Separacao de Poderes
Separacao de Poderes
Separacao de Poderes
Os órgãos funcionais são comandados por pessoas que, do princípio deviam ser
independentes, mas que não podem porque, obedecem a voz suprema lançada a partir da
sede de um partido político, onde supostamente também fazem parte.
Diz a Constituição moçambicana no seu artigo 134: “os órgãos de soberania assentam nos
princípios de separação e interdependência de poderes consagrados na Constituição e
devem obediência à Constituição e às leis”. Contudo, o que se verifica na realidade é que em
vez de obedecer estreitamente a lei mãe, estes órgãos “colam-se” ao mesmo partido
político onde devem obediência total.
A vulnerabilidade está mais assente no poder Judicial, em parte, provocada pela própria
Constituição que apesar de, o proclamar como um órgão independente, não cria condições
para o seu funcionamento sem depender do poder Executivo em termos financeiros e
materiais.
Introdução
Entretanto, é de indagar-se o que abrange esse conceito no texto vigente. Com efeito, nos
quarenta anos e meio que se passaram desde publicado o Espírito das Leis, em que essa
doutrina foi afirmada, diversas concepções dessa ideia vieram à luz e foram consagradas
pelo direito constitucional positivo.
Por outro lado, é preciso ter presente que as constituições evoluem – “crescem”, disse Gilles
Cistac e a Constituição em vigor não é disso uma excepção. Muito ao invés, tudo sugere que
passou, nalguns pontos, numa verdadeira mutação entre 1975 e 2018.
Há os que afirmam ser, naquela idade, obra de Aristóteles, enquanto não faltam os que a
entendem um arranjo empírico que este sistematizou. Sustentam numerosos juristas que,
surgiu em tempos modernos, na obra de John Locke, a que se opõem os que adoptam a
ideia de ter sido formulada pela primeira vez por Montesquieu, no Espírito das Leis.
Na verdade, a ideia de dividir o exercício do Poder em prol da boa governação parece provir
da república romana, com o seu sistema de contraposição de poderes, o do Senado, o dos
cônsules, o do povo nos comitia. Locke, no Segundo Tratado do Governo Civil, no final do
século XVII, inspirado pelas instituições inglesas, distingue também três funções: a
legislativa, a executiva e a federativa. Na primeira, inclui ele não apenas a obra do legislador,
mas igualmente a do juiz. Isto corresponde à criação do statute law por aquele, do common
law por este. E a função federativa? Esta tem por mira as relações internacionais, que
normalmente se entabulam por meio de alianças, aliança, em latim foedus, foederis. E se
ele recomenda a separação entre exercício da função legislativa e o das duas outras
funções, entende que estas últimas devem ser confiadas ao mesmo órgão, pois ambas
importam na força armada e a divisão desta é perigosa fonte de conflitos. Muito ele
contribuiu para a formulação da doutrina da separação dos poderes, mas lhe cabe a honra
de haver estabelecido a doutrina clássica. Inclusive, é a ele devida a ênfase na
indelegabilidade das funções.
É com Montesquieu e o Espírito das Leis que efectivamente nasce a doutrina da separação
dos poderes. Marca-a a ideia de uma divisão funcional do Poder em vista da liberdade e
segurança individuais.
Enfatize-se, ademais, que, no Espírito das Leis, é uma visão política que é dada à ideia de
separação dos poderes. Isto, com efeito, transparece da necessidade de entendimento, de
conciliação, entre os Poderes, o que evidentemente exclui a prevalência de qualquer destes
sobre os demais. Ele aponta que os Poderes teriam de caminhar “de concerto”, pois do
contrário ocorreria um “repouso ou inação” que se chocaria com “o movimento necessário
das coisas.”
Ora, essa paralisia não ocorreria numa concepção jurídica em que a legislação tem primazia
e determina a acção dos demais Poderes.
