1925”.
7. Serguei Tchekhónin nasceu Disponível em: <https://tinyurl.
atividades artísticas, Tchekhónin buscou profissionais que reu- em 1878, na família de um com/ycys5ve5>. Acesso em:
nissem as habilidades necessárias para realização de projetos ferroviário russo. Começou a 18.05.2020.
de agitação em cerâmica: Vassíli Kandínski, Natan Altman, Maria trabalhar cedo e, no final do
Lébedeva, Varvara Freze, Mikhail Adamóvitch, Vladímir Tátlin, século XIX, iniciou os estudos 10. Piotr Kúsmitch Vaúlin (1870-
Kazimir Maliévitch e muitos outros, além de Vassíli Kusnetsov que, de desenho em escolas 1943), russo filho de campo-
de fazendas coletivas e na
em 1918, esculpiu um busto de Karl Marx totalmente em porce- escola de Maria Tiénicheva,
neses, formou-se como mestre
lana, atendendo ao Plano de Propaganda Monumental já em de- ceramista pela Escola Agrícola
especialista e professora de de Krasnoufimsk e, a partir daí,
senvolvimento (LOBANOV-ROSTOVSKY , 1989, p. 128-129). esmalte. Foi diretor artístico da continuou a trabalhar e pesqui-
Fábrica Estatal de Porcelana sar tecnologias de cerâmica,
Conforme assinalado na página do Museu Hermitage, detentor em Petrogrado nos períodos tendo ensinado no ateliê de ce-
de um rico acervo de porcelana soviética advinda do Museu da de 1918 a 1923 e de 1925 râmica do já citado Círculo de
Fábrica Imperial de Porcelana:8 a 1927. Realizou projetos de Arte de Abrámtsevo (sediado na
festivais de rua e espetáculos propriedade do filantropo Sávva
Na década de 1920, a porcelana de vanguarda tornou-se um teatrais e participou ativamente
importante item de exportação para a indústria da arte da re- Ivánovitch Mámontov nas cer-
como designer gráfico na canias de Moscou, onde foram
pública soviética. Em 1925, a fábrica apresentou cerca de elaboração de cartazes,
300 itens que foram feitos no período pós-revolucionário na organizados ateliês de todos os
selos, emblemas. Trabalhou campos artísticos, pintura, es-
Exposição Internacional de Artes Decorativas e Industriais para as principais revistas
Modernas de Paris e recebeu uma grande medalha de ouro. cultura, música, teatro, litera-
revolucionárias e desenhou tura e laboratórios experimen-
A pedido dos colecionadores da Europa Ocidental, a fábri- livros de projeção internacional,
ca repetiu duas vezes a exibição da exposição de Paris para tais) do qual também participou
como A Revolução Mundial e Tchekhónin. Vaúlin fará grande
vender as peças: na Exposição Industrial de Milão e na Feira a Internacional Comunista, de
Internacional de Paris. 9 contribuição para o renascimen-
Zinóviev (1921) e Os dez dias to e desenvolvimento da cerâmi-
que abalaram o mundo, de ca maiólica na Rússia.
Além de sediar o Narkompros, a Fábrica Estatal de Porcelana John Reed (1927). Além disso,
também reunia integrantes do Departamento de Artes Visuais pintou retratos de compositores Rudolf Vilde, prato com
(IZO) em sua direção. Além de Tchekhónin, Piotr Vaúlin10 era (Tchaikóvski, Skriábin, Wagner, a inscrição “Vitória dos
o diretor geral e cuidava dos assuntos administrativos, tendo Glinka e outros). A partir Trabalhadores 25 de Outubro”
David Chtérenberg como responsável pela conexão direta com de 1928, após seu exílio em sobre bandeira vermelha,
Paris, projetou cenografias de Fábrica Estatal de Porcelana de
as diretrizes do IZO. Veremos que, pouco tempo depois, a fá- destacados balés e trabalhou
brica de cerâmica estreitará vínculos com outros dos artistas Petrogrado, porcelana, 1919,
intensamente na Europa e Coleção Piotr Aven
do período, como Kandínski, Tátlin e Maliévitch, muitos dos Japão. Morreu em 1936, na
quais foram mestres dos Svomas e/ou dos Vkhutemas. Nesse cidade alemã de Lörrach.
sentido, evidencia-se que houve motivação suficiente para que
220
223
O ENSINO REVOLUCIONÁRIO
DE UMA ARTE TRADICIONAL

Aleksandr Lavréntiev, historiador, pesquisador, professor e 11. Cf. “Aleksei Vassílievitch I. Rojdiéstvenskaia, serviço de
pró-reitor de pesquisa da Academia Strôganov, em Moscou, e Filíppov – artista ceramista, chá decorado com desenhos
também tutor do legado de seus avós, Aleksandr Ródtchenko e historiador, restaurador e tradicionais, guache, aquarela e
Varvara Stepánova, assim descreve o nascimento da Faculdade inovador em uma única pessoa”. lápis sobre papel
de Cerâmica: Disponível em: <https://
ceramicadecor.ru/blog/ Logo da Faculdade de Cerâmica
[Aleksei] Filíppov foi o iniciador da criação de uma Faculdade de filippov-aleksey/> Acesso em: dos Vkhutemas
Cerâmica especial nos Vkhutemas, como um centro não apenas 19.05.2020.
de arte, mas também de treinamento científico e técnico, no iní-
cio da reorganização dos Svomas, em 1920. Ele levou sua pro-
posta sobre a criação de tal faculdade ao recém-nomeado rei-
tor dos Vkhutemas, [Efim] Ravdel, em agosto de 1920. E assim,
Filíppov convidou o professor da Escola Técnica Superior Boris
S. Chvetsov. A equipe de professores foi aprovada, com mais de
vinte pessoas. Filíppov foi nomeado diretor, e Chvetsov foi nomea-
do vice-diretor (LAVRÉNTIEV, 2020, p. 14-15).
Aleksei Filíppov se formou na Academia de Arte Industrial
Strôganov em 1904, ano em que organizou e passou a coordenar
um coletivo de criadores denominado Artiél Murava de Artistas
Ceramistas, composto por grandes nomes do período, como
Serguei Maliútin, Serguei Koniónkov e Dmitri Mitrókhin (mais tarde
todos eles seriam docentes nos Vkhutemas-Vkhutein). Até 1916,
as oficinas do Artiél Murava detiveram a liderança no campo da
criação e produção de cerâmica, sendo responsáveis por traba-
lhos de revestimento e decoração de edifícios com azulejos e pai-
néis, esculturas, fontes e canteiros de flores, bem como lareiras,
fogões e utensílios domésticos variados.11
Com o advento da Revolução, Filíppov, que também se formara no
Instituto Arqueológico de Moscou em 1915, onde se especializou
em tecnologia de produtos cerâmicos da Rússia antiga, vislum-
brou a utilidade desse material no novo mundo ambicionado pelos
bolcheviques. Ao planejar a Faculdade de Cerâmica, buscou or-
ganizar uma estrutura adequada para formar especialistas tanto
na área técnica quanto na arte.
Desde o início, com sua experiência artística, tecnológica, docen-
te e administrativa, Filíppov tinha diretrizes claras, conforme suas
próprias palavras:
A Faculdade de Cerâmica tem por objetivo formar artistas-ceramistas
familiarizados com essa arte e com as técnicas de produção, bem
como artistas que não estejam vinculados à produção, mas que,
no futuro, sejam capazes de dirigir departamentos de criação das
fábricas. Os programas levam em conta esses requisitos. O en-
sino das disciplinas artísticas gerais permite que os estudantes
recebam uma formação em todas as áreas. As aulas de pintura e
222
elaborados por vários de seus alunos e alunas, com destaque para

