5 - Conceitos de Tradução
5 - Conceitos de Tradução
5 - Conceitos de Tradução
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Sumário
INTRODUÇÃO ......................................................................................... 3
CONCLUSÃO ........................................................................................ 27
REFERÊNCIA ........................................................................................ 29
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NOSSA HISTÓRIA
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INTRODUÇÃO
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1. TRADUÇÃO LITERAL E LIVRE
São Jerônimo (384 AD), o santo protetor dos tradutores, que traduziu a
Bíblia inteira para o latim, também mostrou preferência pela tradução do sentido,
opondo-se, desta maneira, à tendência dominante de seu tempo de se fazer
tradução literal de obras sagradas por respeito à “Palavra de Deus” (cf. Delisle &
Woodsworth, 1995:168).
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Essa discussão continua até hoje. Entre os que, contemporaneamente,
defendem a tradução literal, podemos citar Peter Newmark (Newmark, 1988:69),
ao afirmar que “a tradução literal é correta e não deve ser evitada, uma vez que
assegure a equivalência referencial e pragmática em relação ao original”.2 Entre
os que a combatem, podemos citar Vázquez-Ayora (1977, apud Gonçalves,
1996:43), que “pretende libertar a tradução do literalismo milenar”. Ele define
tradução “como transferência de idéias de uma língua-cultura para outra” (ibid.,
p. 42).
Não se pode negar, portanto, que haja, sob essa perspectiva, dois tipos
válidos de tradução: (a) tradução literal, centrada mais na forma e (b) tradução
livre, centrada mais no sentido (nas idéias ou conceitos). O tradutor pode
focalizar sua atenção em uma ou outra dessas duas modalidades de tradução,
sem, contudo, supervalorizar uma alternativa em detrimento da outra.
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2. POSSIBILIDADE E IMPOSSIBILIDADE DA
TRADUÇÃO.
É verdade que, até certo ponto, pensamos deste ou daquele modo por
causa da língua que falamos, “o que reflete uma diferença no modo como as
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línguas interpretam a experiência do real” (Barbosa, op. cit.:67). Por exemplo,
em português, pensamos distâncias em quilômetros, e não em milhas, como em
inglês, porque nossa língua categoriza as distâncias em quilômetros e não em
milhas. Outros exemplos são dados por Barbosa (ibid.): keyhole (‘buraco da
fechadura’) e like the back of my hand (‘como a palma da minha mão’). Esses
casos, porém, são bastante isolados, em relação ao conjunto total dos fatos
lingüísticos e, portanto, não invalidam a tese da universalidade da linguagem e
da experiência humana, uma vez que o pensamento e as línguas manifestam,
subjacentemente, mais semelhanças do que diferenças, o que explica a
possibilidade da comunicação e da própria tradução.
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Não obstante todas essas afirmações de desespero, permanece o fato de
que a atividade de traduzir vem ocorrendo, e com bastante sucesso, há mais de
dois mil anos. E “sem a tradução, o mundo de hoje, com o rápido intercâmbio de
informações, seria impensável” (Snell-Hornby, 1995:131).
É bem verdade que não existe tradução perfeita, do mesmo modo que
não existe comunicação perfeita, ou absoluta. Toda comunicação humana é
limitada, mas normalmente é satisfatória para atingir seus objetivos.
Comunicação limitada, parcial, não significa, contudo, comunicação ilusória ou
falsa. Do mesmo modo, também não pode haver tradução perfeita. Toda
tradução é parcial, limitada (mas nem por isso ilusória), podendo, porém, ser
aperfeiçoada. (Cf. Buzzetti, 1987:58).
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Mas quem melhor esclarece esse ponto é Jakobson (1971:64), ao afirmar
que:
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formas e regras, mas é também, ao mesmo tempo, um sistema de comunicação,
o que torna possível a tradução. Essa natureza dual da linguagem é bem
expressa por Bell (1991:6-7) nos seguintes termos:
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3. TRADUÇÃO COMO OPERAÇÃO LINGUISTICA
E LITERARIA
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predominantemente linguística, voltada mais para os aspectos
literais/referenciais do que para os efeitos literários/expressivos.
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“Por meio dos exemplos como os precedentes deveria ficar claro
que é possível uma espécie restrita de “transferência de
significado” de uma língua para outra; mas fica igualmente claro
que isso não é o que normalmente se entende por tradução. Em
“tradução” há substituição de significados da LF [Língua-Fonte] por
significados da LM [Língua-Meta]: não transferência de significados
da LF para a LM. Na transferência há uma implantação de
significados da LF no texto da LM. Esses dois processos devem
ser claramente diferenciados em qualquer teoria de tradução.”