Na verdade, pode-se salientar, com Mauro Barberis, que três ideias são inerentes à
concepção da separação dos poderes tal qual a exprime Montesquieu. São elas: 1) no
Estado, três funções são essenciais – a de dar a lei, a exercer a governação dentro da lei,
mormente executando a lei, e a de julgar a conduta dos indivíduos e os litígios em geral,
segundo a lei e de modo objectivo e imparcial. Ou seja, a legiferação, a administração e a
jurisdição, distinção de funções; 2) estas funções não devem estar nas mãos de um só órgão
ou poder, mas devem estar distribuídas entre ao menos três Poderes diferentes, divisão de
funções; 3) Estes Poderes devem estar em condições de independência (e relativo)
equilíbrio, para que cada Poder possa deter, se preciso for, outro ou outros Poderes, são os
freios e contrapesos – a “balance of power” dos doutrinadores anglófonos.
Acrescente-se, ademais, que, ao contrário do que muitos pretendem, inclusive para criticar
a doutrina, Montesquieu não supõe que as três funções sejam cientificamente distintas, elas
não o são, como tantos já o demonstraram, nem que cada Poder tenha a exclusividade no
exercício de uma delas. Ao contrário, está claro no livro que podem colaborar numa função,
do que é exemplo a elaboração da lei, em que ele distingue. Aquela é reservada ao Poder
Legislativo, esta cabe ao Executivo, contudo não haverá lei sem com o estatuído não estiver
de acordo com este último Poder.
No curso do século XIX, uma concepção jurisdicista da separação de poderes veio, todavia, a
prevalecer. Esta foi desenvolvida pelo positivismo jurídico, para o qual todo o direito se
resumiria ao direito positivo. Ou seja, todo o direito proviria da lei, lei esta que o Legislativo
criaria. Trata-se, como adiante se apontará, de uma interpretação estreita e bitolada do
direito em geral e da doutrina da lei, adoptada por essa corrente. Seu êxito em parte é
devido a ajustar-se a preeminência do único Poder de origem popular que foi, nos primeiros
tempos do constitucionalismo, o Legislativo.
Reflexo dessa doutrina é o entendimento de existir uma diferença substantiva entre as três
funções, legislação, administração e jurisdição. Por isso, na determinação desta diferença,
gerações de juristas se esmeraram, desenvolvendo subtilezas dignas da escolástica.
A doutrina positivista da separação dos poderes sobrevive até os nossos dias. Ainda é a que
marca o Estado de Direito, presidido pelo princípio de legalidade, quando estreitamente
concebido. Verdade é que, esse princípio não mais significa a prevalência da lei formal, mas
admite em lugar desta os actos com força de lei, ou seja, actos normativos primários
provenientes do Executivo.
Avança, ademais, uma tendência à transformação “neoconstitucionalista” do Estado de
Direito, a enfatizar a prevalência do Direito - visto como Moral sobre os instrumentos
formais de sua expressão. Ou seja, que é o justo que deve determinar para todos as acções
e proibições. Isto se reflecte num papel “criador” do Judiciário, criando a regra a partir dos
princípios para os casos concretos sobre os quais debruça. Disto há um inequívoco risco,
seja para a democracia, seja para o próprio Estado de Direito, como adverte em recente e
brilhante trabalho de Jorge Lavocat Galvão. Essa tendência se exprime nas ideias de
Constituição aberta e da preeminência dos princípios sobre as regras, actualmente
destacados por uma doutrina “substancialista”, que se pretende pós-positivista (o que é) e
pós-moderna (o que é duvidoso). Na verdade, a ideia de prevalência do justo (jus quia
justum) sobre o direito legislado (jus quia jussum) profundas raízes que se manifestam
desde a Antiguidade e estão presentes quando do nascimento do constitucionalismo. Não
invoca este a qualidade de direitos naturais àqueles que incumbe ao Estado garantir?
A seguir temos o artigo 39º, prevê que os órgãos do Estado sejam dirigidos todos pela
Frelimo. Ligando esta consagração ao facto de a Assembleia Popular (um dos órgãos), ser
dirigido pelo presidente da República Popular, que era, ao mesmo tempo o presidente da
Frelimo, dai que pode-se concluir que não existia a ideia da separação de poderes. Ou seja,
os poderes todos estavam concentrados nas mãos do Presidente da República Popular que
era, ao mesmo tempo, o presidente do partido único e dirigente.