233
Vladímir Kovalski e Sofia Pressman, além de Sótnikov.
Antes de se unir à grande experiência pedagógica revolucionária
na arte e no design, já em sua fase final, Tátlin havia sido mes-
tre dos Svomas e participara intensamente da organização dos
museus soviéticos após 1917, além de ter sido coordenador do
Departamento de Artes Visuais (IZO) do Narkompros. O compro-
metimento com a construção de novas linguagens artísticas se 20. Cf. Vassíli Ivánovitch
manifestou em várias fases de sua vida. Rakítin, “Vladimir Ievgrafovitch
Tátlin”, Enciclopédia online de
Aos 35 anos de idade recebeu a encomenda estatal para construir vanguarda russa. Biografias.
um Monumento à Terceira Internacional, mas sua aspiração por al- Disponível em: <http://
rusavangard.ru/online/
cançar outros espaços e utilizar materiais inusitados na arte e na biographies/tatlin-vladimir-
arquitetura vinha de muito antes: Tátlin foi precoce e destemido.20 evgrafovich/> Acesso em:
21.05.2020.
Nascido em Moscou, filho de uma poeta e um engenheiro
ferroviário, distinguiu-se inicialmente nos estudos de desenho 21. Rakítin aponta que alguns
na Escola Real da Carcóvia, grande cidade ucraniana para onde críticos, ao escreverem sobre
se mudara com o pai em 1906, após a morte da mãe. Aos qua- a obra de Tátlin, “tentaram
torze anos, foge de casa com destino a Odessa, onde parte de apresentar seus primeiros
navio para a Bulgária e Turquia. relevos como uma imitação
de Picasso, não prestando
Entre 1902 e 1910, estudou arte e passou pela Escola da Marinha atenção à diferença nos
Mercante de Odessa até concluir sua formação na Escola de Arte métodos dos dois artistas”. Cf.
<http://rusavangard.ru/online/
Seliviérstov, em Penza. Em 1910, aproximou-se de Mikhail Lariónov, biographies/tatlin-vladimir-
de quem se tornará grande amigo e a quem reconhecerá como pro- evgrafovich/> Acesso em:
fessor. Nesse período seu trabalho se torna respeitado, sendo exi- 24.05.2020.
bido em muitas exposições ao lado dos principais artistas das van-
guardas em Moscou, Odessa e São Petersburgo. Participou dos Vladímir Tátlin no ateliê com
grupos Soiuz Molodiôji [União da Juventude], em 1911, e Oslíni o Monumento à Terceira
Khvost [Rabo de Asno], em 1912. Ao mesmo tempo, destacou-se Internacional ao fundo, 1919
na criação de cenografias e figurinos para o teatro, uma vasta pro-
dução praticamente desconhecida no Ocidente. Em 1913, ano do
tricentenário do reinado da dinastia Románov, realizou figurinos e
cenários para a ópera A vida para o tsar, de Glinka, que ressaltaram
sua excelência no campo da arte decorativa russa.
Entre fevereiro e março de 1914, viajou para Berlim para se apre-
sentar como músico em uma exposição de artesãos russos e de lá
seguiu para Paris onde, por um breve período, frequentou o ateliê
de Picasso.21 Em maio do mesmo ano, exibiu seus primeiros “re-
levos” – construções complexas feitas de madeira, gesso, chapa,
papel, vidro e outros materiais. As texturas contrastantes impuse-
ram um grande desafio ao artista, que executou peças marcadas
pela clareza e harmonia das formas. Os relevos foram seguidos
pelos contrarrelevos angulares e centrais, que se distinguiram pela
tensão da estrutura e a utilização de materiais até então inéditos,
como ferro e outros metais, cabos, tinta pura e madeira; peças que
já enunciavam a estética nascente. Rakítin aponta que
Os relevos mantinham uma sutileza particular da arte de Tátlin.
A genialidade do pintor e a capacidade de esclarecer toda a
232
complexidade das relações lineares e rítmicas são sentidas em sua

235
sofisticada tonalidade luminosa. O vazio do espaço se tornou um
fenômeno artístico.22
A força da obra de Tátlin extrapolou fronteiras e ganhou a admi-
ração dos dadaístas alemães. Prova disso é que a Primeira Feira
Internacional Dadá, ocorrida em Berlim em 1920, teve por tema “A
arte está morta. Viva a nova arte mecânica de Tátlin” (ADES, 1986,
p. 27-28). Na Rússia, a repercussão de seu trabalho não foi menor, 22. Idem.
e o poeta Khlébnikov dedicou-lhe o poema “Tátlin, o visionário dos
mistérios das hélices”.23 23. Idem.
Após 1917, suas atividades artísticas se intensificaram: assu-
24. O texto está incluído neste
miu a direção do IZO, integrou a Comissão para a Proteção dos livro após o capítulo sobre a
Monumentos de Arte e Antiguidades e integrou o corpo docente Faculdade de Escultura.
dos Svomas. Em 1919, algumas de suas obras são incorporadas
aos acervos do Museu Russo e da Galeria Tretiakov. No mesmo 25. Idem.
ano, mudou-se para Petrogrado e começou a trabalhar no projeto
da torre com a colaboração de Nikolai Púnin, que, em 1920, pu- 26. Idem.
blica um ensaio sobre o Monumento à Terceira Internacional.24 No
final do mesmo ano, o modelo da torre é apresentado, primeira- Aleksei Sótnikov, mamadeiras
mente em Petrogrado e, em seguida, em Moscou. com tampas prenseis criadas
para maternidades, supervisor
O monumento deveria alcançar alturas até então inimagináveis, Vladímir Tátlin, 1930
superiores em ao menos um terço à da Torre Eiffel. O projeto pre-
via três blocos de construção que abrigariam escritórios executi- Aleksei Sótnikov, bule de chá e
leiteira em porcelana, supervisão
vos, administrativos e de propaganda da Komintern. Suas janelas Vladímir Tátlin, Vkhutein, 1930
de vidro se deslocariam em diferentes velocidades. Tátlin buscou
reunir formas puramente artísticas – escultura, pintura e arquite-
tura – em uma unidade funcional, que servisse à vida cotidiana do
novo mundo revolucionário.
Segundo Rakítin, a torre espiralada de Tátlin provocou diversas
associações históricas e culturais, da Torre de Babel de Brueghel
à “garrafa” do futurista italiano Umberto Boccioni. Trótski chegou
inclusive a compará-la com uma garrafa de cerveja.25 Contudo,
sua sofisticada estrutura insinuava, paradoxalmente, um ritmo
cinético percorrido pelos metais ascendentes e uma harmonia ab-
soluta, ao mesmo tempo em que, num traço biográfico, remetia
aos mastros dos veleiros que tantas vezes abrigaram o marinheiro
Tátlin. Este projeto tão ambicioso previa um desenvolvimento tec-
nológico inviável para a Rússia da época.
Embora a obra seja apontada como marco inaugural do
Construtivismo, Tátlin recusava ver-se como ideólogo de qualquer
movimento artístico, preservando sua independência. Em 1925,
depois de se desentender com outros participantes do Inkhuk,
Tátlin parte para Kiev. Rakítin ressalta que Tátlin orientou estudan-
tes do Instituto de Arte de Kiev na realização de estruturas “es-
paciais complexas, que mais tarde seriam chamadas de instala-
ções”.26 Em 1927, deixa Kiev em direção a Moscou e, a convite
de Novítski, torna-se docente da Faculdade de Cerâmica e da
Faculdade de Trabalho em Madeira e Metal do Vkhutein até 1930.
234
237
27. Idem.

28. Vale notar que o nome


da máquina é um neologismo
originado da combinação de
duas palavras: o sobrenome do
próprio autor (Tátlin) e o verbo
russo letát, isto é, voar. (N. da E.)

Vladímir Tátlin, maquete


do Monumento à Terceira
Internacional Comunista nos
Svomas de Petrogrado, 1920. No
detalhe, a figura de seu criador.
Arquivo Central de Cinema do
Estado de São Petersburgo

Vladímir Tátlin, contra-relevo de


canto (angular), 1925-1926 (cópia
do autor da obra de 1914), ferro,
cobre e madeira, 71x118cm

Nessa instituição, junto aos seus alunos e alunas, opôs-se firme-


mente ao conceito de geometria funcional de Ródtchenko.27
Com o encerramento do Vkhutein, dedicou-se com alunos e
ex-alunos a projetos de arte e tecnologia. Estes culminariam em
três modelos da máquina voadora Letátlin,28 resultado de estudos
iniciados ainda em Kiev e que fizeram jus ao poema que lhe dedi-
cara Khlébnikov muitos anos antes. Continuou a atividade docen-
te até 1933 no Instituto de Silicatos e Materiais de Construção. A
partir de então, trabalhou intensamente com design de cenários e
figurinos até o final dos anos 1940. Em 1953, morre em Moscou.
Não obstante sua reconhecida contribuição para os campos da
arquitetura, arte, tecnologia e design, até hoje seu legado não ape-
nas é pouco pesquisado no Ocidente: é praticamente ignorado.
236
Numa economia socialista

243
FACULDADE TÊXTIL
planejada, a moda dependerá
não da competição do
mercado, mas da melhoria e
racionalização das indústrias
de vestuário e têxtil. O artista
têxtil ocupará uma posição
de responsabilidade e
independência na fábrica e no
aparato de comércio e vendas.
Varvara Stepánova1
242
245
A FACULDADE TÊXTIL
NOS VKHUTEMAS

Dentre todas as faculdades dos Vkhutemas, a têxtil foi uma das 1. “Vetchiérniaia Moskvá”,
que estabeleceu mais parcerias com a produção industrial soviéti- 1929, citado em Alexander
ca dos anos 1920. Dividida em três ateliês principais — tecelagem, Lavrentiev, Varvara Stepanova:
impressão e bordado — teve seu início marcado pela presença The Complete Work, First MITT
majoritária de mestres tradicionalistas e tecnólogos, como Oskar Press, Cambridge, 1988, p. 180.
Griun e Aleksandr Kuprin, então representantes de um desenho
com influência francesa e britânica que caracterizou a estampa in- 2. A Reforma Emancipadora
assinada em fevereiro de 1861
dustrial russa até 1917.
por Alexandre II encerrou o
O processo de industrialização da Rússia desencadeado a partir regime conhecido como servidão
de 1860 pelo tsar Alexandre II, impulsionado, entre outros fato- da gleba. Um dos resultados
res, pela emancipação dos servos,2 transformou de modo radi- da emancipação dos servos
foi o massivo êxodo rural, com
cal a produção de bens e o desenvolvimento de produtos arte-
grandes massas populacionais
sanais no país, provocando mudanças econômicas, políticas e se deslocando para os centros
sociais significativas. Os primeiros setores privilegiados pelas urbanos. Essas populações seriam
novas políticas econômicas de industrialização seriam a siderur- proletarizadas na segunda metade
gia e a exploração petrolífera. A partir dos anos de 1890, as po- do século XIX, com a aceleração
líticas implementadas pelo Ministro das Finanças, Serguei Witte, da industrialização russa.
e o investimento de capital britânico fomentam o desenvolvimen-
to industrial russo, e a indústria têxtil passa a apresentar inten- 3. Para mais informações, ver
so crescimento. Alguns exemplos são a Manufatura Triokhgórni capítulo “Contexto histórico e
Prókhorovski (Prókhorovskaia Triokhgórnaia Manufaktura), fun- artístico revolucionário” deste livro.
dada em Moscou pela família Prókhorov, em 1799, assim como
a indústria têxtil Ivánovo Voznessiénsk, de propriedade da família Alunos da escola industrial-
Burílin, que, em 1872, recebem grandes investimentos britânicos. fabril (FZU) da Fábrica Unida de
Sosnevo fazendo a montagem da
Com a crise econômica de 1870-1880, o processo de industria- máquina da Fábrica de Ivánovo-
lização russo sofreu uma desaceleração, e só voltou a crescer Voznessiénsk, 1928. Museu
no final do século oitocentista. Isso gerou um clima de grande Estatal Histórico-Regional de
insatisfação social e política, que culminaria em movimentos de Ivánovo D. G. Burilin
insurreição já no início do século XX, como a revolução de 19053
(KACHURIN, 2006, p. 19). Departamento de criação da
Oficina Central de Arte da
Na indústria, a presença de capital e tecnologia estrangeiros será Fábrica Unida de Sosnevo,
determinante para a expansão da produção. Em 1897, a Rússia já Ivánovo-Voznessiénsk, 1931-
1933. Museu Estatal Histórico-
contava com 4449 indústrias operando, que empregavam cerca Regional de Ivánovo D. G. Burilin
de 642.000 trabalhadores. O crescimento industrial urbano con-
trastava de modo dramático com os métodos empregados no
campo russo, com uma agricultura de instrumentalização muito
precária. Tal condição gerava crises de abastecimento de ma-
térias-primas para a indústria, como o algodão no setor têxtil, e
levou o país a uma política de importação. Consequentemente, a
indústria nacional sofria uma forte dependência econômica em re-
lação a capitais e insumos de outros países, como Grã-Bretanha,
244
França e Alemanha, que ao final do século XIX já haviam se tornado

247
potências industriais (LÊNIN, 1985, p. 72-3).
A influência estrangeira marcava também a estampa têxtil industrial,
uma vez que não eram criados desenhos de padronagem autenti-
camente russos, e a grande maioria dos motivos eram de autoria
de criadores franceses e britânicos. A situação foi radicalmente al-
terada nas mesas de criação da Faculdade Têxtil dos Vkhutemas,
quando um grande investimento pedagógico foi realizado para a Varvara Stepánova e Liubov
criação de acervos de padrões gráficos para têxteis. Popova, 1924, foto de
Aleksandr Ródtchenko
A Faculdade Têxtil dos Vkhutemas foi criada em janeiro de
1921 com a unificação dos três ateliês independentes da anti-
ga Academia de Arte Industrial Strôganov, os quais não eram
reconhecidos como cursos superiores, mas apenas de experi-
mentação. Os ateliês de tecelagem, estamparia impressa e bor-
dado foram então reorganizados como curso superior de ofícios
e tecnologias têxteis, cujo objetivo era transformar o ensino de
artesanias em disciplinas de formação de designers tecnólogos
para a indústria.
No entanto, a escassez de profissionais aptos para o ensino
tecnológico e de instalações e maquinários adequados eram
dificuldades iniciais. A solução foi transferir profissionais da in-
dústria para o ensino, como Oskar Griun e Mikhail Tikhomírov,
e utilizar instalações industriais como salas de aula. Griun atua-
va como chefe de produção do setor de fiação da Manufatura
Triokhgórni Prókhorovski, ao passo que Tikhomírov ocupava o
posto de diretor da Primeira Estatal Têxtil de Moscou, antiga
fábrica Tsindel (KACHURIN, 2006).
O ensino das artesanias era considerado inapropriado para a
nova realidade revolucionária, que preconizava a indústria como
grande ferramenta de transformação econômica, social e políti-
ca. Em 1922, o bordado é excluído do currículo e substituído pelo
ateliê de Aerografia e Colorimetria, sob o comando de Liudmila
Maiakóvskaia.
Contudo, na disciplina Composição Artística para Tecelagem,
ministrada por Oskar Griun e Nikolai Sóbolev, persiste a criação
de estampas de influência europeia, principalmente francesa, com
uma repetição dos repertórios existentes no período imperial, par-
ticularmente florais provençais e xadrezes em estampas tramadas.
Isso mudaria em 1923, com a admissão da designer gráfica
Varvara Stepánova como mestre de desenho e composição na
Faculdade Têxtil. A partir de então, à medida que as linguagens
construtivistas se tornaram a principal orientação pedagógica
e projetual da escola, Stepánova desenvolveu um novo currícu-
lo para os estudantes, com a colaboração da artista e designer
Liubov Popova, então mestra do curso propedêutico Cores e
Superfícies no IPO. Uma das pretensões era aprofundar o ensi-
no das disciplinas de formação básica em composição e desenho
246
341
FACULDADE DE ESCULTURA
A forma quer superar a
matéria, a força de atração; a
força de resistência é grande
e pesada; retesando os
músculos, a forma procura
uma saída pelas mais
elásticas e escapadiças
linhas, como só o mundo
conhece, por espirais. Elas
são repletas de movimento,
anseio, corrida e são
apertadas como a vontade
criativa e como o músculo
retesado pelo martelo.
Nikolai Púnin1
340
UM ENSINO CONSERVADOR

Ao lermos sobre o Plano de Propaganda Monumental2 seria 1. Nikolai Púnin, Monumento à


possível pensar que a Faculdade de Escultura teria papel pre- Terceira Internacional: projeto
ponderante a cumprir, ao lado da Faculdade de Pintura e da do artista V. E. Tátlin, São
Faculdade de Arquitetura, na produção de grandiosos monumen- Petersburgo, Izdánie Otdiéla
tos em homenagem aos considerados heróis pelos bolcheviques, Izobrazítelnykh Iskússtv N. K.
P., 1920. Nikolai Nikoláievitch
bem como na celebração de fatos históricos relevantes à ideo- Púnin foi um estudioso, ensaísta
logia soviética. Por outro lado, quem lê este livro possivelmente e historiador de arte nascido na
sabe da existência do célebre projeto do Monumento à Terceira Finlândia em 1888. Teve papel
Internacional de Vladímir Tátlin. Há, ainda, quem se recorde da preponderante na organização
escultura de grandes proporções que uniu as imagens do operá- e manutenção de acervos
museológicos do Museu Russo e
rio e a da mulher kolkhoziana, concebida por Vera Múkhina para o Hermitage em São Petersburgo.
encimar o Pavilhão Soviético na Exposição Internacional de Artes Junto a Maiakóvski, Brik e
e Técnicas Aplicadas à Vida Moderna, ocorrida em Paris, em Ståhlberg foi membro do conselho
1937. Qual a relação entre esses símbolos da cultura soviética e a editorial da revista Iskússtvo
Faculdade de Escultura? Komúni [A Arte da Comuna].
Legou textos significativos sobre a
É fato que o segmento de maior prestígio na Faculdade de gravura japonesa, sobre a pintura
Escultura foi o que se dedicou à escultura monumental, princi- de Andrei Rubliov e, ainda, sobre
o trabalho de Tátlin, além de
palmente quando Novítski assumiu a reitoria dos Vkhutemas. Não escrever sobre a história da arte
obstante, tanto o monumento de Tátlin quanto o de Múkhina foram da Europa Ocidental. A despeito
realizados em períodos em que os Vkhutemas não estavam em fun- de suas amplas e valiosas
cionamento. O Monumento à Terceira Internacional foi concebido contribuições para a cultura e para
em 1919, quando Vladímir Tátlin era professor dos Svomas, por- o patrimônio russo e soviético,
foi preso em 1949 e executado
tanto, um pouco antes da criação dos Vkhutemas. E quando estes em 1953 pelo regime stalinista.
foram criados, Tátlin foi professor, como vimos, da Faculdade de O texto sobre o Monumento
Cerâmica, além da da Faculdade de Trabalho em Madeira e Metal. à Terceira Internacional, de
Tátlin, citado na epígrafe, é
Vera Múkhina, por sua vez, foi docente da Faculdade de Escultura apresentado após este capítulo
no final dos anos 1920, já no Vkhutein. Porém, o monumento como material complementar.
Operário e Mulher Kolkhoziana3 foi realizado em 1937, quando os
Vkhutemas haviam há muito sido extintos. Porém, na Faculdade 2. Para mais detalhes sobre
de Escultura, o Realismo e o conservadorismo nas artes e no de- o Plano de Propaganda
Monumental ver capítulo sobre a
sign se fizeram sentir de forma mais expressiva. Assim, observar Faculdade de Pintura neste livro.
e refletir sobre as obras de Tátlin e de Múkhina é de grande valia.
Pode-se afirmar, ao lado de Khan-Magomiédov e Adáskina e tam- 3. Operário e Mulher Kolkhoziana,
em russo Rabótchii i Kolkhósnitsa.
bém analisando a produção e biografia de mestres e estudantes, Kolkhosiana é a trabalhadora do
que esta foi a menor e também a mais conservadora das facul- kolkhóz (ou colcoz), acrônimo
dades. Muitos membros de seu corpo docente e discente foram em russo para propriedade rural
não apenas acolhidos pelo regime stalinista como exaltados pelo coletivizada.
próprio Stálin, a exemplo de Serguei Koniónkov. Em 1924, a fa- Capa com Torre de Tátlin para
culdade contava com 72 estudantes, cinco dos quais se trans- Vera Múkhina e Iza Burmeister texto “Monumento à Terceira
em ateliê em Paris, 1914 Internacional”, de Nikolai Púnin,
feriram para a Faculdade de Arquitetura e dois para a Faculdade Petrogrado, 1920
Poligráfica (KHAN-MAGOMIÉDOV, 1995, p. 851).
342
345
Escultura se transferissem para as faculdades de produção. O 5. Jivskulptarkh, acrônimo
próprio Lavínski deixou a Faculdade de Escultura em 1923 para russo de Komíssia jivopísno-
integrar o corpo docente da Faculdade Trabalho em Madeira. skulpturno-arkhitekturogo sinteza
(Comissão de síntese entre
Koroliov passou a implementar suas ideias sobre o ensino da pintura, escultura e arquitetura).
escultura a partir de um ponto de vista de síntese das artes, segun-
do o qual pintura, arquitetura e escultura têm papel relevante, uma Selo comemorativo “Símbolos
ideia cultivada e propagada por ele como líder da Jivskulptarkh.5 da Época da Construção
Khan-Magomiédov traça a linha por ele denominada “coerente” na 4. O epíteto “de cavalete” Tais diretrizes, inicialmente, tiveram significativo impacto “em todo Socialista”, Rússia, 2000
formação dos estudantes de escultura: os estudos eram inicia- foi utilizado para qualificar um grupo de arquitetos e, acima de tudo, em líderes de movimen-
dos nos ateliês de escultura das rabfaks, sob a coordenação de diferentes tipos de arte.
tos como o racionalismo (Ladóvski) e a escola inovadora de ro-
Aleksei Bábitchev; a seguir, cursavam a disciplina Volume no IPO Sua origem está na pintura
de cavalete, uma estética mantismo simbólico (Gólossov)” (KHAN-MAGOMIÉDOV, 1996,
para, então, encaminharem-se para a Faculdade de Escultura pro-
representada na época pela p. 130-134) e teriam impacto, como veremos adiante, no projeto
priamente dita, cujo programa se articulava não em departamentos Sociedade de Artistas de de construção do Pavilhão Soviético da Exposição Internacional
(exceto o Principal), mas em temas: o princípio da escultura em Cavalete (OSA). Para mais de Artes e Técnicas Aplicadas à Vida Moderna de Paris, em 1937.
três dimensões; características da construção do relevo; o prin- informações, ver capítulos
cípio do retrato; o princípio da escultura monumental. A estes sobre a Faculdade de Pintura e Contudo, Boris Koroliov deixa os Vkhutemas em 1924, ao
temas uniam-se os cursos Teoria da Composição, ministrado por Poligráfica deste livro. mesmo tempo que Vladímir Favórski assume a reitoria da escola.
Vladímir Favórski; Desenho, por Pável Pavlínov e Mikhail Rodiónov; Iossif Tcháikov assume a diretoria da Faculdade de Escultura e
Boris Koroliov, “Grotesco”,
e Princípios Formais da Arquitetura Aplicados às Artes Visuais madeira, 94,7x34,7x31,8cm.,
dá ampla continuidade à implantação dos princípios metodológi-
(KHAN-MAGOMIÉDOV, 1995, p. 851-853). 1921. Coleção do Museu Estatal cos de Koroliov. Embora realize incursões pelo Cubismo escul-
Russo de São Petersburgo tórico, sua preferência é notadamente por uma pedagogia tradi-
Inicialmente Serguei Koniónkov assumiu a direção da Faculdade,
cional. Assim seguirá até 1929, quando, em parte por pressão do
assessorado por Boris Koroliov e tendo Anton Lavínski como se- Iossif Tcháikov, “Eletricista”, corpo discente, em parte pela nomeação de Novítski (substituto
cretário científico, logo substituído por Koroliov. De início, ambos estudo para uma escultura, 1921, de Favórski) para a reitoria, a escultura de cavalete é suplantada
assessores comungavam de um ponto de vista semelhante sobre aquarela, nanquim e grafite
pela escultura monumental.
as diretrizes da Faculdade de Escultura: planejavam aplicar os sobre papel, 34,6x25,2cm.,
conceitos do Cubismo e da arte de esquerda. Contudo, o movi- Galeria Tretiakov, Moscou Os diretores da Faculdade de Escultura foram: Boris Koroliov
mento de ambos logo toma rumos diferentes. Boris Koroliov pas- (1920-1923), Iossif Tcháikov (1923-1929), Mikhail Belachov
sou a defender a chamada “escultura de cavalete”,4 enquanto (1930). Em 1926, houve uma tentativa infrutífera, que durou um
Anton Lavínski aderiu ao Construtivismo e, atraído pelos resulta- ano, de reunir as Faculdade de Escultura e de Cerâmica.
dos experimentais da Faculdade de Trabalho em Madeira e Metal,
iniciou uma campanha para que alunas e alunos da Faculade de
344
ESCULPINDO O REALISMO
SOCIALISTA SOVIÉTICO

Em 2012, numa mostra inédita com desenhos de Vera Múkhina para 6. Gueorgui Kovalenko, “Teatr
o teatro, exibida no Museu de Arte Moderna de Moscou (MMOMA), à Veri Múkhina: neizviéztnie
Rua Petrovka 25 , o curador Gueórgui Kovaliénko lançou inquietante stranítsi tvórtchestvo skulptora”
questão sobre os caminhos da produção da artista, afirmando que: [O Teatro de Vera Mukhina:
“se os seus projetos teatrais de 1916-1917 tivessem sido realizados, Páginas desconhecidas do
trabalho criativo da escultora].
toda a carreira da artista poderia ter mudado de direção”.6 Disponível em: http://www.
O frêmito que causa essa curta e contundente observação do mmoma.ru/exhibitions/
curador russo é que as opções e preferências da escultora pro- petrovka25/teatr_very_
muhinoj_neizvestnye_stranicy_
jetam uma condicionante histórica muito mais abrangente: se ar- tvorchestva_skulptora/
tistas como ela não tivessem tomado o rumo do Realismo, toda a
produção artística soviética teria tido outra direção, ao menos em 7. O Prêmio Stálin foi criado
tese. Em sua trajetória, tanto artística como pessoal, Múkhina sin- em homenagem a Stálin em
tetiza a própria história da arte russa e soviética a partir do primei- 1940, e foi concedido até 1954
ro decênio do século XX, das experimentações de vanguarda até arealizaçõescidadãos e cidadãs cujas
se destacassem no
o período mais rígido do Realismo Socialista e, consequentemen- campo da tecnologia, ciência
te, seus paradoxos e tensões estéticas e ideológicas. Múkhina militar, literatura e arte, os quais
teve uma carreira respeitada e recebeu muitos prêmios por seu trouxessem melhorias radicais
trabalho no período soviético, tendo sido, inclusive, cinco vezes nos métodos de trabalho e de
agraciada com o mais prestigioso deles, o Prêmio Stálin.7 Apesar produção.
disso, a produção construtivista da artista permaneceu no limbo
até o segundo decênio do século XXI.
Ao noticiar a mostra, em outubro de 2012, a agência russa Tass
afirmou que a exposição no MMOMA apresentava ao público pela
primeira vez uma Vera Múkhina até então “desconhecida”: a desig-
ner de teatro e moda. E não se tratou da mostra de alguns poucos
desenhos. A agência de notícias descreve que “Em salas separa- A obra foi uma encomenda vinculada ao projeto do arquiteto Boris Vera Múkhina com o filho, 1924
das foram montados cenários inteiros, instalações de luz e som e Iofan, que desenhou o Pavilhão Soviético. Sua realização levou em
até colunas antigas feitas de fios delicados – tudo isso mergulha conta a síntese entre arquitetura e escultura, assim idealizou-se
os visitantes no mundo do teatro” (AGEEVA, 2012). que a estrutura vertical do Pavilhão, com 34 metros de altura, de-
veria ser encimada por uma escultura de grandes proporções que
Múkhina, nascida em 1889, na capital da Letônia, é conhecida
constituiria um “objeto único” (MOLOKOVA, 2013, p. 35), assim
internacionalmente como notável escultora e muralista. Desde
definido por Iofan:
que foi exibida em 1937 no Pavilhão Soviético da Exposição
Internacional de Artes e Técnicas Aplicadas à Vida Moderna de Na minha ideia, o Pavilhão Soviético seria retratado como um edi-
Paris, sua obra escultórica Operário e Mulher Kolkhoziana se tor- fício triunfal, refletindo com sua dinâmica o rápido crescimento
das realizações do primeiro Estado socialista do mundo, o entu-
nou célebre mundo afora, a partir de 1947, como ícone dos estú- siasmo e a alegria de nossa grande era [...] O Pavilhão Soviético é
dios de cinema Mosfilm, onipresente nas vinhetas de abertura de apresentado como um edifício de formas dinâmicas, com a parte
filmes desde o período de Eisenstein, conterrâneo de Múkhina, frontal se acumulando nas bordas, coroada por um poderoso
passando por Tarkóvski, até o mais popular dos melodramas do grupo escultórico (IOFAN citado por MOLOKOVA, 2013, p. 36).
Realismo Socialista, mantendo-se até os dias de hoje como a Iofan concebeu “um rapaz e uma moça, representando os donos
logomarca do estúdio. da terra soviética – a classe operária e o campesinato agrícola
coletivo. Eles erguem o emblema da Terra dos Sovietes – uma
346
365

NOTAS BIOGRÁFICAS
DOS PRINCIPAIS MESTRES

364
como cenógrafo e ilustrador de obras de Victor Hugo, Isaac

367
Bábel, Prosper Mérimée, Iliá Ehrenburg, Vladímir Maiakóvski e
ALEKSEI VASSÍLIEVITCH BÁBITCHEV (1887-1963) vários outros autores de literatura infantil.
Escultor, pintor e teórico. Foi professor dos Svomas entre 1918
e 1920. De 1920 a 1924, atuou como professor de escultura dos
Vkhutemas. Em 1920, substitui Kandínski na direção do Inkhuk.
Com Ródtchenko, Stepánova, Brik, Lissítski e Popova, elabo- ALEKSANDR VASSÍLIEVITCH CHEVTCHÉNKO
rou as novas definições sobre o conceito de Construtivismo. (1882-1948)
Dirigiu o Grupo de Trabalho de Análise Objetiva, para o qual
realizou relatórios teóricos entre 1920 e 1924, delineando seus Pintor. Estudou em diversos ateliês em Paris, inclusive com Matisse,
pensamentos sobre a unidade da arquitetura e da escultura. em 1905. Quando retornou à Rússia, estudou na Academia de
Arte Industrial Strôganov, na Escola de Pintura de 1905 a 1907, e
na Escultura e Arquitetura de Moscou de 1907 a 1909. De 1918
a 1920, lecionou nos Svomas e, de 1921 a 1930, na Faculdade
de Pintura dos Vkhutemas e do Vkhutein. Participou de várias
VIKTOR STEPÁNOVITCH BALÍKHIN (1893-1953) associações artísticas, dentre as quais a Jivskulptarkh.
Arquiteto diplomado nos Vkhutemas em 1924. Deste ano a
1930, lecionou a disciplina propedêutica Espaço no IPO, com
os programas elaborados por Nikolai Ladóvski, e Composição
Arquitetônica na Faculdade de Arquitetura. Uma de suas pro- NIKOLAI VASSÍLIEVITCH DOKUTCHÁIEV (1891-1944)
postas era desenvolver junto a alunas e alunos estudos de ex-
pressividade artística e tratamento de volumes e espaços para Arquiteto. Concluiu seus estudos na Escola de Pintura, Escultura
construção de conjuntos habitacionais. Foi membro da Asnova. e Arquitetura de Moscou em 1916 e na Academia Imperial de
Artes de São Petersburgo em 1917. De 1920 a 1930, lecio-
nou na Faculdade de Arquitetura dos Vkhutemas e do Vkhutein
no Segundo Departamento. Com Nikolai Ladóvski, Vladímir
Krínski e Lázar Lissítski, fundou a Asnova, que reuniu arquitetos
NIKOLAI ALEKSÉIEVITCH CHEVERDIÁEV racionalistas.
(1887-1952)
Artista gráfico, concluiu seus estudos na Academia Artístico-
Industrial Chtiglits, em São Petersburgo. Foi docente da
Faculdade Poligráfica dos Vkhutemas, onde lecionou técnicas VLADÍMIR ANDRÉIEVITCH FAVÓRSKI (1886-1964)
de água-forte, xilogravura e fotomecânica para editoração.
Artista gráfico, gravador e pintor. Entre 1906 e 1907, estudou
com Iuon em Moscou e na escola do pintor húngaro Simon
Hollósy em Munique. De 1918 a 1920, atuou nos Svomas e, entre
1920 e 1930, nos Vkhutemas, lecionando as seguintes discipli-
DAVID PETRÓVITCH CHTÉRENBERG (1881-1948) nas: Teoria da Composição e Desenho, na Faculdade de Pintura,
Pintor e artista gráfico. Entre 1906 e 1914, estudou na Escola de Escultura e na Poligráfica; Teoria da Gravura, na Faculdade
de Belas Artes e na Academia Vitti, em Paris. Participou ativa- Poligráfica; e disciplinas gráficas abstratas no IPO. Foi membro
mente da primeira reforma do ensino das artes e técnicas na do grupo Mákovets e da Academia de Artistas da União Soviética
Rússia, que resultou na criação dos Svomas. Foi um dos orga- e reitor dos Vkhutemas de 1923 a 1926.
nizadores do Inkhuk. De 1918 a 1920, dirigiu o IZO em Moscou.
Entre 1910 e 1920, Chtérenberg participou de quase todas as
exposições realizadas em Moscou e Petrogrado-Leningrado.
Foi organizador e participante da Primeira Exposição de Arte
Russa, realizada em 1922 e 1923, em Berlim e Amsterdã.
Ensinou na Faculdade de Pintura dos Vkhutemas e, paralela-
mente, ministrou cursos de composição nas Faculdades Têxtil
e de Escultura. Foi presidente da OST. Chtérenberg trabalhou
366
Um novo campo cultural de

379
BAUHAUS
ideias não pode expandir-se
e desenvolver-se mais
rapidamente do que a nova
sociedade em si, à qual deve
servir. Creio, todavia, poder
afirmar sem exagero que
a comunidade da Bauhaus
contribuiu, pela inteireza de
sua tentativa, para ancorar
novamente a arquitetura e o
design contemporâneos no
domínio social.
Walter Gropius1
378
4. O arquiteto e designer
Joseph Hoffmann (1870-1956)
ARTESANIA E INDÚSTRIA já havia fundado em Viena, em
1903, a Wiener Werkstätte,
em associação com o pintor e
designer gráfico Koloman Moser
(1868-1918), com os mesmos
propósitos que a DWB.
As forças industriais que se tornaram inspiração nas mesas de 1. Walter Gropius, “Minha concep-
criação das faculdades dos Vkhutemas foram potencializadas ção da ideia de Bauhaus” (1935), 5. Peter Behrens (1868-1940),
no século anterior, quando a industrialização se tornou a gran- in: Bauhaus: Novarquitetura, tradu- um arquiteto e designer alemão,
de aposta das economias capitalistas europeias. Durante o sé- ção J. Guinsburg e Ingrid Dormien foi um dos primeiros a propor
Koudela, Editora Perspectiva, São a associação da criação do
culo XIX, os maquinários e as demandas da produção industrial desenho de objeto ao projeto
Paulo, 2015, p. 29.
proletarizaram grandes contingentes populacionais. O mundo se de invenção na indústria de
transformava, e países como a Inglaterra e a França se tornavam 2. William Morris (1834-1896), foi maquinários, favorecendo
potências industriais. um pintor, designer têxtil, escritor, o desenvolvimento de um
tipógrafo e um dos fundadores do mecanismo de multiplicação fabril
Movimentos de criação surgem para atender aos novos processos movimento Arts & Crafts, que agre- próprio para um determinado
produtivos de bens de consumo, agora barateados pela fabrica- gou as artes aos métodos de pro- produto, o que contribuiu
ção multiplicável. Mas nem todos entendiam a indústria como uma dução artesanais, numa proposta para o incremento da indústria
alemã. Criou inúmeros projetos
ferramenta democratizante do objeto, até porque todo o ambiente renovadora e humanista de rejeição
arquitetônicos e de design gráfico
industrial era de exploração cruel e violenta do operariado. O re- ao modelo industrial. Foi um dos
primeiros teóricos da história e fun- para a Allgemeine Elektricitäts-
sultado foi uma explosão demográfica nos grandes centros urba- cionalidade do desenho padrona- Gesellschafft (AEG), cuja Fábrica
nos, que agregavam os polos industriais, com crescente desuma- do para têxteis e papéis de parede. de Turbinas foi o primeiro edifício
nização social e pobreza concentrada nas classes trabalhadoras. Seu trabalho como designer é até em ferro e vidro da Alemanha.
hoje uma das principais referên-
Na segunda metade do século XIX, o artista inglês William Morris2 cias do pattern moderno. Ativista 6. Walter Gropius (1883-1969),
propôs um novo posicionamento em relação à produção mate- marxista, fundou em 1884, com arquiteto e educador alemão, é
Entre seus fundadores estavam Richard Riemerschmid, Joseph considerado um dos grandes
rial em seu trabalho para o desenho de padronagens, mobiliário Eleanor Marx, a Liga Socialista, um
dos primeiros partidos socialistas Maria Olbrich, Josef Hoffmann,4 Theodor Fischer, Bruno Paul e nomes da arquitetura moderna.
e vitrais. Opôs-se aos processos industriais e elegeu a artesania
da Grã-Bretanha. Em decorrên- Peter Behrens,5 entre outros. Em 1912, o arquiteto Walter Gropius Fundou a Bauhaus com o objetivo
como método de resgate da ação do homem no processo cria- de fomentar novas posturas
cia de divergências com membros se junta ao grupo.6
tivo e manufatureiro, rejeitando o trabalho mecanizado da indús- do partido, desligou-se da sigla para a criação arquitetônica e
tria. Suas propostas de criação e produção constituiram o movi- em 1890. Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial em 1914 e a interrup- em outros segmentos do design.
mento Arts & Crafts, que influenciou muitos artistas entre o final ção da produção industrial de bens de consumo, já que todo o es- Com a ascensão do nazismo no
início dos anos 1930, migra para
do século XIX e início do XX. Com a fundação da Morris & Co., 3. Richard Riemerschmid (1868- forço de guerra levou ao incremento da indústria bélica, a DWB Londres e depois para Cambridge,
esse projeto sobre o fabrico de bens foi colocado em prática, es- 1957) foi um arquiteto, designer, se tornou um grande centro de discussão e pensamento sobre o
pintor e urbanista alemão radicado nos Estados Unidos, onde
timulando iniciativas semelhantes em todo o continente europeu em Munique, e um dos fundadores
futuro da criação arquitetônica e material. lecionou e foi diretor da Faculdade
(LAMBOURNE, 2011). do Jugendstil, movimento inspirado de Arquitetura da Universidade de
A Revolução de Outubro de 1917 na Rússia provocou uma revi- Harvard.
no Art Nouveau.
Acompanhando o movimento inglês, a Alemanha viu o surgimento ravolta intelectual para esses artistas e arquitetos alemães. Assim,
de inúmeras pequenas oficinas industriais, que fabricavam utilitá- em 1918, com o fim da guerra, o arquiteto Bruno Taut7 e o crítico 7. Bruno Julius Florian Taut (1880-
rios com processos manuais, desde mobiliários e tecidos a obje- Organizadores da Primeira e teórico da arte Adolf Behne, inspirados pela arte revolucionária 1938), arquiteto e urbanista
Exposição de Arte Russa em alemão, um importante teórico
tos em vidro e metal. No entanto, diferentemente do que ocorreu Berlim, em uma das três salas soviética, fundaram em Berlim o Arbeitsrat für Kunst [Conselho
da arquitetura expressionista
entre os adeptos do Arts & Crafts, os alemães passam a incor- da Galerie van Diemen, da dos Trabalhadores para a Arte] a partir de uma concepção de do período. Fomentou relações
porar maquinários na produção de bens de consumo, que serão esquerda para a direita: David arte e design como ferramentas transformadoras e revolucioná- internacionais entre arquitetos
nomeados objetos mecânicos pelo arquiteto e designer Richard Chtérenberg (diretor da IZO), rias, que se consolidou na linguagem renovadora do expressio- e movimentos, como o
Riemerschmid.3 Ao final do século, a Alemanha se tornaria a gran- D. Marianov (representante da nismo alemão. Walter Gropius esteve atento à atuação de artis- Construtivismo soviético e o De
Tcheká), Natan Altman, Naum Stijl holandês.
de potência industrial europeia, ultrapassando a Inglaterra. Gabo e Friedrich Lutz (diretor da tas, arquitetos e designers russos desde o início da Revolução em
galeria), tendo ao fundo pinturas 1917. Percebeu uma mudança de intenções, assinalada por ele em
É nesse cenário econômico e social que, em 1907, um grupo de
de Chtérenberg e uma escultura carta a Karl Ernst Osthaus: “o ambiente aqui está bastante tenso, Walter Gropius, foto de Lucia
arquitetos e designers fundam a Deutsche Werkbund (DWB), de Arkhípenko, e em primeiro Moholy-Nagy, Dessau, 1927.
e nós, artistas, temos de malhar o aço enquanto ele está quente.
Associação de Artes e Ofícios Alemã, que pretendia associar, de plano um torso de Gabo, 1922. Arquivo Bauhaus, Berlim
Para mim a Werkbund está morta, não se pode esperar mais nada
forma equilibrada, artesania e indústria como forças produtoras. Foto Willy Römmer
dela” (DROSTE, 2006, p. 10-16).
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CRONOLOGIA

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1908 1911 1912 1913 1914 1915-16 1916 1917

7 de janeiro Rússia declara Dois milhões de 23 de fevereiro. Operárias de 4 de abril. Lênin desembarca na
Lênin foge da Rússia guerra contra soldados russos Petrogrado em greve vão às ruas Estação Finlândia, em Petrogrado,
e volta a se exilar Alemanha e Áustria, mortos e um terço pedir por “Pão e Paz”. O governo e apresenta aos bolcheviques as
na Suíça. em apoio à França e de um milhão ordena que tropas militares as Teses de abril com o famoso slogan
Grã-Bretanha. de presos. reprimam, mas estas se rebelam “Todo poder aos sovietes”. Com ele
e a cidade entra em caos. vem Lunatchárski.
Novembro. Escassez
de alimentos e 27 de fevereiro. 7 de julho. O governo provisório
greves por melhores Primeira Revolução. ordena a prisão de Lênin sob a
salários em acusação de traição.
toda a Rússia. 2 de março. Cossacos entram
na insurreição e o tsar Nicolau II Agosto. Lênin retorna à Finlândia
abdica. Primeira composição do para fugir à prisão.
Governo Provisório.
7 de outubro. Lênin retorna à
7 de março. Prisão de Nicolau II Rússia ilegalmente.
e de sua esposa Aleksandra.

Viktor Khlébnikov Primeira exposição Dezembro. 3 de dezembro Maiakóvski escreve Em Petrogrado, a 10 de março. Artistas (Púnin,
cria o neologismo vanguardista do Publicação do Encenação da ópera o manifesto Última exposição Ródtchenko, Tátlin, Meyerhold e
“budetliáne”, oriundo grupo Valete de manifesto “Bofetada futurista Vitória “Budetliáne”, futurista de outros) se manifestam para que
da forma futura Ouros (Gontcharova, no gosto do público”, sobre o sol, de conceituando pinturas 0,10 a arte se desvincule do Estado, e
do verbo ser, para Lariónov, Maliévitch por David Burliuk, Mikhail Matiúchin e e localizando lança o conceito fundam o movimento Liberdade
designar o grupo e outros) em Moscou. Aleksei Krutchônikh, Aleksei Krutchônikh, o movimento de Suprematismo para as Artes.
de artistas de Velimir Khlébnikov e em Petrogrado, com futurista russo. (forma de arte não
vanguarda, que Vladímir Maiakóvski. figurino de Kazimir objetiva). Participam 1º de junho. Fechamento da
posteriormente Maliévitch tendo Maliévitch, Tátlin, maior parte dos museus de arte
serão identificados como cenário o Púnin, Popova, em Petrogrado.
como futuristas. “Quadrado Negro”. Rózanova, Udaltsova,
entre outros. 7 de agosto. União de artistas
na Galeria Tretiakov declara
proteção aos monumentos como
prioridade absoluta.
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1929 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937

Fevereiro. Trótski é deportado. 25 de abril. Fundação do órgão 5 de dezembro. A 20 de fevereiro. Stálin 30 de janeiro. Hitler é Transformação Início do Grande
de Administração dos Campos Catedral de Cristo retira de Trótski a nomeado chanceler da GPU em Terror por meio
Outubro. Início da de Trabalho (Ulag) junto ao Salvador, em Moscou, cidadania soviética. da Alemanha. Comissariado do dos Processos de
Coletivização Forçada da Diretório Estatal de Política é dinamitada e Povo para Assuntos Moscou: julgamento
Agricultura. Nikolai Bukhárin (OGPU) completamente destruída. Internos da URSS dos opositores
e Aleksei Ríkov se opõem para combater o de Stálin. Dentre
e advogam pelo retorno Outubro. Inauguração crime e manter a os julgados e
da NEP. O Politburo apoia do Mausoléu de Lênin segurança pública. executados estavam
Stálin massivamente. desenhado pelo arquiteto Kámenev, Zinóviev
Aleksei Schússev e executado Início dos julgamentos. e Bukhárin.
16 de novembro. Bukhárin é em granito.
expulso do Politburo.
Ulag é reorganizado como
Administração Central dos
Campos de Trabalho (Gulag).

4 de março. Morte de Abril. Dissolução do Vkhutein.


Iliá Tcháchnik.

Setembro. Lunatchárski
é demitido do cargo de
Comissário para a Educação, e
substituído por Andrei Bubnov.

1º de novembro. Exposição Abril. O poeta Maiakóvski 23 de abril. Comitê 26 de fevereiro. Primeira prisão de Funeral suprematista 18 de junho de 25 de maio.
individual de Maliévitch na comete suicídio. Central aprova a Condenação de Óssip Mandelstam. de Maliévitch. 1936. Morte de Inauguração
Galeria Estatal Tretiakov. Resolução de 1932 que Pável Floriênski a dez Maksim Górki. da Exposição
Agosto. Hannes Meyer coloca fim a todas as anos de trabalhos Internacional de Artes
Estreia do filme O homem é demitido da Bauhaus associações livres de forçados no Gulag. Decreto oficial de e Técnicas Aplicadas
com uma câmera, de Dziga e emigra para a URSS, artistas. Stálin proibindo a à Vida Moderna em
Viértov levando consigo um grupo 26 de dezembro. exibição de arte de Paris com pavilhão
de ex-alunos. 20 de Maio. Pela Morte de Anatóli vanguarda na URSS. da URSS projetado
primeira vez é utilizado Lunatchárski. pelo arquiteto Boris
Novembro. Maliévitch o termo Realismo Iofan, que trazia em
é preso como espião Socialista no Encontro seu topo a escultura
alemão e acusado de fazer de Escritores. Trabalhador e Mulher
propaganda antissoviética. Kolkhoziana, de
25 de junho. Início Vera Múkhina.
da criação de
associações de artistas
hierarquizadas e
controladas pelo Estado.
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COORDENAÇÃO EDITORIAL Neide Jallageas © Kinoruss Edições e Cultura Alfabeto em Volumes (uma peça).
EDIÇÃO Priscila Nascimento Marques © Selo Vkhutemas Piotr Mitúritch, 1921. Coleção
© Celso Lima Mitúritch-Khliébnikov, p. 480
REVISÃO Cecília Rosas © Neide Jallageas
PROJETO GRÁFICO, Maria Cau Levy
DIAGRAMAÇÃO E CAPA Julio Mariutti Traduções
© Celso Lima
IMAGEM DA CAPA arte de Maria Cau Levy sobre o croqui © Francisco de Araújo
Grafismo, de Liubov Popova (1924) © Neide Jallageas
© Priscila Nascimento Marques
TRATAMENTO Marcelo Guarnieri
DE IMAGENS Paulo Mattos Angerami Todos os direitos reservados
São Paulo, 2020

É vedada a reprodução de qualquer parte


deste livro sem a expressa autorização da
editora. Realizamos os melhores esforços para
identificar a origem e data de cada imagem
reproduzida neste livro. Os créditos encontram-
se nas legendas de cada uma delas, bem como
as respectivas coleções onde se encontram.
AGRADECIMENTOS Anastasia Lukovnikova, pela Na hipótese de eventual omissão, os direitos
ESPECIAIS pesquisa inicial continuam reservados aos seus titulares.
Gutemberg Medeiros, pelo apoio
a bibliografia Kinoruss Edições e Cultura
São Paulo SP Brasil
Marcelo Guarnieri (Estúdio Guarnieri) [email protected]
que recuperou arquivos de imagens www.kinoruss.com.br
Maria Cau Levy e Julio Mariutti pela
prontidão para o desenvolvimento
gráfico do projeto de financiamento
coletivo
Marco Antonio Sousa Silva, Maurilio
Costa Lima e Paulo Mattos Angerami
pelo companheirismo
Priscila Nascimento Marques cuja
colaboração e disponibilidade tornou
essa escrita legível
AGRADECIMENTOS AOS Aleksandr Lavrentiev (Coleção
HERDEIROS E INSTITUIÇÕES Stepânova e Rodtchenko), Anastasia
Rojdiênstvenskaia, Vera Mitúritch-
Khliébnikova, Museu Hermitage,
Galeria Tretiakov, Museu Estatal
Histórico-Regional de Ivánovo D. G.
Burilin, Museu de Arquitetura A. V.
Schússev, Museu de Arquitetura de
Moscou - MARKHI, Museu Estatal
Russo de São Petersburgo, Biblioteca
Estatal Russa.
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP

Lima, Celso; Jallageas, Neide


Vkhutemas: desenho de uma revolução / Celso Lima e Neide
Jallageas. –
São Paulo: Kinoruss, 2020.
480 p.; Il.

Exposição “Vkhutemas: o futuro em construção (1918–2018)”.


São Paulo, SESC Pompéia, 27 de junho a 30 de setembro de
2018.

ISBN 9786599206207

1.Arte. 2. Educação. 3. Arte Russa. 4. Ensino da Arte. 5.


Educação

Estética. 6. História da Arte. 7. História da Arte Russa. 8.


História do Design. 9. História da Arquitetura. 10. Revolução
Russa. 11. Arte e Sociedade na Rússia. 12. Movimento
Construtivista. Título. II. Desenho de uma revolução. III.
Revoluções e pedagogias. IV. Contexto histórico e artís-
tico revolucionário. V. Svomas: ateliês livres de artes. VI.
Vkhutemas | Vkhutein. VII. Faculdades. VIII. Departamento de
Experiência e Preparação (IPO). IX. Faculdade de Arquitetura.
X. Faculdade de Trabalho em Madeira e Metal. XI. Faculdade
de Cerâmica. XII. Faculdade Têxtil. XIII. Faculdade Poligráfica.
XIV. Faculdade de Pintura. XV. Faculdade de Escultura. XVI.
Certificação de encerramento dos Vkhutemas-Vkutein. XVII.
Notas biográficas dos principais mestres. XVIII. Irradiações.
XIX. Bauhaus. XX. Le Corbusier. XXI. Cronologia. XXII. Lima,
Celso. XXIII. Jallageas, Neide.

CDU 7.03 CDD


709.47

Catalogação elaborada por Regina Simão Paulino CRB 6/1154


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A parceria entre a autora e o
autor na pesquisa e escrita
dessa obra ocorreu, em grande
parte, sob isolamento social
devido à pandemia Covid-19.
Publicado em outubro de
2020, celebrando o centenário
dos Vkhutemas, este livro foi
composto em Akzidenz-Grotesk,
impresso em papel Pólen Soft
80g, na gráfica Expressão e
Arte para a Kinoruss Edições e
Cultura, Selo Vkhutemas, com
480

tiragem de 1000 exemplares.

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