Por isso, para Catford (op. cit.:22), “tradução pode definir-se como a
substituição de material textual numa língua (LF) por material textual equivalente
noutra língua (LM)”.
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tradução propõe é o reconhecimento do caráter essencialmente
criativo do processo de tradução.”
“If you tell the truth long enough you are bound to be found out. (Se
contarmos toda a verdade, com certeza seremos descobertos.)5”
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comportamento social ou moral das pessoas, de tal modo que “falar a verdade”
seja normalmente considerado uma ação digna de louvor. O leitor deve
compreender ainda que existe na frase acima uma certa pitada de humor (ou de
ironia), uma vez que há uma inversão do que normalmente se esperaria na
oração principal (o louvor esperado por quem diz a verdade). Na ausência de tal
conhecimento extralingüístico, a força (o efeito) principal da frase, o contraste
entre a expectativa sugerida pela oração subordinada e a surpresa pela inversão
dessa expectativa (e daí a pitada de humor) na oração principal, desaparece
completamente para o leitor, mesmo que faça uso dos melhores dicionários.
De acordo com esse modelo (cf. Eskey, op. cit.:14- 15), a leitura é um tipo
particular de comportamento cognitivo, baseado em certos tipos de
conhecimento que formam parte da estrutura cognitiva do leitor. Assim, a Figura
1 começa com a estrutura cognitiva na mente do leitor, ou seja, com o que ele já
sabe, com o que está armazenado como esquemas em sua memória de longo
prazo. Ele deve, por exemplo, conhecer bem a língua em sua forma escrita, e ter
suficiente conhecimento do assunto do texto a fim de que o mesmo lhe seja
compreensível. Seu conhecimento de forma (formas grafofônicas, lexicais,
sintáticas, semânticas e retóricas) cria-lhe determinadas expectativas sobre a
linguagem do texto. Com essas expectativas, durante o ato físico da leitura, ele
terá condições de fazer, rápida e automaticamente, identificações precisas das
formas linguísticas, utilizando um número mínimo de pistas visuais.
Simultaneamente, seu conhecimento de substância (conhecimento cultural,
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pragmático e do assunto específico) cria-lhe determinadas expectativas sobre a
estrutura conceptual do texto como um todo. Com essas expectativas, durante o
processo da leitura, ele poderá fazer predições corretas sobre a interpretação do
significado global do texto e atingir, assim, a compreensão, ou seja, uma
reconstrução (ou produção) do significado do texto como um todo.
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um lado, e conhecimento não lingüístico, de outro. Graças ao primeiro tipo de
conhecimento, o leitor identifica/percebe os significados (valores) lingüísticos
(relativamente objetivos e estáveis) do texto e, ao mesmo tempo, através do
segundo tipo de conhecimento, ele produz interpretações subjetivas da
compreensão leitora.
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5. O TEXTO TRADUZIDO COMO “PALIMPSESTO”
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material de escrita, principalmente o pergaminho, usado, em razão
de sua escassez ou alto preço, duas ou três vezes [...] mediante
raspagem do texto anterior” (Arrojo, 1986:23)”
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expressar e fixar os pensamentos humanos. (...) A semântica do
texto é de relativa estabilidade. O texto e seu conteúdo semântico
continuam a existir depois de completado o ato individual de
comunicação para o qual ele foi produzido. O texto se perpetua em
sua forma escrita e se distancia por isso da comunicação original,
preservando, contudo, seu potencial comunicativo. Ele pode agora
transmitir sua informação inerente repetidas vezes a todos os
leitores que conhecem a língua. Esta é a função mais importante
das unidades linguísticas gravadas (ou escritas) que fixam e
preservam o conteúdo cognitivo em suas se mântica, tornando-o
disponível, acessível, a qualquer receptor do presente ou do futuro.
(...) Em resumo, podemos dizer que, por um lado, o texto expressa,
aqui e agora, alguma mensagem específica que é produzida em
determinadas circunstâncias para um determinado receptor, com
sua própria estrutura cognitiva (sua experiência única, seus
conhecimentos prévios). Este é o aspecto subjetivo (interpretativo)
da compreensão da mensagem. Mas, por outro lado, o texto
contém informação acessível a qualquer leitor que conheça a
língua, informação esta que depende, exclusivamente, dos
significados das unidades linguísticas e que, portanto, não
depende das possíveis diferenças na estrutura cognitiva de cada
leitor. Este é o aspecto objetivo da compreensão do texto. (grifos
nossos)”
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a linguagem, oral ou escrita, é vista como um objeto a ser descrito,
fora do sujeito. Ou não há, pelo menos, uma preocupação com a
teoria do sujeito na produção do sentido em suas várias instâncias.
A conseqüência disso é que, quando alguns lingüistas
estruturalistas incursionaram pelo terreno da tradutologia,
deixaram a impressão de que o texto, objeto perceptível e
analisável, seria uma espécie de vasilha a conter um produto: o
sentido. A operação tradutória seria comparável a uma troca de
vasilhas, de suporte, de código lingüístico, mantendo-se intacto e
incólume o conteúdo, o sentido. Reagindo a essas colocações a
que poderíamos chamar de objetivistas, certos teóricos, que se
autodenominam desconstrutivistas, pós-estruturalistas ou pós-
modernos, assumem posição diametralmente oposta. Escudados
na autoridade da palavra (ou em sua leitura da palavra) de autores
como Jacques Derrida, Michel Foucault, Jean-François Lyotard e
outros (cujos seguidores, no Brasil, costumam citar em traduções
inglesas), não aceitam que o texto seja um objeto significante, que
ele tenha “marcas” capazes de produzir sentido. Só existiria sentido
na leitura concreta e particular que cada sujeito faz do texto. Não
há verdade. Ela seria uma mera ilusão, uma projeção dos desejos
do sujeito sobre a realidade exterior. Negam que se possa
estabelecer qualquer distinção, a partir do texto, entre o literário e
o não literário, entre uma oitava de Camões e uma bula de remédio,
entre um soneto de Antero de Quental ou de Cruz e Souza e um
teorema de matemática. Chegam mesmo a contestar a
objetividade dos conceitos de língua materna e de língua
estrangeira. Tal posicionamento teórico, se levado às suas últimas
conseqüências, conduz a negar qualquer hipótese de tradução ou,
paradoxalmente, a considerar que tudo é tradução. Apagam-se
todos os limites. Em nome da diferença, eliminam-se as diferenças.
A nosso ver, tanto a posição estruturalista pura como a posição
desconstrutivista extremada são insuficientes para dar conta do
problema do sentido, da leitura e da sua reescrita que é a tradução.
21
A primeira é insuficiente por não considerar o sujeito, e a segunda
é insuficiente por só considerar o sujeito da leitura.”
22
O bom senso e os fatos nos dizem que tanto a posição
estruturalista/objetivista quanto a subjetivista/desconstrutivista são unilaterais,
por enfatizarem apenas aspectos parciais da verdade tradutória. A nosso ver, os
dois pontos de vista são complementares, pois o tradutor se utiliza das duas
perspectivas ao mesmo tempo: da objetivista e da subjetivista. Não há, portanto,
motivos para separá-las, fechando-nos em barreiras preconcebidas, num ou no
outro polo.
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outro pólo, a dimensão idealista/subjetiva do conheciemnto, da leitura e da
tradução, negando que haja uma distinção clara e objetiva entre sujeito e objeto,
como se pode constatar em Arrojo (1992:9-10), ao tentar definir o que seja
“desconstrução”, fazendo referência ao filósofo francês, Jacques Derrida, o
criador da palavra:
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ser necessariamente relativizados e reconhecidos como produto -
ou sintoma - de uma interpretação, mediação inevitável entre
homem e mundo.”
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inconsciente (aspecto subjetivo do conhecimento, da leitura ou da tradução), que
depende obviamente da estrutura cognitiva subjetiva (consciente e inconsciente)
de cada sujeito cognoscente. Nesse sentido, cada conhecimento (cada
compreensão, cada leitura ou tradução) da realidade é único, pois os
conhecimentos prévios e os condicionamentos circunstanciais de cada sujeito
cognoscente são únicos. Mas, por outro lado, não se pode esquecer o outro pólo
do conhecimento (da leitura ou da tradução), uma vez que para haver interação
(jogo) é condição necessária que haja duas partes envolvidas. Negandose uma,
nega-se também a outra.
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CONCLUSÃO
Queremos concluir nossas avaliações acerca das teorias da tradução,
narrando duas pequenas histórias que se assemelham bastante com as visões
opostas de tradução (de leitura e de conhecimento), discutidas neste artigo.
Eis a primeira
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todo. Como seria bom se os teóricos de várias perspectivas fossem mais
humildes e se juntassem para partilhar a visão de cada um, sem idéias
preconcebidas, e sem querer anular ou negar as visões concorrentes, a fim de
poderem alcançar, com um diálogo franco e respeitoso, um retrato mais amplo
e profundo do fenômeno estudado em todas as suas dimensões e, no caso em
apreço, uma visão integrada do processo tradutório.
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REFERÊNCIA
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CROATA, J. S. 1986. HERMENÊUTICA BÍBLICA: PARA UMA TEORIA DA
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MURATA, Y. (1996). TRANSLATION AS SPIRITUAL COMMUNITY . IN:
TRADTERM : REVISTA DO CENTRO INTERDEPARTAMENTAL DE TRADUÇÃO E
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