Na vigência da CRPM/75, apesar de existir um poder judicial consagrado como Órgão, não
se pode afirmar que havia uma organização judicial que permitisse um correto e desejável
funcionamento da justiça, porque era um órgão totalmente ligado aos outros; ou seja,
estava ligado ao Estado, à Frelimo e ao Presidente da República Popular. Portanto, não era
separado. E também, porque se tratava de um órgão completamente dependente do
Presidente da República, por via da Assembleia. Note-se que nem a revisão de 1978,
mostrou interesse em mudar a filosofia principal subjacente à CRM/75 (a centralização e a
concentração de poderes), na medida em que deixa expresso que os Tribunais se
subordinam à Assembleia Popular.
Apôs a primeira constituição de 1975, tivemos o segundo momento histórico que foi a partir
de 1990, a quando da aprovação, pela Assembleia Popular, aos 2 de Novembro de 1990, da
Constituição da República de Moçambique. Trata-se da Constituição de 1990 (CRM/90), que
entrou em vigor no dia 30 de Novembro de 1990. É uma nova constituição que mudou de
forma radical a filosofia política e ideológica vigente no Estado moçambicano até então, ou
seja essa constituição foi fruto da assinatura dos acordos geral da paz e consequente
realização das primeiras eleições multipartidárias.
Artigo 62º da CRPM. “Na República Popular de Moçambique a função judicial será exercida
pelos tribunais, através do Tribunal Popular Supremo e dos demais tribunais determinados
na lei sobre organização judiciária. A sua composição e competência serão fixadas por lei”.
Ver, Lei o número 11/78, de 15 de Agosto, considerada uma grande revisão da Constituição
de 75. 13 Artigo 212 da CRM/90. (Função jurisdicional): 1. Os tribunais têm como objetivo
garantir e reforçar a legalidade como factor da estabilidade jurídica, garantir o respeito
pelas leis, assegurar os direitos e liberdades dos cidadãos, assim como os interesses
jurídicos dos diferentes órgãos e entidades com existência legal; 2. Os tribunais penalizam as
violações da legalidade e decidem pleitos de acordo com o estabelecido na lei; e 3. Podem
ser definidos por lei mecanismos institucionais e processuais de articulação entre os
tribunais e demais instâncias de composição de interesses e de resolução de conflitos em
que se traduz a mesma concepção e pilares essenciais do Estado de Direito Democrático.
Daí que, tendo abraçado este modelo de Estado, a Constituição moçambicana de 1990,
além de explicitar a qualificação dos tribunais como órgãos de soberania, com dignidade
igual a do Presidente da República, da Assembleia da República e do Governo (art. 109),
fixou-lhes o objetivo de garantir a legalidade, o respeito pelas leis, os direitos e liberdades
dos cidadãos e os interesses jurídicos dos diferentes órgãos e entidades com existência legal
(art. 161, n.º 1).
A mesma constituição fixa ainda a responsabilidade (civil, criminal e disciplinar) dos juízes e
as incompatibilidades de funções para a pessoa que desempenha a função de magistrado
judicial.
Do ponto de vista institucional, a independência dos juízes passou, por via da Constituição
de 90, a beneficiar de uma outra garantia crucial e de índole constitucional, que consistiu na
criação do Conselho Superior de Magistratura Judicial (CSMJ), cuja competência,
composição, organização e funcionamento estariam regulados por lei ordinária, sendo
algumas competências directamente avançadas pelo artigo 222º da CRM, como, por
exemplo, as descritas nas alíneas a) e c), a citar, respectivamente:
Conclusão
Diante de todos os factos aqui levantados sobre a separação de poderes e bem como a
independência do judiciário. Conclui-se que a separação dos poderes surge no momento
liberal como uma das alternativas de divisão do poder, e que junto com o
constitucionalismo e com o reconhecimento dos direitos fundamentais, representa o maior
e mais firme contributo para o modelo de Estado de Direito hoje existente. Sem prejuízo de
outras formulações da separação dos poderes, foi na Inglaterra, na separação proposta por
Locke (2008), que primeiramente se viu a divisão do poder Estatal não somente sob uma
óptica meramente funcional, mas também sob uma perspectiva orgânico-institucional,
dividindo o poder entre o Parlamento e a Coroa.
Referências bobliográficas
- Legislação: